Brandão, Junitos. Mitologia Grega Cap 10001

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mito e religião

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composições daarte figuraoa, o que; aliás, é2Gm~in 'aquase todas as mitologiasantigas. Ora, a forma escrjtàdesfigurao-mito de algumas de suas características

. básicas; como, por. éxemplO, de suasvananies; Que se constituem no verdadeiropulmão. da mitolog~. Com isso, o mito se enrijece e se. fixa numa formadefinitiva. De outrolado, 'a forma escrita o diStancia. do momento da narrativa,das circunstânciaS e da JnaIlCir.Jco~ aquel~ se converteria numa ação sagrada.Um mito. escrito está para um mito "em função', como uma fotografia para umapessoa viva. E. 'se é verdade que a .forma escrita é -uma característica dasmitologias antigas,a grega ainda es.tá comi>ro~iidapor outra particularidade,

'. Mitos' existem, fora. do mundo grego.que, mesmo em sua:r!gida fOnna escrita,-conservaram um nítido e indíscutívCl câráteri.eÍigiQ5():sãoaqueles cujo contextotem um cunho ritual.: '., .' . .... ' .

. ÓEnúi1)(j.Eljsbl~ por exemplo, se reduz aúmvastó repertório ritual. Se. dós mitos :egípcios se conhece rêlativamente P9ucO, é por-

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que tudo quanto nos chegou de autêntico provém de textos rituais, come O.;Textos das Pirámides. os Textos dos Sarcôfagos. O Livro dos Mortos .Análoga é a situação dos mais antigos textos rituais da Índia.

: Acontece, no entanto, que a Grécia antiga ~ão nos legou um único mito emcontexto ritual, embora se pudesse, talvez, defender, ao menos como parte de umnto.» que chegou até nós de alguns festejos dionisíacos.

, "A mitólOgi~ grega chegou até nó~ através da poesia, da arte figurativa e daliteratura erudita; ou 'seja, em documentos de cunho 'profano" 2, se bem queprofano aqui. no caso deva ser tomado em sentido muito lato, uma vez quepoesia, .arte figurativa e literatura erudita tiveram por suporte o mito.

É claro que houve, na' GrécÍa. um liame muito forte entre literatura, artefigurativa e religião, mas, ao plasmar o materialmãclégico, os poetas e artistasgregos não obedeciàmtão-somente a critérios religiosos, mas também. e isso éfácil de 'se perceber, a ditames estéticos, Toda obra de arte como todo gêneroartístico e literário' possuem exigências intrínsecas. Entre narrar um mito, que éuma prdxissagrada. em determinadas circunstâncias, para determinadas pessoas.e compor uma obra de arte, mesmo alicerçada no inlto, vai uma distância muitogrande. A famosa lei das três unidades (ação, tempo e lugar), embora deformulação tardia, como teoria poética, está presente na tragédia clássica. Tal leinão .é válida para '0 mito; que. se desloca livremente no' tempo e no espaço,multiplicando-se através de um número indefinido de episódios. Para reduzir ummitologemaa uma obra de arte, digamos, a' uma tragédia. O poeta terá que fazeralterações: por vezes violentas, a 'flllÍ de que-a ação resulte única, se desenvolvanum mesmo lugar e "caiba" num SÓ dia.) Não é em'vãoque, as mais das vezes,atragédia grega se ínicía in medias res. Édipo Rei de Sófocles começa quandotermina o mito! Oflashback fará o milagre de recompor o restante ...

A redução do mito a uma obra de arte traz outra conseqüência com vistas àdocumentação mitológica. O mito, como já se assinalou, vive em variantes: ora,a obra de arte,' de conteúdo mitológico, somente pode apresentar, e é natural,uma dessas variantes ..

2. BRELlCH. Angelo. Gil Erpi Greci. Roma, Edizioni dell'Atenee e Bizzarri, 1978, p. llsqq.J. veia-se BALDRY. H. C.' TbeDramatiration oflhe Tbeban Legend. .. Greece and Reme, s.~. v. J.p.24sqq:

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do egito nos veio apenas textos rituais
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o mito se descloca livremente no tempo e no espaço
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o mito começa a partir do kaos
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Acontece' que, dado o imenso prestígio da 'poesia na Grécia,' ,a variante'apresentada por um grande poeta ímpunha-se à consciência pública, tomando-seum' mito canônico. com esquecimento, ,das demais variantes; talvezartisticamente menos eficazes, mas, nem por 'isso, menos importantes do pontode vista religioso, "

2As alterações sofridas pelos mitos gregos, todavia, não se restringem aos

poetas e artistas, Estes, conquanto 'reduzissem o mito e o recriassem.alterando-o, para que o mesmo pudesse 'atender às novas exigências àrtísticas, dequalquer forma o aceitavam ~ mantinham."':' ,:! " ' '

Bem diferente é a' atirude do pensamênto' racioruJ •. s~bret~dodosPré-Socrátfcos, muitosdosquais tentaramdesmitizar ou dessacralizar o mito em,nome do lágos, da razão. Acertadamente afirma Mircea ElilIde:~Em nenhumaoutra parte vemos, como na Grécia, ó mito .inspirar e guiarn1los6 à poesia épica,a tragédia e a comédia' (e acrescentar/amos o lirismo),. mas' também as artesplásticas; por outro lado, a cultura grega' foi a única a submeter o mito a umalonga e penetrante análise, da' qual ele saiu radicalmente 'desmítízado'. Aascensão do racionalisrno jôníco coincide -com uma critica cada vez maiscorrosiva da mitologia 'clássica', tal qual é e~Pt,essa nas obras 'de Hornero eHesfodo. Se em todas as língues européias ov04ábulo"mito' denota uma 'ficção',é porque os gregos o proclamaram há vinte e cinco séculos"." ", .

