Black Sabbath - Biografia ilustrada

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BLACK SABBATH

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Com mais de quarenta anos de história, o Black Sabbath revolucionou a história do rock dando o impulso inicial para a criação e propagação do heavy metal. Em quatro décadas de sucesso, a banda liderada por Tony Iommi tem seu reconhecimento em clássicos do metal como “Sabbath Bloody Sabbath” e “Paranoid”. O Sabbath teve vários integrantes, mas foi na voz e na figura excêntrica de Ozzy Osbourne que o grupo ganhou peso no cenário musical. Nesta biografia não autorizada, o leitor vai conhecer toda a trajetória da banda que tingiu o rock com tons mais obscuros e letras que falavam sem medo do mundo das trevas. Traz ainda a discografia completa, curiosidades e fotos sensacionais.

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Universo dos Livros Editora Ltda.Rua do Bosque, 1589 • 6º andar • Bloco 2 • Conj. 603/606Barra Funda • CEP 01136-001 • São Paulo • SPTelefone/Fax: (11) 3392-3336www.universodoslivros.com.bre-mail: [email protected] no Twitter: @univdoslivros

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1ª edição – 2013

Diretor editorialLuis Matos

Editora-chefeMarcia Batista

Assistentes editoriaisCássio Yamamura

Raíça AugustoRaquel Nakasone

ColaboraçãoPedro Zambarda de Araújo

PreparaçãoRodolfo Santana

RevisãoAna Luiza Candido

Claudia Valeria Ortega

Arte e capaFrancine C. SilvaValdinei Gomes

Foto de capaPaul Bergen/Redferns

13-0858 CDD 782.4216

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Angélica Ilacqua CRB-8/7057

B564 Black Sabbath – Biografia Ilustrada/elaborado pela equipe Universo dos Livros – São Paulo: Universo dos Livros, 2013.

184 p.

Bibliografia

ISBN: 978-85-7930-606-8

1. Black Sabbath (conjunto musical) - biografia 2. Rock 3. Música

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São Paulo2013

BiogrAfiA iLuSTrAdABLACK SABBATH

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Sumário

introdução

Capítulo 1Que Se façam aS trevaS!

Capítulo 2do pó ao rock, do rock ao pó

Capítulo 3

a inStabilidade doblack Sabbath e o SuceSSo da

carreira Solo de ozzy

Capítulo 4ozzy, o retorno (?)

Capítulo 5heaven & hell

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introdução

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8 Retrato de Ozzy Osbourne durante uma entrevista em Londres, em 1975.

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Eles eram pobres, esquisitos e fãs de Beatles. Surgiram em Birmingham, uma região operária da Inglaterra, e tingiram o rock com tons negros e obscuros após a overdose cultural trazida

pelo Flower Power e pelo movimento hippie.Ozzy, Geezer, Tony e Bill foram as quatro marcas vivas do Black Sabbath

e do rock’n’roll dos anos 1970. Tornaram-se os pais do heavy metal ao decidir que suas guitarras distorcidas e suas letras refletiriam temas den-sos, indo além de desilusões amorosas e dos hinos contra a Guerra do Vietnã que seus antecessores cantavam.

O Black Sabbath se transformou em uma banda que vendeu mais de 70 milhões de discos ao redor do mundo. Mesmo após quarenta anos de estrada, eles continuam promovendo turnês ao vivo e novos álbuns, como 13, lançado em 2013.

A banda definiu uma estética que consagrou os metaleiros de cabelos compridos, roupas escuras e que cantam, sem medo algum, sobre o dia-bo, as trevas e a melancolia. O maior inimigo da carreira do Sabbath não é o longo tempo de estrada ou a idade dos músicos, mas sim as intrigas internas que vivem separando a formação original.

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Ozzy Osbourne, por abusar de drogas e álcool, foi demitido pelos pró-prios amigos do Black Sabbath nos anos 1980 e decidiu se lançar em carreira solo. A empreitada foi um sucesso absoluto, e rendeu 100 mi-lhões de discos vendidos. Mesmo assim, o cantor voltou a se reunir com seus antigos colegas em 1997. Atualmente, devido ao câncer do guitarris-ta Tony Iommi, Ozzy Osbourne decidiu unir esforços com o Sabbath entre 2012 e 2013 para a criação de novos materiais.

O Black Sabbath sobreviveu com outras formações além de Ozzy nos vocais. Ronnie James Dio transformou a banda em um novo fenômeno nos anos 1980. Mas, assim como seu antecessor, Dio descobriu que pode-ria fazer sucesso sozinho e também saiu da banda. O Sabbath teve uma breve contribuição de Ian Gillan, a voz do Deep Purple, e de Glenn Hughes, outro grande nome do hard rock.

A fase mais baixa do grupo foi com os vocalistas Ray Gillen e Tony Martin, sendo este último o segundo cantor que ficou mais tempo com o Sabbath, perdendo apenas para Ozzy. Eles não possuíam o mesmo ca-risma de seus antecessores, e a banda ficou sem o baixista Geezer Butler e o baterista Bill Ward. Durante esses anos, entre 1987 e 1990, o Black Sabbath foi mantido por Tony Iommi, o guitarrista canhoto que tem dois dedos da mão direita parcialmente amputados.

Tony Martin tocou com o Sabbath entre 1993 e 1995. Nas décadas de 1990 e de 2000, a banda se reuniu com Ozzy e Dio. Entre 2006 e 2009, Dio transformou o Black Sabbath no projeto Heaven and Hell. Depois, o cantor descobriu um câncer no estômago e faleceu em 2010.

A morte de Dio serviu para reunir novamente Bill, Geezer, Ozzy e Tony. Três deles permaneceram juntos, mas o baterista brigou com os demais. Bill Ward se sentiu secundário no Black Sabbath, sem o devido crédito, mesmo com a reunião do grupo original. O baterista saiu, mas baixista, guitarrista e vocalista continuam levando a música do Sabbath ao mundo todo.

Hoje o Black Sabbath tem 45 anos de estrada. Eles são responsáveis por um rompimento sem precedentes no rock, tendo criado um sub-estilo completo: o metal. A história da banda é marcada por abuso de drogas e

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álcool, pela fama e por grandes concertos. As músicas vivem nos acordes estridentes com um fundo de tempestade da música “Black Sabbath”, e até na letra punk de “Paranoid”. “Heaven and Hell” mostra que o Sabbath existe muito além de Ozzy Osbourne.

A biografia do Black Sabbath é sobre quatro músicos de preto, sobre um grupo que se reinventou com as trocas dos integrantes e sobre uma mudança drástica – e permanente – no rock. Sabbath é a própria meta-morfose de um estilo musical.

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capítulo 1

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14 Black Sabbath reunido, em janeiro de 1970.

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Que Se façamaS trevaS!

“Antes, eu estava mais interessado em ficar chapado e bêbado pra caralho do que fazer música. É fácil cair na armadilha de pensar: ‘Como vou criar sem uma garrafa de vodca ao lado?’. É uma falá-cia, porque você é viciado em substância e se engana, achando que, se tirar as substâncias, não consegue fazer.”1

Ozzy Osbourne.

Terence Michael Joseph Butler nasceu em 17 de julho de 1949 em Aston, na região metropolitana de Birmingham. Chamava todas as pessoas de “Geezer”, o nome que virou seu apelido aos oito anos de

idade. De acordo com o baixista, geezer era uma gíria para homens madu-ros na Inglaterra. No Reino Unido, também é uma palavra para designar homens velhos e excêntricos.

Geezer se tornaria conhecido por utilizar uma variedade de contrabai-xos em sua carreira, desde o Fender Precision Bass até o Rickenbacker 4001. No entanto, ele mesmo afirma que nunca tinha experimentado um baixo elétrico até entrar no Black Sabbath. Ele sabia apenas tocar guitarra.

Em meados de 1967, Geezer Butler formou com Ozzy Osbourne uma banda chamada Rare Breed. O cantor conheceu o baixista após publicar um anúncio em um jornal, que dizia: “ozzy zig precisa de uma banda. Vocalista com experiência, possui um sistema de PA*. Lodge Road, nú-mero 14”. Ozzy recebia os interessados entre 18h e 21h, nos dias de sema-na. Não tinha telefone para atender porque sua família era muito pobre.

* Sigla para power am-plifier, termo em inglês para amplificador.

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Ozzy Osbourne tinha sido preso após roubar uma televisão e queria fazer sucesso como cantor de rock depois de ter ouvido Beatles. Geezer já estava no Rare Breed, tocando guitarra, mas não tinha um cantor para completar a banda. “Você é... Ozzy Zig? Acabamos de perder nosso vo-calista”, disse Geezer Butler, ao se apresentar ao pretenso cantor. E Ozzy disse que já conhecia o som do Rare Breed. “Vocês são os caras com luzes estroboscópicas e com o cara hippie com bongôs ou algo assim, certo?”

