Biografia Proibida de Roberto Carlos e a defesa de Paulo Cesar de Araújo

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VENDA DO LIVRO COMPLETO em :

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SELMO MACHADO PEREIRA

Advogado, Químico e Engenheiro de Produção Professor Universitário

Especialista em Justiça Criminal pela UFF Mestre pela UFF

Doutor pela COPPE/UFRJ

O DIREITO CONSTITUCIONAL DA AMPLA

DEFESA TÉCNICA EFETIVA DO

RÉU

ADI 4815, PL 393/2011, OPINIÕES DE ARTISTAS E JORNALISTAS

SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO ANÁLISE JURÍDICA DO

CASO DA BIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA ESCRITA POR PAULO

CESAR DE ARAÚJO E A LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS

CRIMINAIS

EDITORA 91

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Ficha Catalográfica:

Autor: PEREIRA, Selmo Machado

Titulo: O direito constitucional da ampla defesa técnica efetiva do réu. ADI 4815, PL393/2011, opiniões de artistas e jornalistas sobre liberdade de expressão, análise jurídica do caso da biografia não autorizada escrita por Paulo Cesar de Araújo.

1ª edição – Rio de Janeiro: Editora 91, 2015.

Pág. 244.;16x 23 cm. ISBN: 978-85-904407-2-7 CDD 340

1) Liberdade de expressão. 2) Biografia não autorizada.

3) Censura. 4) Lei 9099/95

[2015] Reservados todos os direitos de publicação à

EDITORA 91 Tel. (21) 99463-6836 e-mail: [email protected]

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PREFÁCIO

Foi com muita satisfação que aceitei o convite para

apresentar este livro escrito pelo professor Selmo

Machado Pereira.

E o faço com imenso prazer, não só pela

atualidade e relevância do tema, mas também pelo

respeito e admiração que tenho pelo autor.

O trabalho do professor, apesar de tratar de tema

bastante controvertido e repleto de particularidades, é

feito de forma abrangente, não se limitando a uma

exposição pura e simples dos problemas que o envolvem,

mas examinando questões, bem como abordando todos

os aspectos a eles relacionados. Além disso, apresenta o

histórico e o cronograma da análise jurídica do caso,

estando assim destinado a ser leitura cogente da parte de

todos aqueles que pretendem se aproximar dos temas

constitucionais.

Redigido em linguagem técnica e objetiva,

preocupou-se o autor em informar o leitor a respeito dos

diversos entendimentos da doutrina, da jurisprudência e

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das opiniões de artistas e jornalistas sobre liberdade de

expressão e censura.

Resta-nos, portanto, parabenizar o autor por este

importante trabalho.

Escritor Anônimo

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AGRADECIMENTOS

À Deus que conhece todos os desejos do meu coração e

que me deu força para superar as dificuldades no

decorrer desta jornada;

À minha amada esposa Elisa pela compreensão e

estímulo durante a realização deste trabalho;

À minha querida filha Laís pelo carinho e incentivo na

pesquisa desta obra.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.....................................................................................9

1 AÇÃO DIRETA DE INCOSTITUCIONALIDADE (ADI 4815). ...13

1.1 PROPOSTA DA AÇÃO..........................................................13

1.2 PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL...............47

1.3 DECISÃO DA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA..........................58

1.4 ENCERRAMENTO DA AUDIÊNCIA PÚBLICA................... 62

2 O PROJETO DE LEI 393/2011 DO DEPUTADO FEDERAL

NEWTON LIMA NETO.......................................................................81

2.1 JUSTIFICATIVAS DO PROJETO DE LEI..............................81

2.2 O PROJETO DE LEI..............................................................87

3 O CASO DA BIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA ESCRITA PELO

BIÓGRAFO PAULO CESAR DE ARAÚJO.......................................91

3.1 A AÇÃO PENAL POR CRIMES DE INJÚRIA E DIFAMAÇÃO

PROPOSTA NA JUSTIÇA CRIMINAL DE SÃO PAULO...............94

3.2 A AÇÃO CIVIL INDENIZATÓRIA NA JUSTIÇA CÍVEL DO RIO

DE JANEIRO...............................................................................105

4 ANÁLISE JURÍDICA DO CASO.............................................. 129

4.1 VALIDADE DO ACORDO DE TRANSAÇÃO......................130

4.2 POSSIBILIDADE DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO DA

VONTADE DO BIÓGRAFO NO ACORDO .................................158

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4.3 POSSIBILIDADE DE TER HAVIDO NÃO IMPARCIALIDADE

DO JUIZ CRIMINAL................................................................... 172

4.4 O DIREITO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA

TÉCNICA EFETIVA DO RÉU.....................................................183

5 A CRÍTICA DE PAULO COELHO E OPINIÕES DE ARTISTAS E

JORNALISTAS SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO...............207

5.1 A CRÍTICA DO ESCRITOR PAULO COELHO AO ACORDO

DE TRANSAÇÃO........................................................................208

5.2 AS OPINIÕES DE JOÃO BÔSCOLI, MARCELO TAS,

ERASMOS CARLOS ENTRE OUTROS SOBRE LIBERDADE DE

EXPRESSÃO..............................................................................215

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA..........................................................233

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INTRODUÇÃO

O tema “biografias não autorizadas” desponta

como um dos assuntos mais debatidos na mídia literária

atualmente. Ao mesmo tempo, apresenta-se como um

desafio constante para os profissionais da área do Direito

seja pela variedade de interpretações jurídicas ou pela

complexidade de cada caso estudado.

Com o objetivo de subsidiar e esclarecer o

desenvolvimento da análise jurídica, este livro identifica e

caracteriza os principais aspectos da liberdade de

expressão. Esses aspectos são organizados de forma a

compor um modelo que possa auxiliar os leitores para a

construção de um conhecimento mínimo do processo.

O livro é dividido em cinco capítulos organizados de

modo a mostrar os passos para a construção da análise

sobre o tema, calcado em várias referências bibliográficas

e peças processuais para o estudo.

No capítulo 1, é descrita a Ação Direta de

Inconstitucionalidade de número ADI 4815, proposta pela

Associação Nacional dos Editores de Livros, que visa

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declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de

texto, dos artigos 20 e 21 da Lei nº 10.406/2002, de 10 de

janeiro de 2002 (Código Civil), nos quais se encontraria a

disposição que proíbe biografias não autorizadas pelos

biografados.

Em outro momento, no capítulo 2, é apresentado o

Projeto de Lei 393/2011 (PL 393/2011) de autoria do

Deputado Federal Newton Lima Neto, do PT de São

Paulo, que tramita no Congresso Nacional, com o escopo

de alterar o art. 20 do mesmo Código Civil para, em

termos gerais, garantir a divulgação de imagens e

informações biográficas sobre pessoas de notoriedade

pública.

No capítulo 3 são descritos o caso da biografia não

autorizada, segundo a versão do biógrafo Paulo César de

Araújo e a ação penal por crimes de difamação e injúria

encaminhada à Justiça Criminal de São Paulo e a ação

civil indenizatória proposta na Justiça Civil do Rio de

Janeiro.

O capítulo 4 analisa vários aspectos do acordo de

transação não homologado pelo magistrado realizado na

Justiça Criminal Paulista, como a sua validade, a

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possibilidade de ter ocorrido vício de consentimento da

vontade de Paulo Cesar de Araújo, a não imparcialidade

do juiz e o direito constitucional da ampla defesa técnica

efetiva do biógrafo.

No capítulo 5 são apresentadas a crítica do escritor

Paulo Coelho sobre o acordo de transação e as opiniões

de vários artistas e jornalistas como: João Bôscoli, filho da

cantora Elis Regina, Marcelo Tas, Erasmo Carlos entre

outros sobre liberdade de expressão.

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CAPÍTULO 1

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

(ADI 4815)

No presente capítulo será apresentada a Ação

Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Associação

Nacional dos Editores de Livros – ANEL.

1.1 PROPOSTA DA ADI 4815

Em 5 de julho de 2012, foi ajuizada uma Ação

Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4815), junto ao STF

com requerimento de medida cautelar, pela Associação

Nacional dos Editores de Livros/ANEL, para declaração

de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto,

dos artigos 20 e 21 da Lei n.° 10.406/2002 (Código

Civil), nos quais se encontraria a disposição que proíbe

biografias não autorizadas pelos biografados.

Os autores alegam que, em que pese o pretenso

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propósito do legislador de proteger a vida privada e a

intimidade das pessoas, o alcance e a extensão dos

comandos extraíveis da literalidade dos artigos 20 e 21 do

Código Civil, ao não preverem qualquer exceção que

contemple as obras biográficas, acabam por violar as

liberdades de manifestação do pensamento, da atividade

intelectual, artística, científica e de comunicação (CF, art.

5º, IV e IX), além do direito difuso da cidadania à

informação (art. 5º, XIV).

Afirmam também que, por evidente, as pessoas

cuja trajetória pessoal, profissional, artística, esportiva ou

política, haja tomado dimensão pública, gozam de uma

esfera de privacidade e intimidade naturalmente mais

estreita e que sua história de vida passa a confundir-se

com a história coletiva, na medida da sua inserção em

eventos de interesse público. Daí decorre que exigir a

prévia autorização do biografado (ou de seus familiares,

em caso de pessoa falecida) importa consagrar uma

verdadeira censura privada tanto à liberdade de

expressão dos autores, historiadores e artistas em geral

quanto ao direito à informação de todos os cidadãos.

Seguem abaixo os dispositivos do Código Civil

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questionados:

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.

E a petição inicial da ação de inconstitucionalidade:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Distribuição por urgência durante o recesso

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ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS EDITORES

DE LIVROS – ANEL, entidade de classe de âmbito nacional,

que congrega a categoria econômica dos editores de livros, fundada

em 16 de novembro de 2011, inscrita no CNPJ sob nº

15.480.715/0001-66, com sede na Rua da Ajuda nº 35, 18º andar,

Centro, Rio de Janeiro, CEP 20.040-000 (Estatuto Social, Atas de

constituição e de eleição de diretoria, Relação de Associados e

Cartão do CNPJ – docs. nos 2, 3, 4, 5 e 6), vem, por meio de seu

advogado abaixo assinado (procuração junta como doc. nº 1), com

fundamento nos artigos 102, I, “a” e “p” e 103, IX, da Constituição

da República e no art. 2º, IX, da Lei nº 9.868/1999, propor:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

(COM PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR, A SER

APRECIADO INAUDITA ALTERA PARTE),

tendo por objeto a declaração da inconstitucionalidade parcial, sem

redução de texto, dos artigos 20 e 21 da Lei Federal nº 10.406, de

10 de janeiro de 2002 (Código Civil – docs. 7 e 8), pelas razões que

passa a expor:

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I–DISPOSITIVOS LEGAIS IMPUGNADOS E

DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS

VIOLADOS

1. A presente ação direta tem por objeto a declaração da

inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, dos artigos

20 e 21 do Código Civil (Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro

de 2002), cuja abertura textual tem dado ensejo à proibição de

biografias não autorizadas pelas pessoas cuja trajetória é

retratada nas obras. Com efeito, por força da interpretação que vem

sendo dada aos referidos dispositivos legais pelo Poder Judiciário,

a publicação e a veiculação de obras biográficas, literárias ou

audiovisuais, tem sido proibida em razão da ausência de prévia

autorização dos biografados ou de pessoas retratadas como

coadjuvantes (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas).

2. Confira-se, desde logo, a dicção literal dos dispositivos legais

em questão:

“Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à

administração da justiça ou à manutenção da

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ordem pública, a divulgação de escritos, a

transmissão da palavra, ou a publicação, a

exposição ou a utilização da imagem de uma

pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento

e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe

atingirem a honra, a boa fama ou a

respeitabilidade, ou se se destinarem a fins

comerciais.

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de

ausente, são partes legítimas para requerer essa

proteção o cônjuge, os ascendentes ou os

descendentes.”

“Art. 21. A vida privada da pessoa natural é

inviolável, e o juiz, a requerimento do

interessado, adotará as providências necessárias

para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta

norma.” (docs. 7 e 8)

3. Conforme restará plenamente demonstrado ao longo desta

petição inicial, os dispositivos legais em questão, em sua

amplitude semântica, não se coadunam com a sistemática

constitucional a liberdade de expressão e do direito à

informação. Com efeito, adicção que lhes foi conferida acaba

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dando ensejo à proliferação de uma espécie de censura privada

que é a proibição, por via judicial, das biografias não autorizadas.

4. Por evidente, as pessoas cuja trajetória pessoal, profissional,

artística, esportiva ou política, haja tomado dimensão pública,

gozam de uma esfera de privacidade e intimidade naturalmente

mais estreita. Sua história de vida passa a confundir-se com a

história coletiva, na medida da sua inserção em eventos de

interesse público. Daí que exigir a prévia autorização do biografado

(ou de seus familiares, em caso de pessoa falecida) importa

consagrar uma verdadeira censura privada à liberdade de

expressão dos autores, historiadores e artistas em geral, e ao direito

à informação de todos os cidadãos.

5. Em que pese o pretenso propósito do legislador de proteger

a vida privada e a intimidade das pessoas, o alcance e a extensão

dos comandos extraíveis da literalidade dos artigos 20 e 21 do

Código Civil, ao não preverem qualquer exceção que contemple as

obras biográficas, acabam por violar as liberdades de

manifestação do pensamento, da atividade intelectual, artística,

científica e de comunicação (CF, art. 5º, IV e IX), além do direito

difuso da cidadania à informação (art. 5º, XIV).

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6. De fato, a exigência de prévia autorização do biografado

(ou de seus familiares, em caso de pessoa falecida) acarreta

vulneração da garantia da livre expressão da atividade

intelectual, artística, científica e de comunicação, que o

constituinte originário assegurou de forma plena,

independentemente de censura ou licença.

7. As figuras públicas, ao adquirirem posição de visibilidade

social, têm inseridas as suas vidas pessoais e o controle de seus

dados pessoais no curso da historiografia social, expondo-se ao

relato histórico e a biografias, literárias, dramatúrgicas e

audiovisuais. Quanto a essas, por evidente, não há qualquer dúvida

quanto à desnecessidade de seu consentimento para a elaboração de

obras biográficas a seu respeito. A rigor, entretanto, a nenhuma

pessoa, anônima ou conhecida, é conferido o direito de impedir a

publicação ou a veiculação de obras biográficas, pelo simples fato

de serem nelas retratadas. Com efeito, embora superada a fase da

censura estatal, submeter a livre manifestação de autores e

historiadores ao direito potestativo dos personagens biografados

– ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas – configuraria

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verdadeira censura privada, igualmente banida pela Constituição

de 1988.

8. A presente ação direta tem por finalidade obter decisão que

declare a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, dos

artigos 20 e 21 do Código Civil, a fim de afastar do ordenamento

jurídico brasileiro a necessidade de consentimento do biografado e,

a fortiori, de outras pessoas retratadas como coadjuvantes – ou de

seus familiares, em caso de pessoas falecidas – para a publicação

ou veiculação de obras biográficas. Como se verá, tal é o único

entendimento sobre a matéria que se revela consentâneo com a

Constituição da República.

9. É o que se passa a demonstrar:

II – DA MANIFESTA LEGITIMIDADE AD CAUSAM

DA ANEL PARA A PROPOSITURA DA PRESENTE

AÇÃO DIRETA

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

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XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

CAPÍTULO 2

O PROJETO DE LEI 393/2011 DO DEPUTADO

FEDERAL NEWTON LIMA NETO

A seguir será apresentado o projeto de Lei

393/2011 de autoria do Deputado Federal Newton Lima

Neto que visa garantir a liberdade de expressão, a

informação e o acesso à cultura.

2.1 JUSTIFICATIVAS DO PROJETO DE LEI.

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Em 15 de fevereiro de 2011, o Deputado Federal

do PT de São Paulo, Newton Lima Neto, encaminhou um

Projeto de Lei, chamado de PL 393/11, com o objetivo de

alterar o art. 20 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002

- Código Civil, para garantir a liberdade de expressão,

informação e o acesso à cultura.

O projeto visa, em termos gerais, garantir a

divulgação de imagens e informações biográficas sobre

pessoas de notoriedade pública, cuja trajetória pessoal

tenha dimensão pública ou cuja vida esteja inserida em

acontecimentos de interesse da coletividade.

Na justificação do projeto, Lima Neto afirma que o

PL393/11 foi inspirado no Projeto de Lei 3.378/08, do

então Deputado Federal Antônio Palocci Filho.

O presente projeto de lei, inspirado no projeto de lei 3.378/08, do então deputado federal Antônio Palocci Filho, visa garantir a divulgação de imagens e informações biográficas sobre pessoas de notoriedade pública, cuja trajetória pessoal tenha dimensão pública ou cuja vida esteja inserida em acontecimentos de interesse da coletividade.

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Lima Neto afirma também que as personalidades

públicas, entendidas como políticos, esportistas, artistas,

entre outros, são pessoas cujas trajetórias profissionais e

pessoais confundem-se e servem de paradigma para toda

a sociedade:

As personalidades públicas, entendidas como políticos, esportistas, artistas, entre outros, são pessoas cujas trajetórias profissionais e pessoais confundem-se e servem de paradigma para toda a sociedade. Por sua posição de destaque em relação aos demais cidadãos, as pessoas notoriamente conhecidas verificam que suas condutas, sejam pessoais, sejam decorrentes do exercício da profissão, são norteadoras das decisões de diversos seguimentos sociais, os quais valorizam as escolhas pessoais realizadas por tais personalidades públicas, muitas vezes até reproduzindo-as.

