Caderno de direito economico

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DIREITO ECONÔMICO I Prof. Diogo Rosenthal Coutinho ERICA MAKIYAMA XII-185 2º SEMESTRE 2015

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DIREITO ECONÔMICO I Prof. Diogo Rosenthal Coutinho

ERICA MAKIYAMA XII-185 2º SEMESTRE 2015

Panorama Político

Institucional do Brasil 1. Introdução1

Revolução de 30 é o momento de ruptura para a matéria, e a partir de então ocorre a

industrialização e mudanças na estrutura. A ideia é começar a mapear o pano de fundo para

entender o Direito Econômico (“DE”). Sem o panorama político institucional de cada momento

da economia e da economia política brasileira desde os anos 30 até hoje, sem o exercício

minimamente articulado para compreender o que está em jogo em cada época do DE, não

dá para falar do DE. Não dá para falar de Direito Econômico em abstrato, pois ele está situado

historicamente, Isto é, ele não paira no vácuo.

Não dá para discutir o acórdão de 1933 a não ser que topássemos fazer um exercício

ingênuo de compreensão do que estava acontecendo no país e no mundo naquele momento.

Em 1933 o mundo estava se acabando pela crise de 1929, que estava impactando de forma

radical todas as economias do planeta. Assim, o Direito Econômico daquela época, a

intervenção do Estado na formação do preço do café é reflexo do que acontecia no mundo.

Como a crise golpeou de forma severa a economia cafeeira, Getúlio manda queimar café e

jogar no mar para levantar o preço do café que estava derrubado, gerando escassez para

aumentar o preço.

Contextualizar não é algo que fazemos no DE como espécie de luxo, mas sim fazer o

próprio DE. Não faria sentido começar a aula sem fazer panorama muito genérico do que foi o

papel do Estado desde a década de 30 até o período mais recente. Isso se justifica para

entendermos quais são algumas variáveis relevantes para quem quer entender o DE em cada

uma das épocas. Por exemplo, se nos anos 30 não havia globalização, não é verdade que não

havia economia global e nem comércio internacional.

Há variável, por exemplo, da economia política internacional ou das dinâmicas

domésticas que compõe as variedades de capitalismo, que pressupõe que não há um

capitalismo só. O que existem são tipos muito peculiares de capitalismo. Capitalismo da China,

da Angola, do Brasil, são todos diferentes. Não dá para generalizar muito quando pensamos

em países diferentes. Algum grau de generalização dá para fazer, como “países

desenvolvidos”, “países em desenvolvimento”, mas há especificidade em cada tipo de

capitalismo. Haveria N variáveis para entender o plano doméstico e pintar o que seria a

variável do capitalismo brasileiro. A tabela é um modelo simples de análise.

1 VER ANEXO 1

Assim, o Direito é produto do contexto histórico. Isso quer dizer que o Direito é

determinado pelas políticas econômicas? Há algum determinismo? O direito é influenciado

pela economia e política e é unidirecional? A alternativa é pensar que não só o direito é

produto de influências da economia e da política, mas que o direito também influencia essas

variáveis. Direito é produto, mas ao mesmo tempo é insumo. Em que medida isso acontece? É

uma pergunta empírica e não teórica, necessitando de estudos em cada país.

2. História da segunda metade do século XX O padrão de intervenção estatal na economia passa, sobretudo após final da Segunda

Guerra Mundial, por curva ascendente, que aumenta em termos quantitativos, tornando o

Estado cada vez mais presente na economia brasileira. Ele interfere mais, restringindo mais a

liberdade econômica dos agentes privados, seja porque ele cria mercados que não existiam

para certos setores relevantes, seja porque o Estado cria a si mesmo, criando instrumentos de

direito econômico e direito em geral para formar a musculatura para os seus projetos de

desenvolvimento.

O Estado não só cresce na sua atuação como um Estado, mas também na sua

estrutura institucional. Isso é constante ao longo do século XX e em alguns momentos de

inflexões, ele se retira da economia. Na década de 90 com eleição de Collor, a inflexão foi

mais profunda. É o momento em que acaba a Era Vargas e vem a economia política

neoliberal e o Estado se retrai, mas não elimina toda construção jurídica institucional do período

anterior. Por mais que haja emendas constitucionais, privatizações, reformas do Estado para

construção de agências reguladoras, ainda assim muita coisa do período anterior remanesce.

Isso significa que as instituições, normas, órgãos, processo, etc. mais se sobrepõem em

“camadas geológicas” do que substituem umas às outras. Então não há substituição de Direito

Econômico velho pelo novo.

No início dos anos 2000 há novamente uma inflexão. Parece que estamos vivendo um

período de inflexão a partir de 2008 quando vem uma nova crise tão ou mais grave que de 29.

A cara do DE muda de novo, não por causa só da crise, mas pela conjuntura de políticas

domésticas. O capitalismo brasileiro se torna altamente complexo em 85 anos e altamente

juridicizado. Deixamos de ser uma fazenda de exportação de café para se tornar uma

economia de porte bastante significativo, com planta industrial semiacabada e indústria que

com certeza não é atrasada. A produção normativa é incessante, seja no momento de dar

musculatura para o Estado, seja na hora de tirar o Estado da economia. Tanto “mais Estado”

quanto “menos Estado” na economia são políticas públicas.

A) Crise de 29 e Revolução de 30 A década de 30 se abre como um dos desdobramentos inesperados e devastadores

da crise de 29. A grande depressão afeta não só as economias desenvolvidas da Europa e dos

EUA, mas também de economias periféricas como a nossa. A crise de 29 causa (variável:

economia política internacional) um colapso do sistema mundial de crédito. Significou uma

depressão severa do mercado de capital; um golpe muito duro em todos os sistemas industriais

e produtivos no geral de economias relevantes; desemprego e deflação maciços; e significou

colapso e implosão do comércio internacional.

Imaginemos tudo isso ao mesmo tempo em uma economia baseada no café, cuja

balança de pagamento dependia de um mercado comprador para adquirir o nosso principal

produto. Uma crise que abala tudo isso, gera inflação, e afeta todas as cadeias comerciais que

havia na época, só pode impactar de forma muito dura a legislação e as medidas e decisões

políticas num país como o Brasil, que estava inserido naquela Divisão Internacional do Trabalho.

Brasil era um país periférico, com zero indústria, que precisa, num contexto como esse, decidir o

que precisava fazer. Era a hora da bifurcação.

Com a Revolução de 30, o Brasil precisa enfrentar um projeto de diversificação de

atividades manufatureiras que praticamente não existiam. Havia alguma manufatura primitiva,

mas nada que pudesse chamar de base industrial, havia apenas fabriquetas. Na década de 30,

foi preciso reagir à crise, e a resposta do governo de Getúlio Vargas foi bastante pragmática,

não ideológica e nem por visões econômicas. As teorias econômicas de desenvolvimento só se

formam no corpo teórico acadêmico mais para frente.

Vargas tomou de forma intuitiva certas decisões. A reação foi muito menos pensada

em termo teórico e muito mais uma reação pragmática: precisava diversificar a base

manufatureira e criar uma indústria. Isso significava uma ruptura política, não trivial, nem um

pouco pacífica das coalizões políticas que sustentavam as velhas oligarquias no momento do

café. Entravam em uma espécie de liquidificador, um período instável e turbulento. O fato é

que a grande depressão tinha colocado em cheque a economia cafeeira e colocado em a

questão de alternativas para tal produto. Não íamos conseguir trocar café por laranja, minério

de ferro nos anos 30, porque o que estava em questão é a depressão na demanda por

produtos de baixo valor agregado, chamados hoje de commodities. Não era questão de

trocar commodity, mas mudar a cara da economia brasileira. Alguns analistas chamam essa

reação de espécie de Keynesianismo antes mesmo do Keynes (publicado em 1946 apenas).

Outros discordavam disso.

Seja como for, isso foi usado como instrumento ativo para promover e induzir a criação

de novas atividades produtivas no Brasil. Isso exigia capacitação técnica do próprio Estado, ou

seja, ele precisava se autoconstituir, o que pressupunha criação de órgãos e instâncias de uma

nova tecnoburocracia; pressupunha a multiplicação de regulação da economia e mais,

indução da criação de estruturas industriais que não havia antes. O Estado precisava fazer isso

não apenas como indutor, planejador, mas fazer isso como empresário (Estado Empresário). É o

momento em que a cara do Estado começa a mudar com a função de diversificar a

economia brasileira. Basicamente, antigamente o que o governo fazia é controlar o preço de

café controlando a taxa de câmbio, mas isso já era arcaico. Assim, a intervenção se torna mais

intenso.

B) Era Vargas Sabemos que o governo Vargas teve 3 fases. No Governo Provisório (1930-34), enquanto

esperava uma nova Constituição, ele governou por Decreto de forma centralizada, pois havia

uma Constituinte em curso. O grau de centralização de tomada de decisão no Executivo ou

Legislativo é uma variável relevante para entender o DE. Onde estão sendo tomadas as

decisões? Momentos de crise comumente estão junto com a centralização política de decisão

no chefe, o que significa que as decisões são mais pragmáticas, mas menos debatidas e mais

deficitárias em termos de legitimidade, pois não está dentro da ideia de freios e contrapesos.

Nos 100 primeiros dias de New Deal, Roosevelt mandava projetos de lei prontos para que fosse

aplicado. Quanto mais atores envolvidos na formulação de regras do DE, mais consequências

há em comparação com cenários que tem menos instâncias decisórias, com ônus e bônus.

Decisão tomada de forma centralizada é mais rápida e pragmática, mais capaz de estancar

sangrias em momento de crise, mas são menos democráticas e controláveis, e isso é relevante

para entender o DE. A gênese é importante para entender a função e a “cara” do DE.

O segundo período é o Governo Constitucional (1934-37). É um período curto em que já

havia uma Constituição. Contudo, em 1937 ele dá um golpe e vira ditador Getúlio Vargas,

ficando no poder até 1945.

No período do Estado Novo (1937-45) há um novo CF, escrito por Francisco Campos

(“Gênio do Mal”). Ele escreve uma nova CF e dá ao Estado muitas ferramentas de ação na

economia. Alguns apareciam até na CF de 34, mas se tornam muito mais autoritários na CF de

37. A CF mais do que dá uma espada, dá dentes e garras para o Estado fazer coisas na

economia brasileira:

Lei da Economia Popular: uma lei produzida dentro do Palácio do Catete, no

coração do Poder Executivo, que dava ao Estado brasileiro poderes para

interferir na formação do preço, na forma de relacionamentos entre agentes

econômicos, entre outros;

Lei da Usura: lei que exemplifica de forma muito clara esse novo padrão de

atuação do Estado no domínio econômico, na medida em que diz quanto o

dinheiro vai custar, pois tabela o preço do dinheiro! Nenhum contrato poderia

violar esse juro.

Outros exemplos: além disso, durante a Era Vargas uma legislação trabalhista

surge no Brasil, e isso também é tema de DE. Podemos ver o papel do Estado na

regulação do trabalho sob a ótica do DE. Se o Estado fixa algo chamado

salário-mínimo, ele está influenciando de forma decisiva a conformação

econômica de um país. Se o Estado pode expropriar a propriedade privada

com ou sem indenização, estou criando regimes de DE totalmente centrais na

economia. Se o Estado pode expropriar propriedade privada improdutiva sem

indenização, estou construindo a minha variedade de capitalismo de um jeito

diferente de quando digo que precisa de indenização.

O Direito não só regula elementos centrais do capitalismo, como também cria essas

categorias. O DE cria categorias jurídicas centrais do capitalismo. E na Era Vargas vimos muito

isso, porque é o momento em que estava surgindo aquilo que ainda não havia. Era visível o

padrão de ação governamental de intervenção jurídica do Estado na economia brasileira.

C) Redemocratização Em 1946, depois que o governo Vargas cai por uma intervenção militar, abre-se espaço

para redemocratização. Aqui entra em campo o Eurico Gaspar Dutra e o seu governo foi um

governo no qual aquele ritmo de intervenção arrefece um pouco, ou seja, ocorre moderação

na intervenção. Embora não tenha feito nenhum retrocesso, ele dá uma desacelerada no

processo. Ele tenta colocar o plano SALT (saúde, alimentação, transporte e educação), mas o

plano “morreu na praia”.

Vargas volta em 1950, agora num governo democrático, e retoma o papel do Estado

na intervenção. Contudo, agora o Vargas tem um plano. É aqui que surge o debate SIMONSEN

e GUDIN. É o momento em que ele se mostra aberto a novas teorias econômicas capazes de

defender um projeto industrializante. É o momento em que ele fala das propostas da CEPAL

(Comissão Econômica para América Latina e Caribe) para pensar o desenvolvimento da

América Latina.

Obs.: A CEPAL desenvolveu uma teoria nova de desenvolvimento econômico

(com a ajuda de Celso Furtado), que pressupunha fundamentalmente que na

Divisão Internacional do Trabalha havia o centro, que demandava produtos e

gêneros de baixo valor agregado – normalmente de alimentos e minerais – e a

periferia importava do centro produtos industrializados. A teoria CEPALINA

criticava essa divisão a partir da pressuposição de que quem importa matéria-

prima e exporta produto manufatura, ao longo do tempo, ganharia. É contra a

teoria Ricardiana. Essa teoria mostra justamente que esta ideia de que todo

mundo ganha no mercado internacional é uma furada, pois com o passar do

tempo, o centro ganhava mais do que a periferia. É a deterioração dos termos

de troca. Outra teoria é da ISEB, comandada pelo Inácio Rangel, que em linha

semelhante, tentava desenvolver uma teoria para o desenvolvimento.

Getúlio, conhecendo isso tudo, resolve propor um tipo de desenvolvimentismo, mas

lastreado por uma retórica acadêmica e lustrosa, falando que o Brasil teria que desenvolver

uma indústria pesada. Nessa hora, a política de substituição de importações começa a se

tornar mais robusta. Entra um Direito Econômico de novo tipo. O protagonismo do Estado vira

para cima na curva imaginária a partir dos anos 50 com o Getúlio, que interrompe a sua vida

em 1954. Café filho dá uma leve arrefecida novamente na intervenção.

Em 1955 JK dá um novo impulso, acelerando o processo de desenvolvimentismo, e aí

sim instituindo o primeiro esboço de um plano de desenvolvimento econômico: Plano de Metas,

em que Celso Furtado esteve diretamente envolvido. Esse plano teve intenção de atrair capital

estrangeiro (Investimento estrangeiro/multinacional), diferente de Getúlio, que apesar de ter

sido muito hábil ao fazer algumas negociações com o Eixo e Aliados para obter certas

vantagens, não fazia uma política econômica que pressupunha a empresa de capital

estrangeiro.

Essa participação estrangeira fica mais clara com o JK, que passa a pressupor de forma

central a presença do capital estrangeiro. Isso obviamente implica a mudança de legislação,

um encadeamento de novas regras de DE. Criaram regimes de câmbio diferentes, novas

regras de importação, etc. Tornou-se uma economia baseada no (i) papel do Estado; no (ii)

papel do empresariado doméstico; e no (iii) papel do capital estrangeiro (Tríplice Aliança – três

pilares do capitalismo brasileiro).

José Luis Fiori (professor de Política Econômica Internacional) diz que se o Estado era

forte com uma mão para desenhar um DE mais proativo, ele era débil em assegurar a sua

própria autonomia, ou seja, o Estado foi colonizado por interesses privados. Isso é um padrão

histórico, mas o que Fiori diz é que no momento da industrialização, as elites financeiras,

industriais e o capital estrangeiro subordinaram a capacidade de ação do Estado e

amarraram o Estado brasileiro, tornando o Estado enfraquecido de um lado. O que ele chama

de “nó cego” do desenvolvimento é o retrato paradoxal desse esforço robusto de

industrialização, mas da fraqueza de manutenção da economia. José Fiori compara Brasil com

países asiáticos dizendo como a Ásia conseguiu um arranjo público privado, fazendo com que

o Estado se blinde contra os projetos de interesses públicos. Além disso, ele mostra os efeitos

perversos no campo social: migração de campo para cidade, crescimento maluco da cidade,

surgimento de favelas, periferias, etc. Não foi um processo linear, não foi um processo sem

perdedores, foi um processo aos trancos e barrancos, e passível de críticas.

No plano da política internacional, ocorre a Época de Ouro do capitalismo, com o

Estado de Bem-Estar Social na Europa, e o que era um ensaio crítico de macroeconomia de

Keynes vira política econômica Keynesiana numa época pós-guerra em que a economia

internacional crescia prosperamente. E o JK entra nessa onda com o seu Plano de Metas.

O governo de Jânio Quadros durou só 7 meses, que combinou política externa

independente, mas era ortodoxo e conservador na economia. Já o João Goulart retoma o viés

intervencionista, construindo indústrias, realizando a reforma agrária, bancária, urbana, etc., ou

seja, reformas de base. A principal tentativa foi uma reforma agrária, e o que o Jango tenta

fazer é mudar a norma constitucional que determinava que a indenização por desapropriação

demandaria uma indenização prévia e em dinheiro.

