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Introdução à Análise Não Standard Geovani Pereira Machado DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO INSTITUTO DE MATEMÁTICA E ESTATÍSTICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRE EM MATEMÁTICA Programa: Mestrado em Matemática Orientador: Prof. Dr. Rogério Augusto dos Santos Fajardo São Paulo, Novembro de 2018

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Agradecimentos

Agradeço pelo generoso e incessante apoio que recebi da minha família e meusamigos durante minha trajetória acadêmica. O amor, o incentivo e o suporte concedidospor essas pessoas extraordinárias foram fundamentais para que eu pudesse superar cadaobstáculo dessa longa missão. Também dedico minha sincera gratidão ao meuorientador, Prof. Rogério Augusto dos Santos Fajardo, por ter acreditado na proposta domeu trabalho e ter aceitado o desafio de me guiar nesse prazeroso e gratificante processode aprendizado.

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“Penso que nos séculos vindouros será considerada uma grande estranheza na Históriada Matemática que a primeira teoria exata dos infinitesimais foi desenvolvida 300 anos

após a invenção do Cálculo Diferencial.” [Abraham Robinson, (45); Tradução nossa]

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Resumo

A área conhecida como Análise Não Standard consiste na aplicação dos métodosda Teoria dos Modelos e da Teoria dos Ultrafiltros para a obtenção de extensões peculiaresde sistemas matemáticos infinitos. As novas estruturas construídas segundo esse procedi-mento satisfazem ao Princípio da Transferência, uma propriedade de suma importância einfluência a qual afirma que as mesmas sentenças de primeira ordem com quantificadoreslimitados são verdadeiras para o sistema original e a sua extensão. Concebida em 1961por Abraham Robinson e aprimorada por vários matemáticos nos anos subsequentes, talárea de pesquisa provou ser bastante proveitosa e esclarecedora para diversas outras par-tes da Matemática, como a Topologia, a Teoria das Probabilidades, a Análise Funcionale a Análise Complexa. Manifesta-se uma reavaliação da Teoria dos Domínios Ordenadosseguida de um tratamento completo e gradual das fundações da Análise Não Standardassumindo a perspectiva dos Monomorfismos Não Standard, onde adota-se como metate-oria a teoria dos conjuntos de Neumann-Bernays-Gödel com o Axioma da Escolha. A fimde impulsionar a assimilação da metodologia abordada, o estudo explora as proprieda-des do corpo não arquimediano dos números hiper-reais de maneira intuitiva e informal,utilizando-se destas para revelar demonstrações alternativas e relativamente diretas dealguns dos principais resultados do Cálculo Diferencial e Integral, como o Teorema doValor Intermediário, o Teorema de Bolzano-Weierstrass, o Teorema do Ponto Crítico, oTeorema da Função Inversa e o Teorema Fundamental do Cálculo.Descritores: Domínios Ordenados; Corpos Não Arquimedianos; Números Hiper-reais; Cál-culo Diferencial e Integral; Ultrafiltros; Análise Não Standard.

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Abstract

The field known as Non-standard Analysis consists in the application of the methods ofModel Theory and Ultrafilter Theory to the attainment of peculiar extensions of infinitemathematical systems. The new structures produced under that procedure satisfy theTransfer Principle, a property of the utmost importance and influence which states thatthe same first-order sentences with bounded quantifiers are true for the original systemand its extension. Conceived in 1961 by Abraham Robinson and improved by a number ofmathematicians in the following years, such area of research has proved to be very fruit-ful and illuminating to many other parts of Mathematics, such as Topology, ProbabilityTheory, Functional Analysis and Complex Analysis. The work presents a reexaminationof the Theory of Ordered Domains followed by a thorough and gradual treatment of thefoundations of Non-standard Analysis under the perspective of Non-standard Monomor-phisms, where Neumann-Bernays-Gödel’s set theory with the Axiom of Choice is adoptedas metatheory. In order to boost the assimilation of the methodology put forward, thestudy explores the properties of the non-archimedean field of hyperreal numbers in anintuitive and informal fashion, employing them to reveal alternative and relatively directproofs of some of the main results of Differential and Integral Calculus, such as the Inter-mediate Value Theorem, the Bolzano-Weierstrass Theorem, the Extreme Value Theorem,the Inverse Function Theorem and the Fundamental Theorem of Calculus.

Key words: Ordered Domains; Non-archimedean Fields; Hyperreal Numbers; Differen-tial and Integral Calculus; Ultrafilters; Non-standard Analysis.

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Sumário

Lista de tabelas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . xiii

Lista de Símbolos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . xv

Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . xxi

1 DOMÍNIOS E CORPOS ORDENADOS . . . . . . . . . . . . . . . 11.1 Domínios Ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11.2 Corpos Ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81.3 A Propriedade Arquimediana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111.4 Relações Confrontantes em Domínios Ordenados . . . . . . . . . . 151.5 Ideais Ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171.6 Mônadas e Galáxias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191.7 A Propriedade do Supremo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211.8 Dedekind-Completude . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 231.9 Cauchy-Completude . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 261.10 Domínios Ordenados que Estendem R . . . . . . . . . . . . . . . . . 321.11 Análise Diferencial e Integral em Extensões de R . . . . . . . . . . 34

2 VISÃO INGÊNUA DOS NÚMEROS HIPER-REAIS . . . . . . . . 352.1 Os Números Hiper-reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 352.2 Objetos Relacionados a R e ⇤R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 352.3 Condições com Quantificadores Limitados . . . . . . . . . . . . . . . 372.4 ⇤-Transformações e o Princípio da Transferência . . . . . . . . . . . 382.5 Objetos Standard e Não Standard . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 392.6 Propriedades Conjuntistas de ⇤ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 412.7 Domínios e Corpos Ordenados Relacionados a ⇤R . . . . . . . . . . 432.8 Definição Alternativa para R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 462.9 Objetos Internos e Externos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 472.10 Aplicações no Cálculo Diferencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 532.11 Somas Hiperfinitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 652.12 Atalho Dedutivo Usual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 682.13 Aplicações na Riemann-Integrabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . 70

3 FILTROS E ULTRAFILTROS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 753.1 A Ideia da Construção de ⇤R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 753.2 Filtros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76

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3.3 Produtos Reduzidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 823.4 Limites Generalizados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 863.5 Ultrafiltros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 893.6 Ultraprodutos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 933.7 ↵-Completude de um Filtro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 983.8 A Ultrapotência ⇤R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

4 MONOMORFISMOS NÃO STANDARD . . . . . . . . . . . . . . 1054.1 X!-Objetos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1054.2 Monomorfismos Não Standard . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1114.3 Objetos Internos e Externos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1144.4 Princípio Geral das ⇤-Transformações . . . . . . . . . . . . . . . . . 1194.5 Conjuntos Hiperfinitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1244.6 Operações sobre Hipersequências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1284.7 Overflow e Underflow . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130

5 MONOMORFISMOS NÃO STANDARD EXISTEM . . . . . . . . 1335.1 Cópias Base . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1335.2 A Ideia da Construção de ⇤ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1355.3 Tentativa para Definir ⇤n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1375.4 Outra Fatoração de ⇤n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1395.5 Monomorfismos Não Standard Existem . . . . . . . . . . . . . . . . 1425.6 ⇤Q e ⇤R são Cauchy-completos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147

Apêndice 151

A CONCEITOS DA TEORIA DOS MODELOS . . . . . . . . . . . . 151A.1 Monóides Livres . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151A.2 Linguagens; Substituição Simultânea . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152A.3 Assinaturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152A.4 Termos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155A.5 Fórmulas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 156A.6 Fórmulas em L✏ com Quantificadores Limitados . . . . . . . . . . . 157A.7 Variáveis Livres e Variáveis Ligadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 158A.8 Substituição de Variáveis em Termos e Fórmulas . . . . . . . . . . 159A.9 Estruturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 160A.10 Expansões Naturais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161A.11 Interpretação de Termos Fechados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163A.12 Relação de Satisfatibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 164A.13 Teorias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 166

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A.14 Subestruturas e Subestruturas Elementares . . . . . . . . . . . . . . 167A.15 Morfismos Entre Estruturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 167

B FORMALIZAÇÕES DA TEORIA DOS CONJUNTOS . . . . . . . 171B.1 As Teorias ZF, ZFC e NBG . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171B.2 Alguns Teoremas Básicos de NBG . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 176B.3 Ordinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177B.4 Cardinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182B.5 Hierarquia Cumulativa dos Conjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . 183

REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 185

Índice . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 189

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Lista de tabelas

Tabela 1 – Operações aritméticas entre elementos infinitesimais, finitos,infinitos e apreciáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

Tabela 2 – Classificação dos domínios ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32Tabela 3 – Classificação dos corpos ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32Tabela 4 – Correspondências entre os postulados do Teorema 2.3 e os axiomas,

convenções e teoremas do Capítulo 4. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113

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Lista de símbolos

C (x1

. . . xn) Condição C (x1

. . . xn) nas variáveis x1

. . . xn, a qual é uma L✏-fórmulade primeira ordem (Exemplo A.7 e Definição A.14) na metalinguagemusada nesta dissertação. A metateoria que adotaremos nessa metalin-guagem será a Teoria dos Conjuntos descrita pelos axiomas de NBG(Seção B.1).

¬C (x1

. . . xn) Negação de uma condição C (x1

. . . xn) nas variáveis x1

. . . xn.

C1

_ C2

; C1

ou C2

Disjunção inclusiva das condições C1

e C2

, a qual será con-siderada verdadeira se, e somente se, pelo menos uma das condições C

1

e C2

for verdadeira.

C1

^ C2

; C1

e C2

Conjunção das condições C1

e C2

, a qual será considerada ver-dadeira se, e somente se, ambas as condições C

1

e C2

forem verdadeiras.

C1

) C2

A condição C1

implica na condição C2

, ou seja, C2

será verdadeirasempre que C

1

for verdadeira.

C1

, C2

A condição C1

é equivalente à condição C2

, ou seja, C1

será verdadeiraexatamente quando C

2

for verdadeira.

C1

:, C2

A condição C1

é definida como sendo equivalente à condição C2

.

A :

= B A é definido como sendo igual ao objeto B.

2 Relação de pertinência da Teoria dos Conjuntos.

⇢ Relação de inclusão não estrita entre classes.

( Relação de inclusão estrita ou própria entre classes.

62, 6⇢, 6(, etc. Negações das relações de pertinência, de inclusão não estrita, e deinclusão estrita, respectivamente.

{F (x)}P (x) ,

F (x)...P (x)

Classe dos objetos da forma F (x) para objetos x que

satisfazem à propriedade P (x), a qual pode ser um conjunto ou umaclasse própria dependendo da propriedade P (x). Os sistemas formaisusuais que formalizam a Teoria dos Conjuntos (ZF, ZFC, NBG, etc.)limitam as opções de propriedades P (x) que podem ser usadas paradefinir uma classe. Conjuntos contáveis às vezes são descritos elementoa elemento, usando a notação {x

1

, x2

, . . . , xn, . . . } ou {x1

x2

. . . xn . . . }.

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{Xi}P (i) ,

Xi...P (i)

Embora sejam essencialmente iguais às notações que defi-

nem classes, essas representações às vezes denotam a família (i.e., afunção) cuja classe de índices é

I :

=

i...P (i)

e cuja regra de associação é i 7! Xi. Quando estiverem inseridas emexpressões matemáticas simbólicas na presença de outros símbolos ma-temáticos (como 2, ⇢, \, etc.), elas remeterão à classe subentendida.Quando estiverem isoladas no texto, será explicitamente mencionadono contexto se tais notações representam uma classe ou uma família.

[

i2I

Ai =

[

{Ai}i2I União da família de conjuntos {Ai}i2I , definida por

[

i2I

Ai :=

x... (9i 2 I) x 2 Ai

.

\

i2I

Ai =

\

{Ai}i2I Interseção da família de conjuntos {Ai}i2I , definida por

\

i2I

Ai :=

x... (8i 2 I) x 2 Ai

.

Em NBG, temos\

i2;

Ai =T

; = V.

A� B Diferença (assimétrica) entre as classes A e B, definida por

A� B :

=

x 2 A...x 62 B

.

P (A) Conjunto Potência ou conjunto das partes de um conjunto A,definido por

P (A) :=

x...x ⇢ A

.

Denotaremos por Pn(A) a n-ésima iteração da operação P sobre o

conjunto A, ou seja:

Pn(A) :=

n vezesz }| {

P(· · · (P(P (A))) · · · ),

onde o caso n = 0 é definido por P0

(A) := A.

; Conjunto vazio, definido por

; :=⇢

x...x 6= x

.

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V Universo de von Neumann, definida como sendo a classe dosconjuntos, a qual é dada por

V =

x...x = x

.

N :

= {1, 2, 3, 4, . . . } Conjunto dos números naturais.

N0

:

= {0, 1, 2, 3, 4, . . . } Conjunto cujos elementos são os números naturais eo número zero.

Z :

= {. . . ,�2,�1, 0, 1, 2, . . . } Conjunto dos números inteiros.

Q Conjunto dos números racionais.

Irr Conjunto dos números irracionais.

R Conjunto dos números reais.

(a, b) Par ordenado de Kuratowski, definido por:

(a, b) := {{a} , {a, b}} .

Para objetos matemáticos a1

. . . an, a n-tupla ordenada (a1

. . . an) édefinida indutivamente como segue:

• (a1

)

:

= a1

;

• (a1

, . . . , an, an+1

)

:

= ((a1

, . . . , an) , an+1

) para n > 1.

akak+1

. . . ak+n . . . Sequência de objetos com índice finito ou enumerável, definidapor

akak+1

. . . ak+n · · · := {(k, ak) , (k + 1, ak+1

) , · · · , (k + n, ak+n) , · · · } .

Incluiremos vírgulas entre os objetos de uma sequência com uma quan-tidade indeterminada de termos (e.g. com n elementos) apenas quandohouver possibilidade de confusão na leitura dos termos. Analogamente,quando a quantidade de termos for indeterminada e não houver risco deconfusão, omitiremos as vírgulas nas notações de conjuntos contáveis({a

1

a2

a3

. . . }) e de n-tuplas ordenadas ((a1

a2

. . . an)). Nos casos k = 0

ou k = 1, denotaremos as sequências

a0

a1

a2

. . . e a1

a2

a3

. . .

simplesmente por {an}, onde o contexto deve deixar claro se os índicescomeçam em k = 0 ou em k = 1.

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akak+1

. . . ak+n 2 A Conjunção das n+ 1 condições

ak 2 A, ak+1

2 A, . . . , ak+n 2 A.

A afirmação que a sequência akak+1

. . . ak+n, vista como uma função,pertence ao conjunto A sempre será declarada verbalmente sem a uti-lização do símbolo da relação de pertinência.

A1

[ A2

[ · · · [ An [ · · · União enumerável da sequência A1

A2

. . . An . . . deconjuntos, definida analogamente à união de uma família.

A1

\ A2

\ · · · \ An \ · · · Interseção enumerável da sequência A1

A2

. . . An . . .

de conjuntos, definida analogamente à interseção de uma família.

A1

⇥ A2

⇥ · · ·⇥ An Produto cartesiano finito de uma sequência finita deconjuntos A

1

A2

. . . An, definido por

A1

⇥A2

⇥ · · ·⇥An :

=

(a1

a2

. . . an)... a

1

2 A1

, a2

2 A2

, . . . , an 2 An

.

Note que

A1

⇥ A2

⇥ · · ·⇥ An = (((A1

⇥ A2

)⇥ · · · )⇥ An�1

)⇥ An.

EX Relação de pertinência em uma classe X, definida por

EX :

=

(x, y) 2 X ⇥X...x 2 y

.

dom (R) Domínio de uma relação R, definido por

dom (R)

:

=

x... (9y) (x, y) 2 R

.

Im (R) Imagem de uma relação R, definida por

Im (R) =

y... (9x) (x, y) 2 R

.

R hAi Imagem de A sobre uma relação R, definida por

R hAi :=⇢

y... (9x 2 A) (x, y) 2 R

.

R � S Composição de uma relação R com uma relação S, definida por

R � S :

=

(x, z)... (9y) ((x, y) 2 S ^ (y, z) 2 R)

.

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A/ ⇠ Quociente de um conjunto A por uma relação de equivalência ⇠ emA, definida por

A/ ⇠ :

=

⇠ h{x}i ...x 2 A

.

f : A! B f é uma função com domínio A cujos valores pertencem ao contrado-mínio B. Isso significa que f ⇢ A⇥ B e f satisfaz à condição

(8x 2 A) (9!y 2 B) (x, y) 2 f.

AB Conjunto das funções f do tipo A! B, onde A e B são conjuntos.

idA Função identidade A! A, definida por

idA (x) := x (8x 2 A) .

Y

i2I

Ai Produto cartesiano de uma família de conjuntos {Ai}i2I , definido

porY

i2I

Ai :=

(

f : I ![

i2I

Ai... (8i 2 I) f (i) 2 Ai

)

.

Se Ai = A (8i 2 I) , então definimos IA :

=

Y

i2I

Ai.

|A| Cardinal do conjunto A, definido como sendo o único ordinal inicialequipotente a A.

P↵ (A) Conjunto das partes x de um conjunto A tais que |x| < ↵, onde↵ é um cardinal.

(a, b)(X,R)

Notação para intervalos abertos relativos a uma relação binária R

em uma classe X, definida por

(a, b)(X,R)

:

=

8

>

<

>

:

x 2 X... (a, x) 2 R e (x, b) 2 R

se (a, b) 2 R

; se (a, b) 62 R,

onde a, b 2 X. Quando a relação R em X já estiver implícita nocontexto, denotaremos o intervalo (a, b)

(X,R)

simplesmente por (a, b)X .As notações [a, b]X , (a, b]X , e [a, b)X são definidas de modo análogoconcordando com a simbologia usual para intervalos.

Int(A,R)B Classe das funções que têm o conjunto B como contradomínio e cujosdomínios são intervalos fechados relativos a uma relação binária R emum conjunto A, definida por

Int(A,R)B :

=

[

a,b2A

[a,b]B,

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onde

[a, b] :=

8

>

<

>

:

{a, b} [⇢

x 2 A... (a, x) 2 R e (x, b) 2 R

se (a, b) 2 R

; se (a, b) 62 R.

SeqF (X) Classe das sequências finitas de elementos de uma classe X com índicesem segmentos iniciais de N, definida por

SeqF (X)

:

=

1[

n=0

[1,n]X,

onde [1, n] = [1, n]N0. Note que [1,0]X =

;X = {;} e ; 2 SeqF (X) .

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Prefácio

A noção das quantidades infinitesimais, entendidas como números que em mó-dulo são menores que qualquer número real positivo, surgiu e desapareceu diversas vezesno decorrer da História da Matemática, de forma explícita e implícita (2, 8, 10, 25, 29). Omesmo pode ser dito da ideia das quantidades infinitas, entendidas como números queem módulo são maiores que qualquer número real positivo. Por serem aparentemente au-tocontraditórios, muitos rejeitaram tais conceitos com veemência e dedicação,1 enquantooutros, principalmente físicos e engenheiros, os interpretavam como “ficções úteis” facili-tadoras do processo criativo de descoberta científica e matemática.

O primeiro matemático a propor a existência de uma extensão consistente dosnúmeros reais que contém quantidades infinitesimais e infinitas foi Gottfried Wilhelm vonLeibniz (1646-1716 A.D.). Este foi um polímata e filósofo alemão que ocupa uma posiçãoproeminente na História da Matemática e da Filosofia (18, 30, 34, 44, 51), e seu trabalhoinfluenciou decisivamente gerações de pensadores em diversas áreas do conhecimento. Suaobra mais conhecida, a criação e o desenvolvimento das fundações do Cálculo Diferenciale Integral, impactou profundamente a concepção de Matemática do seu tempo.

O sistema concebido por Leibniz2 consiste em um conjunto de regras que descrevemas propriedades dos novos números ideais, os quais podem ser entendidos como variáveisou constantes dependendo do contexto. Entre tais regras, destaca-se o princípio heurísticofundamental Lex Continuitatis (2, 3, 4, 30, 51), o qual postula que qualquer fato que forverdadeiro para os números finitos, estes entendidos como quantidades mensuráveis cominstrumentos reais de medida, também será válido para os números ideais.Dessa maneira, resultados que envolvem funções transcendentais, como por exemplo aidentidade trigonométrica

sen2

(x) + cos

2

(x) = 1,

também serão verdadeiros quando as suas variáveis assumirem valores na classe dos nú-meros ideais. Isso implica que todas as funções matemáticas definidas sobre valores finitostêm uma extensão para o novo sistema numérico.

Utilizando-se desse sistema, Leibniz obteve resultados importantes da disciplinaconhecida atualmente como Cálculo Diferencial e Integral (ou simplesmente Cálculo),como as regras de derivação para somas, produtos, quocientes, potências e raízes, aspropriedades básicas da integração e o Teorema Fundamental do Cálculo. Alguns dos seustermos e notações, considerados simplificadores e esclarecedores, foram estandardizados1 Mais notavelmente George Berkeley (1685-1753 A.D.) (4, 5), Georg Cantor (1845-1918 A.D.) (4, 17),

e Bertrand Russell (1872-1970 A.D.) (4, 47).2 Para uma exposição detalhada, ver (9).

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pela comunidade matemática até os dias atuais, como o termo “função” e as notaçõesdy/dx e

R

y dx, e talvez sejam seu legado matemático mais duradouro (11).

Vale mencionar que iniciou-se no ano 1699 uma disputa acirrada entre o físico ematemático inglês Isaac Newton (1642-1727 A.D.) (e seus seguidores) e Leibniz (e seusseguidores) relativa ao crédito da invenção inédita do Cálculo (26). Muitas acusaçõesforam feitas de ambas as partes, e, mesmo após a morte de Leibniz, o debate persistiupor anos. O consenso atual entre os historiadores é que os dois pensadores, Newton eLeibniz, inventaram o Cálculo independentemente um do outro, de modo que Newton foio primeiro a obter resultados na área, embora Leibniz tenha sido o primeiro a publicaralgo sobre o assunto. Newton, no entanto, evitava o uso dos números infinitesimais sempreque possível. Isso fica claro na seguinte passagem do Commercium Epistolicum Collinii& aliorum, De Analysi promota, uma coleção de correspondências relevantes à disputacitada entre Newton e Leibniz, onde Newton (referindo-se a si mesmo na terceira pessoa)afirma (15):

Nós não temos ideias de quantidades infinitamente pequenas. Por isso,o Sr. Newton introduz fluxões em seu método que procederiam ao má-ximo possível com quantidades finitas. Esse método é mais natural egeométrico porque se fundamenta nas razões primeiras de quantidadesnascentes [primae quantitatum nascentium rationes] que têm uma exis-tência na geometria [...] [Tradução nossa]

A abordagem Newtoniana ao Cálculo teve uma concepção dinâmica sobre os processosmatemáticos (10), de modo que os infinitesimais eram entendidos como movimentos con-tínuos evanescentes, e eventualmente se desenvolveria na teoria moderna dos limites.

A proposta de Leibniz inspirou uma série de matemáticos de primeira classe dosséculos XVII e XVIII a utilizarem os números infinitesimais e infinitos rotineiramente emseus argumentos, como Jacob Bernoulli (1655-1705 A.D.) (2, 4, 7, 8, 30), Leonhard Euler(1707-1783 A.D.) (2, 3, 4, 6, 51), Joseph-Louis Lagrange (1736-1813 A.D.) (3, 7, 32),e Augustin-Louis Cauchy (1789-1857 A.D.) (2, 3, 4, 6, 7, 8, 12, 30). Tais matemáticosdivergiam consideravelmente em relação às suas concepções de prova (como exemplo,Cauchy era fervorosamente contra o Princípio da Generalidade da Álgebra, o qual eraamplamente aplicado por Euler e Lagrange (6, 7, 8, 30)), mas era consenso entre elesque os números infinitesimais e infinitos tinham lugar garantido na Matemática. Euler,considerado o seguidor mais eloquente dos métodos de Leibniz (23), declarou (21):

Mesmo se alguém negasse que números infinitos realmente existem nestemundo, ainda assim em especulações matemáticas surgiriam questõescujas respostas não podem ser dadas a menos que admitíssemos umnúmero infinito. [Tradução nossa]

Como Leibniz e seus seguidores não forneceram uma base matemática bem fun-dada e convincente para o novo sistema numérico proposto, este foi tratado com muitasuspeita e desconfiança por muitos matemáticos e filósofos dos séculos XVIII e XIX, cul-minando no gradual declínio da teoria dos ideais de Leibniz e na sua substituição pelateoria dos limites de Bernard Bolzano (1781-1848 A.D.) e Karl Weierstrass (1815-1897

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A.D.) predominante até a atualidade, também conhecida como Método ✏� �, cuja formu-lação é puramente aritmética (2, 4, 7, 8, 30). Tal método permitiu que os matemáticosremovessem os números infinitesimais e infinitos dos cursos de Análise, e, em meados doséculo XIX, tais conceitos já haviam sido expurgados da comunidade matemática, assimcomo a dependência dos conceitos geométricos intuitivos e dos diagramas. Nesse período,os ideais de Leibniz persistiram apenas como ajudantes intuitivos para físicos, engenhei-ros e matemáticos que lidavam com integrais múltiplas (36), e assim permanecem sendotratados pela maioria da comunidade matemática contemporânea.

Apenas em meados do século XX que a ambição de Leibniz seria ressuscitada, e,desta vez, não haveriam dúvidas em relação à sua importância e consistência. No dia24 de Janeiro de 1961, em um discurso plenário para as bodas de prata da Associationfor Symbolic Logic, o matemático Abraham Robinson (1918-1974 A.D.) anunciou quehavia encontrado uma formalização para um sistema númerico que correspondia em váriosaspectos ao concebido por Leibniz, e, em 1966, publicou seus resultados em seu aclamadolivro Non-standard Analysis (45), fundando a área que ficaria conhecida como AnáliseNão Standard. Nessa obra, Robinson afirma:

É mostrado neste livro que as ideias de Leibniz podem ser plenamentevindicadas e que elas orientam a uma abordagem inovadora e frutíferada Análise clássica e de muitos outros ramos da Matemática. A chavepara o nosso método é fornecida pela análise detalhada da relação entreas linguagens matemáticas e as estruturas matemáticas que jaz no cerneda Teoria dos Modelos contemporânea. [Tradução nossa]

Utilizando-se de métodos da Teoria dos Modelos, área dedicada ao estudo das estruturasmatemáticas sob a perspectiva da Lógica Matemática, e utilizando-se do Axioma da Es-colha, Robinson provou ser possível obter uma fundação matematicamente correta nãoapenas para uma parte significativa do sistema heurístico idealizado por Leibniz, a qual es-tende os números reais e ficaria conhecida como Sistema dos Hiper-reais, mas tambémpara sistemas generalizados que estendem qualquer estrutura matemática infinita.

Diversas extensões do corpo ordenado dos números reais haviam sido descritascom sucesso antes do trabalho de Robinson (27) e várias outras foram detalhadas pos-teriormente (20, 22). Muitas dessas estruturas propostas carecem de propriedades quesão consideradas cruciais para sistemas numéricos, dificultando o desenvolvimento deuma Análise Diferencial e Integral sobre tais sistemas. Duas abordagens bastante fru-tíferas nesse âmbito que merecem destaque são o corpo ordenado dos números surreais(24, 31, 16) e o corpo de Levi-Civita (48, 49), as quais propiciaram o desenvolvimento deteorias que gozam de vários teoremas análogos aos resultados no cerne da Análise Real.

Uma das principais dificuldades ao lidar com extensões de R surge quando as fun-ções transcendentais são consideradas, como, por exemplo, estender o domínio das funçõesex e sin (x) para o novo corpo não arquimediano em questão. Mesmo que tais extensõessejam sistematicamente definidas em uma construção particular, elas não possuem, em

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geral, as principais propriedades das suas contrapartes usuais. Uma vitória significativade Robinson foi ter revelado que toda função (transcendental ou não) sobre os reais podeser estendida para os hiper-reais, e tais extensões naturalmente “herdam” das suas versõesreais originais todas as propriedades que podem ser descritas em uma linguagem particu-lar de primeira ordem. Assim, de certa maneira, o princípio Lex Continuitatis de Leibnizé respeitado nessas extensões.

Nas décadas subsequentes à descoberta de Robinson até a atualidade, diversosmatemáticos apresentaram maneiras mais práticas e descomplicadas de lidar com o tema,3

expressando-o por intermédio de resultados mais conhecidos e tornando-o mais acessívelao público não especializado na área da Lógica e Fundamentos da Matemática. Alémdisso, houve um significante desenvolvimento de novos métodos que buscavam tornar aAnálise Não Standard melhor aplicável às diversas partes da Matemática, tais como aTopologia, a Teoria das Probabilidades, a Análise Funcional, a Teoria das Medidas e aAnálise Complexa. A despeito desse extensivo aperfeiçoamento e progresso, a pesquisana área é relativamente nova e pouco divulgada, e muitos problemas ainda estão emaberto, abrindo amplo espaço para investigações promissoras com alto potencial paranovas descobertas.

3 O próprio Robinson contribuiu significativamente nesse processo. Outros notáveis são: Elias Zakon(1908-1991 A.D.), Wilhelmus Luxemburg (1929-2018 A.D.), Edward Nelson (1932-2014 A.D.) e KeithStroyan (vivo, nascido em 1944).

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1Domínios e Corpos Ordenados

Neste capítulo, revisaremos algumas especificidades dos domínios e corpos ordena-dos que serão relevantes para nossa discussão nos capítulos subsequêntes, estabelecendouma base de terminologias e notações. Inspiradas em propriedades aritméticas, as axio-matizações dessas estruturas retratam os vínculos fundamentais entre a adição, a multi-plicação e a ordem dos números. Porém, essas propriedades básicas não são suficientespara delimitar todos os atributos numéricos, e, como veremos, existe uma variedade detipos de domínios e corpos ordenados, os quais podem ser classificados de acordo com asconjunturas que eles observam. Destacaremos o corpo ordenado dos números reais devidoà sua importância no âmbito da Análise matemática.

Assumiremos a Teoria dos Conjuntos de Neumann-Bernays-Gödel (Definição B.4)como metateoria nesta dissertação. Como essa teoria é uma extensão conservativa (Defini-ção A.39) de ZFC (Definição B.2), todos os resultados que obteremos podem ser reescritoscomo teoremas de ZFC.

1.1 Domínios Ordenados

Assumiremos que o leitor já está familiarizado com a axiomatização e as proprie-dades básicas dos domínios. Investigaremos os efeitos que a introdução de uma ordem emais dois axiomas a tal estrutura trariam para a discussão.

Definição 1.1. Dizemos que um domínio D é um domínio ordenado quando munidode uma ordem1 < em D se para quaisquer x, y, z 2 D temos:

(Inv) Se x < y, então x+ z < y + z;

(Pos) Se 0 < x e 0 < y, então 0 < xy.

(Invariância Translacional)

(Positividade do Produto)1 Estamos nos referindo à noção de ordem total estrita, ou seja, a relação <⇢ E ⇥ E referida

obedecerá às seguintes propriedades (8x, y, z 2 E):

(Trans) Se x < y e y < z, então x < z;

(Irr) x 6< x;

(Lin) Se x 6= y, então x < y ou y < x.

(Transitividade)

(Irreflexividade)

(Linearidade)

A ordem não estrita correspondente a uma ordem será denotada pelo mesmo símbolo da ordemestrita exceto que haverá um traço a mais abaixo do símbolo em questão (e.g. 6). Um conjuntomunido de uma ordem é dito ser um conjunto ordenado. Um subconjunto F de E é dito ser denso

em E se para quaisquer x, y 2 E com x < y existe um z 2 F tal que x < z < y. Dizemos que oconjunto ordenado (E,<) é denso se E é denso em E.

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Dizemos que x 2 D é positivo (resp. não negativo) se 0 < x (resp. 0 6 x), e dizemosque x é negativo (resp. não positivo) se x < 0 (resp. x 6 0). Se x 2 D e n 2 N, entãodenotaremos a soma

n vezesz }| {

x+ x+ · · ·+ x 2 D

por nx. Em particular, denotaremos o elemento n1 simplesmente por n, e o rotularemoscomo um número natural em D. Similarmente, se m e n forem dois números inteiroscom n inversível em D, então diremos que o elemento m/n = m · n�1 2 D é um númeroracional em D.

A implicação em (Inv) pode ser substituída por uma equivalência sem alterar osignificado da condição, pois basta usar a própria condição (Inv) somando �z em ambosos lados da condição x+ z < y + z para obter x < y.

Prova-se diretamente que a condição (Pos) é equivalente à condição

(InvG) Se x < y e 0 < z, então xz < yz. (Invariância Geométrica)

Se 0 < z e xz < yz, então teremos x < y, pois caso contrário teríamos y 6 x eyz 6 xz por (InvG), o que seria absurdo.

Sob a perspectiva da Teoria dos Modelos (Apêndice A), os domínios ordenados Dsão as LAO-estruturas (Exemplo A.10 e Definição A.23) que são modelos da LAO-teoriagerada pelos seguintes axiomas:

1. (8x, y, z) x+ (y + z) = (x+ y) + z;

2. (8x) x+ 0 = x;

3. (8x) (9y) x+ y = 0;

4. (8x, y) x+ y = y + x;

5. (8x, y, z) x · (y · z) = (x · y) · z;

6. (8x) x · 1 = x;

7. (8x, y) x · y = y · x;

8. (8x, y, z) (x+ y) · z = x · z + y · z;

9. (8x, y) (x · y = 0 �! (x = 0 _ y = 0)) ;

10. 0 6= 1;

11. (8x, y, z) ((x < y ^ y < z) �! x < z) ;

12. (8x) (¬x < x) ;

13. (8x, y) ((¬x = y) �! (x < y _ y < x)) ;

14. (8x, y, z) (x < y �! x+ z < y + z) ;

15. (8x, y) ((0 < x ^ 0 < y) �! 0 < x · y) .

Nesta dissertação, denotaremos tal LAO-teoria por TDO. Os axiomas 1-4 certificamque (D,+, 0) é um grupo comutativo; os axiomas 5-7 certificam que (D, ·, 1) é um monóidecomutativo; os axiomas 1-8 certificam que (D,+, ·, 0, 1) é um anel comutativo; os axiomas1-10 certificam que (D,+, ·, 0, 1) é um domínio; e os axiomas 11-13 garantem que (D,<)

é um conjunto ordenado. Neste capítulo, assumiremos que (D,+, ·, 0, 1, <) é um domínio

2

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ordenado, o qual será denotado apenas por D por simplicidade. O domínio subentendidoem D também será denotado por D por abuso de linguagem.

As noções de morfismo, imersão, imersão elementar e isomorfismoentre domínios ordenados são definidas como casos particulares das noções equivalentesreferidas no estudo da Teoria dos Modelos (Seção A.15). Em particular, se f : D ! E forum morfismo entre domínios ordenados, então a imagem de 1 2 D sobre f será o elementoneutro multiplicativo de E, e, como f também é um morfismo entre os respectivos gruposaditivos subentendidos em D e E, teremos que f (n) = n (8n 2 N). A noção de subdo-mínio ordenado corresponde à noção de subestrutura (Definição A.41). O kernel deum morfismo entre domínios ordenados é a imagem inversa do conjunto {0} sobretal morfismo.

Observação 1.2. Na Definição 1.1, definimos os domínios ordenados com ordens estritas(<), mas poderiamos tê-los definido com ordens não estritas (6). Embora as duas carac-terizações sejam essencialmente iguais, discrepâncias surgem ao considerarmos morfismosf entre tais estruturas. Isso ocorre pois as implicações

x < y ) f (x) < f (y)

ex 6 y ) f (x) 6 f (y)

não são equivalentes. Com finalidade de evitar confusões entre tais conceitos, chamaremosa estrutura de domínio ordenado com a ordem não estrita de domínio nãoestritamente ordenado.

Exemplo 1.3. Se f : D ! E for um morfismo entre domínios não estritamente ordena-dos, se A for um subdomínio ordenado de D, e se B um for subdomínio ordenado de E,então a imagem f hAi será um subdomínio ordenado de E, e a imagem inversa f�1 hBiserá um subdomínio ordenado de D.

Exemplo 1.4. Os domínios dos números inteiros, dos números racionais e dos númerosreais, os quais são respectivamente denotados por Z, Q e R, constituem domínios orde-nados quando munidos das ordens usuais. Estes exemplos são insuspeitos dado que osaxiomas (Inv) e (Pos) originam-se das propriedades desses domínios numéricos.

Exemplo 1.5. Seja g um número irracional, e seja Z (g) o subconjunto de R definido por

Z (g) := Z+ gZ =

u+ vg...u, v 2 Z

.

Note que 0 e 1 pertencem a Z (g).

Provaremos que Z (g) é denso em R. Sejam a, b 2 R com a < b, seja n umnúmero natural com 1/n < (b�a)/2, e sejam f

1

f2

. . . fnfn+1

as respectivas partes fracionárias2

2 A parte fracionária de um número real r é o número real r � k, onde k é o maior número inteirotal que k 6 r. Claramente, a parte fracionária de r é não negativa e é menor que 1.

3

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dos números da lista g, 2g, . . . , ng, (n+ 1) g. Como g é irracional, temos fi 6= fj (8i, j).Considerando a partição

0,1

n

R,

1

n,2

n

R, . . . ,

n� 2

n,n� 1

n

R,

n� 1

n, 1

R

do intervalo [0, 1)R em n conjuntos, o Princípio da Casa dos Pombos3 implica que existemfi0 e fj0 com i

0

6= j0

tais que fi0 e fj0 pertencem a um mesmo intervalo dessa partição,resultando em |fi0 � fj0 | < 1/n. Assim, como cada fi é uma diferença entre um múltiplode g e um número inteiro, temos que existe um z 2 Z (g) com 0 < z < 1/n. Seja k onúmero inteiro tal que kz 6 (a+b)/2 < (k + 1) z. Portanto, temos

0 6 a+ b

2

� kz < z <1

n<

b� a

2

,

resultando em kz < (a+b)/2 < b e

a =

a+ b

2

� b� a

2

< kz.

Resumindo, temos a < kz < b e kz 2 Z (g), provando que Z (g) é denso em R.

A soma de dois elementos de Z (g) pertence a Z (g), e, para a maioria dos valoresde g 2 Irr, o produto de dois elementos de Z (g) não pertencerá necessariamente a Z (g),implicando que Z (g) não forma um subdomínio ordenado de R para esses valores de g.

Seja n um número natural que não é um quadrado perfeito. Provaremos queZ (

pn) é um subdomínio ordenado próprio de R. Temos�

u1

+ v1

pn�

·�

u2

+ v2

pn�

= (u1

u2

+ v1

v2

n) + (u1

v2

+ u2

v1

)

pn 2 Z

�pn�

para quaisquer u1

, u2

, v1

, v2

2 Z, resultando que Z (

pn) forma um subdomínio ordenado

de R. Seja m um número natural que não é um quadrado perfeito e que não é um múltiplode n. Suponha que u e v são números inteiros com

pm = u + v

pn. Se v = 0, então

pm = u e m = u2, o que é absurdo, e se u = 0, então teremos

pm = v

pn e m = nv2, o

que também é absurdo. Assim, u e v são não zero, e temos

m =

�pm�

2

=

u+ vpn�

2

= u2

+ nv2 + 2uvpn,

implicando quepn é um número racional, o que é absurdo. Portanto, provamos que o

número realpm não pertence ao domínio ordenado Z (

pn).

Exemplo 1.6. Considere os domínios dos polinômios com coeficientes inteiros, racionais ereais, Z [x] ,Q [x] e R [x] respectivamente. Para cada um desses três domínios, defina umarelação binária < nesse domínio de modo que p < q se, e somente se, o polinômio q�p for3 O Princípio da Casa dos Pombos (Teorema B.29) é o resultado de ZFC ou NBG cujo enunciado

afirma que se um conjunto A tiver cardinal maior que o cardinal de um conjunto B, então toda funçãosobrejetora do tipo A! B não será injetora.

4

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não zero e tiver coeficiente dominante positivo. Prova-se diretamente que cada relação <

definida é uma ordem em cada domínio mencionado, e que as expansões desses domíniosàs estruturas de domínio ordenado correspondentes satisfazem aos axiomas (Inv) e (Pos).Portanto, os domínios Z [x] ,Q [x] e R [x] são domínios ordenados quando munidos dasrespectivas ordens definidas.

Exemplo 1.7. Considere o conjunto L ⇢ ZR das famílias de reais {an}n2Z tais que

an = 0 (8n < p)

para algum número inteiro p. Informalmente, podemos dizer que L é o conjunto dasfamílias de reais com índices em Z que são eventualmente zero pela esquerda. Como todafamília mencionada neste exemplo terá índices em Z, omitiremos a informação “n 2 Z” aoescrevermos tais famílias, sempre usando a letra n como variável. Sejam {an} , {bn} 2 L.A operação de adição em L será definida por

{an}+ {bn} :

= {an + bn} .

A multiplicação em L será definida por

{an} · {bn} :

= {cn}

com

cn :

=

8

>

>

<

>

>

:

0 se n < p+ qn�qX

i=p

aibn�i se p+ q 6 n,

onde p e q são números inteiros tais que an = 0 (8n < p) e bn = 0 (8n < q). O leitordeverá notar que o produto {an} · {bn} definido acima independe das escolhas de p e q.

A prova de que L é um domínio quando munido dessas operações é direta, onde:

• A família constante e igual a zero, {0}, é o elemento neutro da adição em L, o qualserá denotado simplesmente por 0 por abuso de linguagem;

• Para cada r 2 R e para cada m 2 Z, denotaremos por JrKm a família {un} tal queum = r e un = 0 (8n 6= m). No caso m = 0, denotaremos JrK

0

simplesmente por r

por abuso de linguagem. A família J1K0

, a qual é denotada simplesmente por 1, é oelemento neutro da multiplicação em L.

A ordem em L será definida de modo que {an} < {bn} se, e somente se, {an} 6= {bn}e ak < bk, onde k é o menor número inteiro tal que ak 6= bk. Tal número inteiro k

sempre existe, pois caso contrário pelo menos uma das famílias {an} e {bn} não seria

5

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eventualmente zero pela esquerda. A confirmação de que < é uma ordem em L serádeixada para o leitor.

Provaremos que L é um domínio ordenado quando munido dessa ordem. Se{an} , {bn} , {cn} 2 L com {an} < {bn}, e se k for o menor número inteiro com ak 6= bk,então ak < bk, o número inteiro k será o menor número inteiro tal que ak + ck 6= bk + ck,e, como ak + ck < bk + ck (pois, como vimos, R é um domínio ordenado), teremos

{an}+ {cn} = {an + cn} < {bn + cn} = {bn}+ {cn} ,

provando que L satisfaz a (Inv). Se 0 < {an} e 0 < {bn}, onde p e q são os menoresnúmeros inteiros tais que 0 < ap e 0 < bq, então, denotando {cn} :

= {an} · {bn}, teremoscn = 0 (8n < p+ q), e

cp+q =

(p+q)�qX

i=p

aib(p+q)�i

=

pX

i=p

aibp+q�i

= apbq

> 0,

provando que L observa (Pos). Portanto, L é um domínio ordenado.

Denotaremos por x a família J1K1

. Diretamente da definição da multiplicação emL, obtêm-se os seguintes fatos:

• x�1 é a família J1K�1

;

• {an} · x = {an�1

} e {an} · x�1

= {an+1

} ;

• Para m 2 Z, temos {an} · xm= {an�m} e xm

= J1Km ;

• Para r 2 R e m 2 Z, temos r · J1Km = JrKm .

Assim, temos

{an} = JapKp + Jap+1

Kp+1

+ Jap+2

Kp+2

+ · · ·

= ap · J1Kp + ap+1

· J1Kp+1

+ ap+2

· J1Kp+2

+ · · ·= ap · xp

+ ap+1

· xp+1

+ ap+2

· xp+2

+ · · ·

=

1X

n=p

anxn,

6

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onde p é o menor número inteiro tal que ap 6= 0. Note que1X

n=p

anxn não é uma soma4

– é meramente uma representação formal de {an}. Tais séries formais são conhecidascomo séries de Laurent,5 e são cruciais no ramo da Análise Complexa. As operações deadição e multiplicação que definimos em L correspondem meramente às operações usuaisde adição e multiplicação de polinômios na variável x, mas nesta ocasião em uma versãoampliada para “polinômios infinitos” que admitem uma quantidade finita de potênciasnegativas de x.

A função : R ! L definida por (r) :

= JrK0

é uma imersão (Definição A.42)entre domínios ordenados. Em vista disso, um elemento de L da forma JrK

0

com r 2 R éidentificado com o número real r.

Antes de indicarmos as diferenças entre os variados tipos de domínios ordenados,é apropriado esclarecer as propriedades que todos eles têm em comum. As provas dasafirmações do teorema a seguir estão devidamente explanadas em (14).

Teorema 1.8 (Propriedades dos Domínios Ordenados).

(a) Um elemento não zero x de D será positivo se, e somente se, o seu inverso aditivo,�x, for negativo. Analogamente, x será negativo se, e somente se, o seu inversoaditivo for positivo;

(b) O produto de um elemento positivo e um elemento negativo de D será negativo;

(c) O produto de dois elementos negativos de D será positivo;

(d) Se x < y, 0 < z, e w < 0, então x · z < y · z e y · w < x · w;

(e) Se x for um elemento não zero de D, então 0 < x2. Em particular, 0 < 1

2

= 1;

(f) D é infinito;

(g) Uma unidade6 x em D será positiva se, e somente se, o seu inverso multiplicativo,x�1, for positivo. Analogamente, x será negativo se, e somente se, o seu inversomultiplicativo for negativo.

Por (Lin), se x 2 D, então �x 6 x ou x 6 �x, implicando que o conjunto {�x, x}tem um maior elemento. Tal máximo é dito ser o valor absoluto ou o módulo de x eé denotado por |x|. Se |x| = 0, então x = 0.4 Não há preocupação alguma em relação à convergência de séries aqui. Trata-se apenas de uma

decomposição da família {an} em níveis.5 Mais rigorosamente, as séries que representam os elementos de L são as séries de Laurent que não têm

x = 0 como uma singularidade essencial, ou seja, as séries centradas em 0 cujas partes principais têmuma quantidade finita de termos.

6 Um elemento x de um anel é dito ser uma unidade ou ser inversível se existir um elemento y desseanel tal que x · y = y · x = 1.

7

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Exemplo 1.9. Não existe uma ordem < em C que torna tal conjunto em um domínioordenado. Isso ocorre pois i 6= 0 e i2 = �1 < 0, contradizendo a letra (e) do Teorema 1.8.

1.2 Corpos Ordenados

Os domínios ordenados de maior importância na Matemática contêm apenas uni-dades, com a exceção do elemento 0. Essa propriedade adicional permite que a operaçãode divisão com denominadores não zero seja definida sobre a estrutura, e tal operação éimprescindível para a área da Análise, visto que as noções de derivada e integral de funçõesfundam-se peremptoriamente sobre a caracterização de limites de formas indeterminadasdos tipos 0/0 e 1/1. A viabilidade de efetuar divisões também é bastante desejável doponto de vista algébrico, uma vez que as soluções das equações polinômiais geralmentesão expressas na forma de quocientes.

Definição 1.10. Um corpo ordenado é um domínio ordenado cujo domínio subenten-dido é um corpo. Um corpo não estritamente ordenado é um domínio não estrita-mente ordenado cujo domínio subentendido é um corpo.

A terminologia desenvolvida na Definição 1.1 para descrever as propriedades doselementos dos domínios ordenados é usada para os corpos ordenados.

Sob a perspectiva da Teoria dos Modelos (Apêndice A), os corpos ordenados sãoas LAO-estruturas que são modelos da LAO-teoria gerada pelos axiomas 1-15 discutidosna Seção 1.1 e pelo axioma

(InvM) (8x) (x 6= 0 �! (9y) x · y = 1) . (Invertibilidade Multiplicativa)

Tal LAO-teoria será denotada por TCO nesta dissertação.

Neste capítulo, assumiremos que (K,+, ·, 0, 1, <) é um corpo ordenado, o qualserá denotado apenas por K por simplicidade. O corpo subentendido em K também serádenotado por K por abuso de linguagem. Denotaremos por ÷ a operação dedivisão em K, ou seja, a função ÷ : K ⇥ (K � {0})! K definida por ÷ (x, y) := x/y.

As noções de morfismo, imersão, imersão elementar e isomorfismo entrecorpos ordenados são definidas como casos particulares das noções equivalentes referidasno estudo da Teoria dos Modelos (Seção A.15). Em particular, se f : K ! L for ummorfismo entre corpos ordenados, então a imagem de 1 2 K sobre f será o elementoneutro multiplicativo de L, implicando em f (q) = q (8q 2 Q). A noção de subcorpoordenado corresponde à noção de subestrutura (Definição A.41).

A ordem em um corpo ordenado é densa. Isso ocorre pois se x e y forem elementosde K com x < y, então teremos

x <x+ y

2

< y.

8

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Exemplo 1.11. Se f : K ! L for um morfismo entre corpos não estritamente ordenados,se A for um subcorpo ordenado de K, e se B for um subcorpo ordenado de L, então aimagem f hAi será um subcorpo ordenado de L, e a imagem inversa f�1 hBi será umsubcorpo ordenado de K.

Exemplo 1.12. O domínio ordenado dos números inteiros, Z, não é um corpo ordenado,e os domínios ordenados Q e R são corpos ordenados.

Exemplo 1.13. Seja n um número natural que não é um quadrado perfeito. Se u e v

forem números inteiros com (u, v) 6= (0, 0), então teremos

1

u+ vpn=

1

u+ vpn· u� v

pn

u� vpn

=

u� vpn

u2 � nv2

=

u

u2 � nv2� v

u2 � nv2·pn,

resultando que o número u+ vpn será inversível no domínio ordenado Z (

pn) (Exemplo

1.5) se, e somente se, o número inteiro não zero7 u2 � nv2 dividir u e v. Caso tivermos1 < |u| e v = 0, teremos que u2 � nv2 = u2 não dividirá u, e o número u+ v

pn = u não

será inversível em Z (

pn). Portanto, Z (

pn) não é um corpo ordenado.

Exemplo 1.14. Os domínios ordenados Z [x] ,Q [x] e R [x] (Exemplo 1.6) não são corposordenados, dado que nenhum polinômio não constante nesses domínios é uma unidade.

Exemplo 1.15. Como R [x] é um domínio, existe um corpo R (x) que contém R [x] comosubanel tal que todo elemento r (x) de R (x) pode ser escrito na forma r (x) =

p(x)/q(x)

com p (x) , q (x) 2 R [x] e q (x) 6= 0. Tal corpo, o qual é o único com tais propriedadessalvo isomorfismos, é dito ser o corpo das frações de R [x] ou o corpo das funçõesracionais. A ordem < em R (x) será definida da seguinte maneira:

• Dizemos que r (x) =

p(x)/q(x) 2 R (x) é positivo se 0 < p0/q0, onde p0

e q0

são oscoeficientes dominantes dos respectivos polinômios p (x) e q (x). Nesse caso, nota-seprontamente que o número real p0/q0 não depende da representação particular der (x) como uma fração da forma p(x)/q(x) com p (x) , q (x) 2 R [x] e q (x) 6= 0;

• Para r (x) e s (x) em R (x), dizemos que r (x) < s (x) se s (x)� r (x) é positivo.

A relação < nitidamente satisfaz às condições (Irr) e (Lin). A prova de que < observa(Trans) será deixada para o leitor.

Provaremos que R (x) é um corpo ordenado quando munido dessa ordem. Amaneira que definimos a ordem <, viz. primeiramente definindo quando um elemento é7 Se u2 � nv2 = 0, então

pn = ±u/v será um número racional, o que é absurdo.

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positivo e em seguida vinculando a ordem a uma diferença positiva, implica imediatamenteque R (x) satisfaz a (Inv). Se p(x)/q(x) e p0(x)/q0(x) forem elementos positivos de R (x) comp0

, p00

, q0

e q00

sendo os coeficientes dominantes dos respectivos polinômios p (x) , p0 (x) , q (x)e q0 (x), então 0 < p0/q0, 0 < p00/q00, e, como o quociente dos coeficientes dominantes donumerador e do denominador do produto

p (x)

q (x)· p

0(x)

q0 (x)=

p (x) · p0 (x)q (x) · q0 (x)

é igual ap0

· p00

q0

· q00

=

p0

q0

· p00

q00

> 0,

temos 0 < (

p(x)/q(x))·(p0(x)/q0(x)), provando que R (x) satisfaz a (Pos) e é um corpo ordenado.

O leitor atento notará que a maneira mais rápida de verificar uma condição daforma p/q < p0/q0 consiste em manipular as frações de modo que os coeficientes dominantesde q e q0 sejam positivos, e em seguida investigar a condição equivalente 0 < p0q�pq0. Estaúltima será verdadeira se, e somente se, o coeficiente dominante do polinômio p0q � pq0

for positivo.

A função � : R ! R (x) definida por � (r) :

=

r/1 (onde r e 1 são polinômiosconstantes em R [x]) é uma imersão (Definição A.42) entre corpos ordenados. Por essemotivo, um elemento de R (x) da forma r/1 com r 2 R é identificado com onúmero real r.

Exemplo 1.16. Sejam {an} e {bn} dois elementos não zero do domínio ordenado L(Exemplo 1.7), e sejam p e q dois números tais que p é o maior número inteiro coman = 0 (8n < p) e q é o maior número inteiro com bn = 0 (8n < q). Suponha que asfamílias {an} e {bn} são inversas uma da outra em L. Temos {an} · {bn} = 1, ou seja,p+ q = 1, apbq = 1, e

n�qX

i=p

aibn�i = 0 (8n > p+ q) .

Portanto, temos bq = 1/ap, e, comon�qX

i=p

aibn�i = apbn�p +

n�qX

i=p+1

aibn�i = 0 (8n > p+ q) ,

substituindo n por m+ p com q < m, temos

apbm +

m+p�qX

i=p+1

aibm+p�i = 0 (8m > q) ,

resultando em

bm =

�m+p�qX

i=p+1

aibm+p�i

ap(8m > q) .

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Note que se p+1 6 i, então p < i, p� i < 0, e m+ p� i < m. Assim, para cada m > q, ovalor de bm depende apenas dos valores da sequência finita bqbq+1

. . . bm�2

bm�1

, mostrandoque a família {bn} é univocamente determinada pela família {an}. Isso prova que L é umcorpo ordenado, e, por tal motivo, tal estrutura é chamada de corpo ordenado dasséries de Laurent.

1.3 A Propriedade Arquimediana

Considere dois números naturais, m e n, tais que m < n. Sabemos que n 6 mn,ou seja, temos

n 6n vezes

z }| {

m+m+ · · ·+m .

Em particular, existe uma soma de termos repetidos e iguais a m que ultrapassa ou igualao valor n. O mesmo ocorre para os números racionais positivos, visto que se p/q < r/s,com p, q, r e s números naturais, então, como rq 6 sp · rq, teremos

r

s6 p

q· rq =

rq vezesz }| {

p

q+

p

q+ · · ·+ p

q.

No entanto, isso não ocorre para todo domínio ordenado. Considere o corpo orde-nado das funções racionais, R (x), onde temos 0 < x�1 < 1. Nesse cenário, temos

n vezesz }| {

x�1

+ x�1

+ · · ·+ x�1

= nx�1 < 1 (8n 2 N) ,

ou seja, independentemente de quantas vezes o “valor” x�1 for acumulado, o resultado dasoma nunca ultrapassará o elemento neutro multiplicativo do corpo. Isso indica que oselementos x�1 e 1 estão em classes essencialmente distintas de elementos de R (x).

Definição 1.17. Sejam x e y dois elementos de D.

(a) Dizemos que x é infinitesimal em relação a y (ou y é infinito em relação ax) se n |x| < |y| (8n 2 N) ;

(b) Dizemos que x é infinitesimal se x é infinitesimal em relação a 1, ou seja, sen |x| < 1 (8n 2 N). Se S é um subconjunto de D, então o conjunto de todos oselementos infinitesimais de S é denotado por Inf (S);

(c) Dizemos que x é finito se x não é infinito em relação a 1, ou seja, se |x| 6 n (9n 2 N).Se S é um subconjunto de D, então o conjunto de todos os elementos finitos de S

é denotado por Fin (S);

(d) Dizemos que x é infinito se x não é finito, ou seja, se n < |x| (8n 2 N). Se S é umsubconjunto de D, então o conjunto de todos os elementos infinitos de S é denotadopor S1;

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(e) Dizemos que x é apreciável se x é finito e não é infinitesimal, ou seja,se |x| 6 n (9n 2 N) e 1 6 n |x| (9n 2 N).

