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Conheça a Programação do 17º Encontro de Biólogos do CRBio-1 DEST AQUE Projeto Arara Azul: um grande incentivo à conservação do Pantanal Entrevista com a bióloga Neiva Robaldo Guedes, coordenadora do Projeto e pequisadora da UNIDERP-MS Páginas 5 à 9 Páginas 10 à 12 Foto: Luciano Candisani Foto: Andréa Carvalho Macieira Foto: Mark Stafford

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Conheça a Programação do 17º Encontro de Biólogos

do CRBio-1

DESTAQUE

Projeto Arara Azul: um grande incentivo

à conservação do Pantanal

Entrevista com a bióloga

Neiva Robaldo Guedes, coordenadora

do Projeto e pequisadora

da UNIDERP-MSPáginas 5 à 9

Páginas 10 à 12

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Neiva Guedes treinando a bióloga Andréa Macinara a fazer medição de filhotes de araras azuis

PROJETO ARARA AZUL:

“UMA BANDEIRA PARA A CONSERVAÇÃO DO PANTANAL”

O Projeto Arara Azul é um modelode projeto de conservação de psitací-deos ameaçados e referência no Brasile no exterior. Em 16 anos de atuação,triplicou a população de araras azuis noPantanal, e chamou a atenção do mun-do para a importância da conservaçãoda biodiversidade dessa região. O Pro-jeto foi idealizado e é coordenado pelabióloga Neiva Maria Robaldo Guedes,pesquisadora do curso de Mestrado emMeio Ambiente e DesenvolvimentoRegional da UNIDERP – Universida-de para o Desenvolvimento do Estadoe Região do Pantanal, mestre em Ci-ências Florestais pela ESALQ/USP,doutoranda em Zoologia pela UNESP/Botucatu, membro dos Comitês paraConservação e Manejo da Arara AzulGrande (Anodorhynchus hyacinthi-

nus) e Arara-azul-de-lear (Ano-

dorhynchus leari), sob a coordenaçãodo IBAMA – Brasília e presidente doInstituto Arara Azul.

Neiva Guedes: o caminho da

bióloga até o encantamento pelas

araras azuis

Para conhecer a trajetória do Proje-to arara Azul e como ele foi criado épreciso antes conhecer um pouco so-bre a estória desta bióloga, idealista eincansável que divide o seu tempo en-tre o Pantanal, as atividades na Univer-sidade, e com a família, o marido Joaci-lei Lemos Cardoso, pintor de naturezae a filha do casal, Sophia de três anosde idade. Neiva Guedes é filha de Wal-demir Guedes, marceneiro e de Inocên-cia Robaldo Guedes, dona de casa. Eladiz: “Família simples e humilde, naturalde Ponta Porã-MS, que tiveram seis fi-lhos, dos quais sou a segunda”. A maiorparte de sua infância foi passada emDourados (MS). Por necessidade, co-meçou a trabalhar aos 17 anos comorecepcionista num hospital. Nessa épo-

ca pretendia cursar Medicina: “Passa-va boa parte do tempo na sala de cirur-gia ou centro cirúrgico, quando permiti-am”. Conta que sempre estudou emescolas públicas, e que em 1982, foi paraCampo Grande concluir o colegial e fre-qüentar o cursinho. “Era uma aluna bas-tante dedicada e disciplinada e apesarde trabalhar meio período estava sem-pre entre os primeiros classificados docursinho”, recorda. Aos 19 anos pres-tes a iniciar a sua vida acadêmica, per-deu abruptamente o seu pai, vítima deAVC. “Foi um marco na minha vida: nãopassei no vestibular e não entrei na uni-versidade. Além disso, precisava traba-lhar integralmente para ajudar a família.”

Para conciliar trabalho com estudo,resolveu cursar Biologia. Em 1984, in-gressou no curso de Ciências Biológi-cas da UFMS, em Campo Grande. “Apartir do 2º ano, sempre procurei fazerestágio em laboratório ou campo e pas-sei a gostar da Biologia. Quando termi-nei o curso, decidi que iria trabalhar naprofissão e pedi demissão do cargo de

secretária executiva no DERSUL-MS.”O seu início na área da pesquisa cientí-fica aconteceu em 1988, quando erabolsista de aperfeiçoamento científico doCNPq na EMBRAPA Gado de Corte,em Campo Grande, sob a orientaçãoda Drª Cacilda Borges do Valle.