O rock progressivo, com composições que fugiam da simplicidade de John Lennon e Mick Jagger no começo de suas carreiras, era a musicali-dade predominante da época, inspirada pelo uso abusivo de drogas sinté-ticas. Não era aquilo que Ozzy queria para ele, mas o Rare Breed foi a primeira oportunidade de sua carreira. No entanto, foi Geezer Butler quem aproveitou melhor essa banda principiante, nas palavras do pró-prio cantor: “Geezer tocava guitarra base no Rare Breed e não era ruim. Mas o mais importante era que ele tinha a imagem adequada, com o cabelo de Jesus e o bigode de Guy Fawkes*”.

“Não me pergunte de onde surgiu o ‘Zig’ em ‘Ozzy Zig’. Só surgiu na minha cabeça, um dia. Depois que saí da prisão, estava sempre pensando em novas formas de me promover como cantor. A chance de conseguir era uma em um milhão – e mesmo assim eu era otimista. Eu faria qual-quer coisa que pudesse me salvar do destino”, afirma Ozzy Osbourne em sua autobiografia, ao conhecer o músico chamado Terence Michael Joseph “Geezer” Butler, em meados de 1960. O baixista, segundo Ozzy, tinha o rosto idêntico à figura histórica de Guy Fawkes, com cabelos longos e barbicha chamativa. Fawkes inspirou, anos depois, o escritor Alan Moore

na criação da graphic novel V de Vingança, história que criticou o gover-no inglês da primeira-ministra Margaret Thatcher.

Ozzy não tinha consciência disso em 1967, tampouco o próprio Geezer, mas o visual com cabelos compridos e aparência extravagante seria fun-damental para o sucesso deles nos anos seguintes.

Ozzy chegou a afirmar que não via problema em ser (ou tentar ser) o próximo Pink Floyd. Mas o cantor sabia que essa era uma banda de elite,

* Fawkes (1570-1606) foi um conspirador católico

do Reino Unido que tentou detonar o Parla-

mento inglês na famosa Conspiração da Pólvora, em 1605. Ele foi conde-nado à morte e executa-do em Westminster, em Londres. Seu corpo foi

esquartejado e espalhado pela cidade.

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ouvida por estudantes universitários de classe alta. Por mais que ele cur-tisse ouvir “Interstellar Overdrive” sob o efeito de drogas, Ozzy entendia que a sua música era o oposto daquilo.

*

Anthony Frank “Tony” Iommi era mais velho que Ozzy e Geezer. Nasceu no dia 19 de fevereiro de 1948, também na cidade operária de Birmingham. Tony cresceu querendo tocar bateria, mas, pelo barulho, acabou escolhen-do a guitarra elétrica. Foi influenciado por Hank Marvin, guitarrista de Newcastle e integrante de uma banda chamada The Shadows.

Seus pais, Anthony Frank e Sylvia Maria Iommi, eram católicos, mas não muito praticantes. O pai de Tony nasceu no Reino Unido, segundo o próprio instrumentista, mas sua avó paterna teria nascido no Brasil, uma terra distante de Birmingham. Já a mãe Sylvia Maria tinha vindo da Itália, outro país tipicamente cristão. Dessas origens familiares, Tony Iommi her-dou uma crença em Deus, mas sem filiação a nenhuma igreja.

Apesar de ser um profundo admirador de música pesada, Tony tinha medo do escuro quando pequeno e costumava dormir com uma lanterna ou com alguma luz da casa acesa. Quando tinha entre oito e nove anos de idade, teve o lábio superior cortado quando brincava com o amigo Bobby Nuisance, em Bennetts Road. Por esse motivo, mais tarde, o jo-vem Tony passou a cultivar o famoso bigode.

A família de Tony era musical, visto que o pai e os tios tocavam acor-deão. Iommi afirma que seu sonho era ter um kit de bateria, mas sua casa não comportava tal equipamento (além de ser impossível tocar esse ins-trumento sem incomodar os que moravam com ele). Tocar acordeão era a solução para o menino que aos dez anos já se interessava por música.

Mais tarde, Tony Iommi ficaria conhecido por tocar com sua guitarra SG da marca Gibson,1que era pouco usada no começo dos anos 1970. Ele popularizaria o modelo nas cores vermelha e preta, principalmente.

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Além do guitarrista do Shadows, Tony gostava de Beatles, Cliff Richard e um pouco de Elvis. Na opinião de Iommi, Cliff foi um músico muito maior no Reino Unido se comparado com Elvis Presley, que provocou um estouro de rock’n’roll nos anos 1950. “Eu conversei com Cliff algu-mas vezes em minha vida, mas nunca disse ao cara: ‘Sou um grande fã seu’”, confessou Tony em sua autobiografia.

Filho único, desde cedo Tony foi obrigado a trabalhar para ajudar no sustento da casa. Sofreu um acidente que mudaria sua vida aos dezes-sete anos, em 1965. O rapaz de Birmingham teria parte do dedo anelar e do dedo médio da mão direita arrancados por uma prensa de metal da fábrica onde trabalhava, justamente em seu último dia como empregado. Como Tony resolveu tocar guitarra, ele quase pensou em largar o instrumento.

“As coisas ocorreram tranquilas pela manhã. Depois de voltar do meu almoço, pela tarde, empurrei o pedal e a prensa caiu direto em minha mão direita. Os ossos dos meus dedos estavam expostos. Eu não conse-guia acreditar. Havia sangue em todo canto. O choque foi tanto que não doeu de cara.”2

Tony Iommi

Tony colocou próteses na mão e foi estimulado a ouvir um artista cha-mado Django Reinhardt, um guitarrista que tocava com os dedos, abu-sando do dedo médio e não utilizando tanto a palheta. O estilo do músi-co de jazz inspirou o compositor de Birmingham a utilizar seu instrumento invertido, com a postura de um músico canhoto, mesmo sem ter parte dos dedos, e sem precisar se esforçar para tocar como um destro, como era comum na época.

“As pessoas dão crédito à perda dos meus dedos pelo som profundo e pela afinação diferente que trouxe ao Black Sabbath, que virou modelo para a maioria das músicas pesadas criadas a partir daquela época. Eu admito que doía como o inferno tocar guitarra do jeito convencional com os ossos dos

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meus dedos, e eu tive que reinventar meu estilo de tocar para amenizar a dor. Nesse processo, o Black Sabbath começou a soar como nenhuma ban-da soava antes – ou a partir daquela época. Agora, se o heavy metal foi criado por causa dos meus dedos? Bom, isso é muito exagero”, disse Tony*. Para ele, sua guitarra ajudou a caracterizar a melodia do grupo, mas foi apenas isso.

Na época do acidente, Tony Iommi tocava em uma banda chamada Rockin’ Chevrolets, que começou em 1964 e acabou no ano seguinte. O grupo, que se inspirava em rock e blues, chegou a fazer sucesso no Reino Unido e a viajar para a Alemanha, forçando Tony a abandonar seu em-prego como operário na Inglaterra.

Nessa banda, Tony tocava uma guitarra modelo Stratocaster, da marca Fender. Ele ainda não planejava fazer um som pesado e nem sonhava em ter sua SG vermelha. O instrumentista tinha uma guitarra elétrica básica para blues, com um amplificador Vox AC 30.

“Eu tinha 16 anos de idade [na época do Rockin’ Chevrolets]. Na mi-nha mente, eles eram realmente profissionais. Eles conseguiam tocar as músicas do The Shadows perfeitamente e, porque a maioria dos caras era mais velho do que eu, eles faziam um bom rock’n’roll. Eu nunca fui um fã de Chuck Berry, Gene Vincent ou Buddy Holly, mas daquela forma eu conheci a música deles.”3

Tony Iommi

O guitarrista tocou muito blues e aprendeu os primórdios do rock nes-sa primeira banda. Saindo do Chevrolets, Tony entrou em uma banda chamada The Rest, entre 1966 e 1967. Lá ele conheceu um baterista potente e cabeludo chamado Bill Ward. Em sua companhia, ele funda-ria o futuro Earth, que se tornaria o Black Sabbath.

*

* Iron Man. Tradução para o português de trecho de “Introduction: The Sound of Heavy Metal”.

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Entre os nascimentos de Tony e Ozzy, veio William Thomas “Bill” Ward, no dia 5 de maio de 1948, também em Aston. Ele aprendeu a tocar bateria influenciado pela música dos anos 1940, ainda criança. Ouvia as batidas de Gene Krupa, Buddy Rich e Louie Bellson.

