BARRA DA TIJUCA

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BARRA DA TIJUCA: O CONCEBIDO E O REALIZADO 1[1] Luciana Araujo Gomes da Silva 2[2] Resumo: 1[1] Parte da monografia defendida e aprovada pelo curso de graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense em 21 de dezembro de 2004. 2[2] Geógrafa pela Universidade Federal Fluminense, e – mail : [email protected]

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BARRA DA TIJUCA: O CONCEBIDO E O REALIZADO1[1]

Luciana Araujo Gomes da Silva2[2]

Resumo:

Neste trabalho visa-se o estudo do planejamento espacial da Barra da Tijuca, a

expansão urbana do bairro associada a seu sistema costeiro, a fim de buscar soluções

que pretendam conter a destruição e a poluição do que ainda existe desse sistema. Entre

os objetivos, discute-se o que foi realizado pelo Plano Piloto original do bairro, e o que

dele foi modificado, sinalizando qual a possível interferência no ambiente costeiro,

analisando como ele se encontra hoje. A Barra da Tijuca é um bairro localizado na

cidade do Rio de Janeiro. Um bairro que passa por uma rápida expansão, tendo seu

grande impulso de ocupação a partir da década de 70, apresentando-se, no início,

direcionado por um Plano Piloto que previa a urbanização associada à preservação do

meio ambiente. O Plano Piloto como instrumento de ordenação urbana na Barra da

Tijuca gerou conflitos entre os agentes responsáveis pela produção do espaço urbano. A

influência desses agentes aliados a inexistência de um respaldo jurídico em relação a

importância e obrigação da preservação dos ecossistemas, foram decisivos para a não

realização do projeto de Lucio Costa. Por fim, esse Plano foi enquadrado na legislação

municipal vigente, e pouca atenção foi dada ao meio ambiente. Através de pesquisas de

campo observa-se a degradação ambiental nas lagoas, mangues e praias, causada

principalmente pelo despejo de esgoto sem tratamento nesses ambientes, o que precisa

ser revertido. Pelo observado, pode-se dizer que o Plano não foi seguido na íntegra, e o

processo de construção e expansão urbana da Barra da Tijuca foi modificado pelos

agentes da produção do espaço urbano, e ao ambiente costeiro pouca atenção foi dada

para sua preservação e agora se procura formas de reverter esse processo.

Abstract:

1[1] Parte da monografia defendida e aprovada pelo curso de graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense em 21 de dezembro de 2004. 2[2] Geógrafa pela Universidade Federal Fluminense, e – mail : [email protected]

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In this work aims at itself the study of the spatial planning of the Barra da Tijuca, the urban expansion of the neighborhood associated to its coast system, in order to seek solutions that are going to stop the destruction and the pollution on what exists of that system. Between the objectives, discusses was been carried out what by the original Pilot Plan of the neighborhood, and what of him was modified, showing whick is the possible interference in the coast environment, analyzing as it is today. The Barra da Tijuca is a neighborhood located in the city of the Rio de Janeiro. A neighborhood tha passes for a quick expansion, having its big impulse of occupation from the decade of 70, presenting itself, in the beginning, directed by a Pilot Plan that foressees to urbanization associated to the preservation of the environment. The Pilot Plan as instrument of urban ordering in the Barra da Tijuca generated conflicts between the responsible agents by the output of the urban space. The influence of those allied agents to a miss of a legal endorsement regarding importance and obligation of the preservation of the ecosystems, were decisive for the not achievement of the Project of Lucio Costa. Finally, that Plan was fit in the in force municipal legislation, and little attention was fact to the environment. Through the researches of field observes-itself the environmental degradation in the ponds, mangroves and beaches, caused mainly by the eviction of sewer without handling in those environments, what must to be changed. As observed, is able to be said that the Plan was not followed in the integral on, and the trial of construction and urban expansion of the Barra da Tijuca was modified by the agents of the output of the urban space, and to the coast environment, not enough attention was fact for his preservation and now itself search forms of change that trial.

Introdução:

A cidade do Rio de Janeiro, desde o século XIX, foi uma cidade bastante

pensada e planejada por diversos planos diretores, com a finalidade de embelezar a

cidade, de facilitar o deslocamento interno ou de dotar algumas áreas da cidade e sua

população de infra-estrutura básica. Dentro desse contexto, o bairro da Barra da Tijuca

foi privilegiado, em 1969, com um Plano Diretor específico para o bairro, com o

intuitivo de orientar seu crescimento urbano, criando normas para o uso e ocupação do

solo. Esse plano foi elaborado pelo arquiteto Lucio Costa sob o nome de o Plano Piloto

para Urbanização da Barra da Tijuca, Pontal de Sernambetiba e de Jacarepaguá, que

também pretendia preservar a “natureza agreste” do lugar.

Esse Plano propunha para a Barra da Tijuca uma nova forma de organização do

espaço: o crescimento urbano aliado às questões ambientais. Através do controle da

expansão urbana, e pretendia preservar a geografia do lugar, suas belezas naturais como

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as praias, as dunas, restingas e lagoas, já que era uma das últimas áreas disponíveis para

onde a cidade poderia se expandir. O ponto central do Plano era a construção de duas

vias principais, a Avenida das Américas e a Avenida Alvorada (atualmente Avenida

Ayrton Senna), que fariam a ligação de todo o bairro, e a criação de núcleos autônomos;

também limitava os gabaritos para construção dos prédios, previa áreas de preservação,

dentre outros aspectos.

Assim, esse artigo pretende apresentar uma síntese de um estudo do

planejamento espacial da Barra da Tijuca, e da expansão urbana do bairro associada a

seu sistema costeiro, no qual pretende apontar algumas soluções que visem conter a

destruição e a poluição do que ainda existe desse sistema que compõe o bairro.