No ano seguinte, trabalhou no De-partamento de Educação Ambiental daantiga SEMA-MS, e durante uma aulade campo do curso de Conservação daNatureza no Pantanal, ficou encantadaquando viu um bando de araras azuis(Anodorhynchus hyacinthinus): “Des-cobri que era uma ave ameaçada deextinção, que estava desaparecendorapidamente, e decidi então fazer algopara que isso não acontecesse. Achei acena (cerca de 30 araras-azuis pousa-das num galho seco) muito linda e queoutras pessoas deveriam conhecê-la emseu hábitat natural. Havia poucos estu-dos sobre a arara azul na natureza equase nenhuma literatura. Assim, come-cei os trabalhos de pesquisa científicacom a arara azul”,

Foto: Carlos Cézar Corrêa

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Em 1990, ingressou no curso de Mes-trado em Ciências Florestais da ESALQ/USP. Durante esse período recebeuuma bolsa da Coordenação de Aperfei-çoamento de Pessoal de Nível Superior(CAPES). Obteve título de Mestre em1993, com a dissertação “Biologia Re-produtiva da Arara-azul (Anodorhyn-

chus hyacinthinus) no Pantanal – MS”.Neiva conta: “Concluído o mestrado,apesar de não ter nenhum vínculo em-pregatício decidi continuar o ProjetoArara Azul que já tinha virado projetode vida, para tanto, utilizei todas as eco-nomias que tinha e desde então, dedicominha vida para a conservação destaave no Pantanal brasileiro”.

Os objetivos e área geográfica

abrangida

A bióloga esclarece que o Projetovisa o estudo da biologia, o manejo e aconservação da arara azul no Pantanal,com a manutenção de uma populaçãoviável vivendo na natureza a médio elongo prazo, e também a conservaçãoda região como um todo. Ele é realiza-do em cinco regiões do Pantanal SulMatogrossense: Nhecolândia, Abobral,Rio Negro, Miranda e Aquidauana, atra-vés de atividades como cadastramentode ninhos naturais, instalação de ninhosartificiais, monitoramento e manejo deninhos, ovos e filhotes. “O trabalho ébasicamente desenvolvido no Pantanalde Mato Grosso do Sul, mas esporadi-camente participo de um censo realiza-do numa fazenda no Pantanal de MatoGrosso, onde atualmente também esta-mos cadastrando os ninhos.”

O dia-a-dia do Projeto Arara Azul e

a equipe

Durante os primeiros oito anos doProjeto, Neiva Guedes trabalhou prati-camente sozinha, com auxílio de volun-tários, estagiários e até familiares. Hoje,a equipe é composta por mais quatropessoas, que trabalham integralmente noProjeto. “Temos Carlos Cezar Corrêacomo assistente de pesquisa; duas bió-

logas Andréa Carvalho Macieira e Gra-ce Ferreira da Silva; e Neliane G. Cor-rêa, que trabalha como comunicadora eeducadora. Contamos também com vo-luntários e estagiários.” Ela ressalta quealém da equipe integral, há os pesquisa-dores associados que realizaram ou es-tão realizando, pesquisas paralelas ou emparceria: “Entre os quais podemos citarProfª Drª Anita Wajntal e Profª Drª Cris-tina Yumi Miyaki, do Laboratório de Ge-nética e Evolução Molecular de Aves,do IB/USP, parceiras do Projeto desde1991; Profª Drª Eliane Vicente e outrospesquisadores do IPPAN/UNIDERP(2002), Profª e Doutoranda MariangelaAllgayer, da ULBRA-RS (2003)”.

