Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

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D. Sebastião Décimo sexto rei de Portugal, filho do príncipe D. João e de D. Joana de Áustria, nasceu em Lisboa a 20 de Janeiro de 1554, e morreu em Alcácer Quibir, a 4 de Agosto de 1578. Sucedeu a seu avô D. João III sendo o seu nascimento esperado com ansiedade, enchendo de júbilo o povo, pois a coroa corria o perigo de vir a ser herdada por outro neto de D. João III, o príncipe D. Carlos, filho de Filipe II de Espanha. De saúde precária, D. Sebastião mostrou desde muito cedo duas grandes paixões: a guerra e o zelo religioso. Cresceu na convicção de que Deus o criara para grandes feitos, e, educado entre dois partidos palacianos de interesses opostos - o de sua avó que pendia para a Espanha, e o do seu tio-avô o cardeal D. Henrique favorável a uma orientação nacional -, D. Sebastião, desde a sua maioridade, afastou-se abertamente dum e doutro, aderindo ao partido dos validos, homens da sua idade, temerários a exaltados, que estavam sempre prontos a seguir as suas determinações. Nunca ouviu conselhos de ninguém, e entregue ao sonho anacrónico de sujeitar a si toda a Berbéria a trazer à sua soberania a veneranda Palestina, nunca se interessou pelo povo, nunca reuniu cortes nem visitou o País, só pensando em recrutar um exército a armá-lo, pedindo auxílio a Estados estrangeiros, contraindo empréstimos a arruinando os cofres do reino, tendo o único fito de ir a África combater os mouros.

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D. Sebastião

Décimo sexto rei de

Portugal, filho do príncipe D.

João e de D. Joana de Áustria,

nasceu em Lisboa a 20 de

Janeiro de 1554, e morreu em

Alcácer Quibir, a 4 de Agosto

de 1578. Sucedeu a seu avô D.

João III sendo o seu

nascimento esperado com

ansiedade, enchendo de júbilo

o povo, pois a coroa corria o

perigo de vir a ser herdada

por outro neto de D. João III,

o príncipe D. Carlos, filho de Filipe II de Espanha .

De saúde precária, D. Sebastião mostrou desde muito cedo

duas grandes paixões: a guerra e o zelo religioso. Cresceu na

convicção de que Deus o criara para grandes feitos, e, educado

entre dois partidos palacianos de interesses oposto s - o de

sua avó que pendia para a Espanha, e o do seu tio-a vô o

cardeal D. Henrique favorável a uma orientação naci onal -, D.

Sebastião, desde a sua maioridade, afastou-se abert amente dum

e doutro, aderindo ao partido dos validos, homens d a sua

idade, temerários a exaltados, que estavam sempre p rontos a

seguir as suas determinações.

Nunca ouviu conselhos de ninguém, e entregue ao son ho

anacrónico de sujeitar a si toda a Berbéria a traze r à sua

soberania a veneranda Palestina, nunca se interesso u pelo

povo, nunca reuniu cortes nem visitou o País, só pe nsando em

recrutar um exército a armá-lo, pedindo auxílio a E stados

estrangeiros, contraindo empréstimos a arruinando o s cofres do

reino, tendo o único fito de ir a África combater o s mouros.

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Chefe de um numeroso exército, na sua maioria avent ureiros

e miseráveis, parte para a África em Junho de 1578; chega

perto de Alcácer Quibir a 3 de Agosto e a 4, o exér cito

português esfomeado a estafado pela marcha e pelo c alor, e

dirigido por um rei incapaz, foi completamente dest roçado,

figurando o próprio rei entre os mortos.

Ficha genealógica:

D. Sebastião, nasceu em Lisboa, a 20 de Janeiro de1 554;

faleceu em Alcácer Quibir, a 4 de Agosto de 1578; s epultado em

1582 no Mosteiro dos Jerónimos. Morreu solteiro e s em

descendência.

Page 3: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

Cardeal D. Henrique

Filho do rei D. Manuel e

da segunda mulher deste, D.

Maria, foi o quarto na ordem

varonil dos filhos daquele

rei.

A sua educação foi

orientada para a vida

eclesiástica, recebendo sólida

cultura, que lhe foi

ministrada por sábios como

Pedro Nunes, Nicolau Clenardo

e Aires Barbosa. Um cronista

do tempo define-o como de sua

condição encolhido, e vergonhoso (...) pouco mimoso e severo,

continente e temperado nas palavras».

A sua carreira eclesiástica iniciou-se aos 14 anos, ao ser

investido como prior comendatário de Santa Cruz de Coimbra.

Seis anos depois recebeu a administração do arcebis pado de

Braga. Em 1540 é feito arcebispo de Évora. Nesta ci dade cria

uma pequena corte de letrados, músicos, cantores a

charameleiros, que faziam parte da sua casa episcop al. A

protecção que dispensou à cultura até 1562 permite considerá-

lo como um príncipe de ideal renascentista. Entreta nto fora

nomeado, em 1539, inquisidor-geral do reino, em 154 5 cardeal e

sete anos mais tarde legado apostólico em Portugal.

Em 1562 obteve a arquidiocese de Lisboa, mas doze a nos

depois transferiu-se de novo para Évora. Foi graças aos seus

esforços que se criou, em 1559, uma Universidade na quela

cidade alentejana, tendo o cardeal ajudado ao desen volvimento

dessa instituição. Como prelado e inquisidor foi de fensor

extreme de princípios religiosos que concebia de fo rma

altamente conservadora. A sua importância política começa a

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sobressair durante a menoridade de D. Sebastião, te ndo sido

regente de 1562 a 1568, opondo-se às pretensões de D. Catarina

de Áustria, adepta da ingerência espanhola na polít ica

portuguesa.

Nos primeiros anos após a maioridade de D. Sebastiã o, D.

Henrique é o seu principal orientador. Mas desenten dem-se, e

partir de 1572, e o cardeal voltará a Évora onde, e m Janeiro

de 1578, recusa o seu consentimento à expedição a M arrocos.

Subindo ao trono após o desastre de Alcácer Quibir, começa por

tentar resolver o problema da sucessão ao trono em termos

nacionais, convocando cortes para Almeirim a projec tando o seu

casamento com a rainha-mãe de França. Mas a influên cia

espanhola cada vez maior em Portugal, as rivalidade s entre os

vários pretendentes ao trono, a ruína financeira do País a

outros factores fizeram da última fase do reinado d e D.

Henrique um período de indecisão; eximindo-se a nom ear um

herdeiro da coroa, preferiu deixar o problema em su spenso,

escolhendo cinco governadores para o substituírem a pós a sua

morte.

Ficha genealógica:

D. Henrique, nasceu em Lisboa, a 31 de Janeiro de 1 512 e

morreu em Almeirim a 31 de Janeiro de 1580. Foi sep ultado na

capela-mor da igreja do Paço de Almeirim, e transfe rido em

1582 para o Panteão dos Jerónimos. Cardeal de Portu gal,

arcebispo de Braga, Lisboa e Évora, morreu sem desc endência.

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D. António prior do Crato

Nasceu em Lisboa, filho de

uma mulher do povo e do

infante D. Luís.

Seu pai desejava que ele

seguisse a vida eclesiástica e

a sua educação processou-se em

sucessivos mosteiros e

colégios religiosos, tendo

tido por mestres o grande

humanista Fr. Diogo de Murça,

o padre Simão Rodrigues de

Azevedo, o teólogo Pedro

Margalho a D. Frei Bartolomeu

dos Mártires.

Com a morte de seu pai decide romper com a carreira que lhe

tinha sido imposta. Já prior do Crato e com as orde ns de

diácono, recusa a ordenação de presbítero e comport a-se como

pessoa secular. Por esse motivo, seu tio o cardeal D. Henrique

manifesta-lhe um ódio declarado, o que o leva a exi lar-se em

Castela, em várias ocasiões, durante a menoridade d e D.

Sebastião. Com a subida ao trono deste monarca e go zando da

sua estima, D. António desempenha o cargo de govern ador de

Tânger.

Obtém, então, dispensa do papel das ordens de diáco no. Toma

parte na batalha de Alcácer Quibir e é feito prisio neiro.

Resgatado, regressa a Lisboa para chefiar um dos pa rtidos

nacionais que se opunham à candidatura de Filipe II ao trono

português. O prior do Crato baseava a sua candidatu ra na

situação de filho legitimado do infante D. Luís, se gundo filho

de D. Manuel, uma vez que não havia descendentes di rectos de

D. João III. Era necessário, todavia, provar o matr imónio

secreto de seus pais. Organiza-se um processo a D. António

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obtém uma sentença favorável, mas a actuação pessoa l do

cardeal-rei, que contesta aquela decisão, culmina n uma nova

sentença desfavorável.