A crftica dosfil6sofos jÔnicQs não visava, na realidade,' ao pensamentomítico, à essência do mito, mas aos atos e atitudes dos deuses, tais quais osconcebiam Hornero e Hesíodo. A crftica fundamental era feità "em nome de umaidéia cada vez mais elevada de Deus". Um Deus verdadeiro jamais poderia serconcebido como injusto, vingativo,adúltero' e, ciumento; como enfatizaXenófanes (576-480 a'.C.), de C610fon, na Ásia Menor: "No 'dizer de Homero ede Hesfodo os deuses fazem tudo quanto os homens considerariam vergonhoso:adultério, roubo, trapaças mútuas" (Frgs. BIl, B12). Repele 'a concepção de queos deuses tenham tido, um princlpio e .se assemelhem aos homens: "Mas osmortais acreditam que os

4, EUADE, Mlreea. Mito e Realidade. Tradução de Pola Civelli. São Pautá, Ed. Perspectiva, 1972,p. 130,

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deusesnasceram, qüe~aJnindumentaril\e que, como' eíes, têmumalmguagem.. e um' corpo" (Frg. ·BI4): :O,':antrop<imotflSmo;'Ü1iciado com" Hornéro ,e

aperfeiçoado por Heslodo, é viQleniamente censurado: ·Seos boiS;' os cavalos ~os leões tivessem mãos e pudessem, com suas mãos, pintar, eproduzir.as obrasque o~ homens re:llizilm;o~cavalosp'intariam: fig~m de, deuses semelhantes acavalos, os bois semelhantes a bo ise a .eles atribuiriam OS corpos que elespr6prios têm" (Frg. B 15): , " ,::. ' ,,"

. Para Xen61àries;'a' idéia de De~sealgolnais sÚiO: ,"Há 'um deu~ a~ima de ,"todos os deuses e homens: nem sua .forma mim seu pensamento seassemelbamaos dos mortais" (Frg.B23). ,',' " ,'"

A crítica racionalista' ~eiOiiu~ crescendo, e i> mito recebeu com Demécríto(520-440 a.C) um duro, golpe. Com efeito, o sistema mecanicista do-filésofode •Abdera, na Trácia, reduz tudo a um, entrechoque .de plirtlcúlás mseçáveis,ingênitas, denominadas S,TQ.rHH(áiomoi), de ctool.íoç (átomos, indiY.ls1vel). "Pornecessidade da nàture~~:Os',átomos movem-se no vácuo infiilito 'com movimentoretilíneó de cinia pãrll . baixo' e com desigual velocidade. Dalentrechoquesatômicos e formação deimensos vórtices ou, turbilhões de que se originem osmundos" I, os serea-a alma, os deuses, mas 'tudó,porql)etudoé,matéria,:estásujeito à lei da morte. ". ," , .'. "

Assim,' para Dem6crito,' os deuses Vulgares e à mitologia nasceram dafantasía popular., Os déuses.exístem.: mas' são 'entes superiores ao homem,embora compostos tambérn deátomose, portanto, sujeitos:à leida niOrte:"oeusverdadeiro e natureza imortalnão existem", " ,

, ~oiS outros'sÚi~sentráves para :0: mitôforam:'a' "diCoIOm.iz4çAo;'t"a"pohtização". A 'primeira teve 'p,or 'confeu a um.dos maiores e mais iellgtosospoetas da Hélade, Pliidaro(521-44IIi.q com todaa.justiça cognominado ópríncipe dos POetas eo poeta dos .príncjpes, .o qual; em nome da, moral, começoua filtrar o mito: Para ogigantesco Poeta tebano.identre aS diversas variantes deum mitologema, soméntelima é verdadeira; as demais são coisasque possuemapenas o crédito dós, poetas: "O mundo está repleto de maravilhas e, não raro, as,afirmativas dos mortaisvão. além da verdade; mitos, ornamentados de hábefsficções, nos iludem .. As Graças,» ~ quem os mortais devem-tudo quanto' os~~ ",.. , , ,"

. . J o" '. _.".

5. FRANÇA, Leonel, 'S.i. Noções d« Hlslórlp da Ftlosofia. Rio de ianeilo,l.lvràri •. Asir, E~i,ora,"1952,13' ed.ip. 4o.qq.' , , ' ' . , ..

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tributam-lhes honras e, as mais das' vezes, faZem-nos crer no incrivel!"ó E vaimais longe sua tesoura ética: "O homem não deve atribuir aos deuses a não serbelas ações, Este é o caminho mais seguro",'E quantas vezes.o maior dos Iíricosda Grécia antiga não truncou, não podou e alterou o, mito, para tomá-tocompatível corn suas exigências morais, '

Também Esquilo (525~56 a,C,).o pai da tragédia, depurou.o mito paradele extrair tão-somente a varianresadis; como, já o- demonstramos em livrorecente: "O dever do poeta, diz Ésquilo arespeito do mito de Fedra, é ocultar ovício, .nãcprcpsgé-loe trazê-lo à' cena, Com efeito; se para as crianças oeducador modelo é o professor,' paraosjovensosãoos poetas, Temos o deverimperioso de 'dizer somente coisashonestas". I, ': ' , ' ,

, '

Euripides(480~09), otiágico da solidão, seguiuas pegadas de, Xenófanes;sua concepção religiosa é alta e depurada, coiÍlÓ salientamos na longa Introduçãoque fizernós ao poetae suas idéias na tragédia A lceste. 9 '. ' :

