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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA - INPA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA DE ÁGUA DOCE E PESCA INTERIOR Interações comportamentais e relações predador-presa entre Erythrinus erythrinus (Bloch & Schneider, 1801) e Rivulus micropus (Steindachner, 1863) na Amazônia Central brasileira JEFFERSON GOMES SODRÉ Manaus, Amazonas Maio de 2014

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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA - INPA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA DE ÁGUA DOCE E PESCA

INTERIOR

Interações comportamentais e relações predador-presa entre Erythrinus

erythrinus (Bloch & Schneider, 1801) e Rivulus micropus (Steindachner, 1863)

na Amazônia Central brasileira

JEFFERSON GOMES SODRÉ

Manaus, Amazonas

Maio de 2014

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JEFFERSON GOMES SODRÉ

Interações comportamentais e relações predador-presa entre Erythrinus

erythrinus (Bloch & Schneider, 1801) e Rivulus micropus (Steindachner, 1863)

na Amazônia Central brasileira

Orientador: Dr. JANSEN ALFREDO SAMPAIO ZUANON

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Biologia de Água Doce e

Pesca Interior do Instituto Nacional de

Pesquisas da Amazônia, como parte dos

requisitos para obtenção do título de Mestre

em Ciências Biológicas, área de concentração

em Ecologia.

Manaus, Amazonas

Maio de 2014

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Ficha catalográfica

S679 Sodré, Jefferson Gomes

Interações comportamentais e relações predador-presa entre Erythrinus erythrinus

(Bloch & Schneider, 1801) e Rivulus micropus (Steindachner, 1863) na Amazônia

Central brasileira / Jefferson Gomes Sodré. --- Manaus: [s.n.], 2014.

xvi, 84f : il. color.

Dissertação (Mestrado) --- INPA, Manaus, 2014.

Orientador : Jansen Alfredo Sampaio Zuanon.

Área de concentração : Biologia de Água Doce e Pesca Interior.

1. Mimetismo. 2. Peixes - Amazônia. I. Título.

CDD 597.0929

Sinopse:

Devido às notáveis semelhanças morfológicas e comportamentais entre duas espécies simpátricas de

peixes, o presente estudo avaliou a hipótese de mimetismo agressivo entre um predador (Erythrinus

erythrinus) e uma das suas presas (Rivulus micropus). Foram estimadas as proporções entre predador e

presa, através de observações e coletas em campo. Em campo foram montados conjuntos de seis poças

artificiais para medir as distâncias percorridas por cada indivíduo por entre elas. Para avaliar o

comportamento de movimentação entre poças de R.micropus em diferentes situações de coocorrência,

isolados; na presença de um coespecifico (machos e fêmeas); e do possível mímico agressivo (jovens de

E. erythrynus). Experimentos laboratoriais em aquário foram realizados a fim de verificar as reações de

machos e fêmeas de R. micropus à presença de coespecifico do mesmo sexo ou do sexo oposto, e do

predador E. erythrinus. Informações sobre interações comportamentais e história natural das espécies

estudadas foram fornecidas.

Palavras-chave: Mimetismo agressivo, peixes, igarapés, história natural, Amazônia Central.

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Aos meus pais, Joselito de Souza Sodré e Vera

Lúcia Gomes Sodré, pela força, apoio moral e por

acreditarem nos meus sonhos sempre.

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Agradecimentos

Agradeço imensamente ao meu orientador, Dr. Jansen Zuanon, pela agradável

convivência ao longo do desenvolvimento da realização deste trabalho, por sempre se prontificar

a me ajudar em todas as fases do mestrado, pela oportunidade e principalmente pelos

ensinamentos de taxonomia, comportamento e história natural de peixes Amazônicos.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela bolsa

de mestrado, e ao INPA, pela estrutura e apoio logístico.

À Moema Vasconcelos, pelo incentivo, amizade, carinho, e por todos os bons momentos,

e difíceis também, que passamos juntos durante esses anos.

Aos professores do BADPI pelos ensinamentos e bons momentos durante as disciplinas

do curso.

Aos companheiros de campo, Seu Zé e João Batista, pelo auxílio essencial em campo e

pela diversão nas horas vagas.

Aos amigos Benedito Monteiro, Daniela De Fex Wolf, Paula Guarido, Paulo Adelino,

Helder Espírito Santo, Suzanne Fernandes, Tiago Pires pela ajuda em campo, análises

estatísticas, sugestões e coletas dos peixes.

A toda equipe de filmagens da Light & Shadow, por disponibilizar os vídeos feitos com

as espécies em ambiente natural.

Aos meus amigos Mario Cohen e Aluízio Cohen, pelos ensinamentos e longas conversas

sobre aquarismo.

Aos meus amigos de Porto Velho Talles Colaço, Diogo Hungria, Bruno Barros, Ariana

Ribeiro, João Filho, William Ohara pelos bons momentos e experiências de campo.

Ao amigo Murilo Arantes pela ajuda com as análises estatísticas e apoio logístico nas

coletas de campo.

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Aos administradores da Reserva Florestal Adolpho Ducke pela ajuda com as autorizações

de coleta e por disponibilizarem os laboratórios, cozinha e alojamento durante o período de

estudo.

Ao Gabriel Cardoso pelas boas conversas sobre comportamento reprodutivo de Rivulus.

Por fim, a tudo e a todos que fizeram parte desses dois anos de alegrias e tristezas, e que

foram responsáveis pelo meu crescimento pessoal e profissional.

Muito obrigado!

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"Aliás, o que exponho, sem jurar nas palavras de ninguém,

e sem compilar as descobertas de outrem, é o que eu mesmo

investiguei, achei e observei por diversas vezes e em diverso

tempo."

“Príncipe dos Observadores”- Fritz Müller

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Resumo

Mimetismo representa um exemplo de evolução convergente. A similaridade de um

predador com sua presa pode envolver um caso de mimetismo agressivo, vulgarmente conhecido

pela metáfora “lobo em pele de cordeiro”, e é conhecida para diversas espécies de peixes. Devido

às semelhanças morfológicas notáveis entre duas espécies simpátricas de peixes, o presente

estudo avaliou a hipótese de mimetismo agressivo entre um predador (Erythrinus erythrinus) e

uma das suas presas (Rivulus micropus), que são comumente encontrados em pequenos igarapés

de terra-firme e em poças temporárias na Amazônia central. Mais especificamente, o jovem E.

erythrinus possui uma macha caudal semelhante à das fêmeas de R. micropus. Para a consecução

dos objetivos foram utilizados diferentes métodos de amostragem, coletas de campo,

experimentos de campo e experimentos laboratoriais. As amostragens de campo foram feitas na

Reserva Florestal Adolpho Ducke localizada em (Manaus, Amazonas), onde foram realizadas as

coletas dos peixes, registrado o tamanho, o sexo, e a abundância dessas duas espécies, bem como

características físicas e químicas dos ambientes de poças. Esse estudo de campo buscou verificar

se a presença de um predador potencial (E. erythrinus) influencia a estrutura populacional e razão

sexual de Rivulus micropus (uma presa potencial) nas poças. Nos experimentos de campo foi

avaliado o comportamento de saltar de R. micropus (entre poças próximas) como uma resposta à

presença de predadores ou outros coespecíficos (machos e fêmeas). Foram montados conjuntos

de seis poças artificiais para medir as distâncias percorridas por cada indivíduo por entre elas.

Experimentos laboratoriais foram realizados a fim de verificar as reações de machos e fêmeas de

R. micropus à presença de coespecifico do mesmo sexo ou do sexo oposto, e do predador E.

erythrinus. Nas amostragens de campo, foi observado que o suposto mímico agressivo (E.

erythrinus) apresenta abundância muito menor do que a da espécie modelo e presa potencial (R.

micropus). A razão sexual de R. micropus não diferiu de 1:1. Foram detectadas diferenças na

distância percorrida por machos e fêmeas de R. micropus em diferentes condições de

coocorrência. Os machos R. micropus saltaram significativamente menos na presença de fêmeas,

e significativamente mais na presença de jovens E. erythrinus quando comparados a machos e

fêmeas isolados. Nos experimentos em laboratório foi observado que E. erythrinus não

apresentou preferência por investir sobre machos ou fêmeas de R. micropus. No entanto, machos

apresentaram comportamento de cortejo às fêmeas da própria espécie e aos jovens de E.

erythrinus. Sendo assim, machos de R. micropus falham em distinguir fêmeas e predador,

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podendo ser enganados pelo padrão de coloração e comportamento de seu hipotético mímico

agressivo E. erythrinus. Esse conjunto de resultados, juntamente com observações naturalísticas

de comportamento dos animais, corrobora a hipótese de mimetismo agressivo entre E. erythrinus

e R. micropus. No entanto, não foram encontradas evidências de que os machos sofram mais com

a predação por E. erythrinus do que as fêmeas, como originalmente proposto para Rivulus agilae.

O alcance geográfico de E. erythrinus coincide com várias espécies dimórficas e

morfologicamente semelhantes de Rivulus, e é possível que esta relação mimética também ocorra

para essas outras espécies.

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Abstract

Mimicry is an example of convergent evolution. Aggressive mimicry is a convergence in

morphological similarity between a predator and its prey, commonly known by the metaphor of

the "wolf in sheep's clothing". This kind of mimicry has been reported for several species of fish.

Due to a striking morphological similarity between two sympatric species of fish, the present

study assessed the hypothesis of aggressive mimicry between two species of fish, a predator

(Erythrinus erythrinus) and one of its prey (Rivulus micropus), which are commonly found in

small terra-firme streams and temporary nearby ponds in central Amazonia. More specifically,

young E. erythrinus has caudal spot that resembles females of R. micropus. In order to conduct

this investigation, I gathered data from different sampling methods: field collections, field

experiments and laboratorial experiments. Field collections were conducted in the Adolpho

Ducke Forest Reserve (Manaus, Amazonas). I recorded size, sex, and abundance of these two

species, as well as physical and chemical characteristics of the temporary ponds where they were

found. Therefore, I assessed whether the presence of E. erythrinus influences population structure

and sex ratio of Rivulus micropus in the temporary ponds near streams. Field experiment was

designed to evaluate the movements of R. micropus (though jumping among the nearby ponds) as

a response to the presence of predators or other coespecifics (males and females). I set six

artificial nearby ponds and measured the distances covered by each individual across

them.Laboratorial experiments were conducted in order to verify the reactions of males and

females of R. micropus to the presence of coespecifics of the same sex or opposite sex, and to an

E. erythrinus predator. As expected, I detected a lower abundance of E. erythrinus in relation to

R. micropus. The sex ratio of R. micropus did not differ from 1:1. I detected a difference in the

distance covered by males and females of R. micropus in different conditions of co-occurrence.

Males R. micropus moved significantly less in the presence of females, and significantly more in

the presence of young E. erythrinus when compared to control groups (isolated males and

females). In laboratory experiments I found that E. erythrinus showed no predatory preference

towards males or females of R. micropus. Moreover, males showed courtship behavior towards

both females of their own species and young of E. erythrinus. Thus, males of R. micropus fail in

distinguishing females from its predator on the base of color and behavior of its hypothetical

aggressive mimic. This set of results, along with naturalistic observations, supports the

hypothesis of aggressive mimicry between E. erythrinus and R. micropus. However, despite of

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the closer similarity between females and its aggressive mimic, I found no evidence that one of

the sexes would suffer more from predation. Because the geographical range of E. erythrinus

overlaps with several dimorphic and morphologically similar species of Rivulus, it is also likely

that this mimetic relationship also occur for those species.

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Sumário

Resumo ...................................................................................................................................... vii

Abstract ....................................................................................................................................... ix

Introdução geral ......................................................................................................................... 17

Objetivo geral da Dissertação .................................................................................................... 20

Objetivos específicos ................................................................................................................. 20

Estrutura da Dissertação ............................................................................................................ 20

CAPÍTULO 1 ................................................................................................................................ 22

ABUNDÂNCIA RELATIVA DE ERYTHRINUS ERYTHRINUS E RIVULUS MICROPUS

EM SISTEMAS DE POÇAS LATERAIS A IGARAPÉS NA REGIÃO DE MANAUS,

AMAZONAS, BRASIL ............................................................................................................... 22

Resumo ...................................................................................................................................... 22

Referências bibliográficas .......................................................................................................... 30

CAPÍTULO 2 ................................................................................................................................ 32

COMPORTAMENTO DE MOVIMENTAÇÃO ENTRE POÇAS DE RIVULUS

MICROPUS SOB DIFERENTES SITUAÇÕES DE COOCORRÊNCIA ............................. 32

Resumo ...................................................................................................................................... 32

Introdução .................................................................................................................................. 33

Material e métodos ..................................................................................................................... 35

Protocolo experimental .......................................................................................................... 35

Procedimentos gerais.............................................................................................................. 36

Tratamentos experimentais .................................................................................................... 38

Observações nas arenas e tomada de dados ........................................................................... 39

Análises estatísticas ................................................................................................................ 40

Resultados .................................................................................................................................. 40

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Taxa de movimentação entre poças ....................................................................................... 40

Indivíduos isolados de R. micropus (machos e fêmeas)......................................................... 41

Casais de R. micropus ............................................................................................................ 42

Indivíduos de R. micropus na presença do predador E. erythrinus ........................................ 43

Comparações entre diferentes tratamentos experimentais ..................................................... 45

Discussão ................................................................................................................................... 47

Referências bibliográficas .......................................................................................................... 49

CAPÍTULO 3 ................................................................................................................................ 55

MIMETISMO AGRESSIVO ENTRE: RIVULUS MICROPUS (STEINDACHNER, 1863) E

ERYTHRINUS ERYTHRINUS (BLOCH & SCHNEIDER, 1801) .......................................... 55

Resumo ...................................................................................................................................... 55

Introdução .................................................................................................................................. 56

Material e Métodos .................................................................................................................... 59

Características morfológicas de E. erythrinus e R. micropus relacionadas à possível

ocorrência de mimetismo agressivo ....................................................................................... 59

Relações ecológicas do mímico agressivo com o modelo ..................................................... 60

Protocolo experimental .......................................................................................................... 61

Procedimento experimental e tomada de dados ..................................................................... 62

