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476 ARTIGO ORIGINAL BIOSSEGURANÇA: O CONHECIMENTO DOS FORMANDOS DA ÁREA DA SAÚDE a Aline Daiane Ruthes Iarenhuk da Silva b Marco Fabio Mastroeni c Resumo O objetivo do estudo foi avaliar o conhecimento em biossegurança dos formandos dos cursos de graduação da área da saúde na Universidade do Contestado. Os dados foram coletados em outubro/novembro de 2005 e janeiro de 2006, utilizando-se, como instrumento, um questionário contendo 15 perguntas. Os voluntários foram abordados em sala de aula, nos primeiros 15 minutos da aula e convidados a participar da pesquisa. Dos 177 formandos candidatos a serem entrevistados, 114 (64,4%) responderam o questionário. As idades máxima e mínima encontradas foram 45 e 19 anos, respectivamente, sendo a média de idade 27,0 ± 7,1 anos. O teste Kruskal-Wallis revelou diferença significativa (p<0,05) em relação às notas médias finais dos formandos sobre o conhecimento em biossegurança nos cursos investigados, sendo o curso de Enfermagem o que apresentou maior nota média final (6,29). Acredita-se que tal resultado tenha decorrido principalmente do maior número de horas práticas existente no curso, 990 h/a, ou seja, um curso com maior número de disciplinas envolvendo o tema biossegurança necessariamente não é aquele que prepara melhor o aluno, mas sim o curso que possui maior carga horária em disciplinas com aulas práticas. Palavras-chave: Biossegurança. Educação. Prevenção de acidentes. BIOSAFETY: HEALTH PRE-GRADUATES’ KNOWLEDGE Abstract The objective of this study was to evaluate the knowledge about biosafety among last year health area students at the University of Contestado, SC. The data were collected in October/ November 2005 and January 2006. A 15 questions - questionnaire was used as an instrument. In the first 15 minutes of the class, the volunteers were approached in classroom and invited to a Texto redigido com base na dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Mestrado em Saúde e Meio Ambiente da Universidade da Região de Joinville (UNIVILLE). Órgão financiador: Fundo de Apoio à Pesquisa (FAP/Univille). b Aluna do Programa de Mestrado em Saúde e Meio Ambiente da UNIVILLE. c Doutor em Saúde Pública. Docente do Programa de Mestrado em Saúde e Meio Ambiente da UNIVILLE. Endereço para correspondência: Campus Universitário, s/n, Joinville, SC. CEP: 89.201-972 [email protected] Revista Baiana v33 n3 2009.indd 476 Revista Baiana v33 n3 2009.indd 476 20/4/2010 13:45:14 20/4/2010 13:45:14

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    ARTIGO ORIGINAL

    BIOSSEGURANA: O CONHECIMENTO DOS FORMANDOS DA REA DA SADE a

    Aline Daiane Ruthes Iarenhuk da Silvab

    Marco Fabio Mastroenic

    Resumo

    O objetivo do estudo foi avaliar o conhecimento em biossegurana dos

    formandos dos cursos de graduao da rea da sade na Universidade do Contestado. Os

    dados foram coletados em outubro/novembro de 2005 e janeiro de 2006, utilizando-se,

    como instrumento, um questionrio contendo 15 perguntas. Os voluntrios foram abordados

    em sala de aula, nos primeiros 15 minutos da aula e convidados a participar da pesquisa. Dos

    177 formandos candidatos a serem entrevistados, 114 (64,4%) responderam o questionrio.

    As idades mxima e mnima encontradas foram 45 e 19 anos, respectivamente, sendo a mdia

    de idade 27,0 7,1 anos. O teste Kruskal-Wallis revelou diferena significativa (p

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    participate in the research. From 177 pre- graduate candidates to be interviewed, 114 (64.4%)

    answered the questionnaire. The minimum and maximum age were 19 and 45, with 27.0

    7.1 year-old average. The Kruskal-Wallis Test revealed significant difference (p

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    relacionadas ao trabalho.7 Segundo Carvalho e Jales,8 os indivduos com nvel universitrio

    lideram o nmero de acidentes e infeces, seguidos pelos tcnicos de laboratrio e serventes.

    Outros estudos tambm confirmam esses dados: Zardetto, Guar e Ciamponi,9 com cirurgies-

    -dentistas, e Maciel, Viana, Zeitone, Ferreira, Fregona e Dietze,7 com estudantes de medicina.