A indenização ou não faz toda diferença, e a propriedade não é coisa só do Direito

Privado. Quando lembramos que a propriedade é uma invenção do homem, uma construção

social, que é uma convenção do Direito; se pressupuser que ninguém tem direito natural

Hobbesiano à propriedade, fica mais fácil entender certos debates, e que o direito constrói, em

cada época, uma noção de propriedade, e que quando faz isso, desenha uma forma de

capitalismo.

Quando Jango tenta fazer a reforma de base, uma reação conservadora e autoritária

toma corpo e ele é derrubado em 1964 por militares.

D) Ditadura Militar A Ditadura Militar retoma tendência de ativismo estatal para promoção de

desenvolvimento. Até então já havia pilhas de normas e regras do DE. É mais comum que elas

se sobreponham (não necessariamente de forma convergente) e passem a viver umas com as

outras.

O governo do Castelo Branco é a hora em que surge novas leis, como a lei das SAs (Lei

6.404); criação de regimes bancários; várias empresas estatais já existiam (Estado Empresário);

etc. Além disso, ele fortalece a capacidade fiscal brasileira, por meio de um arrocho salarial.

No ciclo intervencionista, com suas pequenas inflexões, é possível verificar uma expansão de

gastos, com alguns momentos curtos de contenção fiscal, feita menos por redução da carga

tributária e mais por aumento do arrocho salarial. Quem normalmente paga o arrocho são as

pessoas mais pobres. Assim, a tendência é pró-rico e contra pobres.

Entre 1967 e 1969, Costa e Silva dá partida ao Milagre Econômico, período em que Brasil

cresce a taxas jamais vistas, chegando até a 12% ao ano. É o período que cresce

concentrando a renda, pois é o período que todo mundo ganha, mas o rico ganha muito mais

do que os pobres. No Brasil só aconteceu entre 2001 e 2007 o crescimento com distribuição de

renda, e isso tem a ver com a fisiologia do nosso Direito. O nosso Direito é um direito que mais

conserva o status quo, mais cristaliza a distribuição de renda, do que um direito progressista de

forma a produzir redistribuição de renda, relativização da função absoluto da propriedade no

capitalismo, transformador da realidade socioeconômica.

Seminários Seminário 1 – Café

Uma boa forma de entender o direito econômico é situa-lo no contexto de economia

política em que ele se insere. Essa é a chave de ligação entre o direito econômico e o que

tivemos no primeiro ano em Economia Política2.

Cada momento corresponde a um padrão de direito econômico. Se não inteiramente

determinado pela economia política, é resultado dela, ou seja, não é algo aleatório. O DE

pode ser entendido como regulador da nossa sociedade.

Aqui há uma discussão de um caso tido como espécie de precedente importante3. Não

interessa as nuances processuais tratadas nesse caso, mas sim como trampolim de discussão do

tema atual. É caso que vai nos permitir outros debates no campo do DE. Alguns exemplos, de

leis que procuravam implementar um modelo desenvolvimento novo4.

“Examinando detidamente o fator de maior predominância na evolução

social, penso não errar afirmando que a causa principal de falharem

todos os sistemas econômicos se encontra na livre atividade permitida à

atuação das energias naturais. Isto é, na falta de organização do capital

e do trabalho, elementos dinâmicos cuja atividade cumpre, antes de

tudo, regular e disciplinar”5

Getúlio diz que a causa de falha do sistema econômico reside na falta de organização

do capital e do trabalho, que devem ser regulados e disciplinados. Na visão de mundo a partir

dessa perspectiva, o Estado deve regular. A explicação central de falharem os sistemas

econômicos está na falta dessa regulamentação.

Essa é a agenda varguista no começo dos anos 30, que se metamorfoseia durante pelo

menos 5 décadas, em suas variações, mas essa é basicamente a visão do DE. O DE deve

organizar a economia.

Em nenhum momento nesse discurso a palavra democracia aparece nesse contexto,

como elemento relevante para entender o papel do Estado. Não era algo que se associasse

ao debate do papel do Estado. A pressuposição geral era de que o Estado era onisciente, e a

2 Pano de fundo complexo para entender o direito econômico. 3 É difícil falar de precedentes no Brasil, porque não temos no nosso sistema jurídico uma ideia clara do que seja

precedente jurídico. 4 Conselho do Açúcar e do Álcool, Instituto Nacional do Sal, CSN, CLT, Lei da Usura, Lei do Ajustamento Econômico,

Decreto que determina o Curso Forçado (para evitar que as pessoas realizassem comercio na base do escambo), e

tantos outros. É uma lista de órgãos criados pelo período Vargas, que é infindável. O interessante é que esses órgãos

vieram ocupar o espaço de uma sociedade em que havia pouco ou nenhum grau de institucionalidade de regulação

da economia no contexto do desenvolvimento capitalista. Tínhamos direito econômico da república velha, que era

acumulo do direito econômico do império. 5 Parágrafo extraído de discurso feito por Getúlio Vargas em proclamação de rádio

gestão pública, do alto de sua torre de observação, do painel de controle da economia, era

capaz de tomar as decisões adequadas para adotar política econômica proveitosa a todos.

É por isso que nesse contexto o Governo cria inúmeros Conselhos e implementa

iniciativas para estruturar todos eles. Promulga também inúmeros Decretos presidenciais –

quase toda legislação de DE da época vinha através da caneta do presidente da república, e

não por leis do Congresso Nacional. Era o decreto que interpretava os papéis que a CF lhe

dava para regular a economia.

Esses Decretos estruturaram o Estado e organizaram a economia brasileira. Era o DE da

construção da burocracia economia, e era o DE da ação governamental no mercado. Era

também o DE do Estado empresário, que, em setores que acreditava ser chave, agia

diretamente na economia. Por exemplo, intervinha no preço do café, no preço do minério, etc.

É um DE repressivo – o DE do porrete. O porrete é um instrumento de punição, enquanto

a cenoura é instrumento de estímulo econômico, uma racionalidade indutiva. Nosso direito

econômico sempre foi muito mais repressivo do que indutivo, embora isso não seja uma regra

sem exceção. Em geral, o DE mais indutivo, não por acaso, tem mais a ver com períodos mais

democráticos e com períodos mais liberais (no sentido econômico).

Portanto, trata-se da questão do MS 333 da década de 30. Vimos que o STF na década

de 30 teve que enfrentar algumas perguntas em relação a um Decreto. O governo comprava

ou indenizava as sacas de café de produtores que, interessados em exportar café para fazer

disso um negócio, se viram obrigados a entregar ao governo brasileiro 30% da produção,

porque o governo, ao reter um terço de todo o café produzido, esperavam controlar ou

influenciar a formação do preço da principal mercadoria da nossa pauta de exportações

daquela época.

A primeira questão é se o Estado pode interferir no processo de formação de preço de

determinada mercadoria como café. Se sim, outras perguntas: como se faz isso? Poderia impor

um preço teto para determinado grupo de produtores? Poderia obrigar certos produtores a ter

operação no vermelho e usar o Direito Econômico para regular o mercado em busca de atingir

determinados objetivos de política econômica fazendo com que certa parcela da população

enfrentasse prejuízo? Como regular preço e que mercados admitem regulação de preço?

Alguém poderia dizer que nem todos os mercados ou atividades econômicas admitem

regulação de preço por parte do governo, pois vivemos no capitalismo. Essa ideia se torna

rapidamente problemática e simplória: na nossa economia, uma série de mercados é regulada,

em que existe política tarifária. Escola é tipicamente um mercado em que pode ter

tabelamento ou fixação de reajuste de mensalidade. A formação de preço em um

seguimento de atividades culturais também tem sido afetada pela ação normativa do Estado

brasileiro. Como é isso? Como podemos interpretar e compreender o processo de restrição da

liberdade econômica em nome da política pública ou econômica? Que o Estado regula preço

não há dúvida, mas quais são os limites? A formação de um arranjo regulatório de preço é

anterior ou posterior? Qual a diferença entre vendedor de cachorro quente, fabricante de

remédio ou prestação de serviços perante o Direito Econômico?

Cada ministro do STF, pela sua visão de mundo, agregará à resposta a essas perguntas,

um conteúdo indisfarçavelmente ideológico. No caso das mensalidades escolares, uma

interpretação mais liberal diria que poderia regular o preço se as escolas abusarem das

mensalidades, só que isso é feito depois que os abusos acontecem. Já ministros mais

conservadores diriam que a regulação deve vir antes dos abusos acontecerem. Então a

regulação deve vir antes, depois ou os dois ao mesmo tempo?

Vamos pular de uma decisão dos anos 30 para casos mais recentes, com a finalidade

de mostrar que certas controvérsias antigas ainda estão por aí e que através da sua discussão

é possível compreender a ordem econômica atual.

Seminário 2 – Destilaria Alto Alegre6 No caso da Lei 4.870/65, a regulação do preço estava abaixo do valor de custo

suportáveis por produtores de produtos sucroalcooleiros, situação típica da década de 80, em

que um setor importante é regulado por meio da lei. Desde o Decreto 1.831 o governo brasileiro

estabelecia cota de produção, regulava quantidades, etc., e até pouco tempo atrás havia um

órgão regulador chamado IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), vista a relevância do setor

sucroalcooleiro.

A discussão dos usineiros é antiga e típica no Brasil. Cada tonelada de álcool produzido

pela cana tem um potencial energético equivalente a 1.2 barris de petróleo. O setor

sucroalcooleiro tem relevância grande na última década porque o Brasil foi um país que

conseguiu produzir combustível a partir do álcool e é o maior produtor do mundo de cana de

açúcar, seguido de índia e Austrália. Do total produzido, 55% viram álcool e 45% viram açúcar.

Então na década de 60 uma lei fixa critério de formação de preço de produtos

sucroalcooleiro e prevê que o FGV seria o responsável por indicar qual seria o preço de vários

produtos desse setor. Acontece que o próprio governo, que havia regulado e contratado FGV,

começa a obrigar os produtores a operar no vermelho, com prejuízos. Aí os produtores vão

para a justiça e é disso que estamos tratando.

Perguntas: o Estado pode regular preço? Se eu olhar a CF no artigo 1º (que traz os

fundamentos da República), inciso IV, está escrito:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel

dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado

Democrático de Direito e tem como fundamentos:

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

6 VER ANEXO 2

Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa quer dizer gramaticamente valores

sociais do trabalho e valores sociais da livre iniciativa ou significa valor social do trabalho, mas

não da livre iniciativa? Se a livre iniciativa tem valor social é porque ela não é absoluta, e pode

ser restringida. Qual é a função social da livre iniciativa, se eu interpretar gramaticalmente pela

leitura do artigo que ela tem valor social? Posso olhar também o artigo 170, caput:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho

humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência

digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes

princípios: (...).

Não bastasse a livre iniciativa aparecer como fundamento da República, aparece

também a valorização do trabalho. A ordem econômica constitucional brasileira se funda em

duas coisas: (i) livre iniciativa; e (ii) valorização do trabalho. É livre iniciativa, mas é um

capitalismo mediado, contrabalanceado pelo trabalho. Isso faz da nossa CF uma CF menos

capitalista? NÃO. Basta ver a terceira manifestação da livre iniciativa: artigo 170, parágrafo

único:

Art. 170. / Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de

qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de

órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

Se somar artigo 1º, IV com o caput e parágrafo único do artigo 170, haverá um núcleo

relevante de normas constitucionais que consagram a livre iniciativa como regra e não como

exceção. O artigo 170, parágrafo único deixa muito claro que a restrição da livre iniciativa só

pode acontecer por lei. Qualquer um pode desempenhar uma atividade sem autorização, a

não ser que a lei dispunha diferente, ou seja, a livre iniciativa é a regra e a restrição por lei (em

sentido estrito) é a exceção.

Pode restringir a liberdade econômica? Sim, por meio da lei. Isso resolve o nosso

problema? Não. É apenas um parâmetro constitucional para responder a nossa primeira

pergunta. Ao que tudo indica é que sim! É sim em quase todos os países capitalistas, não existe

nenhum país do mundo ocidental capitalista que não preveja normas jurídicas de regulação

da economia. Não existe laissez faire laissez passer a ponto de o Estado não regular em lugar

nenhum em momento histórico nenhum. A questão não é tudo ou nada, preto ou branco. A

questão é quais são as variedades do cinza.

O caso da destilaria nos dá uma resposta que ajuda, embora não resolva, no deslinde

dessa questão. O caso nos diz basicamente que o Estado pode regular preço, desde que haja

lei. Havia inclusive um consultor, mas se existem regras objetivas de fixação de preço, o Estado

não pode, de forma arbitrária, ignorar o procedimento da lei e impor preço menor do que

critérios que ele próprio criou. Então para a destilaria a resposta é favorável, de que ela tem

direito à indenização.

O interessante é que o STF está revertendo uma decisão do STJ (em sentido oposto),

que dizia que poderia estabelecer preço menor do que o custo porque é política econômica,

ou seja, interesse coletivo que sempre sobrepuja o interesse individual. Então o STJ havia dito

que aquela regulação dos preços sucroalcooleiros era admissível. O STJ havia decidido que

junto aos critérios objetivos, seria necessário utilizar critérios subjetivos de interesse, que é

valoração de outros elementos de economia pública. Contudo, o que são esses outros

elementos de economia pública? O que o STJ quer dizer é que em nome do interesse público,

coletivo, pode-se mudar o critério.

O STF então diz que isso traz insegurança jurídica, prejuízo para o próprio consumidor, ou

seja, decisões como essa seriam ruins para o consumidor também. Há um embate de técnica,

mas há um debate sobre o papel do Estado na economia no momento crítico em que alguém

precisava segurar a inflação. O Estado tentou segurar usando vários dispositivos que estavam

ao seu alcance. Durante a década de 80, as tarifas foram congeladas e sucateadas. Quando

houve privatização, muitos esqueceram que as empresas tinham sido quebradas por terem

sido usadas para segurar a inflação!

Assim, o STF conclui que o Estado pode regular preço, mas não pode impor prejuízo,

senão seria caso de responsabilidade objetiva do Estado (não depende da demonstração de

culpa), e tende a haver indenização. O acórdão é explícito ao dizer que seja a atuação do

Estado lícita ou ilícita, se houver prejuízo ao agente privado, ele deve ser ressarcido. Atentem

que não é discussão de licitude ou ilicitude. Se houver imposição de prejuízo ainda que através

de meios lícitos, ou ainda que não tivesse havido desrespeito daquilo estabelecido pelo FGV,

haveria necessidade de indenização.

Ainda no caso do café, alguns receberam subsídio e outros ficaram no prejuízo como

justificativa de igualar as diferentes regiões do Brasil. O fato de alguns produtores receberem

subsídio teria sido explicado como iniciativa de política pública de correção das desigualdades

regionais, que é um dos princípios da ordem econômica, se olharmos o artigo 170 da CF e seus

incisos. É correto o Estado estabelecer de antemão quem vai pagar a conta? É o produtor

(destilaria)? O consumidor? O contribuinte? Partes específicas? Observem o artigo 174:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica,

o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo

e planejamento, sendo este determinante para o setor público e

indicativo para o setor privado.

§ 1º A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do

desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e

compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento.

§ 2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de

associativismo.

§ 3º O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em

cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a

promoção econômico-social dos garimpeiros.

§ 4º As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade

na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e

jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e

naquelas fixadas de acordo com o art. 21, XXV, na forma da lei.

Seminário 3 – Mensalidades Escolares O caso trata da constitucionalidade da Lei 8.039. No contexto internacional, houve a

queda da URSS, processo de globalização e uma onda neoliberal, com uma tendência de

privatização de serviços públicos. Por outro lado, no contexto nacional, havia um período de

pós-ditadura, redemocratização, muita inflação, nova CF, que traz novos parâmetros de

desenvolvimento e que influenciam o DE na época.

Ao mesmo tempo em que o Estado privatiza o serviço de ensino, ele quer regular como

esses agentes fornecem esses serviços (a Lei estabelece, por exemplo, um critério de reajuste

mensal de preço). Ao mesmo tempo em que temos uma política de privatização, há

regulação do preço. O dono da escola só pode aumentar o valor da mensalidade se o salário

mínimo aumentar. Essa Lei foi questionada pela Confederação Nacional de Escolas Privadas,

dizendo que é inconstitucional uma Lei que regule preços dessa forma. Assim, o STF teve que

lidar com essa questão, que não é exatamente de privatização.

Tanto saúde quanto a educação são setores abertos para a livre iniciativa. Ou seja, a

única forma de restringir a livre iniciativa para alguém que quer se tornar empresário na área

de educação é obrigar quem nele atua a observar o cumprimento geral das normas de

educação e não de fixação e reajuste – que não é norma de educação – e obrigar essas

pessoas a se submeter aos testes de qualidade como o ENEM. Nos termos do artigo 209, esta é

a única forma de restringir a livre iniciativa nessa área. Portanto, esta lei, que atrela ao salário

mínimo, é inconstitucional.

