Breve introdução ao conceito a partir da Psicanálise Prof ... · histeria coloca ao método...

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Histeria Histeria Breve introdução ao conceito a partir da Breve introdução ao conceito a partir da Psicanálise Psicanálise Prof. Dr. Fábio Belo Prof. Dr. Fábio Belo [email protected]

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HisteriaHisteriaBreve introdução ao conceito a partir da Breve introdução ao conceito a partir da

PsicanálisePsicanálise

Prof. Dr. Fábio BeloProf. Dr. Fábio Belo

[email protected]

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O útero dos gregosO útero dos gregos

No sexo feminino, o que se chama matriz ou No sexo feminino, o que se chama matriz ou útero é nelas como um ser vivo possuído pelo útero é nelas como um ser vivo possuído pelo desejo de produzir filhos. Quando por longo desejo de produzir filhos. Quando por longo tempo e apesar da época favorável, a matriz tempo e apesar da época favorável, a matriz

permaneceu estéril, ela se irrita perigosamente; permaneceu estéril, ela se irrita perigosamente; agita-se em todos os sentidos dentro do corpo, agita-se em todos os sentidos dentro do corpo,

obstrui as passagens do ar, impede a respiração, obstrui as passagens do ar, impede a respiração, leva assim o corpo às piores angústias e ocasiona leva assim o corpo às piores angústias e ocasiona

enfermidades de todos tipo.enfermidades de todos tipo. Platão. Platão. TimeuTimeu, 91c. Apud. Ramos, 2008, 20., 91c. Apud. Ramos, 2008, 20.

HysteraHystera = útero. = útero.

Hipócrates

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A Idade MédiaA Idade Média Historiadores também Historiadores também articulam as feiticeiras e articulam as feiticeiras e

os sintomas da os sintomas da possessão à histeria.possessão à histeria.

““Não deixarás viva a Não deixarás viva a maga” (Êxodo, 22, 18).maga” (Êxodo, 22, 18).

Malleus MaleficarumMalleus Maleficarum – – referência na luta contra referência na luta contra

a feitiçaria na Europa a feitiçaria na Europa dos séculos XV a XVIII.dos séculos XV a XVIII.

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Charcot e a histéricaCharcot e a histérica

Une leçon clinique à la Salpêtrière (1887) Pierre-André Brouillet

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História em ParisHistória em Paris No fim do século XIX, o problema que a No fim do século XIX, o problema que a histeria coloca ao método anátomo-clínico histeria coloca ao método anátomo-clínico

era importante. era importante. Charcot e Babinski se destacam.Charcot e Babinski se destacam.

Charcot estuda a histeria através dos métodos Charcot estuda a histeria através dos métodos ordinários da observação médica, dando à ordinários da observação médica, dando à

histeria a dignidade de uma doença como as histeria a dignidade de uma doença como as outras.outras.

Babinski aponta para a ausência de qualquer Babinski aponta para a ausência de qualquer lesão orgânica e funda o termo pitiatismo (o que lesão orgânica e funda o termo pitiatismo (o que

se pode curar pela sugestão).se pode curar pela sugestão).

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Pierre JanetPierre Janet De Charcot, pode-se dizer, duas correntes aparecem, bem De Charcot, pode-se dizer, duas correntes aparecem, bem

distintas: Janet e Freud.distintas: Janet e Freud. Pierre Janet: sua tese Pierre Janet: sua tese O estado mental das histéricasO estado mental das histéricas foi foi

defendida numa banca composta por Charcot e Richet. Ele defendida numa banca composta por Charcot e Richet. Ele defendia o exame face a face do paciente, mas ficava na defendia o exame face a face do paciente, mas ficava na

investigação consciente. Considerava a histeria uma doença investigação consciente. Considerava a histeria uma doença puramente psicológica, mas não recebia nenhuma etiologia puramente psicológica, mas não recebia nenhuma etiologia sexual. A histérica tinha uma fraqueza inata da capacidade sexual. A histérica tinha uma fraqueza inata da capacidade

de síntese psíquica e um estreitamento no campo da de síntese psíquica e um estreitamento no campo da consciência.consciência.

Contra essa concepção, Freud se une a Breuer. Ele usa Contra essa concepção, Freud se une a Breuer. Ele usa conceitos como estados hipnoides... Mas depois faz sua conceitos como estados hipnoides... Mas depois faz sua

própria teoria com as noções de fantasia, defesa, própria teoria com as noções de fantasia, defesa, inconsciente e sexual, principalmente.inconsciente e sexual, principalmente.

Detrator da Psicanálise por bastante tempo... Detrator da Psicanálise por bastante tempo...

