Cabra leiteira: fonte de renda para o sertanejo

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12 S ímbolo da pecuária nordestina, o caprino é encontrado em grande parte das unidades de produção familiar em todo Semiárido. Segundo o IBGE (2011), o Brasil possui 9,39 milhões de cabeças e a Bahia responde por 29,21% desse efetivo. Robson Andrade 1 Ildes Ferreira 2 1 – Engenheiro Agrônomo, Especialista em Gestão da Ino- vação Tecnológica; e-mail: [email protected] 2 – Sociólogo, Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS; e-mail: [email protected] O sistema de criação na Bahia ainda é bastante rudimentar, com pouco incremento tecnológico, baixa qualidade genética dos re- banhos, baixos índices zootéc- nicos, dentre outros aspectos. Contudo, apresenta-se como uma cadeia produtiva com elevada po- tencialidade em virtude das boas condições de aceitação da carne, leite e seus derivados pelo merca- do. Atualmente, na Bahia, a implan- tação de frigoríficos especializados para o abate de caprinos tem per- mitido expandir este consumo para novos nichos da população, assim como a produção de derivados de leite pelos laticínios que proces- sam/industrializam o leite caprino. No que tange a produção de leite de cabra, o Território do Sisal, loca- lizado no Semiárido baiano, possui larga experiência em virtude de ter iniciado a produção nos anos 90. O presente comunicado técnico pretende, em linhas gerais, relatar essa experiência do Território do Cabra leiteira: fonte de renda para o sertanejo a experiência do Território do Sisal Foto: Acervo ACCOSSF COMUNICAÇÃO

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Símbolo da pecuária nordestina, o caprino é encontrado em grande parte das unidades de produção familiar em todo

Semiárido. Segundo o IBGE (2011), o Brasil possui 9,39 milhões de cabeças e a Bahia responde por 29,21% desse efetivo.

Robson Andrade1

Ildes Ferreira2

1 – Engenheiro Agrônomo, Especialista em Gestão da Ino-vação Tecnológica; e-mail: [email protected]

2 – Sociólogo, Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS; e-mail: [email protected]

O sistema de criação na Bahia ainda é bastante rudimentar, com pouco incremento tecnológico, baixa qualidade genética dos re-banhos, baixos índices zootéc-nicos, dentre outros aspectos. Contudo, apresenta-se como uma cadeia produtiva com elevada po-tencialidade em virtude das boas condições de aceitação da carne, leite e seus derivados pelo merca-do. Atualmente, na Bahia, a implan-tação de frigoríficos especializados para o abate de caprinos tem per-

mitido expandir este consumo para novos nichos da população, assim como a produção de derivados de leite pelos laticínios que proces-sam/industrializam o leite caprino.

No que tange a produção de leite de cabra, o Território do Sisal, loca-lizado no Semiárido baiano, possui larga experiência em virtude de ter iniciado a produção nos anos 90. O presente comunicado técnico pretende, em linhas gerais, relatar essa experiência do Território do

Cabra leiteira: • fonte de renda para o sertanejo• a experiência do Território do Sisal

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Sisal e abordar a questão da po-tencialidade da cadeia produtiva da caprinocultura de leite.

UM POUCO SOBRE O TERRITÓRIO DO SISAL

O Território do Sisal é constituí-do por 20 municípios (Figura 1), habitado por 582.329 pessoas (IBGE, 2011) e uma extensão territorial de 20.154 km², o cor-respondente a 3,5% do Estado da Bahia. Inserido no Semiárido baiano, é caracterizado pela pre-dominância de uma economia agrícola de base familiar.

A CADEIA PRODUTIVA DA CAPRINOCULTURA DE LEITE NO TERRITÓRIO DO SISAL

No início da década de 1990, no município de Valente, a Associa-ção de Desenvolvimento Sus-tentável Solidária – APAEB, com o intuito de diversificar a renda dos agricultores familiares da re-gião sisaleira, resolveu fomentar, através de um “fundo rotativo”, a compra dos primeiros caprinos leiteiros na região. Em paralelo, com recursos oriundos de organi-zações internacionais, a APAEB, em 1996, iniciou a construção de um laticínio específico para pro-cessamento e industrialização do leite de cabra, consolidando a vi-são inovadora e empreendedora da organização.