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes

condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

O Ministro Marco Aurélio entende que a lei é inconstitucional porque na visão dele,

imbuída de todos os valores que ele traz consigo, a intervenção do Estado na economia, no

caso da educação, deve respeitar os limites do artigo 209. Como a lei discutida não trata de

nenhuma das hipóteses do artigo 209, essa lei seria inconstitucional. Além disso, o ministro diz

que se as escolas começarem a abusar do preço, não tem problema, porque a CF prevê um

mecanismo a posteriori contra abusos que visam a eliminação da concorrência e o aumento

arbitrário de lucros. Então há regras anteriores no artigo 209 e também regras posteriores nos

artigos que tratam do Direito da Concorrência. Como o ministro sabe que se as escolas

abusarem os alunos iriam para a escola pública? Que visão de mundo revela o ministro, que

coloca ao mesmo tempo uma restrição anterior e posterior? Ele é LIBERAL!

Já o Ministro Moreira Alves traz uma perspectiva de justiça social, ou seja, todos têm

direito à educação, e que por isso o Estado poderia intervir mais fortemente. A livre iniciativa

não seria ampla e não estaria atrelado só ao artigo 209. Ele vai por outros caminhos e usa

inclusive outras normas jurídicas para justificar a sua decisão, como o artigo 170, V, que

defende o princípio da proteção do consumidor. Ele diz que o Estado pode sim regular o preço

da mensalidade, porque no artigo 170, além do caput, há vários incisos de princípios da ordem

econômica, e que este é o conjunto normativo relevante para entender o caso, ou seja, se

interpretar a ordem econômica a partir dos princípios do artigo 170, e se fizer recurso ao caput

que diz que a ordem econômica é fundada também na valorização do trabalho humano, e

que o fim é assegurar a existência digna, tenho como resultado que a lei é constitucional,

porque ela está tentando dar algum grau de calibragem para a livre iniciativa no setor da

educação. Ele ainda aponta o artigo 1º, IV, dizendo que a livre iniciativa possui um valor social,

entendendo que estão no plural as duas ideias, ou seja, valores sociais do trabalho e valores

sociais da livre iniciativa.

Há dois ministros, com caminhos diferentes, que não dialogam entre si, chegando a

respostas opostas. Quem ganhou foi o Moreira Alves. A resposta ficou satisfatória? O professor

não concorda nem de um lado e nem do outro.

Nota técnica de 2015: foi declarada que o acesso à educação é justiça social e que

seria aplicável o CDC na relação escola e alunos, assim como o Moreira Alves diz. O PROCON

teria então a prerrogativa de poder de polícia administrativa, para fiscalizar as escolas privadas.

Decreto 3.274 traz uma planilha que as escolas teriam que preencher para dizer se o aumento

é justificável perante os gastos que a escola teve. Nessa nota técnica, o PROCON então teria

esse poder polícia.

Seminário 4 – Meia-entrada Estamos tratando da meia-entrada para o estudante. Há violação do artigo 174? O

estabelecimento comercial invocou o artigo 174 da CF, que poderia ser descrito como espécie

de cláusula regulador do Estado na: (i) fiscalização; (ii) incentivo; (iii) planejamento, sendo

indicativo para setor privado e obrigatório para o setor público. Como a meia-entrada não é

nenhum dos três, portanto, seria inconstitucional.

A questão se resume a esse único artigo da CF? Alguns vão para o artigo 170, caput,

outros para o artigo 1º, IV, etc. Então cada um escolhe a sua fonte normativa para justificar o

seu argumento. Eros Grau volta para o artigo 1º, IV dizendo que há um valor social da livre

iniciativa. O Ayres Britto centra o debate em outro núcleo constitucional: o direito ao acesso à

cultura.

Seminário 5 – Correios Típica histórica do DE brasileiro na vida real. No começo dos anos 90 havia um monte

de empresas grandes (DHL, FEDEX, etc.) que começaram a prestar serviço de entrega de

objetos e correspondências. Nesse pacote de empresas havia inclusive pequenas empresas de

entrega de talão de cheque, de flores, etc. Qual foi a reação dos CORREIOS (empresa estatal

do tipo empresa pública)? Os correios, enxergando uma ameaça a si mesmo, entraram com

uma ação na justiça e argumentaram que uma lei de 1967 lhe dava monopólio na prestação

dos serviços postais. Diante disso, os prestadores de serviço privados foram questionar a

recepção da lei pela CF. O argumento deles era que a CF não havia recepcionado essa lei, e

que, portanto, o correio não poderia ter o monopólio.

Marco Aurélio: fundamentalmente ele diz que o serviço postal já foi lá atrás, quando a

demanda não existia, um serviço de titularidade estatal. Quando não havia empresa

interessada em entregar pacote, fazia sentido que o Estado desempenhasse essa função

sozinha. É por isso que na década de 60 o governo fez uma lei criando os CORREIOS. Entretanto,

ele diz que os tempos mudaram. O capitalismo é mais complexo e tem demanda para serviços

privados de entrega de correspondências, pacotes, etc. e precisaria classificar o que os

CORREIOS fazem, se ele exerce monopólio, se ele presta serviço público, se atua num

seguimento de empresa estatal do tipo estado empresário (artigo 173) ou se a atividade

desempenhada é um caso geral de liberdade econômica (mais ou menos venda de cachorro

quente na rua). Há quatro possibilidades, portanto: (i) monopólio; (ii) serviço público; (iii) estado

empresário do artigo 173 da CF; (iv) livre iniciativa (regra geral de liberdade econômica, do

artigo 170, parágrafo único).

Art. 21. Compete à União:

X - manter o serviço postal e o correio aéreo nacional;

Entre Eros Grau e Marco Aurélio, a resposta é completamente diferente. O art. 21, X da

CF diz que compete ao Estado manter o serviço postal e o correio aeroviário. O que é manter?

É igual a monopolizar? Se fosse assim teríamos um caso de monopólio nesse artigo. Marco

Aurélio disse que é algo como “impedir que desapareça”, e não um caso de monopólio.

Os casos de monopólio do artigo 177 são todos os casos de monopólio da União ou

existem outros casos de monopólio espalhados na CF de 88? Duas possibilidades: se eu

entender que há outros casos espalhados, o art. 21, X seria um caso de monopólio; mas se

interpretar mais restritivamente, dizendo que todos os casos de monopólio do Estado estão no

artigo 177, o “manter” do art. 21, X não pode significar monopolizar.

Marco Aurélio está dizendo o seguinte: o Estado serve para fazer coisas que o mercado

não está fazendo, com uma função supletiva em relação à iniciativa privada. Quando

ninguém quer entregar correspondência, quando no Brasil império não tinha nem empresas

para fazer isso, fazia sentido o Estado falar nisso, mas hoje, no capitalismo, isso não faz mais

sentido! Marco Aurélio dá duas razões então: (i) o verbo “manter” não é monopolizar; e (ii)

todos os casos de monopólio estão no artigo 177.

Provocação do professor: que história é essa de que a interpretação da CF precisa

mudar só porque o tempo mudou? Que tipo de argumentação é essa de que a resposta é A

ou B só porque os tempos mudaram?

Eros Grau: dentre as quatro possibilidades mencionadas acima, o ministro colocou o

CORREIOS nos serviços públicos. Por exemplo, quem presta saneamento é a SABESP. Ela é um

prestador de serviços públicos, mas é um agente direto do Estado? Ou é uma concessão? Eu

sei que se houver licitação e concessão é um caso de serviço público. SABESP é uma empresa

pública que atua sem concessão, ou seja, é o Estado atuando sem contratar nenhum privado.

Se para Eros Grau, CORREIOS é serviço público, mas não é caso dos artigos 206 e 199, só pode

estar no artigo 175! Se o correio está no artigo 175, o que é que ele deveria fazer? Prestar

diretamente ou indiretamente através de concessão. Para Eros Grau, atividade econômica é

um gênero com duas espécies: serviço público e atividade econômica em sentido estrito.

Marco Aurélio disse que correio não é monopólio porque não está no artigo 177, e ele

acha que correio é uma atividade econômica em sentido estrito (livre iniciativa ou Estado

empresário). Se não é serviço público, e é essa atividade, há dois tipos de atividade em sentido

estrito. Os dois requisitos para o Estado ser empresário é: (i) segurança nacional; e (ii) interesse

coletivo. Marco Aurélio então diz que não é Estado empresário, não é monopólio, não é serviço

público, e sim LIVRE INICIATIVA: é tipo vender cachorro quente na rua! A única restrição seria o

art. 190, parágrafo único: a atividade só poderia ser limitada por lei específica daquela

atividade. Logo, para Marco Aurélio, o que era monopólio em 1967, não foi recepcionado pela

CF e deveria ter se tornado uma atividade livre.

Para o professor, ambos os votos são ruins, primeiro porque o Marco Aurélio é confuso

na classificação do serviço dos correios, e o Eros Grau classifica como serviço público, mas não

deixa claros os motivos.

Seminário 6 - Petróleo O que está em jogo: no regime novo (década de 90) há liberalização pelo FHC, com

novo Marco Regulatório, da área de petróleo e gás.

Quando houver um caso de concessão de monopólio do artigo 177, o petróleo que o

concessionário privado achar ficaria para ele, ou seja, quem achar o petróleo fica dono dele e

pode vender, ganhando dinheiro com isso. A lógica econômica é: eu entro num leilão de

exploração de poço de petróleo na Bacia de Campos, por exemplo, ganho o leilão, tiro

petróleo e vendo o petróleo, que é meu.

O governador do estado de PR disse que isso não pode porque o artigo 177 tem que ser

lido junto com o artigo 176, que diz que as jazidas de hidrocarbonetos fluidos pertencem à

União. O artigo 176 diz que esses recursos não são de quem acha, mas que sim da União, isto é,

o produto da lavra não se transfere para quem achou. Isso vale para 177 também?

Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os

potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do

solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à

União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.

Art. 177. Constituem monopólio da União:

I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros

hidrocarbonetos fluidos;

II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; (...)

Para o Ministro Ayres Britto, jazidas de petróleo e gás são espécies de recursos minerais,

tratadas de maneira distinta no regime constitucional, pois seriam da União. Então o produto

da lavra não fica com o particular (especificidade do art. 177 em relação à generalidade do

artigo 176.) Mas e as mudanças no art. 177 então? Para ele, foi só flexibilização do que é

monopólio, permitindo que Petrobrás tenha auxílio da iniciativa privada.

O Ministro Eros Grau, que venceu, usa também de argumentos consequencialistas.

Consequências de ter causado abertura do setor de petróleo sem que se permita ao

concessionário ficar com a propriedade do produto da lavra.

Para o Ayres Britto, o petróleo encaixa no artigo 176, e quem acha o petróleo não fica

com ele. Para o ministro Eros Grau, o artigo 177 flexibiliza o regime de monopólio, podendo a

União contratar com particulares.

Reforma do Estado e

Liberalização Anotações da Géssika Drakoulakis

1. Neoliberalismo e Liberalização Contexto de economia política

o Internacional

o Doméstico

o Novas ideias

Hayek/Friedman - Laissez faire Thatcher

Coase/Williamson - Nova economia institucional Reagan

Tullock/Kruger - public choice Deng Xiao Ping

Posner/Stiger/Becke - Law and economics/rent seeking

Reformas constitucionais

Funções do Direito Econômico

Liberalização

o Privatização

o Regulação/desregulação

o Concorrência

Agências reguladoras/antitruste

Importante continuarmos com aquele quadro7 em mente. Vimos que a pretexto do

caso dos Correios, uma série de discussões suscitam debates importantes não somente sobre o

sentido técnico de serviço público mas também o papel do Estado na promoção das

atividades econômicas. Vimos que dentro do STF há posições antagônicas, mas isso não é

exatamente um problema, pois é natural que as pessoas tenham visões distintas do papel do

Estado.

Vimos o conceito de monopólio também e como os ministros se aventuram no campo

das políticas públicas e fazem considerações sobre sua implementação nos votos. Nesse

capítulo vamos retomar o fio cronológico do nosso curso e iniciaremos encontros sobre as

implicações de mudança paradigmática do papel do Estado na economia, que aconteceu

marcadamente nos anos 90 mas que iniciou antes e que recebeu o nome de neoliberalismo.

Esse tema é até batido, todo mundo fala do neoliberalismo e dos neoliberais, muitas

vezes para acusar, mas pouco se fala sobre o contexto de economia política no qual emergiu

o neoliberalismo e sobre as transformações no Direito que surgiram a partir dessa mudança

7 Anexo 2

teórica e prática do papel do Estado na economia. Hoje começaremos o momento da

economia política do século XX, contextualizaremos as mudanças que surgiram, as reformas

constitucionais, sobretudo para mostrar como a CF de 88 foi profundamente afetada pelas

mudanças neoliberais. Foi modificada para pavimentar uma série de reformas liberalizantes

pelas quais passou o Brasil a partir de 89, com Collor, para o que chamava de nova economia

de mercado, ainda que não de forma organizada.

A liberalização econômica - grande aposta no mercado - é, curiosamente, processo

planejado pelo Estado. A liberalização traz a bandeira do laissez faire mas através de processo

planejado pelo Estado. E curiosamente de novo esse processo gera consequências - muitas

vezes negativas para a sociedade - não planejadas. Karl Polanyi dizia que o planejamento é

muito mais reação contingencial aos efeitos da liberalização econômica.

Lembrando que esse curso está organizado de acordo com uma história, através da

qual estudamos as mudanças nas funções do DE, veremos como este passará a ter funções de

privatização, desregulação e re-regulação a partir dos anos 90, após ter sido grande

estruturador e planejador do mercado na Era Vargas. E atenção: muito mais comum que os

novos processos jurídicos se empilhem sobre os anteriores e não que os anulem.

De onde vem o neoliberalismo? É história interessante porque ainda não acabou. Muitos

discutem sobre a crise financeira de 2008 ter acabado com o neoliberalismo. Professor não

concorda. Acha que sempre se reinventa e se recoloca.

Neoliberalismo se opõe francamente às ideias keynesianas. Neoliberalismo é "guarda-

chuva teórico" que aborda as oposições às ideias de Keynes e ao estado de bem-estar social,

com consequências avassaladoras. Nenhum país ficou imune às ideias neoliberais. Nenhum

ordenamento jurídico nacional deixou de ser diretamente impactado pelo neoliberalismo.

Importante teórico chamado David Harvey define o neoliberalismo como a teoria que embasa

práticas de economia política a partir da premissa básica de que o bem estar das pessoas

pode ser incentivado pela liberdade e pelo estímulo das habilidades empreendedoras

individuais, dentro de contexto de forte apoio à propriedade.

Hayek era o arqui-inimigo teórico de Keynes. Tiveram debates muito importantes, que

sinalizam as grandes batalhas ideológicas do século XX, pelo menos a respeito do papel do

Estado. Hayek defendia que o futuro não é planejável. Apesar de o Estado ser exemplar, não

há garantia de que o Estado possa prever o futuro e organizar-se de acordo com isso. Para ele

é o mercado que gera elementos que podem levar as pessoas a tomarem as melhores

decisões: conhecimento econômico surge no seio do mercado. Planejamento é tradução

necessária embora escamoteada de grupos políticos que se alçam ao poder e se mantêm no

poder enquanto alegam ser defensores do interesse público e favorecem interesses particulares.

Outro inimigo intelectual de Keynes é Friedman, que gestou, na Universidade de

Chicago, geração de vários economistas - ganhadores de prêmio Nobel - defensores do

neoliberalismo. Era grande professor de Economia, tão articulado e de tanta consistência

teórica quanto o próprio Keynes. Friedman demolia as ideias do Keynes em todas as suas aulas.

E pressupunha que o Estado keynesiano e o estado de bem estar social estavam vivendo

hipertrofia e crise de natureza econômico-financeira. Ele defendia que Estado havia sido

colonizado por interesses privados, travestidos de interesses públicos retoricamente.

Tanto Hayek quanto Friedman propõem drástica reforma do Estado. Ideias inicialmente

vocalizadas em sala de aula viram artigos acadêmicos que extravasam as fronteiras

universitárias. Dois políticos importantes dos anos 80 leram e se deixaram seduzir por essas ideias:

uma inglesa chamada Margareth Thatcher, primeira mulher a chegar ao cargo de primeira-

ministra na Inglaterra, que sempre teve intuição liberal. Por exemplo, ela dizia que não existe

sociedade, somente indivíduos e famílias. Isso é o núcleo sociológico do neoliberalismo.

Também dizia que ninguém cuida bem da sua casa como a própria dona da casa. Isso

significa que cada um só cuida direito do que é seu, que Estado não cuida bem, que não se

deve confiar ao burocrata estatal para isso.

A outra frase de Thatcher, famosa, foi proferida durante a campanha contra o

trabalhista James Callahan, marcada por greve terrível dos mineiros de carvão: “There is no

alternative”, que até virou sigla: TINA. A greve piorou com a eleição de Thatcher, que acusou

os líderes sindicais de serem gatos gordos que não caçavam camundongos, que se

aproveitavam dos trabalhadores e os influenciavam. Quando inverno chegou, grevistas

imaginavam que a opinião pública se voltaria contra Thatcher, pois pessoas não teriam carvão

para se esquentar. Na verdade, Thatcher ganhou a briga política, demitindo aqueles líderes

sindicais. Ademais, ela sempre foi conservadora.