, Outro perigo para a mitologia fçia ','p~litização·,:qu<muitasvezes, usandoe abusando dedesJocament~s do mito,particularmentedo mito.dos heróis, fezque os, mesmos tivessempor.passagem iIlevl,tável, viessem deonde viessem, acidade de Atenas. ,A pe~é:grlJJaçàl>; como se pode ver n;l lmroduçâa que fizemos

, ao mito dosherôs, no terceiro volume; é iJllliI éaracterlstica típica dos heróis, maseleger Atenascon» pon\o obrigatório de' convergêncié dos mesmos, só se pode

, atribuir .a ,intençêli:spol~icaS: O desejo- de defender "à hegemonla política' da:Cidadela' de' Aleriá levou seús poetas' 3 "depurarem". e, à castrarem, com esse:encontro 'marcado, certos mnos de. heróis lociiis,ªcrescenlando-Ihes gestas deheró is de' cidades' viiinhaS, fabricando-ilresgeliealog~ espürlas,atribuindo-Ihesimportantesfatos históricos com total inversão da cronologia. De modo inverso, 'as' glórias 'e' feilos ''dós heróis· das cidádes:inimigasforarn, denegridos eempanados, Não foi com outro intento que desfilaram pelas ruas de AtenasAdmetó da Tessálía, Édipo de Tcbas, Adrastode Sicione.Orestes de Argos, ..

N~ realidade; a c~(tica ~çionalista eniroupetosécuto V s.c. e acabou porfazer-discípuJosilustres, Ao contréno do crédulo •.... '

"6, Ollmpic",2~·3J.7, lbid... 3S, '., ' , ", "" '8, BRANÓÀO, !~nilO d'. SOIIza. T,a/rO Grego" Origem" 'Gvoluçdo. 'Rio d~ Janeiro, TAB·Editono.1980, p,46Jqq, .•. ', ,,' "" ' ":' "" "9. EURp'IPES. ~lcel/~:.Traduçio de Junuo d~ .SOU~ I?randão., Rio ..d~ Jancir:o., Brune BuecmiEditor. t968.-3' <d",,: ,19s9Q,' '

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Heródoto (480-425 a,C.), Tucídides (460-395 a,C,) baniu os deuses de suaHistória da Guerra do Pe/oponeso Nesta, I, 21. o adjetivol!ueciXiEç (mythôdes),que significa "semelhante ao mito", passou a ter a acepção de "fabuloso", naexpressão 'to I!E ~\leci>õeç (ló me mythôdes), o que não é fabuloso, numa claraalusão ao mito, De pouco adiantaram as chicotadas e a "xingologia" do maiordos cômicos universais, Aristófanes (445-388 a.C.}, contra os inovadores, Ossofistas, mercê da atitude intelectual de alguns pensadores precedentes,aproveitando-se das condições políticas e sociais 'do tempo, abalaram, com suateoria ancípite e, demolidora, os nervos da polis .. Prevalecendo-se do caminho jáaplainado pelo ceticismo, entre outras sérias "depurações", procuraram varrer omito da mente de seus jovens discípulos. como tentamos demonstrar em AsNuvens, tO' " '

3.Na realidade, a mitologia deixou o século V a.C, meio coxa, "depurada" e

cambaleante, De saída teve, no século IV a.C, um encontro dramático com oEpicurismo. Epicuro (341-270 a.C), retomando o atomismo materialista deDemócritojprocurava libertar o homem do temor dos deuses e da necessidadeinexoravel da Moita. AÍísJal"se os deuses, distantes e 'desinteressados do homem;são também matéria,' sujeitos, por' conseguinte, à morte, já que formados, comoos' homens, P'/r .'entrechoques atômicos, por que temê-Ios? O além, grandepreocupação do homem grego, não existe. Se tudo é matéria, deuses e alma, obem supremo está DO prazer negativo, na 'ausência de dor para o corpo e deperturbação para a alma. Deus ou os deuses não agem Di: sua Ética nos ficouum fragmento sombrio acerca ,da fragilidade' e impotência divina face aoproblema do mali "Deus, ou quer. impedir os males e não 'pode, ou pode e nãoquer, ou não quer nem pode,' ou quer e pode, Se quer e não pode, é impotente: oque é' impossível em Deus. Se pode e não quer, é invejoso, o que, igualmente, écontrário á Deus .. Sé nem quer nem pode, é invejoso e impotente: portanto nemsequer é Deus: Se pode e quer, o que é a única. coisa compatível com Deus,donde provémentão a existênciadosmales? Por que Deus não os impede?"

Parecia niorta a mitologia" Os .deuses agora não estavam apenasdesmitizados. mas também dessacralizados. Mas eis que, em

tO, AJUSTOFANES ..,u NIfV<1IJ, ln e odu~ao c Tradução deiunito de SOUZA BrancUo, Ricde Janeiro,Grifo, t976, p. 20.qq, '

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pleno século IV a.C, surgiram duas novas modalidades de interpretação do mito,as quais, a seu modo, vão contribuir para "salvar. uma certa mitologia" e, comose há de ver mais adiante, para perpetuá-Ia no "crístíaníssimo'tmuüdo ocidental.Alegorismo .e Evemerismo, eis ai os dois novos monstros sagrados. Trata-se,como argutamente percebeu Mircea Eliade, comentando essas duas últimasnovidades do pensamento grego, não apenas de "uma crftica devastadora aomito", mas de "uma critica a qualquer. inundo uilaginário, empreendida em nomede uma psicologia simplista e de um raciocínio elementar". 11

Já que os mitos não eram mais compreendidos literalmente, buscavam-seneles as 1Í1!6VOtCXIthypônotat; isto é, as suposições, as significações ocultas, ossubentendidos. Foi isto que, a partir do século ip.C, sedenomínou alegoria, quesignifica, etirnologicamente, "dizer outra coisa", ou seja, o desvio do sentidopr6prio para uma acepção translata, ou mais claramente: alegoria é "uma espéciede máscara aplicada pelo autor à idéia que se propõe explicar". Teágenes deRégio, já no século vi a.C, tentara fazer uma exegese da poesia homérica combase na ult6voux (hyp6noia), mas somentenoséculoIv a.C. é que a alegoriadescobriu que os nomes dos deuses representavam sobretudo fenômenosnaturais.