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O médico artistaO médico artista Charcot utilizava a hipnose não para curar ou tratar Charcot utilizava a hipnose não para curar ou tratar

de seus doentes, mas para demonstrar a solidez de de seus doentes, mas para demonstrar a solidez de fundamento de suas hióteses. Fabricava e suprimia fundamento de suas hióteses. Fabricava e suprimia sintomas histéricos a fim de demonstrar o caráter sintomas histéricos a fim de demonstrar o caráter

neurótico da doença.neurótico da doença. A tese de Didi-Huberman (1982) é que a histeria foi A tese de Didi-Huberman (1982) é que a histeria foi

produzida por Charcot no Hospital Salpêtrière. Ele produzida por Charcot no Hospital Salpêtrière. Ele descrevia Salpêtrière como um “museu patológico descrevia Salpêtrière como um “museu patológico

vivo”, cujos recursos eram consideráveis... vivo”, cujos recursos eram consideráveis... Desconsiderando a transferência, Charcot julgava Desconsiderando a transferência, Charcot julgava estar fotografando a “histeria como ela é”. Ele não estar fotografando a “histeria como ela é”. Ele não supunha que a catatonia da histérica bem podia ser supunha que a catatonia da histérica bem podia ser

uma pose...uma pose...

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Augustine em seu “estado normal”. O braço direito, na crise, sofria uma paralisia da sensibilidade...

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Fotografias de Augustine.

Como produzir uma histérica? Fazendo dela uma artista!

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Produzir a HisteriaProduzir a Histeria

Catalepsia provocado pelo barulho do diapasão e sonolência com contratura artificial.

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Charcot e a criseCharcot e a crise

Há uma crise bem descrita por Charcot:Há uma crise bem descrita por Charcot: Pródromo (aura histérica): dores ovarianas, Pródromo (aura histérica): dores ovarianas,

paplpitações, bolo histérico, distúrbios visuais.paplpitações, bolo histérico, distúrbios visuais. Período epileptóide: fase tônica.Período epileptóide: fase tônica. Período de contorções (clownismo).Período de contorções (clownismo). Período de transe ou de atitudes passionais, Período de transe ou de atitudes passionais,

encontram-se em pleno sonho.encontram-se em pleno sonho. Período terminal ou verbal.Período terminal ou verbal.

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SexualSexual Entre 1888 e 1893, Freud forja um novo conceito de Entre 1888 e 1893, Freud forja um novo conceito de

histeria. Retoma de Charcot a ideia da origem histeria. Retoma de Charcot a ideia da origem traumática. Todavia, pela teoria da sedução, afirmou traumática. Todavia, pela teoria da sedução, afirmou que o trauma tinha causas sexuais, sublinhando que que o trauma tinha causas sexuais, sublinhando que a histeria era fruto de um abuso sexual realmente a histeria era fruto de um abuso sexual realmente

vivido pelo sujeito na infância.vivido pelo sujeito na infância. Charcot: Charcot: Nesses casos, é sempre a coisa genital, sempre...Nesses casos, é sempre a coisa genital, sempre...

Bernheim: Bernheim: segredos de alcova...segredos de alcova... Chrobak (ginecologista vienense): Chrobak (ginecologista vienense): penis normalis, dosim penis normalis, dosim

repetatur.repetatur. Cf. Trillat, 1991: 238-9Cf. Trillat, 1991: 238-9

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Freud, 1891 Breuer, 1897

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Estudos sobre Histeria (1893-1895)Estudos sobre Histeria (1893-1895) Origem traumática: Os histéricos sofrem principalmente de Origem traumática: Os histéricos sofrem principalmente de

reminiscências. (ESB, II, 43).reminiscências. (ESB, II, 43). Método clínico: ab-reação / catarse. / Hipnose ainda Método clínico: ab-reação / catarse. / Hipnose ainda

presente.presente. Casos:Casos:

Anna O. (Breuer), Emmy von N., Miss Lucy, Katharina, Elisabeth von Anna O. (Breuer), Emmy von N., Miss Lucy, Katharina, Elisabeth von R. R.

O “não saber” do paciente histérico seria, de fato, um “não O “não saber” do paciente histérico seria, de fato, um “não querer saber” – um não querer que poderia, em maior ou querer saber” – um não querer que poderia, em maior ou menor medida, ser consciente. A tarefa do terapeuta, menor medida, ser consciente. A tarefa do terapeuta, portanto, está em superar, através de seu trabalho psíquico, portanto, está em superar, através de seu trabalho psíquico, essa resistência à associação. (ESB, II, 284).essa resistência à associação. (ESB, II, 284).

Aqui já se desmantelou o dispositivo da hereditariedade-Aqui já se desmantelou o dispositivo da hereditariedade-degeneração. Ênfase conferida ao erotismo do sujeito nas degeneração. Ênfase conferida ao erotismo do sujeito nas suas diferentes formas sintomáticas de ser.suas diferentes formas sintomáticas de ser.