O outro político é Ronald Reagan, que venceu eleições mais ou menos no mesmo

contexto que havia Inglaterra, derrotando Jimmy Carter. Economia americana sempre fora

diferente, pois não tinha empresas estatais como a Inglaterra. Então ele traz grande onda de

desregulamentação, trazendo vários economistas de Chicago para o seu corpo econômico,

sempre na busca de eficiência. Maior liberdade econômica, defendiam, leva a mais eficiência,

mais inovação, padrão mais alto de vida. Falhas de governo seriam mais devastadoras para a

economia que falhas de mercado. Além disso, as empresas públicas seriam perdulárias e

ineficientes e precisariam ser privatizadas.

O conjunto de circunstâncias políticas internacionais também favoreceu a

implementação dessa agenda neoliberal, não só na Inglaterra e nos EUA, mas em diversos

outros países. Que circunstâncias? Os choques do petróleo da década de 70 agravaram o

quadro de estagnação econômica, as guerras, a crise da dívida dos EUA foram variáveis que

ajudam a explicar a emergência de paradigma neoliberal. Não dá para entender esse

paradigma sem entender essas variáveis.

Em 1976, o primeiro ministro Deng Xiao Ping começa a abertura da economia chinesa

para o mercado. Até hoje a China não tem economia capitalista de mercado. É mais fácil

controlar o capitalismo abrindo aos poucos um Estado forte. É mais fácil introduzir capitalismo

que controlar (por isso a China foi mais bem sucedida que os Estados da antiga União Soviética

nesse sentido, que tentaram abrir do dia para noite e depois tentar regular de novo).

Consenso de Washington: mais compilação de ideias que grande novidade. A

novidade é sua pretensão de usar o neoliberalismo como receita para países em

desenvolvimento. Defendem a proteção extrema da propriedade (a discussão em torno da

propriedade e seu regime jurídico é a ponte mais visível entre Economia política e Direito

Econômico). Não é à toa que o Banco Mundial gastou bilhões de dólares na reforma de

sistemas judiciais em países em desenvolvimento, com a intenção de criar sistema judiciário

despido de ideologias, barato e eficiente, pois isso levaria ao desenvolvimento econômico.

Direito era até então espada desenvolvimentista e passa a ser escudo da sociedade contra o

Estado.

Reformas constitucionais no Brasil: na década de 90, governo FHC propôs e emplacou

mudanças na CF, que alteraram a cara do Direito Econômico brasileiro. Especialmente no

primeiro mandato, pois governo foi eleito com expressivo apoio do Congresso (liderado por

Antônio Carlos Magalhães, do PFL). É importante ler as Emendas 5, 6, 7, em diante para ver

quais são essas mudanças, tais como a desnacionalização da proteção à pequena empresa,

quebra de monopólios na navegação de cabotagem, telecomunicações (com a criação de

agência reguladora), etc. Isso serve para ilustrar que neoliberalismo não é sinônimo de menos

Direito. Este apenas muda de papel: passa a ser usado para liberalizar.

Emenda 19 introduz de forma sintomática um novo princípio dentre aqueles da

Administração Pública: surge a eficiência no caput do art. 37. Isso faz parte de processo amplo

chamado de reforma do Estado, conduzido em especial pelo Ministério da Administração e

Reforma do Estado, a partir das ideias de livro que defendia a Administração gerencial:

administração como empresa e cidadão como cliente. Esse projeto criou as agências

reguladoras, as OSCIPs. Tudo isso foi criado através de reformas constitucionais.

Professor pretendeu, nesse capítulo, situar o contexto das novas ideias, para avaliarmos

como o DE nasce de novo contexto de Economia Política e dos embates das novas ideias; o

novo momento da economia política e as consequências desse DE no Direito Brasileiro. São

reformas que contagiaram responsáveis pela implementação de efeitos não apenas no nível

da política, mas da própria gestão pública. O neoliberalismo também virou política pública.

Regulação Anotações da Géssika Drakoulakis

1 - Introdução O propósito é mostrar como o DE resulta, em alguma medida, visões de mundo e qual o

papel da iniciativa privada e dos mercados. Com isso, não se quer dizer que o DE pode ser

mecanicamente determinado pela política ou pela economia. Não se quer dizer que o DE é

pura consequência das visões econômicas da época, mas sim que ele é, em alguma medida,

influenciado pelo embate das ideias em conflito.

Qual a exata medida em que o DE resulta deste ou daquele embate de ideias? Para o

professor, é uma questão empírica que não admita questões regulamentativas. Para o

professor, a agenda de DE passa por estudar em que medida as regras de DE são influenciados

por novos contextos de economia política. Em que medida o Direito é influenciado pela

economia é um dos grandes debates filosóficos e teóricos desde as primeiras ideias clássicas

do Direito.

Autores como Marx discutiam isso e dava a entender que o direito era parte do que ele

chamava de superestrutura ideológica da sociedade. Para o materialismo histórico, as

revoluções acontecem a partir da base econômica, onde estão as relações materiais de

produção, influenciando mudanças na estrutura econômica e do direito

Se fizermos uma leitura esquemática e simplista do Marx, poderia entender que o Direito

é mero reflexo da economia. Um influenciaria o outro, para alguns outros estudantes, mas em

que medida se determinam é um tema clássico da economia política e da teoria do direito. É

um ponto importante e relevante, mas um ponto de pano de fundo do nosso curso, não sendo

central agora.

2. Liberalização, Reforma do Estado e Regulação Novas Ideias e Teorias: Public Choice / NEI / Law Economics (individualismo

metodológico

Reforma do Estado no Brasil – administração Burocrática x Administração →

Discricionariedade Fiscal

Regulação, Falhas de Mercado, Monopólios Naturais Agencias → Segurança Jurídica

Essas ideias chegaram às mentes de novos líderes políticos da época, como Margaret

Tatcher e Ronald Regan, e como esses líderes políticos, imbuídos de conjunto de ideias

neoliberais construíram um novo período de regulação.

O Estado era estruturado em torno de procedimentos e rotinas burocráticas, e o Direito

era utilizado como ferramenta para criar mercados ou constituir juridicamente o seu

funcionamento. O Direito, no neoliberalismo, vira uma espécie de escudo para se proteger do

ímpeto intervencionista do Estado. O Direito passa a ser defendido como sendo ferramenta

pela qual a eficiência econômica, em especial a ideia microeconômica de eficiência locativa,

passa a ser perseguida. Passa a ser instrumento de busca de eficiência econômica, partindo-se

do pressuposto lógico de que esse Direito pode aumentar o grau de utilidade de todos os

cidadãos. Nisso, havia o pressuposto de que haveria uma sociedade mais feliz.

O objetivo útil da política liberalizante é aumentar a quantidade na maior intensidade

possível de pessoas que estão com a sua utilidade no nível máximo. Essa será uma utilidade

mais justa.

Direito e economia do ponto de vista filosófico: o que eu consigo fazer para maximizar o

grau de utilidade agregada numa sociedade? Para torná-la mais justa é necessário tornar os

mercados mais eficientes possível. Logo, a eficiência econômica é caminho para justiça. A

justiça seria resultado de um mercado que funciona bem. Logo, se isso acontecer num nível

exponencial, se o mercado funcionar bem e todo mundo puder engajar-se em situações que

aumentem a sua utilidade agregada, todos ficarão mais felizes. Assim, o grau de utilidade

agregada da sociedade aumentará e ela será uma sociedade mais feliz e mais justa.

Ao levar às últimas consequências a ideia de eficiência econômica como critério de

justiça, o pensamento neoliberal termina subordinando o Direito à lógica da economia. O

Direito perde qualquer autonomia disciplinar em relação à economia porque, no fundo, uma

sociedade mais justa passa a ser uma sociedade mais eficiente. Esse foi o grande debate na

teoria do Direito entre o fundador e um dos mais importantes fundadores da chamada escola

da Law and Economics, que foi um jurista8.

Este capítulo está destinada a aplicar esse conjunto que, de forma irresistível, varreu o

mundo na década de 90 e ver como isso acarretou uma profunda reforma do Estado, na

segunda metade dos anos 90, no primeiro mandato do FHC. Houve um momento de inflexão,

de mudança e ruptura, pois vinha sendo claro um certo padrão de intervenção do Estado na

economia até então.

O artigo 171 da Constituição foi ilimado. Havia uma definição de empresa brasileira de

capital nacional. Quando o FHC, na sequência do Itamar e do Collor, resolveu implementar

projeto do Estado, achou por bem extirpar da Constituição brasileira, algumas normas que

atravancariam o processo de reforma estrutural, que se chamava, na época, de economia de

8 Um debate importante se estabeleceu na teoria do direito. Em resposta a essa visão de justiça e de relação entre

direito e economia, em resposta à visão Posneriana, o Dworkin respondeu ao Posner dizendo que a eficiência não é um

fim, mas um meio para se alcançar outros fins. A eficiência economia não poderia ser em si mesma. Para o Dworkin, o

fim era a igualdade, não a eficiência econômica.

O Argumento do Dosner era um argumento intuitivo mas questionável: alguém discorda que é injusto com a sociedade

e em especial com os menos privilegiados da sociedade desperdiçar recursos escassos? É intuitivo que o desperdício é

injusto. Então não é algo exatamente controverso a ideia de que o desperdício é injusto. Dessa forma, o uso racional é

justo. O contrário do ineficiente é o eficiente, é fazer o mais com o menos. Se é injusto desperdiçar, invertendo o

raciocínio, a única coisa que podemos concluir, logicamente, é que é justo ser eficiente.

mercado. O diagnóstico é que a constituição de 88 olhava mais para atrás do que para o

futuro. Era um estorvo para o projeto de país novo.

O artigo 177, artigo que cristalizava o monopólio da Petrobrás no setor de gás e

petróleo foi modificado e ganhou novos parágrafos – chamada de quebra de monopólio.

Outros monopólios também foram quebrados. Isso não veio apenas das academias e da

cabeça de intelectuais pensantes como Hayek e Posner. O neoliberalismo é um conjunto

complexo de variáveis de economia política doméstica e internacional. Há vários outros fatores

que aconteceram entre os anos 70 e os anos 90 que foram dando força e propulsão ao

neoliberalismo. Torna-se cada vez mais hegemônico e passa a ser regra do jogo quando foi

publicado o Consenso de Washington9.

1. Venda suas empresas

2. Vendas estatais

3. Venda seus ativos

4. Use os recursos auferidos nas privatizações para abater a dívida pública e

melhorar a sua fiscalização

5. Desregule as atividades econômicas reguladas pelo Estado, atividades privadas

reguladas pelo Estado, que são excessiva e desnecessariamente reguladas pelo

estado em nome da concorrência. A regulação estatal, em geral, protege

interesses privados10.

6. Use o seu arcabouço jurídico para definir direitos de propriedade. Nenhuma

economia decola sem direitos de propriedade bem definidos. Para os

neoliberais, a definição clara do que é meu e o que é seu, e, portanto, regras

claras para o caso de expropriação e para o descumprimento de contratos. O

direito tem a função primordial de definir quem é dono do quê11.

Suas ideias são a síntese do neoliberalismo exportadas para os outros países. Uma das

principais ideias do neoliberalismo é a ideia de que a intervenção do estado na economia

torna artificiais os preços que seriam “naturalmente” gerados no mercado. O mercado, por sua

vez, na confluência das curvas de oferta e demanda, geraria preços naturais12. A China, por

9 Estão descritas as medidas de política econômica que os países pobres do mundo devem adotar caso queiram se

desenvolver, por John Williansom. 10 Stiglett escreveu em 1971 The Economic Theory of Regulation, que determina que a regulação é, em geral, a

captura do interesse público pelo interesse privado. Essas normas são mais o resultado dos lobbys privados que

capturam os agentes políticos no interesse privado. O interesse público é uma construção retorica que designa o

conjunto de interesses privados que ganhou a briga política e se transformou em interesse público. Seria melhor que

não se regulasse, e no mercado haveria melhor regulação pela concorrência. 11 Hernando Dissoto é um economista peruano seguidor das ideias de Hayek e defensor do consenso de Washington

que escreveu “Le Outro Cendero”. Defendia que, nas favelas de Lima, deveria ser atribuído o direito de propriedade

dos donos do barraco, de modo que, tornando-se donos, garantidos pelo direito, essas pessoas podem ir ao banco e

com o título de propriedade conseguir um empréstimo e abrir seu próprio comercio e girar a economia. Será

dinamizada e economia. No seu coro está a definição do direito de propriedade para o direito econômico. Essa é a

mentalidade desse livro. Por trás disso está a definição jurídica da propriedade privada. 12 Será que existem preços naturais? Não seria um pouco ilusório acreditar que os preços que surgem no encontro da

oferta com a demanda, seriam naturais? Não é ilusório? Para aqueles que defendem essa ideia, sim. A ideia de que o

mercado é capaz, melhor do que ninguém, de regular a economia, a oferta e a demanda são os melhores em

determinar essa questão.

exemplo, estaria distorcendo um mecanismo de preço de forma artificial apenas para

conseguir expandir a sua pauta de exportação, mas isso é ruim para todo comercio

internacional, que sofreria com essas políticas protecionistas. Não seria necessário interferir no

processo de formação de preço do mercado.

Se todos reduzissem suas barreiras, todos ganhariam. Defendiam que o direito deveria

ser utilizado para ser atraído o investimento estrangeiro. Portanto, nessa disputa por recursos,

seria necessário se posicionar de forma a atrair a maior quantidade de investimento possível.

Pode-se afirmar que não há preço natural: todos os preços são políticos, de alguma

forma.

Existe uma imbricação permanente entre mercado e governo, porque não existe

capitalismo sem estado. Para o neoliberal, entretanto, o estado se reduz a corrigir as falhas de

mercado.

O direito de propriedade é sempre uma forma interessante de olhar as relações entre

direito e economia. Se tivermos que olhar para um pais que nunca virmos e tentarmos fazer

uma análise das relações entre direito e economia, uma boa forma é começar pela forma

com ao propriedade é tratada. Se ela é sacralizada ou não.

O Consenso de Washington chega ao Brasil.

No Brasil, as coisas começam a mudar com a eleição do Fernando Collor de Mello e

sua breve passagem pela presidência da república em 89. De forma pouco planejada, o

governo Collor abre a economia brasileira para o comercio internacional, reduzindo as

barreiras da importação. Depois o Collor é removido do poder por escândalo de corrupção e

Itamar Franco assume.

No governo FHC, um distribuidora de energia elétrica no espirito santo é vendida no

primeiro leilão de privatização do país. Depois de uma série de mudanças constitucionais,

passa a ter um processo de mudança do estado. Fernando Henrique cria um ministério novo,

um ministério de reforma do estado. Esse ministério é comandado pelo então ministro Luiz

Carlos Bresser, um teórico, economista político, que, vestindo o ideário de um estado gerencial,

na medida em que ele tem que ser eficiente e tratar o cidadão como cliente, e ao se tornar

ministro, o economista brasileiro cria uma reforma estrutural da economia brasileira.

“O estado precisa ser reformado. Privatização e liberalização fazem parte dessa

reforma. Da mesma maneira que a disciplina fiscal e a recuperação de capacidade o fazem.

Uma vez isto feito, o estado deverá ver restituída a sua capacidade de formular ... intervindo de

forma moderada mas eficiente. Os mercados não funcionam no vácuo. São instituições que

dependem de outras instituições. Particularmente de um estado forte, ainda que pequeno”.

Estava propondo uma mudança que mantivesse nas mãos do poder público respeito e

poder para gerenciar, mas que houvesse a possibilidade de privatizar e liberalizar outros setores

que não era importantes no seu diagnóstico. O chamado plano de reforma do estado de 1965,

o documento elaborado e divulgado pelo então ministro, que virou uma lei federal, tinha como

intenção colocar em prática essas ideias, contribuindo para a restruturação econômica do

setor público, através da melhoria do perfil e da redução da dívida pública liquida (política

fiscal). Também buscava-se permitir a retomada de investimentos, contribuir para a

restruturação econômica do setor privado e para modernização da infraestrutura e do parque

industrial no país; permitir que a administração pública concentre seus esforços nas atividades

em que o estado seja fundamental na consecução das finalidades sociais.

Quais são os setores que podem ser privatizados e quais os locais imprescindíveis do

Estado?

A) Núcleo Estratégico Para o ministro, corresponderia ao governo em sentido lato. É o setor que define as leis,

as políticas públicas e cobra o seu cumprimento. É o setor em que as decisões são tomadas.

São os três poderes, ao MP e todos os outros responsáveis pelo planejamento e implementação

das políticas brasileiras. Isso é o que deve ser estatal ou público.

B) Núcleo de atividades exclusivas São setores em que são prestados serviços que só o Estado pode realizar: regulamentar,

fiscalizar e fomentar. Exemplo: cobrança e fiscalização de impostos, a polícia, a previdência

social básica, o seguro desemprego, a fiscalização do cumprimento das normas sanitárias, etc.

Esses são exemplos do que seriam para o Ministro atividades exclusivas do estado. Não

se confundem com as primeiras, com o próprio governo, mas que não podem ser terceirizadas.

C) Setor dos serviços não exclusivos Setor em que o Estado atua conjuntamente com outras instituições. Não são exclusivos

do Estado, podendo ser objeto de privatização em alguns casos.