E continua dizendo que a pessoa pública

desempenha papel de verdadeiras pessoas-espelho para

um amplo corpo social:

É evidente o protagonismo que um jogador de futebol consagrado ou artista popular exercem sobre a tomada de escolhas das pessoas ditas comuns. Desde a simples adoção da mesma

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modalidade de corte de cabelos até a inspiração de comportamentos e condutas diretamente ligadas à figura da pessoa pública, percebemos que tais personalidades desempenham papel de verdadeiras pessoas-espelho para um amplo corpo social.

E afirma que em países como Estados Unidos e

Inglaterra, por exemplo, podem ser publicadas biografias

sem autorização ou consentimento de pessoas públicas:

Nossa legislação, entretanto, não faz qualquer distinção entre pessoas públicas, quer por exercerem cargos políticos, quer por serem artistas ou desportistas famosos, das demais pessoas desconhecidas. Em outros países, como, por exemplo, a Inglaterra e os Estados Unidos, o fato das personalidades frequentarem constantemente a mídia diminui o seu direito de imagem e privacidade, tornando lícitos, por exemplo, a publicação de biografias não autorizadas e a realização de obras audiovisuais sobre elas, sem a necessidade de prévio consentimento. Nesses países, os interesses da coletividade em ter acesso às informações são garantidos pela inexigência de autorização para a publicação de biografias. A utilização do nome ou da imagem de certas pessoas para garantir o amplo acesso à informação é uma realidade, sobretudo a partir de

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inovações tecnológicas que permitem métodos acessíveis de captação de imagens e sons.

O Deputado Lima Neto entende que a legislação

brasileira para que se adeque à realidade internacional,

não pode encontrar limitações e que a inexigência de

autorização para publicação de obra biográfica não atenta

à dignidade da pessoa humana:

Por se tratar de um processo global e inevitável de acesso irrestrito à informação, sob nenhuma forma de censura, entende-se que o projeto apresentado faz-se necessário para que a legislação brasileira se adeque à realidade internacional, visto que a informação transcende fronteiras nacionais e, para ser plena, não pode encontrar limitações como a atual redação do artigo 20 do Código Civil. Há de se lembrar que a inexigência de autorização para publicação de obra biográfica não significa atentado à dignidade da pessoa humana, garantido pelo artigo 1º, III, da Constituição Federal. Bem como permanece garantido o direito ao nome, previsto pelo artigo 17 do Código Civil.

Assegura também que o projeto de lei visa afastar

os resquícios legais da censura, ainda presentes no artigo

20 do Código Civil e evitar o cerceamento do direito de

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informação, tão caro aos brasileiros, após anos de

ditadura.

Discute-se, no presente projeto de lei, a afastabilidade da exigência de autorização para a elaboração de obras biográficas sobre personalidades notoriamente conhecidas. Trata-se da necessidade de afastar os resquícios legais da censura, ainda presente no artigo 20 do Código Civil e evitar, portanto, o cerceamento do direito de informação, tão caro aos brasileiros, após anos de ditadura.

E finaliza o seu entendimento de que as normas

constitucionais brasileiras, em especial aquelas

estabelecidas no artigo 5º da Constituição Federal de

1988, concedem hierarquia e importância idênticas aos

direitos individuais de imagem, privacidade, honra e nome

e aos direitos individuais de liberdade de expressão e

direito à informação:

As normas constitucionais brasileiras, em especial aquelas estabelecidas no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, concedem hierarquia e importância idênticas aos direitos individuais de imagem, privacidade, honra e nome e aos direitos individuais de liberdade de expressão e direito à informação. Este último também aparece no

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elenco dos direitos coletivos, ligado ao capítulo da Comunicação Social.

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

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CAPÍTULO 3

O CASO DA BIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA, A

AÇÃO PENAL NA JUSTIÇA CRIMINAL DE SÃO PAULO

E A AÇÃO CIVIL INDENIZATÓRIA NA JUSTIÇA CÍVIL

DO RIO DE JANEIRO

Para entendermos o caso na esfera judicial, será

descrita a seguir uma visão geral de todo o seu

procedimento.

Inicialmente em 17/01/07, o artista biografado

propõe uma ação penal/queixa-crime, na Justiça Criminal

de São Paulo, contra o biógrafo por crimes de difamação

e injúria, pelo motivo de o biógrafo descrever, em

detalhes, a vida e a intimidade do artista em seu livro sem

o devido consentimento do biografado. Na queixa-crime,

também é apresentado um pedido de liminar para proibir

imediatamente a venda do livro.

Dois dias depois, em 19/01/07, antes do resultado

do pedido de liminar, o artista biografado propõe na

Comarca da capital do Rio de Janeiro, na 20º Vara Cível,

uma ação civil com pedido de indenização, contra o

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biógrafo e a editora pelos mesmos fatos descritos na

queixa-crime. Na ação civil, além do pedido de uma

indenização, o artista biografado requer também o

deferimento da tutela antecipada para a proibição

imediata da venda da biografia.

Em 24/01/07, o juiz da Justiça Criminal Paulista

nega o pedido de liminar de proibição de venda do livro e

designa uma audiência de conciliação para o dia

27/04/07.

Em 22/02/07, o juiz da Justiça Cível Carioca

concede imediatamente o pedido de tutela antecipada

para a proibição da venda da obra.

Em 12/03/07, o biógrafo impetra o recurso de

agravo de instrumento contra a decisão do juiz carioca

com o objetivo de cassar a decisão de tutela antecipada

concedida.

Em 27/04/07, ocorre a audiência de conciliação na

Justiça Criminal de São Paulo, onde as partes celebram

um acordo de transação chamado também de

“composição dos danos civis”. No acordo, o biógrafo e a

editora se comprometem a não mais venderem a biografia

e a desistirem do recurso de agravo de Instrumento

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impetrado e, por sua vez, o artista biografado desistiria da

ação civil Indenizatória proposta.

Em 1/08/07, arrependido, o biógrafo peticionou ao

juiz paulista requerendo a desistência do acordo de

transação.

Em 24/04/08, ocorre o julgamento da ação civil no

Rio de Janeiro sem a resolução do mérito, devido ao

acordo de transação firmado entre as partes, apesar do

pedido de desistência de Paulo Cesar do acordo feito na

Justiça Criminal Paulista.

Sem êxito com o pedido de desistência do acordo

de transação na Justiça Criminal paulista e não satisfeito

com o resultado da ação civil no Rio de Janeiro, o

biógrafo ingressa na Justiça Carioca sucessivamente com

os recursos de embargos de declaração, apelação,

embargos de infringentes e o recurso especial junto ao

Superior Tribunal de Justiça sendo mais uma vez vencido.

3.1 AÇÃO PENAL E A NEGATIVA DO PEDIDO DE

LIMINAR PARA PROIBIÇAO IMEDIATA DA VENDA DO

LIVRO

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Em 17 de janeiro de 2007, o artista biografado

(chamado na ação de querelante) ingressou com ação

penal(queixa-crime) de número 0005350-72.2007.

8.26.0050(050.07.005350-2), inicialmente somente contra

o biografado, (chamado na ação de querelado).

Segundo o biógrafo Paulo Cesar Araújo, a

acusação teve como base 8 (oito) passagens da biografia

consideradas crime de difamação e 6 (seis) passagens

consideradas crime de injúria, conforme parte da queixa-

crime descrita abaixo:

Comecemos pelos escritos injuriosos, atentados à honra subjetiva do querelante porque ofensivos à sua honra, dignidade, violações de intimidade e vida privada (...). Avancemos na descrição das condutas criminosas, pois, além das passagens de caráter injurioso, no livro em questão avultam trechos de caráter nitidamente ofensivo à reputação do querelante, configurando difamação (...). É de rigor que a Justiça Criminal se pronuncie no sentido de por termo à contínua violação criminosa da honra do requerente, o que só pode se dar pela retirada de circulação da obra criminosa, o que desde logo se requer. (ARAÚJO, 2014, p.237-245)

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No dia 24 de janeiro de 2007, o Ministério Público

deu parecer favorável à proibição do livro e pediu que o

artista biografado promovesse o aditamento da queixa-

crime para incluir também os representantes da editora na

peça de acusação. O juiz, em seguida, em 6 de fevereiro

de 2007, indeferiu o pedido de liminar do artista

biografado de recolher os livros e marcou audiência de

conciliação conforme o despacho abaixo:

Intime-se o Defensor do Querelante, para que se manifeste no prazo de cinco dias - quanto ao item 4 da manifestação ministerial de fls.09/11: Requeiro especifique o Querelante, sob pena de rejeição quem são os Querelados, informando se os representantes da pessoa Jurídica e o autorizador da publicação fazem parte desse rol, e promovendo, caso assim seja o aditamento à queixa crime, bem como adeque a procuração e instrumento de substabelecimento ao que com o que menciona o Código de Processo Penal no que toca as ações penais de iniciativa privada, velando pelo princípio da indivisibilidade da ação penal privada. 2 dias. “Intimem-se os defensores para ficarem cientes da redesignação para o dia 27/04/2007 às 13:30 horas, a realização de audiência, nos termos e para os fins do art. 520, do Código de Processo Penal. 2 dias”

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Correto o parecer do Ministério Público, pois o

Código de Processo Penal estabelece em seu artigo 48, o

princípio da indivisibilidade.

Art. 48. A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade.

Como mencionado anteriormente, inicialmente o

biógrafo e depois os diretores da editora foram acusados

de cometerem respectivamente os crimes de difamação e

injúria tipificados nos artigos 139 e 140 do Código Penal,

conforme descrito abaixo:

CRIME DE DIFAMAÇÃO: Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Exceção da verdade Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

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CRIME DE INJÚRIA: Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. (grifo nosso)

Tendo em vista que a pena máxima de cada crime

foi inferior a 2 (dois) anos de detenção, o seu julgamento

seguiu também o rito da Lei 9099/95, ou seja, a Lei dos

Juizados Especiais Criminais, que trata das infrações

penais de menor potencial ofensivo.

O diploma legal estabelece em seu artigo 61 a sua

definição:

Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa. (Redação dada pela Lei nº 11.313, de 2006, grifo nosso)

Além de definir o que é infração penal de menor

potencial ofensivo, a lei prevê em seu artigo 68, a

presença obrigatória do advogado ou do defensor público.

Para entender todo o procedimento da audiência,

seguem abaixo os artigos da lei sobre o assunto:

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Art. 68. Do ato de intimação do autor do fato e do mandado de citação do acusado, constará a necessidade de seu comparecimento acompanhado de advogado, com a advertência de que, na sua falta, ser-lhe-á designado defensor público. Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários. Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima. (Redação dada pela Lei nº 10.455, de 13.5.2002)) Art. 70. Comparecendo o autor do fato e a vítima, e não sendo possível a realização imediata da audiência preliminar, será designada data próxima, da qual ambos sairão cientes. Art. 71. Na falta do comparecimento de qualquer dos envolvidos, a Secretaria providenciará sua intimação e, se for o caso, a do responsável civil, na forma dos arts. 67 e 68 desta Lei. Art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do

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fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade. Art. 73. A conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob sua orientação. Parágrafo único. Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados, na forma da lei local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os que exerçam funções na administração da Justiça Criminal. Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente. Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação. Art. 75. Não obtida a composição dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo. Parágrafo único. O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica decadência do direito, que poderá ser exercido no prazo previsto em lei. Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público

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poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta. § 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade. § 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado: I - ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva; II - ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo; III - não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida. § 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz. § 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. § 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei. § 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos

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civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível. (grifo nosso)

É prevista a audiência preliminar, em que a lei

exige o comparecimento do autor do fato, da vítima, do

advogado e do Ministério Público. A lei prevê uma fase

pré-processual ou administrativa (pois ainda não existe

ação e nem processo) em que o autor do fato poderá

optar por duas orientações: a transação (composição dos

danos civis) prescrita no artigo 74 ou a transação penal

prescrita no artigo 76.

Ocorrendo a transação ou composição dos danos

civis, na presença do Ministério Público, como fiscal da

lei, lavrar-se-á termo a ser homologado, por sentença,

pelo juiz. A sentença homologatória é declaratória e válida

como título executivo judicial e é irrecorrível, gerando a

renúncia tácita ao direito de queixa ou de representação

com a extinção da punibilidade do autor do fato.

Não chegando as partes a nenhum acordo, se

crime de ação privada, deve o juiz indagar ao querelante

se oferece proposta de transação penal. Não o querendo

naquele momento, será cientificado que poderá fazê-lo no

prazo de seis meses contados da data em que teve

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ciência da autoria do fato, conforme prescreve o artigo 38

do Código de Processo Penal e o artigo 103 do Código

Penal.

Em 27 de abril de 2007, ocorreu a audiência de

conciliação da transação entre o biógrafo (querelado), os

representantes da editora (querelados) e o artista

biografado (querelante), conforme descrito abaixo:

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

3.2 AÇÃO CIVIL INDENIZATÓRIA E A PROIBIÇÃO

IMEDIATAMENTE DA VENDA DO LIVRO

O artista biografado propôs aqui no Rio de Janeiro,

em 19/01/07, a Ação Civil Indenizatória com pedido de

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tutela antecipada nº 2007.001.006607-2 em face do

biógrafo e agora também em face dos representantes da

editora. Afirmou na ação que, em novembro de 2006, a

editora publicou obra literária que pretendia descrever em

detalhes a sua vida e a sua intimidade sem o seu devido

consentimento e que os fatos ofendiam o art. 5º, inciso X,

da Constituição da República, e mais especificamente, o

art. 20, caput, do Código Civil/02. Requereu e obteve, em

22 de fevereiro de 2007, antes da decisão da Ação Penal

no estado de São Paulo, o deferimento da tutela

antecipada para interromper imediatamente a publicação,

distribuição e comercialização do livro em todo território

nacional, sob pena de pagamento de multa diária de R$

50.000,00 (cinquenta mil reais), conforme decisão descrita

abaixo:

Trata-se de ação através da qual o autor se insurge contra a publicação não autorizada da sua biografia, requerendo a antecipação dos efeitos da tutela para que sejam interrompidas a publicação, a distribuição e a comercialização do livro. Defiro a antecipação dos efeitos da tutela. A biografia de uma pessoa narra fatos pessoais, íntimos, que se relacionam com o seu nome, imagem e intimidade e outros aspectos dos direitos da personalidade. Portanto, para que

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terceiro possa publicá-la, necessário é que obtenha a prévia autorização do biografado, interpretação que se extrai do art. 5º, inciso X, da Constituição da República, o qual dispõe serem invioláveis a intimidade, a vida privada e a imagem das pessoas. No mesmo sentido e de maneira mais específica, o art. 20, caput, do Código Civil/02, é claro ao afirmar que a publicação de obra concernente a fatos da intimidade da pessoa deve ser precedida da sua autorização, podendo, na sua falta, ser proibida se tiver idoneidade para causar prejuízo à sua honra, boa fama ou respeitabilidade. Registre-se, nesse ponto, não se desconhecer a existência de princípio constitucional afirmando ser livre a expressão da atividade intelectual e artística, independentemente de censura ou licença (inciso IX do mesmo art. 5º). Todavia, entrecruzados estes princípios, há de prevalecer o primeiro, isto é, aquele que tutela os direitos da personalidade, que garante à pessoa a sua inviolabilidade moral e de sua imagem. Além do mais, conforme mansa jurisprudência, não está compreendido dentro do direito de informar e da livre manifestação do pensamento a apropriação dos direitos de outrem para fins comerciais. Assim, presente a plausibilidade do direito alegado pelo autor da causa, ante a necessidade da sua prévia autorização para a publicação e para a exploração comercial da sua biografia. Presente, ainda, o requisito do receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I, do CPC), na medida em que, não concedida a medida ora

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pleiteada, permanecerá a comercialização da obra, fazendo com que novas pessoas tomem conhecimento de fatos cujo sigilo o autor quer e tem o direito de preservar. Ante o exposto, defiro a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar aos réus a interrupção da publicação, da distribuição e da comercialização do livro, em todo o território nacional, no prazo de três dias, sob pena do pagamento de multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Citem-se. Intimem-se. Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2007. Maurício Chaves de Souza Lima JUIZ DE DIREITO. (grifo nosso)

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CAPÍTULO 4

ANÁLISE JURÍDICA DO CASO

Começaremos, neste capítulo, a analisar as

possibilidades de defesa do biógrafo, à época dos fatos,

em relação ao acordo de transação ocorrido na Justiça

Criminal de São Paulo.

Inicialmente, será analisada a validade do acordo

da transação. Posteriormente será verificada a sua

possível anulação (nulidade ou desconstituição) pelo

vício de consentimento da vontade do biógrafo ou pela

não imparcialidade do juiz ou pela falta de defesa técnica

efetiva de Paulo Cesar de Araújo.

4.1 VALIDADE DO ACORDO DE TRANSAÇÃO NÃO

HOMOLOGADO PELO JUIZ CRIMINAL

Primeiramente é importante frisar que a grande

questão que envolveu a proibição e a venda do livro está

ligada tão somente à validade ou não do pacto do acordo

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de transação realizado na Justiça Criminal de São Paulo e

a sua possível anulação ou desconstituição.

É fácil observar isso no voto do Desembargador

Relator Pedro Raguenet, citado anteriormente, no recurso

de apelação.