Análises estatísticas ................................................................................................................ 63

Resultados .................................................................................................................................. 64

Descrição dos comportamentos do mímico e do modelo ....................................................... 64

Comportamento sexual ........................................................................................................... 64

Comportamento agonístico .................................................................................................... 64

Experimentos de dupla escolha .............................................................................................. 65

Experimento 1 ........................................................................................................................ 65

Experimento 2 ........................................................................................................................ 66

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Experimento 3 ........................................................................................................................ 67

Discussão ................................................................................................................................... 68

Conclusões ................................................................................................................................. 71

Referências bibliográficas .......................................................................................................... 71

Considerações finais .................................................................................................................. 76

Referências bibliográficas .......................................................................................................... 77

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Lista de Figuras

CAPÍTULO 1

Figura 1. 1: Jovem do mímico agressivo E. erythrinus com a presença de ocelo caudal (A) e

pontos escuros nos raios da nadadeira caudal, similar ao padrão de coloração das fêmeas de seu

modelo R. micropus (C). E. erythrinus adulto sem o ocelo caudal ou pouco evidente (B). Machos

de R. micropus mais coloridos e sem máculas em forma de ocelo na base da nadadeira caudal

(D). Fotos: Jansen Zuanon. ............................................................................................................ 28

Figura 1. 2: (A) Rivulus micropus (macho ao lado direito, fêmea à esquerda), sendo possível

visualizar o ocelo caudal da fêmea; (B) poça semipermanente (pode permanecer com água em

anos mais chuvosos) às margens de um igarapé da Reserva Ducke; (C) poça temporária formada

nos períodos de maior pluviosidade; (D) indivíduo jovem de Rivulus kirovskyi, ocupando uma

casca de fruto no solo da floresta, nas proximidades de um igarapé da Reserva Ducke. Fotos:

Jefferson Sodré. ............................................................................................................................. 29

CAPÍTULO 2

Figura 2. 1: Unidade experimental (arena), delimitada com tela de nylon de malha fina e

sustentada por canos de PVC com 1m de altura (A); Vista de uma das arenas com a cobertura de

tecido fino para evitar a queda de itens provenientes da floresta nas bacias (B); disposição das

bacias numeradas no interior da arena. As bacias 1, 2, 3, 4 e 5 apresentavam 40 cm de

espaçamento entre si, e a bacia de número 6 apresentava uma distância de 30 cm em relação às

demais (C); bacias sendo abastecidas com água do igarapé no dia do experimento (D). Fotos:

Jefferson Sodré. ............................................................................................................................. 36

Figura 2. 2: Nos tratamentos experimentais envolvendo indivíduos isolados de R. micropus,

casais, e na presença de coespecífico (macho ou fêmea), os peixes foram soltos sempre na bacia

de número 1 (A); macho e fêmea de R. micropus juntos em uma bacia (B); Nos tratamentos em

que indivíduos de R. micropus foram testados na presença de um predador, os peixes foram

soltos na bacia central, de número 6, com auxílio de tubos de PVC (C);. indivíduo de R. micropus

(maior) e do predador E. erythrinus (menor) (D). Fotos: Jefferson Sodré. .................................. 38

Figura 2. 3: Distância média percorrida entre poças por machos e fêmeas isolados de R.

micropus. ....................................................................................................................................... 42

Figura 2. 4: Distância média percorrida entre poças por machos e fêmeas de R. micropus

mantidos juntos nas arenas (casais). .............................................................................................. 43

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Figura 2. 5: Distância média percorrida entre poças por indivíduos de R. micropus machos

isolados e na presença do predador ............................................................................................... 44

Figura 2. 6: Distância média percorrida entre poças por indivíduos de R. micropus fêmeas,

isoladas e na presença de um predador. ......................................................................................... 45

Figura 2. 7: Macho e fêmea de R. micropus registrados no momento em que saltaram juntos para

fora d’água, macho com a coloração do corpo mais claro e fêmea mais escura ........................... 53

Figura 2. 8: Jovem de E .erythrynus registrado fora d’água no experimento na presença de

predador. ........................................................................................................................................ 54

CAPÍTULO 3

Figura 3. 1: Características morfológicas do mímico agressivo (Erythrinus erythrinus, à esquerda

na figura) e do modelo (Rivulus micropus, à direita). (A) fêmea de R. micropus, repare na

pequena mácula no lobo superior da nadadeira caudal, similar à mácula presente nos jovens de E.

erythrinus (C), e nas pequenas machas marrom claro presente na poção superior da nadadeira

caudal e na base da nadadeira dorsal de ambas as espécies. Os machos (B) não apresentam

mácula na nadadeira caudal e possuem coloração mais conspícua do que as fêmeas. Em E.

erythrinus adultos (D) a mancha escura na caudal torna-se muito menos conspícua ou desaparece.

....................................................................................................................................................... 60

Figura 3. 2: Esquema do aquário experimenta, evidenciando a profundidade da coluna d’água e

posição das duas divisórias de vidro. A posição dos indivíduos nos compartimentos (machos e

fêmeas de Rivulus micropus, e jovens de Erythrinus erythrinus) variou de acordo com o tipo de

experimento. .................................................................................................................................. 62

Figura 3. 3: Tempo médio de associação (em segundos) do predador E. erythrinus diante de

machos e fêmeas de R. micropus, avaliado por meio do teste de Wilcoxon (N=10). ................... 66

Figura 3. 4: Tempo médio de associação de machos de R. micropus (em segundos) diante de

fêmeas de sua espécie e do predador E. erythrinus, avaliado por meio do teste de Wilcoxon

(N=10). .......................................................................................................................................... 67

Figura 3. 5: Tempo médio de associação (em segundos) de fêmeas de R. micropus diante de

machos de sua espécie e do predador E. erythrinus, avaliado por meio do teste de Wilcoxon

(N=10). .......................................................................................................................................... 68

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Lista de tabelas

CAPÍTULO 1

Tabela 1. 1: Tabela do número de parcelas que o modelo R. micropus e o mímico E.erythrynus

foram registrados. Onde (NºParc) corresponde ao número da parcela; (NºM) número de machos;

(NºF) número de fêmeas; (NºE) número de Erythrunus; (CT mm) Comprimento total (mínimo e

máximo) dos indivíduos encontrados. (*) indica as parcelas que eles coocorreram. .................... 27

CAPÍTULO 2

Tabela 2. 1: Valores médios de número de saltos e distância percorrida por machos e fêmeas de

R. micropus e por E. erythrinus nos diferentes tratamentos testados em campo. ......................... 41

Tabela 2. 2: Comparações entre tratamentos testados e tipo de teste utilizado. * indica diferença

significativa. Os símbolos ♂ e ♀ indicam machos e fêmeas de R. micropus testados

isoladamente (S) ou na presença de um indivíduo jovem do predador E. erythrinus (E). ............ 46

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Introdução geral

A região Neotropical possui a maior diversidade de peixes de água doce conhecida, sendo

que a bacia Amazônica contribui com a maior parte, com 2.600 espécies descritas (Reis et al.,

2003) e dezenas sendo descritas a cada ano.

Além da diversidade biológica, a Amazônia também abriga uma grande diversidade

natural de ambientes aquáticos. Em florestas de terra firme, pequenos corpos d’água

(regionalmente chamados de igarapés) nascem e recortam essas florestas, formando uma das mais

densas redes de riachos do mundo (Junk, 1983). A maioria desses igarapés de floresta possui

águas ácidas, com pouca quantidade de sais dissolvidos e baixa produtividade primária. A cadeia

trófica nesses sistemas depende fundamentalmente da matéria orgânica proveniente da vegetação

ripária (Walker, 1990; Lowe-McConnell, 1999; Anjos, 2014). Apesar dessas limitações tróficas,

as espécies de peixes exibem diferentes padrões comportamentais, seja para o uso do

microhabitats específicos ou na forma de táticas alimentares especializadas. Essas características

estão relacionadas com características estruturais dos habitat, períodos de atividade e

características morfológicas das espécies, que permitem a aquisição de alimentos e proteção

contra predadores (Sabino & Zuanon, 1998; Carvalho, 2007).

Dentre os vertebrados, os peixes apresentam um elevado número de predadores, o que

parece constituir uma característica das comunidades tropicais tanto em ambientes marinhos

como de água doce. A predação, e, em contrapartida, as estratégias de evitação desenvolvidas

pelas presas, representam pressões seletivas importantes que moldam as interações das espécies

(Lowe-McConnell, 1999). Com decorrência dessas interações entre predador e presa, é

desenvolvida uma série de adaptações, as quais são resultados de uma longa coexistência e

resultam em uma ‘’corrida armamentista’’ através do tempo evolutivo, na forma de adaptações e

contra-adaptações (Abrams, 1986).

Exemplos de mecanismos de defesa antipredatória e estratégias de predação em peixes

foram descritos por Cott (1940), Wickler (1968), Edmunds (1964) e Keenleyside (1979). Em

sistemas de igarapés de terra firme na Amazônia Central brasileira, Zuanon et al. (2006)

estudaram uma assembleia de peixes psamófilos onde cinco espécies apresentam padrão de

colorido críptico na areia (algumas são translúcidas), características consideradas vantajosas tanto

para evitação de predadores como para aproximação às presas. Carvalho et al. (2006) registraram

três conjuntos de espécies de peixes e camarões, de tamanhos similares entre si, que

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aparentemente dependem da camuflagem e transparência para escapar de potenciais predadores, e

que consistiriam em possíveis casos de mimetismo Batesiano. Ainda em igarapés amazônicos,

Sazima et al. (2006) descreveram uma estratégia de defesa utilizada por três espécies de peixes

de hábitos noturnos (Siluriformes e Gymnotiformes) que permanecem durante o dia em meio a

aglomerados de raízes e folhas submersas, imitando folhas mortas.

Uma interação comportamental complexa e extremamente interessante foi descrita por

Brosset (1997) em riachos da Guiana Francesa, envolvendo uma espécie de predador de

pequeno/médio porte, Erythrinus erythrinus (Bloch & Schneider, 1801); (Erythrinidae) e um

pequeno peixe da família Rivulidae (Rivulus agilae, Hoedeman, 1954). Com base em

observações em aquário, Brosset (1997) apresentou evidências da existência de uma relação de

mimetismo agressivo entre essas duas espécies, onde fêmeas de R. agilae seriam o modelo e

indivíduos jovens do predador E. erythrinus representariam o mímico. As fêmeas dessa espécie

de Rivulus (e de outras espécies do gênero; q.v. Huber, 1992) apresentam um ocelo junto à base

da nadadeira caudal e que representa uma característica sexualmente dimórfica bastante

conspícua. Indivíduos jovens de E. erythrinus também apresentam uma mancha similar, e

aparentemente usam essa semelhança como parte de uma tática de caça. Aparentemente

enganados pela similaridade morfológica e de padrão de colorido, machos de R. agilae se

aproximam e cortejam jovens de E. erythrinus, os quais se aproveitam da situação e atacam os

machos, agarrando-os pela cauda e engolindo-os.

Na região de Manaus, Amazonas, na Amazônia Central brasileira, ocorre uma situação

semelhante à descrita por Brosset (1997), onde uma espécie de Rivulus [R. micropus

(Steindachner, 1863)] compartilha o ambiente de poças associadas a igarapés com indivíduos

jovens de E. erythrinus. Também de forma similar ao observado nos riachos da Guiana Francesa,

a fêmea de R. micropus apresenta um ocelo na base de cauda, o que sugere a existência de uma

relação mimética hipotética como a descrita por Brosset (1997). Ao contrário das espécies de

Rivulus, que geralmente têm distribuições geográficas relativamente restritas, E. erythrinus

ocorre em uma área enorme, que inclui as bacias Amazônica e do Orenoco e rios costeiros das

Guianas (Oyakawa, 2003). Isso sugere que interações comportamentais tendo essa espécie como

mímico agressivo podem ocorrer com diferentes espécies de Rivulus na Amazônia, especialmente

nos casos onde há dimorfismo sexual marcado pela presença de uma mancha caudal nas fêmeas.

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Para que uma interação mimética desse tipo possa ocorrer, é necessário que algumas

condições estejam presentes: 1) As duas espécies ocupem simultaneamente o mesmo micro-

habitat; 2) que haja uma similaridade morfológica e/ou comportamental entre as duas espécies; 3)

que a espécie-modelo seja muito mais abundante do que o mímico. Além da já mencionada

coocorrência das duas espécies nos igarapés próximos a Manaus e da similaridade morfológica

descrita anteriormente, uma característica marcante de R. micropus e E. erythrinus é a capacidade

de se mover fora d’água, saltando entre poças próximas ou rastejando pelo solo úmido (no caso

de E. erythrinus). Essa capacidade permite que as duas espécies se movimentem pelo sistema de

poças e alagados, em busca de alimento (presas, no caso de E. erythrinus), condições ambientais

adequadas, parceiros reprodutivos, e – possivelmente – como forma de fugir de predadores

(principalmente no caso de R. micropus). Assim, entender os padrões de movimentação dessas

espécies pode ajudar a entender a as estratégias que possibilitam a manutenção de uma relação

hipotética de mimetismo agressivo entre essas duas espécies.

Considerando esses fatos e hipóteses, o objetivo do presente estudo é fornecer uma visão

geral sobre história natural de R. micropus e E. erythrinus em ambientes marginais temporários

(poças e alagados) a igarapés da Amazônia Central brasileira, e testar a hipótese de ocorrência de

mimetismo agressivo entre essas duas espécies.

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Objetivo geral da Dissertação

Verificar se a hipótese de mimetismo agressivo proposta por Brosset (1997) é válida para

o par de espécies Rivulus micropus e Erythrinus erythrinus, por meio de observações em campo e

de experimentos controlados em campo e em laboratório.

Objetivos específicos

Verificar a abundância e razão sexual de indivíduos de R. micropus em sistemas de poças

laterais a igarapés na região de Manaus.

Verificar a abundância proporcional de indivíduos de R. micropus e de E. erythrinus

nesses sistemas de poças.

Verificar se o padrão de movimentação (distância percorrida entre poças) de R. micropus

varia entre os sexos, na presença de um coespecifico, e na presença de um predador

potencial (um jovem de E. erythrinus).