D) Núcleo dos bens e serviços para o mercado Corresponde à área de atuação das empresas. É caracterizada pelas atividades

econômicas voltadas para o lucro, ainda que estejam relacionadas ao estado. Monopólios

naturais são algumas atividades econômicas, que por razões puramente econômicas e não

jurídicas, nos quais não é possível e nem eficiente haver competição. Saneamento básico é um

bom exemplo de monopólio natural.

O ponto central aqui é que existem setores empresariais que são indevidamente

ocupados pelo Estado, em nome da eficiência. O estado tem que se focar naquilo que é

núcleo central da sua atividade, porque isso vai permitir uma atuação mais eficiente ao estado

brasileiro.

O neoliberalismo vinha para libertar a economia brasileira que sempre dominaram as

relações público privadas que sempre dominaram o país. Era esse o discurso apresentado pelo

FHC, apesar do embate que o Brasil vivia na época.

A privatização foi irrestrita no Brasil, abrangendo tanto atividades econômicas em

sentido estrito. Em países em desenvolvimento em que houve privatização, foi necessário,

como resposta, regular certos setores marcados pelo monopólio natural. Mesmo o mais

neoliberal dos neoliberais não diz que era desnecessário. O movimento brasileiro é bastante

semelhante ao que ocorreu na Inglaterra.

A teoria econômica neoclássica, a teoria pré-keynesiana, propugnava que o papel do

estado na economia era corrigir falhas de mercado. O mercado não funciona tão bem quanto

Smith havia suposto, mas é a o motor da economia. Deve atuar de forma supletiva não para

interesses artificiais. O estado é o jogador reserva quando entra em campo quando um

jogador se machuca. No mundo real, que não é o mundo da concorrência perfeita, que os

economistas liberais sabem que não existam, mas que usam como referencial teórico, nos

mercados reais imperfeitos, porque comparados à mercados perfeitos, nesses mercados, não

existe concorrência perfeita. Nesses mercados, todos os agentes econômicos tem o mesmo

tamanho. Nos mercados de concorrência perfeita, não existem monopolista e carteis. Esse

mercado não existe, mas serve para balizar a existência de mercados imperfeitos.

No mundo real existem oligopólios, monopólios e carteis. O direito é parte da justificativa

da criação de ferramentas corretivas de mercado. No raciocínio liberal, o direito serve como

ferramenta de correção de falha de mercado. Não é ferramenta de transformação social.

Bens públicos, externalidades, assimetria de informação.

Defesa da Concorrência 1. Falhas de Mercado

Período pós década de 90 no Brasil até 2007, quando ocorre uma nova inflexão,

fazendo surgir novas ferramentas do Direito Econômico. A década de 90 no Brasil trouxe um

novo “bicho” do zoológico brasileiro: agências reguladoras. Elas têm visão econômica

convencional, baseada na teoria das falhas de mercado. Vimos assimetria de informação,

bens públicos, externalidades negativas, etc.

A teoria embasou a construção intelectual da regulação, como ferramenta pela qual o

Estado induz comportamentos privados ou estimula certos investimentos privados a partir da

pressuposição de que o Estado não tem mais competência e legitimidade para fazer

diretamente tais investimentos para atuar nesses setores regulados. Isso foi o pano de fundo do

surgimento da regulação ao longo dos anos 90 no Brasil e curiosamente ao longo dos anos 30

no EUA com o New Deal. 60 anos depois há o surgimento de agências reguladoras no Reino

Unido, como um “dia seguinte” das privatizações.

As externalidades negativas como falhas de mercado na medida em que traduzem

mecanismo alocativo que não corresponde ao mercado. O ideal passa a ser o contraponto do

que é imperfeito. No mercado de concorrência perfeita, todo mundo que gera um custo na

sua atividade, em tese, internaliza esse custo, ou seja, não exporta para a sociedade custo

nenhum. Contudo, no mercado real, os agentes impõem, exportam ou externalizam custos

para os outros.

Ex.: em uma lavanderia, a camisa teve que ser lavada duas vezes

porque caiu poluição. O cliente só queria pagar uma lavagem, mas o

dono diz que não teve culpa se a sujeira caiu na camisa. O dono da

fábrica de pneus, que gerou a poluição, externalizou o seu custo, pois se

essa fábrica tivesse internalizado os custos da poluição, ao invés de

produzir 20 pneus, teria que produzir menos. No mercado real, a cada

pneu, o fabricante externaliza 5 reais de custo para os outros. Essa é a

grande explicação do Direito Ambiental, por exemplo. Do ponto de vista

econômico, o Direito Ambiental visa internalizar as externalidades

negativas. É uma falha de mercado porque no mercado ideal ninguém

externaliza custos para ninguém, mas não é assim que funciona no

planeta terra.

Em muitas ocasiões a externalização ocorre de forma não intencional, mas muitos

fazem isso intencionalmente. Homo economicus é essa figura metafórica de um homem médio

que faz cálculos de custos para ganhar mais. As pessoas não necessariamente se comportam

assim.

Existe outro tipo de externalidade, lembrando que a externalidade pode ser positiva ou

negativa. Acabamos de ver a negativa: alguém empurra para alguém o seu custo. A positiva é

o contrário disso nos seguintes termos: num mercado de concorrência perfeita todos os ganhos

e benefícios individuais ou sociais são adequadamente precificados e valorizados pela

sociedade.

Ex.: quanto custa ensinar uma criança ou adulto analfabeto a ler e

escrever? Vamos fazer de conta que é R$1.000,00. Essa pessoa, ao longo

de toda vida dela vai ter benefícios ou ganhos superiores ao valor da

conta. Se transformarmos isso em dinheiro, há benefícios que superam os

custos. Quando ensinamos alguém a ler e escrever, essa pessoa

desenvolve um potencial intelectual exponencialmente maior do que ela

teria se não soubesse ler e escrever.

Ex.: quanto custa construir uma rede de saneamento básico numa

favela? Vamos fazer de conta que são 22 milhões. Se gastar isso, ao

longo prazo, as pessoas teriam benefícios maiores do que 22 milhões! Ou

seja, vale muito a pena ensinar a ler e escrever alguém, ou construir

saneamento básico.

O retorno social em longo prazo supera o custo inicial de oferecer ou construir essas

coisas. Educação é um típico caso de externalidade positiva. Educar tem benefícios tão

grandes que qualquer que seja o custo de educar, é mais do que compensado posteriormente.

Isso, em termos de racionalidade econômica, significa que se o retorno é maior do que o custo

deveria haver muito mais educação, serviço de utilidade pública em geral, etc. porque a

sociedade não percebe que os benefícios são muito maiores. Isso é uma falha de mercado! É

uma falha porque o mercado oferece menos educação do que deveria. Num mercado de

concorrência perfeita, a sociedade percebe e consegue quantificar o ganho social. Não

conseguimos fazer isso, por isso que o mercado está falhando, mesmo na externalidade

positiva.

No limite, a educação deveria custa zero, porque se custar zero, consegue aumentar

ao máximo o ganho social vs. custo. E não é por outra razão que existe o ensino público. Do

ponto de vista econômico faz sentido que isso custe zero diante do benefício que vai trazer.

Quanto de hospital o SUS vai economizar se tiver saneamento básico? No longo prazo, faz todo

sentido que alguém faça isso, mas o problema é que o mercado não faz isso. O retorno é

demorado, o mercado não tem interesse naquela comunidade, e o mercado de agentes

privados não oferece ensino de graça.

2. Monopólios & Cartéis A última falha de mercado que o professor quer falar é o cartel. A feira de rua é o

exemplo de um mercado quase perfeito, mas feira de rua não é representação adequada do

capitalismo. O capitalismo é a concentração de poder econômico, concentração de

mercado, e em muitos casos a oligopolização do mercado. Em alguns casos, o que nós vemos

são monopólios. Os estudiosos da concorrência consideram que se alguém tem mais de 65%

do mercado, é um monopolista. Com essa porção do mercado, ela já consegue influenciar o

preço, independentemente da reação de seus competidores, ou seja, não depende da

reação do competidor para fazer o seu preço, podendo colocar quase o preço que quiser.

Exerce-se, portanto, o poder de mercado. Obviamente se imaginar que o referencial teórico é

que todos são pequenos, o mundo real é completamente falho.

Cartéis são formas de conluio entre os competidores, para que eles deixem de competir

se estivessem em um mercado ideal. Eles combinam preços, se coordenam em licitações,

dividem territórios, etc. Tudo isso são formas de cartel. No limite, pode ser igualado ao

monopólio, porque se todos os agentes param de competir, é como se fossem um só, ou seja,

um monopolista.

John Rockefeller começou a furar poço de petróleo no século XIX, quando a indústria

automobilística estava bombando. A sua empresa Standard Oil Company se torna então a

principal ofertante de petróleo e derivados. Capitalismo americano dessa época era menos

regulado e movido pela ideia de que o livre mercado é o motor de transformação social. Só

que o John, por instinto, começa a aumentar o preço do petróleo, começando a incomodar

as pessoas. Ele tinha em mãos uma mercadoria inelástica, e o EUA, em 1980, tiveram que

colocar uma lei dizendo que qualquer tentativa efetiva ou não de monopolização seria crime

poderia levar à prisão. É o famoso Sherman Act.

Agências Reguladoras 1. Introdução

As agências reguladoras e as autarquias vieram do direito anglo-saxão. As autarquias

são vinculadas a ministérios, mas na cabeça do Franklin Roosevelt, as autarquias eram

diferentes: autônomas e independentes, não estão subordinadas a nenhum membro político.

No Brasil isso não era possível (por causa da maneira como autarquias eram reguladas no

Decreto-Lei 200). Ainda assim, decidiu-se usar o que já existia e misturar com o estrangeiro:

autarquias de regime especial, criadas pela doutrina (Hely Lopes Meirelles, em especial),

justificando sua atividade pela existência de falhas de mercado.

No Brasil era muito difícil conceder autonomia a dirigente de agência reguladora. Hoje

os dirigentes têm mandato fixo. Portanto, ao menos em tese, não estão subordinados à política

econômica. Não é incomum que a normatividade da agência reguladora cause discussões de

direito econômico, e por trás dessas discussões há: separação dos poderes e legitimidade

(transparência, controle por parte da sociedade - já que, ao aplicar a lei, as agências acabam

inovando o ordenamento jurídico).

Agências são concebidas para serem autônomas, mas será que não deveriam se

coadunar com o planejamento econômico de um país? A retórica da era FHC era: quem faz

política de governo é o Ministério. Agência reguladora implementa a lei em conjunto com o

Ministério, mas sem criar lei. É um pouco artificial essa construção. Mas se a agência ficar à

mercê do poder político vai conseguir cumprir o papel para o qual foi criada? Então o

verdadeiro desafio é não cair nos extremos e saber balancear autonomia e planejamento.

Outro ponto importante: no Brasil era muito difícil conceder autonomia à dirigente de

agências reguladoras. Isso interessa ao Direito Econômico também. Professor não acredita na

separação entre matéria administrativa, econômica ou comercial. O professor diz então que as

agências reguladoras habitadas ou compostas por dirigentes não podem ser demitidos, e assim

eles não estão subordinados à política econômica do Estado.

Contudo, no dia a dia, esses dirigentes precisam respeitar a lei que regula aquele setor.

Assim, eles são, em tese, agentes independentes que fazem a implementação de uma lei, e

não pessoa diretamente vinculada ao respectivo Ministro ou Presidente da República. Mais do

que isso, os dirigente nomeados – não eleitos – desempenham a sua função em um mandato.

A agência não é mera implementação da lei, porque implementar uma lei é inovar

todo dia a ordem jurídica. É uma ficção jurídica acreditar que o regulador, ao cumpri-la, se

atenha a sua literalidade. Quem aplica precisa construir no dia a dia, inovando a ordem

jurídica. A doutrina tradicional de direito público brasileiro defende que as agências não

podem inovar a ordem jurídica, porque o regulamento não pode inovar a ordem jurídica. O

regulamento desdobra o que a lei diz, mas na vida real, ao implementar a lei, ele cria o Direito,

e isso tem uma série de complicações: por exemplo, o regulador, que não foi eleito, faz Direito.

Isso, do ponto de vista democrático, nos leva a concluir que uma pessoa não eleita legisla todo

dia e não pode ser demitido.

Entretanto, não é incomum que haja pressão para o dirigente sair quando o Ministrou

ou o Presidente não o quer mais. Isso tem a ver fortemente com a separação de poderes,

autonomia, etc. São temas que direta e indiretamente afetam o papel do Estado na economia.

O dinheiro das agências reguladoras vem do orçamento da União.

2. Autonomia x Planejamento As agências têm autonomia, mas eles não deveriam se submeter aos projetos, ser parte

dos projetos do Estado? Se não podem ser controladas, como inseri-las em projeto mais amplo?

O FHC dizia que quem faz política do governo é o Ministério, que vem com agenda cotidiana,

de forma que as agências implementam a lei. Quem executa a política é o Ministério, e a

agência cumpre a lei. Por outro lado, se a agência ficar à mercê totalmente do chefe do

Executivo ou do Ministro, ela contemplaria as suas funções? Precisa de equilíbrio entre

autonomia e participação de projetos. Ex.: Ministério da Comunicação decide pela política de

expansão da banda larga. Como compatibilizar isso com as agências reguladoras? Se isso for

feito no limite, haverá incompatibilidade entre o governo e essas agências. É um dilema

estrutural da regulação no Direito brasileiro.

3. Estabilidade x Adaptação Um dos maiores problemas acontece quando o governo resolve criar uma obrigação

jurídica nova. Regulação precisa ser estável, pois um dos principais problemas da regulação

acontece quando o governo resolve criar obrigação jurídica nova para a agência

regulamentar. Contudo, ao mesmo tempo a regulação precisa ser adaptável, pois muitos

fatores fazem com que a regra às vezes precise mudar.

4. Captura x Controle Democrático Se blindar demais as agências, perdemos o seu controle, mas se controlar de mais, ela

não terá a sua autonomia. Regulador quer vantagem simbólica da permanência do cargo.

Aqui, troca-se a regulação por apoio político. Trocam-se normas reguladoras por apoio político

de permanência no cargo. Entretanto, por se ter uma assimetria, e quem sabe do mercado é o

sujeito que o Estado mesmo regula, como ele sabe que a turbina que a hidrelétrica que o

sujeito usa era a melhor turbina que poderia usar? Quem regula depende de informação de

quem é regulado. Depende-se de informações que agentes regulados têm para regulá-lo. Se

isso é verdade, então, a tendência de médio prazo é que o regulador tenha de comer na mão

do regulado.

O regulador depende tanto da indústria regulada para regular, que ele termina sendo

capturado pelo agente regulado. O agente regulado captura o Estado. O Estado então

encontra, ainda que de forma subjetiva, um arranjo pelo qual o regulado dá a ele informações

estrategicamente que o regulador acha que precisa (por exemplo, o regulado nunca vai

deixar o regulador saber o quanto ele fatura). Se isso é verdade, para o Stiber, a regulação é

algo ruim. Ele é um autor neoliberal e reage à regulação, pois ela cria relações impróprias e

indesejáveis entre regulado e regulador. Ele acaba privilegiando o regulado mais forte, que

terá mais poder de barganha.

Se a ferramenta regulação não funciona, ele deve ser retirado, ou seja, se a falha de

governo for maior do que a falha de mercado, deve-se retirar a regulação. Dessa forma, a

ferramenta para combater o monopólio e cartel são as leis antitrustes. O nome do jogo é a

intervenção seletiva e inteligente do governo. Quais são os casos em que precisa de mais

Estado e quais são os casos que não precisa do Estado?

5. Concorrência A concorrência é um tipo de política pública, de ação reguladora lato senso do Estado,

que tem origem teórica na falha do mercado. Monopólios e cartéis são falhas de mercado que

justificam a ação corretiva por parte do Estado. A teoria da falha está alicerçada num ideal de

mercado de concorrência perfeita. É utilizado pelos economistas para justificar a ação

reguladora do Estado para mostrar que há falhas entre o ideal e o real.

Poder de mercado: ter o poder de mercado ou exercê-lo não é um problema. O

problema começa quando ele fica abusivo. Aí entra a ferramenta antitruste para mitigar esse

tipo de abuso de poder de mercado. Quem tem pelo menos 20% de market share ou de

mercado, possui poder de mercado. Poder de mercado e o seu abuso são as justificativas para

que o Estado se organize e em nome do próprio mercado regule a concorrência. A ironia é

que se o Estado não for forte, o mercado não reúne as características necessárias para dar

conta de si mesmo, de regular a si mesmo. Esse é um pressuposto aceito universalmente, até

pelos ideólogos mais liberais.

No Brasil, a aplicação da defesa da concorrência é historicamente situada e é no

campo da Economia Política do capitalismo brasileiro que é compreendida em certa

conjuntura. No Brasil existe lei de defesa da concorrência desde os anos 30. Entretanto, ela só

foi levada a sério na segunda metade dos anos 90, quando o Brasil resolve refrear o controle de

preço e substituir por concorrência. Isso não quer dizer que o sistema anterior foi

completamente abandonado. Pelo contrário: ainda temos muitos setores em que há controle

de preço: cinema, teatro, escola, serviço público, etc.