O Bairro da Barra da Tijuca:

O Bairro da Barra da Tijuca, objeto desta análise, localiza-se na zona oeste do

município do Rio de Janeiro, dentro da XXIV Região Administrativa, do mesmo nome.

Trata-se de um bairro localizado em uma planície costeira, mais especificamente

na Baixada de Jacarepaguá. Os limites da baixada de Jacarepaguá são, leste o Maciço da

Tijuca, a oeste o Maciço da Pedra Branca, a norte o encontro desses dois maciços e a sul

o mar.

Costuma-se confundir o Bairro da Barra da Tijuca com a Região Administrativa

(R.A.) da Barra da Tijuca, por isso é preciso diferenciá-los: A XXIV R.A. abrange os

bairro de Grumari, Vargem Grande, Vargem Pequena, Camorim, Recreio dos

Bandeirantes, Jóa, Itanhanguá e Barra da Tijuca; o que é diferente, apesar do mesmo

nome, do bairro da Barra da Tijuca, o qual se limita a oeste com bairro do Joá e

Itanhangá, e o maciço da tijuca; a norte com a R.A. de Jacarepaguá, limitado pelas

lagoas; a leste com o Bairro do Recreio dos Bandeirantes, separados pela Avenida

Salvador Allende; e a sul banhado pelo Oceano Atlântico, formando as praias do Pepê e

da Barra da Tijuca.

A área territorial do bairro corresponde a 4.815,6 ha, ou seja, o quinto maior

bairro do município, apresentando 53,15% de área urbanizada e o restante de área

natural. 10% de sua área é tomada por um complexo hidrográfico, extremamente

singular no município do Rio de Janeiro, o que faz sua dele a característica mais

marcante da região.

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O sítio urbano do bairro se torna extremamente importante nessa aálise por dois

aspectos. O primeiro diz respeito às características físicas do bairro. E a segunda diz

respeitos à expansão urbana da cidade: a ocupação do bairro se apresenta como um

processo de expansão da Zona Sul da cidade, sendo este conseqüência do primeiro. São

esses aspectos que vão gerar as características individuais do bairro e contribuir para sua

ocupação tardia.

Plano Lucio Costa: O concebido

A apresentação do Plano Diretor para a Baixada de Jacarepaguá, escrita pelo

então Secretário de Obras Públicas Engenheiro Raymundo de Paula Soares, ressalta

toda a importância e expectativa do que se ergueria na região, “a mais bela cidade

oceânica do mundo”.

Não seria exagero, pois considerando a beleza da região, sua amplitude e a

baixíssima densidade populacional, seria ali o palco ideal para planejar-se a expansão

(inevitável) da cidade do Rio de Janeiro, guardando toda sua beleza natural, que se

estendia nessa imensa região plana.

Em 1932, o jornalista Ricardo Palma, em uma reportagem para o Diário

Carioca (jornal de grande circulação na época) escreveu que o Rio também possuía o

seu sertão3[3], uma área maravilhosa, com lagoas cristalinas, a três horas do centro

(GONÇALVES, 1999). Referia-se à Barra da Tijuca, região que se apresentava como

expansão urbana da cidade do Rio de Janeiro, marcada pela natureza abundante, que

deveria ser planejada, e não deixada a uma ocupação ao acaso, para poder preservar

suas belezas tão marcantes.

3[3] Ao fazer essa afirmativa, o jornalista Ricardo Palma quis comparar a fisionomia das lagoas e manguezais da Barra da Tijuca com os alagados/brejos do sertão nordestinos. Porém a formação dos brejos no nordeste é diferente do que ocorre na Baixada de Jacarepaguá. No Nordeste, essa formação está relacionada ao micro-clima, enquanto na Barra se relaciona a presença das lagoas.A ocorrência dos alagados no sertão nordestino ocorre devido as chuvas orográficas – quando a massa de ar úmida se desloca do oceano em direção ao interior e encontra a Serra de Baturité,Chapadas do Araripe, Apodi e Ibiataba, o ar úmido dessa massa de ar se eleva, condensa e precipita, e a parte da massa que consegue transpor a borda do Planalto, chega enfraquecida ao interior, no agreste, e a precipitação vai ocorrer somente em alguns pontos que, devido ao tipo do solo pouco permeável retém essa água e forma os alagados ou brejos. Na Barra da Tijuca os brejos e alagados estão em um ambiente de transição, associados a evolução das lagoas e ao lençol freático, abastecidas pela maré.

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Por isso, o governador Negrão de Lima, pensou no arquiteto e urbanista Lucio

Costa para planejar a urbanização da região. Lucio Costa foi convidado para elaborar a

ocupação dessa baixada ainda selvagem porque, segundo o Secretário,

“tal planejamento não poderia resultar do raciocínio frio de computadores

(...) Trouxemos Lucio Costa com a certeza de que o seu gênio criaria um Rio

mais humano, aliando a beleza selvagem da Baixada às necessidades e ao

progresso da cidade que explodirá nos próximos 30 anos” (COSTA, 1969: 1).

Esse plano se fez presente porque, segundo Costa, o governo se via perante

diversas indagações sobre o que fazer nessa imensa área e como fazer? Era preciso

planejar sua ocupação de forma ao melhor aproveitamento da área.

O plano para urbanização da região, que recebeu o nome de Plano-Piloto para a

Urbanização da Baixada Compreendida entre a Barra da Tijuca, o Pontal de

Sernambetiba e Jacarepaguá, deveria ser compreendido dado a importância do sítio:

uma baixada extremamente singular na cidade do Rio de Janeiro, com características

peculiares.

Lucio Costa almejava que nascesse na região da Baixada de Jacarepaguá um

novo pólo Distrito Central Financeiro (CBD – Central Business District) para

contrabalançar com a região central (o atual Centro da Cidade). Acreditava que a área

era um foco natural de encontro do eixo Norte/Sul (Zona Norte e Zona Sul da cidade,

através de Jacarepaguá) e do eixo Leste/Oeste (por está no centro da ligação entre Santa

Cruz – zona industrial – e o Centro da Cidade), o que faria convergir o fluxo para a

região, criando um novo Centro Metropolitano.