Testar se a resposta comportamental de R. micropus difere entre machos e fêmeas quando

confrontados com um predador potencial (um jovem de E. erythrinus).

Estrutura da Dissertação

Esta dissertação foi dividida em três capítulos. O primeiro capítulo é apresentado em

formato de Nota Científica e reúne informações obtidas em campo sobre Rivulus micropus e

Erythrinus erythrinus em sistemas de igarapés e poças laterais da Reserva Florestal Adolpho

Ducke, em Manaus, Amazonas. O principal objetivo desse estudo foi verificar se a as

características populacionais e de uso de habitat pelas duas espécies permitem a existência de

uma relação de mimetismo agressivo entre elas, como proposto por Brosset (1997) para E.

erythrinus e R. agilae na Guiana Francesa. São apresentadas informações acerca da distribuição

espacial das espécies em diferentes igarapés da Reserva Ducke, tipo de ambiente ocupado,

proporção de machos e fêmeas de R. micropus, e abundância relativa dessa espécie e de E.

erythrinus. O segundo capítulo apresenta os resultados de um estudo experimental realizado em

campo, onde foi avaliado o comportamento de saltar entre poças de R. micropus em diferentes

situações (indivíduos isolados, aos pares, e na presença de um predador em potencial: jovens de

E. erythrinus). O principal objetivo desse estudo foi verificar se R. micropus altera o seu

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comportamento de saltar entre poças dependendo da situação em que se encontra, e inferir sobre

os fatores que motivam os peixes a saltar entre poças na natureza. O terceiro capítulo, testou a

hipótese de existência de respostas comportamentais diferenciadas de machos e fêmeas de R.

micropus à presença de coespecíficos e de jovens de E. erythrinus, através de experimentos e

observações em aquários. Uma seção final reúne os resultados obtidos nos três capítulos da

Dissertação e discute a possível existência de uma relação de mimetismo agressivo envolvendo

E. erythrinus e R. micropus em igarapés de terra firme da Amazônia Central brasileira.

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CAPÍTULO 1

ABUNDÂNCIA RELATIVA DE ERYTHRINUS ERYTHRINUS E RIVULUS

MICROPUS EM SISTEMAS DE POÇAS LATERAIS A IGARAPÉS NA

REGIÃO DE MANAUS, AMAZONAS, BRASIL

Jefferson Gomes Sodré1 & Jansen Zuanon

2

1 Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior do INPA. Email:

[email protected].

2 Coordenação de Biodiversidade, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Av. André Araújo, 2936, Cx. P.

2223, CEP 69080-971, Manaus, AM, Brasil.

Resumo

Ambientes aquáticos temporários (poças e alagados) abrigam comunidades especializadas

de organismos que dependem deste tipo de ambiente para completar seus ciclos de vida. Neste

trabalho foi estimada a abundância relativa e amostradas características do habitat de duas

espécies de peixes, R. micropus e E. erythrinus, que possuem características morfológicas e

comportamentais peculiares e que possivelmente envolvem um caso de mimetismo agressivo.

Segundo essa hipótese, indivíduos jovens de E. erythrinus mimetizariam fêmeas de R. micropus

como estratégia comportamental para predar machos dessa espécie, que seriam enganados pela

semelhança entre o predador e as fêmeas. A fim de testar essa hipótese, foi realizado um estudo

de campo em parcelas aquáticas junto a igarapés na Reserva Ducke, Manaus, Amazonas, Brasil,

onde foram amostradas 92 poças em 14 parcelas aquáticas. Indivíduos de R. micropus e/ou E.

erythrinus foram encontrados em nove parcelas, e em seis delas as duas espécies coocorreram nas

poças. A proporção de machos e fêmeas de R. micropus foi de 1:1, e a proporção de indivíduos

jovens de E. erythrinus em relação à de R. micropus foi de ~1:13. Em suma, a similaridade

morfológica entre as duas espécies, associada ao fato de compartilharem o ambiente das poças, e

à proporção observada entre predador e presa, indicam que as condições necessárias para a

ocorrência de mimetismo agressivo entre E. erythrinus e R. micropus estão presentes nos

ambientes aquáticos da Reserva Ducke. Porém, observações em laboratório e experimentos são

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necessários para verificar de este tipo de interação comportamental de fato ocorre entre essas

duas espécies.

Palavras-chave: Ictiofauna, Poças temporárias, Relações predador-presa, Reserva Adolpho

Ducke.

Os igarapés Amazônicos são sistemas aquáticos intimamente conectados física, química e

biologicamente à sua zona ripária, de forma similar ao observado para riachos de ambientes

temperados por Murphy & Meehan (1991). A retenção da água da chuva ou do extravasamento

do canal do igarapé forma sistemas de alagados laterais e poças temporárias, o que parece estar

relacionado ao complexo sistema de raízes da floresta, à composição do solo, à morfologia do

canal do igarapé e à presença de dispositivos de retenção da água (Pazin et al., 2006).

Registros sobre interações comportamentais de peixes que ocupam esses tipos de

ambiente são raros, principalmente aquelas envolvendo relações comportamentais entre

predadores e suas presas. Um dos poucos registros desse tipo foi realizado por Brosset (1997),

que registrou um caso de mimetismo agressivo entre as espécies Rivulus agilae e Erythrinus

erythrinus em riachos da Guiana Francesa. Nessa interação os jovens de E. erythrinus apresentam

morfologia, coloração e comportamento similares aos de fêmeas de R. agilae, e se utilizam dessa

semelhança para se aproximar e predar os machos dessa espécie. Para que esse tipo de interação

ocorra, algumas condições devem ser satisfeitas: as populações das duas espécies devem ter

sobreposição de áreas geográficas (Thresher, 1978); o mímico e o modelo devem ocupar o

mesmo habitat (Randall & Randall 1960); e a espécie mimética deve ser menos abundante do que

a espécie modelo; caso contrário, o receptor do sinal (no caso, o modelo e espécie-presa, R.

agilae) vai encontrar muitos imitadores e aprender com essas experiências (Bates, 1862).

Dentre as espécies de peixes que ocupam principalmente ambientes marginais (poças e

alagados) a igarapés de terra firme da Amazônia Central estão Rivulus micropus (Steindachner,

1863) (Cyprinodontiformes: Rivulidae) e E. erythrinus (Bloch & Schneider, 1801)

(Characiformes: Erythrinidae). Indivíduos jovens de E. erythrinus são bastante semelhantes a

fêmeas de R. micropus, especialmente pelo formato geral do corpo, pela presença de uma

pequena mancha escura na base da nadadeira caudal (Figura 1. 1), e pelo comportamento de

movimentação e repouso nas poças marginais aos igarapés. Entretanto, não há informações

disponíveis sobre a razão sexual de R. micropus e tampouco sobre a abundância relativa dessa

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espécie e de E. erythrinus nos sistemas de poças laterais aos igarapés, de forma a atender às

premissas. Neste sentido, o objetivo deste estudo foi verificar se R. micropus e E. erythrinus

satisfazem as premissas de coocorrência, e relação de abundância entre o mímico e o modelo,

propostas para casos de mimetismo agressivo.

O estudo foi realizado na Reserva Florestal Adolpho Ducke (RFAD), que possui 10.000

hectares e está situada no município de Manaus, Amazonas (sede: 02°55’S e 59°59’W). A RFAD

é coberta predominantemente por floresta tropical úmida de terra firme, com altura média de

dossel entre 30 e 35 metros e temperatura média anual do ar de 26°C (Ribeiro et al., 1999). A

reserva abriga uma densa rede de pequenos igarapés, cujas margens são constituídas por um

complexo sistema de poças e alagados que se formam durante o período chuvoso (Mendonça,

2002) (Figura 1. 2). As amostragens foram realizadas entre fevereiro e junho de 2013, que

corresponde ao período de maior precipitação de chuvas na região. No total, foram amostradas 14

parcelas aquáticas, correspondentes a trechos de 50 m de comprimento ao longo de igarapés de 1ª

a 2ª ordem (cf. Strahler, 1957), pertencentes às bacias dos igarapés do Barro Branco, Acará e

Tinga. Para caracterização do ambiente de estudo, em cada poça da parcela foram feitas cinco

medidas de cada um dos seguintes atributos: comprimento, largura, profundidade e tipo de

substrato das poças, e parâmetros limnológicos, como pH, temperatura (°C), condutividade

elétrica, oxigênio (mg/l e % de saturação), com auxílio de sonda multiparamétrica (Yellow

Springs, modelo YSI 556). Os valores de cada atributo foram expressos como média ± desvio

padrão.

Os peixes foram coletados com puçás por um período de 5 minutos em cada poça, ou até

que nenhum indivíduo fosse mais coletado; em seguida, foram armazenados em sacos plásticos

com água e dados de identificação da posição da poça na parcela. Durante as amostragens

também foram registradas características do comportamento dos animais, por meio de

observações naturalísticas (Lehner, 1996). A identidade das espécies, o tamanho (comprimento

total – CT - e padrão - CP, em mm), sexo, e a quantidade de indivíduos de cada espécie na poça

foram anotados, e os peixes foram subsequentemente soltos nas mesmas poças onde haviam sido

coletados.

Nas 14 parcelas aquáticas avaliadas, foram amostradas 92 poças. Os valores médios dos

parâmetros limnológicos nas poças foram: profundidade = 7±3.72 cm; profundidade ou altura do

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substrato = 1,89±1,11cm; condutividade = 16,99±6.26µS; pH = 4,30±0,48; O2 dissolvido =

2.65±1.97mg/l; % saturação = 32,20±23,47%; temperatura da água = 25,10±0,42°C.

Foram coletados 345 peixes, pertencentes a 12 espécies distribuídas em nove famílias:

Erythrinidae (Erythrinus erythrinus), Callichthyidae (Callichthys callichthys), Characidae

(Hyphessobrycon aff. melazonatus), Crenuchidae (Crenuchus spilurus), Rivulidae (Rivulus

micropus, R. kirovskyi, R. obscurus), Cichlidae (Aequidens pallidus), Gymnotidae (Gymnotus

coropinae), Lebiasinidae (Pyrrhulina cf. brevis, Copella nigrofasciata), e Synbranchidae

(Synbranchus sp.).

Rivulus micropus (n=93) e E. erythrinus (n=18) foram registrados em nove das 14

parcelas, isoladamente ou em coocorrência; Em seis parcelas essas duas espécies foram

encontrados juntas, compartilhando os ambientes das poças (Tabela 1. 1). Do total de indivíduos

de R. micropus, 30 eram machos e 36 eram fêmeas, e 28 não tiveram o sexo determinado

(jovens). Dos indivíduos de E. erythrinus, 17 eram jovens e apenas um era adulto (sexo

indeterminado). A proporção observada de machos e fêmeas de R. micropus não diferiu de 1:1

(G= 0,379, p>0,05). A proporção de indivíduos de E. erythrinus em relação à de R. micropus foi

de 18:93 (1:5.2), ou seja, para cada cinco indivíduos R. micropus foi encontrado um E.

erythrinus.

Dos 17 indivíduos jovens de E. erythrinus, cinco apresentaram comprimento padrão entre

34 e 43 mm, uma faixa de tamanho correspondente aos tamanhos observados das fêmeas adultas

de R. micropus (34,9-53,78 mm CP), como registrado por Cardoso (2012) para essa espécie na

Reserva Ducke. Sendo assim, a proporção real de jovens de E. erythrinus dentro da classe de

tamanho para que o mimetismo agressivo possa ocorrer foi de 5:66 (1:13.2); ou seja, para cada

indivíduo jovem de E. erythrinus havia 13 indivíduos adultos (machos e fêmeas) de R. micropus.

Deste modo, a proporção do hipotético mímico e seu modelo estão de acordo com as premissas

estabelecidas pela hipótese de mimetismo agressivo (Wickler, 1968).

Espírito-Santo et al. (2013), estudando estratégias reprodutivas de peixes que ocupam

tanto o canal do igarapé quanto os sistemas de poças marginais, verificaram que ao longo do ano

as espécies R. micropus e E. erythrinus são mais abundantes durante o período de maior

precipitação na região, mas utilizam o canal dos igarapés principalmente como refúgio durante a

estação de estiagem, quando a maior parte das poças seca completamente. Assim, as populações

das duas espécies aparentemente têm suas abundâncias sincronizadas com as variações sazonais,

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ou seja, há sobreposição na distribuição espacial e temporal das populações do modelo e do

mímico, também atendendo às premissas relacionadas à hipótese de mimetismo. Portanto, a

coocorrência de indivíduos adultos de R. micropus e de jovens de E. erythrinus ocorre de fato,

embora não seja obrigatória.

A hipótese de mimetismo agressivo de Brosset (1997) propõe que E. erythrinus imita o

padrão de coloração e o comportamento de fêmeas de R. agilae para iludir e predar indivíduos

machos dessa espécie. Considerando que a proporção sexual observada para R. micropus é de

1:1, isso significa que a estratégia comportamental representada pelo mimetismo agressivo seria

eficiente em apenas 50% dos encontros entre o predador e suas presas potenciais. Isso não

significa que E. erythrinus não prede as fêmeas de Rivulus, pois isso poderia ocorrer se

predadores de maior porte atacassem as fêmeas diretamente, ou utilizassem outras táticas de caça.

Entretanto, não se conhece o comportamento de E. erythrinus em relação às fêmeas de Rivulus (e

tampouco as respostas comportamentais das fêmeas quando confrontadas com esse predador em

potencial). Estudos nesse sentido poderão ajudar a elucidar detalhes dessa interação

comportamental complexa entre as duas espécies, e contribuir para uma melhor compreensão dos

mecanismos que mantêm relações de mimetismo agressivo na natureza.

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Tabela 1. 1: Número de machos e fêmeas de Rivulus micropus e de Erythrinus erythrinus nas parcelas de

amostragem ao longo de igarapés da Reserva Ducke. São apresentadas apenas as parcelas na qual pelo menos uma

das duas espécies foi registrada (total amostrado= 14 parcelas). CT (mm) = Comprimento total (mínimo e máximo)

dos indivíduos encontrados.