O elemento neutro aditivo, 0, é infinitesimal em relação a qualquer elemento nãozero de D. Todo infinitesimal é finito, e todo número racional em D é apreciável. Umaunidade x será infinitesimal se, e somente se, x�1 for infinito.

Teorema 1.18. Sejam x, y 2 D. A Tabela 1 a seguir sumariza a situação da soma x+y,do produto xy e do quociente x/y (caso y for uma unidade) para diversas combinações deatributos de x e y descritos na Definição 1.17.

Tabela 1 – Operações aritméticas entre elementos infinitesimais, finitos, infinitose apreciáveis

x y x+ y xy x/y

Infinitesimal Infinitesimal Infinitesimal Infinitesimal IndeterminadoInfinitesimal Finito Finito Infinitesimal IndeterminadoInfinitesimal Infinito Infinito Indeterminado InfinitesimalInfinitesimal Apreciável Apreciável Infinitesimal Infinitesimal

Finito Infinitesimal Finito Infinitesimal IndeterminadoFinito Finito Finito Finito IndeterminadoFinito Infinito Infinito Indeterminado InfinitesimalFinito Apreciável Apreciável Finito FinitoInfinito Infinitesimal Infinito Indeterminado InfinitoInfinito Finito Infinito Indeterminado InfinitoInfinito Infinito Infinito Infinito IndeterminadoInfinito Apreciável Infinito Infinito Infinito

Apreciável Infinitesimal Apreciável Infinitesimal InfinitoApreciável Finito Apreciável Finito IndeterminadoApreciável Infinito Infinito Infinito InfinitesimalApreciável Apreciável Apreciável Apreciável Apreciável

A entrada “indeterminado” na Tabela 1 representa que o resultado da operaçãoindicada não será necessariamente infinitesimal, finito, infinito ou apreciável.

Demonstração. Trataremos apenas das duas seguintes hipóteses:

1. Se x e y forem infinitesimais, então x+ y será infinitesimal;

2. Se x for infinitesimal e y for finito, então xy será infinitesimal.

As provas dos casos restantes mostrados na Tabela 1 são diretas e serão deixadaspara o leitor.

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1. Se x e y forem dois infinitesimais em D, e se n 2 N, então

n |x+ y| 6 n |x|+ n |y|< 1 + 1

= 2.

Nesse caso, escolhendo n = 2m com m 2 N, temos 2m |x+ y| < 2, resultando em

m |x+ y| < 1 (8m 2 N) ,

e provando que x+ y é infinitesimal.

2. Se x for infinitesimal, se y for finito, e se n 2 N, então existirá um m 2 N com|y| 6 m, e teremos

n |xy| = n · |x| · |y|6 n · |x| ·m= mn |x|< 1,

mostrando que xy é infinitesimal.

Se x e y forem elementos não zero de D tais que x é infinitesimal e y não éinfinitesimal, então x será infinitesimal em relação a y. Isso ocorre pois y será apreciávelou infinito, e em ambos os casos teremos que y/x será infinito, ou seja, teremos

n <�

y

x

=

|y||x| (8n 2 N) ,

resultando em n |x| < |y| (8n 2 N). Em particular, teremos |x| < |y|.

Corolário 1.19.

(a) Fin (D) é um subdomínio ordenado de D;

(b) Inf (D) é um subdomínio ordenado sem unidade8 de D e é um ideal em Fin (D) .

Definição 1.20. Dizemos que D é um domínio arquimediano9 se não existem x, y 2 D

não zero tais que x é infinitesimal em relação a y. Caso contrário, dizemos que D é umdomínio não arquimediano.8 Um domínio ordenado sem unidade é uma LA-estrutura (Exemplo A.9) que é modelo dos axiomas

dos domínios ordenados exceto os axioma 6 e 10 descritos na Seção 1.1.9 Em 1882 (1), o matemático austríaco Otto Stolz (1842-1905) vinculou o nome do matemático grego

Arquimedes de Siracusa a tal propriedade, uma vez que ela aparece como Axioma V na obra desteentitulada Sobre a esfera e o cilíndro.

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A condição que define os domínios arquimedianos é conhecida comoPropriedade Arquimediana.

Se D for arquimediano, então teremos Inf (D) = {0}, Fin (D) = D, e D1 = ;.

Exemplo 1.21. O domínio ordenado dos números inteiros, Z, e o corpo ordenado dosnúmeros racionais, Q, são arquimedianos. Utilizando o fato de que Q é denso em R,prova-se que R também é um corpo arquimediano.

Exemplo 1.22. Se n for um número natural que não é um quadrado perfeito, então odomínio ordenado Z (

pn) será arquimediano, visto que ele é um subdomínio

ordenado de R.

Exemplo 1.23. Os domínios ordenados Z [x] ,Q [x] e R [x] (Exemplo 1.6) são não ar-quimedianos, uma vez que temos n < x (8n 2 N) para cada um deles. Se m e n foremnúmeros inteiros não negativos com m < n, então xm será infinitesimal em relação a xn.Percebe-se que

Inf (R [x]) = {0} ,

Fin (R [x]) = R,

eR [x]1 = R [x]� R,

e equações análogas são válidas para Z [x] e Q [x].

Exemplo 1.24. O corpo ordenado das funções racionais, R (x) (Exemplo 1.15), é nãoarquimediano. Se m < n forem números inteiros, então xm será infinitesimal em relaçãoa xn. Em particular, se n for um número natural, então x�n será infinitesimal e xn seráinfinito. Constata-se diretamente que

Inf (R (x)) =

p

q

... p, q 2 R [x] com q 6= 0 e gr (p) < gr (q)�

,

Fin (R (x)) =

p

q

... p, q 2 R [x] com q 6= 0 e gr (p) 6 gr (q)�

,

eR (x)1 =

p

q

... p, q 2 R [x] com q 6= 0 e gr (q) < gr (p)�

.

Exemplo 1.25. O corpo ordenado das séries de Laurent, L (Exemplo 1.7), é não arqui-mediano. Se m < n forem números inteiros, então xn será infinitesimal em relação a xm.Em particular, se n for um número natural, então x�n será infinito e xn será infinitesimal.Constata-se diretamente que

Inf (L) =⇢

{an}... ai = 0 (8i 6 0)

,

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Fin (L) =⇢

{an}... ai = 0 (8i < 0)

,

eL1 =

{an}... ai 6= 0 (9i < 0)

.

Teorema 1.26. As seguintes condições são equivalentes:

(a) K é arquimediano;

(b) K não tem um elemento infinitesimal não zero;

(c) K não tem um elemento infinito.

Demonstração. As implicações (a)) (b) e (b)) (c) são imediatas.

(c)) (a) : Suponha que existem x, y 2 K não zero tais que x é infinitesimal em relaçãoa y, ou seja, tais que

n |x| < |y| (8n 2 N) .

Como x é não zero, temos que |x| é invertível, e, multiplicando ambos os ladosdaquela inequação por |x|�1, temos

n < |y| · |x|�1

(8n 2 N) ,

implicando que |y| · |x|�1 é infinito, e contradizendo (c).

1.4 Relações Confrontantes em Domínios Ordenados

Nesta seção, trataremos de uma classe de relações de equivalência ⌘ em D queinduzem canonicamente uma ordem no quociente D/ ⌘.

Definição 1.27. Uma relação de equivalência ⌘ em D é dita ser confrontante em D seas seguintes condições são observadas:

(Som) Se x ⌘ y, então x+ z ⌘ y + z;

(Conf) x < y < z e x ⌘ z implicam x ⌘ y ⌘ z.

Exemplo 1.28. Considere a relação binária , em Q [x] (Exemplo 1.6) definida porrX

i=0

cixi ,

sX

i=0

dixi:, crx

r= dsx

s

, (r = s e cr = ds) .

15

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Verifica-se prontamente que , é uma relação de equivalência em Q [x] que obedece a

(Som). Sejam p (x) =lX

i=0

cixi, q (x) =

mX

i=0

dixi e r (x) =

nX

i=0

eixi três polinômios em Q [x]

com p (x) < q (x) < r (x) e p (x) , r (x). Assim, teremos l = n e cl = en = el. Se l < m,então os graus dos polinômios q (x) � p (x) e r (x) � q (x) serão iguais a m, e teremos0 < dm < 0, o que é absurdo. Se m < l, então os graus dos polinômios q (x) � p (x) er (x)� q (x) serão iguais a l, e teremos cl < 0 < el = cl, o que é absurdo. Portanto, temosl = m = n, resultando em cl 6 dl 6 el = cl, cl = dl = el, e p (x) , r (x). Isso prova que, satisfaz a (Conf) e é confrontante em Q [x].

Na Seção 1.6, lidaremos com os dois exemplos de relações confrontantes em D demaior influência para a teoria dos domínios ordenados.

Nesta seção, consideraremos uma relação de equivalência ⌘ em D que é confron-tante em D, e, para cada x 2 D, a classe de equivalência de x em relação a ⌘ serádenotada por x.

Seja @ a relação binária no quociente D/ ⌘ dada por

A @ B :, (8x 2 A) (8y 2 B) x < y.

A proposição a seguir caracteriza a versão não estrita dessa relação.

Proposição 1.29. Se A e B forem classes de equivalência em D/ ⌘, então

(A @ B ou A = B), (9x 2 A) (9y 2 B) x 6 y.

Demonstração. A prova da parte ) da condição é imediata. Suponha que x 2 a = A,y 2 b = B, e a 6 b. Assim, temos x ⌘ a e b ⌘ y. Por (Som), temos x� a ⌘ 0, b� y ⌘ 0,e

(x� a) + (b� y) ⌘ 0 + (b� y) = b� y ⌘ 0.

Se y 6 x, então

0 6 x� y = (x� a) + (a� y) 6 (x� a) + (b� y) ⌘ 0

e por (Conf) teremos x � y ⌘ 0, resultando em A = B. Portanto, se A 6= B, então por(Lin) teremos x < y para quaisquer x 2 A e y 2 B.

Corolário 1.30. A relação @ é uma ordem em D/ ⌘.

Definição 1.31. O quociente D/ ⌘ munido da ordem @ é dito ser o conjunto ordenadoquociente de D módulo ⌘, e ele também é denotado por D/ ⌘ por abuso de linguagem.

16

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1.5 Ideais Ordenados

Constata-se na Teoria dos Anéis que qualquer ideal I no domínio subentendido emD induz sobre o quociente D/I uma estrutura de domínio. Porém, para que possamosdefinir uma estrutura canônica de domínio ordenado sobre aquele quociente, o ideal Ideve satisfazer a uma propriedade suplementar às que qualquer ideal observa.

Definição 1.32. Um subconjunto I de D é dito ser um ideal ordenado em D se I forum ideal no domínio subentendido em D tal que as condições x 2 D, y 2 I e 0 < x < y

implicam x 2 I.

Exemplo 1.33. O subconjunto {0} de D, o qual é denotado por 0, é um ideal ordenadoem D.

Exemplo 1.34. Como vimos no Corolário 1.19, o conjunto Inf (D) é um ideal em Fin (D).Se x 2 Fin (D), y 2 Inf (D), e 0 < x < y, então x será infinitesimal, pois caso contrárioexistirá um número natural n com 1 < nx < ny, contradizendo a circunstância de que y

é infinitesimal. Assim, Inf (D) é um ideal ordenado em Fin (D).

Exemplo 1.35. Se f : D ! E for um morfismo entre domínios não estritamente orde-nados, então ker (f) será um ideal ordenado em D.

Exemplo 1.36. Seja ⌘ uma relação de equivalência em D que é confrontante em D,e seja I a classe de equivalência de 0 em relação a ⌘. A estrutura de D induz sobreI uma estrutura de grupo comutativo (I,+), e para quaisquer x, y 2 D as condições0 < x < y e y 2 I implicam x 2 I. Contudo, como I não é necessariamente fechado sob amultiplicação, não pode-se afirmar que I é um ideal ordenado em D. Se para quaisquerx, y 2 D a condição x ⌘ 0 implicar na condição xy ⌘ 0, o conjunto I será um idealordenado em D. Veremos que a noção de relação de equivalência confrontante generalizaa noção de ideal ordenado (Teorema 1.37).

Nesta seção, consideraremos um ideal ordenado I em D. Como I é um ideal nodomínio subentendido em D, a relação binária ⌘ em D definida por

x ⌘ y :, x� y 2 I

é uma relação de equivalência em D. Para cada x 2 D, a classe de equivalência de x emrelação a ⌘ é igual ao conjunto x+ I, o qual será denotado por x nesta seção.

Define-se o domínio quociente de D módulo I, denotado por D/I, como sendoo conjunto

D/ ⌘ =

x...x 2 D

munido das operaçõesx+ y :

= x+ y

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e

x · y :

= x · y.

Prova-se que tais operações são bem definidas e que D/I é um domínio (33).

Teorema 1.37. A relação de equivalência ⌘ em D é confrontante em D.

Demonstração. Se x < y < z com x ⌘ z, então 0 < y� x < z� x e z� x 2 I, implicandoem y � x 2 I e z ⌘ x ⌘ y.

Seja @ a ordem do conjunto ordenado quociente de D módulo ⌘ (Corolário 1.30).

Teorema 1.38. O domínio quociente D/I é um domínio ordenado quando munido daordem @.

Demonstração. Sejam x, y, z 2 D/I. Se x @ y, então x < y, x+ z < y + z, e

x+ z = x+ z v y + z = y + z,

resultando claramente em x + z @ y + z, e provando que D/I observa (Inv). Se 0 @ x e0 @ y, então 0 < x, 0 < y, 0 < x · y, e

0 v x · y = x · y,

resultando em 0 @ x · y pois D/I não tem divisores de zero, e provando que D/I satisfaza (Pos).

Definição 1.39. O domínio quociente D/I munido da ordem @ é dito ser o domínioordenado quociente de D módulo I, e ele também é denotado por D/I porabuso de linguagem.

A demonstração do teorema a seguir será deixada para o leitor.

Teorema 1.40 (Primeiro Teorema do Isomorfismo para Domínios Não Estritamente Or-denados). Se f : D ! E for um morfismo entre domínios não estritamente ordenados,então a função g : D/ ker (f)! Im (f) dada por

g (x+ ker (f)) := f (x)

será bem definida e será um isomorfismo entre domínios ordenados.

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1.6 Mônadas e Galáxias

Como 0 é infinitesimal, como toda soma de infinitesimais é infinitesimal, e comotoda soma de finitos é finita, podemos definir duas relações de equivalência emD como segue.

Definição 1.41.

• Denotaremos por ⇠D a relação binária em D definida de modo que x ⇠D y se, esomente se, x� y for infinitesimal. Tal relação é uma relação de equivalência, e elaé chamada de relação de proximidade infinita. Quando x e y forem elementosde D tais que x ⇠D y, dizemos que x e y estão infinitamente próximos. Quandoo domínio ordenado D estiver implícito no contexto, denotaremos a relação ⇠D

simplesmente por ⇠. Para cada x 2 D, denotaremos por x a classe de equivalência10

de x em relação a ⇠, a qual é dita ser a mônada de x.

• Denotaremos por ⇡D a relação binária em D definida de modo que x ⇡D y se, esomente se, x� y for finito. Tal relação é uma relação de equivalência, e ela é cha-mada de relação de proximidade finita. Quando x e y forem elementos de D taisque x ⇡D y, dizemos que x e y estão finitamente próximos. Quando o domínioordenado D estiver implícito no contexto, denotaremos a relação ⇡D simplesmentepor ⇡. Para cada x 2 D, denotaremos por G (x) a classe de equivalência de x emrelação a ⇡, a qual é dita ser a galáxia de x.

Temos Inf (D) = 0 e Fin (D) = G (0), e se x 2 D, então teremos x = x + 0 eG (x) = x + G (0). Portanto, para caracterizar as mônadas e as galáxias em D bastadescrever os conjuntos 0 e G (0). Toda mônada é isomorfa a 0 como conjuntos ordenados,e toda galáxia é isomorfa a G (0) como conjuntos ordenados.

Em termos intuitivos, pode-se pensar em uma mônada x como um envólucro aoredor de x de comprimento pequeno e insignificante, e pode-se pensar em uma galáxiaG (x) como uma extensa região contendo x limitada apenas pela ressalva de que a distânciaentre quaisquer dois pontos nessa região deve ser finita.

Corolário 1.42.

(a) Inf (D) é um ideal ordenado em Fin (D) ;

(b) Inf (K) é um ideal maximal em Fin (K) .

Demonstração. Basta provar a maximalidade do ideal Inf (K) em Fin (K). Suponha queI é um ideal em Fin (K) que contém Inf (K) propriamente. Assim, existe um x 2 I

10 Muitos autores denotam essa classe de equivalência por µ (x). Adotarei a notação algébrica padrão.

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com x 62 Inf (K). Como 0 2 Inf (K), temos x 6= 0. Se x�1 for infinito, então x seráinfinitesimal, o que é absurdo. Portanto, temos x�1 2 Fin (K), ou seja, x é uma unidadeem Fin (K), implicando em I = Fin (K).

A letra (b) do Corolário 1.42 implica que o quociente Fin (K) /Inf (K) entre domí-nios ordenados é um corpo ordenado.

Corolário 1.43. As relações de equivalência ⇠ e ⇡ em D são confrontantes em D.

Nesta dissertação, denotaremos as respectivas ordens dos conjuntos ordenados quo-cientes D/ ⇠ e D/ ⇡ por � e /. Tais ordens são densas quando lidamos com corposordenados, como mostra a proposição a seguir.

Proposição 1.44.

(a) A relação � é uma ordem densa em K/ ⇠;

(b) A relação / é uma ordem densa em K/ ⇡.

Demonstração.

(a) Suponha que a e b são elementos de K tais que a � b. Como a 6⇠ b, existe umnúmero natural n tal que 1

2n< 1

n< b� a, e temos

a < a+1

2n< b.

Claramente, temos a 6⇠ a+ 1

2n, e se a+ 1

2n⇠ b, então

1

2n=

1

n� 1

2n< b� a� 1

2n⇠ 0,

o que é absurdo. Portanto, temos

a � a+1

2n� b.

(b) Suponha que a e b são elementos de K tais que G (a) / G (b). Como a 6⇡ b, temosn < b�a (8n 2 N), e, tomando n = 2m, temos m < (b�a)/2 (8m 2 N), ou seja, (b�a)/2

é infinito. Assim, temosa < a+

b� a

2

< b,

e claramente temos a 6⇡ a+ (b�a)/2 6⇡ b, resultando em

G (a) / G✓

a+b� a

2

/ G (b) .

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1.7 A Propriedade do Supremo

Os conceitos referidos na definição a seguir são indispensáveis para o estudodas ordens.

Definição 1.45. Sejam E ⇢ D e y 2 D.

• Dizemos que y é uma cota superior (resp. cota inferior) de E se x 6 y (resp.y 6 x) para todo x 2 E. Nesse caso, dizemos que y é o supremo ou a menor cotasuperior (resp. ínfimo ou a maior cota inferior) de E se y 6 z (resp. z 6 y)para qualquer cota superior (resp. cota inferior) z de E. Caso o supremo (resp.ínfimo) de E exista, ele é denotado por sup (E) (resp. inf (E));

• Dizemos que y é um maior elemento (resp. menor elemento) de E se y 2 E ey é uma cota superior (resp. cota inferior) de E.

Se E tiver um maior elemento (resp. menor elemento), então ele será um supremo(resp. ínfimo) de E, e se E tiver um supremo (resp. ínfimo), então ele será único.

Considere o conjunto

R :

=

x 2 D | x2 < 2

.

Tal conjunto é não nulo (pois 1 2 R) e o elemento 2 2 D é uma cota superior de R, jáque se x 2 R e 2 < x, então

4 = 2

2

= 2 · 2 < x · x = x2 < 2,

o que é absurdo, resultando em x < 2 (8x 2 R). A existência de uma cota superior deR acarreta na existência de uma menor cota superior de R? Isto é, o conjunto de todasas cotas superiores de R tem um menor elemento? A resposta é positiva para o corpoordenado dos números reais (com supR (R) =

p2), e, como veremos na Seção 1.9, essa

peculiaridade define R salvo isomorfismos entre corpos ordenados.

Definição 1.46. Dizemos que um domínio ordenado D satisfaz à Propriedade do Su-premo se todo subconjunto não nulo de D que tem uma cota superior tem um supremoem D.

Na Definição 1.46, podemos substituir os vocábulos “cota superior” e “supremo”respectivamente por “cota inferior” e “ínfimo” sem alterar a essência da definição, umavez que se y for uma cota inferior de um subconjunto E de D, então �y será uma cotasuperior do conjunto {�x ...x 2 E}.

Proposição 1.47. Se D obedecer à Propriedade do Supremo, então D será arquimediano.

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Demonstração. Suponha que D obedece à Propriedade do Supremo e é não arquimediano.Seja X o conjunto

X :

=

x 2 D... 0 6 x e x é finito

.

Como 0 2 X, tal conjunto é não nulo, e, como qualquer elemento infinito positivo de D

é uma cota superior de X, temos que D é limitado superiormente (Teorema 1.26, Letra(c)) e existe um supremo s de X em D. Se s 2 X, então s+1 2 X, o que é absurdo vistoque s < s+ 1, e se s 62 X, então s� 1 será infinito e será uma cota superior de X em D

com s � 1 < s, o que também é absurdo. Portanto, a suposição inicial da demonstraçãoé falsa.

Proposição 1.48. Se D for um subdomínio ordenado próprio de um domínio ordenadoE, e se D for denso em E, então D não obedecerá à Propriedade do Supremo.

Demonstração. Se x 2 E�D, então, como x < x+1 e como D é denso em E, o conjunto⇢

y 2 D... y < x

terá uma cota superior mas não terá um supremo em D.

Exemplo 1.49. O domínio ordenado dos números inteiros, Z, satisfaz à Propriedadedo Supremo.

Exemplo 1.50. O corpo ordenado dos números racionais, Q, não satisfaz à Propriedadedo Supremo, visto que Q é denso em R.

Exemplo 1.51. O corpo ordenado dos números reais, R, satisfaz à Propriedade do Su-premo. Para provar esse fato, deve-se trabalhar com uma construção particular de R comoas construções por sequências de Cauchy e por cortes de Dedekind. Tais construções sãodesenvolvidas com detalhe em (14). Na Seção 2.8, veremos outra maneira de definir R apartir do corpo ordenado dos números racionais, Q.

Exemplo 1.52. Se n for um número natural que não é um quadrado perfeito, então odomínio ordenado Z (

pn) (Exemplo 1.5) não obedecerá à Propriedade do Supremo, visto

que Z (

pn) é denso em R (Proposição 1.48).

Exemplo 1.53. Os domínios ordenados não arquimedianos Q [x] e R [x] (Exemplo 1.6)não obedecem à Propriedade do Supremo. Se o subconjunto Z de Z [x] tiver um supremo,então nota-se facilmente que esse supremo será positivo e terá grau 1, ou seja, tal supremoserá da forma ax + b com a, b 2 Z e a > 0 , o que é absurdo pois ax + b � 1 é uma cotasuperior de Z menor que ax+ b. Portanto, Z [x] não satisfaz à Propriedade do Supremo.

Exemplo 1.54. O corpo ordenado não arquimediano R (x) (Exemplo 1.15) não satisfazà Propriedade do Supremo.

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Exemplo 1.55. O corpo ordenado não arquimediano L (Exemplo 1.7) não satisfaz àPropriedade do Supremo.

1.8 Dedekind-Completude

O corpo ordenado dos números racionais, Q, pode ser particionado da seguinteforma. Sejam

A :

=

x 2 Q ...x < 2

eB :

=

x 2 Q... 2 6 x

.

Como A e B são conjuntos não vazios disjuntos que cobrem Q, diz-se que eles formamuma partição de Q. Além disso, tal partição preserva a ordem usual em Q, no sentido quetodo elemento de A é menor que todo elemento de B. Intuitivamente, podemos descrevertal partição como uma divisão geométrica de Q em duas metades, onde o número racional2 está exatamente no meio11 dessa divisão. Denotaremos tal partição pelo parordenado (A,B).

É fácil encontrar outros exemplos de partições de Q em duas metades. Sejam

A0:

=

x 2 Q ...x 6 0 ou x2 < 2

eB0

:

=

x 2 Q ... 0 < x e 2 < x2

.

Claramente,12 A0 e B0 são disjuntos. Como o número 2 não tem raiz quadrada racional,o quadrado de qualquer número racional x é distinto de 2, e verifica-se prontamente queA0 [ B0

= Q. Se x 2 A0, y 2 B0, e y < x, então teremos dois casos:

• Se y 6 0, então y 2 A0, o que é absurdo;

• Se 0 < y, então 0 < x e 2 < y2 < x2, resultando em 2 < x2 e x 2 B0, o queé absurdo.

Assim, a partição (A0, B0) preserva a ordem usual de Q. Neste caso, porém, não há um

número racional exatamente no ponto médio da divisão obtida pela partição considerada.11 Tecnicamente, temos 2 2 B, mas estamos ignorando esse fato por enquanto.12 Basta aplicar (Lin) e as leis de De Morgan

¬ (p _ q), (¬p) ^ (¬q) e ¬ (p ^ q), (¬p) _ (¬q) ,

onde p e q são condições, ¬ é a negação de uma condição, _ é a disjunção de condições, ^ é a conjunçãode condições, e , representa a equivalência lógica entre condições.

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Ao que parece, a partição (A0, B0) evidencia um “vácuo” existente no corpo ordenado dos

números racionais, e presumivelmente existem infinitos outros espaços vazios desse tipo.

A definição a seguir alicerça os conceitos que desenvolvemos nesses dois exemplos.

Definição 1.56. Seja D um domínio ordenado. Um par ordenado (X, Y ) é dito ser umcorte de Dedekind13 em D se:

(Part) X e Y particionam D, ou seja, são subconjuntos não nulos de D taisque X \ Y = ; e X [ Y = D;

(Ord) Para quaisquer x 2 X e y 2 Y , temos x < y;

(Mel) X não tem um maior elemento.

Nesse caso, dizemos que o par (X, Y ) é uma lacuna em D se Y não tem um menorelemento. Dizemos que D é Dedekind-completo se não existem lacunas em D.

Acontece que a Propriedade do Supremo e a ausência de lacunas são dois aspectosde uma mesma propriedade dos domínios ordenados.

Teorema 1.57. O domínio ordenado D será Dedekind-completo se, e somente se, eleobservar a Propriedade do Supremo.

Demonstração. Se D obedecer à Propriedade do Supremo, e se (X, Y ) for um corte deDedekind em D, então X será um subconjunto não nulo de D que é limitado superior-mente, resultando que X terá um supremo s em D. Nesse caso, como X não tem ummaior elemento, teremos s 2 Y , e, como todo elemento de Y é uma cota superior de X,teremos que s é o menor elemento de Y , implicando que D será Dedekind-completo.

Reciprocamente, suponha que D é Dedekind-completo, suponha que S é um sub-conjunto não nulo de D que não tem um maior elemento e é limitado superiormente, eseja X o conjunto

X :

=

x 2 D... (9s 2 S) x 6 s

.

Nota-se que X não tem um maior elemento, X é limitado superiormente, e o par ordenado(X,D �X) é um corte de Dedekind em D. Como esse corte não é uma lacuna em D,temos que a diferença D �X tem um menor elemento s, o qual claramente é o supremode S em D, provando que D satisfaz à Propriedade do Supremo.

13 O matemático Richard Dedekind (1831-1916) desenvolveu o conceito dos cortes nos números racionaisobjetivando definir o corpo ordenado dos números reais, R, a partir do corpo ordenado dos númerosracionais, Q. Por essa razão, tais cortes hoje levam o seu nome.

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Proposição 1.58. Se D for um subdomínio ordenado próprio de um domínio ordenadoE, e se D for denso em E, então D não será Dedekind-completo.

Demonstração. Seja x 2 E �D, e sejam X e Y os conjuntos

X :

=

y 2 D... y < x

;

Y :

=

y 2 D...x < y

.

Claramente, o par (X, Y ) satisfaz aos axiomas (Part) e (Ord), e a densidade de D em E

implica diretamente que X não tem um maior elemento e Y não tem um menor elemento.

Exemplo 1.59. O domínio ordenado dos números inteiros, Z, é Dedekind-completo porvacuidade, pois não existem cortes de Dedekind em Z.

Exemplo 1.60. O corpo ordenado dos números racionais, Q, não é Dedekind-completo,visto que Q é denso em R.

Exemplo 1.61. O corpo ordenado dos números reais, R, é Dedekind-completo. A de-monstração desse fato é detalhada em (14). Assim como no caso da Propriedade doSupremo, verifica-se que R é o único corpo ordenado que é Dedekind-completo, salvoisomorfismos.

Exemplo 1.62. Se n for um número natural que não é um quadrado perfeito, então odomínio ordenado Z (

pn) (Exemplo 1.5) não será Dedekind-completo, visto que Z (

pn)

é denso em R (Proposição 1.58).

Exemplo 1.63. Os domínios ordenados não arquimedianos Z [x] ,Q [x] e R [x] (Exemplo1.6) não são Dedekind-completos.

Exemplo 1.64. O corpo ordenado não arquimediano das funções racionais, R (x) (Exem-plo 1.15), não é Dedekind-completo.

Exemplo 1.65. O corpo ordenado não arquimediano das séries de Laurent, L (Exemplo1.7), não é Dedekind-completo.

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1.9 Cauchy-Completude

Considere a sequência {qn} de números racionais definida por

• q1

:

= 1;

• qn+1

= qn + 10

�n2(8n > 1) .

Os primeiros termos dessa sequência são

1; 1, 1; 1, 1001; 1, 100100001; 1, 1001000010000001; . . .

Percebe-se que os termos da sequência {qn} parecem tender a um número comparte inteira 1, com casas decimais cuja posição é um quadrado perfeito iguais a 1, e comas demais casas decimais iguais a 0. Tal número não pode ser racional pois suas casasdecimais não repetem a mesma sequência finita de dígitos incessantemente.

Prova-se por indução que o n-ésimo termo dessa sequência é dado por

qn =

nX

i=0

10

�i2(8n > 0) .

Constataremos que os termos da sequência {qn} ficam arbitrariamente próximosuns dos outros a partir de algum índice n. Seja h um número racional positivo arbitra-riamente pequeno, seja nh um número natural tal que14

10

�n2h < 9h, e sejam m e n dois

números naturais tais que nh < n < m. Mostraremos que |qm � qn| < h. Para cadak = 1, 2, . . . ,m� n, temos k 6 k2, 0 < 2nk, e

n2

h + k < n2

+ k < n2

+ 2nk + k2

= (n+ k)2

resultando em10

�(n+k)2 < 10

�(

n2h+k

)

= 10

�n2h · 10�k < 9h · 10�k.

Assim, temos

|qm � qn| =�

mX

i=0

10

�i2 �nX

i=0

10

�i2

= 10

�(n+1)

2

+ 10

�(n+2)

2

+ · · ·+ 10

�(n+(m�n))2

< 9h · 10�1

+ 9h · 10�2

+ · · ·+ 9h · 10�(m�n)

< 9h · 10

�1

1� 10

�1

= h.

14 Isso ocorre para algum número natural nh em razão den

10�n2o

ser uma sequência decrescente nocorpo ordenado R, o qual satisfaz à Propriedade do Supremo. Prova-se que o ínfimo dessa sequêncianão pode ser positivo e é o limite daquela sequência.

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Embora a sequência {qn} seja constituída inteiramente de números racionais e seaproxime de um determinado valor, ela não tende a um número racional quando n!1.Tal fato indica que os números racionais não são “completos” em um sentido peculiar re-lacionado a uma classe de sequências que têm “potencial de convergência” mas convergemapenas em uma extensão de Q.

Definição 1.66. Seja D um domínio ordenado, e seja

{xn} = x1

x2

x3

. . .

uma sequência em D.

• Para l 2 D, dizemos que l é um limite de {xn} em D se para todo h > 0 em D

existe um número natural nh tal que para todo número natural n temos

nh 6 n) |xn � l| < h.

Nesse caso, dizemos que a sequência {xn} é convergente em D, e denotamos oelemento l 2 D por lim xn;

• Dizemos {xn} é uma sequência de Cauchy em D se para todo h > 0 em D existeum número natural nh tal que para quaisquer números naturais m e n temos

m,n > nh ) |xm � xn| < h;

• Dizemos que D é Cauchy-completo se toda sequência de Cauchy em D é conver-gente em D.

Se l e l0 forem limites da sequência {xn} em D, então teremos l = l0. Isso ocorrepois se h for um elemento positivo em D, então existirão números naturais nh/2 e n0

h/2 taisque |xn � l| < h/2 e |xn0 � l0| < h/2 para quaisquer n > nh/2 e n0 > n0

h/2. Nesse caso, se

n > max

n

nh/2, n0h/2

o

, então teremos

|l � l0| = |(l � xn) + (xn � l0)|6 |l � xn|+ |xn � l0|

<h

2

+

h

2

= h,

e, como h é arbitrário, teremos l = l0.

Proposição 1.67. Se D for um subdomínio ordenado próprio de um domínio ordenadoarquimediano E, se D for denso em E, e se todo número natural for inversível em E,então D não será Cauchy-completo.

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Demonstração. Seja l 2 E �D. Como o domínio ordenado D é denso em E, para cadanúmero natural n existe um xn 2 D tal que |xn � l| < 1/2n. Como E é arquimediano,temos xn ! l quando n!1, visto que todo elemento positivo de E é maior que algumnúmero racional da forma 1/2n para algum número natural n suficientemente grande. Seh for um elemento positivo de D, então existirá um número natural nh com 1/nh < h, e sealém disso m e n forem números naturais maiores que nh, então teremos

|xm � xn| 6 |xm � l|+ |l � xn|

<1

2m+

1

2n

<1

2nh

+

1

2nh

=

1

nh

< h,

provando que {xn} é uma sequência de Cauchy.

Exemplo 1.68. O domínio ordenado dos números inteiros, Z, é Cauchy-completo. Defato, toda sequência de Cauchy em Z é eventualmente constante.

Exemplo 1.69. Como vimos, {qn} é uma sequência de Cauchy que não é convergenteem Q. Portanto, o corpo ordenado Q não é Cauchy-completo, e, como Q é um domínioordenado imerso em Q [x], temos que Q [x] não é Cauchy-completo.

Exemplo 1.70. O corpo ordenado dos números reais, R, é Cauchy-completo. Tal fato éprovado em (14).

Exemplo 1.71. Se n for um número natural que não é um quadrado perfeito, então odomínio ordenado Z (

pn) (Exemplo 1.5) não será Cauchy-completo, visto que Z (

pn) é

denso em R e que todo número natural é inversível em R (Proposição 1.67).

Exemplo 1.72. Seja

(

qnX

i=0

cn,ixi

)

uma sequência arbitrária em R [x] (Exemplo 1.6).

Suponha que essa sequência é de Cauchy. Assim, para todo h > 0 em R [x] existe umnúmero natural nh tal que para quaisquer números naturais m e n temos

m,n > nh )�

qmX

i=0

cm,ixi �

qnX

i=0

cn,ixi

< h.

Em particular, se h for um número real positivo e m,n > nh, então os polinômiosqmX

i=0

cm,ixi

eqnX

i=0

cn,ixi terão o mesmo grau e diferirão apenas no coeficiente da potência x0, ou seja,

teremos qm = qn, cm,i = cn,i�

8i 2 [1, qm]N0

, e |cm,0 � cn,0| < h. Seja q o valor constante

28

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que a sequência {qn}n2N eventualmente assume, e, para cada número natural i

com 1 6 i 6 q, seja ci o valor constante que a sequência {cn,i}n2N eventualmente assume.A sequência {cn,0}n2N é de Cauchy em R, e, como R é Cauchy-completo, tal sequênciaconverge para um número real c

0

. Prova-se diretamente que(

qnX

i=0

cn,ixi

)

!(

qX

i=0

cixi

)

quando n ! 1. Portanto, R [x] é Cauchy-completo. Uma demonstração semelhantemostra que Z [x] é Cauchy-completo.

Exemplo 1.73. Considere a sequência {an (x)} em R (x) (Exemplo 1.15) dada por

an (x) :=1

xn·n�1

X

i=0

xi=

nX

i=1

1

xi

para n > 1, a qual tem seus primeiros termos iguais a

1

x,x+ 1

x2

,x2

+ x+ 1

x3

,x3

+ x2

+ x+ 1

x4

,x4

+ x3

+ x2

+ x+ 1

x5

, . . .

Seja u(x)/v(x) > 0 em R (x), com u (x) =kX

i=0

gixi, gk 6= 0, v (x) =

lX

i=0

hixi, e hl = 1. Se m

e n forem números naturais tais que l � k � 1 < n < m, então

(m� n� 1) + l < m+ k,

resultando em

|am (x)� an (x)| =mX

i=1

1

xi�

nX

i=1

1

xi

=

mX

i=n+1

1

xi

=

1

xn·m�nX

i=1

1

xi

=

1

xn· 1

xm�n·m�n�1

X

i=0

xi

=

1 + x+ x2

+ · · ·+ xm�n�1

xm

<u (x)

v (x),

e provando que {an (x)} é uma sequência de Cauchy.

Provaremos que a sequência {an (x)} não é convergente. Suponha que p(x)/q(x)

é o limite dessa sequência em R (x), com p (x) =

rX

i=1

cixi, cr 6= 0, q (x) =

sX

i=1

dixi, e

29

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ds = 1. Como {an (x)} é crescente, a fração p(x)/q(x) é o supremo dessa sequência, e temos1/x < p(x)/q(x), resultando em 0 < x · p (x) � q (x) e s 6 r + 1. O cenário s 6 r pode serfacilmente descartado visto que nesse caso teríamos cr/2 < p(x)/q(x), contradizendo o fatode que p(x)/q(x) é o supremo da sequência {an (x)}. Portanto, temos s = r + 1, e, como0 < x · p (x)� q (x), temos 1 < cr. Nota-se que a

1

(x) < (x+2)/x2 < p(x)/q(x), e temos

an (x) =1

x+

1

x2

+

1

x3

+ · · ·+ 1

xn

<1

x+

1

x2

+

n�2 vezesz }| {

1

(n� 2) x2

+

1

(n� 2) x2

+ · · ·+ 1

(n� 2) x2

=

x+ 2

x2

para todo n > 1, ou seja, (x+2)/x2 é uma cota superior da sequência {an (x)}, o que é ab-surdo pois p(x)/q(x) é o supremo dessa sequência. Provamos que {an (x)} não é convergente,e o corpo ordenado R (x) não é Cauchy-completo.

Exemplo 1.74. Seja

( 1X

i=pn

cn,ixi

)

uma sequência arbitrária em L (Exemplo 1.7). Supo-

nha que essa sequência é de Cauchy. Isso significa que para todo h (x) > 0 em L existeum número natural nh tal que

1X

i=pu

cu,ixi �

1X

i=pv

cv,ixi

< h (x)

para quaisquer u e v maiores ou iguais a nh. Em particular, para cada número inteiro k

existe um número natural nk tal que�

1X

i=pu

cu,ixi �

1X

i=pv

cv,ixi

< xk

para quaisquer números naturais u e v maiores ou iguais a nk.

Se i < min {pn0 , 0}, então cn0,i = 0, e, como�

1X

i=pu

cu,ixi �

1X

i=pn0

cn0,ixi

< x0

= 1 (8u > n0

) ,

temos cu,i = 0 (8u > n0

). Definindo p :

= min {pn0 , 0}, temos

cu,i = 0 (8u > n0

) (8i < p) .

Em particular, para cada número inteiro i < p a sequência {cn,i}n>1

eventualmenteestabiliza-se no valor 0.

30

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Seja k um número inteiro qualquer, e sejam u e v dois números naturais maiores ouiguais a nk. Por indução sobre i, prova-se diretamente que cu,i � cv,i = 0 (8i < k). Comok é arbitrário, temos que para cada número inteiro i a sequência {cn,i}n>1

eventualmenteestabiliza-se em um número real ri para todo n maior ou igual a um número natural Ni,ou seja, cn,i = ri (8n > Ni). Pelo parágrafo anterior, temos rn = 0 (8n < p) e {rn} 2 L.

Mostraremos que1X

i=pn

cn,ixi !

1X

i=p

rixi quando n ! 1. Seja h (x) :=

1X

i=a

eixi em

L com 0 < ea, e seja

nh :

= max

n0

, Nmin{p,a}, Nmin{p,a}+1

, . . . , Nmax{p,a}

.

Assim, se n for um número natural com nh 6 n, então cn,i = ri (8i 6 max {p, a}),e teremos

1X

i=pn

cn,ixi �

1X

i=p

rixi

=

1X

i=max{p,a}+1

(cn,i � ri) · xi

< h (x) ,

provando que a sequência

( 1X

i=pn

cn,ixi

)

é convergente e o corpo ordenado L é

Cauchy-completo.

Na Seção 5.6 veremos um exemplo de um corpo ordenado tal que toda sequênciade Cauchy é eventualmente constante, e, por conseguinte, tal corpo ordenado éCauchy-completo.

O teorema a seguir tem importância substancial para a teoria dos corpos ordena-dos, e sua demonstração pode ser encontrada em (14). Além de estabelecer um vínculoentre os principais conceitos vistos neste capítulo, ele revela a singularidade do corpoordenado dos números reais.

Teorema 1.75. Seja K um corpo ordenado. As seguintes condições são equivalentes:

• K é arquimediano e Cauchy-completo;

• K satisfaz à Propriedade do Supremo;

• K é Dedekind-completo.

De fato, o corpo ordenado dos números reais, R, é o único corpo ordenado que satisfaz àscondições equivalentes mencionadas, salvo isomorfismos.

Sintetizando o que vimos até este ponto, podemos agrupar os domínios e corposordenados em quatro classes:

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Tabela 2 – Classificação dos domínios ordenados

Cauchy-incompleto Cauchy-completoNão arquimediano R (x) ,Q [x] Z [x] ,R [x] ,L

Arquimediano Q, Z (

pn) Z,R

Tabela 3 – Classificação dos corpos ordenados

Cauchy-incompleto Cauchy-completoNão arquimediano R (x) L

Arquimediano Q R apenas, salvo isomorfismos

1.10 Domínios Ordenados que Estendem RNesta seção, considere que existe uma imersão R ! D (Definição A.42) entre

domínios ordenados. Assim, podemos identificar os elementos da imagem dessa imersãocom os números reais, e, por abuso de linguagem, podemos escrever R ⇢ D. Todo númeroreal é finito em D.

Exemplo 1.76. O domínio ordenado R [x] (Exemplo 1.6) é uma extensão de R.

Exemplo 1.77. O corpo ordenado das funções racionais, R (x) (Exemplo 1.15), é umaextensão de R.

Exemplo 1.78. O corpo ordenado das séries de Laurent, L (Exemplo 1.7), é uma extensãode R.

Proposição 1.79. O número zero é o único infinitesimal real em D.

Demonstração. Seja r um infinitesimal real em D. Se r 6= 0, então |r| 6= 0, e, como R éum corpo ordenado arquimediano, existirá um número natural n tal que 1 6 n |r|, o queé absurdo pois r é infinitesimal.

Teorema 1.80. Se x for um elemento finito de D, então existirá um único número realr tal que x ⇠ r.

Demonstração. Como x é finito, o conjunto

A :

=

y 2 R ... y < x

é limitado superiormente em R. Seja r :

= supR (A). Provaremos que x ⇠ r, e para issobasta mostrar que |r � x| 6 h para todo número real positivo h. Seja h um número dessetipo. Se r < x� h, então r + h < x, r + h 2 A, e r + h 6 r, o que é absurdo pois 0 < h.

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Se x + h < r, então x < r � h e r � h é uma cota superior de A em R, o que é absurdopois 0 < h e r � h < r = supR (A). Portanto, temos

x� h 6 r 6 x+ h,

ou seja, |r � x| < h, mostrando que x ⇠ r. A unicidade de r é uma consequência imediatada Proposição 1.79 e da transitividade da relação de equivalência ⇠.

Todo elemento finito x de D pode ser escrito na forma st (x) + e, onde e é uminfinitesimal unicamente determinado por x.

Definição 1.81. A função parte standard associada a D, stD : Fin (D)! R, é a funçãoque associa cada elemento finito x em D ao único número real stD (x) tal que x ⇠ stD (x).Denotaremos tal função simplesmente por st quando o domínio ordenado D em questãoestiver implícito no contexto.

Temos Im (st) = R e ker (st) = Inf (D).

Proposição 1.82. A função st : Fin (D) ! R é um morfismo entre domínios não es-tritamente ordenados. Ou seja, as seguintes condições são observadas para quaisquerx, y 2 Fin (D):

(a) st (1) = 1;

(b) st (x+ y) = st (x) + st (y) ;

(c) st (x · y) = st (x) · st (y) ;

(d) Se x 6 y, então st (x) 6 st (y).

Demonstração. As letras (a), (b) e (c) são consequências imediatas do Teorema 1.18.

(d) Provaremos primeiro que para z finito em D vale a implicação 0 6 z ) 0 6 st (z).Seja z 2 Fin (D), e seja e o infinitesimal em D tal que z = st (z) + e. Se st (z) < 0,então |st (z)| não será infinitesimal (Proposição 1.79) e teremos

|e| < |st (z)| = �st (z) ,

ou seja, st (z) < e < �st (z), resultando em 0 < �st (z) � e = �z e z < 0, eprovando a implicação desejada. Se x 6 y, com x e y finitos, então 0 6 y � x e

0 6 st (y � x) = st (y)� st (x) .

O Primeiro Teorema do Isomorfismo (Teorema 1.40) implica que o domínio orde-nado quociente Fin (D) /Inf (D) é isomorfo a R.

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1.11 Análise Diferencial e Integral em Extensões de RA Análise Real é repleta de resultados amplamente aplicáveis a diversas áreas do

conhecimento, como a Física e as Engenharias. A ampla aplicabilidade dos números reaisdecorre em razão de eles modelarem satisfatoriamente a intuição que temos das grandezascontínuas como as distâncias e o tempo. De fato, é possível argumentar que nenhumoutro objeto matemático foi tão útil e benéfico ao desenvolvimento teórico-científico comoo conjunto R.

Porém, tal corpo ordenado é arquimediano. Isso significa que ele não contémquantidades infinitesimais e infinitas, as quais são bastante úteis na exploração de novosconceitos e resultados na Ciência e na Matemática. Essa aparente imperfeição levoumuitos a questionarem a possibilidade de substituir o conjunto dos números reais poruma extensão deste a um corpo ordenado não arquimediano que ainda goze de muitasdas qualidades que os números reais possuem.

É desejável que o desenvolvimento de uma teoria acerca de um substituto de Rcontenha resultados precisos, notáveis e utilitários sobre a convergência de séries de potên-cias, as expansões de funções diferenciáveis em séries de Taylor e as equações diferenciáisordinárias e parciais, entre outros temas. Ademais, versões renovadas de teoremas intui-tivos relacionados à noção de continuidade, como o Teorema do Valor Intermediário, oTeorema do Valor Médio e o Teorema Fundamental do Cálculo, são indispensáveis paraa teoria de um sistema numérico que seja proposto para sobrepor os números reais. Duasconstruções não arquimedianas apresentadas que cumprem essas demandas são os corposde números surreais (16, 24, 31) e o corpo de Levi-Civita (48, 49). Construído medianteuma variedade de métodos da área conhecida como Análise Não Standard, o corpo or-denado dos números hiper-reais, o qual é denotado por ⇤R, é um sistema numérico nãoarquimediano que satisfaz a todas as propriedades desejáveis para uma extensãode R. A edificação da Análise Hiper-real como uma proposta persuasiva de substituiçãode R por ⇤R está fora do escorpo deste trabalho, e pode ser encontrada em (43, 45, 50).

No Capítulo 2, estabeleceremos de modo informal os princípios que regem o com-portamento e a aplicabilidade dos números hiper-reais. Veremos que o resultado conhe-cido como Princípio da Transferência permite que determinações sejam bilateralmentetransferidas entre os sistemas dos números reais e dos números hiper-reais. Essa peculia-ridade viabiliza um procedimento proveitoso que permite que vários resultados da AnáliseReal sejam provados de maneira mais espontânea, direta e intuitiva.

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2Visão Ingênua dos Números Hiper-reais

2.1 Os Números Hiper-reais

Neste capítulo trataremos informalmente de um corpo ordenado não arquimedianodenotado por ⇤R cujos elementos são ditos serem números hiper-reais. A construçãoformal dessa estrutura será mostrada apenas nos Capítulos 3 e 5, e aqui abordaremosapenas as propriedades de ⇤R que o tornam úteis para o estudo da Análise Real.

O que faz ⇤R ser especial e incomum em relação a qualquer outra extensão nãoarquimediana de R, como R (x) e L? Como veremos, há um vínculo essencial entre osnúmeros reais e hiper-reais, o qual permite que vários resultados fundamentais do CálculoDiferencial e Integral em R sejam provados de maneira direta e intuitiva, aproximando-sedo caráter das demonstrações originais de Leibniz e Euler nos séculos XVII e XVIII.

Exploraremos os princípios que regem a conexão entre R e ⇤R, e enunciaremosnovas interpretações para as noções básicas do Cálculo.

2.2 Objetos Relacionados a R e ⇤RQuais objetos matemáticos são potencialmente relevantes ao estudo da Análise

Real? Os números reais e o conjunto R são certamente relevantes nessa área, e incontáveisexemplos mostram que vários outros objetos e conjuntos podem ser considerados nosresultados da teoria. Intervalos em R são citados no Teorema de Heine-Borel; uniõesde sequências crescentes de conjuntos abertos em Rn são importantes em critérios deintegrabilidade; produtos cartesianos finitos são usados para definir funções reais de maisde uma variável; e o conjunto das partes de N é citado em resultados que envolvem ocardinal de R. É admissível assumir que a coleção dos conjuntos pertinentes na AnáliseReal é fechado sob algumas operações básicas da Teoria dos Conjuntos. A definição aseguir é uma tentativa de formalizar essa ideia.

Definição 2.1 (Objetos Relacionados a R e ⇤R - Versão Ingênua).

(a) Dizemos que os números reais são átomos relacionados a R ou R-átomos;

(b) Definiremos o conceito dos conjuntos relacionados a R ou R-conjuntos induti-vamente de modo que:

1. R é um R-conjunto;

2. Todo subconjunto de um R-conjunto é um R-conjunto;

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3. Se A for um R-conjunto, então P (A) será um R-conjunto;

4. Toda união de R-conjuntos é um R-conjunto.

(c) Dizemos que um objeto matemático é um objeto relacionado a R ou R-objetose ele pertence a algum conjunto relacionado a R.

Definimos os conceitos de átomo, conjunto e objeto relacionado a ⇤R demodo análogo.

Nos Capítulos 4 e 5, veremos que, para os propósitos desta dissertação, será ne-cessário restringir a propriedade 4 de modo que apenas algumas uniões específicas deR-conjuntos necessariamente serão R-conjuntos (Teorema 4.8, Letra (d)).

O leitor familiarizado com a Teoria dos Conjuntos perceberá que a classe dosobjetos relacionados a R (resp. ⇤R) será igual ao universo de von Neumann (ExemploB.8), o qual é dado por (Seção B.5)

V =

x...x = x

=

[

�2On

V�.

Portanto, a investida para definir os objetos relacionados a R, representada pelaDefinição 2.1, excede severamente a meta de identificar os objetos matemáticos que sãopertinentes à investigação da Análise Real. Esse quesito será ignorado neste capítulo,sendo propriamente ponderado apenas no Capítulo 4.

Será importante para a discussão subsequente que nenhum átomo relacionado aR (resp. ⇤R) tenha um objeto relacionado a R (resp. ⇤R) como elemento. Na Seção 5.1,veremos como obter uma cópia de R tal que esse requisito seja cumprido.

Proposição 2.2.

(a) Se a e b forem R-objetos, então {a, b} será um R-conjunto;

(b) Se a e b forem R-objetos, então (a, b) será um R-conjunto;

(c) Se A e B forem R-conjuntos, então A⇥ B será um R-conjunto.

Tais afirmações são verdadeiras ao trocarmos R por ⇤R.

Demonstração.

(a) Se A e B forem R-conjuntos tais que a 2 A e b 2 B, então A[B será um R-conjunto,e, como {a, b} ⇢ A [ B, teremos que {a, b} será um R-conjunto.

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A letra (b) é consequência imediata da (a).

(c) Se a 2 A e b 2 B, então, pelas letras (a) e (b), teremos que (a, b) e {(a, b)} sãoR-conjuntos, implicando que a união

A⇥ B =

[

a2A,b2B

{(a, b)}

será um R-conjunto.

As provas dessas afirmações são análogas ao trocarmos R por ⇤R.

Em geral, assumiremos que o leitor tem a mestria para demonstrar que um objetomatemático é relacionado a R ou ⇤R, e nos pouparemos desse tipo de incumbêncianeste trabalho.

2.3 Condições com Quantificadores Limitados

Neste capítulo, quando nos referirmos informalmente a uma condição matemática� (x

1

. . . xn), estaremos assumindo que ela observa aos seguintes requisitos:

• Toda variável livre que aparece em � pertence à lista de variáveis x1

. . . xn. As variá-veis ligadas em � podem ser quaisquer variáveis que não estejam na lista x

1

. . . xn;

• � é completamente descrita por símbolos basilares da Teoria dos Conjuntos, os quaissão:

– Objetos matemáticos fixos, como 2, ⇡,C, 1/3,!1

;

– Os símbolos lógicos: ¬,_,^,),,,=, 6=;

– Os quantificadores (prefixais): 9, 9!, 8;

– Os delimitadores: ), (, ], [, }, {;

– A relação de pertinência: 2;

– A notação de par ordenado: (x, y) representa o par ordenado cuja primeiracoordenada é x e cuja segunda coordenada é y;

– A notação de aplicação funcional prefixal: x (y) representa a imagem de umobjeto y sobre a função x;

– A notação de aplicação funcional infixal: xyz representa a imagem do parordenado cujas respectivas primeira e segunda coordenadas são x e z sobre alei de composição y;

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– A notação de vinculação relacional infixal: xyz representa que o par ordenadocujas respectivas primeira e segunda coordenadas são x e z pertence à relaçãobinária y.

• Cada ocorrência do quantificador existencial 9x (lê-se “existe um x”) e do quan-tificador universal 8x (lê-se “para todo x”) em � está semanticamente limitada aum universo delimitado, de modo que tais quantificadores aparecem nessa condiçãoapenas nas formas 8x 2 y e 9x 2 y, onde y pode ser uma variável (livre ou ligada)ou um objeto matemático fixo.

Se pelo menos uma variável da lista x1

. . . xn aparece livre em �, então dizemos que � éaberta, e caso contrário dizemos que � é fechada. Se � é aberta e nenhum objeto ma-temático fixo aparece em �, então dizemos que � é completamente aberta. Condiçõesfechadas ou são verdadeiras ou são falsas. Se todo objeto matemático fixo que apareceem � é um objeto relacionado a R (resp. ⇤R), então dizemos que � é uma condiçãorelacionada a R (resp. ⇤R) ou uma R-condição (resp. ⇤R-condição).

2.4 ⇤-Transformações e o Princípio da Transferência

O teorema a seguir é a principal ferramenta desta dissertação, e ele é utilizadosistematicamente em todo o estudo da Análise Não Standard. Desenvolveremos duasmaneiras distintas de prová-lo nos Capítulos 3 e 5, onde o enunciaremos de maneiras maisprecisas e gerais.

Teorema 2.3 (⇤-Transformações de Objetos - Versão Ingênua). Existe uma função inje-tora ⇤ tal que:

(a) O domínio de ⇤ é o conjunto dos R-objetos;

(b) O contradomínio de ⇤ é o conjunto dos ⇤R-objetos;

(c) ⇤ (x) = x (8x 2 R);

(d) ⇤ (R) = ⇤R;

(e) Se A for um R-conjunto, então ⇤ hAi ⇢ ⇤ (A), e se além disso A for infinito, então⇤ hAi ( ⇤ (A). Em particular, N ( ⇤ (N) e R ( ⇤ (R);

(f) (Princípio da Transferência; PT) Seja � (x1

. . . xn) uma condição completamente aberta,e seja a

1

. . . an uma sequência de R-objetos. A condição fechada � (a1

. . . an) seráverdadeira se, e somente se, a condição fechada � (⇤ (a

1

) · · · ⇤ (an)) for verdadeira.

38

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Tal função ⇤ é dita ser um monomorfismo não standard.

