CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO CESAR WADDINGTON CRUZ CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL Rio de Janeiro (2016)

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO

CESAR WADDINGTON CRUZ

CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO

SOBRE A INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA

PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL

Rio de Janeiro

(2016)

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Cesar Waddington Cruz

CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A

INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa

de Pós-graduação em Administração, Instituto

COPPEAD de Administração, Universidade

Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial

à obtenção do título de Mestre em Administração.

Orientador: Prof. Renato Cotta de Mello

Rio de Janeiro

(2016)

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Cesar Waddington Cruz

CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A

INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação

em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade

Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de

Mestre em Administração.

Aprovada em 10 de agosto de 2016, por:

Renato Cotta de Mello, D.Sc. – COPPEAD/UFRJ

Luís Antônio da Rocha Dib, D.Sc. – COPPEAD/UFRJ

Jorge Ferreira da Silva, D.Sc. – PUC-RJ

Rio de Janeiro

(2016)

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AGRADECIMENTOS

Escrever a dissertação é trabalho muito sóbrio e impessoal. Sendo assim, gostaria de utilizar

um pouco de liberdade criativa para escrever meus agradecimentos. Ele será dividido em duas

partes, sendo a primeira mais abrangente e a segunda mais pessoal.

Em primeiro lugar, agradecer a minha família por ter me aturado ao longo da vida e dado

todas as condições necessárias para que pudesse me dedicar integralmente ao mestrado, fora a

viagem com meu pai até a empresa do caso. Além disso, agradeço a existência de música no mundo,

pois ajudou (e ajuda) a manter minha concentração e sanidade mental nas atividades que realizo.

Por fim, agradecer a todos os envolvidos no Coppead, sejam professores, alunos, funcionários, etc.,

pois realizam um trabalho dedicado que nos permite usufruir de um mestrado de excelência.

Com relação a parte um pouco mais pessoal, aqui vamos nós. As hashtags tem contexto.

Agradecer ao meu conjunto de amigos mais próximos (#NoLimits) que estão comigo desde

o início dessa empreitada, Max, Renato, Ana, Carla, Henrique, Felipe, Luís (embora seja uma

adição tardia), pois são pessoas que possuem uma experiência singular de vida profissional e

pessoal. Além disso, não esquecerei dos dias impagáveis de “relaxamento suave” no mangue.

Agradecer a uma grande amiga minha (#AmizadesInfinitis), Lucyana Felícia, pois é uma

pessoa que tenho grande carinho e tive a sorte de conhecer, levando em conta que ela é de um ano

à frente do meu. Além disso, foi minha “co-orientadora” disfarçada, pois me ajudou muito mesmo!

Agradecer ao meu orientador, Renato Cotta de Mello, pois essa dissertação foi uma

experiência que me acrescentou muito. Além disso, foi muito compreensivo ao longo de todo o

processo, o que tornou a elaboração da dissertação mais “relaxante”.

Agradecer ao Dib (não sabia que ia ser da banca), pois as aulas de estratégia em marketing

foram únicas. Além disso, nunca mais vou conseguir escutar um “maravilha” sem rir.

Agradecer a Ariane, pois, apesar de ser uma professora nova no Coppead, é muito atenciosa.

Além disso, as aulas de ambiente internacional de negócios agregaram muito.

Agradecer a professora Letícia, pois sem ela acredito que nunca iria ter conhecido o famoso

“Mercadão de Madureira”. Além disso, é uma professora excepcional, dentro e fora de sala.

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RESUMO

CRUZ, Cesar Waddington. Café Fazenda Ninho da Águia: Um estudo de caso sobre a

internacionalização de uma fazenda produtora de café especial. Rio de Janeiro, 2016. Dissertação

(Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do

Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

O presente estudo teve por finalidade investigar o processo de internacionalização da

empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, uma pequena propriedade agrícola localizada na região

de Alto Caparaó (MG). Desde sua fundação, em 1969, a propriedade realiza o cultivo e venda de

cafés no mercado nacional e, após a chegada de um novo empreendedor, em 1996, a fazenda

conseguiu destacar-se nacional e internacionalmente pelos cafés especiais que passou a

comercializar, exportando atualmente para mais de 8 países. Para a análise do referido processo,

foram utilizadas as teorias de internacionalização com um viés comportamental, sendo essas:

Teoria de Uppsala e suas revisões mais recentes, Teoria de Redes de Relacionamento, Teoria de

Empreendedorismo Internacional, e a lógica Effectuation. A partir das teorias mencionadas,

buscou-se entender os fatores que motivaram a empresa a se internacionalizar, a relevância dos

relacionamentos no processo de internacionalização, o papel do empreendedor no processo de

internacionalização, os aspectos que influenciaram na ordem dos territórios internacionais nos

quais a empresa passou a atuar, e os aspectos que influenciaram o modo de entrada escolhido para

os países em questão. Levando em consideração tais objetivos de pesquisa, foi adotado um método

qualitativo, com estudo de caso único. A partir da análise do caso, foi possível observar que cada

uma das teorias utilizadas como referências para o estudo do fenômeno apresenta proposições que

ajudam a compreender o processo de internacionalização e a construção de vantagens competitivas

da empresa, sendo a Teoria de Uppsala Revisitada (2013 e 2014) a que permite uma compreensão

mais completa do caso em questão.

Palavras-chave: Marketing de Exportação, Internacionalização, Café - Comércio - Brasil,

Administração - Teses.

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ABSTRACT

CRUZ, Cesar Waddington. Café Fazenda Ninho da Águia: Um estudo de caso sobre a

internacionalização de uma fazenda produtora de café especial. Rio de Janeiro, 2016. Dissertação

(Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do

Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

The present study tries to evaluate the internationalization process of the company “Café

Fazenda Ninho da Águia”, a small agricultural property located in Alto do Caparaó (MG). Since

its creation, in 1969, the company grows and sells coffee in the domestic market and, after the

arrival of a new entrepreneur, in 1996, the company managed to stand out in both the domestic and

international market through its commercialization of specialty coffees, currently selling in over 8

countries. In order to study this phenomena, behavioral internationalization theories were applied,

such as: Uppsala Theory and its recent revisions, Network Theory, International Entrepreneurship

Theory and Effectuation logic. Keeping these theories in mind, the study tries to analyze the aspects

that led the company to internationalize, the relevance of relationships in the internationalization

process, the entrepreneur’s role in the process, the aspects related to the entry order of international

markets, and the aspects that influenced the chosen entrance mode in these markets. In accordance

with these study topics, the research method selected was the qualitative one, specifically the single

case study. From the case analysis, it was observed that each of these theories has properties that

helps in understanding the firm internationalization process and development of competitive

advantages, being the Uppsala Revisited Theory (2013 e 2014) the one that would allow a more

holistic understanding of the case in question.

Keywords: Export Marketing, Internationalization, Coffee - Trade - Brazil, Business - Thesis.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Representação da Cadeia Agroindustrial do Café ....................................................... 12

Figura 2 - Modelo de Uppsala Traduzido..................................................................................... 33

Figura 3 - Internacionalização e o Modelo de Redes: Situações para Análise ............................. 45

Figura 4 - Revisão do Modelo de Uppsala ................................................................................... 52

Figura 5 - O Modelo Conceitual de Empreendedorismo Internacional ....................................... 57

Figura 6 - Classificações de “International New Ventures” ......................................................... 62

Figura 7 - Fatores de Influência ao Surgimento de Born Globals ................................................ 66

Figura 8 - Dinâmica do Modelo de Effectuation .......................................................................... 77

Figura 9 - Estrutura do modelo de Uppsala para a evolução da empresa multinacional (MBE) . 83

Figura 10 - Linha do tempo resumida da empresa "Café Fazenda Ninho da Águia" ................ 111

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Consumo de Café por Continentes ................................................................................ 9

Tabela 2 - Consumo de Café por País (Bloco Econômico) ............................................................ 9

Tabela 3 - Exportação mundial por país exportador (*estimativa 2014)...................................... 13

Tabela 4 - Exportações Brasileiras de Café para os Principais Destinos (sacas de 60kg)............ 14