Bill conheceu Tony na banda The Rest, mas ficou pouco tempo com o guitarrista naquele grupo. Os dois decidiram participar de outra banda, chamada Mythology, entre 1967 e 1968. Nesse grupo, eles tiveram seus primeiros problemas com drogas.

No mês de janeiro de 1968, Tony Iommi entrou como guitarrista no Mythology. Um mês depois, em fevereiro, Bill Ward assumiu a bateria da banda. Em maio, eles foram detidos pela polícia por porte de resina de maconha. O processo rendeu uma multa de 15 libras e uma condicional para Bill, Tony e seus colegas de banda, Neil Marshall e Chris Smith.

O último concerto deles foi em 13 de julho, no Queen’s Hotel, em Silloth.

*

John Michael “Ozzy” Osbourne nasceu em 3 de dezembro de 1948 também em Aston. Aos catorze anos, se tornou fã de Beatles, um vício musical que levou para o resto da vida, e que sempre influenciou sua carreira e a trajetória do Black Sabbath. Na adolescência, era consi-derado maluco pelas garotas. Ou, em suas próprias palavras: “Não era exatamente um Romeu na escola”. Aos quinze, após problemas esco-lares, foi empurrado pelo pai para começar a trabalhar. Foi assistente de obras, encanador, aprendiz de fábrica, afinador de buzinas de au-tomóveis (que ele considerou como seu “primeiro trabalho na indús-tria musical”) e até funcionário de um matadouro de animais (um de seus trabalhos prediletos).

Desde pequeno, Ozzy odiava a escola. Ele lembra com trauma de seu primeiro dia de aula no Prince Albert Juniors, quando foi arrasta-do pelo colarinho aos prantos por não querer entrar. O garoto tinha dificuldade para ler e não tirava boas notas.

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O apelido Ozzy Zig veio na escola primária e se tornou seu nome ar-tístico, sendo que apenas sua primeira esposa, Thelma, o chamava pelo nome original: John.

Mesmo começando a trabalhar cedo, os empregos não impediram que Ozzy Osbourne tivesse um breve momento como ladrão de televisores. O cantor subiu com a TV em cima de um muro e caiu com ela sobre o próprio peito. Acabou preso.

“Meu pai sempre disse que eu iria fazer algo importante algum dia. ‘Sinto isso, John Osbourne’, ele me dizia, depois de algumas cervejas. ‘Ou você vai fazer algo muito especial ou vai acabar na cadeia’. E ele estava certo, meu velho pai. Fui parar na cadeia antes de completar 18 anos. Roubo – foi assim que acabei lá. Ou, como estava escrito no documento de acusação: ‘Invasão de domicílio e roubo de bens no valor de 25 libras’. O que equiva-le a umas 300 libras nos dias de hoje.”4

Ozzy Osbourne

Ozzy ficou preso por algumas semanas em Winson Green e saiu no inver-no de 1966. Lá, o jovem cortou os cabelos e tatuou o corpo, com medo de parecer muito feminino diante dos outros detentos e acabar sendo estuprado. Quando saiu da prisão, decidiu se dedicar à carreira de cantor.

Ao lado de Geezer Butler, Ozzy formou o Rare Breed, que fez apenas dois shows antes de desmanchar. Ao conhecer o baterista Bill Ward e o guitarrista Tony Iommi, o quarteto decidiu formar o Polka Tulk Blues Company. A banda tinha mais dois integrantes: o guitarrista de slide*

Jimmy Phillips e o saxofonista Alan “Aker” Clarke.Com mais dois shows, Aker e Jimmy foram demitidos. Ozzy, Tony e o

grupo rebatizaram a banda de Polka Tulk, apenas. Mas, mesmo com essa mudança, o nome não se fixou. Então eles a rebatizaram com o nome de Earth, mesmo com a rejeição quase instantânea que veio logo em segui-da, em setembro de 1968.

* Técnica de extrair sons utilizando um pequeno cilindro de metal ou plástico no braço do instrumento.

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“Nós tocávamos blues, como Ten Years After, e Fletwood Mac original. Tínhamos uma perua cheia de equipamento e íamos aos shows esperan-do que as outras bandas não conseguissem nada, o que aconteceu diversas vezes. Costumávamos tocar por dinheiro nenhum. Fazíamos recepções para casamentos.”5

Ozzy Osbourne,

Tony Iommi saiu temporariamente do Earth, em dezembro daquele ano, para tocar guitarra no Jethro Tull em um show batizado de “The Rolling Stones Rock & Roll Circus”, com participação de John Lennon, Keith Richards, Mick Jagger, Yoko Ono e do The Dirty Mac, banda formada por Lennon, Eric Clapton, Mitch Mitchell e Keith Richards apenas para tocar uma jam nesse show.2

A saída de Tony foi recebida com espanto, desejos de boa sorte e tristeza pelos amigos do Polka Tulk. Eles chegaram a ir a um bar para encheram a cara. Segundo Ozzy, “só havia um Tony Iommi e sabíamos disso”.

Em dezembro daquele ano, o guitarrista voltou aos amigos Geezer, Ozzy e Bill. Ele queria ter um projeto original e fazer algo mais profundo além de tocar guitarra com John Lennon, Keith Richards ou Eric Clapton – homens até hoje considerados deuses do rock’n’roll. Sua volta foi rece-bida com alegria e espanto.

Tony disse que Ian Anderson (líder do Tull e a pessoa que entrou em contato com o guitarrista) era um cara divertido, mas que não provocava risadas como seus amigos de banda amadora. Um ano depois, em de-zembro de 1969, desentendimentos com outra banda chamada Earth no Reino Unido forçaram os garotos de Birmingham a trocar de nome. Ou seria assim, ou eles seriam processados.

*

Tony Iommi, assim que saiu do Tull e voltou a se reunir com seus amigos, disse: “Olha, esqueça o nome. Só precisamos concordar que

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queremos algo sério. Não podemos ficar zoando. Vi como os caras do Jethro Tull trabalham. E eles trabalham: quatro dias de ensaio para um show. Precisamos começar a fazer isso”6. Quando o grupo de Ozzy dei-xou de ligar para o nome da banda, uma ideia boba surgiu e ficou. Um filme de terror de qualidade duvidosa iria inspirá-los.

A ideia do nome partiu do baixista Geezer Butler, que assistiu a um filme de terror de baixo orçamento chamado Black Sabbath, do diretor Mario Bava, originalmente lançado em 1963. O longa-metragem deu ideias para Tony Iommi, que resolveu comentar que não entendia como alguém podia assistir àquele tipo de produção: “Por que gastam dinheiro para ver coisas que dão medo? Talvez a gente devesse parar de fazer blues e começar a escrever músicas de medo”7, disse Tony. A pergunta do gui-tarrista ficou, e o nome “Black Sabbath” inspirou Bill e Ozzy a criarem uma música e a mudarem o direcionamento da banda.

O baixista Geezer teve um pesadelo naquele ano de 1969 com uma figura obscura perseguindo-o, como se fosse o próprio diabo. Ele e Ozzy acharam que aquela história resultaria em uma boa música, recebendo ajuda de Bill Ward. Tony Iommi contribuiu com o que aprendeu a fazer de melhor: frases na guitarra elétrica. Com um intervalo musical chama-do trítono, Tony popularizou o que seria chamado de “timbre do demô-nio”, um tipo de sonoridade que havia sido banida pela Igreja Católica na Idade Média porque provocava medo nos fiéis.

As letras de Ozzy Osbourne, que narravam o desespero de Geezer Butler no pesadelo, contagiaram os ouvintes da música que consagraria um estilo obscuro e mais introspectivo do que o rock tradicional da cha-mada “invasão britânica” e do movimento hippie.3

Ozzy, Tony, Bill e Geezer também se inspiraram no autor londrino Dennis Yates Wheatley, escritor reconhecido no começo do século 1920 por suas novelas e romances best-sellers. Surgia assim a primeira música criada originalmente pela banda, com o nome de “Black Sabbath”. A com-posição receberia um comentário simbólico de Rob Halford, o vocalista do Judas Priest: “Provavelmente é a canção mais diabólica já escrita”.

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24 Show da banda no início de carreira,

ainda com Ozzy como vocalista.

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A música fala de um homem que tem uma visão: uma figura de preto surge de um lago em chamas e começa a caminhar em sua direção. Para aumentar a atmosfera sombria da cena, Tony criou um riff de dar medo e provocar arrepios na espinha.