Evidente, desta sorte, que o aqui recorrente anuiu com a proposta visando fazer cessar os efeitos da demanda criminal, sendo certo que toda sua argumentação recursal acerca da ineficácia daquela padece de vício primário, qual seja, a não desconstituição daquele pacto, naquele outro juízo, previamente e consoante os termos da legislação própria. Evidente então que qualquer intenção de prosseguir no andamento deste processo necessitaria, por óbvio, que de primeiro fosse aquele pacto anulado, o que não ocorreu. Isto faz com que se a reconheça – em relação aos litigantes – como válido e eficaz aquilo que os mesmos dispuseram acerca da questão da circulação do livro, devendo se submeter aos efeitos deste pacto. Vista a matéria sob o ponto de vista do direito material, no que tange ao direito processual temos que, extinto este processo sem manifestação sobre o mérito, nada haverá a se apreciar sobre referido tema. Realmente assim o é, eis que o lançamento da sentença acarreta, concomitantemente, a extinção dos efeitos da tutela antecipada concedida, sendo uma corolário da outra. Não mais existindo o

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processo, não mais existe a decisão inaugural aqui discutida, sendo desnecessário, até, que haja manifestação sobre sua revogação, conforme precedente da 12ª Câmara Cível (...) Pelo exposto VOTO pelo conhecimento e improvimento do recurso, nos termos acima. Rio de Janeiro, 10 de Março de 2009.Pedro Raguenet, Desembargador Relator (grifo nosso)

Na visão do Desembargador, a solução do caso

envolve duas áreas do direito. A primeira sobre o direito

processual referente à ação civil no Rio de Janeiro e a

segunda sobre direito material, que tratou do acordo de

transação na Justiça Criminal de São Paulo.

O Desembargador afirma que, na perspectiva do

direito material, as partes pactuaram o acordo de

transação realizado na Justiça Criminal de São Paulo e se

comprometeram, respectivamente, o biógrafo e a editora,

a não mais vender a biografia e o artista, a desistir da

ação civil proposta no Rio de Janeiro.

Ele entende que o pacto do acordo de transação

foi válido e eficaz, independente de sua homologação e,

por isso, a ação civil foi extinta sem a resolução do mérito

e sua respectiva tutela antecipada.

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Para ele, o que está agora proibindo a venda da

obra é tão somente o acordo de transação realizado e que

só com a sua desconstituição ou anulação é que o livro

poderia ser novamente vendido.

Por outro lado, em entendimento contrário e a favor

do biógrafo, o Desembargador Jorge Luiz Habib, que foi

voto vencido no recurso de apelação, afirma em linhas

gerais, segundo Paulo Cesar de Araújo, que o acordo não

foi homologado e por isso não é válido e eficaz e que, no

prazo legal, o réu desistiu da aceitação do acordo de

transação e que a defesa do artista afirmou,

equivocadamente, que o acordo foi homologado.

Depois de pronunciarem os três desembargadores o mais enfático depois deles foi Jorge Luiz Habib, quando expôs seu voto na segunda sessão. “Estou convencido de que juridicamente não se justifica a proibição deste livro”. Ele se valeu de quatro argumentos principais para defender sua opinião: 1) O acordo na ação penal em São Paulo não foi homologado; 2) No prazo legal o réu manifestou desistência da aceitação da transação penal; 3) O artista é uma figura de dimensão pública com restrito direito ao controle de sua imagem e privacidade;

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4) O livro possui relevância informativa e cultural. O desembargador explicou que, após o réu manifestar desistência do acordo, o juiz de São Paulo mandou intimar os interessados, e o artista biografado não atendeu às intimações. O prazo passou sem que ninguém se pronunciasse, e o juiz mandou arquivar o caso sem homologá-lo. A não homologação, portanto, no entender do desembargador, invalidaria o acordo. Para reforçar seu argumento, ele cita uma decisão do relator Pereira da Silva, a qual diz textualmente que; “é impossível o reconhecimento da composição dos danos civis com base em acordo extrajudicial não homologado pelo juiz [...] somente a homologação constitui o título executivo judicial”. Para o relator, a defesa do cantor “tenta induzir a erro o julgador” ao afirmar que a documentação comprovaria o trânsito em julgado da homologação do acordo, ignorando o pedido de desistência do réu. O fato do artista ter sido intimado e não se manifestar teria como anulação daquele pacto (...) a ínclita juíza de primeiro grau, ao que e parece, não observou a manifestação de desistência da inoperante transação por parte do querelado(Paulo Cesar de Araújo) (...).Ela não atentou para o fato que o réu tinha interesse processual em prosseguir com a ação, a partir do momento em que manifestou, expressamente, desistência da transação nos autos da ação penal, capital paulista, transação que não recebeu sentença homologatória”. (ARAÚJO, 2014, p.401-402)

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É interessante destacar que a maioria da doutrina

entende que o acordo de transação é um negócio jurídico

de direito civil privado que pode ser realizado, por

exemplo, na Justiça Criminal, na Justiça Trabalhista, etc.

Para Silvio Rodrigues, negócio jurídico representa

uma prerrogativa que o ordenamento jurídico confere ao

indivíduo capaz de, por sua vontade, criar relações a que

o Direito empresta validade, e que uma vez estabelecida,

por convenção entre os particulares, legalmente

constituída, a lei lhe empresta sua força coercitiva e ela se

torna obrigatória. Para o jurista, alguns códigos dizem

que tal convenção tem força de lei que é chamado de

princípio de pacta sunt servanda.

De fato. O negócio jurídico representa uma prerrogativa que o ordenamento jurídico confere ao indivíduo capaz de, por sua vontade, criar relações a que o direito empresta validade, uma vez que se conformem com a ordem social. A vontade procura um fim que não destoa da lei e que, por esse motivo, obtém dela a eficácia necessária. O fim da declaração é produzir efeitos jurídicos imediatos, e, dada a licitude do propósito, tais efeitos são efetivamente gerados. A esse princípio se chama autonomia da vontade. Representa a

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medida na qual o direito positivo reconhece aos indivíduos a possibilidade de praticar atos jurídicos, produzindo seus efeitos. Uma vez estabelecida uma relação jurídica, por convenção entre os particulares, legalmente constituída, a lei lhe empresta sua força coercitiva e ela se torna obrigatória. Alguns códigos dizem que tal convenção tem força de lei''. É o princípio pacta sunt servanda (...). (RODRIGUES, 2007, p. 170)

Na visão de Caio Mário Pereira, transação é um

negócio jurídico que se aproxima do contrato, na sua

constituição, e do pagamento, nos seus efeitos.

(...) é uma modalidade especial de negócio jurídico, que se aproxima do contrato, na sua constituição, e do pagamento, nos seus efeitos. (PEREIRA, 1990, p. 179)

Então, o acordo de transação visa pôr fim ao

conflito entre as partes através de concessões mútuas, e

está previsto no artigo 840 do Código Civil. Vejamos:

Art. 840. É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.

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O artigo 842 do mesmo Código dispõe sobre a

obrigação da homologação da transação por termos nos

autos pelo magistrado.

Artigo 842. A transação far-se-á por escritura pública nas obrigações em que a lei o exige, ou por instrumento particular, nas em que ela o admite; se recair sobre direitos contestados em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado pelos transigentes e homologado pelo juiz.(grifo nosso)

Esse é o mesmo pensamento de Caio Mário

Pereira sobre a obrigação da homologação para

aperfeiçoar a transação por termos nos autos.

A que se realiza por termo nos autos não se considera perfeita senão com a homologação, que constitui destarte uma sua formalidade integrativa. (PERERA, 2000, p.176)

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

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XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

Pelo exposto, sendo o pacto do acordo de

transação que proibiu a venda do livro do biógrafo válido e

eficaz, como poderia se anulado ou desconstituído na

Justiça Criminal de São Paulo?

O pacto da transação poderia ser anulado ou

desconstituído em tese, o que dependeria de provas, por

uma ação de nulidade alegando o vício do consentimento

da vontade do biógrafo ou a imparcialidade do juiz ou a

falta de defesa técnica efetiva de Paulo Cesar.

Para verificar a possibilidade de nulidade do

acordo de transação por vício de consentimento da

vontade do biógrafo em aceitar o acordo, é interessante

reproduzir abaixo trechos da audiência de conciliação,

segundo relato de Paulo Cesar de Araújo:

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Logo que entramos na sala, o juiz foi nos advertindo da gravidade da situação. (...) “A editora pode até vir a ser fechada”, ameaçou o juiz sem meias palavras. “Fechar à editora? Como assim?” (...). “Sim, a editora pode ser fechada porque é muito grave no Brasil publicar uma biografia não autorizada”, enfatizou o magistrado, para espanto do executivo argentino. (...) O juiz respondeu com certa impaciência: “Não adianta, a situação de vocês é muito difícil”, e em seguida indagou: “Paulo Cesar, quantos anos você tem?” (...). “Pois, então, vocês vão querer carregar durante cinco anos uma queixa-crime nas costas? Perder a condição de réus primários? Isso vai trazer uma série de aborrecimentos para a vida de vocês. Vamos selar um acordo com o artista biografado (...)”. Surpreendido com a atitude do juiz ponderei que estava aberto a um acordo desde que não atingisse a integridade da obra. “Mas ele não quer essa biografia. Acabei de conversa com o artista e ele está muito aborrecido com isso e não aceita nenhuma proposta que não seja a retirada de circulação do livro.” E depois de cerca de vinte minutos de pressão sobre nós, o juiz deu por encerrada a conversa (...). Até esse momento eu estava relativamente tranquilo, pois acreditava que a editora e seus advogados se manteriam firmes no propósito de defender o livro que tinham publicado. Por mais de uma vez em comunicados oficiais distribuídos à imprensa no início do processo, a editora manifestou “a certeza de ter editado um ensaio biográfico sério, à altura da grandeza do artista e sua obra” e disse que

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continuaria na “luta em defesa do livro e pela liberdade de expressão”. (...) Tive dificuldade de compreender o que diziam por conta do frequente uso de termos jurídicos como “exordial”, “ agravo de instrumento”, “tutela antecipada”, “direito de reconvenção”. (...) Os advogados do artista biografado aproveitaram então a reunião para novamente cobrar a multa determinada pelo juiz (no caso o juiz da ação civil do Rio de Janeiro que proibiu a venda do livro). Enfatizando que 50 mil reais por 61 dias totalizariam uma multa acumulada, até aquele momento de 3,050 milhões de reais. A advogada argumentou que a editora nada devia, pois tinha cumprida a liminar. “Isso não aconteceu na prática”, rebateu o advogado do artista, “vocês são responsáveis pela publicação e comercialização da obra e esta, numa afronta à determinação da justiça, continua a venda nas livrarias. É fato que o delito foi cometido, e notas fiscais estão aqui para comprovar”. Além da multa por determinação de sentença judicial, o artista biografado queria receber indenização por supostos danos morais e materiais que a biografia teria lhe causado. (...) O medo de perder muito dinheiro fez com que a editora aceitasse o acordo proposto pelo juiz. (...) Lembro-me da conversa da advogada da editora com o diretor-geral, ambos sentados um pouco à minha frente; ela afirmava que o acordo seria um bom negócio para a empresa. Não seria mais indicada em termos de liberdade de expressão, mas seria interessante para a editora o acordo com o artista biografado. Em nenhum momento fui consultado sobre

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qualquer decisão relativa ao meu livro e também nada me foi comunicado diretamente. (...) Foi nesse momento que constatei, surpreso e perplexo, que a editora desistira de brigar com o artista. A partir desse momento, me senti abandonado e desnorteado. Não sabia o que fazer numa situação dessas, se podia virar a mesa e não aceitar o acordo. Não estavam claras para mim as consequências disso. A editora não queria correr o risco de pagar a multa até ali acumulada. Em não aceitando essa decisão, quem pagaria esse montante, eu, a editora, metade cada um? Eu não poderia arcar com essa despesa. Se também fôssemos depois condenados a pagar uma alta indenização ao artista, qual parte da dívida caberia a mim? Sendo eu o único responsável pelo desacordo, com certeza a editora me cobraria à conta. Eu sabia praticamente de cor aquela cláusula do meu contrato de edição com a editora: “O autor será o único responsável pelas reclamações formuladas por terceiros em relação ao conteúdo da obra, assim com pelos danos e prejuízos que possa comprovadamente sofrer a editora”. Essas questões me vieram à cabeça e eu não tinha alguém para me defender nem me orientar em minhas dúvidas. Teria que decidir sozinho, no calor da hora e na frente de todos. O fato de estar numa sala na presença do artista, de seus advogados, do juiz e dos promotores me deixou pouco à vontade para questionar os representantes da editora e tentar esclarecer melhor as coisas. Minha primeira reação foi então

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torcer que o acordo não se efetivasse, pois havia ainda uma importante questão pendente. (...) “Já que o artista biografado insiste em cobrar algo que a empresa não pode pagar, só nos resta continuar com essa briga na justiça. Para mim não tem problema nenhum, isso é apenas um processo a mais. Vamos então aguardar o julgamento da tutela antecipada e retornaremos todos aqui numa outra data”. A fala do advogado me deu esperanças de que o acordo pudesse não se materializar. Entretanto, foi nesse momento de impasse o juiz usou de sua autoridade para mais uma vez ameaçar a editora, dizendo que aquilo era coisa séria, que já estava com a ordem de fechamento da editora assinada para segunda-feira, caso o diretor-geral da editora não comparecesse àquela audiência. Insistia que o que estavam discutindo era muito sério, que não estavam brincando, e que portanto iam fazer o acordo sim, e encerrar a disputa jurídica naquele dia mesmo.(...) Pediu então ao juiz para acrescentar ao texto do acordo a proibição de que eu falasse publicamente sobre a biografia. (...) Pensei que os advogados da editora fossem se manifestar contra mais essa flagrante agressão a liberdade de expressão. Mas não falaram nada. Então me levantei e fui o meu próprio advogado. “Excelência, por favor, isso não pode constar do acordo. A Constituição brasileira nos garante a liberdade de expressão, a livre manifestação de ideias e de pensamento”, e deixando modéstia de lado, afirmei: “ Não sei se vocês sabem, mas o livro já faz parte da história. Querer me proibir de

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falar dele é o mesmo que me impedir de falar de Getúlio Vargas, de JK ou da Guerra de Canudos. E eu como autor, professor, historiador e cidadão, vou sempre falar desse livro”. (...) “E doravante Paulo Cesar de Araújo se absterá de tecer comentários sobre a vida pessoal do artista...”. Era evidente que eu não queria e não devia ter nenhum veto ao direito de livre expressão. Porém, ninguém protestou e, e então mais uma vez me levantei e fui o meu próprio advogado. “Excelência por favor, isso também não pode constar do acordo”. (...) Confesso que já não tinha mais argumentos para retrucar, e novamente ninguém veio em minha defesa. (...) “É que eu não quero mais ter problemas com ele, não quero mais ter que discutir se ele está invadindo ou não a minha privacidade”. Com essa frase, o autor de “Jesus Cristo” manifestou a sua vontade de se livrar definitivamente de mim. Isso me incomodou muito na hora, e reagi: Eu sou um homem sério, um pesquisador e historiador da música brasileira. (...) Eu fiz este livro com tanto amor e carinho que o dediquei á minha filha Amanda, de cinco anos. E será lamentável essa biografia não mais existir quando ela crescer. Disse dessa última frase desatei a chorar, ali na cadeira, com a mão direita sobre o rosto. Acho que as lágrimas já estavam presas havia muito tempo, porque chorei compulsivamente. (...) É possível que, eu estivesse ali com algum amigo – como desejei levar – ou com um advogado próprio – que fui aconselhado a contratar –-, naquele momento eles tivessem me retirado da sala a audiência tivesse

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tomado outro rumo. (...) Depois de mais de cinco horas de reunião, eu já estava exaurido, emocionalmente arrasado e sem ânimo para dizer ou ouvir mais nada. Acusado pelo artista biografado e seus advogados, pressionado pelo juiz pelos promotores e abandonado pela editora, a minha única vontade era sair daquela sala o mais rápido possível. Antes disso, porém, o juiz pegou uma bolsa que estava ao lado de sua mesa e, para surpresa de todos, dela retirou um CD que mostrava na contracapa a sua imagem segurando um violão. Ele abriu o encarte, autografou e ofereceu ao artista, com um pedido que todos ouviram. “eu também sou cantor e compositor, com o nome artístico de Thé Lopes. Gostaria muito que você ouvisse esse disco e desse sua opinião sobre o trabalho.” (...) No dia seguinte à audiência, num sábado, a advogada da editora me enviou uma mensagem por e-mail com cópia para os diretores.“ Paulo, como você está? Tentei te ligar em casa, mas ninguém atendeu.” (...) Minha resposta à advogada foi com cópia também endereçada ao diretor-geral e ao editor da editora (...). Na mensagem pergunto por que eles não apoiaram a proposta que fiz ao artista e também reclamo que me “senti abandonado naquela audiência e meu livro, sem defesa”. (...) “Mas você não me pediu para fazer o acordo. Quando a Dra. Rosa decidiu aceitar a proposta, pensei que você estivesse de acordo, porque em nenhum momento você me disse que não queria.” É verdade. Nenhuma vez durante a audiência eu disse diretamente ao advogado que não aceitava

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condenar meu livro à fogueira. Imagino, no entanto, a seguinte cena: em vez de mim, é o artista biografado quem se levanta durante a sessão e, aos prantos, diz que os termos do acordo são absurdo, apresentando então uma outra proposta. Será que os advogados deles teriam alguma dúvida de que eu seu cliente não queria aquilo que foi decidido? Por essas e outras, eu era mesmo o único daquele que não queria e não podia esquecer o que havia se passado. (ARAÚJO, 2014, p.299-323)

Abaixo, temos a versão dada pela advogada da

editora publicada em 8 de maio de 2007, no site da

redação de Migalhas esclarecendo as razões pelas quais

a editora fechou um acordo com o artista biografado:

"Muitos têm perguntado por que a editora e o autor Paulo César celebraram acordo que culminou na apreensão do livro. A resposta é simples: a justiça brasileira, diferentemente da justiça norte-americana, por exemplo, não privilegia a liberdade de expressão. Ambas as partes do processo judicial estavam amparadas por garantias constitucionais, sendo que ambas as garantias estão, inclusive, asseguradas pelo mesmo artigo da Constituição Federal, o quinto. O artista biografado ingressou com duas ações, uma cível na comarca do Rio de Janeiro, na qual pedia a proibição da venda do livro e uma

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indenização por danos, e uma criminal na comarca de São Paulo, na qual também pedia a proibição da venda do livro e a condenação do autor e de dois representantes da editora no crime de difamação. Assim que o artista biografado ingressou com a ação no Rio de Janeiro obteve em caráter liminar uma decisão a seu favor. Nessa decisão, o juiz da causa já demonstrava que o processo estava perdido para a editora (...). Inicia-se aqui o primeiro ponto contra a editora e o autor. Imediatamente estes ingressaram com recurso visando a reforma dessa decisão. No recurso, pediam a imediata suspensão daquela ordem de proibição, mas o Relator do processo – Dr. Pedro Raguenet indeferiu essa suspensão imediata e a proibição valeria até o julgamento final do recurso. Outro ponto contra a editora e o autor. Apurou-se, ainda, em pesquisa realizada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que o Dr. Pedro Raguenet não seguia, a principio, a linha da liberdade de expressão, pois havia condenado recentemente uma Rede de Televisão. Foi feita ampla pesquisa de jurisprudência nos Tribunais Estaduais e também no Superior Tribunal de Justiça e apurou-se que a balança pendia para a prevalência do direito de intimidade sobre o direito de liberdade de expressão, não havendo sequer um processo envolvendo livro com jurisprudência pacificada a favor de autor, embora fossem encontradas, obviamente, diversas decisões a favor da liberdade de expressão expressas em jornais e revistas.