Tabela 5 - Exportações Brasileiras de Café por Ano e Tipo ........................................................ 16

Tabela 6 - Exportações Brasileiras de Cafés Diferenciados de janeiro a dezembro de 2014 ....... 26

Tabela 7 - Definição de Café Gourmet por Classe ....................................................................... 28

Tabela 8 - Dimensão das Variáveis em Análise na Pesquisa ....................................................... 92

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Consumo Mundial de Café por Tipo ............................................................................ 8

Gráfico 2 - Consumo Mundial de Café por Tipo de Mercado ........................................................ 8

Gráfico 3 - Preço Médio da Saca de Café..................................................................................... 10

Gráfico 4 - Participação do Café nas Exportações Totais e do Agronegócio Brasil (jan/nov) .... 15

Gráfico 5 - Evolução do Volume e Receita Cambial das Exportações de Café ........................... 16

Gráfico 6 - Participação Percentual da Produção de Café por Unidade Federativa ..................... 17

Gráfico 7 - Variação da Área, Produtividade e Produção em Relação à Safra de 2003 - Brasil .. 18

Gráfico 8 - Evolução do Consumo Interno de Café ..................................................................... 19

Gráfico 9 - Bebidas consumidas Regularmente pelo Brasileiro ................................................... 20

Gráfico 10 - Bebidas Abandonadas pelos Brasileiros .................................................................. 20

Gráfico 11 - Perfil dos Consumidores por Nível de Renda .......................................................... 21

Gráfico 12 - Conceito de Qualidade do Café................................................................................ 22

Gráfico 13 - Intenção de Pagar a Mais por Qualidade em um Café ............................................. 22

Gráfico 14 - Evolução das Exportações de Cafés Diferenciados (jan/dez) .................................. 26

Gráfico 15 - Definição de Café Gourmet ..................................................................................... 27

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1

1.1 OBJETIVO DO ESTUDO........................................................................................... 1

1.2 RELEVÂNCIA DO ESTUDO .................................................................................... 2

1.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO .................................................................................. 3

1.4 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO ................................................................................ 4

1.5 ANÁLISE DO SETOR ................................................................................................ 5

1.5.1 INFORMAÇÕES GERAIS .................................................................................. 5

1.5.2 CENÁRIO MUNDIAL ......................................................................................... 6

1.5.3 PRODUÇÃO DE CAFÉ NO BRASIL ............................................................... 11

1.5.4 HÁBITOS DE CONSUMO DE CAFÉ NO BRASIL ........................................ 18

1.5.5 MERCADO DE CAFÉS ESPECIAIS ................................................................ 23

1.5.6 PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES .................................................................. 29

2. REVISÃO DE LITERATURA ....................................................................................................... 31

2.1 MODELO DE UPPSALA (1977) ............................................................................. 31

2.1.1 CRÍTICAS A UPPSALA .................................................................................... 37

2.2 TEORIA DE REDES ................................................................................................ 39

2.3 UPPSALA REVISITADO – TEORIA DE REDES .................................................. 48

2.4 EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL ....................................................... 54

2.5 TEORIA DE EFFECTUATION ............................................................................... 70

2.6 UPPSALA REVISITADO (2013, 2014) ................................................................... 81

3. MÉTODO DE PESQUISA .............................................................................................................. 86

3.1 PROBLEMA DE PESQUISA ................................................................................... 86

3.2 MÉTODO DE PESQUISA ........................................................................................ 86

3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .............................................................. 90

3.4 LIMITAÇÕES DO MÉTODO .................................................................................. 92

4. ESTUDO DE CASO .......................................................................................................................... 94

4.1 HISTÓRIA DA EMPRESA ...................................................................................... 94

4.1.1 ANTES DE 1996 ................................................................................................ 94

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4.1.2 DEPOIS DE 1996 ............................................................................................... 98

4.2 PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO ...................................................... 112

4.3 A EMPRESA HOJE ................................................................................................ 120

4.4 FUTURO DA EMPRESA ....................................................................................... 125

5. ANÁLISE DO CASO ...................................................................................................................... 127

5.1 PERSPECTIVA DE UPPSALA .............................................................................. 127

5.2 PERSPECTIVA DE REDES ................................................................................... 134

5.3 PERSPECTIVA DE EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL ................... 136

5.4 PERSPECTIVA DE EFFECTUATION .................................................................. 139

6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ................................................................................. 143

6.1 CONCLUSÕES ....................................................................................................... 143

6.2 RECOMENDAÇÕES PARA PESQUISAS FUTURAS ........................................ 147

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................ 148

REFERÊNCIAS DE SITES ................................................................................................................... 155

LISTA DE APÊNDICES......................................................................................................................... 158

APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA ........................................................... 158

APÊNDICE B - “ÁRVORE” DE CAFÉ E SUAS “FLORES” ..................................... 168

APÊNDICE C - DIMENSÃO DA ALTURA DE UM PÉ DE CAFÉ (PESSOA NA

FOTO POSSUI 189 CM DE ALTURA) ....................................................................... 169

APÊNDICE D - CAFÉS VERDES E TORRADOS PRODUZIDOS NA

FAZENDA DE CLAYTON ........................................................................................... 170

APÊNDICE E - EMBALAGEM UTILIZADA NA EXPORTAÇÃO ATRAVÉS

DA MINAS HILL COFFEE .......................................................................................... 171

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1. INTRODUÇÃO

1.1 OBJETIVO DO ESTUDO

O presente estudo analisou o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda

Ninho da Águia”, localizada na região do Alto do Caparaó/MG. A empresa é atuante no setor

cafeeiro, mais especificamente, no setor de cafés especiais, também chamados de café “gourmet”.

A análise foi realizada através do método de estudo de caso único. Com relação a análise, será

utilizado como referencial teórico as teorias sobre internacionalização de empresas que possuem

uma abordagem comportamental do processo.

Através da realização desse estudo, procurou-se esclarecer questões relativas ao surgimento

da empresa, como: a relevância dos relacionamentos, abordagem de risco pelo empreendedor, e

outras questões abordadas pelas teorias comportamentais de internacionalização.

Baseado nisso, foi definido como problema de pesquisa do estudo: de que modo o processo

de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia” pode ser explicado pelas teorias

de internacionalização de empresas desenvolvidas pela corrente comportamental?

Sendo assim, foram consideradas as seguintes perguntas de pesquisas com o intuito de

direcionar o estudo:

1. Quais fatores motivaram a empresa a se internacionalizar?

2. Qual foi a relevância dos relacionamentos no processo de internacionalização?

3. Qual a relevância do papel do empreendedor no processo de internacionalização?

4. Quais aspectos influenciaram na ordem dos territórios internacionais que a empresa

passou a atuar?

5. Quais aspectos influenciaram o modo de entrada escolhido para os países em questão?

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1.2 RELEVÂNCIA DO ESTUDO

A indústria do café possui relevância histórica para a economia brasileira desde os tempos

do império. Atualmente representa cerca de 3% do total de exportações, assumindo o valor de cerca

de 6,58 bilhões de dólares em 2014 (CECAFÉ, 2014).

Um dos setores que mais cresce no setor cafeeiro é o dos cafés de alta qualidade, chamados

de especiais, diferenciados ou gourmet. Esse produto tem maior valor de venda e uma forte

aceitação nos mercados nacional e internacional. De acordo com dados da “Brazil Specialty Coffee

Association” (BSCA), o valor de venda para alguns cafés diferenciados tem um sobre preço médio

que varia de 30% a 40% acima do café convencional. Em alguns casos, pode ultrapassar a barreira

dos 100% (BSCA, 2015).

Com relação ao tamanho de mercado, dados recentes mostram que a demanda pelos grãos

especiais cresce em torno de 15% ao ano, principalmente no exterior, enquanto o commodity cresce

cerca de 2% ao ano. Atualmente, o segmento representa cerca de 12% do mercado internacional

da bebida (BSCA, 2015). A partir de dados divulgados pela Conselho dos Exportadores de Café

do Brasil (CECAFÉ), em 2014, o Brasil exportou um volume 59,9% maior do que em 2013 no

segmento de cafés especiais. Sendo assim, em 2014, o país exportou aproximadamente 8,1 milhões

de sacas (60 kg) de cafés diferenciados, valor esse que representou uma receita de 1,88 bilhões de

dólares para o setor (CECAFÉ, 2014). Além das oportunidades associadas ao mercado externo, o

Brasil representa o terceiro maior mercado mundial consumidor de Café (ICO, 2015).