Mesmo com essa criação original, a música-título do Black Sabbath não foi o primeiro single da banda. No entanto, a composição foi a liga que uniu todos em torno de um propósito e de uma originalidade pró-pria. Dali em diante, eles não seriam mais um grupo que tocava blues pesado, como o Cream* ou os Yardbirds. Eles não seriam só uma banda de garagem operária de Birmingham. Black Sabbath seria um grande grupo musical de caras vestidos de preto, com cabelos negros e músicas sombrias.

*

Um cover de “Evil Woman (Don’t Play Your Games With Me)” foi escolhido como música de lançamento pelo grupo obscuro de Ozzy e companhia. Eles tocaram no primeiro single uma versão pesada da can-ção, composta originalmente pela banda Crow, de Minneapolis, Estados Unidos. A gravação original foi lançada também em 1969 e tinha três minutos e três segundos de duração.

A versão do Black Sabbath chegou ao mercado um ano depois, em ja-neiro de 1970. Foi fruto de um contrato da banda com a gravadora Philips, e foi gravada no Trident Studios, em St. Anne’s Court, em Londres. A subsidiária da Philips, Fontana Records, foi responsável pelo apoio ao grupo em seu primeiro single.

“Evil Woman” nem chegou ao topo das paradas britânicas, e não teve nenhuma visibilidade nos rankings. O material foi lançado pela Vertigo Records, um selo voltado para o rock progressivo. Mesmo com a estreia diferente, a música foi um fiasco comercialmente. Por esse motivo, foi dado à banda um prazo curto para produzir um álbum de estúdio. O disco foi gravado em 48 horas, com banda ao vivo e um som incrivelmen-

* Banda do tipo power trio, formada por Eric

Clapton na guitarra, Jack Bruce no baixo e no vocal, e Ginger

Baker na bateria. Apesar da curta duração (de 1966 a 1968), o grupo

influenciou a geração de músicos do heavy metal.

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te pesado e mórbido. O disco Black Sabbath foi lançado em uma sexta--feira, dia 13 de fevereiro de 1970. Teve produção de Rodger Bain, que separou um dia para gravar e outro para mixar todo o material.

Tony Iommi conseguiu resumir o sentimento de euforia do grupo naque-la época: “Nós pensamos mesmo que tínhamos apenas um dia para gravar e um dia para fazer a mixagem. Por isso separamos um dia para gravar ao vivo. Ozzy cantou em uma cabine separada e prosseguimos. Não tivemos a chan-ce de regravar muitas das faixas do material”. Mesmo com esse método dis-cutível de gravação, o álbum Black Sabbath estreou no oitavo lugar das pa-radas britânicas.

O disco abre com a primeira composição original da banda, “Black Sabbath”, que tem introdução ao som de trovões e chuva, como no filme de terror B que Tony Iommi foi apreciar no cinema. “The Wizard”, a segunda faixa, puxa para o blues e para as origens mais tradicionais da banda, acompanhadas por uma gaita marcante e uma guitarra elétrica de destaque. Dizem que a letra da música é inspirada no personagem Gandalf, dos livros O Hobbit e O Senhor dos Anéis.4

“Não conseguíamos fazer feitiçaria. Recebíamos convites para tocar em convenções de bruxaria e missas negras no cemitério de Highgate. Eu realmente achava que era uma piada. Éramos a última banda hippie – estávamos numa de paz e amor.”8

Ozzy Osbourne

Em seguida, o material é recheado por “Behind the Wall of Sleep”. Ao final dessa faixa, inicia-se uma improvisação de contrabaixo. Geezer se sente à vontade tocando seu instrumento, dando ares menos pesados para o disco, até interromper toda a sua liberdade musical para executar a frase de “N.I.B.”, que evolui com a entrada explosiva de Tony Iommi e sua guitarra elétrica. Diziam que o nome da música era uma sigla para “Nativity in Black”, mas Geezer desmentiu essa teoria, afirmando que nib era o apelido do cavanhaque de Bill Ward na época.

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“N.I.B.” é um dos pontos altos do álbum, com uma letra que diz o contrário do que é afirmado em “Black Sabbath”. Em vez de encarnar uma figura fugindo de uma entidade demoníaca, Ozzy assume a pers-pectiva do próprio diabo. “Look into my eyes, you’ll see who I am. My name is Lucifer, please take my hand”, diz a composição do vocalista, acompanhada por um instrumental forte, vigoroso e potente.

O resto de Black Sabbath é composto de músicas que já tinham sido apresentadas anteriormente pela banda, como “Evil Woman”. “Sleeping Village” e “Warning” são uma preparação para “Wicked World”, que começa com os pratos de Bill Ward. O encerramento do álbum contém um jazz limpo e direto de Tony Iommi, repetindo fraseados que ecoam da guitarra e se ligam com as linhas de baixo de Geezer. Ozzy canta so-bre o cotidiano forçado do trabalhador, enquanto políticos se aproveitam das classes menos abastadas. O terror do início do disco se dissipa, reve-lando uma banda estreante à vontade, livre para criar um novo estilo de rock – um estilo essencialmente questionador.

A Warner Bros. levou o material do Sabbath até os Estados Unidos e o Canadá, infectando o mercado norte-americano com o rock pesado mis-turado com blues. Essa sinergia do som do Black Sabbath, que seria ba-tizado de heavy metal, faria tanto sucesso a ponto de colocar o disco na posição 23 da lista Billboard 200. Foi um sucesso comercial, ao contrário do material compacto lançado meses antes.

No entanto, o disco não foi poupado por críticos. “O álbum é todo aparências – apesar dos títulos obscuros e algumas letras vazias que soam como homenagem ao burlesco Aleister Crowley”, disse Lester Bangs na revista Rolling Stone – que estava ganhando importância nos anos 1970. Ao mesmo tempo, Bangs chama a banda de Ozzy de herdeira do Cream, do guitarrista inglês Eric Clapton. Para o jornalista, o Sabbath foi respon-sável por “transformar o escuro em moda”.

“Uma das poucas coisas boas de ser disléxico é que, quando digo que não leio críticas, eu realmente não leio críticas. De todas as péssimas críticas de

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Black Sabbath, a pior foi provavelmente a escrita por Lester Bangs na Rolling Stone. Ele tinha a minha idade, mas eu não o conhecia na época. Na verdade, nunca tinha ouvido falar nele antes e, depois que os outros me contaram o que ele tinha escrito, preferia nunca ter ouvido. Lembro de Geezer lendo palavras como ‘pretensioso’, ‘rígido’ e ‘atrapalhado’. A última linha dizia algo assim: ‘Eles são como o Cream, mas pior’, algo que não en-tendi, porque eu achava o Cream uma das melhores bandas do mundo.”9

Ozzy Osbourne

As críticas foram mudando com o passar o tempo, principalmente após a consolidação do metal como um subgênero relevante do rock’n’roll. Steve Huey, do Allmusic, avaliou o material anos depois e disse que o disco é “reconhecível instantaneamente como heavy metal, após décadas de evolução do gênero”. O jornalista complementa que a banda deu o pontapé para “uma revolução musical” que rompeu com o “pesadelo industrial de Birmingham”, terra natal de Ozzy, Geezer, Tony e Bill. O escritor deu 4,5 estrelas, em uma escala de cinco.

*

“As pessoas dizem que a gente inventou [o heavy metal], mas... Bom, é impossível para uma banda pensar: ‘Ok, nós vamos começar esse tipo de música, e daqui a 45 anos seremos considerados reis desse negócio’. Isso foi o que a imprensa e as pessoas colocaram na gente. Não foi intencional de nossa parte. Nunca, para ser honesto, me senti confortável sendo rotu-lado como heavy metal, porque não há referências musicais nisso.”10

Ozzy Osbourne

Black Sabbath chegou às lojas e vendeu um milhão de cópias. Conso-lidou o estilo obscuro da banda, chamada rapidamente pela imprensa de heavy metal: hard rock pesado. Ozzy Osbourne concordava que o som da banda era pesado, mas nunca gostou muito do rótulo de metaleiro,

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afirmando em entrevistas que executava o puro rock’n’roll nos palcos. Já Tony Iommi não pensava como o vocalista, e se destacava justamente por apelar, cada vez mais, ao fraseado de impacto na guitarra.

Se o primeiro disco foi a fonte do sucesso, ele também começou a demarcar as primeiras diferenciações dentro da banda. Geezer e Bill Ward se conservavam como a cozinha e participavam das composições do Sabbath. Já Ozzy tentava puxar a banda para um apelo mais pop, enquanto Tony investia no que havia destacado a banda a princípio.