R. micropus E. erythrinus

Parcela ♂ CT (mm) ♀ CT (mm) Nº E CT (mm)

1 1 30-36 2 20-22

4 2 23-30

1 22*

5 5 20-25 2 21-40 1 27*

7 9 18-54 12 19-56 1 30*

8 2 30-33 1 35

9 2 43-53 2 19-55 5 19-130*

10 8 37-58 12 20-61

11 1 47 2 34-38 9 20-43*

12

3 26-51 1 24*

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Figura 1. 1: Jovem do mímico agressivo E. erythrinus com a presença de ocelo caudal (A) e pontos escuros nos

raios da nadadeira caudal, similar ao padrão de coloração das fêmeas de seu modelo R. micropus (C). E. erythrinus

adulto sem o ocelo caudal ou pouco evidente (B). Machos de R. micropus mais coloridos e sem máculas em forma de

ocelo na base da nadadeira caudal (D). Fotos: Jansen Zuanon.

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Figura 1. 2: (A) Rivulus micropus (macho ao lado direito, fêmea à esquerda), sendo possível visualizar o ocelo

caudal da fêmea; (B) poça semipermanente (pode permanecer com água em anos mais chuvosos) às margens de um

igarapé da Reserva Ducke; (C) poça temporária formada nos períodos de maior pluviosidade; (D) indivíduo jovem

de Rivulus kirovskyi, ocupando uma casca de fruto no solo da floresta, nas proximidades de um igarapé da Reserva

Ducke. Fotos: Jefferson Sodré.

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CAPÍTULO 2

COMPORTAMENTO DE MOVIMENTAÇÃO ENTRE POÇAS DE

RIVULUS MICROPUS SOB DIFERENTES SITUAÇÕES DE

COOCORRÊNCIA

Jefferson Gomes Sodré1; Jansen Zuanon

2; Moema Rachel Vasconcelos

1

1 Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior do INPA.

Email:[email protected].

2 Coordenação de Biodiversidade, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Av. André Araújo, 2936, Cx. P.

2223, CEP 69080-971, Manaus, AM, Brasil.

Resumo

O rivulídeo Neotropical Rivulus micropus adota um modo incomum para se movimentar

entre poças laterais a igarapés, saltando através do ambiente terrestre à procura de locais

favoráveis para a reprodução, alimentação e refúgio contra predadores. Neste estudo nós

realizamos experimentos em campo para verificar, se há variação na taxa de movimentação entre

poças por machos e fêmeas de R. micropus, e se a presença de um predador (jovens de E.

erythrinus) altera a sua taxa de movimentação. Os experimentos foram realizados em conjuntos

de poças experimentais (bacias plásticas) e a variável mensurada foi a distância percorrida por

meio dos saltos realizados ao longo de um dia de observações (das 07:00h às 17:00h). Não houve

diferença na distância percorrida por machos e fêmeas solitários (N=20), mas casais se

movimentaram significativamente menos do que indivíduos solitários. Na presença do predador,

machos se deslocaram significativamente mais do que indivíduos solitários, mas as fêmeas não.

Assim, embora as taxas de movimentação de Rivulus machos e fêmeas não sejam intrinsecamente

diferentes, houve um efeito negativo da presença de um coespecífico do sexo oposto, e positivo

para a presença de um predador, nas taxas de movimentação de machos de R. micropus. Esses

resultados indicam que pode haver uma maior vulnerabilidade dos machos de R. micropus à

predação por E. erythrinus nas poças, e que o comportamento dos machos de saltar entre poças

pode ser modulado pela presença de fêmeas nesses ambientes.

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Palavras-chave: Manipulação experimental; estratégia de defesa; saltar fora d’água; efeito não

letal.

Introdução

Peixes piscívoros exercem efeitos diretos nas populações de suas presas como, por meio

de redução populacional, alteração na densidade de indivíduos e na estrutura de tamanho das

populações (Persson et al., 1996). Consequentemente as espécies presas podem apresentar

alterações comportamentais em resposta à atuação do predador (e.g. tempo e local de forrageio,

uso de microhabitats, padrão geral de atividade) (Pettersson & Bronmark, 1993). Como

decorrência dessas interações entre predador e presa, foram desenvolvidas diversas adaptações

tanto pelos predadores (p. ex. melhora na acuidade visual, aprendizagem, capacidade de eliminar

ou incorporar toxinas) como pelas presas (coloração críptica, mimetismo, comportamentos

evasivos, produção ou aquisição de toxinas). Esses mecanismos desenvolvidos por predadores e

suas presas, são considerados resultados de uma longa coexistência, e geram uma “corrida

armamentista” evolutiva entre as espécies (Edmunds, 1974).

As adaptações e estratégias antipredatórias são classificadas por Edmunds (1974) e

Keenleyside (1979) como mecanismos de defesa primários, quando presentes na presa mesmo na

ausência do predador, e mecanismos de defesa secundários, quando manifestados apenas no

momento do confronto da presa com o predador. A primeira categoria diminui a chance do

confronto da presa com o predador, enquanto a segunda aumenta a possibilidade de

sobrevivência da presa após o ataque do predador. Ações evasivas como, por exemplo, peixes

que saltam fora d’água para diminuir a probabilidade de serem alcançados e mortos por

predadores são considerados como defesa secundária de caráter comportamental (Baylis, 1982;

Sazima & Machado, 1989). Muitos peixes teleósteos que vivem em ambientes aquáticos

temporários (poças e alagados), tais como os rivulídeos (Cyprinodontiformes), saltam para fora

d’água para fugir de predadores (Baylis, 1982), e também para buscar novos locais de

forrageamento ou para fugir de condições ambientais inadequadas (por exemplo, poças em

retração durante a seca).

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Os rivulídeos não têm especializações morfológicas evidentes do esqueleto pós-craniano

para facilitar o movimento em terra (Parenti, 1993), mas possuem excepcional capacidade de

saltar entre poças marginais aos riachos. Além disso, são capazes de memorizar a topografia do

ambiente no período de cheia, e se orientar em direção a poças mais estáveis e favoráveis para

sua permanência no período de vazante/seca (Mast, 1915; Aronson, 1951; 1971; Davis et al.,

1990; Gibb, 2011). Possuem também especializações morfológicas que incluem uma epiderme

bastante vascularizada que supostamente possibilita a realização de respiração aérea durante a

locomoção terrestre, onde podem sobreviver por até 60 horas (Seghers, 1978; Grizzle &

Thiyagarajah, 1987). Outro grupo de peixes que também possuem estratégias peculiares para

ocupar ambientes aquáticos pouco favoráveis são os eritrinídeos, conhecidos popularmente como

traíras e jejus. Esses peixes são predadores vorazes, adaptados a viver em lagos, alagados e poças

com baixas concentrações de oxigênio dissolvido, graças a um sistema acessório de respiração

que absorve o oxigênio diretamente do ar (Godoy, 1975; Jucá-Chagas, 2004). Dentre esses,

Erythrinus erythrinus é capaz de retirar o oxigênio diretamente do ar e rastejar pelo solo úmido

durante a noite, à procura de poças (Géry, 1970; Fernandez, 1994).

Em igarapés de terra firme na Reserva Florestal Adolpho Ducke, em Manaus, Amazonas,

um complexo sistema de poças e alagados é formado durante o período chuvoso às margens dos

igarapés. Essas poças são relativamente pequenas e pouco profundas, com uma fase seca anual de

duração variável, e abrigam comunidades de organismos aquáticos que dependem deste tipo de

ambiente para completar seus ciclos de vida (Pazin et al., 2006). Dentre os organismos que vivem

nesses ambientes de poças estão duas espécies de peixes, Erythrinus erythrinus (Erythrinidae) e

Rivulus micropus (Rivulidae). Rivulus micropus ocupa os ambientes de poças durante todo seu

ciclo de vida, e se refugiam nos canais de igarapés apenas quando as poças secam

completamente. Já E. erythrinus ocupa as poças laterais aos igarapés principalmente durante as

fases iniciais de vida, e os adultos vivem predominantemente nos igarapés. Dado que E.

erythrinus é um predador voraz, é possível que a sua presença influencie a permanência de R.

micropus nas poças e interfira na taxa de movimentação dessa espécie entre as poças laterais aos

igarapés. Além disso, Brosset (1997) aventou a hipótese de existência de uma relação de

mimetismo agressivo envolvendo essas duas espécies, onde jovens de E. erythrinus mimetizariam

fêmeas de R. agilae para atrair e predar machos dessa espécie. Neste sentido, é possível que o

padrão de uso e movimentação entre as poças seja diferente para machos e fêmeas de R.

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micropus. Finalmente, é necessário considerar que o uso das poças por machos e fêmeas de R.

micropus também pode envolver relações intraespecíficas, sendo influenciado diferentemente

pela presença de um indivíduo coespecífico do mesmo sexo ou do sexo oposto (pois isso

envolveria potencialmente questões relacionadas ao uso de recursos e/ou comportamento

reprodutivo).

O presente estudo teve como objetivo avaliar o comportamento de movimentação entre

poças por R. micropus, e verificar se a presença de coespecíficos (machos e fêmeas) e do

predador E. erythrinus influenciam a movimentação entre poças. Essas diferentes situações foram

testadas por meio de uma série de experimentos em campo, para responder às seguintes

perguntas: 1) A movimentação entre poças por R. micropus varia entre machos e fêmeas? 2) A

movimentação entre poças por R. micropus varia na presença de um coespecifico (machos e

fêmeas)?, e 3) A movimentação entre poças de R. micropus (machos e fêmeas) varia na presença

do predador E. erythrinus?

Material e métodos

Protocolo experimental

Os experimentos foram realizados na Reserva Florestal Adolfo Ducke no período de

junho a novembro de 2013. Foi selecionada uma área próxima ao igarapé do Barro Branco para

montar um conjunto de 10 arenas experimentais distantes entre si aproximadamente 3 m. Houve

um cuidado com a topografia do ambiente na escolha da área para montagem das arenas, já que

no período chuvoso as margens e o solo próximo aos igarapés ficam encharcados, o que poderia

interferir nos experimentos ou facilitar a fuga dos peixes.

Cada arena consistia de um cercado em forma de pentágono, delimitado por uma tela

plástica tipo “mosquiteiro” (malha 1 mm) fixada com canos de PVC com 1 metro de altura. Cada

arena continha seis bacias numeradas para simular poças artificiais (Figura 2. 1). Cada bacia

(volume = 1,5 l) foi enterrada ao nível do solo, com cerca de 6 cm de coluna d’água. As bacias

foram numeradas e as arenas cobertas com uma tela de tecido fino, para proteger de possíveis

objetos que caíssem nas bacias (Figura 2. 1). As bacias dispostas nos vértices do pentágono

distavam 40 cm entre si, e a bacia central distava 30 cm das demais.

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No dia anterior à realização de cada rodada de observações foi feito a manutenção de cada

cercado e fechados quaisquer espaços por onde os peixes pudessem escapar. Os peixes utilizados

nos experimentos foram coletados em poças laterais a igarapés na Reserva Florestal Adolpho

Ducke, durante a primeira etapa dos trabalhos de campo desta dissertação.

Figura 2. 1: Unidade experimental (arena), delimitada com tela de nylon de malha fina e sustentada por canos de

PVC com 1m de altura (A); Vista de uma das arenas com a cobertura de tecido fino para evitar a queda de itens

provenientes da floresta nas bacias (B); disposição das bacias numeradas no interior da arena. As bacias 1, 2, 3, 4 e 5

apresentavam 40 cm de espaçamento entre si, e a bacia de número 6 apresentava uma distância de 30 cm em relação

às demais (C); bacias sendo abastecidas com água do igarapé no dia do experimento (D). Fotos: Jefferson Sodré.

Procedimentos gerais

Antes do início dos experimentos, os peixes foram mantidos individualmente em potes

plásticos de 2,5 litros numerados, e foram alimentados com ração do tipo comercial (Tetra

color®) para peixes ornamentais. Posteriormente, os peixes foram transportados do laboratório

úmido da Coordenação de Biodiversidade do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia

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(INPA) até o local de experimentos na Reserva Ducke. Os peixes foram medidos em campo com

uso de paquímetro digital (acurácia = 1 mm), um dia antes de cada experimento, para evitar a

possível interferência do estresse de manipulação. A seleção dos peixes para inclusão em cada

arena foi feita por sorteio.

No dia de realização dos experimentos os peixes foram colocados em suas respectivas

arenas, e foi estabelecido um tempo mínimo de aclimatação de 15 minutos antes de se iniciar as

vistorias. Foram realizadas observações a cada 60 minutos, desde 07:00h até 17:00h, totalizando

10 (dez) observações por arena e experimento. Ao final dos experimentos os peixes eram

recolhidos e armazenados novamente em seus potes plásticos numerados.

Como parte do protocolo experimental, os peixes foram inicialmente soltos sempre na

bacia de número 1, para os seguintes tratamentos (vide detalhes mais abaixo): indivíduos

solitários, casal, presença de coespecífico. Nos tratamentos em que os indivíduos de R. micropus

foram observados na presença de um predador (E. erythrinus), e no caso de observações de

predadores solitários, os peixes foram soltos na bacia central, correspondente à de número 6.

Nesse tratamento (presa na presença do predador), os peixes foram soltos com auxílio de dois

tubos de PVC de 20 cm de comprimento e 10 cm de diâmetro, fixados com liga elástica (Figura

2. 2). Cada peixe foi inserido em um dos tubos, com o objetivo de evitar contato visual antes do

início do experimento.

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Figura 2. 2: Nos tratamentos experimentais envolvendo indivíduos isolados de R. micropus, casais, e na presença de

coespecífico (macho ou fêmea), os peixes foram soltos sempre na bacia de número 1 (A); macho e fêmea de R.

micropus juntos em uma bacia (B); Nos tratamentos em que indivíduos de R. micropus foram testados na presença

de um predador, os peixes foram soltos na bacia central, de número 6, com auxílio de tubos de PVC (C); Indivíduo

de R. micropus (maior) e do predador E. erythrinus (menor) (D). Fotos: Jefferson Sodré.

Tratamentos experimentais

Para responder às perguntas propostas neste trabalho, foram realizados os seguintes

experimentos: 1) Machos isolados e fêmeas isoladas (♂S; ♀S): os indivíduos foram observados

isoladamente nas arenas, a fim de verificar se há variação na taxa de movimentação entre os

sexos, e serviu como um controle da taxa de movimentação em relação aos demais tratamentos.