Com a morte do cardeal, as tropas filipinas entram em

Portugal. Os partidários do prior do Crato aclamam- no rei em

Santarém; Lisboa e Setúbal recebem-no vibrantemente e, em

breve, quase todos os burgos do reino alinham a seu lado. Mas,

não dispondo de exército organizado, nem de recurso s, é

derrotado na batalha de Alcântara pelo exército cas telhano.

Consegue fugir com dificuldade para o estrangeiro o nde, nas

cortes de França a de Inglaterra, procura obter aux ílio para

lutar contra Filipe II.

Duas esquadras francesas enviadas à Ilha Terceira s ão

derrotadas sucessivamente pelos castelhanos. A Terc eira perde-

se, como último bastião de D. António. Vivendo mise ravelmente

em França, a expensas de Catarina de Médicis resolv e passar à

corte de Isabel I pedindo novo auxilio. Os ingleses como

represália contra o ataque da Invencível Armada, re solvem

enviar a Portugal uma esquadra, comandada por Drake . D.

António desembarca em Peniche mas sofre novo desair e. Regressa

a França e, depois de ter conseguido um novo auxíli o de

Henrique IV, morre em Paris de uma crise de uremia, sem

realizar o projecto por que tanto lutou.

Ficha genealógica:

D. António nasceu em Lisboa, em 1531, tendo falecid o em

Paris, a 26 de Agosto de 1595, tendo sido enterrado no

Convento de S. Francisco da mesma cidade. Era filho natural ou

legitimado do infante D. Luís e de Violante Gomes, mulher

plebeia. Foi rei de Portugal desde 19 de Junho de 1 580, data

da sua aclamação em Santarém, até à derrota de Alcâ ntara, a 25

de Agosto seguinte.

Nunca resignou aos seus direitos e, embora exilado em

França e na Inglaterra, manteve luta armada contra Filipe II,

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nos Açores (1582-1583) a em Lisboa (1589). De vária s mulheres

teve 10 filhos, sendo os mais conhecidos:

1. D. Manuel de Portugal (n. em Lisboa, 1568; f. em

Bruxelas, a 22 de Junho de 1638), acompanhando seu pai no

exílio e vivendo em França, na Inglaterra a na Flan dres. Casou

em 1597 com Emília de Nassau, princesa de Orange, d ela se

separando em 1625 por motivos de ordem religiosa;

2. D. Cristóvão de Portugal (n. em Tânger, em Abril de

1573; f. em Paris, a 3 de Junho de 1638). Viveu tam bém no

estrangeiro, sustentando a causa paterna e, após a morte de D.

António, manteve vivo o mesmo ideal.

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Filipe II de Espanha e I de

Portugal

n. 1527

f. 13 de Setembro de 1598

O Prudente.

Nasceu em Valladolid em

1527, faleceu no Escurial a 13

de Setembro de 1598. Era filho

de Carlos V, imperador da

Alemanha, e da imperatriz D.

Isabel, filha de el-rei D.

Manuel, de Portugal.

Casou em 15 de Novembro de

1543, contando 16 anos de

idade, com a infanta D. Maria,

que também contava a mesma

idade, filha de D. João III e da rainha D.: Catarin a, a qual

faleceu dois anos depois, a 12 de Julho de 1545. Fi cando viúvo

aos 18 anos, Filipe assim se conservou até 1551, em que casou

com Maria Tudor, rainha de Inglaterra, e foi residi r em

Londres, mas tornou-se tão pouco simpático aos ingl eses, que

estes, com o maior prazer o viram partir em 1555 pa ra os

Países Baixos, cujo governo Carlos V lhe cedeu, com o

anteriormente lhe cedera, um ano antes, o governo d e Nápoles e

da Sicília, e como lhe cedeu mais tarde, em 1556, a coroa de

Espanha, quando completamente abdicou para se recol her no

mosteiro de S. Justo. Filipe enviuvou também da rai nha de

Inglaterra, falecida em 1558, e tornou a casar, pel a terceira

vez, com a princesa de França, Isabel de Valois, fi lha de

Henrique II. Não seguiremos a vida deste monarca, s enão depois

de se ter apoderado de Portugal em 1530.

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Depois da morte de el-rei D. Sebastião na funesta b atalha

de Alcácer Quibir, Filipe pensou na posse do trono português,

com as maiores esperanças, por ver aclamado o carde al D.

Henrique, velho decrépito, de quem não se podia rec ear

sucessão. Era, porém, preciso antes da sua morte, a ssegurar a

posse do trono, e para isso empenhou, todos os meio s, intrigas

e dinheiro para ganhar ao seu partido a corte de Po rtugal,

conseguindo assim chamar para seu lado muitos fidal gos

portugueses. Os pretendentes, que eram sete, disput avam entre

si a posse do reino, mas; desses sete, contavam-se cinco que

baseavam as suas pretensões em fundamentos aceitáve is. Estes

cinco eram: Filipe do Espanha, que alegava ser filh o de D.

Isabel, filha primogénita de D. Manuel, que casara com Carlos

V; o duque de Sabóia dizia ser filho da infanta D. Beatriz,

filha do referido monarca, que casara com seu pai o duque de

Sabóia; D. António, prior: do Crato, alegava ser fi lho natural

do infante D. Luís, igualmente filho de el-rei D. M anuel; o

duque de Parma, o ser neto, por sua mãe, do príncip e D.

Duarte, filho também de D. Manuel; e a duquesa de B ragança, D.

Catarina, alegava ser filha do mesmo príncipe. Os d ois, que

menos direito mostravam, eram Catarina de Medicis, rainha de

França, dizendo-se descendente de D. Afonso III e d e sua

primeira mulher, a condessa Matilde de Bolonha, e f inalmente o

papa, que se dizia herdeiro natural dos cardeais, e entendia

portanto dever usufruir o reino que um cardeal gove rnava como

podia usufruir uma quinta de que fora possuidor. Os cinco

primeiros é que apresentavam títulos valiosos, e en tre esses

só três disputavam seriamente entre si a coroa: Fil ipe, D.

António, prior do Crato, e a duquesa de Bragança. C em a morte

do cardeal D. Henrique ainda mais se acendeu a intr iga.

Cristóvão de Moura, o português renegado que estava sendo em

Portugal o agente infernal do rei de Espanha, conhe cido pelo

demónio do meio-dia, enleava tudo nas redes da sua diplomacia

corruptora, espalhando ouro castelhano, com que com prava as

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consciências que quisessem vender-se: Filipe II, em Espanha,

seguia com ansiedade a marcha dos acontecimentos, e de lá

dirigia os planos e auxiliava a politica do seu emi ssário. O

reino ficara, entregue a cinco governadores vendido s a

Cristóvão de Moura, os quais, receando do povo que se agitava;

hesitavam em reconhecer Filipe como rei de Portugal . Vendo

isto, o monarca castelhano dispôs-se a conquistar o reino pela

força das armas, empresa fácil, porque os governado res das

praças já eram, na maior parte, criaturas de Cristó vão de

Moura. D. António, prior do Crato, fizera-se aclama r em

Santarém, mas dispunha de poucas tropas. Apesar dis so, Filipe

reuniu um poderoso exército, cujo comando confiou a o general

duque de Alba; confiou ao marquês de Santa Cruz o c omando duma

esquadra, e conservou-se próximo da fronteira de Ba dajoz. O

duque de Alba marchou sobre Setúbal; conquistando f acilmente o

Alentejo, atravessou para Cascais na esquadra do ma rquês de

Santa Cruz, marchou sobre Lisboa, derrotou o prior do Crato na

batalha de Alcântara, a 4 de Agosto de 1580, perseg uiu-o até à

província do Minho, e preparou enfim o reino para r eceber a

visita do seu novo soberano. (V. António, D.).