Ela explica que o Projeto Arara Azulé realizado desde 1990, sem interrup-ção e as atividades de campo podemvariar de acordo com os objetivos es-pecíficos a serem cumpridos a cadaano. “Entretanto, em geral, realizamoso monitoramento de ninhos o ano todo.Na época de reprodução da A. hyacin-

thinus (julho a março) o monitoramen-to é mais intenso para verificar a taxade eclosão dos ovos e mortalidade e/ousobrevivência dos filhotes. Por váriosanos fizemos a biometria dos filhotes,diária, semanal ou mensal. Atualmente,realizamos apenas o acompanhamentodo desenvolvimento dos filhotes e umpouco antes de voar, visitamos todos osninhos com filhotes, juntamente comuma veterinária, para coletar materialbiológico e verificaros aspectos sanitári-os, anilhar, colocarmicroship, coletarsangue para análisede DNA. A partir de2000, recebemos au-torização do Comitêde Manejo e Con-servação das ArarasAzuis, coordenadopelo IBAMA pararealizar alguns expe-rimentos de manejocom ovos e filhotes.Desta forma, reali-zamos este tipo de

manejo, quando é absolutamente neces-sário, mas sempre em pequena escala.Nos meses de abril a junho, realizamoso manejo de ninhos naturais e instala-ção, manejo ou substituição de ninhosartificiais. Mapeamos todos os ninhoscadastrados e instalados, as áreas de ali-mentação e dormitórios. Além das ara-ras azuis realizamos estudos sobre a bi-ologia reprodutiva das araras vermelhas(Ara chloroptera), araras canindés(Ara ararauna), tucanos (Ramphas-

tos toco), pato-do-mato (Cairina mos-

chata), gavião-relógio (Micrastur se-

mitorquatus), entre vários outros.”O Projeto dá suporte de campo para

a realização de outras investigaçõescomo: a) Caracterização Populacionaldo Manduvi (Sterculia apetala) pelobiólogo Antonio dos Santos Jr, mestran-do da UFMS; b) Estudo do RepertórioVocal das Araras Azuis (A. hyacinthi-

nus), realizado pelo biólogo Fábio Ueno,mestrando da UNICAMP; c) de Ento-mofauna associada aos ninhos de A.

hyacinthinus, por Thiago Dutra deCarvalho, acadêmico de Biologia daUNIDERP; Avaliação da Implementa-ção de Turismo Científico pelo ProjetoArara Azul, por Eveline R. Guedes, aca-dêmica de turismo da UNIDERP.

No Centro de Visitantes do ProjetoArara Azul, reinaugurado em Setembro2004, os hóspedes do Refúgio Ecológi-co Caiman, podem assistir palestras econhecer o trabalho. Uma vez por se-

Filhote de arara azul dentro do ninho

Foto: Vanessa Bernardo

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mana, a educadora da equipe, desen-volve atividades de educação ambien-tal e resgate da cultura pantaneira comcrianças do Pantanal de Miranda. Sãoministradas inúmeras palestras em es-colas e também para o público leigo emeventos culturais locais. “Contribuímospara a elaboração de material didáticoe concedemos entrevistas para matéri-as de jornal, revista e TV. Treinamosacadêmicos (nacionais e estrangeiros)periodicamente em técnicas desenvol-vidas pelo Projeto.”

As ameaças às Araras Azuis e as

ações do governo

As araras azuis assim como outrasespécies da fauna brasileira enfrentamsérias ameaças que comprometem a suasobrevivência. No caso específico daarara azul (Anodorhynchus hyacinthi-

nus) as principais ameaças são: o tráfi-co, a descaracterização ambiental (queresulta em perda de hábitat e escassez decavidades) e a própria característica daespécie que tem baixa taxa reprodutiva.

Neiva Guedes cita um exemplo re-cente sobre o tráfico, ocorrido em no-vembro de 2004: “Um traficante foi pre-so com oito filhotes de arara azul emCorumbá-MS. Menos de 15 dias depois,o mesmo indivíduo foi preso novamen-te, numa rodovia do interior do Estado,com mais dois filhotes. Além disso, atra-vés de informações de um pesquisadorboliviano, constatamos que ele conse-guiu embarcar mais de dez filhotes deArara Azul em Santa Cruz na Bolívia,com destino a Colômbia e pelo menosoutros cinco foram parar no Uruguai.Assim, verificamos que o tráfico infe-lizmente continua intenso, exceto noPantanal, onde, se não acabou, pelomenos diminuiu muito. Falamos isso,baseado nas fiscalizações que têm sidomais atuantes no Estado de Mato Gros-so do Sul; da população humana que estámais atenta, informada e por isso fazmais denúncias e pelos resultados dasanálises genéticas que tem mostrado queas aves apreendidas nos últimos anostêm mais probabilidade de serem donorte e nordeste do Brasil do que do

Pantanal”. Na sua opinião, ogoverno tem promovido a ca-pacitação dos policiais federaise ambientais, porém destacaque são necessárias modifica-ções na legislação, pois, estahoje não está eficiente. “Um tra-ficante pode ser autuado emflagrante, mas logo em seguidaé liberado e pode praticar omesmo ato novamente.”