    Toledo Jr. Ribeiro, Ferreira, Ferraz e Greco,10 em um estudo desenvolvido com estudantes de

    medicina, relataram elevado risco de exposio desses alunos a material biolgico e baixo nvel

    de conhecimento das medidas de biossegurana, a despeito de fazerem uso de algumas delas,

    demonstrado por cerca de um tero dos participantes. Segundo os pesquisadores, fundamental

    organizar estratgias de treinamento dos alunos no ensino formal.10

    O responsvel pelo gerenciamento do laboratrio, seja este de sade ou outras

    reas, deve oferecer a seus empregados a garantia de trabalhar com segurana, vacinao,

    reforar as polticas de proteo e segurana, manter materiais perigosos em local seguro,

    entre outros aspectos que garantam a minimizao de riscos.11

    Posso, SantAnna, Giaretta, Chagas e Cardoso12 destacam que a vivncia docente

    e o estudo desenvolvido na Universidade do Vale do Paraba trouxeram-lhes subsdios sobre

    o ensino da biossegurana nos cursos de Graduao da rea da sade. Tal estudo despertou

    o interesse e a conscincia de outros profissionais para o desempenho da prtica segura na

    universidade e na vida profissional. importante que a educao em biossegurana inicie j

    nas escolas, oferecendo aos estudantes preparo para a vida profissional.

    Nesse sentido, este estudo teve como objetivo avaliar o conhecimento em

    biossegurana de formandos dos cursos da rea da sade na Universidade do Contestado, no

    norte catarinense.

    MATERIAL E MTODOS

    Este estudo foi desenvolvido nas cidades de Mafra e Canoinhas, Regio Norte

    de Santa Catarina, no perodo de agosto de 2005 a janeiro de 2006. Trata-se de um estudo

    transversal, tipo inqurito, realizado por meio de questionrio para os formandos e entrevista

    estruturada para os coordenadores. Os sujeitos de estudo compreenderam todos os alunos

    formandos dos cursos de graduao em Cincias Biolgicas, Enfermagem, Farmcia e

    Optometria da Universidade do Contestado, turmas 2005, e os coordenadores dos respectivos

    cursos que concordaram em participar da pesquisa. No houve distino de sexo, cor, idade,

    religio ou condio socioeconmica. O nico critrio de excluso foi a no aceitao em

    participar do estudo.

    Os dados foram coletados em dois momentos outubro/novembro de 2005

    e janeiro de 2006 , utilizando-se, como instrumento, um questionrio contendo 15

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    perguntas. Os voluntrios foram abordados em sala de aula, nos primeiros 15 minutos da

    aula e convidados a participar da pesquisa com a leitura do Termo de Consentimento Livre e

    Esclarecido Termo de Consentimento Livre e Esclarecidos (TCLE). Em seguida, os voluntrios

    receberam os questionrios e foram convidados a responder as questes nos prximos 30

    minutos. De forma a garantir o entendimento das questes abordadas no questionrio, em

    agosto de 2005 foi realizado um pr-teste com 30 alunos dos cursos de Farmcia e Cincias

    Biolgicas de outra universidade da regio norte de Santa Catarina.

    Alm dos dados obtidos com o questionrio, outros dados como grade

    curricular, carga horria total, nmero de disciplinas, carga horria de aulas prticas e nmero

    de disciplinas que envolviam o tema biossegurana tambm foram coletados para cada curso

    investigado.

    O questionrio foi construdo de forma a representar o conhecimento mnimo

    em biossegurana que um aluno de sade deve apresentar aps sua formao na graduao.

    Nove temas foram selecionados com base em diferentes referncias na rea:11, 13-15

    1. controle do crescimento microbiano;

    2. preveno e combate a princpios de incndio;

    3. resduos de servios de sade;

    4. equipamentos de Proteo Individual;

    5. armazenamento de materiais;

    6. manuseio de perfurocortantes;

    7. precaues padro em qualquer tipo de paciente;

    8. primeiros socorros;

    9. principais doenas diagnosticadas em profissionais de sade.

    O questionrio utilizado para a entrevista com os coordenadores foi construdo

    de forma a identificar-se a cincia do coordenador quanto ao tema biossegurana no curso

    que coordena. Para os coordenadores dos cursos, utilizou-se entrevista individual, estruturada,

    com cinco perguntas, sendo uma fechada e quatro abertas.