Assim é que o estóico Crisipo reduziu a mitologia a postulados fisicos ouéticos. Homero e Heslodo estão "salvos"; "salva" está a poesia e a arte, quepoderão continuar a beber na fonte inesgotável do mito, embora:alegorizado.

Não foi, todavia, só a alegoria que "salvou'í.a mitologia helênica. Um poucomais tarde, lá pelos fins do século IV a.C. e inícios do '" a.C, o filósofoalexandrino Evêmero publicou uma obra, de que nos restam alguns fragmentos,intitulada 'IEpCX'Avcxypacpt\ (Hlerà Anagraphéí; História 'Sagrada, que, com o.mesmo título, foi traduzida para o latim pelo poeta Quinto Ênio (239-169 a.C.).Trata-se de uma espécie de romance sob forma de viagem filosófica, no qualafirma Evêmero haver descoberto a origem dos deuses. Estes eram antigos reis eheróis divinizados e seus mitos não passavam de reminiscências, por vezesconfusas, de suas façanhas na terra.

O Evemerismo, por conseguinte, nada mais e do que a tentativa de explicaro processo de apoteose de homens ilustres. Embora teoricamente antlpodadoalegorismo, o Evemerismo muito

li. ELJADE, Mire ea. Op. ctt .. p. 135.

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contribuiu também para "saIVar"itmitólogia, injetando-lhe uma. dose de caréter"histórico" e humano. A!fua~ os deuses nãopassavam de transposições,através.da apoteose e de reminiscência, Um tanto. desordenada;'das ~estas dc reis e deheróis primitivos, personagens autenticamente históricas.'. O próPrio Evêmero,aliás, diz ter encontradona Ilha dos Bem-Aventurados um templo dedicado áZeus. Neste templo se conservava unia coluna de. ouro em que o próprio deus,quando ainda vivia como simples mortal; gravara ahistória da humanídadef.Eraa total desmitízação: . . .

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r Após baialhas tão ingentes contra acarênci~dedoeumentos rituais; contraas reduções introduzídas pela própria literatura e arte figurativa, mercê de suasexigências estéticas; contra o lógos desmitízadordos pré-socrâtcos: contra adicotomização. e epolltizdção; contra o sistema mecanicista de Dernécrito edepois de Epicuro; contra a depuração da scenicaPhllosophta .de. Eurípides;contra o mylhôdes de Tucídides; contraalavagem cerebral dos Sofistas; contra oAlegorismo, tão aplicado pelos Estóicos; contra oEvemerismo ... seria omomento de-se perguntar. morreu a /nUa/ogia? A resposta é: ainda não.

Com efeito, ao longo de todas essas refregas, dos fíns do século V11'aosfins do século I a.C, a mitologia, semdesmtttzação e sem dessacralizaçãa, sebem que bastante ferida; manteve-se viva e atuante. A fótnlUla de talsobrevivência é facílmente .explicável. Se a tenacidade e o vigor, com que ospré-socráticos bem cornoalguns outros pensadores e "reforrnadores" combatiamo mno, se tivessem. ímpostovintegraíménteià consciência grega, a tradiçãomitológica teriadesaparecido por completo. Mas talnão aconteceu, porque osataques desfechados contra o mito partiram. sempre da elite pensànte, defilósofos, de poetas e de escritores (com muitas e poderosas exceç{Jes) e se umaparcela dessa mesma elíte pensante .descobriu; sobretudo no 'Oriente, "outrasmitologias" capazes de alimentar-lhe o espírito; a massa í1etrada, tradicionalistapor vocação e indiferente a controvérsias sutls.raalegorismos eaévemerismos,agarra va-sé cada vezmaisà tradiçãoreligiosá.. . .....

De outro lado estava li religião oficial, estatal, que, embora se apresentasse,não raro, como uma liturgia sem fé, tinha interesses óbvios em defender-seusdeuses, outrora destemidos pàladinos da pólis. Mas a grande trincheira damitoldgia foram as relígíões dos .

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Mistérios, em' particular. dos . Mistérios de .Eleusis, dos MistériosGreco-Oneatais.da secular autoridade religiosa doOrâculo de Delfos, do cultodo deus do êxtase e do entusiasmo, Dioniso, de. modo particular nas Antestérias,de que falaremos nosegundo volume •.e das Confrarias Órfíco-Píragõncas." Atudo isso somaram-se as chamadas sotertologias oudoutrinas da salvação,verdadeiras "mitologias da alma:', . propagadas .. pelo neopuagorismo,neoplatonismo, gnosticismo e herménsmo.ta.cujo lado .se expandiram mitologiassolares, astrais.efunerérias.bemcomo arnagia e';t bruxaria,