Um dos motivos musicais que fez Tony Iommi tocar um som mais pesado foi justamente seus dedos amputados. Por ser forçado a tocar com próteses, o músico passou a afinar seu instrumento um semitom para baixo – da afinação mi (E) para ré sustenido (D#). O timbre mais grave de seus fraseados deu outra atmosfera para a música do Black Sabbath, fazen-do-os soarem de forma original e autêntica. As limitações físicas de Tony, encorpadas pelo vocal marcante de Ozzy, se transformaram em caracte-rísticas peculiares e em uma fonte de avanço.

No embalo do sucesso de estreia, a banda decidiu lançar um novo material, com o intuito de vender mais e aproveitar a onda de criativida-de. O quarteto se reuniu três meses depois, em junho de 1970, para gravar um novo material. O disco iria se chamar War Pigs, com a ideia de pro-testar contra a Guerra do Vietnã, indo na onda de críticas já estabeleci-das anos antes pelos Beatles e pelos Stones. Mas a Warner decidiu mudar o nome do compacto para Paranoid.

Ozzy diz que a produtora fez essa mudança não por temer uma reação dos americanos ao conteúdo do disco, mas porque “Paranoid” parecia uma música que cairia facilmente nas graças das rádios e até da televisão. “Os caras de terno estavam certos. Paranoid nos levou ao [programa de tv] Top of the Pops,5junto a Cliff Richard”, disse o cantor, sobre a mudan-ça de nome e o sucesso que começaria a brotar.

O segundo disco saiu em 18 de setembro de 1970 com apenas oito músicas, sendo uma delas instrumental (“Rat Salad”). Esse número de faixas, segundo o baterista Bill Ward, mostra que a banda tinha pouco

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material na época. Mesmo assim, Paranoid foi um álbum com tamanha qualidade que chegou ao quarto lugar das paradas britânicas, um feito surpreendente para o Black Sabbath daquela época. Tempos depois, a obra chegaria ao topo da lista de sucessos. Tony afirmou que, mesmo com uma faixa sem voz, o disco tem “muitas palavras nas letras”.

“Sabe, você sempre quer ganhar, mas às vezes vence sem saber. O disco iria se chamar War Pigs, o nome já estava impresso na capa, com a foto de um soldado de calças cor-de-rosa e segurando um escudo. E de repen-te lá estava ‘Paranoid’, o single. Não lembro bem, mas achei parecida com algo que tinha ouvido antes, tipo Led Zeppelin, aquela mesma vi-bração. Mas nunca me cansei dela. Acho que nunca fiz um show sem tocá-la. E ainda funciona muito bem!”11

Ozzy Osbourne

De fato, Paranoid tem muito mais conteúdo se comparado com o pri-meiro álbum, e soa até um pouco punk em suas críticas contra a sociedade e contra os conflitos norte-americanos na Guerra Fria. Mesmo com toda essa informação em forma de música, o disco surgiu esquisito no mercado, com uma capa mostrando um militar vestido com calça rosa, capacete e escudo. O descompasso da imagem com o título do material permaneceu porque a banda não conseguiu lançar uma nova figura que simbolizasse Paranoid. Restou o soldado de War Pigs com o novo nome no disco.

“O único problema era a capa do álbum, que tinha sido feita antes da mudança de nome e agora não faria nenhum sentido. O que quatro caras cor-de-rosa segurando escudos e espadas tinham a ver com paranoia? Eram cor-de-rosa porque essa era supostamente a cor dos porcos de guerra. Mas, sem ‘War Pigs’ escrito na frente, eles só pareciam esgrimistas gays.”12

Ozzy Osbourne

A música de abertura, “War Pigs”, foi composta para se chamar “Walpurgis”, termo relacionado ao sabá das bruxas. A revelação do nome

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é de Phil Alexander e está nas notas do encarte do álbum Reunion, de 1998, o primeiro disco depois do retorno de Ozzy ao Black Sabbath após sua saída nos anos 1980. Foi melhor para Ozzy e sua turma, acompanha-dos pelo produtor Rodger Bain, optarem pela ideia do novo nome.

“War Pigs” teve a letra inspirada em depoimentos que a banda pegou em uma base da Força Aérea Norte-americana na Europa, após um show. Eles recolheram essas declarações durante a turnê europeia, logo após o lançamento do primeiro álbum, e escreveram a música em Zuri-que, na Suíça. Tony Iommi teve liberdade nesta faixa de abertura para mostrar seus dons com a guitarra elétrica e sua pegada jazzística, que não foi tão aproveitada em Black Sabbath, exceto talvez pela música “Wicked World”, a última do material.

Ozzy insiste que não sabia nada sobre o Vietnã e que “War Pigs” era apenas uma “música antiguerra”. Mas o fato é que o público e a crítica entenderam as letras como um recado direto ao governo norte-america-no, que se envolveu em um combate com bombas napalm e guerrilhei-ros sem perspectivas positivas para o país.

Do ponto de vista do vocalista, a explicação para as letras estava no fato de Geezer não se interessar por músicas com uma pegada pop. As canções da banda sempre incorporavam algo estranho, mesmo quando a história era sobre uma relação amorosa. Geezer se empenhava em acres-centar referências contemporâneas (como a Guerra do Vietnã).

Lançada antes do álbum, o single “Paranoid” foi composto em mi menor (E) e gravado poucos meses depois do primeiro material, Black Sabbath, em agosto de 1970. Era um resto de trabalho pós-disco de estreia, que nasceu de uma frase simples da guitarra de Tony, seguida por um proces-so de criação espontâneo do resto do grupo. A criação ocorreu no Regent Sound, após um tempo de ensaios em uma fazenda no Rockfield Stu-dios, na parte sul do País de Gales.

“Foi quando Rodger Bain percebeu que precisávamos de mais uns minu-tos de material. Lembro que ele entrou na sala de controle numa parada

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para comer e disse: ‘Vejam, caras, precisamos de mais material. Podem fazer uma jam?’. Todos queriam comer os sanduíches, mas Tony come-çou um riff de guitarra enquanto Bill fazia uns ritmos, eu murmurei algu-ma melodia e Geezer sentou num canto, riscando algumas palavras. Vin-te minutos depois, tínhamos uma música chamada ‘The Paranoid’. No final do dia, ela tinha virado simplesmente ‘Paranoid’.”13

Ozzy Osbourne

“Paranoid” foi uma criação simples de Tony que ganhou fama e corpo na voz de Ozzy Osbourne. Mesmo saindo da banda anos depois, o vocalista usaria essa música na carreira solo. A letra aborda um homem com proble-mas na cabeça, atormentado e que se sente paranoico. Ozzy iria incorporar esse personagem em praticamente todas as suas apresentações ao vivo. Essa música ajudaria a fixar o apelido “Madman”– “homem louco” – ao cantor.6

Ozzy afirma que nenhum dos integrantes da banda botou muita fé na canção (que já tinha vários elementos do punk). Ela parecia ter uma qualidade inferior se comparada a “Iron Man” ou “Hand of Doom”, mas em pouco tempo eles perceberam todo o potencial da composição.

Já “Planet Caravan” tem uma atmosfera mais introspectiva, com uma letra sobre o deus romano Marte e a luz da noite. Essa composi-ção, na verdade, é uma preparação para “Iron Man”, uma das músi-cas mais marcantes do Sabbath e um verdadeiro chumbo sonoro, au-têntico heavy metal.

O nome original era para ser “Iron Bloke”, nome dado por Ozzy ao ouvir a guitarra estalada de Tony Iommi. No entanto, a banda decidiu de-pois que “Iron Man” seriam duas palavras de maior impacto. A música não tem nenhuma relação com o super-herói homônimo da Marvel, Homem de Ferro, criado em 1963, porém a canção entrou na trilha sonora do filme de 2008, Homem de Ferro, protagonizado por Robert Downey Jr.. Geezer Butler escreveu a letra pensando em um homem que viaja para o futuro e, ao retornar ao presente, começa a se transformar em uma entidade metáli-ca, afetado pela paisagem apocalíptica que observou no outro tempo. A

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narrativa é toda recheada pelas entradas densas do instrumental de Tony, que ambientam a real mensagem da música.

“Tony é um pioneiro do metal, mas há uma sofisticação verdadeira em seu estilo: não é tão rápido o tempo todo. Seu estilo tem uma vibração tão clássica que me inspira muito”.14

Brent Hinds, guitarrista e cantor da banda Mastodon.

“Iron Man” é uma boa síntese do som do Sabbath de todas as épocas. Não tem o apelo punk de “War Pigs” ou “Paranoid”, e carrega uma obs-curidade menos intensa que “Black Sabbath” ou “N.I.B.”.