A letra (f) do Teorema 2.3, conhecida como Princípio da Transferência (PT),estabelece um elo lógico entre as propriedades dos R-objetos e as propriedadesdos ⇤R-objetos.

A condição fechada � (⇤ (a1

) · · · ⇤ (an)) relacionada a ⇤R, mencionada no enunciadodo PT, é dita ser a ⇤-transformação da condição fechada � (a

1

. . . an).

Notação 2.4. Se a for um R-objeto, então a ⇤-transformação de a, dada por ⇤ (a), serádenotada por ⇤a.

Corolário 2.5 (Propriedades de ⇤ - Versão Ingênua). Sejam a e b dois R-objetos, e sejamA e B dois R-conjuntos. Temos:

(a) ⇤ hAi ⇢ ⇤A;

(b) a = b, ⇤a =

⇤b;

(c) a 2 A, ⇤a 2 ⇤A;

(d) A ⇢ B , ⇤A ⇢ ⇤B;

(e) ⇤; = ;.

Demonstração. A letra (a) é consequência evidente da letra (e) do Teorema 2.3, e a letra(b) é uma releitura da injetividade da função ⇤. Os resultados das letras (c) , (d) e (e)

seguem ao aplicarmos o Princípio da Transferência às respectivas condições fechadas dadaspor a 2 A, (8x 2 A) (x 2 B) e (8x 2 ;) (x 6= x).

2.5 Objetos Standard e Não Standard

A função ⇤ não é sobrejetora, ou seja, existem ⇤R-objetos quenão são ⇤-transformações de algum R-objeto. Considere, a título de exemplo, o conjunto⇤A � ⇤ hAi, onde A é um R-conjunto infinito qualquer, o qual é não nulo pela letra (e)

do Teorema 2.3. Seja x 2 ⇤A � ⇤ hAi. Se existir um R-objeto y tal que x =

⇤y, entãoteremos ⇤y 2 ⇤A e y 2 A pela letra (c) do Corolário 2.5, resultando em x =

⇤y 2 ⇤ hAi, oque é absurdo. Portanto, x não está na imagem da função ⇤.

Definição 2.6. Dizemos que um ⇤R-objeto é standard se ele está na imagem dafunção ⇤. Caso contrário, dizemos que ele é não standard.

Exemplo 2.7. Como vimos, se A for um R-conjunto (finito ou infinito), então ⇤A�⇤ hAiserá o conjunto dos elementos não standard de ⇤A. Nesse caso, se A for infinito, então ⇤A

terá pelo menos um elemento não standard.

Exemplo 2.8. Seja � (x1

. . . xn) uma condição completamente aberta, e seja a1

. . . an umasequência de R-objetos. Todo objeto matemático fixo que aparece na condição fechada

39

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� (⇤a1

. . . ⇤an) é standard. Portanto, ao aplicarmos o PT nenhum objeto não standardpode aparecer na ⇤R-condição fechada envolvida.

Teorema 2.9 (Princípio da Definição Standard; PDS - Versão Ingênua). Seja

� (x1

. . . xn, y1 . . . yp)

uma condição completamente aberta, seja R um R-conjunto que é uma relação n-ária, esejam a

1

. . . ap R-objetos. Sejam

C :

=

(t1

. . . tn) 2 R...� (t

1

. . . tn, a1 . . . ap) é verdadeira�

eD :

=

(t1

. . . tn) 2 ⇤R...� (t

1

. . . tn,⇤a

1

. . . ⇤ap) é verdadeira�

.

Temos ⇤C = D.

Demonstração. Como C ⇢ R, temos ⇤C ⇢ ⇤R. Nesta seção, provaremos apenas o cason = 1, e o caso geral é uma consequência imediata de um princípio geral que veremos naSeção 4.4. A condição fechada

(8x 2 R) (x 2 C , � (x, a1

. . . ap))

é verdadeira pela definição de C, e pelo PT temos que a condição fechada

(8x 2 ⇤R) (x 2 ⇤C , � (x, ⇤a1

. . . ⇤ap))

também é verdadeira.

Exemplo 2.10. Considere um intervalo [a, b]R entre dois números reais a e b com a 6 b,o qual é definido por

[a, b]R :

=

x 2 R ... a 6 x 6 b

.

Pelo PDS, a ⇤-transformação desse intervalo é dada por

⇤[a, b]R =

x 2 ⇤R ... ⇤a ⇤ 6 x ⇤ 6 ⇤b

=

x 2 ⇤R ... a ⇤ 6 x ⇤ 6 b

.

Corolário 2.11.

(a) ⇤N =

x 2 ⇤Z ... 0 ⇤ < x

;

(b) ⇤Z =

x 2 ⇤Q ...x 2 ⇤N ou (�1) ⇤ · x 2 ⇤N�

;

(c) ⇤Q =

x 2 ⇤R ... (9p, q 2 ⇤Z) (q 6= 0 e x = ⇤ ÷ (p, q))

.

40

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2.6 Propriedades Conjuntistas de ⇤A função ⇤ preserva algumas operações básicas da Teoria dos Conjuntos.

Teorema 2.12 (Propriedades Conjuntistas de ⇤ - Versão Ingênua). Sejam a e b doisR-objetos, e sejam A e B dois R-conjuntos. Temos:

(a) ⇤ {a, b} = {⇤a, ⇤b} ;

(b) ⇤(a, b) = (

⇤a, ⇤b) ;

(c) ⇤(A [ B) =

⇤A [ ⇤B;

(d) ⇤(A \B) =

⇤A \ ⇤B;

(e) ⇤(A� B) =

⇤A� ⇤B;

(f) ⇤(A⇥ B) =

⇤A⇥ ⇤B;

Demonstração. Sejam �1

. . .�5

as seguintes condições completamente abertas:

• �1

(x, y1

, y2

)

:

= x = y1

_ x = y2

;

• �2

(x, U, V )

:

= x 2 U _ x 2 V ;

• �3

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 2 V ;

• �4

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 62 V ;

• �5

(x1

, x2

, U, V )

:

= x1

2 U ^ x2

2 V,

e seja R um R-conjunto que contém os conjuntos {a, b}, A [ B, A \ B, A� B e A⇥ B.Os resultados das letras (a) , (c) , (d) , (e) e (f) seguem ao aplicarmos o PDS às condições�1

,�2

,�3

,�4

e �5

, respectivamente. A letra (b) é consequência imediata da (a).

Pela letra (e) do Teorema 2.3, temos que se A for um R-conjunto infinito, entãoteremos ⇤ hAi ( ⇤A. A recíproca desse fato também é válida.

Teorema 2.13. Para todo R-conjunto A, teremos ⇤ hAi ( ⇤A se, e somente se,A for infinito.

Demonstração. Basta provar a condição necessária. Se A for finito, então ele poderá serescrito na forma A = {x

1

. . . xn}, onde x1

. . . xn são R-objetos. Nesse caso, pelo Teorema2.12, teremos ⇤A = {⇤x

1

. . . ⇤xn} = ⇤ hAi.

Pelo Exemplo 2.7, o Teorema 2.13 pode ser reescrito com as seguintes palavras:⇤A terá elementos não standard se, e somente se, A for infinito.

A função ⇤ preserva algumas noções básicas referentes às relações e funções.

Teorema 2.14 (⇤-Transformações de Relações e Funções - Versão Ingênua). Sejam A,B

e C três R-conjuntos. Se R ⇢ A⇥ B e S ⇢ C ⇥ A, então teremos:

(a) ⇤R ⇢ ⇤A⇥ ⇤B;

(b) dom (

⇤R) =

⇤(dom (R)) ;

(c) Im (

⇤R) =

⇤(Im (R)) ;

41

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(d) ⇤R h⇤Di = ⇤(R hDi) (8D ⇢ dom (R)) ;

(e) (

⇤R)

�1

=

⇤(R�1

) ;

(f) ⇤R � ⇤S =

⇤(R � S) .

Em particular, se f : A! B, então teremos:

(g) ⇤f :

⇤A! ⇤B;

(h) ⇤f (

⇤x) = ⇤(f (x)) (8x 2 A) ;

(i) ⇤f será injetora se, e somente se, f

for injetora;

(j) ⇤f será sobrejetora se, e somente se, ffor sobrejetora.

Demonstração. A letra (a) é consequência da letra (d) do Corolário 2.5 e da letra (f) doTeorema 2.12. Seja M um R-conjunto que contém os conjuntos dom (R), Im (R), R hDi,R�1 e R � S, e sejam �

1

. . .�5

as seguintes condições completamente abertas:

• �1

(x, U, T ) := (9y 2 T ) (x, y) 2 U ;

• �2

(x, U, T ) := (9y 2 T ) (y, x) 2 U ;

• �3

(x, U, V )

:

= (9y 2 V ) (y, x) 2 U ;

• �4

(x1

, x2

, U)

:

= (x2

, x1

) 2 U ;

• �5

(x1

, x2

, U, V, T ) := (9y 2 T ) ((x1

, y) 2 S ^ (y, x2

) 2 R) .

Pela letra (d) do Corolário 2.5, as ⇤-transformações dos conjuntos dom (R), Im (R), R hDi,R�1 e R �S estão contidas em ⇤M . Os resultados das letras (b), (c), (d), (e) e (f) seguemao aplicarmos o PDS às condições �

1

, �2

, �3

, �4

e �5

, respectivamente, onde a variável Tdeve ser substituída pelo conjunto M .

Sejam �6

,�7

e �8

as seguintes condições completamente abertas:

• �6

(U, P,Q)

:

= (8x 2 P ) (9!y 2 Q) y = U (x) ;

• �7

(U, P,Q)

:

= (8x 2 P ) (8y 2 Q) (U (x) = U (y)) x = y) ;

• �8

(U, P,Q)

:

= (8y 2 Q) (9x 2 P ) y = U (x) .

Os resultados das letras (g) , (i) e (j) seguem ao aplicarmos o PT às condições �6

,�7

e �8

,respectivamente, onde a variável U deve ser substituída pela função f , a variável P deveser substituída pelo conjunto A, e a variável Q deve ser substituída pelo conjunto B.

Se x 2 A, então (x, f (x)) 2 f , resultando em (

⇤x, ⇤ (f (x))) 2 ⇤f , eprovando (h).

42

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2.7 Domínios e Corpos Ordenados Relacionados a ⇤RAs classes de estruturas dos domínios ordenados e dos corpos ordenados

são fechadas sob ⇤-transformações, uma vez que tais classes são axiomatizáveis na lógicade primeira ordem.

Teorema 2.15.

(a) Se D for um domínio ordenado relacionado a R, então ⇤D será um domínio ordenadoquando munido das ⇤-transformações da adição, da multiplicação e da ordem de D;

(b) Se K for um corpo ordenado relacionado a R, então ⇤K será um corpo ordenadoquando munido das ⇤-transformações da adição, da multiplicação e da ordem de K.

Demonstração.

(a) Os axiomas 1-15 (Seção 1.1) se tornam condições fechadas quando substituímoscada ocorrência dos quantificadores (8x) e (9x) por (8x 2 D) e (9x 2 D), respecti-vamente. O resultado segue pelo PT.

(b) O axioma (InvM) (Seção 1.2) se torna uma condição fechada quando substituímoscada ocorrência dos quantificadores (8x) e (9x) por (8x 2 K) e (9x 2 K), respecti-vamente. O resultado segue pelo PT.

Em particular, o conjunto ⇤R é um corpo ordenado quando munido das⇤-transformações da adição, da multiplicação e da ordem de R. O vínculo entre R e ⇤Restabelecido pelo Princípio da Transferência faz com que o corpo ordenado dos númeroshiper-reais se sobressaia às extensões de R que vimos no Capítulo 1, visto que ele simplificaconsideravelmente as demonstrações de vários resultados importantes acerca de R e ⇤R.

Exemplo 2.16. Seja D um domínio ordenado e seja K um corpo ordenado, ambosrelacionados a R, e considere as funções f : D ! D e g : K � {0} ! K dadas porf (x) := �x e g (x) := x�1. As condições

(8x 2 D) x+ f (x) = 0

e(8x 2 K � {0}) x · g (x) = 1

são verdadeiras, e, pelo PT, temos que as condições

(8x 2 ⇤D) x ⇤+

⇤f (x) = 0

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e(8x 2 ⇤K � {0}) x ⇤ · ⇤g (x) = 1

também são verdadeiras. Assim, considerando o domínio ordenado (

⇤D, ⇤+, ⇤·, 0, 1, ⇤ <) eo corpo ordenado (

⇤K, ⇤+, ⇤·, 0, 1, ⇤ <), temos que se x 2 ⇤D e y 2 ⇤K � {0}, então ⇤f (x)

e ⇤g (y) serão o inverso aditivo de x em ⇤D e o inverso multiplicativo de y

em ⇤K, respectivamente. Por tal razão, denotaremos os respectivos objetos ⇤f (x) e ⇤g (y)

simplesmente por �x e y�1.

Exemplo 2.17. Todo número real positivo tem uma raiz quadrada, ou seja, a condição

(8x 2 R) (0 < x) (9y 2 R) x = y · y)

é verdadeira, e, pelo PT, a condição

(8x 2 ⇤R) (0 ⇤ < x) (9y 2 ⇤R) x = y ⇤ · y)

é verdadeira. Nota-se que os corpos ordenados L e R (x) (Exemplos 1.7 e 1.15) não ob-servam essa propriedade, e, portanto, não são extensões de R que satisfazem ao Princípioda Transferência.

Os elementos dos conjuntos ⇤N, ⇤Z, ⇤Q, ⇤Irr e ⇤R são chamados de númeroshipernaturais, números hiperinteiros, números hiper-racionais, números hiperir-racionais e números hiper-reais, respectivamente. Pelo Teorema 2.15, temos que ⇤Z éum domínio ordenado enquanto ⇤Q e ⇤R são corpos ordenados.

Teorema 2.18.

(a) N = Z \ ⇤N;

(b) Z = Q \ ⇤Z;

(c) Q = R \ ⇤Q;

(d) ⇤N1 =

⇤Z1 \ ⇤N;

(e) ⇤Z1 =

⇤Q1 \ ⇤Z;

(f) ⇤Q1 =

⇤R1 \ ⇤Q.

Demonstração. As equações das letras (d), (e) e (f) são claras.

(a) Como N ⇢ Z e N ⇢ ⇤N, temos N ⇢ Z \ ⇤N. Se n 2 Z \ ⇤N, então n =

⇤n 2 ⇤N,e, pela letra (c) do Corolário 2.5, teremos n 2 N. Provam-se as letras (b) e (c) demodo análogo.

Teorema 2.19. Todo número hipernatural que não é um número natural é infinito.Assim, temos ⇤N = N [ ⇤N1 e ⇤Z = Z [ ⇤Z1, onde tais uniões são disjuntas.

44

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Demonstração. Suponha que n 2 ⇤N � N e n é finito. Assim, existe um número naturalm tal que n ⇤ 6 m. A condição fechada

(8y 2 N) (y 6 m) (y = 1 _ y = 2 _ · · · _ y = m))

é verdadeira, e pelo PT temos que a condição fechada

(8y 2 ⇤N) (y ⇤ 6 m) (y = 1 _ y = 2 _ · · · _ y = m))

também é verdadeira, resultando em n 2 {1, 2, . . . ,m} ⇢ N, o que é absurdo. Sek 2 ⇤Z� Z, então pelo Corolário 2.11 teremos |k| 2 ⇤N�N e |k| será infinito, resultandoem k 2 ⇤Z1.

Corolário 2.20. O domínio ordenado dos números hiperinteiros, ⇤Z, e os corpos orde-nados dos números hiper-racionais e hiper-reais, ⇤Q e ⇤R, são não arquimedianos.

Demonstração. Pela letra (e) do Teorema 2.3, o conjunto ⇤Z tem um elemento infinito, e,pela letra (d) do Corolário 2.5, temos que ⇤Q e ⇤R também têm um elemento infinito.

Notação 2.21 (Identificações Usuais). Símbolos que comumente denotam relações n-áriasem R serão usados para denotar as ⇤-transformações dessas relações. Assim, se ⇧ for umsímbolo usual usado (na literatura clássica) para denotar uma relação R ⇢ A ⇥ B comA,B ⇢ R, então a relação ⇤R ⇢ ⇤A⇥ ⇤B também será denotada por ⇧.

Como funções são relações, tal notação também será aplicada para funções. Comoexemplo, se x e y forem dois números hiper-reais, então denotaremos a soma x ⇤

+ y porx+ y, e se além disso x for positivo e f : (0,1)R⇥R! (0,1)R for a função definida porf (x, y) := xy, então denotaremos o número hiper-real positivo ⇤f (x, y) por xy.

Exemplo 2.22. Empregando a Notação 2.21, o desfecho do Exemplo 2.10 se torna

⇤[a, b]R =

x 2 ⇤R ... ⇤a ⇤ 6 x ⇤ 6 ⇤b

=

x 2 ⇤R ... a 6 x 6 b

= [a, b]⇤R .

Assim, pelo Teorema 2.15, temos que as ⇤-transformações dos intervalos em R são inter-valos em ⇤R entre números reais.

Dizemos que um número hiperinteiro n é par se n = 2m (9m 2 ⇤Z), e dizemos quen é ímpar se n = 2m+ 1 (9m 2 ⇤Z). Pelo PT, temos que todo número hiperinteiro ou épar ou é ímpar.

Pela Proposição 1.44, os respectivos conjuntos ordenados das galáxias em ⇤Q e ⇤Rsão densos. O mesmo ocorre para o conjunto ordenado das galáxias em ⇤Z.

45

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Proposição 2.23. O conjunto ordenado das galáxias em ⇤Z é denso.

Demonstração. Para cada x 2 ⇤Z, seja G (x) a galáxia de x em ⇤Z (Definição 1.41), esejam m e n dois números hiperinteiros tais que G (m)/G (n). Assim, n�m é um númerohipernatural infinito. Seja

k :

=

8

<

:

m+

n�m2

se n�m for par;

m+

n�m+1

2

se n�m for ímpar;

=

8

<

:

m+n2

se n�m for par;m+n+1

2

se n�m for ímpar.

Nota-se prontamente que G (m) / G (k) / G (n).

Doravante, usaremos as notações descritas na Definição 1.41 apenas para o casoD =

⇤R, ou seja, para cada número hiper-real x teremos

x :

= x+ Inf (⇤R) e G (x) := x+ Fin (

⇤R) .

2.8 Definição Alternativa para RA função ◆ : R! ⇤R dada por ◆ (x) := x é claramente uma imersão entre domínios

ordenados. Portanto, ⇤R é uma extensão do domínio ordenado R, e podemos aplicaros resultados da Seção 1.10. No restante desta dissertação, denotaremos a função partestandard associada a ⇤R por st (Definição 1.81).

Pelo Corolário 1.19, o conjunto Fin (

⇤Q) forma um subdomínio ordenadode Fin (

⇤R).

Proposição 2.24. A restrição do morfismo st : Fin (

⇤R) ! R ao subdomínio ordenadoFin (

⇤Q) de Fin (

⇤R) é um morfismo sobrejetor do tipo Fin (

⇤Q)! R entre domínios nãoestritamente ordenados cujo kernel é Inf (⇤Q).

Demonstração. Basta provar que a restrição

st �Fin(⇤Q)

: Fin (

⇤Q)! R

é sobrejetora. Seja r um número real e seja h um número hiper-real infinitesimal e positivo.Como a condição fechada

(8x 2 R) (8y 2 R) (x < y ) (9z 2 Q) (x < z ^ z < y))

é verdadeira, temos pelo PT que existe um número hiper-racional z tal que r < z < r+h.Assim, z é finito, z ⇠ r, e st (z) = r.

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Pelo Teorema 1.40, temos o seguinte corolário.

Corolário 2.25. O quocienteFin (

⇤Q) /Inf (⇤Q)

é isomorfo ao corpo ordenado dos números reais.

Um isomorfismo entre estruturas é uma tradução entre duas maneiras de descre-ver a essência de um sistema matemático. Assim, pode-se devidamente definir o corpoordenado dos números reais, (R,+, ·, 0, 1, <), como sendo o quociente Fin (

⇤Q) /Inf (⇤Q).Como veremos no Capítulo 5, a determinação de ⇤Q independe de R e ⇤R, e, portanto,não há circularidade alguma em definir o sistema dos números reais como sendoo quociente mencionado.

Essa descrição do sistema dos números reais prontamente proporciona a ordemusual e as operações de soma e multiplicação no quociente referido, distinguindo-se dasconstruções usuais, as quais exigem algumas deliberações técnicas para definir as muniçõesque tornam o conjunto R em um corpo ordenado. Além disso, sob a nova definição, prova-se facilmente que R satisfaz a diversas propriedades oriundas de Q, como, por exemplo,a Propriedade Arquimediana (Seção 1.3).

Na Seção 2.10, veremos que uma sequência de números racionais, {f (n)}n>1

, seráuma sequência de Cauchy em Q se, e somente se, tivermos ⇤f (M) ⇠ ⇤f (N) para quais-quer números hipernaturais infinitos M e N . Nesse caso, como toda sequência de Cauchyé limitada, teremos que ⇤f (M) é um número hiper-racional finito para um M 2 ⇤N1

qualquer (Corolário 2.47, Letra (c)), e a mônada

⇤f (M) + Inf (⇤Q) 2 Fin (

⇤Q) /Inf (⇤Q)

não dependerá do número hipernatural infinito M . Assim, tal mônada determinará umnúmero real.

2.9 Objetos Internos e Externos

Postularemos a existência de um método objetivo de rotular os ⇤R-objetos emduas variedades: os objetos internos e os objetos externos. A definição rigorosa dessanoção será apresentada no Capítulo 4, e, para os propósitos deste capítulo, mencionaremosapenas os principais resultados acerca desse tópico.

Intuitivamente, pode-se pensar que os objetos internos se comportam da maneiraque esperaríamos que um R-objeto de natureza similar se comportaria, enquanto os ob-jetos externos não acatam às leis que regem a conduta das suas contrapartesrelacionadas a R. Como exemplo, temos que todo subconjunto interno de ⇤R que tem

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uma cota superior tem um supremo em ⇤R, e, como sabemos (Seção 1.7), o mesmo ocorrepara os subconjuntos de R que têm uma cota superior. Todavia, existem subconjuntos de⇤R que têm uma cota superior mas não têm um supremo, tal como o conjunto N, e taisobjetos são externos.

As provas dos dois teoremas a seguir serão descritas na Seção 4.3.

Teorema 2.26.

(a) Todo objeto standard é interno;

(b) Todo elemento de um conjunto interno é interno.

A letra (b) do Teorema 2.26 implica que se uma n-tupla ordenada (a1

. . . an) de⇤R-objetos for interna, então cada ai será interno.

Teorema 2.27 (Princípio da Definição Interna; PDI - Versão Ingênua). Seja

� (x1

. . . xn, y1 . . . yp)

uma condição completamente aberta, seja R um conjunto interno que é umarelação n-ária, e sejam a

1

. . . ap objetos internos. O conjunto

S :

=

(t1

. . . tn) 2 R...� (t

1

. . . tn, a1 . . . ap) é verdadeira�

é interno.

Exemplo 2.28. Sejam a e b dois números hiper-reais com a 6 b. O intervalo [a, b]⇤R édefinido por

[a, b]⇤R :

=

x 2 ⇤R ... a 6 x 6 b

,

e, como ⇤R, a, b e 6 são objetos internos, temos pelo PDI que o intervalo [a, b]⇤R é interno.Analogamente, qualquer intervalo aberto, fechado ou semi-aberto em ⇤N, ⇤Z, ⇤Qe ⇤R é interno.

Corolário 2.29. Seja� (x, y, z

1

. . . zp)

uma condição completamente aberta, seja R um conjunto interno que é uma relaçãobinária, e sejam a

1

. . . ap objetos internos. Suponha que para cada u 2 dom (R) existe umúnico v 2 Im (R) tal que a condição fechada � (u, v, a

1

. . . ap) é verdadeira. A função f

com domínio dom (R) definida pela condição fechada

� (u, f (u) , a1

. . . ap)

é interna.

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Demonstração. Basta notar que

f =

(u, v) 2 R...� (u, v, a

1

. . . ap) é verdadeira�

e aplicar o PDI.

O atributo de um conjunto ser interno é preservado sobre algumas operaçõesconjuntistas.

Teorema 2.30 (Propriedades Conjuntistas dos Objetos Internos - Versão Ingênua).

(a) Se a e b forem objetos internos, então o conjunto {a, b} será interno;

(b) Se A e B forem conjuntos internos, então os conjuntos

A [ B,A \B,A� B e A⇥ B

serão internos;

(c) Se R for uma relação interna, e se A for um conjunto interno, então R�1, dom (R)

e R hAi serão internos.

Demonstração. Sejam �1

�2

. . .�8

as seguintes condições completamente abertas:

• �1

(x, y1

, y2

)

:

= x = y1

_ x = y2

;

• �2

(x, U, V )

:

= x 2 U _ x 2 V ;

• �3

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 2 V ;

• �4

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 62 V ;

• �5

(x1

, x2

, U, V )

:

= x1

2 U ^ x2

2 V ;

• �6

(x1

, x2

, U)

:

= (x2

, x1

) 2 U ;

• �7

(x, U, T ) := (9y 2 T ) (x, y) 2 U ;

• �8

(x, U, V )

:

= (9y 2 V ) (y, x) 2 U.

O resultado da letra (a) segue ao aplicarmos o PDI à condição �1

, e os resultadosda letra (b) seguem ao aplicarmos o PDI às condições �

2

,�3

,�4

e �5

.

(c) Aplicando o PDI às condições �6

e �8

, obtém-se facilmente que R�1 e R hAi sãointernos. Assuma que existe1 um conjunto interno B que contém dom (R). Assim,obtém-se que o conjunto dom (R) é interno aplicando o PDI à condição �

7

, onde asrespectivas variáveis U e T devem ser substituídas por R e B.

1 Não é possível confirmar a existência desse conjunto neste capítulo. Na Seção 4.3, veremos que o apro-visionamento dessa peça imprescindível para a presente demonstração é completamente justificável.

49

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Denotaremos o conjunto dos objetos internos por I.

O teorema a seguir será provado na Seção 4.4.

Teorema 2.31. Sejam A e B dois R-conjuntos. Temos:

(a) ⇤Pn(A) = I \ Pn

(

⇤A), onde n 2 N;

(b) ⇤ �AB�

= I \ (

⇤A)

(

⇤B) ;

(c) ⇤ �Int(A,6)B�

= I \ Int(⇤A,⇤6)

(

⇤B) onde6 é uma relação binária em A.

Exemplo 2.32. Pelo Princípio da Boa Ordenação (Teorema B.12), a condição fechada

(8S 2 P (N)� {;}) (9x 2 S) (8y 2 S) x 6 y

é verdadeira. Pelo PT e pela letra (a) do Teorema 2.31, todo subconjunto interno nãonulo de ⇤N tem um menor elemento. Analogamente, como todo subconjunto não nulode N que é limitado superiormente tem um maior elemento, temos que todo subconjuntointerno não nulo de ⇤N que é limitado superiormente tem um maior elemento.

Suponha que o conjunto dos números naturais é interno. Assim, a diferença⇤N� N =

⇤N1 é interna (Teorema 2.30, Letra (b)), e, como ela é não nula (Teorema 2.3,Letra (e)), ela tem um menor elemento N . Como N é infinito, temos n < N (8n 2 N),resultando em n < N � 1 (8n 2 N) e N � 1 2 ⇤N1, o que é absurdo visto que N � 1 < N .Portanto, o conjunto N é externo.

Exemplo 2.33. Pelo Princípio da Indução (Exemplo B.20), a condição fechada

(8S 2 P (N)) [(0 2 S ^ (8n 2 N) (n 2 S ! n+ 1 2 S))! S = N]

é verdadeira, resultando pelo PT que se S for um conjunto interno de números hiperna-turais que contém o número 0, e se o sucessor de cada elemento de S pertencer a S, entãoS será igual ao conjunto ⇤N. Esse resultado é conhecido como Princípio daIndução Interna.

Exemplo 2.34. Como ⇤N é standard, temos que ⇤N é interno. Já o conjunto das partesP (

⇤N) não pode ser interno, pois caso contrário o elemento N 2 P (

⇤N) também seriainterno (Teorema 2.26, Letra (b)), o que é absurdo (Exemplo 2.32). Assim, o conjuntodas partes de um conjunto interno não é necessariamente interno.

Corolário 2.35. Se A for um R-conjunto infinito, então ⇤ hAi será externo.

Demonstração. Seja f : N! A injetora. Se ⇤ hAi for interno, então o conjunto

⇤ hAi \ ⇤(f hNi) = ⇤ hf hNii = ⇤f hNi

será interno, e, como ⇤f é injetora (Teorema 2.14, Letra (i)), teremos que(

⇤f)�1 h⇤f hNii = N é interno, o que é absurdo (Exemplo 2.32).

50

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Exemplo 2.36. Seja D :

Int(Z,<)R ! P (Z) a função definida por D (x) :

= dom (x).Assim, a condição fechada

8x 2 Int(Z,<)R�

(8n 2 Z) (n 2 D (x), (9r 2 R) (n, r) 2 x)

é verdadeira, e pelo PT e pelo Teorema 2.31 temos que a condição�

8x 2 I \ Int(⇤Z,⇤<)

(

⇤R)�

(8n 2 ⇤Z) (n 2 ⇤D (x), (9r 2 ⇤R) (n, r) 2 x)

também é verdadeira, resultando que a função ⇤D : I\ Int(⇤Z,⇤<)

(

⇤R)! I\P (

⇤Z) étal que

⇤D (x) = dom (x)

para todo x 2 I \ Int(⇤Z,⇤<)

(

⇤R).

Exemplo 2.37. Denotaremos por Psup (R) o conjunto dos subconjuntos de R que têmum supremo, ou seja

Psup (R) :=⇢

S ⇢ R ...S tem um supremo�

=

S 2 P (R)... (9M 2 R) ((8x 2 S)x 6 M ^ (8N 2 R) ((8x 2 S)x 6 N )M 6 N))

Pelo PDS e pelo Teorema 2.31, temos

⇤Psup (R) =⇢

S 2 I \ P (⇤R)... (9M 2 ⇤R) ((8x 2 S)x 6 M ^ (8N 2 ⇤R) ((8x 2 S)x 6 N )M 6 N))

=

S ⇢ ⇤R ...S é interno e tem um supremo�

.

Denotaremos por Pinf (R) o conjunto dos subconjuntos de R que têm um ínfimo.Analogamente ao procedimento que vimos, obtém-se que ⇤Pinf (R) é o conjunto dos sub-conjuntos internos de ⇤R que têm um ínfimo.

Exemplo 2.38. Sejam Sup : Psup (R) ! R e Inf : Pinf (R) ! R as funções respectiva-mente definidas por

Sup (S) := sup (S) e Inf (S) := inf (S) .

Assim sendo, temos que as condições fechadas

(8S 2 Psup (R)) ((8x 2 S) x 6 Sup (S) ^ (8N 2 R) ((8x 2 S) x 6 N ) Sup (S) 6 N))

e

(8S 2 Pinf (R)) ((8x 2 S) Inf (S) 6 x ^ (8N 2 R) ((8x 2 S)N 6 x) N 6 Inf (S)))

são verdadeiras, e pelo PT temos que as condições

(8S 2 ⇤Psup (R)) ((8x 2 S) x 6 ⇤Sup (S) ^ (8N 2 ⇤R) ((8x 2 S) x 6 N ) ⇤Sup (S) 6 N))

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e

(8S 2 ⇤Pinf (R)) ((8x 2 S) ⇤Inf (S) 6 x ^ (8N 2 ⇤R) ((8x 2 S)N 6 x) N 6 ⇤Inf (S)))

são verdadeiras. Portanto, as funções ⇤Sup :

⇤Psup (R) ! ⇤R e ⇤Inf : ⇤Pinf (R) ! ⇤R sãotais que

⇤Sup (S1

) = sup (S1

) e ⇤Inf (S2

) = inf (S2

)

para quaisquer subconjuntos internos S1

e S2

de ⇤R tais que S1

tem um supremo e S2

temum ínfimo.

Corolário 2.39. Os conjuntos numéricos

N,Z,Q, Irr,R, Inf (⇤Q) , Inf (⇤Irr) , Inf (⇤R) ,Fin (

⇤Q) ,

Fin (

⇤Irr) ,Fin (

⇤R) , ⇤N1, ⇤Z1, ⇤Q1, ⇤Irr1 e ⇤R1

são externos.

Demonstração. Vimos que N e ⇤N1 são externos (Exemplo 2.32), e, como os conjuntosinfinitos Z, Q, Irr e R são da forma ⇤ hAi com A ⇢ R infinito, pelo Corolário 2.35 temosque eles são externos.

O corpo ordenado dos números reais satisfaz à Propriedade do Supremo (Seção1.7), ou seja, a condição fechada abreviada

(8S 2 P (R)) (S 6= ; ^ (9x 2 R) (“x é uma cota superior de S”)) (9y 2 R) (“y é o supremo de S”))

é verdadeira. Portanto, pelo PT e pelo Teorema 2.31, a condição fechada

(8S 2 I \ P (

⇤R)) (S 6= ; ^ (9x 2 ⇤R) (“x é uma cota superior de S”)) (9y 2 ⇤R) (“y é o supremo de S”))

é verdadeira, e os conjuntos Inf (⇤Q) , Inf (⇤Irr) , Inf (⇤R) ,Fin (

⇤Q) ,Fin (

⇤Irr) e Fin (

⇤R)não podem ser internos, visto que todos eles têm uma cota superior em ⇤R e nenhum delestem um supremo.

Os conjuntos ⇤N, ⇤Z e ⇤Q são standard, e, portanto, são internos. Como temos

⇤N1 =

⇤N \ ⇤Z1;

⇤Z1 =

⇤Z \ ⇤Q1;

⇤Q1 =

⇤Q \ ⇤R1,

pela letra (b) do Teorema 2.30 temos que os conjuntos ⇤Z1, ⇤Q1 e ⇤R1 são externos.

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2.10 Aplicações no Cálculo Diferencial

O Princípio da Transferência permite que as noções básicas do Cálculo Diferencialpossam ser reescritas em termos dos números hiper-reais, e essas novas perspectivas muitose assemelham às interpretações que uma série de matemáticos dos séculos XVII e XVIIInutriam acerca desses conceitos.

O Teorema 2.41, o Teorema 2.46 e o Corolário 2.47 desta seção apresentam algu-mas dessas traduções dos conceitos do Cálculo para a Análise Não Standard. Antes deenunciarmos tais resultados, introduziremos a seguinte notação:

Notação 2.40. Sejam I e R dois conjuntos relacionados a R, e seja {xi}i2I uma família deelementos de R com índices em I. Se j for um elemento de ⇤I, então denotaremos por xj

o elemento ⇤f (j) do conjunto ⇤R, onde f é a função I ! R definida por f (i) := xi. Nocaso I = [n

0

,1)Z para algum n0

2 Z, dizemos que a família

{⇤f (i)}i2⇤I = {⇤f (n)}n>n0n2⇤Z

é uma hipersequência de elementos de ⇤R.

Em outras palavras, a Notação 2.40 estipula que sempre que um subíndice em umtermo geral de uma família pertencer à ⇤-transformação do conjunto de índices original,estará pressuposto que, de fato, trata-se de um termo da ⇤-transformação daquela família.

Teorema 2.41 (Equivalências no Cálculo). Seja I um conjunto de números reais e sejai0

um número real estendido.2 Temos:

(a) I será limitado superiormente se, e somente se, todo elemento positivo de⇤I for finito;

(b) i0

será um ponto de acumulação3 de I pela esquerda se, e somente se, tivermosi ⇠ i

0

para algum i 2 ⇤I menor que i0

.

Suponha que i0

é um ponto de acumulação de I pela esquerda. Seja S um conjuntorelacionado a R, seja {fi}i2I uma família de funções reais definidas4 em S com índicesem I, e seja f uma função real definida em S.2 O conjunto ordenado dos números reais estendidos consiste no conjunto R := R[ {�1,1}, onde�1 e 1 são objetos que não pertencem a R, munido da extensão da ordem usual de R definida por�1 < 1 e �1 < x < 1 (8x 2 R). Dizemos que �1 e 1 são os elementos infinitos de R. Acondição 0 < x 2 ⇤R1 (resp. 0 > x 2 ⇤R1) é denotada por x ⇠ 1 (resp. x ⇠ �1), e o conjunto

{x 2 ⇤R...x ⇠ 1} (resp. {x 2 ⇤R

...x ⇠ �1}) é denotado por 1 (resp. �1). Note que as condiçõesx ⇠ 1 e y ⇠ 1 não implicam x ⇠ y.

3 Estamos considerando que o elemento1 (resp. �1) do conjunto ordenado dos números reais estendi-dos, R = R[{�1,1}, é um ponto de acumulação pela esquerda (resp. pela direita) dos subconjuntosde R que são ilimitados superiormente (resp. inferiormente). Analogamente, consideraremos que 1(resp. �1) é um ponto de acumulação das funções reais que são ilimitadas superiormente (resp.inferiormente) nas proximidades de um ponto de acumulação do domínio.

4 Dizemos que uma função f é definida em S se S ⇢ dom (f).

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(c) lim

i!i�0

fi = f pontualmente em S se, e somente se, fi (x) ⇠ ⇤f (x) para todo i 2 i0

\ ⇤I

menor que i0

e para todo x 2 ⇤ hSi ;

(d) lim

i!i�0

fi = f uniformemente em S se, e somente se, fi (x) ⇠ ⇤f (x) para todo i 2 i0

\⇤I

menor que i0

e para todo x 2 ⇤S.

Suponha que S ⇢ R e x0

é um ponto de acumulação de S pela esquerda. Seja l um númeroreal estendido.

(e) f será uniformemente contínua em S se, e somente se, ⇤f (x) ⇠ ⇤f (y) para quais-quer x, y 2 ⇤S com x ⇠ y;

(f) lim

x!x�0

x2S

f (x) = l se, e somente se, ⇤f (x) ⇠ l para todo x 2 x0

\ ⇤S menor que x0

;

(g) f será uma função de Cauchy nas proximidades de x0

em S pela esquerda se, esomente se, ⇤f (x) ⇠ ⇤f (y) para quaisquer x, y 2 x

0

\ ⇤S menores que x0

;

(h) l será um ponto de acumulação de f nas proximidades de x0

em S pela esquerda se,e somente se, ⇤f (x) ⇠ l para algum x 2 x

0

\ ⇤S menor que x0

;

(i) f será limitada superiormente nas proximidades de x0

em S pela esquerda se, esomente se, existir um número real M tal que ⇤f (x) < M para todo x 2 x

0

\ ⇤S

menor que x0

.

Suponha que x0

2 S.

(j) f terá um máximo local nas proximidades de x0

em S pela esquerda se, e somentese, ⇤f (x) 6 f (x

0

) para todo x 2 x0

\ ⇤S menor que x0

;

(k) f será contínua em x0

pela esquerda se, e somente se, ⇤f (x) ⇠ f (x0

) para todox 2 x

0

\ ⇤S menor que x0

.

Seja b um número real.

(l) f será diferenciável em x0

pela esquerda com derivada b se, e somente se, tivermos

⇤f (x)� f (x0

)

x� x0

⇠ b

para todo x 2 x0

\ ⇤S menor que x0

.

Demonstração. Provaremos tais afirmações apenas para o caso em que os números reaisestendidos i

0

, l e x0

são finitos, e as provas dos casos em que i0

, l ou x0

são números reaisestendidos infinitos são análogas às que veremos aqui.

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(a) Se I for limitado superiormente, então existirá um número real positivo r tal quei < r (8i 2 I), e, pelo PT, teremos i < r (8i 2 ⇤I), implicando na condição necessáriada afirmação. Reciprocamente, se todo elemento positivo de ⇤I for finito, então acondição fechada

(9r 2 ⇤R) (0 < r ^ (8i 2 ⇤I) i < r)

será verdadeira (pois bastaria escolher um r infinito e positivo), e o resultado seguiráao aplicarmos o PT a essa ⇤R-condição.

(b) Suponha que i0

é um ponto de acumulação de I pela esquerda. Isso significa que acondição fechada

(8✏ 2 R) (0 < ✏) (9i 2 I) 0 < i0

� i < ✏)

é verdadeira, e, pelo PT, se ✏ for um número hiper-real positivo e infinitesimal,então existirá um i 2 ⇤I tal que 0 < i

0

� i < ✏, resultando em i ⇠ i0

e i < i0

.Reciprocamente, se i ⇠ i

0

para algum i 2 ⇤I menor que i0

, se ✏ for um número realpositivo, então teremos 0 < i

0

� i < ✏, e a condição fechada

(9i 2 ⇤I) 0 < i0

� i < ✏

será verdadeira. Nesse caso, pelo PT, existirá um i 2 I com 0 < i0

�i < ✏, resultandoque i

0

será um ponto de acumulação de I pela esquerda.

(d) Suponha que lim

i!i�0

fi = f uniformemente em S. Seja ✏ um número real positivo, e

seja �✏ um número real positivo tal que a condição fechada

(8i 2 I) (0 < i0

� i < �✏ ) (8x 2 S) |fi (x)� f (x)| < ✏)

é verdadeira. Se i 2 i0

\ ⇤I com i < i0

, e se x 2 ⇤S, então teremos 0 < i0

� i < �✏,e, pelo PT, teremos |fi (x)� ⇤f (x)| < ✏, implicando em fi (x) ⇠ ⇤f (x) pois ✏ éarbitrário. Reciprocamente, se fi (x) ⇠ ⇤f (x) para todo i 2 i

0

\ ⇤I menor que i0

epara todo x 2 ⇤S, e se ✏ for um número real positivo, então a condição fechada

(9� 2 ⇤R) (0 < � ^ (8i 2 ⇤I) (0 < i0

� i < � ) (8x 2 ⇤S) |fi (x)� ⇤f (x)| < ✏))

será verdadeira (pois bastaria escolher um � infinitesimal e positivo), e o resultadoseguirá ao aplicarmos o PT a essa ⇤R-condição.

(e) Suponha que f é uniformemente contínua em S. Seja ✏ um número real positivoqualquer, e seja �✏ um número real positivo tal que a condição fechada

(8x, y 2 S) (|x� y| < �✏ ) |f (x)� f (y)| < ✏)

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é verdadeira. Se x, y 2 ⇤S com x ⇠ y, então |x� y| < �✏, e pelo PT teremos|⇤f (x)� ⇤f (y)| < ✏, resultando em ⇤f (x) ⇠ ⇤f (y) pois ✏ é arbitrário. Reciproca-mente, se ⇤f (x) ⇠ ⇤f (y) para quaisquer x, y 2 ⇤S com x ⇠ y, e se ✏ for um númeroreal positivo, então a condição fechada

(9� 2 ⇤R) (0 < � ^ (8x, y 2 ⇤S) (|x� y| < �✏ ) |⇤f (x)� ⇤f (y)| < ✏))

será verdadeira (pois bastaria escolher um � infinitesimal e positivo), e o resultadoseguirá ao aplicarmos o PT a essa ⇤R-condição.

(f) Suponha que o limite lim

x!x�0

x2S

f (x) existe e é igual a l. Seja ✏ um número real positivo

qualquer, e seja �✏ um número real positivo tal que a condição fechada

(8x 2 S) (0 < x0

� x < �✏ ) |f (x)� l| < ✏)

é verdadeira. Se x 2 x0

\ ⇤S com x < x0

, então teremos 0 < x0

� x < �✏, e,pelo PT, teremos |⇤f (x)� l| < ✏, implicando em ⇤f (x) ⇠ l pois ✏ é arbitrário.Reciprocamente, se ⇤f (x) ⇠ l para todo x 2 x

0

\ ⇤S menor que x0

, e se ✏ for umnúmero real positivo, então a condição fechada

(9� 2 ⇤R) (0 < � ^ (8x 2 ⇤S) (0 < x0

� x < � ) |⇤f (x)� l| < ✏))

será verdadeira (pois bastaria escolher um � infinitesimal e positivo), e o resultadoseguirá ao aplicarmos o PT5 a essa ⇤R-condição.

(c) Se r 2 S e x =

⇤r, então, como f (r) 2 R, teremos (Teorema 2.14, Letra (h))

⇤f (x) = ⇤f (

⇤r) = ⇤(f (r)) = f (r) .

O resultado segue ao aplicarmos a letra (f) ;

(g) Suponha que f é uma função de Cauchy nas proximidades de x0

em S pela esquerda.Seja ✏ um número real positivo qualquer, e seja x✏ um elemento de S menor que x

0

tal que a condição fechada

(8x, y 2 S) ((x✏ < x < x0

^ x✏ < y < x0

)) |f (x)� f (y)| < ✏)

5 O leitor deve estar atento à Notação 2.21. Na ausência das convenções estabelecidas nessa notação, a⇤R-condição fechada a qual nos referimos na prova da letra (f) é expressa como

(9� 2 ⇤R) (0 ⇤ < � ^ (8x 2 ⇤S) (0 ⇤ < ⇤M (x ⇤ � a) ⇤ < � ) ⇤M (⇤f (x) ⇤ � l) ⇤ < ✏)) ,

onde M : R ! R é a função valor absoluto dada por M (x) := |x|, e, tendo em vista que⇤x = x (8x 2 R), tal condição também pode ser exprimida como

(9� 2 ⇤R) (⇤0 ⇤ < � ^ (8x 2 ⇤S) (⇤0 ⇤ < ⇤M (x ⇤ � ⇤a) ⇤ < � ) ⇤M (⇤f (x) ⇤ � ⇤l) ⇤ < ⇤✏)) ,

evidenciando o fato de que todo objeto matemático fixo que aparece nessa condição é um objetostandard (Exemplo 2.8) e facilitando o entendimento da aplicação do PT a essa condição. A incon-veniência nítida de abandonar a Notação 2.21 consiste na abundância de asteriscos que ocorrem nas⇤R-condições fechadas.

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é verdadeira. Se x, y 2 x0

\ ⇤S com x, y < x0

, então teremos x✏ < x ex✏ < y, resultando pelo PT em |f (x)� f (y)| < ✏ e f (x) ⇠ f (y) pois ✏ é arbitrário.Reciprocamente, se ⇤f (x) ⇠ ⇤f (y) para quaisquer x, y 2 x

0

\ ⇤S menores que x0

, ese ✏ for um número real positivo, então a condição fechada

(9z 2 ⇤S) (8x, y 2 ⇤S) ((z < x < x0

^ z < y < x0

)) |⇤f (x)� ⇤f (y)| < ✏)

será verdadeira (pois bastaria escolher um z 2 ⇤S com z ⇠ x0

e z < x0

, o qualexiste pois assumimos que x

0

é um ponto de acumulação de S pela esquerda), e oresultado seguirá ao aplicarmos o PT a essa ⇤R-condição.

(h) Suponha que l é um ponto de acumulação de f nas proximidades de x0

em S pelaesquerda. Isso significa que a condição fechada

(8✏ 2 R) (8x 2 S) ((0 < ✏ ^ x < x0

)) (9y 2 S) (x < y < x0

^ |f (y)� l| < ✏))

é verdadeira, e, pelo PT, se ✏ for um número hiper-real positivo e infinitesimal, ese x 2 ⇤S com x ⇠ x

0

e x < x0

, então existirá um y 2 ⇤S com x < y < x0

e|⇤f (y)� l| < ✏, resultando em y ⇠ x

0

e ⇤f (y) ⇠ l. Reciprocamente, se ⇤f (x) ⇠ l

para algum x 2 x0

\ ⇤S menor que x0

, se ✏ for um número real positivo, e se y forum elemento de S menor que x

0

, então teremos y < x, |⇤f (x)� l| < ✏, e acondição fechada

(9x 2 ⇤S) (y < x ^ |⇤f (x)� l| < ✏)

será verdadeira. Nesse caso, pelo PT, existirá um x 2 S com y < x e |f (x)� l| < ✏,resultando que l será um ponto de acumulação de f nas proximidades de x

0

em S

pela esquerda.

(i) Se f for limitada superiormente nas proximidades de x0

em S pela esquerda, se M

for um número real tal que existe um número real positivo � tal que acondição fechada

(8x 2 S) (0 < x0

� x < � ) f (x) < M)

é verdadeira, e se x 2 x0

\ ⇤S com x < x0

, então teremos 0 < x0

� x < �, e, peloPT, teremos ⇤f (x) < M . Se M for um número real, e se tivermos ⇤f (x) < M paratodo x 2 x

0

\ ⇤S menor que x0

, então a condição fechada

(9� 2 ⇤R) (0 < � ^ (8x 2 ⇤S) (0 < x0

� x < � ) ⇤f (x) < M))

será verdadeira (pois bastaria escolher um � infinitesimal e positivo), e o resultadoseguirá ao aplicarmos o PT a essa ⇤R-condição.

(j) Se f tiver um máximo local nas proximidades de x0

em S pela esquerda, se � for umnúmero real positivo tal que a condição fechada

(8x 2 S) (0 < x0

� x < � ) f (x) 6 f (x0

))

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é verdadeira, e se x 2 x0

\ ⇤S com x < x0

, então teremos 0 < x0

� x < �, e, peloPT, teremos ⇤f (x) 6 f (x

0

). Se ⇤f (x) 6 f (x0

) para todo x 2 x0

\ ⇤S menor quex0

, então a condição fechada

(9� 2 ⇤R) (0 < � ^ (8x 2 ⇤S) (0 < x0

� x < � ) ⇤f (x) 6 f (x0

)))

será verdadeira (pois bastaria escolher um � infinitesimal e positivo), e o resultadoseguirá ao aplicarmos o PT a essa ⇤R-condição.

As letras (k) e (l) são consequências imediatas da letra (f).

Exemplo 2.42. Seja X um subconjunto de R. Empregando os mesmos procedimentosaplicados na demonstração do Teorema 2.41, prova-se que existirá um número real positivoh com |x� y| > h para quaisquer x, y 2 X distintos se, e somente se, para quaisquerx, y 2 ⇤X com x ⇠ y tivermos x = y. Esse será o caso para os exemplos X = N e X = Z,e, para qualquer X ⇢ R desse tipo, teremos que toda função real definida em X seráuniformemente contínua em X (Teorema 2.41, Letra (e)).

Exemplo 2.43. Seja Y um subconjunto ilimitado superiormente de R tal que existe umnúmero hiper-real positivo e infinito N com N 2 ⇤Y e N + N�1 2 ⇤Y . Esse será o casopara Y = Q, Y = Irr e Y = R. Seja n um número natural maior que 1, e seja p : Y ! Ra função dada por p (x) := xn. Pelo PT, nota-se que ⇤p (x) = xn

(8x 2 ⇤Y ), e

⇤p�

N +N�1

=

N +N�1

�n

=

nX

k=0

n

k

Nk�

N�1

(n�k)

=

nX

k=0

n

k

N2k�n

= h+H +

⇤p (N) ,

onde

h :

=

X

06k<n/2

n

k

N2k�n=

8

<

:

N�n+ nN2�n

+ · · ·+�

n(n�2)/2

N�2 se n for par

N�n+ nN2�n

+ · · ·+�

n(n�1)/2

N�1 se n for ímpar

e

H :

=

X

n/26k<n

n

k

N2k�n=

8

<

:

nn/2

+

n(n+2)/2

N2

+ · · ·+�

nn�1

Nn�2 se n for par�

n(n+1)/2

N +

n(n+3)/2

N3

+ · · ·+�

nn�1

Nn�2 se n for ímpar.

Nesse caso, como h é infinitesimal e H não é, teremos ⇤p (N +N�1

) 6⇠ ⇤p (N), resultandoque p não é uniformemente contínua (Teorema 2.41, Letra (e)).

58

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Se Z for um subconjunto limitado de R, e se u e v forem elementos de ⇤Z comu ⇠ v, então u e v serão números hiper-reais finitos (Teorema 2.41, Letra (a)), e teremosun � vn = (u� v) · k, onde

k :

= un�1

+ un�2v1 + · · ·+ u1vn�2

+ vn�1.

Nesse caso, como u � v é infinitesimal e k é finito (Teorema 1.18), teremos un ⇠ vn,provando que a função polinomial x 7! xn é uniformemente contínua em Z.

Nas letras (c) e (d) do Teorema 2.41, note que ⇤ hSi ⇢ ⇤S (Teorema 2.3, Letra(e)), resultando que as famílias de funções reais que convergem uniformemente para umafunção real também convergem pontualmente para tal função.

Exemplo 2.44. Seja {f�}�2(0,1)Ra família de funções f� : (0, 1)R ! R dadas por

f� (x) := e��x. Mostraremos que lim

�!1f� = 0 pontualmente mas não uniformemente. Seja

� um índice positivo e infinito, e seja x um número real em (0, 1)R = ⇤ h(0, 1)Ri. Comox é apreciável, o produto �x é infinito (Teorema 1.18), resultando em e��x ⇠ 0 visto quelim

y!1e�y

= 0, e provando que lim

�!1f� = 0 pontualmente (Teorema 2.41, Letra (c)). Além

disso, temos

0 ⇠ ��1 2 (0, 1)⇤R =

⇤((0, 1)R)

ee����1

= e�1 6= 0,

provando que a família {f�}�2(0,1)Rnão converge uniformemente para 0 (Teorema 2.41,

Letra (d)).

Exemplo 2.45. Seja {g�}�2(0,1)Ra família de funções g� : [0, 1]R ! R dadas

por g� (x) :

= xe��x. Mostraremos que lim

�!1g� = 0 uniformemente. Seja � um índice

positivo e infinito, e seja x um número hiperreal em ⇤([0, 1]R) = [0, 1]⇤R. Como

0 < e�r 6 1 (8r 2 [0,1)R), pelo PT temos 0 < e�r 6 1 (8r 2 [0,1)⇤R), e, como 0 6 �x,temos que e��x é finito, implicando em xe��x ⇠ 0 se x for infinitesimal (Teorema 1.18). Sex não for infinitesimal, então �x será infinito e teremos e��x ⇠ 0, resultando em xe��x ⇠ 0

pois x é finito. Portanto, temos xe��x ⇠ 0 em todo caso, e lim

�!1g� = 0 uniformemente

(Teorema 2.41, Letra (d)).

Seja I um conjunto de números reais, seja i0

um ponto de acumulação de I pelaesquerda, seja S um conjunto relacionado a R, e seja {fi}i2I uma família de funçõesreais definidas em S com índices em I. Pela Notação 2.40, se i 2 ⇤I, então a notação fi

representa a função ⇤g (i), onde g é a função com domínio I definida por g (i) := fi. Comocada função fi com i 2 I é definida em S, a condição fechada

(8i 2 I) (8r 2 S) (9s 2 R) (r, s) 2 g (i)

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será verdadeira, resultando pelo PT que cada função fi com i 2 ⇤I é definida em ⇤S. Paracada r 2 S, seja gr a função do tipo I ! R definida por gr (i) := fi (r). Assim,a condição fechada

(8i 2 I) (gr (i) = g (i) (r))

é verdadeira, e, pelo PT, temos ⇤gr (i) = fi (⇤r) (8i 2 ⇤I).

Teorema 2.46 (Equivalências para Convergências de Famílias de Funções). Seja I umconjunto de números reais, seja i

0

um ponto de acumulação de I pela esquerda, seja S

um conjunto relacionado a R, e seja {fi}i2I uma família de funções reais definidas em S

com índices em I. Temos:

(a) A família {fi}i2I convergirá pontualmente em S quando i ! i0

pela esquerda se, esomente se, fi (x) ⇠ fj (x) para quaisquer i, j 2 i

0

\ ⇤I menores que i0

epara todo x 2 ⇤ hSi ;

(b) A família {fi}i2I convergirá uniformemente em S quando i ! i0

pela esquerda se,e somente se, fi (x) ⇠ fj (x) para quaisquer i, j 2 i

0

\ ⇤I menores que i0

epara todo x 2 ⇤S.

Demonstração. As provas das condições necessárias dessas duas equivalências são con-sequências imediatas da transitividade da relação de proximidade infinita e das letras(c) e (d) do Teorema 2.41. Considere a função g e as funções gr definidas no parágrafoimediatamente anterior a este teorema.

(a) Suponha que fi (x) ⇠ fj (x) para quaisquer i, j 2 i0

\ ⇤I menores que i0

e para todox 2 ⇤ hSi. Assim, se r for um elemento de S, então ⇤r 2 ⇤ hSi, e teremos

⇤gr (i) = fi (⇤r) ⇠ fj (

⇤r) = ⇤gr (j)

para quaisquer i, j 2 i0

\ ⇤I menores que i0

, implicando, pela letra (a) do Teorema2.48, que o limite

lim

i!i�0

gr (i) = lim

i!i�0

fi (r)

existe. Nota-se que a família {fi}i2I converge pontualmente em S para a funçãof : S ! R definida por f (r) := lim

i!i�0

fi (r) quando i! i0

pela esquerda.