Sendo assim, a relevância do estudo pode ser percebida pelo potencial comercial no

mercado interno e externo dos cafés especiais. Esse potencial pode ser observado de duas formas.

Primeiro, permite transformar um produto tratado como “commodity” para um extremamente

diferenciado, e de possível produção mesmo em pequenas propriedades. Sendo assim, tais

empresas estariam menos expostas às volatilidades do preço de café “commodity” no mercado.

Segundo, o sobre preço médio do café especial potencializa ainda mais sua atratividade em

comparação ao “commodity”, pois resulta em retornos financeiros mais elevados.

Além disso, o setor de cafés especiais representa um caso interessante na literatura de

negócios internacionais, pois, em um setor dominado por grandes produtores que vendem um

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produto tido como “commodity”, é possível a existência de produtores menores que conseguem

ofertar um produto diferenciado e competitivo no mercado internacional.

Inicialmente, buscou-se uma fazenda que estivesse localizada em Minas Gerais, tendo em

vista dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC) (2015) que aponta Minas Gerais

como maior estado produtor de café no Brasil. A partir da escolha do estado, foi verificado que a

região de Alto Caparaó possuía duas características interessante. Primeiro, o microclima e

qualidade do solo apresentava características singulares para o cultivo de café. Segundo, a região

apresentava uma fazenda que, embora pequena, apresentava tanto prêmios obtidos pela qualidade

de seu café como atividades no mercado internacional. Sendo assim, escolheu-se estudar o processo

de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, pois seria um caso atípico para

a região e o setor, visto que é uma fazenda que possui baixo volume de produção, não apresenta

uma estrutura organizacional bem definida, e, mesmo assim, é uma das poucas fazendas da região

que realiza vendas para o mercado internacional.

1.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO

O objetivo da pesquisa foi delimitado como o estudo do processo de internacionalização da

empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, tendo por base as abordagens comportamentais sobre o

processo de internacionalização de empresas. Com relação a utilização de dados, foram

consideradas fontes secundárias, como sites e notícias presentes em jornais, e fontes primárias,

sendo esta última obtida através da realização de entrevistas semi-estruturadas, presenciais, com

representes da empresa em questão.

O estudo apresenta limitações com relação ao método e ao escopo de pesquisa. Com relação

ao escopo do objeto em análise, foi considerado uma empresa localizada no interior do estado de

Minas Gerais, na região de Alto Caparaó, inserida no setor de cafés especiais. Com relação ao

método, o estudo de caso estaria inserido no âmbito de pesquisas qualitativas. Sendo assim,

incialmente seria possível descrever limitações ao método como àquelas apresentadas relacionadas

aos critérios de qualidade citados por Flick (2009). Além disso, Yin (2003) aponta limitações

relacionados à validade interna do método, pois o estudo de caso envolve a realização de

inferências, assim como da validade externa, tendo em vista a limitação de possíveis generalizações

do estudo.

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1.4 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO

Com relação a organização do estudo, inicialmente serão apresentadas as descrições gerais

sobre a pesquisa, assim como sua relevância e delimitação de seu escopo. No final desse capítulo,

será apresentada uma visão geral sobre o setor, com o intuito de contextualizar o leitor nos aspectos

relacionados à sua dinâmica, relevância econômica, evolução histórica, peculiaridades, e ambiente

internacional.

No segundo capítulo, serão apresentadas as teorias de internacionalização de empresas que

possuem uma abordagem comportamental. Serão descritas as teorias mais notórias acerca do

assunto em questão, passando pelo modelo de Uppsala original, a teoria de Redes, os estudos de

Empreendedorismo Internacional, a abordagem por racionalidade limitada em Effectuation, e as

revisões da teoria de Uppsala. Tais teorias serão utilizadas para a avaliação do estudo de caso

realizado.

No terceiro capítulo, serão considerados os seguintes aspectos do método do estudo: 1)

problema e perguntas de pesquisa, utilizadas no estudo; 2) o método de pesquisa utilizado na

investigação e análise do caso, e a justificativa para sua escolha; 3) procedimentos metodológicos,

considerando os tipos de fontes de dados utilizados e o tratamento utilizados nestes; 4) limitações

relacionadas ao método de pesquisa utilizado.

No quarto capítulo, será descrito o caso investigado no presente estudo através do

detalhamento da origem, das atividades realizadas, do processo de internacionalização, e decisões

relevantes na história da empresa.

Nos capítulos cinco e seis, será realizado a análise do caso em questão com base nas teorias

mencionadas, sendo possível responder os problemas de pesquisa e atingir os objetivos de pesquisa

propostos. Por fim, serão apresentadas conclusões acerca do caso estudado e recomendações

relacionados ao tema de pesquisa.

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1.5 ANÁLISE DO SETOR

1.5.1 INFORMAÇÕES GERAIS

Não há uma evidência precisa sobre a descoberta do café, mas há muitas lendas que relatam

sua possível origem. Uma das vertentes mais difundidas seria que, em meados do século XV, um

pastor da Etiópia notou que suas cabras, ao ingerirem os frutos de certo arbusto de coloração

amarelo avermelhada, ficavam mais alegres e saltitantes. O pastor resolveu apresentar os frutos a

um monge da região que, posteriormente, realizou uma infusão com os tais frutos para

experimentá-lo. Após beber, ele achou que sua disposição física tinha melhorado, passando a beber

e divulgar sobre a descoberta. Sendo assim, a planta de café seria originária da Etiópia, centro da

África, onde, ainda hoje, faz parte da vegetação natural (ABIC, 2015).

Com relação ao seu comércio, teria sido a Arábia responsável pela propagação da cultura

do café. Ironicamente, o nome não é originário da “Kaffa”, local de origem da planta, e sim da

palavra árabe “qahwa”, que significa vinho. Por esse motivo, o café era conhecido como "vinho da

Arábia" quando chegou à Europa no século XVII. A partir de 1615, o café começou a ser

comercializado no continente europeu, trazido por viajantes em suas frequentes viagens ao oriente.

Até meados do século XVII, somente os árabes produziam e tinham controle sobre a produção de

café, razão pela qual alemães, franceses e italianos procuravam desesperadamente uma maneira de

desenvolver o plantio em suas colônias. Contudo, foram os holandeses que conseguiram as

primeiras mudas e as cultivaram nas estufas do jardim botânico de Amsterdã, fato que tornou a

bebida uma das mais consumidas no velho continente, passando a fazer parte definitiva nos hábitos

dos europeus. Após o sucesso holandês na produção de café, o cultivo do produto espalhou-se para

outros países na Europa.

Em 1645, aparecerem as primeiras casas de café na Itália, espalhando-se em seguida pela

península, tornando-se celebres os cafés venezianos, genoveses e romanos. Em 1657, na França

foram surgindo várias casas de café público em Londres e Paris, tornando-se pontos de encontros

para debates e discussões, principalmente sobre política e arte. No final do século XVII, os

holandeses levaram o café para cultivo na Malásia, Java, Célebes, Timor e Sumatra. Além disso,

outros países europeus também começaram a expandir o cultivo do café para suas colônias

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tornando-se um produto de grande importância econômica para o desenvolvimento da África, Ásia

e América Latina (ABIC, 2015).

Somente em 1727 o café chegou ao Brasil através do sargento-mor Francisco de Melo

Palheta, que foi em missão oficial às Guianas. As primeiras lavouras começaram em Belém do

Pará sendo levadas posteriormente para o Amazonas e Maranhão. Já em 1767, o café produzido no

Amazonas era exportado para a Europa. Devido às nossas condições climáticas, o cultivo de café

espalhou-se rapidamente sendo cultivado em regiões como Maranhão, Bahia, Rio de Janeiro, São

Paulo, Paraná e Minas Gerais. O Marquês do Lavradio foi um dos maiores incentivadores da

cultura do café no Brasil, dando isenção do serviço militar para o lavrador que tivesse plantado um

determinado número de cafeeiros. A partir do ano de 1810, a cultura do café no Brasil teve um

crescimento considerável, tanto que, em 1826, as exportações já representavam 20% da produção

mundial (ABIC, 2015).