    O desempenho de cada curso foi calculado com base na frequncia mdia de

    acertos das questes de todos os alunos. A cada questo atribuiu-se o valor de 0,67 pontos,

    totalizando, assim, 10 pontos para 15 acertos.

    A anlise estatstica foi realizada utilizando-se o programa Statistical Package

    for the Social Science (SPSS), verso 14.0. As notas so apresentadas sob a forma de mdia,

    desvio-padro, e organizadas segundo o curso. As diferenas de mdias entre os cursos foram

    verificadas utilizando-se o teste Kruskal-Wallis, para variveis com distribuio assimtrica.

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    A normalidade foi verificada mediante a aplicao do teste Shapiro-Wilk; o nvel de

    confiabilidade adotado foi de 95%.

    Os dados foram armazenados com o pesquisador responsvel pelo estudo,

    mantendo-se sob sigilo a identificao dos participantes. Quando houve concordncia

    em participar da pesquisa, os voluntrios assinaram o Termo de Consentimento Livre e

    Esclarecidos (TCLE), elaborado de acordo com as normas da Resoluo no 196/1996,

    do Conselho Nacional de Sade, sendo fornecida uma cpia a cada um. Este estudo foi

    submetido e aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa da Universidade da Regio de

    Joinville (UNIVILLE), sob o protocolo 058/2005.

    RESULTADOS

    Dos 177 formandos candidatos entrevista, 114 (64,4%) responderam o

    questionrio, 11 (6,2%) no estavam presentes no momento em que os dados foram coletados

    e 52 (29,4%) recusaram-se a participar da pesquisa. As idades mxima e mnima encontradas

    foram 45 e 19 anos, respectivamente, sendo a mdia de idade 27,0 7,1 anos.

    As frequncias relativas de acertos de cada questo e suas respectivas respostas

    so mostradas na Tabela 1. Das 15 questes que compuseram o questionrio para avaliar o

    desempenho dos alunos, a que apresentou maior frequncia relativa de acertos, na maioria

    dos cursos investigados, foi a de nmero 11: Luvas de procedimento devem ser utilizadas

    sempre que o profissional entrar em contato com sangue ou outros fludos corpreos. A

    questo com menor frequncia relativa de acertos na maioria dos cursos investigados foi a de

    nmero 10: Sempre que estocar produtos qumicos em uma estante imprescindvel fazer

    uma relao dos mesmos e armazen-los em ordem alfabtica para facilitar a localizao. As

    respostas para as questes 11 e 10 so sim e no, respectivamente.

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    Tabela 1. Frequncia relativa (%) de acertos de cada questo e suas respectivas respostas (R.), segundo o curso investigado. Santa Catarina, 2005

    CB: Cincias Biolgicas; FA: Farmcia; OP: Optometria; EN: Enfermagem.

    A Tabela 2 mostra a distribuio da carga horria total, o nmero de disciplinas

    do curso, a carga horria de aulas prticas e o nmero de disciplinas que envolviam o tema

    biossegurana, segundo o curso investigado. O curso de Farmcia foi o que apresentou maior

    carga horria total (4.185 h/a), maior nmero de disciplinas (63) e maior nmero de disciplinas

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    que envolviam o tema biossegurana. O curso de Enfermagem foi o que apresentou maior

    carga horria de aulas prticas, 990 h/a.

    Tabela 2. Carga horria total, nmero de disciplinas do curso, carga horria de aulas prticas e nmero de disciplinas que envolviam o tema biossegurana, segundo o curso. Santa Catarina, 2005

    Em relao s entrevistas realizadas com os coordenadores de cada curso,

    apenas um recusou-se a participar. Quando questionados sobre a classificao do curso,

    50% dos coordenadores o consideraram bom, 25% regular e um optou por no responder,

    alegando ser difcil mensurar o conhecimento do assunto biossegurana em um curso novo,

    mesmo com alunos formandos.

    Ao serem questionados sobre a importncia do assunto biossegurana nos

    cursos da rea da sade, todos salientaram a relevncia do tema, principalmente para que os

    alunos criem uma cultura prevencionista, j que esto ligados a uma profisso com provvel

    exposio a diferentes fatores de risco.

    No momento em que foram apresentados os resultados obtidos dos

    questionrios realizados com os alunos, todos os coordenadores demonstraram surpresa

    e relataram a possibilidade dos docentes no terem repassado tal conhecimento de forma

    adequada aos alunos. Consideraram ainda a pesquisa importante para avaliar o prprio curso.