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Carta 69Carta 69

Depois dessa primeira teoria com Breuer, Depois dessa primeira teoria com Breuer, Freud abandona sua Freud abandona sua neuroticaneurotica. [cf. Carta . [cf. Carta

69, de 21 de setembro de 1897, para 69, de 21 de setembro de 1897, para Fliess].Fliess].

Privilégio da fantasia e da realidade psíquica.Privilégio da fantasia e da realidade psíquica. Cf. Caso Dora. [1901/1905] (ESB, VII).Cf. Caso Dora. [1901/1905] (ESB, VII).

Aparece com clareza, no tratamento, o Aparece com clareza, no tratamento, o conceito de conceito de transferênciatransferência. (ESB, VII, 110).. (ESB, VII, 110).

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TiposTipos Classe de neuroses que apresentam quadros clínicos muito Classe de neuroses que apresentam quadros clínicos muito

variados. Há duas formas sintomáticas mais bem variados. Há duas formas sintomáticas mais bem identificadas:identificadas:

Histeria de Conversão;Histeria de Conversão; Histeria de Angústia.Histeria de Angústia. Outros tipos:Outros tipos:

Histeria de retenção – os afetos não puderam ser ab-reagidos.Histeria de retenção – os afetos não puderam ser ab-reagidos. Histeria de defesa – contra a histeria “hipnoide” e a de retenção, essa Histeria de defesa – contra a histeria “hipnoide” e a de retenção, essa

forma decorre da defesa contra representações suscetíveis de forma decorre da defesa contra representações suscetíveis de provocarem afetos desagradáveis.provocarem afetos desagradáveis.

Histeria hipnoide – o sujeito não integra as representações que Histeria hipnoide – o sujeito não integra as representações que surgem durante o estado hipnoide.surgem durante o estado hipnoide.

Importante: a defesa vai ganhando cada vez mais importância e Importante: a defesa vai ganhando cada vez mais importância e deixando de lado essas outras nomeações.deixando de lado essas outras nomeações.

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Histeria de angústiaHisteria de angústia A angústia é fixada de modo mais ou A angústia é fixada de modo mais ou menos estável neste ou naquele objeto menos estável neste ou naquele objeto

exterior (fobias).exterior (fobias). Na histeria de angústia, a libido que o Na histeria de angústia, a libido que o recalque desligou do material patogênico recalque desligou do material patogênico

não é não é convertidaconvertida, mas libertada sob a , mas libertada sob a forma de angústia.forma de angústia.

O deslocamento para um objeto fóbico é O deslocamento para um objeto fóbico é secundário ao aparecimento da angústia livre.secundário ao aparecimento da angústia livre.

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Histeria de conversãoHisteria de conversão O conflito psíquico simboliza-se nos sintomas O conflito psíquico simboliza-se nos sintomas

corporais mais diversos, paroxísticos (ex.: corporais mais diversos, paroxísticos (ex.: crise emocional com teatralidade) ou mais crise emocional com teatralidade) ou mais

duradouros (ex.: anestesias, paralisias, duradouros (ex.: anestesias, paralisias, “bola” faríngica etc.)“bola” faríngica etc.)

Conversão Conversão do afeto para o corpo. do afeto para o corpo. Qual corpo? Num corpo simbólico: a histérica se Qual corpo? Num corpo simbólico: a histérica se

comporta como se a anatomia não existisse. Os comporta como se a anatomia não existisse. Os materiais com os quais constroi esse corpo são materiais com os quais constroi esse corpo são

retirados da concepção popular que dele se tem.retirados da concepção popular que dele se tem.

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Caráter histéricoCaráter histérico Sugestionabilidade – influenciável e inconstante.Sugestionabilidade – influenciável e inconstante. Mitomania – falsifica sua relação com o outro.Mitomania – falsifica sua relação com o outro.

Distúrbios sexuais – pares de opostos Distúrbios sexuais – pares de opostos frigidez/insatisfação.frigidez/insatisfação.

Inconsistência da pessoa – falso personagem que Inconsistência da pessoa – falso personagem que vivem uma falsa existência.vivem uma falsa existência.

Desejo de substituir o princípio da realidade pelo Desejo de substituir o princípio da realidade pelo princípio do prazer e da fantasia. Como se fosse princípio do prazer e da fantasia. Como se fosse

uma criança.uma criança.

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Sonho do salmão defumadoSonho do salmão defumado Uma mulher sonha que só tem em casa um pequeno salmão Uma mulher sonha que só tem em casa um pequeno salmão

defumado. E desiste da ceia que deseja oferecer.defumado. E desiste da ceia que deseja oferecer. Ela desejava caviar, mas pedira ao marido para Ela desejava caviar, mas pedira ao marido para não não lhe dar. lhe dar.