Então, além de estabelecer um Plano Diretor para urbanização da área, Costa

também estava preocupado em criar condições para a construção desse novo centro

Metropolitano, por isso afirma que estava diante de dois problemas distintos.

Ao conceber o Plano, o arquiteto se via em um grande dilema, ao mesmo tempo

em que precisava planejar a inevitável ocupação da área, sua maior desígnio era que ali

não se fizesse nada, que toda a área fosse preservada assim como se encontrava,

tornando-se parque nacional:

“Assim o primeiro impulso, instintivo, há de ser sempre o de impedir que

se faça lá seja o que fôr. Mas, por outro lado, parece evidente que um espaço

de tais proporções e tão acessível não poderia continuar indefinidamente

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imune, teria mesmo de ser, mais cedo ou mais tarde, urbanizado. A sua intensa

ocupação é, já agora irreversível.” (ibid. p.8)

Quando Costa elabora para a região o Plano Piloto, algumas áreas já

apresentavam sinais de ocupação, como o Jardim Oceânico, a Barrinha e o Tijuca-Mar.

Essas áreas apresentavam uma ocupação muito voltada para a Zona Sul, guardando as

mesmas características de bairros como Leblon e Ipanema, e ocupadas por uma

população proveniente, inclusive, desses bairros.

Para a região já existia um planejamento, enquadrado dentro do Plano de

Diretrizes de Vias Arterias (1955), que previa arruamentos paralelos ao longo de toda

sua extensão, e sua tendência natural seria a ocupação ao longo de todas essas vias,

assim como aconteceu nos bairros da Zona Sul, principalmente Copacabana, Ipanema e

Leblon. As áreas onde estão localizadas as lagoas seriam preservadas como parques.

Também estabelecia para toda a Baixada de Jacarepaguá vias para fins industriais,

comerciais e residenciais.

O objetivo principal do Plano-Piloto para a Urbanização da Baixada

Compreendida entre a Barra da Tijuca, o Pontal de Sernambetiba e Jacarepaguá ,

também conhecido por Plano Lucio Costa, era o de controlar a expansão urbana e

preservar a geografia do lugar, suas belezas naturais como as praias, as dunas, restingas,

manguezais e lagoas, já que era uma das últimas áreas disponíveis para onde a cidade

poderia se expandir. Nas palavras do arquiteto, para urbanizar a região era (é) preciso

“encontrar a fórmula que permita conciliar a urbanização na escala em que se impõe,

com a salvaguarda, embora parcial, dessas peculiaridades que importa preservar”.

(1969, p.8) Ele acreditava que qualquer implementação urbanística para a área deveria

ser feita “sob medida”.

Como Lucio Costa acreditava que nasceria nessa área o novo Centro

Metropolitano, no Plano foi dada a devida atenção às vias de circulação, que deveriam

possuir ligação com toda a cidade.

A principal via de circulação do bairro seria, e ainda hoje é, a Avenida das

Américas. Quando da elaboração do Plano, essa via já existia (fazia parte da BR-101, e

assim era chamada) e Lucio Costa pretendia mantê-la como uma via expressa de

circulação. Essa via não deveria conter sinais para travessia de pedestres e retorno dos

carros, e sim travessias em nível inferior que fariam a comunicação de veículos e

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pedestres das áreas ao entorno. Paralela a BR haveria uma outra avenida, ao longo do

canal Cortado, que faria a circulação interna do bairro.

Previa, além de vias rodoviárias, um eixo metroviário ligando a região a Cidade

Universitária (hoje conhecida como o projeto da Linha 6 do Metrô). Contudo afirmava

que a oferta de meios de transporte deveriam ir aumentando gradativamente, de acordo

com as necessidades, para que não ocorresse um boom, e a ocupação saísse fora do

planejado.

Com relação aos espaços de construção das habitações, uma das principais

preocupações era de fixar as áreas onde seria possível construir e seus respectivos

gabaritos. Para isso, Lucio Costa propõe que a urbanização deveria ser feita em núcleos

de urbanização, intercalando residências multi-familiares (prédios) com uni-familiares

(casas), para uma melhor circulação do ar, não deixando acontecer o mesmo que nos

bairros da Zona Sul, uma muralha de cimento na frente do mar e nas quadras interiores,

barrando a brisa do mar e impedindo a vista da paisagem praiana pelos moradores do

interior do bairro. Para tal, todos os núcleos deveriam ter taxas de ocupação reduzidas,

sendo, por exemplo, 10% de ocupação para construções de dois pavimentos, e 20% para

um único pavimento.

A concepção de moradia detalhada no Plano fala sobre a construção de núcleos

autônomos. E esses núcleos seriam construídos com 1km de afastamento entre si, seus

edifícios teriam de 8 a 10 andares, e seriam ocupados também por escolas e comércios.

Esses núcleos se localizariam entre a Avenida das Américas e o Canal de Marapendi,

sendo que comércios e serviço deveriam ser localizado nas articulações junto ao canal,

podendo sofrer alterações, de acordo com a conveniência dos interessados, os

moradores. Porém as áreas onde ocorressem dunas seriam construídas apenas

residências uni-familiares, mansões ou casas menores, limitando a taxa de ocupação a

10% e ligadas as estradas e aos núcleos de moradias por caminhos entre as dunas,

tentando conservar a paisagem próxima de como esta se apresentava.

Esses núcleos autônomos constituíram e ainda constituem a característica mais

marcante da Barra da Tijuca, os condomínios fechados, embora distorcidos das suas

características originas, no que diz respeito ao gabarito, a separação entre eles e a área

ocupada.

