Bioma Pampa - Patrimônio Nacional

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Publicação sobre o Bioma Pampa, contendo a Proposta de Emenda à Constituição 424/09, de autoria do deputado Fernando Marroni, que inclui o ambiente entre os patrimônios nacionais reconhecidos pela Constituição Federal.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

FERNANDO MARRONI Deputado Federal

Bioma Pampa Patrimônio Nacional

Centro de Documentação e Informação

Coordenação Edições Câmara

BRASÍLIA – 2009

CÂMARA DOS DEPUTADOS

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53ª Legislatura – 3ª Sessão Legislativa

SÉRIE

SEPARATAS DE DISCURSOS, PARECERES E PROJETOS

Nº 108/2009

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Sumário

Apresentação ................................................................................ p.05

O Pampa ....................................................................................... p.07

Litoral ............................................................................................ p.10

Encosta do Sudeste ..................................................................... p.11

Serra do Sudeste ........................................................................... p.12

Depressão Central ....................................................................... p.13

Campanha ..................................................................................... p.13

Missões e Planalto Médio ........................................................... p.14

Novos usos para a biodiversidade do Pampa .......................... p.15

Proposta de Emenda à Constituição n.º 424, de 2009 ........... p.21

Contatos do Deputado Fernando Marroni .............................. p.24

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Apresentação

Cantado nos versos melancólicos das milongas ou nas pajeadas recitadas a beira do fogo de chão, esse substantivo de dois gêneros, a pampa ou o pampa, se apresenta como a origem e a essência do povo mestiço nascido nos campos limpos do sul do América.

Em fins do século XIX o poeta argentino José Hernandes personificou na figura de Martín Fierro a alma do gaúcho. A identidade cultural forjada nas pradarias sulinas espalha-se por Brasil, Argentina e Uruguai dando forma a um território com três bandeiras, três brasões, três nacionalidade, mas um único povo ligado por elos ancestrais, que desconhecem fronteiras políticas e geográficas.

No cerne deste povo está o território, a paisagem, o bioma que o une, caracterizado, principalmente, pelos campos limpos espalhados a perder de vista.

Mais de um século após Hernandes ter descrito com maestria incomparável o pampa e o gaúcho, nos deparamos com o desafio da preservação deste bioma e de tudo o que representa.

Lançar o Pampa sob o manto da proteção constitucional brasileira surge como o primeiro passo na longa jornada da identificação de novos arranjos produtivos sustentáveis, capazes de manter vivo não apenas o habitat, o ecossistema, mas também o território de todos os gaúchos sejam brasileiros, argentinos ou uruguaios.

A biodiversidade e a riqueza cultural deste território, justifica conceder-lhe a mesma proteção legal dispensada à Floresta Amazônica, ao Pantanal Matogrossense, à Serra do Mar, à Mata Atlântica e a Zona Costeira. Proteger o Pampa é imprescindível para resguardar o conjunto da rica biodiversidade brasileira.

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Este é o objetivo da PEC 424/09, apresentada a partir de agora

nessa publicação juntamente com um minucioso e valioso estudo elaborado por pesquisadores da Embrapa Clima Temperado, sediada em Pelotas (RS), que se debruçaram sobre o Pampa em busca dos elementos naturais formadores da alma gaúcha.

Espero que a leitura agrade e ajude-o a entender a importância desta luta travada desde 2009 no Congresso Nacional. Afinal, preservar o pampa é preservar a essência dos gaúchos e de todo o povo brasileiro.

Boa leitura,

Fernando Marroni

Deputado Federal – PT/RS

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O PAMPA

Um novo olhar sobre o pampa contrasta com sua história, marcada pela tradição cultural de sua gente, seus costumes, seu tempo e suas vidas. Muitas lutas, conquistas, lendas.

O momento atual impõe uma reflexão sobre sua ocupação e novos usos para sua rica biodiversidade. Fauna, flora, água, terra, gente, uma visão renovada. O desafio de resgatar saberes e conhecimentos locais e de identificar novos arranjos produtivos sustentáveis está presente nas pautas de discussão sobre o desenvolvimento regional.

