Boca-livre oficial

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Página publicada dia 09/03/11

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13GAZETA DO POVO Quarta-feira, 9 de março de 2011

Vida PúblicaEditor responsável: Fernando Martins – [email protected]

TribuTo

Ministro da Saúde indica a volta da CPMFPágina 16

Verba de ressarcimenTo

Boca-livre oficialDeputados gastaram

R$ 1,7 milhão da

Assembleia com

alimentação em 2010.

Verba pública pagou

até almoços para

aliados políticos,

prática que pode

caracterizar

improbidade e na qual

o MP já está de olho

Rosana Félix e Sandro Moser

z Os deputados estaduais do Paraná gastaram R$ 1,7 milhão com alimentação em 2010. O montante até seria pouco se fosse usado exclusivamente para refei-ções dos parlamentares e de seus assessores – que, somados, eram cerca de mil pessoas no ano pas-sado. O problema é que, muitas vezes, essas despesas custearam bocas-livres para apoiadores polí-ticos, correligionários, prefeitos, vereadores e até professores. Essa prática, vedada em alguns esta-dos, como em São Paulo, também pode ser interrompida no Paraná. O Ministério Público Estadual (MP) já recebeu solicitações e vai iniciar, em breve, investigações sobre o uso da verba de ressarci-mento dos parlamentares. Segundo especialistas, a utiliza-ção de recursos públicos de forma indiscriminada para refeições pode ser enquadrada como crime de improbidade administrativa.

O MP já recebeu diversas solici-tações para verificar como os deputados gastam os R$ 15 mil mensais que recebem para despe-sas de alimentação, combustíveis, locação de carros e imóveis, passa-gens, material de escritório e de divulgação, e gráficas, entre outros. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, a iniciativa da Promotoria de Proteção do Patrimônio Público deve ter início após a conclusão das investigações sobre a existência de funcionários fantasmas na Assembleia – uma das irregularidades apontadas pela série Diários Secretos, da Gazeta do Povo e da RPC TV.

reuniões políticasGeralmente, os assessores dos deputados usam a verba de res-sarcimento para almoçar no Restaurante Leda – localizado dentro da Assembleia. Apesar de estar com contrato vencido desde 31 de dezembro e de o processo licitatório ter apresentado irregu-laridades, o estabelecimento ain-da funciona normalmente, con-forme mostrou reportagem da Gazeta do último dia 25. Do total gasto pelos deputados com comi-da em 2010, o restaurante ficou com R$ 319,4 mil (18,3%). Outra parte da verba é usada em restau-rantes do interior do estado, nas bases políticas dos deputados.

Mas, além dessas refeições, os deputados usam o dinheiro públi-co para ressarcir despesas de con-fraternizações e reuniões políti-cas em todo o estado. O Restau -ran te Madalosso, por exemplo, famoso pela culinária italiana e pelo seu tamanho, é um dos pre-feridos pelos parlamentares em Curitiba: 38 dos 54 deputados declararam gastos no local no ano passado. Somadas, as despesas totalizaram R$ 63,9 mil. Na Churrascaria Devons, que fica no Centro Cívico, perto da Assembleia, 30 deputados decla

Segundo os parlamentares, o pagamento de refeições para correligionários, prefeitos e vereadores faz parte da rotina. Mas no Direito Público essa tra-dição não é tolerada. “Esses almoços para aliados são despe-sas feitas sem o interesse públi-co”, diz o advogado Carlos Al -berto Mariano, especialista em Direito Político e Eleitoral. “Não há relação com a missão do par-lamentar. As confraternizações até têm uma motivação política, mas não pública. Em tese, confi-guram ato de improbidade

administrativa.” Mariano ressalta que, em

muitos casos, os prefeitos e vere-adores que viajam para a capital recebem diárias para custear ali-mentação. Por isso o deputado estadual não deve arcar com essa conta. O advogado também explica que o correto é haver uma nota para cada refeição. “Não é correto juntar dez refei-ções e pegar uma nota só de R$ 1.000,00. É preciso discriminar os gastos públicos”, diz ele, reprovando uma prática comum dos deputados paranaenses.

modelo paulistaNa Assembleia Legislativa de São Paulo, por exemplo, as regras são mais claras – apesar de o custo com comida também causar grande impacto nos cofres públicos. Os servidores, mesmo os comissionados dos gabinetes, recebem vale-alimen-tação de R$ 20 por dia. Isso gera uma grande despesa no fim do ano. Por outro lado, os deputa-dos pagam apenas as próprias refeições e não patrocinam bocas-livres.

O promotor de Justiça de São

Paulo Saad Mazloum, que atua na Promotoria de Patrimônio Público do MP paulista, não quis comentar o caso dos deputados paranaenses. Mas disse que, se os parlamentares paulistas usassem verba de gabinete para pagar refeições políticas, o caso seria investigado. “Haveria bons ele-mentos para abrir um inquérito. Isso vai contra o princípio de moralidade e é má aplicação dos recursos públicos.”

Colaboraram Guilherme R. Storck e Aurélio

Cardoso, do Jornal de Londrina

conTeúdo exTraAcesse www.gazetadopovo.com.br/vidapu-blica e assista a um vídeo com comentários exclusivos sobre a boca-livre da Assembleia.

Infografia: Gazeta do PovoFonte: Portal da Transparência da Assembléia.