“A questão é que Tony Iommi acabou se tornando um dos maiores cria-dores de riffs de rock pesado de todos os tempos. Sempre que entrávamos em estúdio, nós o desafiávamos a fazer um riff melhor que o anterior – ele acabava com algo como ‘Iron Man’ e deixava todo mundo louco.”15

Ozzy Osbourne

“Electric Funeral” mantém a camada pesada criada por Tony em “Iron Man”, mas dá mais destaque à voz de Ozzy. A letra fala sobre robôs e pes-soas artificiais que criaram uma radiação mortal. O cantor vocifera sobre uma iminente tempestade atômica, após presenciar uma explosão.

Com sete minutos de duração, uma das músicas mais longas da banda, “Hand of Doom” foi mais uma ideia que partiu de Geezer Butler e foi traba-lhada pelos quatro integrantes do grupo, em conjunto. O baixista novamen-te colocou a Guerra do Vietnã na composição, retratando o vício em drogas dos veteranos após o regresso ao Reino Unido, como uma forma de escapis-mo diante dos traumas. O disco segue com “Rat Salad”, música instrumen-tal que destaca a guitarra acompanhada pela bateria potente de Bill Ward. A faixa de encerramento, “Fairies Wear Boots”, é uma história sobre o encon-tro dos integrantes do Sabbath com skinheads nazistas, segundo Geezer.

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O disco Paranoid mantém, como padrão, um tom pesado e alarmante em suas composições e letras, reforçando músicas obscuras, mas não ne-cessariamente depressivas. Não há a mesma melancolia de Black Sabbath. A obra também marcou a primeira viagem da banda para a América. Os relatos da época falam sobre as primeiras orgias, as drogas que fariam parte das letras e o sexo libertário dos integrantes da banda. Mesmo pres-tes a se casar, Ozzy Osbourne transava com qualquer groupie que se ofe-recesse para ele no camarim. O Sabbath estava pouco acostumado a essa vida de libertinagem e a ida até grandes capitais como Londres e Nova York mudou a cabeça dos jovens de Birmingham.

*

O ritmo de trabalho do Sabbath continuou incessante nos primeiros anos de existência da banda. Com menos de um ano de estrada, eles es-tavam na televisão, se apresentando no programa Top of Pops. Ao com-pletar um ano, o Black Sabbath viajou para os Estados Unidos, conhe-ceu Nova York e iniciou os preparativos para o seu terceiro álbum.

Top of Pops, inclusive, foi um programa que ajudou Ozzy a conhecer o talento dos Beatles. Para o cantor, aparecer no programa era um sonho para ganhar audiência em um veículo que tinha sido utilizado por seus ídolos da chamada “invasão britânica”.

“Top of Pops era provavelmente a coisa mais importante que eu já tinha feito na minha vida, naquele ponto. Toda semana, quando eu era jovem em Aston, a família Osbourne se juntava ao redor da TV para assistir ao show. Até minha mãe adorava. Assim, quando meus pais ficaram sabendo que eu ia aparecer, ficaram espantados. Naquela época, 15 milhões de pessoas assistiam.”16

Ozzy Osbourne

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36 Ozzy Osbourne tocando piano, na década de 1970.

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O cantor, depois de ir para a TV, foi com sua banda até a capital da França. Em Paris, após um concerto do Black Sabbath, Ozzy conheceu uma francesa. “[Ela] me levou para seu apartamento e a gente trepou a noite toda. Não entendi uma palavra do que ela disse”, confessou o astro.

Em terras norte-americanas, o Black Sabbath tocou com o cantor Rod Stewart e sua banda, The Faces. As duas bandas não casavam bem no palco, já que Stewart tinha um forte apelo pop,7enquanto o Sabbath ain-da mantinha seu som “sujo” da estreia, e as roupas pretas e crucifixos no visual dos integrantes.

De acordo com Ozzy Osbourne, a banda chegou a ser chamada de “satanista” durante o procedimento na imigração americana. Mesmo as-sim, as autoridades permitiram a passagem do grupo, que entrou no país como representante da música britânica. Aquela denominação era a pro-va viva de que o estilo pesado do Sabbath tinha chamado a atenção da sociedade. Era uma pista sobre o que fazer no próximo trabalho.

Tony Iommi desta vez afinou a guitarra um tom e meio abaixo da afi-nação convencional em mi (E) para dó sustenido (C#). As mudanças de afinação de Iommi tinham sempre dois objetivos: facilitar sua interação com o instrumento de seis cordas após perder a ponta dos dedos e ajustar a sonoridade do Black Sabbath. As decisões do guitarrista foram cruciais para criar a musicalidade característica do quarteto de Birmingham. Geezer também afinou o contrabaixo acompanhando Tony. A redução da tensão dos instrumentos de corda fez com que o próximo material da banda soasse ainda mais obscuro e pesado. Foi uma opção que visava chegar mais próximo do resultado de Black Sabbath, e não do apelo pop sugeri-do por Paranoid.

No Island Studios, em Londres, o Black Sabbath contou novamente com a produção de Rodger Bain, que trabalharia pela última vez com a banda em estúdio, em plena ascensão de Ozzy, Geezer, Tony e Bill como estrelas do rock inglês.

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Master of Reality chegou ao mercado no dia 21 de julho de 1971, conquis-tando o disco duplo de platina ao atingir os primeiros 2 milhões de unidades vendidas. Além do peso, a banda apostou em passagens acústicas nesse ter-ceiro álbum, variando ainda mais sua própria sonoridade.

No mesmo ano, Ozzy se casou com sua primeira mulher, Thelma Riley. Ela era divorciada e tinha um filho.

As primeiras edições de Master vieram com o título do disco escrito na cor cinza, visível para todos os compradores. Em versões posteriores, a banda quis brincar com formas e relevo, colocando “Master of Reality” em preto acompanhado por um fundo igualmente escuro. O único deta-lhe que delimita o nome nessas edições é o contorno das letras.

“Sweet Leaf” abre o material mostrando que Ozzy e sua turma já esta-vam mergulhados no consumo de maconha e outras drogas, como o ál-cool*. A música sobre a erva começa com Tony Iommi tossindo, com um efeito de eco que reforça o tema. É uma abertura bem pouco convencio-nal para os padrões do Sabbath até então.

Com uma temática espiritual católica, “After Forever” foi escrita por Geezer Butler e reflete parte de sua religiosidade pessoal. Mesmo com a afinação diferenciada deste álbum, o lado obscuro do disco não foi revelado logo nas primeiras músicas. “Embryo” é a abertura instrumental para a mú-sica que definitivamente introduz peso ao disco: “Children of the Grave”.

Novamente adentrando o universo da Guerra do Vietnã, Geezer narra nessa música a realidade das crianças que convivem com a morte nos conflitos armados. “Children of the Grave” é a prova de que, para a ban-da, era possível fazer letras politizadas em uma composição tão pesada quanto “Iron Man”, mas sem a obrigatoriedade de levar a letra para a ficção científica.

“Orchid”, assim como “Embryo”, é mais uma música instrumental que mostra a habilidade de Tony Iommi com o som acústico. As duas faixas mostram a evolução do músico, de um guitarrista especialista em fraseados para um criador de outras musicalidades explorando apenas as

* Em diversas entre-vistas, Ozzy Osbourne diria que é mais difícil largar o álcool, uma droga legalizada, do que as drogas ilícitas.

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40 Bill Ward, Tony Iommi, Ozzy Osbourne e Geezer Butler: a formação do Black Sabbath em 1970.

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seis cordas do instrumento. Tony também utiliza essas criações como interlúdios agradáveis aos ouvidos, entre uma música com letra leve e outra mais pesada. Toda essa mudança, em apenas um ano, mostra que o Sabbath não havia surgido apenas para se repetir.

“Lord of This World”, “Solitude” e “Into the Void” fecham o disco com um tom de melancolia e sem a atmosfera lisérgica do começo do material. “Lord of This World” narra a história de um senhor cruel e cheio de maldade. Em “Solitude”, Ozzy canta sobre solidão e o vazio das pessoas. Já “Into the Void” mistura o perigo bélico da Guerra Fria e dos conflitos dos anos 1970 com figuras demoníacas, como o próprio Satã.

Master of Reality conseguiu o disco de ouro no dia 27 de setembro de 1971, ao atingir 500 mil cópias vendidas. Com um milhão de discos ven-didos, o material recebeu o primeiro disco de platina em 13 de outubro de 1986. O disco duplo de platina só foi conquistado em 26 de julho de 2001, com 2 milhões de vendas.

Mesmo com tamanho sucesso, além das músicas variadas que aborda-vam desde política até drogas, o estereótipo de garotos que faziam magia negra, ligados ao satanismo, permaneceu. Após três discos, superficial-mente essas características eram a própria definição do Black Sabbath.