(b) Suponha que fi (x) ⇠ fj (x) para quaisquer i, j 2 i0

\ ⇤I menores que i0

e para todox 2 ⇤S, seja f a função definida na prova da letra (a), e seja ✏ um número realpositivo. Pela letra (a), temos que lim

i!i�0

fi = f pontualmente em S, e a

condição fechada

(8x 2 S) (9� 2 R) (0 < � ^ (8i 2 I) (0 < i0

� i < � ) |g (i) (x)� f (x)| < ✏))

60

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é verdadeira. Seja x um elemento de ⇤S. Portanto, pelo PT, existe um númerohiper-real positivo � tal que, para cada i 2 ⇤I com 0 < i

0

� i < �, temos|fi (x)� ⇤f (x)| < ✏, e podemos assumir6 que � é infinitesimal. Seja7 j um elementode ⇤I com 0 < i

0

� j < �. Assim, temos j 2 i0

\ ⇤I, j < i0

, |fj (x)� ⇤f (x)| < ✏, ese i for um elemento de i

0

\ ⇤I menor que i0

, então fi (x) ⇠ fj (x) pela suposição,e |fi (x)� ⇤f (x)| < ✏. Nesse caso, como ✏ é arbitrário, teremos fi (x) ⇠ ⇤f (x),provando que lim

i!i�0

fi = f uniformemente em S (Teorema 2.41, Letra (d)).

Voltando a atenção para as situações:

• I = [n0

,1)Z e i0

=1 nas letras (c) e (d) do Teorema 2.41 e nas letras (a) e (b) doTeorema 2.46;

• S = [n0

,1)Z e x0

=1 nas letras (f), (g), (h) e (i) do Teorema 2.41,

temos o seguinte corolário:

Corolário 2.47. Seja S um conjunto relacionado a R, seja n0

um número inteiro, seja{fn}n>n0

uma sequência de funções reais definidas em S, e seja f uma função real definidaem S. Teremos:

(a) lim

n!1fn = f pontualmente em S se, e somente se, fn (x) ⇠ ⇤f (x) para todo n 2 ⇤N1

e para todo x 2 ⇤ hSi ;

(b) lim

n!1fn = f uniformemente em S se, e somente se, fn (x) ⇠ ⇤f (x) para todo

n 2 ⇤N1 e para todo x 2 ⇤S;

(c) A sequência {fn}n>n0convergirá pontualmente em S quando n!1 se, e somente

se, fm (x) ⇠ fn (x) para quaisquer m,n 2 ⇤N1 e para todo x 2 ⇤ hSi ;

(d) A sequência {fn}n>n0convergirá uniformemente em S quando n!1 se, e somente

se, fm (x) ⇠ fn (x) para quaisquer m,n 2 ⇤N1 e para todo x 2 ⇤S.

Seja {xn}n>n0uma sequência de números reais e seja l um número real estendido.

(e) lim

n!1xn = l se, e somente se, xn ⇠ l para todo n 2 ⇤N1;

6 Se � não for infinitesimal, então qualquer número hiper-real positivo e infinitesimal pode substituí-lona demonstração.

7 Por hipótese, i0 é um ponto de acumulação de I pela esquerda, ou seja, a sentença fechada

(8� 2 R) (0 < � ) (9i 2 I) 0 < i0 � i < �)

é verdadeira. A existência do elemento j de ⇤I com 0 < i0 � j < � segue pelo PT.

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(f) {xn}n>n0será uma sequência de Cauchy se, e somente se, xm ⇠ xn para

quaisquer m,n 2 ⇤N1;

(g) l será um ponto de acumulação de {xn}n>n0se, e somente se, xn ⇠ l para

algum n 2 ⇤N1;

(h) {xn}n>n0será limitada superiormente se, e somente se, existir um número real M

tal que xn < M para todo n 2 ⇤N1.

No restante desta seção, empregaremos as novas perspectivas apresentadas noTeorema 2.41, no Teorema 2.46 e no Corolário 2.47 para demonstrar alguns teoremas im-portantes da Análise Real. O cunho dessas demonstrações se aproxima do estilo dos ma-temáticos dos séculos XVII e XVIII, destoando da tendência promovida por matemáticosproeminentes do século XIV como Bolzano, Weierstrass e Cantor, os quais desaprovavamveementemente o uso das quantidades infinitesimais e infinitas na Matemática.

Teorema 2.48. Seja S um conjunto de números reais com um ponto de acumulação x0

pela esquerda e seja f uma função real definida em S. Temos:

(a) O limite lim

x!x�0

x2S

f (x) existirá se, e somente se, a função f for uma função de Cauchy

nas proximidades de x0

em S pela esquerda;

(b) (Teorema de Cauchy) O corpo ordenado dos números reais é Cauchy-completo. Ouseja, uma sequência {rn}n>n0

de números reais será convergente se, e somente se,ela for uma sequência de Cauchy;

(c) (Teorema de Bolzano-Weierstrass)8 Se f for limitada nas proximidades de x0

em S

pela esquerda, então f terá um ponto de acumulação real nas proximidades de x0

em S pela esquerda.

Demonstração. Claramente, a letra (b) é uma consequência da letra (a).

(a) A condição necessária segue pela transitividade da relação de proximidade infinita.Se f for uma função de Cauchy nas proximidades de x

0

em S pela esquerda, entãof será limitada9 nas proximidades de x

0

em S pela esquerda, e se além disso y for8 Esta é uma generalização do Teorema de Bolzano-Weierstrass. A versão tradicional corresponde ao

caso em que x0 = +1 e S = N.9 Existirá um z 2 S menor que x0 tal que |f (x)� f (y)| < 1 para quaisquer x, y 2 S entre z e x0.

Assim, fixando um y em S entre z e x0, teremos

f (y)� 1 < f (x) < f (y) + 1 (8x 2 (z, x0)S) ,

implicando que a função f é limitada nas proximidades de x0 em S pela esquerda.

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um elemento de x0

\ ⇤S que é menor que x0

, então ⇤f (y) será finito (Teorema 2.41,Letra (i)), resultando em

⇤f (z) ⇠ ⇤f (y) ⇠ st (⇤f (y))

para todo z 2 x0

\ ⇤S menor que x0

, provando que lim

x!x�0

x2S

f (x) = st (⇤f (y)).

(c) Como x0

é um ponto de acumulação de S pela esquerda, existe um x 2 ⇤S menor quex0

tal que x ⇠ x0

(Teorema 2.41, Letra (b)), e, como f é limitada nas proximidadesde x

0

em S pela esquerda, existe um número real positivo M tal que |⇤f (y)| < M

para todo y 2 x0

\ ⇤S menor que x0

(Teorema 2.41, Letra (i)). Em particular,temos |⇤f (x)| < M , implicando que ⇤f (x) é finito. Assim, o número real st (⇤f (x))

é um ponto de acumulação real de f nas proximidades de x0

em S pela esquerda(Teorema 2.41, Letra (h)).

Teorema 2.49. Seja f uma função real definida no intervalo compacto [a, b]R, ondea, b 2 R com a < b. Se f for contínua em [a, b]R, então f será uniformemente contínuaem [a, b]R.

Demonstração. Sejam x e y dois elementos do conjunto ⇤([a, b]R) = [a, b]⇤R (Exemplo

2.10) tais que x ⇠ y. Assim, x e y são finitos. Seja r :

= st (x) = st (y). Como a funçãoparte standard associada a ⇤R é um morfismo entre domínios não estritamenteordenados, temos

st (a) 6 st (x) 6 st (b) ,

ou seja, temos a 6 r 6 b. Portanto, f é contínua em r, e, como x ⇠ r e y ⇠ r, temos

⇤f (x) ⇠ f (r) ⇠ ⇤f (y) ,

provando que f é uniformemente contínua em [a, b]R (Teorema 2.41, Letra (e)).

Teorema 2.50 (Teorema do Ponto Crítico). Seja f : (a, b)R ! R uma função diferen-ciável em c 2 (a, b)R. Se f tiver um máximo local em c, então f 0

(c) = 0.

Demonstração. Seja h um número hiper-real infinitesimal e positivo. Nota-se facilmenteque c ± h 2 (a, b)⇤R, e temos ⇤f (c± h) � f (c) 6 0 (Teorema 2.41, Letra (j)),resultando em

f 0(c) ⇠

⇤f (c+ h)� f (c)

h6 0 6

⇤f (c� h)� f (c)

�h ⇠ f 0(c)

pela letra (l) do Teorema 2.41. Assim, temos f 0(c) ⇠ 0 e f 0

(c) = 0 (Proposição 1.79).

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Teorema 2.51 (Teorema da Função Inversa). Seja f : (a, b)R ! R contínua, estritamentemonotônica e diferenciável em x 2 (a, b)R com f 0

(x) 6= 0. A função inversa g :

= f�1 édiferenciável em y :

= f (x), e

g0 (y) =1

f 0(x)

.

Demonstração. Pelo Teorema do Valor Intermediário e pela monotonicidade de f , nota-seque a função g é definida em um intervalo aberto em R contendo y. Assim, fixando umnúmero hiper-real infinitesimal h, temos que a função ⇤g é definida em y + h. Note queas funções ⇤f e ⇤g são inversas (Teorema 2.14, Letra (e)). Provaremos que

⇤g (y + h)� g (y)

h=

⇤g (f (x) + h)� x

h⇠ 1

f 0(x)

.

Os número ⇤g (f (x) + h) é finito, uma vez que ele pertence a ⇤((a, b)R) = (a, b)⇤R. Se

⇤g (f (x) + h) 6⇠ x, então ⇤g (f (x) + h) 6= x, e existirá um número real r (estritamente)entre ⇤g (f (x) + h) e x (Proposição 1.44). Nesse caso, como f é estritamente monotônica,⇤f será estritamente monotônica pelo PT, e f (r) estará entre f (x)+h e f (x), implicandoem f (r) ⇠ f (x), f (r) = f (x), e r = x, o que é absurdo pela maneira que obtivemos r.Portanto, temos ⇤g (f (x) + h) ⇠ x. Seja Q o número hiper-real dado por

Q :

=

⇤f (

⇤g (f (x) + h))� f (x)⇤g (f (x) + h)� x

=

h⇤g (f (x) + h)� x

=

✓⇤g (y + h)� g (y)

h

◆�1

.

Como f é diferenciável em x, temos Q ⇠ f 0(x) 6= 0, Q é apreciável, e a diferença

1

Q� 1

f 0(x)

=

f 0(x)�Q

Q · f 0(x)

é infinitesimal (Teorema 1.18).

Após ter contemplado as demonstrações dos últimos quatro teoremas, o leitorpode ter notado que tais argumentos são consideravelmente mais simples e diretos queas provas apresentadas nos cursos tradicionais de Cálculo e Análise Real. Uma possívelinterpretação para tal simplificação é o fortalecimento do sistema de axiomas utilizado naargumentação manifestada nesta seção. Nos Capítulos 3 e 5 veremos que o Axioma daEscolha é imprescindível na construção do monomorfismo não standard ⇤, enquanto asprovas tradicionais dos teoremas basilares da Análise utilizam apenas uma versão maisfraca daquele axioma conhecida como Axioma da Escolha Contável (40). De modogenérico, a Análise Não Standard pode ser vista como uma maneira criativa e eficiente deaproveitar melhor o potencial do Axioma da Escolha, mesmo em parcelas da Matemáticaonde apenas versões mais fracas desse axioma são estritamente necessárias.

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2.11 Somas Hiperfinitas

Seja S :

Int(Z,<)R! R a função que associa uma sequência finita de números reaisà sua soma, ou seja, a função definida recursivamente sobre o comprimento das sequênciasfinitas em Int(Z,<)R como segue:

(S1) S�

{xi}m6i6m

:

= xm para qualquer sequência {xi}m6i6m em Int(Z,<)R cujo conjuntode índices é unitário;

(S2) S�

{xi}m6i6n

:

= S�

{xi}m6i6n�1

+ xn para qualquer sequência finita de númerosreais {xi}m6i6n com m,n 2 Z e m < n.

Tais cláusulas definem os valores de S sobre cada sequência não nula pertencente aInt(Z,<)R, e, a fim de completar a definição de S, definimos S (;) := 0.10

Pelos Teoremas 2.14 e 2.31, temos que ⇤S é uma função do tipoI \ Int(⇤Z,<)

(

⇤R) ! ⇤R, e, assim como fizemos na Notação 2.40, dizemos que as famíliaspertencentes ao conjunto Int(⇤Z,<)

(

⇤R) são hipersequências.11

Definição 2.52. Seja xmxm+1

. . . xn uma hipersequência interna de números hiper-reais.O número hiper-real

⇤S (xmxm+1

. . . xn)

é chamado de soma hiperfinita da hipersequência interna xmxm+1

. . . xn, e, por abuso

de linguagem, ele é denotado pornX

i=m

xi ou por

xm + xm+1

+ · · ·+ xn.

Veremos no teorema a seguir que as somas hiperfinitas compartilham algumaspropriedades com as somas finitas.

10 Como 0 2 R é o elemento neutro da adição, a função S pode ser definida pelas seguintes condições:

(S0) S (;) := 0;

(S20) S⇣

{xi}m6i6n

:= S⇣

{xi}m6i6n�1

+ xn para qualquer sequência finita de números reais{xi}m6i6n com m,n 2 Z e m 6 n.

Note que {xi}m6i6m�1 = ; e

S⇣

{xi}m6i6m

= S (;) + xm = 0 + xm = xm.

11 Em geral, os matemáticos chamam de sequências apenas as famílias cujos conjuntos de índices sãobem ordenados.

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Teorema 2.53 (Propriedades das Somas Hiperfinitas). Se xm . . . xn . . . xp e ym . . . yn fo-rem duas hipersequências internas de números hiper-reais (onde m 6 n < p são númeroshiperinteiros), se r 2 ⇤R, e se j 2 ⇤Z, então teremos:

(a)nX

i=m

(xi + r · yi) =nX

i=m

xi + r ·nX

i=m

yi;

(b)nX

i=m

xi +

pX

i=n+1

xi =

pX

i=m

xi;

(c)nX

i=m

xi =

n+jX

i=m+j

xi�j;

(d)nX

i=m

xi 6nX

i=m

yi se xi 6 yi (8i 2 [m,n]⇤Z) ;

(e)

nX

i=m

xi

6nX

i=m

|xi|.

(Linearidade)

(Aditividade)

(Invariância Translacional)

(Monotonicidade)

(Desigualdade Triangular)

Demonstração. Sejam D, Sup e Inf as funções definidas nos Exemplos 2.36, 2.37 e 2.38,sejam

E :

=

(x, y) 2�Int(Z,<)R

2

...D (x) = D (y)

,

5 :

=

(x, y) 2 E ... (8S 2 P (Z)) (S = D (x)) (8n 2 S) x (n) 6 y (n))

,

e

C :

=

(x, y) 2�Int(Z,<)R

2

...D (x) 6= ; 6= D (y) ^ Sup (D (x)) + 1 = Inf (D (y))

subconjuntos do produto cartesiano�

Int(Z,<)R�

2

=

Int(Z,<)R�

⇥�

Int(Z,<)R�

, e sejam

• � : E ! Int(Z,<)R definida de modo que D (x� y) := D (x) = D (y) e

(x� y) (n) := x (n) + y (n) ;

• ⌦ : R⇥ Int(Z,<)R! Int(Z,<)R definida de modo que D (r ⌦ x) := D (x) e

(r ⌦ x) (n) := r · x (n) ;

• ? : C ! Int(Z,<)R definida de modo que D (x?y) = D (x) [D (y) e

(x?y) (n) :=

8

<

:

x (n) se n 2 D (x)

y (n) se n 2 D (y) ;

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• Trans : Int(Z,<)R! Int(Z,<)R definida de modo que D (Trans (x)) := D (x) + j e

Trans (x) (n) := x (n� j) ;

• Abs : Int(Z,<)R! Int(Z,<)R definida de modo que D (Abs (x)) := D (x) e

Abs (x) (n) := |x (n)| .

Os resultados das letras (a), (b), (c), (d) e (e) seguem ao aplicarmos o PT às respectivascondições fechadas a seguir:

1.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

(8r 2 R) ((x, y) 2 E ) S (x� (r ⌦ y)) = S (x) + r · S (y)) ;

2.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

((x, y) 2 C ) S (x?y) = S (x) + S (y)) ;

3.�

8x 2 Int(Z,<)R�

S (x) = S (Trans (x)) ;

4.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

(((x, y) 2 E ^ x 5 y)) S (x) 6 S (y)) ;

5.�

8x 2 Int(Z,<)R�

|S (x)| 6 S (Abs (x)) .

Deixaremos para o leitor a demonstração da propriedadenX

i=n

xi = xn.

Corolário 2.54. Se xm . . . xn for uma hipersequência interna de números hiper-reais(onde m < n são números hiperinteiros), então teremos

nX

i=m+1

(xi � xi�1

) = xn � xm.

Demonstração. Temos

nX

i=m+1

(xi � xi�1

) =

nX

i=m+1

xi �nX

i=m+1

xi�1

=

n�1

X

i=m+1

xi +

nX

i=n

xi

!

m+1

X

i=m+1

xi�1

+

nX

i=m+2

xi�1

!

=

n�1

X

i=m+1

xi + xn

!

0

@x(m+1)�1

+

n�1

X

i=(m+2)�1

x(i�1)+1

1

A

= xn � xm.

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Pode-se definir produtos hiperfinitos de hipersequências de números hiper-reaisde modo análogo ao que fizemos nesta seção para as somas, e, sistematicamente aplicandoo PT, prova-se que tais produtos hiperfinitos herdam várias propriedades dos produtosfinitos. Veremos no Capítulo 4 que é possível estender qualquer lei de composição as-sociativa e interna em um conjunto interno para uma operação sobre hipersequênciashiperfinitas de elementos desse conjunto.

2.12 Atalho Dedutivo Usual

Na literatura dedicada à Análise Não Standard, é comum que as respectivas con-dições 1-5 apresentadas na demonstração do Teorema 2.53 sejam expressas das seguintesmaneiras equivalentes:

10.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

(8r 2 R) (dom (x) = dom (y)) S (x+ (r · y)) = S (x) + r · S (y)) ;

20.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

((dom (x) 6= ; 6= dom (y) ^ sup (dom (x)) + 1 = inf (dom (y)))

) S (xy) = S (x) + S (y)) ;

30.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

(8S 2 P (Z)) ((dom (x) + j = S = dom (y)

^ (8i 2 S) y (i) = x (i� j))) S (x) = S (y)) ;

40.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

(8S 2 P (Z)) ((dom (x) = S = dom (y) ^ (8i 2 S) x (i) 6 y (i))

) S (x) 6 S (y)) ;

50.�

8x, y 2 Int(Z,<)R�

(8S 2 P (Z)) ((dom (x) = S = dom (y) ^ (8i 2 S) y (i) = |x (i)|)) |S (x)| 6 S (y)) .

A extensa série de definições prévias (D, Psup (R), Sup, Inf, E , 5, C, �, ⌦, ?,Trans e Abs) gerada com o objetivo de revelar as condições 1-5 não foi necessária paraque pudéssemos escrever as condições 1’-5’, de modo que os objetos dessa série foramsubstituídos por relações mais comuns na prática da Matemática. Em contrapartida, nãopode-se aplicar o PT a tais condições, visto que a presença dos operadores dom, sup e inf,os quais são operadores entre classes próprias e não são R-objetos, viola um dos requisitosassentados na Seção 2.3.

Seja � (x1

. . . xm, y1 . . . yn) uma R-condição completamente aberta que segueàs regras que haviam sido predeterminadas na Seção 2.3, sejam a

1

. . . am R-objetos, econsidere que A

1

. . . An são classes não relacionadas a R tais que existem R-conjuntosA0

1

. . . A0n que observam a seguinte exigência:

(SubS) Cada A0i (resp. ⇤A0

i) é um “substituto satisfatório” para a classe Ai no contextodos R-conjuntos (resp. ⇤R-conjuntos), de modo que a fórmula

� (a1

. . . am, A1

. . . An) (resp. � (⇤a1

. . . ⇤am, A1

. . . An))

68

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seja metamatematicamente equivalente à fórmula

� (a1

. . . am, A01

. . . A0n) (resp. � (⇤a

1

. . . ⇤am,⇤A0

1

. . . ⇤A0n)) .

Nesse caso, por abuso de linguagem, a condição fechada � (a1

. . . am, A01

. . . A0n) é

denotada por� (a

1

. . . am, A1

. . . An) ,

e a ⇤-transformação dessa condição, dada por � (⇤a1

. . . ⇤am,⇤A0

1

. . . ⇤A0n), é denotada por

� (⇤a1

. . .⇤ am, A1

. . . An) .

O leitor é encorajado a se habituar a reconhecer rapidamente quando uma classeA pode ser restrita a um R-conjunto A0 que satisfaz a (SubS), pois frequentemente talconjunto A0 não é mencionado explicitamente nas argumentações e demonstrações.O uso desse abuso de linguagem é indispensável na prática da Análise Não Standard,visto que ele abrevia consideravelmente o processo dedutivo vinculado à aplicação regulardo Princípio da Transferência. No caso do Teorema 2.53, percebe-se que umaextensa série de definições prévias foram necessárias para que pudéssemos escreveras condições 1-5 seguindo às regras que haviam sido predeterminadas na Seção 2.3, e amaioria dos autores da área se poupariam dessa incumbência. Esse atalho dedutivo édispensado nesta dissertação apenas até esta seção.

Exemplo 2.55. Em diversas situações, poderemos empregar a função dom, a qual é defi-nida na classe das funções cujos domínios são conjuntos, em nossas condições matemáticas.Em particular, quando o contexto demandar uma função que compute o domínio das fun-ções pertencentes a Int(Z,<)R ou I \ Int(⇤Z,⇤<)

(

⇤R), a função D (Exemplo 2.36) observará(SubS) para a função-classe dom.

Exemplo 2.56. Em diversas situações, poderemos empregar a função sup, a qual é defi-nida na classe das ordens parciais que têm um supremo, em nossas condições matemáticas.Em particular, quando o contexto demandar uma função que compute o supremo dos ele-mentos de Psup (R) ou ⇤Psup (R) (Exemplo 2.37), a função Sup (Exemplo 2.38) observará(SubS) para a função-classe sup.

Exemplo 2.57. A relação ⇢ pode ser restrita a qualquer conjunto de subconjuntos deuma classe. Seja D a relação

D :

=⇢ \ (P (R)⇥ P (R)) .

Note que D⇢ P (R)⇥P (R) e ⇤ D⇢ (I \ P (

⇤R))⇥ (I \ P (

⇤R)) (Corolário 2.5; Teoremas2.12 e 2.31). Temos que a condição

(8S, T 2 P (R)) (S D T , (8x 2 S) x 2 T )

69

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é verdadeira, e, aplicando o PT a essa condição fechada, temos que a condição

(8S, T 2 I \ P (

⇤R)) (S ⇤ D T , (8x 2 S) x 2 T )

é verdadeira, resultando que D e ⇤ D são restrições de ⇢. Assim, quando o contextodemandar uma relação binária de inclusão entre os elementos de P (R) ou I \ P (

⇤R), arelação D observará (SubS) para a relação-classe ⇢.

Exemplo 2.58. Seja Func a relação binária tal que (f,B) 2 Func se, e somente se,tivermos que f é uma função com domínio R e contradomínio B, e seja Func a relação

Func := Func \�RR⇥ P (R)

.

Note que Func ⇢ RR⇥ P (R) e

⇤Func ⇢�

I \ (

⇤R)(

⇤R)�

⇥ (I \ P (

⇤R))

pelo Corolário 2.5 e pelos Teoremas 2.12 e 2.31. Claramente Func é umarestrição de Func. É possível (porém bastante maçante) obter uma R-condição fechadaque descreve a relação Func plenamente, e, aplicando o PT a tal condição, obtém-se que⇤Func é uma restrição de Func. Assim, quando o contexto demandar uma relação bináriaque associe uma função em RR ou I\ (

⇤R)(

⇤R) a um possível contradomínio em P (R) ouI \ P (

⇤R) para tal função, a relação Func observará (SubS) para a relação-classe Func.

2.13 Aplicações na Riemann-Integrabilidade

Na história do Cálculo Integral, o primeiro aparecimento do símboloZ

, a letraS alongada, ocorreu no manuscrito Analyseos tetragonisticae pars secunda de Leibniz,datado de 29 de Outubro de 1675. Nele, o autor afirma que o uso da letra S para denotarintegrais representa a palavra soma em Latim, summa, visto que ele concebia o processode integração como uma soma infinita de somandos infinitesimais (35).

Veremos que a noção de Riemann-integrabilidade pode ser formalmente reescritade uma maneira bastante semelhante à idealizada por Leibniz. De fato, sob a perspectivada Análise Não Standard, uma integral de Riemann é a parte standard de uma somahiperfinita de números hiper-reais infinitesimais.

Definição 2.59. Sejam a e b dois números reais com a < b, e seja n 2 ⇤N. Um par dehipersequências de números hiper-reais

P = (x0

x1

. . . xn, ⇡1⇡2 . . . ⇡n)

70

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é dito ser uma hiperpartição (etiquetada) do intervalo [a, b]⇤R se

a = x0

< x1

< · · · < xn = b

exi�1

6 ⇡i 6 xi (8i 2 [1, n]⇤N) .

Nesse caso, dizemos que P é refinada se xi � xi�1

⇠ 0 (8i 2 [1, n]⇤N) .

Se P for interna, então pelo Teorema 2.26 as hipersequências x0

x1

. . . xn e ⇡1

⇡2

. . . ⇡n

serão internas, e o subconjunto

S :

=

xi � xi�1

... 1 6 i 6 n

de ⇤R será interno pelo PDI. Nesse caso, se P for refinada, então S terá uma cota superiorem ⇤R (e.g., qualquer número real positivo), resultando na existência do supremo

sup

⇤R(S) = sup

16i6n(xi � xi�1

),

o qual será infinitesimal.

Teorema 2.60. Seja f : [a, b]R ! R uma função limitada. Essa função será Riemann-integrável se, e somente se, existir um número real I tal que

nX

i=1

⇤f (⇡i) · (xi � xi�1

) ⇠ I

para toda hiperpartição refinada e interna de [a, b]⇤R dada por

P = (x0

x1

. . . xn, ⇡1⇡2 . . . ⇡n) .

Nesse caso, teremosZ

f = I.

Demonstração. Suponha que f é Riemann-integrável. Seja P = (x0

x1

. . . xn, ⇡1⇡2 . . . ⇡n)

uma hiperpartição interna e refinada de [a, b]⇤R, e seja ✏ > 0 um número real. Assim,existe um � > 0 real tal que a condição fechada

mX

i=1

f (⇢i) · (yi � yi�1

)�Z

f

< ✏ para toda partição

Q = (y0

y1

. . . ym, ⇢1⇢2 . . . ⇢m)

de [a, b]R com sup

16i6m(yi � yi�1

) < � ”

é verdadeira, e, aplicando o PT a tal condição, temos que a condição fechada

mX

i=1

⇤f (⇢i) · (yi � yi�1

)�Z

f

< ✏ para toda hiperpartição interna

Q = (y0

y1

. . . ym, ⇢1⇢2 . . . ⇢m)

de [a, b]⇤R com sup

16i6m(yi � yi�1

) < � ”

71

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é verdadeira. Como P é interna e refinada, temos que sup

16i6n(xi � xi�1

) é infinitesimal e

sup

16i6n(xi � xi�1

) < �, resultando em

mX

i=1

⇤f (⇡i) · (xi � xi�1

)�Z

f

< ✏

emX

i=1

⇤f (⇡i) · (xi � xi�1

) ⇠Z

f

pois ✏ é arbitrário. Portanto, a condição necessária do teorema está provada.

Suponha que I é um número real tal quenX

i=1

⇤f (⇡i) · (xi � xi�1

) ⇠ I

para toda hiperpartição refinada e interna de [a, b]⇤R dada por

P = (x0

x1

. . . xn, ⇡1⇡2 . . . ⇡n) .

Seja ✏ um número real positivo, e seja � um número hiper-real positivo e infinitesimal.Como toda hiperpartição interna

Q = (y0

y1

. . . ym, ⇢1⇢2 . . . ⇢m)

de [a, b]⇤R com sup

16i6m(yi � yi�1

) < � é refinada, temos que a ⇤R-condição fechada dada por

(9⇣ 2 ⇤R)

⇣ > 0 ^ “

mX

i=1

⇤f (⇢i) · (yi � yi�1

)�Z

f

< ✏ para toda

hiperpartição internaQ = (y

0

y1

. . . ym, ⇢1⇢2 . . . ⇢m)

de [a, b]⇤R com sup

16i6m(yi � yi�1

) < ⇣ ”◆

é verdadeira, e, aplicando o PT a essa condição, temos que a condição

(9⇣ 2 R)

⇣ > 0 ^ “

mX

i=1

f (⇢i) · (yi � yi�1

)�Z

f

< ✏ para toda partição

Q = (y0

y1

. . . ym, ⇢1⇢2 . . . ⇢m)

de [a, b]R com sup

16i6m(yi � yi�1

) < ⇣ ”◆

é verdadeira, provando que f é Riemann-integrável.

Teorema 2.61 (Teorema Fundamental do Cálculo). Seja f : [a, b]R ! R uma função con-tínua, e seja F : [a, b]R ! R a função dada por F (x) :=

R x

af . A função F é diferenciável

e F 0= f .

72

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Demonstração. Seja x 2 (a, b)R. Para cada número real positivo h, seja Ph uma hi-perpartição refinada interna do intervalo [x, x+ h]⇤R, seja mh :

= min

x6y6x+hf (y), e seja

Mh :

= max

x6y6x+hf (y). Note que mh e Mh são números reais bem definidos visto que f é

contínua, e temoslim

h!0

+mh = f (x) = lim

h!0

+Mh.

Suponha que h é um número real positivo. Assim, pelo Teorema 2.60, temos

F (x+ h)� F (x)

h=

1

h

Z x+h

x

f ⇠ 1

nX

i=1

⇤f (⇡i) · (xi � xi�1

) ,

onde o par de sequências (x0

x1

. . . xn, ⇡1⇡2 . . . ⇡n) representa Ph. Comof h[x, x+ h]Ri ⇢ [mh,Mh]R, temos ⇤f h[x, x+ h]⇤Ri ⇢ [mh,Mh]⇤R, e temos (Teorema 2.53)

1

h·mh ·

nX

i=1

(xi � xi�1

) 6 1

nX

i=1

f (⇡i) · (xi � xi�1

) 6 1

h·Mh ·

nX

i=1

(xi � xi�1

) .

resultando em (Corolário 2.54)

mh =

1

h·mh · h 6 1

nX

i=1

f (⇡i) · (xi � xi�1

) 6 1

h·Mh · h = Mh.

Aplicando a função parte standard st nos três membros dessa inequação, temos

mh 6 1

h

Z x+h

x

f 6 Mh,

e, pelo Teorema do Confronto, temos que1

h

Z x+h

x

f ! f (x) quando h! 0

+. A prova de

que1

h

Z x+h

x

f ! f (x) quando h! 0

� é análoga.

Como anunciado, o aparato matemático descrito informalmente neste capítulopode ser incorporado em NBG, e o restante desta dissertação será destinada a essa tarefa.Nesse processo de formalização, retificaremos algumas lacunas propositalmente inseridasneste capítulo em prol da simplicidade, como a ausência da construção do monomorfismonão standard, ⇤, e a privação das demonstrações íntegras dos Teoremas 2.3, 2.9, 2.26, 2.27e 2.31. Também revisitaremos alguns conceitos parcialmente inextricáveis com os quaistrabalhamos aqui, como a noção das condições relacionadas a R (ou ⇤R) e a noção dosobjetos internos e externos.

73

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3Filtros e Ultrafiltros

3.1 A Ideia da Construção de ⇤R

Uma das construções usuais dos números reais a partir dos números racionais,atribuída a Charles Méray e Georg Cantor, consiste na identificação de cada número realcom uma classe de equivalência de sequências de Cauchy em Q, onde duas sequênciasdesse tipo, {rn} e {sn}, são equivalentes se, e somente se, temos

lim

n!1(rn � sn) = 0.

Tal relação de equivalência tem em consideração apenas o “valor alvo” de uma sequênciade Cauchy “no infinito”, ou seja, a classe de equivalência que uma sequência de Cauchy{rn} pertence depende somente do valor residual para o qual essa sequência se aproximaquando n ! 1, independentemente da forma e rapidez que essa sequência tende a essevalor. Como exemplo, nessa construção de R as sequências de Cauchy em Q dadas por

n+ 1

n

e⇢

n+ (�1)n

n

correspondem ao mesmo número real, viz. o número 1, embora a primeira sempre assumavalores maiores que 1 e a segunda se aproxime do valor limite alternando entre valoresmenores e maiores que 1.

Neste capítulo, desenvolveremos uma construção dos números hiper-reais análogaà mencionada abstração de Méray e Cantor, a qual foi essencialmente concebida porEdwin Hewitt em 1948 (27) e popularizada por Wilhelmus Luxemburg na décadade 1960 (37, 38). Nessa idealização, cada número hiper-real é identificado com uma classede equivalência de uma sequência de números reais. Em particular, as sequências em Rcom limite 0 correspondem aos números infinitesimais em ⇤R, e as sequências ilimitadasem R correspondem aos números infinitos em ⇤R. A relação de equivalência no conjuntodas sequências em R empregada nessa concepção de ⇤R é tal que duas sequências denúmeros reais, {xn} e {yn}, são equivalentes se, e somente se, o conjunto de índices n taisque xn = yn pertence a um subconjunto de P (N) cujas propriedades serão estabelecidasnas Seções 3.2, 3.5 e 3.7. Desse modo, a classe de equivalência de uma sequência denúmeros reais depende não somente do possível valor para o qual os elementos dessasequência assintoticamente se aproximam, mas também da configuração específica deuma subsequência que sumariza o comportamento da sequência em questão.

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3.2 Filtros

A noção que introduziremos a seguir é bastante útil no estudo da Topologia, e elatem aplicações em diversas outras áreas da Matemática.

Definição 3.1. Seja I um conjunto não nulo. Um subconjunto não nulo F de P (I) édito ser um filtro em I se as seguintes condições são observadas:

(F1) Se X ⇢ Y ⇢ I e X 2 F , então Y 2 F ;

(F2) Se X, Y 2 F , então X \ Y 2 F .

Nesse caso, dizemos que:

• F é próprio se ; 62 F ; caso contrário dizemos que F é impróprio;

• F é principal se ele é da forma

F =

X ⇢ I...E ⇢ X

para algum E ⇢ I não nulo; caso contrário, dizemos que F é não principal;

• F é livre se\

F = ;;

• F é maximal se ele é o único filtro próprio em I que contém F .

A condição (F1) implica que P (I) é o único filtro impróprio em I, e, como filtrossão não nulos, temos que o conjunto I pertence a todo filtro em I. Todo filtro livre énão principal, e, por (F2), todo filtro próprio em um conjunto finito é principal. Umainterseção de filtros em I é um filtro em I.

Há na literatura diversas tentativas de interpretar a noção de um filtro F em umconjunto I de modo elementar, porém, na visão deste autor, nenhuma delas obteve êxitoem especificar uma analogia simples na qual os axiomas (F1) e (F2) são asseguradamenteverdadeiros sem que outras propriedades indesejadas também fossem intuitivamente ob-servadas. Por tal razão, não trabalharemos com alguma versão intuitiva da Definição 3.1,embora essa não seja a maneira ideal de introduzir conceitos matemáticos dessa relevância.

Neste Capítulo, assumiremos que I é um conjunto não nulo.

Exemplo 3.2. O conjunto unitário {I} é um filtro principal em I, o qual é chamado defiltro trivial em I.

Exemplo 3.3. Para cada i 2 I, o conjunto

J i:

=

X ⇢ I... i 2 X

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é um filtro principal em I. Se um conjunto unitário {i} com i 2 I pertencer a um filtropróprio F em I, então teremos J i ⇢ F por (F1), e {i} \ X 6= ; (8X 2 F) por (F2),resultando em F = J i. Assim, para cada i 2 I, teremos a igualdade F = J i se, esomente se, tivermos {i} 2 F , implicando que J i é maximal.

Exemplo 3.4. Seja T uma topologia em I, e seja J um subconjunto não nulo de I. Oconjunto T J das T -vizinhanças de J será um filtro em I que não é livre. Temos que Tserá uma topologia de Alexandrov1 se, e somente se, todo filtro em I da forma T {i} parai 2 I for principal.

Exemplo 3.5. Se I for infinito, então o conjunto dos subconjuntos finitos de I, o qualé denotado por P! (I), não será um filtro em I, visto que ele falhará em satisfazer aoaxioma (F1). De fato, teremos I 62 P! (I) nesse caso.

Exemplo 3.6. Seja

C :

=

X ⇢ I... I �X é finito

.

Se I for finito, então C será o filtro impróprio em I.

Suponha que I é infinito. Claramente I 2 C 6= ; e ; 62 C. Se X ⇢ Y ⇢ I e X 2 C,então teremos I � Y ⇢ I �X, resultando que I � Y é finito e Y 2 C. Assim, C satisfazao axioma (F1). Se X, Y 2 C, então os conjuntos I �X, I � Y e

(I �X) [ (I � Y ) = I � (X \ Y )

serão finitos, resultando em X \ Y 2 C, e provando que C é um filtro próprio em I. Talfiltro é chamado de filtro de Fréchet em I. Um subconjunto X ⇢ I é dito ser cofinitose I �X é finito, e por tal razão às vezes C é chamado de filtro dos cofinitos em I.

O filtro C é livre, pois se i 2\

C, então i 2 I � {i} 2 C, o que é absurdo.Provaremos que C é o menor filtro livre em I. Seja F um filtro livre em I, e suponha queX 2 C. Como o complemento I �X é finito, podemos escrever I �X = {i

1

i2

. . . in}, e,como F é livre, para cada ik existe um Xk 2 F tal que ik 62 Xk. A interseção X

1

\ · · ·\Xn

pertence a F por (F2), e

X1

\ · · · \Xn ⇢ I � {i1

i2

. . . in} = X 2 F

por (F1), provando que C ⇢ F . De fato, um filtro F qualquer em I será livre se, e somentese, ele contiver o filtro de Fréchet em I, visto que nesse caso teremos

\

F ⇢\

C = ;.

Exemplo 3.7. Seja i um elemento de I, e seja

Ci:

=

X ⇢ I... I �X é finito e i 2 X

.

1 Uma topologia em um conjunto é dita ser uma topologia de Alexandrov se todo ponto do conjuntotem uma menor vizinhança que o contém, ou seja, se a interseção das vizinhanças de qualquer pontodo conjunto é aberta.

77

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Analogamente ao procedimento realizado no Exemplo 3.6, nota-se que Ci é um filtro emI que não é livre. Se I for finito, então Ci será o filtro principal J i (Exemplo 3.3) .

Suponha que I é infinito e Ci é principal. Assim, existe um E ⇢ I tal que Ci é da

forma⇢

X ⇢ I...E ⇢ X

. Como E 2 Ci, temos que E é infinito e i 2 E, e se j for um

elemento de E distinto de i, então E� {j} será um subconjunto cofinito de I que contémi, resultando em E � {j} 2 Ci e E ⇢ E � {j}, o que é absurdo. Portanto, quando I forinfinito, o filtro próprio Ci será não principal.

Exemplo 3.8. Suponha que d : I ⇥ I ! [0,1)R é uma pseudométrica2 em I tal que I éd-ilimitado. O conjunto

Md:

=

S ⇢ I...S = I ou I � S é d-limitado

é um filtro próprio em I. Se i 2\

Md e se r for qualquer número real positivo, então abola aberta

Br (i) :=

j 2 I... d (i, j) < r

será um subconjunto próprio d-limitado de I, resultando em I � Br (i) 2Md ei 2 I � Br (i), o que é absurdo. Portanto, o filtro Md é livre.

Exemplo 3.9. Seja V uma �-algebra em I, e seja µ : V ! [0,1]R uma medida nãonegativa em I com µ (I) > 0. O conjunto

Oµ:

=

S 2 V ...µ (I � S) = 0

é um filtro próprio em I. Se para cada i 2 I tivermos que o conjunto unitário{i} é V-mensurável e tem µ-medida zero, então para cada i 2 I teremos I � {i} 2 Oµ,implicando em

\

Oµ= ;. Assim, nesse caso, teremos que o filtro Oµ é livre.

Para cada conjunto K de subconjuntos de I, existe um filtro em I que contém Ke que está contido em todo filtro em I que contém K.

2 Uma pseudométrica em um conjunto não nulo I é uma função d : I ⇥ I ! [0,1)R tal que paraquaisquer x, y, z 2 I temos

• d (x, x) = 0;

• d (x, y) = d (y, x) ;

• d (x, z) 6 d (x, y) + d (y, z) .

(Distâncias Triviais)

(Simetria)

(Desigualdade Triangular)

Nesse caso, dizemos que um subconjunto S de I é d-limitado se existem um x0 2 Se um r 2 (0,1)R tais que d (x0, x) < r (8x 2 S); caso contrário dizemos que S é d-ilimitado. Umamétrica em I é uma pseudométrica d : I ⇥ I ! [0,1)R tal que a condição d (x, y) = 0 implica x = y.

78

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Definição 3.10. Seja K um subconjunto de P (I).

• A interseção dos filtros em I que contêm K é chamada de filtro em I

gerado por K;

• Dizemos que K satisfaz à Propriedade das Interseções Finitas (PIF) seT

F 6= ;para todo subconjunto finito F de K.

Exemplo 3.11. O filtro em I gerado por ; é o filtro trivial {I} (Exemplo 3.2).

Se K for um conjunto de subconjuntos de I, então o filtro em I gerado por Kpoderá ser impróprio. A proposição a seguir esclarece precisamente a circunstância emque isso ocorre.

Proposição 3.12. Seja K ⇢ P (I). O filtro F em I gerado por K é dado por

F =

X ⇢ I...Y

1

\ · · · \ Yn ⇢ X para alguma sequência Y1

. . . Yn em K�

,

o qual será próprio se, e somente se, K obedecer à PIF.

Demonstração. Nota-se prontamente que F é um filtro em I que contém K. Se G foroutro filtro em I que contém K, e se X 2 F , então existirá uma sequência Y

1

. . . Yn em Kcom Y

1

\ · · · \ Yn ⇢ X, teremos Y1

\ · · · \ Yn 2 G por (F2), e X 2 G por (F1). Portanto,F está contido em todo filtro em I que contém K.

Exemplo 3.13. Seja < uma ordem parcial direcionada pela direita3 em um subconjuntonão nulo J de I, e, para cada i 2 J , seja i6 o conjunto

i6 :

=

j 2 J... i 6 j

.

O filtro ZJ em I gerado pelo conjunto⇢

i6... i 2 J

é chamado de filtro das caudas de

J em I.

Se i1

i2

. . . ip 2 J , então, como < é direcionada pela direita, existirá um j 2 J comin 6 j (8n), e teremos

; 6= j6 ⇢ i61

\ i62

\ · · · \ i6p .

Pela Proposição 3.12, o filtro ZJ é próprio e é dado por

ZJ=

X ⇢ I... i6 ⇢ X (9i 2 J)

.

No caso I = N, temos ZN= C (Exemplo 3.6).

3 Uma ordem parcial < em um conjunto J é dita ser direcionada pela direita se para quaisquer x, y 2 Jexiste um z 2 J tal que x, y 6 z.

79

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Nota-se diretamente que ZJ será livre se, e somente se, o conjunto parcialmenteordenado J não tiver um maior elemento k. Caso contrário, ZJ será o filtro principal J k.Assim, mostramos que o filtro ZJ será não principal se, e somente se, ele for livre.

A partir deste ponto neste capítulo, assumiremos que F é um filtro próprio em I.

Notação 3.14. Seja C (i) uma condição na qual a letra i é uma variável. Usaremosa notação

C (i) q.t.p.

para denotar a condição

i 2 I...C (i)

2 F .

Quando o filtro F não está implícito no contexto, tal condição é denotada por C (i) q.t.p. [F ].Neste trabalho, sempre usaremos a letra i como variável ligada em condições dessa forma.

Nota 3.15. No Capítulo 2, tratamos as condições matemáticas predominantemente comoentidades metamatemáticas, as quais podem ser verdadeiras ou falsas. Neste capítulo, elastambém serão tratadas como cláusulas completas em ocasiões. Por exemplo, poderemosconstruir sentenças da forma

“Se C (i) , então ...”,

onde C (i) representa uma cláusula, em vez de nos limitarmos apenas às sentençasda forma

“Se C (i) for verdadeira, então ...”,

onde C (i) representa o sujeito da cláusula antecedente da implicação.

Proposição 3.16. Sejam C1

(i) e C2

(i) duas condições na variável i, e seja C (i, x) umacondição nas variáveis i e x.

(a) Se (8i 2 I)C1

(i), então C1

(i) q.t.p.;

(b) Se (8i 2 I) (C1

(i)) C2

(i)) e se C1

(i) q.t.p., então C2

(i) q.t.p.;

(c) As condições C1

(i) q.t.p. e C2

(i) q.t.p. serão verdadeiras se, e somente se,a condição

(C1

(i) ^ C2

(i)) q.t.p.

for verdadeira;

80

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(d) Se (Ai)i2I for uma família de conjuntos não nulos, então as seguintes condiçõesserão equivalentes:

1. ((9x 2 Ai)C (i, x)) q.t.p.;

2.

9r 2Y

k2I

Ak

!

[C (i, r (i)) q.t.p.] ;3.

"

9r 2Y

k2I

Ak

!

C (i, r (i))

#

q.t.p.

Demonstração.

(a) Basta notar que I 2 F .

(b) Temos⇢

i 2 I...C

1

(i)

2 F e

i 2 I...C

1

(i)

⇢⇢

i 2 I...C

2

(i)

,

resultando em⇢

i 2 I...C

2

(i)

2 F pelo axioma (F1).

(c) Se C1

(i) q.t.p. e C2

(i) q.t.p., então os conjuntos⇢

i 2 I...C

1

(i)

e⇢

i 2 I...C

2

(i)

pertencerão a F , e, pelo axioma (F2), a interseção⇢

i 2 I...C

1

(i)

\⇢

i 2 I...C

2

(i)

=

i 2 I...C

1

(i) ^ C2

(i)

pertencerá a F . A prova da implicação recíproca segue pela letra (b).

(d) Como cada Ai é não nulo, nota-se prontamente que as condições

(9x 2 Ai)C (i, x) e

9r 2Y

k2I

Ak

!

C (i, r (i))

são equivalentes para cada i 2 I, implicando que as condições 1 e 3 são equivalentes.Se r 2

Y

k2I

Ak for tal que C (i, r (i)) q.t.p., então teremos

i 2 I... (9x 2 Ai)C (i, x)

�⇢

i 2 I...C (i, r (i))

2 F ,

resultando em ((9x 2 Ai)C (i, x)) q.t.p. por (F1), e provando que 2 implica 1.

Suponha que a condição 1 é verdadeira, e seja J o conjunto

J :

=

i 2 I... (9x 2 Ai)C (i, x)

.

81

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Assim, temos J 2 F . Para cada i 2 J , seja r (i) um elemento de Ai com C (i, r (i)),e para cada i 2 I � J , seja r (i) um elemento qualquer de Ai. Portanto, temos

i 2 I...C (i, r (i))

= J 2 F ,

provando que 1 implica 2.

3.3 Produtos Reduzidos

Considerando uma família de conjuntos {Mi}i2I com índices em I, temos que ofiltro F em I canonicamente induz uma relação de equivalência no produtocartesiano

Y

i2I

Mi.

Definição 3.17. Seja {Mi}i2I uma família de conjuntos. Denotaremos por =Mi,F arelação binária no produto cartesiano

Y

i2I

Mi definida de modo que, para quaisquer

r, s 2Y

i2I

Mi, teremos r =Mi,F s se, e somente se, tivermos r (i) = s (i) q.t.p.

O resultado a seguir segue diretamente da Proposição 3.16.

Corolário 3.18. Seja {Mi}i2I uma família de conjuntos. A relação =Mi,F é uma relaçãode equivalência em

Y

i2I

Mi.

Notação 3.19. Para cada r 2Y

i2I

Mi, a classe de equivalência

r/ =Mi,F =

(

s 2Y

i2I

Mi... r =Mi,F s

)

=

(

s 2Y

i2I

Mi... r (i) = s (i) q.t.p.

)

é dita ser o limite de r módulo (Mi,F), e ela é denotada por lim

Mi,Fr (i).

Proposição 3.20. Sejam {Mi}i2I e {Ni}i2I duas famílias de conjuntos não nulos taisque Mi ⇢ Ni (8i 2 I), e seja s 2

Y

i2I

Ni tal que s (i) 2 Mi q.t.p. Existe um r 2Y

i2I

Mi

tal que r (i) = s (i) q.t.p.

82

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Demonstração. Como cada conjunto Mi é não nulo, existe um t 2Y

i2I

Mi (Teorema B.26).

Seja J :

=

i 2 I... s (i) 2Mi

e seja r a função com domínio I dada por

r (i) :=

8

<

:

s (i) se i 2 J

t (i) se i 2 I � J.

Assim, J está contido no conjunto⇢

i 2 I... r (i) = s (i)

, e, como J 2 F , temos

r (i) = s (i) q.t.p. por (F1).

Sob as condições da Proposição 3.20, seja r0 2Y

i2I

Mi. Nota-se que

r0 (i) = s (i) q.t.p. se, e somente se, r0 (i) = r (i) q.t.p. (Proposição 3.16, Letras (b) e (c)),resultando em

lim

Mi,Fr (i) =

(

r0 2Y

i2I

Mi... r0 (i) = s (i) q.t.p.

)

.

Portanto, a classe de equivalência de r em relação a =Mi,F é determinada por s, justifi-cando a seguinte notação:

Notação 3.21. Em situações análogas à da Proposição 3.20, a classe de equivalêncialim

Mi,Fr (i) poderá ser denotada por lim

Mi,Fs (i) por abuso de linguagem.

Até agora nesta seção, obtivemos uma sistematização de um processo que gera umconjunto quociente

Y

i2I

Mi

!

/ =Mi,F

a partir de uma família de conjuntos {Mi}i2I com índices em I. Esse processo podeser generalizado,4 de modo que se L for uma assinatura (Definição A.5) e se {Mi}i2Ifor uma família de L-estruturas (Definição A.23) com índices em I, então poderemoscanonicamente definir uma L-estrutura cujo universo é o quociente do produto cartesianoda família {kMik}i2I módulo =kMik,F .

Até o restante deste capítulo, assumiremos que L é uma assinatura e {Mi}i2I éuma família de L-estruturas com índices em I, e, por abuso de linguagem, denotaremoso produto cartesiano

Y

i2I

kMik porY

i2I

Mi.

Antes de definir a nova L-estrutura mencionada, devemos levar em conta outradecorrência imediata da Proposição 3.16:

Corolário 3.22. Se r1

r2

. . . rn e s1

s2

. . . sn forem sequências de funções pertencentes aY

i2I

Mi tais que rk =Mi,F sk (8k), então as seguintes condições serão verdadeiras:

4 Conjuntos são ;-estruturas.

83

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(a) Para cada símbolo relacional n-ário P em L, teremos

(r1

(i) . . . rn (i)) 2 PMi q.t.p.

se, e somente se, tivermos

(s1

(i) . . . sn (i)) 2 PMi q.t.p.;

(b) Para cada símbolo funcional n-ário G em L, teremos

GMi(r

1

(i) . . . rn (i)) = GMi(s

1

(i) . . . sn (i)) q.t.p.

Definição 3.23. O produto reduzido de {Mi}i2I módulo F é a L-estrutura N definidacomo segue:

1. O universo de N é definido por

kNk :=

Y

i2I

Mi

!

/ =Mi,F

=

(

lim

Mi,Fr (i)

... r 2Y

i2I

Mi

)

;

2. Para cada símbolo relacional n-ário P em L, definimos a relação n-ária PN em kNktal que

lim

Mi,Fr1

(i) . . . limMi,F

rn (i)

2 PN

se(r

1

(i) . . . rn (i)) 2 PMi q.t.p.

Tal relação é bem definida (Corolário 3.22, Letra (a));

3. Para cada símbolo funcional n-ário G em L, definimos a função GN: kNkn ! kNk

dada por

GN

lim

Mi,Fr1

(i) . . . limMi,F

rn (i)

:

= lim

Mi,FGMi

(r1

(i) . . . rn (i)) .

Tal função é bem definida (Corolário 3.22, Letra (b));

4. Para cada símbolo de constante c em L, definimos cN :

= lim

Mi,FcMi .

Essa L-estrutura é denotada porY

F

Mi. Se {Mi}i2I é uma família constante

com Mi = M (8i 2 I), então o produto reduzidoY

F

M é dito ser a potência reduzida

de M módulo F , e a função d : M !Y

F

M dada por d (x) := lim

M,Fx é dita ser canônica.

84

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Convenciona-se (Definição A.23) que o símbolo relacional binário de igualdade, =,sempre deve ser interpretado em uma L-estrutura qualquer M da seguinte forma

=M:

=

(x, y) 2 kMk2 ...x = y

.

No caso do produto reduzidoY

F

Mi, temos que essa convenção vai ao encontro do item 2

da Definição 3.23, visto que a condição

lim

Mi,Fr1

(i) = lim

Mi,Fr2

(i)

é equivalente à condição (r1

(i) , r2

(i)) 2 =Mi q.t.p., onde r1

, r2

2Y

i2I

Mi.

Exemplo 3.24. O produto direto da família de L-estruturas {Mi}i2I é a L-estruturaN definida por:

• kNk :=Y

i2I

Mi;

• Para cada símbolo relacional n-ário P em L, definimos a relação n-ária PN em kNktal que

(r1

. . . rn) 2 PN

se(r

1

(i) . . . rn (i)) 2 PMi(8i 2 I) ;

• Para cada símbolo funcional n-ário G em L, definimos a função GN: kNkn ! kNk

tal que, para quaisquer r1

. . . rn em kNk, a imagem GN(r

1

. . . rn) é a funçãoi 7! GMi

(r1

(i) . . . rn (i)) com domínio I;

• Para cada símbolo de constante c em L, definimos cN como sendo a função i 7! cMi

com domínio I.

Se F for o filtro trivial {I} em I, então o limite de cada r 2Y

i2I

Mi módulo (Mi,F) será

o conjunto unitário {r}, e a função f : N !Y

F

Mi dada por f (r) := {r} será um iso-

morfismo entre L-estruturas. Desse modo, temos que os produtos reduzidos generalizamos produtos diretos.

Exemplo 3.25. Suponha que o conjunto I é infinito e é tal que para cada número naturaln existe um subconjunto cofinito Jn de I tal que cada L-estrutura Mi com i 2 Jn tem nomínimo n elementos. No Exemplo 3.48, mostraremos que se F for livre, então o produtoreduzido

Y

F

Mi será infinito.

85

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Teorema 3.26 (Termos Interpretados por Produtos Reduzidos). Se t (x1

. . . xn) for umL-termo (Definição A.13) e se r

1

. . . rn 2Y

i2I

Mi, então

tQ

F Mi

lim

Mi,Fr1

(i) . . . limMi,F

rn (i)

= lim

Mi,FtMi

(r1

(i) . . . rn (i)) .

Demonstração. Procederemos por indução sobre a complexidade de t. O resultado éimediato quando t é uma variável ou um símbolo de constante em L. Suponha que t temcomplexidade k positiva, e que o teorema já foi provado para termos de complexidademenor que k. Assim, t será da forma

t (x1

. . . xn) = G (t1

(x1

. . . xn) , . . . , tm (x1

. . . xn)) ,

onde G é um símbolo relacional m-ário em L e t1

. . . tm são L-termos abertos nas variáveisx1

. . . xn. Definindo N :

=

Y

F

Mi, temos

tN✓

lim

Mi,Fr1 (i) . . . lim

Mi,Frn (i)

◆= GN

✓tN1

✓lim

Mi,Fr1 (i) . . . lim

Mi,Frn (i)

◆, . . . , tNm

✓lim

Mi,Fr1 (i) . . . lim

Mi,Frn (i)

◆◆

= GN✓

lim

Mi,FtMi1 (r1 (i) . . . rn (i)) , . . . , lim

Mi,FtMim (r1 (i) . . . rn (i))

= lim

Mi,FGMi

⇣tMi1 (r1 (i) . . . rn (i)) , . . . , tMi

m (r1 (i) . . . rn (i))⌘

= lim

Mi,FtMi

(r1 (i) . . . rn (i)) ,

onde a hipótese de indução foi aplicada na transição da primeira linha para a segunda.Portanto, o teorema é válido para termos de complexidade k, e, pelo Princípio da Indução,o resultado está demonstrado.