[O que aconteceria se ela permitisse que seu homem lhe [O que aconteceria se ela permitisse que seu homem lhe desse o que lhe falta? (Mayer, 1989: 40)]desse o que lhe falta? (Mayer, 1989: 40)]

No dia anterior, conversava com uma amiga que elogiou No dia anterior, conversava com uma amiga que elogiou seus jantares. Essa amiga era muito ossuda... E seu marido seus jantares. Essa amiga era muito ossuda... E seu marido

gostava das cheinhas. Detalhe: o marido, açougueiro, gostava das cheinhas. Detalhe: o marido, açougueiro, elogiava essa amiga ossuda...elogiava essa amiga ossuda...

Salmão defumado, claro, é o prato predileto de sua amiga.Salmão defumado, claro, é o prato predileto de sua amiga. Ela cria um desejo insatisfeito. Que é então o objeto do Ela cria um desejo insatisfeito. Que é então o objeto do desejo? O desejo de um desejo, desejo que incide sobre a desejo? O desejo de um desejo, desejo que incide sobre a

falta no Outro e não sobre o que causa essa falta (isso seria falta no Outro e não sobre o que causa essa falta (isso seria mera rivalidade).mera rivalidade). Cf. ESB, IV, 180-4.Cf. ESB, IV, 180-4.

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TerceiraTerceira

Uma terceira teoria pode ser deduzida no Uma terceira teoria pode ser deduzida no texto freudiano a partir de seus textos texto freudiano a partir de seus textos

sobre a feminilidade.sobre a feminilidade. O papel do complexo de Édipo;O papel do complexo de Édipo;

A oralidade;A oralidade; A passividade;A passividade;

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Histeria e ÉdipoHisteria e Édipo A histérica, por não ter conseguido superar satisfatoriamente A histérica, por não ter conseguido superar satisfatoriamente

seu complexo de Édipo, fica fixada na fase fálica da evolução seu complexo de Édipo, fica fixada na fase fálica da evolução libidinal, isto é, submersa em mundo povoado por seres que ou libidinal, isto é, submersa em mundo povoado por seres que ou são “fálicos” ou são “castrados”. É, em termos psicossexuais, são “fálicos” ou são “castrados”. É, em termos psicossexuais,

uma menina ferida em seu narcisismo, pois considera o fato de uma menina ferida em seu narcisismo, pois considera o fato de não ter pênis como o resultado de uma castração, seja como for não ter pênis como o resultado de uma castração, seja como for

que a imagine. Quer vivencie o horror de encarnar um ser que a imagine. Quer vivencie o horror de encarnar um ser monstruoso a quem a mãe não deu o pênis que todos possuem, monstruoso a quem a mãe não deu o pênis que todos possuem,

quer acredite com desespero que teve pensamentos ou atos quer acredite com desespero que teve pensamentos ou atos “maus”, pelos quais lhe “tiraram” o pênis, tentará compensar “maus”, pelos quais lhe “tiraram” o pênis, tentará compensar

este sentimento de intolerável inferioridade dissimulando o que este sentimento de intolerável inferioridade dissimulando o que ela percebe como falta, imperfeição ou defeito, com o desejo de ela percebe como falta, imperfeição ou defeito, com o desejo de ocupar um lugar de completude e perfeição. Lugar instável no ocupar um lugar de completude e perfeição. Lugar instável no qual precisa ser constantemente confirmada pelo desejo que é qual precisa ser constantemente confirmada pelo desejo que é capaz de despertar no outro: pela perfeição de sua voz, pelo capaz de despertar no outro: pela perfeição de sua voz, pelo

atrativo de suas roupas, pela beleza de seu corpo, pela agudeza atrativo de suas roupas, pela beleza de seu corpo, pela agudeza de seu intelecto... (Mayer, 1989: 42)de seu intelecto... (Mayer, 1989: 42)

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Desejo insatisfeitoDesejo insatisfeito A histérica precisa frequentemente criar um desejo A histérica precisa frequentemente criar um desejo

insatisfeito não somente para mostrar a insatisfeito não somente para mostrar a “insuficiência” do homem e para não se sentir “insuficiência” do homem e para não se sentir

humilhada ao gozar com aquele que é seu rival, humilhada ao gozar com aquele que é seu rival, mas também para manter vivo o desejo mas também para manter vivo o desejo

inconsciente de completude. Sua máscara de inconsciente de completude. Sua máscara de sofrimento encobre a menina que sofrimento encobre a menina que

inconscientemente seguirá gozando com o ilusório inconscientemente seguirá gozando com o ilusório encontro com um objeto idealizado e proibido ao encontro com um objeto idealizado e proibido ao

qual não pode e nem quer renunciar. qual não pode e nem quer renunciar. (Mayer, 1989: 43)(Mayer, 1989: 43)

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Teorias em FreudTeorias em Freud

Aproximadamente, sem distinções Aproximadamente, sem distinções rígidas:rígidas:

1.1. Teoria da sedução restrita;Teoria da sedução restrita;2.2. Primazia da defesa, fantasia, realidade Primazia da defesa, fantasia, realidade

psíquica;psíquica;3.3. Problemática da feminilidade e do pré-Problemática da feminilidade e do pré-

edípico.edípico.

