Bauman, Zygmunt - Comunidade

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3 – Tempos de desengajamento ou a grande transformação, segundo tempo. Desde o começo dos tempos modernos, a gerência não é uma questão de escolha, mas uma necessidade. (p.40) Assim que puderam fazê-lo, os empresários capitalistas passaram as tarefas gerenciais a empregados contratados. (p.40) Os lucros, dizia Brunham, ainda fluíam como antes para os bolsos dos proprietários, mas a condução cotidiana dos negócios passara a ser uma prerrogativa dos gerentes, e ninguém se atreveria a interferir, nem desejaria fazê-lo. (p.40) O poder moderno dizia respeito antes e acima de tudo à capacidade de gerenciar pessoas, de comandar, de estabelecer as regras de conduta e obter obediência a essas regras. (p.41). Nestes dias, a dominação não se apoia principalmente no engajamento e no compromisso (...) Ela ganhou um novo fundamento (...): a incerteza dos governados sobre o próximo movimento dos governantes. (p.42). O desmantelamento dos panópticos anuncia um grande salto para frente no caminho da maior liberdade do indivíduo. (p.43) A rotina imposta pelas “fábricas de disciplina” (panoptico) era sem duvida detestada e provocava ressentimentos. (p.43) A situação artificial dos ratos no labirinto parecia uma replica fiel da sina diária dos humanos no mundo. (p.45)

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3 Tempos de desengajamento ou a grande transformao, segundo tempo.Desde o comeo dos tempos modernos, a gerncia no uma questo de escolha, mas uma necessidade. (p.40)Assim que puderam faz-lo, os empresrios capitalistas passaram as tarefas gerenciais a empregados contratados. (p.40)Os lucros, dizia Brunham, ainda fluam como antes para os bolsos dos proprietrios, mas a conduo cotidiana dos negcios passara a ser uma prerrogativa dos gerentes, e ningum se atreveria a interferir, nem desejaria faz-lo. (p.40)

O poder moderno dizia respeito antes e acima de tudo capacidade de gerenciar pessoas, de comandar, de estabelecer as regras de conduta e obter obedincia a essas regras. (p.41).Nestes dias, a dominao no se apoia principalmente no engajamento e no compromisso (...) Ela ganhou um novo fundamento (...): a incerteza dos governados sobre o prximo movimento dos governantes. (p.42).

O desmantelamento dos panpticos anuncia um grande salto para frente no caminho da maior liberdade do indivduo. (p.43)

A rotina imposta pelas fbricas de disciplina (panoptico) era sem duvida detestada e provocava ressentimentos. (p.43)A situao artificial dos ratos no labirinto parecia uma replica fiel da sina diria dos humanos no mundo. (p.45)Deixaram de existir os simpticos mercadinhos de esquina; se conseguiram sobreviver competio dos supermercados, seus donos, gerentes e os rostos atrs dos balces mudam com excessiva frequncia para que qualquer um deles possa substituir a permanncia que j no se encontra nas ruas. (p.46-47)Uma criana media tem diversos pares de avs e diversos lares entre os quais escolher por temporada, como as casas de praia. (p.47)

Em suma: foi-se a maioria dos pontos firmes e solidamente marcados de orientao que sugeriam uma situao social que era mais duradoura, mais segura e mais confivel do que o tempo de uma vida individual. (p.47)

Esses e outros supostos semelhantes formava, por assim dizer, o fundamento epistemologico da experincia de comunidade. (p.47-48) essa experincia que falta hoje em dia, e sua ausncia que referida como decadncia, desaparecimento ou eclipse da comunidade.

4 A secesso dos bem-sucedidosO ttulo refere-se ao novo distanciamento, indiferena, desengajamento e, em verdade, extraterritorialidade mental e moral daqueles que no se importam de ficar SOS, desde que os outros, que pensam diferente, no insistam em que se ocupem e muito menos partilhem sua vida por conta prpria. (p.49)

O cool parece estar usurpando o lugar da tica do trabalho para instalar-se como forma mental dominante do capitalismo de consumo avanado. Cool significa fuga ao sentimento, fuga da confuso da verdadeira intimidade, para o mundo do sexo fcil, do divorcio casual, de relaes no possessivas. (p.50)O nico atrativo do exlio voluntario a ausncia de compromissos, especialmente de compromissos de longo prazo,d o tipo dos que impedem a liberdade de movimento numa comunidade com sua confusa intimidade. (p.51)

O prazer de Don Juan, como Kierkegaard o via, no era a posse das mulheres, mas a seduo delas. (p.51)

Don Juan estava s, e se estivesse numa multido de outros como ele isso no faria diferena: uma multido de Don Giovannis no constituiria uma comunidade.Seu mundo no tem outro endereo permanente que no o e-mail e o numero do telefone celular. (p. 53)

A secessao dos bem-sucedidos , antes e acima de tudo, uma fuga da comunidade. (p. 55).