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Mesmo com toda essa situação desfavorável, o autor e a editora estavam firmes na posição de levar adiante a luta. A gota d’água, porém, ocorreu naquela tarde fatídica de 27/4 perante a justiça criminal. O juiz da causa, juntamente com dois promotores, determinaram que as partes seriam primeiramente ouvidas sem os respectivos advogados, conforme faculta o artigo 520 do Código de Processo Penal. Nessa ocasião o autor e os representantes da editora foram diversas vezes advertidos dos riscos que corriam. O juiz chegou a dizer que fecharia a editora na segunda-feira seguinte, caso o Diretor Geral, que sequer havia sido citado para aquela audiência, não comparecesse. (...) Após mais de 5 horas de debates e, percebendo a Editora que o seu futuro já estava selado, achou que um acordo seria a única salvação. No agravo de instrumento interposto o autor e a Editora lutaram pela prevalência do direito de liberdade de expressão. Na defesa da ação cível também o fizeram. Infelizmente, percebendo a tempestade se aproximando, não tiveram tempo de ver esse direito prevalecer. Nós, defensores do autor e da editora amargamos, juntamente com todos os brasileiros defensores da liberdade, profunda frustração."(texto com adaptações)

Sobre o episódio, é interessante observar também

a versão do Juiz Tércio Pires:

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JUIZ DA CONCILIAÇÃO ENTRE PAULO CESAR DE ARAÚJO E O CANTOR BIOGRAFADO REPUDIA HISTÓRIA CONTADA EM LIVRO O GLOBO - 21/5/2014

Tércio Pires nega que tenha pedido para o

cantor dar opinião sobre o disco que gravou,

conforme história descrita em 'O réu e o rei',

livro do biógrafo sobre a batalha judicial.

SÃO PAULO - O Juiz Tércio Pires, que hoje atua

como substituto de segundo grau no TJ-SP,

afirmou que não pediu autógrafo ao artista

biografado, mas confirmou que entregou seu CD

autografado ao artista, assim como a todos os

outros presentes na audiência de conciliação

entre Paulo Cesar de Araújo e o artista.

Segundo trecho do livro "O Réu e o Rei - Minha

História com o Artista, em Detalhes", após a

audiência em que estavam presentes

representantes da Editora Planeta, o promotor do

caso, advogados, o cantor e o biógrafo, o Juiz

teria dado um CD com seu trabalho de músico ao

ídolo. E teria dito, na frente de testemunhas, que

gostaria de ouvir a opinião do ídolo sobre o disco.

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- É mentira, não falei nada disso (que gostaria que

o artista ouvisse e desse opinião sobre o CD

dele), nem ele (o artista, que teria respondido que

ouviria com carinho). Terminou o acordo, estava

todo mundo conversando, todos felizes e

sorridentes e, exatamente por esse

desprendimento, peguei meus CDs e dei para

todos os advogados, promotores, para todo

mundo, inclusive para o seu Paulo. Posso até ter

feito um comentário para ouvirem, mas foi dentro

desse contexto - afirmou Pires, cujo nome

artístico é Thé Lopes.

O magistrado afirma que, antes de ditar o

acordo para a redação final, comunicou aos

presentes que tinha dois CDs gravados e era

coautor de um livro ("Demandas contra a Fazenda

Pública"). E que não houve contestação de

nenhuma parte. Pires contou que foi chamado

pelo artista para tirar foto ao lado dele após o final

da audiência. (grifo nosso)

- O artista tirou foto como todo mundo que estava

presente na audiência, inclusive com os

promotores e advogados. Só não tirou com o Sr.

Paulo, ele não quis. Ao final, disse que era a vez

do Juiz. Em um clima absolutamente feliz, sereno,

mas entenda o contexto, num clima de acordo.

Você acha que num panorama desse eu diria que

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não tiraria foto com ele? Eu acharia grosseiro não

aceitar - contou o Juiz, para em seguida observar:

- Começo a achar que o artista tem razão e que

ele (autor do livro) é oportunista. Inclusive o

lançamento desse novo livro, que eu não tinha

conhecimento, me parece oportunismo. O que ali

ocorreu foi um acordo entre advogados de

expressivo respeito do mundo jurídico, um deles

aliás, na defesa do Sr. Paulo. Reconhecendo ali a

condição (de Paulo Cesar) de fã fanático do

artista, enveredei para o convencer a fazer um

acordo.(grifo nosso)

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4.2 POSSIBILIDADE DE TER HAVIDO VÍCIO DE

CONSENTIMENTO DA VONTADE DO BIÓGRAFO NA

ACEITAÇÃO DO ACORDO DE TRANSAÇÃO

Inicialmente, gostaria de destacar que os juristas

Ada Pellegrini Grinover e o Ex-promotor de Justiça e Juiz

Luiz Flávio Gomes, escreveram um livro em conjunto

sobre a Lei 99099/95 ou Lei dos Juizados Especiais

Criminais. Eles participaram da comissão responsável

pela orientação para toda comunidade jurídica e, em

especial, para os órgãos judicantes, da interpretação da

então nova lei na época.

No livro, Grinover afirma que na hora da proposta

do acordo de transação, a manifestação de vontade do

autor do fato é personalíssima, voluntária, absoluta,

formal, vinculante e tecnicamente assistida. Para ela, o

autuado (autor do fato), seguro de sua inocência e

devidamente orientado pela defesa técnica, poderá

preferir responder ao processo para lograr absolvição ou

não concordar com os termos da proposta de transação.

Grinover destaca que se houver conflito entre a

vontade do autor do fato e de seu advogado, deve

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prevalecer a vontade do envolvido. Ela afirma que só a

ele cabe a última palavra e cita a décima quinta cláusula

instituída pela comissão constituída pela Escola Nacional

da Magistratura para o seu convencimento.

(...) a manifestação de vontade do autor do fato é personalíssima, voluntária, absoluta, formal, vinculante e tecnicamente assistida. (...) O autuado seguro de sua inocência e devidamente orientado pela defesa técnica, poderá preferir responder ao processo para lograr absolvição. Ou poderá não concordar com os termos da proposta formulada e, considerando seus prós e contras, escolher a via jurisdicional. Nada se poderá fazer, sem o consenso do autor do fato. (...) Mas, se não houver mesmo consenso, pensamos que deve prevalecer a vontade do envolvido, desde que devidamente esclarecido das consequências da aceitação. Só a ele cabe a última palavra (...). Consciente desse aspecto, a Comissão constituída pela Escola Nacional da Magistratura (v. notas introdutivas à seção, n. 11) assim se manifestou: Décima quinta conclusão: “Quando entre o interessado e seu defensor ocorrer divergência quanto à aceitação de proposta de transação penal ou suspensão condicional do processo, prevalecerá a vontade do primeiro”. (GRINOVER et al 2002, p.153)

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Sobre declaração de vontade é interessante

observar o que diz o artigo 112 do Código Civil sobre a

interpretação das declarações de vontade na hora das

partes celebrarem um acordo.

Artigo 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

O professor Silvio Rodrigues ensina que o referido

artigo acima contém mais um princípio de interpretação

dos negócios jurídicos do que uma regra de Direito. O

mestre entende que o legislador abre um caminho ao

intérprete para ajudá-lo a resolver os casos obscuros e,

havendo dúvida, deve o juiz buscar a efetiva vontade dos

contratantes, pois sendo o ato jurídico um ato de vontade,

é o conteúdo volitivo que deve ser procurado.

O art. 112 do Código Civil, dispondo que nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção do que ao sentido literal da linguagem, contém mais um princípio de interpretação dos negócios jurídicos do que uma regra de direito. O legislador abre um caminho ao intérprete, para ajudá-lo a resolver os casos obscuros. Havendo dúvida, deve o juiz perscrutar a vontade das

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partes, ou seja, o que os contratantes efetivamente queriam, pois, sendo o ato jurídico um ato de vontade, é o conteúdo volitivo que deve ser procurado. (RODRIGUES, 2007, p. 178)

Continuando no tema sobre interpretação, o art.

113 do mesmo diploma afirma que os negócios jurídicos

(acordo de transação) devem ser interpretados conforme

a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração, ou seja,

deve atender ao interesse social de segurança das

relações jurídicas, uma vez que as partes devem agir

sempre com lealdade e probidade.

Artigo 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

Para o professor Caio Mário da Silva Pereira, a

vontade deve estar em conformidade com a norma legal

para só assim produzir efeitos jurídicos válidos.

O pressuposto do negócio jurídico é a declaração da vontade do agente em conformidade com a normal legal, visando à produção de efeitos jurídicos. Então, o elemento específico é a

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emissão de vontade. Se faltar, o negócio não se constitui. Se existe, origina o negócio jurídico. Assim, essa vontade deve estar em consonância com o íntimo e verdadeiro querer do agente e submissa ao ordenamento jurídico. Para que ocorra o resultado do negócio jurídico, ou seja, a produção de seus efeitos jurídicos, é necessário a verificação das circunstâncias que a envolveram, pois pode ter ocorrido uma declaração de vontade em determinadas circunstâncias que não traduza a verdadeira atitude volitiva do agente. Desta forma, não se nega a existência do negócio jurídico, pois a vontade se manifestou, porém se recusa seus efeitos. Pode-se dizer então que há negócio jurídico, porém defeituoso. (PEREIRA, 2007, p. 513.)

Silvio Rodrigues segue na mesma linha afirmando

que os vícios do consentimento, isto é, o erro, o dolo e a

coação, incidem sobre a vontade impedindo de se

externar conforme o íntimo desejo do agente e por isso

podem ser anulados de acordo com o art. 147,II do antigo

Código Civil e o art. 171, II do atual código.

De fato. De acordo com o art. 147, 11, do Código Civil de 1916: "Art.147. É anulável o ato jurídico: (...)II - por vício resultante de erro, dolo, coação, simulação, ou fraude (arts. 86 a 113)".

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Diante do exposto, o que seria então vício de

consentimento ou coação para viciar a declaração da

vontade?

Inicialmente é interessante destacar o conceito de

ameaça ou coação na visão de vários especialistas.

Para Humberto Theodoro Júnior ameaçar é anunciar

a alguém o propósito de causar à sua pessoa ou a seus

bens, ou a outrem, um mal.

Ameaçar é anunciar a alguém o propósito de causar à sua pessoa ou a seus bens, ou a outrem, um mal. Pela ameaça, cria-se o constrangimento, que irá alterar o processo normal de formação da vontade, porquanto o sujeito passivo da coação não terá mais condições de exteriorizar livremente seu querer. Sob a pressão da ameaça, o declarante acaba

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querendo, de fato, o que enuncia, mas não de forma livre. (THEODORO JÚNIOR, 2003, p.174)

Sobre coação, Roberto Senise Lisboa afirma que é

o mal injusto, grave e iminente, causado à vítima,

mediante violência física ou moral, que a leva a realizar

ato jurídico que, em outra situação, não faria.

Coação é o mal injusto, grave e iminente, causado à vítima, mediante violência física ou moral, que a leva a realizar ato jurídico que, em outra situação, não faria. (LISBOA, 2003, p. 553)

Carlos Roberto Gonçalves entende que coação é

toda ameaça ou pressão exercida sobre um indivíduo

para forçá-lo, contra a sua vontade, a praticar um ato.

Coação é toda ameaça ou pressão injusta exercida sobre um indivíduo para forçá-lo, contra a sua vontade, a praticar um ato ou realizar um negócio. O que a caracteriza é o emprego da violência psicológica para viciar a vontade. (GONÇALVES, 2005, p. 383)

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Para Silvio Rodrigues, baseando-se em Capitant,

coação é toda pressão exercida sobre um indivíduo para

determiná-lo a concordar com um ato.

Coação, na definição de Capitant, é toda pressão exercida sobre um indivíduo para determiná-lo a concordar com um ato. (RODRIGUES, 2007, p.199)

Já o Código Civil, em seu artigo 151 afirma que a

coação para viciar a declaração da vontade entre outros,

há de ser tal, que incuta ao paciente fundado temor de

dano iminente.

Artigo 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerá-lo à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.

Observando as declarações do biógrafo Paulo

Cesar de Araújo na audiência na Justiça Criminal em São

Paulo, descrita em outra seção, seria possível afirmar que

ele, além de não querer aceitar a proposta do acordo de

transação, foi também coagido a aceitá-lo por um fundado

temor de dano iminente à sua pessoa ou aos seus bens?

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Aprofundando sobre o tema, Silvio Rodrigues

entende que para a configuração da coação é necessário

que ela seja: grave, injusta, atual ou iminente, que traga

justo receio de um grave prejuízo e que o prejuízo recaia

sobre a pessoa ou os bens do paciente, ou pessoa de sua

família.

De fato, para que a figura da coação se componha, e seja capaz de invalidar o ato jurídico, é mister: a) que a ameaça seja causa do ato; b) que ela seja grave; c) que ela seja injusta; d) que ela seja atual ou iminente; e) que traga justo receio de um grave prejuízo; f) que o prejuízo recaia sobre a pessoa ou os bens do paciente, ou pessoa de sua família. (RODRIGUES, 2007, p. 201).

O mestre afirma que configura coação quando,

embora a ameaça seja a da prática de um ato lícito, o

resultado que se quer extorquir é injusto. Ele cita o

exemplo do credor que ameaça proceder à execução da

hipoteca contra sua devedora para forçá-la a desposá-lo e

a do contratante que ameaça apresentar queixa-crime

contra o outro para, sem lhe haver pago a dívida, obter

quitação. Nos dois casos, ele entende que o ato

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ameaçado é lícito, pois o credor pode executar sua

hipoteca e qualquer um pode denunciar à justiça um

criminoso, mas, em ambas as hipóteses, o fim colimado

pelo coator é contra o Direito.

Configura-se, contudo, a coação quando, embora a ameaça seja a da prática de um ato lícito, o resultado que se quer extorquir é injusto. Assim, por exemplo, o credor ameaça proceder à execução da hipoteca contra sua devedora para forçá-la a desposá-lo; um contratante ameaça apresentar queixa-crime contra o outro (por delito efetivamente praticado) para, sem lhe haver pago a dívida, obter quitação. Nos dois casos, o ato ameaçado é lícito, pois o credor pode executar sua hipoteca e qualquer um pode denunciar à justiça um criminoso; mas, em ambas as hipóteses, o fim colimado pelo coator é contra o direito, pois a lei, querendo preservar a liberdade dos contratantes, permite se invalide o casamento se a anuência de um dos nubentes proceder de ameaça, e dá ação ao coagido para anular a quitação que foi extorquida mediante violência. Portanto, a injustiça pode encontrar-se tanto na ilicitude da ameaça como na ilicitude do fim almejado. (RODRIGUES, 2007, p. 209)

O jurista chega a esse raciocínio baseado no

artigo. 153 do Código Civil citado abaixo:

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Artigo 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial. (grifo nosso)

Para ele, o artigo 153 do Código Civil emprega o

adjetivo “normal”, que restringe a extensão do substantivo

exercício (do direito) e que a coação aparece não só

quando o ato coator se divorcia do direito, como também

quando sua atitude, ainda que jurídica, corresponde ao

exercício anormal ou irregular ou abusivo de um direito.

Tal entendimento decorre da própria lei, pois o art. 153 do Código Civil emprega o adjetivo normal, que restringe a extensão do substantivo exercício (do direito). De sorte que a coação aparece não só quando o ato coator se divorcia do direito, como também quando sua atitude, ainda que jurídica, corresponde ao exercício anormal, ou irregular, ou abusivo de um direito. É unânime a doutrina ao admitir como injustas essas duas espécies de atos. São repelidas não só as ameaças praticadas contra direito, como também as praticadas com abuso de direito. Quer tenha o agente recorrido a um meio ilegal, quer tenha recorrido a um meio legal para alcançar um resultado ilegal, em ambas as hipóteses se caracteriza a coação. (RODRIGUES, 2007, p.209)

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É interessante também destacar que o abuso de

direito, chamado de “atos ilícitos”, está previsto

respectivamente nos artigos 186 e 187 do Código Civil.