As paisagens abrigam espécies de beleza incomum, com as quais certamente muitos de nós cruzamos, sem, no entanto, perceber suas cores, suas formas, seus aromas e sua arquitetura, por vezes rústica, que demonstram vitalidade e instinto de sobrevivência nos contrastes do pampa gaúcho.

O Brasil é um país de vasta extensão territorial e de marcante clima tropical na maior parte de seu território. Amazônia, Cerrado, Caatinga, Pantanal e Mata Atlântica são áreas contrastantes de um país onde a maior parte das terras se situa na região equatorial e tropical da América do Sul. Mas, a partir da porção sul do estado de São Paulo, próximo à divisa com o Paraná, o espaço tropical vai, gradativamente, diluindo-se e começa a ceder lugar para o Brasil Subtropical, caracterizado pelas matas com pinheiros, pelas florestas subtropicais e pelos campos de cima da serra. As paisagens deste Brasil Subtropical abruptamente se despedem nas encostas da porção meridional do planalto sul-brasileiro, no Rio Grande do Sul, e abrem espaço para uma região pouco conhecida pelos próprios brasileiros. A partir desse limite, no paralelo 30°S, descortinam-se os horizontes amplos dos pampas de um Brasil Platino. Uma região moldada pelo clima temperado e caracterizada pelas vastas planícies, às vezes interrompidas e

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emolduradas por cerros isolados e serras de antigas montanhas desgastadas pelo tempo, ou entremeadas por lagoas e outros corpos d’água, onde os últimos elementos de tropicalidade ainda marcam presença, lembrando que ali ainda é Brasil.

A história associada à paisagem natural dos pampas forneceu a base para a formação da cultura e da identidade do gaúcho e para a constituição de um sentimento de pátria que ultrapassa os limites políticos convencionais, ligando os povos que habitam essas paisagens do extremo sul brasileiro aos hermanos pampeanos do Uruguai e da Argentina. O termo pampa foi cunhado no idioma indígena quechua pelos primeiros habitantes das planícies do sul da América do Sul, em tempos pré-colombianos, e significa região plana. Essa denominação estava ligada às paisagens de extensas planícies com topografia suave ou levemente ondulada, cobertas por vegetação baixa, predominante em uma área de clima temperado que se estende a partir da Patagônia argentina, em seu limite sul, até as encostas do planalto sul-brasileiro no Rio Grande do Sul, em seu limite norte.

No Brasil, o Bioma Pampa possui uma área de 178.243 km2 e está restrito ao Rio Grande do Sul, ocupando cerca de 63% do Estado e 2% do Brasil. Este bioma compreende um conjunto ambiental de diferentes solos recobertos, predominantemente, por vegetações campestres, sendo caracterizado por clima chuvoso, sem período seco sistemático, mas marcado pela frequência de frentes polares e temperaturas negativas no inverno. O mapeamento da cobertura vegetal identificou 49% da área do bioma alterada por usos antrópicos, restando ainda 41% de vegetação nativa em diferentes estados de conservação, além da área ocupada pelos corpos d’água, que corresponde a 10%. Dentre as áreas remanescentes de vegetação nativa os campos equivalem a 23%, enquanto que a vegetação de transição entre campos e florestas ocupa 13% do território e as formações florestais 5%.

A vegetação dominante no pampa apresenta gramíneas que atingem em média 60 cm ou mesmo mais de 1 metro de altura, entre as quais crescem numerosas espécies herbáceas e alguns subarbustos e arbustos. Essas espécies constituem pastagens naturais que possuem um período de repouso no inverno e outro no verão, e que mostram todo o seu esplendor quando florescem na primavera, assemelhando os

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campos a um mar policromático. É estimada a ocorrência de cerca de 3.000 espécies de plantas nos Campos Sulinos no Rio Grande do Sul, englobando as formações campestres no Bioma Pampa e no Bioma Mata Atlântica (campos de altitude ou campos de cima da serra), porém, uma estimativa do número de espécies ocorrentes especificamente no Bioma Pampa ainda não foi publicada.