Filipe, em 9 de Dezembro, atravessou a fronteira, e ntrou em

Elvas, onde se demorou dois meses recebendo nesta s ua visita

os cumprimentos dos novos súbditos, sendo um dos pr imeiros que

o veio saudar o duque de Bragança. A 23 de Fevereir o de 1581

saiu de Elvas, atravessou triunfante e demoradament e todo o

país, e a 16 de Março entrou em Tomar, para onde co nvocara

cortes, e ali distribuiu as primeiras recompensas, e ordenou

os primeiros suplícios e confiscos, e recebeu a not ícia de que

todas as colónias portuguesas haviam reconhecido a sua

soberania, exceptuando a ilha Terceira, onde se arv orara a

bandeira do prior do Crato, que fora ali, jurado re i de

Portugal a 16 de Abril de 1581. Nessas cortes prome teu Filipe

II respeitar os foros e as isenções de Portugal, e nunca lhe

dar para governador senão um português ou um membro da família

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real. Entendendo que devia demorar-se algum tempo n o

território português, expediu de Lisboa as tropas q ue

subjugaram, depois de porfiada luta, a resistência da ilha

Terceira, em que D. António fora auxiliado pela Fra nça, e só

partiu para Espanha, quando a vitória naval de Vila Franca, em

que o marquês de Santa Cruz destroçou a esquadra fr ancesa em

26 de Julho de 1582, lhe garantiu a definitiva subm issão da

referida ilha. Nomeando para vice-rei de Portugal s eu

sobrinho, o cardeal-arquiduque Alberto, e depois lh e ter

agregado um conselho de governo, e de ter nomeado o s membros

do conselho de Portugal, que devia funcionar em Mad rid, partiu

finalmente a 11 de Fevereiro de 1583 para Espanha. A 29 de

Agosto conquistava o marquês de Santa Cruz a ilha T erceira. A

nova monarquia hispano-lusitana era opulentíssima; abrangia na

Europa toda a península ibérica, Nápoles, Sicília, Milão,

Sardenha e Bélgica actual; na Ásia as feitorias por tuguesas da

Índia, da Pérsia, da China, da Indochina, e a da Ar ábia; na

África: Angola, Moçambique, Madeira. Cabo Verde, S. Tomé e

Príncipe, Canárias, toda a América menos algumas da s Antilhas,

parte dos actuais Estados Unidos e o Canadá, e urna s porções

de terrenos na Guiana; na Oceânia tudo o que então havia

conhecido e pertencente aos europeus. Nenhuma outra nação ali

fora ainda assentar domínio. As Molucas eram a part e mais

importante dessas possessões.

A Europa principiou a assustar-se com este poderio

colossal, receosa de que por este caminho Filipe ch egasse a

realizar o sonho ambicioso de monarquia universal. Sucederam

se então importantes acontecimentos políticos, em q ue a

Inglaterra aproveitou para se vingar de Filipe, de quem se

considerava ofendida. As coisas complicaram-se grav emente

porque Isabel, de Inglaterra, mostrou-se disposta a auxiliar

as pretensões do prior do Crato, e o almirante Drak e, por

ordem superior, invadiu as colónias espanholas, que eram

também as portuguesas, saqueando Cabo Verde, tomand o o castelo

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do Cabo de S. Vicente, e apresando quantos galeões americanos

cruzavam nos mares dos Açores. Foi então que Filipe organizou

a célebre Armada Invencível, comandada pelo duque d e Medina

Sidónia, que uma tempestade aniquilou por completo, em Junho

de 1588. (V. Armada Invencível). As ambições de Fil ipe II

foram profundamente ruinosas para as nossas colónia s. Em 1589

fechara aos ingleses os Portos portugueses e em 159 1 fechou-os

também aos holandeses Daí resultou que não podendo nem uns nem

outros vir buscar a Portugal os géneros do Oriente, lembraram-

se de ir à, fonte desse comércio. Os holandeses com eçaram a

aparecer no seu tempo no Oriente, onde a nossa deca dência era

sensível, e onde depois da perda da nossa independê ncia só

dois capitães ilustres, D. Paulo de Lima Pereira e André

Furtado de Mendonça, tinham mantido nobremente a ho nra da

bandeira portuguesa. Os ingleses salteavam as nossa s

possessões mais próximas, Cabo Verde e os Açores, m as não

tardariam também a aparecer no Oriente favorecendo a natural

reacção dos indígenas contra o nosso domínio.

Em Portugal houve duas tentativas de revolta, promo vidas

pela aparição de dois homens em quem o povo julgou ver D.

Sebastião, e que por isso tiveram a denominação de rei de

Penamacor e de rei da Ericeira. O motim promovido p or este

último tomou proporções gravíssimas, e foi reprimid o dum modo

sanguinário e violentíssimo. Filipe II, apesar da d estruição

da Armada Invencível, não desistiu das suas expediç ões contra

a Inglaterra, e ainda em 1596 enviou urna à Irlanda que também

os temporais dispersaram, perdendo a Espanha neste desastre 40

navios. Filipe enviuvou pela terceira vez, e casou novamente

com uma segunda prima, Ana de Áustria, que faleceu em 1580,

quando estava com seu marido em Badajoz, seguindo o progresso

das armas castelhanas em Portugal, deixando-o pela quarta vez

viúvo. Filipe II teve uma série de primeiros-minist ros

notáveis: o duque de Alba, que morreu em Lisboa doi s anos

depois da conquista; o príncipe de Eboli que morreu muito

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antes do rei; António Peres, que lhe sobreviveu, ma s que ele

perseguiu implacavelmente; o cardeal de Granville, que depois

de ter perdido todo o valimento, o recuperou e foi chamado de

Nápoles para ficar como regente do reino em Madrid, enquanto o

rei vinha a Portugal; e Cristóvão de Moura, que foi o valido

da última hora, o que recebeu o seu derradeiro susp iro e as

suas derradeiras confidencias. Pouco tempo antes de morrer, o

cardeal-arquiduque Alberto, vice-rei de Portugal, f ora nomeado

soberano de Flandres, e para o substituir em Portug al nomeou

um conselho composto do arcebispo de Lisboa, dos co ndes de

Portalegre, de Sabugal e de Santa Cruz, e de Miguel de Moura.

Foi este o último acto importante do seu reinado.

Com a Universidade de Coimbra deu-se o seguinte fac to, logo

no começo do reinado de Filipe. Em Fevereiro de 158 0, pouco

depois da morte do cardeal rei D. Henrique, apresen tou-se ao

claustro da Universidade o Dr. João Nogueira, com u ma provisão

dos governadores do reino, na qual permitiam a todo s os

lentes, que não fossem desembargadores, dar o seu p arecer

dentro de oito dias, sobre a sucessão do trono. Qui s, porém, a

má estrela da Universidade, que D. António, prior d o Crato,

lhe escrevesse uma carta, datada de Santarém aos 20 de Junho

do mesmo ano, dando conta de ter sido aclamado rei em diversos

lugares do reino. A Universidade resolveu em claust ro que se

fizesse uma procissão, em acção de graças, desde a sua capela

até Santa Cruz; e no mesmo claustro foram eleitos, para irem

dar obediência ao nosso rei, reconhece-lo como tal e fazer-lhe

a entrega da protectoria, o reitor Fernão Moniz Mas carenhas e

Fr. Luís Sotto-mayor. Em 13 de Dezembro voltou o re itor, disse

em claustro que era desnecessário dar conta do dese mpenho da

sua missão, pois de todos era já sabido que o rei d e Castela

estava reconhecido como rei de Portugal. Em vista d esta

declaração deliberou-se que o próprio reitor, encar regado

havia pouco de cumprimenta o prior do Crato, fosse agora com

os lentes da sua escolha, dar obediência a Filipe I . Este acto

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cerimonial realizou-se em Elvas a 20 de Dezembro de 1580,

sendo a Universidade representada por D. Jorge de A taíde e D.

Afonso Castelo Branco. Tornou-se a fazer outra proc issão

solene, quando o reitor, em voltando, trouxe carta de el-rei,

datada de Elvas a 25 de Fevereiro de 1581, na qual significava

o contentamento que sentira pela obediência da Univ ersidade, e

com o ser declarado seu protector. Mas Filipe não e ra homem

que deixasse sem castigos os sentimentos que a Univ ersidade

manifestara ao prior do Crato. Pedro de Alpoim, col egial de S.

Pedro e lente do Código, foi degolado em Lisboa; Fr . Luís de

Sotto-mayor privado da cadeira grande de Escritura; Fr.

Agostinho da Trindade, da de Escoto; Fr. Luís foi d epois

restituído, mas Fr. Agostinho ausentou-se para Fran ça, e foi

lente de Teologia na Universidade de Tolosa; João R odrigues de

Vasconcelos, que trouxera a carta do prior do Crato , foi preso

e morreu na prisão. Outro facto é também digno de n arrar-se;

pela provisão de 9 de Março de 1583 foi Manuel de Q uadros

nomeado visitador e reformador da Universidade; tom ou posse do

cargo e prestou, juramento a 21 de Março do mesmo a no. O

visitador vinha encarregado de construir escolas pa ra a

Universidade, mas os seus esforços estacaram afinal pela falta

de dinheiro. A Universidade pediu a Filipe I que lh e cedesse

os paços reais para neles se assentarem as escolas, que lá

estavam havia já 40 anos. O rei respondeu, em 30 de Setembro

do referido ano de 1583, que, embora desejasse faze r muitas

mercês à Universidade, não era conveniente a seu se rviço dar-

lhe os seus paços, que aliás, em sendo desocupados pela

Universidade, tencionava mandar concertar, para pod er em algum

tempo ir a eles, como desejava. Filipe nunca realiz ou o desejo

que disse ter de ir aos paços de Coimbra. Anos depo is, em

1597, o mesmo monarca vendeu à Universidade esses m esmos paços

por 30 mil cruzados. Neste sentido foi expedido um alvará em

17 de Maio de 1597, e se fez a carta de venda, em n ome de el-

rei, a 16 de Setembro do mesmo ano. No reinado de F ilipe I

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recebeu a Universidade estatutos por duas vezes, um a em 1592,

sendo trazidos de Madrid pelo Dr. António Vaz Cabaç o,

resultantes da reformação operada por Manuel de Qua dros;

outra, os novos estatutos confirmados em 8 de Junho de 1597, e

trazidos de Madrid pelo Dr. Rui Lopes da Veiga.