Quanto às ações do gover-no em relação à conservaçãoda biodiversidade, ela comen-ta: “Exceto a criação de reser-vas na região Amazônica (quenem sei se foram realmente im-plantadas), ainda não vi muitasações positivas do governo fe-deral com esse objetivo. Nanossa região, deixaram de re-novar o Projeto Pantanal quevinha sendo elaborado e traba-lhado por vários anos. Então,houve até retrocessos. Na es-fera estadual, a situação não ficou mui-to diferente, chegando a ponto do go-verno querer modificar a legislação parapermitir a implantação de usinas de ál-cool na bacia do Paraguai, com risco degrandes ameaças para o Pantanal”. Se-gundo ela, faltam mais incentivo e re-cursos governamentais para pesquisa naárea de conservação da biodiversidadee trabalhos de campo para diminuir otráfico de animais silvestres. “Por outrolado, vejo uma preocupação e envolvi-mento maior de pessoas físicas e prin-cipalmente empresas privadas no Bra-sil com as questões ambientais, fatopositivo que é marcante e crescente nosúltimos anos.”

O “status” atual da arara azul

O status atual da arara azul (Ano-

dorhynchus hyacinthinus) é ameaça-da de extinção, na Lista da Fauna Bra-sileira Ameaçada de Extinção, publica-da pelo MMA em 2003 e 2004; é citadacomo em perigo pela IUCN (UniãoMundial para Conservação da Nature-za) em 2003 e está listada no apêndiceI do CITES (Convenção sobre o Co-

mércio Internacional de Espécies Ame-açadas). A bióloga dá a sua opinião so-bre uma mudança nesse quadro: “Creioque é possível mudar este status atual,sim. Porém, para tanto, é preciso agirsob vários aspectos: legislação (o exem-plo do tráfico mostra claramente que elanão é eficaz); político (os dirigentes pú-blicos e os governantes, em todas asesferas, precisam compreender que abiodiversidade brasileira é um patrimô-nio único e que a sua perda é irrepará-vel); social e econômico, com o envol-vimento da população humana onde asararas azuis ocorrem, para que se cons-cientizem da fragilidade da espécie epossam se beneficiar com a presençadela, com educação ambiental, artesa-natos, ecoturismo e outras atividadesque promovam a auto sustentabilidade,por exemplo.”

Ela acredita que na área de pesqui-sa, seria necessário levantar o status erealizar estudos sobre araras azuis(Anodorhynchus hyacinthinus) no nor-te e nordeste do Brasil: “Fora do Panta-nal, as populações são pouco conheci-das e o tráfico ainda é intenso. Entre-tanto, este quesito começa a ser viabili-

Casal de araras azuis na caixa ninho artificial,

Fazenda Barranco Alto

Foto: Lucas Leuzinger

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zado com alguns biólogos que entraramem contacto comigo recentemente, parainiciar pesquisas no Pará, Tocantins eAmazônia. No Pantanal, embora a po-pulação de Anodorhynchus hyacin-

thinus esteja aumentando e expandin-do, ela ainda não é auto-sustentável,pois o maior fator limitante à reprodu-ção é a disponibilidade de ninhos, o quea torna dependente de muitas ações demanejo que o Projeto Arara Azul reali-za diariamente”.

Principais dificuldades

As principais dificuldades enfrenta-das pelo Projeto apontadas por Neivasão: recursos financeiros e humanos.“Podemos dizer que para o Projeto AraraAzul, nunca faltou recurso financeiro,mas também, sempre trabalhamos comrecursos pequenos. Para se ter umaidéia, hoje, o custo total do Projeto, estána faixa de R$ 200 mil ano, incluindotodos os salários e encargos. É difícilconseguir patrocínio para manter umprojeto de conservação funcionando porlongo prazo. Após tantos anos de traba-lhos, anualmente, temos que estar es-crevendo propostas e pedindo doações.