Na área entre a Avenida das América e a Lagoa de Marapendi haveria núcleos,

com os mesmos afastamentos entre eles, porém não alinhados como os da Avenida

principal. As edificações seriam em número reduzido, porém com gabarito de 25 a 30

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andares, e contariam com a mesma infra-estrutura dos demais núcleos residenciais.

Contudo, a área ao redor da pedra de Itaúna deveria ser preservada íntegra e

devidamente ambientada, sem ocupação ao seu entorno.

Entre a Litorânea e a Lagoa e o Canal de Marapendi, com exceção das

construções que já havia, a paisagem deveria ser mantida o quanto mais preservada, se

possível mantendo seu ar agreste, intocada. Com exceção para algumas construções de

caráter muito especial, para atender aos seus freqüentadores. Lucio Costa não queria que

a Avenida Litorânea se transformasse em uma avenida de mão-dupla, com canteiro

central e retorno, acreditava sim, que essa seria a área que mais deveria ser mantida

“rústica para integrar-se no ambiente agreste” que deveria ser preservado.

Ao mesmo tempo em que estava preocupado com a preservação da praia

intocada, Lucio Costa estava preocupado em organizar vias de acesso a ela: “duas

pontes-passarelas nos seus trechos mais estreitos e em três pontos do canal, a fim de

garantir-se um mínimo de articulação viária” (COSTA, op cit.: 11).

Com relação ao atrativo turístico da região, que deveria atrair por sua paisagem,

algumas considerações foram feitas: não foram definidas áreas para a instalação dos

hotéis, mas foram indicadas as áreas onde não poderiam ser construídos. Essas áreas

seriam as áreas próximas a Lagoa de Marapendi, com exceção do entroncamento com a

Via 11, atual Av. Ayrton Senna. As localizações ideais eram as extremidades do cordão

arenoso da Avenida Litorânea.

Os locais da Barra da Tijuca já habitados (Jardim Oceânico, Tijucamar e

Barrinha, e a Lagoinha no Recreio) para se enquadrarem a “composição paisagística do

conjunto” deveriam ser arborizados, o que beneficiaria também a população, gerando

áreas sombreadas.

A área pertencente a Aeronáutica, ao longo da Av. Ayrton Senna, ocupada

parcialmente com o aeroporto de Jacarepaguá, deveria ser mantida como parque (ainda

hoje é, chamado de Bosque da Barra).

Para construções que necessitam de espaço aberto e ambientação – como clubes,

campos de golfe, estádios, a nova hípica (que deveria ser construída) etc. – foram

reservadas as áreas entre os Morros Dois Irmãos e a Pedra Negra, a sudoeste (onde hoje

se localiza o Projac) em Vargem Grande, e a área a extremo leste do bairro da Barra da

Tijuca, próximo a Pedra da Panela. Também deveriam ser construídos dois

ancoradouros: um próximo ao morro da Joatinga e outro no Canal de Sernambetiba, a

oeste, no bairro do Recreio.

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Para os demais bairros que compõe a Baixada de Jacarepaguá, o Plano

delimitava zonas industriais em Jacarepaguá, e afirmava que Vargem Grande, Vargem

Pequena e os campos de Sernambetiba – a oeste da baixada – deveriam ser áreas de

cultura, com sítios, granjas e chácaras.

Outra determinação do plano era a desapropriação de uma área de 4 km2,

destinada a implementação do novo Centro Metropolitano, e também para a construção

dos aparatos públicos necessário, mas não indicava sua melhor localização, apenas

falava de sua prevista elaboração por um grupo de trabalho que ficaria a cargo de

elaborar uma segunda etapa do Plano.

O Plano Lucio Costa pode ser considerado uma primeira etapa do planejamento

para a Barra da Tijuca, e teve como principal resolução a criação das vias de acesso a

baixada, pelo poder público. Isso porque, como se tratava de terras particulares, cabendo

ao governo somente a criação das condições de acesso, já que as construções das

edificações e dos núcleos autônomos estariam a cargo da iniciativa privada. O Plano

constituía-se, então, em um regulamentador de diretrizes para a ocupação da área.

A segunda etapa do Plano seria a criação de um órgão responsável pela

implementação do Plano Piloto. Foi criado o Grupo de Trabalho da Baixada de

Jacarepaguá (G.T.B.J.), que tinha por objetivo fiscalizar e analisar os projetos de

edificação para a região, através da apreciação caso a caso, e seu ajustamento as normas

estabelecida pelo Plano, caso necessário. Lucio Costa trabalhava como consultor

especial.

Plano Lucio Costa: O realizado

Abordaremos a ocupação do bairro a partir da década de 1970, pelo motivo de

que foi a partir da década dessa década que a Barra da Tijuca apresentou um grande

impulso de ocupação e urbanização, caracterizado como a expansão das fronteiras da

Zona Sul4[4] da cidade.

A tendência dessa expansão ocorre seguindo a orla carioca. Com o esgotamento

de grande parte do solo da Zona Sul nasce procura por novas terras para a construção

imobiliária, que deveria acompanhar o crescimento da população.

4[4] A Zona Sul da cidade compreende os bairros situados na vertente sul do Maciço da Tijuca, destacam-se nessa expansão os bairros da orla marítima: Flamengo, Botafogo, Leme, Copacabana, Arpoador, Ipanema e Leblon.

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Seu impulso se dá, a partir da década de 1970, caracterizado por um rápido

processo de expansão e urbanização, que transformou rapidamente uma área pouco

habitada, caracterizada pela predominância abundante da vegetação nativa, onde

predominava a agricultura, em um espaço bastante ocupado e movimentado, e que

atualmente é um dos mais valorizado do Rio de Janeiro.

A ocupação dos espaços da Zona Sul carioca é marcado pela ocupação da elite.