Em 2001, o laticínio DACABRA passou a produzir iogurtes, quei-jos e doces sob a orientação de pesquisadores da Escola de Agronomia da Universidade Fe-deral da Bahia (UFBA), a atual Universidade Federal do Recôn-cavo da Bahia (UFRB).

A experiência em Valente fomen-tou a expansão da cadeia produti-va e, em 2009, a Cooperativa Mis-ta dos Agricultores Familiares do Território do Sisal – COOPSISAL implantou outro laticínio no Terri-tório, localizado no município de

São Domingos, conhecido como Laticínio Ouro verde.

Hoje, a caprinocultura é um componente fundamental da agricultura familiar e da própria economia do Território do Sisal, com destaque para os municí-pios de Valente, São Domingos, Santaluz e Retirolândia. De acor-do com o IBGE (2011), o efetivo caprino do conjunto dos municí-pios que compõem o Território é de 253.105 cabeças, o que cor-responde 9,23% do rebanho do Estado da Bahia.

Figura 1

Nordestina

Queimadas

Santaluz

Araci

Valente

São Domingos

Retirolândia

Ichu

Barrocas

Biritinga

Serrinha

Lamarão

Candeal

Teo�lândia

Conceição do Coité

Monte Santo

Itiúba

Cansanção

Quijingue

Tucano

Fonte: MDA. Relatório Analítico, 2011

MAPA DO TERRITÓRIO DO SISAL NO ESTADO DA BAHIA

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Os laticínios DACABRA e OURO VERDE, juntos, processam cerca de 36.000 litros de leite de cabra por mês, beneficiando 140 famílias da agricultura familiar, com a gera-ção de renda fruto da cadeia pro-dutiva na ordem de R$ 43.200,00 mil/mês, ou seja, um incremento na renda familiar médio de aproxi-madamente R$ 300 reais.

SISTEMA DE CRIAÇÃO

Os animais são criados no sis-tema semiconfinado onde parte do dia alimentam-se de forra-geiras existentes na caatinga ou pastagem formadas por forra-geiras como buffel ou urochloa. Ao retornar para as instalações, as cabras que estão em orde-nha, recebem como suplemento alimentar farelo de milho e soja, como fonte de energia e proteína, respectivamente, e silagem ou feno de resíduo de sisal (abun-dante na região). O resíduo do sisal é um volumoso importante na região, com ele os agriculto-res conseguem manter a produ-ção de leite, mesmo nos longos períodos de estiagem.

Nas propriedades familiares as instalações foram adequadas para a produção de leite, obede-cendo a critérios técnicos e sani-tários.

O manejo sanitário, assim como o manejo reprodutivo e nutricio-nal é orientado por técnicos de organizações parceiras do laticí-

nio que prestam assistência téc-nica para todos os cooperados de cada laticínio.

MERCADO

Entre os principais produtos pro-duzidos estão o leite de cabra pas-teurizado, iogurte, doce de leite e queijo. O principal mercado con-sumidor localiza-se nas regiões metropolitanas de Feira de San-tana e Salvador. Além desse mer-cado, os laticínios fornecem o leite pasteurizado, conhecido como “barriga mole”, para programas governamentais como o Programa de Aquisição de Alimento – PAA.