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HipocondriaHipocondria Do ponto de vista histórico, desde o séc. XVII, acreditava-se que a Do ponto de vista histórico, desde o séc. XVII, acreditava-se que a

hipocondria fosse a perturbação moral masculina com sintomas hipocondria fosse a perturbação moral masculina com sintomas corporais mais frequente, pois – diferentemente da histeria – um corporais mais frequente, pois – diferentemente da histeria – um

controle maior do sistema nervoso e das faculdades intelectuais sobre controle maior do sistema nervoso e das faculdades intelectuais sobre o corpo somático. Com isso, no homem, não existiria comumente na o corpo somático. Com isso, no homem, não existiria comumente na hipocondria a experiência convulsionária, como ocorria nas mulheres. hipocondria a experiência convulsionária, como ocorria nas mulheres.

(Cf. Birman, 2001: 106)(Cf. Birman, 2001: 106) Dentre as muitas diferenças diagnósticas, uma importante a se fazer Dentre as muitas diferenças diagnósticas, uma importante a se fazer

entre a histeria e a hipocondria é que essa última expressa uma falta entre a histeria e a hipocondria é que essa última expressa uma falta de simbolização (falta a palavra para designar aquilo que, do corpo, de simbolização (falta a palavra para designar aquilo que, do corpo, escapa à língua), ao passo que a conversão histérica manifesta um escapa à língua), ao passo que a conversão histérica manifesta um

excesso de simbolização (o significante, aqui, anexa o corpo a ponto excesso de simbolização (o significante, aqui, anexa o corpo a ponto de lhe retirar a função orgânica) e um excesso de sexualização (os de lhe retirar a função orgânica) e um excesso de sexualização (os órgãos ou partes do corpo anexados pelo sintoma são levados a órgãos ou partes do corpo anexados pelo sintoma são levados a desempenhas um papel de zona erógena para o qual não foram desempenhas um papel de zona erógena para o qual não foram

destinados).destinados). No hipocondríaco, a afirmação é a de que não há castração. Ali onde No hipocondríaco, a afirmação é a de que não há castração. Ali onde

o outro diz: “Mas eu não vejo nada”, ele insiste: “Mas sim, há alguma o outro diz: “Mas eu não vejo nada”, ele insiste: “Mas sim, há alguma coisa! Olhe mais de perto!”coisa! Olhe mais de perto!”

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Uma teoriaUma teoria Ramos (2008) cita várias teorias sobre histeria que Ramos (2008) cita várias teorias sobre histeria que

aparecem depois de Freud. Uma delas, a de Eric Brenman, aparecem depois de Freud. Uma delas, a de Eric Brenman, propõe um modelo de mãe histerógena:propõe um modelo de mãe histerógena:

(1) Essa mãe estaria subjugada pela angústia, (1) Essa mãe estaria subjugada pela angústia, comunicando ao filho que suas angústias são realmente comunicando ao filho que suas angústias são realmente

catastróficas. (2) Como paliativo, ela transmitiria a ideia de catastróficas. (2) Como paliativo, ela transmitiria a ideia de que está tudo bem, provendo um modelo de identificação que está tudo bem, provendo um modelo de identificação

irreal. (3) Essa mãe encorajaria a negação da verdade irreal. (3) Essa mãe encorajaria a negação da verdade psíquica. (4) Ela proveria sua criança de um amor externo psíquica. (4) Ela proveria sua criança de um amor externo

idealizado, excessivamente indulgente e devotado, idealizado, excessivamente indulgente e devotado, encorajando a dependência voraz e a hipersexualidade. (5) encorajando a dependência voraz e a hipersexualidade. (5) Por esses meios, a mãe evitaria a catástrofe psíquica. (Cf. Por esses meios, a mãe evitaria a catástrofe psíquica. (Cf.

Ramos, 2008: 126-7)Ramos, 2008: 126-7)

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Teoria lacanianaTeoria lacaniana A preocupação dos histéricos é de preservar o A preocupação dos histéricos é de preservar o desejo, que é o único testemunho da existência do desejo, que é o único testemunho da existência do sujeito do inconsciente. Ao perder o desejo, na sua sujeito do inconsciente. Ao perder o desejo, na sua realização, o que estaria em risco seria o próprio realização, o que estaria em risco seria o próprio inconsciente. Isto é, o ser do sujeito. inconsciente. Isto é, o ser do sujeito. O que o O que o desejo deseja é continuar desejandodesejo deseja é continuar desejando. Os . Os histéricos estão numa busca de si mesmos.histéricos estão numa busca de si mesmos.

O desejo insatisfeito tem a ver com o pai, com a O desejo insatisfeito tem a ver com o pai, com a inveja do pênis e com a castração.inveja do pênis e com a castração.