2) Machos e Fêmeas juntos, em casais (♂+♀): nesse tratamento os indivíduos de cada casal

apresentavam tamanhos similares, e o objetivo foi testar se machos e fêmeas, quando juntos,

modificariam suas taxas de movimentação quando comparados com a condição de isolamento. 3)

Macho na presença de coespecífico do mesmo sexo (♂+♂): nesse tratamento foi testado se há

variação na taxa de movimentação entre poças, em comparação com a condição de isolamento e

de presença de coespecífico do sexo oposto (casais). Para facilitar a identificação individual, os

indivíduos eram sempre de tamanhos ligeiramente diferentes. Os indivíduos utilizados neste

experimento nunca foram usados em outro experimento. 4) Fêmea na presença de coespecífico

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do mesmo sexo (♀+♀): idem tratamento anterior. 5) Predador isolado (ES): um indivíduo jovem

de Erythrinus erythrinus foi testado em cada arena, a fim de verificar a sua taxa de movimentação

na ausência de R. micropus. 6) Macho de R. micropus na presença de um predador (♂S + E):

esse tratamento teve o objetivo de verificar de a presença de um predador altera a taxa de

movimentação de R. micropus. Os indivíduos de E. erythrinus utilizados nesse tratamento foram

de tamanhos menores que as presas (machos de R. micropus), para que não pudessem mata-las e

consumi-las, o que interferiria no experimento. Os indivíduos de R. micropus utilizados neste

tratamento foram os mesmos observados no tratamento de machos solitários. 7) Fêmeas na

presença de um predador (♀S + E): idem tratamento anterior, variando apenas o sexo dos

indivíduos de R. micropus.

Observações nas arenas e tomada de dados

As vistorias seguiram uma sequência que começava na arena de número 1 e terminava na

de número 10, e o tempo total de cada vistoria não ultrapassou 15 minutos. Diante de cada arena

era feita uma varredura visual do espaço interno e anotada(s) a(s) posição(ões) do(s) indivíduo(s)

nas bacias (ou fora d’água). Foram estabelecidos previamente alguns critérios para registro das

informações, de acordo com as possibilidades de comportamento previstas: A) quando um

indivíduo foi observado em uma bacia adjacente à que ocupava na vistoria anterior, a distância

percorrida foi considerada como sendo de 40 cm. Quando o indivíduo havia se deslocado de

qualquer bacia para a bacia central, a distância foi considerada como sendo 30 cm. B) Quando

um indivíduo havia se deslocado para uma bacia não adjacente à que estava, e nem para a bacia

central, a distância percorrida foi contabilizada como sendo de 70 cm. C) Para indivíduos

observados fora d’água (entre duas bacias quaisquer), após terem sido registrados em uma das

bacias na vistoria anterior, foram considerados 20 cm de distância percorrida; nos casos em que o

indivíduo permaneceu fora d’água em vistorias consecutivas, a distância percorrida foi

considerada como 0 (zero). D) Para indivíduos observados fora d’água em uma vistoria, e

registrados em uma das bacias na vistoria seguinte, foram considerados 20 cm de distância

percorrida.

Com base nos dados obtidos dessa forma, foram calculados os valores das seguintes

variáveis, para cada tratamento experimental: 1) distância total percorrida pelo(s) indivíduo(s):

soma das distâncias percorridas entre as vistorias (em cm). 2) Número de saltos entre bacias:

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nesses casos, foram contabilizados como saltos quando um indivíduo se deslocou de uma bacia

para outra, ou quando se deslocou de uma bacia para fora d’água (ou quando retornou para uma

das bacias).

Análises estatísticas

Inicialmente foi testada a normalidade da distribuição dos dados (teste de Shapiro–Wilk)

e a homocedasticidade das variâncias. Além disso, foi realizada uma análise de correlação de

Pearson entre as variáveis distâncias percorridas e número de saltos, foi obtido um valor de r =

0,88. Em função desse resultado, optou-se por utilizar apenas a distância percorrida entre poças

como variável nas análises seguintes.

Para as comparações entre tratamentos, e em função da não normalidade das

distribuições, foi utilizado o teste não paramétrico de Wilcoxon para amostras pareadas nas

seguintes comparações (♂+♀) x (♂s) x (♂s + E); (♀s) x (♀s + E). Nos casos em que os

tratamentos não envolveram a utilização dos mesmos indivíduos, nem indivíduos observados

juntos nas mesmas arenas (♂S; ♀S), foram utilizados testes de Mann Whitney para dados não

pareados. Nas comparações envolvendo três tratamentos experimentais [(♂s) x (♂+♂) x (♂+♀) e

(♀s) x (♀+♀) x (♂+♀)] foi utilizada a média da distância percorrida pelos indivíduos nos

tratamentos envolvendo indivíduos do mesmo sexo (♀+♀; ♂+♂). Nesses casos foram realizadas

Análises de Variância (ANOVAs), com transformação dos dados por raiz quadrada nos casos em

que não apresentaram distribuição normal. Testes a posteriori de Tukey foram aplicados quando

as ANOVAs identificaram diferenças significativas entre os tratamentos.

Resultados

Taxa de movimentação entre poças

A taxa de movimentação de R. micropus variou entre os diferentes tratamentos experimentais.

Uma síntese dos resultados é apresentada na (Tabela 2.1).

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Tabela 2. 1: Valores médios de número de saltos e distância percorrida por machos e fêmeas de R. micropus e por E.

erythrinus nos diferentes tratamentos testados em campo. Rm= Rivulus micropus; Ery = Erythrinus erythrinus

(predador).

Espécie/sexo Tratamentos Comp. total

(cm)

Nº de

replicas

Média nº

de saltos

Distância média

percorrida (cm)

R. micropus

(macho)

Isolado 3,1 - 6,0 20 3,75 105

+ ♀ Rm 3,0 - 6,2 20 3,15 76

+ Ery 3,6 - 5,9 15 5,26 136

+ ♂ Rm 3,0 - 5,6 10 4,7 129

R. micropus

(fêmea)

Isolado 3,1 - 6,0 20 3,85 108

+ ♂ Rm 2,8 - 5,7 20 4,05 110

+ Ery 3,5 - 6,0 15 3,4 90

+ ♀ Rm 2,5 - 5 10 2,8 78

E. erythrinus

Isolado 2,8 - 4,7 18 1,61 34

+ ♂ Rm 3,0 - 3,6 10 1,4 28

+ ♀ Rm 2,8 - 4,7 10 0,6 12

Indivíduos isolados de R. micropus (machos e fêmeas)

Nesse tratamento foi testado se a taxa de movimentação entre poças difere entre machos e

fêmeas de R. micropus isolados nas arenas experimentais. Não houve diferença significativa na

distância média percorrida por machos e fêmeas (Machos: 105 cm ± 62.70 EP; fêmeas: 108,5 cm

± 74.78 EP; U= 198, p= 0,9568; n= 20; Figura 2. 3). Não houve correlação entre a distância

percorrida e o tamanho dos indivíduos utilizados nos experimentos (Correlação de Pearson, r =

0,1034; p = 0,5254; n=20).

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Solitários

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Machos Fêmeas0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Dis

tân

cia p

erco

rrid

a e

ntr

e p

oça

s (c

m)

p=0,9568

Figura 2. 3: Distância média percorrida entre poças por machos e fêmeas isolados de R. micropus.

Casais de R. micropus

Nesse tratamento, machos e fêmeas de R. micropus foram dispostos em casais para

verificar se a taxa de movimentação variava entre machos e fêmeas nessa condição. As fêmeas se

movimentaram por distâncias significativamente maiores do que os machos nessa condição

experimental (Machos: 76 cm ± 45,11 EP; Fêmeas: 110,5 cm ± 64,52 EP; Z= 2.02; p= 0,0428; n=

20; Figura 2. 4).

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Casais

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Machos Fêmeas0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Dis

tân

cia p

erco

rrid

a e

ntr

e p

oça

s (c

m) p=0,0428

Figura 2. 4: Distância média percorrida entre poças por machos e fêmeas de R. micropus mantidos juntos nas arenas

(casais).

Indivíduos de R. micropus na presença do predador E. erythrinus

Nesse experimento foi testado se a taxa de movimentação dos machos e fêmeas de R.

micropus na presença de um predador (um indivíduo jovem de E. erythrynus) difere daquela

observada para indivíduos isolados, para cada sexo. Indivíduos machos se movimentaram por

distâncias maiores na presença do predador do que quando foram testados isoladamente (machos

isolados: 96,66 cm ± 48,20 EP; com predador: 136,66 cm ± 57,89 EP; Z= 2,09, p= 0,036; n= 15;

Figura 2. 5).

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Machos

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Solitários Presença do predador0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Dis

tân

cia

per

corr

ida

en

tre

po

ças

(cm

) p=0,0360

Figura 2. 5: Distância média percorrida entre poças por indivíduos de R. micropus machos isolados e na presença do

predador

Ao contrário do observado para os machos, não houve diferença significativa entre as

distâncias médias percorridas pelas fêmeas isoladas e na presença de um predador (fêmeas

isoladas: 94 cm ± 61,03 EP; com predador: 90 cm ± 59,28 EP; Z= 0,4193, p= 0,6749; n= 15;

Figura 2. 6).

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Fêmeas

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Solitárias Presença do predador0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Dis

tân

cia

per

corr

ida

en

tre

po

ças

(cm

) p=0,6749

Figura 2. 6: Distância média percorrida entre poças por indivíduos de R. micropus fêmeas, isoladas e na presença de

um predador.

Comparações entre diferentes tratamentos experimentais

Não houve diferença significativa na distância média percorrida por fêmeas de R.

micropus isoladas, em companhia de um indivíduo do mesmo sexo, ou de indivíduo do seco

oposto (♀S X ♀+♀ X ♂+♀) (ANOVA, F2,52=0,6754, p=0,5134). Porém, houve diferença

significativa nas comparações envolvendo os machos (♂S X ♂+♂ X ♂+♀) (ANOVA,

F2,55=3,2763; p=0,0452) (Tabela 2. 2). O teste a posteriori de Tukey mostrou que a distância

média percorrida por machos mantidos com coespecíficos do mesmo sexo foi maior do que a

distância percorrida por eles na companhia de fêmeas (♂+♂ > ♂+♀) (p=0,0405).

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Tabela 2.2: Comparações entre tratamentos testados e tipo de teste utilizado. * indica diferença significativa. Os

símbolos ♂ e ♀ indicam machos e fêmeas de R. micropus testados isoladamente (S) ou na presença de um indivíduo

jovem do predador E. erythrinus (E).

Comparações Estatística (Teste de Mann

Whitney ou Wilcoxon) p p Valor

Sentido da

diferença

♂S X ♀S U=194,5 0,9568 p=0,9568 ♂S=♀S

♂+♀ Z=2,0250 0,0428* p=0,0428* ♂<♀*

♂S X ♂s+E Z=2,0965 0,0360* p=0,0360* ♂S+E>♂S*

♀S X ♀s+E Z=0,4193 0,6749 p=0,6749 ♀S =♀S+E

Análise de variância (ANOVA)

♂S X ♂+♂ X ♂+♀ F=0,6754 0,0452* p=0,0452* ♂S=♂+♂>♂+♀

♀S X ♀+♀ X ♂+♀ F=3,2762 0,5134 p=0,5134 ♀S=♀+♀=♂+♀

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Discussão

Os resultados obtidos no presente estudo mostraram que não houve diferença na distância

média percorrida por machos e fêmeas de Rivulus micropus mantidos isoladamente nas arenas

experimentais; entretanto, machos se movimentaram menos do que as fêmeas quando foram

mantidos em casais. Em algumas vistorias nas arenas foi possível registra machos e fêmeas juntos

fora d’água (Figura 2. 7). Por outro lado, machos se movimentaram mais na presença de um

predador potencial do que quando mantidos isoladamente. Finalmente, vale notar que as

distâncias percorridas pelos jovens de Erythrinus erythrinus, que corresponderam a cerca de um

terço da distância percorrida por indivíduos de R. micropus nas mesmas condições experimentais.

Esses resultados indicam que a presença de um coespecífico de sexo oposto ou de um predador

potencial afetaram significativamente a movimentação de R. micropus entre as poças artificiais.

O significado dessas variações nos padrões de movimentação é discutido a seguir.

Os indivíduos de R. micropus (machos e fêmeas) apresentam comportamentos distintos

em relação à taxa de movimentação entre poças, dependendo das condições de coocorrência de

indivíduos da espécie ou de predadores, como observado nos diferentes experimentos realizados

neste estudo. O comportamento de saltar fora d’água, uma tática frequentemente utilizada por

Cyprinodontiformes, além de representar uma estratégia de defesa contra predadores (Baylis,

1982), possibilita a exploração de novos ambientes, à procura de recursos alimentares e parceiros

reprodutivos (Seghers, 1978; Davis, 1990).

O fato dos machos saltarem menos quando estão na presença de fêmeas sugere que a

busca por uma parceira reprodutiva seja um fator motivador importante que motiva os machos a

saltar entre poças. Essa hipótese é reforçada pelo fato de não ter havido diferença na taxa de

movimentação de machos solitários ou em duplas, o que indica que eles parecem ser indiferentes

à presença de um coespecífico do mesmo sexo. Sendo assim, os machos parecem ser os

principais responsáveis pelos efeitos desses tipos de interações entre indivíduos, regulando o seu

comportamento (aumentando ou diminuindo sua taxa de movimentação entre poças) de acordo

com as condições encontradas. Sob condições naturais, é provável então que os machos de R.

micropus saltem entre poças à procura de fêmeas para reprodução, reduzindo a sua taxa de

movimentação quando obtêm sucesso nessa busca. Por outro lado, o eventual encontro com um

predador pode fazer com que os machos abandonem aquela poça, como forma de defesa.

