BULHÃO PATO. Poemas para quê [págs. 04-07] quando pode ... · a personagem Tomás de Alencar,...

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BULHÃO PATO. Poemas para quê quando se pode comer amêijoas [págs. 04-07]

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BULHÃO PATO.Poemas para quê

quando se podecomer amêijoas

[págs. 04-07]

BULHÃO PATO /Centenário de umprato bem servido

O poeta mais gastronómico de Portugal morreu há cem anos e revisitamos

uma história quase esquecida da Margem Sul, de tempos de diletantismo.,

poesia à luz das velas e picardias com Eça de Queiroz. Luis Freitas Brancopercorreu Caparica,Trafaria e Caolhas a degustar a maior herança de BulhãoPato: um prato de amêijoas. Patrícia de Melo Moreira ajudou a limpar as

cinco travessas e levou a máquina fotográfica

A receita de amêijoas é mui-

to reconhecida; a memó-ria do poeta que lhe deu

nome perdeu-se alguresnas crescentes urbaniza-

ções da Caparica Um dos

últimos românticos do século XIX, Bulhão

Pato fez de sua casa o Monte da Capari-ca, em tempos em que as lebres e perdi-zes em abundância faziam da caça umaactividade predilecta. Na Margem Sul fez

tertúlias literárias e gastronómicas, ondedizia ter mais orgulho num bom pratoque num bom verso alexandrino. Quan-do estava mais folgado passeava por Lis-

boa, com paragem obrigatória no Res-taurante Estrela de Oiro do Chiado. Arecorrente ementa eram, inevitavelmen-

te, as amêijoas.A celebrar os cem anos da morte de

Bulhão Pato, o Arquivo Histórico de Alma-

da inaugura no dia 14 Setembro a expo-sição "0 Poeta que viveu na Caparica".Apesar da sua forte ligação à MargemSul, Bulhão nasceu em Bilbau no dia 3

de Março de 1828. "Embora de pais por-tugueses, passou a primeira infâncianaquela região", explica o director do

arquivo histórico, Alexandre Soares. Filhode Perira Pato Alvares de Bulhão e Mariada Piedade Blandy, após a guerra civil afamília firma-se definitivamente em Lis-boa. Aos 12 anos, o poeta ficava órfão de

pai e ingressava no colégio interno de

Quelhas.

Quando em 1846 conhece AlexandreHerculano, inspira-se a traçar uns pri-meiros versos em "Se Coras Não Conto".

"Fui viver com Herculano para a Ajuda,de 47 para 48. Em 49 foi para lá o Gar-rett passar a Primavera e o Verão. Dor-míamos no mesmo quarto, Garrett escre-

veu ali parte das 'Folhas Caídas'", conta-

va o próprio Bulhão em "Carta

Autobiográfica".Como escrevente na Secretaria de Esta-

do das Obras Públicas, Bulhão começouo seu percurso poético e diletante. Enquan-to sócio da Academia de Ciências de Lis-boa travou amizade com os simpatizan-tes do romantismo, entre eles OliveiraMartins, José Estêvão e Miguel Angelo

Lupi. Em 1866 arriscou uns primeiroscontos narrativos com "Paquita"; seguiu--se "Paisagens" (1871), "Sob os Ciprestes"(1877) e "Livro do Monte-Geórgicas"(1896). Mas o seu episódio literário maisfamoso seria a picardia com o fervoro-so defensor da extinção do romantismo,

Eça de Queiroz. "Havia alguma coisa de

antiquado, de artificial e de lúgubre",assim descreve Eça na obra "Os Maias"a personagem Tomás de Alencar, umacaricatura de Bulhão Pato. Furioso, o

poeta retribui com os poemas de escár-

nio, "O Grande Maia" e "Lázaro Cônsul".Em 1890, Bulhão fez finalmente casa

no Monte da Caparica, para onde convi-dou todos os seus amigos no "Livro do

Monte"( 1896): "Vem. A casita é modesta/

Mas, quando surge um amigo,/ pareceum castelo em festa". Algures nesta altu-

ra, pensa-se que foi o chefe joão da Matado Hotel Bragança, em Lisboa, que impro-visou uma simples receita de amêijoasem honra de Bulhão, que não se cansa-va de as comer e que já tinha habituadoos cozinheiros a roteiros gastronómicos.

Hoje, na Margem Sul restam três ruascom o seu nome e uma placa comemo-rativa. Apesar de alguns protestos abafa-

dos, a estátua para o poeta ainda está emfalta. Mas a sua homenagem é feita dia-riamente nestes meses mais quentes portodo o Portugal, seja em casa ou numaesplanada. Decerto que Bulhão Pato não

quereria ser lembrado de outra forma.