Apesar disso, a cafeicultura no centro-sul do Brasil enfrentou problemas em 1870, quando

uma grande geada atingiu as plantações do oeste paulista provocando grandes prejuízos, e, mais

tarde, durante a crise de 1929. No entanto, após se recuperar das crises, a região se manteve como

importante centro produtor. Nela se destacam quatro estados produtores: Minas Gerais, São Paulo,

Espírito Santo e Paraná (ABIC, 2015).

Desde então, a produção cafeeira no Brasil passou por diversas transformações sendo o

Brasil o maior exportador de café do mundo (ICO, 2015), e assume o quinto lugar como item

agrícola mais exportado pelo país em 2014 (CONAB, 2015).

1.5.2 CENÁRIO MUNDIAL

Desde as primeiras descrições do café, no século 18, os botânicos não têm conseguido fazer

uma classificação precisa. As dificuldades na classificação de uma planta como membro verdadeiro

do gênero “Coffea” ocorre por causa da grande variedade nas plantas e sementes. As duas mais

importantes espécies de café, de um ponto de vista econômico, são o arábica (Coffea Arábica), e o

robusta (Coffea Canephora) (também chamado de “conilon”) (CNC, 2015). Há também outras

subespécies destas, além de espécies híbridas provenientes de possíveis cruzamentos. Apesar disso,

para efeitos de simplificação e com o intuito de utilizar a mesma nomenclatura mundial da

Organização Internacional do Café (ICO), serão consideradas apenas as duas mencionadas.

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De acordo com dados da ICO (2015), apesar do aumento da produção mundial de café até

2012, houve queda nos anos seguintes (Gráfico 1). Neste contexto, a redução global da produção

do café arábico foi de 2,1 % a.a. (em média) enquanto do café robusta foi de 1,77 % a.a. (em

média). Apesar disso, desde 2011 há um crescimento consistente do consumo mundial de café em

cerca de 2,3 % a.a. (em média) (Gráfico 2), atingindo um valor de 149,3 milhões de sacas (60 kg)

de café consumidos em 2014. Tal aumento deve-se, além da elevação de consumo nos países (ou

blocos econômicos) tradicionalmente importadores líquidos de café (Canada, União Europeia,

Japão, Noruega, USA, etc.), principalmente pela elevação de consumo dos países emergentes

(Algéria, Austrália, Rússia, Coréia do Sul, Turquia, Ucrânia, etc.) e dos exportadores líquidos de

café (ICO, 2015). A diferença entre os valores dos gráficos 1 e 2 pode ser explicada pela existência

de outras espécies de café não contabilizadas pela organização.

Page 20: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

8

Fonte: ICO (2015)

Gráfico 1 - Consumo Mundial de Café por Tipo

Gráfico 2 - Consumo Mundial de Café por Tipo de Mercado

Fonte: ICO (2015)

Page 21: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

9

Com base em dados de junho de 2015 da Organização Internacional do café (ICO), é

possível constatar algumas tendências acerca dos principais mercados consumidores. Os principais

mercados continentais são Europa, Ásia e Oceania, América do Norte, e América do Sula, nessa

ordem (Tabela 1). A Europa representa o maior mercado em números absolutos, contudo ao levar

em consideração aspectos populacionais percebe-se que a América do Norte também é um grande

consumidor comparativo. Além disso, pode-se destacar que há um crescimento do consumo mais

acelerado na África, e na Ásia e Oceania. Já considerando o consumo por país (ou bloco

econômico) (Tabela 2) percebe-se que há algumas mudanças acerca das localizações continentais

dos maiores mercados, pois o Brasil passa ser o terceiro maior mercado de consumo de café. Temos

União Europeia, USA, Brasil, e Japão como sendo os consideravelmente maiores, seguidos de

Japão, Indonésia e Rússia (ICO, 2015).

Fonte: ICO (2015)

Fonte: ICO (2015)

Tabela 1 - Consumo de Café por Continentes

Tabela 2 - Consumo de Café por País (Bloco Econômico)

Page 22: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

10

O preço médio das sacas de café (Gráfico 3) apresentou algumas flutuações durante os

últimos dois anos provocadas por fatores adversos como produtividade das safras, instabilidade

econômica mundial, e flutuações do Real. Em junho de 2015 apresentou uma de 124, 97 centavos

de dólar. Apenas para estimar o tamanho do mercado mundial, consideremos a média de junho a

junho (2014-2015) em 140 centavos de dólares, e que uma libra peso é equivalente a 0,453

quilogramas. A partir desses dados temos que o mercado mundial teria um valor aproximado de

27,7 bilhões de dólares (ICO, 2015).

Considerando possíveis tendências dos mercados mundiais, de acordo com dados de junho

de 2015 do Bureau de Inteligência Competitiva do Café (BICC), temos que a importação de café

verde (café sem processamento) pelos próprios países produtores tem sido utilizada de forma

estratégica. Alguns países importam dos seus vizinhos, ou mesmo de origens mais distantes, com

o objetivo de industrializar os grãos e agregar valor às suas exportações. Vietnã e Índia, dois dos

maiores produtores mundiais de café, aumentaram suas importações de grãos nos últimos anos.

Ambos os países possuem indústrias de solúvel cujas exportações estão em crescimento. A

Colômbia, por outro lado, aumentou suas importações por conta das sucessivas quebras de safra

decorrentes do programa de renovação das lavouras. Esses dados demonstram que existe um fluxo

de comércio de café verde entre os países produtores. Essa medida é adotada de forma estratégica,

Fonte: ICO (2015)

Gráfico 3 - Preço Médio da Saca de Café

Page 23: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

11

de modo a trazer benefícios ao próprio país através da agregação de valor ao produto ou suprimento

de um eventual déficit na oferta interna. (BICC, 2015)

Por fim, o café que há muito tempo é considerado uma commodity, passa também a possuir

o status de “speciality”, devido a agregação de valor. O café segue tendências que se movem de

acordo com a demanda do mercado e com o perfil dos consumidores. Dentre as grandes tendências,

a sustentabilidade/ética tem sido visada tanto por consumidores quanto pelas empresas. Ela se

refere a um conjunto de valores e princípios que levam o comprador a associá-los com a própria

companhia (BICC, 2015).

Apesar da prioridade com preocupações clássicas como preço e qualidade, os consumidores

estão mudando seus critérios no momento da compra. Nesse contexto, a sustentabilidade torna-se

um atributo que passa a somar à marca, gerando uma relação de confiança entre empresa e

consumidor, demonstrando as vantagens que um produto possui em detrimento de outro. Esse

princípio pode ser aplicado no âmbito das monodoses, pois seu acelerado crescimento trouxe um

maior volume de resíduos. Levando isso em consideração, no mercado internacional as cápsulas,

que são referência de inovação, ganham novos tamanhos, reciclabilidade (total ou parcial), e outras

características com o intuito de reduzir seu impacto no mio ambiente (BICC, 2015).

1.5.3 PRODUÇÃO DE CAFÉ NO BRASIL

A atividade cafeeira é bastante ampla envolvendo agentes que atuam desde a produção até

a distribuição do produto. Sendo assim é uma atividade que possui uma dinâmica de funções

interdependentes. Para ilustrar seu funcionamento como forma de facilitar a sua compreensão será

utilizado a cadeia agroindustrial do café de Castro (2000) que é composta dos segmentos ligados

aos fatores de produção, à produção agrícola, ao beneficiamento, e à comercialização do produto.

Tal processo envolve a participação fornecedores, produtores, maquinista, trabalhadores rurais,

cooperativas e corretores (Figura 1).

Page 24: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

12

Fonte: Castro (2000)

Figura 1 - Representação da Cadeia Agroindustrial do Café

Page 25: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

13

Tendo tal processo em mente, tem-se que os três principais produtos de venda na indústria

cafeeira seriam: cafés verdes (grãos); moídos e torrados; e solúvel. A partir disso, é possível fazer

uma análise acerca de alguns indicadores do mercado cafeeiro no Brasil.