Essa população começa a se deslocar com expressividade na década de 1940, na busca

das amenidades físicas, áreas verdes e beleza natural, o sítio urbano da Zona Sul começa

a ser, então, valorizado. Nessa época, a cultura do banho de mar passa a ser algo

saudável e ganha força; aliada a especulação imobiliária, valorizam essas áreas, e ocorre

o deslocamento da elite urbana do Centro e de bairros da Zona Norte, como São

Cristóvão e Tijuca, a procura dos bairros da Zona Sul, principalmente os litorâneos

(ABREU, 1987). É nesse contexto que a Barra da Tijuca surge como expansão da elite

carioca, tanto dos emergentes e quanto dos oriundos do parque imobiliário esgotado da

Zona Sul. O mapa abaixo mostra o caminho da expansão urbana da elite carioca,

seguindo a Zona marítima do município, na qual a Barra da Tijuca seria a última

fronteira.

Com a construção das vias de acesso e com o Plano Lúcio Costa, começa

efetivamente a ocupação e urbanização da Barra da Tijuca. A área se transforma, como

o piscar dos olhos, na grande área de expansão e especulação da cidade do Rio de

Janeiro.

O Estado começa, então, a criar infra-estrutura para a ocupação da Barra. No

final da década de 60, ocorre o início da construção da Auto Estrada Lagoa-Barra,

principal via de ligação com a Zona Sul da Cidade. Sua construção é o marco para a

aceleração do processo de ocupação da região. E, na década de 70, a CEDAE começa a

ampliar a implantação de infra-estrutura (ampliação da rede de abastecimento de água e

gás).

A construção das vias de acesso e das vias internas é o marco mais importante.

O Plano estabelecia duas vias principais – a Via 11 e a BR – e que até hoje são

responsáveis pela circulação do bairro, e fazem ligação com os acessos do mesmo.

Hoje, as vias de acesso se fazem através da Avenida das Américas: a leste, a ligação

com a Auto-Estrada Lagoa-Barra e a Estrada do Auto da Boa Vista; a oeste, o Recreio

do Bandeirante até a Estrada da Grota Funda, seguindo para Santa Cruz; e a Avenida

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Ayrton Senna, ligando Jacarepaguá com a Linha Amarela, fazendo a ligação do bairro

com a Zona Norte.

Uma primeira etapa da realização e ocupação da região se dá através da

implementação dos Condomínios Fechados. Isso ocorre na segunda metade da década

de 70. Esses Condomínios marcam uma nova forma de viver na cidade, aliando a

privacidade à segurança e à concentração próxima de serviços. Esses condomínios são a

realização dos núcleos urbanos estabelecidos por Lucio Costa: associam moradias com

serviços. Os primeiros desses núcleos foram os condomínios Novo Leblon e Nova

Ipanema, este no entroncamento da Avenida das Américas com a Avenida Ayrton

Senna, e aquele 1 km a oeste do primeiro, conforme padrões estabelecidos no Plano

Piloto.

Logo depois foram construídos os condomínios Barramares, Atlântico Sul,

Riviera del Fiori, Village Oceanique e Terrazas da Barra, porém esses já não seguiram a

risca o Plano Lúcio Costa, havendo modificações no gabarito permitido, espaçamento

entre os condomínios e a não construção das edificações de serviço e comércio.

Apesar disso, esses condomínios introduziram novas maneiras de viver na

cidade, com algumas características do Plano como: áreas de lazer coletivas entre os

prédios cercados por áreas verdes; porém possuíam terrenos murados e homogeneidade

de classes sociais. Algumas dessas características geradas pelas busca de áreas seguras

para viver e criar os filhos, dada à violência que crescia na cidade. Até hoje, essa

característica é um diferencial da Barra da Tijuca, em relação a outros bairros da cidade,

em atração de população.

Os condomínios Barramares e Atlântico Sul, apesar de possuírem toda a gama

de serviços estabelecidos pelo Plano dentro desses condomínios, foram os pioneiros a

desrespeitar o Plano abrindo precedentes para as construções hoje existentes na orla.

Esses condomínios, com aproximadamente 8 edificações multi-familiares cada, e com

25 a 30 pavimentos cada, barram a vista marinha das edificações que posteriormente

surgiram mais interioranamente.

Nessa mesma época, o então prefeito Marcos Tamoio fez alguns investimentos

na região já fora do estabelecido pelo Plano Piloto, como a duplicação da Av

Sernambetiba. Foi exatamente esse fato que atraiu a construção dos condomínios

descritos acima – Barramares e Atlântico Sul. Sua gestão também foi responsável pelo

término da construção do Autódromo e do Rio Centro.

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A década de 70 é caracterizada, então, pelo surgimento dos primeiros

condomínios, criando uma nova forma de morar, pois associavam as residências com

serviços e lazer, conforme proposta original do Plano, destinado a uma classe média

alta.

Na década seguinte, as principais construções estavam voltadas para o setor

comercial, de serviços e lazer, localizados fora desses condomínios fechados. Ocorre a

construção de prédios isolados, no sentido de não formarem condomínios fechados,

porém, por estarem construídos próximos uns aos outros, formam associação – como é

o caso do Parque das Rosas, do Bosque Marapendi, e mais recentemente do Parque

Lúcio Costa. Em outros casos, alguns prédios caracterizam-se por possuírem um

gabarito bem mais baixo do que o permitido por lei, principalmente próximo a Avenida

Canal de Marapendi e na Avenida das Américas.

Durante a gestão de Marcelo Alencar foi implantado o projeto RIO-ORLA, que

transformou a Avenida Litorânea – Sernambetiba – exatamente no que Lúcio Costa não

gostaria que ocorresse. A Av. Sernambetiba foi duplicada, ganhou canteiro central,

transformado em jardim, com estacionamento e retorno.

