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17° CONGRESSO BRASILEIRO DE APICULTURA E 3° DE MELlPONICULTURA SIMPÓSIO: CONHECIMENTO TRADICIONAL E MELlPONICUL TURA Uso Tradicional dos Produtos das Abelhas Indígenas Sem Ferrão (Apidae: Meliponini) no Estado do Pará, Amazonas e Amapá. Gíorgío C. Venturieri Pesquisador Embrapa Amazônia Oriental [email protected] Introdução Antes da introdução da abelha Apis mettitere. as populações indigenas da América do Sul conheciam e utilizavam os produtos das abelhas sem ferrão. O mel. naturalmente rico em açúcares, é um alimento altamente enerçeuco e muito aqradável ao paladar: o saburá (nome dado ao pólen processado pelas abelhas) é rico em proteina e utilizado na fermentação de bebidas; o cerume (mistura de cera com resina) e a cera são utilizados para encerar fios de algodão aumentando a sua durabilidade. dar acabamento em pontas de flechas e lanças, na fabricação de adornos cerimoniais, na calafetagem de canoas e na fabricação de diversos outros artefatos. Embora exista uma extensa utilização destes produtos na cultura indígena sul-americana, são raros os relatos de uma meliponicultura mais elaborada, que utilize caixas especialmente desenhadas para esta atividade Material e Métodos São relatados casos de uso de abelhas indígenas sem ferrão nos Estados do Para, Amazonas e Arnapá. Os casos aqui expostos resultam de diversas viagens realizadas a comunidades de agricultores tradicionais do interior da Amazônia, Flecheira em Tracuateua, (PA), Cocal do Tauá em Santo Antônio do Tauá (PA), Hurnaitá (AM) e Aldeia Kumenê no Oiapoc (AP). Estas viagens foram realizadas entre os anos de 2000 a 2007 São descritas as espécies o uso de seus produtos e forma de criação. Resultados e Discussão Infelizmente ainda é muito comum a exploração de ninhos naturais, onde arvores são derrubadas para a retirada do mel pelos chamados meleiros. Nestes casos o mel é o único produto explorado, é de baixa qualidade, contaminado por restos de detritos do ninho. serragem, areia, pólen e suor. Na região nordeste do Para, em regiões de manguezais, coletores de mel mais experientes costumam procurar por ninhos de abelhas uruçu-cinzenta (Melipona tescícutetes durante a noite, de forma semelhante ao que os indios Kaiapós realizam (Carnarqo e raSey.

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17° CONGRESSOBRASILEIRODE APICULTURAE 3° DE MELlPONICULTURA

SIMPÓSIO: CONHECIMENTO TRADICIONAL E MELlPONICUL TURA

Uso Tradicional dos Produtos das Abelhas Indígenas Sem Ferrão (Apidae:Meliponini) no Estado do Pará, Amazonas e Amapá.

Gíorgío C. VenturieriPesquisador

Embrapa Amazônia [email protected]

Introdução

Antes da introdução da abelha Apis mettitere. as populações indigenas da Américado Sul conheciam e utilizavam os produtos das abelhas sem ferrão. O mel. naturalmente ricoem açúcares, é um alimento altamente enerçeuco e muito aqradável ao paladar: o saburá(nome dado ao pólen processado pelas abelhas) é rico em proteina e utilizado nafermentação de bebidas; o cerume (mistura de cera com resina) e a cera são utilizados paraencerar fios de algodão aumentando a sua durabilidade. dar acabamento em pontas deflechas e lanças, na fabricação de adornos cerimoniais, na calafetagem de canoas e nafabricação de diversos outros artefatos. Embora exista uma extensa utilização destesprodutos na cultura indígena sul-americana, são raros os relatos de uma meliponiculturamais elaborada, que utilize caixas especialmente desenhadas para esta atividade

Material e Métodos

São relatados casos de uso de abelhas indígenas sem ferrão nos Estados do Para,Amazonas e Arnapá. Os casos aqui expostos resultam de diversas viagens realizadas acomunidades de agricultores tradicionais do interior da Amazônia, Flecheira em Tracuateua,(PA), Cocal do Tauá em Santo Antônio do Tauá (PA), Hurnaitá (AM) e Aldeia Kumenê noOiapoc (AP). Estas viagens foram realizadas entre os anos de 2000 a 2007 São descritas asespécies o uso de seus produtos e forma de criação.

Resultados e Discussão

Infelizmente ainda é muito comum a exploração de ninhos naturais, onde arvoressão derrubadas para a retirada do mel pelos chamados meleiros. Nestes casos o mel é oúnico produto explorado, é de baixa qualidade, contaminado por restos de detritos do ninho.serragem, areia, pólen e suor.

Na região nordeste do Para, em regiões de manguezais, coletores de mel maisexperientes costumam procurar por ninhos de abelhas uruçu-cinzenta (Melipona tescícutetesdurante a noite, de forma semelhante ao que os indios Kaiapós realizam (Carnarqo e raSey.