E se o Crist~riisinolutou tanto p~a'impo~~se e teve primeiro que"fertilizar" tantas arenas 'como sangue de seusmârtirés, a oposição à nova eautênticúxperiência religiosa nlÍo teve origemna religião e mitologias clássicas,de restojá agonizantes.,alegorizadas e evernerizadas, más na oposição' tenaz dasreligiões dos Mistérios, das soteriologiase dos diversos tipos de mitologias ereligiões populares, que nem mesmo os decretos do Imperador Teodósio(346-395 p.C), fechando e destruindo templos.. conseguiram eliminar. A"extinção religiosa" do paganismo se haveria de conseguir por outros meios, semrepressão e sem viol~ric~s.E se o Cristianismo, sem nenhuma conivência, semnenhuma alteração de sua 'doutrina, adotou da mitologia tantos signíficantes etantossimbolcs, Ô fez ad captandam beneuolentiam,isio é, com o fito de atrairos pagãos para a verdadeira fé e para o o escândalo da Cruz. Se, até hoje, muitosestranham e seespantam com "as múltiplas semelhanças" 'do culto cristão com"fatos' mitológicos", isto sé deve não apenas à prudente cristianização designificantes da mitologia grega, oriental e romana, mas sobretudo ao Espírito deDeus, que sopra onde lhe agrada, Sob muitos aspectos o Cristianismosalvou amitologia: dessacraÜzou-a de seu. conteúdo pagão .e ressacralizou-a 00';'elementos ~ristãos; ecumenizando-a. Quando se pensa na:' homologação. porparte do CrisÚanisl,llO, daS tradições'religiosaspopularcs .~.que os fatos se tornammais nítidos, "Ctistianízadcs.rdeusese locais de cultõ~:da Europa inteira, na felizel<pressão<!e.Mircea Eliade, receberam eles não somente nomes comuns, mastambém .reeiicontniram, .de' certa forma,' seus próprjós arquétipos e, porconseguinte, seu pteStlgio universal. Uma fonte da. Gália, sagrada desde lipré-história, por causa' da, presença de. uma figura divina. local ou- regional:.torna-se Santa plif1llodaa cr.istandade, após ser Consagrada à Virgem Maria, Osmatadores dedragõessão assimilados a São-Jorge ou a:11moutro ~erói

cristão; os deuses das tempestades o 'são a Elias.· De regional e provincial, amitologia tornou-se universal. É de modo especial pela criação de uma nova'linguagem mitológica' comum a toda a população rural, que permaneceu presa àterra, e portanto na iminência de se isolar em suas próprias tradições, que o papelcivilizador do Cristianismo se tornou considerável. Cristianizando a antigaherança religiosa européia, ele não apenas a purificou, mas ainda fez ascender auma nova etapa religiosa da humanidade tudo quanto merecia ser 'salvo' entre asvelhas práticas, crenças e esperanças do homem pré~CristãO". IJ .

Talvez não fosse de todo fora de propósito recordar uma verdade que ogrande' Cardeal. Jean Daníélou gostava de repetir, verdade que atesta aperenidade da cultura clássica, de que o mito não é pane menos importante:"Uma coisa é a revelação, outra, as representações sob as quais os escritoressacros no-Ia transmitiram, hauridas, 'em grande parte, nas civilizações antigas". 14

Em. conclusão: foi graças ao alego ris mo e ao evemerismo e sobretudoporque a literatura grega e as .artes plásticas se desenvolveram cimentadas nomito que os deuses e heróis da Hélade sobreviveram ao longo processo dedesrnitização e dessacralização, mesmo após o triunfo' do Cristianismo, .queacabou por absorvê-los, porque já então estavam esvaziados por completo de"valores religiosos viventes".

"CamutJados sob os mais' inesperados disfarces", evemerizadosdespojados de suas formas clássicas, deuses e heróis conseguiram, emboraduras penas, atravessar toda a Idade Média.

Na Renascença, porém, recobertos com sua roupagem. de gala, regressaramtriunfantes, de corpo inteiro, para não mais se esconder.' Salva pelos poetas,artistas, filósofos li pelo Cristianismo, a herança clássica converteu-se emtesourocultural: Camões, Femando Pessoa e Carlos Drununond de Andrade, apenas paracitar o triângulo. maior da poesia em língua portuguesa, estão ai para prová-lo,

Estamos de acordo com Georges Gusdorf: "A consciência mitica, emborareprimida, não está morta. Afirma-se mesmo entre os filósofos e sua persistênciasecreta encoraja-lhes talvez os empreendimentos no que estes têm de melhor.Não, se trata, por conseguinte, de uma simples arqueologia da razão. O interessepelo passado constitui-se aqui na preocupação com o atual".ll

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13. EUADE, Mircee, ImageJ et SymboltJ. Paris, Gallimard, 19S2, p. 230.14. CHAUCHARD, Paul CI AI'i. La S.rvi< apr'J Ia Mort. Paris, Edition. Labergerie, 1968, p~ 24.1S. GYSDORF;George.i. Myrh< erMéIDphysiq.<, Paris, Flammarion Editeur. 19S3, p. 8.

12. Vej.-se. a respeito' dOJMillOiio. Grego. e Oocniai" obra m'pnúmentaJ de Io.eph Holmer.AUlou~.de3t,d,., Pàul.: çap. V: '-Lés· tdyatcrej GrCC3 te I'tdé~ d'u sàJut;. Paris,' Éditions Alnti •• 19S J.p, 75-123 .. ' .. . ... . ,

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CAPÍTULO 11

Mito,' rito e religião

1, É nçcessáriodejxar bem claro, nestatentativa de conceituar ~ mito 16~que omesmo não tem aqui aconotação usualde fábula,ieildal'; invenção, ficção, masa acepção que lhe atrjbuíam e ainda atribuem as sociedades arcaicas, asimpropriamentedenomínadas culturas primitiv!ls, ondemno éo relato de umacontecimento ocorrido no tempo primordial, mediante a intervenção de entessobrenaturaís.iEm outros termos, mito, ccnsoante Mírcea Eliade, é o relato deuma hist6ria verdadeira, ocorrida .nos tempos dos princípio, illanempôre.quando, com a, Interferência' de entes sobrenaturais, urnarealidade passou aexistir, seja uma realidade total; o '