    No ltimo questionamento, em que o coordenador foi solicitado a fornecer

    alternativas para melhorar os resultados apresentados, as principais sugestes foram:

    desenvolver cursos de aperfeioamento para professores e alunos; reformular as grades e

    ementas curriculares; e criar um projeto nico, tendo a biossegurana como seu eixo principal

    para todos os campi da universidade.

    O teste Kruskal-Wallis revelou diferena significativa (p

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    Tabela 3. Nota mdia final, desvio padro (DP) e valor de p segundo o curso. Santa Catarina, 2005

    DISCUSSO

    Entender a biossegurana como base educacional fundamental do ponto

    de vista cientfico, mas, ao mesmo tempo, estratgico para garantir a segurana biolgica

    dos indivduos e do ambiente que os cerca. Silva16 e Mastroeni5 revelam que a falta de

    uma cultura prevencionista tem sido o principal obstculo para as pessoas agirem com

    precauo nos locais de trabalho. A ausncia de uma cultura prevencionista est relacionada

    principalmente carncia de investimentos em cursos de atualizao, de incentivo educao

    em biossegurana por parte das instituies pblicas e privadas, de editais provenientes de

    instituies de fomento que possibilitem a capacitao dos profissionais das diversas reas

    do conhecimento, entre outras. nesta perspectiva que este estudo buscou focalizar a

    importncia do conhecimento em biossegurana ainda nos cursos de graduao.

    No Brasil, estudos isolados realizados com os cursos de Enfermagem, Medicina e

    Odontologia10,17 mostraram a dificuldade em discutir o assunto do ponto de vista da formao

    e, principalmente, enquanto norma de segurana. Tal dificuldade pode ser percebida pelo

    reduzido nmero de publicaes que enfocam a biossegurana em seu aspecto prtico,

    ou seja, aquele que responde s dvidas dos profissionais em diferentes reas da sade.

    Consiglieri e Hirata18 salientam que os alunos no esto conscientizados a respeito das

    medidas de segurana, visto que deveriam receber treinamento sobre o tema durante a

    faculdade, nas disciplinas afins. Essas evidncias condizem com os resultados obtidos neste

    estudo, os quais mostraram diferenas nas respostas dos temas abordados. Como exemplo

    cita-se a resposta dos alunos quando questionados sobre a necessidade de usar luvas de

    procedimento sempre que houver contato com sangue ou outros fludos corpreos. No

    obstante a maioria dos alunos terem acertado essa questo, preocupante saber que alguns

    ainda desconhecem a obrigatoriedade do uso desse EPI quando sangue ou outros fludos

    corpreos forem manipulados, independente de o material estar ou no contaminado.

    Segundo Mastroeni5, as luvas so de uso obrigatrio para todos aqueles que trabalham em

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    ambientes laboratoriais, em que so manipulados desde microrganismos patognicos at uma

    simples lavagem de material.

    Outro tema abordado no estudo e de extrema relevncia diz respeito ao

    processo de esterilizao de materiais. A despeito do uso da autoclave e do forno eltrico

    para esterilizao (este erroneamente chamado de estufa pela maioria dos profissionais

    de sade) serem equipamentos bem conhecidos e certamente utilizados na disciplina de

    microbiologia, nenhum curso investigado obteve ndice de acerto superior a 40,0%. Zardetto,

    Guar e Ciamponi9 relataram, no estudo desenvolvido com cirurgies dentistas em So Paulo,

    que 31,2% dos entrevistados no possuam conhecimento sobre o tempo e a temperatura

    ideais para a esterilizao utilizando-se forno eltrico. As tcnicas de esterilizao permitem

    assegurar nveis de esterilidade compatveis com as caractersticas do produto, sendo

    imprescindvel que o tempo e a temperatura estejam corretos. Alm disso, uma vez iniciado,

    o ciclo de esterilizao no forno no poder ser interrompido.