Desde o Litoral até a Campanha, o Bioma Pampa brasileiro apresenta paisagens distintas, associadas com floras peculiares. Especialmente a metade sul do Rio Grande do Sul é a porção de maior diversificação topográfica e geológica da Região Sul do Brasil. Dentro da complexidade de ambientes encontrados no Estado, são descritas 11 regiões fisiográficas, das quais sete (Litoral, Encosta do Sudeste, Serra do Sudeste, Depressão Central, Campanha, Missões e Planalto Médio) estão representadas no Bioma Pampa.

Delimitação entre os Biomas Pampa e Mata Atlântica no Brasil e Regiões Fisiográficas representadas no Bioma Pampa (adaptado por Heiden, 2009).

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A região fisiográfica do Litoral é uma extensa planície arenosa

litorânea, salpicada por inúmeras lagoas e caracterizada por formações pioneiras de restinga, vegetações formadas principalmente por espécies que ocorrem ao longo dos rios e nas proximidades de lagoas ou do mar, em dunas ou áreas inundáveis, por exemplo. Além de abrigar espécies exclusivas, a flora também é influenciada por outras espécies de ampla dispersão ou pela vegetação de regiões adjacentes, onde a porção norte relaciona-se com o Bioma Mata Atlântica, enquanto que na porção sul predominam espécies típicas do Bioma Pampa. Habitats propícios para as plantas começam a surgir a partir das primeiras dunas em uma ordem de ecossistemas que passa pelas lagoas temporárias, banhados, campos de restinga, arroios e lagoas permanentes, matas paludosas e matas de restinga. Cada ambiente apresenta um conjunto próprio de espécies, adaptadas a estresses como secas, inundações, insolação ou salinidade. Um ecossistema singular encontrado no estuário da Laguna dos Patos são as marismas, um ambiente de transição entre águas rasas e salobras e a terra firme. Também são peculiares os palmares, extensas formações de butiás (Butia spp.).

Palmar na Encosta do Sudeste, em Tapes (Fotografia: Rosa Lía Barbieri).

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A região da Encosta do Sudeste abrange as encostas leste das

serras do Herval e dos Tapes, sendo uma área de transição entre o Litoral e a Serra do Sudeste propriamente dita. A composição da flora mostra influência de espécies arbóreas típicas da Mata Atlântica, formando matas cuja extensão e diversidade diminui em direção ao sul. Em função do relevo, que varia de ondulado a fortemente ondulado, e do histórico de colonização, com predominância da pequena propriedade rural, os ecossistemas e agroecossistemas se distribuem como uma colcha de retalhos, alternando matas, campos nativos e cultivos. Nas áreas baixas e menos inclinadas predominam campos com capões e matas de galeria e banhados, enquanto que nos vales e nas encostas suaves ou íngremes, que se tornam freqüentes em direção ao interior, predominam as florestas, onde os capões e matas de encosta de Floresta Estacional Semidecidual (floresta caracterizada pela perda de 20 a 50% das folhas das árvores durante o outono e o inverno) são as matas mais desenvolvidas no Bioma Pampa. Também ocorrem nessa região os mais extensos remanescentes de palmares do Bioma Pampa.

Remanescentes de Floresta Estacional Semidecidual na Encosta do Sudeste, em Pelotas (Fotografia: Gustavo Heiden).