Filipe I, o rei ambicioso e desumano, que todos esm agava

com o seu feroz despotismo, faleceu coberto de verm es e de

úlceras, depois dum doloroso e demorado sofrimento.

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Filipe III de Espanha e II de

Portugal

n. 1578

f. 31 de Março de 1621

O Pio. Nasceu em Madrid em

1578, onde também faleceu em

31 de Março de 1621. Era filho

de Filipe II, e de sua quarta

mulher, D. Ana de Áustria.

Subiu ao trono em 1598,

contando 20 anos de idade.

Tinha um carácter fraco,

apático e irresoluto, e foi

completamente dominado pelo

seu ministro duque de Lerma,

D. Cristóvão de Moura, que

fora elevado a marquês de Castelo Rodrigo, e nomead o vice-rei

de Portugal, o que muito indignou os portugueses, a pesar da

sua administração ser das mais hábeis, segundo cons ta. O duque

de Lerma procurava um pouco favorecer Portugal e ci mentar a

união dos dois reinos da península, adoptando medid as de

grande importância. Assim tratou tanto quanto possí vel do

desenvolvimento da marinha, aboliu os Portos secos, as

alfândegas, abriu os Portos de Portugal ao comércio inglês, e

por algum tempo também os abriu ao comércio holandê s, mas essa

ultima medida pouco tempo durou, o que prejudicou m uito

Portugal. Em 1609, vendo que não podia lutar por ma is tempo

com os estados da Holanda, assinou com eles uma tré gua de doze

anos, mas tão ineptamente procedeu o marquês de Cas telo

Rodrigo que, assinando a trégua na Europa, deixou q ue

continuassem as hostilidades nas colónias, onde mai s

prejudiciais eram ao país. Por essa mesma época pub licou

Page 17: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

Filipe III um edito expulsando definitivamente de E spanha os

descendentes dos mouros. Depois da conquista de Gra nada por

Fernando o Católico, esses moiros tinham sido força dos a

abraçar o Cristianismo, formavam uma massa de popul ação

submissa, industriosa, cultivando admiravelmente a terra e

enriquecendo o Estado, mas o fanatismo espanhol não lhes

perdoava a sua origem. A sua expulsão foi uma grand e

fatalidade para a península, que perdeu perto de um milhão doa

seus habitantes mais industriosos, e arruinou a sua

agricultura e a sua indústria. Desses desgraçados, os que se

recusavam a abandonar a pátria, eram perseguidos co mo feras e

assassinados, ficando somente as crianças de menos de 7 anos,

que se venderam como escravas, depois de se baptiza rem. Esta

expulsão dos moiros não foi movida só pelo fanatism o, porque

Filipe III tratava ao mesmo tempo com os judeus de Portugal

para os proteger contra os rigores da Inquisição, a troco dum

subsídio importante. Ao marquês de Castelo Rodrigo sucedera no

governo de Portugal o bispo de Coimbra, a este o bi spo de

Leiria, voltara depois ao marquês, novamente ao bis po de

Leiria, ao arcebispo de Braga, ao arcebispo de Lisb oa, e

finalmente ao marquês de Alenquer, espanhol de orig em, e que

por conseguinte estava completamente fora das condi ções

estipuladas pelas cortes de Tomar. O descontentamen to dos

portugueses era geral, e Filipe III, que não o igno rava,

empreendeu uma viagem a Portugal, resolução que mui to aplaudiu

o novo ministro e valido, o duque de Uzeda, filho d o duque de

Lerma, que descaíra do valimento real, e se havia a fastado da

corte. A viagem realizou-se em 1619. Dela ficou a

interessantíssima narrativa ilustrada de João Bapti sta

Lavanha, e que, embora impressa em Madrid, o foi à custa da

cidade de Lisboa. O soberano foi acolhido por toda a parte com

o maior entusiasmo, as câmaras e as corporações por tuguesas

gastaram enormes somas para uma pomposa recepção, e sperando

grandes proveitos desta viagem, imaginando que o so berano

Page 18: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

daria providencias contra os danos de que todos se queixavam

das arbitrariedades dos governadores. Filipe III, p orém, nada

fez, nem sequer soube cativar simpatias. Insinuou-s e-lhe que

fizesse de Lisboa a capital da vasta monarquia espa nhola, e

Filipe nem se dignou responder; os fidalgos e os

jurisconsultos queixaram-se de que nem recebiam mer cês, nem

eram empregados nos tribunais, nas embaixadas, nas

universidades espanholas, e Filipe não fez o mínimo caso

destas reclamações. O duque de Uzeda, muito menos h ábil que

seu pai tratou com aspereza o duque de Bragança, qu e viera

também prestar homenagem à majestade castelhana. De pois de

estar alguns mexes em Lisboa, sem fazer mais do que causar

grandes despesas aos seus súbditos portugueses, Fil ipe

retirou-se em Outubro do referido ano de 1619, deix ando

Portugal descontentíssimo, agravando-se ainda mais esse

descontentamento, depois da sua saída, com a recond ução do

marquês de Alenquer no cargo de vice-rei de Portuga l. Na

Índia, contudo, mantinha-se o nosso domínio, ainda que, a

muito custo; os holandeses já tinham tentado tomar- nos as

Molucas, Malaca e Moçambique, mas batidos por André Furtado de

Mendonça e Estêvão de Ataíde, haviam desistido dess a empresa.

Na América também os holandeses ainda não tinham at acado as

nossas colónias. Filipe III casou com D. Margarida de Áustria,

filha do arquiduque Carlos, no dia 18 de Abril de 1 599. Ao

sair de Portugal Filipe adoeceu gravemente em Covar rubias, e

nunca mais se restabeleceu, falecendo pouco mais du m anuo

depois. Diz-se que a sua morte foi devida ao rigor de

etiqueta, porque sentindo-se muito incomodado com o calor dum

braseiro, teve de o suportar enquanto não apareceu o fidalgo,

que pela sua hierarquia, segundo as praxes palacian as, era

encarregado de o fazer remover para outro lugar. No Panorama,

vol. II da 2.ª série, 1843, a pág. 218, 238 e 253, vem uma

narrativa intitulada O Brazeiro, em que se descreve este

facto. No seu reinado publicou-se a reforma das Ord enações do

Page 19: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

reino, que Filipe II tratou logo no começo do seu r einado;

apesar de já estar concluída em 1597, só veio a pub licar-se em

1603. São as conhecidas ordenações denominadas Fili pinas, e

que na ordem dos tempos foram precedidas pelas inti tuladas

Afonsinas e Manuelinas.

Page 20: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

Filipe IV de Espanha e III de

Portugal

n. 8 de Abril de 1605

f. 7 de Setembro de 1665

O Grande. Nasceu em Madrid

a 8 de Abril de 1605, onde

também faleceu a 7 de Setembro

de 1665. Era filho de Filipe

III, de Espanha, e da rainha

sua mulher, D. Margarida de

Áustria.