Geezer, de fato, tinha curiosidade por bruxaria e culturas ocultas, principal-mente durante a gravação de Black Sabbath em 1970. Mas isso começou a mudar em 1971, já em Master of Reality. Essa curiosidade do baixista era divi-dida entre os estudos sobre história, curiosidades mundiais e até sobre política militar. O guitarrista Tony Iommi reforçou a ausência de uma pregação satâ-nica na banda, em uma entrevista no programa HARDtalk da BBC, em 2013.

“No começo, éramos interessados em ocultismo, mas nunca fomos satanis-tas. Estávamos fazendo música, e isso é tudo que eu faço. Eu não tentei criar qualquer coisa que pudesse destruir as pessoas ou perturbar alguém.”17

Tony Iommi

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Nas paradas britânicas, Master of Reality chegou ao quinto lugar, além do oitavo lugar dos rankings norte-americanos, uma das melhores colo-cações de material do Sabbath nos Estados Unidos. Lester Bangs, da Rolling Stone (o “queridinho” de Ozzy e Geezer), continuou escrevendo críticas negativas sobre a banda. Bangs colocou o Black Sabbath no mes-mo saco que MC5 e Stooges, bandas consideradas pré-punks nos EUA. Também os acusou de fazer um som monótono.

“O público desse rock de segunda geração (ou seja, aqueles que foram criados por ‘I Wanna Hold Your Hand’8e ficou maduro com ‘Highway 62 Revisited’)9sofrem bastante em uma luta livre com o fenômeno represen-tado por Grand Funk e Black Sabbath.”18

Lester Bangs

Além de Lester Bangs, que não é admirado pela banda, Robert Christgau do The Village Voice chamou o quarteto de Birmingham de “decaden-te”. O fato é que, mesmo sendo “monótono” e “decadente”, o Black Sabbath estava se consolidando como um sucesso comercial em 1971.

O Biohazard fez um cover de “After Forever” no disco Nativity in Black, de 1994, com White Zombie tocando “Children of the Grave”. As versões das músicas garantiram sobrevida e crescimento de vendas de Master of Reality, um verdadeiro sucesso comercial.

*

“Os três primeiros discos foram feitos relativamente sóbrios. No primeiro álbum, a gente não tinha dinheiro para comprar droga ou bebida. Então... totalmente sóbrios [risos].”19

Geezer Butler

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O Black Sabbath definitivamente se americanizou a partir de 1972 e mergulhou fundo no consumo de drogas. Apesar do crescimento percep-tível de Tony Iommi em Master of Reality, os outros integrantes se prepa-ravam para buscar mais prestígio dentro do grupo. Ozzy Osbourne era uma das pessoas mais interessadas em ganhar destaque entre os integran-tes, além de ser um dos maiores junkies da banda.

Rodger Bain deixou as produções do Sabbath e a própria banda passou a participar do processo de criação dos discos. O estúdio escolhido foi o Record Plant Studios, em Los Angeles, nos Estados Unidos. Patrick Meehan assumiu o lugar de Bain, mantendo o grupo na produção, após ter traba-lhado como roadie do rockabilly Gene Vincent, um dos ícones do rock’n’roll clássico, autor de “Be-Bop-A-Lula”.10

As gravações começaram em maio de 1972 e os entorpecentes fizeram o trabalho se prolongar. Muitas músicas simplesmente não saíam de imediato porque os integrantes não tinham condições físicas de executar as composições. O disco Vol. 4 chegou às lojas no dia 25 de setembro de 1972, com Ozzy vestindo uma roupa clara na capa, em uma foto registra-da em um show ao vivo.

O álbum de número quatro explorou tanto a música pesada, que já era sua marca registrada, quanto um lado mais sensível da banda. E essa calmaria do som não era um instrumental acústico de Iommi, que já ti-nha sido utilizado em trabalhos anteriores, mas sim intervenções e efei-tos vocais mais calmos de Ozzy Osbourne.

“Wheels of Confusion/The Straightener” abre o material com peso, sem muitos rodeios e nenhum interlúdio, diferentemente de Master of Reality. No segundo minuto da primeira faixa, a música ganha velocida-de e ganha corpo com um solo de Tony Iommi, que segue com uma se-leção simples, mas impactante, de notas.

“Tomorrow’s Dream” é uma música de superação, com letra otimista. Mesmo com essa tendência positiva, a música não chamou atenção e nem chegou a entrar em rankings de singles da época. A faixa seguinte foi dedicada ao baterista da banda, Bill Ward.

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“Changes” entrou para a história como a primeira música sensível de sucesso de Ozzy Osbourne, e foi inspirada no primeiro divórcio de Ward. Tony Iommi deixou a guitarra de lado e assumiu tanto o piano quanto o mellotron, um instrumento eletrônico*. Geezer ficou no baixo e Ozzy ajustou a voz para cantar uma balada sobre mudanças na vida pessoal e questões ligadas ao amor.

Apostar em um tema mais sentimental em um disco de heavy metal quebrou um pouco do ritmo comum dos trabalhos anteriores do Black Sabbath. No entanto, “Changes” marca provavelmente o primeiro gran-de destaque para a voz de Ozzy Osbourne, que mostra qualidade e versa-tilidade, presentes mesmo após o consumo de drogas. O cantor ganharia um destaque próprio na indústria musical poucos anos depois.

“FX” é um prelúdio para a potente “Supernaut”, uma retomada com-pleta ao peso característico da banda, para ser ouvida no volume máxi-mo. Todos os quatro integrantes exibem seus dons, com um refrão de Tony Iommi para ficar grudado na cabeça.

Cocaína, a droga que ativa o organismo, é o tema da música “Snowblind”, que segura os riffs de Tony Iommi. “Cornucopia” foi difícil de ser grava-da. Eles estavam chapados de drogas e Bill Ward temeu não conseguir tocar bateria. “Achei que fosse ser demitido da banda”, disse o músico. “Laguna Sunrise” mostra a evolução de Tony Iommi no violão clássico, preenchida com notas de violino bem encaixadas. “St. Vitus Dance” é uma faixa mais comercial de hard rock, seguida pelo encerramento po-tente de “Under the Sun/Every Day Comes and Goes”.

Nos Estados Unidos, o disco chegou a 500 mil cópias vendidas no dia 6 de novembro de 1972, apenas dois meses depois do lançamento, con-quistando o disco de ouro. Em 13 de outubro de 1986, a marca de um milhão de vendas foi atingida, e o Sabbath conquistou o disco de platina. No dia 1o de setembro de 1977, foram 100 mil álbuns vendidos no Cana-dá, o que rendeu também um disco de platina por lá.

*

* Curiosamente, o mellotron foi construído na mesma cidade do Sabbath, Birmingham. O desenvolvimento do instrumento se deu na década de 1960.

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Esses quatro primeiros discos – Black Sabbath, Paranoid, Master of Reality e Vol. 4 – marcaram o começo de uma banda que iria ditar moda, sonoridade e estilo para o subgênero do metal, além de alterar drastica-mente o rock. De certa maneira, o Black Sabbath ajudou a enterrar o sonho de “paz e amor” do lema hippie, mostrando novamente a faceta sombria do ocultismo, além dos problemas sociais dos indivíduos nas ci-dades. É “a figura vestida de preto que aponta seu dedo para mim” da primeira música da banda, “Black Sabbath”.

E a transformação seria provocada justamente por um quarteto de mú-sicos que não quis – e ainda não quer – renegar suas influências iniciais. Até hoje, Ozzy Osbourne fala com carinho sobre como os Beatles o aju-daram a se tornar músico, embora ele seja muito diferente do que Paul McCartney ou John Lennon pretendiam como rockstars. Geezer Butler se consolidou como letrista e compositor, e conseguiu aliar seu gosto por história à percepção sobre os problemas econômicos que estavam surgin-do com a Guerra do Vietnã, além de problematizar a convocação de jo-vens a um conflito que parecia perdido.

Bill Ward seria o companheiro que ajudaria o grupo a permanecer unido, nessa formação, por mais tempo. Mas o símbolo do Sabbath, sem dúvida, seria o guitarrista Tony Iommi. Com uma evolução perceptível em apenas quatro álbuns, as seis cordas metálicas da banda se revelariam a verdadeira aparência do grupo nos grandes shows. Tony ficaria imorta-lizado por “Iron Man”, em notas inesquecíveis para os fãs. Sua guitarra soa livre em “War Pigs”, dividindo as atenções com Ozzy. E é ele, certa-mente, aquele que consegue embalar toda a banda em “Paranoid”.