O corpo que se produz – a perfeição da beleza e O corpo que se produz – a perfeição da beleza e não a perfeição obsessiva – visa obliterar a não a perfeição obsessiva – visa obliterar a

castração.castração.

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Lacaniana (cont.)Lacaniana (cont.) Os histéricos desejam um mestre que lhe Os histéricos desejam um mestre que lhe

digam o que desejar.digam o que desejar. A interpretação de Nasio (1991) também é A interpretação de Nasio (1991) também é

importante: o fantasma histérico como importante: o fantasma histérico como fantasma da castração feminina, fantasia de fantasma da castração feminina, fantasia de ser penetrada pelo corpo inteiro da mãe, de ser penetrada pelo corpo inteiro da mãe, de

maneira a ter seu pequeno útero e sua maneira a ter seu pequeno útero e sua vagina arrebentados. Essa fantasia teria o vagina arrebentados. Essa fantasia teria o

papel de defesa contra o gozo total e papel de defesa contra o gozo total e aniquilador. (Apud. Ramos, 2008: 173).aniquilador. (Apud. Ramos, 2008: 173).

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Lacaniana (cont. 2)Lacaniana (cont. 2) Lacan, no seminário Lacan, no seminário O Avesso da PsicanáliseO Avesso da Psicanálise, trata a histeria , trata a histeria

como um discurso.como um discurso. O discurso histérico é o oposto ao discurso do mestre. O discurso histérico é o oposto ao discurso do mestre. Retorna no discurso histérico o que o discurso do mestre Retorna no discurso histérico o que o discurso do mestre

recalcou.recalcou. Divisão do sujeito: ali onde está representado, ele não está, Divisão do sujeito: ali onde está representado, ele não está,

ali onde ele está, não há significante que o diga. Não há ali onde ele está, não há significante que o diga. Não há portanto outro sujeito senão o sujeito que mente... sem o portanto outro sujeito senão o sujeito que mente... sem o saber! Ele é exclusão da cadeia significante, retirada da saber! Ele é exclusão da cadeia significante, retirada da

ordem simbólica. A histeria define essa verdade freudiana ordem simbólica. A histeria define essa verdade freudiana de que não há sujeito senão mascarado. Não é à toa que a de que não há sujeito senão mascarado. Não é à toa que a

persona persona latina deu nome à noção ocidental de pessoa.latina deu nome à noção ocidental de pessoa. A verdade desse discurso: o mestre está castrado...A verdade desse discurso: o mestre está castrado...

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o agente → o outro ↑ ↓a verdade // a produção

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Caso ClínicoCaso Clínico 25 a., inúmeros sintomas fóbicos (zoofobia, agorafobia, 25 a., inúmeros sintomas fóbicos (zoofobia, agorafobia, dentista), físicos (vômitos, dores de cabeça, nó na garganta) dentista), físicos (vômitos, dores de cabeça, nó na garganta)

e sintomas dissociativos (períodos de amnésia).e sintomas dissociativos (períodos de amnésia). Necessidade de comer quando sob tensão. Recentemente, Necessidade de comer quando sob tensão. Recentemente,

“excessiva indulgência com o álcool”. Seu pai sofrera de “excessiva indulgência com o álcool”. Seu pai sofrera de alcoolismo crônico e morreu qdo. a pcte. tinha 14 anos.alcoolismo crônico e morreu qdo. a pcte. tinha 14 anos.

Mãe dominadora e narcísica. Dava comida quando a criança Mãe dominadora e narcísica. Dava comida quando a criança chorava. Muito repressiva com relação ao sexo.chorava. Muito repressiva com relação ao sexo.

Sentia-se uma “sereia”: anestesiada da cintura para baixo. Sentia-se uma “sereia”: anestesiada da cintura para baixo. Promiscuidade sexual.Promiscuidade sexual.

Voracidade (sexual e alimentar): exprime ao mesmo tempo o Voracidade (sexual e alimentar): exprime ao mesmo tempo o desejo e a impossibilidade de satisfazê-lo.desejo e a impossibilidade de satisfazê-lo.

Caso citado por Judd Marmor em “Oralidade na personalidade Caso citado por Judd Marmor em “Oralidade na personalidade histérica” (1953), apud. Ramos (2008: 85-95 e 257-9)histérica” (1953), apud. Ramos (2008: 85-95 e 257-9)

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Teoria da Sedução GeneralizadaTeoria da Sedução Generalizada A essência da histeria é ser cênica e, portanto, concreta e A essência da histeria é ser cênica e, portanto, concreta e

corporal. O que o sujeito necessita encenar, isto é, “pôr corporal. O que o sujeito necessita encenar, isto é, “pôr de pé”, como dizem os diretores de teatro, senão o de pé”, como dizem os diretores de teatro, senão o

fantasma?fantasma? O cênico na histeria é tentativa de tradução e de O cênico na histeria é tentativa de tradução e de interpretação do excesso, do enigma que persegue o interpretação do excesso, do enigma que persegue o

histérico, inclusive em seu sentimento de insatisfação, o histérico, inclusive em seu sentimento de insatisfação, o excessivo enigma do outro.excessivo enigma do outro.

