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Caderno de Desenvolvimento Humano sobre Escolas Ativas no Brasil 2016

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Caderno de DesenvolvimentoHumano sobre Escolas

Ativas no Brasil2 0 1 6

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102REALIZAÇÃON i k y Fa b i a N c i cRepresentante Residente do PNUD no brasil

D i D i e R T R e b U cQDiretor de País do PNUD no brasil

M a R i a i N ê s F i N iPresidente do iNeP

SUPERVISÃOM a R i s T e l a M a R Q U e s b a i o N iRepresentante Residente assistente para Programa do PNUD no brasil

COORDENAÇÃOa N D R é a b o l zo Ncoordenadora do Relatório de Desenvolvimento Humano Nacional – PNUD

PaU l a ko R s a k a scoordenadora da Pesquisa sobre escolas ativas – Programa de Desenvolvimento Humano pelo esporte (PRoDHe)/UsP

EQUIPE TÉCNICAPNUD s a M a N T H a D oT To s a lv e , va N e s s a G o M e s z a N e l l a , lU i s a k i e l i N G , R a í s s a T e i x e i R aINEP e D Ua R D o D e s ão PaU loPEsqUIsaDorEs e D i s o N D e J . M a N o e l , lU i z e . P. b . To U R i N H o Da N Ta s , o s va l D o l . F e R R a z , Da lTo N F R a N c i s co D e a N D R a D e , J e ova N i s c H M i T TCoorDENaDorEs TéCNICos J o s é a N i b a l F. a . M a R Q U e s , e D Ua R D o N . P. D i c i l lo

COMITÊ TÉCNICO DA PESQUISADa N i e l a c a s T R o - Rede esporte pela Mudança socialí Ta lo D U T R a - Ministério da educaçãoDeboR aH MalTa – Ministério da saúdeG i s e l e b . a . R o D R i G U e s D e s á – Ministério da saúdeTa í s P o R To o l i v e i R a – Ministério da saúde c á s s i a Da M i a N i – Ministério do esportea N D R é a e w e R To N – Ministério do esporteMaRco a . R . De aNDRe a zzi – ibGe

PARCEIRO INSTITUCIONALM i N i s T é R i o Da e D U c aç ão

AGRADECIMENTOS (pela ideia inicial que ensejou a pesquisa) lU i z c l aU D i o co s Ta - Ministério da educaçãoJ o s é F R a N c i s co s oa R e s - iNeP

EDIÇÃO PNUD BRASILProjeto Gráfico e Design: DaTa D oT e s T ú D i oimagens: b R U N o F e R N a N D e s e s H U T T e R s To c kimpressão: G R á F i c a c a P i Ta lPrimeira edição: J U l H o D e 2016Tiragem: 500 e x e M P l a R e s

Caderno de Desenvolvimento Humano sobre Escolas Ativas no Brasil : 2016. – Brasília: PNUD : iNeP, 2016. 68 p. : il., gráfs. color.

isbN: 978-85-88201-33-0

1. Desenvolvimento Humano. 2. escolas ativas. 3. educação. 4. educação Física. 5. brasil. i. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. ii. instituto Nacional de estudos e Pesquisas educacionais anísio Teixeira.

cDD 370.11

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CaDErNo DE DEsENvolvImENTo hUmaNo // escolas ativas no brasil 1

s u m á r i o

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DeseNvolviMeNTo HUMaNo é MoviMeNTo

QUaNDo MeDiR é aNTes coNHeceR

o QUe se MeDe

ReFeRêNcia sbibl ioGR áFic a s

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PReFácio N ik y FabiaNcic

escol a aT iva No ceNáRio Da escol a

bR a sileiR a

coNclUsão

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iNTRoDUç ão

escol a aT iva No coNTe x To Do

DeseNvolviMeNTo HUMaNo

QUaNDo coNHeceR é aNTes TR aNsFoRMaR

o QUe se coNHece

a história da pesquisa, cujos primeiros re-sultados apresentamos agora, teve início em meados de 2014, quando PNUD, MEC e INEP se encontraram face à motivação co-

mum de influenciar os mecanismos oficiais de pes-quisa ligados ao tema do esporte e da educação, as-sim como as políticas públicas a eles relacionadas.

As Nações Unidas atuam fortemente na pro-moção do esporte e das atividades físicas como vetores de desenvolvimento humano. Em nível internacional, o Escritório das Nações Unidas do Esporte para o Desenvolvimento e a Paz advo-ga pela utilização dessas práticas na cooperação para o desenvolvimento. Atualmente, mais de 20 agências da ONU desenvolvem coordenadamente programas com base em esportes e jogos em di-versos países. Em nível nacional, diversas agên-cias da ONU trabalham o tema coordenadamente por meio da implementação de campanhas e pro-jetos em todo o país, além da realização de pes-quisas sobre o tema.

No caso desta iniciativa, foi importante a constituição de um Comitê Técnico, responsável por orientar os trabalhos em termos de sua abor-dagem metodológica, composto pelos Ministérios da Educação, Saúde e Esporte, além de represen-tantes do IBGE e da Rede Esporte pela Mudança Social (REMS). Traçadas as diretrizes básicas, uma equipe de alta qualidade técnica foi reunida no âmbito da Universidade de São Paulo e da Uni-versidade Federal de Santa Catarina, para empre-ender a investigação.

prefácio

Como resultado, temos hoje uma pro-posta conceitual sobre o que pode signifi-car designar uma escola como ativa e, além disso, elementos que permitem uma apro-ximação para a medição desse fenômeno. Todas as bases nacionais de dados perti-nentes foram visitadas e analisadas, uma abordagem telefônica nacional, com amos-tra representativa para o país, foi realizada (atingindo ao redor de 600 escolas) e traba-lhos etnográficos em todas as regiões estão em vias de conclusão.

O objetivo de todo esse esforço é um só: colaborar na reflexão sempre atual sobre como fazer da escola um espaço propício ao desenvolvimento humano, melhorando a compreensão sobre o papel das atividades físicas e esportivas nesse contexto e, conse-quentemente, as políticas educacionais na área. Esperamos estar contribuindo para o debate e, ao mesmo tempo, recolher sub-sídios para a fase final dessa iniciativa, que culminará na proposição de um conjunto de políticas capazes de fazer das escolas brasileiras, escolas mais ativas. ◊

PoR Nik y FabiaNcic

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introduçãoo desenvolvimento das pessoas, ain-

da que pareça um processo regular de desvelamento de traços e característi-cas que permitem ao bebê, à criança, ao

jovem, ao adulto e ao idoso, realizar suas vidas de forma minimamente competente é, antes, cons-trução, criação, novidade, recriação do constru-ído. Se, numa primeira impressão, somos objeto do desenvolvimento com sua esteira rolante de fases e estágios, um olhar mais detido nesse pro-cesso apresenta outra perspectiva: a de que somos sujeitos do nosso próprio desenvolvimento.

A escola como invenção humana vem da An-tiguidade, mas a escola como a conhecemos hoje se instala entre os Séculos XVII e XIX. Se a escola da Antiguidade foi o espaço do ócio criativo, do livre pensar, não obstante, balizado por doutrinas de mestres e sábios, a escola moderna é o espa-ço do desenvolvimento ao eleger a criança como seu sujeito pedagógico por excelência. Na escola se trabalha não com o que é, mas com o vir a ser. Todavia, a escola moderna não escapou aos gran-des embates do pensamento humano em que se opõem o natural e o cultural. Assim, correntes pedagógicas se alinharam de um lado e de outro em prejuízo de uma escola mais dinâmica, para além de visões dicotômicas. Não raro, a criança e o jovem na escola foram tratados como sendo objeto do desenvolvimento, e seus corpos como

objetos estranhos à escolarização, com ex-ceção das abordagens que viam no corpo o meio para disciplinar o indivíduo.

No presente caderno apresentamos, discutimos e trazemos dados ilustrativos para um conceito de Escola Ativa. Uma es-cola é Ativa quando se organiza como es-paço pessoal, social e institucional voltado ao Desenvolvimento Humano, entendido como processo de ampliação das capacida-des e consequentemente das possibilida-des de escolha das pessoas. Há três pontos chaves para essa conceituação. Primeiro, a escola é o sítio da construção do processo civilizatório de uma sociedade, e assim, crianças, jovens e professores interagem e se fazem como sujeitos do conhecimento, sujeitos que se reconhecem numa cultu-ra e que abraçam e fomentam valores que lhes são caros. Segundo, a escola pode ser o espaço para capitalizar o mover-se corpo-ralmente da criança e do jovem e com ele potencializar as ações de conhecer sobre o mundo e de transformar o mundo. Bas-ta observar a chegada na escola, a saída de uma sala de aula, os intervalos entre aulas e veremos o mover-se corporal da criança vivo, latente e pulsante. Em sua dinâmica, o mover-se corporal não é amarrado a essa ou aquela política pública ou à proposta pedagógica da escola, posto que ele é es-sencial ao viver da criança e do jovem, e de todo indivíduo. Pode-se cerceá-lo, mas jamais extingui-lo. O mover-se corporal-mente, sendo parte presente e constante do viver infantil e juvenil, precisa falar alto no cotidiano escolar. O mover-se permeia o cotidiano de todos e assim garante desde as interações mais básicas à vida como as manifestações que produzem cultura no humano. Sobretudo, o mover-se possibi-lita o conhecer no mover-se (knowing in movement), processo pelo qual o indivíduo experimenta e processa um conhecimento

SE, NUMA PRIMEIRA IMPRESSÃO, SOMOS OBjETO

DO DESENVOLVIMENTO COM SUA ESTEIRA ROLANTE

DE fASES E ESTáGIOS, UM OLHAR MAIS DETIDO NESSE

PROCESSO APRESENTA OUTRA PERSPECTIVA: A DE QUE

SOMOS SUjEITOS DO NOSSO PRóPRIO DESENVOLVIMENTO.

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tácito com impactos em suas percepções do mundo e no mundo, de suas transações e competências para agir e transformar o seu entorno. O mover-se se sistematiza em práticas corporais com impactos em todas as dimensões do indivíduo, na biológica, na psicológica e na social. Terceiro, a es-cola é encontro. O encontro com o outro, o encontro consigo, o encontro do corpo e da mente, o encontro como exercício da alteridade, o encontro como exercício do autoconhecimento, o encontro como con-vergência do natural e do cultural, do bio-lógico e do social.

A Escola Ativa engendra um processo civilizatório de encontros: de crianças, jo-vens e professores como sujeitos de conhe-cimento; do mover-se com o conhecer; do indivíduo com seu desenvolvimento, que descobre o desenvolvimento como a cons-trução de si próprio. Essa ideia de Escola Ativa será apresentada e discutida como um conceito que faça sentido em termos filosóficos – posto que dialoga com ques-tões perenes do sentido de nossa existên-cia – e científico – ao se pautar pelo que se conhece das relações multicausais entre o mover-se e o cérebro, o mover-se e a saúde, o mover-se e a educação, e o desenvolvi-mento bio-psico-social. ◊

NÃO RARO, A CRIANÇA E O jOVEM NA ESCOLA fORAM TRATADOS COMO SENDO OBjETO DO DESENVOLVIMENTO, E SEUS CORPOS COMO OBjETOS ESTRANHOS à ESCOLARIZAÇÃO, COM ExCEÇÃO DAS ABORDAGENS QUE VIAM NO CORPO O MEIO PARA DISCIPLINAR O INDIVíDUO.

Os fundamentos para uma escola ativa

As possibilidadesde operacionalizar o conceito de escola ativa para o levantamento e análise de sua presença nas escolas brasileiras

1 2 3O DOCUMENTO É PROPOSITIVO AO INQUIRIR SOBRE:

A sistematização de uma escola ativa no universo pedagógico brasileiro

As caracteristicas do cotidiano escolar enquanto propiciador de uma cultura de escola ativa

4 5 Os desafios para tornar a escola uma escola ativa

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D esenvolvimento pode significar várias coi-sas, mas queremos demarcar aqui o senti-do que ele tem para a vida de qualquer in-divíduo: mudanças que ocorrem ao longo

da vida das pessoas, comuns à maioria delas e que lhes permite agir de forma competente e transfor-mar o meio em que vivem. Esse sentido é essencial e aproxima o desenvolvimento do próprio viver. De fato, viver é desenvolvimento. E assim, o de-senvolvimento é marcado por uma universalidade, posto que é comum a todas as pessoas. No entanto, o desenvolvimento é também caracterizado por grandes variações, já que é balizado pela história de vida de cada um. Mas, o que isso implica para a construção de um olhar ampliado de desenvolvi-mento, que possa ser direcionado para as diretri-zes de promoção do Desenvolvimento Humano no mundo, premissa básica do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)?

Como foi colocado anteriormente, o desen-volvimento humano é entendido como o proces-so de ampliação das capacidades e consequente-mente das possibilidades de escolha das pessoas. Não obstante, muitos ainda veem o desenvol-vimento como um processo gradual em que as mudanças na vida do bebê e da criança ocor-rem naturalmente, sem esforço de quem cuida

e principalmente de quem se desenvolve. Ainda que o desenvolvimento de um indi-víduo possa parecer um álbum de retratos cronológicos de sua vida, as fotos captam instantes de um processo em que a pessoa necessita agir efetivamente em seu meio. No início da vida ela necessita do ampa-ro dos pais e parentes, de cuidadores de uma forma geral, para exercer a sua agên-cia no desenvolvimento, mas a pessoa é sempre ativa no processo. Um exame no álbum fotográfico dessa pessoa denotará que suas expressões como bebê mudam não só com o tempo, mas com a situação. A postura em que ele é mantido também varia. Sua vestimenta e os objetos que es-tão ao seu redor e ao seu alcance demar-cam a situação. O recém-nascido denota em sua expressão muita competência para imitar a face de quem lhe arremata a ima-gem. O bebê de oito meses já “abstrai” o ato de lhe sacar uma foto com as mãos. Num dado momento, já não são os pais que tiram a foto, mas a criança que faz, ela própria, um autorretrato, uma “selfie” como se costuma chamar hoje. Há mu-danças de um retrato para outro, mas elas

1 Desenvolvimentohumano émovimento

capítulo

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não se rendem a uma régua domesticada na progressão. Cada retrato é o quadro de uma composição em que pais e filhos interagem para anunciar não só um mo-mento, mas sua história. Assim posto, as mudanças não simplesmente acontecem, mas se fazem a partir de uma teia de re-lações: indivíduo-meio físico; indivíduo-meio social: indivíduo-indivíduo; indiví-duo-cuidador; indivíduo-grupo etc. Essa concepção é o que podemos denominar de processo no qual o indivíduo é sujeito do desenvolvimento. A Escola Ativa, como veremos adiante, se funda nessa possibi-lidade do indivíduo em exercer a agência no seu desenvolvimento.

Na concepção do indivíduo como sujei-to do desenvolvimento se considera que os processos de mudança ocorrem na medida em que o indivíduo age, ativamente ressal-te-se, no meio físico e social. O indivíduo explora seus graus de liberdade (conjunto de elementos bio-psicológicos) ao efetuar ações e efetivar resultados, ele explora os meios e os fins influenciando os que estão no seu entorno (os pais, cuidadores, ir-mãos, parentes, amigos, professores etc.), mas também sendo influenciado por eles. E mais, suas ações têm consequências inter-nas alterando o fluxo de influências neural e genética (COTTLIEB, 1992). O desenvol-vimento corresponde às transições que o indivíduo passa a partir da construção da sua própria experiência no espaço pessoal e no espaço social, e por esse motivo ele é sujeito do desenvolvimento.

Vale ressaltar que nessa concepção não faz sentido se falar numa sequência de de-senvolvimento, mas sim em trilhas desen-volvimentistas (MANOEL, 2008). Trilhas são feitas passo a passo na direção de um dado estado de desenvolvimento. Há mais de uma trilha para um mesmo estado de-senvolvimentista. Casos específicos ilus-tram trilhas que chegam a becos sem saída ou trilhas incomuns que podemos con-

siderar como inovadoras.1 Já os casos de indivíduos virtuosos nas artes (incluindo aqui a música, a dança, a expressão corpo-ral, o teatro e o esporte) são exemplos dos que percorreram as trilhas igualmente in-comuns, mais difíceis. Contudo, há ainda as trilhas que são amigáveis – fáceis de se-guir, não requerem muito esforço, primam pela economia - proporcionam belas vistas (experiências). Essas tendem a ser seguidas por muitos e são as que mais se aproximam da noção de sequência de desenvolvimento numa visão tradicional desse fenômeno.

Há um conjunto de elementos, incluin-do o que é herdado geneticamente e cul-turalmente, que pode contribuir para que muitos sigam a mesma trilha, ou na verda-de, trilhas muito similares que à distância parecem ser uma única e principal aveni-

1 oliver Sacks desenvolve a ideia de que pessoas com deficiência seguem percursos de desenvolvimento muito distintos, atos de criação e inovação, cf. Sacks, o. (1995). um antropólogo em Marte. São paulo: cia. das letras.

paquistanês Mahbub ul Haq e preconizado pelo PNUD para idealizar políticas públicas que tenham como foco a promoção da qua-lidade de vida das pessoas de todo mundo.