Artigo 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Artigo 187. Também comete ato ilícito, o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Sílvio Rodrigues, na mesma obra, citando

Josserand fala sobre o abuso de direito:

A maioria dos escritores entende que a circunstância de tentar obter, por meio de um remédio legal, uma vantagem excessiva é o que, justamente, caracteriza o abuso de direito. Josserand fixa bem a tese. Pretende o agente obter aquilo que lhe é devido? Então a pressão sobre seu devedor é lícita. Mas, se recorre a uma via lícita para obter proveitos não devidos, pratica uma espécie de extorsão que vicia o consentimento da vítima. Estabelece-se, assim, a distinção entre o exercício regular e o exercício abusivo das vias legais.

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Age coagida a esposa que dá quitação ao marido que a ameaça de prosseguir em processo-crime por adultério; anula-se a declaração de reconhecimento de dívida, em muito superior ao montante devido, obtida pelo credor sob ameaça de apresentação de queixa por crime de falsidade. (RODRIGUES, 2007, p. 210)

E conclui seu pensamento citando Duranton e

Ulpiano ao afirmar que existe ameaça mesmo que a

vítima da coação tenha agido com culpa. Para ele, se a

ameaça é grave e injusta ocorre o vício da vontade capaz

de anular o negócio jurídico.

O problema não se altera pelo fato de haver a vítima da coação agido com culpa. Duranton

repete a hipótese, figurada no Digesto (Liv. 4º, Tít. 2º, frag. 7º, § 1º), da pessoa que, apanhada em adultério ou a praticar furto, é compelida a se obrigar para com quem a surpreendeu no crime, a fim de evitar denúncia. E renova, nessa instância, a lição de Ulpiano, no sentido de não ver válida a concordância provinda dessa injusta violência. Será inócuo apontar a culpa da vítima por se haver colocado na desagradável posição em que foi surpreendida; ela poderá redarguir que o fato de ser culpada não impede que seu

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consentimento ou negócio tenha sido extorquido pelo temor de denúncia ameaçada. A questão fundamental continua a mesma. Se o consentimento proveio da ameaça, se esta é grave e injusta, houve vício da vontade, e, por conseguinte é anulável o negócio jurídico. (RODRIGUES, 2007, p. 210)

4.3 POSSIBILIDADE DE NÃO IMPARCIALIDADE DO

JUIZ CRIMINAL NO ACORDO DE TRANSAÇÃO

Passaremos agora a analisar a postura do juiz na

condução da audiência, segundo o princípio da

imparcialidade.

O Desembargador Rêmulo Letteriello do TJ do

Mato Grosso do Sul, afirma que a imparcialidade é uma

das características mais importantes da jurisdição, pois é

pressuposto essencial de toda atividade jurisdicional,

constituindo um dever para aquele que decide e um

direito e uma garantia para os cidadãos. Para ele esse

atributo faz com que o julgador não tenha qualquer

sentimento particular com os demandantes e esteja alheio

a qualquer interesse material das partes, colocando-se

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super e inter partes para não acarretar uma exceção de

suspeição.

O Código de Ética da Magistratura Nacional

estabelece esse princípio em seus artigos 8º e 9º

respectivamente do capítulo III.

Art. 8º O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito. Art. 9º Ao magistrado, no desempenho de sua atividade, cumpre dispensar às partes igualdade de tratamento, vedada qualquer espécie de injustificada discriminação.

Por sua vez, a Lei Orgânica da Magistratura

Nacional, a Lei Complementar nº 35, de 14 de março de

1979, dispõe em seu artigo 36, inciso III, sobre a proibição

do magistrado de emitir por qualquer meio de

comunicação, opinião sobre processo pendente de

julgamento.

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Art. 36 - É vedado ao magistrado: (...) III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.

Sobre o acordo realizado pelo biógrafo, é

interessante destacar mais uma vez que a transação teve

como fundamento jurídico a Lei dos Juizados Especiais

Criminais ou a Lei 99099/95, que trata dos crimes de

menor potencial ofensivo.

No livro sobre a lei, Grinover afirma que juiz tem o

relevante papel de mediador de conflitos e deve

aproximar-se, com nova postura e mentalidade renovada,

para orientar os interessados pelos critérios da equidade

evitando-se a vocação legalitária.

Para Grinover, o juiz, de acordo com o novo papel

na lei dos juizados especiais criminais, deve conduzir a

audiência sem pressão e com serenidade, evitando fazer

da conciliação algo meramente formal.

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Qualquer lei nova, para ser bem interiorizada pelos operadores jurídicos, também exige uma nova mentalidade. Ainda mais quando se trata de lei profundamente inovadora, que introduz a transação em nosso sistema jurídico. (...) Cabe ao juiz, nessa audiência, o relevante papel de mediador de conflitos ao qual se deve aproximar-se com nova postura e mentalidade renovada. Sem prejudicar, deverá orientar os interessados pelos critérios da equidade, despindo-se de sua vocação legalitária para fazer com que as partes se componham segundo critérios de Justiça e pacificação social. (...) Sem exercer pressões, tranquila e serenamente, o juiz deverá assumir seu novo papel no procedimento das infrações penais de menor potencial ofensivo, evitando fazer conciliação algo meramente formal. (GRINOVER, 2002, p.125-126)

Diante dessa nova mentalidade da lei, será que o

juiz no caso do acordo de transação entre o biógrafo e o

artista biografado orientou os interessados pelos critérios

da equidade evitando-se a vocação legalitária? Será que

magistrado adiantou qualquer opinião ou aconselhamento

sobre o mérito da causa que poderia equivaler a um pré-

julgamento?

Para Grinover, na nova lei dos Juizados Especiais

Criminais, o juiz não deve adiantar qualquer opinião ou

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aconselhamento sobre o mérito da causa que possa

equivaler a pré-julgamento afim de não se enquadrar em

causa de suspeição do artigo 254, inciso IV do Código de

Processo Penal.

O juiz conciliador deverá estar alertado para não

adiantar qualquer opinião sobre o mérito da causa que

possa equivaler a pré-julgamento, afim de não se

enquadrar em causa de suspeição do artigo 254, inciso IV

do CPP, o qual considera causa de suspeição e de recusa

o aconselhamento, pelo juiz, de qualquer das partes.

(GRINOVERl, 2002, p.128)

Realmente, se o juiz adiantar a sua opinião sobre

o mérito da causa na audiência poderá haver uma causa

de suspeição, conforme prescreve o artigo 254, inciso IV,

Código de Processo Penal.

Art. 254 - O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: IV - se tiver aconselhado qualquer das partes; (grifo nosso)

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O artigo 135, inciso IV, 2º parte do Código de

Processo Civil descrito abaixo, também trata da suspeição

do juiz quando aconselhar alguma das partes acerca do

objeto da causa:

Art. 135. Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando: (...) IV –(...) aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, (...);

Nelson Nery Jr. em sua obra afirma que fazer

considerações apriorísticas sobre qualquer questão

deduzida na causa, processual ou material, antes de

decidi-la efetivamente, antecipando juízo de valor sobre

essas questões, constitui causa de suspeita de

parcialidade do juiz, caracterizando pré-julgamento.

O juiz que tem interesse no desfecho da causa não pode julgá-la (nemo iudex in causa sua). O interesse referido na norma em comentário é o próprio e direto (Montesano-Arieta Tattato, v. 1, t. I, n. 121, I, p. 416) isto é, interesse que possa transformá-lo em verdadeira parte processual, violando-se o princípio do nemo iude x in causa

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sua, de modo que não haveria mais dúvida quanto à imparcialidade do juiz, mas sim presunção de que ele é parcial. (...) O que torna o juiz suspeito de parcialidade não é o conhecimento prévio que a parte e/ou interessado possam ter sobre opinião jurídica, política, religiosa ou filosófica já exteriorizada pelo juiz, mas sim o adiantamento de sua opinião sobre o caso concreto , que está ou estará sob julgamento /prejulgamento. 1.Interesse na causa. Conceito legal indeterminado. Nada obstante o entendimento da doutrina de que os motivos de suspeição são enumerados taxativamente pela lei, a norma sob comentário é de encerramento, constituindo-se em conceito vago, pois somente no caso concreto, diante das provas produzidas, é que se poderá saber se o juiz tem ou não interesse no desfecho da causa em favor de uma das partes. No direito alemão, onde também vigora a taxatividade dos motivos de suspeição, há o entendimento pacífico de que a ZPO § 42 encerra hipótese de "perigo de parcialidade", que se assemelha ao nosso CPC 135, V. 2. Prejulgamento. Fazer considerações apriorísticas sobre qualquer questão deduzida na causa, processual ou material, antes de decidi-la efetivamente, antecipando juízo de valor sobre essas questões, constitui causa de suspeita de parcialidade do juiz, caracterizando prejulgamento. As razões de fato e de direito dadas pelo juiz como fundamentação de decisão sobre liminar ou tutela

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antecipada não constituem perse, prejulgamento mas se inserem no conceito de cognição sumária, imprescindível para que o juiz possa decidir o pedido de liminar ou de tutela antecipada. O prejulgamento se caracteriza quando o juiz faz afirmação intempestiva de ponto de vista sobre o caso em concreto, ou seja, sobre os fatos da causa que se encontra sob julgamento e ainda não foi julgada.)(...)O prejulgamento se verifica se há adiantamento sobre o caso concreto , isto é, matéria que se encontra sub iudice e o juiz da causa sobre ela se manifesta.” (NERY JR et al, 2013, p. 489-490). (grifo nosso)

Sobre o tema de imparcialidade e suspeição do

juiz, é interessante citar abaixo parte do voto do relator

Ministro Antônio de Pádua Ribeiro da terceira turma do

Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso

especial nº. 307.045-MT:

(...) O Parquet estadual com precisão afirmou: "Data máxima vênia, em que pese a possível boa intenção do nobre julgador, ultrapassou ele os limites éticos que seu cargo impõe" (fls. 198). Concluindo: "Aliás, a prova bastante desse liame com a Excipiente foi confirmado pelo douto julgador, o que nos leva a indagar das razões que deixaram o mesmo de fazer uso do § único do artigo 135 do CPC. Ora, a afirmativa posta pelo

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ilustre Magistrado, traduz-se numa verdadeira auto suspeição, não deixando qualquer dúvida sobre o fato ocorrido" (fls. 199). Salienta Pontes de Miranda que "os conselhos fazem suspeito o juiz se se prendem à causa quanto ao objeto" (In "Comentários ao Código de Processo Civil", 3ª ed., 1995, pág. 428). O Prof. Celso Agrícola Barbi com precisão afirma: "O juiz que aconselha a parte a propor, ou a não propor alguma ação, ou a se conduzir de uma ou outra forma se for proposta ação contra ela, toma posição prévia em relação ao direito do litigante, vincula sua opinião. Por isto, poderia mesmo ficar em dificuldade para julgá-la, quando as provas não resultassem naquilo que a parte lhe expôs. Tudo isto leva a tornar inconveniente sua participação no processo" "Comentários ao Código de Processo Civil", 11ª. ed.,Ed. Forense, pág. 425). Antonio Dal' Agnol também sustenta: "Também aconselhar as partes acerca do objeto da causa, ressalvadas aquelas hipóteses em que o conselho se dá familiarmente ou entre amigos com quem se tenha intimidade (o que, por si só, já geraria suspeita), não é função do juiz. O fato é até criticável profissionalmente, pois dar conselhos jurídicos é atividade que se reconhece, e privativamente, ao advogado (art.1º, II, da Lei 8.906, de 04.07.1994). Em hipótese como esta, sobre suspeito o juiz, merece ser investigada a sua conduta pelos órgãos de disciplina da magistratura"

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("Comentários ao Código de Processo Civil", vol. 2, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 165). (...) O Prof. Clito Fornaciari Júnior esclarece: "A confiança da parte na Justiça é um fator de fundamental importância para a aferição da parcialidade. A desconfiança fará com que a parte só aceite a decisão como uma imposição ao mais fraco; contrariamente a confiança pode deixar o vencido até mesmo render-se ao decidido, não como se curva diante da força, mas pelo poder de persuasão feito. Nesse sentido é de se ter presente decisão do Tribunal Constitucional de Portugal que firmou: 'quando a imparcialidade do Juiz ou a confiança do público nesta imparcialidade é justificadamente posta em causa, o Juiz não está em condições de 'administrar justiça'. Nesse caso, não deve poder intervir no processo, antes deve ser impedido pela lei impedido de funcionar - deve, numa palavra, poder ser declarado iudex inhabilis '. Nesse mesmo sentido, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem proclamou: 'a imparcialidade da jurisdição não é só a imparcialidade subjetiva. É também a imparcialidade objetiva que deve ser assegurada antes e durante o julgamento. Afinal, 'trata-se da confiança que os tribunais de uma sociedade democrática devem inspirar às partes. (...) Deve, pois, recusar-se qualquer Juiz relativamente ao qual se possa legitimamente recear a existência de uma falta de imparcialidade..." Concluindo:

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"Nenhum comprometimento, porém, é de menor importância a ponto de poder ser relevado, porque a Justiça supõe total e absoluta isenção, de modo a dever ser afastado o julgador ainda que não seja parcial, a ponto de ser parte, ou ter ligações com as partes, mas também em vista de ter concepção formada acerca do conflito ou das teorias que o envolvam, como ainda ter passado que possa fazer supor que a questão posta em juízo lhe seja simpática ou antipática" (RT 766/99, pág. 66). Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento para declarar a suspeição do juiz excepto e, em consequência, nulos os atos decisórios por ele praticados.

ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho votaram com o Sr. Ministro Relator. Sustentou oralmente, o Dr. Alexandre Slhessanrenko, pelo recorrente. Brasília, 25 de novembro de 2003

Ocorrendo caso de imparcialidade do magistrado

por suspeição devem ser declarados nulos os atos

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decisórios por ele praticados com base no artigo 564 do

Código de Processo Penal abaixo.

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz; (grifo nosso)

4.4 O DIREITO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA

TÉCNICA EFETIVA DO BIÓGRAFO NA AUDIÊNCIA DO

ACORDO DE TRANSAÇÃO

Passar-se-á agora a verificar o papel do advogado

na defesa do biógrafo no momento da aceitação do

acordo de transação na Justiça Criminal de São Paulo.

Seguem mais uma vez abaixo alguns trechos

relativos à audiência, segundo a versão de Paulo Cesar

Araújo:

(...) Tive dificuldade de compreender o que diziam por conta do frequente uso de termos jurídicos como “exordial”, “ agravo de instrumento”, “tutela antecipada”, “direito de reconvenção”. (...) Em nenhum momento fui consultado sobre qualquer

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decisão relativa ao meu livro e também nada me foi comunicado diretamente. (...) Foi nesse momento que constatei, surpreso e perplexo, que a editora desistira de brigar com o artista. A partir desse momento, me senti abandonado e desnorteado. Não sabia o que fazer numa situação dessas, se podia virar a mesa e não aceitar o acordo. Não estavam claras para mim as consequências disso. A editora não queria correr o risco de pagar a multa até ali acumulada. Em não aceitando essa decisão, quem pagaria esse montante, eu, a editora, metade cada um? Eu não poderia arcar com essa despesa. Se também fôssemos depois condenados a pagar uma alta indenização ao artista, qual parte da dívida caberia a mim? Sendo eu o único responsável pelo desacordo, com certeza a editora me cobraria à conta. Eu sabia praticamente de cor aquela cláusula do meu contrato de edição com a editora: “O autor será o único responsável pelas reclamações formuladas por terceiros em relação ao conteúdo da obra, assim com pelos danos e prejuízos que possa comprovadamente sofrer a editora”. Essas questões me vieram à cabeça e eu não tinha alguém para me defender nem me orientar em minhas dúvidas. Teria que decidir sozinho, no calor da hora e na frente de todos. O fato de estar numa sala na presença do artista, de seus advogados, do juiz e dos promotores me deixou pouco à vontade para questionar os representantes da editora e tentar esclarecer melhor as coisas. (,,,) Pensei que os advogados da editora fossem se manifestar contra mais essa

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flagrante agressão a liberdade de expressão. Mas não falaram nada. Então me levantei e fui o meu próprio advogado. “Excelência, por favor, isso não pode constar do acordo. A Constituição brasileira nos garante a liberdade de expressão, a livre manifestação de ideias e de pensamento”, e deixando modéstia de lado, afirmei: “ Não sei se vocês sabem, mas o livro já faz parte da história. Querer me proibir de falar dele é o mesmo que me impedir de falar de Getúlio Vargas, de JK ou da Guerra de Canudos. E eu como autor, professor, historiador e cidadão, vou sempre falar desse livro”. (...) “E doravante Paulo Cesar de Araújo se absterá de tecer comentários sobre a vida pessoal do artista...”. Era evidente que eu não queria e não devia ter nenhum veto ao direito de livre expressão. Porém, ninguém protestou e, e então mais uma vez me levantei e fui o meu próprio advogado. “Excelência por favor, isso também não pode constar do acordo”. (...) Confesso que já não tinha mais argumentos para retrucar, e novamente ninguém veio em minha defesa. (...) Eu fiz este livro com tanto amor e carinho que o dediquei á minha filha Amanda, de cinco anos. E será lamentável essa biografia não mais existir quando ela crescer. Disse essa última frase e desatei a chorar, ali na cadeira, com a mão direita sobre o rosto. Acho que as lágrimas já estavam presas havia muito tempo, porque chorei compulsivamente. (...) É possível que, eu estivesse ali com algum amigo – como desejei levar – ou com um advogado próprio – que fui aconselhado a contratar - , naquele momento eles

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tivessem me retirado da sala a audiência tivesse tomado outro rumo. (...) Depois de mais de cinco horas de reunião, eu já estava exaurido, emocionalmente arrasado e sem ânimo para dizer ou ouvir mais nada. Acusado pelo artista biografado e seus advogados, pressionado pelo juiz pelos promotores e abandonado pela editora, a minha única vontade era sair daquela sala o mais rápido possível. (...) Minha resposta à advogada foi com cópia também endereçada ao diretor-geral e ao editor da editora (...). Na mensagem pergunto por que eles não apoiaram a proposta que fiz ao artista e também reclamo que me “senti abandonado naquela audiência e meu livro, sem defesa”. (...) “Mas você não me pediu para fazer o acordo. Quando a dra. Rosa decidiu aceitar a proposta, pensei que você estivesse de acordo, porque em nenhum momento você me disse que não queria.” É verdade. Nenhuma vez durante a audiência eu disse diretamente ao advogado que não aceitava condenar meu livro à fogueira. Imagino, no entanto, a seguinte cena: em vez de mim, é o artista quem se levanta durante a sessão e, aos prantos, diz que os termos do acordo são absurdo, apresentando então uma outra proposta. Será que os advogados deles teriam alguma dúvida de que eu seu cliente não queria aquilo que foi decidido? Por essas e outras, eu era mesmo o único daquele que não queria e não podia esquecer o que havia se passado. (ARAÚJO, 2014, p.299-323)

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Pelo exposto acima será que o biógrafo teve o seu

direito constitucional da ampla defesa técnica exercido de

forma efetiva e real pelo seu advogado?