Atualmente, o Brasil mantém sua posição como maior produtor de café do mundo sendo

responsável por aproximadamente 32,3% da produção mundial de café, seguido por Vietnã com

aproximadamente 15,8% e Indonésia com 9,7% (Tabela 3) (ABIC, 2014). Os principais

importadores do produto brasileiro, de acordo com dados de 2014 do Conselho dos Exportadores

de Café do Brasil (CECAFÉ), são os EUA (20%) e os países da União Europeia (51%),

especialmente Alemanha (19%), Bélgica (8%), e Itália (8%) (Tabela 4).

Fonte: ABIC (2014)

Tabela 3 - Exportação mundial por país exportador (*estimativa 2014)

Page 26: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

14

Tabela 4 - Exportações Brasileiras de Café para os Principais Destinos (sacas de 60kg)

Fonte: CECAFÉ (2014)

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15

O agronegócio é extremamente relevante para as exportações totais do Brasil assumindo

um valor de cerca de 43% do seu total. Historicamente o café é um produto que assume uma

relevância na balança comercial brasileira e, embora tenha decrescido sua participação, ainda

representa cerca de 3% de todas as exportações brasileiras, e aproximadamente 7% ao considerar

sua participação frente ao total de exportações do agronegócio (Gráfico 4) (CECAFÉ, 2014).

Fonte: CECAFÉ (2014)

Gráfico 4 - Participação do Café nas Exportações Totais e do Agronegócio Brasil (jan/nov)

Page 28: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

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A exportação de café brasileira dá-se principalmente pela sua forma verde (grãos) (Tabela

5), e movimenta um valor aproximado de 5 a 8 bilhões de dólares ao ano (Gráfico 1), considerando

um valor de receita FOB (Free on Board). Tal valor oscila dessa forma, pois depende da cotação

média da saca de café durante o período analisado (CECAFÉ, 2014).

Fonte: CECAFÉ (2014)

Tabela 5 - Exportações Brasileiras de Café por Ano e Tipo

Fonte: CECAFÉ (2014)

Gráfico 5 - Evolução do Volume e Receita Cambial das Exportações de Café

Page 29: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

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Em relação aos tipos de empresas atuantes na produção, estas são majoritariamente de

grande porte (mais de 10.000 sacas por ano), representando um valor aproximado de 74,5% da

produção total de acordo com dados dos associados da Associação Brasileira da Indústria de Café,

ABIC (2014).

Com relação as regiões produtoras, de acordo com dados de junho de 2015 da Companhia

Nacional de Abastecimento (CONAB), Minas Gerais é o maior estado produtor e responde por

mais de 50% da produção nacional. O cultivo predominante no estado é de café arábica. O Espírito

Santo, segundo maior estado produtor, cultiva predominantemente o café conilon e produziu quase

80% da safra brasileira desta espécie (Gráfico 6).

Além disso, é importante destacar o ganho de produtividade nas lavouras do país, uma vez

que o produtor tem utilizado técnicas de manejo para melhorar o sistema de manejo, o que resulta

em ganho de produção apesar da redução de área (Gráfico 7) (CONAB, 2015).

Fonte: CONAB (2015)

Gráfico 6 - Participação Percentual da Produção de Café por Unidade Federativa

Page 30: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

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1.5.4 HÁBITOS DE CONSUMO DE CAFÉ NO BRASIL

O mercado brasileiro é o terceiro maior mercado consumidor de café do mundo (ICO,

2015). Além disso é um mercado que tem crescido cresceu ao longo dos anos de forma considerável

(Gráfico 8) assumindo um valor aproximado de 3,77 bilhões de dólares (considerando 185,43

dólares o preço médio da saca para 2014). Além disso, é um mercado que apresenta características

de consumo próprias. Sendo assim, é interessante destacar algumas características do hábito de

consumo dos brasileiros como forma de melhor entendê-los, e ajudar no dimensionamento do seu

potencial. Tais dados foram retirados de um estudo de tendências de consumo de café realizado em

2010, e divulgado pela Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC).

Gráfico 7 - Variação da Área, Produtividade e Produção em Relação à Safra de 2003 - Brasil

Fonte: CONAB (2015)

Page 31: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

19

Com relação ao consumo de bebidas, o brasileiro majoritariamente consome café sendo a

segunda bebida mais consumida (Gráfico 9). Além disso, o nível de consumo de café é regular e

não é impactado de forma considerável pelo abandono do mesmo, pois o índice de abandono do

café é de 4%, além de ser historicamente baixo (Gráfico 10) (ABIC, 2010).

Fonte: ABIC (2014)

Gráfico 8 - Evolução do Consumo Interno de Café

Page 32: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

20

Fonte: ABIC (2010)

Fonte: ABIC (2010)

Gráfico 9 - Bebidas consumidas Regularmente pelo Brasileiro

Gráfico 10 - Bebidas Abandonadas pelos Brasileiros

Page 33: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

21

Com relação a penetração do consumo pelo nível de renda, a classe C é a maior

consumidora de café, além de estar se tornando cada vez mais expressiva (Gráfico 11). Dentre

outras características, é possível destacar que o consumo regular de café é um hábito inserido no

cotidiano dos consumidores. Tal hábito costuma estar associado com o consumo vem quando

criança, quando a mãe oferecia. Além disso, o consumo entre homens e mulheres é bem equilibrado

(ABIC, 2010)

Embora haja essas diferenças acerca do consumo, há uma consolidação do conceito de

qualidade (“um bom café”) como um produto sem misturas, aromático e saboroso, independente

de região, classe e idade (Gráfico 12). Sendo assim, o estudo indica que há uma predisposição de

pagar a mais por uma maior qualidade de café (Gráfico 13) (ABIC, 2010).

Fonte: ABIC (2010)

Gráfico 11 - Perfil dos Consumidores por Nível de Renda

Page 34: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

22

Fonte: ABIC (2010)

Gráfico 12 - Conceito de Qualidade do Café

Fonte: ABIC (2010)

Gráfico 13 - Intenção de Pagar a Mais por Qualidade em um Café

Page 35: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

23

1.5.5 MERCADO DE CAFÉS ESPECIAIS

Um dos setores que mais crescem no setor cafeeiro são os cafés de alta qualidade, chamados

de especiais ou diferenciados. A definição refere-se aos cafés de excelente qualidade, obtidos por

um conjunto de processos que abrangem desde o cultivo da planta até a forma de preparo da bebida,

possibilitando a obtenção de um café especial. Esse produto tem maior valor de venda e uma forte

aceitação nos mercados nacional e internacional. De acordo com dados da “Brazil Specialty Coffee

Association”, O valor de venda atual para alguns cafés diferenciados tem um sobrepreço médio

que varia entre 30% e 40% acima do preço do café convencional. Em alguns casos, pode ultrapassar

a barreira dos 100% (BSCA, 2015).

Não existe uma definição precisa sobre o produto e, para estabelecer uma caracterização

mais aproximada, devem-se considerar parâmetros intrínsecos da qualidade da bebida, além da

condição da produção dos grãos. Sendo assim, diversas vezes o termo café especial é utilizado

como sinônimo de café gourmet, contudo não são exatamente a mesma coisa, pois a classificação

em café especial envolve a obtenção de certos tipos de certificados. No Brasil, a entidade

responsável pela avaliação, qualificação, certificação e fomento do café é a ABIC, contudo ao se

tratar especificamente do café especial, a BSCA encarrega-se de avaliar e qualificar os produtos

conforme norma rígida de avaliação (SEBRAE, 2015).

Dentre os certificados de possível obtenção, pode-se destacar os seguintes (SEBRAE,

2015):

Café gourmet: está relacionado a grãos de café arábica de alta qualidade. É um produto

diferenciado, quase livre de defeitos. A produção de café gourmet tem sido incentivada pela

Organização Internacional do Café (ICO).