Amartya Sen define desenvolvimento humano como “um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfru-tam” (SEN, 2000, p. 17) e que, portanto, “a condição de agente livre e sustentável emerge como motor fundamental do de-senvolvimento” (SEN, 2000, p.19). Duas ideias são centrais nessa concepção e re-levantes para a discussão aqui proposta: a noção de liberdade como fim e meio do de-senvolvimento e o papel das pessoas como agentes de desenvolvimento.

Na perspectiva de Sen, expandir as li-berdades das pessoas compreende tanto o fim primordial quanto o principal meio de desenvolvimento. A liberdade como fina-lidade última do desenvolvimento consti-tui-se a partir das liberdades individuais manifestas como facilidades econômicas, liberdades políticas, oportunidades so-ciais, garantias de transparência e segu-rança protetora. Estas, por sua vez, tam-bém são as disposições sociais tidas como liberdades instrumentais – os meios de desenvolvimento - que se complementam mutuamente e são capazes de aumentar diretamente as capacidades das pessoas de viverem mais livremente. Segundo o autor, o sucesso ou fracasso de uma sociedade está relacionado ao grau de liberdades que seus membros desfrutam, na medida em

(...) DESENVOLVIMENTO HUMANO (...) COMO UM PROCESSO DE AMPLIAÇÃO DAS ESCOLHAS DAS PESSOAS PARA QUE ELAS TENHAM CAPACIDADES E OPORTUNIDADES PARA SEREM AQUILO QUE DESEjAM SER.” “ ( O q u e é d e s e n v O l v i m e n t O h u m a n O , P n u d , 2 0 1 2 )

da. Nessa concepção, pode-se contemplar a ideia de fases e estágios associados às fai-xas etárias na infância e adolescência. Mas elas – as fases e os estágios - são referen-ciais, pontos de partida para uma análise mais detalhada do contexto do desenvolvi-mento onde o indivíduo – o bebê, a crian-ça, o jovem, o adulto, o idoso – trilha o seu próprio processo de desenvolvimento.

Partindo do conceito de desenvolvi-mento no qual o indivíduo é sujeito do seu próprio desenvolvimento, nos encontra-mos com o conceito de Desenvolvimento Humano, idealizado pelo economista in-diano Amartya Sen, materializado pelo

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que ter mais liberdade aumenta o potencial das pessoas de cuidarem de si mesmas e influenciar o mundo ao seu redor, agindo efetivamente sobre o processo de desenvolvimento, na condição de agente do desenvolvimento:

caminho senão pela garantia do exercí-cio destas liberdades ao longo do proces-so, justamente por reconhecer as pessoas como agentes do mesmo. Vale notar que não se estabelece uma simples relação cau-sa-efeito em que mais liberdade gera mais desenvolvimento. Defende-se uma intera-ção dinâmica e recíproca entre os ganhos de liberdade para agir sobre seu próprio desenvolvimento – aumento das capacida-des das pessoas – e o incremento de liber-dade de agir sobre seu entorno social.

Este é o ponto que Sen procura escla-recer quando discute sobre as oportunida-des sociais como a saúde e a educação. Por exemplo, o processo de escolarização in-fluencia a capacidade das pessoas para vi-verem melhor e terem uma vida saudável, ao mesmo tempo em que também impacta a liberdade de participação em atividades econômicas e políticas. Ambas, por con-seguinte, impactam o desenvolvimento de uma sociedade.

A educação, como uma das oportuni-dades sociais, é aquela que interessa discu-tir mais detalhadamente e, na perspectiva apresentada, também é concebida numa relação dialética, tanto como uma das me-didas de desenvolvimento, quanto como um motor do mesmo. Parte-se do pressu-posto de que a educação, para que atue pela expansão das liberdades na direção desse desenvolvimento e resulte na ampliação das oportunidades, ela própria deve assu-mir a centralidade das pessoas nas políti-cas e práticas educacionais como sujeitos de desenvolvimento.

A essa altura cabe pensar na relação que dá título a essa seção: Desenvolvimen-to Humano é Movimento. A perspectiva e proposição atual do PNUD Brasil é a de que a relação entre desenvolvimento e movi-mento humano são íntimas. Nos referimos aqui a movimento humano como o conjun-to de ações motoras que todos nós empre-endemos para viver. Esse conjunto com-

OS fINS E OS MEIOS DO DESENVOLVIMENTO ExIGEM QUE A PERSPECTIVA DA LIBERDADE SEjA

COLOCADA NO CENTRO DO PALCO. [...] AS PESSOAS TÊM DE SER VISTAS COMO

ATIVAMENTE ENVOLVIDAS – DADA A OPORTUNIDADE – NA CONfORMAÇÃO DE

SEU PRóPRIO DESTINO, E NÃO APENAS COMO BENEfICIáRIAS PASSIVAS DOS

fRUTOS DE ENGENHOSOS PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO. O ESTADO E A

SOCIEDADE TÊM PAPÉIS AMPLOS NO fORTALECIMENTO E NA PROTEÇÃO DAS CAPACIDADES HUMANAS. SÃO

PAPÉIS DE SUSTENTAÇÃO, E NÃO DE ENTREGA SOB ENCOMENDA”

( s e n , 2 0 0 0 , P . 7 1 ) .

“preende tanto ações de vida diária como andar, comer, lavar-se, vestir-se etc., como também ações ocupacionais – movimentos corporais do mundo do trabalho, e ainda ações que empreendemos no nosso tempo livre. O PNUD Brasil reconhece nesse úl-timo conjunto de ações um papel crucial para o Desenvolvimento Humano, pois é nelas que cada indivíduo pode fazer opções e escolhas que muito contribuirão para seu desenvolvimento. Compreendem-se aqui as atividade físicas e esportivas realizadas com o propósito de saúde, de cultura e de lazer. Vejamos três cenários para que pos-samos melhor expressar a compreensão imbricada entre Desenvolvimento Huma-no e Movimento Humano.

Em cada um desses cenários vemos di-ferentes situações que demarcam o porquê da tese sobre a relação entre Desenvolvi-mento Humano e Movimento Humano. No Cenário 1, vemos uma senhora que sem

Dona Maria das Mercedes chega junto com seu neto, um rapaz alto e forte. Dona Maria das Mer-cedes caminha com a ajuda de seu neto, ela re-clama de mal-estar e dores nas costas. a equipe de triagem avalia que o caso dela não inspira ur-gência, ela recebe uma etiqueta verde em forma de bolinha na roupa. isso significa uma demora de até quatro horas para ser atendida. No primei-ro momento, Dona Maria das Mercedes não en-tende o motivo da demora e pede ajuda a todo atendente que por ela passa. Todos explicam a ela que seu caso não é grave, ela só precisa ter um pouco de paciência. aos poucos Da. Maria das Mercedes vai se acalmando e começa a conversar com quem está ao seu lado. ao contar sua histó-ria, as dores e o mal-estar parecem desaparecer e Da. Maria das Mercedes nos revela que ela mora no “País da Mooca”, mas que ela veio muito jovem para são Paulo, viajando muitos dias do interior do Piauí até chegar aqui. ela veio com 20 anos para cá. e sempre viveu no País da Mooca desde então, e lá se vão 70 anos. Descobrimos então que Da. Maria das Mercedes tem 90 anos. Não parece. a essa altura ela já está de pé e vai con-versando e dando conselhos para todo mundo sentado esperando a vez. e novamente ela diz: “tenho uns 90 anos, mas não fico parada em casa não, faço tudo, limpo, lavo, cozinho, vou na feira, não fico sentada, quem fica sentado encolhe!....a gente não pode parar, tem que se movimentar, porque vida é movimento!” E Da. maria das mer-cedes continuou já sem dores ou reclamações e foi “curando” muita gente que ali estava com menos da metade da idade dela. ◊

9h, domingo, pronto atendimento do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, São Paulo

CENáRIO #1

Assim, a liberdade proposta como fim e meio do desenvolvimento sugere que o alcance do de-senvolvimento almejado – a expansão das liber-dades das pessoas – não pode se dar por outro

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pnud // 201612 13caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

Duas mulheres em seus trinta e poucos anos, caminham apressadas se prote-gendo do frio que cai sobre a rua cheia de árvores. São trabalhadoras domésti-cas se dirigindo às casas onde vão traba-lhar. uma delas reclama da patroa para a outra. Ela diz: “eu falei para minha patroa que precisava sair às 17h na quarta e na sexta para dar tempo de eu chegar na academia de ginástica na hora da aula de aeróbica que quero fazer...e imagine ela me disse que eu não preciso fazer ginás-tica porque eu já faço exercício o dia todo no trabalho!”. como assim, pergunta a amiga. E ela responde: “a patroa me disse que varrer, lavar, limpar, esfregar e tudo mais que eu faço o dia inteiro já era bastante exercício para o dia! Tudo para me dizer que eu não precisava sair 17h e nem ir perder tempo na acade-mia! Imagine! como se essas coisas que a gente faz no trabalho fossem iguais a atividade da academia! capaz?!”. ◊

7h, Terça-feira, Bairro de Classe Média Alta de Cotia, São Paulo

CENáRIO #2

Dividia meu tempo entre São paulo e Muzambinho. Em São paulo buscava es-tudar, fazer um mestrado. Em Muzambi-nho trabalhava, era docente na Escola Superior de Educação Física. as aulas ocorriam em sua maioria no período no-turno, mas eu não saia da escola, ficava na biblioteca, me reunia com alunos que queriam fazer pesquisa. Já no final da tarde eu voltava andando para a “mi-nha casa” na Rua 7 de setembro, não me lembro o número, mas ali do lado da casa eu me lembro o que havia: um terreno vazio. Da janela do quarto onde dormia eu tinha uma visão privilegiada desse terreno, vazio como disse, e pla-no, ótimo para um campinho de futebol, mas não é que um grupo de crianças en-tre 9 a 11 anos de idade resolveu fazer desse espaço uma quadra de voleibol?! Estava então para presenciar algo fan-tástico. aqui cabe lembrar que o volei-bol era o esporte do momento, o time que depois ficou conhecido como da ge-ração de prata tinha a atenção da mídia, estava na tV. as crianças queriam jogar voleibol. E quase todas as tardes elas iam para lá jogar “voleibol”. Não havia

1983, Muzambinho, Minas Gerais

CENáRIO #3

marcações no piso, havia uma risca tor-ta feita a galho de árvore dividindo a “quadra” em duas partes aproximada-mente iguais. as crianças se dividiam e começava o jogo. alguém batia na bola com a mão e bater é o melhor verbo para descrever a ação. a bola não era lançada, ela era espirrada, mas não importava, uma vez que a bola estava em sua trajetória aérea eram todos ten-tando fazê-la ficar no ar o quanto fos-se possível e tentavam mandá-la para o outro lado da quadra. E ali, naquele mundo de mãos tentando fazer a bola desafiar a lei da gravidade ouviam-se os gritos de “Wiliam” levanta para “Renan” que toca para “Bernard” ou “Bernard” levanta para “Xandó” e... ponto!!! Havia também um “juiz de rede” que se encar-regava de julgar os movimentos escusos e garantir o bom desenrolar da peleja. ao espectador experimentado aquilo era tudo menos voleibol, mas para as

crianças não importava, a bola po-dia tocar no chão, duas, três vezes, podia haver condução, tudo valia e o jogo se desenrolava. Fiquei ali da janela vendo-os jogarem durante seis meses. aos poucos o campinho foi virando quadra, a cada semana aparecia uma marcação nova aproxi-mando-o de uma quadra de voleibol. aos poucos as batidas na bola foram dando lugar ao toque, à manchete, à cortada. E o jogo não cessava. Sem sequência pedagógica, sem filas, sem exercícios educativos, apenas o jogo e, aos poucos, aparecia o bloqueio, a finta, e logo entravam em quadra os Bernard, os Wiliam, os Renan, os Xan-dó, entre outros, tomando posição, cada um no seu ritmo e individualida-de e tudo isso sem influência de um adulto. Num prazo de seis meses as crianças construíram a sua própria pedagogia do esporte. ◊

fIQUEI ALI DA jANELA VENDO-OS jOGAREM

DURANTE SEIS MESES. AOS POUCOS O CAMPINHO

fOI VIRANDO QUADRA, A CADA SEMANA APARECIA

UMA MARCAÇÃO NOVA APROxIMANDO-O DE UMA

QUADRA DE VOLEIBOL.”

“ MaTyas ReHak / sHUTTeRsTock.coM

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dúvida deve ter enfrentado, e talvez ainda en-frente, preconceitos sobre sua condição de mu-lher. Pela descrição de onde veio e como veio a São Paulo, do bairro onde ela mora, há indícios de que possivelmente ela teve poucas oportuni-dades ou graus de liberdade de escolha no que concerne ao seu desenvolvimento. Todavia, é im-portante ressaltar que diante dos obstáculos que ela enfrentou a vida toda, diante dos percalços sociais que talvez tenham marcado sua trajetória, ela reconhece que em seu viver o mover-se foi e é crucial para que, do alto dos seus 90 anos, con-tinue ativa. Essa capacidade de se movimentar parece ser fonte de resiliência, como denota a sua fala final: “vida é movimento”, que bem podia ser a epígrafe do presente documento. Essa frase é praticamente um aforismo que se juntaria a ou-tro: vida é desenvolvimento. Logo por dedução: Desenvolvimento é Movimento.

No Cenário 2, a trabalhadora doméstica que reclama de sua patroa mostra igualmente um en-tendimento de atividade física que vai além do que é preconizado, inclusive pelos meios acadêmicos que tratam da relação atividade física e saúde. É comum vermos ações de promoção da sáude pela atividade física indicando a necessidade de se ter um gasto energético diário de pelo menos trinta minutos em atividade vigorosa, que bem pode ser andar até a padaria (ao invés de ir de carro), ou arrumar o jardim de casa. A trabalhadora mostra que atividade física é mais do que gasto energéti-co! Atividade física é a escolha de um espaço de ação que não pode se confundir com o que é ins-trumental e ocupacional. Trata-se de um momen-to do dia em que a pessoa escolhe para dedicar a si própria, para exercer o direito de se movimentar. Isso faz com que a prática da atividade física em si pela pessoa tenha um contexto social significati-vo, posto que ela escolhe o que fazer, com quem fazer e como fazer. Reduzir a atividade física ao gasto energético é deixar escapar o que nos faz apreciar os movimentos corporais e experimentar sensações e sentimentos quando nos movimenta-mos conosco e com os outros.

Os dois primeiros cenários foram relatados aqui de forma proposital pois eles desenham con-

textos de privação pessoal, social e cul-tural em que os nossos personagens, não obstante, buscam dentro de tantas amar-ras buscar exercer o direito do que a vida lhes oferece a priori: a capacidade para se movimentar. Assim, mesmo dentro de li-mites, os casos relatados ilustram como a atividade física pode ser um importante instrumento para ampliar as escolhas das pessoas. Essa possibilidade incide direta-mente na noção de Desenvolvimento Hu-mano e na abordagem das capacidades. Nas duas situações, as pessoas fazem es-colhas possíveis, em sua realidade socioe-conômica e cultural, e lutam por elas por julgá-las importantes para o seu viver e o seu desenvolvimento.

Vale destacar que essas escolhas têm nas atividades físicas uma centralidade que as tornam tanto fim como meio para

OS DOIS PRIMEIROS CENáRIOS fORAM RELATADOS AQUI DE fORMA PROPOSITAL POIS ELES DESENHAM CONTExTOS DE PRIVAÇÃO PESSOAL, SOCIAL E CULTURAL EM QUE OS NOSSOS PERSONAGENS, NÃO OBSTANTE, BUSCAM DENTRO DE TANTAS AMARRAS BUSCAR ExERCER O DIREITO DO QUE A VIDA LHES OfERECE A PRIORI: A CAPACIDADE PARA SE MOVIMENTAR.

o desenvolvimento. A atividade física é meio por-que as pessoas podem realizar-se pessoalmen-te e socialmente em capacidade e competências (biológicas, psicológicas, sociais e culturais), que transcendem a atividade física em si. A atividade física é fim porque as pessoas adquirem sentidos e significados particulares a cada um e só possíveis de apreender por quem se movimenta. Ela per-mite uma experiência pessoal intransferível, um prazer pelo prazer de se movimentar.

O último cenário compreende uma experiên-cia de crianças de longo prazo e que igualmente denota o papel da agência no desenvolver. Crian-ças, no caso meninos, optam por uma prática es-portiva desconhecida a eles, e ainda não típica do seu gênero (nos anos 1970 e 1980, voleibol era con-siderado um esporte de “meninas”). Ele se organi-zam, ou melhor se auto organizam, num exemplo de pedagogia do agente autônomo como está ins-crito na definição de Desenvolvimento Humano:

um processo de ampliação das escolhas, para que se tenha capacidade de desejar e realizar o que se quiser e se puder ser.