Inicialmente, é interessante destacar que o direito a

ampla defesa constitui a base de todo o sistema de

proteção dos direitos individuais e em especial ao

princípio da dignidade da pessoa humana.

Seguindo esse raciocínio, Antonio Scarance

Fernandes afirma que todo acusado em geral tem o

direito fundamental a uma efetiva defesa técnica e essa

defesa não pode ter o seu conteúdo essencial esvaziado

pela negligência ou imperícia do seu defensor:

O fato de ter o réu defensor constituído, ou de ter sido nomeado advogado para sua defesa, não é suficiente. É preciso que se perceba, no processo, atividade efetiva do advogado no sentido de assistir o acusado. De que adiantaria ao réu o defensor que não arrolasse testemunhas, não reperguntasse, oferecesse alegações finais exageradamente sucintas, sem análise da prova, e que, por exemplo, culminassem com pedido de Justiça? Há alguém que foi designado para defender o acusado, mas a sua atuação é tão deficiente que é como se não houvesse defensor. Também nesses casos a causa deve ser anulada por falta de defesa. (FERNANDES, 1999, p. 256.)

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Já Edgar Silveira Bueno Filho afirma que a

Constituição não se preocupou com o direito formal à

defesa, mas com um real e efetivo direito a ela.

(...) a Constituição não se preocupou com o direito formal à defesa, mas com um real e efetivo direito a ela.” (BUENO FILHO, 1994, p. 51)

Sobre o papel da defesa técnica na audiência

preliminar do Juizado Especial Criminal, é interessante

citar o voto do Ministro Eros Grau, relator do recurso de

habeas corpus nº 88.797-0/RJ da 2º turma do Supremo

Tribunal Federal, onde foi anulado o processo desde a

audiência preliminar de acordo de transação por falta de

orientação técnica efetiva do advogado.

A Lei n. 9.099/95, em seus artigos 68, 72 e 76, § 3º, denota, com clareza a imprescindibilidade da defesa técnica na audiência preliminar. Vejamos: “Art. 68. Do ato de intimação do autor do fato e do mandado de citação do acusado, constará a necessidade de seu comparecimento acompanhado de advogado, com a advertência de que, na sua falta, ser lhe-á designado defensor público. Art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil,

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acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade de composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.”

O Ministro afirma que, ainda que se trate de fase

pré-processual, anterior mesmo ao oferecimento da

denúncia (queixa), a presença do defensor técnico é

indispensável quanto à transação penal e se assim não se

fizesse, aí sim ficariam vulneradas as garantias

constitucionais, aplicáveis não só ao processo

jurisdicional, mas a qualquer processo administrativo em

que haja conflito de interesses.

A tal respeito, é necessário ressaltar que os princípios norteadores da Justiça Consensual, a exemplo da oralidade, informalidade e celeridade, não têm o condão de afastar a cláusula do devido processo legal, da qual o direito à ampla defesa é corolário. Sobre a matéria, leciona melhor a doutrina. ‘A lei exige expressamente a presença dos advogados do autuado e da vítima na audiência de conciliação, para que se resguarde sua livre vontade na transação e haja a devida orientação técnica por parte de quem é comprometido com a defesa. Ainda que se trate de fase pré-processual, anterior mesmo ao

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oferecimento da denúncia, a presença do defensor técnico é indispensável quanto à transação penal, em que o autuado poderá consentir na imediata aplicação de uma sanção penal, ainda que não privativa da liberdade. Se assim não se fizesse, aí sim ficariam vulneradas as garantias constitucionais, aplicáveis não só ao processo jurisdicional, mas a qualquer processo administrativo em que haja conflito de interesses. Tanto assim que, como visto, o art. 68 dispõe expressamente que do ato de intimação do autor do fato deverá constar a necessidade de seu comparecimento à audiência (de conciliação) em companhia de advogado, com a advertência de que, na sua falta, ser-lhe-á designado defensor público.’ E ainda: ‘Cabe assinalar que a anuência pessoalmente manifestada pelo réu há de estar acompanhada de igual assentimento de seu defensor, como aliás, deixa claro o art. 76 da Lei 9.099/95. Tal tratamento legal vincula-se ao atendimento da exigência de correta formação da vontade do réu em torno da anuência pessoalmente expressada. Esta correta formação de vontade do réu, indispensável à validade do ato de disposição por ele praticado, naturalmente estará a depender de uma avaliação da situação jurídica dada, para a qual, sem dúvida, se faz necessário o conhecimento técnico do profissional que exerce a defesa.’2 Dessa maneira, uma vez observada nulidade de caráter absoluto, pertinente o pedido da impetração para que o processo seja anulado desde a audiência preliminar, a fim de que outra seja realizada nos

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moldes legalmente previstos. Ante o exposto, opina-se pelo deferimento do writ.“ Acolho o parecer ministerial e concedo a ordem.(...) Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Senhor Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Em outro processo, os Ministros da quinta turma do

Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

concederam a ordem em uma ação/recurso de habeas

corpus de n.° 16.559-RS (2001/0047855-7), para anular o

processo. O relator do julgado, Ministro Felix Ficher, em

seu voto, afirmou em linhas gerais que todo e qualquer

réu, não importa a imputação, tem direito à efetiva defesa

no processo penal e que desempenho meramente formal

do defensor, em postura praticamente contemplativa,

caracteriza a insanável ausência de defesa.

(...) No que se refere às demais nulidades arguidas, o reclamo merece prosperar. Com efeito, os autos retratam, de forma límpida, hipótese em que o réu, contextualmente, restou indefeso, uma vez que a defensora pública

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designada para assisti-lo não foi satisfatoriamente atuante, tendo praticado e participado dos atos processuais como se fossem mera formalidade procedimental. Exemplo disso foi a absoluta inércia da defensora que, durante a audiência de oitiva de testemunhas de acusação, limitou-se a uma participação totalmente passiva, não formulando qualquer pergunta, conforme se constata das cópias dos termos de depoimentos às fls. 151/160 destes autos (fls. 65/74 dos autos originais).

O relator destacou que no processo penal, mais

do que em qualquer outra seara, tendo em vista que está

em jogo a liberdade do acusado ou até o estigma causado

por condenação, exige-se um rigor adicional na

observância do princípio da ampla defesa.

(...) Todo e qualquer réu, não importa a imputação, tem direito a defesa (art. 5º, inciso LV da Lex Fundamentalis e art. 261 do CPP). No presente caso, a situação é clara, inaplicável a limitação inserida na Súmula nº 523-STF. No processo penal, mais do que em qualquer outra seara, tendo em vista que está em jogo a liberdade do acusado ou até o estigma causado por condenação, exige-se um rigor adicional na observância do princípio da ampla defesa. Mais do que simplesmente se abrir ao acusado a chance de se defender, é preciso que a defesa

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seja realmente exercida. Sobre o assunto, vale citar o comentário de FERNANDO DE ALMEIDA PEDROSO ("Processo Penal O Direito de Defesa: Repercussão, Amplitude e Limites", RT, 2ª edição, 1994, p. 233-235): “A defesa técnica do acusado, por conseguinte, não há de figurar em o processo penal como simples fantasia legal, colocada em ângulo sombrio e a título de mera espectadora. Deve ser efetiva, real, como uma entidade sempre presente. Isso não significa, porém, deva ser erudita e brilhante, mas que não se limite a expressões vagas e de nenhum conteúdo, como um nada a requerer ou aguarda-se Justiça, ou que chegue ao extremo de, analisando a prova, deva o réu ser condenado (cf. RT 558/313, 575/396 e 678/360), pois nada há a aduzir-se em seu favor. Ainda que ocorra essa última hipótese, impende-lhe não a sustentação de alegações inverossímeis e absurdas, com o comprometimento, até, da reputação e cultura de quem a exerce, mas fiscalizar a regularidade da relação processual e trazer à tona as circunstâncias favoráveis ao acusado, como, verbi gratia, sua primariedade, a adoção de corrente jurisprudencial, em questões controvertidas, que o favoreça... Assim, se o defensor dativo se limita a concordar com a condenação do réu em alegações finais, proclamável é a nulidade do processo ( RT 394/327, 701/332 caso de constituído).(...)”

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O Ministro cita ainda Nilo Batista ao afirmar que a

defesa que não aborda os aspectos essenciais mínimos

do processo é defesa deficiente, por não possuir

substância:

Nessa conjuntura, e é Nilo Batista quem ainda ressalta, “a defesa que não aborda os aspectos essenciais mínimos do processo é defesa deficiente”, por não possuir substância. “É lição de NILO BATISTA ("Decisões Criminais Comentadas", Saber Juris , 2ª edição, 1984, pp. 102-108): "A Constituição Federal assegura aos acusados o direito de ampla defesa (art. 153, 15), princípio que, de forma explícita, remonta à Constituição de 1891 (art. 72, 16:"a mais plena defesa"), e esteve presente em todas as Cartas, com a exceção explicável de 1937, que se referia tão-só às "necessárias garantias de defesa"(art. 122, inc. 11). É mister, pois, que a lei ordinária assegure aos acusados a ampla defesa que lhes garante a Constituição. Consoante bem observa Pontes de Miranda, não existe um conceito apriorístico de defesa:" mas existe algo mínimo, aquém do qual não mais existe defesa "(Comentários à Constituição de 1967, S. Paulo, 1971, V, 234). O processo penal brasileiro atende, sem qualquer dúvida, ao mandamento constitucional, por mais críticas que possam merecer alguns aspectos que setorialmente subsistiam como vestígios de uma filosofia processual cunhada pelo autoritarismo.

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Todavia, na estipulação de oportunidades de defesa, e de participação efetiva na produção de provas, temos a rigor um aspecto formal da atividade defensiva. Bem pode ocorrer, e desgraçadamente ocorre, que a defesa, dispondo dos recursos que lhe são inerentes, e das oportunidades que lhe faculta a lei processual, não se exerça efetiva ou eficazmente, por desídia ou despreparo daquele que foi investido em suas funções. Ou seja: embora satisfeitas as formas, não houve, numa perspectiva já agora substancial , o exercício da defesa. Os autores brasileiros que versam a matéria podem ser divididos em dois grandes grupos: aqueles que consideram suficiente a presença formal de defesa, e aqueles que exigem a presença formal e substancial de defesa. Como representante do primeiro grupo, mencionaríamos Espínola Filho, para quem "é indiferente o grau de eficiência da defesa ou mesmo a abstenção desta, pois do mesmo modo que nemo tenetur se detegere, também não é obrigado a defender-se ..." (Código de Processo Penal Brasileiro Anotado, Rio, 1965, III, 252). O segundo grupo pode ser representado por Frederico Marques, o qual ressalva que "se estiver evidente a inércia e desídia do defensor nomeado, o réu deve ser tido por indefeso e anulado o processo desde o momento em que deveria ter sido iniciado o patrocínio técnico no juízo penal" (Elementos de Direito Processual Penal, ed. Forense, 1965, II, 423). Esta última posição nos parece, a todas as luzes, a mais correta. Poder-se-ia afirmar, mesmo, que é ela a

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posição de nossa lei processual penal, face à existência de expressa disposição a respeito, na disciplina dos processos de competência do júri (art. 497, inc. V CPP); nenhuma razão pode ser oposta à trasladação desse princípio para os demais processos. Ninguém duvida de que o juiz singular disponha, na condução dos trabalhos que lhe são afetos, de várias das atribuições que o art. 497 confere ao juiz presidente do júri, quando cabíveis. Sobretudo, que obscuros e insondáveis motivos teriam levado o legislador a pretender que apenas o acusado por crime doloso contra a vida tivesse direito a defesa eficiente, contentando-se, nos demais casos, com a só aparência e forma de defesa?”

O Ministro menciona também a jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal reconhecendo a ausência de

defesa do réu em hipóteses em que ela assume mera

postura contemplativa ou se mostra inerte ante a

pretensão punitiva.

Há precedentes do colendo Supremo Tribunal Federal reconhecendo a ausência de defesa do réu em hipóteses em que ela assume mera "postura contemplativa" ou se mostra inerte ante a pretensão punitiva. Confira-se: "DEFESA - EFETIVIDADE. O princípio segundo o qual "nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem

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defensor"- artigo 261 do Código de Processo Penal - há de ter alcance perquirido considerada a realidade. Exsurgindo dos autos que o defensor designado teve desempenho simplesmente formal, em verdadeira postura contemplativa, forçoso e concluir que o réu esteve indefeso. "A defesa e órgão da administração da Justiça e não mero representante dos interesses do acusado. Isto porque ela se exerce, substancialmente, para a preservação e tutela de valores e interesses do corpo social, sendo, assim, garantia de proteção da própria sociedade"(Nilo Batista - Defesa Deficiente, Revista de Direito Penal, página 169) - Por outro lado, "se estiver evidente a inércia e desídia do defensor nomeado, o réu deve ser tido por indefeso e anulado o processo desde o momento em que deveria ter sido iniciado o patrocínio técnico no juízo penal"(Frederico Marques - Elementos do Direito Processual Penal - Volume II, página 423). Longe fica de revelar o exercício do direito de defesa alegações finais que, pela generalidade, prestam-se, sob o ângulo estritamente formal, a todo e qualquer processo. Nas alegações finais, indispensável e que haja o debate sobre as provas coligidas, emitindo a defesa juízo sobre o conjunto dos elementos probatórios." (HC 72.573/RJ, 2ª Turma , Rel. Min. Março Aurélio , DJU de 08/03/1996).”

O Ministro Felix Ficher afirma que, quando ainda

pertencente ao Ministério Público do Estado do Paraná,

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elaborou um parecer em caso semelhante sobre a

ausência de efetiva defesa.

Quando ainda pertencente ao Ministério Público do Estado do Paraná, assim me pronunciei sobre o tema, ao elaborar parecer em caso semelhante: "Todo e qualquer réu, não importa a classe social a que pertença, tem o direito à ampla e plena defesa. Trata-se de regra antiga (na Carta Magna anterior, art. 153, 15 ) inserida no art. 5º, inciso LV da CF, e que foi erigida ao nível de cláusula pétrea (art. 60, 4º). Se, por um lado, o desempenho criticável (o que, muitas vezes, é de valoração subjetiva) não possa ensejar a sustentação de nulidade ( ex vi Súmula nº 523-STF ), a ausência de efetiva defesa é, por óbvio, nulidade absoluta. E, esta situação de ausência não precisa ser de caráter formal (física, natural). Todas as hipóteses de equivalência estão abrangidas pelo que está insculpido no art. 5º, inciso LV. Pois bem, é inegável que há flagrante cerceamento de defesa, nulidade absoluta, quando não são apresentadas, mormente por defensor dativo (mais de 90% dos réus, em nosso país, são pobres), as alegações finais antes do iudicium causae, por quanto manifestação derradeira, fundamental e indispensável. É de percepção imediata que equivale à ausência acima delineada, a hipótese do defensor concordar com a imputação ou o que, também, dá na mesma o pedido de pena mínima, etc. (em

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processo no qual o réu não tenha confessado, com detalhes, em juízo, o que lhe fora atribuído). As três situações indicadas são, em verdade, de ausência de defesa ( e não de mera deficiência). Preleciona H. C. Fragoso que: "A defesa efetiva do cidadão submetido a processo penal constitui interesse público. Como dizia Carrara, não tem o Estado mais interesse na condenação dos culpados do que na absolvição dos inocentes. A defesa, no processo penal moderno, constitui valor que transcende as conveniências do acusado para projetar-se na perspectiva da reta administração da Justiça. Por isso mesmo, o defensor não atua como representante do réu. Suas funções são mais largas e mais amplas. Como afirma Müller Meiningen (Der Verteidiger im heutigem Strafrecht, no volume Schuld Sühne , 1960, 53), a Sociedade que punisse arbitrariamente estaria irremediavelmente comprometida e fadada à dissolução. A defesa é autêntico órgão de controle de auto proteção social. "( in "Jurisprudência Criminal", p. 203, 4ª ed.). E o inesquecível Pontes de Miranda: "existe algo de mínimo, aquém do qual não mais existe defesa"( in "Comentários à Constituição de 1967", 1971, vol. V, p. 234). Sobre o tema, em posições ainda mais rigorosas, J. Frederico Marques ( in " Elementos de D. Processual Penal ", II, p. 423) e Nilo Batista ( in " Decisões Criminais Comentadas ", 2ª ed., p. 102 e segtes). E, se a Súmula nº 523 – STF pudesse merecer interpretação ou incidência restrita, literal, então, forçosamente, ela

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seria contrária às características do Estado de Direito (art. 5º, inciso LV da Lex Maxima )."