Nas palavras de Marcelo Alencar (2002), era preciso, ao urbanizar a orla da

Barra da Tijuca, tomar cuidado com seu ar agreste:

“mas esse trecho da orla carioca exigia um cuidado especial, era uma

região agreste, marcada por dunas e uma vegetação típica de restinga toda

interferência realizada respeitaram esse conjunto de particularidades. Até os

quiosque receberam tratamento estético especial (...)” (p. 68)

É difícil hoje, com todo o acelerado processo de urbanização que ocorreu na

Barra da Tijuca, imaginar a orla com as mesmas características da década de 60. O

projeto Rio Orla ganhou prêmio internacional na Itália, como o melhor do gênero no

mundo.

Antes da realização desse projeto, a orla já se encontrava completamente

distorcida do Plano Piloto. Havia prédios de mais de 25 pavimentos, fazendo sombra na

areia; apart-hotéis; comércio o mais variado possível; e se encontrava em uma grande

desordem, principalmente no que diz respeito ao estacionamento dos automóveis em dia

de praia.

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O projeto Rio Orla buscou dar atenção não só à praia da Barra, mas a todas as

praias oceânicas do Rio de Janeiro. Seu objetivo era dotar as praias de infra-estrutura

para atender seus freqüentadores: calçadão para os pedestres e pistas para os ciclistas,

estacionamento, postos de salvamento e quiosques para alimentação. Além de um

tratamento paisagístico nas praias, que ganharam um aspecto de cuidadas. No caso da

Barra da Tijuca, procurou-se manter a paisagem agreste com tratamentos especiais,

como: a construção de um deck de madeira sobre o quebra-mar e, os quiosques

receberam seus telhados de sapê (o que hoje não ocorre mais).

Esse projeto ajudou na imagem da orla, mas pouco contribuiu para manter o ar

agreste da região. Contudo, isso se fez necessário devido ao caos que se encontrava a

Avenida Sernambetiba, principalmente durantes os fins de semana, quando o número de

freqüentadores aumentava consideravelmente. Com o projeto a orla perdeu o ar agreste

e ganhou um ar urbanizado.

A Avenida das Américas recebeu suas alteração durante o primeiro mandato do

prefeito César Maia. A Avenida se transformou em uma grande auto-estrada, primeiro

sendo duplicada e depois ganhando pistas auxiliares, para fazer a ligação interna do

bairro, conforme previa o Plano Lúcio Costa. Contudo, ao invés de serem construídas as

passagens de nível para a circulação dos carros e pedestre, foi implantada a sinalização

em toda sua extensão, da Barra da Tijuca ao Recreio dos Bandeirantes.

A preocupação paisagística também esteve presente nos mandatos de César Maia

e Luiz Paulo Conde. As vias de rolamento principais ganharam canteiros centrais

arborizados, que se encontram sempre bem cuidados. Esse fato se faz importante por

dois fatores: 1° esses canteiros antes eram cobertos por capim e lixo; e 2° porque essas

áreas, não cimentadas, contribuem para a infiltração da água da chuva, o que ajuda no

abastecimento das lagoas.

Os anos 90 são fortemente marcados pela construção de edifícios comerciais e

de escritórios – Centro Empresarial Barra Shopping, Barra Medical, Centro Médico

Richet e Centro Comercial Esplanada da Barra. Não se sabe se devido a isso, ou como

causa, a sede de grandes empresas se transfere para o bairro, como a Amil, Shell, CBF e

mais recentemente a Unimed, aumentando o contingente populacional do bairro.

Também é a partir dessa mesma década, que o turismo ganha importância na

Barra da Tijuca. Podemos observar a construção de parques temáticos – Terra

Encantada, Rio Water Planet, Wet n’ Wild – e de hotéis, como o da rede Sheraton e

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Blue Tree, e mais recentemente o Transamérica, e os shoppings também se

multiplicam5[5].

No final da década de 90, surgem duas “novas formas de morar” na Barra da

Tijuca. A primeira é o “home-office”, novos condomínios privados, que procuram

conciliar, em um mesmo espaço a moradia e o escritório, para poder-se trabalhar em

casa; e a segunda é a construção para um outro estrato da classe média, de edifícios

construídos em terrenos menos valorizados, distantes um pouco do núcleo de

concentração da Barra, como é o caso do Rio 2 e do Nova Barra (esses condomínios são

construídos no Recreio ou Jacarepaguá mas seu grande atrativo é estar “a alguns

minutos” da Barra da Tijuca).

Contudo, a função do bairro se modifica. No início da década de 70, sua função

era extremamente de moradia: as famílias moravam na Barra, mas trabalhavam e

estudavam fora do bairro. Com o passar do tempo, a construção de novos edifícios e

toda uma gama de comércio e serviço que veio ao longo da década de 80 e 90, o bairro,

se caracteriza hoje, além do uso residencial, por funções das mais diversas possíveis:

comércio, serviços, lazer, turismo e começa a ganhar forma a função de um novo centro

metropolitano, assim com previsto por Lucio Costa e pelo PUB-Rio.

“Atualmente, é possível afirmar que a Barra da Tijuca cumpre, de modo

simultâneo, os papéis de expansão urbana da cidade do Rio de Janeiro e de

centro de prestação de serviços em escala metropolitana, atraindo habitantes

de municípios situados na Baixada Fluminense e de Niterói, São Gonçalo, do

outro lado da baía de Guanabara.” (lEITÃO, 2002: 20)

Muitas das preocupações estéticas de Lúcio Costa, hoje ainda estão presentes na

Barra da Tijuca. A preocupação com as instalações elétricas, que no princípio eram

aparentes, só da década de 90 se tornam subterrâneas. A paisagem verde, outra grande

preocupação, se faz presente nos canteiros centrais arborizados, na presença de parques,

bosques, áreas de preservação, áreas de reflorestamento etc.