16. Clarcque .• ,pafavra m'llo, tem múltiplos .significedca. ma.s, como diz Roland Barthes, o que selenc&' definir coi •••• ni~palavra>, ,,'17. Mito -so"di.lingu,e.de lend .•• fâbul~ alegoria e parábola. uiulf:l é"uma n~aüva de cunho, as maisda> vezes, .difi"""t e, eompo'1a,p.ra se; lido (provêm 'do latim leiel1d.o. o que deve ser lido) ounarrada em público e que tem-pOr alicerce o histórico, embora deformado., Fábula é.uma pequena"narrativa' de ca,.'t«. puramente i,TQaginano, q~e Visa,a transmitir um, eilliniun'ento teórico ou moral.Parábola. na definiçàode MoniqueAúgr"", em A, Dimensão Simbólica. Petrópoli" Vozes, 1980, p..15, "é um miei> eJaboradQ de maneira intencional", Tem, an1es do mais, !J,~ caráter didático. "OsEvangelhOl evidenciam ~ wÁtcr didático da parábola, que tende a criar um·simbolismo para explicarprincípios. religiosos", éonl~te a mesma autora, ··A/~g~r~a. etimofogicarrient~ dizer-outra coisa. éuma ficçio' que representa um Objeto para dar idéia de .octrc cu, maia-profundàmente.. "um processo'mental que consiste em simboli~ como ser divino, humano ou.animal ~ma ação.ou uma qu~idade~.

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cosmo, .ou tão-Somente um fragmento, umilha, uma espécie animal ou vegetal umMito é, pois, a narrativa de uma criação:algo, que não era, começou a ser,

Em slntese:

história verdadeiraocorrido no tempo.primordial t

inurvenção.de entessobrenaturais

monte, Uma pedra, umacomportamento humano,

conta-nos de 'que modo

"

MITO

nova realtdade: cosrnoantrcpofania(rorol ou parCial)

De outro lado; o mito é sempre uma representação coletiva, transmitidaatravés de várias gerações e que relata uma explicação do mundo, Mito é, porconseguinte, a paro/e, a palavra "revelada"; o dito .: E,' desse modo" se o ,mitopode se exprimir ao nivel da linguagem, "ele é, antes de tudo, uma palavra quecircunscreve e fixa um acontecímento".'! Maurice Leenhardt precisa ainda maiso conceito: "O mito é sentido e vivido antes de ser inieligido e formulado. Mito éa palavra, a imagem, o gesto, que circunscreve o acontecimento no coração dohomem, emotivo como uma criança, antes de fixar-se como narrativa"."

O mito expressa' o mundo e a realidade humana, mas cuja essência éefetivamente uma representação coletiva, que, chegou até nós através 'de váriasgerações, E, na medida em que pretende explicar o mundo, e o homem, isto é, acomplexidade do real, o mito' não pode ser lógico: ao revés, é ilógico eirracional. Abre-se' como uma janela a todos, os ventos; presta-se a todas asinterpretações, Decifrar o, mito é, pois, decifrar-se. E, como afirma RolandBarthes, o mito não pode" conseqüentemente, "ser um objeto, 'um 'conceito ouuma idéia: de é um modo de significação; uma forma",20 Assim, não se há dedefinir o mito "pelo objeto de sua mensagem, mas pelo modo como, a profere",

18, DER LEEUW, ven. L'Homme Primtttf et 'o Religio", Pari" Alcan, 1940,p; \31.19 LEENHARDT, Maurice. Do Komo. Pari',l:'I,R':F,. 1941, p. 247"20, BARTHES. Roland. Myrhologi<l, Paria, S.uil.1970, p.' 130,

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2

É bem verdad~quea, ;ocíedade U;dustrlÍlI usa o mito ~onxi expressãcdefantasia, de,mentitis, ,"4ai mito mania, 'mas não é. este' o ~entido' que

.hodiernamente selhe' atr'ili\Ji, " " , , ", ,

, ' O .mesmo Roland Barthes, 'aliáS, procurou', reduzir, embora.'significativamente, o conceito de, mito, apresentando .•ocotmqualquerforme.substituível de .uma 'verdade, Uma verdade quê escondeoutra v.crdade. Talvezfosse mais .exato defíni-locomo uma verdade profunda-,4e nossa mente. É que,poucos se dão ao trabalhc'de verificaraverdadé que existe DO mito, buscando'apenas li ilusão que o mesmo contém, Muitos vêem: 110 mitiHao~Soriiente os'significantes, 'isto é, a parte concreta do signo: É mister ir além das aparênciase

.buscar-lheossignificados, quer dizer, a: parte 'abstrata; o sentido pro~ndo,'

Talve'z se pudesse .deflnir mito,deniro' do conceito de Cárl Gustav Jung,como' a' conscientizaçâo dos arquétipos do inconsciente coletivo, quer dízer.ium

, elo entre o consciente e o inconsciente coleuvo.berncomo as formasatravés das.quais o inconsciente se manifesta; , , ' " ' " ' '

Compreende-se 'por~flconicienle c~/elivo" a herança das vjvêri~ias das "gerações anteriores, Desse modo" o inconsciente coietivo exprêssaria taidentidade de todos os hornens.iseja qual for aépoca e o' fugar onde tenhamv~~o ' , , ' , '

Arquétipo, dogregó 'ar*héty'pO~. etimologlcamente, ;ignifJCa modelo'primitivo, idéias inatas, Corno conteúdo do, inconsciente coletivo foi empregado.pela primeira vez por .Jung. Nomitç, esses eonteúdos remontam a umatradição,cuja idade é impossível' determínar. Pertencem 'a um inundo do passado,