Em 14 de Julho de 1619 foi

jurado príncipe de Portugal, e

aos 16 anos de idade, em 1621,

sucedeu no trono por morte de

seu pai. Logo no começo do seu

reinado chamou para junto de si D. Gaspar de Guzman , que fez

conde-duque de Olivares, que se tornou o seu minist ro e valido

homem em que depositava a maior confiança e a quem entregou

completamente a administração dos negócios do Estad o. O novo

valido era mais activo e mais inteligente que os an teriores

ministros, os duques de Lerma e de Uzeda, mas pela sua má

política, foi mais prejudicial do que eles ao rei e aos países

que governava. Julgando conseguir os seus fins adop tando

medidas rigorosas, tomou tais providências com rela ção a

Portugal, que provocou a maior resistência. O que o s

portugueses aceitaram de bom grado, serenando mais os ânimos

irrequietos, foi a demissão do marquês de Alenquer, que era o

vice-rei de Portugal, substituindo-o por uma junta de três

membros, composta do conde de Basto, D. Nuno Alvare s Portugal

e o bispo de Coimbra. Seria decerto um bom ensejo p ara se

entrar numa politica conciliadora, muito mais, conh ecendo-se a

Page 21: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

irritação que lavrava em Lisboa e nas províncias, m as o conde-

duque não viu ou não quis ver a gravidade da situar ão, e

seguiu um caminho cheio de precipícios. Promulgou, em nome do

rei, decretos sobre bens da Coroa, sobre a fiscaliz ação

financeira, que feria os interesses do povo, decret os que

começaram a suscitar grande indignação; arrancou tr ibutos ao

país, a título de subsídios voluntários, publicou f echar outra

vez os Portos do reino aos holandeses, medidas que muito

contribuíram para a ruína do país, que tivera algum as

esperanças de lucrar com a actividade e inteligênci a do novo

ministro e valido. A esta situação pouco tranquiliz adora

sobrevieram factos que seriamente inquietavam o con de-duque, e

que o obrigaram a empregar toda a energia.

A trégua com as Províncias Unidas estava concluída, e a

luta recomeçava não muito desvantajosa na Europa, o nde Spínola

mantinha o prestigio das armas espanholas, mas nas colónias,

onde o desmoronamento estava sendo completo, princi palmente

nas colónias portuguesas menos protegidas que as de Espanha,

pelo egoísmo inepto do governo de Madrid. Em 1623, Ormuz caiu

em poder dos persas auxiliados pelos ingleses; em 1 624, os

holandeses tomaram Baía; no entretanto, Macau e a M ina foram

heroicamente defendidas; repeliram os holandeses, e a Baia

foi-lhes reconquistada em 1625, por uma forte esqua dra, que o

conde-duque de Olivares mandou rapidamente aprestar , com o

auxílio do patriotismo português, então vivamente e xcitado.

Contudo, o ministro bem calculava que os holandeses deveriam

continuar a inquietá-lo, porque a França aliara-se com os

protestantes da Alemanha, com a Dinamarca e a Holan da, sendo

um dos planos desses aliados o enfraquecimento da E spanha

pelos repetidos assaltos dados ás suas colónias pel as

esquadras holandesas. Para resistir àquela aliança, entendeu

Olivares que devia ligar fortemente os diferentes r einos que

constituíam a monarquia espanhola, quebrando os for os e as

isenções que cada um deles guardava com a maior ten acidade.

Page 22: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

Para realizar esse plano começou por enfraquecer os diversos

reinos, exigindo-lhes pesados impostos, especialmen te a

Portugal, que no plano tributário ocupava o primeir o lugar. O

conde-duque de Olivares, de tal forma o oprimiu que o povo se

revolucionou, cansado de tantas violências. Não ten do já sobre

que lançar impostos, chegou até a tributar as maçar ocas, o que

amotinou as regateiras do Porto, que correram à ped rada

Francisco de Lucena, que fora ali encarregado de di stribuir e

cobrar o novo imposto. (V. Maçarocas, imposto das). Os

governadores do reino, o conde de Basto e D. Afonso Furtado de

Mendonça eram os primeiros a protestar contra os in auditos

tributos e tão repetidas vexações, ponderando ao go verno de

Madrid que o povo, já tão oprimido e massacrado, po deria

reagir energicamente, mas os seus protestos não for am ouvidos,

e o implacável ministro castelhano ainda mais agrav ou os

impostos, recomendando aos agentes fiscais que proc edessem com

o máximo rigor contra os que não pagassem pontualme nte. Era

duma sofreguidão insaciável; Olivares empregava mil formas

para arrancar dinheiro a Portugal, já alcançando do s cristãos

novos milhão e meio de cruzados a troco de um indul to que lhes

oferecia, já levantando empréstimos, que eram verda deiros

tributos, já promovendo subscrições, a que dava o n ome de

voluntárias, a pretexto de socorrer as colónias. As ordens do

conde-duque de Olivares tinham hábeis executores em Diogo

Soares, secretário do conselho de Portugal em Madri d, e no seu

parente, o celebre Miguel de Vasconcelos, nomeado e scrivão de

fazenda e secretário de Estado de Portugal, quando a duquesa

de Mântua, parenta de el-rei, foi nomeada em 1631 v ice-rainha

de Portugal.

Este homem tornou-se justamente odioso aos portugue ses pelo

modo como desempenhava a sua missão de secretário d e Estado.

Os impostos eram cada vez mais odiosos. Olivares ti vera a

ideia de obrigar os portadores de títulos de divida publica a

um empréstimo forçado, mandando que os tesoureiros das

Page 23: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

alfândegas retivessem um trimestre de juros aos por tadores, a

quem os pagavam. Com esta simplicidade entendia tam bém Miguel

de Vasconcelos que se deviam cobrar os tributos. Fo i ele quem

lembrou que, em vez de se lançarem tributos novos n este ou

naquele género, se lançasse ao reino de Portugal um a finta de

500:000 cruzados, finta que as câmaras distribuiria m depois

entre os contribuintes como lhes aprouvesse. A paci ência

popular estava esgotada; de tantos sacrifícios e ve xames

resultara o povo revolucionar-se. Em Évora romperam os

tumultos e com Poda a energia, em que tanto se sali entou o

celebre Manuelinho de Évora. Contudo, tomaram um ca rácter

exclusivamente democrático, que foi muita prejudici al, porque

a nobreza em vez de se aliar à insurreição, viu-se insultada

pelo povo, e o mais que pôde fazer, em atenção ao p atriotismo,

foi apresentar-se como medianeira deixando a revolu ção

entregue ás suas próprias forças, mas o movimento p ropagou-se

com bastante rapidez no Alentejo, Algarve, Porto e em alguns

pontos do Minho. Faltava, porém, um chefe, direcção e unidade

neste ímpeto revolucionário. Olivares aproveitou-o como

pretexto para trazer tropas castelhanas a Portugal, punindo

severamente os revoltosos de Évora, e tornando aind a mais

despótico e opressor o jugo que fazia pesar sobre P ortugal.

Esperava que o povo português reagisse de novo, dan do-lhe

pretexto para poder aniquilar completamente a nossa autonomia.

Tomara para isso todas as precauções necessárias. F ora

chamando a Espanha pouco a pouco os principais fida lgos

portugueses, invocando diferentes pretextos, mas na realidade

para tirar à revolução, que esperava, os seus natur ais chefes;

mandava alistar em Portugal terços que remunerava b em para

irem servir em Flandres, apoderava-se de todos os n avios

portugueses, e dera ordem à, esquadra de D. António de Oquendo

que viesse para Lisboa, afim de dar força à proclam ação da

união definitiva de Portugal com a Espanha.

Page 24: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

Receando que o duque de Bragança se resolvesse a ca pitanear

uma insurreição, resolveu Olivares enleá-lo de tal modo que,

ou se declarasse formalmente em oposição ao governo espanhol,

e então seria um pretexto para o obrigar a sair do reino, ou

se tornasse cúmplice do domínio espanhol, fazendo-s e executor

das suas ordens mais odiadas. D. João aceitou o car go de

presidente de uma junta de defesa do reino, e nessa qualidade

veio até Almada, onde os fidalgos lhe pediram para tomar a

Coroa. D. João recusou, mas se a sua timidez o impe dia de se

lançar no caminho da revolução, o seu natural bom s enso fazia

com que se escapasse dos laços de Olivares, e evita sse a

posição falsa em que o ministro castelhano o preten dia

colocar, procedendo de modo que todos percebessem q ue ele

andava ali forçado e tratando dos interesses do nos so país.

Procurando por todas as formas desprestigiar, desmo ralizar e

enfraquecer Portugal, Olivares não hesitava em reco mendar a

Miguel de Vasconcelos que promovesse tanto quanto p ossível a

desonra e o descrédito das famílias nobres; fazendo com que se

lhes seduzissem as filhas, indicação que pareceria fantasiada,

se não estivesse publicada a correspondência sobre este

assunto, entre Diogo Soares e Miguel de Vasconcelos . Os planos

do conde-duque de Olivares não se realizaram, porqu e a

esquadra do almirante Oquendo foi derrotada pelos h olandeses

na batalha do Canal, porque a guerra dos Trinta Ano s

recrudesceu, achando-se a Espanha a braços com todo o poder da

França, porque a Catalunha, que via os seus foros j á

suprimidos violentamente por Olivares, respondeu à opressão

com a revolução, e, expulsando o vice-rei e as trop as

castelhanas, declarou-se em insurreição aberta. Os

acontecimentos das colónias, que estavam cada vez e m piores

circunstâncias, tendo-nos tomado os holandeses Pern ambuco,

Paraíba, Maranhão, S. Jorge da Mina e Malaca, indig navam

seriamente os portugueses que já tinham reagido com toda a

energia contra a imprudência com que o conde-duque de Olivares

Page 25: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

quisera mandar em socorro do México uma esquadra, e quipada à

custa do tesouro português e destinada ao Brasil.