Café de origem certificada: relaciona-se às regiões de origem dos plantios, uma vez que alguns

dos atributos de qualidade do produto são inerentes à região onde a planta é cultivada. O

monitoramento da produção é necessário para a rotulagem.

Café orgânico: é desenvolvido sob as regras da produção orgânica. Isso significa que o café

deve ser cultivado com fertilizantes orgânicos e o controle de pragas e doenças deve ser feito

por meio de controle biológico. Para ser rotulado como orgânico, tanto a produção como o

processamento precisam ser monitorados por uma agência certificadora credenciada.

Page 36: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

24

Café fair trade: é aquele consumido em países desenvolvidos por consumidores preocupados

com as condições sociais e ambientais sob as quais o café é cultivado. Observa-se uma

disposição para pagar mais pelo café produzido por pequenos agricultores e/ou sistemas de

produção sombreados. O processamento também é monitorado, para garantir a presença dos

atributos de qualidade desejados.

Com relação ao café gourmet, para entender melhor os aspectos que interferem na qualidade

do café devem-se levar em consideração variáveis como fatores regionais, espécies e variedades

culturais, sistema de processamento e comercialização, tipos de solo, dentre outros. De maneira

geral, pode-se dizer que os fatores e os cuidados antes da colheita, durante e após influenciam

intensamente na qualidade da bebida. Numa mesma região, e numa mesma espécie, a forma de

cultivo dos tratos culturais na colheita podem variar de produtor para produtor devido às condições

técnicas, econômicas, disponibilidade de mão-de-obra e equipamentos, o que resulta em grandes

variações no resultado do café (LOPES e ANDRADE, 2015).

A qualidade do café no Brasil é determinada, principalmente, através de três classificações.

A classificação oficial do café por peneira discrimina os grãos beneficiados pelas suas dimensões.

Eles são separados e quantificados por peneiras de formas circulares e alongadas, designadas por

números, divididos por 64. Cada número indica o tamanho dos furos, expressos em frações de

polegadas. As peneiras de grãos chatos vão de 12 a 20 e as dos grãos mocas (arredondados) vão de

8 a 13. Em outra classificação, a cor dos grãos de café influencia, de forma quase decisiva, a

avaliação do seu aspecto. As principais tonalidades de cores apresentadas do café arábica são: verde

azulada, verde-cana, verde, esverdeada, amarelada, amarela, marrom, chumbada, esbranquiçada e

discrepante. O marrom, normalmente, é atribuído ao grão do café conilon e a cor discrepante é

consequência de ligas de lotes de café de safras e cores diferentes. Por fim, a “prova de xícara”, é

a determinação da qualidade da bebida. Tal classificação é conhecida como análise sensorial, pois

é analisado o sabor e o aroma que o café apresenta na prova de xícara. Essa classificação é quase

tão antiga quanto a história do café no Brasil. Surgiu no início do século XX e foi adotada pela

Bolsa Oficial de Café e Mercadorias de Santos, a partir de 1917. Basicamente, a análise sensorial

é realizada por provadores treinados para diferenciar os cafés, segundo seus sentidos. Em ordem

decrescente, e de acordo com a tabela oficial de classificação pela bebida, o café é classificado

Page 37: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

25

como “estritamente mole”, “mole”, “apenas mole”, “dura”, “riado”, “rio”, e “rio zona” (BSCA,

2015).

O Brasil apresenta uma vantagem considerável nesse mercado devido à diversidade de

regiões ocupadas pela cultura do café. Sendo assim, o país consegue produzir tipos variados desse

produto, fato que possibilita atender às diferentes demandas mundiais, referentes a paladar e preços.

O Brasil tem 12 principais regiões produtoras de café (identificados como Sul de Minas, Matas de

Minas, Chapada de Minas, Cerrado de Minas, Mogiana-SP, Montanhas do Espírito Santo, Conilon

Capixaba, Paraná, Planalto da Bahia, Cerrado da Bahia e Conilon de Rondônia), o que evidencia a

variedade de aromas e sabores dos cafés do Brasil. Mesmo sendo os aspectos sensoriais os mais

relevantes na caracterização de um café especial, os padrões de sustentabilidade ambiental,

econômica e social da cafeicultura brasileira cada vez mais têm influenciado na caracterização do

produto (BSCA, 2015).

Com relação ao tamanho de mercado, dados recentes mostram que a demanda pelos grãos

especiais cresce em torno de 15% ao ano, principalmente no exterior, em relação ao crescimento

de cerca de 2% do café commodity. O segmento representa hoje cerca de 12% do mercado

internacional da bebida (BSCA, 2015). A partir dos dados divulgados pela Conselho dos

Exportadores de Café do Brasil (CECAFÉ), em 2014 o Brasil exportou um volume de 59,9% maior

do que em 2013 (Tabela 6). Sendo assim, em 2014 o país exportou aproximadamente 8,1 milhões

de sacas (60 kg) de café diferenciados, valor esse que representou uma receita de 1,88 bilhões de

dólares para o setor (Gráfico 14) (CECAFÉ, 2014).

Page 38: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

26

Fonte: CECAFÉ (2014)

Tabela 6 - Exportações Brasileiras de Cafés Diferenciados de janeiro a dezembro de 2014

Fonte: CECAFÉ (2014)

Gráfico 14 - Evolução das Exportações de Cafés Diferenciados (jan/dez)

Page 39: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

27

Apesar do potencial de mercado, especialmente no mercado interno, a comercialização de

café especial enfrenta suas dificuldades, pois há uma assimetria de informação sobre a qualidade e

procedência do café que muitas vezes não fica claro e transparente ao consumidor. Um aumento

da regulamentação aliado às tendências de maior conscientização vis-à-vis a estagnação do

tradicional gera mais oportunidades de mercados ao café especial (LOPES e ANDRADE, 2015).

Ao considerar, por exemplo, o conhecimento sobre o produto tal aspecto fica mais evidente.

Muitos dos consumidores não sabem definir com precisão o que seria um café gourmet. Daqueles

que sabem, percebe-se que a alta qualidade/sofisticação são elementos que compõem o conceito

do produto. Os maiores conhecedores são os consumidores de classe A, possivelmente por serem

mercado alvo deste produto, que também associam o café gourmet a grãos especiais e tipo

exportação (ABIC, 2010).

Fonte: ABIC (2010)

Gráfico 15 - Definição de Café Gourmet

Page 40: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

28

Visto que o consumidor pode não conseguir distinguir, mesmo após saborear a bebida, se

ela possui os atributos por ele desejados, o SEBRAE (2015) recomenda que nesses casos o

fortalecimento da confiança no organismo certificador estimula a comprovação dos atributos

contidos no selo impresso na embalagem. Assim, é necessário criar relações de confiança que só

se estabelecem no longo prazo. Além disso, é preciso rastrear todo o caminho do produto ao longo

do sistema produtivo, para reduzir perdas de informação durante o processo.

Além disso, a ABIC (2015) também a reforça a tese de que é preciso estimular o consumo

de café investindo muito mais em marketing, publicidade, diferenciação e inovação de produtos.

O comportamento dos consumidores tem sido o de ampliar a experimentação e valorizar os

produtos com melhor qualidade, certificados e sustentáveis. A publicidade institucional deve servir

para orientar, educar e difundir conhecimentos sobre café e suas qualidades. Dessa forma, a

entidade desenvolveu uma campanha de marketing em 2014, investindo cerca de R$ 2,0 milhões

de seus próprios recursos, para enfatizar a importância da pureza e da qualidade, com destaque para

o Selo de Pureza. A pesquisa mostrou que 65% dos consumidores entrevistados declara que

Fonte: ABIC (2010)

Tabela 7 - Definição de Café Gourmet por Classe

Page 41: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

29

conhece o Selo de Pureza e 78% consideram o trabalho da ABIC muito importante para estimular

o consumo e a qualidade do café. Outro foco de difusão de conhecimento da ABIC a elaboração

de iniciativas que destaquem os atributos do café e os seus benefícios para a saúde, energia e bem-

estar, de modo a criar uma relação estreita entre a vida saudável, com energia e prazer, que o

consumo de café propicia.