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A Serra do Sudeste corresponde ao espaço ocupado pelo

Escudo Sul-Rio- Grandense, com exceção das encostas voltadas para o leste. Predominam nessa região morros e cristas de serras de granito, mas também estão presentes formações rochosas constituídas por arenitos e conglomerados. Nessa região predomina vegetação campestre herbáceo-subarbustiva, onde estão representados os campos sujos com diversas espécies de carquejas e vassouras (Baccharis spp., Dodonaea viscosa Jacq.). Os campos são entremeados por formações do tipo parque (vegetação onde ocorrem espécimes esparsos de árvores, cujas copas não se tocam, em meio à vegetação predominantemente herbácea) ou matas de encosta, matas de galeria e capões, sendo que as transições entre campo e florestas não costumam ser tão abruptas como nas demais regiões do bioma. Destacam-se campos de solos rasos e afloramentos rochosos onde ocorrem espécies xerófilas, sendo várias endêmicas. Também merece nota a ocorrência pontual de capões e matas com araucária, que constituem o limite sul da Floresta Ombrófila Mista, também denominada Mata com Araucária.

Vegetação de transição entre matas de encosta, campos sujos e vegetação rupestre na Serra do Sudeste, em Caçapava do Sul (Fotografia: Gustavo Heiden).

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A Depressão Central é uma planície localizada entre o Planalto

Sul-Brasileiro e o Escudo Sul-Rio-Grandense, polvilhada por cerros de arenito e basalto e banhada por uma vigorosa rede hidrográfica. É a região fisiográfica do Bioma Pampa que apresenta maior área de contato com o Bioma Mata Atlântica, porém com transições abruptas entre campo e floresta. Os campos dominam os relevos planos e as florestas estão representadas nas áreas de maior declividade, no limite entre os biomas, ou avançando sobre o campo através das matas ao longo dos rios. As formações campestres herbáceo-arbustivas predominam nos terrenos planos, onde também ocorrem áreas úmidas como banhados e campos periodicamente alagados. Em relação às formações florestais, predomina a Floresta Estacional Decidual, que se caracteriza pela perda de mais de 50% das folhas das árvores durante o outono e o inverno.

A Campanha abrange a porção oeste do Bioma Pampa no Brasil, sendo considerada sua área mais característica. A paisagem se caracteriza pela sucessão interminável de coxilhas, pequenas elevações arredondadas e de baixa altitude, cobertas por vegetação campestre. Por trás da aparente uniformidade da paisagem, escondem-se distintos tipos de solos que resultam em composições florísticas diferenciadas. A amplitude da paisagem é interrompida esporadicamente por cerros, com base de arenito e topo de basalto, ou por cadeias de morros como a Serra do Caverá. A Campanha é a região fisiográfica do bioma com a menor porcentagem de cobertura por formações florestais. Entretanto, várias espécies arbóreas são encontradas nas matas ciliares ou capões, ou ainda formando vegetação do tipo parque. Além dos campos, são áreas importantes para a flora os banhados e os campos de várzea na proximidade de rios; e os topos dos cerros, os afloramentos rochosos e os campos em áreas de basalto, os quais guardam espécies xerófilas muito características, sendo algumas endêmicas. Na Campanha estão representadas algumas paisagens singulares, como os palmares de butiá-anão (Butiá lalemantii Deble & Marchiori) que ocorrem em conjunto com espécies típicas dos campos de areia ou areais; e os parques de espinilho, onde são encontrados o espinilho (Acacia caven (Molina) Molina) e a cina-cina (Parkinsonia aculeata L.).

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Campos da Campanha em Bagé, a porção mais característica do Bioma Pampa no Brasil (Fotografia: João R. V. Iganci)

Parte do território das regiões fisiográficas das Missões e do Planalto Médio estão incluídos no Bioma Pampa, correspondendo à porção noroeste do mesmo. A vegetação original dessas duas regiões é composta por uma alternância de campos, salpicados por capões ou árvores dispostas em formações do tipo parque, e matas de galeria. Nas Missões são encontrados palmares de butiá-da-serra (Butia eriospatha (Mart. ex Drude) Becc.), assim como formações de parque com o pau-ferro (Astronium balansae Engl.) ou com a coronilha (Gleditsia amorphoides (Griseb.) Taub.). No Planalto Médio, os campos nativos remanescentes são notáveis pela presença do capim-barba-de-bode (Aristida jubata (Arechav.) Herter), conferindo um aspecto típico para as paisagens campestres dessa região.