A notícia da insurreição da Catalunha veio agitar a inda

mais a opinião pública. Olivares aproveitou esse ac ontecimento

para arrancar mais tropas a Portugal, e chamar a Ma drid

quantos fidalgos pôde, sendo o primeiro que chamou o duque de

Bragança. Em Lisboa conspirava um grupo de fidalgos de acordo

com João Pinto Ribeiro, procurador do duque de Brag ança, para

lhe darem a Coroa. D. João, vendo que não podia des obedecer ás

ordens do governo de Espanha, que o chamava a Madri d, senão

pondo-se à frente da revolução, deu o seu consentim ento, e o

glorioso dia primeiro de Dezembro de 1640 raiou fin almente, em

que Portugal readquiriu a sua independência depois de tio anos

de ignominiosa opressão sob o domínio de três monar cas

castelhanos. Filipe IV de Espanha e III de Portugal , enquanto

o seu ministro e valido conde-duque de Olivares gov ernava

abertamente, cavando com os seus planos e as suas t eorias a

ruína de Espanha, empregava o tempo divertindo-se, caçando,

escrevendo comédias, namorando actrizes, com especi alidade

Maria Calderon, de quem teve um filho, que foi depo is D. João

de Áustria, um dos generais espanhóis de maior nome ada; e

fazia-se retratar por Velásquez e Rubens. Apesar da sua

indiferença, causou-lhe uma certa sensação a perda de

Portugal, e desde então começou a desgostar-se do v alido, que

não tardou a substituir por D. Luís de Haro. Deram- se em

seguida grandes batalhas, como as das Linhas de Elv as, do

Ameixial, de Castelo Rodrigo, terminando a campanha da

Independência com a de Montes Claros, em 1665.

Filipe faleceu pouco depois desta batalha. Tinha ca sado com

D. Isabel de Bourbon, filha de Henrique IV, de Fran ça.

Page 26: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

D. João IV

Filho de D. Teodósio,

duque de Bragança e de D. Ana

Velasco, casou em 1633 com D.

Luísa de Gusmão, espanhola da

casa de Medina Sidónia.

Já em 1638, os conjurados

da Revolução de 1640 tinham

procurado obter a aceitação de

D. João para uma revolta

contra Espanha. Mas as

hesitações, ou cautelas, do

duque fizeram levantar a

hipótese de se conseguir o

regresso do infante D. Duarte, solução que falhou, tendo-se

mesmo encarado a instauração de uma república, nos moldes da

das Províncias Unidas.

A verdade é, que depois da sua aclamação como rei a 15 de

Dezembro de 1640, todas as hesitações desapareceram e D. João

IV fez frente às dificuldades com um vigor que muit o

contribuiu para a efectiva restauração da independê ncia de

Portugal. Da actividade global do seu reinado, deve remos

destacar o esforço efectuado na reorganização do ap arelho

militar - reparação das fortalezas das linhas defen sivas

fronteiriças, fortalecimento das guarnições, defesa do

Alentejo e Beira e obtenção de material e reforços no

estrangeiro; a intensa e inteligente actividade dip lomática

junto das cortes da Europa, no sentido de obter apo io militar

e financeiro, negociar tratados de paz ou de trégua s e

conseguir o reconhecimento da Restauração; a acção

desenvolvida para a reconquista do império ultramar ino, no

Brasil e em Africa; a alta visão na escolha dos col aboradores;

Page 27: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

enfim, o trabalho feito no campo administrativo e l egislativo,

procurando impor a presença da dinastia nova.

Quando morreu, o reino não estava ainda em seguranç a

absoluta, mas D. João IV tinha-lhe construído umas bases

suficientemente sólidas para vencer a crise. Sucede u-lhe D.

Afonso VI, seu segundo filho.

Ficha genealógica:

D. João IV nasceu em Vila Viçosa, a 19 de Março de 1604 e

morreu em Lisboa, a 6 de Dezembro de 1656, tendo si do

sepultado no Mosteiro de S. Vicente de Fora. Era fi lho de D.

Teodósio II, 7 ° duque de Bragança, e de sua mulher , D. Ana de

Velasco. Do seu casamento, celebrado em 12 de Janei ro de 1633,

com D. Luísa Francisca de Gusmão, que nasceu em San Lucar de

Barrameda, a 13 de Outubro de 1613, e morreu em Lis boa a 27 de

Outubro de 1666, filha do 8 ° duque de Medina-Sidón ia, D. Juan

Manuel Pérez de Guzman, e da duquesa D. Joana de Sa ndoval,

nasceram:

1. D. Teodósio, que nasceu em Vila Viçosa a 8 de Fe vereiro

de 1634 e morreu em Lisboa, a 13 de Maio de 1653. F oi 9 °

duque de Bragança e príncipe do Brasil, em 1645;

2. D. Ana, que nasceu em Vila Viçosa, a 21 de Janei ro de

1635 e morreu no mesmo dia; estando enterrada no Co nvento das

Chagas daquela vila;

3. D. Joana, que nasceu em Vila Viçosa a 18 de Sete mbro de

1635 e morreu em Lisboa, a 17 de Novembro de 1653; sepultada

no Mosteiro dos Jerónimos e mais tarde trasladada p ara o

Mosteiro de S. Vicente de Fora;

4. D. Catarina, que nasceu em Vila Viçosa, a 25 de Novembro

de 1638 e morreu em Lisboa, a 31 de Dezembro de 170 5. Foi

sepultada no Mosteiro dos Jerónimos e mais tarde tr asladada

para o Mosteiro de S. Vicente de Fora. Foi rainha d e

Inglaterra pelo seu casamento, em 1661, com o Carlo s II, rei

de Inglaterra, que morreu em 16 de Fevereiro de 168 5;

Page 28: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

5. D. Manuel, que nasceu em Vila Viçosa, a 6 de Set embro de

1640 e faleceu no mesmo dia, tendo sido sepultado n o Convento

de S. Francisco daquela vila;

6. D. Afonso VI, que herdou a coroa;

7. D. Pedro II, que sucedeu ao precedente;

Teve D. João IV uma filha ilegítima, de mãe desconh ecida:

8. D. Maria, que nasceu em Lisboa, a 30 de Abril de 1644, e

morreu em Carnide, a 7 de Fevereiro de 1693, no Con vento de S.

João dos Carmelitas Descalços. Foi reconhecida pelo

progenitor, o qual lhe fez mercê das vilas de Torre s Vedras e

Colares e dos lugares de Azinhaga e Cartaxo, tendo- se dado à

vida religiosa.

Page 29: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

D. Afonso VI

Rei de Portugal.

Sexto filho de D. João IV

e de D. Luísa de Gusmão.

Atacado na infância por

doença não identificada, fica

mental e fisicamente

diminuído. Com a morte de seu

irmão D. Teodósio e de seu

pai, sobe ao trono com treze

anos, pelo que a regência

ficou entregue a sua mãe. O

rei foi crescendo, rebelde a

toda a acção educadora,

levando uma vida desregrada e manifestando-se perfe itamente

incapaz para assumir as responsabilidades do govern o.

Um dos seus companheiros, na vida de arruaceiro que levava,

António Conti, italiano de origem, insinuou-se-lhe de tal

maneira que em breve passou a viver no Paço, a conv ite de D.

Afonso VI e a ter influência nos negócios do govern o do reino.

O escândalo aumentou a um ponto que D. Luísa de Gus mão fez

jurar herdeiro do trono o infante D. Pedro e Antóni o Conti foi

preso. Logo a seguir, o conde de Castelo Melhor exe cuta um

golpe de Estado, compelindo D. Luísa a entregar o g overno a D.

Afonso VI e forçando-a a retirar-se para um convent o.

Nas boas graças do rei, Castelo Melhor lança-se na sua

curta a brilhante carreira política, terminando vit oriosamente

com a guerra da Restauração e conseguindo casar D. Afonso com

Mademoiselle de Aumale. Em breve a nova rainha entr a em

conflito com Castelo Melhor.

Giza-se nova conspiração no paço, de que resulta a demissão

do conde e a abdicação de D. Afonso VI. D. Pedro to ma as

rédeas do poder, casa com a cunhada, depois da anul ação do

Page 30: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

casamento desta com D. Afonso e este último é deste rrado para

Angra do Heroísmo em 1669, donde regressa em 1674, sendo então

encerrado no Palácio de Sintra até à sua morte.