Raimundo Antóniode Bulhão PatoPOETA

Nasceu a 3 de Março de 1 828e morreu no Monte da

Caparica em 24 de Agostode 1912.

Na baía da Trataria só os barcos

pintados de laranja pela políciamarítima podem pescar amêijoas;no entanto, a astúcia dos locaislevou a que alaranjassem de noite

as embarcações. O perigo de ser

apanhado não é em vão: "A melhor

amêijoa de Portugal é a da Trataria"

anuncia António Veiga, de 60 anos,dono da Casa Ideal. Nascido emVinhais, Trás-os-Montes, António ea mulher Bernardete abriram o

restaurante em 1978,especializando-se em choco frito,

filetes de tamboril, salmonete,peixe-espada e sardinhas. Apesar

dos meses quentes encherem mais

a casa e ao contrário do esperado,António é fã das outras estações."Gostamos de nos basear nahistória que diz que o marisco deveser comido nos meses com R." OBulhão Pato tem aqui um segredode manutenção: além da águasalgada para limpar e apurar, usamainda água gelada para fazer uma

limpeza antes de cozinhar. "Outro

segredo é o azeite de qualidade."Morada Rua Tenente Maia, 22, TratariaContacto: 212 950 898Preço das amêijoas: 12 euros

Aqui a manobra que faz a diferençaé um pouco de água do mar

Depois de um atarefado dia de

trabalho, quem atravessa o Tejo nobarco para o porto de Cacílhas jásabe que tem uma paragemobrigatória a fazer antes de casa. OFarol - a mais antiga marisqueira deAlmada - serve desde 1 933 aobalcão o combo perfeito decamarão com cerveja. "Vendemosmil litros de cerveja de três em três

dias", garante o gerente, PauloPreso. Além da população "daoutra banda", o restauranteatafulha-se diariamente dos turistas

que fazem os trajectos do Tejo. A

aparição mais usual das amêijoas éno chamado misto de marisco,uma saborosa combinação de

lagosta com sapateira, gambás eafins. No entanto, elas também vêmsolteiras numa travessa, sendoestas especialmente coentradas e,

sobretudo, grandes. As amêijoastanto podem ser da Trafaria comodo Algarve, mas se estiver indecisonada melhor do que espreitar daentrada o aquário de água salgada,onde elas estão bem vívinhas.

A alheira de Mirandela pode ter

ganho o concurso das SeteMaravilhas da Gastronomia

Portuguesa, mas a cozinha doSolar Beirão foi quem deixou toda agente a aguar na RTPI poramêijoas à Bulhão Pato. A

marisqueira ganhou o epíteto de

beirão, pelo seu primeiroproprietário, que emigrou da Beira

para Cacilhas em 1968. Entretanto,o espaço cresceu para doisandares, podendo agora receber120 pessoas. De pai português emãe italiana, Marcos Manièsnasceu na Alemanha, regressando

com a família a Portugal aos 1 1

anos. Marcos trabalha narestauração desde muito novo.Além de ser gerente do SolarBeirão há cinco anos, a sua mulheré a cozinheira de serviço. A amêijoaque apareceu na televisão tem dois

truques na manga: usar margarinana frigideira antes do cozinhado e"não deixar as amêijoas muito

tempo fora de água, para nãomurcharem".Morada Rua Cândido dos Reis, 17, CacilhasContacto: 212 766 019Preço das amêijoas: 9,90 euros

Helena Correia - mulher de Marcos- prepara o petisco tão aguardado

A acompanhar as amêijoas à Bulhão Patofica mesmo bem pão torrado e limão

O contexto idílico é conhecido detoda a gente e já de tal formabanalizado que quase esquecemosquão incrível é estar no sopé dapraia a comer uma sapateira nasombra dos toldos. Na praia daMorena, o restaurante Borda D'Águaserve o propósito veraneante comorgulho e glória. Os 12 empregadosde mesa acabam com as esperasmuito longas e, chegada a altura depedir, a escolha costuma ser a

lagosta à Borda D'Água, o polvo àlagareiro ou o peixe do dia. Mas asair com frequência da cozinhaestão, claro está, as amêijoas docozinheiro Adolfo Barreiros. A receitaé a original e os bivalves vêm dosviveiros de Olhão. Mas estas

amêijoas nada ficam a dever às daTrafaria, primando pela simplicidadee textura de sabor. Se a razão que ofaz estar afastado das esplanadasde praia é manter a linha, tenha emconta que 1 00 gramas de amêijoastêm apenas 75 calorias, ou seja,engordam tanto como farinha de

trigo.Morada Praia da Morena, 2825 Costa da CaparicaContacto: 212 975 213Preço das amêijoas: 16,50 euros