5[5] Os shoppings, no início, possuíam a característica de encontro fora dos condomínios fechados, porém guardando a característica dos mesmos, um lugar protegido, controlado, auto-suficiente (PINHEIRO , 2001). Hoje eles são um dos grandes atrativos do bairro, atraem pessoas de todo os bairros cariocas e até de outros municípios, além de ser ponto turístico. Alguns se caracterizam por seu tamanho (Barra shopping), outro pela natureza (Città América), outros procuram retratar o centro da cidade, conciliando lojas e escritórios (Downtown), outro no entanto por retratar os símbolos de outros países (Barra World), e ainda aquelas por atraírem mais os habitantes do bairro, sendo mais vazios, sem grandes agitações (Barra Garden, Barra Point). Etc.

Page 15: BARRA DA TIJUCA

Essa questão é tão forte no bairro que muitas das construtoras até hoje utilizam o

verde, o contato com a natureza, como propaganda para a venda de seus imóveis. No

início dos anos 70, os condomínios Novo Leblon e Nova Ipanema, em suas

propagandas, já tinham esse apelo, como: “Venha morar onde você gostaria de passar as

férias” ou “Venha acordar com o canto dos pássaros”, hoje, condomínios como a

Península ainda utilizam desse mesmo “marketing ecológico” para a venda, com

outdoors apontando para um “equilíbrio urbano-ecológico”. O mais recente lançamento

de condomínios na Barra da Tijuca, o Santa Mônica Jardim, também tem seu

“marketing ecológico”, anunciando: “Achei meu jardim”.

As construções residenciais e comerciais continuam a se multiplicar no bairro. O

“marketing ecológico” é amplamente utilizado, o que garante, em parte, a preservação

dos ecossistemas costeiros, principalmente a faixa de mangue das lagoas. Já o pouco

que ainda podemos encontrar das dunas, continuam sendo retiradas para a construção

das edificações. As fotos abaixo expressam claramente esses argumentos.

Atualmente, a prefeitura da cidade possui o projeto Adoção de áreas verdes, de

parceria público-privada, que prevê a adoção, no caso da Barra da Tijuca, de parques e

canteiros das Avenidas por empresas particulares para a transformá-los em jardins. Em

troca, a prefeitura permite a essas empresas o direito de divulgar suas marcas no local

adotado. O projeto vem ganhando aceitação e empresas, como o restaurante Barra

Brasa, a Unimed e a Sociedade Civil de Amigos da Península, que adotaram alguma

área (Reportagem do JB Barra, Jornal do Brasil, 31 de outubro de 2004, p.4).

Esse projeto lembra o cuidado que Lúcio Costa tinha com a paisagem da Barra.

Longe de somente resgatar a vegetação nativa, o objetivo do projeto é embelezar a

região, principalmente para os Jogos Pan-Americanos. Entretanto, as 156 palmeiras que

vêm sendo plantadas ao longo da Avenida Via Parque e na Avenida Abelardo Bueno,

em muito recordam o desejo de Costa em fazer o mesmo na Avenida Ayrton Senna.

Considerações Finais

Ao elaborar o Plano Piloto para Urbanização da Barra da Tijuca, Pontal de

Sernambetiba e de Jacarepaguá, Lúcio Costa propunha para o bairro da Barra da Tijuca

uma nova forma de organização do espaço: o crescimento urbano aliado às questões

ambientais, preservação de seus ecossistemas: mangue, restinga e mata atlântica. Mas a

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expansão urbana e a valorização do bairro fizeram com que as questões ambientais

ficassem em segundo plano.

O que viabilizou a elaboração do Plano Piloto foi que, até então, o uso do solo

era rarefeito, a região era uma área plana, ideal para a execução dos princípios do

urbanismo modernista racionalista, e porque a área se manteve preservada da ocupação

urbana da cidade do Rio de Janeiro, cercada entre dois maciços, preservando suas

belezas naturais e mantendo seus ecossistemas preservados, até o início da ocupação.

Tal plano pretendia estabelecer critérios para a urbanização da região e, através

da ordenação espacial, pretendia conciliar a urbanização e a preservação do meio

ambiente. Por isso, o Plano Lúcio Costa possuía um caráter flexível. A ocupação da área

gradativamente possibilitaria, através da SUDEBAR, a análise dos projetos de

edificações das áreas, caso a caso, sem deixar de lado a preocupação com a natureza.

Também não se pretendia criar áreas de segregação, mas sim desenvolver

a região para todas as camadas da população, ao contrário do que acontecia no restante

da cidade do Rio de Janeiro. Porém a atuação dos agentes imobiliários (leia-se os atores

particulares envolvidos no processo de construção do espaço urbano: o grande capital

imobiliário, que engloba as empresas construtoras, os promotores imobiliários e os

corretores de imóveis) contribuiu efetivamente para que a Barra da Tijuca se tornasse

uma área destinada a uma classe média privilegiada, excluindo as camadas mais baixas

da população. Com isso criou-se um estereótipo para a Barra da Tijuca como sendo um

lugar de emergente, mas com uma conotação negativa, e, como não havia e não há

projetos de moradia que beneficie classes mais baixas, as favelas nascem como uma

alternativa de moradia da classe baixa.

O Plano como instrumento de ordenação da ocupação urbana na Barra da Tijuca

gerou conflitos entre os agentes responsáveis pela produção do espaço urbano. A

influência desses agentes aliados à inexistência de um respaldo jurídico em relação à

importância e obrigação da preservação dos ecossistemas6[6], foi decisiva para a não

realização do projeto de Lúcio Costa, principalmente sobre esse ponto de vista.

Seu modelo, porém, não foi seguido na íntegra e o processo de construção e

expansão da Barra da Tijuca foi modificado desconsiderando a dinâmica dos ambientes

costeiros. A degradação do mesmo, associada a outros problemas, como por exemplo a 6[6] Nesse momento não existiam leis municipais nem federais que falavam sobre a preservação e/ou conservação do meio ambiente. A preocupação com a preservação ambiental só vai possuir um respaldo jurídico em 1988, com a promulgação da nova Constituição Federal. E em 1986, com a Resolução n o 1 do CONAMA, que estabelece as definições e diretrizes par a implementação da Avaliação de Impactos Ambientais, como Política Nacional do Meio Ambiente.