Uma das maiores dificuldades é conse-guir recursos para pagamento de salá-rios, para manter uma equipe no campoem período integral, e por esse motivonossa equipe sempre foi pequena, mui-tas vezes formada principalmente porvoluntários e estagiários. Por outro lado,quando se tem recurso financeiro, po-dem faltar recursos humanos. A ofertade pessoas querendo passar uns dias ouum mês trabalhando no campo, é imen-sa, mas pessoas que queiram abdicar,por longo período, do conforto da cida-de e enfrentar o calor, o cansaço e osinsetos no campo, são poucos. Então,esse é outro problema, pois às vezes apessoa até quer trabalhar no campo, masnão tem o perfil.”

Parceiros e apoios

Se por um lado o Projeto Arara Azultem dificuldades, existem os parceirose apoios que devem ser citados. Desde1994, o Projeto vem sendo executadopela UNIDERP e os seus principaisparceiros são: WWF-Brasil (desde1990), Toyota-Brasil (desde 1990), Re-fúgio Ecológico Caiman (desde 1998).Neiva explica que os patrocinadores

podem variar a cada ano, mas atualmen-te contam com recursos da: Vanzin Es-capamentos (desde 2001), Brasil Tele-com (desde 2002), Bradesco Capitali-zação (2005), Criadouro Asas do Brasil(2004), T. Bracher (2004); Br Tintas(2003), além do apoio da Parrots Inter-national, FMB, IPPAN e Repans. “Naparte técnica, desde o início temos par-ceria com Drª Anita Wajntal e Drª Cris-tina Y. Miyaki, do Laboratório de Gené-tica e Evolução Molecular de Aves doIB/USP e contamos com o apoio da Co-ordenação Geral de Fauna do IBAMA,em Brasília.”

Desde de seu início, o Projeto trocainformações e mantém contacto compesquisadores norte-americanos e eu-ropeus que trabalham com Psitacídeos,bem como com pesquisadores do Peru,Costa Rica, México, Porto Rico, Vene-zuela, Argentina, Bolívia e Paraguai.

Resultados positivos

Neiva Guedes conta que desde o co-meço do Projeto Arara Azul já foramregistrados mais de 360 ninhos naturais,em cinco regiões do Pantanal Sul, e maisde 200 ninhos artificiais foram instala-dos. “Foram criados métodos de mane-jo que deram resultados positivos. Alémdisso, a estimativa do número de ararasazuis na natureza na década de 80 era1.500 indivíduos para o Pantanal. Hojea estimativa é de 5.000 indivíduos, ouseja, o número inicial triplicou.” O Pro-jeto desenvolveu métodos inovadores,entre os quais se destaca a técnica deinstalação de ninhos artificiais (modelo,material, tamanho), como o manejo e re-cuperação de ninhos naturais e manejode ovos e filhotes.

Também o trabalho de campo temincentivado estudos de outros pesquisa-dores nas áreas de genética, veteriná-ria, sanidade, biologia, comunicação,nutrição com a arara azul, resultando em7 dissertações de mestrado e 4 teses dedoutorado. “Baseados em nossos resul-tados, outros pesquisadores estão inici-ando trabalhos com as araras azuis, ara-ras vermelhas, (Ara chloroptera) e ara-Carlos Cezar Corrêa, assistente de pesquisa, monitorando ninho com filhote

Foto: Neiva Guedes

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ras canindé, (Ara ararauna), no Bra-sil. Além disso, temos treinado biólogosbolivianos e vamos treinar também estu-dantes do Paraguai para iniciar estudossemelhantes, em seus países. Desta for-ma, estamos contribuindo para o estudoe conservação da biodiversidade.”