O espaço da escola é crucial para os cenários aqui desenhados. A escola como formadora das pessoas em sua individua-lidade e em sua sociabilidade pode, e so-bretudo deve, ser o sítio em que a crian-ça e o jovem apreendam a sua agência no desenvolvimento, e de forma amparada e mediada pela escola, possam construir as capacidades para exercer essa agência. A possibilidade de construção e exercício da agência no seu próprio desenvolvimento é o que pode tornar uma Escola verdadeira-mente Ativa. Antes de seguir adiante no tratamento de como podemos vislumbrar uma escola que pode ser ativa vamos des-tacar mais alguns pontos sobre o termo atividade da expressão atividade física.

Atividade é um termo genérico utili-zado para denotar movimento, compor-tamento ou ação de um organismo e, por isso, costuma vir acompanhado de um adjetivo para melhor qualificá-lo: ativi-dade motora, atividade física, atividade esportiva, entre outros. Atividade, assim como desenvolvimento, é um conceito multifacetado e o adjetivo que a qualifica remete a finalidades distintas e concep-ções diversas. Toda atividade física para ocorrer necessita de energia e informação2. As dimensões energética e informacional não representam polos opostos, mas ex-tremos de um contínuo. A energia resulta de uma série de processos metabólicos que viabilizam as contrações musculares com intensidades e durações variadas, de acor-

2 a atividade só é possível para o organismo se há energia livre para trabalho e informação disponível para mediar os processos energéticos, cf. Manoel, E. de J. (1989). Desenvolvimento do comportamento motor humano: uma abordagem sistêmica. Dissertação (Mestrado). São paulo: universidade de São paulo.

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do com a direção (intencionalidade) e o contexto em que se realizam. Direção e contexto envolvem a dimensão da informação da atividade. A infor-mação controla a energia do sistema, otimizando seu gasto na medida do possível. Ela consiste de uma série de processos denominados executivos: atenção, percepção, tomada de decisão, memó-ria, programação, controle e avaliação. Embora os termos atividade, atividade física, atividade mo-tora ou exercício físico, sejam muitas vezes usa-dos co mo se fossem sinônimos, há implicações importantes no sentido que eles assumem e nas bases epistemológicas em que se sustentam (qua-dro 1).

A associação do termo atividade física à di-mensão energética se dá pela definição clássica do termo como qualquer movimento corporal produzido pelos músculos esqueléticos do qual resultam dispêndios energéticos. A partir dessa definição, nota-se que os conceitos que se apro-ximam do termo atividade física, seu foco, tipo de intervenção, nível de análise, o aproximam

de uma base de conhecimentos das áreas biológica e médica. Entretanto, quando se busca a sua aproximação com a concepção de Desenvolvimento Humano na perspec-tiva da liberdade das pessoas como agentes do seu próprio desenvolvimento, esse ter-mo não parece ser o mais adequado.

Ao se pensar no Desenvolvimento Hu-mano como ampliação das escolhas das pessoas para que elas tenham capacidades e oportunidades para serem aquilo que desejam ser, seria mais pertinente tratar o termo atividade em sua dimensão in-formacional. Isso porque se defende aqui que o físico da Educação Física, o físico da atividade, o físico do esporte não se refere ao músculo, ou à força, ou à velocidade, ou ainda ao gasto energético. O físico se re-fere ao mover-se corporalmente, concre-tamente. Se refere aos sentidos do corpo dados pela propriocepção, que dá a medi-da de todas as coisas e assim dá aos sujeitos

suas próprias medidas, lhe diz quem ele é, dá sus-tentação à sua identidade.

A dimensão informacional da atividade re-conhece que o que define uma ação não são os movimentos realizados, mas o objetivo que se deseja, a intenção pretendida. Quando os meios para realizar a ação envolvem necessariamen-te movimentos, podemos denominá-la de ação motora. A ação é motora porque os meios para realização do objetivo consistem de movimentos corporais, e a forma como são implementados tem direta influência para o sucesso da ação. A noção de ação motora, analogamente ao conceito de Desenvolvimento Humano, envolve o grau de liberdade de escolha que se amplia pela prática, pela experimentação.

A aproximação entre o Desenvolvimento Hu-mano e a ação motora converge para um processo em que agir é um direito e um ato de conhecer so-bre o que se age e sobre como se age. Vale lembrar o conceito de atividade proposto por Leontiev (apud VALSINER, 1988) de que toda atividade en-volve uma estrutura circular aferência-eferência em que o indivíduo age sobre objetos e a represen-tação dos mesmos não é um reflexo das proprieda-des do objeto, mas fruto da atividade do indivíduo sobre ele. A essa concepção se junta a de cognição encarnada, de Francisco Varela, que lembra que uma das grandes contribuições de Jean Piaget foi mostrar que “a cognição é fundamentada na ati-vidade concreta de todo organismo, isto é, o aco-plamento sensório-motor” (VARELA, 1999, p.8).

Indivíduo e ambiente são indissociáveis, ain-da que distintos, por um fato biológico: só existe organismo porque existe ambiente e vice-versa. Só foi possível a um organismo transformar-se em várias direções graças ao histórico de tran-sações – experiências – entre ele e seu meio fí-sico e social. O nosso corpo emerge de inúmeras transformações oriundas dessas experiências, e aí está a origem de uma cognição encarnada. A nossa retina não é uma estrutura física sem vida que simplesmente responde à estimulação lumi-nosa: a retina processa as informações que tem valor biológico (valor de vida, de sobrevivência) para o organismo. A propriocepção informa sobre

a postura do corpo a partir de ações, isto é, através da avaliação de tensões efetua-das numa magnitude mínima, mas forte o suficiente para dar indicadores de posição do corpo e de partes dele. Percepção e ação formam um ciclo sem que uma anteceda a outra. Para perceber, é preciso agir, para agir é preciso perceber. Assim, não se pode separar a percepção da ação. Não se pode separar atividade física de atividade men-tal. Atividade física e mental são elementos inseparáveis de um mesmo sistema que se concretiza nas experiências corporais.

A circularidade entre a percepção e a ação, entre a ação e percepção, faz com que seja possível apreender noções e conceitos sobre fatos e eventos, sobre coisas e obje-tos por meio da ação motora, o que muitos denominam de aprendizagem pelo movi-mento. O lugar do corpo e dos movimentos corporais na escola já foi e continua sendo

QUADRO I. : DIMENSÕES DA ATIVIDADE fíSICA

CARACTERíSTICAS DIMENSÃO ENERGÉTICA DIMENSÃO INfORMACIONAL

ATIVIDADEatividade física atividade motora

Exercício físico tarefa motora

Movimento ação

INTERVENÇÃO treinamento prática

fOCOcapacidades físicas Habilidades motoras

aptidão física práticas corporais

MECANISMOFunções metabólicas Funções executivas

Gasto energético controle/coordenação

NíVEL DE ANáLISE Bioquímico/fisiológico psicológico/sociocultural

ORIENTAÇÃO fILOSófICADualismo Monismo

Mente-corpo cognição encarnada

OS DOIS PRIMEIROS CENáRIOS fORAM RELATADOS AQUI DE fORMA PROPOSITAL POIS ELES DESENHAM CONTExTOS DE PRIVAÇÃO PESSOAL, SOCIAL E CULTURAL EM QUE OS NOSSOS PERSONAGENS, NÃO OBSTANTE, BUSCAM DENTRO DE TANTAS AMARRAS BUSCAR ExERCER O DIREITO DO QUE A VIDA LHES OfERECE A PRIORI: A CAPACIDADE PARA SE MOVIMENTAR.

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defendido a partir dessa perspectiva. O profes-sor de física na escola pode se valer do mover-se corporal de seus alunos para que eles apreendam conceitos de mecânica clássica. Todavia, vamos destacar a aprendizagem que vem do próprio mover-se corporalmente. O que na apresentação desse caderno denominamos de “conhecer no mover-se”. Ela proporciona um conhecimento pessoal3 e intransferível para o outro (diferente dos conceitos de Mecânica que uma vez apreen-didos por uma pessoa, podem ser transmitidos para outra pessoa). Trata-se de uma experiência no sentido pleno de construção de um significado

3 usamos deliberadamente o termo cunhado por Michael polanyi no seu livro personal Knowledge, london: Routledge, 1958.

pessoal de si e do mundo. A experiência do mover-se tem contornos de uma experiên-cia estética e, como tal, pode ser libertado-ra (BRACHT, 2012). Sem prejuízo da apren-dizagem pelo movimento, destacamos aqui o aprender ou conhecer no mover-se.

O conceito de experiência pode ser tratado tanto como produto de um pro-cesso, quanto o próprio processo em si. A experiência como processo consiste na dinâmica que se estabelece entre um or-ganismo e o meio no qual ele age (nesse sentido, o conceito de atividade de Leon-tiev se mescla com o de experiência). Essa dinâmica envolve exploração, mas tam-bém o uso e transformação do meio e do agente (o indivíduo). Dessa forma, a expe-riência como produto remete aos resulta-dos dessa dinâmica e eles consistem numa classe de efeitos que variam de processos bioquímicos até psicológicos, dos quais uma classe específica de resultado é o que se denomina de aprendizagem. A expe-riência é tanto uma função de condições externas do ambiente como da natureza do organismo que a vivencia.

Por tudo isso, é importante considerar que a experiência dá o sentido e o contexto para as atividades físicas e esportivas. Nes-sa lógica, o termo atividade ou ação mo-tora é mais pertinente na medida em que não determina o desenvolvimento e nem o desenvolvimento a determina, ambas co-agem entre si, tendo a experiência como o tecido que as envolve e as faz se influencia-rem de forma recíproca. É no âmbito dessa relação multifacetada que se pode vislum-brar como estabelecer os vínculos entre atividade e Desenvolvimento Humano.

A essa altura, cabe nos voltarmos para o espaço da escola a fim de refletir em que medida esse espaço pode caracterizar uma Escola Ativa, situando a noção de ativida-de física no campo da experiência corporal como um eixo fundamental para uma pe-dagogia ativa.◊

NÃO SE PODE SEPARAR ATIVIDADE fíSICA DE

ATIVIDADE MENTAL. ATIVIDADE fíSICA E

MENTAL SÃO ELEMENTOS INSEPARáVEIS DE

UM MESMO SISTEMA QUE SE CONCRETIZA NAS ExPERIÊNCIAS

CORPORAIS.

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2 Escola ativa no contexto do desenvolvimento humano

capítulo

a proposição para uma Escola Ativa parte de uma apreciação daquilo que é consi-derado como um dos males da sociedade industrial: o sedentarismo. Ao longo da

história da humanidade, a vida dos indivíduos e das comunidades sempre esteve apoiada em ati-vidades físicas: a busca e produção de alimentos, o transporte, a construção e uso de utensílios e da própria casa. A subsistência e a sobrevivência dos seres humanos dependia de sua capacidade para se movimentar. Todavia, com as transformações que se iniciaram com a emergência da agricultura (cerca de 10 mil anos atrás) e principalmente com a Revolução Industrial (cerca de 300 anos atrás), houve uma crescente urbanização dos conglome-rados humanos, acompanhado da transformação dos meios e modos de produção e de consumo. Os avanços tecnológicos desencadearam, e con-tinuam desencadeando, mudanças na relação do ser humano com o ambiente, resultando em uma diminuição drástica na necessidade de se movi-mentar para executar ações no cotidiano.

Etimologicamente, o termo sedentário deriva do latim sedere, que significa sentar. Em outras palavras, sedentária é aquela pessoa que realiza grande parte das suas atividades cotidianas sen-tada. E um indivíduo sentado, seja olhando para um monitor tanto no trabalho quanto no lazer, seja locomovendo-se sentado em algum veículo, poderia, facilmente, ser a caricatura do ser hu-mano contemporâneo. Isso demonstra que, nes-ses últimos séculos, em uma escala não conhecida anteriormente, o desenvolvimento econômico e tecnológico tem tido grande sucesso em evitar a necessidade de se fazer atividades físicas em vá-rios contextos, inclusive no ambiente escolar.

As evidências de que um modo de vida se-dentário está associado ao aumento das doenças crônico-degenerativas na população mundial são muito convincentes e sugerem que este estilo de vida pode impactar de forma negativa na saúde humana. Na época atual, se por um lado as pes-soas vivem mais e sofrem menos com doenças infecciosas e fome, por outro lado, aumentou a ocorrência das chamadas doenças da civilização, como diabetes e distúrbios cardiovasculares, for-

temente associadas aos novos hábitos. Segun-do a Organização Mundial da Saúde (OMS), saúde é “(...) um estado de completo bem-es-tar físico, mental e social e não meramente a ausência de doenças e enfermidades” (OMS, 2015) e, em seu relatório Recomendações Glo-bais para Atividade Física e Saúde, afirma que o sedentarismo é o quarto fator de risco mais importante para a mortalidade no mundo e aponta a atividade física como um fator de prevenção de doenças:

“A PARTICIPAÇÃO REGULAR EM ATIVIDADES fíSICAS REDUZ O RISCO DE DOENÇAS CORONARIANAS, ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL, DIABETE, HIPERTENSÃO, CâNCER DE COLO, CâNCER DE MAMA E DEPRESSÃO. ALÉM DISSO, A ATIVIDADE fíSICA É UMA DETERMINANTE CHAVE DO DISPÊNDIO ENERGÉTICO E, ASSIM, É fUNDAMENTAL PARA O BALANÇO ENERGÉTICO E CONTROLE DE PESO.”

( O m s , 2 0 1 0 , P . 1 0 ) .

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orientações para o planejamento e desen-volvimento de Escolas Ativas - uma ten-dência crescente em vários países do mun-do - definidas como aquelas que integram opções de atividade física ao cotidiano es-colar: antes, durante e após as aulas.

As proposições para as políticas de saú-de, de fato, têm passado pelo contexto esco-lar, a exemplo do relatório da OMS lançado há 15 anos, com apontamentos para a efe-tivação de políticas educacionais que pro-movam a vida ativa nas escolas, sustentado pelas premissas de que:

Tais iniciativas reconhecem na escola uma oportunidade para dar escala a uma política de longo prazo que visa à mudanças no envolvimen-to de crianças e jovens com atividades físicas. Nessa política, a Escola Ativa é vista tanto como um local para a prática de atividade física siste-mática pelas crianças e jovens, como também um lugar para se aprender sobre atividade física re-lacionada à saúde e sobretudo dar sentido a sua prática, programar a sua prática e entender como ela pode e deve fazer parte do seu cotidiano. Ba-seado em evidências, existe um consenso de que o envolvimento rotineiro (e prazeroso) com ati-vidades físicas durante essa fase da vida, aliado à compreensão da relação entre atividade física e a promoção da saúde, pode impactar positivamen-

5 Designed to move active schools: a practical guide for school leaders. Disponível em: http://e13c7a4144957cea5013-f2f5ab-26d5e83af3ea377013dd602911.r77.cf5.rackcdn.com/resources/pdf/en/active-schools-full-report.pdf. acesso em: 27 nov. 2015.

4 Desenhado para o Movimento é uma plataforma de ação global, liderada no Brasil pelo programa das Nações unidas para o Desen-volvimento (pNuD). Disponível em: http://pt.designedtomove.org/

te na relação desses jovens com atividade física quando adultos e na capacidade des-ses de tomar decisões adequadas sobre o que fazer e como fazer para adotar e man-ter um estilo de vida ativo.

No Brasil, como no resto do mundo, os índices de sedentarismo não têm diminu-ído a despeito do extenso corpo de conhe-cimento produzido nas últimas décadas ter comprovado os benefícios da atividade física. O DIESPORTE (BRASIL, 2015), pes-quisa realizada pelo Ministério do Esporte apresentada em 2015, revelou que 45,9% dos brasileiros são sedentários e, destes, 45% pararam de praticar atividades físicas regulares entre os 16 e 24 anos, justamen-te no período entre o final da vida escolar e início da vida adulta. Ainda que a escola não seja a única responsável pelos hábitos das pessoas, o fato de 48% dos sedentários reconhecerem que iniciaram a prática de atividade física na escola, indica o poten-cial da escola brasileira em influenciar a adoção de um estilo de vida ativo e dura-douro na vida adulta.

Apesar da escola ser um local em que uma parcela significativa de indivíduos ini-

Dos brasileiros reconhecem que são sedentários

45,9%Dos sedentários pararam de praticar atividades fisicas

entre os 16 e 24 anos

45%Dos sedentários iniciaram

a prática de atividade física na escola

48%

Na busca de compreender e intervir sobre esse problema, que veio se acentuando ao longo dos últimos séculos da história humana, é que o ter-mo atividade física deixa de ser considerado como a mera realização de movimentos corporais, e passa a ser visto como um processo sistematizado de exercitação pessoal, tornando- se uma possível resposta ao problema do sedentarismo.