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Essa dicotomia na escolha dos machos de R. micropus em saltar à procura de fêmeas ou

fugir da predação por E. erythrinus pode estar sendo mediada pela ocorrência de uma interação

mimética, como proposta por Brosset (1997). Deste modo, quando um macho salta para uma

poça que esteja sendo habitada por um jovem de E. erythrinus, ele pode ser enganado pela

aparência morfológica similar à de uma fêmea de sua espécie (vide Capítulo 3 da presente

Dissertação). Dependendo da relação de tamanhos entre os indivíduos de R. micropus e E.

erythrinus envolvidos, a interação pode resultar em uma interação letal, com a morte do macho

de R. micropus (quando o predador é suficientemente grande para comê-lo), ou em uma tentativa

de predação mal sucedida (quando o predador não é suficientemente grande), o que estimularia o

macho a saltar para outra poça. Isso explicaria o aumento na movimentação dos machos na

presença de um predador potencial, como observado nos experimentos realizados.

Em ambientes aquáticos os predadores influenciam de diversas maneiras o

comportamento de espécies utilizadas como presas, as quais modificam o seu comportamento

principalmente na tentativa de evitar confrontos (Carvalho, 2004; Lima, 2008). Em um estudo

realizado na América do Norte, Baylis (1982) descreveu uma estratégia de fuga onde a presa

(uma espécie de Cyprinodontiformes) saltava fora d’água e permanecia sobre as folhas de

macrófitas aquáticas, fugindo momentaneamente da vista do predador. Entretanto, o predador

desenvolveu uma contra-estratégia, atacando por debaixo das folhas das macrófitas,

aparentemente guiado pela silhueta da presa em contraluz. Esse tipo de interação, denominado de

“corrida armamentista” (Edmunds, 1974), pode levar ao surgimento de relações comportamentais

complexas, formadas por estratégias de ataque, defesa e contra-ataque, que podem ser utilizadas

em diferentes condições.

O tamanho relativo dos indivíduos envolvidos nesse tipo de interação, e possivelmente o

sexo, aparentemente são fatores capazes de determinar a permanência, fuga, ou envolvimento em

uma interação agressiva por R. micropus nas poças. Durante a realização dos experimentos em

campo, foi possível observar em diversas ocasiões, fêmeas perseguindo um jovem predador, o

qual evitava o combate direto com as fêmeas e tentava saltar para fora d’água (Figura 2. 8). Esse

comportamento agressivo das fêmeas de R. micropus, bem como o seu maior tamanho em relação

aos machos da espécie, podem explicar a não existência de diferença significativa na taxa de

movimentação entre fêmeas adultas solitárias e com a presença do predador. Assim, indivíduos

jovens de E. erythrinus podem ser ignorados ou até mesmo expulsos das poças pelas fêmeas.

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Porém, fêmeas de tamanho similar ou menor do que os jovens de E. erythrinus poderiam sofrer

ferimentos letais e serem predadas.

A ocupação diferencial dos estratos da coluna d’água pode possibilitar a convivência de

diferentes espécies em ambientes tão limitados como as poças temporárias. Shibatta (2006)

registrou que indivíduos de Simpsonichthys boitonei (Rivulidae) ocupam principalmente o estrato

inferior da coluna d’água. Por outro lado, indivíduos adultos de R. micropus ocupam

principalmente o estrato superior da coluna d’água, fato registrado em observações de campo

(Vide Capítulo 1 da presente Dissertação). Desse modo, Rivulus adultos dominariam a coluna

d’água em poças laterais, enquanto jovens de E. erythrinus permaneceriam abrigados em meio ao

substrato e se envolveriam em interações agonísticas apenas quando a relação de tamanho entre

eles e as presas potenciais fosse favorável ao predador. A movimentação conspicuamente menor

dos indivíduos de E. erythrinus quando comparados com os de R. micropus indica que a

estratégia predominante para o predador possivelmente consiste em esperar pela chegada de uma

presa potencial (no caso, um indivíduo de R. micropus de tamanho adequado). Todavia, vale

ressaltar que E. erythrinus provavelmente não depende exclusivamente dessa estratégia, pois essa

espécie também consome insetos e outros invertebrados, que caem nas poças oriundos da

floresta. Da mesma forma, E. erythrinus é capaz de se movimentar fora d’água e apresenta

respiração aérea acessória, o que o torna um predador extremamente versátil nos ambientes de

igarapés e poças marginais associadas (Abelha, 2008).

A persistência de contatos diretos entre as espécies tem o potencial de influenciar as

características comportamentais de cada uma delas e até mesmo suas trajetórias evolutivas

(Matthews, 2006). Mesmo que predadores menores possivelmente não causem ferimentos letais

às suas presas, a mutilação de nadadeiras ou outras partes do corpo poderia prejudicar a

capacidade de locomoção e captura de alimentos por R. micropus (cf. Sazima, 1988). Assim,

interações não letais podem moldar respostas comportamentais diferenciadas por parte de machos

e fêmeas de R. micropus ao predador E. erythrinus, como observado nos experimentos realizados

no presente estudo.

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Figura 2. 7: Macho e fêmea de R. micropus registrados no momento em que saltaram juntos para fora d’água,

macho com a coloração do corpo mais claro e fêmea mais escura. Foto: Jefferson Sodré.

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Figura 2. 8: Jovem de E .erythrynus registrado fora d’água no experimento na presença de predador.Foto: Jefferson

Sodré

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CAPÍTULO 3

MIMETISMO AGRESSIVO ENTRE: RIVULUS MICROPUS

(STEINDACHNER, 1863) E ERYTHRINUS ERYTHRINUS (BLOCH &

SCHNEIDER, 1801)

Jefferson Gomes Sodré1 & Jansen Zuanon

2

1 Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior do INPA.

Email:[email protected].

2 Coordenação de biodiversidade, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Av. André Araújo, 2936, Cx. P.

2223, CEP 69080-971, Manaus, AM, Brasil.

Resumo

O peixe predador Erythrinus erythrinus compartilha poças laterais a igarapés amazônicos

com Rivulus micropus, um rivulídeo de pequeno porte capaz de saltar entre poças. Há uma

grande semelhança morfológica e comportamental entre jovens de E. erythrinus e fêmeas de R.

micropus, e os machos dessa espécie podem ser ludibriados e atacados pelo predador, o que

constituiria um caso de mimetismo agressivo. Experimentos laboratoriais foram realizados a fim

de comparar o tempo de permanência e as reações de machos e fêmeas de R. micropus junto a um

coespecífico do mesmo sexo ou do sexo oposto, e em relação ao predador E. erythrinus. Não

houve diferença no tempo despendido pelo predador diante de machos ou fêmeas de R. micropus.

Machos dessa espécie também não apresentaram diferença no tempo de associação com uma

fêmea e com um predador, indicando que os machos aparentemente são enganados pela

semelhança morfológica entre as duas opções de escolha (o predador e hipotético mímico

agressivo, e as fêmeas). As fêmeas de R. micropus permaneceram por mais tempo junto aos

machos, e investiram agressivamente contra o predador. Esses experimentos corroboram a

hipótese de mimetismo agressivo entre as duas espécies; entretanto, essa forma especializada de

predação provavelmente não é obrigatória e não representa a única tática predatória de E.

erythrinus, pois ocorre (ou é eficaz) apenas nos estágios iniciais de vida do predador.

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Palavras-chave: mimetismo facultativo; predação; coloração.

Introdução

O fenômeno do mimetismo, onde duas ou mais espécies desenvolvem uma marcante

similaridade morfológica ao longo do processo evolutivo surgem muitas vezes nos reinos animal

e vegetal (Wickler, 1965; Turner, 1977; Gilbert, 1983; Malcolm, 1990; Mallet & Joron, 1999). A

evolução do mimetismo ocorre em resposta a pressões seletivas que favorecem que os indivíduos

de uma determinada espécie desenvolvam a capacidade de disfarçar sua identidade e tornando-se

semelhantes a outras espécies (Wickle, 1968). Os estudos sobre associações miméticas

começaram em meados de 1800, com a maioria das teorias desenvolvida a partir de estudos de

campo sobre os grupos de animais terrestres, principalmente borboletas (Bates, 1862; Müller,

1879).

Quatro tipos de mimetismo são conhecidos tradicionalmente: Mimetismo Batesiano,

quando espécies inofensivas e palatáveis se assemelham a espécies não palatáveis ou venenosas,

e são favorecidas ao serem evitadas por predadores (Bates, 1862). Mimetismo Mülleriano,

quando duas ou mais espécies não palatáveis compartilham semelhanças em seus padrões de

coloração e, assim reforçam a sua evitação por predadores (Müller, 1879). Mimetismo Social

quando duas ou mais espécies adotam coloração e morfologia similares reduzindo o risco

individual de morte por predação (Moynihan, 1968); e o Mimetismo Agressivo, quando uma

espécie predadora se assemelha a uma espécie inofensiva, a fim de enganar a sua potencial presa,

assim aumentando sua chance de acesso aos alimentos (Wickler, 1965, 1968; Malcolm, 1990).

Estes mecanismos desenvolvidos por predadores e suas presas, os quais são resultados de uma

longa história de coexistência, geram uma ‘’corrida armamentista’’ através do tempo evolutivo

das espécies (Edmunds, 1974).

Casos de mimetismo em especial de mimetismo “agressivo” têm sido registrados em

vários grupos de animais, tanto invertebrados como vertebrados. Uma revisão dos casos de

mimetismo agressivo descritos na literatura para peixes marinhos foi realizada por Randall

(2005). Entretanto, o trabalho de Sazima (2002) revisa os principais casos de mimetismo

agressivo tanto para peixes de água doce quanto para peixes marinhos conhecidos até aquela data.

Nesse estudo, Sazima (2002), descreve um caso adicional, envolvendo jovens de Centropomus

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mexicanus (Centropomidae) e sua presa Eucinostomus melanopterus (Gerreidae). A interação

entre espécies de piranhas e pequenos caracídeos compõe um dos poucos registros de mimetismo

agressivo entre peixes de água doce (Sazima, 1977; Nico & Taphorn, 1988; Sazima & Machado,

1990). Em riachos da região Centro Oeste do Brasil, Bessa et al. (2011) registrou um tipo de

mecanismo semelhante aos dois casos citados, onde jovens do predador Salminus brasiliensis

mimetizam adultos da espécie onívora Brycon hilarii obtendo vantagem da semelhança no seu

padrão de coloração para se aproximar dos cardumes dessa espécie, que constitui uma presa

importante.

Semelhanças marcantes no padrão de coloração e/ou morfológico entre espécies

sintópicas pode sugerir a ocorrência de um possível caso de mimetismo entre elas. Porém, para

que seja possível compreender e (eventualmente) corroborar esse tipo de hipótese, é necessário

realizar observações naturalísticas em campo e/ou experimentos controlados em laboratório,

técnicas que têm produzido resultados relevantes para o entendimento das relações entre os

indivíduos mímicos e seus modelos (Moland & Jones, 2004). No entanto, poucos estudos

experimentais desse tipo têm sido realizados para peixes de água doce, de forma a verificar se

este tipo de interação está ocorrendo de fato e quais os seus efeitos para os modelos e os mímicos.

Um dos exemplos desse tipo de estudo foi o registro de mimetismo agressivo proposto por

Brosset (1997), envolvendo peixes associados a poças temporárias de riachos da Guiana

Francesa, onde Rivulus agilae (Rivulidae: Cyprinodontiformes) seria o modelo e Erythrinus

erythrinus (Erythrinidae: Characiformes) um mímico agressivo. Nesse estudo, o autor, realizou

observações em campo e experimentos em laboratório e verificou que indivíduos jovens do

predador E. erythrinus mimetizam o padrão de coloração e a postura de fêmeas de R. agilae para

atrair os machos dessa espécie, que se aproximam da suposta fêmea para cortejá-la e são

predados.

Na Amazônia Central brasileira, nos arredores de Manaus, Amazonas, há uma densa rede

de pequenos igarapés que drenam áreas de floresta de terra firme e que abrigam uma rica

ictiofauna (Mendonça et al., 2005; Espírito Santo et al., 2009; Dias, 2010). As margens dos

riachos comumente abrigam um complexo sistema de poças e alagados, sazonalmente

disponíveis no período de chuvas da região. Dentre as diversas espécies de peixes que utilizam

esses ambientes estão E. erythrinus e R. micropus. Jovens de E. erythrinus se assemelham

bastante a fêmeas de R. micropus, especialmente pelo formato geral do corpo e pela presença de

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uma pequena mancha escura na base da nadadeira caudal, de forma idêntica à semelhança

registrada por Brosset (1997) para R. agilae e E. erythrinus. Assim, foi aventada a hipótese de

ocorrência de uma relação mimética similar, envolvendo R. micropus e E. erythrinus nos riachos

da Amazônia brasileira. O jeju E. erythrinus é uma espécie de ocorrência extremamente ampla na

Amazônia (Oyakawa, 2003), ao contrário das espécies de Rivulus, que frequentemente têm

distribuições geograficamente restritas. Assim, caso seja corroborada a hipótese de mimetismo

agressivo entre as duas espécies no Brasil, isso indicaria a existência de um caso particularmente

interessante, onde as características morfológicas e comportamentais de E. erythrinus permitiriam

o estabelecimento de relações de mimetismo agressivo envolvendo diferentes espécies de

modelos/presas ao longo de sua área de distribuição. Dado que a relação mimética proposta é

temporária e restrita à fase juvenil de E. erythrinus, a possibilidade de utilizar diferentes espécies

como modelo pode ter contribuído para fixar o padrão morfológico e comportamental que

possibilitam a ocorrência do mimetismo agressivo nessa espécie ao longo de sua área de

distribuição.

O caso de mimetismo proposto por Brosset (1997) também não detalha as relações do

suposto mímico agressivo com ambos os sexos da espécie–modelo, o que dificulta uma

compreensão adequada dessa associação mimética. Desta forma, o presente estudo teve como

objetivo geral testar a hipótese de ocorrência de um caso de mimetismo agressivo envolvendo E.

erythrinus e R. micropus em riachos da Amazônia Central brasileira, analisando em detalhe a

participação de machos e fêmeas da espécie modelo/presa. Assim, buscamos responder às

seguintes questões: 1) Jovens de E. erythrinus imitam o padrão de coloração e comportamental da

fêmea de R. micropus e predam preferencialmente os machos dessa espécie? 2) Os machos de R.

micropus são enganados pelo padrão de coloração do predador E. erythrinus, e,

consequentemente, isto os torna mais suscetíveis à predação? 3) As fêmeas de R. micropus são

enganadas pela semelhança com o predador E. erythrinus, e isto também as torna mais

suscetíveis à predação?