3.4 Limites Generalizados

Podemos definir subconjuntos do universo de um produto reduzidoY

F

Mi a partir

de famílias {Ai}i2I de conjuntos com quase todo conjunto Ai contido no universo darespectiva L-estrutura Mi.

Definição 3.27. Seja {Ai}i2I uma família de conjuntos tal que Ai ⇢ kMik q.t.p.O limite integral de {Ai}i2I módulo (Mi,F) é o subconjunto de

Y

F

Mi definido por

(

lim

Mi,Fr (i)

... r 2Y

i2I

Mi e r (i) 2 Ai q.t.p.

)

,

o qual é denotado por lim

Mi,FAi.

Exemplo 3.28. Se Ai = ; para todo i 2 I, então teremos lim

Mi,FAi = ;.

86

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A proposição a seguir mostra que o limite integral lim

Mi,FAi é uma cópia do produto

reduzidoY

F

Ai de ; -estruturas (i.e., conjuntos) quando cada Ai é não nulo.

Proposição 3.29. Seja {Ai}i2I uma família de conjuntos não nulos tal que Ai ⇢ kMik q.t.p.A função u :

Y

F

Ai ! lim

Mi,FAi dada por

u

lim

Ai,Fr (i)

:

= lim

Mi,Fr (i)

é bem definida e é bijetora.

Demonstração. ComoY

i2I

Ai ⇢Y

i2I

Mi, nota-se que u é bem definida. A injetividade de

u é imediata, e, como cada conjunto Ai é não nulo, a sobrejetividade de u segue pelaProposição 3.20.

Relações n-árias cujas n-tuplas têm as j-ésimas coordenadas pertencentes a produ-tos reduzidos

Y

F

N ji para cada j 2 [1, n]N são canonicamente definidas a partir de famílias

{Ri}i2I de relações n-árias que satisfazem a certas condições, como veremos na definiçãoa seguir.

Definição 3.30. Seja�

N ji

i2I16j6n

uma família dupla de L-estruturas, seja�

Aji

i2I16j6n

uma

família dupla de conjuntos com Aji ⇢

�N ji

� q.t.p. (8j), e seja {Ri}i2I uma família derelações n-árias com Ri ⇢ A1

i ⇥ A2

i ⇥ · · · ⇥ Ani q.t.p. O limite relacional de {Ri}i2I

módulo✓

N ji

i2I16j6n

,F◆

é a relação n-ária

lim

Nji ,F

Ri ⇢✓

lim

N1i ,F

A1

i

⇥✓

lim

N2i ,F

A2

i

⇥ · · ·⇥✓

lim

Nni ,F

Ani

definida por

lim

N1i ,F

r1

(i) . . . limNn

i ,Frn (i)

2 lim

Nji ,F

Ri :, (r1

(i) . . . rn (i)) 2 Ri q.t.p.,

onde rj 2Y

i2I

N ji (8j) .

O limite relacional lim

Nji ,F

Ri é uma relação n-ária bem definida (Proposição 3.16).

Proposição 3.31. Seja�

N ji

i2I16j6n+1

uma família dupla de L-estruturas, seja�

Aji

i2I16j6n+1

uma família dupla de conjuntos com Aji ⇢

�N ji

� q.t.p. (8j), e seja {fi}i2I uma família

87

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de funções n-árias com fi : A1

i ⇥ A2

i ⇥ · · · ⇥ Ani ! An+1

i q.t.p. O limite relacional da

família {fi}i2I módulo✓

N ji

i2I16j6n+1

,F◆

é uma função n-ária do tipo

lim

Nji ,F

fi :

lim

N1i ,F

A1

i

⇥✓

lim

N2i ,F

A2

i

⇥ · · ·⇥✓

lim

Nni ,F

Ani

! lim

Nn+1i ,F

An+1

i

dada por

lim

Nji ,F

fi

!

lim

N1i ,F

r1

(i) . . . limNn

i ,Frn (i)

:

= lim

Nn+1i ,F

fi (r1 (i) . . . rn (i)) ,

onde fi (r1 (i) . . . rn (i)) pode ser definido como sendo qualquer objeto quando i

for tal que (r1

(i) . . . rn (i)) 62 dom (fi) (Notação 3.21).

Demonstração. Pela definição dos limites relacionais, temos

lim

Nji ,F

fi ⇢✓

lim

N1i ,F

A1

i

⇥✓

lim

N2i ,F

A2

i

⇥ · · ·⇥✓

lim

Nni ,F

Ani

lim

Nn+1i ,F

An+1

i

!

.

Sejam r1

r2

. . . rn funções tais que, para cada j 2 [1, n]N, temos rj 2Y

i2I

N ji e

rj (i) 2 Aji q.t.p. Assim, tendo em vista a Proposição 3.16, temos

(r1

(i) . . . rn (i)) 2 A1

i ⇥ A2

i ⇥ · · ·⇥ Ani q.t.p.

e(r

1

(i) . . . rn (i) , fi (r1 (i) . . . rn (i))) 2 fi q.t.p.,

resultando em

lim

N1i ,F

r1

(i) . . . limNn

i ,Frn (i) , lim

Nn+1i ,F

fi (r1 (i) . . . rn (i))

!

2 lim

Nji ,F

fi.

Se s1

, s2

2Y

i2I

Nn+1

i com s1

(i) 2 An+1

i q.t.p. e s2

(i) 2 An+1

i q.t.p., e se as (n+ 1)-tuplas

lim

N1i ,F

r1

(i) . . . limNn

i ,Frn (i) , lim

Nn+1i ,F

s1

(i)

!

e

lim

N1i ,F

r1

(i) . . . limNn

i ,Frn (i) , lim

Nn+1i ,F

s2

(i)

!

pertencerem à relação lim

Nji ,F

fi, então

((r1

(i) . . . rn (i) , s1 (i)) 2 fi ^ (r1

(i) . . . rn (i) , s2 (i)) 2 fi) q.t.p.,

e, como (fi é uma função) q.t.p., teremos s1

(i) = s2

(i) q.t.p. e lim

Nn+1i ,F

s1

(i) = lim

Nn+1i ,F

s1

(i),

provando que lim

Nji ,F

fi é uma função.

Sob as condições da Proposição 3.31, dizemos que a função n-ária lim

Nji ,F

fi é o limite

funcional de {fi}i2I módulo✓

N ji

i2I16j6n+1

,F◆

.

88

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3.5 Ultrafiltros

Para cada X ⇢ I, temos que X e o seu complemento I�X não podem simultane-amente pertencer ao filtro próprio F , visto que isso implicaria em ; = X \ (I �X) 2 Fpelo axioma (F2). Nesta seção, investigaremos os filtros U em I que são saturados nosentido que o complemento I�X de um subconjunto X de I pertencerá ao filtro U sempreque X não pertencer a U .

Definição 3.32. Um filtro próprio U sobre um conjunto não nulo I é dito serum ultrafiltro em I se para cada X ⇢ I temos

(U) Se X 62 U , então I �X 2 U .

O limite lim

Mi,Ur (i) é chamado de ultralimite de r módulo (Mi,U) para cada r 2

Y

i2I

Mi,

o produto reduzidoY

U

Mi é chamado de ultraproduto de {Mi}i2I módulo U , e cada

um dos três tipos de limites generalizados módulo (Mi,U) são ditos serem ultralimitesgeneralizados. Se {Mi}i2I é uma família constante com Mi = M (8i 2 I), então oultraproduto

Y

U

M é dito ser a ultrapotência de M módulo U .

O axioma (U) configura os ultrafiltros de modo que eles sejam filtros próprios quecompreendem a maior quantidade possível de subconjuntos de I. O teorema a seguirmostra que os ultrafiltros podem ser caracterizados por outras propriedades de saturação.

Teorema 3.33. As seguintes condições são equivalentes:

(a) F é um ultrafiltro em I;

(b) Para cada X ⇢ I, teremos X 2 F se, e somente se, I �X 62 F ;

(c) Para quaisquer subconjuntos X1

. . . Xn de I, se tivermos

X1

[ · · · [Xn 2 F ,

então algum Xi pertencerá a F ;

(d) F é maximal (Definição 3.1).

Demonstração. Provaremos separadamente que (a) é equivalente a cada uma das condi-ções (b), (c) e (d). Claramente, temos (b)) (a).

(a)) (b) : Seja X um subconjunto de I. Se I �X 62 F , então

X = I � (I �X) 2 F ,

e se I �X 2 F , então X 62 F por (F2).

89

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(a)) (c) : Sejam X1

. . . Xn subconjuntos de I comn[

i=1

Xi 2 F . Se Xi 62 F (8i), então

I �Xi 2 F (8i), e por (F2) teremos

I �n[

i=1

Xi =

n\

i=1

(I �Xi) 2 F ,

o que é absurdo.

(c)) (a) : Se X for um subconjunto de I, então X [ (I �X) = I 2 F , implicando queX 2 F ou I �X 2 F .

(a)) (d) : Se E for um filtro próprio em I que contém F , e se X 2 E�F , então teremosI �X 2 F ⇢ E , resultando em

; = X \ (I �X) 2 E

por (F2), o que é absurdo.

(d)) (a) : Seja X ⇢ I com X 62 F , e seja K :

= F [ {I �X}. Provaremos que F éum ultrafiltro em I, e, para isso, basta provarmos que I �X 2 F . Por (F2), umainterseção finita de elementos de K ou pertence a F ou é da forma Y \ (I �X) paraalgum Y 2 F . No primeiro caso, tal interseção finita é não nula visto que F é umfiltro próprio. No segundo caso, temos Y \ (I �X) 6= 0 pois caso contrário teríamosY ⇢ X e X 2 F por (F1), o que seria absurdo. Portanto, interseções finitas deelementos de K são não nulas, e, pela Proposição 3.12, o filtro H em I gerado porK é próprio. Como F é maximal, temos F = H e I �X 2 F .

Chamaremos de (U’) a condição expressa na letra (b) do Teorema 3.33, a qualpode ser vista como uma alternativa simples a (U) para axiomatizar os ultrafiltros.

Exemplo 3.34. O filtro trivial {I} em I será um ultrafiltro em I se, e somente se, I forum conjunto unitário, visto que se i 2 I e I � {i} 6= ;, então os conjuntos {i} e I � {i}não pertencerão a {I}, contradizendo (U’).

Exemplo 3.35. Para cada i 2 I, o filtro próprio J i (Exemplo 3.3) é ultrafiltro em I.

Exemplo 3.36. Suponha que I é infinito. Assim, existe uma função injetora f : N! I,e os conjuntos 2N, f h2Ni, 2N� 1 e f h2N� 1i têm o mesmo cardinal !, implicando quetodos eles são infinitos. O complemento de f h2Ni em I também é infinito visto quef h2N� 1i ⇢ I�f h2Ni. Portanto, f h2Ni e I�f h2Ni não pertencem ao filtro de Fréchetem I (Exemplo 3.6), provando que C não é um ultrafiltro em I pelo axioma (U’).

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Exemplo 3.37. Seja i um elemento de I. Se I for finito, então o filtro Ci em I (Exemplo3.7) será o filtro principal J i, o qual claramente é um ultrafiltro em I, e se I for infinito,então, analogamente à prova mostrada no Exemplo 3.36, obtém-se que Ci não é umultrafiltro em I.

Exemplo 3.38. Suponha que d : I ⇥ I ! [0,1)R é uma pseudométrica em I tal queI é d-ilimitado. Mostraremos que o filtro próprio Md em I (Exemplo 3.8) não é umultrafiltro. Seja i um elemento de I. Como I é ilimitado, existe uma sequência {in}n>1

depontos de I tal que a sequência {d (i, in)}n>1

é crescente e é tal que d (i, in)!1 quandon!1. Assim, temos que o conjunto {i

2n}i>1

é d-ilimitado, e o seu complemento em I,o qual contém o conjunto {i

2n�1

}n>1

, também é d-ilimitado, contradizendo o axioma (U’)e implicando que Md não é um ultrafiltro em I.

Exemplo 3.39. Seja V uma �-algebra em I, e seja µ : V ! [0,1]R uma medida nãonegativa em I com µ (I) > 0. Se existir um S 2 V tal que 0 < µ (S) < µ (I), então ofiltro próprio Oµ em I (Exemplo 3.9) não será um ultrafiltro em I, visto que nesse casoteremos µ (I � S) = µ (I) � µ (S) > 0, resultando que S e I � S não pertencem a Oµ econtradizendo o axioma (U’).

A partir deste ponto neste capítulo, assumiremos que U é um ultrafiltro em I econsideraremos que U é o filtro subentendido no contexto das ocorrências das condiçõesda forma C (i) q.t.p. (Notação 3.14).

Proposição 3.40. Seja C (i) uma condição na variável i. A condição C (i) q.t.p. seráfalsa se, e somente se, ¬C (i) q.t.p. for verdadeira.

Demonstração. A condição C (i) q.t.p. será falsa se, e somente se, tivermos

I �⇢

i 2 I...¬C (i)

=

i 2 I...C (i)

62 U ,

e, pelo axioma (U’), temos que isso é equivalente à condição ¬C (i) q.t.p.

Proposição 3.41. As seguintes condições são equivalentes:

(a) U = J i(9i 2 I) (Exemplo 3.3);

(b) U é principal;

(c) U não é livre;

(d) U tem um subconjunto finito de I

como elemento.

Demonstração. As implicações (a)) (b)) (c) são imediatas.

(c)) (d) : Como U não é livre, ele não contém o filtro de Fréchet C em I (Exemplo3.6), e existe um X ⇢ I não nulo tal que I � X é finito e X 62 U , implicando emI �X 2 U por (U).

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(d)) (a) : Sejam i1

. . . in os elementos de um subconjunto finito de I pertencente a U .Assim, temos

{i1

} [ · · · [ {in} 2 U

e algum {ik} pertence a U (Teorema 3.33, Letra (c)), resultando em U = J ik .

O Axioma da Escolha (Definição B.2) na forma do Lema de Zorn (TeoremaB.26) viabiliza uma maneira não construtiva de obter extensões de filtros própriospara ultrafiltros.

Teorema 3.42 (Lema do Ultrafiltro). Todo filtro próprio em I está contido em umultrafiltro em I.

Demonstração. Seja W o conjunto dos filtros próprios em I que contêm F , o qual é nãonulo pois F 2 W . Usaremos o Lema de Zorn para provar que W tem um elementomaximal quando parcialmente ordenado pela inclusão. Suponha que K é um subconjuntonão nulo de W que é ordenado pela inclusão. A união

S

K contém F e não contém oconjunto vazio como elemento. Provaremos que

S

K observa os axiomas (F1) e (F2):

• Se X ⇢ Y ⇢ I e X 2S

K, então X 2 A para algum A 2 K, e teremos Y 2 A por(F1), resultando em Y 2

S

K e provando queS

K satisfaz ao axioma (F1).

• Se X, Y 2S

K, então X 2 A e Y 2 B para algum A 2 K e algum B 2 K. ComoK é ordenado pela inclusão, temos A ⇢ B ou B ⇢ A, e, sem perda de generalidade,podemos assumir que B ⇢ A e X, Y 2 A. Portanto, temos X \ Y 2 A por (F2), eX \ Y 2

S

K, provando queS

K satisfaz ao axioma (F2).

Assim,S

K é uma cota superior de K em W , e, pelo Lema de Zorn, existe um elementomaximal F 0 no conjunto parcialmente ordenado W . Todo filtro próprio em I que contémF 0 pertence a W , implicando que F 0 é um filtro maximal e é um ultrafiltro em I (Teorema3.33, Letra (d)).

Em particular, podemos estender os filtros livres, como o filtro de Fréchet (Exemplo3.6), para ultrafiltros livres, os quais são não principais.

Corolário 3.43. Existe um ultrafiltro livre em I.

Se I é infinito, então a existência de um ultrafiltro não principal em I é umacondição estritamente mais fraca que o Axioma da Escolha módulo ZF (Definição A.34),e ela não pode ser demonstrada em ZF. De fato, existe um modelo de ZF no qual todoultrafiltro em qualquer conjunto é principal (42).

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Exemplo 3.44. Se < for uma ordem parcial direcionada pela direita em um subconjuntoJ de I, então, pelo Lema do Ultrafiltro, existirá um ultrafiltro em I que contém ZJ

(Exemplo 3.13), o qual terá o conjunto J como elemento. Esse ultrafiltro será livre se J

não tiver um maior elemento.

3.6 Ultraprodutos

O teorema a seguir foi publicado pela primeira vez por Jerzy Łoś em 1955 (53).Também conhecido por Teorema Fundamental dos Ultraprodutos , ele evidencia a impor-tância dos ultrafiltros e ultraprodutos na Teoria dos Modelos.

Teorema 3.45 (Teorema de Łoś). Seja � (x1

. . . xn) uma L-fórmula (Definição A.14).Para quaisquer r

1

. . . rn 2Y

i2I

Mi, temos

Mi |= � [r1

(i) . . . rn (i)] q.t.p.,Y

U

Mi |= �

lim

Mi,Ur1

(i) . . . limMi,U

rn (i)

.

Demonstração. Procederemos por indução sobre a complexidade de �. Pelas Definições3.23 e A.34, a validade do resultado é imediata quando � for uma fórmula atômica.Suponha que � tem complexidade k positiva, e que o teorema já foi provado para fórmulasde complexidade menor que k. Assim, temos os seguintes casos:

1. Se � for da forma (¬�0(x

1

. . . xn)), então a L-fórmula �0 terá complexidadek� 1, e, pela Proposição 3.40, a negação da condição Mi |= � [r

1

(i) . . . rn (i)] q.t.p.será equivalente à condição Mi |= �0

[r1

(i) . . . rn (i)] q.t.p., a qual, por sua vez, éequivalente a

Y

U

Mi |= �0

lim

Mi,Ur1

(i) . . . limMi,U

rn (i)

pela hipótese de indução. O resultado desejado segue pela definição darelação de satisfatibilidade.

2. Se � for da forma (�1

(x1

. . . xn) ^ �2

(x1

. . . xn)), então a soma das complexidadesdas L-fórmulas �

1

e �2

será k� 1, implicando que ambas têm complexidademenor que k. Nesse caso, pela letra (c) da Proposição 3.16, a condiçãoMi |= � [r

1

(i) . . . rn (i)] q.t.p. será equivalente à conjunção das condições

Mi |= �1

[r1

(i) . . . rn (i)] q.t.p. e Mi |= �2

[r1

(i) . . . rn (i)] q.t.p.,

a qual, por sua vez, é equivalente à conjunção das condições

Y

U

Mi |= �1

lim

Mi,Ur1

(i) . . . limMi,U

rn (i)

eY

U

Mi |= �2

lim

Mi,Ur1

(i) . . . limMi,U

rn (i)

93

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pela hipótese de indução. O resultado desejado segue pela definição darelação de satisfatibilidade.

3. Se � for da forma (�1

(x1

. . . xn) _ �2

(x1

. . . xn)), então � será equivalente à condição

[¬ [¬ (�1

(x1

. . . xn)) ^ ¬ (�2

(x1

. . . xn))]] ,

e o teorema será válido para � pelos casos 1 e 2.

4. Se � for da forma (9y)� (x1

. . . xn, y), onde y é uma variável que não está na listax1

. . . xn,5 então a L-fórmula � terá complexidade k� 1, e, pela letra (d) da Propo-sição 3.16, a condição Mi |= � [r

1

(i) . . . rn (i)] q.t.p. será equivalente à condição

9s 2Y

k2I

Mk

!

(Mi |= � [r1

(i) . . . rn (i) , s (i)] q.t.p.) ,

a qual, por sua vez, é equivalente à condição

9s 2Y

k2I

Mk

!

Y

U

Mi |= �

lim

Mi,Ur1

(i) . . . limMi,U

rn (i) , limMi,U

s (i)

!

pela hipótese de indução. Como todo elemento deY

U

Mi é uma classe de equiva-

lência de algum elemento do produtoY

k2I

Mk, temos que o resultado desejado segue

pela definição da relação de satisfatibilidade.

5. Se � for da forma (8y)� (x1

. . . xn, y), onde y é uma variável que não está na listax1

. . . xn, então � será equivalente à condição

[¬ (9y) (¬� (x1

. . . xn, y))] ,

e o teorema será válido para � pelos casos 1 e 4.

Portanto, pelo Princípio da Indução, provamos que o teorema é válido para L-fórmulas �de qualquer complexidade inteira não negativa.

Veremos que o Teorema de Łoś implica em uma versão fraca do Princípio daTransferência (Corolário 3.71) e obteremos a versão geral desse princípio de forma análogaà que demonstramos o Teorema 3.45.5 Se y = xi para algum i, então xi não aparecerá livre em �, e poderemos escrever

� = � (x1 . . . xi�1xi+1 . . . xn) .

Assim, y não estará na lista x1 . . . xi�1xi+1 . . . xn, mostrando que basta provarmos o caso em que ynão aparece na lista x1 . . . xn.

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Corolário 3.46. Toda classe axiomatizável K de L-estruturas (Definição A.37) é fechadasobre ultraprodutos, ou seja, temos

Y

U

Mi 2 K para qualquer família {Mi}i2I de

L-estruturas em K.

Exemplo 3.47. Na Seção 3.8, veremos que é possível obter um corpo não arquimedianocomo resultado de um ultraproduto de corpos arquimedianos, implicando que a classe doscorpos arquimedianos não é axiomatizável. Isso ocorre devido à limitação do processo deconstrução das LAO-fórmulas (Definição A.14) na lógica de primeira ordem, onde apenasuniões e interseções finitas de LAO-fórmulas são permitidas. Em lógicas infinitárias, aPropriedade Arquimediana (Definição 1.20) pode ser expressa pela LAO-fórmula infinitária

(8x, y)

0 < x < y �!1_

n=1

y <

n vezesz }| {

x+ x+ · · ·+ x

!!

,

onde o símbolo1_

n=1

representa uma disjunção infinita das LAO-fórmulas que correspondem

a cada número natural n. Tal fórmula não pode ser expressa em lógicas finitárias como aque estamos trabalhando nesta dissertação.

Exemplo 3.48. Considere o caso descrito no Exemplo 3.25, e suponha que F é livre.Assim, temos C ⇢ F , e, pelo Lema do Ultrafiltro, podemos assumir que F ⇢ U . Paracada número natural n, seja �>n uma L-sentença que afirma que uma L-estrutura temno mínimo n elementos.6 Assim, para cada número natural temos Mi |= �>n q.t.p. [U ], e,pelo Teorema de Łoś, temos

Y

U

Mi |= �>n (8n), implicando que o ultraprodutoY

U

Mi é

infinito. Nota-se que a função f :

Y

F

Mi !Y

U

Mi dada por

f

lim

Mi,Fr (i)

:

= lim

Mi,Ur (i)

é bem definida e sobrejetora, resultando que o produto reduzidoY

F

Mi é infinito.

Ademais, tal função f é um morfismo entre L-estruturas.

Exemplo 3.49. Seja p um número primo maior que 2, e, para cada número natural n,seja Fpn a LA-estrutura (Exemplo A.9) do corpo com exatamente pn elementos, o qualé único salvo isomorfismos e tem característica p. Se n 2 N e se todo elemento de Fpn

6 A sentença �>n pode ser escrita na forma

�>n = (9x1) (9x2) · · · (9xn)^

16i<j6n

xi 6= xj ,

onde^

16i<j6n

representa uma conjunção finita das L-fórmulas que correspondem a cada par (i, j) de

números naturais menores ou iguais a n com i < j.

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possuir uma raiz quadrada, ou seja, se para todo x 2 Fpn existir um y 2 Fpn com x = y2,então a função x 7! x2 do tipo Fpn ! Fpn será sobrejetora, e, como Fpn é finito, talfunção será bijetora. Nesse caso, como (�1)2 = 1 = (1)

2, teremos �1 = 1 (em Fpn) e acaracterística p do corpo Fpn será igual a 2, o que é absurdo. Portanto, para cada n 2 Nexiste um elemento de Fpn que não tem uma raiz quadrada, e teremos

Fpn |= (9x) (8y) (x 6= y · y) .

Considerando I = N, pelo Teorema de Łoś temos que o ultraprodutoY

U

Fpi é um corpo

infinito (Corolário 3.46 e Exemplo 3.48) de característica p que não é algebricamentefechado. Se n for um número natural, se I for um conjunto infinito de números primos, ese U for não principal, então o ultraproduto

Y

U

Fin será um corpo infinito de característica

0 que não é algebricamente fechado.

Exemplo 3.50. Seja {Ki}i2I uma família de corpos algebricamente fechados com índi-ces em I. Se o ultraproduto

Y

U

Ki não for algebricamente fechado, então existirá um

polinômio emY

U

Ki de grau k > 2 que não possui raízes nesse corpo, e teremos

Y

U

Ki |= (9ck�1

) · · · (9c0

) (8x)�

xk+ ck�1

· xk�1

+ · · ·+ c1

· x+ c0

6= 0

,

onde cada xn é o LA-termon vezes

z }| {

x · x · · · x .

Nesse caso, pelo Teorema de Łoś, teremos

Ki |= (9ck�1

) · · · (9c0

) (8x)�

xk+ ck�1

· xk�1

+ · · ·+ c1

· x+ c0

6= 0

q.t.p.,

o que é absurdo visto que cada Ki é algebricamente fechado. Portanto, provamos quequalquer ultraproduto de corpos algebricamente fechados é algebricamente fechado.

O Teorema de Łoś implica no corolário a seguir no caso particular da família deL-estruturas {Mi}i2I ser constante com Mi = M (8i 2 I) .

Corolário 3.51. Seja M uma L-estrutura e seja d : M !Y

U

M canônica.

(a) Se t (x1

. . . xn) for um L-termo e se a1

. . . an 2M , então

d�

tM (a1

. . . an)�

= tQ

U M(d (a

1

) . . . d (an)) ;

(b) Se � (x1

. . . xn) for uma L-fórmula e se a1

. . . an 2M , então

M |= � [a1

. . . an],Y

U

M |= � [d (a1

) . . . d (an)] .

Em outras palavras, d é uma imersão elementar (Definição A.42);

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(c) M ⌘Y

U

M (Definição A.36);

(d) Se M for finita, então as L-estruturas M eY

U

M serão isomorfas (Definição A.42).

Demonstração. Somente a letra (d) ainda não foi provada.

(d) Assumindo que M é finita, mostraremos que d é sobrejetora, e, portanto, é umisomorfismo pela letra (b). Todo elemento de

Y

U

M é da forma lim

M,Ur (i)

para r 2 IM =

Y

i2I

M . Seja r uma função desse tipo, sejam a1

. . . an os elementos

de M , e, para cada ai, seja Ji := r�1 h{ai}i. Temos

J1

[ J2

[ · · · [ Jn = I 2 U

e existe um Jk pertencente a U (Teorema 3.33, Letra (c)), resultando emr (i) = ak q.t.p. e lim

M,Ur (i) = d (ak).

Ultrafiltros principais não podem ser utilizados para representar L-estruturas novasvia ultraprodutos, como está evidenciado no corolário a seguir.

Corolário 3.52. Se U for principal, então existirá um j 2 I tal queY

U

Mi⇠=

Mj.

Demonstração. Pela Proposição 3.41, existe um j 2 I tal que U = J j, resultandona equivalência

C (i) q.t.p., C (j)

para qualquer condição matemática C (i) na variável i. Assim, nota-se prontamente quea função f :

Y

U

Mi !Mj dada por

f

lim

Mi,Ur (i)

:

= r (j)

é bem definida e é sobrejetora. Pelo Teorema de Łoś, temos

Mj |= � [r1

(j) . . . rn (j)],Y

U

Mi |= �

lim

Mi,Ur1

(i) . . . limMi,U

rn (i)

para quaisquer r1

. . . rn 2Y

i2I

Mi, e, por conseguinte, f é uma imersão elementar

e um isomorfismo.

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3.7 ↵-Completude de um Filtro

Pelo axioma (F2), sabemos que interseções finitas de conjuntos em um filtro qual-quer pertencem a esse filtro. Porém, o mesmo não é necessariamente válido parainterseções infinitas.

Definição 3.53. Seja ↵ um cardinal. Dizemos que um filtro F sobre I é ↵-completose ele é fechado sobre interseções com menos de ↵ elementos de F envolvidos, ou seja, seele obedecer à seguinte condição:

(F2↵) Se {Xk}k2K for uma família de elementos de F indexada por um conjunto nãonulo K com K � ↵ (Definição B.24), então

\

k2K

Xk 2 F .

Caso contrário, dizemos que F é ↵-incompleto. Dizemos que um filtro é completo se eleé ↵-completo para qualquer cardinal ↵, e caso contrário dizemos que ele é incompleto.

Se ↵ e � forem cardinais com ↵ < �, então todo filtro �-completo será ↵-completo.

O axioma (F2↵) prontamente implica na condição:

(F2↵’) Se {X�}�<� for uma família de elementos de F indexada por um ordinal nãozero � menor que ↵, então

\

�<�

X� 2 F .

Como estamos admitindo que Axioma da Escolha está em vigor, temos que (F2↵) e(F2↵’) são equivalentes. De fato, se (F2↵’) for verdadeira, e se {Xk}k2K for uma famíliade elementos de F com K � ↵, então, pelos Teoremas B.14 e B.26 existirá um ordinal �equipotente a K e existirá uma família injetora {k�}�<� cujos elementos são os elementosde K. Nesse caso, visto que ↵ é um ordinal inicial, teremos � < ↵ e

\

k2K

Xk =

\

�<�

Xk� 2 F ,

provando que (F2↵) será verdadeira. Além disso, o Axioma da Escolha nos permite lidarcom a concepção do cardinal de um conjunto arbitrário (Definição B.27), e, assim, umacondição da forma K � ↵ é equivalente a |K| < ↵.

Exemplo 3.54. O filtro trivial em I (Exemplo 3.2) é completo.

Exemplo 3.55. Pelo axioma (F2), todo filtro finito em I é completo e todo filtro em I

é !-completo.

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Exemplo 3.56. Qualquer interseção de conjuntos em um filtro principal pertence a essefiltro. Assim, todo filtro principal é completo.

Proposição 3.57. As seguintes condições são equivalentes:

(a) F é não principal;

(b) F é |F|+-incompleto;

(c) F é |I|+-incompleto.

Demonstração. As provas das condições contrapositivas das implicações (b) ) (a)

e (c)) (a) são imediatas (Exemplo 3.56).

(a)) (b) : Se F for |F|+-completo, então {X}X2F será uma família de elementos de Findexada pelo conjunto não nulo F com cardinal menor que |F|+, e, por(F2↵), teremos

\

F =

\

X2F

X 2 F ,

implicando que o filtro F será principal.

(a)) (c) : Suponha que F é |I|+-completo, e seja S o conjunto

S :

=

I � {i} ... i 2 I e I � {i} 2 F�

⇢ F .

Temos |S| 6 |I| < |I|+ e\

S 2 F por (F2↵). Se X 2 F e i 2 I � X, entãoteremos X ⇢ I � {i}, I � {i} 2 F por (F1), e i 62 I � {i} 2 S, resultando emi 62

\

S. Portanto, temos\

S ⇢ X (8X 2 F), e, por (F1), provamos que F é o

filtro principal dos subconjuntos de I que contêm\

S.

Em particular, todo filtro não principal em N é !1

-incompleto.

Valendo-se do Axioma da Escolha, pode-se atestar a existência de um filtro!1

-incompleto em qualquer conjunto infinito. A demonstração desse resultado está forado escorpo desta dissertação e pode ser encontrada em (13).

Teorema 3.58. Se I for infinito, então existirá um ultrafiltro !1

-incompleto em I.

Se P1

P2

. . . Pn for uma partição finita de I, ou seja, se P1

P2

. . . Pn forem subcon-juntos disjuntos de I que cobrem I, então teremos

P1

[ P2

[ · · · [ Pn = I 2 U ,

e, pela letra (c) do Teorema 3.33, pelo menos um Pi pertencerá a U . A proposição aseguir assegura que esse fato pode ser estendido para partições infinitas de I quando oultrafiltro U for ↵-completo com ! < ↵.

99

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Proposição 3.59. Seja ↵ um cardinal infinito. O ultrafiltro U será ↵-completo se, esomente se, toda partição de I em uma quantidade de partes menor que ↵ tiver pelomenos uma dessas partes pertencente a U .

Demonstração. Se U for ↵-completo, e se {Pk}k2K for uma partição7 de I com |K| < ↵,então teremos

\

k2K

(I � Pk) = ; 62 U ,

e, por (F2↵), existirá um k 2 K com I � Pk 62 U , implicando em Pk 2 U por (U’).

Suponha que toda partição de I em uma quantidade de partes menor que ↵ tempelo menos uma dessas partes pertencente a U , e seja {X�}�<� uma família de elementosde U indexada por um ordinal não zero � menor que ↵. Provaremos que

\

�<�

X� 2 U .

Seja f : I ! �0 (Definição B.15) a função definida da seguinte maneira:

• Se i 2\

�<�

X�, então f (i) := �;

• Se i 2 I �\

�<�

X�, então f (i) será o menor ordinal � menor que � tal que i 62 X�.

Note que teremos f (i) = � se, e somente se, tivermos i 2\

�<�

X�. O conjunto {f�1 h{�}i}�6�

é uma partição de I em uma quantidade de partes menor que ↵, e, pela suposição, existeum ordinal ⌘ 6 � tal que f�1 h{⌘}i 2 U . Se ⌘ < �, e se i for um elemento de f�1 h{⌘}i,então i 62 X⌘ pela definição de f , implicando em f�1 h{⌘}i \X⌘ = ;, o que é absurdo por(F2). Assim, ⌘ = �, e temos

\

�<�

X� = f�1 h{�}i 2 U ,

provando que U é ↵-completo por (F2↵’).

Dada uma L-estrutura M , é claro que a imersão canônica d : M !Y

U

M é

injetora. No entanto, a situação da sobrejetividade dessa função depende da L-estruturaM e do ultrafiltro U , e, caso M seja infinita, esse quadro reduz-se à condição de completudedo ultrafiltro U , como mostra a proposição a seguir.

Proposição 3.60. Seja M uma L-estrutura infinita. A imersão canônica d : M !Y

U

M

será sobrejetora se, e somente se, o ultrafiltro U for |M |+-completo.7 Uma partição de I é uma família {Pk}k2K de subconjuntos não nulos de I tal que I =

[

k2K

Pk e

Pk \ Pl = ; (8k, l 2 K).

100

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Demonstração. Se U for |M |+-completo, e se r : I !M for uma função, então o conjunto{r�1 h{a}i}a2Im(r) será uma partição de I em uma quantidade de partes menor que |M |+,e, pela Proposição 3.59, existirá um elemento a de Im (r) com r�1 h{a}i 2 U , resultandoem d (a) = lim

M,Ur (i), e provando que a função d é sobrejetora.

Suponha que d é sobrejetora, e seja {Pk}k2K uma partição de I com |K| < |M |+.Assim, temos |K| 6 |M | e existe uma injeção do tipo K ! M , de modo que podemosassumir que K é um subconjunto de M . Seja f : I !M a função definida por

f (i) := k se i 2 Pk.

Como d é sobrejetora, existe um a 2M com

d (a) = lim

M,Ua = lim

M,Uf (i),

resultando em f�1 h{a}i 2 U , f�1 h{a}i 6= ;, a 2 Im (f) = K, e

Pa = f�1 h{a}i 2 U .

Portanto, pela Proposição 3.59, o ultrafiltro U é |M |+-completo.

3.8 A Ultrapotência ⇤R

Nesta seção, assumiremos que I = N e que o ultrafiltro U em N é não principal.Como C é livre, o Lema do Ultrafiltro implica que ultrafiltros desse tipo existem em N.Também assumiremos que o conjunto dos números reais, R, está munido de suaLAO-estrutura usual de corpo ordenado.

Definição 3.61. A ultrapotênciaY

U

R é dita ser o corpo ordenado dos números

hiper-reais, e ela é denotada por ⇤R. Pelo Corolário 3.46, tal estrutura é um corpoordenado que estende R. Assim como fizemos na Seção 1.10, identificaremos os elementosda imagem da imersão canônica d : R ! ⇤R com os números reais, e, por abuso delinguagem, escreveremos R ⇢ ⇤R. Além disso, denotaremos a adição, a multiplicação e aordem em ⇤R por +, · e <, respectivamente.

Notação 3.62 (Limites Generalizados em ⇤R).

• Se A é um subconjunto de R, então o ultralimite integral limR,U

A é denotado por ⇤A

e é chamado de ⇤-transformação de A;

101

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• Se A1A2 . . . An são subconjuntos de R, e se R ⇢ A1 ⇥ A2 ⇥ · · ·⇥ An é uma relaçãon-ária, então ultralimite relacional

lim

R,UR ⇢ ⇤A1 ⇥ ⇤A2 ⇥ · · ·⇥ ⇤An

é denotado por ⇤R e é chamado de ⇤-transformação de R.

Exemplo 3.63. A adição, a multiplicação e a ordem na ultrapotência ⇤R são respectiva-mente iguais aos ultralimites relacionais da adição, da multiplicação e da ordemem R (Seção 3.4).

Exemplo 3.64. A ⇤-transformação do conjunto vazio, ⇤;, é igual ao conjuntovazio (Exemplo 3.28).

Pela Proposição 3.29, os limites integrais ⇤N, ⇤Z, ⇤Q e ⇤Irr são cópias das respec-tivas ultrapotências

Y

U

N,Y

U

Z,Y

U

Q eY

U

Irr, e, assim como fizemos no Capítulo 2,

chamaremos os elementos desses conjuntos de números hipernaturais, númeroshiperinteiros, números hiper-racionais e números hiperirracionais, respectivamente.Nota-se que as ultrapotências mencionadas têm os mesmos traços estruturais dos respec-tivos limites integrais que elas espelham em ⇤R.

Exemplo 3.65. Seja {qn} a sequência definida na Seção 1.9, e considere o número hiper-real w dado pelo ultralimite w :

= lim

R,Uqi. Claramente, temos qi 2 Q (8i), e, pela definição

dos limites integrais, temos w 2 ⇤Q. Assim, w é um número hiper-racional mesmo sendogerado por uma sequência cujo limite em R é um número irracional.

Exemplo 3.66. Considere o número hiper-real h dado pelo ultralimite h :

= lim

R,U1/i. Como

0 < 1/i (8i), temos 0 < lim

R,U1/i = h, e se n 2 N, então teremos

nh =

n vezesz }| {

h+ · · ·+ h

= lim

R,U

n vezesz }| {

1 + · · ·+ 1

i

= lim

R,U

n

i

< 1,

visto que (n,1)N 2 C ⇢ U . Portanto, h é um infinitesimal positivo em ⇤R, e h�1 éinfinito (Teorema 1.18). Analogamente, nota-se que o ultralimite lim

R,U

p2/i é um número

hiperirracional positivo e infinitesimal. Provamos, assim, o teorema a seguir.

Teorema 3.67. O corpo ordenado dos números hiper-reais é não arquimediano.

102

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Exemplo 3.68. Considere o número hiper-real u dado pelo ultralimite u :

= lim

R,U(�1)i.

Pelo Axioma (U’) (Seção 3.5), temos que ou (�1)i = 1 q.t.p. ou (�1)i = �1 q.t.p.,resultando em ou u = 1 ou u = �1. Como os conjuntos ordenados 2N e 2N � 1 sãodirecionados pela direita e não possuem um maior elemento, é possível escolher oultrafiltro não principal U em N de modo que cada uma dessas duas alternativasvigora (Exemplo 3.44).

Exemplo 3.69. Considere a sequência {cos (i)}i>1

, onde os ângulos nos argumentos dafunção cosseno são dados em radianos. Se m e n forem números naturais comcos (m) = cos (n), então existirá um número inteiro k com m ± n = 2⇡k. Nesse caso, sek 6= 0, então o número ⇡ será racional, o que é absurdo, implicando que k = 0 e m = n.Assim, a sequência {cos (i)}i>1

é injetora, e, como o ultrafiltro U em N é não principal,temos que o ultralimite lim

R,Ucos (i) não é um número real em ⇤R.

Como ⇡ é um número irracional, temos cos (i) 6= ±1 (8i). Provaremos que oconjunto {cos (i)}i>1

é denso em [�1, 1]R. Sejam a, b 2 [�1, 1]R com a < b, e seja u umnúmero real com cos (u) = (a+b)/2. Como a função cosseno é contínua, teremos que existeum número real positivo h tal que

|x� u| < h)�

cos (x)� a+ b

2

<b� a

2

para todo número real x, e, como o conjunto Z+2⇡Z é denso em R (Exemplo 1.5), existemnúmeros inteiros n e k tais que |n+ 2⇡k � u| < h e

cos (|n|)� a+ b

2

=

cos (n+ 2⇡k)� a+ b

2

<b� a

2

,

resultando em a < cos (|n|) < b, e provando que {cos (i)}i>1

é denso em [�1, 1]R.

Seja r 2 [�1, 1]R qualquer, seja {ni}i>1

uma sequência injetora de números naturaistal que |cos (ni)� r| < 1/i para cada índice i 2 N, e considere que U é um ultrafiltro nãoprincipal em N que contém o filtro Z{ni}i>1 (Exemplo 3.44). Para cada número naturalpositivo k, temos

�1

k< lim

R,U(cos (i)� r) <

1

k,

implicando em lim

R,Ucos (i) ⇠ r. Portanto, para cada r 2 [�1, 1]R existe um ultrafiltro não

principal U em N tal que o número hiper-real limR,U

cos (i) é infinitamente próximo a r.

O corpo ordenado dos números hiper-reais satisfaz à letra (e) do Teorema 2.3 parasubconjuntos de R:

Corolário 3.70. Se A for um subconjunto de R, então A ⇢ ⇤A, e se além disso A forinfinito, então A ( ⇤A.

103

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Demonstração. A prova da inclusão A ⇢ ⇤A é imediata. Suponha que A é infinito.Assim, temos !

1

6 |A|+, e, como U é !1

-incompleto (Proposição 3.57), o ultrafiltro Ué |A|+-incompleto, resultando que a imersão canônica e : A !

Y

U

A não é sobrejetora

(Proposição 3.60). Seja u :

Y

U

A! ⇤A a bijeção canônica (Proposição 3.29). Portanto, a

composição u � e : A! ⇤A não é sobrejetora, e, como (u � e) (x) = d (x) (8x 2 A), existeum elemento de ⇤A que não é da forma d (x) para x 2 A.

O Teorema de Łoś (Teorema 3.45) implica na seguinte variante do Princípioda Transferência:

Corolário 3.71 (Princípio da Transferência; PT - Versão paraY

U

R). Para toda

LAO-fórmula � (x1

. . . xn) e para quaisquer a1

. . . an 2 R, temos

R |= � [a1

. . . an], ⇤R |= � [a1

. . . an] ,

ou seja, ⇤R é uma extensão elementar de R. Em particular, temos

R |= �, ⇤R |= �

para toda LAO-sentença �, ou seja, os corpos ordenados R e ⇤R sãoelementarmente equivalentes.

A versão informal do Princípio da Transferência com a qual operamos no Capítulo2 é mais abrangente e aplicável que a do Corolário 3.71. Essa disparidade dá-se, primei-ramente, pelo fato de que nesta seção definimos apenas as ⇤-transformações dos númerosreais, dos conjuntos de números reais e das relações n-árias em R, deixando indetermi-nada a concepção da ⇤-transformação de um R-objeto qualquer, a qual foi postulada noTeorema 2.3. Ademais, na Seção 2.3 permitimos que o símbolo da relação de pertinência,2, aparecesse nas condições matemáticas, e isso nos possibilitou trabalhar com condiçõesmatemáticas mais expressivas que as consideradas na lógica de primeira ordem, como,por exemplo, as sentenças de segunda ordem.8

8 Embora as condições matemáticas especificadas na Seção 2.3 sejam fórmulas de primeira ordem,algumas delas têm aspecto de fórmulas de segunda ordem. A título de exemplo, na sentença verdadeira

(8S 2 P (R)) (8x 2 R) (x 2 S _ x 62 S)

há uma quantificação sobre os subconjuntos de R típica das sentenças da lógica de segunda ordem.

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4Monomorfismos Não Standard

No Capítulo 2, trabalhamos informalmente com a concepção de um monomorfismonão standard ⇤ (Teorema 2.3), uma função que origina uma conexão lógica entre doisterrenos matemáticos: os objetos relacionados a R e os objetos relacionados a ⇤R. Veremosneste capítulo que essa ideia pode ser adequadamente formalizada mediante os conceitosda Teoria dos Modelos (Apêndice A), e ela não é aplicável apenas à extensão do conjuntodos números reais para o conjunto dos números hiper-reais: ela pode ser utilizada paraconectar o universo relacionado a um conjunto X qualquer ao universo relacionado a umconjunto ⇤X associado. Dessa forma, os resultados do Capítulo 2 correspondem ao casoespecial X = R, e outras escolhas de X são proveitosas em diversas outras áreas daMatemática como a Topologia, a Teoria das Probabilidades, a Análise Funcional,a Teoria das Medidas, etc.

4.1 X!-Objetos

Vimos no Capítulo 2 que a classe dos objetos relacionados a R (ou ⇤R) é igual aouniverso de von Neumann, V, tornando a definição desses objetos supérflua e infrutífera.Nesta seção, desenvolveremos uma noção similar à que foi elaborada na Seção 2.2, a qualconfina os objetos definidos em uma classe não própria (i.e., um conjunto). O leitor éencorajado a comparar as definições e os resultados apresentados nesta parte com os daSeção B.5.

Pelo restante desta dissertação, assumiremos que X é um conjunto qualquer.

Definição 4.1. Denotaremos por

X0

X1

. . . Xn . . . X!

a sequência de conjuntos definida recursivamente (Teorema B.21) da seguinte maneira:

• X0

:

= X;

• Xn+1

:

= Xn [ P (Xn) (8n < !) ;

• X! :

=

[

n<!

Xn.1

Os índices dessa sequência são os ordinais finitos e o ordinal infinito ! (Seção B.3). Temosas seguintes terminologias e notações:1 O Teorema B.21 permite que a sequência dos X↵ seja estendida para qualquer índice ↵ em On. Para

os propósitos da Análise Não Standard, será suficiente lidar apenas com a parte dessa sequência cujosíndices são menores ou iguais a !.

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• Os elementos de X! são chamados de X!-objetos;

• Cada conjunto Xn com n 6 ! é dito ser o n-ésimo nível de X!, e dizemos quecada elemento de Xn tem nível n em X!;

• Os elementos de X, os quais são os X!-objetos de nível 0, são chamados de átomosem X! ou X!-átomos;

• Cada diferença Xn�X com n 6 ! é denotada por2 Xn e é dita ser o n-ésimo nívelde X!. Os elementos de X! são chamados de conjuntos em X! ou X!-conjuntos,e dizemos que cada elemento de Xn tem nível n em X!.

As sequências {Xn} e {Xn} são crescentes em relação à inclusão, e temos X0

= ;,Xn ⇢ Xn (8n 6 !), e X! 62 X!. O Teorema B.21 assegura que as classes Xn com n 6 !

não são próprias.

A recursividade da Definição 4.1 nos permitirá construir o monomorfismo nãostandard ⇤ em níveis

⇤0

⇢ ⇤1

⇢ ⇤2

⇢ . . . ,

de modo que cada função ⇤n será do tipo Xn ! Yn e ⇤ será a extensão das funções dessasequência (Seção 5.2).

Exemplo 4.2. Prova-se facilmente por indução sobre n > 1 que se o conjunto X forfinito, então todo X!-conjunto de nível n será finito, implicando que todo X!-conjuntoserá finito.

Exemplo 4.3. Nota-se que as sequências ;0

;1

. . . ;! e V0

V1

. . .V! são definidas da mesmamaneira (Seção B.5), resultando em ;n = Vn (8n 6 !). Para qualquer conjunto X temos; ⇢ X e ;n ⇢ Xn (8n 6 !).

O conjunto vazio, ;, pertence ao nível X1

em X!, mas ele também pode ser umX!-átomo. Também pode ocorrer de algum X!-átomo ter elementos que pertencem aoconjunto X!. Nesta seção, veremos que esses casos são indesejáveis e inconvenientes, e,por conseguinte, nos ateremos a trabalhar com conjuntos X que não têm tais especifici-dades. Na Seção 5.1, uma maneira de superar essa limitação será apresentada, de modoque poderemos lidar com qualquer conjunto X (ou pelo menos com uma cópia dele) naconstrução do monomorfismo não standard ⇤ : X! ! Y!.2 Embora a notação para o n-ésimo nível de X! seja idêntica à notação para o produto cartesiano

n vezesz }| {

X ⇥X ⇥ · · ·⇥X,

o autor providenciará contextos suficientemente claros para que o leitor tenha ciência de qual objetomatemático a notação Xn representa.

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Definição 4.4. Dizemos que um conjunto X é um conjunto base se ; 62 X e

x \X! = ; (8x 2 X) .

Se X for um conjunto base, então o conjunto vazio será um X!-conjunto, e todoX!-objeto ou será um X!-átomo ou um X!-conjunto.

Exemplo 4.5. O conjunto vazio, ;, é um conjunto base.

Exemplo 4.6. Se x \ ;! 6= ; para algum x 2 X, então X não será um conjunto base,visto que ;! ⇢ X! (Exemplo 4.3).

As condições que determinam que um conjunto X é um conjunto base são regu-larmente utilizadas para demonstrar que alguns X!-objetos não são X!-átomos. A títulode exemplo, se X for um conjunto base, e se a

1

. . . an forem X!-objetos, então o conjunto{a

1

. . . an} não será um X!-átomo, visto que

{a1

. . . an} \X! = {a1

. . . an} 6= ;.

Prova-se diretamente por indução sobre n que a n-tupla (a1

. . . an) é um X!-conjunto.

Até o final deste capítulo, admitiremos que X é um conjunto base.

Proposição 4.7. Para cada número natural n, temos Xn= P (Xn�1

) .

Demonstração. Temos P (Xn�1

) ⇢ Xn, e se x 2 X \ P (Xn�1

), então, como X é umconjunto base, teremos x 6= ;, e existirá um y 2 x ⇢ Xn�1

, resultando em y 2 X!, o queé absurdo visto que x \X! = ;. Portanto, provamos que P (Xn�1

) ⇢ Xn, e provaremosa inclusão oposta por indução sobre n. O resultado é imediato para n = 1. Suponhaque ele é verdadeiro para um número natural n, e tome A 2 Xn+1. Temos A 2 Xn ouA 2 P (Xn). No primeiro caso, a hipótese de indução implica em A ⇢ Xn�1

⇢ Xn. Assim,em ambos os casos temos A 2 P (Xn), finalizando a indução.

Temos Xn = X [P (Xn�1

) para cada número natural n, onde tal união é disjunta.Para cada número natural n, as condições A 2 Xn e A ⇢ Xn�1

são equivalentes, e se todoelemento de A for um X!-conjunto, então as condições A 2 Xn e A ⇢ Xn�1

serão equivalentes.

Teorema 4.8 (Propriedades de X!). Seja n < !. Temos:

(a) Se A 2 Xn então P (A) 2 Xn+1

;

(b) Se S ⇢ A 2 Xn, então S 2 Xn;

(c) Se ; 6= A ⇢ X!, entãoT

A 2 X!;

(d) Se A for um X!-conjunto de níveln cujos elementos são X!-conjuntos,então

S

A 2 Xn�1;

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(e) Se A,B 2 Xn, então A� B 2 Xn; (f) Se A,B 2 Xn, então A⇥ B 2 Xn+2;

Seja a1

a2

. . . am uma sequência finita de X!-objetos com m > 2.

(g) Teremos ai 2 Xn (8i) se, e somente se, {a1

a2

. . . am} 2 Xn+1

;

(h) Teremos a1

, a2

2 Xn e ai 2 Xn+2i�4

(8i > 3) se, e somente se, a m-tupla (a1

. . . am)

pertencer a Xn+2m�2

;

(i) Se A,B 2 Xn, se R ⇢ A⇥B, e se A ⇢ dom (R), então R,R�1 2 Xn+2 e R hAi 2 Xn.Em particular, toda função do tipo A! B será um X!-conjunto de nível n+ 2;

(j) Se R for uma relação binária em X! com R 2 Xn, e se A ⇢ dom (R), entãoo conjunto R será uma relação binária em Xn�3

, e as condições R�1 2 Xn eA,R hAi 2 Xn�2 serão verdadeiras;

(k) Se R e S forem relações binárias em Xn, então R � S 2 Xn+3

;

(l) Se {Ai}i2I for uma família de X!-conjuntos pertencente a Xn com I ⇢ X!,então

Y

i2I

Ai 2 Xn+1.

Demonstração.

(a) Temos A ⇢ Xn�1

, e todo subconjunto de A é um subconjunto de Xn�1

, resultandoem P (A) ⇢ P (Xn�1

) ⇢ Xn e P (A) 2 Xn+1.

(b) Temos S ⇢ A ⇢ Xn�1

e S 2 Xn.

(c) Se A 2 A com A 2 Xm (m < !), então teremosT

A ⇢ A ⇢ Xm�1

eT

A 2 Xm.

(d) Temos A ⇢ Xn�1 e A ⇢ Xn�2

(8A 2 A), resultando emS

A ⇢ Xn�2

eS

A 2 Xn�1.

(e) Temos A� B ⇢ A ⇢ Xn�1

, implicando em A� B 2 Xn.

(f) Como A⇥ B ⇢ P (P (A [B)), o resultado segue pelas letras (a) e (d).

(g) Basta observar que as condições {a1

a2

. . . am} 2 Xn+1 e {a1

a2

. . . am} ⇢ Xn

são equivalentes.

(h) Provaremos o resultado desejado por indução sobre m. Se a1

, a2

2 Xn, então osconjuntos {a

1

} e {a1

, a2

} pertencerão a Xn+1, e teremos

(a1

, a2

) = {{a1

} , {a1

, a2

}} 2 Xn+2

= Xn+2·2�2.

Reciprocamente, se (a1

, a2

) 2 Xn+2, então, pela letra (g), os conjuntos {a1

} e{a

1

, a2

} pertencerão a Xn+1

, e, como X é um conjunto base, tais conjuntos serão

108

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X!-conjuntos de nível n + 1, resultando em a1

, a2

2 Xn e provando que a equiva-lência desejada é válida no caso m = 2. Suponha que ela é válida para um númeronatural m > 2 qualquer, e considere o caso em que a sequência dos ai tem m + 1

elementos. Se a1

, a2

2 Xn e ai 2 Xn+2i�4

(8i > 3), então teremos am+1

2 Xn+2m�2

e (a1

. . . am) 2 Xn+2m�2 pela hipótese de indução, implicando em

(a1

. . . amam+1

) = ((a1

. . . am) , am+1

) 2 Xn+2m�2+2

= Xn+2(m+1)�2

como vimos no caso m = 2. A prova da implicação recíproca é análoga, finalizandoa indução.

(i) Temos R hAi ⇢ B ⇢ Xn�1

. Pela letra (f), os produtos cartesianos A ⇥ B e B ⇥ A

estão contidos em Xn+1

, e, consequentemente, as relações R e R�1 também estão.

(j) Todo elemento de R é um X!-conjunto, e se (x, y) 2 R ⇢ Xn�1, então x, y 2 Xn�3

pela letra (h). Assim, os conjuntos A e R hAi estão contidos em Xn�3

, a relaçãoinversa R�1 é uma relação binária em Xn�3

, e, como Xn�3

2 Xn�2, pela letra (f)

temos R�1 ⇢ Xn�1

.

(k) Como Xn 2 Xn+1 eR �H ⇢ Xn ⇥Xn 2 Xn+3,

pela letra (f) temos R �H 2 Xn+3.

(l) Pela letra (j), os conjuntos I e {Ai}i2I têm nível n � 2 em X!, e, pela letra (d),temos

[

i2I

Ai 2 Xn�3. Como

Y

i2I

Ai ⇢ P

I ⇥[

i2I

Ai

!

,

o resultado segue pelas letras (a) e (f).

Note que X! satisfaz às condições 1, 2 e 3 da definição indutiva apresentada naSeção 2.2, mas a condição 4 não é observada, ou seja, existem uniões de X!-conjuntosque não são X!-conjuntos. Por exemplo, o conjunto X! é a união dos níveisX

0

X1

X2

. . . , e temos X! 62 X! (Teorema B.5). Para que uma união de X!-conjuntos sejaum X!-conjunto, a coleção das classes envolvidas nessa união deve formar um X!-conjunto(Teorema 4.8, Letra (d)).