O Bioma Pampa brasileiro apresenta uma diversidade muito grande de paisagens e de flora na pequena superfície que ocupa no território nacional. Saber reconhecer os múltiplos potenciais que a natureza pampeana oferece, valorizando e usufruindo de forma sustentável seus patrimônios naturais, é também uma forma de preservar as tradições e a cultura dos povos que se formaram a partir das interações com este ambiente.

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Novos usos para a biodiversidade do Pampa

As diferentes denominações adotadas para se referir ao pampa brasileiro, que muitas vezes fica em segundo plano devido à pequena área ocupada no país ou é ofuscado pela exuberância das demais formações vegetacionais ocorrentes em território nacional, tornou essa porção da nossa região uma área negligenciada quanto ao seu valor como um cenário natural rico em biodiversidade própria. Ainda hoje os campos são, às vezes, erroneamente interpretados como uma paisagem artificial, resultante da ação do homem nesse ambiente. Um novo olhar sobre o Pampa, que passou a ser interpretado como uma paisagem natural, valiosa e peculiar, somente foi despertado após a publicação, por parte do IBGE, do mapa de biomas continentais do Brasil.

Para conservar a biodiversidade do Bioma Pampa é necessário conhecê-la, divulgá-la e também atribuir a ela valores econômicos ou culturais, que visem sensibilizar a população para a sua preservação. A riqueza dos campos do sul do Brasil, em termos de flora e fauna, e sua importância na preservação do ambiente, contradizem a pouca importância dada a esse ecossistema, que já constituiu a base econômica da região através da pecuária. A presença de muitas espécies nativas com valor forrageiro é indiscutível e encontra-se muito bem documentada na literatura científica, enquanto outras frentes de pesquisa reconhecem também seu potencial medicinal e farmacológico. Além desses valores, também devem ser reconhecidos usos ornamentais para a flora do Bioma Pampa, que naturalmente agrega atributos estéticos à paisagem, moldando e diversificando os amplos horizontes da região e a cultura do gaúcho.

A preocupação com a conservação e o conhecimento da biodiversidade busca nos biomas um recorte regional de estudo e planejamento, por meio de políticas que visam à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica. No Bioma Pampa, 105 áreas foram indicadas para ações prioritárias de conservação, uso

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sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade, enquanto que 13 locais foram considerados áreas-chave para a conservação da biodiversidade de plantas raras. Tais dados demonstram a importância que o bioma possui por apresentar paisagens singulares, possibilidade de exploração sustentável da biodiversidade e presença de espécies raras.

Grande parte das plantas utilizadas nos mais diversos locais do mundo não é nativa das regiões onde são cultivadas, o que pode trazer conseqüências negativas, tanto aos ambientes naturais quanto aos ambientes agrícolas. No Bioma Pampa algumas plantas exóticas introduzidas como ornamentais, ou com outras finalidades, ou ainda de forma não-intencional, já se tornaram exóticas invasoras e hoje são agentes de substituição da flora nativa, como o asparguinho (Asparagus setaceus (Kunth). J.P.Jessop.), o capim-anoni (Eragrostis plana Ness), a madressilva (Lonicera japonica Thunb.), o cafezinho (Pittosporum undulatum Vent.) e o tojo (Ulex europaeus L.). A substituição de plantas ornamentais exóticas por espécies nativas com potencial ornamental, por exemplo, é uma tendência na floricultura e reduz o risco de novas invasões da paisagem natural. Plantas nativas desempenham importante papel no paisagismo, com destaque para a menor necessidade de manutenção, a valorização da identidade regional, a preservação da diversidade biológica e o oferecimento de ambientes para a fauna. Além disso, quando aplicadas na arte floral, também conferem competitividade e identidade local aos produtos oferecidos.