Afirma que outro fato que tambémserve de parâmetro para avaliação doProjeto (“e é gratificante”) é o início dareplicação do trabalho em outras partesdo Brasil e América Latina. A visita deoutros pesquisadores e turistas brasilei-ros e estrangeiros que hoje vem ao Pan-tanal para conhecer as araras e as ati-vidades do Projeto Arara Azul. “Alémdisso, o recebimento de medalhas, tro-féus e prêmios de conservação, tantonacionais como internacionais, dá umaconsolidação ao nosso trabalho, reforçao compromisso que temos com a con-servação da natureza, honra a nossa Ins-tituição, aos nossos parceiros, patrocina-dores e todos que colaboram conosco.”

Ela observa que o Projeto visa tam-bém a conscientização e a educação am-biental principalmente entre a popula-ção local. “São motivos de alegria e gra-tificação ver a diminuição do tráfico, oaumento e expansão da população deA. hyacinthinus, proprietários plantan-do e protegendo o manduvi (S. apéta-

la) a principal espécie arbórea utilizadacomo ninho, criando reservas, ver que

não estão saqueando os ninhos. Assim,aves que nas últimas décadas estavamficando raras, tornaram-se mais comunse abundantes em várias regiões do Pan-tanal e Estado de Mato Grosso do Sul.Fato este, não só constatado pelos da-dos coletados durante a pesquisa, mastambém por outros cientistas e os mo-radores locais é reconfortante.”

O papel do Comitê para Conserva-

ção da Arara Azul

Neiva Guedes participa do Comitêpara Manejo e Conservação da AraraAzul (Anodorhynchus hyacinthinus),criado e coordenado pelo IBAMA, quevisa o estabelecimento de estratégiaspara estudo, manejo e conservação daarara azul com o objetivo de alcançar oestabelecimento de populações geneti-camente viáveis da espécie. Ela comen-ta: “O Comitê dá as diretrizes e elaboraas ações tanto para os trabalhos de na-tureza como de cativeiro. Em meadosde 2006, o Comitê estará concluindo oPlano de Ação para a Conservaçãoda Arara Azul, (Anodorhynchus hya-

cithinus), o qual deverá conter as açõesprioritárias in sito e ex situ para a espé-cie. O IBAMA coordena também os Co-mitês para Conservação da Ararinha-azul(Cyanopsitta spixii) e Comitê para Con-servação da Arara-azul-de-lear (Ano-

dorhynchus leari), dos quais tambémfaço parte, juntamente com outros pro-fissionais altamente capacitados de ou-tras instituições do Brasil e do Exterior”.

Uma bandeira para a conservação

do Pantanal

Quando começou a desenvolver oProjeto Arara Azul, Neiva não tinha idéiada dimensão que o seu trabalho alcan-çaria: “Comecei o Projeto apenas coma vontade de fazer algo para ajudaraquela bela espécie, que estava amea-çada. Nunca imaginei que teria tantarepercussão como tem hoje, o que au-menta a nossa responsabilidade”. Dizque o plano é continuar, expandir e apri-morar o trabalho. Além do Centro deVisitantes no Refúgio Ecológico Caiman,em breve terão mais uma base de cam-po no IPPAN/UNIDERP, na PousadaAraraúna, propriedade da UNIDERP.“Esperamos assim, poder investir maisem produtos exclusivos do projeto, etambém em turismo científico, não sónas bases, mas também em outras pro-priedades, visando no futuro que o pro-jeto seja auto-sustentável. Queremosevitar que aconteça com esta espécie omesmo que ocorreu com a ararinha azul(Cyanopsitta spixii), que já desapare-ceu da natureza, restando apenas cer-ca de 60 em cativeiro, e com a arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari),cuja população está muito reduzida, comcerca de 500 indivíduos na natureza.Mas vale ressaltar, que esta última, tam-bém está se recuperando graças aos es-forços da Coordenação de Fauna doIBAMA-sede, com o apoio de váriasempresas e instituições.”

Como comentário final acrescenta:“Na realidade, trabalhamos pela conser-vação da arara azul e utilizamos estaespécie como uma bandeira para a con-servação do Pantanal como um todo.Mais que amor e dedicação pela natu-reza, abrimos mão de algumas coisaspara doarmos nosso tempo e nossa vidapara a conservação da biodiversidadebrasileira porque acreditamos naquiloque estamos fazendo”.

Neiva Guedes realizando biometria do filhote no trator

Foto: Carlos Cezar Corrêa