PARCERIAS Os dois laticínios, DACABRA e OURO VERDE, contam com o apoio de organizações da socie-dade civil como MOC, APAEB, Fun-dação APAEB, FATRES, UNICAFES e do poder público a exemplo da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Reforma Agrária, Pesca e Aquicultura – SEAGRI, Secretaria

de Desenvolvimento Social e Com-bate a pobreza – SEDES, Embrapa Semiárido e da Companhia Nacio-nal de Abastecimento – CONAB, Serviço de Apoio a Pequena e Mi-cro Empresa – SEBRAE, Univer-sidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB e Universidade Esta-dual de Feira de Santana – UEFS. Apesar de ainda existirem muitas limitações, são notórios os avanços na qualificação dos agricultores, através dos processos de pesqui-sa, assistência técnica e capacita-ções, como também na gestão e finanças dos empreendimentos, frutos das parcerias firmadas, as-sim como a dedicação dos dirigen-tes de cada laticínio.

OPORTUNIDADES DA CADEIA PRODUTIVA DA CAPRINOCULTURA

� Condições edafoclimáticas fa-voráveis a criação dos caprinos;

� Histórico de criação do caprino de corte por parte dos agricul-tores familiares do Território;

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� Mercado em expansão, tanto do setor público quanto do setor privado;

� Incremento adicional na ren-da familiar da unidade de produção;

� Fonte de proteína para a família, principalmente as crianças;

� Elevada capacidade de orga-nização dos agricultores;

� Produção em consórcio com a cultura do sisal;

� Aproveitamento do resíduo de sisal como fonte de ali-mento para os caprinos.

PRINCIPAIS DESAFIOS DA CADEIA PRODUTIVA DA CAPRINOCULTURA

Apesar da posição destacada que ocupa a caprinocultura no Território, do empenho dos agri-cultores e parceiros, há a neces-sidade de se superar algumas dificuldades de natureza estru-tural. São elas:

� Melhorar a produtividade do rebanho leiteiro;

� Adotar as medidas profi-láticas necessárias para a redução da incidência de zoonoses;

� Introduzir planejamento da unidade familiar de produção, incorporando-se os princípios da economicidade e da pre-servação ambiental;

� Otimizar recursos naturais, aproveitando as potencialida-des da caatinga;

� Incorporar tecnologias apro-priadas para o sistema de produção;

� Melhorar geneticamente o rebanho;

� Adotar medidas de convivência com a seca para assegurar a manutenção da produção nos períodos de estiagens (capta-ção e armazenamento de água, bancos de alimentos etc.);

� Ampliar a oferta de crédito (PRONAF);

� Adequar as Leis e Normativas

estabelecidas para a produ-ção de leite;

� Buscar certificações de quali-dade e de origem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cadeia produtiva da caprino-cultura no Território do Sisal é um elemento crucial para a manu-tenção e melhoria das condições de vida das famílias, pela sua ca-pacidade de gerar renda numa região de condições adversas para muitas atividades econômi-cas. Há potenciais para aumento da produtividade e da produção, há mercado para os produtos e há um valioso aprendizado por parte dos agricultores e de suas organizações. É relevante, também, para o fortalecimento e consolidação de iniciativas de economia solidária no Território, mas requer o efetivo e decisivo apoio dos governos federal e es-tadual, seja para ampliar as prá-ticas exitosas já verificadas, seja para suscitar o surgimento de novas o que muito poderá con-tribuir para a economia local no contexto da agricultura familiar do Território do Sisal.

REFERÊNCIAS

APAEB. Laticínio Dacabra. Disponível em: <http://www.apaeb.com.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=51&Itemid=41> Acesso em 28 set. 2012.

BNB. Ações do Banco do Nordeste do Brasil em P&D na arte da pecuária de caprinos e ovinos no Nordeste Brasileiro. Fortaleza, 2009.

FERREIRA, I. et al. Relatório Analítico do Território do Sisal. Disponível em <http://sge.mda.gov.br/bibli/bibli_re/ra_sisal_ba_043.pdf>. Acesso em 03 out. 2011.

IBGE. Censo Agropecuário. Disponível em <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em 03 out. 2012.

IBGE. Censo Demográfico. Disponível em <http://www.ibge.gov.br.> Acesso em out. 2012.

LIMA F. A. Q. Plano de negócio e marketing do Laticínio Dacabra. Salvador: SEBRAE/BA, 2009.