Plantas nativas são aquelas que ocorrem naturalmente em uma região, que não foram introduzidas pelo ser humano e nem necessitam diretamente dele para subsistirem. Alguns exemplos de plantas nativas no Bioma Pampa e que já são cultivadas na região são o capim-dos-pampas (Cortaderia selloana (Schult. & Schult. f.) Asch. & Graebn.), a cidreira-brava (Lantana fucata Lindl.) e a catléia (Cattleya intermedia Graham). Predominam na flora nativa do Bioma Pampa as espécies tipicamente pampeanas, além de outras relacionadas com vegetações de regiões próximas como a Mata Atlântica, da costa brasileira, e o Chaco, do centro-sul da América do Sul. Dentre as espécies caracteristicamente pampeanas, destacam-se Baccharis hyemalis Deble, Ephedra tweediana Fisch & C.A.Mey., Kelissa brasiliensis (Baker) Ravenna, Regnellidium diphyllum Lindm. e Tibouchina asperior Cogn. Muitas espécies típicas da Mata

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Atlântica também encontram naturalmente condições favoráveis para o seu estabelecimento no Bioma Pampa, principalmente em capões de mata ao longo do litoral e em áreas mais ao norte. São exemplos dessas espécies Brasiliorchis porphyrostele (Rchb. f.) R.Singer et al., Bromelia antiacantha Bertol., Coccocypselum lanceolatum (Ruiz & Pav.) Pers., Myrsine umbellata Mart. e Ruellia angustiflora (Ness) Lindau ex Rambo. Já as espécies chaquenhas ocorrem geralmente em afloramentos rochosos e solos rasos ou arenosos, dentre as quais se destacam como ornamentais, Colletia paradoxa (Spreng.) Escal., Jodina rhombifolia (Hook. & Arn.) Reissek, Schinus lentiscifolius Marchand e Scutia buxifolia Reissek.

Algumas espécies que existem naturalmente no Bioma Pampa possuem ocorrência ampla em outros biomas do Brasil, em outros países da América ou até mesmo em outros continentes. Dentre essas estão Bidens laevis (L.) Britton et al. e Crinum americanum L., que ocorrem nas Américas em áreas úmidas desde o sudeste dos Estados Unidos, passando pelos banhados sul-rio-grandenses, até alcançar o Uruguai; Hibiscus diversifolius Jacq., que habita regiões costeiras da América do Sul, da África e da Oceania; e Nymphoides indica (L.) Kuntze, que ocorre em corpos de água estagnada ao redor do mundo.

Diversas plantas nativas, para as quais muitas vezes não é atribuída importância econômica imediata pela população local, são frequentemente denominadas invasoras ou inços. Entretanto, elas fazem parte da paisagem natural do Bioma Pampa e participam da vegetação clímax dos campos ou de estágios de sucessão ecológica na regeneração de áreas alteradas, fornecendo abrigo ou alimento para outras espécies. Estas plantas poderiam, no máximo, ser consideradas indesejáveis em cultivos agrícolas, pela competição por nutrientes e espaço, ou em pastagens, por não oferecerem alimento ao gado. Contudo, não é por isso que deixam de ser plantas nativas no Bioma Pampa. Dentre essas plantas estão Aspilia montevidensis (Spreng.) Kuntze, Cordia curassavica (Jacq.) Roem. & Schult., Stenachaenium megapotamicum Baker e espécies dos gêneros Baccharis e Eryngium, que apesar de pouco exploradas economicamente, têm aplicação na medicina popular e são importantes fontes de pólen e néctar. Outras espécies nativas, como Campuloclinium macrocephalum (Less.) DC., Opuntia monacantha Haw. e Sesbania punicea (Cav.) Benth., foram levadas intencionalmente ou de forma não intencional para outros países e se

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tornaram espécies invasoras naqueles locais. Entretanto, continuam sendo espécies nativas no Bioma Pampa, onde convivem em harmonia com a flora e a fauna locais.