Com a criação e edição do plano real, a concorrência passou a ser valorizada como

vetor de organização da economia brasileira. Quando a inflação se estabiliza no Brasil, os

preços, ao se tornarem mais estáveis, passam a transmitir aos produtores informações mais

precisos. Isso muda a cara do DE no Brasil: novas leis, novas instituições, novos processos

jurídicos, etc. Assim, o CADE passa a efetivamente funcionar, com a Lei 8.884, no mesmo ano

em que o Plano Real foi editado.

Para isso foi necessário criar um arcabouço do zero. Brasil não é um país de tradição de

competição ou aplicação de legislação. Isso tem a ver com a nossa própria história: (i) Brasil é

resultado de um monopólio colonial (Tratado de Tordesilhas é um acordo monopolial); (ii)

relação metrópole e colônia. Brasil não tem cultura anglo-saxão de concorrência.

Se compararmos o capitalismo peruano, colombiano, argentino, brasileiro com

capitalismo inglês, belga, holandês, veremos que a diferença cultural faz muita diferença. Por

exemplo, temos uma tradição católica, e nele, competir, lucrar, emprestar dinheiro a juros,

enriquecer, não são exatamente sinônimos de uma vida virtuosa. Isso é o oposto do

protestantismo, do judaísmo, etc. O mundo católico é diferente: a nossa história, a nossa

religião não nos criaram condições para que a gente encare a competição, seja ela política,

econômica, qualquer outra forma, como uma coisa da vida, como algo natural.

A criação de uma cultura concorrencial não é uma coisa que se dá do dia para noite.

Nenhuma cultura, nenhuma instituição muda do dia para noite, e as mudanças são muito mais

incrementais do que institucionais. Aliás, a mudança social é um dos maiores enigmas da

sociologia. O que temos a partir da década de 90 é a atuação paulatina e cada vez mais

importante de uma autoridade brasileira de defesa da concorrência, até que em 2011 veio

uma nova lei.

Além disso, temos fusões e aquisições que reduzem a competição entre duas empresas,

ou seja, a estrutura do mercado é modificada por meio de uma fusão, aquisição, compra de

controle acionário, associação contratual de qualquer tipo, etc. e uma empresa deixa de

competir totalmente ou parcialmente.

A primeira grande fusão analisada no Brasil ainda na década de 90 foi a compra de

uma famosa marca de pasta de dente chamada COLINOS por um grupo econômico que

detinha uma pasta de dente menos conhecida chamada COLGATE. Assim, o grupo COLGATE

compra a marca COLINOS. Por critérios relativos ao tamanho e faturamento das empresas,

essa compra teve que ser notificada ao CADE, mas o Brasil simplesmente não sabia aplicar a

ferramenta antitruste. A concentração no mercado de pasta de dente chegava perto de 80%,

ou seja, os dois juntos dominavam 80% do mercado relevante.

Obs.: Determinar mercado relevante é importante para saber a

porcentagem de domínio das empresas. O mercado relevante é de

pasta de dente ou de higiene bucal? É só de pasta de dente, porque a

pasta de dente só pode ser substituída por pasta de dente.

CADE resolve aprovar essa compra, mas impondo restrições ao comprador. Ele

determinou que as partes retirassem a marca COLINOS do mercado por 2 anos, para que a

remoção gerasse oportunidades para novos entrantes que aproveitariam aquela lacuna. A

autoridade antitruste queria um espaço para novos agentes econômicos. Isso deu errado

porque apesar de a COLINOS ter saído por 2 anos, ninguém entrou para substituir. COLINOS era

Top of the Mind. Nessa época, a Colgate entrou com uma nova marca: SORRISO. A empresa

americana P&G, que iria entrar com uma pasta, resolveu não entrar com pasta de dente e sim

com o sabão em pó ARIEL.

Quando a fusão da BRAHMA e ANTARCTICA foi aprovada, a AMBEV (resultante da

fusão) teria que vender algumas marcas de cerveja, como a Bavaria. A ideia era de novo que

a AMBEV, ao vender uma marca, um novo entrante comprasse esse pacote (com cervejaria,

marketing, distribuidora, etc.). A ideia era que alguém já entrasse com todos os ativos. O

mercado relevante nesse caso é o mercado só de cerveja, porque é difícil substituir a cerveja

por outra bebida.

Alguns mercados relevantes estão restritos a algumas regiões, mas há outros que são

globais. Mercado de turbina de avião é global, porque não olhamos a esquina, o bairro. Alguns

mercados são geograficamente pequenos, mas outros são globais.

O que aconteceu no Brasil é que durante quase 20 anos, as partes primeiro realizavam

a transação e tinham 15 dias úteis para notificar o CADE. Essa notificação era condicionada ao

porte da empresa. Por exemplo, se a Volks fosse comprar uma padaria, teria que contar o

CADE, apesar de isso ser irrelevante para a concorrência.

Entretanto, quando o negócio já é fechado, há informações sensíveis que são trocadas

entre as partes, que mesmo que o CADE mande desfazer o negócio, não conseguiriam

esquecer. Isso era um problema, portanto, hoje precisa notificar o CADE antes da transação

para que ela autorize e então as partes fechem o negócio. Brasil só passou a adotar a regra de

notificação prévia em 2011 com a nova regra de concorrência. Notificação prévia é um

exemplo de aprendizado. Hoje temos apenas um órgão central chamado CADE para fazer

esse controle. Antes havia três instituições para fazer a aprovação.

Outra coisa que ilustra a evolução institucional é a criação do Instituto de acordo de

leniência. Passou-se a incorporar a possibilidade de, no caso de cartéis, um dos membros

denunciar e com isso, eventualmente e dependendo de requisitos, receber uma comissão mais

branda. Isso é evolução porque no Brasil, até a delação premiada, as autoridades tinham de

fazer buscas e apreensões nas quais as empresas suspeitas de cartel tinham a sua sede visitada

pela polícia, MP, CADE, e uma série de computadores, arquivos, etc. eram levadas para

verificar se havia cartel. Isso ainda continua existindo, mas a possibilidade de uma das

empresas denunciar e fornecer documentos que comprovem a alegação mudou a regra do

jogo bastante significativamente no Brasil. Isso vem dos americanos, que criaram a regra

segundo a qual se você dedurar o seu colega de cartel, você pode se dar bem e ele se dar

mal, e isso gera falta de confiança entre os membros do cartel. A possibilidade de alguém vir

contar e dar tudo que o Estado precisa reduz os custos do Estado. Isso mudou o panorama da

defesa de concorrência do Brasil. Esse cenário gerou, ao longo dos últimos 20 anos, um

mercado de advogados, especialistas, estagiários especializados nessa área de antitruste. É

algo que 20 anos atrás não tinha.

No campo das condutas, que são comportamentos individuais que podem até ter o

caráter coletivo, como no caso de cartéis, há condutas que independem de contratos

societários como fusão e aquisição. Dentro do capítulo de condutas, não há problemas

apenas de cartéis. Por exemplo, o agente que derrube o preço para baixo do mercado. Se ele

tem poder de mercado, ele derruba o preço, consegue operar no prejuízo por um

determinado tempo, quebra os concorrentes e depois sobe o preço de volta. É um exemplo de

conduta anticompetitivo. Entretanto, isso é muito difícil de acontecer, pois precisa de muita

certeza de que vai conseguir quebrar o concorrente para fazer isso. Precisa conseguir suportar

operar em prejuízo por meses ou até anos. Outro exemplo é o Gun Jumping: troca de

informações sensíveis.

Gun Jumping é um tipo de prática vedada pela atual legislação, na qual, antes de o

CADE aprovar a operação, já se começa a cruzar a linha e trocar informações com a outra

parte. É um tipo muito particular de conduta anticoncorrencial porque é relacionada ao

próprio prazo do CADE.

6. Concorrência Desleal x Antitruste Os dois não são as mesmas coisas. Concorrência desleal é um conjunto de ações que

não podem ser utilizadas por causa do Código de Propriedade Industrial. Isso não decorre de

lei e o foco é um concorrente em particular. A defesa da concorrência analisa a concorrência

como um todo e, em última análise, o consumidor. No caso da concorrência desleal, o que

está em jogo são brigas entre agentes concorrentes em específico.

Um exemplo de antitruste é o acordo de exclusividade. Por exemplo, X dá uma

geladeira, pintura, etc. do boteco, mas em troca o boteco precisa vender só a marca de

cerveja de X. Precisa analisar o mercado caso a caso. Venda casada é um tipo interessante

por ser um problema do consumidor mas é um problema de concorrência. É um problema do

consumidor, mas é um problema de concorrência. Não é simples assim. Se eu vender o

shampoo e condicionador com desconto, mas vender o shampoo e condicionador separado,

não há problemas. É natural no capitalismo que se dê descontos por quantidade! Práticas de

desconto são boas para o capitalismo, mas pode se tornar descriminação. X consegue só dar

desconto em uma região se numa outra região ele não tiver concorrência. Assim, em um lugar

não dá desconto, porque não tem competidor, mas no outro dá descontos absurdos porque

há concorrência. Um exemplo de concorrência desleal é o sham litigation, em que o

concorrente inunda o outro de ações judiciais para atrapalhar a vida do outro competidor.

Começo dos anos 90: época do controle de preço, mas a Lei 8.884 já estava em vigor.

Em 1995 sentam numa reunião no Ministério da Fazenda, representantes de 3 ou 4 empresas do

setor siderúrgico brasileiro (USIMINAS, COSEP, etc.). Eles se reúnem para dizer: “o preço das

nossas chapas de aço é controlado desde sempre, pois havia controle de preço. Nós viemos

aqui para dizer que como o dólar aumentou, a taxa de câmbio variou, e viemos aqui unidos

para pedir à autoridade pública que conceda um reajuste de preço para que possamos

cobrar um pouco mais caro as nossas chapas de aço. Seria justo porque os custos

aumentaram”. Problema é que já estava em vigor a Lei 8.884. A autoridade pública então ligou

imediatamente ao CADE dizendo que acabaram de comparecer empresas que admitiram o

cartel! Essas reuniões sempre foram comuns quando havia regulação do preço, mas o

problema é que já estava em vigor a Lei 8.884. Assim, abriu-se um processo de cartel. O

advogado da CSN disse que aquilo não procedia porque sempre havia sido assim, que era

normal ir à autoridade pedir a mudança de preços. Contudo, o resultado final foi que aquilo foi

considerado um cartel.

Direito Econômico,

Economia Política e

Economia 1. Introdução

É importante situar o DE no contexto da Economia Política. Não dá para estudar o DE

como algo que paira no vácuo jurídico, institucional, cultural e histórico. Capitalismo não é uma

engrenagem, mas sim um sistema socioeconômico e político, e não há um tipo só de

capitalismo. Se isso é verdade, também seria razoável deduzir que não há apenas um DE,

como algo invariável.

O DE está equidistante da Economia Política (“EP”), assim como a EP está distante da

Ciência Econômica. A EP está no meio do caminho entre o DE e a Ciência Econômica. A EP é

o estudo das relações de poder no campo da economia. Para o professor, algumas perguntas-

chave ilustram o que é EP: quem ganha e quem perde? Qual é o conjunto de impactos

distributivos e redistributivos? Quem decide? Quem participa? Quem tem poder de participar?

Quem toma decisão? Quem veta decisão? Quem fica fora das decisões? Além de impactos

distributivos, a EP joga luz sobre temas relativos a quem toma decisão. Além disso, a EP nos

serve como uma lente para situar economicamente o DE.

DE só pode se prestar a ser um instrumento de mudança social se as suas funções

dentro do capitalismo forem reconhecidas. Por isso que o professor estuda as funções do DE

dentro do capitalismo. O tema das funções do Direito é clássico, mas muito pouco estudado,

porque somos dominados pela visão segundo a qual cabe aos juristas, como ofício, descrever

o dizer que o Direito é. Nós somos treinados nas faculdades para interpretar o Direito e dizer o

que ele é no caso concreto ou o que ele é ontologicamente falando. Nós somos treinados

para dizer o que o Direito é ou que deveria ser. Isso é o que Bobbio chama de visão estrutural

do Direito. Com a emergência do Estado Social e o capitalismo, Bobbio diz que passa a ser tão

importante para o jurista entender o Direito de uma perspectiva funcional quanto interpretar o

Direito. Não é coisa de sociólogo ou antropólogo do Direito analisar o Direito do ponto de vista

das funções. A principal atividade do jurista para Bobbio não é a interpretação de um Direito já

construído, mas a pesquisa de um Direito a ser construído.

Autores como Karl Marx refletiram sobre a função do Direito, mostrando que o Direito

tinha especialmente a função de conservação do capitalismo no qual as classes dominantes,

por regime de contratação e de propriedade, exploravam os outros. Outros autores se

dedicaram ainda mais para entender o papel do Direito no capitalismo. Um deles foi o Max

Webber, que de forma mais intencional fez uma reflexão sobre o que é o papel do Direito no

capitalismo da Revolução Industrial. Ele queria entender o que caracteriza do ponto de vista

jurídico uma sociedade tipicamente capitalista. Ele argumentou que a existência de um Direito

racional entendido como Direito calculado era uma pré-condição para a construção de um

capitalismo bem sucedido como o capitalismo inglês. Ele não está dizendo que isso causou a

Revolução Industrial, mas sim que isso tem a ver com características jurídicas e com funções

desempenhadas pelo Direito inglês. O Direito da Common Law, diferente do francês, por

exemplo, garantia previsão, calculabilidade, que conspirou a reunião de condições suficientes

para que a Revolução Industrial nascesse lá. O Direito então garante a coerção e a

legitimidade. Juristas como o Webber estavam tentando entender a função do Direito e não a

teoria do direito.

Jurista Karl Hammer mostra que em diferentes momentos de transação histórica, o

direito se prestou a instrumentalizar diferentes funções no capitalismo industrial que ele

observava. Ele exemplifica isso com contrato e propriedade privada. A propriedade muda de

função econômica, apesar de não mudar necessariamente de regime jurídico. A ideia de que

antes você poderia ser dono de uma pessoa e hoje não pode mais, ou seja, os regimes de

propriedade são razoavelmente estáveis, mas as funções mudam. Assim, ele analisa FORMA e

FUNÇÃO e diz que hoje não podemos comprar uma pessoa, mas pode comprar o corpo de

uma mulher para ter sexo, por exemplo. São funções que o contrato passa assumir ao longo do

tempo, sem que necessariamente ela seja acompanhada por mudança de estrutura e forma

de Direito. Há certas funções que são sociais (hoje adotamos na CF) e não sociais. Para esse

autor, a sociedade só se torna próspera e justa quando a função social é cumprida e não a

função individual. Ademais, Norbert Reich diz que DE tem duas funções. Organizar o Estado e

dar ferramentas para que o Estado persiga os objetivos públicos.

Todos analisam o que o Direito faz, mas não a estrutura do Direito e nem a sua antologia.

Para o professor, olhar o Direito como uma óptica funcional é tão útil quanto analisar o Direito

de um ponto de vista ontológico, hermenêutico, etc. No Brasil há infinitas definições do DE, mas

o importante é saber como ele opera, isto é, como funcionaliza certos objetivos públicos e

regulatórios. Como pensar o DE como tecnologia jurídica de transformação? Seria fácil fazer de

uma forma ideológica, mas são necessárias agendas de investigação científica para valer. A

agenda de DE entra também o trabalho de um jurista como um todo, e não apenas de

pesquisas.

Direito constitui a economia, cria mercado, estrutura e molda a economia para mais

além do mercado. Direito também regula a economia e dá ao Estado uma função

instrumental. Direito Econômico pode ser entendido como tecnologia de transformação da

sociedade. Portanto, é preciso dissecar o papel do Direito nas políticas públicas, para entender

o que o Estado faz e o seu papel na sociedade.

DE, como agenda de pesquisa, significa entender os efeitos, impactos e relações que se

podem estabelecer entre o arcabouço jurídico de uma determinada sociedade e os aspectos

econômicos. Há uma linhagem, não muito constante, que traz uma perspectiva de análise

funcional. De forma muito resumida vimos que em vez de procurar entender de forma

ontológica o que o DE é, ou o que o próprio Direito é, seria melhor procura entender de forma

aplicada quais são os seus impactos, efeitos, etc. na economia.

Essa agenda de pesquisa é inexplorada. É uma empreitada coletiva de investigação. O

professor convida os alunos a refletir o DE de um determinado ângulo. A seguir tentaremos ver

quais são as funções desempenhadas pelo Direito no sentido de manter a desigualdade na

sociedade, mas como ao mesmo tempo o Direito tem trazido alguma função transformativa.

Como o Direito desempenha uma função de manutenção do status quo, mas como ele pode

ser uma ferramenta de transformação.

A despeito de isso ser um campo fértil, ele não é um campo estudando nem entre os

pesquisadores do DE e nem do Direito. O estudo da pobreza e desigualdade, o estudo da

justiça distributiva não é algo que fazemos e nem aprendemos no curso de graduação.

Aprendemos algumas concepções metafísicas sobre o que é a justiça, sobre o que é justo, etc.,

mas não saímos desse nível de abstração. Aprendemos que justo é tratar os iguais igualmente e

os desiguais desigualmente ou formulações desse tipo. Aprendemos que filósofos como

Aristóteles, Tomás de Aquino trataram da relação entre Direito e igualdade. Aprendemos que

esse debate chegou ao século XX, mas de novo, não avançamos para planos mais aplicados

e concretos da realidade. Não conseguimos fazer uma ponte entre a concepção abstrata de

igualdade e a realidade.