.pnmitivo, cujaséxigências espirituaissão semelhantes às que se observam entre,culturas primitivasvainda" existentes. Normalrnenté, ou didaticamente, se,

, distinguem dois tipos de imagens: " """ " , '

'a) imagens" (incluídos, os s6nhOs) de" caráter ' pessoal, ' que ,remontam aexperiências pessoais esquecidasoú reprimidas, que podem ser explicadaspela anamnese individual; , , '

b) imagens (incluidoso!sonh~sj. d~ êaráter ,in,ipe;~oa~quenio pOdeinser.incorporados r hisi6ria .índividual; Correspondem ta certos elementos

, coletivos: são hereditárias. ,,'," ,

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o mito representação coletiva
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, ,A palavra textual de Jung 'ilustra melhor o que se expôs: "Os conteúdos do. inconsciente pessoal' são aquisições daexisténcia individual, ao passo que osconteúdos do. inconscientecoletivo sãoarquétiposque existem sempre e aprtori"."

. Embora sé tenha que admitir' a importâ'nciada tradição e da dispersão pormigrações, casos há 'e muito numerosos em que essas: imagens pressupõem umacamada psíquica çoletiv.~: é O. inconsciente cóletivo.zz· Mas, como este não éverbal,qQer dizer, não podendo .'o .inconsciente .~e..manifestar ,de fonna

.conceüuat, verboll,e.le," &.Z através de slmbàlos. At~nte~se para a étunologia desímbo/~,' do' grego symbolon. do vertx)"sym!Jallein, "lançar 'com", arremessar aomesmo tempo, "com-jogar". De inicio, símbolo era um smal di: reconhecimento:um. objeto dividido em duas partes, cujo' ajuste, confronto, permitiam aos

, portadores de' Cada uma das partes ·se. reconhecerem. O símbolo é, pois,' aexpressão de um cillice~1i de equivalência: : ' ' , .

Assim. p~Tii se atingir o mito, que se expressa porsimbolÓs: é preciso fazerumaequivcilên~la; uma "cóe-jugação", Uma. "re-união", porque, se osigno ésempre menor -do que o conceito que representao: símbolo representa, sempremais do que seusigniflcado evidente e imediato." , . .'

Eins~tes~i ~s mitos sã~ a, lingu~g~m ~~giStica . d~s princípios."Traduzem" a-origem de uma instituição: de um: hábito, a lógica de uma gesta, aeconomia de um encontro. .' ,;' '. "

Na expressão de Goethe, osmüossão as relações permanentes da vida:

Se mito i,pois, umarepresentaçao.c~leti~a, transmiÚda através de várias'geraçõe~e que relata uma .explicação dó mundo,:entãooq~.é mitologia?

. ,Se mitalogema é a somados eleinéhtosimii~o's tra"ns~itidos pela tradição e.mitema as, unidades cónstitunvasdesses elementos; mitologia é o "movimento"desse 'material: algodc-es.távci c' mutávelslmuliilOc;amente"sujeito; portanto. atransformações-Do: ponto d~ vistaetimológico, riUtologÍá éo estudo dos mitos,concebkíos como históriaverdadeir3: ' ,'. " , '

. 21. JUNO" CO, Ai~n .-:. EJluao. $óÍir''; Simbolismo do Si:mesmo.TraduçàQ de Dom MaI~us, RamaJhO Rodi •• 0.5:8: POlJÓ~lis"Vou., t982, p, s. " .. :: :',' .' ' .

• 22. Veja.s.; 'para ini!iore. ,'~.,ooímeiilos,"a: obra de ÇO:: lúng. ;':Çh. K"ényi, lntroduelionà I'EJsinc,.dela MythQI~$i•. Paii.;Payo~.I9S3;p: 9Ssqq,' , ' '

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3

'J Quanto à religião, do latim religione. a palavra possivelmente se prende aoverbo religare, ação de ligar. o que parece comprovado pela imagem do grandepoeta latino Tito Lucrécio Caro (De Rerum Natura, I, 932): Religionum animumnodis exsoluere púgo - esforço-me' por libertar o espírito dos nós dassuperstições -' onde o. poeta epicurista joga, como está claro, com as palavrasreligio e nodus, religião ("ligação") e nó, .

Religião pode, assim, ser definida como o conjunto de atitudes e .atos pelosquais o homem se prende; se liga ao divino ou manifesta sua dependência emrelação a seres invisíveis tidos como sobrenaturais. Tornando-se o vocábulo numsentido mais estrito, pode-se dizer que a religião para os antigos é a reatualizaçãoe a ritualização do mito. O rito possui, no dizer de ,Georges Gusdor( "o poder desuscitar ou; ao menos.de reafirmar o mito".2J .' '. ' .

Através di> rito, o homem se, incorpora ao mito, beneficiando-se de todas asforças e energias que jorraram nas origens. A ação ritual realiza no imediato umatranscendência vivida. O rito' toma, nesse caso, "o sentido de uma ação essenciale primordial através da referência .que se estabelece do profano ao sagrado"."Em resumo: o rito é a práxis do mito. É o mito em ação. O mito reme mora, o ritocomemora.

Rernemorançlo os mitos, reatualizando-os, renovando-os por meio de certosrituais, o homem toma-se apto a repetir o 'que os deuses e os heróis fizeram "nasorigens", porque conhecer os mitos é aprender o segredo da origem das coisas."E o rito pelo qual se exprime (o mito) reatualizaaquilo que é rjtualizado:re-criação, queda, redenção"." E conhecer a origem das coisas - deum objeto,de um nome, de um animal ou planta - "equivale a adquirir sobre as mesmasum poder mágico, graças -ao qual-é possível dominá-Ias, multiplicá-Ias 'oureproduzi-Ias à vontáde',26 Esse retomo às origens, Por meiodorito, é de sumaimportància, porque "voltar às origens é readquírir as forças que jorraram nessasmesmas origens". Não' é .em vão. que na Idade, Média muitos cronistas'começavam suas histórias coro li origem do mundo,' A finalidade era recuperar otempo forte,' o tempo primOrd iale as bênçãos que jorraram il/o tempôre.