Ficha genealógica:

D. Afonso VI nasceu em Lisboa, a 12 de Agosto de 16 43 e

morreu em Sintra, a 12 de Setembro de 1683, tendo s ido

sepultado no Mosteiro dos Jerónimos e trasladado pa ra o

Mosteiro de S. Vicente de Fora. Casou em 1666 com D . Maria

Francisca Isabel de Sabóia, que nasceu em Paris, a 21 de Junho

de 1646, e morreu em Lisboa, a 27 de Dezembro de 16 83, estando

sepultada na igreja do Convento das Francesinhas e trasladada

em 1912, para o Mosteiro de S. Vicente de Fora, fil ha de

Carlos Amadeu de Sabóia, duque de Nemours, e de Isa bel de

Vendôme. Morreu sem descendência.

Page 31: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

D. Pedro II

Último dos sete filhos de

D. João IV, quarto na ordem de

sucessão, nascido em 1648, foi

vigésimo terceiro rei de

Portugal e o terceiro da

Dinastia de Bragança, pelo

imperativo duma solução

política de emergência na mais

grave conjuntura das primeiras

décadas da Restauração, tão

recente como ainda

periclitante.

Um signo funesto parecia

pesar sobre os destinos da nascente dinastia. Não d esistia o

orgulho da Espanha de eliminá-la radicalmente por g uerra de

reconquista. Consumira-se o fundador, exausto na lu ta, sem ter

podido consolidá-la. Por cúmulo, três anos antes da sua morte,

falecera-lhe em 1653, aos 19 anos de idade, o primo génito,

príncipe D. Teodósio, em quem seu pai fundava as me lhores

esperanças. Ficava-lhe por sucessor, ainda menor de 13 anos, o

infante D. Afonso, com os defeitos que o incompatib ilizavam

com o exercício da realeza e as consequências polít icas da sua

doentia inferioridade, a principal das quais foi o golpe de

estado que elevou à situação de primeiro-ministro,

aparentemente na modesta designação de escrivão da puridade do

monarca, mas na função efectiva de verdadeiro sober ano, o

conde de Castelo Melhor.

Entretanto em 1666, para assegurar-lhe a sucessão e o apoio

do poderoso Luís XIV, o diligente ministro negociar a o

casamento de D. Afonso VI com uma princesa de Franç a,

Mademoiselle d'Aumale, D. Maria Francisca Isabel de Sabóia,

sobrinha de Luís XIV e neta de Henrique IV. E foi e sse o único

Page 32: Biografias Reis da União Ibérica ao fim da Guerra da Restauração

acto imprudente do sagaz político, tão fatal para a desgraça

do rei, como para os seus próprios planos ambicioso s duma

política de engrandecimento do Reino. Realizado em 1666,

resultou o casamento irreparavelmente desastroso, d ada a

incapacidade física e moral do rei. Foi praticament e o

detonador da segunda revolução de palácio, em 1667, encabeçada

agora pelo infante D. Pedro, com o apoio de todos o s inimigos

de Castelo Melhor, invejosos da sua fortuna polític a.

Educada na dissoluta corte de Versalhes, a nova e f ormosa

rainha D. Maria Francisca, vexada por tal consórcio ,

apaixonou-se pelo brilhante cunhado D. Pedro, de 18 anos. Nos

seus delituosos amores, ambos conluiaram novo golpe político.

Em certa manhã de Novembro de 1667, a rainha abando nava o Paço

e, de concerto com o infante D. Pedro, refugia-se n o Convento

da Esperança, aonde logo ele acorria a seu favor, c om o

Conselho de Estado; e, depois de tumultos vários, o rei era

coagido a assinar a sua própria deposição e entrega do governo

do Reino a seu irmão, o qual, em nome da rainha, as sumia o

poder como príncipe-regente, desterrando para os Aç ores o

irmão destronado e, depois de rápido e escandaloso divórcio,

casava com a cunhada em Abril de 1668, dela tendo l ogo em

Janeiro do ano seguinte a sua primeira e única filh a, a

princesa D. Isabel Luísa.

Consumara-se a dupla usurpação do trono e da mulher .

Assim dramaticamente, com 20 anos apenas, começava D.

Pedro, em 1668, a sua atribulada vida política. Def rontava-se

de entrada com a gravíssima situação económica e fi nanceira do

Portugal restaurado, arruinado por vinte e oito ano s de guerra

sem tréguas, depois dos sessenta de estragos direct os e

indirectos do domínio filipino.

Resolutamente se esforçou desde logo o usurpador po r

administrar bem, com acerto, chamando ao Conselho, para

conjurar a crise, um escol de homens notáveis pela cultura e

pelo carácter, como Diogo Rodrigo de Macedo, o 3.º conde da

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Ericeira, D. Luís de Meneses, e outros economistas, homens

cultos, informados já pelas novas teorias económica s

fisiocráticas de Colbert, grande ministro das Finan ças de Luís

XIV.

Nada, porém, remediavam de momento as suas tentativ as de

reformas drásticas, por inoperantes em país tão dev astado pela

guerra, desfalcado de população produtiva, com as l avouras ao

abandono, sem indústrias fabris e inveteradamente v iciado no

gozo falaz da ilusória opulência do comércio do Ori ente, já

reconhecidamente ruinoso para o Estado e para a Naç ão desde os

tempos de D. João III e Pêro de Alcáçova Carneiro.

Restava à Metrópole, como esteio económico, o Brasi l, com

sua próspera actividade, agro-industrial de plantaç ões e

engenhos de açúcar, exportação de pau-brasil e outr as madeiras

e produtos exóticos, além da intensiva pesquisa de minas de

ouro e prata que se presumia existirem a oeste, com o nos

sertões do Peru e da Bolívia, próximos em continent al

continuidade. No afã de se acudir por todos os meio s à ameaça

duma bancarrota à vista, recorria-se ainda compleme ntarmente à

valorização económica dos domínios de África. Em 16 78 tentava-

se uma colonização militar em Moçambique, para fixa ção de

colonos e exploração agrícola, e desenvolvia-se na

fertilíssima região da Zambézia um símile de capita nias

donatárias, à semelhança das do Brasil, com as conc essões de

terras, a que se deu a designação oficial de prazos da Coroa.

Na Guiné, em Cabo Verde, em Angola, que praticament e viviam do

tráfico de escravatura, incrementava-se por meios a dequados o

fomento agrícola e comercial, criando companhias de comércio

privilegiadas, como as de Cacheu e Cabo Verde e out ras,

disseminando feitorias e povoações comerciais nas z onas mais

populosas de Angola e Moçambique.

Tudo, porém, pouco mais do que inútil. Progressivam ente se

agravavam a penúria e decadência material da Metróp ole, sob a

regência de D. Pedro, cujo reinado legítimo só prop riamente

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começara em 1683, por morte do irmão proscrito, sem

descendência, na sua prisão-desterro do Paço de Sin tra, para

onde viera transferido dos Açores (ilha Terceira), depois de

malograda, pela execução dos cabecilhas, a conjura de 1673,

para o libertar e repor no trono.

De perto o seguiu no túmulo, ainda nesse ano, a pró pria

rainha D. Maria Francisca, sua ex-mulher, sem outro s herdeiros

além da infanta D. Isabel Luísa. Já rei de facto, p roclamado

em Cortes, D. Pedro II casava, em segundas núpcias, com D.

Maria Sofia de Neuburgo, princesa bávara do Palatin ado do

Reno, que em 1689 lhe assegurava a sucessão da coro a em varão

herdeiro dando à luz o príncipe D. João, depois D. João V,

logo como tal proclamado, em substituição da prince sa Isabel

Luísa, das primeiras núpcias, falecida pouco depois , aos 22

anos de idade.

Nesse mesmo ano de 1690 a situação agravava-se com o

suicídio do 3.0 conde da Ericeira, seu vedor da Faz enda, numa

crise aguda de neurastenia, exacerbada pela inanida de da sua

sábia administração desde 1675 e de todos os seus p lanos da

criação de indústrias fabris para ressurgimento da Metrópole

em sólidas bases económicas. Era o sinal de alarme duma

inevitável ruína financeira a curto prazo, que arra staria

possivelmente a própria Nação à catástrofe duma des agregação

política, precursora de definitiva absorção por Esp anha. De

resto, já mesmo em 1683, ano da proclamação do rei em Cortes,

era tão patente e generalizada a previsão dessa fat alidade que

o próprio D. Pedro II chegara a encarar seriamente o propósito

de renunciar à coroa e retirar para o Brasil, abdic ando na

filha D. Isabel e em quem viesse a ser seu marido.