E lembra o voto sobre o assunto proferido pelo

Desembargador Luiz Viel do egrégio Tribunal de Alçada

do Paraná.

Sobre o assunto, vale, por fim, lembrar o voto proferido pelo eminente e saudoso Desembargador LUIZ VIEL, notável penalista, quando ainda era integrante do egrégio Tribunal de Alçada do Paraná, por ocasião do julgamento do HC 177/89, do qual foi relator, pelo egrégio Grupo de Câmaras Criminais daquela Corte (DJE de 22/09/1989), in verbis: “(...) Um dos pontos mais angustiantes para quem lida na Justiça penal e se preocupa com as questões que se armam ou deixam de ser armadas nos processos, um pouco além da consideração meramente formal, é a qualidade da defesa, especialmente a dativa. Quem tenha um pouco de sensibilidade há de ver, com desconfortável constância, condenações ou erradas ou exageradas, quando os juízes acastelam-se numa formulação de sistema acusatório puro, que não corresponde ao modelo da nossa lei, e diante do que a defesa não faz, aplicam penas. (...) Bem por isso o Egrégio STF jamais deixou de sublinhar o real significado da

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sua jurisprudência, dizendo com muita clareza que a defesa extremamente negligente, nada fazendo o defensor, mera figura de palha, presença física, mas ausência espiritual, intelectual e anímica, equivale à falta de defesa e constitui, por conseguinte, nulidade absoluta. Colhem-se algumas decisões, meramente exemplificativas. (...) d) DJU de 12.4.82, pág. 3.210, 4ª coluna, RHC nº 59.503, SP, 1ª Turma, maioria, com a seguinte ementa: "Direito à defesa. Não há praticamente defesa oferecida em benefício do réu, se o defensor dativo comportou-se com omissão em substância, quanto a atos próprios de seu ofício na ação, limitando-se a assinar atos e termos de depoimentos de testemunhas que não reinquiriu, apenas cumprindo um rito formal e burocratizante, o qual não corresponde à garantia constitucional da ampla defesa do acusado." (...) e) DJU de 16.4.82, pág. 3406, 3ª coluna, RHC nº 59.653, SP, 1ª Turma, unânime, doutrinando a ementa: "Recurso de habeas corpus. Direito à defesa. Ação penal que se desenvolve, o réu recebendo defensor dativo que se comporta como se ausente estivesse, sem interrogar nem arrolar testemunhas, não obstante a minudente peça da denúncia fornecer elementos, deve ser, esta ação, declarada nula a partir da denúncia, que permanece por ter sido produzida conforme a lei. Defensor que resume a defesa prévia nesta assertiva incongruente "injusto o delito imputado ao réu" não contém, juridicamente entendida, defesa alguma, e é peça nula pois que prejudica o

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direito constitucional do acusado à mais ampla defesa. Recurso de habeas corpus que dá provimento para reformar o acórdão e conceder a ordem a fim de anular o processo a partir da defesa prévia". (...) Assim, se a defesa tiver sido extremamente omissa, negligente, e nesse sentido, substantivamente ausente, há violação de garantia constitucional (ampla defesa), nulidade absoluta, que não fica obscurecida ou diminuída por não ter havido alegação oportuna – o que, aliás, cairia num esdrúxulo vácuo, pois se há descaso equivalente à ausência, alegação hábil não terá havido, e o defeito é exatamente da atuação (isto é, falta de atuação) do defensor, que desinteressado não iria apontar a própria falha. (...)Ora, cumpria refutar a acusação, expor alguma idéia, pedir a absolvição, sustentar alguma tese, negar a autoria. O reconhecimento implícito da procedência da imputação e o pedido de "faça-se justiça", isto é, aplique-se pena leve, somada à defesa antecedente, significa nenhuma defesa. Lavar as mãos é figura muito conhecida, de teor bíblico, mas como ato de defensor, em ação penal, viola a Constituição Federal, que assegura a ampla defesa e o contraditório como garantias individuais.”

O Ministro terminou o seu voto concedendo a

ordem para anular o processo por cerceamento de

defesa.

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Assim, está caracterizada a nulidade por cerceamento à defesa do paciente (art.261 do CPP e 5º, inciso LV da Carta Magna). Ante o exposto, concedo a ordem para anular processo a partir da audiência (...). É o voto.

Em outro julgamento, o relator da medida cautelar

em habeas corpus nº. 96.905 o Ministro Celso de Mello,

do Supremo Tribunal Federal, disse que ninguém pode

ser privado de sua liberdade, de seus bens ou de seus

direitos sem o devido processo legal, não importando,

para efeito de concretização dessa garantia fundamental,

a natureza do procedimento quer seja criminal, disciplinar

ou materialmente administrativa. Afirmou também sobre o

direito do acusado de escolher o seu próprio defensor.

(...) que ninguém pode ser privado de sua liberdade, de seus bens ou de seus direitos sem o devido processo legal, não importando, para efeito de concretização dessa garantia fundamental, a natureza do procedimento estatal instaurado contra aquele que sofre a ação persecutória do Estado. Isso significa, portanto - não constituindo demasia reiterá-lo (RTJ 183/371-372, p. ex.) -, que, em tema de restrição à esfera jurídica de qualquer cidadão (e, com maior razão, em matéria de privação da liberdade individual), o

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Estado não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no exercício de sua atividade, o postulado constitucional da plenitude de defesa, pois o reconhecimento da legitimidade ético-jurídica de qualquer medida imposta pelo Poder Público - de que resultem consequências gravosas no plano dos direitos e garantias individuais - exige a fiel observância da garantia básica do devido processo legal (CF, art. 5º, LV),(...) Cumpre referir, ainda, que o magistério jurisprudencial desta Suprema Corte já reconheceu ser direito daquele que sofre persecução penal escolher o seu próprio defensor (RTJ 117/91, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI - RTJ 150/498-499, Rel. Min. MOREIRA ALVES, v.g.), consoante se verifica de decisões que restaram consubstanciadas em acórdãos assim ementados: “(...) O réu tem o direito de escolher o seu próprio. defensor. Essa liberdade de escolha traduz, no plano da ‘persecutio criminis’, específica projeção do postulado da amplitude de defesa proclamado pela Constituição. Cumpre ao magistrado processante, em não sendo possível ao defensor constituído assumir ou prosseguir no patrocínio da causa penal, ordenar a intimação do réu para que este, querendo, escolha outro Advogado. Antes de realizada essa intimação - ou enquanto não exaurido o prazo nela assinalado - não é lícito ao juiz nomear defensor dativo sem expressa aquiescência do réu.” (RTJ 142/477, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

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“(...) A jurisprudência desse Pretório tem entendimento firmado no sentido de que o réu deve ser cientificado da renúncia do mandato pelo advogado, para que constitua outro, sob pena de nulidade por cerceamento de defesa. ‘Habeas corpus’ deferido.” (HC 75.962/RJ, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - grifei) (...) Tenho acentuado, em diversas decisões proferidas nesta Suprema Corte, a essencialidade do direito à prova (inclusive à prova testemunhal), cuja inobservância, pelo Poder Público, qualifica-se como causa de invalidação do procedimento estatal instaurado contra qualquer pessoa, seja em sede criminal, seja em sede meramente disciplinar, seja, ainda, em sede materialmente administrativa: (...) defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final do julgamento da presente ação de “habeas corpus”, (...) Publique-se. Brasília, 03 de abril de 2009. Ministro CELSO DE MELLO Relator.

Nessa mesma linha, explana Guilherme de Souza

Nucci sobre o direito do acusado de escolher um defensor

de sua confiança.

A escolha de defensor de sua confiança, é direito inafastável do acusado, fazendo parte da ampla defesa. Deve haver uma estreita relação de confiança entre o réu e o profissional destacado

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para ouvir seus segredos e usar todos os recursos cabíveis para garantir o seu indisponível direito à liberdade (NUCCI, 2003, p. 463).

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CAPÍTULO 5

A CRÍTICA DO ESCRITOR PAULO COELHO E

OPINIÕES DE ARTISTAS E JORNALISTAS SOBRE

LIBERDADE DE EXPRESSÃO

Neste capítulo, será apresentada a crítica do escritor

Paulo Coelho sobre o acordo da transação e as opiniões

de vários artistas e jornalistas como: João Bôscoli, filho da

cantora Elis Regina, Marcelo Tas, Erasmo Carlos entre

outros sobre liberdade de expressão.

5.1 A CRÍTICA DO ESCRITOR PAULO COELHO AO

CONTEXTO DESFAVORÁVEL DO ACORDO DE

TRANSAÇÃO

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Em seu novo livro, Paulo Cesar de Araújo descreve

a crítica feita pelo escritor Paulo Coelho em relação à

forma de como foi celebrado o acordo.

Paulo Coelho então partiu para o ataque: O editor diz um disparate para salvar a honra, o cantor não diz nada e o autor fica proibido de dar declarações a respeito. E estamos conversados. Estamos conversados? Não, não estamos, e tenho autoridade para dizer isso. Tenho autoridade porque, desde que publiquei meu primeiro livro, tenho sido sistematicamente atacado. Creio que qualquer pessoa em seu juízo normal sabe que, a partir do momento em que sua carreira se torna pública, está exposta a ter sua vida esquadrinhada, suas fotos publicadas, seu trabalho louvado ou enxovalhado pelos críticos. Isso faz parte do jogo e vale para escritores, políticos, músicos, esportistas. (ARAÚJO, 2014, p.325)

Em outro momento, o biógrafo diz que Paulo

Coelho cobra esclarecimento da editora e depois do

próprio Paulo Cesar.

“Desfavorável é fazer acordo a portas fechadas, colocando em risco uma liberdade reconquistada com muito sacrifício depois de ter sido sequestrada por anos a fio pela ditadura militar. (...) E não entendo por que você, Paulo Cesar

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Araújo, se comprometeu a não fazer, em entrevistas, comentários sobre o conteúdo do livro no que diz respeito à vida pessoal do cantor (Ilustrada, 28/4). Não é apenas o seu livro, cujo destino foi negociado entre quatro paredes, que está em jogo. É o destino de todos os escritores brasileiros neste momento. (...) Não sei se vou ter as explicações que pedi. Mas não podia ficar calado, porque isso que aconteceu na 20ª Vara Criminal da Barra Funda me diz respeito, já que desrespeita minha profissão de escritor ”. (ARAÚJO, 2014, p.326) XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

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5.2 AS OPINIÕES DE JOÃO BÔSCOLI, MARCELO

TAS, ERASMOS CARLOS ENTRE OUTROS SOBRE

LIBERDADE DE EXPRESSÃO.

Serão apresentadas a seguir as opiniões de

diversos artistas e jornalistas sobre biografias não

autorizadas e liberdade de expressão.

O cantor Alceu Valença publicou em 10 de outubro

de 2013, em seu facebook, quatro pontos essenciais

sobre biografias, e afirmou que a liberdade de expressão

é um conceito igualmente amplo, delicado e precioso e

que deveria estar na frente de qualquer questão.

Pare, repare, respire, reveja, revise sua direção... E compus essa letra para o disco Maracatus, Batuques e Ladeiras que lancei em 1994. Desde ontem (terça-feira), um assunto tomou conta dos meus pensamentos. No fim da manhã, recebi um telefonema de uma jornalista que solicitava minha posição acerca da polêmica que vem acontecendo em torno da autorização ou não de biografias. Como já estava na hora de buscar meu filho no colégio, pedi para ela me ligar à tarde. Dali em diante, fiquei remoendo o assunto e aguardando seu novo contato, o que não veio a acontecer. A questão não é simples. Pesei

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costumes e comportamentos. Refleti sobre o tempo e a história. Considerei valores e conceitos. Cheguei a uma conclusão que envolve 4 pontos essenciais: Ética. O assunto até parece démodé, mas deveria estar intrinsecamente no centro de diversas situações que vivemos hoje em dia. Inclusive, neste caso. Óbvio que o conceito é subjetivo e, até, utópico. No entanto, sem a sua prática, o desequilíbrio é evidente. Fala-se muito em biografias oportunistas, difamatórias, mas acredito que a grande maioria dos nossos autores estão bem distantes desse tipo de comportamento. Arrisco em dizer que cerceá-los seria uma equivocada tentativa de tapar, calar, esconder e camuflar a história no nosso tempo e espaço. Imaginem a necessidade de uma nova Comissão da Verdade daqui a uns 20 anos... Assim entramos em outro conceito, igualmente amplo, delicado e precioso: liberdade de expressão. Aliás, tão grandioso que deveria estar na frente de qualquer questão. O que é pior: a mordaça genérica ou a suposta difamação? Eficiência e celeridade processual são princípios que devemos reivindicar para garantia dos nossos direitos. Evitar a prática de livros ofensivos e meramente oportunistas através do Poder Judiciário é uma saída muito mais eficaz e coerente com os fundamentos democráticos. Definitivamente, a questão não é financeira. A ideia de royalties para os biografados ou herdeiros me parece imoral. Falem mal, mas me paguem... (?) é essa a premissa??? Nem tudo pode se resumir ao vil metal! Com todo o respeito

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pelas opiniões contrárias, este é o meu posicionamento. Viva a democracia! Alceu Valença.

Na entrevista do biógrafo Paulo Cesar de Araújo,

no programa de televisão Roda Viva, da TV Brasil, exibido

em 28 de outubro de 2013, o jornalista Alberto Dines

disse que a nossa sociedade é inquisitorial.

O que nós temos que ver é o seguinte: É uma sociedade inquisitorial. O Brasil durante 300 anos teve três censuras simultâneas. Fomos um dos últimos países a ter permissão para ter uma tipografia funcionando e um dos últimos países a ter um jornal circulando. O nosso primeiro jornal foi impresso em Londres, senão a inquisição ia lá e pegava. O que o artista biografado está fazendo? Ele é o herdeiro da inquisição. (texto com adaptações)

No mesmo programa de televisão, o jornalista

Augusto Nunes falou sobre a censura à imprensa.

O que me assusta um pouco nessa história, sobretudo depois da entrada em cena do pessoal do “Procure Saber”, que é um nome paradoxal pra dizer o mínimo, pra saber é bom consultar biografias também. Eu acho o seguinte: se o perfil publicado pela imprensa é pra mim uma espécie

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de biografia resumida e se você eternizar a censura aos livros, você daqui a pouco pode chegar à imprensa, porque se um livro não pode contar determinados episódio da vida de uma pessoa, a imprensa e os jornais e revistas, também não. (texto com adaptações)

O jornalista Alberto Dines complementa a opinião

do jornalista acima afirmando que o assunto transcende a

figura do artista biografado.

Eu insisto: Esse assunto transcende a figura do artista biografado. Estamos tratando de uma ameaça séria à cultura brasileira e a democracia brasileira. (texto com adaptações)

No programa de televisão Canal Livre, exibido no

dia 04 de novembro de 2013, na Rede Bandeirante, sobre

polêmica das biografias, o jornalista Fernando Mitre

elogiou a posição de um dos entrevistados, João Marcello

Bôscoli, filho da cantora Elis Regina, em apoio à liberdade

de expressão.

Você teve uma atitude que eu achei nobilíssima: Apoiar a liberdade de expressão desde o começo. Mas como é essa experiência de pegar a biografia

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de sua mãe e ver coisas pessoais? (texto com adaptações)

Bôscoli respondeu que o Brasil é um país que tem

poucas biografias ou quase nada em comparação a

outros países.

Em primeiro lugar a gente fala como se houvesse um mar de biografias no Brasil. Parece que a gente está falando das dez mil biografias dos Beatles, das quarenta mil do John Kennedy e da Elis, que eu saiba, existe uma. Então assim, coletâneas de frases, expressões e tal, é um deserto literário, é um deserto biográfico. Enfim, a gente está falando de um nada. (...) Eu fico feliz em você dizer que minha atitude foi nobre, mas é como ganhar um parabém por salvar uma criação do afogamento. (texto com adaptações)

E o Jornalista Mitre completa a resposta acima

falando sobre o cerceamento da liberdade de expressão:

Mas no momento em que você vê nomes que estão aí defendendo cerceamento da liberdade de expressão e limitações e restrições, acaba aquilo que seria uma obrigação virando uma virtude. (texto com adaptações)

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Em outra parte do programa, o jornalista Mitre fala

da contradição na entrevista, concedida na mídia, pelo

artista biografado.

Vamos pegar aquela entrevista que o artista biografado deu. Não faz sentido, porque ao mesmo tempo em que diz que é a favor da liberdade de produção de biografia, ele diz que desde que haja um acerto prévio. O que é esse acerto prévio, meu Deus do céu? É condicionar alguma coisa? É interferir? Isso é censura! Não tem outra palavra, e se esse negócio pegar, isso é muito grave, porque uma coisa é o livro, outra coisa é a imprensa e daí vai e ninguém segura mais. (texto com adaptações)

No debate, o entrevistado Bôscoli elogiou a nova

postura do cantor Chico Buarque em voltar atrás e

reconhecer que já tinha sido entrevistado por Paulo César

e criticou os textos dos artistas do grupo Procure Saber

sobre o caso:

O Chico foi muito bem nesse ponto: “Eu perdi, se eu errei. Eu perdi tudo bem.” Achei que ele não esticou muito o assunto. (...) porque o Chico Buarque não ficou no meio do caminho porque eu li vários textos de alguns artistas do grupo

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Procure Saber e reli, reli e tive dúvida e me senti um idiota. Eles estão a favor ou estão contra? Em nenhuma direção eles sustentam, me desculpe. (texto com adaptações)

O entrevistado Bôscoli afirmou também que a

Justiça é lenta para todos e que no caso de Paulo Cesar

de Araújo, foi rápida porque os artistas têm poder.