OS “COMILÕES”

Alguns deputados extrapolaram bastante a médiade gastos com comida ao longo de 2010. Veja quemmais gastou com alimentação:

Total gasto pelos parlamentares Total gasto com comida em 2010

Em 2010 R$ 9.551.623,67 R$ 1.737.643,86Em dezembro R$ 1.185.253,17 R$ 176.896,42

Antonio Anibelli (PMDB) R$ 84.540,42Luiz Fernandes Litro (PSDB) R$ 77.530,92Stephanes Jr. (PMDB) R$ 65.358,91Luiz Eduardo Cheida (PMDB) R$ 58.865,77Dobrandino da Silva (PMDB) R$ 58.743,68Marcelo Rangel (PPS) R$ 55.363,91Augustinho Zucchi (PDT) R$ 54.909,33Felipe Lucas (PPS) R$ 52.633,26Waldyr Pugliesi (PMDB) R$ 48.103,53Edson Strapasson (PMDB) R$ 41.878,79Luiz Cláudio Romanelli (PMDB) R$ 41.634,09Luiz Accorsi (PSDB) R$ 40.830,91Gasto médio dos 54 deputados R$ 31.860,94

DESPESAS TOTAIS

A ocasião faz a refeição. Tanto restaurantes simples e pequenos como os grandes receberam almo-ços ou jantares de parlamentares paranaenses em 2010. O deputado estadual Stephanes Jr. (PMDB), por exemplo, gastou boa parte da verba de gabinete no Restaurante Madalosso – com 4.645 lugares, ele é tido como o maior das Américas, e um dos maiores do mundo. Dos R$ 63.969,00 gastos pelos deputa-dos no estabelecimento curitibano, R$ 30,3 mil foram do peemedebista.

Segundo a gerência de eventos do Madalosso, o local é muito procurado pelos deputados, pois os vários salões do restaurante comportam eventos de qualquer tamanho. O rodízio tradicional com massas, risoto e galeto custa em torno de R$ 30 por pessoa.

Por outro lado, Stephanes Jr. também teve gastos altos em res-taurantes de pequeno porte. Ele

apresentou uma única nota de R$ 4 mil no Restaurante Santa Papa, no bairro do Alto da XV, em Curitiba, em outubro. O sistema, de buffet self service, custa R$ 17,50 o quilo. De acordo com funcionários do restaurante ouvidos pela repor-tagem, assessores do deputado almoçavam diariamente no local, inclusive aos sábados.

O ex-deputado Antonio Anibelli (PMDB) também foi assíduo frequentador do Madalosso. Dos R$ 14.853 gastos por ele no res-taurante em 2010, a maior parte se refere a três ocasiões entre outubro e novembro – o valor das notas foram de R$ 1.753, R$ 1.630 e R$ 1.250. Em Londrina, o depu-tado Teruo Kato (PMDB) fez duas despesas elevadas no Restaurante Taka, em dezembro: R$ 2.500,00 e R$ 1.600. O restaurante serve pe tis -cos e também faz pratos mais elabo-rados sob encomenda, como paellas.

z do pequeno ao grande

Parlamentar gastou R$ 30,3 mil num único restaurante em 2010

R$ 63.969 foram gastos pelos deputados estaduais no Restaurante Madalosso em 2010.

R$ 1.770foi o gasto de Reni Pereira (PSB) com um almoço para estudantes da cidade de Roncador. Se a refeição de cada aluno custasse em média R$ 15 (preço de um quilo), a despesa daria para alimentar 118 pessoas.

“Esses almoços para aliados são despesas feitas sem o interesse público. (...) Em tese, configuram improbidade.”carlos alberto mariano, especialista em Direito Político e Eleitoral.

Deputado pagou até refeição para alunosFoz do iguaçuDenise Paro, da sucursal

z O deputado estadual Reni Pereira (PSB) gastou no ano passado R$ 3.178,00 no Restaurante Fortoni, em Foz do Iguaçu. O parlamentar apresentou três notas justificando os gastos, segundo o portal da Assembleia Legislativa. A maior delas foi de R$ 1.770,00, registrada em novembro. Em setembro, foram desembolsados R$ 878,00 e, em junho, R$ 530,00.

Modesto, o restaurante, situado no centro de Foz, tem um buffet

self-service e o quilo da refeição sai por R$ 14,50. O almoço livre por pessoa custa R$ 8,00. Um dos pra-tos a la carte mais caros é a picanha na pedra, que custa R$ 48,50 e ser-ve três pessoas. O espaço é peque-no e, no interior, há mais ou menos 12 mesas de madeira, com quatro cadeiras cada.

O restaurante confirmou que o deputado é um cliente assíduo e costuma frequentar a casa na com-panhia de outras pessoas. Quanto à maior despesa – a de R$ 1.770,00 – a informação fornecida pelo estabelecimento é de que foi o gas-

to de um almoço oferecido pelo deputado a um grupo de alunos e professores da cidade de Roncador, que chegou em um ônibus.

Os convidados comeram pra-tos mais simples (não pediram picanha). Não foi informado o número de pessoas que participou do almoço. Se cada pessoa gastas-se, em média, R$ 15, o valor da no -ta de R$ 1.770,00 corresponderia a 118 re feições.

As demais notas, segundo o estabelecimento, são referentes a refeições feitas por assessores de Reni Pereira no restaurante.

LegisLativo estaduaL

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