Dissuadiram-no dessa espécie de deserção o confesso r e o seu

conselheiro secreto, sem que por esse facto se desa nuviassem

as perspectivas do pessimismo que havia levado ao s uicídio o

seu mais ilustre vedor da Fazenda. Em 1685, cedia e nfim ao

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acto de generosidade de autorizar o regresso de Cas telo

Melhor, já velho e sem veleidades políticas.

Nesse destino lúgubre se teria talvez afundado, com a

dinastia, a sobrevivência da Nação, se nos fins do século não

tivesse providencialmente chegado à corte a alvoroç ada notícia

da descoberta de minas de ouro e brilhantes no Bras il, a

coroarem de pleno êxito as exaustivas e pertinazes incursões

do bandeirismo paulista nas selvas e sertões a oest e do imenso

e inexplorado estado americano.

Como o rendimento fiscal da Coroa era desde logo o quinto

da mineração, a primeira remessa de 1699 trazia a D . Pedro,

além de 11000 quilos de ouro amoedado, o valor de s ete milhões

de cruzados, na transacção de brilhantes em Amester dão; e até

final do reinado o quinto devido à Coroa orçaria po r cerca de

cinco milhões de cruzados.

Era uma ressurreição de desvairantes esperanças!

Considerados desnecessários, e logo abandonados, to dos os

planos de sadia reformação económica por exploração metódica

das próprias riquezas da Metrópole, e por isso tamb ém já

despiciendo, por supérfluo, o acordo comercial nego ciado com

Inglaterra em 1703, conhecido por Tratado de Methue n. Era,

aliás, de vantagens problemáticas para a nossa econ omia a

colocação dos nossos vinhos em Inglaterra, mas subs tancial

para esta a colocação entre nós de seus lanifícios. O fortuito

caudal de ouro e pedras preciosas do Brasil tudo vi ria suprir

e sanar sem mais cuidados para o futuro da dinastia .

Ter-lhe-ia, pois, terminado em glória o tormentoso reinado

sem a aventura militar em que por fim precipitava o Reino,

acedendo a pressões inglesas para se imiscuir també m, como

aliado, no imbróglio inextricável da Guerra de Suce ssão de

Espanha, em que rigorosamente não se pleiteavam vit ais

interesses materiais ou políticos para a Nação, nem mesmo a

defesa do seu território ou da honra nacional, que, pelo

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contrário, ficavam sob a permanente ameaça das cont ingências

duma guerra, sempre imprevisíveis.

Aderindo à tripla aliança anglo-austro-holandesa co ntra o

bloco bourbónico franco-espanhol, D. Pedro obrigava -se, por

acordo de 1703, a fornecer aos aliados um exército de 28 000

homens e, pior que tudo, à cedência do próprio terr itório

pátrio para teatro de operações, como a melhor base

estratégica de invasão da Espanha.

Favorável de começo a campanha, pelos êxitos efémer os do

exército do marquês das Minas na sua marcha e entra da triunfal

em Madrid (1706), evoluiria em breve desastrosament e para os

aliados, depois da sua decisiva derrota na batalha de Almansa,

em Espanha (1707), a que se seguiu a contra-ofensiv a espanhola

sobre Portugal, em cujas fronteiras, forçosamente

desguarnecidas, a batalha do Caia foi outra--derrot a para o

exército anglo-português.

Em suma, por sua morte, em 1706, o rei, cognominado

Pacífico, deixava ao sucessor, com várias praças do Alentejo

ocupadas por espanhóis, o encargo de liquidar uma g uerra

inglória e dispendiosa que, no reinado seguinte, se arrastaria

por mais seis anos e de que a única vantagem positi va para a

Nação, pelo Tratado de Paz de Utreque, ratificado e m 1713 com

a França e em 1715 com a Espanha, viria a ser a de se ter

salvo, ao menos, a integridade dos seus domínios do Ultramar.

Em reinado de tão tumultuária política interna e ex terna, a

actividade cultural da Nação não sofreu, todavia, o colapso ou

afrouxamento que seria de esperar, quer na expressã o

literária, em que fulgurara o talento dum António V ieira,

mestre e renovador da língua, quer nas artes plásti cas,

pintura religiosa e arquitectura religiosa e civil, em que o

barroquismo seiscentista, com toda a sua sobrecarga de

decoração ornamental, teve entre nós e no Brasil o seu período

áureo e de carácter tão inconfundivelmente nacional como o

manuelino, no século XVI.

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Ficha genealógica:

D. PEDRO II nasceu em Lisboa, a 26 de Abril de 1648 , e

faleceu em Lisboa a 1 de Dezembro de 1706; tendo si do

sepultado no Mosteiro de S. Vicente de Fora. Do seu primeiro

casamento, com a cunhada D. Maria Francisca Isabel de Sabóia,

teve:

1. D. Isabel Luísa Josefa (n. em Lisboa, a 6 de Jan eiro de

1668; f. no palácio de Palhavã, a 21 de Outubro de 1690;

sepultada no Convento das Francesinhas, erigido por sua mãe, e

transladada para o Mosteiro de S. Vicente de Fora). Foi

herdeira presuntiva do Reino entre 1668 e 1689, ten do-se

malogrado o projecto de consórcio com Vítor Amadeu de Sabóia.

Do segundo casamento de D. Pedro II, com D. Maria S ofia de

Neuburg (n. em Brewath, a 6 de Agosto de 1666; f. e m Lisboa, a

4 de Agosto de 1699; sepultada no Mosteiro de S. Vi cente de

Fora), filha de Filipe Guilherme de Neuburg, eleito r palatino

do Reno, e de sua mulher Isabel Amália, nasceram os seguintes

filhos:

2. D. João (n. em Lisboa, a 30 de Agosto de 1688; f . em 17

de Setembro seguinte; sepultado em S. Vicente de Fo ra);

3. D. João, que herdou o trono;

4. D. Francisco Xavier José António Bento Urbano (n . em

Lisboa, a 25 de Maio de 1691; f. na quinta das Gaei ras, em

Óbidos, a 21 de Julho de 1742; sepultado no Mosteir o de S.

Vicente de Fora). Foi 7 ° duque de Beja, grão-prior do Crato e

senhor do Infantado. Morreu solteiro e sem descendê ncia;

5. D. António Francisco Xavier José Bento Teodósio Leopoldo

Henrique (n. em Lisboa, a 15 de Março de 1695; f. e m Lisboa, a

20 de Outubro de 1757; sepultado no Mosteiro de S. Vicente de

Fora). Morreu solteiro e sem descendência;

6. D. Teresa Maria Francisca Xavier Josefa Leonor ( n. em

Lisboa, a 24 de Fevereiro de 1696; f. em Lisboa, a 16 de

Fevereiro de 1704; sepultada no Mosteiro de S. Vice nte de

Fora);

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7. D. Manuel José Francisco António Caetano Estêvão

Bartolomeu (n. em Lisboa, a 3 de Agosto de 1697; f. na quinta

de Belas, em igual dia de 1736; sepultado no Mostei ro de S.

Vicente de Fora). Morreu solteiro e sem descendênci a;

8. D. Francisca Josefa (n. em Lisboa, a 30 de Janei ro de

1699; f. na mesma cidade, em 15 de Julho de 1736; s epultada no

Mosteiro de S. Vicente de Fora). Morreu solteira.

Fora dos dois consórcios, D. Pedro II teve os segui ntes

filhos:

9. D. Luísa (n. em Lisboa, a 9 de Janeiro de 1679; f. em

Évora; a 23 de Dezembro de 1732; sepultada no Conve nto de S.

João Evangelista, dos cónegos seculares da mesma ci dade),

filha de D. Maria da Cruz Mascarenhas. Foi criada n a família

do secretário de estado Francisco Correia de Lacerd a, e depois

no Mosteiro de Carnide, junto de sua tia D. Maria ( veja-se

supra, 1, 8). Casou com D. Luís e, em seguida, com D. Jaime de

Melo, respectivamente, 2.º e 3.º duques de Cadaval.

10. D. Miguel (n. em Lisboa, a 15 de Outubro de 169 9; f.

afogado no Tejo, a 13 de Janeiro de 1724; sepultado no

Convento de S. José de Ribamar), filho da francesa Ana Armanda

Du Verger. Foi reconhecido por D. João V como seu i rmão e

casou em 1715 com D. Luísa Casimira de Nassau e Lig ne,

herdeira da casa de Arronches.

11. D. José (n. em Lisboa, a 6 de Maio de 1703; f. em Ponte

de Lima, a 3 de Junho de 1756; sepultado na sé arqu iepiscopal

de Braga), filho de D. Francisca Clara da Silva, fo i aluno da

Universidade de Évora e ali obteve o grau de doutor em

Teologia. Arcebispo de Braga em 1739, foi sagrado e m 5 de

Fevereiro de 1741 e entrou naquela sé em 23 de Julh o seguinte.