O DESAfIO DA PROMOÇÃO DE UM ESTILO DE VIDA ATIVO E O PAPEL DA ESCOLA

Q ualquer movimento corporal produzido por músculos esqueléticos que resulta em gasto energético, abrangendo desde ações cotidia-

nas como caminhar para ir ao trabalho ou carregar as compras, até fazer ginástica ou praticar espor-te, é considerado uma atividade física. Muitas ve-zes, a expressão atividade física é confundida com exercício físico, caraterizado por uma sequência planejada de movimentos que é repetida sistema-ticamente com o objetivo de elevar o rendimento e a aptidão física, como a melhora da resistência cardiorrespiratória, força ou composição corporal (BOUCHARD; SHEPHARD, 1994). Exercício físi-co, assim como esporte, dança ou transporte ativo (andar a pé ou de bicicleta) são categorias de ativi-dade física. A contribuição do envolvimento regu-lar com atividades físicas para a saúde do indiví-duo é pungente e isso tem colocado o problema do sedentarismo na agenda mundial. Na vanguarda desse movimento, que vem se fortalecendo desde seu surgimento na segunda metade do século pas-sado, estão inciativas mundiais de promoção de um estilo de vida mais ativo a exemplo da plataforma Designed to Move (DTM), lançada no Brasil em 2013 com o nome Desenhado para o Movimento. Seme-lhante a outras iniciativas, a DTM tem um caráter multisetorial e busca mobilizar organizações para agirem coletivamente, alicerçadas em duas gran-des ações: tornar as crianças mais ativas e reinte-grar a atividade física no cotidiano das pessoas4.

Como estratégia principal para fomentar a ati-vidade física entre os mais jovens, essa plataforma apresenta um documento publicado em 20155 com

A prática de atividades físicas nos anos iniciais de vida é essencial para adquirir disposição, ha-bilidades necessárias e experiências favoráveis para manter o hábito regular de exercícios físi-cos ao longo da vida. além disso, essa participa-ção ajuda a manter a condição de saúde adqui-rida durante a vida adulta e contribui para um envelhecimento saudável;

As oportunidades para prática de atividade físi-ca são um direito essencial de toda criança e jo-vem, e sua provisão é reponsabilidade dos pais, da comunidade local, do sistema educacional e da sociedade como um todo

Uma escola ativa é uma escola mais saudável e com melhor desempenho, e um lugar melhor para se trabalhar, estudar e estar (oMS, 2000).

FoNTe: DiesPoRTe (bRasil, 2015)

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pnud // 201624 25caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

ciou de maneira sistemática a prática de atividades físicas, a escola também apresenta uma configura-ção ambígua que, por outro lado, acaba por valori-zar o comportamento sedentário. Quase que na to-talidade dos países desenvolvidos, as crianças e os jovens passam grande parte da sua vida na escola, tendência que começa a ser observada também no Brasil, com a implantação de políticas de educação integral e ampliação do turno escolar. Entretanto, a arquitetura física e as rotinas didático-pedagó-gicas da escola, no seu formato atual, priorizam uma organização de seus espaços e tempos que re-força, e muitas vezes determina, um estilo de vida sedentário em seus alunos. A imagem que melhor representa a instituição escolar, desde há alguns séculos, é a dos alunos sentados em carteiras por longos períodos, seja ouvindo o professor, escre-vendo, participando de uma discussão, ou fazendo exames de avaliação, dentre outros.

Somado a isso, o relatório sobre o status da Educação Física escolar no mundo publicado em 2014 pela UNESCO revela que, em grande par-te dos países, apesar da existência de dispositi-vos legais e normas gerais, a oferta da disciplina não é algo assegurado universalmente durante os anos escolares, nem para todos os alunos. De acordo com o documento, as aulas de Educação Física apresentam uma frequência maior de can-celamentos do que outras disciplinas, além dos professores reportarem que não gozam do mesmo status profissional que aqueles de disciplinas mais prestigiadas na escola, como Línguas ou Matemá-tica (UNESCO, 2014).

Não obstante, o documento também apresenta críticas aos currículos da disciplina em que ainda prevalecem conteúdos de caráter esportivo com ênfase competitiva. O relatório citado é preocu-pante porque a natureza curricular da Educação Física na escola é o que garantiria contato e aces-so com algum tipo de atividade física sistemática para a totalidade dos alunos. No entanto, o docu-mento desvela uma realidade em que essas aulas não estão garantidas e nem a sua qualidade.

As evidências que apontam no sentido de que o engajamento com a prática de atividade física durante a idade escolar estaria positivamente as-

sociado à melhora geral da saúde física não tem sido suficientemente convincentes para imprimir mudanças na rotina escolar. O que se constata é que ainda há lacunas entre as proposições de políticas públicas voltadas para a promoção de atividade físi-ca na escola, sua implantação e a geração de impactos efetivos. Mais recentemente, com vistas a fortalecer esse movimento, novas pesquisas têm sido apresentadas em defesa da atividade física dentro das escolas, de-vido aos avanços da neurociência, que tem encontrado relações positivas entre ativi-dade física, funções cognitivas e desempe-nho escolar. Esses resultados trazem novos elementos para a discussão, até então, bas-tante voltada para os seus impactos na di-mensão da saúde biológica.

NOVAS PESQUISAS TÊM SIDO APRESENTADAS EM

DEfESA DA ATIVIDADE fíSICA DENTRO DAS ESCOLAS,

DEVIDO AOS AVANÇOS DA NEUROCIÊNCIA, QUE TEM ENCONTRADO RELAÇÕES

POSITIVAS ENTRE ATIVIDADE fíSICA, fUNÇÕES COGNITIVAS

E DESEMPENHO ESCOLAR.

Se considerarmos a noção de uma escola que promova um estilo de vida ativo, vemos que a esco-la que é Escola Ativa torna-se um contexto rico para o Desenvolvi-mento Humano tendo como eixo (não exclusivo) as atividades físicas e esportivas. O debate em torno das Escolas Ativas envolve algu-mas polêmicas que tem ocupado o centro das discussões no campo da educação há mais de um sécu-lo. Uma delas, senão a principal, remete ao conceito de educação integral na escola, mas a dicoto-mia mente-corpo tão presente no pensamento ocidental fez com que o corpo fosse marginalizado na es-cola, e com isso as atividades físi-cas e esportivas se tornassem me-ros adereços no ambiente escolar. Como se fossem algo que traz ale-gria ou paixão, mas nunca conhe-cimento para a criança e o jovem.

Esse é um dos motivos pelos quais, ainda hoje, a ideia de uma Escola Ativa esbarra no pensamen-to obtuso de alguns pedagogos e gestores de educação que veem no corpo uma máquina, ainda que intrincada, para transportar men-tes. A seguir, apresentaremos o resultado de nossas investigações conceituais e documentais acerca da Escola Ativa no pensamento pe-dagógico brasileiro, afim de buscar um alinhamento conceitual e pe-dagógico para a proposição de uma visão de Escola Ativa condizente com o cenário brasileiro. ◊

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agentes de aprendizagem, que reconhece a indissociabilidade entre teoria e prática, e que privilegia a aprendizagem por in-termédio de ações concretas baseadas na busca de soluções para problemas reais e cotidianos da comunidade escolar. Entre os vários pensadores que influenciaram tal corrente educacional, John Dewey (2011) é analisado com maior detalhamento por-que suas proposições exibem relação com o conceito de Desenvolvimento Humano de Mahbub ul Haq e Amartya Sen pela cons-trução semântica de suas ideias.

Assim como ul Haq e Sen posicionam a liberdade como questão central – meio e fim – do desenvolvimento, Dewey (1979) considera a liberdade como elemento fun-damental na educação, defendendo o exer-cício da liberdade tanto no processo de aprendizagem: meio; como uma finalidade: formação de sujeitos livres. Para Dewey, a liberdade é fundamental para que o aluno seja sujeito nas experiências educativas e de seu próprio desenvolvimento. Ele reconhe-ce que “a educação é um processo social, é desenvolvimento. Não é a preparação para a vida, é a própria vida” e, portanto, qual-quer coisa que se espere dos jovens quando adultos deve ser vivida na escola. Da mes-ma forma, reafirma a centralidade e o papel ativo que os alunos devem ter no processo educativo como agentes do seu próprio de-senvolvimento, em contraponto à passivi-dade prevalecente nos modelos mais tradi-cionais de escola, reforçando o apelo a uma escola fundada em relações democráticas. A escola ativa organiza espaços e tempos para que crianças e jovens (e também seus pais e suas famílias) vivenciem experiências que proporcionam a construção de sua autono-mia, de sua capacidade para escolher, de seu pensamento reflexivo sobre sua condi-ção humana e social num grupo e numa so-ciedade. Assim, a escola ativa é um contexto de desenvolvimento, mas não se confunde com o desenvolvimento humano.

3 Escola Ativa no cenário da escola brasileiracapítulo

P ara os estudiosos da educação, o termo Es-cola Ativa remete, originalmente, ao movi-mento de educação progressista, também conhecido como Escola Nova, que surgiu

na América e na Europa no final do século XIX, e que ganhou força no Brasil no início do século XX. Várias propostas pedagógicas compuseram esse movimento sob influência de pedagogos como Ma-ria Montessori e Célestin Freinet, e filósofos como John Dewey. No Brasil, estas ideias foram introdu-zidas na mesma época por Rui Barbosa e ganharam força em 1932 com a divulgação do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, redigido por Fernando de Azevedo e assinado por Anísio Teixeira, entre outros intelectuais da época. O Manifesto defendia a universalização da educação pública, laica e gra-tuita e sofreu duras críticas da Igreja Católica e do governo com a instituição do Estado Novo.

Em síntese, esse movimento propôs abordagens pedagógicas voltadas para que os alunos aprendes-sem a conviver em uma sociedade democrática a partir de experiências no espaço escolar contextu-alizadas com a vida cotidiana, se contrapondo aos modelos de educação tradicional baseados na au-toridade exclusiva do professor, na passividade dos alunos e na transmissão de informações.

Atualmente, encontram-se referências à Es-cola Ativa baseadas em concepções similares, em que o processo educacional é centrado nos alunos e na aprendizagem significativa. Essa aprendiza-gem acontece em ações pedagógicas contextuali-zadas para que os alunos experimentem e descu-bram conhecimentos como forma de garantir que aprendam aquilo que precisam para viver fora da escola. As experiências, particularmente com es-colas multisseriadas e em zonas rurais, tiveram origem na Colômbia (MOGOLLÓN; SOLANO, 2011) e influenciaram, no Brasil, a criação do Programa Escola Ativa (BRASIL, 2010) pelo Ministério da Educação em 1997, ainda em vigor como uma das ações do Programa FUNDESCOLA, atendendo, prioritariamente, as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Portanto, o termo “ativa” para quali-ficar a escola se referia, e ainda se refere como nos exemplos acima, a uma visão de educação em que os alunos ocupam papel central como sujeitos/

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A expressão Escola Ativa, que se origina no pensamento de John Dewey, destaca os alunos como sujeitos da experiência educacional, man-tendo íntima relação com a democracia. É ainda mais interessante notar que Dewey fez reflexões sobre a importância da atividade física para o aprendizado escolar. Ao explanar sobre a centra-lidade das experiências na educação, ele tratou da relação entre liberdade de movimento e liber-dade de pensamento:

( d e W e Y , 1 9 7 9 , P . 6 3 )

“A LIMITAÇÃO QUE fOI IMPOSTA SOBRE AS AÇÕES ExTERNAS PELOS ARRANjOS RíGIDOS DA TíPICA SALA DE AULA TRADICIONAL, COM SUAS fILEIRAS E CARTEIRAS fIxAS E A ARREGIMENTAÇÃO MILITAR DE SEUS ALUNOS QUE Só PODIAM SE MOVIMENTAR A PARTIR DE SINAIS ESTABELECIDOS DE PERMISSÃO, RESTRINGIAM RIGOROSAMENTE A LIBERDADE MORAL E INTELECTUAL”

Dewey defendeu a liberdade de movimento dos alunos como uma condição necessária para o exer-cício da liberdade de pensamento. Além disso, des-tacou a importância dos movimentos pela própria natureza do processo de aprendizagem:

Vale ressaltar que a atividade física a que Dewey se refere, neste caso, nada tem a ver com a atividade física enfatizada pelas políticas públicas de promoção da saúde, cujo enfoque é energético, com base bioló-gica e médica. Sua visão de educação está calcada na aprendizagem pela experiência e, nesta, o mover-se tem uma finalidade em si mesmo. A experiência educativa se dá pela relação didática entre ação e reflexão, em que a segunda perde em sentido sem a primeira. A atividade física na experiência educativa se caracteriza por ações moto-ras, em que o indivíduo imagina e percebe o mundo físico e social, antecipa situações, julga o contexto para que seus movimentos se adequem ao entorno, ou ainda de modo que o entorno se adeque a eles. O mover-se permite ao sujeito testar hipóteses sobre suas transações com os contextos físico e social. Trata-se de um processo dinâmico de solução de problemas num sentido con-creto, encarnado e situado.

Em síntese, ele advogou em favor da prática da liberdade no campo educacio-

Existem, evidentemente, momentos em que a atividade intelectual é tão intensa que não demandam, necessariamente, uma atividade física ou movimentos corporais visíveis. Porém, a capacidade para esse tipo de atividade intelectual surge mais tarde [...]. Por isso, é preciso propiciar aos mais jovens breves intervalos de tempo para reflexões silenciosas que só poderão ser considerados como períodos de verdadeira reflexão se ocorrerem após ações mais concretas e que sejam utilizados para organizar o que foi obtido nos períodos de atividade em que as mãos e outras partes do corpo além do cérebro foram usados.”

nal, a partir da aprendizagem pela experiência que acontece na relação dinâmica entre indiví-duo e meio, em que os alunos são sujeitos e apren-dem conceitos, atitudes e técnicas fazendo, se movimentando. Na concepção do indivíduo como sujeito do desenvolvimento se considera que os processos de mudança ocorrem na medida em que o indivíduo age, ativamente ressalte-se, no ambiente físico e social. O indivíduo explora seus graus de liberdade (conjunto de meios disponí-veis para solucionar uma dada situação) ao efetu-ar ações e efetivar resultados. O desenvolvimento corresponde às transições que o indivíduo passa a partir da construção da sua própria experiência no espaço pessoal e no espaço social, e por esse motivo ele é sujeito do desenvolvimento no pro-cesso educativo.

Assim, se a educação é um dos elementos constitutivos do desenvolvimento como liber-dade instrumental (meio) que amplia a liberda-de individual (fim), algumas formas de educação devem ser mais coerentes com essa visão de de-senvolvimento e, neste caso, os princípios filosó-ficos postulados pelo movimento da Escola Ativa e seus autores no final do século XIX parecem se aproximar de uma abordagem educacional ali-nhada com o enfoque do Desenvolvimento Hu-mano um século depois. Curiosamente, é tam-bém no final do século XX que novas proposições para políticas educacionais serão batizadas com o nome “Escola Ativa”, desta vez com o foco cen-tral na promoção de atividade física no contexto escolar, sem necessariamente retomar os princí-pios originais do conceito.

ESCOLA ATIVA NO SÉCULO xx E O PAPEL DA ATIVIDADE fíSICA NA EDUCAÇÃO

e m meados da década de 1990, a expressão Escola Ativa passa a denotar uma dimensão pouco valorizada até então dentro da insti-

tuição escolar. Se, originalmente, a Escola Ativa era aquela onde o aluno aprende fazendo, experi-mentando, nas últimas décadas, o termo ganhou um novo significado e passa a ser também utili-

zado para se referir a uma escola compro-metida em garantir atividades físicas no cotidiano escolar e a uma educação que contribua para a adoção de um estilo de vida ativo ao longo de toda a vida.

Os estudos mais antigos encontrados que fazem menção à Escola Ativa relacio-nada à promoção de atividade física no contexto escolar coincidem com o período em que o sedentarismo passou a ser con-siderado um fator de risco primário e in-dependente para doenças cardiovasculares pela American Heart Association (AHA). A partir daí, as evidências a favor de uma vida ativa foram se acumulando rapida-mente e forçaram a proposição de políticas públicas para promoção de atividade física em muitos países, como o documento Phy-sical Activity and Health – A Report of the Surgeon General, dos EUA, considerado o mais importante da década pelos especia-listas (NAHAS; GARCIA, 2010).

Especificamente, com relação a crian-ças e jovens em idade escolar, o relatório da OMS (2000) que alertou as escolas a se responsabilizarem pela promoção de uma vida ativa pode ser visto como uma síntese do movimento que vinha amadurecendo ao longo do final do século passado com um posicionamento que destacava a urgência de garantir oportunidades de atividades físicas e conhecimentos sobre atividades físicas para crianças e jovens na escola e fora dela. Das pesquisas sobre atividade física e saúde na infância e adolescência, e dos apontamentos para se organizar es-colas promotoras de saúde. originaram-se vários programas educacionais voltados para seu desenvolvimento.