Page 17: BARRA DA TIJUCA

falta de investimento em infra-estrutura, contribuiu para que muito fosse modificado em

relação ao plano original.

A principal contribuição dos agentes imobiliários agentes foi agregar valor de

troca ao solo do bairro, principalmente através do chamado “marketing ecológico”,

vendendo não só seus imóveis mais a paisagem da natureza e um “novo estilo de vida”.

Eles se apropriaram dos ideais de Lúcio Costa, no que diz respeito a “paisagem agreste

que importa preservar” para vender seus empreendimentos, sem, no início, se

preocuparem de fato com o meio ambiente, as lagoas, dunas, mangue etc., que

chamavam de amenidades naturais da região; e atualmente vendendo a imagem da

preservação e do reflorestamento, que pretende, assim com o Plano Piloto, encontrar um

equilíbrio entre a urbanização e o meio ambiente.

Outro ator que contribuiu bastante foi o Estado, permitindo que a legislação

fosse ajustada ao interesse desse grande capital imobiliário privado, que importava.

Mais gravemente, o Estado até hoje não instalou a infra-estrutura necessária para a

ocupação do bairro no que diz respeito ao saneamento básico. Essa “briga” por

saneamento básico na Barra data do início da década de 80, com a proposta de

construção de um emissário submarino (EVANGELISTA, 1989), e até hoje não teve

fim; o emissário ainda está em fase de implantação, mas só ele não basta para a

despoluição, sobretudo das lagoas do bairro. É preciso conciliar com outras propostas.

Com relação ao sistema costeiro do bairro, muito foi alterado e até mesmo

destruído. O principal impacto ambiental foi através da eutrofização da região: com a

chegada da ocupação urbana, houve a construção de aterros irregulares nas bordas das

lagoas, desmatamento, construção de canais artificiais e retilínezação de outros, e com o

aumento demográfico, ocorreu o aumento da concentração de matéria orgânica nas

lagoas.

Para solucionar esse problema segue uma lista de alternativas, que deve ser

investida para podermos recuperar as lagoas, a qualidade de suas águas e a conseqüente

despoluição das mesmas e das praias, que em geral são afetadas pelas águas poluídas

das lagoas, ficando impróprias pra banhos (como ocorre na praia dos Amores de do

Pepê, e mais recentemente na praia da Barra da Tijuca).

Saneamento ambiental: estação de tratamento de esgoto, troncos coletores

e emissário submarino, ou seja, criação de infra-estrutura sanitária, que

deveria ser condição primordial para a ocupação do bairro e de qualquer outro

bairro.

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Regulação de uso do solo: fazer uso dos planejamentos pensados para a

Barra da Tijuca, ordenando sua ocupação; fiscalizar as construções e o uso do

solo. Fazer uso das leis que existem;

Revegetação e reflorestamento das encostas, das áreas de mangue e

restinga, como já vem ocorrendo;

Criação de parques ambientais, permitindo seu uso pela população e

preservando as áreas, inserindo a educação ambiental e um turismo

ecológico na região, para a conscientização da população sobre a importância

da preservação do meio ambiente; e

Fiscalizar e preservar os ecossistemas do bairro, se preciso fazendo uso

das leis, através da aplicação de multas.

Apesar dos inúmeros decretos e leis para a ordenação do espaço da Barra da

Tijuca, na prática os agentes privados da produção do espaço urbano conseguiram

aprovar empreendimentos fora dos padrões estabelecidos no plano, através de brechas

nas legislações de uso do solo, em cada época, desvirtuando assim toda a característica

pensada para o espaço urbano da Barra da Tijuca.

A ocupação da Barra da Tijuca, desde 1990, está enquadrada dentro do Plano

Diretor da cidade, através da Lei Orgânica do Município, no Código de Obras, o que

não garante nenhuma atenção especial ao bairro, muito menos a preservação de seu

sistema costeiro. Discute-se a retomada do Plano Piloto, mas na prática nada acontece.

A reabilitação do Plano Lúcio Costa sempre volta à tona. Sua retomada por

completo é impossível: primeiro, devido ao número de modificações que o Plano já

sofre, e segundo porque ele não tem mais validade para aplicação. O próprio Lúcio

Costa falava sobre a importância de revalidar o Plano a cada período de tempo. O Plano

Lúcio Costa foi concebido dentro do “milagre econômico” brasileiro por isso previa

obras grandiosas e capital para sua realização; hoje ele precisa ser enquadrado dentro da

realidade brasileira, na qual boa parte da classe média passa por uma recessão.

Estado, ONGs, Universidades e a sociedade civil organizada discutem o futuro

do Plano Piloto e a importância da conservação da natureza e, na Barra da Tijuca, sobre

a conservação, principalmente, dos sistemas lagunares. Contudo, o que se observa na

prática é que muito pouco, ou nada, foi feito ao longo dos 30 anos de ocupação urbana

no bairro. Agora a questão da preservação ambiental e despoluição das praias e lagoas

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volta a ser amplamente debatida, na cidade do Rio de Janeiro, por ser condição

primordial para a realização dos jogos Pan-Americanos, que ocorrerá em 2007.

Porém as questões ambientais não deveriam estar presentes só em momentos

como esses. Deveria ser pauta diária da população e do Estado tratar questões como a

falta de infra-estrutura e o não comprometimento com o meio ambiente, para melhorar a

qualidade de vida da população e garantir que a natureza possa conviver com o

crescimento urbano, assim com propunha Lúcio Costa e como é garantido pela

Constituição.

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