1.5.6 PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES

Com relação a atuação do governo brasileiro e outras associações na promoção de

exportações no setor, dois aspectos podem ser citados como relevantes para o mercado de cafés

especiais.

Através de negociações do governo brasileiro e de outros países no âmbito da Organização

Internacional do Café (ICO), foi firmado o sétimo Acordo Internacional do Café (AIC) que prevê

incentivo à qualidade dos grãos nos países produtores, a expansão sustentável da cultura, e

instrumentos de crédito diferenciados para o setor. Segundo a ICO, entidade que representa o setor

mundialmente, o acordo busca promover a cafeicultura sustentável (BRASIL GOV, 2015).

Além disso, cabe destaque da Agência de Promoção de Exportações (APEX) em conjunto

com a Brazil Specialty Coffee Association (BSCA) para uma maior difusão e divulgação dos cafés

especiais brasileiros. A participação em feiras internacionais pode ser destacada como uma das

formas de divulgação das entidades. Por meio do projeto setorial Brazilian Specialty and

Sustainable Coffees, parceria APEX e BSCA, foi levado a nova imagem promocional do País e os

melhores grãos produzidos pelos cafeicultores brasileiros à SCAE World of Coffee 2015,

considerado o principal evento de cafés especiais da Europa, ocorreu em Gotemburgo, na Suécia,

de 16 a 18 de junho. Em um estande estrategicamente montado para evidenciar a imagem de

sustentabilidade, sofisticação e futuro da cafeicultura brasileira, foi exposto o respeito a questões

ambientais, sociais e econômicas através das imagens do novo posicionamento de branding “Brazil.

The Coffee Nation”. Além disso, foram oferecidos cafés especiais brasileiros, preparados em filtro

e em máquina de expresso, originários de diversas regiões produtoras do País. Durante o evento, o

setor de cafés especiais brasileiro realizou aproximadamente 10,7 milhões de dólares em negócios,

havendo expectativa de que outros 31,5 milhões de dólares fossem concretizados através dos

contatos realizados. Os participantes do evento reportaram receber muitos elogios pela nova forma

Page 42: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

30

de apresentação dos cafés especiais sendo que o estande esteve lotado durante todo o tempo. De

acordo com os participantes, os valores de negócios fechados e a concretizar demonstram que os

europeus sempre primaram pela qualidade da bebida, e sabem que o Brasil, a nação do café, possui

o que desejam para suprir essa busca pela excelência (APEX, 2015).

Page 43: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

31

2. REVISÃO DE LITERATURA

Neste capítulo serão abordadas as proposições teóricas comportamentais que procuram

explicar o fenômeno da internacionalização de empresas. Mais precisamente, serão expostas e

discutidas o Modelo de Uppsala, a teoria de Redes, a teoria de Empreendedorismo Internacional,

aí incluída a perspectiva Born Global, e a abordagem de Effectuation.

2.1 MODELO DE UPPSALA (1977)

A teoria desenvolvida pela escola de Uppsala representa um marco para as teorias de

internacionalização de empresa, pois apresenta uma modelagem teórica simples, mas de

importantes conclusões para o entendimento do processo de internacionalização da firma, sendo

evidenciada em diversos estudos empíricos até os dias de hoje. De forma resumida, o modelo

descreve esse processo como sendo uma sequência de decisões incrementais de comprometimento,

em que o acúmulo de conhecimento sobre diferentes aspectos do mercado no exterior entra como

variável chave para explicar a atitude incremental. Além disso, é curioso observar que o processo

de tomada de decisão não estaria ligado com um direcionamento estratégico claro da empresa, mas

sim como um processo natural de respostas a oportunidades e desafios que surgem a partir da

interação firma-mercado. Para compreender a relevância do modelo de maneira mais completa, e

as conclusões descritas anteriormente, é preciso que seja explicitado a formalização teórica do

mesmo, realizada por Johanson e Vahlne (1977).

No presente estudo de caso, o modelo será utilizado como forma de iniciar as discussões

das teorias de internacionalização com viés comportamental. A partir do modelo, diversos estudos

e discussões foram geradas que contribuíram inclusive para futuras revisões do próprio modelo.

Sendo assim, considerar a configuração original do modelo é interessante para ter um ponto de

partida e analisar cronologicamente as mudanças nas abordagens teóricas que serão utilizadas para

analisar o caso em questão.

O modelo desenvolvido pelos autores foi inspirado em evidências empíricas de estudos

anteriores, principalmente a partir de estudos na área de negócios internacionais realizados na

universidade de Uppsala. Tais estudos apontaram que as empresas suecas estudadas desenvolveram

suas atividades internacionais através de pequenos passos ao longo do tempo, ao invés de

investimentos pontuais consideráveis. Além disso, o estabelecimento dessas firmas em novos

Page 44: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

32

países apresentou um comportamento alinhado com o conceito de distância psíquica entre país de

origem e o hospedeiro. O conceito de distância psíquica é definido como soma de fatores que

previnem o fluxo de informação de e para um mercado, como por exemplo: diferenças culturais,

educação, linguagem, etc. (JOHANSON e VAHLNE, 1977)

Os autores (JOHANSON e VAHLNE, 1977) buscam traçar uma explicação formal para o

padrão de internacionalização observado nos estudos. Para tal, buscaram o suporte teórico em

outros autores.

A empresa não teria uma visão de alocação ótima de recursos como uma base para a tomada

de decisão. O processo de internacionalização seria um conjunto de decisões incrementais em

resposta a mudanças provenientes da interação entre firma e o ambiente em que atua (JOHANSON

e VAHLNE, 1977). Tais mudanças promovem o aparecimento de novas oportunidades e desafios,

e, sendo tais questões consideradas de caráter único e associadas ao contexto evidenciado, as

soluções a serem implementadas estariam próximas a área do problema em questão (CYERT e

MARCH, 1963).

A questão do conhecimento entra como ponto chave no desenvolvimento da teoria, pois a

dificuldade de acesso a informações voltadas às operações internacionais representaria uma

barreira à atuação de empresas no exterior. A dificuldade do acesso a informações, por exemplo,

aspectos específicos ligados à operação e cultura local, são fontes de incertezas para as empresas

que desejam operar internacionalmente, o que explicaria consideravelmente o caráter incremental

do processo de internacionalização. O conjunto de informações específicas ligadas à atuação da

firma no mercado do país hospedeiro, e informações desse mercado é definido como conhecimento

de mercado (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

Assume-se que a firma tem como objetivo a maximização do seu lucro de longo prazo, que

é tido como equivalente ao seu crescimento (WILLIAMSON, 1966). Por fim, Johanson e Vahlne

(1977) optam pela construção de um modelo dinâmico, pois acreditam que o processo de tomada

de decisão da firma é afetado por decisões passadas tomadas pela mesma.

Page 45: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

33

A partir de tal suporte teórico, o modelo elaborado (JOHANSON e VAHLNE, 1977) é

composto por dois conjuntos de variáveis que interagem entre si. As variáveis de estado são

comprometimento de mercado e conhecimento de mercado. As variáveis de mudança são atividade

correntes e decisão de comprometimento de recursos. Uma estrutura conceitual do modelo pode

ser observada a seguir (Figura 2).

A seguir, cada uma das variáveis do modelo é explicada para permitir o entendimento da

mecânica do modelo.

O conceito de comprometimento de mercado envolve dois aspectos.

O primeiro possui um caráter mais direto referindo-se à quantidade de investimento

comprometido, ou seja, recursos financeiros, humanos, de marketing, etc. Quanto maior a

quantidade de recursos investidos em um mercado no exterior, maior será o nível de

comprometimento com esse mercado (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

O segundo envolve certo aspecto de "liquidez" do investimento realizado, pois a qualquer

instante do tempo a firma poderia escolher realocar os recursos de uma atividade A para uma

atividade B. Quanto maior for a dificuldade de transferência de recursos de uma atividade A para

uma B, maior será considerado o grau de comprometimento da empresa. A dificuldade de uma

realocação eficiente desses recursos está intimamente relacionada ao grau de especialização que

Fonte: Adaptado de Johanson e Vahlne (1977), p. 26

Figura 2 - Modelo de Uppsala Traduzido

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34

esses teriam para a atividade em questão. Além disso, cabe ressaltar que mesmo após a realocação

e possível adaptação, não há garantia de que esses recursos seriam rentáveis, e tal incerteza

contribui para aumentar o grau de comprometimento da empresa com determinado mercado

(JOHANSON e VAHLNE, 1977).