Pela letra (h) do Teorema 4.8, nota-se que se a1

. . . am 2 X! (com m > 2) e se am-tupla (a

1

. . . am) pertencer a Xk, então cada ai pertencerá ao (k � 2)-ésimonível em X!.

109

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Podemos hierarquizar os X!-objetos de acordo com o menor nível que cada ele-mento aparece na sequência dos Xn. Temos, assim, a seguinte definição:

Definição 4.9. Seja x 2 X!. O posto de x em X!, denotado por postoX!(x), é o menor

número inteiro n > �1 tal que x 2 Xn+1

.

Apenas os átomos têm posto �1, e, para cada número inteiro não negativo n, oconjunto dos X!-objetos de posto n é dado pela diferença

Xn+1

�Xn = Xn+1 �Xn,

a qual tem posto n + 1 em X!. Como assumimos que X é um conjunto base, temosposto (;) = posto (X) = 0.

Proposição 4.10. Se A for um X!-conjunto não nulo, então

postoX!(A) = sup

postoX!(a) + 1

... a 2 A

.

Demonstração. Seja n o posto de A em X!, e seja N :

=

postoX!(a) + 1

... a 2 A

. Assim,

temos A 2 Xn+1 e A ⇢ Xn, resultando que se a for um elemento de A, então

postoX!(a) + 1 6 (n� 1) + 1 = n = postoX!

(A) ,

ou seja, o número n é uma cota superior de N em Z. Suponha que m é uma cota superiorde N com m < n. Se a 2 A, então postoX!

(a)+1 6 m e a 2 Xm, resultando em A ⇢ Xm,A 2 Xm+1 e n+ 1 6 m+ 1, o que é absurdo, provando que n é a menor cota superior deN em Z.

A função dada por x 7! postoX!(x) com domínio X! é crescente com respeito à

relação de pertinência.

Corolário 4.11. Se a, b 2 X! com a 2 b, então

postoX!(a) < postoX!

(b) .

Exemplo 4.12. Se Y :

= {;, {;}}, então Y não é um conjunto base. Nesse caso, temos

postoY!({;}) = �1 6= 0 = sup

postoY!(a) + 1

... a 2 {;}�

epostoY!

(;) = �1 = postoY!({;}) ,

mostrando que a Proposição 4.10 e o Corolário 4.11 não seriam necessariamente válidoscaso X não fosse um conjunto base.

110

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4.2 Monomorfismos Não Standard

O conceito de X!-objeto (Definição 4.1) e a ideia de satisfatibilidade deuma L✏-estrutura sobre uma L✏-fórmula com parâmetros (Definição A.34) viabilizam aelaboração de uma caracterização formal e generalizada da noção de monomorfismo nãostandard apresentada na Seção 2.4. Para isso, as condições relacionadas a X (Seção 2.3)são substituídas por L✏-fórmulas com quantificadores limitados (Definições A.14 e A.16),e a noção de verdade ou falsidade de uma condição é manifestada por condições da formaM |= �, onde as L✏-estruturas M utilizadas são definidas a seguir.

Definição 4.13. A L✏-estrutura (X!,EX!) é chamada de superestrutura com átomosem X e é denotada por V (X).

Como todo conjunto finito de elementos de X! está contido algum nívelXn, podemos aplicar livremente várias notações que reduzem a aparência das fórmulasconsideradas, tais como as Notações A.29, A.30 e A.31. Isso nos permitirá representarem L✏-fórmulas com quantificadores limitados os conjuntos finitos, as n-tuplas ordenadas,as imagens de funções sobre elementos dos seus domínios, os tipos de funções e diversasoutras noções e operações conjuntistas.

Observação 4.14. Por efeito de X ser um conjunto base, é impossível manifestar comalguma relevância as propriedades internas dos X!-átomos por meio de condições da formaV (X) |= �, embora, tecnicamente, eles sejam conjuntos em NBG. A título de exemplo, se� (x) for uma L✏-fórmula e se a for um X!-átomo, então a condição V (X) |= (8x 2 a)� (x)

será verdadeira por vacuidade, visto que ela equivale a afirmar

(8x 2 X!) (x 62 a _ � (x))

e temos a\X! = ;. De fato, as condições da forma x 2 a para a 2 X sempre terão valorlógico de falsidade sob a interpretação da L✏-estrutura V (X), ou seja, os átomos em umasuperestrutura comportam-se como se eles não possuíssem estrutura interna.

Definição 4.15. Seja Y um conjunto base. Uma função ⇤ : X! ! Y! é dita ser ummonomorfismo não standard se ela satisfaz às seguintes condições:

(Mon1) ⇤ (X) = Y ;

(Mon2) Para todo subconjunto infinito A de X, teremos ⇤ hAi ( ⇤ (A) ;

(Mon3) (Princípio da Transferência; PT) Para toda L✏-fórmula � (x1

. . . xn) com quan-tificadores limitados (Definição A.16), temos

V (X) |= � [a1

. . . an], V (Y ) |= � [⇤ (a1

) · · · ⇤ (an)]

para quaisquer a1

. . . an 2 X!.

111

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O PT implica que a função ⇤ é uma imersão do tipo V (X) ! V (Y ) que não éuma imersão elementar (Definição A.42). Em particular, ⇤ é injetora. A Notação 2.4 seránovamente posta em uso para representar as imagens de ⇤ sobre X!-objetos.

O digrafo SupEstr cuja classe de objetos é dada por⇢

V (X)

...X é um conjunto base�

e cujas setas são os monomorfismos não standard entre superestruturas forma uma cate-goria grande3 tal que todos os morfismos de SupEstr são mono4, elucidando a escolha donome atribuído às funções que satisfazem aos axiomas (Mon1)-(Mon3).

O único exemplo concreto de um monomorfismo não standard que veremos nestetrabalho será construído ao longo do Capítulo 5. Tal construção é indubitavelmente a maissimples possível, mas existem diversas outras, incluindo algumas que são caprichosamenteprojetadas para que a função ⇤ obtida observe propriedades extras desejáveis.

Até o final deste capítulo, assumiremos que ⇤ é um monomorfismo não standardcujo domínio é a superestrutura V (X). Em virtude do axioma (Mon1), podemos dizerque ⇤ é do tipo V (X)! V (

⇤X).

Notação 4.16. Se n 6 ! for um ordinal, o n-ésimo nível da superestrutura V (

⇤X) serádenotado por ⇤Xn. Tal notação não deve ser confundida com a ⇤-transformaçãodo n-ésimo nível em X!, a qual será consistentemente denotada por ⇤

(Xn) a fim de evitarambiguidades notacionais.

Notação 4.17. Ao lidarmos com os axiomas (Mon1)-(Mon3) dos monomorfismos não stan-dard ⇤ : V (X) ! V (

⇤X), apenas duas L✏-estruturas serão de interesse, e.g. V (X)

e V (

⇤X). Por tal motivo, convém simplificar a notação para as condições das formasV (X) |= � e V (

⇤X) |= �, as quais serão respectivamente denotadas por |= � e ⇤ |= �

neste capítulo.

Se x for um X!-átomo (resp. X!-conjunto), então teremos |= x 2 X (resp.|= x 62 X), resultando em ⇤ |= ⇤x 2 ⇤X (resp. ⇤ |= ⇤x 62 ⇤X), ou seja, ⇤x será um⇤X!-átomo (resp. ⇤X!-conjunto).

Como ⇤ é uma imersão entre L✏-estruturas, seria razoável identificar cadaX!-objeto com a sua ⇤-transformação. Porém, a identificação de um X!-conjunto A como ⇤X!-conjunto ⇤A pode gerar muitas complicações e despropósitos, uma vez que, emgeral, os conjuntos A e ⇤A apresentam traços estruturais consideravelmente discrepantes,tornando, assim, inquietante a ideia de denotá-los pelos mesmos símbolos. Seria incabíveldenotarmos o conjunto dos números hiper-reais pelo símbolo R, por exemplo. Além3 Uma categoria é dita ser grande se a classe dos seus objetos for uma classe própria.4 Um morfismo f : A! B em uma categoria C é dito ser mono se, para quaisquer morfismos

u, v : C ! A em C, a condição f � u = f � v implica u = v.

112

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disso, o ⇤X!-conjunto ⇤ hAi é uma cópia5 de A, tornando-o um candidato mais pertinenteem ⇤X! para ser identificado com A. Não há inconveniência alguma, no entanto, emidentificar cada X!-átomo a com a sua ⇤-transformação ⇤a, visto que os átomos sãodesprovidos de estrutura interna sob a interpretação da superestrutura na qual estãoinseridos (Observação 4.14). Assim, adotaremos a seguinte notação:

Notação 4.18. Cada X!-átomo será identificado com a sua respectiva ⇤-transformação,e escreveremos

a =

⇤a (8a 2 X) .

Decorre dessa notação a identificação de cada subconjunto S de X com a imagem ⇤ hSi,a qual está contida em ⇤X.

Notação 4.19. Quando considerarmos que o conjunto X é infinito, adotaremos uma in-jeção6 fixa do tipo Z ! X e identificaremos a imagem dessa função com o conjunto dosnúmeros inteiros. Assim, escreveremos Z ⇢ X, e, em virtude da Notação 4.18, tambémescreveremos Z ⇢ ⇤X. Como os produtos cartesianos da forma Zn são X!-conjuntos e⇤X!-conjuntos (Teorema 4.8, Letra (f)), temos que qualquer relação n-ária em Z é umX!-conjunto e um ⇤X!-conjunto.

No Capítulo 2, tratamos informalmente do caso X = R, ou seja, investigamos osmonomorfismos não standard do tipo ⇤ : R! !⇤ R!. A tabela a seguir resume a correlaçãoexistente entre os conceitos desenvolvidos neste capítulo e no Teorema 2.3.

Tabela 4 – Correspondências entre os postulados do Teorema 2.3 e os axiomas, convençõese teoremas do Capítulo 4.

Postulado Axioma/convenção ObservaçãoLetra (a) dom (⇤) = R! Os objetos relacionados a R (resp. ⇤R) foram

substituídos pelos R!-objetos (resp. ⇤R!-objetos).Letra (b) Im (⇤) ⇢ ⇤R!

Letra (c) Notação 4.18 A igualdade ⇤x = x para x 2 R passoua ser uma identificação notacional.

Letra (d) (Mon1) —Letra (e) Corolário 4.28 —

Letra (f) (Mon3)

As condições completamente abertas relacionadasa R foram substituídas pelas L✏-fórmulas, as quais

são avaliadas via relação de satisfatibilidadesobre superestruturas.

Nas seções a seguir, averiguaremos que os demais postulados consideradosno Capítulo 2, viz. a letra (e) do Teorema 2.3 e os Teoremas 2.9, 2.26, 2.27 e 2.31, sãoconsequências de outras definições e dos axiomas (Mon1)-(Mon3).5 A restrição ⇤ �A: A! ⇤hAi é uma bijeção.6 A imersão de Z em X é suficiente para os propósitos deste capítulo, mas poderíamos ter fixado uma

injeção Q! X, visto que os conjuntos Z e Q são equipotentes.

113

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4.3 Objetos Internos e Externos

Duas categorizações para os ⇤X!-objetos são indispensáveis no estudo dos mono-morfismos não standard.

Definição 4.20.

1. Um ⇤X!-objeto é dito ser standard se ele pertence à imagem Im (⇤) do monomor-fismo não standard ⇤. Caso contrário, dizemos que ele é não standard;

2. Um ⇤X!-objeto é dito ser interno se ele pertence a algum ⇤X!-objeto standard.Caso contrário dizemos que ele é externo.

Todo objeto standard é interno, e, em particular, todo ⇤X!-átomo é interno. Comoas ⇤-transformações dos X!-átomos são ⇤X!-átomos, e como ⇤X é um conjunto base,temos que um ⇤X!-objeto a é interno se, e somente se, existe um X!-conjunto A tal quea 2 ⇤A. Veremos que se X for finito, então todo ⇤X!-objeto será standard (Exemplo4.33). Diversos exemplos de objetos standard, não standard, internos e externos forammostrados no Capítulo 2.

Proposição 4.21. O conjunto dos ⇤X!-objetos internos é dado pela união[

n<!

⇤(Xn).

Demonstração. Como Xn 2 X!(8n < !), todo elemento da união do enunciado é interno.

Suponha que a é um ⇤X!-objeto interno. Assim, existe um B 2 Xm com m < ! tal quea 2 ⇤B. Como |= (8x 2 B) x 2 Xm�1

, pelo PT temos ⇤ |= (8x 2 ⇤B) x 2 ⇤(Xm�1

),implicando em

a 2 ⇤(Xm�1

) ⇢[

n<!

⇤(Xn) .

Notação 4.22.

• Semelhantemente à maneira como fizemos no Capítulo 2, denotaremos por I! oconjunto

[

n<!

⇤(Xn) dos ⇤X!-objetos internos;

• Cada imagem ⇤(Xn) com n < ! é dita ser o n-ésimo nível de I! e é denotada por

In. Dizemos que cada elemento de In tem nível n em I!;

• Cada diferença In � ⇤X com n 6 ! é denotada por In. Dizemos que cada elementode In tem nível n em I!.

Claramente, temos I0

=

⇤X, I0 = ;, e, como

|= (8x 2 Xn) (x 62 X ! x 2 Xn) ,

114

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temos In =

⇤(Xn

). Para um n < !, aplicando o PT às condições verdadeirasXn, X

n 2 Xn+1 e Xn ⇢ Xn ⇢ Xn+1

obtém-se In, In 2 In+1 e In ⇢ In ⇢ In+1

.

Haja vista que|= (8A 2 Xn

) (8x 2 A) x 2 Xn�1

,

temos que a condição A 2 In implica A ⇢ In�1

, e se todo elemento de A

for um ⇤X!-conjunto, então a a condição A 2 In implicará A ⇢ In�1. Em particular,todo elemento de um conjunto interno é interno, solidificando a validez do Teorema 2.26.Existem subconjuntos de In�1

que não pertencem a In, e.g. no caso X = R temos que Ré um subconjunto externo de ⇤R = I

1�1

(Corolário 2.35).

Observação 4.23. Analogamente à demonstração da letra (h) do Teorema 4.8, prova-seque se a

1

a2

. . . am forem ⇤X!-objetos tais que a m-tupla ordenada (a1

a2

. . . am) pertenceao nível In com n < !, então cada ai pertencerá ao nível In�2

.

Com tais decorrências da Definição 4.20, temos as ferramentas necessárias parademonstrar a versão formal do Teorema 2.27.

Teorema 4.24 (Princípio da Definição Interna; PDI). Seja

� (x1

. . . xn, y1 . . . yp)

uma L✏-fórmula com quantificadores limitados, seja R uma relação n-ária em ⇤X! comR 2 Im (m < !), e sejam a

1

. . . ap 2 Ik (k < !). O conjunto

S :

=

(t1

. . . tn) 2 R... ⇤ |= � (t

1

. . . tn, a1 . . . ap)

tem nível m em I!.

Demonstração. Se H for uma relação n-ária em X! com H 2 Xm, e se (t1

. . . tn) 2 H,então, como cada elemento de H é um X!-conjunto, teremos H ⇢ Xm�1,(t

1

. . . tn) 2 Xm�1, cada coordenada ti pertencerá a Xm�3

(Teorema 4.8, Letra (h)), epara quaisquer c

1

. . . cp 2 Xk teremos⇢

(t1

. . . tn) 2 H... |= � (t

1

. . . tn, c1 . . . cp)

2 Xm.

Assim, a condição

|= (8H 2 Xm) (8y

1

. . . yp 2 Xk) (9I 2 Xm) (I,Xm�1

, H, y1

. . . yp, Xm�3

)

é verdadeira, onde a L✏-fórmula (I, U,H, y1

. . . yp, V ) é lida informalmente como

“I =

(t1

. . . tn) 2 H... |= � (t

1

. . . tn, y1 . . . yp)

115

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e é dada formalmente por

(8u 2 U) [u 2 I ! (u 2 H ^ (9x1

. . . xn 2 V ) (u = (x1

. . . xn) ^ � (x1

. . . xn, y1 . . . yp)))].

Pelo PT, existe um I 2 Im tal que ⇤ |= (I, Im�1

, R, a1

. . . ap, Im�3

). Claramente temosI ⇢ S, e se (t

1

. . . tn) for uma n-tupla ordenada pertencente a S, então, como cadaelemento de R é um ⇤X!-conjunto, teremos S ⇢ R ⇢ Im�1 e cada ti pertencerá a Im�3

(Observação 4.23), resultando em (t1

. . . tn) 2 I e provando que S = I 2 Im.

Ao aplicarmos o PDI no caso n = 1 e m > 1, basta assumirmos que R é o nívelIm�1

em I!.

Teorema 4.25 (Propriedades Conjuntistas dos Objetos Internos).

(a) Se a1

a2

. . . am 2 In, então {a1

a2

. . . am} 2 In+1 e (a1

a2

. . . am) 2 In+2m�2

;

(b) Se A ⇢ I! e A 2 In, entãoS

A,T

A 2 In�1

;

(c) Se A,B 2 In, então A [ B,A \ B,A� B 2 In;

(d) Se A,B 2 In, então A⇥ B 2 In+2

;

(e) Se R for uma relação binária em ⇤X! pertencente a In, e se P for um subcon-junto interno de dom (R), então R será uma relação binária em In�3

, os conjuntosdom (R) e R hP i e terão nível n � 2 em I!, a relação inversa R�1 terá nível n emI!, e teremos

Q :

=

R h{x}i ...x 2 P

2 In+1.

Em particular, se f for uma função que é uma relação binária em ⇤X! pertencentea In, e se ↵ 2 dom (f), então f (↵) 2 In�3

;

(f) Se R e H forem duas relações binárias em ⇤X! pertencentes a In, então a composiçãoR �H terá nível n em I!;

(g) Se {Ai}i2I for uma família de ⇤X!-conjuntos pertencente a In com I 2 ⇤X! finito,então o produto cartesiano

Y

i2I

Ai terá nível n+ 2 em I!.

Demonstração. Sejam �1

�2

. . .�13

as seguintes L✏-fórmulas:

• �1

(x, y1

y2

. . . ym) := x = y1

_ x = y2

_ · · · _ x = ym;

• �2

(x, U)

:

= (9y 2 U) x 2 y;

• �3

(x, U)

:

= (8y 2 U) x 2 y;

• �4

(x, U, V )

:

= x 2 U _ x 2 V ;

• �5

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 2 V ;

116

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• �6

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 62 V ;

• �7

(x1

, x2

, U, V )

:

= x1

2 U ^ x2

2 V ;

• �8

(x, U, T ) := (9y 2 T ) (x, y) 2 U ;

• �9

(x, U,N)

:

= (9x 2 N) (x, y) 2 R;

• �10

(x1

, x2

, U)

:

= (x2

, x1

) 2 U ;

• �11

(x, U, V )

:

= (8y 2 x) y 2 V ^ (9u 2 U) (8y 2 V ) (y 2 x ! (u, y) 2 x) ;

• �12

(x1

, x2

, U, V, T ) := (9z 2 T ) ((x1

, z) 2 V ^ (z, x2

) 2 U) ;

• �13

(x, J, U, F )

:

= x : J ! U ^ (8j 2 J) x (j) 2 F (j) ,

onde aplicamos várias abreviações análogas às mencionadas nas Notações A.29, A.30 eA.31 para representar algumas dessas fórmulas.

(a) Como {a1

a2

. . . am} ⇢ In 2 In+1, o resultado {a1

a2

. . . am} 2 In+1 segue ao aplicar-mos o PDI à fórmula �

1

, e a condição (a1

a2

. . . am) 2 In+2m�2 é provada diretamentepor indução sobre m.

(b) Se A 2 A ⇢ In�1, então A ⇢ In�2

, implicando emS

A,T

A ⇢ In�2

2 In�1, e oresultado segue ao aplicarmos o PDI às fórmulas �

2

e �3

.

(c) Como A,B ⇢ In�1

, temos A [ B,A \ B,A� B ⇢ In�1

2 In, e o resultado segue aoaplicarmos o PDI às fórmulas �

4

,�5

e �6

.

(d) Temos A,B ⇢ In�1

. Se (x, y) 2 A ⇥ B, então x, y 2 In�1

e (x, y) 2 In+1 pela letra(a), implicando em A⇥B ⇢ In+1 2 In+2. Assim, o resultado segue ao aplicarmos oPDI à fórmula �

7

.

(e) Se (x, y) 2 R, então (x, y) 2 In�1, os conjuntos {x} e {x, y} terão nível n � 2 emI!, e teremos x, y 2 In�3

, resultando em dom (R) , R hP i ⇢ In�3

2 In�2. Assim,aplicando o PDI às fórmulas �

8

e �9

, temos dom (R) , R hP i 2 In�2, onde a variávelT deve ser substituída por In�3

em �8

e a variável N deve ser substituída por P

em �9

. Nesse caso, como (y, x) 2 In�1 pela letra (a), temos R�1 ⇢ In�1 2 In, e acondição R�1 2 In segue ao aplicarmos o PDI à fórmula �

10

.

Se x 2 P , então x e {x} serão internos, resultando que R h{x}i terá ní-vel n � 2 em I!. Assim, temos Q ⇢ In�2 2 In�1, e o resultado Q 2 In�1 segue aoaplicarmos o PDI à fórmula �

11

, onde as variáveis U e V devem ser substituídas porP e In�3

, respectivamente.

117

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(f) Pela letra (e), temos que R e H são relações binárias em In�3

, resultando emR �H ⇢ In�3

⇥ In�3

2 In pela letra (d). O resultado desejado segue ao aplicarmoso PDI à fórmula �

12

, onde a variável T deve ser substituída por In�3

.

(g) Seja f 2Y

i2I

Ai e seja (i, x) 2 f . Pela letra (e), temos I ⇢ In�3

e Ai 2 In�3

(8i 2 I),

resultando em Ai ⇢ In�2

(8i 2 I) e f ⇢ In�3

⇥ In�2

⇢ In. Como I é finito, temosque f é um conjunto finito de elementos de In, implicando em f 2 In+1 pela letra(a), e provando que

Y

i2I

Ai ⇢ In+1 2 In+2. O resultado segue ao aplicarmos o PDI à

fórmula �13

, onde a variável U deve ser substituída por In�2

.

Pela letra (a), temos que um ⇤X!-conjunto finito será interno se, e somente se,cada um dos seus elementos for interno.

Exemplo 4.26. Se A for um ⇤X!-conjunto interno e se b for um ⇤X!-objeto interno, entãoa função constante do tipo f : A ! {b} será interna, visto que f = A ⇥ {b} (Teorema4.25, Letras (a) e (d)).

Exemplo 4.27. Seja A um ⇤X!-conjunto interno de nível n em In, e considere a funçãoidentidade idA : A ! A. Como o produto cartesiano A ⇥ A é interno (Teorema 4.25,Letra (d)) e como idA ⇢ A⇥A, pelo PDI temos que idA é interna, visto que tal função édada por

idA =

(t1

, t2

) 2 A⇥ A... ⇤ |= t

1

= t2

.

Se existir um X!-conjunto infinito, então X será infinito (Exemplo 4.2), existiráuma cópia de N contida em X e ⇤X (Notação 4.19), e, pelo axioma (Mon2), teremosN ( ⇤N, implicando que o conjunto N será um ⇤X!-conjunto externo (Exemplo 2.32).Esta é a única aplicação direta do axioma (Mon2) neste capítulo.

O corolário a seguir implica na letra (e) do Teorema 2.3, e ele é demonstrado demodo análogo à argumentação discorrida no Corolário 2.35.

Corolário 4.28. Se A for um X!-conjunto infinito, então ⇤ hAi será externo. Em parti-cular, teremos ⇤ hAi ( ⇤A nesse caso.

Na presença do axioma (Mon3) e quando o conjunto X for infinito, o axioma(Mon2) será equivalente à condição N ( ⇤N.

118

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4.4 Princípio Geral das ⇤-Transformações

Várias operações matemáticas em X! são definidas por L✏-fórmulas, de modo queX!-conjuntos são formados a partir de sequências finitas de parâmetros em X!. O teoremaa seguir oferece uma descrição geral das ⇤-transformações dos resultados dessas operações.

Teorema 4.29 (Princípio Geral das ⇤-Transformações7; PGT). Seja � (x, y1

. . . yp) umaL✏-fórmula com quantificadores limitados, e sejam a

1

. . . ap 2 X!. Se o conjuntoC dado por

C :

=

t 2 X!... |= � (t, a

1

. . . ap)

for um X!-conjunto, e se D for o conjunto

D :

=

t 2 ⇤X!... ⇤ |= � (t, ⇤a

1

. . . ⇤ap)

,

então ⇤C = I! \D.

Demonstração. Seja Z um X!-conjunto qualquer. Como

|= (8x 2 Z) (x 2 C ! � (x, a1

. . . ap)) ,

pelo PT temos|= (8x 2 ⇤Z) (x 2 ⇤C ! � (x, ⇤a

1

. . . ⇤ap)) .

Em particular, o caso Z = C resulta em ⇤C ⇢ D. Se t for um elemento interno de D,então t 2 ⇤A para algum X!-conjunto A, e o caso Z = A implicará t 2 ⇤C.

Sob as condições do Teorema 4.29, o conjunto D será um ⇤X!-conjunto, visto queC e D são definidos pela mesma L✏-fórmula e C é um X!-conjunto. Assim, a mesmaargumentação que legitimiza C como um membro de X! valerá para justificar que D

pertence a ⇤X!. Se todo elemento de D for um ⇤X!-conjunto, então ⇤C = I! \ D, e setodo elemento de D for interno, então ⇤C = D.

Corolário 4.30 (Princípio da Definição Standard; PDS). Seja

� (x1

. . . xn, y1 . . . yp)

uma L✏-fórmula com quantificadores limitados, seja R uma relação n-ária em X! perten-cente a X!, e sejam a

1

. . . ap 2 X!. Sejam

C :

=

(t1

. . . tn) 2 R... |= � (t

1

. . . tn, a1 . . . ap)

7 Diferentemente do PDS e do PDI, o enunciado do Teorema 4.29 é raramente explicitamente menci-onado na literatura. O autor considera-o tão importante, elucidativo e generalizante quanto aquelesprincípios, legitimando, assim, a atribuição de um nome e uma sigla a tal resultado.

119

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eD :

=

(t1

. . . tn) 2 ⇤R... ⇤ |= � (t

1

. . . tn,⇤a

1

. . . ⇤ap)

.

Temos ⇤C = D.

Demonstração. Seja k < ! tal que R 2 Xk. Como C ⇢ R, temos que C éum X!-conjunto, e se (t

1

. . . tn) for uma n-tupla de X!-objetos pertencente a R, então(t

1

. . . tn) 2 Xk�1 e ti 2 Xk�3

(8i), resultando que o conjunto C pode ser escrito na forma

C =

t 2 X!... |= t 2 R ^ (9t

1

. . . tn 2 Xk�3

) (t = (t1

. . . tn) ^ � (t1

. . . tn, a1 . . . ap))

.

Seja E o conjunto

E :=

t 2 ⇤X!... |= t 2 ⇤R ^ (9t

1

. . . tn 2 Ik�3

) (t = (t1

. . . tn) ^ � (t1

. . . tn,⇤a

1

. . . ⇤ap))

.

Todo elemento de D é interno, e, pelo PGT, temos ⇤C = E. Como ⇤R 2 Ik, pelaObservação 4.23 nota-se que E = D.

Exemplo 4.31. Como ; =⇢

t 2 X... |= t 6= t

, pelo PDS temos

⇤; =⇢

t 2 ⇤X... ⇤ |= t 6= t

= ;.

Todas as propriedades conjuntistas dos monomorfismos não standard são con-sequências do PGT, incluindo as que apresentamos como postulados no Teorema 2.31.

Teorema 4.32 (Propriedades Conjuntistas de ⇤).

1. Sejam a1

a2

. . . an 2 X! e sejam A e B dois X!-conjuntos.

(a) ⇤ {a1

a2

. . . an} = {⇤a1

⇤a2

. . . ⇤an} ;

(b) ⇤(a

1

a2

. . . an) = (

⇤a1

⇤a2

. . . ⇤an) ;

(c) ⇤(A [ B) =

⇤A [ ⇤B;

(d) ⇤(A \ B) =

⇤A \ ⇤B;

(e) ⇤(A� B) =

⇤A� ⇤B;

(f) ⇤(A⇥ B) =

⇤A⇥ ⇤B;

(g) ⇤(Pn

(A)) = I! \ Pn(

⇤A), onde n

é um número natural;

(h) ⇤ �AB�

= I! \ (

⇤A)

(

⇤B) ;

(i) ⇤ �Int(A,6)B�

= I! \ Int(⇤A,⇤6)

(

⇤B)

onde 6 é uma relação bináriaem A.

2. Sejam R e S relações binárias em X! pertencentes a X!, e seja P ⇢ dom (R).

(j) Se R ⇢ A⇥B, então ⇤R ⇢ ⇤A⇥⇤B;

(k) ⇤(dom (R)) = dom (

⇤R) ;

(l) ⇤(Im (R)) = Im (

⇤R) ;

(m) ⇤(R hP i) = ⇤R h⇤P i ;

(n) ⇤(R�1

) = (

⇤R)

�1

;

(o) ⇤(R � S) = ⇤R � ⇤S.

120

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3. Seja f : A! B uma função, e seja x 2 A.

(p) ⇤f :

⇤A! ⇤B;

(q) ⇤(f (x)) = ⇤f (

⇤x) ;

(r) ⇤f será injetora se, e somente se, ffor injetora;

(s) ⇤f será sobrejetora se, e somentese, f for sobrejetora.

4. Seja {Mi}i2I uma família de X!-conjuntos pertencente a X! com I 2 X!.

(t) ⇤

[

i2I

Mi

!

=

[

i2⇤I

⇤Mi;

(u) ⇤

\

i2I

Mi

!

=

\

i2⇤I

⇤Mi,

(v) ⇤

Y

i2I

Mi

!

= I! \Y

i2⇤I

⇤Mi.

5. Sejam A e B dois X!-conjuntos cujos elementos são X!-conjuntos.

(w) ⇤⇢

A [B...A 2 A e B 2 B

=

A [ B...A 2 ⇤A e B 2 ⇤B

;

(x) ⇤⇢

A \ B...A 2 A e B 2 B

=

A \B...A 2 ⇤A e B 2 ⇤B

;

(y) ⇤⇢

A� B...A 2 A e B 2 B

=

A� B...A 2 ⇤A e B 2 ⇤B

;

(z) ⇤⇢

A⇥ B...A 2 A e B 2 B

=

A⇥ B...A 2 ⇤A e B 2 ⇤B

;

(↵) ⇤(

S

A) =

S ⇤A;

(�) ⇤(

T

A) =

T ⇤A.

Demonstração. Claramente, temos (a) ) (b) e (f) ) (j) . As condições (p) , (r) e (s)

são consequências imediatas de (j) e do PT, e as condições (c) e (d) são consequências de(a) , (b) , (t) e (u). Como

R hP i = Im [R \ (P ⇥ Im (R))] ,

temos que (m) é consequência de (d) , (f) e (l).

Sejam �1

�2

. . .�19

as seguintes L✏-fórmulas com quantificadores limitados:

• �1

(x, y1

y2

. . . yn) := x = y1

_ x = y2

_ · · · _ x = yn;

• �2

(x, U, V )

:

= x 2 U ^ x 62 V ;

• �3

(x, U, V )

:

= (9c1

2 U) (9c2

2 V ) x = (c1

, c2

) ;

• �4

(x, U)

:

= (8yn 2 x) (8yn�1

2 yn) · · · (8y1 2 y2

) y1

2 U ;

121

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• �5

(x, U, V )

:

= x : U ! V ;

• �6

(x, U, V,R)

:

= (9y1

, y2

2 U) (x : [y1

, y2

]R ! V ) ;

• �7

(x, U, T ) := (9y 2 T ) ((x, y) 2 U) ;

• �8

(x, U, T ) := (9y 2 T ) ((y, x) 2 U) ;

• �9

(x, U, T ) := (9c1

2 T ) (9c2

2 T ) ((c1

, c2

) 2 U ^ x = (c2

, c1

)) ;

• �10

(x, U, V, T ) := (9c1

2 T ) (9c2

2 T ) (9c3

2 T ) ((c1

, c2

) 2 V ^ (c2

, c3

) 2 U ^ x = (c1

, c3

)) ;

• �11

(x, J, F )

:

= (9j 2 J) x 2 F (j) ;

• �12

(x, J, F )

:

= (8j 2 J) x 2 F (j) ;

• �13

(x, J, F, U)

:

= x : J ! U ^ (8j 2 J) x (j) 2 F (j) ;

• �14

(x, U, V, T ) := (9Y1

2 U) (9Y2

2 V ) (8y 2 T ) (y 2 x ! (y 2 Y1

_ y 2 Y2

)) ;

• �15

(x, U, V, T ) := (9Y1

2 U) (9Y2

2 V ) (8y 2 T ) (y 2 x ! (y 2 Y1

^ y 2 Y2

)) ;

• �16

(x, U, V, T ) := (9Y1

2 U) (9Y2

2 V ) (8y 2 T ) (y 2 x ! (y 2 Y1

^ y 62 Y2

)) ;

• �17 (x, U, V, T ) := (9Y1 2 U) (9Y2 2 V ) (8y 2 T ) [y 2 x ! ((9c1 2 Y1) (9c2 2 Y2) y = (c1, c2))] ;

• �18

(x, U)

:

= (9y 2 U) x 2 y;

• �19

(x, U)

:

= (8y 2 U) x 2 y.

Nota-se que

{⇤a, ⇤b} , ⇤A� ⇤B, ⇤A⇥ ⇤B,[

i2⇤I

⇤Mi,\

i2⇤I

⇤Mi,[

⇤A,\

⇤A ⇢ I!,

e os resultados das letras (a) , (e) , (f) , (g) , (h) , (i) , (t) , (u) , (v) , (↵) e (�) seguem ao apli-carmos o PGT às L✏-fórmulas �

1

,�2

,�3

,�4

,�5

,�6

,�11

,�12

,�13

,�18

e �19

, respectivamente.Em �

13

, a variável U deve ser substituída por um nível em X! que contenha aunião

[

i2I

Mi.

Como R, S 2 Xn para algum número natural n, temos R ⇢ Xn�3

⇥Xn�3

(Teorema4.8, Letra (j)), e as letras (k) , (l) , (n) e (o) seguem ao aplicarmos o PGT às L✏-fórmulas�7

,�8

,�9

e �10

, respectivamente, onde a variável T deve ser substituída pelo nível Xn�3

em X!.

Como A,B ⇢ X! e A,B 2 Xn para algum número natural n, temos A,B ⇢ Xn�1,e todo elemento de A ou de B será um subconjunto de Xn�2

. Portanto, as letras (w) , (x)e (y) seguem ao aplicarmos o PGT às L✏-fórmulas �

14

,�15

e �16

, respectivamente, onde a

122

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variável T deve ser substituída pelo nível Xn�2

em X!. Produtos cartesianos de elementosde Xn�1 são subconjuntos de Xn (Teorema 4.8, Letra (f)), resultando que a letra (z) segueao aplicarmos o PGT à L✏-fórmula �

17

, onde a variável T deve ser substituída pelo nívelXn em X!.

Por fim, se x 2 A, então pelas letras (a) e (m) teremos

{⇤ (f (x))} =

⇤ {f (x)} =

⇤(f h{x}i) = ⇤f h⇤ {x}i = ⇤f h{⇤x}i = {⇤f (

⇤x)} ,

implicando em ⇤(f (x)) = ⇤f (

⇤x) e provando a letra (q).

As letras (g), (h) e (i) do Teorema 4.32 correspondem ao Teorema 2.31. Assim,finalizamos as demonstrações de todas as afirmações postuladas no Capítulo 2.

Exemplo 4.33. Se X for finito, então todo elemento de ⇤X =

⇤X0

será standard (Teorema4.32, Letra (a)), e prova-se por indução sobre n que todo elemento do nível ⇤Xn serástandard. Assim, nesse caso, todo ⇤X!-objeto será standard, e o monomorfismo nãostandard ⇤ : V (X)! V (

⇤X) será um isomorfismo.

Corolário 4.34.

(a) In = I! \ ⇤Xn para cada número natural n;

(b) Para cada x 2 X!, temos

postoX!(x) = posto⇤X!

(

⇤x) .

Demonstração.

(a) TemosIn =

⇤P (Xn�1

) = I! \ P (

⇤Xn�1

) = I! \ ⇤Xn.

(b) Seja n o posto de x em X!. Se n = �1, então x 2 X e ⇤x 2 ⇤X, ou seja, ⇤x teráposto �1 em ⇤X!. Se 0 6 n, então

|= x 2 Xn+1 ^ x 62 Xn,

e, pelo PT, teremos ⇤x 2 In+1 � In, resultando em x 2 ⇤Xn+1 � ⇤Xn pela letra (a),e provando que posto⇤X!

(

⇤x) = n.

Temos ⇤ �X : X ! ⇤X e ⇤ �Xn: Xn ! ⇤Xn para cada n < !. A letra (a) do

Corolário 4.34 é equivalente à afirmação de que a equação In = I! \ ⇤Xn é válida paracada n < !. Assim, cada nível In é o conjunto dos elementos internos no n-ésimo nívelde ⇤X!.

123

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4.5 Conjuntos Hiperfinitos

Há uma classe peculiar de ⇤X!-conjuntos associada à noção de finitude deum conjunto.

Definição 4.35. Um ⇤X!-conjunto A é dito ser hiperfinito se existe um X!-conjuntoE tal que A 2 ⇤P! (E). Se B for um ⇤X!-conjunto, então o conjunto dos subconjuntoshiperfinitos de B é denotado por Phf (B).

Todo conjunto hiperfinito é interno.

Exemplo 4.36. O conjunto vazio, ;, é hiperfinito, visto que

; 2 {;} = {⇤;} =

⇤ {;} =

⇤P! (;) .

Exemplo 4.37. Suponha que o conjunto X é finito. Assim, os X!-conjuntos e os⇤X!-conjuntos são finitos (Exemplo 4.2). Se A for um ⇤X!-conjunto, então existirá umX!-conjunto E tal que A 2 ⇤E (Exemplo 4.33), e se n for o nível de E em X!, entãoteremos E ⇢ Xn�1

, ⇤E ⇢ In�1

, A 2 In�1, e

A 2 I! \ P (In�2

) =

⇤P (Xn�2

) =

⇤P! (Xn�2

) ,

implicando que A será hiperfinito. Portanto, todo ⇤X!-conjunto será hiperfinito quandoX for finito.

Proposição 4.38.

(a) ⇤(P! (E)) = Phf (

⇤E) para todo X!-conjunto E;

(b) Todo subconjunto interno de um ⇤X!-conjunto hiperfinito é hiperfinito;

(c) Se f : A ! B for uma função interna que é uma relação binária em ⇤X!, e se S

for um subconjunto hiperfinito de A, então a imagem f hSi será hiperfinita.

Demonstração.

(a) Como P! (E) ⇢ P (E), temos (Teorema 4.32, Letra (g))

⇤P! (E) ⇢ ⇤P (E) = I! \ P (

⇤E) ,

implicando em ⇤(P! (E)) ⇢ Phf (

⇤E). Se A for um subconjunto hiperfinito de ⇤E,então existirá um X!-conjunto F tal que A 2 ⇤

(P! (F )), e, como

|= (8A 2 P! (F )) (A ⇢ E �! A 2 P! (E)) ,

pelo PT temos A 2 ⇤P! (E), provando o resultado desejado.

124

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(b) Seja E um X!-conjunto, seja A 2 ⇤(P! (E)), e seja S ⇢ A com S 2 Ik (k < !).

Temos|= (8A 2 P! (E))

8S 2 Xk�

(S ⇢ A �! S 2 P! (E)) ,

e o resultado segue pelo PT.

(c) Pelas letras (c), (d) e (e) do Teorema 4.25, o conjunto B e a restrição

g :

= f �S= f \ (S ⇥ B)

são internos. Seja E um X!-conjunto de nível m < ! tal que S 2 ⇤P! (E), e seja n

um número natural tal que B e g têm nível n em I!. Assim, temos B ⇢ In�1

e

|= (8g 2 Xn) (8S 2 P! (E)) (g : S ! Xn�1

�! Im (g) 2 P! (Xn�1

)) ,

resultando pelo PT e pela letra (a) em

f hSi = Im (g) 2 ⇤P! (Xn�1

) .

Até o final deste capítulo, assumiremos que o conjunto X é infinito. A Notação4.19 será posta em uso.

Exemplo 4.39. Se {xn}M6n6N for uma hipersequência interna de ⇤X!-objetos comM,N 2 ⇤Z, então o conjunto {xn}M6n6N será hiperfinito (Proposição 4.38, Letra (c)).

Nesta seção, denotaremos por Fin (E,P ) a L✏ (X!)-fórmula (Definição A.26e Nota A.27)

(9!n 2 N) (9S 2 P (N)) (9f 2 P )� (E, n, S, f) ,

onde � (E, n, S, f) é a conjunção das L✏ (X!)-fórmulas

1. (8x 2 S) x 2 N;

2. (8x 2 N) (x 2 S ! x 6 n) ;

3. (8p 2 f) (9s 2 S) (9e 2 E) p = (s, e) ;

4. (8s 2 S) (9!e 2 E) (s, e) 2 f ;

5. (8e 2 E) (9!s 2 S) (s, e) 2 f.

Se A e B forem dois X!-conjuntos, então a condição |= Fin (A,P (N⇥ B)) será verdadeirase, e somente se, A for um subconjunto finito de B.

Teorema 4.40. Um ⇤X!-conjunto A será hiperfinito se, e somente se, existir um úniconúmero hiperinteiro não negativo n tal que existe uma bijeção interna f : [1, n]⇤N0

! A.

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Demonstração. O resultado é imediato para A = ;, visto que a bijeção nula; : ; ! ; é interna.

Suponha que A é hiperfinito e não nulo. Assim, existirá um X!-conjunto F talque A 2 ⇤P! (F ), e, como

|= (8E 2 P! (F ))Fin (E,P (N⇥ F )) ,

pelo PT temos que existem exatamente um número hipernatural n, um

S 2 ⇤P (N) ⇢ P (

⇤N)

e uma funçãof 2 ⇤P (N⇥ F ) ⇢ P (

⇤N0

⇥ ⇤F )

tais que S = [1, n]⇤N e f é uma bijeção do tipo S ! A, provando a condição necessária.

Suponha que existe um único número hipernatural n tal que existe uma bijeçãointerna f : [1, n]⇤N ! A. Assim, existe um número natural k com A 2 Ik (Teorema 4.25,Letra (e)), e, como

|=�

8E 2 Xk�

[Fin (E,P (N⇥Xk�1

)) �! E 2 P! (Xk�1

)] ,

pelo PT temos A 2 ⇤P! (Xk�1

), resultando que A é hiperfinito.

Corolário 4.41. Seja E um X!-conjunto.

(a) ⇤E será hiperfinito se, e somente se, E for finito;

(b) Um ⇤X!-conjunto finito será hiperfinito se, e somente se, ele for interno.

Demonstração.

(a) Se E for finito, então ⇤E será finito e será hiperfinito (Teorema 4.32, Letra (a)). Se⇤E for hiperfinito, se n for um número natural com E 2 Xn, e se E for infinito,então teremos

|= ¬Fin (E,P (N⇥Xn�1

)) ,

o que é absurdo pelo PT.

(b) Suponha que A é um ⇤X!-conjunto finito e interno. Como A é finito, existe umn 2 N

0

⇢ ⇤N0

e existe uma bijeção f : [1, n]⇤N0! A. Tendo em vista que f é um

conjunto finito de pares ordenados internos (Teorema 4.32, Letras (a) e (b)), temosque f é interna , implicando que A é hiperfinito.

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Exemplo 4.42. O conjunto dos números hipernaturais, ⇤N, não é hiperfinito. De fato, a⇤-transformação de qualquer X!-conjunto infinito não é hiperfinita (Corolário 4.41,Letra (a)).

Definição 4.43. Se A for um ⇤X!-conjunto hiperfinito, então o único número hipernaturaln tal que existe uma bijeção interna f : [1, n]⇤N0

! A é chamado de cardinal internode A e é denotado por JAK.

Exemplo 4.44. Temosq[1, n]⇤N0

y= n (8n 2 ⇤N

0

), e, em particular, J;K = 0. Se m e n

forem dois números hiperinteiros com m 6 n, então teremos J[m,n]⇤ZK = n�m+1, vistoque a função

f : [1, n�m+ 1]⇤N0! [m,n]⇤Z

dada por f (x) := x+m� 1 é uma bijeção interna.

Proposição 4.45. Se E for um X!-conjunto, e se f : P! (E) ! N0

for a função dadapor f (A) := |A|, então ⇤f será a função do tipo Phf (

⇤E)! ⇤N0

dada por ⇤f (A) = JAK .

Demonstração. Como |= (;, 0) 2 f e

|= (8A 2 P! (E)) (8n 2 N) (8g 2 P (N⇥ E)) (8S 2 P (N)) (� (A, n, S, g) �! (A, n) 2 f) ,

pelo PT temos que se A 2 ⇤(P! (E)) = Phf (

⇤E), então (A, JAK) 2 ⇤f .

A seguir, utilizaremos os conceitos desenvolvidos nesta seção para fornecer umademonstração alternativa para o Teorema do Valor Intermediário, um dos resultados maisimportantes da Análise Real. Nesse caso, devemos escolher qualquer conjunto X quecontenha R.

Teorema 4.46 (Teorema do Valor Intermediário). Sejam a, b 2 R com a < b. Se umafunção f : [a, b]R ! R for contínua com f (a) 6= f (b), e se y for um número real entref (a) e f (b), então existirá um número real c entre a e b tal que f (c) = y.

Demonstração. Assumiremos que f (a) < f (b). Seja N um número hipernatural infinito,e seja {xn}

06n6N a hipersequência de números hiper-reais definida por

xn :

= a+b� a

N· n.

Como o intervalo [0, N ]⇤N é interno (Exemplo 2.28), a sequência dos xn é interna (Corolário2.29). Seja A o conjunto não nulo dado por

A :

=

xn... 0 6 n 6 N e ⇤f (xn) < y

.

Pelo PDI temos que A é interno, e, como A é um subconjunto do conjunto hiperfinito{xn}

06n6N , temos que A é hiperfinito (Proposição 4.38, Letras (b) e (c)). Como todo

127

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subconjunto finito não nulo de R tem um maior elemento, pelo PT temos que todosubconjunto hiperfinito não nulo de ⇤R tem um maior elemento, implicando que existeum k 2 [0, N ]⇤N tal que xk é o maior elemento de A. Seja c := st (xk) 2 [a, b]R. Temos

⇤f (xk) < y 6 ⇤f (xk+1

) =

⇤f

xk +b� a

N

,

e, como f é contínua em c, temos (Teorema 2.41, Letra (k))

⇤f (xk) ⇠ f (c) ⇠ ⇤f

xk +b� a

N

,

resultando em f (c) ⇠ y e f (c) = y (Proposição 1.79).

4.6 Operações sobre Hipersequências

Na Seção 2.7, verificamos que a ⇤-transformação da adição entre os números reais,⇤+, é uma extensão de + que pode ser vista como uma adição entre os números hiper-reais,

e, na Seção 2.11, constatamos que essa operação pode ser estendida para obter somas dehipersequências internas de números hiper-reais. Nesta seção, veremos que qualquer leide composição interna, assim como adição standard ⇤

+ em ⇤R, pode ser estendida paraobter composições de hipersequências internas.

Consideraremos um ⇤X!-conjunto interno A, uma lei de composição interna� : A ⇥ A ! A, e um número natural k com Z, <2 Xk e A,� 2 Ik, onde < é a ordemusual em Z.

Se E for um X!-conjunto de nível k, então cada lei de composição f : E⇥E ! E

em E terá nível k + 4 em X!, cada sequência {xi}m6i6n 2 Int(Z,<)E terá nível k + 2 emX!, e cada função do tipo Int(Z,<)E � {;} ! E terá nível k + 5 em X! (Teorema 4.8).Assim, o processo recursivo efetuado na Seção 2.11 com o intuito de definir a função Satesta a veridicidade da condição

|=�

8E 2 Xk� �

8f 2 Xk+4

� �

f : E ⇥ E ! E �!�

9g 2 Xk+5

(E, f, g)�

,

onde (E, f, g) é a conjunção das L✏ (X!)-fórmulas:

• g :

Int(Z,<) E � {;}! E;

•�

8x 2 Xk+2

(8m 2 Z) (x : {m}! E �! g (x) = x (m)) ;

•�

8x, y 2 Xk+2

(8m,n 2 Z) [(m < n ^ x : [m,n]Z ! E ^ y : [m,n)Z ! E ^(8i 2 Z) (m 6 i 6 n� 1 �! x (i) = y (i))) �! g (x) = g (y)� xn] .

Assim, pelo PT, existe uma função internaM

: I! \�Int(⇤Z,<)A� {;}

! A

de nível k + 5 em I! tal que

128

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•M

{xi}m6i6m

= xm para qualquer hipersequência interna {xi}m6i6m com xm 2 A

cujo conjunto de índices é unitário;

•M

{xi}m6i6n

=

M

{xi}m6i6n�1

� xn para qualquer hipersequência interna{xi}m6i6n de elementos de A com m,n 2 ⇤Z e m < n.

Dizemos que a funçãoM

é a operação hiperfinita induzida por �, visto que cadaelemento do seu domínio define um conjunto hiperfinito (Proposição 4.38, Letra (c)). Casoa lei de composição � tenha um elemento neutro 0A 2 A, a função

M

será estendida

para o domínio I! \ Int(⇤Z,<)A de modo queM

(;) := 0A.

Exemplo 4.47. Na Seção 2.11, lidamos com o caso particular � =

⇤+ :

⇤R⇥ ⇤R ! ⇤R.Naquela ocasião, definimos a função S :

Int(Z,<)R ! R, a qual efetua somas finitas desequências de números reais, e obtemos a sua ⇤-transformação, ⇤S : I!\Int(⇤Z,<)

(

⇤R)! ⇤R,a qual efetua somas hiperfinitas de hipersequências de números hiper-reais. Por induçãointerna (Exemplo 2.33) sobre o número hipernatural de elementos das hipersequênciasinternas em Int(⇤Z,<)

(

⇤R), obtém-se que ⇤S é a funçãoM

definida nesta seção.

Exemplo 4.48. Se A =

⇤R e se � é a ⇤-transformação da operação de multiplicaçãoem R, então a função

M

: I! \ Int(⇤Z,<)

(

⇤R) ! ⇤R definida nesta seção é denotada porY

por abuso de linguagem. Se xmxm+1

. . . xn é uma hipersequência interna de números

hiper-reais, então a imagemY

{xi}m6i6n

é chamada de produto hiperfinito da hi-

persequência interna xmxm+1

. . . xn, e, por abuso de linguagem, ela é denotada pornY

i=m

xi

ou porxm · xm+1

· · · xn.

Analogamente à demonstração do Teorema 2.53, prova-se que os produtos hiperfinitossatisfazem às seguintes propriedades:

(a)nY

i=m

r · xi = rn ·nY

i=m

xi;

(b)

nY

i=m

xi

!

·

pY

i=n+1

xi

!

=

pY

i=m

xi;

(c)nY

i=m

xi =

n+jY

i=m+j

xi�j;

(d)nY

i=m

xi 6nY

i=m

yi

se 0 6 xi 6 yi (8i 2 [m,n]⇤Z) ;

(e)

nY

i=m

xi

=

nY

i=m

|xi|.

(Fatoração)

(Aditividade)

(Invariância Translacional)

(Monotonicidade)

(Distributividade de |·|)

129

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onde xm . . . xn . . . xp e ym . . . yn são duas hipersequências internas de números hiper-reais com m 6 n < p, r 2 ⇤R, e j 2 ⇤Z.

Exemplo 4.49. Seja E 2 Xn com n < !, e seja [ : P (E) ⇥ P (E) ! P (E) a lei decomposição em P (E) que associa cada par (M,N) de subconjuntos de E à união M [N .Assim, temos

|= (8M,N 2 P (E)) [M [N ⇢ E ^ (8x 2 E) (x 2M [N $ (x 2M _ x 2 N))] ,

e, pelo PT, temos que

⇤[ : (I! \ P (

⇤E))⇥ (I! \ P (

⇤E))! (I! \ P (

⇤E))

é a função dada por ⇤ [ (M,N) = M [ N , ou seja, a função ⇤[ é essencialmente uma

união. Analogamente, tomando � =

⇤[ prova-se quenM

i=m

Mi =

n[

i=m

Mi para qualquer

hipersequência interna {Mi}m6i6n de subconjuntos internos de ⇤E, implicando que a uniãon[

i=m

Mi é interna. Esses resultados também são válidos ao considerarmos as interseções no

lugar das uniões.

Exemplo 4.50. Considere a função mdc : N⇥ N! N, a qual associa cada par (p, q) denúmeros naturais ao maior divisor comum de p e q. Temos

|= (8p, q 2 N) [mdc (p, q) |p ^mdc (p, q) |q ^ (8n 2 N) ((n|p ^ n|q)! n|mdc (p, q))] ,

onde as L✏ (X!)-fórmulas da forma a|b são dadas por (9c 2 N) a · c = b, resultando peloPT que se p e q forem dois números hipernaturais, então o número ⇤mdc (p, q) será omaior divisor comum de p e q em ⇤N. Analogamente, tomando � =

⇤mdc prova-se que se

{pi}m6i6n é uma hipersequência interna de números hipernaturais, então a imagemnM

i=m

pi

é o maior divisor comum dos números pi em ⇤N. Esses resultados também são válidos aoconsiderarmos os menores múltiplos comuns no lugar dos maiores divisores comuns.

4.7 Overflow e Underflow

Concluiremos este capítulo com dois resultados que atuam como princípios pode-rosos na Teoria dos Monomorfismos Não Standard. Foi opção do autor não utilizar taisnoções no Capítulo 2 e no restante deste capítulo, enfatizando, assim, a aplicabilidadedireta do Princípio da Transferência nesta dissertação.

Teorema 4.51. Seja � (x, y1

. . . yn) uma L✏-fórmula com quantificadores limitados, sejama1

. . . an 2 I!, e seja A o conjunto de números hipernaturais dado por

A :

=

n 2 ⇤N ... ⇤ |= � (n, a1

. . . an)

.

130

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(a) (Princípio do Overflow) Se existir um k 2 N tal que [k,1)N ⇢ A, então existirá umK 2 ⇤N� N tal que [k,K]⇤N ⇢ A;

(b) (Princípio do Underflow) Se existir um K 2 ⇤N�N tal que [1, K]⇤N�N ⇢ A, entãoexistirá um k 2 N tal que [k,K]⇤N ⇢ A.

Demonstração. Pelo PDI, o conjunto A é interno, assim como qualquer intervalode números hipernaturais (Exemplo 2.28).

(a) A união B :

= [1, k � 1]N [ A é interna (Teorema 4.25, Letra (c)), e, pela hipótese,temos N ⇢ B ⇢ ⇤N. Se B =

⇤N, então [k,1)⇤N ⇢ A, e, em particular, teremos[k,K]⇤N ⇢ A para qualquer K 2 ⇤N � N. Se B 6= ⇤N, então a diferença interna⇤N � B será não nula e terá um menor elemento H (Exemplo 2.32)pertencente a ⇤N� N, implicando em

[k,H � 1]⇤N ⇢ [k,1)⇤N \B ⇢ A.

(b) A união C :

= [K + 1,1)⇤N[A é interna (Teorema 4.25, Letra (c)), e, pela hipótese,temos ⇤N � N ⇢ C ⇢ ⇤N. Se C =

⇤N, então [1, K]⇤N ⇢ A. Se C 6= ⇤N, então adiferença interna ⇤N�C será não nula e terá um maior elemento h (Exemplo 2.32)pertencente a N, implicando em

[h+ 1, K]⇤N ⇢ [1, K]⇤N \ C ⇢ A.

Se S for um subconjunto interno de ⇤N, então, tomando � (x, y1

)

:

= x 2 y1

ea1

:

= S, teremos que o conjunto A definido no enunciado acima é igual a S. É comumque os resultados do Teorema 4.51 sejam aplicados nessas circunstâncias.

Tratamos dos Princípios do Overflow e Underflow no caso dos conjuntos de nú-meros hipernaturais, mas existem múltiplas variações desses princípios relacionadas aossubconjuntos de ⇤Q e ⇤R, as quais não serão abordadas neste trabalho.