Em geral, tais propostas enfatizavam a dimensão da saúde, preocupadas com a quantidade total de atividade física prati-cada pelas crianças e jovens sob a influência das recomendações da OMS para escolares de, no mínimo, 60 minutos de ativida-de física diária de intensidade moderada

“( d e W e Y , 1 9 7 9 , P . 6 5 )

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a vigorosa, preferencialmente aeróbia; somada a prática de exercícios físicos, pelo menos três vezes por semana, que melhorem a resistência muscular e o fortalecimento dos ossos. Reformas curricula-res propondo o aumento da carga horária semanal das aulas de Educação Física (AUSTRÁLIA, 2015) e a inclusão de exercícios físicos regulares como componente curricular obrigatório e da educação para a saúde como tema transversal são exemplos de estratégias utilizadas para promover atividade física na escola que atribuíram um papel central à Educação Física como um componente curricular capaz de provocar as transformações desejadas de incremento da quantidade de atividade física pra-ticada pelos alunos (CALE, 1997).

Em uma revisão de vários estudos (CALE; HARRIS, 2006) sobre o tema, foram encontrados indícios de que as alterações curriculares na Edu-cação Física foram realmente importantes para

elevar o nível de atividade física praticada pelos alunos no ambiente escolar e melho-rar a aptidão física dos mesmos, mas não houve evidências para o aumento dos níveis de atividade física fora da escola. Tampouco foram encontradas relações positivas con-sistentes entre a oferta de aulas sobre edu-cação para a saúde e o aumento da prática de atividade física, fato que parece estar re-lacionado, ao menos em parte, com o mode-lo de aula teórica geralmente utilizado com ênfase na transmissão de informação ao in-vés de uma abordagem que alie experiência com tomada de decisão, segundo os autores.

A partir de análises críticas destas ini-ciativas, modelos ecológicos mais robus-tos de Escola Ativa (IRLANDA DO NOR-TE, 2015), (FINLÂNDIA, 2015) passaram a ser propostos pela compreensão de que os

comportamentos relativos à atividade física são influenciados por fatores intrapessoais (aspec-tos biológicos e psicológicos), interpessoais (pa-res, familiares etc.) e ambientais (infraestrutura, política institucional, legislação etc.). O pressu-posto básico é que não só o currículo, mas tudo o que acontece na escola, pode reforçar ou inibir a prática de atividade física: as estratégias de en-sino-aprendizagem utilizadas em sala de aula; a forma como os alunos ocupam seu tempo livre nos intervalos e recreios; a disponibilidade, segurança e conservação de instalações, equipamentos e ma-teriais para os alunos e para a comunidade escolar; as condições para transporte escolar ativo; as par-cerias com outras organizações promotoras de ati-vidade física como clubes e centros comunitários, além de políticas promotoras de atividade física.

Vale destacar que estas abordagens mais re-centes de Escola Ativa não se apoiam exclusiva-

mente em argumentos em prol da promo-ção da saúde, ainda que sejam importantes. Propostas e programas tem buscado sus-tentação para suas premissas no progresso das pesquisas em Neurociência que suge-rem impactos positivos da atividade física nas funções cognitivas e no desempenho escolar (FINLÂNDIA, 2012). O próprio guia de orientações para Escolas Ativas publi-cado em 2015 pelo Desenhado para o Mo-vimento traz tais avanços entre seus prin-cipais argumentos. As investigações sobre essa relação tem analisado a atividade físi-ca na escola em quatro situações diversas: atividades físicas situadas na escola; estu-dos sobre o recreio escolar; atividades fí-sicas na sala de aula; atividades físicas nas atividades extracurriculares. Em todos os casos se busca evidência de que a atividade física pode impactar positivamente o de-sempenho intelectual dos alunos de for-ma geral ou no desempenho acadêmico de forma específica. E de fato, os resultados encontrados são positivos para denotar a convergência entre atividade física e as di-versas dimensões de atividade intelectu-al no âmbito da escola (TOMPOROWSKI; LAMBOURNE; OKUMURA, 2011). Uma palavra de cuidado está em ordem para destacar que esses resultados merecem ser tratados com ponderação na medida em que também se reconhece que não há rela-ção simples de causa-efeito quando se trata de entender o papel das atividades físicas nas atividades intelectuais da criança e do jovem. Vários fatores necessitam ser con-siderados como elementos psicossociais, nível de aptidão física e fatores de saúde, além de outros mediadores como idade, gênero e cultura.

Alguns pontos podem ser destacados até aqui. Primeiro, é o de que há a tendência para dar sustentação à atividade física como elemento importante do desenvolvimen-to das pessoas com base na sua dimensão energética (metabólica). Esse efeito bené-

A EDUCAÇÃO fíSICA BRASILEIRA PASSOU POR

MUDANÇAS IMPORTANTES EM TERMOS DA PERSPECTIVA DE ABORDAGENS PEDAGóGICAS QUE MERECEM SER TRATADAS

PARA ENTENDERMOS E AVALIARMOS O QUÃO fAVORáVEL É A CENA

PEDAGóGICA BRASILEIRA PARA UMA PROPOSIÇÃO

DE ESCOLA ATIVA.

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pnud // 201632 33caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

fico da atividade física na dimensão energética tem sido proclamado por pesquisadores da área de Saúde Pública face à sua direta relação no combate aos males metabólicos do sedentarismo. Segundo, nota-se uma preocupação recente na busca de vín-culo entre a atividade física e o desempenho aca-dêmico e cognição operacionalizada em funções executivas. Isso chamou a atenção de autoridades da área da educação criando um cenário mais favo-rável para instalação de Escolas Ativas.

A Educação Física brasileira passou por mu-danças importantes em termos da perspectiva de abordagens pedagógicas que merecem ser trata-das para entendermos e avaliarmos o quão favo-rável é a cena pedagógica brasileira para uma pro-posição de Escola Ativa.

ESCOLA ATIVA, EDUCAÇÃO fíSICA, CURRíCULO E SUAS TEORIAS

uma Escola Ativa é, antes de tudo, uma escola. Uma instituição social, com uma missão que a define: educação. Assim, o conceito de Escola

Ativa deve atender simultaneamente a dimensão educativa e o cuidado com a saúde e desenvolvi-mento dos seus alunos. Portanto, é preciso consi-derar que as experiências desenvolvidas na esco-la ou a partir da escola devem se constituir como atividades escolares, porque se assim não o forem, a escola estará se desvirtuando da sua finalidade.

A Paideia Grega, para muitos a raiz da esco-la contemporânea e uma das heranças antigas mais significativas, propunha “a formação do ho-mem através do contato orgânico com a cultura” (GAMBI, 1999). A cultura que constitui a comu-nidade, porque “a educação não é uma proprie-dade individual, mas pertence por essência à co-munidade (...) ela é o princípio por meio do qual a comunidade humana conserva e transmite a sua peculiaridade física e espiritual” (JAEGER, 2001). Em síntese, a educação “é, pois, o ato de acolher e iniciar os jovens no mundo, tornando-os aptos a dominar, apreciar e transformar as tradições públicas, que formam a nossa herança simbólica comum” (CARVALHO, 2008).

Dentro dessas perspectivas de educa-ção, as práticas corporais também devem ser ensinadas na escola, pois são ativida-des humanas construídas e modificadas ao longo da história, e são um patrimônio cultural que constituem um aspecto fun-damental de qualquer sociedade.

Vale notar que a seleção do que deve ser ensinado implica na adoção de critérios que justifiquem a escolha dos conteúdos do currículo e está, implícita ou explicita-mente, pautada na questão do tipo de ci-dadão que se deseja formar pelo processo de escolarização. Toda teoria de currículo tem um papel normativo e crítico. O pri-meiro estabelece regras que orientam a elaboração e a prática do currículo e o se-gundo refere-se aos valores que norteiam a vida do cidadão e da sociedade. Histori-camente, estes papéis têm sido apartados na proposição das teorias curriculares em detrimento de ambos, constituindo-se num sério problema (YOUNG, 2014). Sabe-se que os propósitos e as direções imprimi-das aos processos educacionais escolares mudam, uma vez que o contexto sócio-histórico (econômico, político, cultural,

científico) e os interesses envolvidos também se modificam. Como consequência, de um modo ge-ral, os objetivos e os conteúdos da escolarização devem acompanhar estas mudanças e, portanto, as práticas escolares também precisam se modifi-car (BETTI; FERRAZ; DANTAS, 2011).

No caso específico do componente curricular de Educação Física, a adoção e manutenção de um estilo de vida ativo, por tudo o que foi já exposto ao longo deste documento, é tema essencial nas

A EDUCAÇÃO NÃO É UMA PROPRIEDADE INDIVIDUAL, MAS PERTENCE POR ESSÊNCIA à COMUNIDADE (...) ELA É O PRINCíPIO POR MEIO DO QUAL A COMUNIDADE HUMANA CONSERVA E TRANSMITE A SUA PECULIARIDADE fíSICA E ESPIRITUAL”

( J a e G e R , 2 0 0 1 )

políticas educacionais e de saúde públicas, e à escola tem sido atribuído um papel fun-damental na promoção de conhecimentos e habilidades voltados para o tema da vida ativa em nossa sociedade. Assim sendo, identifica-se atualmente uma demanda para os propósitos da Educação Física Es-colar que há algumas décadas não se cons-tituía como tema imperativo.

O sentido etimológico da palavra cur-rículo, curriculum em latim, expressa movimento progressivo, pista de corri-da, caminho a ser percorrido. No contex-to educacional, a noção de currículo tem abarcado proposições diversas englobando referenciais curriculares propostos pelas redes de ensino, grade curricular com dis-ciplinas e atividades, conjunto de planos de ensino dos professores e professoras, aquilo que acontece nas aulas e experiên-cias vividas pelos alunos na escola, entre outros. Este processo decorre do fato de que o currículo é uma construção histórica e cultural, que sofre influências dos dife-rentes sentidos que se dá ao processo de escolarização em termos gerais e, especifi-camente, aos diferentes papéis dos compo-nentes curriculares (FERRAZ; CORREIA, 2012). A partir de reflexões sobre a nature-za humana, cultura, sociedade, concepção de aprendizagem e desenvolvimento, as diferentes teorias curriculares tem se di-ferenciado na proposição do que é consi-derado válido e importante para merecer o rótulo de conteúdo de aprendizagem (SIL-VA, 2009); (LOPES; MACEDO, 2011).

As teorias curriculares em Educação Fí-sica têm influenciado a elaboração de cur-rículos oficiais das redes públicas federal, estadual e municipal, além das publicações que expressam o avanço teórico-metodo-lógico da Educação Física Escolar que, por sua vez, orientam a prática pedagógica nas escolas. Por conseguinte, pode-se identi-ficar e analisar diferentes perspectivas de estruturação de programas curriculares

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em Educação Física que irão oportunizar a prática de atividades físicas para seus alunos e a apren-dizagem de saberes relacionado à atividade física, saúde e bem-estar de formas distintas.

No panorama atual destas teorias curriculares, identificam-se três propostas: teoria tradicional, teoria crítica e teoria pós-crítica (FERRAZ; COR-REIA, 2012); (NEIRA; NUNES, 2009). A relevância da análise destas diferentes perspectivas curricu-lares é buscar compreender de que maneira cada uma delas reforçam, negam ou ignoram as ideias centrais contidas na visão almejada de Escola Ati-va, que é entendida como um espaço físico e so-cial que oferece experiências corporais pelo seu valor cultural, como um fim em si mesma, bem como pela sua relevância funcional e ocupacional, considerando-se como elementos: o currículo, o ambiente e a comunidade. Este compromisso com a atividade física deve abarcar os estudantes, os familiares e a comunidade do entorno da escola.

TEORIAS CURRICULARES TRADICIONAIS EM EDUCAÇÃO fíSICA

n a teoria curricular tradicional, o foco prin-cipal do currículo de Educação Física está relacionado ao objeto de estudo da discipli-

na curricular: o movimento humano ou a cultura corporal de movimento – partindo da premissa de que, ao longo de sua existência, o ser huma-no construiu conhecimentos e práticas ligados ao corpo e ao seu movimentar-se – devem ser trata-dos na Educação Física Escolar. Assim, a decisão sobre o que ensinar circunscreve os conhecimen-tos sobre este objeto (movimento humano ou a cultura corporal de movimento) que se expressam nas práticas corporais de jogo, esporte, dança, gi-nástica e luta; além das habilidades motoras bá-sicas e capacidades físicas que dão suporte à estas manifestações da cultura corporal de movimento. Esta perspectiva curricular dá destaque para o tratamento pedagógico por meio da organização e desenvolvimento dos conteúdos.

Nas teorias curriculares tradicionais, um tema importante para o diálogo com a Escola Ativa é o incentivo à adoção de uma vida fisicamente ativa e

a importância de conhecer sua relação com a saúde e o bem-estar. Todavia, esta cate-goria de análise – teoria curricular tradi-cional – comporta diversas vertentes. Isto decorre do fato de que a Educação Física, ao longo de sua história, sofreu influências de movimentos advindos de necessidades sociais específicas em diferentes momen-tos históricos. Em que pese a importância destes movimentos sociais na consolida-ção das diferentes perspectivas de Educa-ção Física que se tem atualmente, foge ao objetivo deste texto uma análise histórica detalhada. Desta maneira, sob o escopo da denominada teoria curricular tradicional, algumas das atuais vertentes da Educação Física Escolar serão apresentadas a seguir, e suas relações com a noção de Escola Ativa serão consideradas.

A Educação Física voltada para a saúde, uma destas vertentes tradicionais derivada do movimento em defesa da atividade físi-ca dos anos 90 e que impulsionou a atual noção de Escola Ativa, enfatiza conteúdos diretamente relacionados às noções de atividade física e de exercício físico com enfoque na aptidão física. Nas aulas são abordados conhecimentos teóricos e prá-ticos relacionados à atividade física e ao exercício físico como resistência cardior-respiratória, força, resistência muscular, composição corporal e flexibilidade. Como resultado, é possível identificar aulas que favorecem a prática de atividade física, me-diante práticas variadas de ginástica, jogo, esporte, entre outros, com a finalidade de estimular o desenvolvimento e manuten-ção de uma aptidão física condizente com uma capacidade funcional e com a promo-ção da saúde (NAHAS; CORBIN, 1992).

Outra vertente das teorias curricula-res tradicionais é a denominada Educação Física esportiva, que se utiliza das dimen-sões biológicas para a prática pedagógica, mas amplia a perspectiva de atuação. Com a preocupação voltada para o desempe-

nho esportivo expresso pela eficiência mecânica e controle de movimentos, seu foco nos conteúdos está nas técnicas, táticas e estratégias que com-põem as diversas modalidades esportivas e jogos pré-desportivos e no aprimoramento dos siste-mas biológicos de suporte destas atividades. Em decorrência dos pressupostos adotados nesta ver-tente, é possível identificar aulas em que o nível moderado e intenso de atividade física é bastante contemplado. Entretanto, pesquisas têm indicado que a participação intensa nas atividades não se dá com todos os alunos, sendo que os alunos me-nos habilidosos necessitam de atenções especiais por parte dos professores e professoras.

A partir da década de 1980, aproximadamen-te, surgiram outras vertentes curriculares que também podem ser consideradas no espectro das teorias tradicionais, uma vez que seu foco de aten-ção está nos conteúdos relacionados ao movimen-to humano, à cultura corporal de movimento ou à cultura de movimento. Desta maneira, propõem o objetivo básico de disseminar conhecimentos sistematizados para que, ao final da escolariza-ção, o aluno esteja apto para participar e usufruir de programas de ginástica, dança, esporte, jogo, luta, entre outras práticas corporais; avaliando sua adequação e qualidade no sentido de promoção da saúde e do bem-estar. Além disso, visam a contri-buir para a formação de um consumidor crítico dos espetáculos esportivos e das informações veicula-das pela mídia, por meio de elementos conceituais e perceptivos que lhe permitam apreciar e refletir sobre a estética, a técnica e as implicações sociais e econômicas dessas manifestações (FERRAZ, 2001). Nesta vertente, informações, conhecimentos e movimentos são aprendidos nas aulas de Educação Física para que os estudantes possam aumentar seu repertório de movimentos relacionado à cultura de movimento, bem como atender seus desejos, mo-bilizar suas potencialidades e conscientizar-se dos vínculos socioculturais das práticas corporais do ponto de vista individual e coletivo.