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23, OU.SDORF, O.or8", Op. cit... p. 24.24. GUSDORf, Georgea. Op;.ell" p. 25. .' ..25, I.AOENEST,1.P. BanvcJ de. ElemenllU de Sociologia.da Religião. Petrópolis, Vezes, 1976p. 25.26. ELIADE, Mire ea. Miloe Realidade. Tráduçio de'Pcla <:ivell'. São Pa410, Ed, Perspectiva, 1972.p 19.

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Page 10: Brandão, Junitos. Mitologia Grega Cap 10001

Além do mais, o rito, reiterando o mito, aponta o caminho, oferece' ummodelo exemplar, colocando o homem na contemporaneidade do sagrado, É oque nos diz, com sua autoridade, Mircea Eliade: "Um objeto ou um ato não setornam reais, a não ser na medida em que repetem um arquétipo. Assim arealidade se adquire exclusivamente pela' repetição ou participação; tudo que nãopossui um modelo exemplar é vazio de sentido, isto é, carece de realidade",27 ,

O rito, que é o aspecto litúrgico do mito, transforma a palavra em verbo,sem o que' ela é apenas lenda .. "legenda", o que deve ser lido e hão maispro fer ido, .

No .entanto, também. é possível Ver no sagrado um modo de serindependente do observador, Na medida' em que o sobrenatural allóra através donatural, não é mais osentimentnque cria o caráter sagredo..« slmccarátersagrado, preexistente,que provoca o sentimento, Deste ponto de vista, não hásolução de continuidade entre a manifestação da divindade através de uma pedra,de uma árvore, de um animal ou de uni homem consagrados-Nesse' caso, riem apedra, nem a árvore.nem o animal.nem o homem são sagrados e sim aquilo' querevelam: a hierofania faz que o objeto se torne outra coisa; emborbpermaneça omesmo ( ...), Um objeto ou uma pessoa ' não são 'apenas' aquilo que se vê; sãosempre 'sacramento,'; sinal sensível de outra coisa; e, por isso mesmo, permitem oacesso ao sagrado e,acornunhãocom ~le",21 ".

Nada mais apropriado para encerrareste capíttllo que as palavras deBronislav Malinowski, o grande .esnidíoso .dos cósrumesfndígenas das IlhasTrobriand, na Melailésia, Procura mostrar o etnólogo que "a consciência mftica",

, embora rejeitada no mundo moderno, àiJida. está, viva e atuante nàscivilizações .denominadas primitivas: "O' mito, quando estudado. ao vivo, imo é umaexplicação destinada a satisfazera lima curiosidade científica; mas uma narrativaque faz reviveruma realidade prlmeva, que satisfaz a profundas necessidadesreligiosas, aspirações 'morais,. li pressões e a' imperativos de ordem social emesmo a exigências práticas. NaS Civilizações primitivas, o mito desempenhauma função indispensável: ele exprime, .exalta e codifica a crença; salvaguarda eimpõe os prlncípios morais; garante a eficácia do. ritual e oferece regras práticaspara a orientação do .homem, O mitoé um ingrediente vital da civilizaçãohumana; longede ser uma fabulaçâovâ, ele.é.ao contrário, uma realidade viva, liqual se recorre incessantemente; não e, absolutamente, uma teoria abstrata ouuma fantasia artística, mas urna verdadeira codíficação da religião primitiva e dasabedoria prâtica".29 ", ,", ' " .' , "

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À idéia de reiteração prende-se a idéia de tempo, O mundo transcendentedos deuses e heróis é religiosamente acessível e reatualizável, exatamente porqueo-homem das culturas primitivas não aceita a irreversibilidade do tempo: o ritoabole o tempo profano e recupera o tempo sagrado do mito. É que,enquanto otempo profano, cronológico, é linear e.por isso mesmo, irreversível(pode-se"comemorar" uma data histórica, mas não fazê-Ia voltar no tempo),o tempomítico, ritualizado, écircularvoltando sempre sobre si mesmo, É precisamenteessa reversibilidade que liberta o homem do peso di> tempo morto, dando-lhe asegurança de que ele é capaz di: abolír! o passado, de recomeçar sua vida erecriar seu mundo, O profano é o tempo da' vida; o sagrado, o "tempo" daeternidade,

1.8. Barruel de Lagenest tem uma página luminosa acerca da dicotomia doprofano e do sagrado. Para o-teólogo em pauta; o profano e o sagrado podem serenfocados subjetiva e objetivamente: "Se considerarmos a experiência sensívelcomo o elemento mais importante da atitude religiosa, a percepção do sagrado(.. .) será valordetertninante da vida profunda de um indivíduo ou de um grupo,Diante da divindade a criátura só se pode sentir fraca, incapaz, totalmentedependente,

Esse sentimento se transforma em instrumento de compreensão, pois tornaaquele que o vive capaz de descobrir" como que por intuição, o eterno notransitório, o infinito no fmito,' o absoluto através do relativo, O sagrado é,assim, o sentimento religioso que aflora. I,

28, LAGENEST, i,P, Barrue! de. Op, cli;p, 17'q,29. MALINOWSKI, Bronislev ..Citado por Mircea Eliade, Op. ctt., p,23,27, EUADE, Mire ee, Citado por Georges Gcsdof Op. cit. p, 26,

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