Exemplo 4.52. Se g :

⇤N! ⇤R for uma função interna tal que g (n) ⇠ 0 (8n 2 N), entãotodo número natural pertencerá ao conjunto

A :

=

n 2 ⇤N ... |g (n)| < 1

n

,

e, pelo Princípio do Overflow, existirá um número hipernatural infinito N talque |g (n)| < 1/n (8n 2 [1, N ]⇤N), implicando, em particular, em g (n) ⇠ 0 (8n 2 [1, N ]⇤N).Esse resultado é conhecido como Lema Sequencial de Robinson.

131

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Exemplo 4.53. Seja S um subconjunto interno de ⇤N. Provaremos que S conterá núme-ros hipernaturais infinitos arbitrariamente pequenos se, e somente se, S contiver númerosnaturais arbitrariamente grandes. Se a interseção S \N tiver um número natural n comocota superior, então, como o complemento ⇤N � S é interno e contém todo número nointervalo [n+ 1,1)N, pelo Princípio do Overflow existirá um número hipernatural infi-nito K tal que [n+ 1, K]⇤N ⇢ ⇤N � S, resultando em S1 ⇢ [K + 1,1)⇤N e provandoa implicação contrapositiva da condição necessária do problema. Reciprocamente, se ainterseção S \ ⇤N1 tiver uma cota inferior N em ⇤N1, então a diferença [1, N � 1]⇤N�Nestará contida no conjunto interno ⇤N � S, e, pelo Princípio do Underflow, existirá umnúmero natural k tal que [k,N � 1]⇤N ⇢ ⇤N� S. Nesse caso, teremos S \N ⇢ [1, k � 1]N

e o conjunto S \ N será finito, finalizando a demonstração da equivalência desejada.

132

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5Monomorfismos Não Standard Existem

Os resultados dos Capítulos 2 e 4 não têm relevância matemática até que a existên-cia dos monomorfismos não standard ⇤ : X! ! Y! seja demonstrada em NBG. Veremosneste capítulo que o Axioma da Escolha e o aparato conceitual desenvolvido noCapítulo 3 e na Seção 4.1 são suficientes para descrever uma construção de uma funçãocom as propriedades desejadas. Essa idealização de ⇤, concebida por AbrahamRobinson e Elias Zakon (46, 54), é parcialmente ardilosa e emaranhada, embora seja amais simples conhecida. A fim de elucidá-la, procederemos, inicialmente, à descrição deuma função ? : X! ! Y!, para depois definirmos a função ⇤ pretendida evitando umempecilho peculiar que impede que ? seja um monomorfismo não standard.

Assim como fizemos na Seção 3.8, aproveitaremos a imersão canônica associada auma ultrapotência

Y

U

X para iniciar a concepção de ⇤, onde será necessário que U seja

um ultrafiltro não principal em um conjunto I. Como existe um modelo de NBG� {AC}no qual todo ultrafiltro em todo conjunto I é principal, deduz-se que o Axioma da Escolhaé indispensável para que a construção descrita neste capítulo seja possível. De fato, nãoé conhecida uma única maneira de obter ⇤ sem a utilização do Axioma da Escolha.

5.1 Cópias Base

Verificamos que há diversas vantagens em assumirmos que os conjuntos X e Y sãoconjuntos base ao lidarmos com um monomorfismo não standard ⇤ : X! ! Y!. Nestaseção, veremos que essa imposição não limita a escolha de X, contanto que tal conjuntoseja identificado com uma cópia dele. Também constataremos que as potências reduzidasda forma

Y

F

X são conjuntos base em certas circustâncias, e isso será suficiente para

assegurarmos que o conjunto Y seja um conjunto base na construção de ⇤ apresentada norestante deste capítulo.

Lema 5.1. Seja ↵ um ordinal infinito. Se X for um conjunto tal que ; 62 X e todoelemento de um elemento de X tem posto ↵, então X será um conjunto base.

Demonstração. Provaremos por indução sobre o número inteiro não negativo n que cadaX!-objeto x de nível n é tal que posto (x) < n ou ↵ < posto (x) 6 ↵+n+1. Tal afirmaçãoé válida para n = 0, visto que todo X!-átomo tem posto ↵+1. Suponha que ela é válidapara um número n e seja x 2 Xn+1

. Se x 2 X, então posto (x) = ↵+1 6 ↵+(n+ 1)+1.Considere o caso em que x 2 Xn+1, ou seja, x ⇢ Xn. Assim, pela hipótese de indução,todo elemento de x terá posto menor que n ou pertencente ao intervalo (↵,↵ + n+ 1]On.

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Se todo elemento de x tiver posto menor que n, então o posto de x será menor que n+ 1

(Proposição B.33), e se x tiver pelo menos um elemento no intervalo (↵,↵ + n+ 1]On,então, como ↵ é infinito, teremos ↵ < posto (x) 6 ↵+ (n+ 1) + 1, finalizando a indução.

Portanto, se a 2 X e x 2 a \ X!, então x terá posto ↵ e existirá um númerointeiro não negativo n tal que x 2 Xn, resultando em posto (x) < n < ↵ ou↵ < posto (x) 6 ↵ + n+ 1, o que é absurdo.

Se x e y forem quaisquer dois objetos, então o posto do par ordenado (x, y) serádado por

posto ((x, y)) = posto ({{x} , {x, y}})= max {posto ({x}) , posto ({x, y})}+ 1

= max {posto (x) + 1,max {posto (x) , posto (y)}+ 1}+ 1

= max {posto (x) , posto (y)}+ 2.

Portanto, o posto de um par ordenado é duas unidades maior que o maior postodas suas coordenadas.

Proposição 5.2 (Cópias Base). Seja X um conjunto. Existe um conjunto X 0 equipotentea X que é um conjunto base.

Demonstração. Seja ↵ um ordinal infinito maior ou igual ao posto de X, e sejaX 0 o conjunto

X 0:

=

{(x,↵)} ...x 2 X

.

Note que X 0 é equipotente a X. Se x 2 X, então posto ((x,↵)) = ↵ + 2, visto que

posto (x) < posto (X) 6 ↵ = posto (↵) .

Todo elemento de um elemento de X 0 tem posto infinito e igual a ↵ + 2, resultando queX 0 é um conjunto base pelo Lema 5.1.

Vale lembrar que se X 0 for uma cópia de X, então qualquer estrutura matemáticarelacionada ao conjunto X pode ser convertida em uma estrutura equivalente relacionadaa X 0. Por exemplo, se f : X ! X 0 for uma bijeção, e se R for uma relação n-ária em X,então a relação n-ária R0 em X 0 definida pela equivalência

(x1

. . . xn) 2 R0 ,�

f�1

(x1

) . . . f�1

(xn)�

2 R

será essencialmente igual à relação R.

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Proposição 5.3 (Potências Reduzidas Base). Seja X um conjunto, seja I um conjuntonão nulo de posto infinito, e seja F um filtro em I. Se

posto (X) 6 posto (I) ,

então a potência reduzidaY

F

X será um conjunto base.

Demonstração. Se i 2 I, então posto (i) < posto (I), e se x 2 X, então

posto (x) < posto (X) 6 posto (I) .

Seja f : I ! X uma função. Se posto (I) for um ordinal sucessor, então existirá um ordinal↵ com posto (I) = ↵ + 1 tal que posto (i) 6 ↵ (8i 2 I), e existirá um elemento i↵ de I

com posto (i↵) = ↵. Nesse caso, se i 2 I, então os ordinais posto (i) e posto (f (i)) serãomenores ou iguais a ↵ (Teorema B.16), implicando em posto ((i, f (i))) 6 ↵ + 2 (8i 2 I)

com a igualdade ocorrendo no caso i = i↵, e posto (f) = ↵ + 3.

Suponha que posto (I) é um ordinal limite. Assim, se (i, x) 2 f , entãoteremos (Teorema B.23)

posto ((i, x)) = max (posto (i) , posto (x)) + 2 < posto (I) ,

e se � for qualquer ordinal menor que posto (I), então existirá um i� 2 I com� < posto (i�) < posto (I), resultando em

� < max (posto (i�) , posto (f (i�))) + 2 = posto ((i�, f (i�))) < posto (I)

e posto (f) = posto (I). Portanto, o posto de qualquer função f : I ! X é infinito e nãodepende de f , provando que

Y

F

X é um conjunto base pelo Lema 5.1.

5.2 A Ideia da Construção de ⇤Assumiremos um conjunto base X como o único input da nossa discussão, e, ao

decorrer deste capítulo, definiremos um conjunto base Y e uma função ⇤ : X! ! Y! quesatisfaz às condições (Mon1)-(Mon3) da Definição 4.15:

(Mon1) ⇤X = Y ;

(Mon2) Para todo subconjunto infinito A de X, teremos A ( ⇤A;

(Mon3) (Princípio da Transferência; PT) Para toda L✏-fórmula � (x1

. . . xn) com quan-tificadores limitados, temos

|= � [a1

. . . an], ⇤ |= � [⇤a1

. . . ⇤an]

para quaisquer a1

. . . an 2 X!,

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onde estamos aplicando a Notações 4.17 e 4.18.

Como vimos na Seção 3.8, é razoável definir Y =

⇤X como uma ultrapotência daforma

Y

U

X. Por ora, escolheremos um conjunto não nulo I qualquer e um ultrafiltro U

qualquer em I, e definiremos:

Definição 5.4. Seja Y a ultrapotênciaY

U

X.

A Proposição 5.3 nos fornece uma condição suficiente para que a ultrapotência Y

seja um conjunto base. Por tal razão, faremos a seguinte suposição:

Suposição 5.5. O conjunto I tem posto infinito e maior ou igual a posto (X).

Exemplo 5.6. Se J for um conjunto qualquer, então o conjunto

I :

=

(i,max (!, posto (X)))

... i 2 J

é uma cópia de J que tem posto infinito e maior que posto (X).

Assim, Y é um conjunto base.

A ideia da construção de ⇤ consiste em obter uma sequência enumerável de funções⇤0

⇤1

⇤2

. . . tal que⇤0

⇢ ⇤1

⇢ ⇤2

⇢ ⇤3

⇢ · · ·

e ⇤n : Xn ! Yn para cada n, e a função ⇤ desejada será a extensão infinita1[

n=0

⇤n de

todas as funções dessa sequência. Portanto, se já tivermos definido a função ⇤n, entãoprecisaremos determinar os valores da função ⇤n+1

apenas em argumentos pertencentes àdiferença Xn+1

� Xn, os quais são os X!-objetos de posto n em X! (Definição 4.9). Sex 2 Xn, então ⇤n+1

(x) := ⇤n (x).

A função canônica X !Y

U

X, a qual é dada por x 7! lim

X,Ux, é uma escolha notória

para ⇤0

.

Definição 5.7. Seja ⇤0

: X0

! Y0

a imersão elementar canônica relacionada à ultrapo-tência Y = Y

0

=

Y

U

X.

Como definir a função ⇤1

: X1

! Y1

? Devemos prescrever os seus valores apenasem X!-objetos de posto 0, ou seja, em subconjuntos A de X. Vimos na Seção 3.8 que oslimites integrais dos subconjuntos de R são adequados para indicar as ⇤-transformaçõesdesses subconjuntos. Por essa razão, definiremos ⇤

1

de maneira análoga, substituindo Rpor X (ou X

0

).

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Definição 5.8. Para cada subconjunto A de X, seja

⇤1

(A) :=

lim

X,Us (i)

... s 2 IX0

e s (i) 2 A q.t.p.�

.

Assim, temos

⇤1

(X) =

lim

X,Us (i)

... s 2 IX0

e s (i) 2 X q.t.p.�

=

lim

X,Us (i)

... s 2 IX

= Y,

satisfazendo ao axioma (Mon1).

5.3 Tentativa para Definir ⇤nO próximo passo é determinar as imagens da função ⇤

2

nos elementos de X2

deposto 1, ou seja, nos subconjuntos A de X

1

que têm pelo menos um elementode posto 0. A formulação dessa etapa é explicitada quando analisamos as definições de⇤0

e ⇤1

e tentamos encontrar um padrão para a definição geral de ⇤n. Podemos fatorar ⇤0

em uma composição funcional q0

� p0

conforme o esquema

xp07! {x}i2I

q07! lim

X,Ux

X0

p0! IX0

q0! Y0

e podemos fatorar ⇤1

na forma q1

� p1

conforme o esquema

Ap17! {A}i2I

q17!

8

>

<

>

:

q0

(A) se A 2 X0

lim

X,Us (i)

... s 2 IX0

e s (i) 2 A q.t.p.�

se A 2 X1

�X0

X1

p1! IX1

q1! Y1

onde:

• q0

:

IX0

! Y0

é dada por q0

(r) := lim

X,Ur (i);

• q1

:

IX1

! Y1

é a extensão de q0

tal que

q1

(r) :=

lim

X,Us (i)

... r 2 IX0

e s (i) 2 r (i) q.t.p.�

=

q0

(s)... s 2 IX

0

e s (i) 2 r (i) q.t.p.�

para todo r 2 IX1

� IX0

.

137

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As funções p0

e p1

exibem um padrão previsível.

Definição 5.9. Para cada n < !, seja pn a função Xn ! IXn dada por

pn (x) := {x}i2I .

A extensão infinita das funções pn, a qual é dada pela união1[

n=0

pn e é uma função do

tipo X! !1[

n=0

IXn, será denotada por p.

Temos p �Xn= pn (8n < !) e

p0

⇢ p1

⇢ p2

⇢ · · · .

Os valores da função q1

dependem exclusivamente de q0

. Exploraremos esse padrãorecursivo para determinar as outras funções qn.

Definição 5.10.

• Supondo que a função qn já foi determinada, definimos a função qn+1

como sendo aextensão da função qn ao domínio IXn+1

tal que

qn+1

(s) :=

qn (r)... r 2 IXn e r (i) 2 s (i) q.t.p.

para cada s 2 IXn+1

� IXn;

• Para cada n < !, seja ?n :

= qn � pn;

• A extensão infinita das funções ?n, a qual é dada por1[

n=0

?n, será denotada por ?.

Temos ?0

= ⇤0

, ?1

= ⇤1

, e

q0

⇢ q1

⇢ q2

⇢ · · · .

A verificação de que o conjunto Yn pode ser considerado como um contradomínio dafunção qn não é necessária para a discussão deste capítulo e será deixada para o leitor.Posto isso, cada ?n é do tipo Xn ! Yn, e ? é do tipo X! ! Y!.

No exemplo a seguir, mostraremos que a função ? não é um monomorfismo nãostandard no caso X 6= ;. Assim, não podemos definir as funções ⇤

2

⇤3

⇤4

. . . da maneiraque definimos ?

2

?3

?4

. . . , e, como veremos na Seção 5.4, há uma maneira sutil de alterara caracterização recursiva das funções ?n que é adequada para obter ⇤n.

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Exemplo 5.11. Suponha que X 6= ;, seja a um X!-átomo, e seja1 A um X!-conjuntode posto 1 tal que a 2 A. Empregando a Notação 2.4 para a função ?, temos

?A = q2

(p2

(A))

= q2

{A}i2I�

=

q1

(r)... r 2 IX

1

e r (i) 2 A q.t.p.�

.

Seja Z 2 U e seja r : I ! X1

a função dada por

r (i) :=

8

<

:

a se i 2 Z;

; se i 2 I � Z.

Assim, temos r 2 IX1

e r (i) 2 A q.t.p., resultando em⇢

q0

(t)... t 2 IX

0

e t (i) 2 r (i) q.t.p.�

= q1

(r) 2 ?A.

Se t 2 IX0

e t (i) 2 r (i) q.t.p., então, como r (i) 2 X0

q.t.p., teremos (Proposição 3.16,Letra (c))

t (i) 2 r (i) 2 X0

q.t.p.,

o que é absurdo pois X é um conjunto base. Isso prova que ; = q1

(r) 2 ?A.

Se a função ? : X! ! Y! for um monomorfismo não standard, então pelo Exemplo4.31 teremos

?; = ; 2 ?A,

implicando em ; 2 A pelo PT. Nesse caso, como A é arbitário, o conjunto vazio pertenceráa todo X!-conjunto de posto 1 que tem um átomo como elemento, o que é claramenteum absurdo como diversos contraexemplos mostram. Portanto, a função ? indicada naDefinição 5.10 não pode ser um monomorfismo não standard quando X 6= ;.

5.4 Outra Fatoração de ⇤nInvestigando o Exemplo 5.11, observa-se que as inconveniências surgem quando

aplicamos a função q1

a uma função r 2 IX1

� IX0

tal que r (i) 2 X0

q.t.p. Caso pudés-semos aplicar a definição de q

0

ao calcularmos a imagem q1

(r), ou seja, caso de algumamaneira pudéssemos considerar r como um elemento de IX

0

= dom (q0

), teríamos

q1

(r) “=” q0

(r)

“=” lim

X,Ur (i)

1 Existe um X!-conjunto com tal propriedade. Como exemplo, podemos tomar A = {a, {a}}.

139

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em vez de q1

(r) = ;, tornando a conclusão da argumentação daquele exemplo impraticá-vel. Há coerência e significância em expressar o ultralimite lim

X,Ur (i) (Notação 3.21), e isso

sugere que devemos considerar uma nova sequência de funções

f0

⇢ f1

⇢ f2

⇢ · · ·

definidas de modo análogo às funções q0

q1

q2

. . . tal que os elementos do domínio de cada fn

é o conjunto das funções r : I ! X! tais que r (i) 2 Xn q.t.p. Informalmente, pode-se in-terpretar dom (fn) como sendo o conjunto das funções do tipo I ! X! que “praticamentepertencem a IXn”.

Definição 5.12.

• Para cada n < !, seja

Wn :

=

r 2 IX!... r (i) 2 Xn q.t.p.

,

e seja W! :

=

1[

n=0

Wn;

• Seja f0

: W0

! Y0

a função dada por

f0

(r) := lim

X,Ur (i) ,

onde tal ultralimite é determinado na Notação 3.21. Supondo que a função fn jáfoi determinada, definimos a função fn+1

como sendo a extensão da função fn aodomínio Wn+1

tal que

fn+1

(r) :=

fn (s)... s 2 Wn e s (i) 2 r (i) q.t.p.

para cada r 2 Wn+1

�Wn;

• A extensão infinita das funções fn, a qual é dada por1[

n=0

fn, será denotada por f.

Os níveis Yn em Y! podem ser considerados como contradomínios das funções fn.

Proposição 5.13. Para cada ordinal finito n, temos Im (fn) ⇢ Yn.

Demonstração. Claramente, a afirmação do enunciado é válida no caso n = 0. Se ela forválida para todo ordinal menor ou igual a um ordinal finito n, e se s 2 Wn+1

�Wn, então

fn+1

(s) =

fn (r)... r 2 Wn e r (i) 2 s (i) q.t.p.

⇢ Yn

e fn+1

(s) 2 Y n+1, provando que Im (fn+1

) ⇢ Yn+1

. Pelo Princípio da Indução, a demons-tração está completa.

140

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Cada função fn é do tipo Wn ! Yn, e f é do tipo W! ! Y!.

Até o restante deste capítulo, aplicaremos as Proposições 3.16 e 3.40 semmencioná-las explicitamente.

Proposição 5.14. Se r 2 IX!, se s 2 Wn+1

com n < !, e se r (i) 2 s (i) q.t.p., entãos 62 W

0

e r 2 Wn.

Demonstração. Se s 2 W0

, então s (i) 2 X q.t.p. e r (i) 2 s (i) 2 X q.t.p., o que éabsurdo pois X é um conjunto base. Portanto, temos s 62 W

0

, s (i) 2 Xn+1 q.t.p. er (i) 2 s (i) ⇢ Xn q.t.p., resultando em r (i) 2 Xn q.t.p.

Corolário 5.15. Para cada ordinal finito n e para cada s 2 Wn+1

, temos

f (s) = fn+1

(s)

=

fn (r)... r 2 W! e r (i) 2 s (i) q.t.p.

=

f (r)... r 2 W! e r (i) 2 s (i) q.t.p.

=

f (r)... r 2 IX! e r (i) 2 s (i) q.t.p.

.

Proposição 5.16. Sejam r, s 2 W!.

(a) f (r) = f (s) se, e somente se, r (i) = s (i) q.t.p.;

(b) f (r) 2 f (s) se, e somente se, r (i) 2 s (i) q.t.p.

Demonstração. A letra (b) é consequência imediata da letra (a).

(a) Se r, s 2 W0

, então

lim

X,Ur (i) = f

0

(r) = f (r) = f (s) = f0

(s) = lim

X,Us (i)

e a conclusão desejada será imediata. Suponha que o resultado desejado é válidopara os elementos de Wn (n < !), suponha que r, s 2 Wn+1

�Wn, e suponha quer (i) 6= s (i) q.t.p. Pelo Axioma da Extensão (Definições B.1 e B.4), temos

(r (i) ⇢ s (i)) s (i) 6⇢ r (i)) q.t.p.,

e podemos assumir que r (i) 6⇢ s (i) q.t.p. sem perda de generalidade. Comor, s 62 W

0

, temos(r (i) 6⇢ s (i) ^ r (i) , s (i) 2 X!

) q.t.p.,

ou seja, existe um U 2 U tal que r (i) 6⇢ s (i) e r (i) , s (i) 2 X! para todo i 2 U .Para cada i 2 U , seja u (i) um elemento de r (i) que não pertence a s (i), e, para cada

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i 2 I � U , seja u (i) := ;. Definimos, assim, uma função u : I ! X! pertencentea Wn (Proposição 5.14) tal que u (i) 2 r (i) q.t.p. e u (i) 62 s (i) q.t.p., resultandoem f (u) 2 f (r). Se f (u) 2 f (s), então existirá um v 2 Wn com v (i) 2 s (i) q.t.p.tal que f (u) = f (v), e, pela hipótese de indução, teremos u (i) = v (i) q.t.p. eu (i) 2 s (i) q.t.p., o que é absurdo. Portanto, temos f (u) 2 f (r) � f (s), o que éabsurdo, provando a proposição pelo Princípio da Indução.

Enfim, dispomos das ferramentas necessárias para trabalhar com os objetos mate-máticos desejados neste capítulo: as funções ⇤

0

⇤1

⇤2

. . . e a função ⇤.

Definição 5.17. Para cada n < !, seja

⇤n :

= fn � pn : Xn ! Yn

e seja

⇤ :=1[

n=0

⇤n : X! ! Y!.

Note que ⇤n = ⇤ �Xn (8n < !) e ⇤ = f � p.

Corolário 5.18. Para cada X!-conjunto não nulo A, temos

⇤A =

f (r)... r 2 IA

.

Demonstração. Seja n < ! tal que A 2 Xn, e seja a um elemento de A. Se r : I ! A

for uma função, então, como A ⇢ Xn�1

e I 2 U , teremos r : I ! X! e r (i) 2 A q.t.p.,implicando que f (r) pertencerá a ⇤A. Suponha que s : I ! X! é uma função comr (i) 2 A q.t.p., seja U :

= s�1 hAi, e seja r : I ! A a função dada por

r (i) :=

8

<

:

s (i) se i 2 U

a se i 2 I � U.

Assim, temos U 2 U , s (i) = r (i) q.t.p., e f (s) = f (r) 2⇢

f (r)... r 2 IA

pela

Proposição 5.16.

5.5 Monomorfismos Não Standard Existem

Com o acréscimo de uma imposição sobre as características do ultrafiltro U em I,provaremos que a função ⇤ : X! ! Y! é um monomorfismo não standard, alicerçando,assim, a teoria acerca dessas funções descrita nos Capítulos 2 e 4.

142

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Se A ⇢ X, então

⇤ hAi =⇢

⇤x...x 2 A

=

lim

X,Ux

...x 2 A

⇢⇢

lim

X,Ur (i)

... r 2 W0

e r (i) 2 A q.t.p.�

=

⇤A ,

ou seja, A ⇢ ⇤A (Notação 4.18).

Ao lidarmos com o caso particular X = R e I = N na Seção 3.8, atestamosque é suficiente assumir que o ultrafiltro U em I é !

1

-incompleto para assegurar queos subconjuntos infinitos A de X estejam propriamente contidos em seus ultralimitesintegrais lim

X,UA (Corolário 3.70). Como a definição da função ⇤

1

= ⇤ �X1 é fundamentada

na noção de ultralimite integral (Definição 5.8), faremos essa mesma suposição a respeitodo ultrafiltro U em I.

Suposição 5.19. O ultrafiltro U em I é !1

-incompleto.

Pelo Exemplo 3.55, o conjunto I é infinito.

Observação 5.20. Pelo Teorema 3.58, existe um ultrafiltro U em I que satisfaz à Suposição5.19. Pelo Exemplo 5.6, podemos escolher o conjunto I de modo que ele seja uma cópiade N, e, nesse caso, o Lema do Ultrafiltro e a Proposição 3.57 implicam a existência de Ucom a propriedade desejada.

Proposição 5.21. A função ⇤ : X! ! Y! obedece ao axioma (Mon2), ou seja, se A forum subconjunto infinito de X, então A ( ⇤A.

Demonstração. Temos !1

6 |A|+ e o ultrafiltro U é |A|+-incompleto, resultando que aimersão canônica e : A!

Y

U

A não é sobrejetora (Proposição 3.60). Seja u :

Y

U

A! ⇤A

a bijeção canônica (Proposição 3.29). Portanto, a composição u � e : A ! ⇤A não ésobrejetora, e, como (u � e) (x) =

⇤x (8x 2 A), existe um elemento de ⇤A que não é daforma ⇤x para x 2 A.

Com o intuito de demonstrar que ⇤ obedece ao axioma (Mon3), apontaremos osseguintes lemas:

Lema 5.22. Seja C (i, x) uma condição nas variáveis i e x, e seja r 2 W!. As condições

[(9x 2 X!) (x 2 r (i) ^ C (i, x))] q.t.p.

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e(9s 2 W!) [(s (i) 2 r (i) ^ C (i, s (i))) q.t.p.]

são equivalentes.

Demonstração. A prova de que a segunda condição implica na primeira é imediata. Supo-nha que existe um conjunto U no ultrafiltro U tal que (9x 2 X!) (x 2 r (i) ^ C (i, x)) paratodo i 2 U . Para cada i 2 U , seja s (i) um X!-objeto pertencente a r (i) tal que C (i, s (i)),e, para cada i 2 I � U , seja s (i) := ;. Assim, definimos uma função s : I ! X! tal ques (i) 2 r (i) q.t.p. e C (i, s (i)) q.t.p. Pela Proposição 5.14, temos s 2 W!, provando acondição necessária da equivalência desejada.

Lema 5.23. Para toda L✏-fórmula � (x1

. . . xn) com quantificadores limitados, e paraquaisquer r

1

. . . rn 2 W!, temos

|= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p., ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) .

Demonstração. A prova é por indução sobre a complexidade de �. Suponha que � (x1

. . . xn)

é uma L✏-fórmula de complexidade k, e suponha que o resultado do Lema já foi provadopara toda L✏-fórmula de complexidade < k. Sejam r

1

. . . rn 2 W!.

• Se � (x1

. . . xn) for uma L✏-fórmula atômica, então n = 2, e � = x1

2 x2

ou� = x

1

= x2

. No primeiro caso, as seguintes condições serão equivalentes:

1. |= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p.;

2. |= r1

(i) 2 r2

(i) q.t.p.;

3. r1

(i) 2 r2

(i) q.t.p.;

4. f (r1

) 2 f (r2

) ;

5. ⇤ |= f (r1

) 2 f (r2

) ;

6. ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) ,

onde usamos a Proposição 5.16 na equivalência 3, 4. A prova do caso � = x1

= x2

é análoga.

• Se � (x1

. . . xn) for da forma

� (x1

. . . xn) = ¬� (x1

. . . xn) ,

então a L✏-fórmula � terá complexidade k�1, e as seguintes condiçõesserão equivalentes:

1. |= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p.;

2. 6|= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p.;

3. ⇤ 6|= � (f (r1

) . . . f (rn)) ;

4. ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) ,

onde usamos a hipótese de indução em 2, 3.

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• Se � (x1

. . . xn) for da forma

� (x1

. . . xn) = (� (x1

. . . xn) ^ (x1

. . . xn)) ,

então as L✏-fórmulas � e terão complexidades menores que k, e as seguintes con-dições serão equivalentes:

1. |= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p.;

2. |= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p. e |= (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p.;

3. ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) e ⇤ |= (f (r1

) . . . f (rn)) ;

4. ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) ,

onde usamos a hipótese de indução em 2, 3.

• Se � (x1

. . . xn) for da forma (9y)� (x1

. . . xn, y) (onde y é uma variável que nãoaparece na lista x

1

. . . xn), então, como � tem quantificadores limitados (DefiniçãoA.16), a L✏-fórmula � (x

1

. . . xn, y) será da forma

� (x1

. . . xn, y) = y 2 xm ^ (x1

. . . xn, y) ,

onde 1 6 m 6 n e (x1

. . . xn, y) é uma L✏-fórmula. Sem perda de generalidadeassumiremos m = 1. As condições

⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) ;

(9g 2 Y!) ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn) , g) ;

(9g 2 f (r1

) \ Y!) ⇤ |= (f (r1

) . . . f (rn) , g)

são equivalentes. Como Y é um conjunto base, se g 2 f (r1

)\ Y!, então f (r1

) 62 Y ,r1

62 W0

, e

g 2 f (r1

) =

f (s)... s 2 W! e s (i) 2 r

1

(i) q.t.p.�

pelo Corolário 5.15, implicando que existe um s 2 W! tal que s (i) 2 r1

(i) q.t.p.e g = f (s). Portanto, como a fórmula tem complexidade k � 2, as seguintescondições são equivalentes:

1. ⇤ |= � (f (r1

) . . . f (rn)) ;

2. (9g 2 f (r1

) \ Y!) ⇤ |= (f (r1

) . . . f (rn) , g) ;

3. (9s 2 W! com s (i) 2 r (i) q.t.p.) ⇤ |= (f (r1

) . . . f (rn) , f (s)) ;

4. (9s 2 W! com s (i) 2 r (i) q.t.p.) |= (r1

(i) . . . rn (i) , s (i)) q.t.p.;

5. (9s 2 W!) (|= s (i) 2 r1

(i) ^ (r1

(i) . . . rn (i) , s (i)) q.t.p.) ;

6. ((9x 2 X!) |= x 2 r1

(i) ^ (r1

(i) . . . rn (i) , x)) q.t.p.;

7. |= � (r1

(i) . . . rn (i)) q.t.p.,

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onde usamos a hipótese de indução na equivalência 3 , 4 e usamos o Lema 5.22em 5, 6.

• As provas dos casos

� (x1

. . . xn) = � (x1

. . . xn) _ (x1

. . . xn)

e� (x

1

. . . xn) = (8y 2 x1

) (x1

. . . xn, y)

são consequências imediatas dos casos que provamos e das identidades lógicas

� _ , [¬ ((¬�) ^ (¬ ))]

e(8y 2 x

1

) , (¬ (9y 2 x1

) (¬ )) ,respectivamente.

A indução está completa, provando que o resultado desejado é válido para toda L✏-fórmula� (x

1

. . . xn) com quantificadores limitados.

Proposição 5.24. A função ⇤ : X! ! Y! satisfaz ao axioma (Mon3).

Demonstração. Se � (x1

. . . xn) for uma L✏-fórmula com quantificadores limitados, e sea1

. . . an forem X!-objetos, então pelo Lema 5.23 temos a equivalência

|= � (p (a1

) (i) . . . p (an) (i)) q.t.p., ⇤ |= � (f (p (a1

)) . . . f (p (an))) .

Como p (am) (i) = am para quaisquer m 2 [1, n]N e i 2 I, e como I 2 U , temos

|= � (a1

. . . an), ⇤ |= � (⇤a1

. . . ⇤an) .

Em nossa construção do conjunto base Y e em nossa verificação de que a função⇤ satisfaz aos axiomas (Mon1), (Mon2) e (Mon3), fizemos duas suposições cruciais emrelação ao conjunto não nulo I e ao ultrafiltro U sobre I: as Suposições 5.5 e 5.19. NoExemplo 5.6 e na Observação 5.20 vimos que existem infinitas escolhas de I e U tais queessas duas suposições sejam obedecidas, e a prova do principal teorema desta dissertaçãoestá completa.

Teorema 5.25 (Existência dos Monomorfismos Não Standard). Se X for um conjuntobase, então existirão um conjunto base Y e um monomorfismo não standard ⇤ : X! ! Y!.

A concepção de ⇤ que elaboramos é dita ser uma construção por ultraprodu-tos. Existem outras construções dessa variedade que obtêm monomorfismos não standardcom particularidades desejáveis, e também existem construções dessas funções que nãoenvolvem ultraprodutos.

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5.6 ⇤Q e ⇤R são Cauchy-completos

Encerraremos este capítulo mostrando que, dependendo do monomorfismo nãostandard ⇤ considerado, é possível concluir que os corpos ordenados dos números hiper-racionais e hiper-reais, ⇤Q e ⇤R, são Cauchy-completos.

Assumiremos que X contém uma cópia do conjunto dos números racionais,e escreveremos Q ⇢ X.

Lema 5.26. Para quaisquer A,B 2 X! e para toda função h : ⇤ hAi ! ⇤B, existe umaextensão interna H :

⇤ A! ⇤B de h.

Demonstração. Para cada a 2 A, temos h (⇤a) 2 ⇤B e existe uma função ta : I ! B talque h (⇤a) = f (ta) (Corolário 5.18). Seja T : I ! AB a função dada por T (i) (a) := ta (i).Como AB 2 X! (Teorema 4.8, Letra (l)), temos (Teorema 4.32, Letra (h))

f (T ) 2 ⇤ �AB�

= I! \ (

⇤A)

(

⇤B) ,

ou seja, f (T ) é uma função interna do tipo ⇤A! ⇤B. Seja H :

= f (T ). Pela definição dafunção T , para cada a 2 A a condição

|= (p (a) (i) , ta (i)) 2 T (i)

é verdadeira para todo i 2 I, e, pelo Lema 5.23, temos

⇤ |= (f (p (a)) , f (ta)) 2 f (T ) ,

ou seja, ⇤ |= (

⇤a, h (⇤a)) 2 H, implicando em H (

⇤a) = h (⇤a) (8a 2 A) .

Lema 5.27. Seja K um X!-conjunto tal que ⇤K ⇢ ⇤X!. Se B for um subconjuntoenumerável de ⇤K que satisfaz à PIF (Definição 3.10), então

T

B 6= ;.

Demonstração. Sejam B1

B2

. . . Bn . . . os elementos de B, e seja h : N ! ⇤K a funçãodada por h (n) := Bn. Existe uma extensão interna H :

⇤ N ! ⇤K de h (Lema 5.26), e,como a união U :

=

S ⇤K é interna (Teorema 4.25, Letra (b)), o conjunto

G :

=

n 2 ⇤N ... ⇤ |= (9x 2 U) (8m 2 ⇤N) (m 6 n �! x 2 H (m))

é interno pelo PDI. Como B observa a PIF, temos N ⇢ G e existe um número hipernaturalinfinito N pertencente a G (Teorema 4.51, Letra (a)), resultando que existe umx 2 U tal que

x 2\

m2[1,N ]⇤N

H (m) ⇢\

m2N

H (m) =

\

m2N

h (m) =

\

B.

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A propriedade de ⇤ descrita no enunciado do Lema 5.27 é chamada de !1

-saturação.Assim, o monomorfismo não standard ⇤ descrito na Definição 5.17 é !

1

-saturado.

Teorema 5.28. Toda sequência de Cauchy no corpo ordenado dos números hiper-racionaisé eventualmente constante.

Demonstração. Suponha que x1

x2

x3

. . . é uma sequência de Cauchy em ⇤Q que não éeventualmente constante. Para cada n 2 N, seja mn o menor índice maior que n talque xn 6= xmn , e seja yn :

= |xn � xmn |. Seja B o conjunto de intervalos em ⇤Q dadopor

(0, yn)⇤Q

n>1

. Como todo elemento de B é interno (Exemplo 2.28), temos (Teorema4.32, Letra (g))

B ⇢ I! \ P (

⇤Q) =

⇤(P (Q)) ,

e, como B é enumerável e satisfaz à PIF, existirá um número hiper-racional positivo r

tal que r < yn (8n) (Lema 5.27). Assim, como supomos que {xn} é uma sequência deCauchy, existe um número natural N tal que para quaisquer números naturais m

e n temos a implicaçãom,n > N ) |xm � xn| < r,

o que é absurdo, visto que N,mN > N e r < yN = |xN � xmN |. Portanto, provamos quetoda sequência de Cauchy em ⇤Q é eventualmente constante.

Trocando toda ocorrência do conjunto Q por R nesta seção, obtém-se uma de-monstração completa de que toda sequência de Cauchy em ⇤R é eventualmente constante.Assim, ⇤R é Cauchy-completo.

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Apêndice

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AConceitos da Teoria dos Modelos

Diversos conceitos da Teoria dos Modelos, área que estuda classes de estruturasmatemáticas sob a perspectiva da Lógica Matemática, são imprescindíveis para o textoprincipal desta dissertação. Este apêndice tem o propósito de recapitular esses conceitos,assim como prestar esclarecimentos acerca das definições e terminologias relevantes queserão amplamente empregadas ao longo do trabalho. Para uma exposição detalhada,ver (13, 28, 39).

A.1 Monóides Livres

A codificação de mensagens na maioria dos sistemas de escrita concebidos na his-tória da humanidade consiste em sequências horizontais de símbolos engravados em umatela, e esses símbolos devem pertencer a um conjunto, o alfabeto do sistema. O corres-pondente a esse procedimento na Teoria dos Conjuntos (ZFC ou NBG) é desempenhadoatravés dos monóides livres.

Seja A um conjunto. Considere a função binária

. : SeqF (A)⇥ SeqF (A)! SeqF (A)

definida por

(a1

a2

. . . am) . (b1b2 · · · bn) := a1

a2

. . . amb1b2 . . . bn

=

8

<

:

8

<

:

ai se i 6 m

bi�m se m < i

9

=

;

16i6m+n

.

Note que

((a1

. . . am) . (b1 · · · bn)) . (c1 . . . cp) = (a1

. . . am) . ((b1 . . . bn) . (c1 . . . cp))

= a1

. . . amb1 . . . bnc1 . . . cp

e;. (a

1

a2

. . . am) = (a1

a2

. . . am) .; = a1

a2

. . . am

para quaisquer sequências finitas {ai}i6m , {bi}i6n , {ci}i6p 2 SeqF (A), de modo que afunção binária que definimos é uma lei de composição associativa em SeqF (A) que tem ;como elemento neutro. Assim, o conjunto SeqF (A) é um monóide quando munido dessalei, o qual é chamado de monóide livre sobre A. A lei de composição em SeqF (A) serádenotada por justaposição, ou seja, a composição de quaisquer A e B em SeqF (A) será

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denotada por AB. Os elementos de SeqF (A) são chamados de palavras em SeqF (A), etodo subconjunto de SeqF (A) é dito ser uma linguagem com alfabeto A.

Observação A.1. Na Teoria dos Monóides, é comum estabelecer que um produtório nulo éigual ao elemento neutro do monóide. Assim, temos que um produtório da forma A

1

. . . An

com Ai 2 SeqF (A) (8i) será igual a ; no caso n = 0.

Definição A.2. Sejam A e B duas palavras em SeqF (A). Dizemos que A é uma sub-palavra de B se existirem palavras C e D em SeqF (A) tais que B = CAD.

A.2 Linguagens; Substituição Simultânea

Em certas situações, é necessário e relevante que alguns símbolos em uma palavrasejam substituídos por outras palavras.

Definição A.3. Se S ⇢ N, então uma função s : S ! SeqF (A) é dita ser um esquemade substituição (em SeqF (A)).

Definição A.4. Seja A um alfabeto, seja A = a1

a2

. . . ak (com ai 2 A (8i)) uma palavraem SeqF (A), e seja

s : {i1

< i2

< . . . < in}! SeqF (A)

um esquema de substituição (com in 6 k). A palavra Apsq obtida de A por substituiçãosimultânea das letras de posições i

1

. . . in por s (i1

) . . . s (in), respectivamente, édefinida por

Apsq :

= a1

. . . ai1�1

s (ai1) ai1+1

. . . ai2�1

s (ai2) ai2+1

. . .

. . . ain�1

s (ain) ain+1

. . . ak.

A.3 Assinaturas

Os símbolos matemáticos não lógicos têm papéis sintáticos específicos nos termos esentenças nas quais eles ocorrem. É conveniente que cada um desses símbolos seja enqua-drado em uma categoria correspondente a exatamente uma dessas aplicações sintáticas.

Definição A.5. Uma assinatura é uma quadra ordenada

L :

=

SLrel, SL

fun, SLcon, arL

,

onde:

• SLrel, SL

fun e SLcon são conjuntos disjuntos possivelmente nulos;

• arL é uma função do tipo SLrel [ SL

fun [ {=}! N com arL (=) = 2.

152

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Nesse caso, dizemos que:

• Os elementos de SLrel são os símbolos relacionais em L, os quais denotaremos pela

letra P ;

• Para cada número natural n, os elementos P de SLrel tais que arL (P ) = n são os

símbolos relacionais n-ários em L;

• Os elementos de SLfun são os símbolos funcionais em L, os quais denotaremos pela

letra G;

• Para cada número natural n, os elementos G de SLfun tais que arL (G) = n são os

símbolos funcionais n-ários em L;

• Os elementos de SLcon são os símbolos de constante em L, os quais denotaremos

pela letra c;

• Para cada S 2 SLfun [ SL

rel [ {=}, o número natural arL (S) é dito ser a aridade deS em L.

Em geral, identificamos L com a união disjunta SLrel [ SL

fun [ SLcon, e dizemos que os

elementos dessa união são elementos de L. Em particular, quando os conjuntos SLrel,

SLfun e SL

con forem finitos, denotaremos a assinatura L utilizando-se da notação usual{x

1

x2

. . . xn} para conjuntos finitos, onde a situação de cada símbolo da lista como umsímbolo relacional n-ário, um símbolo funcional n-ário ou um símbolo de constante deveráser explicitada pelo o contexto.

Exemplo A.6. No caso em que

SLrel = SL

fun = SLcon = ;,

dizemos que L é a assinatura vazia, ou L = ; em símbolos.

Exemplo A.7. A assinatura L✏ := {2} tal que 2 é um símbolo relacional binário é ditaser a assinatura dos conjuntos.

Exemplo A.8. A assinatura LG :

= {·,�1 , e} tal que

• · é um símbolo funcional binário;

• �1 é um símbolo funcional unário;

• e é um símbolo de constante

é dita ser a assinatura dos grupos.

153

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Exemplo A.9. A assinatura LA :

= {+, ·, 0, 1} tal que

• + e · são símbolos funcionais binários;

• 0 e 1 são símbolos de constante

é dita ser a assinatura dos anéis.

Exemplo A.10. A assinatura LAO :

= {+, ·, 0, 1, <} tal que

• + e · são símbolos funcionais binários;

• 0 e 1 são símbolos de constante;

• < é um símbolo relacional binário

é dita ser a assinatura dos anéis ordenados.

Definição A.11. Sejam L e L0 duas assinaturas. Dizemos que L é uma subassinaturade L0, ou L0 é uma extensão de L , ou L ⇢ L0 simbolicamente, se:

• SLrel ⇢ SL0

rel;

• SLfun ⇢ SL0

fun;

• SLcon ⇢ SL0

con;

• arL é uma restrição de arL0.

No restante deste apêndice, admitiremos que L é uma assinatura.

As assinaturas contêm apenas os símbolos não lógicos de uma linguagem matemá-tica. Um alfabeto matemático completo também deve conter os símbolos lógicos.

Definição A.12. Seja L uma assinatura, e seja

AL :

= {v1

v2

. . . vi . . . } [ {¬,_,^, 9, 8,=, ), (, ,} [ L,

onde:

• A união tripla que define AL é disjunta;

• {v1

v2

. . . vi . . . } é um conjunto enumerável de objetos vi distintos;

• Os símbolos¬,_,^, 9, 8,=, ), (, e ,

são distintos.

O conjunto AL é dito ser o alfabeto de assinatura L com igualdade. Dizemos que:

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• v1

v2

. . . vi . . . são as variáveis;

• ¬,_,^, 9, 8 são os símbolos lógicosem AL;

• Os elementos de L são os símbolosespecíficos em AL;

• ¬ é o símbolo da negação;

• _ é o símbolo da disjunção;

• ^ é o símbolo da conjunção;

• 9 é o símbolo da quantificaçãoexistencial;

• 8 é o símbolo da quantificaçãouniversal;

• = é o símbolo da igualdade,1 o qualé considerado um símbolo relacionalbinário em L embora não seja um ele-mento de L;

• ( e ) são os parênteses;2

• , é a vírgula.3

As variáveis v1

v2

v3

. . . podem ser denotadas por qualquer outro símbolo, geral-mente as letras x, y e z com ou sem subíndices. Assim, se x

1

. . . xn forem variáveis(distintas), então existirá uma sequência i

1

. . . in de números naturais (distintos)tal que xk = vik (8k).

A.4 Termos

Objetos matemáticos são representados pelas palavras em SeqF (AL) que são ge-radas por três regras sintáticas.

Definição A.13. Dizemos que uma palavra t 2 SeqF (AL) é um L-termo ou um termoem L se existe uma sequência finita não nula de palavras t

1

t2

. . . tk tal que tk = t, e, paracada índice i, uma das seguintes condições é observada:

(Ter1) ti é uma variável;

(Ter2) ti é um símbolo de constante em L;

(Ter3) Existe um símbolo funcional n-ário G em L e existem índices i1

i2

. . . in < i

tais que4

ti = G (ti1,ti2, . . . ,tin) .

1 Note que o símbolo =2 AL é (sutilmente) distinto do símbolo de igualdade = da metateoria. Taldistinção foi introduzida para evitar certas ambiguidades possíveis, como por exemplo na condição� = v1 = v2, a qual afirma que a palavra � é formada pelos símbolos v1, = e v2, nesta ordem.

2 Não é necessário diferenciar os símbolos dos parênteses em AL dos símbolos dos parênteses da meta-teoria (NBG), pois não há exemplos de possíveis ambiguidades resultantes dessa incúria.

3 O símbolo , 2 AL é (sutilmente) distinto da vírgula comum.4 As virgulas do tipo , serão omitidas no restante do texto.

155

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A complexidade de um L-termo t é o número de ocorrências de símbolosfuncionais em t. O conjunto dos L-termos é uma linguagem com alfabeto AL a qual édenotada por T (L). Denotaremos por V (t) o conjunto dos índices das variáveis queocorrem em um termo t, e dizemos que t é um termo fechado se V (t) = ;. A notaçãot (vi1 . . . vin) significará V (t) ⇢ {i

1

. . . in}, onde i1

i2

. . . in 2 N, e, sempre que escrevermost (x

1

. . . xn), estará subentendido que x1

. . . xn são variáveis.

Um subtermo de uma palavra é uma subpalavra dessa palavra que é um termo.

A.5 Fórmulas

Algumas palavras em SeqF (AL) representam afirmações matemáticas completas.

Definição A.14. Dizemos que uma palavra � 2 SeqF (AL) é uma L-fórmula ou umafórmula em L (de primeira ordem) se existe uma sequência finita não nula de palavras�1

�2

. . .�k tal que �k = �, e, para todo índice i, uma das seguintes condições é observada:

(For1) Existem um símbolo relacional n-ário P em L e L-termos t1

t2

. . . tn tais que

�i = P (t1

t2

. . . tn) .

Tais fórmulas são chamadas de fórmulas atômicas;

(For2) Existe um índice j < i tal que �i = (¬�j);

(For3) Existem índices j, k < i tais que �i = (�j _ �k);

(For4) Existem índices j, k < i tais que �i = (�j ^ �k);

(For5) Existem um índice j < i e uma variável x tais que �i = (9x)�j;

(For6) Existem um índice j < i e uma variável x tais que �i = (8x)�j.

Nota. Em ocasiões, omitiremos pares de parênteses que não forem estritamente necessáriospara evitar ambiguidades em algumas fórmulas. Porém, em outras ocasiões, adicionare-mos pares de parênteses que ajudem na “leitura semântica” das fórmulas.

A complexidade de uma L-fórmula � é o número de ocorrências dos símbolos ¬, _, ^,9 e 8 em �. O conjunto das L-sentenças é uma linguagem com alfabeto AL, a qual échamada de linguagem de primeira ordem de assinatura L com igualdade e édenotada por L=

!!.

Notação A.15. Para quaisquer L-fórmulas �1

e �2

, as L-fórmulas

((¬�1

) _ �2

) e (((¬�1

) _ �2

) ^ ((¬�2

) _ �1

))

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são respectivamente denotadas por

(�1

�! �2

) e (�1

! �2

) .

Fórmulas da forma (�1

�! �2

) são implicações, e fórmulas da forma (�1

! �2

) sãoduplas implicações ou equivalências.

Uma subfórmula de uma palavra é uma subpalavra dessa palavra queé uma fórmula.

A.6 Fórmulas em L✏ com Quantificadores Limitados

As fórmulas mais relevantes para o estudo da Análise Não Standard são fórmulasem L✏ (Exemplo A.7) que podem conter quantificadores apenas em certasconfigurações específicas.

Definição A.16. Dizemos que uma L✏-fórmula � tem quantificadores limitados se asseguintes condições são observadas:

(QLim1) Para toda subfórmula de � da forma (9x)� para alguma variável x e algumafórmula �, a fórmula � é da forma

� = (x 2 y ^ )

para alguma variável y e alguma fórmula ;

(QLim2) Para toda subfórmula de � da forma (8x)� para alguma variável x e algumafórmula �, a fórmula � é da forma

� = (x 2 y �! )

para alguma variável y e alguma fórmula .

Notação A.17. Para quaisquer variáveis x e y e para qualquer L✏-fórmula , as L✏-fórmulas

(9x) (x 2 y ^ ) e (8x) (x 2 y �! )

são respectivamente denotadas por

(9x 2 y) e (8x 2 y) .

Tais fórmulas têm quantificadores limitados.

Exemplo A.18. A L✏-fórmula

� = (8x) (x 2 y _ y 6= z) ^ z = w

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não tem quantificadores limitados, pois a fórmula

(8x) (x 2 y _ y 6= z)

é uma subfórmula de �, e a fórmula

(x 2 y _ y 6= z)

não é da forma (x 2 vi �! ). Assim, � não satisfaz à condição (QLim2).

Exemplo A.19. A L✏-fórmula

� = (9y) (y 2 x ^ y 62 z) �! (8y) (y 62 z _ y = w)

tem quantificadores limitados, pois:

• A única subfórmula de � da forma (9vi)� é a fórmula

(9y) (y 2 x ^ y 62 z) ,

e a fórmula (y 2 x ^ y 62 z) é da forma (y 2 vi ^ ) para alguma variável vi (nestecaso x) e para alguma fórmula (neste caso y 62 z), observando a condição (QLim1).

• A única subfórmula de � da forma (8vi)� é a fórmula

(8y) (y 62 z _ y = w) ,

e a fórmula (y 62 z _ y = w) é da forma (y 2 vi �! ) para alguma variável vi

(neste caso z) e para alguma fórmula (neste caso y = w), observando a con-dição (QLim2).

A.7 Variáveis Livres e Variáveis Ligadas

É proveitoso classificar as ocorrências das variáveis que ocorrem em uma L-fórmulade acordo com o papel que ela desempenha na fórmula: denotar um objeto matemáticofixo em um dado contexto ou representar a atuação de um quantificador.

Definição A.20. Seja � = �1

�2

. . .�n (com �i 2 AL (8i)) uma L-fórmula, sejat = t

1

t2

. . . tr (com ti 2 AL (8i)) um L-termo, e seja x uma variável. Temos as definições:

• Dizemos que x ocorre livre em � na posição i se �i = x e não existe uma subfórmula�j�j+1

. . .�j+m de � das formas (9x)� ou (8x)� tal que j 6 i 6 j +m;

• Dizemos que x ocorre livre em � se x ocorre livre em � em alguma posição i. Oconjunto dos índices das variáveis que ocorrem livres em � é denotado por V (�);

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• � é dita ser uma L-sentença ou uma sentença em L se V (�) = ;;

• Dizemos que x ocorre ligada em � na posição i se x não ocorre livre em � naposição i;

• Dizemos que x ocorre ligada em � se x ocorre ligada em � em alguma posição;

• Dizemos que t é livre para x em � na posição i se x ocorre livre em � na posição i,e, para cada índice j tal que tj é uma variável, temos que tj ocorre livre na fórmula

�1

. . .�i�1

t�i+1

. . .�n

na posição i+ j � 1;

• Dizemos que t é livre para x em � se, para cada índice i tal que x ocorre livre em� na posição i, temos que t é livre para x em � na posição i.

A notação � (vi1 . . . vin) significará V (�) ⇢ {i1

. . . in}, onde i1

i2

. . . in 2 N, e, sempre queescrevermos � (x

1

. . . xn), estará subentendido que x1

. . . xn são variáveis.

As propriedades básicas da função � 7! V (�) estão retratadas no teorema a seguir:

Teorema A.21. Seja P um símbolo relacional n-ário em L, sejam t1

. . . tn L-termos,sejam � e � duas L-fórmulas, e seja vi uma variável. Temos:

(a) V (P (t1

. . . tn)) =n[

k=1

V (tk);

(b) V ((¬�)) = V (�) ;

(c) V (� _ �) = V (�) [ V (�) ;

(d) V (� ^ �) = V (�) [ V (�) ;

(e) V ((9vi)�) = V (�)� {i} ;

(f) V ((8vi)�) = V (�)� {i} .

A.8 Substituição de Variáveis em Termos e Fórmulas

O modo mais relevante do processo de substituição (Definição A.4) consiste nasubstituição de variáveis em termos e fórmulas por termos. Quando essa operação éexecutada sobre uma fórmula, evita-se alterar as variáveis ligadas e introduzir termos quecontenham variáveis que possam estar ligadas a algum quantificador após a permuta.

Definição A.22.

(a) Sejat = t

1

t2

. . . tk = t (x1

. . . xn)

(com ti 2 AL (8i)) um L-termo, sejam h1

. . . hn L-termos, sejam i1

i2

. . . ip 6 k osíndices tais que cada tij é uma variável, e seja s : {i

1

i2

. . . ip} ! T (L) o esquema

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de substituição definido por s (ij) :

= hu quando tij = xu. A palavra tpsq é umL-termo, o qual é denotado por t (h

1

. . . hn).

(b) Seja� = �

1

�2

. . .�k = � (x1

. . . xn)

(com �i 2 AL (8i)) uma L-fórmula, sejam h1

. . . hn L-termos tais que cada hu élivre para xu em �, sejam i

1

i2

. . . ip 6 k os índices tais que cada �ij é uma variávelque ocorre livre em � na posição ij, e seja s : {i

1

i2

. . . ip} ! T (L) o esquema desubstituição definido por s (ij) :

= hu quando �ij = xu. A palavra �psq é umaL-fórmula, a qual é denotada por � (h

1

. . . hn).

A.9 Estruturas

Muitas estruturas matemáticas consistem em um conjunto munido de relações,funções e constantes definidas nesse conjunto. À vista disso, pode-se compreender umaassinatura (Definição A.5) como um esquema de construção adequado a um determinadotipo de estrutura, o qual contém as variedades de munições que devem ser fornecidas aum conjunto para que ele seja uma estrutura do tipo desejado.

Definição A.23. Uma L-estrutura M é uma terna ordenada

kMk , L, IM�

,

onde:

• kMk é um conjunto não nulo, o qual é dito ser o universo de M . Na prática, porabuso de linguagem, é comum denotar o conjunto kMk simplesmente por M quandonão houver risco de confusão;

• IM é uma função com domínio SLrel [ SL

fun [ SLcon [ {=} tal que:

– Para cada P 2 SLrel, a imagem IM (P ) é uma relação arL (P )-ária em kMk, a

qual é dita ser a M-interpretação de P e é denotada por PM ;

– Para cada G 2 SLfun, a imagem IM (G) é uma função arL (G)-ária em kMk, a

qual é dita ser a M-interpretação de G, e ela é denotada por GM;

– Para cada c 2 SLcon, a imagem IM (c) é um elemento de M , o qual é dito ser a

M-interpretação de c e é denotado por cM ;

– Definimos:IM (=) = =M

:

=

(x, y) 2 kMk2 ...x = y

.

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Nesta dissertação, abriremos exceção para a regra kMk 6= ; somente quando aassinatura L for tal que SL

fun = SLcon = ;. Assim, por exemplo, consideraremos que a

terna�

;, ;, IM�

é uma ;-estrutura, onde IM é a função definida em {=} dadapor IM (=)

:

= ;.