É um absurdo o grupo de artistas do “Procure Saber” reclamarem da lentidão da justiça e quem lê jornais todos os dias sabe que existe coisa mais grave do que essa, é esperar oito, dez, doze ou quinze anos. A justiça é lenta para todos com exceção dos artistas que têm força. Sabe qual é a foto mais vendida no congresso americano? É a foto de Elvis com Nixon. Sabe como é que foi decidido que o Elvis ia entrar lá? De manhã ele resolveu que ia falar com o Presidente e foi. Quando ele chegou à porta, disseram: “O Elvis está aí e vou mandá-lo embora. Não manda. É bom ele entrar pois o Presidente está em baixa”. Então o artista tem esse poder.

Em outro momento, o entrevistado afirma que um

livro de biografia que fale bem de sua mãe, Elis Regina,

não precisa de nenhuma defesa ou garantia e conclui a

sua opinião dizendo que biografia escrita pelo próprio

biografado não é muito legal.

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Um livro que fale bem sobre Elis não precisa de nenhuma defesa ou garantia (...). São duas biografias da Elis. Você tem mais de dez mil sobre os Beatles. É muito pouca coisa e nunca passou pela minha cabeça e nem pela cabeça dos meus irmãos de fazer nada contra isso (...). Mesmo os artistas de que eu gosto, as biografias escritas pelos próprios não são muito legais, são sempre os caras falando de suas maravilhas do tipo: O meu maior defeito é ser perfeccionista demais. Eu exijo demais de mim, parece entrevista de emprego. (texto com adaptações)

Ao participar também do debate, o escritor Lira

Neto, destacou o papel do escudo ético da discussão em

torno da defesa da privacidade e as adaptações das

biografias para cinema e televisão.

Um grupo de artistas está de olho na parte financeira e na indústria que está por trás das adaptações de biografias pra cinema e para televisão. Parece-me que essa era a discussão inicial, e que precisou de um escudo ético pra poder ficar de bem com a opinião pública. Então, nada melhor do que a discussão da defesa da privacidade no momento em que todo mundo hoje se assusta com a ausência absoluta

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de privacidade por causa das novas tecnologias. (texto com adaptações)

Quase no final do debate, o jornalista Marcelo Tas,

que foi do programa CQC da TV Bandeirantes, falou

sobre o poder de decidir o que vai ser publicado em um

país e que famílias estão se apoderando de parte da

nossa história.

Esse assunto biografia começou muito trivial, estamos querendo falar só sobre intimidade de não revelar muito a vida das pessoas e na hora que as pessoas realmente se posicionaram, inclusive por escrito, pra mim foi um grande susto, porque eu e muita gente imaginamos, alguns dos meus maiores ídolos da juventude, caras que eu cresci ouvindo e fui formado por eles, caras que me tocaram o coração defenderam uma ideia que para mim não tem outra palavra para descrever, que é censura e censura prévia. Se alguém quer ter o poder de decidir o que pode ser publicado em um país, o nome disso é censura e não tem outra palavra não. Infelizmente tá acontecendo de famílias se apoderarem de parte da nossa história como aconteceu com Garrincha, como está acontecendo atualmente com Guimarães Rosa, dos herdeiros serem donos da cultura brasileira e não a gente e não o povo brasileiro. (texto com adaptações)

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Em 30 de outubro de 2013, o jornalista Michel

Alecrim publicou um artigo interessante na revista ISTO É

sobre a questão financeira das adaptações das biografias

para cinema e televisão.

Além da preocupação com a privacidade, por trás do debate sobre biografias autorizadas está a cobiça pelas centenas de milhares de reais que a venda dos direitos de um livro para o cinema ou tevê pode propiciar. (...) Enquanto o País discute quem é dono de uma história pública, o pano de fundo é quanto vale uma história vivida. Afinal as cifras podem alcançar centenas de milhares de reais quando estão em jogo produtos audiovisuais. Três das maiores bilheterias do cinema nacional nos últimos dez anos foram adaptações de biografia (fonte: Filme B) de personalidades. O filme mais bem sucedido, “Chico Xavier” (2010), baseado no livro “As vidas de Chico Xavier”, do jornalista Marcel Souto Maior, teve 3,4 milhões de espectadores e arrecadou R$ 35,3 milhões em valores atualizados. As pessoas envolvidas costumam guardar a sete chaves os valores dessas negociações entre escritor e produtor.

Em outro programa de televisão, chamado de

Espaço Público, também da TV Brasil, exibido em 3 de

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junho de 2014, em que foi entrevistado o biógrafo Paulo

Cesar de Araújo, o deputado federal Newton Lima Neto

perguntou ao biógrafo como iria ficar a possibilidade de

acesso à biografia não autorizada se fosse derrubada a

censura prévia.

Olá, Paulo Cesar! Com a iminência da derrubada da censura prévia das biografias no Brasil, eu queria te perguntar, e certamente faço em nome de uma grande quantidade de brasileiros: Como é que vai ficar a possibilidade de acesso ao teu livro? (texto com adaptações)

O biógrafo respondeu dizendo que o ideal seria

que o próprio artista biografado tomasse a iniciativa de

liberar o livro e caso não entenda assim, ele pretende

entrar com recurso e esperar que a Justiça libere. E

afirma que caso isso não aconteça, o seu livro será a

última biografia proibida e que o artista biografado será o

último censor do Brasil em plena era da Comissão da

Verdade e em pleno século 21.

No dia seguinte à mudança da lei eu vou entrar com recurso evidentemente pra tentar trazer o

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livro de volta e acho que, aí voltando a falar em relação ao artista biografado, só lamento. O ideal seria que o próprio artista biografado tomasse essa iniciativa de liberar o livro, porque ele vai ficar em uma situação difícil e o meu livro será certamente o último livro proibido no Brasil. Com a mudança da lei outros livros que estão na pendência serão naturalmente liberados porque, como esse foi resultado de um acordo no criminal em 2007, não será automático. Então eu vou ter que entrar com recurso, mas espero que o próprio biografado tome essa iniciativa. Se ele tiver um amigo, um conselheiro é bom que aconselhe o biografado a liberar o livro para que ele não seja o último censor do Brasil, porque ele vai ficar na seguinte situação: O meu livro será o último livro proibido e o artista biografado o último censor do Brasil em plena era da comissão da verdade e em pleno século 21. Se não tomar a iniciativa e se ele não entender assim, eu vou entrar com recurso e espero que nossa justiça acolha esse recurso. (texto com adaptações)

No final do programa, Paulo Cesar comentou a

nova postura do artista biografado em relação à liberação

da biografia não autorizada.

Ele divulgou uma nota na sexta-feira dizendo que o livro é irrevogável. Aliás, na entrevista em uma emissora de televisão no ano passado, quando pareceu mais tolerante e que era favorável a

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biografias não autorizadas a repórter perguntou ao artista biografado: “Em relação ao livro de Paulo Cesar, você autorizaria também? Ele pensou por cinco segundos e falou: Temos que discutir”. Então ele pareceu tolerante. Agora sexta-feira ele divulgou uma nota dizendo que não autorizaria a biografia e que a censura ao livro é irrevogável. (texto com adaptações)

Em 11 de Junho de 2014, o cantor Erasmo Carlos

em entrevista realizada pela revista Veja, sinalizou que

era a favor das biografias e contra a obrigação de pedir

autorização ao biografado. Defendeu punições severas

para quem escreva mentiras ou publique algo que agrida

o biografado e afirmou também que biografia só deveria

ser lançada com o biografado morto.

No ano passado, o senhor fez parte do grupo Procure Saber, que se posicionava contra as biografias não autorizadas de artistas. Qual sua avaliação dessa campanha? Sou roqueiro, talvez a expressão mais pura que exista de liberdade. Ainda sou membro do Procure Saber e mantenho a mesma postura que tive no inicio do grupo: sou a favor das biografias e contra a obrigação de pedir autorização ao biografado. Mas defendo punições severas para

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quem escreva mentiras ou publique algo a que me faça sentir agredido. Nos anos 1980, houve uma tentativa de criar um caso (...). E ali eu tive duas lições valiosas. Primeiro, que existem péssimos profissionais da imprensa. Segundo, que eu deveria preservar a minha vida pessoal. No período da jovem guarda, a gente era acostumado a expor o dia a dia. Mostrava os carros, as namoradas, os familiares. Hoje, não faço mais isso. Quando lancei Minha Fama de Mau, disse que era um livro de memórias. Se fosse uma biografia, eu teria de contar as minhas derrotas, as coisas erradas que eu fiz. E sabe de uma coisa? Biografia só deveria ser lançada com o biografado morto. Quero mesmo é olhar o que foi escrito sobre mim lá de cima, no céu. Porque vamos combinar que deve ser muito chato passar os dias admirando aquele cenário branco e escutando música suave. (texto com adaptações)

Erasmo Carlos afirmou que na entrevista

concedida ao biógrafo Paulo Cesar, ele nunca disse que

iria escrever uma biografia sobre o artista biografado e

afirmou também que a parte escrita referente à sua vida

na biografia estava tudo certo.

Paulo Cesar nunca me disse que iria me entrevistar para uma biografia do artista biografado. Ele veio aqui na minha casa com um

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grupo de estudantes e conversou comigo a respeito da jovem guarda. Tempos depois, ele me ligou e fez perguntas mais específicas sobre o artista biografado. Ora, eu sempre fui cabreiro com isso, porque geralmente as pessoas me usam em matérias sobre o artista biografado. Da biografia, li só as partes que falam de mim, e posso dizer que está tudo certo e não li o novo livro de Paulo Cesar, O Réu e o Rei. Se não tive paciência para ler o primeiro livro, por que iria perder tempo com o segundo? (texto com adaptações)

O jornalista Julio Maria do jornal O Estado de S.

Paulo, entrevistou em 5 de janeiro de 2015, o biógrafo

Paulo Cesar de Araújo, sobre o especial da vida de Tim

Maia, exibido em uma emissora de televisão. No especial,

segundo Paulo Cesar, houve algumas cenas baseadas na

biografia não autorizada escrita por ele.

Na entrevista concedida, ele fala novamente sobre a

censura ao seu livro e clama pela sua liberação.

O que me espanta é que não tenha ninguém próximo ao artista biografado que fale: Dê um basta nisso. Não é possível que ele não tenha um amigo, um filho, que fale: meu pai larga isso pra lá, libere esse livro (a biografia não autorizada) tira essa mancha da sua história, se

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é possível tirar, mas pelo menos não carregue mais isso. Enquanto o artista biografado não tomar essa decisão, nós vamos ficar debatendo, problematizando, lamentando, mas parece que ele não entende assim. Mudando a lei agora, isso está para ser mudado, o artista biografado vai ser o último censor do Brasil e meu livro o último livro proibido do Brasil. Não sei por que que ele continua carregando essa pecha, por mais quanto tempo? (texto com adaptações)

E fala do especial de televisão sobre a vida de Tim

Maia.

Uma das cenas que a emissora de televisão podou é uma que só está escrita na biografia não autorizada. Aliás, uma das cenas. (...) Isso tem a ver com o nosso debate hoje no Brasil a respeito das biografias autorizadas. Essa visão que leva a desejar só biografias autorizadas. Essa visão autoritária, excludente, patrimonialista, de dizer a “minha história é um patrimônio meu”, como disse o artista biografado. Por que ele diz isso? Porque ele quer contar essa visão, cor de rosa, um passado sem conflitos, sem contradições. Por isso que essa ideia não pode prevalecer no Brasil, porque o resultado vai ser isso que vimos no especial sobre o cantor Tim Maia exibido em uma emissora de televisão” (texto com adaptações)

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Chegando ao fim desta obra podemos observar que

quase a totalidade da opinião pública está a favor da

liberação da biografia, quanto mais agora com os

acontecimentos ocorridos na França em relação à

liberdade de expressão.

Analisando a postura do artista biografado diante do

caso, assim como ocorreu com o biógrafo Paulo Cesar,

verifica-se que o biografado tomou até agora atitudes

equivocadas por falta de orientação técnica de um

profissional que realmente conheça o assunto para

esclarecer e explicar os prós e os contras de cada

decisão tomada.

Atendendo ao clamor da opinião pública

principalmente do biógrafo Paulo Cesar, e a título de

orientação para o sucesso e término definitivo deste caso,

seria interessante que o artista biografado sinalizasse em

direção a um verdadeiro espírito de reconciliação e

autorizasse a venda de sua biografia em detalhes.

.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALECRIM, Michel. Quanto vale uma história. 30 de outubro de 2013. São Paulo: Editora Três, Revista Isto É, ano 37, n º 2293, págs. 52/54.

ALMEIDA, João Ferreira de. Bíblia Sagrada com hinos históricos e canções do Missionário R.R. Soares. Edição revista e corrigida. Barueri/São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2009. XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

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E se lembrar de que seu irmão tem algo contra você, deixe sua oferta ali,

diante do altar, e vá primeiro reconciliar-se com seu irmão; depois volte e

apresente sua oferta. (Biógrafo Mateus 5:23-24)

Evangelho do Biógrafo Marcos

Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for

batizado será salvo; mas quem não crer será condenado. E estes sinais

seguirão aos que crerem: Em meu nome expulsarão os demônios; falarão

novas línguas; Pegarão nas serpentes; e, se beberem alguma coisa mortífera,

não lhes fará dano algum; e porão as mãos sobre os enfermos, e os curarão.

(16:15-18)

Evangelho do Biógrafo João

Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o

ressuscitarei no último dia. (6:54.) Eu sou o caminho, e a verdade e a vida;

ninguém (ex: nem Tício, Mévio, etc) vem ao Pai, senão por mim. (14:6); O

Espírito de verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o

conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco, e estará em vós.

(14:16,17.) Quem não me ama não guarda as minhas palavras. (14:24)

Evangelho do Biógrafo Mateus

É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo? Ele, porém,

respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio

macho e fêmea os fez, E disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se

unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne? (19; 3-5)

Êxodo

Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há

em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.

Não te encurvarás a elas nem as servirás. (20:4-5)

Deuteronômio Nem encantador, nem quem consulte a um espírito adivinhador, nem mágico,

nem quem consulte os mortos; Pois todo aquele que faz tal coisa é

abominação ao Senhor; e por estas abominações o Senhor teu Deus os lança

fora de diante de ti. (18:11-12)

Isaías

Congregai-vos, e vinde; chegai-vos juntos, os que escapastes das nações;

nada sabem os que conduzem em procissão as suas imagens de escultura,

feitas de madeira, e rogam a um deus que não pode salvar. (45:20)

Apocalipse

Para que ninguém possa comprar ou vender, senão aquele que tiver o sinal,

ou o nome da besta, ou o número do seu nome. (13: 16-17) E na sua testa

estava escrito o nome: Mistério, a grande babilônia, a mãe das prostituições

e abominações da terra. E vi que a mulher estava embriagada do sangue

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dos santos, e do sangue das testemunhas de Jesus. (17:5- 6) E clamou

fortemente com grande voz, dizendo: Caiu, caiu a grande Babilônia, e se

tornou morada de demônios, e coito de todo espírito imundo, e coito de toda

ave imunda e odiável. E ouvi outra voz do céu, que dizia: Sai dela, povo

meu, para que não sejas participante dos seus pecados, e para que não

incorras nas suas pragas. (18:2-4) E vi tronos; e assentaram-se sobre eles, e

foi-lhes dado o poder de julgar; e vi as almas daqueles que foram degolados

pelo testemunho de Jesus, e pela palavra de Deus, e que não adoraram a

besta, nem a sua imagem, e não receberam o sinal em suas testas nem em

suas mãos; e viveram, e reinaram com Cristo durante mil anos. Mas os

outros mortos não reviveram, até que os mil anos se acabaram. Esta é a

primeira ressurreição. Bem-aventurado e santo aquele que tem parte na

primeira ressurreição; sobre estes não tem poder a segunda morte; mas

serão sacerdotes de Deus e de Cristo, e reinarão com ele mil anos. (20:4-6)

E o diabo, que os enganava, foi lançado no lago de fogo e enxofre, onde

estão a besta e o falso profeta; e de dia e de noite serão atormentados para

todo o sempre. (20:10) E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam

diante de Deus, e abriram-se os livros; e abriu-se outro livro, que é o da

vida. E os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos

livros, segundo as suas obras. E deu o mar os mortos que nele havia; e a

morte e o inferno deram os mortos que neles havia; e foram julgados cada

um segundo as suas obras. E a morte e o inferno foram lançados no lago de

fogo. Esta é a segunda morte. E aquele que não foi achado escrito no livro

da vida foi lançado no lago de fogo. (20:12-15) E eu, João, vi a santa cidade,

a nova Jerusalém, que de Deus descia do céu, adereçada como uma esposa

ataviada para o seu marido. (21:2) Quem vencer, herdará todas as coisas; e

eu serei seu Deus, e ele será meu filho. (21:7)

Evangelho do Biógrafo Lucas

E aconteceu que o mendigo morreu, e foi levado pelos anjos para o seio de

Abraão; e morreu também o rico, e foi sepultado. E no inferno, ergueu os

olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão, e Lázaro no seu seio.

(16:22-23) E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai,

Pois tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de que não

venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Têm Moisés

e os profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, pai Abraão; mas, se algum

dentre os mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém, Abraão lhe

disse: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco acreditarão, ainda

que algum dos mortos ressuscite. (16:27-31)

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