1990). Este tipo de exploração acontece especialmente entre os meses de setembro edezembro, quando existe grande quantidade de mel armazenado. Muitos ninhos localizam-seem árvores de siriubeira (Avicennia germinans - Verbenaceae). Nestes casos o mel pode serexplorado ou apenas coletado o ninho. No caso da coleta do ninho o tronco é cortado etransferido com a colônia em seu interior para próximo de habitaçôes. Os troncos sãoposicionados na horizontal e incisões são realizadas para a continua exploração (Fig 1a)Alguns criadores costumam fabricar caixas de marupá (Simarouba amara - Simaroubaceae).madeira leve e resistente a cupins. Estas caixas são simples, sem divrsôes internas e com alargura dependendo da tábua disponível (Venturieri et ai. 2004). Nos murucipios deTracuateua e Bragança muitos realizam divisão dos seus enxames e protegem as abelhascontra inimigos naturais vedando a caixa com argila umedecida. Esta prática protege dosprincipais inimigos naturais da região, formigas tracuás (Camponotus abdominalis -Formicidae), dípteros forídeos (Pseudohypocera kerteszi e Megaselia scalari - Phoridae) eabelhas pilhadoras dos gênero Trigona e Parlamona.

No municipio de Santo Antônio do Tauá foram observadas pessoas praticandométodos chamados de semidomésticos, onde ninhos, depois de explorados. são deixadosparcialmente no interior da árvore, para que a colônia se restabeleça e possa ser exploradaem anos subseqüentes. Para isso, uma espécie de tampa é aberta com o uso de machadoou motoserra, após a retirada do mel e outras partes do ninho, a tampa é recolocada, vedadacom argila e amarrada com cipós ou fibras vegetais retiradas de cascas de determinadasárvores conhecidas como enviras. Método semelhante foi descrito por (Coletto-Silva, 2005).

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Figura 1. Métodos de criação tradicional. a. "cortiço" no município de Tracuateua. Pará, b Caixarústica em casa de palafita em Humaitá, Amazonas.

Na Aldeia Kumenê, PIN Palikur, Terra Indígena Uaçá, Murucipio do Oiapoque-Af'. osíndios costumam alimentar-se do mel, pólen e crias das abelhas: o cerume é utilizado noacabamento de pontas de flechas e arpôes utilizados na pesca e caça de Jacarés Corno osindios Palikur vivem em pequenas ilhas espalhadas sobre extensa área alagada, com opassar dos anos a sucessiva exploração dos ninhos provocou a diminuição das populaçõesnaturais de meliponíneos. Nos últimos anos, com o apoio da Embrapa e da TNC. deu-seinicio um programa de incentivo a criação destas abelhas, restabelecendo a disponibilidadedos recursos utilizados pela cultura Palikur e as populações de abelhas indlqenas semferrão.

Em toda a Amazônia o método tradicional mais encontrado é o de criação em caixasretangulares, que são penduradas em beirais de residências e outras edificações rurais (Fig1b). Destas caixas os potes de alimento são retirados manualmente. Atualmente o principalproduto da meliponicultura tradicional é o mel, que é comercializado Informalmente devido afalta de regulamentação e a baixa qualidade do produto, muitas vezes fermentado e creio deimpurezas.

Nos últimos oito anos, houve uma grande expansão da meliponicultura em váriosmunicípios da Amazônia, que foi ocasionada pela divulgação de métodos de Criação racional,que utiliza caixas verticais moduladas que facilitam a colheita higiênica dos produtos dacolméia e a multiplicação dos enxames (ASSIS,2001: Oliveira, Kerr, 2000, CARVALHO-ZILS[et al., 2005; VENTURIERI, 2004). Esta metodologia foi divulgada através do treinamentoextensivo a criadores, técnicos e estudantes, resultando em grande adoção por parte doscriadores da Amazônia.

Bibliografia

ASSIS, M, da G, P. de A, Criação prática e racional de abelhas sem ferrão Manaus-AMINPA, 2001, 46p,

CAMARGO, J, M, F,; POSEY, D, A, O Conhecimento dos Kayapó Sobre As Abelhas SociaisSem Ferrão (Meliponinae, Apidae, Hymenoptera): Notas Adicionais, Boletim do MuseuParaense Emilio Goeldi. Zoologia, v, 6, n. 1, p. 17-42, 1990,

CARVALHO-ZILSE, G, A,; NUNES-SILVA, C G,; ZILSE, N.; VILAS-BOAS, H,; COLLETO-DA-SILVA; LARAY, J. P ; FREIRE, D, da C, B,; KERR, W. E, Criação de abelhas semferrão. Manaus: Edições IBAMA, 2005. v, 1.27 p.

COLETTO-SILVA, A Captura de Enxames de Abelhas Sem Ferrão (Hymenoptera, Apidae,Meliponinae) sem Destruição de Árvores, Acta Amazonica. Manaus-AM, v, 35, n. 3. p 385-390,2005,

OLIVEIRA, F,; KERR, W E, Divisão de uma colônia de jupará (Melipona compres siposmanaosensis) usando-se uma colméia e o método Fernando Oliveira Manaus AMINPA, 2000,10 p.VENTURIERI, G, C, Criação de abelhas indígenas sem ferrão. 1, ed. Selem EmbrapaAmazônia Oriental, 2004, 36 p.

VENTURIERI, G. C.; RAIOL, V F, O,; PEREIRA, C A, S, Avaliação da introdução da criaçãoracional de Melipona fasciculata (Apidae: Meliponina), entre os agricultores familiares ueBragança, PA, Brasil. Biota Neotropica, São Paulo, v, 3, n. 2, p. 1-7,2003,