    O tema reencape de agulhas, principal causa de acidentes em profissionais

    de sade, tambm mostrou o pouco conhecimento dos voluntrios em um procedimento

    de elevado risco de contaminao. Com exceo do curso de Enfermagem, que obteve

    66,7% de acertos, quando questionados se o reencape deve ser efetuado, os demais cursos

    no excederam 50%. Um estudo realizado com cirurgies dentistas em Maryland, Estados

    Unidos, constatou aumento no uso de equipamentos de proteo. Entretanto, destacou altas

    taxas de reencape de agulhas, uma vez que, nessa categoria, o procedimento de anestesia

    exige a repetio desse ato durante um mesmo atendimento.19 Branco e Caixeta,20 em um

    estudo que buscou identificar profissionais de sade envolvidos em acidentes com material

    biolgico em seis hospitais pblicos do Distrito Federal, relataram que a categoria profissional

    associada ao maior nmero acidentes foi a de cirurgio-dentista, seguida dos mdicos, em

    que a principal causa foi o uso de material perfurocortante. Os autores colocaram ainda que

    o nmero de acidentes envolvendo material biolgico pode ser reduzido se as normas de

    biossegurana forem implementadas no ambiente de trabalho.20 Gir, Caffer Netto, Malaguti,

    Canini, Hayashida e Machado,21 em estudo que analisou os acidentes com material biolgico

    ocorridos com alunos de graduao da rea da sade, revelaram que 78,2% dos acidentes

    foram do tipo percutneo, sendo os alunos de odontologia os que registraram maior

    frequncia (48,8%).

    Os profissionais de sade envolvidos na assistncia direta a pacientes, ou aqueles

    que manipulam ou tm contato com materiais biolgicos potencialmente contaminados,

    apresentam risco no s infeco pelo HIV, mas tambm a outros agentes infecciosos.22

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    Maciel, Viana, Zeitone, Ferreira, Fregona e Dietze7 ressaltam que os estudantes representam

    um grupo de risco com elevada chance de contrair infeces e enfatizam a importncia da

    exposio ocupacional durante os estgios curriculares.

    Quanto ao curso de Enfermagem ter obtido a maior nota mdia final, ainda

    que inferior a 70% de acertos, acredita-se que tal resultado seja devido principalmente

    ao maior nmero de horas prticas nesse curso: 990 h/a. Manter o aluno maior tempo

    junto s disciplinas com aulas prticas permite que perceba a importncia das normas de

    biossegurana para sua segurana e a da equipe, o que, certamente, contribuir para diminuir

    ou evitar a gerao de acidentes quando se tornar profissional. Seguindo este raciocnio,

    conclui-se que um curso com maior nmero de disciplinas envolvendo o tema biossegurana

    necessariamente no aquele que prepara melhor o aluno, mas sim o curso que possui maior

    carga horria em disciplinas com aulas prticas.

    Em relao entrevista com os coordenadores dos cursos, todos foram unnimes

    em revelar surpresa frente aos resultados obtidos e enfatizaram urgncia em realizar cursos e

    treinamentos peridicos para alunos e professores, alm de alteraes nas grades curriculares.

    No basta construir laboratrios com equipamentos adequados e disponibilizar

    material de segurana sem investir em educao e treinamento.2 O grande problema no

    est nas tecnologias disponveis para eliminar os riscos, mas sim no comportamento dos

    profissionais.23

    CONSIDERAES FINAIS

    O conhecimento em biossegurana dos formandos de todos os cursos foi

    considerado insuficiente, na medida em que nenhum curso atingiu a mdia de 70% de

    acertos das quinze questes aplicadas. Acredita-se que o sistema educacional seja falho no

    ementrio, como os coordenadores alertaram, mas falta comprometimento dos profissionais

    educadores para salientar determinadas normas, ou at mesmo cobrar em suas aulas detalhes

    que fazem a diferena, visto que tais condutas podem evitar acidentes.

    Os resultados mostraram diferena significativa das mdias finais entre os cursos

    investigados, sugerindo que os formandos do curso de enfermagem sejam os mais aptos a

    trabalhar com segurana, principalmente pelo nmero de horas/aula, atividades prticas e

    disciplinas relacionadas ao tema biossegurana que tal curso apresenta.

    Os coordenadores mostraram interesse em mudar o perfil dos resultados,

    criando alternativas que propiciem melhorar o ensino tanto no aspecto terico como no

    prtico. Entretanto, alm do interesse, preciso colocar em prtica tais alternativas.

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    As medidas tomadas no contexto da biossegurana, aliadas economia de

    recursos, preservao do meio ambiente, tica e responsabilidade certamente iro garantir

    maior qualidade de vida para os profissionais de sade, alm de manter a segurana do

    ambiente de trabalho.

    REFERNCIAS1. Souza ACS. Risco biolgico e biossegurana no cotidiano de enfermeiros

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    Recebido em 12.12.2008, aprovado em 17.11.2009.

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