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Material e Métodos

Características morfológicas de E. erythrinus e R. micropus relacionadas à possível ocorrência

de mimetismo agressivo

O tamanho máximo observado para exemplares de E. erythrinus em poças laterais a

igarapés na Reserva Ducke foi de 11,5 cm de comprimento padrão (CP); em R. micropus o

tamanho de indivíduos adultos varia entre 3,5 e 6,5cm CP (obs. pess.). Ambas as espécies têm

corpo fusiforme e robusto, o que lhes confere uma grande capacidade para saltar, rastejar e se

locomover em ambiente terrestre (Géry, 1970; Baylis, 1982). Os jovens de E. erythrinus possuem

dentes caniniformes que são utilizados para agarrar a presa. Os machos de R. micropus

apresentam fileiras horizontais de pontos com coloração verde a azul metálico, não evidentes em

juvenis, cuja coloração varia entre creme a marrom claro com manchas escuras irregulares sobre

o dorso. Os lados da cabeça e região dorsal do corpo são marrom claro, nadadeiras anal e dorsal

hialinas, com tonalidade amarela pálida e com pontos vermelhos na base, e nadadeira caudal

amarelo claro. As fêmeas possuem os lados do corpo marrom claro, com sete a oito linhas

longitudinais de pontos marrons ou avermelhados, muitas vezes não evidentes. A coloração do

dorso é marrom claro, com uma faixa estriada de cada lado do corpo (marrom escuro), que inicia

da região opercular e percorre pela região dorsal até a base do pedúnculo caudal. Nadadeira

dorsal hialina com três fileiras longitudinais de pontos marrons; nadadeira anal amarelo pálido

com pontos marrom na base; e nadadeira caudal hialina, com pontos marrons escuro no lobo

superior. Em R. micropus, o padrão de coloração sexualmente dimórfico é adquirido muito cedo,

sendo observado em indivíduos a partir de 2,0 cm CP (Huber, 1992), e permanece nos indivíduos

durante toda a vida.

A semelhança no padrão morfológico e de coloração entre o modelo e o mímico agressivo

supostamente ocorre entre as fêmeas de R. micropus e jovens de E. erythrinus. Além da

semelhança geral no formato do corpo, os jovens de E. erythrinus apresentam uma pequena

mancha preta na base da nadadeira caudal, além de pontos marrons na nadadeira dorsal e caudal

(Figura 3. 1), o que confere uma grande semelhança com as fêmeas de R. micropus. A única

diferença mais conspícua ocorre na nadadeira anal, que em E. erythrinus é amarela a

avermelhada e em R. micropus é amarelo claro. Além da similaridade morfológica, tanto o

mímico quanto o modelo adotam postura semelhante tanto no ambiente natural quanto em

aquários, onde se posicionam próximo à superfície ou à meia água, mantendo a parte posterior do

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corpo pendente. Esse padrão postural é observado em varias espécies da família Rivulidae (obs.

pess.). O padrão de colorido considerado mimético para E. erythrinus desaparece em peixes

acima de 7,0 cm CP, quando a mancha caudal se torna inconspícua e a diferença de tamanho em

relação a R. micropus se acentua (Brosset, 1997).

Figura 3. 1: Características morfológicas do mímico agressivo (Erythrinus erythrinus, à esquerda na figura) e do

modelo (Rivulus micropus, à direita). (A) fêmea de R. micropus, repare na pequena mácula no lobo superior da

nadadeira caudal, similar à mácula presente nos jovens de E. erythrinus (C), e nas pequenas machas marrom claro

presente na poção superior da nadadeira caudal e na base da nadadeira dorsal de ambas as espécies. Os machos (B)

não apresentam mácula na nadadeira caudal e possuem coloração mais conspícua do que as fêmeas. Em E. erythrinus

adultos (D) a mancha escura na caudal torna-se muito menos conspícua ou desaparece. Ilustração: Jefferson Sodré

Relações ecológicas do mímico agressivo com o modelo

Para ser eficaz, além da similaridade morfológica e de padrão de colorido em relação à

presa, o predador deve compartilhar o mesmo habitat da presa e apresentar abundância menor do

que a do modelo (Wickler, 1968). Na Reserva Florestal Adolpho Ducke, localizada ao norte da

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cidade de Manaus, Amazonas (02°55’S; 59°59’W), indivíduos de R. micropus e jovens de E.

erythrinus são encontrados juntos em alagados e poças laterais a igarapés. Esses ambientes são

pouco profundos (até 40 cm), mal iluminados (pela sombra do dossel da floresta) e possuem

vários tipos de substrato (folhas, troncos, areia, raízes) (Pazin et al., 2006). Cada poça pode

abrigar diversos indivíduos de R. micropus, incluindo jovens e adultos. Quando adultas, as

fêmeas são altamente agressivas e não toleram a presença de outras fêmeas; em aquários, fêmeas

adultas podem lutar até a morte quando confinadas em pequenos espaços (obs. pess.).

Protocolo experimental

Para responder as questões proposta neste estudo, foram realizados três experimentos de

dupla escolha. Estes experimentos foram realizados no laboratório úmido do Programa de Pós-

graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior (BADPI) do Instituto Nacional de

Pesquisas da Amazônia (INPA). Os indivíduos utilizados nos experimentos foram coletados em

poças laterais a igarapés na Reserva Florestal Adolpho Ducke, e mantidos em aquários

individuais por aproximadamente um mês antes de iniciar os experimentos. Os peixes foram

alimentados com ração do tipo comercial (Tetra Color®) para peixes ornamentais.

As observações comportamentais e os experimentos foram realizados em quatro aquários

de tamanhos iguais (40 X 29 X 30 cm, 36L), com coluna d’água de 8 cm, aeração constante

(retirada no dia do experimento), substrato composto por uma fina camada de areia fina,

iluminação indireta (12h claro/12h escuro) e temperatura ambiente 24°C. Cada aquário foi

dividido em três compartimentos, com auxílio de placas de vidro fixadas nos painéis frontal e

traseiro, sendo dois compartimentos laterais com 10 cm de largura e um compartimento central

de 30 cm, onde o indivíduo focal era mantido. Nesse compartimento central foram marcadas duas

linhas verticais, dividindo-o em três áreas de 10 cm, denominadas zonas laterais de preferência, e

zona central ou neutra (Figura 3. 2). A cada rodada de experimentos os aquários eram lavados e a

água trocada, para evitar possíveis sinais químicos deixados pelos peixes. Os peixes foram

colocados em seus respectivos compartimentos na tarde anterior ao início dos experimentos, para

que tivessem um tempo de ambientação. Nesse período foram inseridas placas de PVC preto

(fosco) ao lado das divisórias de vidro, para que os peixes não tivessem contato visual antes dos

experimentos.

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62

Figura 3. 2: Esquema do aquário experimental, evidenciando a profundidade da coluna d’água e posição das duas

divisórias de vidro. A posição dos indivíduos nos compartimentos (machos e fêmeas de Rivulus micropus, e jovens

de Erythrinus erythrinus) variou de acordo com o tipo de experimento.

Procedimento experimental e tomada de dados

Para testar a hipótese de mimetismo agressivo envolvendo E. erythrinus e machos de R.

micropus, como proposta por Brosset (1997), foram realizados três experimentos, de forma a

verificar as respostas comportamentais das duas espécies sob diferentes condições. Cada

experimento de dupla escolha teve 10 réplicas, onde foram testadas as seguintes situações: 1) um

predador e suposto mímico agressivo E. erythrinus como indivíduo avaliado, tendo como

possibilidades de escolha um macho ou uma fêmea de R. micropus; 2) um macho de Rivulus

micropus, na presença de uma fêmea e de um jovem E. erythrinus; e 3) uma fêmea de R.

micropus, na presença de um macho de R. micropus e de um jovem E. erythrinus. Nesses

experimentos foram utilizados indivíduos jovens de E. erythrinus com o ocelo caudal conspícuo,

considerado por Brosset (1997) como um possível sinal do mímico agressivo para atrair sua

presa. O tamanho do trio de indivíduos observados em cada réplica seguiu um padrão pré-

determinado, onde os machos eram menores do que as fêmeas e o predador, mas a fêmea e o

predador tinham tamanhos similares. Ao longo dos experimentos foram utilizados indivíduos de

tamanhos variados (mímico e modelo), mas sempre mantendo as relações de tamanho descritas

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acima, e nunca um mesmo indivíduo foi utilizado em mais de um experimento. Após cada rodada

de observação o tamanho dos peixes (comprimento total, CT, em mm) foi mensurado com uso de

paquímetro digital.

Os experimentos foram sempre realizados durante o período da manhã. Após a remoção

das placas de PVC preto e depois de cinco minutos de aclimatação, foi realizada filmagem do

comportamento dos peixes. Para evitar perturbações aos eventos comportamentais, as filmagens

foram realizadas por detrás de um anteparo (pano preto) com um orifício por onde passava

apenas a lente da filmadora (Sony Handycam DCR-SR68). As filmagens foram feitas por um

período de 50 minutos para cada réplica. Para as análises quantitativas os 10 minutos iniciais e

finais foram desprezados. Esta medida foi tomada para evitar a inclusão de possíveis observações

sob efeito de estresse decorrente da manipulação (trecho inicial), ou habituação dos animais aos

estímulos (trecho final das gravações).

A partir das filmagens realizadas, e buscando uma compreensão adequada dos padrões

comportamentais exibidos por R. micropus e E. erythrinus, foram realizadas observações

utilizando diferentes métodos de registro (animal focal, todas as ocorrências, e ad libitum; cf.

Lehner, 1979). O tempo de preferência foi definido como a soma dos tempos em que o indivíduo

experimental permaneceu em cada uma das zonas de preferência do aquário experimental, e

foram cronometrados para ambas as escolhas dos indivíduos. Foi considerada uma associação do

indivíduo experimental com uma das possibilidades de escolha quando pelo menos 2/3 do corpo

do animal estivesse dentro da zona de preferência, com a cabeça voltada em direção à

extremidade correspondente do aquário (ou seja, ao indivíduo situado naquele compartimento

lateral). Assim, cada réplica teve como resultados os tempos totais de associação do indivíduo

experimental com cada uma das opções de associação testadas.

Análises estatísticas

A normalidade dos dados e a homocedasticidade das variâncias foram testadas por meio

dos testes de Shapiro–Wilk e de Levene, respectivamente. A existência de diferenças nos tempos

de associação dos indivíduos experimentais com cada uma das possibilidades de escolha foi

verificada com uso do teste não paramétrico de Wilcoxon para amostras pareadas, ao nível de

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significância de α=0,05. As análises foram realizadas por meio do sofware computacional

Statistica 7.0.

Resultados

Descrição dos comportamentos do mímico e do modelo

Os comportamentos apresentados pelo modelo R. micropus e pelo predador e suposto

mímico agressivo E. erythrinus, observados nos experimentos de dupla escolha, foram divididos

em duas unidades comportamentais: comportamento sexual ou de corte (reprodutivo) e

comportamento agonístico (de luta, agressivo). Os experimentos totalizaram 15 horas de

observações, e contiveram 196 interações entre machos, fêmeas e predadores. As descrições a

seguir enfocam sempre o comportamento do indivíduo testado no compartimento central dos

aquários experimentais.

Comportamento sexual

No comportamento sexual observamos que o macho de R. micropus corteja a fêmea

quando ela se aproxima da divisória, através da extensão das nadadeiras e realização de

movimentos ondulatórios do corpo enquanto nada de um lado para o outro na frente da fêmea.

Também ocorre mudança no padrão de coloração do macho, quando se acentua a coloração

avermelhada do corpo, e fica evidente uma faixa amarelada a marrom escuro na parte distal dos

raios das nadadeiras anal e caudal. O macho realiza este comportamento várias vezes, até que a

fêmea se afaste. Esse padrão comportamental apresentado pelo macho foi observado sendo

realizando tanto diante das fêmeas quanto do predador, e raramente foi realizado por fêmeas

(Vídeo suplementar 1: macho cortejando a fêmea e o predador).

Comportamento agonístico

O comportamento agonístico observado nos experimentos foi interpretado como uma

forma de ameaça, e foi constituído por uma combinação de movimentos, como segue: extensão

das nadadeiras, expansão dos opérculos e membranas branquiostegais, e movimentos

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ondulatórios do corpo. Estes comportamentos foram realizado com maior frequência pela fêmea

de R. micropus diante do predador E. erythrinus, quando ambos os indivíduos apresentaram

respostas comportamentais similares (Vídeo suplementar 2: fêmea enfrentando o predador). Em

certas situações esse comportamento evoluiu para o ataque em direção à divisória de vidro, tanto

por parte da fêmea quanto pelo predador, e comportamento de esquiva também foi observado

(tentativas de saltar fora d’água). Quando diante de um macho de R. micropus, o predador

apresentou comportamento menos agressivo do que em relação às fêmeas, com movimentos

similares mas lentos, abrindo e fechando os raios branquiostegais e estendendo as nadadeiras.

(Vídeo suplementar 3: macho interagindo com o predador).

Experimentos de dupla escolha

Experimento 1

No primeiro experimento foi testado se o predador E. erythrinus demonstrava preferência

por machos de R. micropus, na presença de uma fêmea de R. micropus como alternativa de

associação. O comprimento total dos indivíduos avaliados foi de 32 a 54 mm para machos e de

31 a 59 mm para fêmeas de R. micropus, e de 37 a 64 mm para E. erythrinus. Não houve

diferença significativa no tempo de associação de E. erythrinus com machos ou fêmeas de R.

micropus (Z= 1,27, p=0,20, n= 10) (Figura 3. 3).

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Predador

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Fêmeas Machos0

200

400

600

800

1000

1200

1400

Tem

po

méd

io d

e a

sso

cia

ção

(se

g)

p=0,2026

Figura 3. 3: Tempo médio de associação (em segundos) do predador E. erythrinus diante de machos e fêmeas de R.

micropus, avaliado por meio do teste de Wilcoxon (N=10).