A diversidade de cores e formas nas plantas do Bioma Pampa é o resultado da interação de fatores como a posição geográfica do bioma em uma área de transição florística; da diversidade de ambientes e microclimas com paisagens diferenciadas, desde o Litoral até a Campanha, além da complexidade da história geológica e dos diferentes tipos de solos da metade sul do Rio Grande do Sul. Todos estes fatores contribuem para a existência de um mosaico de ecossistemas. Para ocupar essa amplitude de variações, a vegetação nativa apresenta adaptações morfológicas e fisiológicas que fazem da flora local um leque de possibilidades para a aplicação no paisagismo e na arte floral.

Plantas de sombra ou de sol, para grandes áreas ou para pequenos vasos, terrestres ou aquáticas, anuais ou perenes, com longo período de florescimento ou fugazes, dotadas de uma beleza clássica ou singular, enfim, plantas que atendem aos mais variados nichos de mercado estão presentes, aguardando pesquisas de propagação e viabilidade econômica. No entanto, a diversidade de ambientes que propicia a existência de diferentes tipos de vegetação, com plantas adaptadas para cada uma das formações, também torna esses locais frágeis a perturbações. A grande especificidade apresentada por algumas espécies as faz dependentes do microhabitat onde vivem. A remoção da vegetação nativa, a uniformização das paisagens naturais pelas monoculturas, bem como outras alterações nos ciclos ecológicos causadas pelo homem, além da coleta indiscriminada de plantas nativas em ecossistemas naturais, trazem conseqüências negativas que levam à redução das populações ou até mesmo à extinção de algumas espécies.

Por outro lado, a inserção de uma espécie em cultivo é uma forma de conservação ex situ (fora do seu habitat natural) e ajuda a despertar interesse na sua preservação à medida que aumenta sua visibilidade e importância econômica. Para ilustrar, podem ser citadas as cactáceas dos gêneros Frailea e Parodia, nativas no Bioma Pampa e que são amplamente cultivadas e comercializadas em todo o mundo. Estes cactos são perfeitamente adaptados aos afloramentos rochosos, onde poucas espécies conseguem sobreviver, mas não suportam pressões como pisoteio pelo gado, fogo ou coleta indiscriminada de

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espécimes para comercialização. Se, por um lado, o extrativismo, o comércio ilegal e a biopirataria contribuem para a extinção dessas espécies em seus ambientes, por outro, o cultivo das mesmas em bancos de germoplasma e jardins botânicos ainda não permitiu uma completa extinção. Talvez, um dia, essas coleções sirvam como fonte de material para a recomposição das populações naturais extintas ou em vias de extinção, garantindo a perpetuação dessas espécies em seus ambientes naturais.

Trevo-rosa (Trifolium polymorphum Poir.), espécie forrageira nativa no Bioma Pampa, com potencial também para uso ornamental (Fotografia: Elisabeth R. T. Stumpf).

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Quaresmeira-do-banhado (Tibouchina asperior Cogn.), espécie endêmica do Bioma Pampa, é utilizada como medicinal e apresenta potencial ornamental ainda inexplorado. Apesar de sua importância, esta espécie está ameaçada de extinção (Fotografia: Gustavo Heiden).

Créditos: Textos de autoria de Gustavo Heiden e João Ricardo Vieira Iganci, extraído de Stumpf, E.R.T.; Barbieri, R.L.; Heiden, G. (Org.). Cores e formas no Bioma Pampa - plantas ornamentais nativas. Pelotas: Embrapa Clima Temperado, 2009.

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Proposta de Emenda à Constituição nº 424 , de 2009

(Do Sr. Fernando Marroni)

Modifica o parágrafo 4º do artigo 225 da Constituição Federal, incluindo Pampa na lista dos biomas considerados patrimônio nacional.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:

Art. 1º Fica acrescido ao § 4º do art. 225, da Constituição, que passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 225..................................................................................

―§ 4º A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense, o Pampa e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.‖

Art. 2º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de

sua publicação.