Devido ao consumo excessivo de drogas, aos problemas pessoais de cada integrante e às transformações que estavam ocorrendo dentro do próprio rock, o Black Sabbath entraria em uma fase de decadência. Essa decaída certamente não foi musical, mas sim no que diz respeito à união que marcou o grupo nos primeiros trabalhos. Se a unidade da banda ti-vesse se mantido, provavelmente o quarteto inicial de Aston teria criado mais materiais originais juntos.

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As diferenças entre Tony, Ozzy, Geezer e Bill causariam não apenas fraturas em seus relacionamentos pessoais, mas profundas mudanças na própria criação artística do Sabbath. A liderança da banda, disputada entre Ozzy Osbourne e Tony Iommi, iria se somar à importância de Geezer Butler como compositor e ao papel fundamental de Bill Ward como unificador do grupo.

E, como essa amizade entre os quatro não seria eterna, outros músicos e compositores teriam a oportunidade de emprestar seus dons para o Black Sabbath. No entanto, o que o tempo demonstrou é que, essencial-mente, o Sabbath continua sendo uma banda de jovens de uma cidade operária inglesa, que tinham cabelos compridos, cantavam letras estra-nhas e se vestiam de preto, portando cruzes e falando sobre Satã.

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Lester Bangs e a tríade de Bandas que fundaram o heavy metaL

Leslie Conway “Lester” Bangs nasceu em 13 de dezembro de 1948 na cidade de Escondido, no estado da Califórnia, nos Estados Unidos. Foi um jornalista musical de destaque nos anos 1970 ao trabalhar na Creem e, principalmente, na Rolling Stone, que surgiu da contra-cultura e do rock’n’roll.

Filho de um caminhoneiro texano, ele começou sua carreira como repór-ter freelancer, responsável por resenhas de novos discos em 1969. A relação de Bangs com a Rolling Stone era fornecer um depoimento honesto sobre álbuns e novos artistas. Em nome desse tipo de honestidade, o jornalista arrumou brigas e inimizades com inúmeras bandas.

A primeira crítica negativa que ele escreveu foi sobre o material Kick of the Jams, da banda MC5, lançado em feve-reiro de 1969. Desde então, Lester Bangs conquistou fama de crítico mordaz da maioria dos novos sucessos dos anos 1970. Boa parte de seus textos faz comparações com bandas hippies e progressivas que in-fluenciaram a turma de Ozzy Osbourne.

“Isso não é apenas aquela morte pre-matura que se torna um fato na vida e que, então, se torna perturbador. É per-turbador saber que isso foi aceito tão rapi-damente”, escreveu Bangs sobre a morte de Janis Joplin, no dia 4 de outubro de 1970, por overdose de heroína combina-da com o consumo de álcool. O jornalis-ta se consolidou com suas análises mais realistas do rock’n’roll, sem textos empol-gados sobre as novas bandas desse estilo.

No entanto, em 1973, Lester Bangs provou do próprio veneno: foi demitido pelo fundador da Rolling Stone, Jann Wenner, por uma resenha negativa da banda Canned Heat. Bangs então mu-

dou-se de Nova York para Detroit e passou a escrever e editar a publicação Creem. Tornou-se fã da música barulhenta de Lou Reed em 1975.

Após a passagem pela Creem, Lester Ban-gs também escreveu para The Village Voice, Penthouse, Playboy, New Musical Express e outras publicações. Em 1982, faleceu em Nova York, após uma overdose envolvendo valium e outras substâncias.

Apesar de odiado por Geezer e pelos outros integrantes do Black Sabbath, Lester Bangs foi essencial para a criação do heavy metal. Ele acompanhou o Sabbath e outras duas bandas fundamentais do rock pesado: Led Zeppelin e Deep Purple.

Mas o vocabulário surgiu de outro jorna-lista: Barry Gifford, em um artigo de 1968 sobre a banda Electric Flag, que saiu na re-vista Rolling Stone. A banda durou de 1967 a 1974, e fazia um rock psicodélico misturado com blues. Gifford descreveu o som deles como “um blues branco e um heavy metal rock”. Outras bandas surgiram com inspi-ração no Cream e nos Yardbirds, fissurados por improvisações instrumentais.

Um nome de peso para definir o heavy metal como gênero foi o guitarrista James Marshall “Jimi” Hendrix. Ele era um negro canhoto com talento descomunal na guitar-ra elétrica e engajado contra a Guerra do Vietnã. Hendrix abusou de efeitos de pedais wah-wah nas guitarras, além de simplificar os acordes das seis cordas, utilizando uma técnica consagrada e simples chamada Power Chords, conhecida em português por bicordes (acordes com apenas dois dedos).

Jimi Hendrix tocava utilizando as caixas de som com o máximo de saturação, dando todo o peso que depois seria reconhecido como heavy metal, aproveitando o máximo da potência dos amplificadores do engenheiro

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inglês Jim Marshall. Hendrix foi o músico que popularizou a guitarra elétrica distorci-da. Fez carreira musical entre 1963 e 1970.

O Led Zeppelin surgiu em 1968 dos tra-balhos em estúdio e do sucesso que o guitar-rista Jimmy Page fez com o Yardbirds, uni-do ao talento do baterista John Bonham, do baixista John Paul Jones e do vocalista Robert Plant. Excursionando pelo mundo, o Zeppelin ganhou fama como banda de rock pesado, mesmo sem nunca perder suas raízes no blues negro.

O Deep Purple apareceu de um pro-jeto chamado Roundabout, em que os músicos trocavam de instrumentos, num exercício em grupo incomum na época. Com esse background, o grupo atingiu popularidade desde seu surgimento, em 1968. Consolidou o tecladista e especialis-ta em órgãos Jon Lord, o baterista versátil Ian Paice, o baixista Roger Glover, o voca-lista que abusava de agudos Ian Guillan e o guitarrista com influências de música erudita Richie Blackmore. No entanto, não foi somente essa formação que ga-nhou destaque, revelando outros músicos nas diversas trocas de integrantes, como o vocalista David Coverdale, o baixista e vocalista Glenn Hughes e a segunda gui-tarra de maior sucesso na banda, nas mãos de Steve Morse. Entre reuniões e brigas, o Deep Purple marcou uma geração com suas composições complexas. A tríade de bandas viveu um ápice de criatividade e inovação entre 1970 e 1974. Com a ascen-são gradual dos grupos de punk rock dos Estados Unidos, o heavy metal começou a entrar em declínio. Somente com o surgi-mento do Saxon e do Iron Maiden, a cha-mada “New Wave of British Heavy Metal” (NWOBHM) teria vigor para recuperar o rock pesado.11

As três bandas eram do Reino Unido e conversavam entre si. “Nunca houve muita rivalidade entre o Sabbath e o Zeppelin, na

realidade. Ambas eram de Birmingham, todos fazíamos parte da mesma turma, en-tão sempre desejamos o melhor para eles, como tenho certeza de que eles também desejavam para nós”, explica Tony Iommi.

A operária Birmingham brigava direto com a capital Londres. Os músicos das re-giões interioranas inglesas eram despreza-dos pelos artistas da capital. Isso criou um inimigo comum entre o Black Sabbath e o Led Zeppelin. “Era sempre Zeppelin, Sabbath e Purple, mas a rivalidade era com o Deep Purple. Ainda mais depois, quando ‘Paranoid’ estava nas paradas e eles tinham lançado ‘Black Night’. Foi quando ambas as bandas subiram que sen-timos a verdadeira rivalidade”, desabafa Tony, em suas memórias.

Ozzy não gosta do rótulo de heavy metal até os dias atuais, e disse que fez, desde sempre, um simples rock. “Sabe, ‘música do Sabbath’ ou ‘hard rock’, tudo bem, porque há nuances. Mas heavy me-tal não tem, é uma cor só. E muita gente pega essas diversas cores dos anos 1970, 1980, 1990 e do novo milênio e diz que são o tal ‘heavy metal’ – uma coisa não tem nada a ver com outra! Uma vez vi uma árvore genealógica do heavy metal, com um monte de bandas e o Sabbath bem no meio. Tinha esses grupos de goth metal, death metal, metal maluco e infeliz, metal-do-caralho”, desabafou o cantor em um depoimento em 2013.

Portanto, se nem o homem considera-do “padrinho” do metal aceita bem esse subgênero do rock’n’roll, é possível enten-der por que a história do estilo é tão con-fusa e repleta, sobretudo, de intervenções marcantes da própria imprensa. Não foi o Black Sabbath que criou o metal ao se ves-tir de preto e falar sobre novos temas, mas foram os jornais e as revistas que reconhe-ceram, naquele grupo, um tipo de música que estava em surgimento.