Experimento 2

Neste experimento os machos de R. micropus puderam optar por um jovem E. erythrinus

ou por uma fêmea de sua espécie, visando a verificar se os machos podem ser enganados pelo

predador (ou se conseguem distingui-lo de um fêmea). O comprimento total dos indivíduos

avaliados foi de 36 a 47 mm para machos e de 36 a 49 mm para fêmeas de R. micropus, e de 42 a

50 mm para E. erytrhinus. Não houve diferença significativa no tempo médio de associação de

machos de R.micropus com as fêmeas ou com os predadores (Z= 0,35, p= 0,72, n= 10; Figura

3.4)

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Machos

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Predador Fêmeas0

200

400

600

800

1000

1200

Tem

po m

édio

de

ass

oci

açã

o (

seg)

p=0,7212

Figura 3. 4: Tempo médio de associação de machos de R. micropus (em segundos) diante de fêmeas de sua espécie

e do predador E. erythrinus, avaliado por meio do teste de Wilcoxon (N=10).

Experimento 3

Neste experimento, fêmeas de R. micropus tiveram a possibilidade de escolher entre um

jovem E. erythrinus e um macho de sua espécie. O comprimento total dos indivíduos avaliados

foi de 36 a 54 mm para machos e de 37 a 54 mm para fêmeas de R. micropus, e de 36 a 65 mm

para E. erythrinus. As fêmeas permaneceram junto ao compartimento dos machos por intervalos

de tempo significativamente maiores do que nos compartimentos do predador (Z= 2.39, p= 0,016;

n= 10; Figura 3.5). Também foi possível observar no registro de comportamento dos indivíduos,

que as tentativas de ataque das fêmeas ao predador foram relativamente frequentes.

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Fêmeas

Média Desvio padrão Intervalo de confiança

Predador Machos0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

Tem

po m

édio

de

ass

oci

açã

o (

seg)

p=0,0166

Figura 3. 5: Tempo médio de associação (em segundos) de fêmeas de R. micropus diante de machos de sua espécie

e do predador E. erythrinus, avaliado por meio do teste de Wilcoxon (N=10).

Discussão

O resultado obtido no primeiro experimento revela que não houve uma preferência de

associação de indivíduos jovens do predador E. erythrinus por machos ou fêmeas de R. micropus.

Isto indica que o predador não escolhe suas presas potenciais em função da hipotética

similaridade morfológica com as fêmeas de R. micropus, ou com a possibilidade de ludibriar os

machos dessa espécie com base na sua aparência similar à das fêmeas. Por outro lado, machos de

R. micropus realizaram comportamento de corte tanto para fêmeas de sua espécie quanto para

jovens de E. erythrinus, e exibiram tempos de associação similares com essas duas opções de

escolha. Isto sugere que machos de R. micropus podem ser enganados pela similaridade

morfológica (e comportamental) dos jovens predadores em relação às fêmeas, e que o mimetismo

agressivo pode de fato ocorrer entre essas duas espécies. Finalmente, o terceiro experimento

demonstrou que as fêmeas de R. micropus se associam preferencialmente com machos da própria

espécie quando têm jovens de E. erythrinus como opção de escolha, e exibem comportamento

agonístico em relação a eles. Isso indica que as fêmeas são capazes de distinguir os predadores e

que eventualmente os enfrentam na natureza, dependendo da diferença de tamanho entre os

indivíduos (fêmeas de R. micropus maiores do que os jovens E. erythrinus). Assim, esse conjunto

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de resultados corrobora a hipótese de ocorrência de mimetismo agressivo entre as duas espécies

avaliadas no presente estudo.

Machos jovens (relativamente pequenos e inexperientes) de R. micropus podem confundir

jovens E. erythrinus com fêmeas maduras da própria espécie, aproximando-se do predador e

tornando-se presas. As fêmeas em peixes tendem a ser selecionadas sexualmente pelo seu

tamanho corporal ou pela presença de ornamentos que indiquem a condição de maturidade

reprodutiva (Amundsen & Forsgren, 2001). Apesar das fêmeas de R. micropus serem menos

coloridas que os machos, elas são maiores do que eles e possuem um ocelo caudal que as

diferencia dos machos. Desta maneira, um jovem de E. erythrinus que possui corpo robusto e um

ocelo caudal conspícuo poderia ser confundido com uma fêmea “avantajada” e ser cortejado pelo

macho, como verificado no segundo experimento. Essas condições permitiriam o estabelecimento

da relação de mimetismo agressivo envolvendo as duas espécies, o que corrobora a hipótese de

Brosset (1997) e indica que as características morfológicas dos jovens de E. erythrinus

constituem um disfarce eficiente para diferentes espécies de Rivulus, desde que mantidas

condições similares de dimorfismo sexual na espécie utilizada como modelo (fêmeas maiores do

que os machos, e com a presença de um ocelo ou mancha na base da cauda).

Uma das condições fundamentais para que esse tipo de mimetismo se mantenha na

natureza é que os mímicos sejam menos abundantes do que os modelos, de forma a que esse tipo

de interação não seja tão comum a ponto de perder a sua eficiência (já que a espécie-modelo ou

presa poderia aprender a reconhecer e evitar o predador naquelas circunstâncias) (Bates, 1862;

Wickler, 1965). De fato, a relação de abundância entre Rivulus e Erythrinus favorece a interação

(vide Capítulo 1 da presente Dissertação). Além disso, a eficiência dessa estratégia de predação

não deveria ser grande o suficiente a ponto de dizimar a população de presas, impedindo a

continuidade da associação mimética ao longo do tempo evolutivo (Wickler, 1965). Neste

sentido, nossa hipótese é que a eficiência do disfarce deve ser maior nas interações envolvendo

machos jovens de R. micropus, que seriam menores do que os predadores disfarçados de fêmeas e

poderiam ser atacados e consumidos pelos jovens de E. erythrinus. A atração dos machos

inexperientes de R. micropus por “fêmeas robustas” (no caso, os jovens de E. erythrinus) e

posterior morte por predação constitui um caso típico de “lobo em pele de cordeiro”, como

enfatizado por Sazima (2002). Segundo esse autor, este tipo de disfarce seria utilizado

predominantemente por espécies que se alimentam de presas de tamanho similar ao seu o que

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frequentemente ocorre entre peixes lepidófagos e mutiladores em ambientes de água doce.

Assim, a interação comportamental envolvendo E. erythrinus e R. micropus constitui um caso

notável de associação mimética agressiva onde há a morte e a ingestão da presa/modelo, e a

característica que permitiria sua manutenção como estratégia evolutiva estável seria justamente a

limitação de sua ocorrência à fase juvenil do predador.

Outra característica marcante do comportamento de Rivulus micropus é que, as fêmeas

são aparentemente mais agressivas que os machos, e frequentemente lutam entre si quando

confinadas (obs. pess.). Assim, o comportamento agressivo exibido pelas fêmeas em relação aos

jovens de E. erythrinus pode significar que o predador pode estar sendo confundido com uma

fêmea da própria espécie. A razão sexual de R. micropus nas poças estudadas é de 1:1 (Vide

Capítulo 1 da presente dissertação), o que indica que a taxa de encontro dos jovens de E.

erythrinus com indivíduos machos e fêmeas da espécie-presa deve ser similar. Neste sentido, a

eficiência da estratégia de predação baseada no mimetismo agressivo ficaria restrita aos machos

de R. micropus, o que “desperdiçaria” metade dos encontros com presas potenciais. Assim, a

agressividade observada entre as fêmeas de R. micropus pode fazer com que o disfarce dos

jovens E. erythrinus adquira uma dupla função, estimulando as interações agonísticas com as

fêmeas da espécie-modelo e gerando oportunidades de predação.

Um detalhe importante nessa hipótese diz respeito à relação de tamanhos entre o predador

e a presa. Parece razoável supor que o disfarce de Erythrinus seja eficiente na medida em que os

tamanhos dos indivíduos envolvidos sejam similares; entretanto, isso pode estimular a fêmea a

entrar em combate com o predador, com riscos para ambos. A fêmea dificilmente poderia

escapar sem danos (incluindo risco de morte), mas o tamanho da fêmea também pode representar

uma barreira para o predador, que dificilmente conseguiria engolir a presa inteira. Além disso,

uma tentativa de predação nessas condições envolve um risco de retaliação (Sazima, 1988), com

injúrias corporais ou perda de sítios de forrageamento. De fato, fêmeas grandes podem expulsar

jovens de E. erythrinus das poças (obs. pess.; vide Capítulo 2 da presente Dissertação).

A manutenção da interação mimética agressiva como estratégia evolutiva estável depende

da incapacidade de aprendizado por machos e fêmeas de Rivulus micropus de que os jovens de E.

erythrinus representam um potencial predador. O comportamento de mimetismo agressivo

restrito a um estágio de vida do predador pode representar um mecanismo de dissociação

temporal entre o predador e sua presa potencial (Sazima, 2002), reduzindo as chances de

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aprendizado e esquiva por parte da presa. Neste caso, o comportamento de mimetismo

envolvendo machos e fêmeas de R. micropus, e jovens de E. erythrinus, pode estar sendo mantido

pelo fato de que E. erythrinus adultos ocupam preferencialmente o canal do igarapé,

abandonando os sistemas de poças laterais ocupadas por R. micropus (cf. Pazin et al. 2006;

Espírito-Santo et al., 2013).

Conclusões

Indivíduos jovens de E. erythrinus não apresentaram preferência por machos ou fêmeas

de R. micropus nos experimentos realizados, o que indica que indivíduos de ambos os

sexos devem constituir presas potenciais para a espécie.

Machos de R. micropus não apresentaram preferência e cortejaram tanto fêmeas da

própria espécie quanto jovens de E. erythrinus, o que indica que podem ser enganados

pela similaridade morfológica entre ambos e fornece evidências a favor da hipotética

relação de mimetismo agressivo entre as duas espécies.

As fêmeas de R. micropus interagem agressivamente com os jovens de E. erythrinus de

tamanho similar ao seu, o que representa uma expansão potencial da interação mimética

hipotética proposta por Brosset (1997) para as fêmeas de espécies Rivulus que apresentam

ocelo na base da nadadeira caudal.

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Vídeos suplementares

1. Vídeo1: Comportamento reprodutivo de Rivulus micropus, macho cortejando a fêmea

e/ou predador.

2. Vídeo 2: Comportamento agonístico, fêmea enfrentando o predador.

3. Vídeo 3: Macho de Rivulus micropus aparentemente sendo enganado por jovem de

Erythrinus erythrinus.

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Considerações finais

As observações em campo os resultados dos experimentos realizados em laboratório

corroboram a hipótese de ocorrência de uma relação de mimetismo agressivo envolvendo Rivulus

micropus e Erythrinus erythrinus. A abundância de machos e fêmeas do modelo (R. micropus)

nos sistemas de poças laterais aos igarapés da Reserva Ducke foi maior do que a do hipotético

mímico agressivo (E. erythrinus). Nos experimentos realizados em campo, por meio de sistemas

experimentais de poças artificiais, foi observado que machos e fêmeas de R. micropus

apresentaram respostas comportamentais distintas em relação à movimentação entre poças, a qual

variou em função das diferentes situações de coocorrência dos indivíduos. Machos e fêmeas de R.

micropus testados isoladamente nas áreas experimentais não diferiram quanto ao padrão de

movimentação entre poças. Entretanto, machos se movimentaram significativamente menos

quando na companhia de fêmeas da espécie, e, ao contrário, se deslocaram por maiores distâncias

quando havia um predador em potencial presente na arena. Assim, parece que os fatores que

motivam indivíduos de R. micropus a saltar entre poças variam de acordo com o sexo e,

hipoteticamente, em função do tamanho relativo do predador em relação ao da presa, o que ainda

precisa ser testado adequadamente.

Jovens do mímico agressivo (E. erythrinus) quando presentes nas poças parecem não

exercer influencia na decisão de permanecer na poça, este comportamento parece está mais

relacionado à procura de ambientes favoráveis ou a escolha de um possível parceiro para

reprodução.

Os jovens de E. erythrinus testados em aquários experimentais não apresentaram

preferência por machos ou fêmeas de R. micropus, o que indica que indivíduos de ambos os

sexos dessa espécie provavelmente constituem presas potenciais. Porém, machos de R. micropus

cortejaram tanto fêmeas da própria espécie quanto jovens de E. erythrinus, o que dica que podem

ser enganados pela similaridade morfológica entre esses indivíduos. Nesse caso, os machos se

tornariam mais vulneráveis à predação pelos jovens de E. erythrinus, corroborando a hipótese de

Brosset (1997) e expandindo-a para outra espécie de Rivulus. Por outro lado, fêmeas de R.

micropus reagiram agressivamente à presença de jovens de E. erythrinus de tamanho similar ao

seu. Isso indica duas possibilidades de interação: as fêmeas reconhecem o predador e se dispõem

a combatê-lo, talvez expulsando-o da poça; alternativamente, as fêmeas também seriam

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enganadas pela similaridade morfológica (mimetismo), engajando-se em uma interação

agonística e tornando-se vulneráveis ao predador. Nessa condição, o mimetismo agressivo

protagonizado por E. erythrinus seria eficaz tanto em relação aos machos quanto às fêmeas (mas

com base em respostas comportamentais diferentes), o que também expandiria a hipótese de

Brosset (1997).

Desta forma, o conjunto de características ecológicas e comportamentais observadas para

as duas espécies (ocupação compartilhada das poças, proporção entre predador e presa na

natureza, e a restrição da interação comportamental à fase juvenil do predador), indica que o

mimetismo agressivo envolvendo E. erythrinus e R. micropus deve constituir uma estratégia

evolutiva estável, porém, não obrigatória, corroborando a hipótese proposta por Brosset (1997).

Além disso, o presente estudo expande a hipótese de mimetismo agressivo envolvendo as duas

espécies e mostra que as fêmeas também exercem papel importante na evolução deste

mecanismo. Finalmente, é possível sugerir que este tipo de interação mimética pode estar

ocorrendo entre E. Erythrinus e outras espécies de Rivulus que possuem características

morfológicas similares ao mímico agressivo, com similaridade do padrão de coloração geral do

corpo e presença de ocelo caudal, o que resta ser verificado.

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