Ouvimos a ideia de função social da propriedade, cantada em prosa e verso por vários

professores que enchem o tempo para falar que a CF de 88 enaltece a função social, mas o

professor Coutinho nunca viu nenhuma discussão mais aplicada do que venha a ser, no mundo

real, a função social da propriedade. A propriedade é uma das características mais centrais

para quem quer entender a relação entre Direito e economia. Marx fez isso, e Webber fez isso.

O Direito pode ser um conjunto de normas que sacraliza e perpetua a propriedade privada ou

pode ser um conjunto de normas que relativiza essa sacralidade, e isso ocorre

esporadicamente ao longo do século XX por transformação social, convulsão social, etc. que

modifica um regime jurídico e altera a roupagem da propriedade.

O problema é que não estudamos isso. Se os juristas não estudarem e entenderem isso,

quem é que vai estudar e vai entender? O professor não quer dizer que há uma reserva de

mercado dos juristas, mas é que não podemos nos abster de discutirmos sobre esse tema.

Portanto, para tanto precisamos de um método que infelizmente não temos ou que felizmente

estamos aprendendo a ter, e Isso é uma agenda de pesquisa.

Direitos Econômicos

Sociais, Pobreza e

Desigualdade 1. Introdução

Para tentar ilustrar o que foi exposto no capítulo anterior, o professor queria entrar no

campo da pobreza e desigualdade. Muitos acreditam que esse assunto não cabe em DE,

porque afinal de contas isso não tem a ver com o núcleo do DE, se entendê-lo como núcleo de

organização do capitalismo. Mas será que a pobreza e desigualdade não têm a ver com a

organização do capitalismo brasileiro? Será que estudar pobreza e desigualdade não é uma

forma de entender o presente e fazer conjecturas para o futuro? Será que isso não é DE?

Professor acha que isso é o DE na veia. O escopo do DE não se limita à regulação do mercado.

O DE também é um Direito que estrutura e constrói políticas públicas no campo da pobreza e

desigualdade. O Direito não apenas regula matérias centrais como moeda, crédito, salário,

juros, propriedade, mas o Direito também cria isso. Direito cria a propriedade e ela não existe

antes da sociedade, sendo uma construção social. A não ser que seja um jurista Lockeano, a

propriedade é uma construção jurídica convencional. Nem sempre isso acontece de forma

consciente, mas a propriedade é uma convenção jurídica.

É por isso que entre tributaristas existe o seguinte debate: será que quando pago o IR, é

o Estado comendo um pedaço da minha propriedade? Preciso dar um pedaço da minha

renda que consegui porque trabalhei? É a típica mentalidade do contribuinte, que não vê

melhoramento nos serviços públicos, etc. A pergunta é: tenho direito a uma propriedade que o

Estado vai tributar ou só tenho propriedade após a tributação? Os tributaristas não chegaram a

uma conclusão em relação a isso. Quando a propriedade surge? Quando alguém pode “violar”

a propriedade em nome do interesse público? Há hipóteses legais e constitucionais para isso.

Vários economistas mostram que as sociedades que se transformaram de forma mais estrutural

e deram saltos de qualidade de vida, como com a Revolução Industrial e ganhos com a

distribuição de renda, são sociedades que não levaram a propriedade como algo sacralizado.

Fizeram desapropriação, por exemplo. Repensar a propriedade não necessariamente significa

roubar, tomar propriedade dos capitalistas. Essa é a forma radical de relativiza a propriedade.

Porém, há formas intermediárias que não estamos habituados a pensar. Existem formas

técnicas e triviais que em outros países são adotadas no Direito Civil para pensar em

propriedade fundiária, mas que não temos aqui.

É importante questionarmos a propriedade, e o campo da pobreza e desigualdade

mostra isso com clareza. A desigualdade e a pobreza aumentaram globalmente nas últimas

décadas. Tanto uma quanto a outra aumentam em especial e de forma mais empinada no

gráfico quando a globalização financeira começa há mais ou menos 25 anos. A pobreza, que

é algo mais fácil de medir, de medição mais quantitativa, é uma medida internacional – viver

com menos de 1 ou 2 dólares por dia está abaixo da linha de pobreza, por exemplo. A

desigualdade é um conceito mais complexo do que a pobreza. É menos uma linha que se

mede e mais uma distância que se calcula entre a franja mais rica da sociedade e a massa

mais pobre da sociedade. A desigualdade então é a distância que separa as classes sociais

em uma determinada sociedade.

Em geral, é medida em relação à renda, mas pode ser de outras formas: de

oportunidade, de raça, de gênero, de riqueza (não é igual à renda, pois riqueza mede a

propriedade acumulada), etc. Em geral, a desigualdade de renda segue um padrão

convencional de índice GINI, que varia de 0 a 1. Igual a 0 significa que não há desigualdade.

Tal sociedade não existe, pois nem a sociedade mais igualitária do mundo – Noruega – o GINI é

igual a 0. O outro lado da moeda é o GINI é igual a 1: toda a renda em uma pessoa só. Nem a

sociedade mais desigual conseguiria a façanha de concentrar a renda na mão de uma

pessoa só. Assim, não há GINI igual a 0 nem a 1. O que é há é uma distribuição de GINI entre

Estados, municípios, dentro de uma sala de aula, etc. O índice GINI do Brasil é de 0,44, mais ou

menos, mas já tivemos índice de 0,6 (na época era o mais desigual do mundo). É óbvio que isso

tem raízes históricas, e essas raízes são profundas, que remontam ao século XVI, ao modo como

os portugueses estabeleceram uma relação com o Brasil. Para alguns vivemos uma espécie de

“armadilha da desigualdade”, uma expressão que mostra que a desigualdade está tão

inserida nas instituições que a desigualdade se perpetua entre as gerações, século após século.

É sociedade em que a mobilidade social é baixa.

Mas qual é o problema da desigualdade? Afinal de contas, será que teríamos que ser

todos iguais? Qual é o limite da desigualdade? E quando falamos de desigualdade falamos de

dinheiro? É desigualdade de que? Não por acaso, diferentes autores escreveram livros cujo

título é “Desigualdades de Quê?”. Por que desigualdade é ruim? Até um tempo atrás essa

pergunta era difícil de ser respondida. Mais do que isso, ainda era muito forte na década de 90

a ideia de que em uma sociedade, a desigualdade aumenta para poder diminuir depois. O

economista Kuznets, estudando a revolução industrial na Inglaterra, chegou à seguinte

conclusão: para que a Inglaterra pudesse dar um salto, tornando-se uma potência industrial,

ela precisou de uma grande concentração de renda sem a qual investimentos necessários

para catapultar o progresso não seriam fornecidos. A desigualdade reduziu quando a

sociedade de consumo surgiu. Olhando dados da Revolução Industrial, o economista propôs

que a desigualdade cresce e depois diminui, ou seja, precisa de concentração para se

desenvolver. No Brasil chegou a ideia de que “vamos fazer o bolo crescer e depois distribuir”.

Quando a economia cresce, ela provoca um efeito cascata de que todo mundo

ganha, inclusive os mais pobres. O crescimento econômico beneficia as classes. E esse é o

crescimento bom, que não distingue classes. É o trickle down economics: a sociedade inteira

se move para frente. Todas as políticas macroeconômicas de desenvolvimento se basearam

direta ou indiretamente nisso. Só na década de 90, que alguns estudos começaram a mostrar

que a desigualdade é ruim para o desenvolvimento. A desigualdade produz efeitos sociais

inimagináveis há 20 anos. A desigualdade então estaria associada a mais violência, depressão,

desnutrição, doença, num estudo longitudinal (feito em longo prazo) que durou cerca de 30

anos (pela The Spirit Level). Esse livro mostra que a desigualdade está relacionada

estatisticamente a tudo de ruim, que desagregam laços sociais, que podem implodir em uma

sociedade. A desigualdade também é ruim para o topo da pirâmide, não só para os mais

pobres. Quando a elite passa a se dar conta que ela pode ser prejudicada pela desigualdade,

há novos estudos e novas questões.

Uma tese nova começa a ganhar corpo: existe um tipo de crescimento econômico de

melhor qualidade do que o trickle down. Melhor que uma economia que cresce nessa forma, é

uma economia que cresce diminuindo a desigualdade. Isso é melhor do que crescer

distribuindo a renda linearmente, ou seja, crescer de forma Robin Wood, distribuindo mais

renda aos pobres, é melhor inclusive para a elite a longo prazo. Esses estudos mostram que é

possível, embora seja raro, promover um tipo de crescimento virtuoso em que a desigualdade

cai. Na história do Brasil, nos poucos momentos de crescimento econômico sustentável, em

quase nenhum deles a desigualdade diminuiu. Em quase todos os crescimento, a desigualdade

aumentou.

Exemplo de manual: Milagre Econômico foi a época em que o Brasil cresceu mais e

mais rápido na sua história (entre 68 e 72), só que no Milagre Econômico, a desigualdade

disparou (o índice GINI disparou). Os ricos ganharam mais do que os pobres nesse período do

Milagre Econômico. O padrão então foi a concentração de renda. Só entre 2001 até 2009,

quando a economia cresceu muito pouco, a desigualdade diminuiu. Assim, uma sociedade

pode crescer distribuindo renda ou concentrando renda.

A Índia é um país mais homogeneamente pobre do que o Brasil. Há mais pessoas

vivendo abaixo da pobreza, mas é um país menos desigual do que o Brasil. Bélgica é um país

mais igualitário de gente mais rica do que Portugal, por exemplo, que tem renda maior que os

outros países, mas é muito mais desigual. EUA é o país mais rico do mundo, mas um dos países

com maiores desigualdades – só não é mais do que a América Latina. Dos 10 países mais

desiguais no mundo, no mínimo 6 ou 7 estão na América Latina. Isso tem raízes históricas, mas

tem a ver também com a estrutura jurídica.

Qual seria então o grau de desigualdade que uma sociedade livre poderia ponderar?

Qual é o grau de igualdade que uma sociedade livre deve perseguir? No campo do Direito,

isso chegou de maneira incidental, sendo que no Brasil nem chegou. Nós somos incapazes de

enxergar o fato óbvio de que, por exemplo, o nosso sistema tributário é totalmente regressivo

(favorece o rico), como no Imposto de Renda (tributo voltado para promover distribuição de

renda). O Imposto de Renda, que deveria ser progressivo, acaba sendo regressivo no Brasil, pois

a escala de progressividade é ruim e também porque algumas rendas não são tributadas,

como dividendos. Alguns estudos mostram que as classes médias e altas, quando fazem

dedução com educação e saúde, acabam gerando a regressão. A outra causa é que os ricos

não estão com sua renda na pessoa física, e sim na pessoa jurídica e nem sempre no Brasil

(muita gente não declara a sua renda corretamente, e isso tem raízes culturais também). O IR

tem o seu potencial distributivo mitigado por uma série de fatores.

Os impostos de consumo são extremamente regressivos no Brasil. O imposto sobre

grandes fortunas nunca foi instituído. O IPTU nunca conseguiu virar IPTU progressivo em cidade

nenhuma (essa progressividade foi emendada na CF). Além disso, não conseguimos tributar a

herança, por exemplo. Há lugares em que essa tributação é de até 40%, e não são países

como Coréia do Norte ou Cuba, mas sim países ricos europeus. Quando aumentamos muito o

tributo da herança, duas coisas acontecem: as pessoas passam a transmitir propriedade em

vida ou criam mecanismo de doação e dão um drible no imposto de herança. Os juristas

pensam muito mais o DT como satisfação do Fisco do que propriamente uma forma de

distribuição de renda.

Quantos de nós poderíamos estar pagando para estudar na USP? No Brasil, quem

estuda em escola privada estuda de graça na universidade, e quem estuda na escola pública,

paga a universidade. Quem pode provar que isso é justo? Faculdade de Direito da USP está no

topo da pirâmide brasileira. Nossa sociedade é tão desigual que a classe média está no meio

pra cima da pirâmide social do Brasil. Nós somos tão desiguais que reproduzimos essa

desigualdade no nível das universidades.

Há muitos casos em que a progressividade poderia ser introduzida de forma que os mais

pobres pudessem ganhar. Na faculdade de Direito da USP, a mesa tem que ser velha ou de

plástico e tem que ser comprado por menor preço na licitação. Então não pode ter uma

biblioteca bonita? Não, pois isso seria coisa de país rico. Precisamos seguir a Lei 8.666. Temos

essa ideia de que como é público, precisa ser ruim. Por isso que a biblioteca é ruim. Até

quando temos que pensar assim?

Francisco Clementino de Santiago Dantas é um jurista carioca muito interessante. Em

vários de seus textos aponta o dedo na seguinte ferida: a elite brasileira não tem consciência

de elite. Quando a elite não conhece a sua função social, a sociedade não funciona bem. Nós

somos a elite intelectual e cultural, e é daqui que sai a elite jurídica do país. Se não tivermos

uma visão crítica do papel conservador que o nosso direito imprime na sociedade, mais

ninguém vai ter. É por isso que temos que acordar. As elites atrapalham as política públicas de

saúde do Brasil quando usam o sistema público, obtendo remédios, por exemplo. Seria melhor

um remédio para curar um câncer raro de alguém rico ou comprar 100 remédios de

tuberculose para população mais pobre? O professor não saber se isso é realmente uma

discussão utilitarista e nem sabe se defenderia as 100 vidas frente a essa única vida, mas é algo

que deveríamos parar para pensar.

Ademais, por que entre 2001 e 2009 conseguimos um crescimento com distribuição de

renda? 3 coisas explicam isso. Essas 3 têm relação com arcabouço jurídico, e nenhuma delas

quebrou nenhum dos pilares da armadilha da desigualdade, ou seja, não tem nada a ver com

destravar as travas da armadilha. A principal razão são os (1º) aumentos sucessivos, e acima da

inflação, do salário mínimo. Discutimos que todo preço é político, e o salário mínimo é uma

decisão política. Entre 2001 e 2009, o aumento do salário diminuiu em mais de 25% a

desigualdade. Mais 25% tem a ver com a (2º) bolsa família e (3º) estabilidade da moeda.

Quando a inflação aumenta, quem mais se prejudica são os pobres. Já o rico não sente tanto.

O pobre deixa de comer, e o rico deixa de tomar champanhe, de tal forma que a inflação

pega muito mais rápido o pobre. Contudo, nenhum dos três fatores atacaram nenhum dos

problemas que falamos.

Há pessoas que dizem oito mil maravilhas do Bolsa Família, e realmente ele tem

mecanismos muito interessantes, mas não é capaz de atacar aqueles problemas anteriores. O

Piqueti mostra que os mais ricos precisam pagar mais, não em nome do socialismo, mas que

isso é bom para o capitalismo. Não é o neomarxista propondo que todos tenham mesma

conta bancária, mas é uma pessoa que fala da necessidade de estruturas para melhorar o

capitalismo. Essa é a luz que acende no fim.

Brasil clama por pessoas que tenham interesses e formação crítica para discutir essas

coisas. Jurista não é só aquele que corrige o problema, mas sim o arquiteto institucional da

sociedade. É para isso que existimos, mas não é isso que nos ensinam.

Direito Econômico e

Políticas Públicas Anotações da Fernanda Cunha.

1. Políticas públicas e desenvolvimento econômico Cabe ao direito econômico criar instituições, regras, que estruturam os mecanismos

pelos quais o Estado e o mercado promovem dinâmicas capazes de fomentar o

desenvolvimento econômico.

Há um conjunto de medidas necessárias para implementar objetivos constitucionais

ligados ao desenvolvimento econômico. São arranjos sem os quais os objetivos não podem ser

alcançados, um arcabouço de implementação desses objetivos.

2. Relações público-privadas Contudo, o DE não é apenas o direito do Estado regular a economia, é relação público

privada, estimular o investimento privado também, para que agentes privados invistam de

alguma forma que sem isso não investiriam

3. Inovação Não é o Estado que promove inovação, quem faz isso são investidores, agentes

privados. Assim, não é o Estado que inova, mas se Estado não promover condições para que o

mercado possa investir em inovação, a inovação não acontece.

A inovação, então, é uma política pública de indução de investimento privado,

interface entre público e privado. A inovação precisa do Estado, mas não é feita pelo Estado.

A) Schumpeter x Walras

Walras – Equilíbrio Geral Walras criou equações matemáticas para mostrar como o mercado, em regime de

concorrência, tende a um estado de equilíbrio geral. Se mercados não forem atrapalhados por

meio de ações distorcidas do Estado, ele tenderá a um estado de equilíbrio em que oferta e

demanda vão s encontrando → o que é ofertado é demandado (Lei Say). Quando oferta e

demanda se encontram em todos os mercados da economia, dá para construir uma grande

equação matemática que conclui que a economia tende a um equilíbrio geral.

Schumpeter – Equilíbrio Dinâmico: Inovação Na década de 1930, Schumpeter desafiou a teoria sobre equilíbrio geral. Ele mostra que

no capitalismo é mais importante a competição por inovação do que a competição por preço.