A diferença fundamental entre esta e as ou-tras vertentes anteriormente apresentadas reside no fato de que, mesmo reconhecendo a presença das manifestações da cultura de movimento como

conteúdo da Educação Física Escolar, não justifica suas escolhas pela simples tradição cultural (esporte) ou por uma necessidade biológica do ser humano (saúde). Em essên-cia, argumenta ser fundamental considerar as práticas corporais como construções cul-turais humanas, com significados inerentes aos diversos grupos sociais que os produzi-ram e que os transformam. Em outras pala-vras, a ginástica é conteúdo da Educação Fí-sica Escolar não somente porque faz bem ao corpo (saúde), mas porque foi criada em um momento histórico específico que deve ser tematizado pedagogicamente como um sa-ber escolar. Um exemplo esclarecedor pode ser encontrado no tema “Corpo, Saúde e Be-leza” apontado nas orientações da proposta curricular da Educação Física do Estado de São Paulo (SEE-SP, 2008), que aborda con-teúdos como: diferentes padrões de beleza veiculados pela mídia; práticas diversas de exercício físico; hábitos alimentares; doen-ças decorrentes do sedentarismo; precon-ceitos relacionados ao sexo, etnia, desempe-nho físico; apelo ao consumo e interesses do mercado em produtos para o corpo; o direito ao lazer no mundo do trabalho. Desta ma-neira, estes conteúdos são analisados e pro-blematizados, indicando possibilidades de aplicação na vida dos estudantes. A adoção desta perspectiva de currículo de Educação Física tem como consequência a divisão do tempo de aula entre a atividade física pro-priamente dita e atividades de exposição, análise e discussão de conceitos e teorias, trabalhos de investigação e seminários. Consequentemente, divide-se o período de aula entre a prática de atividade física e a re-flexão teórica.

A segunda perspectiva de teoria curri-cular em Educação Física é aquela orientada pelas teorias críticas em educação. Defen-de que o conceito de classe tem um caráter fundamental e central para os programas curriculares, argumentando que é fator es-sencial para a compreensão socioeconômica

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dos indivíduos e, com isso, favorecendo o entendi-mento de justiça e dos conflitos sociais. Preocu-pando-se com as conexões entre poder, ideologia, classe social e práticas corporais, o foco principal de atenção do currículo está voltado para as rela-ções de poder, sobretudo, relações de classe socio-econômica. Deste modo, a ênfase dos conteúdos recai sobre estas implicações nas manifestações da cultura corporal de movimento para formar um ci-dadão crítico dos arranjos sociais existentes que fa-vorecem o capital em detrimento do trabalho, que beneficiam uma minoria economicamente privi-legiada e exclui a maioria da população do acesso aos bens materiais e culturais para o bem-estar e a qualidade de vida.

A crítica da sociedade fundamentada nos va-lores do capitalismo, na lógica do mercado, no lucro acima de tudo, na crença da necessidade de consumo de produtos e modismos de práticas corporais para um corpo “belo e sarado”, consti-tui-se no foco da Educação Física. Como exem-plo, esta perspectiva relaciona a atividade física à saúde, definida como resultante das condições de vida (alimentação, emprego, lazer, acesso aos serviços de saúde, transporte, educação, etc.) e argumenta que estes aspectos são decorrentes das formas de organização social da produção. Focaliza o principal conteúdo no processo de ca-pacitação da comunidade para agir e intervir na sociedade visando a melhoria da saúde e, con-sequentemente, da qualidade de vida. Portanto, defende que não se pode responsabilizar o sujeito individualmente pelo sedentarismo sem consi-derar as condições sociais e econômicas que difi-cultam ou impedem o engajamento em uma vida fisicamente ativa. Ainda, destaca que mudanças no comportamento individual para aumentar o nível de prática de atividade física pouco contri-buem para a obtenção das condições necessárias para a promoção da saúde, ou seja, justiça social, renda, equidade, economia sustentável, entre outros. Pode-se identificar, portanto, que esta perspectiva diminui o tempo de prática de ati-vidades físicas despendido na aula de Educação Física, enfatizando a necessidade de reflexão so-bre como, por quê e a partir de quais interesses o

conhecimento da cultura corporal de mo-vimento foi produzido e validado.

Mais recentemente, incorporando os pressupostos da teoria crítica do currículo em Educação Física, tem sido proposta uma terceira perspectiva denominada teoria cur-ricular pós-crítica que se baseia nos estudos culturais, no multiculturalismo crítico, nos estudos feministas, na filosofia da diferen-ça, entre outros. Nela, amplia-se o foco das relações de poder econômico e de classe so-cial para as questões de gênero, raça, etnia, sexualidade, entre outros temas. Em sínte-se, a expectativa busca analisar as questões de identidade e diferença, as relações de po-der local e global, e as dinâmicas próprias de sociedades multiculturais.

Sendo assim, o questionamento da he-gemonia do conhecimento e da cultura dos grupos dominantes em detrimento das mi-norias e de grupos menos privilegiados do ponto de vista cultural, econômico e so-cial é enfatizado nos conteúdos. A questão fundamental para esta teoria curricular é a análise e reflexão sobre o “porque” deter-minado conteúdo é importante para a edu-cação escolar e não outro. Quais interesses, do ponto de vista das relações de poder entre os diversos grupos (classe social, gê-nero, raça, etnia, sexualidade) fazem com que este conhecimento esteja no currículo? Sendo assim, o diálogo, o respeito e o en-tendimento entre as diferentes culturas de sociedades diversas ou de sociedades mul-ticulturais tem se constituído em um desa-fio educacional importante para o combate à violência e aos conflitos sociais.

Em resumo, o que está em jogo é a ca-pacidade da educação para o acolhimen-to da diversidade. Para a escola isto é um grande desafio, pois seus padrões de fun-cionamento tendem à homogeneização e à normalização (SACRISTAN, 2001). O foco principal diz respeito à luta por significa-ções. No caso específico da atividade físi-ca e as relações com a saúde, reconhece o

sedentarismo como um fenômeno atual e carac-terístico de determinados grupos sociais; entre-tanto, argumenta que práticas de atividade físi-ca hegemônicas de combate à inatividade física como, por exemplo, os exercícios em academias ou a prática esportiva, não podem ser identifi-cados como “a melhores” possibilidades de en-frentamento dos problemas advindos do seden-tarismo. Propõe, assim, vivenciar e analisar as diferentes práticas corporais e suas lutas por sig-nificação no universo da cultura de movimento, ou seja, indica a necessidade de problematizar a supervalorização das práticas da cultura domi-nante, demonstrando os interesses mercadológi-cos veiculados pela grande mídia.

É nossa perspectiva que a construção de uma proposta de Escola Ativa não pode estar amarrada a uma ou outra corrente, já que essas correntes se constituíram a partir de uma dicotomia entre na-tureza e cultura. As correntes citadas aqui foram elaboradas no âmbito da academia e buscavam construir visões de mundo, verdadeiros paradig-mas para formatar um modo de olhar a realidade. Todavia, a realidade é multifacetada e, portanto, exige vários olhares. Na construção de uma con-cepção de Escola Ativa (como se poderá depreen-der a seguir) trabalhamos na lógica da comple-mentaridade entre correntes a partir da ideia de que não é possível compreender e promover o De-senvolvimento Humano com um único olhar, o da natureza ou da cultura6. O cuidado em se olhar de diferentes ângulos, de olhar pelo microscópio, de olhar com o óculos de ópera e também olhar pelo

6 Discutimos o princípio da complementaridade e seu papel para uma compreensão ampliada do desenvolvimento humano em Manoel, E. de J. (2015). Natureza//cultura; Natureza x cultura; Natureza ~ cultura: o conceito de desenvolvimento na constituição da educação física na escolar. In M. Sitgger (org). Educação Física + Humanas. campinas: Editora autores associados.

37CaDErNo DE DEsENvolvImENTo hUmaNo // escolas ativas no brasilPNUD // 201636

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pnud // 201638

telescópio7, nos proporciona um olhar ampliado sobre a realidade em que buscamos agir.

RESIGNIfICANDO A ESCOLA ATIVA PARA O BRASIL

A s práticas corporais são objeto de interven-ção das diferentes teorias curriculares em Educação Física. Algumas enfatizam sua di-

mensão energética nas aulas, focando a prática e o estímulo à atividade física; outras, de forma mais abrangente ressaltam a compreensão do papel da atividade física na dinâmica cultural, no desen-volvimento das pessoas e na qualidade de vida, em detrimento da experiência corporal em si; outras ainda buscam equilibrar ação e reflexão, se apro-ximando da ideia de aprendizagem pela experiên-cia, defendida neste documento. Evidentemente, pesquisas educacionais ainda são necessárias para se identificar o potencial de modificação dos com-portamentos dos estudantes para a adoção de um estilo de vida ativo, a partir de cada teoria curri-cular em Educação Física.

Como dito anteriormente, o currículo, em essência, expressa o caminho a ser percorrido e, neste sentido, o currículo da Educação Física Es-colar tem papel central na definição de condições que favoreçam ou limitem a configuração de uma Escola Ativa para além das aulas, influenciando também o desenho dos programas extra curri-culares, o tempo livre de recreio e entre aulas dos estudantes; bem como as atividades com a família e a comunidade, na escola e no seu entorno.

Busca desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação no mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal: jogos, danças lutas, exercícios ginásticos, esporte, malabarismo, contorcionismo, mímica e outros, que podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas.”

“( C O l e t i v O d e a u t O R e s , 1 9 9 2 )

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (BRASIL, Lei no 9.394, 1996; Lei no 10.793, 2003) define a Educação Física como componente curricular obrigatório, integrado à proposta pedagógica da escola e ajustado às diferentes faixas etárias e condi-ções dos alunos. O texto da lei denota clara intenção de superar a tradicional descone-xão entre a Educação Física e o projeto peda-gógico da escola que, muitas vezes, a posi-ciona como uma atividade que se estabelece dentro da escola, ao invés de uma disciplina com saberes escolares próprios inserida no contexto maior da cultura escolar. Em de-corrência da LDB, a publicação dos Parâme-tros Curriculares Nacionais (PCNs) que guiou as reformas educacionais da Educação Física Escolar no país afirma que a finalida-de da Educação Física na escola é “garantir o acesso dos alunos às práticas da cultura cor-poral, contribuir para a construção de um estilo pessoal de exercê-las e oferecer ins-trumentos para que sejam capazes de apre-ciá-las criticamente” (BRASIL, 1998, p. 24).

A teoria curricular crítica é a orientação predominante da Educação Física Escolar no Brasil e, em uma de suas principais obras (COLETIVO DE AUTORES, 1992) afirma-se que ela, como disciplina escolar:

síntesePROPOSITIVA PARA A

esCOlaativa

2PROmOveR a aprendizagem das práticas corporais;

1 atendeR às necessidades diárias de atividade física preconizadas para crianças e jovens, considerando as evidências da sua relação com a saúde, bem-estar e desenvolvimento;

3aPResentaR conhecimentos teóricos que permitam a autonomia e liberdade dos alunos quanto à atuação individual e política em relação às práticas corporais na sua vida e na sua comunidade.

7 usamos essa analogia com base em lewis carroll na passagem de seu livro” through the looking-Glass and What alice Found there” (1871) em que alice entra num trem e o fiscal da condução a inquiri sobre que direção ela vai, na incerteza demonstrada por alice o fiscal a examina no que sucede a seguinte passagem: “todo esse tempo, o fiscal estava olhando para ela, primeiro com o telescópio, depois por meio do microscópio e então com o óculos de ópera. Enfim ele disse: Você está viajando no caminho errado” (caRRoll, 1871, p. 139).

Pode-se deduzir que a atividade física para a Educação Física Escolar brasileira supera uma intencionalidade restrita a ga-nhos para a saúde. Assume a influência e conhecimento para a adoção de um estilo de vida ativo nas fases posteriores de de-senvolvimento, o estímulo para o desen-volvimento de funções executivas e, as-sociado a isso, o desempenho acadêmico. Assume também a responsabilidade pelas tradições humanas nomeadas de cultura corporal, que como tradições de outra na-tureza, suas raízes remetem a uma diversi-dade de práticas, saberes e valores, herda-dos e recriados, na maioria das vezes, em séculos de existência histórica. Seus sig-nificados têm origem numa diversidade de demandas sociais e econômicas, mas tam-bém em projetos políticos e concepções de homem/mulher e de mundo. ◊

39CaDErNo DE DEsENvolvImENTo hUmaNo // escolas ativas no brasil

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pnud // 201640 41caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

4capítulo

o processo de construção da concepção de Escola Ativa foi desenhado em etapas complementares, partindo de análises quantitativas dos aspectos relacionados

às atividades físicas – infraestrutura, atividades curriculares e extracurriculares, recursos huma-nos – constantes nas bases de dados nacionais. Tais análises ofereceram referências importantes para a construção da amostra da abordagem te-lefônica nacional realizada com 572 escolas, que retrata muitos potenciais e também desafios atuais da educação no Brasil, em garantir opor-tunidades de atividades físicas na rotina escolar e promover um estilo de vida ativo entre os alunos e a comunidade escolar.

Além da análise descritiva, os resultados da pesquisa telefônica também foram tratados pela Teoria de Resposta ao Item (TRI) em uma primei-ra tentativa de construção de uma “régua” capaz de medir o quão ativas são as escolas brasileiras. A régua criada permitiu que as escolas fossem clas-sificadas em nível alto, médio ou baixo de “ativis-mo”. A partir desta classificação foram seleciona-das 20 escolas para a realização de uma pesquisa de campo de caráter etnográfico, a fim de desvelar elementos capazes de trazer uma maior compre-ensão sobre a cultura de atividade física presente em diversas escolas no território nacional. Esta última etapa ainda está em curso.

Com a pesquisa conceitual-teórica e docu-mental sistematizada nas seções anteriores, che-gamos a indicativos do que seria um espaço de formação humana que possa ser denominado de Escola Ativa. Identificamos doze ações que ca-racterizariam esse espaço e o desafio foi encon-trar um instrumento que nos permitisse aferir a dimensão de escolas potencialmente ou efetiva-mente ativas no Brasil.

Medir é um dos mais caros atos humanos. Medir é, antes e sobretudo, um ato de conhecer o que se mede. E é esse vínculo com o ato epistêmi-co que faz da mensuração algo tão caro à ciência. Medir implica na quantificação dos objetos, even-tos e processos e, com isso, nos deparamos com inúmeras expressões de uma mesma questão. To-davia, os números se manifestam de acordo com

certas tendências, denotam relações, pos-sibilitando à ciência não só descrever, mas também encontrar regularidades na di-versidade da natureza. Regularidades que uma vez descritas revelam padrões. Nosso objetivo foi encontrar uma escala que nos pudesse mostrar Escolas Ativas, e na qual ainda pudéssemos identificar escolas po-tencialmente ativas ou com poucas condi-ções de serem ativas.

Em qualquer dos casos nos deparamos com o desafio de encontrar uma “régua” para algo que não é bem definido ou que não é passível de ser observado diretamen-te, ainda que conceitualmente tenhamos o nosso objeto delimitado. O dilema foi me-dir algo, antes de conhecê-lo. Consideran-do a dimensão que apreendemos do que é uma Escola Ativa, mas tendo em mente que não temos claro como medi-la, porque

MEDIR É UM DOS MAIS CAROS ATOS HUMANOS.

MEDIR É, ANTES E SOBRETUDO, UM ATO DE

CONHECER O QUE SE MEDE. E É ESSE VíNCULO COM O ATO EPISTÊMICO QUE fAZ

DA MENSURAÇÃO ALGO TÃO CARO à CIÊNCIA.

Medindo as Escolas Ativas no Brasil: Quando medir é antes conhecer o que se mede

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pnud // 201642 43caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

• Política de promoção de atividade física na escola (currículo)• Atividades físicas e esportivas extra-curriculares• Abertura para uso das instalações da escola aos finais de semana• Possibilidades de prática e realização de atividades físicas e esportivas nos intervalos e recreios• Existência de pequenas pausas para atividade física durante as aulas em salas• Aulas regulares de educação Física com expectativas anuais de aprendizagem • Oportunidades para participação em eventos esportivos• Relações com outras instituições (clubes esportivos)

b E N s I m a T E r I a I s

• Infra-estrutura dedicada à prática de atividades físicas e esportivas• Existência e disponibilização de materiais para serem utilizados em atividades para além do componente curricular educação Física• Disponibilização de espaço físico para prática de atividades físicas e esportivas aos finais de semana• Recursos humanos suficientes e com formação adequada

b E N s m a T E r I a I s

33 mil E s C o l a s

E D U C a ç ã o I N f a N T I l

82 mil E s C o l a s

E N s I N o f U N D a m E N T a l

4.4 milE s C o l a s

E N s I N o m é D I o

ela não se apresenta como entidade diretamente observável, optamos por empregar uma teoria pertinente para aferir sistemas ou estados carac-terizados pelo que se chama de traços latentes. Fizemos uso principalmente da TRI (ARAÚJO; ANDRADE; BORTOLOTTI, 2009) para caracteri-zar esses traços que são indicadores de um modo de operar ou estado de organização, como por exemplo, proficiência num determinado domínio do conhecimento, nível de qualidade de vida, ou no nosso caso, o grau em que uma escola é ativa.