A histeria pode ser vista como um efeito extremo A histeria pode ser vista como um efeito extremo de sedução.de sedução.

Passividade e sedução se articulamPassividade e sedução se articulam. Não importa . Não importa tanto a pulsão parcial, mas a oral desempenha papel tanto a pulsão parcial, mas a oral desempenha papel

importante. O que está em questão é que a fantasia de importante. O que está em questão é que a fantasia de passividade e dependência depois vai ter lugar passividade e dependência depois vai ter lugar

privilegiado.privilegiado.

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TSG – Cont.TSG – Cont. Se pensarmos na Se pensarmos na sedução origináriasedução originária, a criança , a criança

está na posição passiva, sendo objeto da ação do está na posição passiva, sendo objeto da ação do outro, ação essa que ela passará toda a sua vida outro, ação essa que ela passará toda a sua vida tentando traduzir. Desse modo, então, pode-se tentando traduzir. Desse modo, então, pode-se interpretar a sedução histérica como de algum interpretar a sedução histérica como de algum modo traduzindo, justamente como sedução, o modo traduzindo, justamente como sedução, o

enigma do outro. É como se se pusesse na posição enigma do outro. É como se se pusesse na posição passiva, que é a originária, mas fazendo cumprir a passiva, que é a originária, mas fazendo cumprir a

sedução, que foi a prerrogativa do outro na sedução, que foi a prerrogativa do outro na situação primitiva. Essa sedução talvez seja uma situação primitiva. Essa sedução talvez seja uma

espécie de reprodução, mas em que a atividade do espécie de reprodução, mas em que a atividade do sedutor original, o outro adulto, se transforma em sedutor original, o outro adulto, se transforma em

“função”, de seduzir, e a posição da criança, “função”, de seduzir, e a posição da criança, passiva, se mantém na cena. passiva, se mantém na cena.

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O rancor da histéricaO rancor da histérica Em seu texto, Masud Khan lembra que o histérico responde às faltas de Em seu texto, Masud Khan lembra que o histérico responde às faltas de

uma maternagem-suficientemente-boa com um desenvolvimento sexual uma maternagem-suficientemente-boa com um desenvolvimento sexual precoce. O resultado disso são a promiscuidade e as inibições que marcam precoce. O resultado disso são a promiscuidade e as inibições que marcam

suas experiências sexuais.suas experiências sexuais. Todo histérico acredita sinceramente que se seus anseios sexuais Todo histérico acredita sinceramente que se seus anseios sexuais

fossem gratificados, estaria curado.fossem gratificados, estaria curado. Eles atribuem sua incapacidade de Eles atribuem sua incapacidade de conseguir esta gratificação com um companheiro à impossibilidade destes conseguir esta gratificação com um companheiro à impossibilidade destes de os aceitar totalmente e os amar. (A culpa é do outro... O outro não dá de os aceitar totalmente e os amar. (A culpa é do outro... O outro não dá

conta...)conta...) Esta desconfiança em relação ao objeto gratificante adulto é pré-Esta desconfiança em relação ao objeto gratificante adulto é pré-

condicionada, no histérico, pelo caráter das primeiras experiências infantis. condicionada, no histérico, pelo caráter das primeiras experiências infantis. As necessidades corporais foram satisfeitas, mas as necessidades do eu não As necessidades corporais foram satisfeitas, mas as necessidades do eu não

foram nem reconhecidas nem facilitadas, o que era essencial. Projetando foram nem reconhecidas nem facilitadas, o que era essencial. Projetando essa situação passada numa atual, o rancor do histérico é que o novo essa situação passada numa atual, o rancor do histérico é que o novo objeto de amor não consegue distinguir entre os desejos do isso e as objeto de amor não consegue distinguir entre os desejos do isso e as

necessidades do eu.necessidades do eu. As lembranças que o histérico guarda de sua primeira infância são As lembranças que o histérico guarda de sua primeira infância são

lembranças somáticas, relativas aos cuidados maternos, não servindo nem à lembranças somáticas, relativas aos cuidados maternos, não servindo nem à elaboração psíquica nem à verbalização. Daí a demanda que os histéricos elaboração psíquica nem à verbalização. Daí a demanda que os histéricos

fazem, na situação clínica, de uma gratificação sensual e, esta demanda não fazem, na situação clínica, de uma gratificação sensual e, esta demanda não podendo ser satisfeita, sua tendência a passar ao ato.podendo ser satisfeita, sua tendência a passar ao ato.