Exemplo A.24. Se L for a assinatura vazia, então L não terá símbolo algum para serinterpretado por uma L-estrutura M , implicando que tal estrutura sempre poderá seridentificada com seu conjunto de elementos. Ou seja, nesse caso podemos dizer que asL-estruturas são os conjuntos.

Definição A.25. Sejam L0 uma assinatura que estende L, seja M uma L-estrutura, eseja N uma L0-estrutura. Dizemos que M é a redução de N a uma L-estrutura, ou N éuma expansão de M a uma L0-estrutura, se as seguintes condições são observadas:

• kMk = kNk ;

• PM= PN para cada símbolo relacional P em L;

• GM= GN para cada símbolo funcional G em L;

• cM = cN para cada símbolo de constante c em L.

A.10 Expansões Naturais

Em algumas aplicações, é proveitoso estender o conjunto de símbolos de constantede uma assinatura.

Definição A.26. Seja U um conjunto e seja u 7! u uma bijeção com domínio U cujaimagem, U , é disjunta de L. Denotaremos por L (U) a extensão de L definida por

• SL(U)

rel :

= SLrel;

• SL(U)

fun :

= SLfun;

• SL(U)

con :

= SLcon [ U ;

• arL(U)

:

= arL.

Em palavras, a assinatura L (U) é obtida de L anexando a esta os símbolos de constantepertencentes ao conjunto U .

Nota A.27. Podemos atribuir propriedades extras à bijeção u 7! u de acordo com anecessidade de cada situação. Exemplos dessas atribuições são:

• Se U \ L = ;, então poderemos assumir que u = u (8u 2 U). Tal simplificação ébastante usada na literatura;

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• Sejam {ui}i2I e {u0i}i2I duas famílias, e sejam ui 7! ui e u0

i 7! u0i duas bijeções5 com

respectivos domínios {ui}i2I e {u0i}i2I cujas respectivas imagens,

ui

i2I en

u0i

o

i2I,

são disjuntas de L. Podemos assumir que ui = u0i (8i 2 I) quando tivermos a in-

tenção de impor que os símbolos de constante anexados à assinatura L na definiçãode L

{ui}i2I�

sejam iguais aos símbolos de constante anexados à assinatura L nadefinição de L

{u0i}i2I

. Nesse caso, os índices i 2 I operam como “etiquetas” queobjetivam identificar cada símbolo de constante ui = u0

i que será anexado a L.

Se U for um subconjunto do universo de uma L-estrutura M , então uma maneiracanônica de definir uma L (U)-estrutura consiste em interpretar os símbolos de constanteadicionados a L por eles próprios.

Definição A.28. Seja M uma L-estrutura e seja U ⇢ kMk. Denotaremos por MU aL (U)-estrutura definida por

• kMUk = kMk ;

• PMU:

= PM�

8P 2 SLrel

;

• GMU:

= GM�

8G 2 SLfun

;

• cMU:

= cM�

8c 2 SLcon

;

• uMU:

= u (8u 2 U).

A linguagem de NBG é gerada pela assinatura L✏, a qual contém apenas o sím-bolo relacional binário 2 representante da relação de pertinência, e todas as operaçõesconjuntistas podem ser expressas por L✏-fórmulas. Tais sequências finitas de símbolostêm comprimentos enormes para a maioria dos teoremas relevantes de NBG, exigindo quenotações sejam introduzidas na atividade matemática a fim de reduzir a aparência dasfórmulas abordadas.

Quando apenas as fórmulas com quantificadores limitados (Definição A.16) sãoconsideradas, para que esse processo de abreviação seja praticável é preciso que o universono qual os objetos são considerados seja um conjunto U predeterminado no contexto.Nesse caso, as noções matemáticas poderão ser descritas por L✏ (U)-fórmulas, e, como oconjunto U muitas vezes não é mencionado nas versões abreviadas dessas fórmulas, taisL✏ (U)-fórmulas são tratadas como L✏-fórmulas por abuso de linguagem. As notações aseguir exemplificam essa prática, onde assumiremos que U \ L = ; e u = u (8u 2 U).

Notação A.29. A L✏ (U)-fórmula com quantificadores limitados dada por

(8w 2 U) (w 2 z ! (w = x _ w = y))

é denotada por z = {x, y}, para quaisquer variáveis x, y, z e w. Se t1

, t2

e t3

foremL✏ (U)-termos, então a substituição simultânea das respectivas variáveis x, y e z por t

1

,t2

e t3

em z = {x, y} será denotada por t3

= {t1

, t2

}.5 Tais bijeções são comumente denotadas da mesma maneira, viz. com uma barra embaixo do objeto

do domínio da função. Porém, em geral, elas são distintas.

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Notação A.30. A L✏ (U)-fórmula com quantificadores limitados dada por

(8w 2 U) (w 2 z ! (w = {x, x} _ w = {x, y}))

é denotada por z = (x, y), para quaisquer variáveis x, y, z e w. Se t1

, t2

e t3

foremL✏ (U)-termos, então a substituição simultânea das respectivas variáveis x, y e z por t

1

,t2

e t3

em z = (x, y) será denotada por t3

= (t1

, t2

).

Notações da forma z = ... como as mostradas acima podem ser aproveitadas paradefinir notações de inúmeras outras formas, como mostra o exemplo a seguir.

Notação A.31. A L✏ (U)-fórmula com quantificadores limitados dada por

(8w 2 U) (w = (x, y)! w 2 z)

é denotada por (x, y) 2 z ou y = z (x), onde assume-se (implicitamente) que uma variáveldistinta de w está ligada ao quantificador presente na composição interna da fórmulaw = (x, y). Se t

1

, t2

e t3

forem L✏ (U)-termos, então a substituição simultânea dasrespectivas variáveis x, y e z por t

1

, t2

e t3

em (x, y) 2 z será denotada por (t1

, t2

) 2 t3

ou t2

= t3

(t1

).

A.11 Interpretação de Termos Fechados

Cada L-termo representa um objeto matemático, e, para cada L-estrutura M , háuma maneira de vincular cada L-termo a um elemento de M .

Definição A.32. Seja M uma L-estrutura. Para cada L-termo fechado t definiremos oelemento tM de M indutivamente sobre a complexidade de t. Se t tem complexidade 0,então t é um símbolo de constante em L, e, nesse caso, definimos tM :

= IM (t). Para umnúmero natural k, suponha que tM está definido para L-termos fechados t de complexidade< k, e suponha que t é um L-termo fechado de complexidade k. O termo t é da formaG (w

1

w2

. . . wn), onde G é um símbolo funcional n-ário em L e cada wi é um L-termofechado. Assim, definimos:

tM :

= GM�

wM1

wM2

. . . wMn

.

Note que os termos w1

w2

. . . wn têm complexidade < k, pois suas complexidades somamk � 1. Para um L-termo fechado t, o elemento tM de M é dito ser aM-interpretação de t.

Notação A.33. Seja M uma L-estrutura. Se t (x1

. . . xn) for um L-termo e a1

. . . an 2M ,então t

a1

. . . an�

será um L (M)-termo fechado, e a sua MM -interpretação, t�

a1

. . . an�MM ,

será denotada portM (a

1

. . . an) .

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A.12 Relação de Satisfatibilidade

Cada L-fórmula é uma representação de uma afirmativa matemática, e, para cadaL-estrutura M , há uma maneira formal de averiguar se uma L-fórmula simboliza umaasserção verdadeira ou falsa acerca da essência de M .

Definição A.34. Seja M uma L-estrutura. Definiremos a relação de satisfatibili-dade, M |= �, para toda L (M)-sentença � indutivamente sobre a complexidade de �.Primeiramente, definimos M |= � para L (M)-sentenças de complexidade 0 (ou seja,sentenças atômicas):

• Se P for um símbolo relacional n-ário em L, e t1

t2

. . . tn forem L (M)-termos fecha-dos, então definiremos:

M |= P (t1

t2

. . . tn) :,�

tMM1

tMM2

. . . tMMn

2 PM .

Para um número natural k, suponha que a condição M |= � está definida paraL (M)-sentenças � de complexidade < k, e suponha que � é uma L (M)-sentençade complexidade k. Temos os 5 seguintes casos:

• Se � for da forma (¬�0), então definiremos:

M |= � :, M 6|= �0.

Note que �0 tem complexidade k � 1;

• Se � for da forma (�1

_ �2

), então definiremos:

M |= � :, (M |= �1

ou M |= �2

) .

Note que �1

e �2

têm complexidade < k, pois suas complexidades somam k � 1;

• Se � for da forma (�1

^ �2

), então definiremos:

M |= � :, (M |= �1

e M |= �2

) .

Note que �1

,�2

têm complexidade < k, pois suas complexidades somam k � 1;

• Se � for da forma (9x)� (x), então definiremos:

M |= � :, M |= � (a) (9a 2M) .

Note que � (a) tem complexidade k � 1;

• Se � for da forma (8x)� (x), então definiremos:

M |= � :, M |= � (a) (8a 2M) .

Note que � (a) tem complexidade k � 1.

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Temos as seguintes terminologias:

• Para cada L-sentença �, dizemos que M é um modelo de � se a condição M |= �

é verdadeira;

• Para cada conjunto � de L-sentenças, dizemos que M é um modelo de �

se M |= � (8� 2 �);

• Para quaisquer conjuntos �, e ⌦ de L-sentenças, dizemos que � semantica-mente6 implica módulo ⌦, ou � |=

simbolicamente, se toda L-estruturaque é modelo de � [ ⌦ é modelo de . Quando � e forem conjuntos unitários,digamos {�} e { } respectivamente, a condição � |=

será denotada por � |=⌦

.Quando ⌦ = ;, tal conjunto pode ser omitido em todas essas notações;

• Para cada L-fórmula � (x1

. . . xn) e para a1

. . . an 2M , dizemos que a1

. . . an realiza� em M , ou M é um modelo de � com parâmetros a

1

. . . an, se acondição M |= �

a1

. . . an�

é verdadeira. Por vezes, denota-se tal condiçãopor M |= � [a

1

. . . an];

• Dizemos que uma L-sentença � é logicamente válida, ou |= � simbolicamente, seM |= � para toda L-estrutura M .

Prova-se por indução sobre a complexidade de � (x1

. . . xn) que a1

. . . an 2 M

realizará � (x1

. . . xn) em M se, e somente se, MM for um modelo de ��

a1

. . . an�

.

Teorema A.35. Seja L0 uma assinatura que estende L, seja M uma L-estrutura, seja� (x

1

. . . xn) uma L-fórmula, e sejam a1

. . . an 2 M . Se M 0 for uma expansão de M auma L0-estrutura, então

M |= � [a1

. . . an],M 0 |= � [a1

. . . an] .

As L-estruturas podem ser classificadas de acordo com as L-sentenças queelas modelam.

Definição A.36. Sejam M e N duas L-estruturas. Dizemos que M e N são elemen-tarmente equivalentes, ou M ⌘ N em símbolos, se

M |= �, N |= �

para qualquer L-sentença �.6 Outro tipo fundamental de implicação é a noção de implicação sintática. Não trabalharemos com

esse conceito nesta dissertação.

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Definição A.37. Uma classe K de L-estruturas é dita ser axiomatizável (resp. finita-mente axiomatizável) se existe um conjunto (resp. conjunto finito) � de L-sentenças

tal que K =

M...M |= �

. Nesse caso, dizemos que � é um conjunto de axiomas

para K.

Algumas classes de estruturas são automaticamente axiomatizáveis pela maneiraque são definidas. Especificamente, dado um conjunto � de L-sentenças, se K for definidacomo sendo a classe das L-estruturas que são modelos de �, então K será axiomatizável.Esse é o caso das classes dos grupos, dos aneis, dos corpos, dos corpos ordenados, etc.

A.13 Teorias

Se uma L-estrutura for modelo de um conjunto de L-sentenças, então ela tambémserá modelo das L-sentenças que são implicações semânticas desse conjunto. Portanto, aclasse das sentenças modeladas por uma estrutura é fechada sobre implicações semânticas,motivando a seguinte definição:

Definição A.38. Seja T um conjunto de L-sentenças. Denotamos por T |= o conjuntodas L-sentenças � tais que T |= �. Dizemos que T é uma L-teoria ou uma teoria em L

se T = T |=. Os elementos de T são chamados de teoremas de T .

Considere uma assinatura L0, e suponha que há uma maneira de traduzir uni-vocamente cada L-sentença para uma L0-sentença, ou seja, existe uma função injetorah : L=

!! ! (L0)

=!!. Assim, toda L-teoria T estará em correspondência um-pra-um com o

conjunto de L0-sentenças h hT i. Se U for uma L0-teoria com h hT i ⇢ U , então a traduçãode cada teorema de T será um teorema de U , significando que U estende T de certamaneira, e se além disso tivermos h�1 hUi ⇢ T , então a tradução inversa de cada teoremade U que for inversamente traduzível será um teorema de T . Nesse caso, alguns fatores,como a expressividade da linguagem de L0 e a força dedutiva dos axiomas que definem U ,podem tornar mais vantajoso e conveniente trabalhar com a teoria U que com T , mesmoque o interesse principal da discussão esteja voltado para os teoremas de T .

Definição A.39. Seja L0 uma assinatura, seja T uma L-teoria, seja U uma L0-teoria, e sejah : L=

!! ! (L0)

=!! uma função injetora. Dizemos que U é uma h-extensão conservativa

de T se h hT i ⇢ U e h�1 hUi ⇢ T , ou seja, se a equivalência

� 2 T , h (�) 2 U

é verdadeira para qualquer L-sentença �.

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Existe uma função h : (L✏)=!! ! (L✏)

=!!, a qual é definida indutivamente sobre a

complexidade das L✏-sentenças em seu domínio, cuja aplicação h (�) sobre umaL✏-fórmula � consiste na troca de cada subfórmula de � das formas (9x)� e (8x)� pelasrespectivas fórmulas (9cx)� e (8cx)� (Definição B.3), mantendo o restante dos símbolosque ocorrem em � intactos em suas posições originais. Prova-se que essa função é injetorae que o seguinte teorema é válido:

Teorema A.40. A L✏-teoria NBG (Definição B.4) é uma h-extensão conservativa daL✏-teoria ZFC (Definição B.2).

A.14 Subestruturas e Subestruturas Elementares

Uma L-estrutura N é substancialmente caracterizada por sua estabilidade – ascoordenadas das relações PN , os valores das funções GN e as constantes cN estão segura-mente confinadas ao conjunto kNk, para qualquer símbolo relacional P em L, qualquersímbolo funcional G em L e qualquer símbolo de constante c em L. Se essa mesma sortede estabilidade qualificar um subconjunto de kNk perante as mesmas relações, funções econstantes que definem N , então esse subconjunto definirá uma L-estrutura demodo canônico.

Definição A.41. Seja L uma assinatura e sejam M e N duas L-estruturas. Dizemos queM é uma subestrutura de N , ou M ⇢ N simbolicamente, se as seguintes condiçõessão observadas:

(SubU) kMk ⇢ kNk ;

(SubR) PM= PN \ kMkn para todo símbolo relacional n-ário P em L;

(SubF) GM= GN � kMkn para todo símbolo funcional n-ário G em L;

(SubC) cM = cN para todo símbolo de constante c em L.

Nesse caso, dizemos que M é uma subestrutura elementar de N , ou M 4 N

simbolicamente, se:

(SubEl) Para toda L-fórmula � (x1

. . . xn) e para quaisquer a1

. . . an 2M , temos

M |= � [a1

. . . an], N |= � [a1

. . . an] .

A.15 Morfismos Entre Estruturas

A compreensão dos objetos matemáticos é substancialmente beneficiada quandoexaminamos a maneira que eles se relacionam entre si e buscamos assimilar as seme-lhanças e diferenças estruturais que eles manifestam, culminando na criação de variadas

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perspectivas para examinar os enigmas da disciplina. Na Teoria dos Modelos, as principaisferramentas de comparação entre estruturas estão definidas a seguir:

Definição A.42. Seja L uma assinatura e sejam M e N duas L-estruturas.

• Uma função f : M ! N é dita ser um morfismo de M em N se as seguintescondições são observadas:

(InvR) Para todo símbolo relacional n-ário P em L e para quaisquer a1

. . . an 2M ,temos

(a1

. . . an) 2 PM ) (f (a1

) . . . f (an)) 2 PN;

(InvF) Para todo símbolo funcional n-ário G em L e para quaisquer a1

. . . an 2M ,temos

f�

GM(a

1

. . . an)�

= GN(f (a

1

) . . . f (an)) ;

(InvC) Para todo símbolo de constante c em L, temos f�

cM�

= cN .

Nesse caso, se f for sobrejetora, então dizemos que N é uma imagemhomomórfica de M .

Se f : M ! N for um morfismo, então temos as seguintes definições:

• Dizemos que f é uma imersão se:

(Im) Para todo símbolo relacional n-ário P em L e para quaisquer a1

. . . an 2 M ,temos

(a1

. . . an) 2 PM , (f (a1

) . . . f (an)) 2 PN .

Nesse caso, dizemos que N é uma extensão de M ;

• Dizemos que f é uma imersão elementar se

(ImEl) Para toda L-fórmula � (x1

. . . xn) e para quaisquer a1

. . . an 2M , temos

M |= � [a1

. . . an], N |= � [f (a1

) . . . f (an)] .

Nesse caso, dizemos que N é uma extensão elementar de M ;

• Dizemos que f é um isomorfismo se f é uma imersão sobrejetora. Nesse caso,dizemos que M e N são isomorfas, ou M ⇠

=

N em símbolos.

Toda imersão é injetora e toda imersão elementar é uma imersão. Se existir umaimersão elementar f : M ! N , então M ⌘ N . Prova-se que todo isomorfismo é umaimersão elementar e a função inversa de um isomorfismo é um isomorfismo.

Como a negação de uma condição da forma M |= � é equivalente a M |= (¬�),temos que (ImEl) é equivalente à condição

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(ImEl’) Para toda L-fórmula � (x1

. . . xn) e para quaisquer a1

. . . an 2M , temos

M |= � [a1

. . . an]) N |= � [f (a1

) . . . f (an)] .

Se f for uma função kMk ! kNk entre conjuntos que observa o axioma (ImEl’), entãoprova-se que f será uma imersão elementar M ! N entre L-estruturas.

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B Formalizações da Teoria dos Conjuntos

O estudo informal e intuitivo dos conjuntos, conhecido como Teoria Ingênua dosConjuntos, provou ser incerto e pouco confiável à medida que diversos paradoxos foramsendo descobertos no início do século XX. O afastamento dessa abordagem foi encaradocomo uma prioridade crucial por vários pensadores, visto que praticamente todas as áreasda Matemática fundam-se decisivamente na noção de conjunto. A solução encontrada paraesse problema consiste na instauração de uma série de postulados que determinam quaisconjuntos podem ser considerados no estudo, tornando, assim, impraticável a construçãodos conjuntos envolvidos nos paradoxos encontrados na versão ingênua do tema.

Várias axiomatizações da teoria foram propostas, a princípio com o mero objetivode tornar o estudo consistente e posterioremente com outros objetivos variados, e as maisaceitas pela comunidade matemática são conhecidas como ZFC e NBG. A primeira trataexclusivamente de uma qualidade de objeto, os conjuntos, enquanto a segunda trata dasclasses, as quais são subdivididas em dois tipos: conjuntos e classes próprias. Ambasas teorias são equivalentes para teoremas que não envolvem classes próprias (TeoremaA.40). Na visão do autor, NBG possibilita que muitos teoremas sejam apresentados demaneiras mais diretas e elegantes comparativamente à maneira que eles são exprimidosem ZFC, e, por tal razão, ela foi escolhida como metateoria para este trabalho.

Neste apêndice, apontaremos as definições de ZFC e NBG e evocaremos os teore-mas de NBG que serão relevantes para a temática da dissertação. Para uma exposiçãodetalhada, ver (39).

B.1 As Teorias ZF, ZFC e NBG

As teorias que veremos são descritas na linguagem de primeira ordem gerada pelaassinatura L✏ (Exemplo A.7), onde o símbolo 2 representa a relação de pertinência.

Os pares ordenados podem ser manifestados em L✏-fórmulas que não têm quantifi-cadores limitados (Definição A.16) assim como é indicado nas Notações A.30 e A.31, ondecada quantificador da forma (8x 2 U) deve ser substituído por (8x). Deixaremos parao leitor a incumbência de especificar precisamente as representações das outras noçõesconjuntistas nas L✏-fórmulas, como as notações x ⇢ y, x = P (y) e x 6= ;.

Nesta seção, denotaremos as variáveis de modo que símbolos distintos representemvariáveis distintas na lista v

1

v2

. . . vi . . . (Definição A.12). Ou seja, metavariáveis distintasrepresentam variáveis distintas.

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Definição B.1. Chamamos de Teoria dos Conjuntos de Zermelo-Fraenkel, denominadasob a sigla ZF, a L✏-teoria gerada pelos seguintes axiomas:

(Extensão) Se dois conjuntos tiverem os mesmos elementos, então eles serão iguais.Simbolicamente, temos

(8X, Y ) ((8z) (z 2 X ! z 2 Y ) �! X = Y ) ;

(Separação) Se Z for um conjunto e � for uma propriedade, então existirá o conjuntodos elementos de Z que satisfazem à propriedade �. Simbolicamente, temos

(8Z,w1

. . . wn) (9Y ) (8x) (x 2 Y ! (x 2 Z ^ �))

para qualquer L✏-fórmula � (x, Z, w1

. . . wn) ;

(Par) Se x e y forem dois objetos, então existirá um conjunto que contém apenas x e y

como elementos. Simbolicamente, temos

(8x, y) (9Z)Z = {x, y} ;

(União) Se S for um conjunto, então existirá um conjunto U que contém os elementosdos elementos de S. Simbolicamente, temos

(8S) (9U) (8Y 2 S) (8x 2 Y ) x 2 U ;

(Substituição) Se D for um conjunto e se � (x, y,D,w1

. . . wn) for uma propriedade talque para cada x 2 D existe um único objeto y que torna a condição � verdadeira,então existirá um conjunto C tal que para cada x 2 D existe um y 2 C que torna� verdadeira. Simbolicamente, temos

(8D,w1

. . . wn) ((8x 2 D) (9!y)� �! (9C) (8x 2 D) (9y 2 C)�)

para qualquer L✏-fórmula � (x, y,D,w1

. . . wn) ;

(Infinito) Existe um conjunto I que contém o conjunto vazio como elemento e é talque x [ {x} 2 I para todo x 2 I. Simbolicamente, temos

(9I) (; 2 I ^ (8x 2 I) x [ {x} 2 I) ;

(Potência) Se X for um conjunto, então existirá um conjunto cujos elementos são ossubconjuntos de X. Simbolicamente, temos

(8X) (9Y )Y = P (X) ;

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(Fundação) Se X for um conjunto não nulo, então existirá um elemento x de X talque todo elemento de X não pertence a x. Simbolicamente, temos

(8X) (X 6= ; �! (9x 2 X) (8y 2 X) y 62 x) .

Note que os Axiomas da Separação e da Substituição são esquemas axiomáticos,os quais descrevem infinitas L✏-fórmulas pertencentes a ZF. Prova-se que ZF não é finita-mente axiomatizável (Definição A.37). Alguns autores não incluem o Axioma da Fundaçãona definição de ZF.

Denotaremos por Func (f) a conjunção das L✏-fórmulas

• (8z) (z 2 f �! (9x, y) (x, y) = z) ;1

• (8x, y, y0) (((x, y) 2 f ^ (x, y) 2 f) �! y = y0) .

Essa fórmula simboliza que f é uma função.

Definição B.2. Chamamos de Teoria dos Conjuntos de Zermelo-Fraenkel-Choice,denominada sob a sigla ZFC, a L✏-teoria gerada pelos axiomas de ZF e o axioma:

(Escolha) Se X for um conjunto, então existirá uma função f tal que qualquer sub-conjunto não nulo S de X pertence ao domínio de f e é tal que f (S) 2 S. Simbo-licamente, temos

(8X) (9f) [Func (f) ^ (8S) ((S 6= ; ^ S ⇢ X) �! f (S) 2 S)] .

Uma função f definida em P (X)� {;} que satisfaz à propriedade descrita no Axioma daEscolha é dita ser uma função de escolha para X.

O Axioma da Escolha foi encarado com relutância e desaprovação por vários pen-sadores do século XX, em virtude dele ser utilizado para demonstrar a existência de algunsobjetos matemáticos que não podem ser explicitamente construídos2 e implicar diversosresultados contraintuitivos e aparentemente contraditórios. No entanto, ele é quase una-nimemente aceito pela comunidade matemática contemporânea, sendo supresso apenasem aplicações pontuais.

1 Essa fórmula simboliza que f é uma relação.2 Como exemplo, o Axioma da Escolha implica o Lema do Ultrafiltro (Teorema 3.42), o qual certifica a

existência de ultrafiltros sem especificar os elementos que os compõem.

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Definição B.3.

• Denotaremos por M (x) a L✏-fórmula

M (x) := (9y) (x 2 y) .

Tal fórmula é lida como “x é um conjunto”, e a sua negação é lida como “x é umaclasse própria”;

• Denotaremos por (8cx)� a L✏-fórmula

(8x) (M (x)! �) .

Tal fórmula é lida como “� é verdadeira para todo conjunto x”;

• Denotaremos por (9cx)� a L✏-fórmula

(9x) (M (x) ^ �) .

Tal fórmula é lida como “� é verdadeira para algum conjunto x”.

O Axioma do Par implica que nenhum objeto é uma classe própria em ZF e ZFC.

Definição B.4. Chamamos de Teoria dos Conjuntos de Neumann-Bernays-Gödel,denominada sob a sigla NBG, a L✏-teoria gerada pelo Axioma da Extensão eos seguintes axiomas:

(Parc) Se x e y forem dois conjuntos, então existirá um conjunto que contém apenas xe y como elementos. Simbolicamente, temos

(8cx, y) (9cZ) (8cu) (u 2 Z ! (u = x _ u = y)) ;

(Conjunto Vazio) Existe um conjunto que não tem elemento algum. Simbolicamente,temos

(9cX) (8cx) x 62 X;

(Relação de Pertinência) Existe uma classe cujos elementos são os pares ordenados(x, y) de conjuntos tais que x 2 y. Simbolicamente, temos

(9E) (8cz) (z 2 E ! (9cx, y) (z = (x, y) ^ x 2 y)) ;

(Interseção) Se X e Y forem duas classes, então existirá uma classe cujos elementossão os objetos que pertencem a X e Y simultaneamente. Simbolicamente, temos

(8X, Y ) (9Z) (8cz) (z 2 Z ! (z 2 X ^ z 2 Y )) ;

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(Complemento) Se X for uma classe, então existirá uma classe cujos elementos são osconjuntos que não pertencem a X. Simbolicamente, temos

(8X) (9Y ) (8cz) (z 2 Y ! z 62 X) ;

(Domínio) Se X for uma classe, então existirá uma classe cujos elementos são os con-juntos que são primeiras coordenadas dos pares ordenados que pertencem a X.Simbolicamente, temos

(8X) (9D) (8cu) (u 2 D ! (9cv) (u, v) 2 X) ;

(Relação Universal) Se X for uma classe, então existirá uma classe cujos elementossão os pares ordenados de conjuntos tais que as primeiras coordenadas desses parespertencem a X. Simbolicamente, temos

(8X) (9Z) (8cz) (z 2 Z ! (9x 2 X) (9cy) z = (x, y)) ;

(Permutação 231) Se X for uma classe, então existirá uma classe cujos elementos sãoas ternas ordenadas (u, v, w) de conjuntos tais que a terna (v, w, u) pertence a X.Simbolicamente, temos

(8X) (9Z) (8cz) (z 2 Z ! (9cu, v, w) ((v, w, u) 2 X ^ z = (u, v, w))) ;

(Permutação 132) Se X for uma classe, então existirá uma classe cujos elementos sãoas ternas ordenadas (u, v, w) de conjuntos tais que a terna (u, w, v) pertence a X.Simbolicamente, temos

(8X) (9Z) (8cz) (z 2 Z ! (9cu, v, w) ((u, w, v) 2 X ^ z = (u, v, w))) ;

(Uniãoc) Se X for um conjunto, então existirá um conjunto U que contém os elementosdos elementos de X. Simbolicamente, temos

(8cX) (9cU) (8Y 2 X) (8x 2 Y ) x 2 U ;

(Potênciac) Se X for um conjunto, então existirá um conjunto cujos elementos são ossubconjuntos de X. Simbolicamente, temos

(8cX) (9cY )Y = P (X) ;

(Subconjuntos) Se X for um conjunto e se Y for uma classe, então existirá um con-junto cujos elementos são os objetos que pertencem a X e Y simultaneamente.Simbolicamente, temos

(8cX) (8Y ) (9cZ) (8cz) (z 2 Z ! (z 2 X ^ x 2 Y )) ;

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(Substituiçãoc) Se f for uma função e se X for um conjunto, então a imagem de f

sobre X existirá como um conjunto. Simbolicamente, temos

(8f) [Fnc (f) �! (8cX) (9cY ) (8cy) (y 2 Y ! (9x 2 X) (x, y) 2 f)] ;

(Infinitoc) Existe um conjunto I que contém o conjunto vazio como elemento e é talque x [ {x} 2 I para todo x 2 I. Simbolicamente, temos

(9cI) (; 2 I ^ (8x 2 I) x [ {x} 2 I) ;

(Fundaçãoc) Se X for um conjunto não nulo, então existirá um elemento x de X talque todo elemento de X não pertence a x. Simbolicamente, temos

(8cX) (X 6= ; �! (9x 2 X) (8y 2 X) y 62 x) ;

(Escolhac) Se X for um conjunto, então existirá uma função f tal que qualquer sub-conjunto não nulo S de X pertence ao domínio de f e é tal que f (S) 2 S. Simbo-licamente, temos

(8cX) (9cf) [Func (f) ^ (8cS) ((S 6= ; ^ S ⇢ X) �! (9cy 2 S) (S, y) 2 f)] .

Note que NBG é definida por dezessete axiomas, implicando que ela é umaL✏-teoria finitamente axiomatizável. Alguns autores não incluem o Axioma da Fundaçãona definição de NBG.

Como trataremos apenas de NBG no restante do trabalho, omitiremos o símboloc sobrescrito no nome de alguns axiomas de NBG.

B.2 Alguns Teoremas Básicos de NBG

O Axioma dos Subconjuntos implica que todo subconjunto de um conjunto é umconjunto e o Axioma da Fundação implica no teorema a seguir:

Teorema B.5. Para cada conjunto x, temos x 62 x.

Demonstração. Considere o conjunto unitário {x}. Pelo Axioma da Fundação, existe uma 2 {x} tal que y 62 a (8y 2 x), implicando em x 62 a. Como {x} é unitário e a 2 {x},temos a = x e x 62 x.

Dizemos que uma L✏-fórmula � é predicativa se ela pode ser escrita de maneiraque todos os quantificadores que aparecem em � sejam das formas (8cx) e (9cx), ou seja,se apenas quantificações sobre conjuntos aparecem em �.

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O Axioma da Relação de Pertinência atesta a existência da relação cujos elementossão os pares ordenados (x, y) com x 2 y, a qual será denotada por E. Utilizando-se de talaxioma, prova-se por indução sobre a complexidade das fórmulas que qualquer L✏-fórmulapredicativa define uma classe.

Teorema B.6 (Teorema da Existência das Classes). Seja � (x1

. . . xm, y1 . . . yn) umaL✏-fórmula predicativa. Para quaisquer classes C

1

. . . Cn, existe uma classe Z tal que paraquaisquer conjuntos a

1

. . . am temos

(a1

. . . am) 2 Z , � (a1

. . . am, C1

. . . Cn) .

A classe Z cuja existência é afirmada nesse teorema é denotada por

Z =

(x1

. . . xm)...� (x

1

. . . xm, C1

. . . Cn)

.

Exemplo B.7. Se X e Y forem duas classes, então o Teorema da Existência das Classesnos permite definir a classe

X ⇥ Y :

=

(x, y)...x 2 X ^ y 2 Y

,

a qual é chamada de produto cartesiano de X e Y .

Exemplo B.8. Denotaremos por V a classe

V :

=

x...x = x

,

a qual é conhecida como Universo de von Neumann.

Exemplo B.9. Para cada classe X, denotaremos por EX a relação dada por

EX :

=

(x1

, x2

)

...x1

2 x2

^ x1

, x2

2 X

= E \ (X ⇥X) .

Temos EV = E, e se X for um conjunto, então EX será um conjunto.

B.3 Ordinais

Existe uma maneira elegante e prática de listar todos os conjuntos bem ordena-dos, salvo isomorfismos. Os elementos dessa sequência de conjuntos comportam-se comonúmeros em diversos aspectos.

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Definição B.10.

• Dizemos que uma classe X é transitiva se todo elemento de X é um subconjuntode X;

• Dizemos que uma classe ↵ é uma classe ordinal se ↵ é transitiva e a relação E↵ éuma boa ordem3 em ↵;

• Uma classe ordinal que é um conjunto é dita ser um ordinal. Os ordinais sãocomumente denotados por letras gregas minúsculas. A classe dos ordinais é denotadapor On.

Exemplo B.11. Os conjuntos ;, {;}, {;, {;}} e {;, {;} , {;, {;}}} são ordinais, respec-tivamente denotados por 0, 1, 2 e 3 e chamados de zero, um, dois e três.

Teorema B.12.

• Se X for uma classe ordinal, se S ( X, e se S for transitivo, então S 2 X;

• Se X e Y forem classes ordinais, então as condições X ( Y e X 2 Y

serão equivalentes;

• Se X e Y forem classes ordinais distintas, então ou X 2 Y ou Y 2 X;

• Se X for uma classe ordinal, então ou X = On ou X 2 On;

• (Princípio da Boa Ordenação) A classe própria EOn é uma boa ordem em On;

• On é a única classe ordinal que é uma classe própria;

• Se X for uma classe não nula de ordinais, entãoT

X será o menor elemento de X

em On;

• Se X for um conjunto de ordinais, entãoS

X será o supremo de X em On.

Para quaisquer ordinais ↵ e �, a condição ↵ 2 � é denotada por ↵ < �, uma vezque EOn é uma ordem em On.

Os ordinais satisfazem a um tipo extremamente útil de indução muito utilizadoem diversas áreas da Matemática.

Teorema B.13 (Princípio da Indução Transfinita - Primeira Versão). Seja X uma classe.Se para todo ordinal � a condição � ⇢ X implicar � 2 X, então On ⇢ X.3 Uma ordem < em uma classe X é dita ser uma boa ordem em X se qualquer subclasse não nula de

X tiver um menor elemento. Nesse caso, dizemos que X é bem ordenado por <.

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Cada ordinal ↵ é um conjunto bem ordenado quando munido da ordem E↵ em ↵.Reciprocamente, cada conjunto bem ordenado é isomorfo a exatamente um ordinal.

Teorema B.14. Seja < uma boa ordem em um conjunto X. Existem um único ordinal ↵e uma única função f : X ! ↵ tais que f é um isomorfismo entre os conjuntos ordenados(X,<) e (↵,E↵).

Dado um ordinal ↵, podemos definir um conjunto bem ordenado a partir de ↵adicionando a este um elemento maior que todo elemento contido nele. Constata-se quetal conjunto ordenado será um ordinal quando o elemento adicionado a ↵ for o próprio ↵.

Definição B.15. Se ↵ for um ordinal, então o ordinal ↵[{↵} será chamado de sucessorde ↵ e será denotado por ↵0. Nesse caso, dizemos que ↵ é o antecessor de ↵0. Um ordinalnão zero ↵ é dito ser um ordinal sucessor, ou Suc (↵) simbolicamente, se ele é o sucessorde algum ordinal, e caso contrário dizemos que ele é um ordinal limite.

O sucessor de um ordinal é o menor ordinal que o supera.

Teorema B.16. Sejam ↵ e � dois ordinais.

• Um conjunto X será um ordinal se, e somente se, o conjunto X 0:

= X [ {X} forum ordinal;

• Não existe um ordinal � tal que ↵ < � < ↵0;

• Se ↵0= �0, então ↵ = �;

• Teremos ↵ < �0 se, e somente se, ↵ 6 �.

Teorema B.17 (Princípio da Indução Transfinita - Segunda Versão). Seja X uma classe.Se forem observadas as condições

• 0 2 X;

• Se ↵ for um ordinal em X, então ↵0 2 S;

• Se � for um ordinal limite, e se � ⇢ X,então � 2 X,

então On ⇢ X.

Definição B.18. O conjunto dos ordinais finitos é a classe ! definida por

! :

=

n... (n = 0 _ Suc (n)) ^ (8x 2 n) (n = 0 _ Suc (x))

.

Dizemos que os ordinais não pertencentes a ! são infinitos.

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A classe ! é um conjunto, e temos 0, 1, 2, 3 2 ! (Exemplo B.11).

Teorema B.19. Sejam ↵ e � dois ordinais.

• ↵ 2 ! se, e somente se, ↵0 2 !;

• Se ↵ 2 ! e � < ↵, então � 2 !;

• ! é um ordinal limite.

Exemplo B.20. Se X for um conjunto de ordinais com 0 2 X tal que o sucessor de cadaordinal finito em X pertence a X, então, utilizando-se do Axioma do Infinito, prova-se quetodo ordinal finito pertencerá a X. Essa conclusão é conhecida como Princípioda Indução.

O teorema a seguir descreve uma técnica poderosa de construção de sequênciascom índices em On tais que cada elemento é determinado ou pelo seu antecessor ou portodos os elementos que aparecem antes dele na sequência.

Teorema B.21 (Recursão Transfinita). Seja x um conjunto, seja S : V! V uma função,e seja L uma função cujo domínio é a classe das funções f com dom (f) 2 On. Existeuma única função F : On! V que satisfaz às seguintes condições:

• F (0) = x;

• F (↵0) = S (F (↵)) para cada ordinal ↵;

• F (↵) = L (F �↵) para cada ordinallimite ↵.

Várias operações entre os ordinais, como a adição, a multiplicação, a exponenci-ação, etc. podem ser definidas via Recursão Transfinita. Neste apêndice, mostraremosapenas o caso da adição em On.

Exemplo B.22. Seja ↵ um ordinal e seja F↵ : On! On a função definida recursivamente(Teorema B.21) pelas seguintes condições:

• F↵ (0) := ↵;

• F↵ (�0)

:

= (F↵ (�))0 para cada ordinal �;

• F↵ (�) :=[

�<�

F↵ (�) para cada ordinal

limite �.

Para cada ordinal �, a imagem F↵ (�) é dita ser a soma dos ordinais ↵ e �, e ela édenotada por ↵ + �. A função + : On ⇥ On ! On dada por (↵, �) 7! F↵ (�) é chamadade adição em On.

É comum que muitas propriedades das funções definidas por Recursão Transfinitasejam demonstradas por intermédio do Princípio da Indução Transfinita.

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Teorema B.23. Para quaisquer ordinais ↵, � e �, temos:

• 0 é um elemento neutro de +;

• ↵ + 1 = ↵0;

• + é associativa mas não é comutativa;

• + �!⇥! é a adição usual em !;

• Se ↵ < �, se � for um ordinal limite, ese n < !, então ↵ + n < �;

• Se ↵ < �, então ↵ + � < � + �;

• Se ↵ < �, então � + ↵ 6 � + �;

• Se ↵ + � = ↵ + �, então � = �.

O processo de contagem consiste em efetuar correspondências um-para-um entreos elementos de duas classes. Desse modo, pode-se estabelecer uma comparaçãoprecisa entre os “tamanhos” das classes sem sequer atribuir uma escala para mensuraressa grandeza.

Definição B.24. Sejam X e Y duas classes.

• Denotamos X 4 Y se existir uma função injetora do tipo X ! Y ;

• Dizemos que X e Y são equipotentes, ou X ⇠=

Y simbolicamente, se existe umafunção bijetora do tipo X ! Y ;

• Denotamos X � Y se X 4 Y e X 6⇠=

Y ;

• Um conjunto é dito ser finito se ele é equipotente a um ordinal finito, e caso contrárioele é dito ser infinito;

• Dizemos que um conjunto é enumerável se ele é equipotente a !;

• Dizemos que um conjunto é contável se ele é finito ou enumerável.

A classe dos pares de conjuntos (X, Y ) tais que X ⇠=

Y é uma relação de equiva-lência em V, a qual é chamada de relação de equipotência entre conjuntos.

Teorema B.25. Sejam X, Y e Z classes.

• X 4 X e X ⌃ X;

• Se X ⇢ Y , então X 4 Y ;

• Se X 4 Y e Y 4 Z, então X 4 Z;

• (Teorema de Bernstein) Se X 4 Y e Y 4 X, então X ⇠=

Y .

• Se ↵ for um ordinal infinito, então ↵ ⇠=

↵0;

• Se ↵ for um ordinal finito, � for um ordinal, e ↵ ⇠=

�, então ↵ = �;

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• Se ↵ for um ordinal finito, e x ( ↵, então x 6⇠=

↵;

• (Teorema de Hartog) Se X for um conjunto, então existirá um ordinal ↵ que não éequipotente a qualquer subconjunto de X.

Algumas condições equivalentes ao Axioma da Escolha são bastante aproveitadasnas demonstrações dos teoremas de NBG.

Teorema B.26. Seja T a L✏-teoria gerada pelos axiomas de NBG exceto o Axioma daFundação e o Axioma da Escolha. As seguintes condições são equivalentes ao Axioma daEscolha módulo T :

• Produtos cartesianos de famílias de conjuntos não nulos são não nulos;

• (Teorema de Zermelo) Todo conjunto pode ser bem ordenado;

• Para quaisquer conjuntos X e Y , temos X 4 Y ou Y 4 X;

• (Lema de Zorn) Se toda cadeia ordenada4 em um conjunto parcialmente ordenadotiver uma cota superior, esse conjunto parcialmente ordenado terá umelemento maximal.

As equivalências retratadas no Teorema B.26 também são válidas móduloa L✏-teoria gerada pelos axiomas de ZF exceto o Axioma da Fundação.

B.4 Cardinais

Se R for a relação de equipotência entre dois ordinais, então cada classe de equiva-lência no quociente On/R representará uma “quantidade” de elementos que um conjuntopode compreender. Em virtude da classe On ser bem ordenada por EOn, uma maneiranatural de apontar um representante para cada classe de equivalência em On/R consisteem escolher o menor ordinal pertencente a cada classe.

Definição B.27. Seja X um conjunto e seja ↵ um ordinal.

• Dizemos que um ordinal é um cardinal ou um ordinal inicial se, e somente se, elenão é equipotente a um ordinal menor que ele;

• Pelo Teorema de Zermelo (Teorema B.26) e pelo Teorema B.14, existe um ordinalequipotente a X. O menor ordinal equipotente a X é um cardinal, o qual é chamadode cardinal de X e é denotado por |X| ;

4 Uma cadeia ordenada em um conjunto parcialmente ordenado (E,<) é um subconjunto S de E talque x < y ou y < x para quaisquer x, y 2 S distintos.

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• Pelo Teorema de Hartog (Teorema B.25), existe um ordinal maior que ↵ que nãoé equipotente a ↵. O menor ordinal maior que ↵ que não é equipotente a ↵ é umcardinal, o qual é chamado de cardinal sucessor de ↵ e é denotado por ↵+.

Todo ordinal finito é um cardinal, e todo cardinal infinito é um ordinal limite.Temos n+

= n+ 1 (8n 2 !), e se ↵ for um cardinal, então |↵| = ↵.

Sem o Axioma da Escolha, não seria possível atribuir um cardinal ↵ a cada con-junto X de modo que X ⇠

=

↵.

Exemplo B.28. O ordinal ! é o cardinal dos conjuntos numéricos N, Z e Q.

Seja5 {!�}�2On a sequência definida recursivamente (Teorema B.21) pelasseguintes condições:

• !0

:

= !;

• !↵0= (!↵)

+ para cada ordinal ↵;

• !↵ =

[

�<↵

!� para cada ordinal limite ↵.

Teorema B.29. Sejam X e Y dois conjuntos.

• {!↵}↵2On é a classe dos cardinais infinitos;

• A função f : On ! {!↵}↵2On definida por f (↵) :

= !↵ é um isomorfismo entreclasses ordenadas;

• ↵ 6 !↵ para todo ordinal ↵;

• Teremos |X| = |Y | se, e somente se, existir uma função bijetora do tipo X ! Y ;

• (Princípio da Casa dos Pombos) Se |Y | < |X|, então toda função sobrejetora dotipo X ! Y não será injetora;

• (Teorema de Cantor) |X| < |P (X)| .

B.5 Hierarquia Cumulativa dos Conjuntos

Seja V0

V1

. . .V! . . .V↵ . . . a sequência definida por Recursão Transfinita (TeoremaB.21) da seguinte maneira:

• V0

:

= ;;

• V↵0 := V↵ [ P (V↵) para cada ordinal ↵;

• V↵ :

=

[

�<↵

V� para cada ordinal limite ↵.

5 Muitos autores denotam essa sequência por {@�}�2On.

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Tal sequência é dita ser a hierarquia cumulativa dos conjuntos em NBG. Para cadan 2 !, temos que Vn é um conjunto finito de conjuntos finitos. Em particular, todoelemento de V! é finito.

Teorema B.30.

• V↵ ( V� se, e somente se, ↵ < �;

• V↵0= P (V↵) para cada ordinal ↵;

• V↵ =

[

�<↵

P (V�) para cada ordinal

limite ↵.

O Axioma da Fundação permite que os conjuntos em NBG sejam plenamentehierarquizados de acordo com o menor nível que os contêm na sequência dos V↵.

Teorema B.31. Seja T a L✏-teoria gerada pelos axiomas de NBG exceto o Axioma daFundação e o Axioma da Escolha. O Axioma da Fundação é equivalente àequação V =

[

↵2On

V↵ módulo T .

Definição B.32. Seja X um conjunto. O menor ordinal ↵ tal que X 2 V↵0 é chamadode posto de X e é denotado por posto (X).

Todo conjunto infinito tem posto infinito.

Proposição B.33.

posto (X) = sup

posto (x) + 1

...x 2 X

.

Exemplo B.34. Como ; 2 V0

0= P (V

0

), temos posto (;) = 0. Prova-se por induçãotransfinita que posto (↵) = ↵ (8↵ 2 On), implicando em ↵ 2 V↵0

(8↵ 2 On) .

Exemplo B.35. Temos posto (V↵) = ↵ (8↵ 2 On) .

Corolário B.36. Se X e Y forem dois conjuntos tais que X 2 Y , então

posto (X) < posto (Y ) .

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Referências

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187

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43 PINTO, J. S. Infinitesimal Methods of Mathematical Analysis. 1. ed. [S.l.]:Woodhead Publishing, 2004. 270 p.

44 RESCHER, N. Leibniz’s Monadology: An Edition for Students. 1. ed. [S.l.]:University of Pittsburgh Press, 1991. 480 p.

45 ROBINSON, A. Non-standard Analysis. [S.l.]: Princeton University Press,1996. 308 p.

46 ROBINSON, A.; ZAKON, E. A set theoretical characterization of enlargements:Applications of model theory to algebra, analysis and probability. InternationalSymposium, Pasadena (CA): Rinehard & Winston. 1967. p. 109-122.

47 RUSSELL, B. A critical exposition of the philosophy of Leibniz, with an appendixof leading passages. [S.l.]: Nabu Press, 2010. 336 p.

48 SHAMSEDDINE, K.; BERZ, M. Analysis on the Levi-Civita field: A brief overview.Contemporary Mathematics, v. 508, p. 215-237, 2010.

49 SHAMSEDDINE, K. New results on integration on the Levi-Civita field. IndagationesMathematicae, v. 24, n. 1, p. 199-211, 2013.

50 STROYAN, K. D.; LUXEMBURG, W. A. J. Introduction to the theory ofinfinitesimals. New York: New York Academic Press, 1976. 326 p.

51 STRUIK, D. J. A Source Book in Mathematics, 1200-1800. [S.l.]: PrincetonUniversity Press, 2014. 444 p.

52 VÄTH, M. A. Nonstandard Analysis. [S.l.]: Birkhäuser, 2007. 252 p.

53 ŁOŚ, J. Quelques remarques, théorèmes et problèmes sur les classes définissablesd’algèbres. Mathematical interpretation of formal systems. North-Holland PublishingCo., Amsterdam, p. 98-113, 1955. Studies in logic and the foundations of mathematics.

54 ZAKON, E. A new variant of non-standard analysis. Victoria Symposium onNonstandard Analysis. Springer, Berlin, Heidelberg. 1974. p. 313-339. Lecture Notes inMathematics.

188

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Índice

AAdição em On, 180Alfabeto de uma assinatura, 154Antecessor de um ordinal sucessor, 179Apreciável

elemento, 12Aridade, 153Assinatura, 152

dos anéis, 154dos anéis ordenados, 154dos conjuntos, 153dos grupos, 153vazia, 153

Átomoem X!, 106relacionado a ⇤R, 36relacionado a R, 35

Axioma, 166da Escolha, 64, 98, 133, 173, 176da Escolha Contável, 64

Axiomatizávelclasse de estruturas, 166

BBase

conjunto, 107

CCanônica

função, 84Cardinal, 182

de um conjunto, xix, 182interno, 127

Cauchysequência de, 27

Cauchy-completodomínio ordenado, 27

Classe, xv, 171de índices, xviordinal, 178própria, 174transitiva, 178

Cofinitosubconjunto, 77

Completofiltro, 98

Complexidadede um termo, 156de uma fórmula, 156

Composição de relações, xviiiCondição, xv

aberta, 38completamente aberta, 38fechada, 38negação de uma, xvrelacionada a ⇤R, 38relacionada a R, 38

Condição fechadafalsa, 38verdadeira, 38

Condiçõesconjunção de, xvdefinição de, xvequivalência de, xvimplicação de, xv

Confrontanterelação de equivalência, 15

Conjunto, 171, 174das partes, xviem X!, 106potência, xvirelacionado a ⇤R, 36relacionado a R, 35

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vazio, xviConstrução por ultraprodutos, 146Contagem, 181Contável

conjunto, 181Convergente

sequência, 27Corpo

das frações de R [x], 9das funções racionais, 9dos números hiper-reais, 101não estritamente ordenado, 8ordenado, 8ordenado das séries de Laurent, 11

Corte de Dedekind, 24Cota

inferior, 21superior, 21

DDedekind-completo

domínio ordenado, 24Diferença, xviDisjunção inclusiva, xvDivisão, 8Domínio

arquimediano, 13não arquimediano, 13não estritamente ordenado, 3ordenado, 1

Dupla implicação, 157

EEnumerável

conjunto, 181Equipotentes

classes, 181Equivalência, 157Esquema de substituição, 152Estrutura, 160

Estruturaselementarmente equivalentes, 165isomorfas, 168

Expansão de uma estrutura, 161Extensão

conservativa, 166de uma assinatura, 154de uma estrutura, 168elementar, 168

Externoobjeto, 47, 114

FFamília, xviFiltro, 76

das caudas, 79de Fréchet, 77dos cofinitos, 77impróprio, 76livre, 76maximal, 76não principal, 76principal, 76próprio, 76trivial, 76

Finitamente axiomatizávelclasse de estruturas, 166

Finitamente próximoselementos, 19

Finitoconjunto, 181elemento, 11

Fórmula, 156atômica, 156com quantificadores limitados, 157logicamente válida, 165predicativa, 176

Função, xix, 173de Escolha, 173identidade, xix

190

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GGaláxia de um elemento, 19

HHierarquia cumulativa, 184Hiperfinito

conjunto, 124operação, 129produto, 68, 129soma, 65

Hiperpartição, 71refinada, 71

Hipersequência, 53, 65

IIdeal ordenado, 17Imagem homomórfica, 168Imersão, 168

elementar, 168Ímpar

número hiperinteiro, 45Implicação, 157Implicação semântica, 165Inclusão

estrita, xvnão estrita, xv

Incompletofiltro, 98

Ínfimo, 21Infinitamente próximos

elementos, 19Infinitesimal

elemento, 11em relação a outro elemento, 11

Infinitoconjunto, 181elemento, 11

Internoobjeto, 47, 114

Interpretação

de um símbolo de constante, 160de um símbolo funcional, 160de um símbolo relacional, 160de um termo, 163

Interseção, xvienumerável, xviii

Intervalo aberto, xixIsomorfismo, 168

KKernel, 3

LLacuna, 24Lema

de Zorn, 182do Ultrafiltro, 92Sequencial de Robinson, 131

Limitede uma sequência convergente, 27em um produto reduzido, 82funcional, 88integral, 86relacional, 87

Linguagem, 152de primeira ordem, 156

MMaior cota inferior, 21Maior elemento, 21Menor cota superior, 21Menor elemento, 21Modelo

de um conjunto de fórmulas, 165de uma fórmula, 165

Módulo, 7Mônada de um elemento, 19Monóide livre, 151Monomorfismo não standard, 39, 111Morfismo, 168

191

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NNão negativo

elemento, 2Não positivo

elemento, 2Não standard

objeto, 39, 114Negativo

elemento, 2Nível

em I!, 114em I!, 114em X!, 106em X!, 106

Númerohiperinteiro, 44, 102hiperirracional, 44, 102hipernatural, 44, 102hiper-racional, 44, 102hiper-real, 35, 44inteiro, xviiirracional, xviinatural, xvii, 2racional, xvii, 2real, xvii

OObjeto

em X!, 106relacionado a ⇤R, 36relacionado a R, 36

Objetosdefinição de, xv

Ordinal, 178finito, 179infinito, 179inicial, 182limite, 179sucessor, 179

PPalavra, 152Par

número hiperinteiro, 45Par ordenado de Kuratowski, xviiParte standard

função, 33Positivo

elemento, 2Posto

em V, 184em X!, 110

Potência reduzida, 84Primeiro Teorema do Isomorfismo, 18Princípio

da Boa Ordenação, 178da Casa dos Pombos, 183da Definição

Interna (PDI), 48, 115Standard (PDS), 40, 119

da Indução, 180Interna, 50Transfinita, 178, 179

da Transferência (PT), 39, 111da Transferência para

Y

U

R, 104

do Overflow, 131do Underflow, 131Geral das ⇤-Transformações (PGT), 119

Produtocartesiano, xix, 177

finito, xviiidireto, 85reduzido, 84

PropriedadeArquimediana, 14das Interseções Finitas (PIF), 79do Supremo, 21

192

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QQuociente

conjunto ordenado, 16de um conjunto, xixdomínio ordenado, 17, 18

RRecursão Transfinita, 180Redução de uma estrutura, 161Relação

de equipotência, 181de pertinência, xvde pertinência em uma classe, xviiide proximidade finita, 19de proximidade infinita, 19de satisfatibilidade, 164domínio de uma, xviiiimagem de uma, xviii

SSaturação, 148Sentença, 159Sequência, xviiSérie de Laurent, 7Símbolo

da conjunção, 155da disjunção, 155da igualdade, 155da negação, 155da quantificação existencial, 155da quantificação universal, 155da vírgula, 155de constante, 153de variável, 155do parêntese, 155específico, 155funcional, 153lógico, 155relacional, 153

Soma de dois ordinais, 180

Standardobjeto, 39, 114

Subassinatura, 154Subcorpo ordenado, 8Subdomínio ordenado, 3Subestrutura, 167

elementar, 167Subfórmula, 157Subpalavra, 152Substituição simultânea, 152Subtermo, 156Sucessor

de um cardinal, 183de um ordinal, 179

Superestrutura, 111Supremo, 21

TTeorema, 166

da Função Inversa, 64de Bernstein, 181de Bolzano-Weierstrass, 62de Cantor, 183de Cauchy, 62de Łoś, 93de Hartog, 182de Zermelo, 182do Ponto Crítico, 63do Valor Intermediário, 127Fundamental do Cálculo, 72Fundamental dos Ultraprodutos, 93

Teoria, 166Teoria dos Conjuntos

de Neumann-Bernays-Gödel (NBG), 174de Zermelo-Fraenkel (ZF), 172de Zermelo-Fraenkel-Choice (ZFC), 173

Termo, 155fechado, 156livre para uma variável, 159

Transformação

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de um subconjunto de R, 101de uma condição fechada, 39de uma relação em R, 102

UUltrafiltro, 89Ultralimite, 89

generalizado, 89Ultrapotência, 89Ultraproduto, 89União, xvi

enumerável, xviiiUniverso

de uma estrutura, 160de von Neumann, xvii, 177

VValor absoluto, 7Variável

ligada, 159ligada em uma posição, 159livre, 158livre em uma posição, 158

194

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