A TRI foi desenvolvida como forma de lidar com as limitações da Teoria Clássica de Medidas em que o resultado indicativo de um estado é en-viesado, pois há uma relação de dependência en-tre o instrumento de medida e as características sob exame. A TRI possibilita, primeiro, conside-rar cada item de forma particular sem amarras ao questionário ou ao teste a partir do qual ele foi ge-rado. Isso possibilita avaliar bases de dados varia-das e diferentes entre si, posto que a TRI trabalha com o “item” e não com o teste do qual resultou. Segundo, a TRI estima parâmetros dos itens e dos indivíduos numa escala de medida, daí se poder falar numa régua e na expectativa de poder sub-meter uma “escola” a teste e graduá-la num con-tinuo de Escola Ativa a Escola Não Ativa.

Todavia, nem a TRI, nem qualquer instru-mento vai medir o grau em que uma Escola é Ati-va sem que antes conheçamos o que é uma Escola Ativa. Para saber o que queríamos medir fizemos um exercício de usar os resultados de nossa pes-quisa conceitual e teórica como um óculos (crité-rio) para visualizar em bases de dados existentes sobre escolas brasileiras o que poderia ser indica-tivo do grau de ativismo nesse universo. Após essa identificação, teríamos um conjunto de perguntas ou dados que uma vez analisados poderiam ter os seus resultados submetidos à aplicação da TRI.

Dessa forma, acessamos dados das bases dis-poníveis sobre a escola brasileira, em particular a “Prova Brasil 2013” e o Censo Escolar 2013. Os três níveis de educação básica foram considera-dos, totalizando quase 120 mil escolas analisa-das, assim distribuídas:

Os dados permitiram realizar o exer-cício de pensar nos espaços de formação como uma Escola Ativa. Com os dados ob-tidos pudemos refletir no que seriam bens materiais e bens imateriais que suportam e tornam uma escola Ativa. Nos bens mate-riais foi considerado o que cada escola apre-sentava em termos de locais apropriados e facilitadores de práticas corporais como pátios e quadras descobertos e cobertos, e a disponibilização desses locais aos finais de semana. Por bens imateriais, o levanta-mento de dados enfocou a presença ou não da Educação Física como componente nos

currículos, além do oferecimento de atividades fí-sicas e esportivas extra-curriculares, aos finais de semana, a promoção de eventos esportivos para a comunidade, entre outros.

Cabe ressaltar que é nosso entendimento que os bens materiais são condição necessária, mas não suficiente para uma Escola Ativa. A presen-ça dos bens imateriais seria o principal elemento catalisador para gerar as ações sistematizadas nas doze ações que fazem uma Escola Ativa (Ver logo adiante págs. 54, 55 e 56). Com o uso combinado da Teoria Clássica de Medidas para construção de indicadores e da Teoria de Resposta ao Item para criar escalas nesses indicadores, foi possível de-finir um caminho metodológico para identificar nos dados informações potenciais para qualificar os bens materiais e imateriais no que concerne a uma Escola Ativa.

Como as bases de dados tinham limites para nos informar a respeito dos indicadores para uma escola ativa, optou-se por construir um questio-nário com questões orientadas aos indicadores que poderiam oferecer elementos para caracte-

rização do traço latente da escola, relativo ao grau em que ela pode ser considerada ativa. Oito itens foram definidos de modo a melhor representar as doze ações que caracterizam idealmente uma escola ativa.

SONDAGEM TELEfôNICA PARA APREN-DER UM POUCO SOBRE ESCOLAS E ESCO-LAS ATIVAS

c om o impulso de abarcarmos uma amos-tra expressiva de escolas brasileiras, es-tudos foram realizados para definição

dos critérios para composição da amostra. A amostra inicial foi composta por 3000 escolas, sendo 600 titulares e 2400 substitutas, tendo como meta o alcance de 600 escolas. De for-ma proporcional à oferta dos níveis de ensino no Brasil, foram disponibilizadas 810 escolas (162 escolas titulares e 648 substitutas) para cada um dos níveis infantil, fundamental I e fundamental II. Já no ensino médio o número de escolas disponíveis foi de 570 (114 titulares e 456 substitutas). Além da estratificação por níveis de ensino, a amostra foi subdividida em categorias pertinentes às cinco regiões políti-co geográficas do país (Norte, Nordeste, Cen-tro-Oeste, Sudeste e Sul), à localização das

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pnud // 201644 45caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

escolas em relação ao centro urbano dos municí-pios em que estavam localizadas (urbana ou ru-ral), ao IDEB destas regiões, ao tipo de instituição (pública ou particular), e à classificação de proxy (a partir dos dados obtidos no Censo Escolar e na Prova Brasil, ambos de 2013). Nesse sentido, a tro-ca de uma escola titular por uma substituta não poderia ser feita simplesmente pelo nível de en-sino. Para cada escola titular foram selecionadas 4 substitutas, cujas características eram similares em todos os quesitos apresentados acima. Abaixo, uma ideia do universo de escolas entrevistadas.

entre ambos (IDEB e indicadores socioeco-nômicos). Procurou-se também ponderar acerca dos erros de amostragens manten-do-os em valores que não inviabilizassem as interpretações sobre o alcance e impli-cações dos dados.Seu objetivo foi conhecer as potencialidades das escolas em serem consideradas Escolas Ativas, em termos estruturais, organizacionais e pedagógi-cos, analisando as oportunidades ofereci-das e as condições disponíveis para a pro-moção de atividade física, por intermédio de entrevistas telefônicas dos gestores das mesmas. De acordo com os resultados en-contrados, as disparidades de desenvolvi-mento social e econômico entre as regiões brasileiras parecem afetar as oportunida-des e condições oferecidas pelas escolas para que os alunos e a comunidade escolar se engajem em atividades físicas. Tal fato é retratado nas diferenças encontradas em relação a vários itens pesquisados: condi-ções oferecidas para o desenvolvimento da Educação Física como disciplina – frequ-ência e carga horária semanal, professor especialista responsável pela disciplina; oferta de atividades extracurriculares, e infraestrutura disponível.

O universo das escolas rurais pesqui-sadas também se revelou muito diferente das escolas públicas urbanas e privadas, em geral, indicando menos oportunidades e condições mais precárias para a prática de atividade física.

O cruzamento de dados sobre as regiões e sobre o tipo de escola chama a atenção. Se as escolas rurais são as que contam com menor percentual de professores de Edu-cação Física responsáveis pelas disciplinas, estas escolas nas regiões Norte (11,7%) e Nordeste (24,8%) são as que apresentam os piores cenários.Há que se ressaltar, contu-do, que a compreensão da análise das dife-renças regionais é mais complexa do que os dados podem sugerir. Há escolas excelentes

ESCOLAS COM PROfESSOR DE EDUÇAÇÃO fíSICA POR REGIÃO (%)

educAção físicA nA escolA

CEN

Tro

-oEs

TE

No

rDEs

TE

No

rTE

sUD

EsTE sU

l

bra

sIl

bra

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62

37

29

8281

56

ESCOLAS COM PROfESSOR DE EDUCAÇÃO fISICA POR TIPO DE ESTABELECIMENTO E LOCALIZAÇÃO (%)

PrIv

aDa

Púb

lICa

rUra

l

Urb

aNa

56

74

51

31

71

DISTRIBUIÇÃO DA AMOSTRADe acordo com os níveis de ensino

27,6% (158 escolas)ENsINo fUNDamENTal

27% (154 escolas)

ENsINo fUNDamENTal II

26% (149 escolas)ENsINo INfaNTIl

19,4%(111 escolas)

ENsINo méDIo

A sondagem telefônica foi uma primeira apro-ximação do universo das escolas. Por isso,+ ela não deve ser tomada como definitiva. É importante declarar e reconhecer que a amostra, em que pese seu tamanho, não pode ser considerada represen-tativa no sentido estrito do universo de escolas brasileiras. Não obstante, foram tomados cuida-dos para garantir representatividade lato sensu, por exemplo, usando os indicadores de IDEB para garantir na amostra escolas de diferentes matizes, inclusive socioeconômicos, dada a boa correlação

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pnud // 201646 47caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

próprias da escola para promoção de atividade fí-sica – diretrizes instituídas, parcerias com outras instituições, atividades extracurriculares e aos finais de semana, envolvimento das famílias e co-munidades no planejamento e gestão – que inde-pendem da legislação e que vão além dos cumpri-mentos de normas que regem a gestão da escola e as obrigatoriedades curriculares devem ter grande relevância para a delimitação do que se compreen-de como Escola Ativa, na medida em que sugerem grande valor atribuído pela escola a estas práticas. Neste estudo, o percentual de escolas que respon-deu positivamente a estas questões foi, em geral, bastante baixo, indicando aspectos a serem mais explorados em programas e políticas educacionais.

Os resultados deste estudo retratam o poten-cial das escolas em serem mais ou menos ativas e os achados oferecem alguns indicativos do grau em que se aproximam ou se distanciam da concepção de uma Escola Ativa. Os dados demonstram quais aspectos considerados como parâmetros de uma Escola Ativa são mais ou menos frequentes na rea-lidade das escolas pesquisadas, apontando aqueles

que atingem positivamente grande par-te delas, e outros que ainda se constituem como desafios para as políticas educacio-nais que desejam valorizar a atividade física de maneira integral e integrada ao projeto político-pedagógico da escola.

Como já mencionado, com os dados ob-tidos foi possível elaborar uma régua, isto é, uma medida de Escola Ativa calculada por meio da TRI. As questões que compuseram o instrumento para a sondagem telefônica foram posicionadas numa escala de média 0 e desvio padrão 1. Foi efetuado também um “novo escore” baseado somente nos 17 itens que calibraram. A primeira escola na régua obteve o escore pela TRI de 2,24 (o máximo seria o valor 5). Assim, conhe-cendo-se o escore da Escola e com os itens posicionados na escala, podemos conferir quais itens são realizados/atendidos por esta escola ou qualquer outra.

O Quadro 2 traz as questões do ins-trumento de sondagem telefônica com

9

11

18

45

PAUSA PARA ATIVIDADESescolas em que há pausas na aulas da sala para prática de atividades físicas (%)

Infantil

fundamental I

fundamental II

médio

em regiões que alcançaram valores baixos em al-guns resultados, tanto quanto há escolas bastan-te precárias em áreas que apresentaram melhores resultados na pesquisa.Portanto, qualquer enten-dimento de Escola Ativa, necessariamente, deve considerar as particularidades do contexto local das escolas em relação às oportunidades e condi-ções disponíveis, mas também no que diz respeito às necessidades e interesses destas populações pe-las atividades físicas, uma vez que o modo de vida e a cultura corporal dos territórios – regiões geo-gráficas ou rural/urbano - também são distintos. O estudo também evidencia uma tendência de os processos pedagógicos da escola valorizarem os movimentos corporais no início da educação bási-ca em detrimento dos anos finais. Os dados mos-traram que a atividade física está mais presente nos anos iniciais, notadamente na educação infantil, e diminui progressivamente em direção ao ensino médio. Provavelmente porque o movimento, as brincadeiras e os jogos corporais são considerados importantes recursos para aprendizagem e desen-volvimento das crianças, inclusive para aquisição

da linguagem e raciocínio matemático, ao passo que os processos de ensino nos anos fi-nais da educação básica parecem privilegiar a dimensão cognitiva por meio de métodos tradicionais que enfatizam atividades pre-dominantemente intelectuais e pouco ativas.

Por outro lado, as oportunidades de prá-tica fora do currículo aumentam conforme se progride nos ciclos de ensino, sendo maiores no Fundamental II e Médio. Portanto, o es-tabelecimento de parâmetros de uma Escola Ativa deve pressupor análises do conjunto de oportunidades de prática de atividade física nos diferentes ciclos da educação básica em razão das diferenças constatadas.

Os marcos legais também parecem ser relevantes para a efetivação de ações em favor da prática de atividades físicas nas escolas, uma vez que a frequência e volume das aulas de Educação Física e a presença de professo-res especialistas parecem estar relacionadas às exigências dispostas na legislação sobre estas temáticas. Por outro lado, iniciativas

25

43

44

60

ATIVIDADE fíSICA ExTRACURRICULARescolas que oferecem atividades físicas extracurriculares (%)

Infantil

fundamental I

fundamental II

médio

o P o r T U N I D a D E D E P r á T I C a D E a T I v I D a D E s f í s I C a s a o s f I N a I s D E s E m a N a

Estão abertas nos finais de semana para prática

de atividades físicas

20%Ofertam programas

de atividade física aos finais de semana

16%São usadas pela comunidade

nos finais de semana para prática de atividades

34%

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pnud // 201648

sondAgem os respectivos valores (quanto mais alto o valor, maior a importância daquela questão) indicando a contribuição de um dado item para uma com-posição de Escola Ativa.

A nossa expectativa era a de que Escolas Ativas seriam destacadas no conjunto de indicadores que denominamos bens imateriais da escola. Todavia, os resultados indicados no Quadro 2 nos mostram que esse balizamento se deu por fatores que estão vinculados à infra-estrutura. A tendência desse resultado não se modifica com a construção da ré-gua calculada pela TRI (Figura 1).

Os resultados da aplicação da régua indicam que um elemento da infra-estrutura como ter pista de atletismo (Q31D) ou piscina (Q31E), são importantes para uma escola apresentar maior grau de ativismo. É interessante notar que na análise das frequências de resposta notamos que muitas escolas deram indicativo de não ter uma atitude protagonista para advogar sobre a impor-tância da prática de atividade físicas e esportivas, por nós considerada um bem imaterial de uma Escola Ativa (Tabela 1).

A frequência de resposta positiva sobre a exis-tência ou não de políticas de promoção da ativida-de física na escola indicou que menos da metade das escolas sondadas tem tais políticas (44,9%). Em apenas duas regiões do Brasil mais da metade das escolas declararam ter políticas de promoção, no Sudeste com 50,1% e no Sul com 59,3%. Ainda assim, pode-se depreender que a ausência de uma política ou de diretrizes específicas para promoção da atividade física denota que a presença de Escolas

QUESTÕES DO INSTRUMENTO DE SONDAGEM TELEfôNICA

QUESTÃO – DESCRIÇÃO ITEM VALORES

As aulas de educação física/atividades de movimento são ministradas por professor de educação física? q18a -0,82

A escola tem expectativas de aprendizagem para cada ano nas aulas de educação física/ atividades de movimento? q19a -1,70

A escola oferece atividades físicas/ esportivas extracurriculares regularmente? q20a 0,24

Os alunos frequentam a escola nos finais de semana para a prática de atividades físicas/ esportivas? q29a 0,69

A escola oferece programas de atividades físicas/ esportivas para os alunos, durante os finais de semana? q30a 0,91

Pátio coberto/ quadra coberta q31b -1,39

Pista de atletismo q31D 4,52

Piscina q31E 3,14

Salas (musculação/ ginástica/ lutas/ dança) q31f 2,27

Vestiário para banho q31G 1,64

Bicicletário q31h 2,41

A escola organiza eventos que promovem atividades físicas/ esportivas? q33a -1,65

A escola participa de eventos externos de atividade física/ esportiva? q34a -0,71

A escola abre aos finais de semana para uso das instalações esportivas/ de atividade física pelos pais dos alunos e moradores do entorno, além dos alunos?

q35a 0,65

Há participação de pais e responsáveis no planejamento e gestão das atividades físicas/ esportivas para a comunidade? q36a 1,31

A escola possui uma diretriz específica para promoção de atividade física no seu cotidiano? q37a 0,46

Há alguma parceria da escola junto a outras instituições de forma a facilitar/viabilizar a prática de atividades físicas/ esportivas por seus alunos? q38a 0,97

QUADRO 2Ativas é exceção ao invés de regra no Bra-sil, da perspectiva por nós adotada.A son-dagem telefônica nos ajudou a contrapor a sistematização do conceito de Escola Ativa (conduzido na pesquisa conceitual e teóri-ca) com os dados de um perfil feito a partir das bases nacionais existentes. Esse contra-ponto permitiu-nos ponderar sobre os indi-cadores mais apropriados para caracterizar o grau de ativismo das escolas. O protago-nismo da infra-estrutura – bens materiais – sobre os indicadores de ações de promo-

Centro-oeste 44,5% 55,5% 5,2% 10%

Nordeste 42,8% 57,2% 5,4% 11%

Norte 23,6% 76,4% 6,1% 12%

sudeste 50,1% 49,9% 4,1% 8%

sul 59,3% 40,7% 4,7% 9%

BRASIL 44,9% 55,1% 2,6% 5%

REGIÃOSIM NÃO

ESTIMATIVA DESVIOPADRÃO ERRO

TABELA 1: ExISTÊNCIA DE DIRETRIZES ESPECífICAS

ção da atividade física e esportiva deve ser interpretado com cuidado. Por exemplo, a pista de atletismo apresentou um valor na régua de 4 (entre cinco possíveis), entretan-to, isso não pode ser interpretado como se a

fIGURA 1: POSICIONAMENTO DOS ITENS DA MEDIDA DE ESCOLA ATIVA POR MEIO DA TRI

-4 -3 -2 1-1 20 3 4

33a

19a 31b

34a

18a 20a37a29a 35a

38a35a

30a 31G 31f31h

31E 31D

49CaDErNo DE DEsENvolvImENTo hUmaNo // escolas ativas no brasil

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pnud // 201650 51caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

pista fosse em si um indicador de Escola Ativa. Ao contrário, ele indica que ter uma pista de atletismo na escola acarretará em ter vários outros indicado-res importantes para uma escola ativa. Ou seja, a pista de atletismo ou a piscina, representam mais um epifenômeno do que uma causa de uma Escola Ativa. O traço de latência que buscamos identificar não é estático, ele se caracteriza por tendências e não raro tendências são erroneamente interpreta-das ou confundidas por relações de causa-efeito.