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O Êxtase de Santa Teresa (1645-1652)

Gian Lorenzo Bernini

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PersonalidadesPersonalidades No seu texto sobre personalidade múltipla, Mikkel No seu texto sobre personalidade múltipla, Mikkel

Boch-Jacobsen lembra como esse fenômeno Boch-Jacobsen lembra como esse fenômeno midiático das décadas de 70-90, nos EUA, tem a ver midiático das décadas de 70-90, nos EUA, tem a ver

com a histeria. com a histeria. A epidemiologia faz lembrar as crises histéricas nos A epidemiologia faz lembrar as crises histéricas nos

internatos por “contágio”. Quando internatos por “contágio”. Quando SybilSybil foi lançado, foi lançado, em 1973, houve um rápido crescimento de casos.em 1973, houve um rápido crescimento de casos.

200 antes de 1980.200 antes de 1980. 1000 em 1984.1000 em 1984. 4000 em 19894000 em 1989

Últimas estimativas: 30.000.Últimas estimativas: 30.000.

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HistériaHistéria História, histeria: nenhuma forma patológica é mais História, histeria: nenhuma forma patológica é mais

sensível ao espírito do tempo. Fazer a história da sensível ao espírito do tempo. Fazer a história da histeria é também atribuir-lhe sintomas que não histeria é também atribuir-lhe sintomas que não

cessam de mudar. O histérico procura confundir os cessam de mudar. O histérico procura confundir os hábitos de pensamento socialmente aceitos, hábitos de pensamento socialmente aceitos,

perturbar os referenciais do saber universitário perturbar os referenciais do saber universitário pondo à mostra seus limites, seus avatares, seus pondo à mostra seus limites, seus avatares, seus

percalços.percalços. A clínica da histeria conta a história da cultura, da A clínica da histeria conta a história da cultura, da

sexualidade e dos discursos do saber que lhe sexualidade e dos discursos do saber que lhe solicitam uma forma de apresentação: solicitam uma forma de apresentação: é dentro de é dentro de um espaço de saber que a histeria se instituium espaço de saber que a histeria se institui..

(Cf. Alonso, 2000: 86).(Cf. Alonso, 2000: 86).

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Histeria, historiaHisteria, historia A identidade do sujeito é sempre historicamente A identidade do sujeito é sempre historicamente determinada, dependente de um contexto ideológico determinada, dependente de um contexto ideológico

específico.específico. Histeria aparece quando um sujeito começa a questionar Histeria aparece quando um sujeito começa a questionar

ou a sentir desconforto com relação à sua identidade: ou a sentir desconforto com relação à sua identidade: “Você me diz que eu sou seu amado – o que há em mim “Você me diz que eu sou seu amado – o que há em mim que me faz ser isso? O que você vê em mim que faz você que me faz ser isso? O que você vê em mim que faz você

me deseja assim?”me deseja assim?” O problema para o histérico é distinguir o que ele é (seu O problema para o histérico é distinguir o que ele é (seu verdadeiro desejo) daquilo que os outros veem ou desejam verdadeiro desejo) daquilo que os outros veem ou desejam

dele / nele.dele / nele. Žižek, 2006: 34-6.Žižek, 2006: 34-6.

Por falar e por ser histórico, todo sujeito é histérico…Por falar e por ser histórico, todo sujeito é histérico…

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Saber inacabadoSaber inacabado

A histeria mostra o saber inacabado. A histeria mostra o saber inacabado. Saber do inconsciente, isto é, saber que Saber do inconsciente, isto é, saber que não se sabe. O saber não se sabe. O saber sobresobre a histeria, de a histeria, de

repente, deve se render ao saber repente, deve se render ao saber da da histeria... sob o risco da perversão... mas histeria... sob o risco da perversão... mas

essa já é outra história...essa já é outra história...

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A lógica (perversa) da ciênciaA lógica (perversa) da ciência

Raquitismo – Revue Photographique des Hôpitaux de Paris

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BibliografiaBibliografia Alonso, Silvia Leonor. “O que não pertence a ninguém...” e as Alonso, Silvia Leonor. “O que não pertence a ninguém...” e as

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l’iconographie photographique de la Salpêtrière. Paris: Macula, 1982.l’iconographie photographique de la Salpêtrière. Paris: Macula, 1982. Ey, Henry (et al.). Ey, Henry (et al.). Manual de psiquiatria.Manual de psiquiatria. 5.ed. Trad. Paulo César 5.ed. Trad. Paulo César

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Edição Standard das Obras Psicológicas Completas de Sigmund FreudEdição Standard das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud [ESB], vol. II. Rio de Janeiro: Imago, 1969.[ESB], vol. II. Rio de Janeiro: Imago, 1969.

Freud, S. A interpretação dos sonhos [1900]. In ESB, vol. IV, Rio de Freud, S. A interpretação dos sonhos [1900]. In ESB, vol. IV, Rio de Janeiro: Imago, 1969.Janeiro: Imago, 1969.

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