No mercado ideal, compete-se por preço e qualidade, mas a competição por preço

representa pequena parte, o que dá saltos é a competição por inovação: o capitalismo é

movido à inovação. O capitalismo não é caracterizado pelo estado de equilíbrio, o

desenvolvimento do estado capitalismo não é estado de equilíbrio, mas a mudança de um

estado de equilíbrio para outro.

B) Dinâmica da inovação Quando alguém inventa um processo novo, matéria-prima nova, que diminui o custo,

há inovação: pequenas coisas que mudam produtos tradicionais. O empresário, até ser imitado

pelos outros empresários, dá um salto e fica monopolista naquele mercado novo por um tempo.

Isso é a dinâmica capitalista: não são pequenos agentes competindo, mas alguém ficar

sozinho no mercado novo até alguém o imitar. O equilíbrio se quebra e é deslocado a outro

estado de equilíbrio.

Capitalismo não é fotografia, mas filme dinâmico. O desenvolvimento econômico é a

busca pela quebra do equilíbrio → equilíbrio dinâmico.

C) Alta taxa de risco na inovação Como a inovação é uma atividade muito arriscada e quem tem boas ideias muitas

vezes não tem dinheiro, a tendência é que a inovação ocorra menos do que a sociedade

desejaria. A sociedade desejaria que o ritmo de deslocamento do equilíbrio dinâmico fosse

mais frequente, já que a pessoa ganha muito dinheiro mas logo em seguida outra pessoa

também vai ganhar dinheiro. Então se esperava que mais inovações ocorressem, porque tem

predisposição de não investirem em inovação e alta taxa de risco.

Assim, Schumpeter defendia que duas figuras deveriam agir em conjunto:

Empresário inovador → alto risco.

Banqueiro → empresta dinheiro para que empresário faça investimento de alto

risco

Sem banqueiro não tem inovação. Para Schumpeter o papel do Estado era quase nulo,

porque basta a associação entre empresário e banqueiro.

4. Papel do Estado Estimular o desenvolvimento e criar monopólios temporários (patentes).

A) Escola neoshcumpeteriana Se deu conta de que se Estado não der condições sistêmicas para inovar, a inovação

não ocorre.

Ecossistema → Estado não inova, mas cria instrumentos jurídicos para que a inovação

possa acontecer.

B) Países subdesenvolvidos Se pressupuser que o capitalismo evolui com a inovação, o que pensar de países que

não tem capacidade de inovar?

Quando o Estado inova, pode trocar mais bens de valor agregado por bens primários,

com preços que não variam muito. Os bens de alto valor agregado geram muito mais riqueza

e pautam a demanda mais do que as commodities.

Com o passar do tempo, quem exporta commodity perde mais. Bens industrializados,

inovadores, geram sua própria demanda (basta criar um novo celular que as pessoas vão

trocar), ao passo que bens de baixo valor não conseguem, por isso gera mais riqueza para o

país.

Entretanto, não dá pra virar do dia pra noite de exportador de commodities para

inovações. Então as decisões tem que mirar os impactos futuros, inventar algo para depois

liderar o mercado, terá que privilegiar determinados setores, criar linhas de crédito, incentivo

fiscais, entre outros.

Críticos da política industrial: isso seria o Estado escolher os vencedores, é

uma escolha política. Estado não pode escolher determinados setores e

privilegiar. É ilegítimo que Estado escolha vencedores.

Defensores da política industrial: Estado não consegue tratar todos os setores

sem privilégios, mas não é ele que escolhe vencedores, ele só identifica.

Então defendem a ideia de que o Estado deva criar uma espécie de

incubadora de empresas inovadoras, sem isso, a inovação não ocorre, o

Estado vai exportar commodity pra sempre

É necessário escolher entre Estado que inova por empresas estatais ou que induz

investimentos? O melhor é o Estado saber como atuar a depender do caso. A dicotomia entre

Estado que faz tudo e que faz nada são muito rasas e superficiais para entender o papel do

direito no desenvolvimento, não tem que escolher um deles. O DE é seletivo e escolhe a

solução mais adequada ao caso. Tem que ter uma estratégia integrada.

Ex.: Coreia fez uma política industrial muito mais agressiva que o Brasil, para exportar e

não para só substituir importação. Mas aos críticos das políticas industriais, a diferença da

Coreia e do Brasil não foi isso, mas o investimento em educação.

Países mudaram a sociedade porque resolveram quebrar a teoria das vantagens

comparativas e resolveram construir novas vantagens: não é porque tem laranja que vai ficar

só exportando ela, tem que criar novas vantagens.

5. Políticas Arranjos para articular investimentos com estímulo de política à inovação. Estado

estimulando pesquisa básica, Estado que cria o mercado e não que corrige o mercado.

Em 2004, Brasil criou a Lei de Inovação (Lei 10.973);

Criou um programa de venture care. Nos EUA, há empresários que procuram

pequenos projetos e investem, no Brasil não tinha isso, então criaram um

programa público. Há linha de financiamento, pega a empresa, investe,

depois joga no mercado;

BNDES;

Patentes.

6. Funções do direito - Coordenação Deve existir um conjunto de normas, arranjo jurídico, que promova divisão de tarefas e

diálogos institucionais entre Estado, Universidade e empresa.

Universidade deveria ficar com parte dos royalties, mas no Brasil, a patente fica com o

agente privado. Mas sem arranjos jurídicos que permitam que Estado também ganhe dinheiro

com a inovação, ela sempre vai ser visto como um gasto público: o povo paga para o

particular ganhar.

Não faz sentido o Estado pagar para o particular ganhar. O problema é que não saímos

dos cânones do direito civil, administrativo, etc., isto é, não enxergamos conexões entre as

gavetas do direito. Temos que fazer estudos de casos.

Devemos pensar em arranjos institucionais e não analisar apenas a legislação, daí a

coordenação entre empresários, Estado e Universidades.

Direito Econômico e

Desenvolvimento 1. Introdução

É a última aula do curso, mas quando acabar essa aula, ninguém vai ter aprendido o

DE. Mais do que ensinar de forma definitiva do que é DE, o DE é uma agenda de estudo para a

vida. O professor quer que tenhamos reflexão crítica a partir de olhos de um jurista. O que

vamos fazer neste capítulo é uma amarração provisória, pois essa conversa não se encerra.

Para quem tiver vontade de continuar, pode fazer uma iniciação científica, mestrado,

doutorado, etc.

Grande debate: qual o tamanho da sua perna? Qual é o tamanho que o país

consegue dar? Consegue sair do suco de laranja e ir para super computadores? Brasil não

conseguiria fazer isso. Poderia dar pulos menores, como produção de remédios, etc. São tipos

de decisões que precisam de um arcabouço jurídico que permita esse salto, por menor que ela

seja. Inovação é algo que acontece no âmbito do mercado – não o Estado – mas sem que o

Estado garanta um sistema isso não acontece. É a parceria público privada em sentido amplo.

Vimos ainda o exemplo da Coreia do Sul, que se desenvolveu em 30 anos a ponto de

ser uma plantação de arroz para se tornar país com nível médio alto, baixa desigualdade, e

mudou as feições de sua indústria. O desenvolvimento da Coreia tem paralelos com o Brasil. Os

dois tinham o mesmo estágio de desenvolvimento na década de 50. Coreia adotou a

estratégia de exportação e o Brasil de substituição das importações. Coreia investiu

pesadamente na educação de base, e redistribuição de renda. Coreia nos ensina que o

desenvolvimento é um projeto nacional que pode ser em certa medida pilotado, e é possível

construir um arcabouço jurídico voltado com fins políticos. Por outro lado outros pensam que a

Coreia desenvolveu APESAR do Estado. Esse debate nunca termina. O Estado é o motor do

desenvolvimento ou ele é a retaguarda?

Debate de hoje: o direito econômico pode ser instrumentalizado para promover fins

políticos identificados como agenda do Direito Econômico? O direito pode causar

desenvolvimento?

É o debate entre os otimistas e céticos. Esse debate pode ser transposto para o campo

que procura investigar qual o papel do desenvolvimento econômico. O direito pode ser

instrumentalizado como espécie de tecnologia institucional, de política pública para promover

e dar condições para que certos projetos de desenvolvimento floresçam para os otimistas. Para

os céticos, o direito é incapaz de pré-determinar e alcançar objetivos políticos. O direito é

melhor compreendido como forma e estabilização das expectativas sociais, criando o pano

de fundo para o qual são necessárias as decisões de investimento que causam o

desenvolvimento econômico. O direito, ao definir a propriedade, ele cria um conjunto de

incentivos e estabiliza expectativas para que o desenvolvimento se dê. O direito se presta a

estabilizar as relações sociais e econômicas e nesse cenário, o desenvolvimento pode se

deslanchar porque as incertezas reduzem. É uma visão limitada do direito.

Existem estudos nesse tipo de chave analítica, mas nem todos os estudos são feitos por

juristas, mas sim por economistas. Esses estudos comparam Coreia com Brasil e Botsuana com

Angola. Botsuana é um país que deu muito mais certo que todos os seus vizinhos. Será que é

por razões climáticas, demográficas, etc.? Primeiramente, o grau de inserção do país no

comércio internacional é uma variável importante porque é medida quanto um determinado

país está inserido no plano das relações internacionais e quanto o país conseguiu se inserir na

globalização.

A terceira variável mais importante é a qualidade das instituições. Essas três variáveis

são as três referências para medir causalidade em desenvolvimento econômico. Botsuana tem

a mesma riqueza e clima que os seus vizinhos. Angola tem mais riqueza natural, como

diamante, do que a Botsuana, mas é terrível. Angola ficou anos com uma guerrilha selvagem e

metade da população se matou. Por que Botsuana está dando certo? É a mesma coisa que

comparar Costa Rica com Guatemala. Os dois tem o mesmo clima, mas a Guatemala e Belize

é uma tragédia. Costa Rica tem IDH alto, monte de turistas, etc.

Esses países conseguiram constituir instituição jurídica, regime de propriedade mais justa

e igualitária. O regime jurídico de propriedade do diamante que a Angola tem são cada vez

mais identificadas como variável degradante. A propriedade é uma variável importante para

medir o papel do Direito Econômico no desenvolvimento do país. A Coreia fez uma reforma

agrária que o Brasil nunca fez.

Há um famoso estudo de Harvard Dany Rotley (turco) chamado Institutions Rule. O que

ele diz é que se comparar as variáveis (i) inserção no comércio, (ii) geografia e (iii) qualidade

das instituições, a geografia seria a menos importante, o grau de inserção seria razoavelmente

importante e todas essas duas primeiras são causas. A terceira variável é a mais importante, e

além de ser causa, é consequência, sendo duplamente importante. Ao mesmo tempo em que

boas instituições causam desenvolvimento, o desenvolvimento produz boas instituições. Essa

história serve para dizer que esse não é um debate exclusivamente interessante ou válido para

nós juristas. É um convite para entrarmos nesse debate das instituições. O que um jurista deve

fazer é pensar nas instituições. Somos engenheiros institucionais, e há pessoas que enxergam o

Direito assim.

O que é a separação dos poderes senão uma reflexão institucional sobre a

organização da política? É uma análise macro institucional. Qual a função do MP? Existe

também o nível micro, como o desenvolvimento tecnológico.

2. Otimistas x Pessimistas Os pessimistas basicamente dizem que você não controla uma norma jurídica. É a

implementação que reinventa a norma. Mesmo que todos sejam bem intencionados, você

não controla os efeitos de uma norma jurídica. E mais, normalmente elas produzem efeitos

diferentes ou opostos das quais foram pensadas. Há um elemento severo de indeterminação

do Direito, e isso é o Direito, não sendo algo que se possa de antemão conceber como

elemento de transformação da realidade. Nem o legislador mais bem intencionado é capaz

de predeterminar regras jurídicas que serão capazes e entregar o que promete. A sociedade é

mais complexa do que isso

Quando o Direito é pensado como instrumento de transformação social, para eles, os

efeitos são perversos, de forma que efeitos deletérios e indesejáveis ocorrem. Mesmo que no

nível das políticas públicas seja possível direcionar resultados, nunca será possível controlar o

judiciário, que lida com indeterminações, com processos de interpretações. Logo, é um perigo

pensar que o Direito pode mudar a realidade do país. É uma forma retórica que os grupos

políticos do poder utilizam para auferir benefícios pessoais e em nome próprio. Muita gente

favorece os amigos, ganhas as benesses de estar no poder, mas isso está longe de ser um

desenvolvimento econômico.

O principal teórico dessa tese é o Luhman, para quem o direito é o estabilizador de

expectativas da sociedade. O direito não pode tomar o papel da política, servindo apenas

para estabilizar as relações sociais. Os autores que tem essa visão entendem que o que o

direito precisa fazer é definir a propriedade, de forma a reduzir os custos de transação. No

Direito existem autores que vestem essa carapuça. O sujeito que com mais vigor defendeu isso

é um americano chamado Brian Tamanaha, um teórico de direito e desenvolvimento. É um

sujeito que critica Law and Development.

Tamahara diz que cultura é muito mais importante do que o impulso legislativo. Países

que tem hábitos, manifestações culturais e um direito que não é compatível com direito

ocidental, não serão manejáveis do ponto de vista político, no sentido de desenvolvimento

econômico, porque esse direito vivo vai se sobrepujar aos direitos formais. Segunda crítica: o

direito até impacta o desenvolvimento, mas isso não é manejável, não podendo planejar. É

quase lotérico. Ademais, a última crítica é que existe um elemento de dependência de

trajetória que é resultado acumulado de construção histórica do qual dependemos. Nunca

conseguimos escrever o futuro como se fosse uma folha em branco. É ingênuo achar que uma

nova CF vai ser capaz de mudar um país que está habituado historicamente ser desigual,

racista, etc. É a ideia de Path Independence. Não há um estágio zero. Além disso, Tamanaha

diz que é um erro atribuir função apenas instrumental ao Direito. Essa é a visão cética,

pessimista no campo do Direito e desenvolvimento.

A visão oposta, em vários níveis, é aquela segundo a qual o direito pode fazer diferença.

Por que demora tanto para registrar uma patente? Por que precisamos de reforma da

lei da propriedade intelectual? Quem estudou as patentes do Brasil? Será que é tão difícil de

detectar o problema? Será que essa agenda que traz investigações jurídicas no campo do

desenvolvimentos é nociva? Se não formos nós juristas, quem identificará isso? A agenda de

direito e desenvolvimento é pé no chão que não necessariamente precisa pressupor que o

direito vai fazer mudanças milagrosas. O direito não é só instrumentalização de fins políticos. No

momento que estamos vivendo hoje, essa agenda parece ser muito pertinente.

Em 2007 o mundo vinha de cabeça para baixo. Antes disso no Brasil as coisas começam

a mudar. Alguns autores começaram a dizer que o neoliberalismo arrefeceu e o Estado estava

voltando a ficar mais ativo. Ao retomar a condição mais ativa, o Estado brasileiro está

funcionalizando o direito, sem que isso signifique o retorno ao padrão de intervenção do

desenvolvimentismo clássico. Hoje o nome do jogo é coordenação público privada. É a

capacidade de o Estado articular a si mesmo e com a iniciativa privada. É uma política pública

de coordenação.

Portanto, o Direito precisa criar válvula de escape para que as políticas sejam

implementadas ao longo do caminho.

BOA PROVA!

Prova: feita para quem estava na sala de aula. Ela vai demandar raciocínio e capacidade

analítica na hora. É uma prova que valoriza quem estava presente na sala. São perguntas não

de memorização do caderno.

Prova com 4 ou 5 perguntas para responder apenas UMA. Professor valoriza textos organizados,

com começo, meio e fim. Não precisa de N argumentos, mas apenas um ou dois.

O melhor é ler todas as perguntas, escolher uma delas, gastar 15 ou 20 minutos para rascunhar

um esquema, e apenas então começar a escrever. Melhor não improvisaria no texto. Limite de

duas páginas.

É um exercício de concisão e objetividade, uma espécie de editorial.

BRASIL

Panorama Político

Institucional

Economia Política Internacional

Investimento Estrangeiro/Multina

cionais

Dinâmicas domésticas

(variedades de capitalismo)

Grupos de Interesse

Conflitos Distributivos

Elites

Agrárias

(GUDIN)

Financeiras/Industriais

(SIMONSEN)

ClasseMédia

Trabalhadores

Despossuídos

Substituição de Importação

Ferramentas e Arranjos

Institucionais

(Instrumentos de DE)

Estado Planejador

Estado Indutor/Fomentador

Estado Regulador

Anexo 1

Anexo 2 – Ordem Econômica Constitucional

Art. 173

Parágrafo 4º: ação antitruste

"Estado Empresário"

Imperativo de Segurança Nacional

Lei

Interesse Coletivo

Lei

Art. 170Ordem

Econômica

Fundamentos

Livre Iniciativa

Valoração do trabalho

Fins

PrincípiosArt. 174Estado "Agente

Normativo e Regulador"

Art. 175Serviços Públicos

Prestação Direta

Incentivo

Fiscalização

Planejamento

Indicativo setor privado

Determinante para setor

público

Prestação Indireta

Concessão Licitação

Permissão Licitação

Art. 176Jazidas e Potencial Hídráulico

Art. 177Monopólios da

UniãoParágrafo

ÚnicoUnião pode

contratar"Concessão"