Enquanto a forma como a sondagem telefóni-ca foi estruturada por um olhar de conjunto para o que é uma Escola Ativa, entendemos ser necessário “calibrar” o olhar focalizando o particular: a enti-dade escola. Não falamos na perspectiva de estudo de caso, mas do entendimento de que o olhar sobre uma escola permite apreender a escola como enti-dade singular, única. Ainda que cada olhar – o ge-ral e o particular – pareça incongruente em relação ao outro, tomados em conjunto possibilitam uma visão ampliada do nosso objeto: a Escola Ativa no Brasil. Tratamos disso a seguir ao discorrermos so-bre os passos adiante da investigação sobre Escola Ativa e Desenvolvimento Humano.

Faltam ainda outros indicadores que permitam situar as escolas como um “locus de atividade físi-ca” pela ótica da Escola Ativa. Compreender como se realizam as atividades e com quais objetivos; quem participa e porque; qual a qualidade com que essas experiências corporais acontecem e os resul-tados que elas provocam, ainda se faz necessário para a construção de uma concepção de Escola Ati-va mais abrangente. O potencial das escolas repre-sentado pelas oportunidades e condições investi-gadas neste estudo deve ser esmiuçado a partir do conhecimento do contexto próprio de cada escola, da sua capacidade de mobilização e engajamento de alunos, professores, funcionários e familiares, e dos reais impactos gerados nos modos de vida da comunidade escolar como um todo.

Cabe voltarmos à pergunta: O que é uma Esco-la Ativa? É um espaço e um tempo que se constitui para mediar a aquisição de conhecimentos, fo-mentar competências e estruturar oportunidades em e para crianças e jovens (sujeitos pedagógicos

por excelência) com o sentido de ampliar suas escolhas no presente, mas, sobretudo, para lhes dar condições de compreensão e exercício efetivo de construção de experi-ências significativas numa perspectiva de tornar-se o que desejam ser, de forma con-tínua e progressiva.

A Escola Ativa assim posta, vai para além de um local institucional onde se transmite conhecimentos sistematizados num currí-culo. Ela envolve isso também, mas se es-trutura num espaço físico e humano tendo como eixo o desenvolvimento em todas as suas dimensões física, psicológica, social e política. Os espaços assim constituídos vão alinhavar os vários tempos do desenvolvi-mento (ROSSETTI-FERREIRA et al., 2000): o presente onde o agir se concretiza num contexto que denota o vivido nos ethos ou habitus do local; ambos embebidos no ima-

ginário cultural que denota o histórico; e todos se estruturando em torno de expectativas individu-ais e marcos e metas que exprimem o prospectivo.

A concretização de uma Escola Ativa se benefi-cia de inúmeras atividades humanas consagradas na dimensão da técnica e da ciência, do cotidiano e da arte. Dentre esse conjunto de atividades pos-síveis damos destaque às atividades corporais de expressão e introspecção, de esporte e aventura, de jogos e brincadeiras. O fazemos por força de foco e assim sem prejuízo das demais.

Dessa forma, uma Escola Ativa se constitui num espaço físico e humano onde crianças e jo-vens compreendam e incorporem práticas corpo-rais não só nos tempos presente, vivido e histó-rico do Desenvolvimento Humano, mas também no tempo prospectivo. Práticas corporais guar-dam correspondência com atividade física, mas vão além na medida em que sua sistematização não se pauta por critérios de gasto energético,

mas também, e principalmente, pelos sentidos e significados que o movimen-tar-se adquiriu e adquire num contexto histórico e de acordo com a intencionali-dade do indivíduo.

Vale ressaltar que a atividade motora que compõe as práticas corporais é tanto subsidiaria, e portanto, é um meio de De-senvolvimento Humano quando pratica-da adequadamente, como essa atividade é um fim em si mesma, isto é, a sua prá-tica proporciona sentidos, significados, conhecimento pessoal único. O mover-se propicia experiências pessoais que estão na base do viver. Quando nos movemos realizamos processos de imaginar, per-ceber, desejar, decidir, planejar, efetuar e avaliar, e esses processos são ampliados quando se considera o contexto físico e social e assim outros processos se reali-zam: conciliar, cooperar, desafiar, inves-tir, superar, competir. O desenvolver-se ocorre na medida em que o indivíduo age, ativamente ressaltamos, explorando seus graus de liberdade (um conjunto de elementos bio-psicológicos), efetuando ações e efetivando resultados.

Assim, o indivíduo age consigo e com os outros, explora meios e fins influenciando os que estão no seu entorno (pais, cuidado-res, irmãos, parentes, amigos, professores, etc.) e sendo influenciados, eles próprios, em desenvolvimento pelas mesmas vias. Assim o indivíduo se desenvolve quando busca, elabora, cria e recria novos modos de agir para exercer suas escolhas e ampli-á-las. E desse modo dizemos que o indiví-duo constrói sua experiência, que é o tecido a partir do qual se faz o desenvolvimento. Uma Escola é Ativa quando proporciona à criança e ao jovem espaços e tempos para que eles construam elaborem e exercitem modos de agir na ampliação e escolha de caminhos que constituirá a trajetória de desenvolvimento de cada um. ◊

UMA ESCOLA É ATIVA QUANDO PROPORCIONA à CRIANÇA E

AO jOVEM ESPAÇOS E TEMPOS PARA QUE ELES CONSTRUAM,

ELABOREM E ExERCITEM MODOS DE AGIR NA AMPLIAÇÃO E

ESCOLHA DE CAMINHOS QUE CONSTITUIRÃO A TRAjETóRIA

DE DESENVOLVIMENTO DE CADA UM.

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pnud // 201652 53caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

5 Conhecendo as Escolas Ativas no Brasil: Quando conhecer é antes transformar o que se conhececapítulo

a o conhecermos algo, operamos sobre e, assim, o transformamos em objeto. o ato de desve-lar a Escola ativa, e dessa forma conhece-la, nos permitirá atuar sobre ela e transformá-la.

todavia, a transformação não é unívoca: conhecer, ope-rar e transformar o objeto, impacta e também transfor-ma quem conhece. Iniciamos o percurso dessa pesquisa com uma leitura dos conceitos de Escola ativa já estabe-lecidos e daí fizemos a nossa própria construção do con-ceito Escola ativa tendo como referência o conceito de Desenvolvimento Humano e os conceitos de atividade e Experiência. onde chegamos e o que sabemos?

• Que lhes permitem mergulhar no universo cultural de seu tempo; • Que lhes dão os meios para incorporar e mudar hábitos que igualmente promovam seu bem estar;• Que lhes ampliam as capacidades de obter, selecionar, gerenciar informações na solução de problemas;• Que lhes proporcionam o exercício da agência no seu próprio desenvolvimento em sintonia com a sociedade em que vivem, mas também com a capacidade de contribuir para sua transformação.

o v í N C U l o E s C o l a a T I v a E D E s E N v o l v I m E N T o h U m a N o

a escola ativa é um espaço privilegiado para promover o Desenvolvimento Humano. Nela, a criança e o jovem podem elaborar e experimentar ações:

• Uma escola é Ativa quando a ação é encarnada, compreende e promove o conhecer no mover-se;• Uma escola é Ativa quando a ação se estrutura em práticas corporais significantes a um tempo e lugar, mas também significadoras, transformadoras do tempo e lugar do sujeito.

o v í N C U l o E s C o l a a T I v a E a ç ã o

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2

as 12RazõesQUE TORNAM A ESCOLA UMA

esCOlaativa

5

86

advOGa a favor das práticas

corporais para todos os envolvidos com a escola tanto

dentro como fora do currículo, disseminando

informações baseadas em evidência de forma

concisa, consistente e acessível

envOlve toda a comunidade no

planejamento e execução da política de atividades físicas/práticas corporais

no cotidiano da escola

• Recursos humanos suficientes e com formação adequada para planejar e executar ações de promoção de práticas corporais dentro e fora do currículo escolar

• Materiais didáticos adequados e em quantidade suficiente para atender as necessidades didáticas de todos os alunos

• Estrutura física adequada para as práticas corporais nos diferentes momentos do cotidiano escolar

OPORtuniza práticas corporais diversificadas nas aulas de Educação Física e em outros momentos do período escolar (outras aulas, períodos de recesso, contra turno)

avalia regularmente a qualidade e a quantidade do envolvimento dos seus alunos com práticas corporais na escola e fora delaestaBeleCe

Metas para quantidade e qualidade das práticas corporais no projeto político pedagógico; Relações com outras instituições de forma a ampliar as oportunidades de práticas corporais para seus alunos (clubes esportivos, eventos)

3 4POssui: 1

7eXPliCita em seu programa o compromisso com o aprendizado de práticas corporais diversas, tanto o seu saber orgânico (prático) quanto o saber relativo às suas significações históricas

GaRante no currículo e fora dele oportunidades para aprendizagem de um espectro de práticas corporais que permitam autonomia e liberdade no envolvimento atual e futuro dos alunos com uma vida ativa

55CaDErNo DE DEsENvolvImENTo hUmaNo // escolas ativas no brasilPNUD // 201654

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pnud // 201656 57caderno de desenvolvimento humano // escolas ativas no brasil

conclusão

A concretização de uma Escola Ativa se beneficia de inúmeras atividades huma-nas consagradas na dimensão da técnica e da ciência, do cotidiano e da arte. Den-tre esse conjunto de atividades possíveis damos destaque às atividades corporais de expressão e introspecção, de esporte e aventura, de jogos e brincadeiras.

Praticas corporais guardam corres-pondência com atividade física, mas vão além na medida em que sua sistematização não se pauta por critérios de gasto energé-tico, mas também e principalmente pelos

e aGORa?

11

como mencionamos antes, é preciso exercitar o olhar, a mirada e transformá-la. Nossa pers-pectiva é a de abarcar a Escola ativa a partir de dois olhares: um amplo e outro focado, um geral e o outro particular/local/ideográfico. para isso, nesse momento estamos indo a algumas escolas pelo Brasil afora. Balizados pela sondagem telefô-nica e por critérios já praticados na definição da amostra para sondagem, elegemos vinte escolas de diferentes regiões geográficas do Brasil que estão sendo visitadas por nossos pesquisadores. o propósito é conduzir uma pesquisa qualitativa

tendo como referencial a antropologia e a ferra-menta da etnografia. Faremos assim uma imersão nessas escolas: senti-las, experimentá-las, vivê-las, mas sobretudo apreender as suas dinâmicas como contextos de Desenvolvimento Humano que podem ser modelares de Escola ativa em suas identidades e particularidades. um grupo de dez pesquisadores foram selecionados para condução das etnografias, tendo passado por um período de treinamento e alinhamento quanto ao que se busca apreender no âmbito da presente pesquisa sobre Escola ativa e Desenvolvimento Humano. ◊

9COnsideRa na organização dos tempo e espaço escolar, na sala de aula e fora dela, oportunidades livres ou guiadas para as práticas corporais

valORiza o envolvimento de seus alunos com as práticas corporais na escola e fora dela

ORGaniza os espaços e rotinas didáticas no período escolar de maneira a reduzir o tempo sedentário

12ensina através da disciplina de Educação Física e outras atividades curriculares um amplo espectro de práticas corporais que acrescentam protagonismo e liberdade de escolha frente às oportunidades presentes no seu cotidiano e ao longo da vida, bem como empoderamento, para que o aluno possa envolver-se criticamente com a sua própria prática corporal

10

o que é uma Escola Ativa? Essa foi a questão que disparou todo o processo investigati-vo que relatamos e que ainda está em mo-vimento. Já se desvelou a nós que Escola

Ativa é um espaço e um tempo que se constitui para mediar a aquisição de conhecimentos, fo-mentar competências e estruturar oportunidades para e com crianças e jovens (sujeitos pedagógicos por excelência) com o sentido de ampliar suas es-colhas no presente, mas sobretudo para lhes dar condições de compreensão e exercício efetivo de construção de experiências significativas numa perspectiva de tornar-se o que desejam ser, de forma contínua e progressiva. Logo a Escola Ativa promove o Desenvolvimento Humano, ao mesmo tempo em que o Desenvolvimento Humano po-tencializa o grau de ativismo de uma escola.

A Escola Ativa assim posta, vai para além de um local institucional onde se transmite conheci-mentos sistematizados num currículo. Ela envolve isso também, mas se estrutura num espaço físico e humano tendo como eixo o desenvolvimento das pessoas em todas as suas dimensões: física, psico-lógica, intelectual, social, cultural e política. Os espaços assim constituídos vão alinhavar os vários tempos do desenvolvimento: no tempo presente onde o agir se concretiza num contexto que denota o tempo vivido nos ethos ou habitus do local; am-bos embebidos no imaginário cultural que deno-ta o tempo histórico; e todos se estruturando em torno de expectativas individuais e marcos e metas que exprimem o tempo prospectivo.

A ESCOLA ATIVA SE ESTRUTURA NUM ESPAÇO fíSICO E HUMANO TENDO COMO EIxO O DESENVOLVIMENTO DAS PESSOAS EM TODAS AS SUAS DIMENSÕES: fíSICA, PSICOLóGICA, SOCIAL, CULTURAL E POLíTICA.

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referênciAsbiliográficAs

sentidos e significados que o mover-se corporal-mente adquiriu e adquire num contexto histórico e de acordo com a intencionalidade do indivíduo.

Vale ressaltar que a atividade motora que compõe as práticas corporais é tanto subsidiaria do desenvolvimento das pessoas como é um fim em si mesma. O mover-se propicia experiências pessoais que estão na base do viver. Quando nos movemos realizamos processos de imaginar, perceber, desejar, decidir, planejar, efetuar e avaliar, e esses processos são ampliados quando se considera o contexto físico e social e assim ou-tros processos se realizam: conciliar, cooperar, desafiar, investir, superar, competir.

O desenvolver-se ocorre na medida em que o indivíduo age ativamente , explorando seus graus de liberdade, efetuando ações e efetivan-do resultados. O indivíduo age consigo e com os outros, explora meios e fins influenciando os que estão no seu entorno (pais, cuidadores, irmãos, parentes, amigos, professores, etc.) e sendo in-fluenciados, eles próprios em desenvolvimento pelas mesmas vias. Todo o processo se dá ainda por transições no modo de agir a partir da cons-trução de experiências por parte do indivíduo no espaço físico e social, destacando assim o indiví-duo como sujeito de seu desenvolvimento.

O Desenvolvimento Humano, por sua vez, encontra nesse cenário o contexto primordial para que se efetive um processo de real expansão das liberdades das pessoas. Só um indivíduo que seja sujeito de seu desenvolvimento, e que seja agente livre e sustentável desse processo, pode atuar como motor do Desenvolvimento Humano. Pode experimentar a expansão de suas capacida-des e oportunidades e a consequente liberdade de escolha delas advinda. As duas ideias centrais dessa concepção: a noção de liberdade como fim

e meio do desenvolvimento e o papel das pessoas como agentes de desenvolvimen-to são assim retomadas e imbrincadas com a centralidade do movimento corpo-ral enquanto aspecto vital na existência de qualquer pessoa.

Assim, uma Escola é Ativa quando se constitui nesse espaço, que proporciona o contexto para o Desenvolvimento Hu-mano, sendo os indivíduos sujeitos do seu próprio desenvolvimento. ◊

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Quantas escolas ativas há no Brasil? o que fazer, que políticas e programas implementar, para que as escolas sejam mais ativas? como melhorar os instrumentos de coleta de dados para entender e monitorar com qualidade o que acontece em termos de atividades físicas e esportivas nas escolas? Qual é a relação, afinal, entre desenvolvimento humano, enquanto ampliação da liberdade de escolha das pessoas, e escolas ativas?

Essas são algumas das questões que ensejaram a investigação cujos primeiros resultados são apresentados nessa publicação. a intenção é contribuir para o debate, trazer elementos para a construção de uma visão sobre escolas ativas e, claro, apontar rumos possíveis de mudança. tudo para que, cada vez mais, as escolas se constituam enquanto espaços que favorecem o movimento das crianças e dos jovens, e toda a comunidade a ela ligada, enriquecendo suas vidas no presente e no futuro. ◊

O que é umaesCOlaativa?