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Justificativa

A Constituição de 1988 inovou ao assegurar o status de patrimônio nacional aos biomas Amazônico, Mata Atlântica, Pantanal Mato-Grossense, bem como a Serra do Mar e a Zona Costeira. Ocorre que, o Brasil possui seis biomas, a saber: Pampa ou Campos Sulinos, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Amazônico e Pantanal Mato-Grossense. O texto constitucional deixou de fora três dos sei biomas nacionais. Entretanto, já se encontra pronto para Plenário a PEC 115 de 1995, com vários apensos, visando sanar esta lacuna incluindo o Cerrado e a Caatinga no rol dos biomas considerados Patrimônio Nacional. Todavia, o bioma Pampa não figura neste rol constitucional criando com isso uma assimetria jurídica entre este bioma e os demais.

Neste contexto, para assegurar uma simetria jurídica entre os seis biomas que compõe o mosaico ecológico nacional, será de bom tom acrescer o bioma Pampa no bojo do texto Constitucional. E aqui vale uma pequena explanação sobre a importância deste bioma. O Pampa é um nome de origem Quechua, que é uma importante língua indígena da América do Sul ainda hoje falada por cerca de dez milhões de pessoas, genericamente dado à região pastoril de planícies com coxilhas, entre o estado brasileiro do Rio Grande do Sul, as províncias argentinas de Buenos Aires, La Pampa, Santa Fé, Entre Ríos e Corrientes e a República Oriental do Uruguai. É também chamado de campos sulinos e, segundo o IBGE, ocupa 2,% do território nacional.

Ecologicamente, é um bioma caracterizado por uma vegetação composta por gramíneas e plantas rasteiras, sendo encontradas algumas árvores e arbustos próximos a cursos d'água. Comparados às florestas e às savanas, os campos têm importante contribuição na preservação da biodiversidade, principalmente por atenuar o efeito estufa e auxiliar no controle da erosão. Na parte brasileira do bioma, existem cerca de três mil espécies de plantas vasculares, sendo que aproximadamente 400 são gramíneas, como capim-mimoso, pelo menos 385 espécies de aves, como pica-paus, caturritas, anus-pretos e 90 de mamíferos terrestres, como guaraxains, veados e tatus. No Brasil é um bioma ameaçado pelas ações antrópicas insustentáveis.

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O Bioma Pampa ocupa uma área de aproximadamente 700 mil

km², compartilhada pelo Brasil, Argentina e Uruguai, sendo que no território brasileiro se distribui pela metade sul do Rio Grande do Sul, abrangendo 176.496 km², o que corresponde a 64% do território gaúcho. O Pampa gaúcho é o único bioma brasileiro cuja ocorrência é restrita a somente um estado e que ainda conserva um total de 41,13% da cobertura vegetal nativa (original) _ 23,03% correspondem a formações campestres, 5,19% a formações florestais e 12,91% a formações de transição — mosaico campo-floresta. Isso quer dizer que mais de 50% do Pampa já está alterado ou ocupado de alguma maneira, por alguma atividade _ pecuária ou agrícola.

Atualmente, cerca de 40 espécies de animais que habitam campos estão ameaçadas de extinção no pampa gaúcho, como o veado-campeiro, o loboguará, o gato-palheiro e aves, como a noivinha-de-rabopreto, a águia-cinzenta, o veste-amarela e a corruíra-do-campo. O avanço sem controle de atividades potencialmente transformadoras da paisagem pode ser determinante na permanência dessas ou de outras espécies no Pampa Gaúcho. Uma nova matriz que vise à sustentabilidade, à manutenção da vida e dos serviços prestados pela natureza e que permita inter-relacionar unidades ambientais, interesses econômicos e preocupações sociais deve ser adotada, e para isso, de grande importância é que este bioma seja elevado à categoria de patrimônio nacional.

Destarte, contamos com os nobres pares desta Casa para aprovar esta PEC que incluirá o Pampa no texto Constitucional, possibilitando mais segurança ao uso sustentável deste tão importante bioma nacional.

Sala das Sessões, de de 2009.

Fernando Marroni

Deputado Federal PT/RS

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Contatos do Deputado Fernando Marroni

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