A relevância do nível de comprometimento com determinado mercado estrangeiro reside

no fato de que o mesmo afetaria a percepção de oportunidades e de exposição ao risco da empresa

(JOHANSON e VAHLNE, 1977).

Conhecimento de mercado é uma das principais variáveis considerada no modelo de

Johanson e Vahlne (1977). Esse conhecimento funcionaria como um gatilho, pois a descoberta de

novas oportunidades e desafios poderia iniciar um processo de tomada de decisão. Além disso, o

conhecimento também serviria como um meio de avaliar suas alternativas, visto que informações

sobre mercado e atividades da firma serviriam como base para mapear as opções estratégicas de

atuação nesse mercado.

O termo conhecimento por si só possuí um caráter amplo, sendo assim os autores utilizam

uma classificação do conhecimento definida por Penrose (1966). De acordo com essa autora, o

conhecimento é dividido em dois: objetivo, e experiencial. Essencialmente, o conhecimento

objetivo seria aquele relacionado a uma maior facilidade de transmissão entre agentes, ou seja,

poderia ser ensinado. Já o conhecimento experiencial estaria mais ligado a questões específicas da

experiência do agente, o que dificultaria o processo de transmissão desse aprendizado.

A relevância dessa separação está relacionada à importância que o modelo de Johanson e

Vahlne (1977) dá à questão do conhecimento experiencial. A dificuldade da aquisição de tal

conhecimento, e por ser um processo de aquisição gradual, ajuda a entender a razão para diferentes

percepções de risco ao longo do tempo, e para o mapeamento de alternativas, visto que esse

conhecimento seria um poderoso diferencial na forma de abordagem do problema de acordo com

o agente tomador de decisão.

Além disso, considerando o conhecimento sobre um mercado em determinado país (hábitos

de consumo, cultura, idioma etc.) como uma forma de recurso do agente, há uma clara relação entre

conhecimento de mercado e nível de comprometimento de recursos. Quanto maior o conhecimento

de mercado, principalmente no tipo de conhecimento experiencial, maior será o nível de

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35

comprometimento da firma com esse mercado visto a dificuldade de transferência desse recurso

para usos alternativos, além de seu próprio valor absoluto em si (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

A, denominada pelos autores, “atividades correntes” é uma das variáveis de mudança, e

possui dois aspectos relevantes na sua avaliação.

Existe um certo “lag” entre as atividades correntes da empresa e seu impacto para certos

resultados da firma. Sendo assim, quanto maior for o “lag” que a empresa está incorrendo, maior

será o nível de comprometimento da empresa com o mercado no exterior (JOHANSON e

VAHLNE, 1977).

Além disso, as atividades correntes da firma são uma fonte direta de experiência, estando

relacionado à construção de conhecimento de mercado. Os autores (JOHANSON e VAHLNE,

1977) subdividem experiência como forma de explorar melhor a questão. A experiência da firma

estaria relacionada ao aprendizado de seu processo e operação, estando associada a um aprendizado

interno dos agentes que nela trabalham. Experiência de mercado seria aquela relacionada ao

aprendizado de aspectos específicos do mercado em que a empresa opera. Este segundo aspecto

serve de explicação para atitudes adotadas como a aquisição de empresas locais no país hospedeiro,

e de contratação de agentes locais, pois seriam uma forma de acesso mais rápido e direto de

experiência de mercado. Apesar disso, experiência de mercado não é o único aspecto relevante para

a empresa na atuação em outros países, experiência da firma também seria um fator crucial para

uma maior eficiência, ou seja, esses dois aspectos da experiência devem interagir

harmoniosamente, e são igualmente importantes para o processo de internacionalização da firma.

Por fim, a descrição da decisão de comprometimento de recursos serve como forma de

consolidar os aspectos do modelo levantados anteriormente. Para entender tal decisão, é necessário

compreender de que forma as alternativas para a tomada de decisão seriam levantadas, e de que

forma o agente tomador de decisão as escolheria (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

Com relação ao primeiro aspecto, as alternativas são mapeadas a partir do conhecimento

acumulado pelo agente, principalmente aquele ligado ao aspecto experiencial, razão pela qual,

segundo os proponentes do modelo, cada agente observa um conjunto de alternativas único. Além

disso, possivelmente o tomador de decisão seria alguém ligado mais diretamente a área de

Page 48: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

36

operações da firma, pois ele estaria exposto diretamente ao aprendizado proveniente da experiência

da empresa, e da experiência de mercado (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

Visto que a parte de operações da firma estaria mais em contato com o mercado, possíveis

oportunidades e desafios também seriam identificados por esse setor. Sendo assim, a partir do

argumento de Cyert e March (1963) sobre as soluções a serem implementadas estarem próximas a

área do problema em questão, Johanson e Vahlne (1977) concluem que as alternativas mapeadas

estarão relacionadas às atividades correntes da firma, ou seja, a escala das operações.

Para avaliar a forma como o agente escolhe entre as diferentes alternativas é necessário

levar em consideração dois efeitos associados com a decisão de comprometimento de recursos.

Um efeito econômico estaria relacionado com o aumento de escala das operações da firma. Além

disso, seria necessário avaliar o efeito da incerteza, que é determinado pelas percepções do agente

tomador de decisão. Cabe ressaltar que o nível de incerteza é reduzido pelo aumento de interação

entre a firma e o mercado. A interação entre essas variáveis é demonstrada pelo framework a seguir.

R* = Risco máximo tolerado (em um mercado i) = f (nível de recursos, curva de risco)

R = Atual nível de exposição ao Risco = Ci * U

Ci = Atual nível de comprometimento de recursos ; R = Incerteza de mercado

A partir do framework construído por Johanson e Vahlne (1977), algumas ilações podem

ser feitas para um melhor entendimento da mecânica do modelo.

De acordo com os autores, decisões de aumento da escala das operações serão realizadas

enquanto a atual situação de exposição ao risco da empresa estiver abaixo do máximo tolerável

pela mesma. Isso pode ocorrer por um aumento no nível máximo de risco tolerável pela firma (ex:

aumento de recursos totais da firma, postura mais agressiva de investimento) ou por uma redução

do nível de incerteza sobre o mercado (ex: experiência adquirida pela interação firma-mercado,

medidas governamentais de estabilização etc.) (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

De um ponto de vista global, o caráter incremental do modelo pode ser observado a partir

daí, pois cada nova decisão de comprometimento teria por base uma situação e uma percepção de

risco em um determinado instante do tempo. Ou seja, uma decisão em “T-1” de comprometimento

aproximaria a empresa da sua fronteira de exposição máxima tolerável ao risco. Uma decisão de

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37

aumento de comprometimento estimularia a interação entre firma-mercado, o que gera experiência

e conhecimento de mercado. Sendo assim, as percepções de incerteza e risco de mercado são

modificadas, levando a uma nova situação de exposição ao risco da empresa em t, e a uma nova

decisão de comprometimento (JOHANSON e VAHLNE, 1977).

Por fim, Johanson e Vahlne (1977) argumentam que a firma fugiria desse processo

incremental de comprometimento em três situações. Quando o nível de recursos da firma é

suficientemente alto, o que resultaria em um nível de exposição máximo ao risco elevado (R* alto).

Quando os mercados são estáveis e homogêneos, pois a experiência não seria um fator fundamental

para a atuação da firma no mercado e, por último, quando a empresa já atua em mercados com

características de muito similares do mercado para o qual ela quer se expandir.

2.1.1 CRÍTICAS A UPPSALA

O modelo de Uppsala ganhou muito espaço entre aqueles que estudam a internacionalização

das empresas, pois é um modelo elegante que combina poucas variáveis com uma grande

capacidade explicativa. Apesar disso, a partir de estudos de casos realizados e da análise de

premissas do modelo, diferentes autores fizeram observações acerca da lógica do modelo e de sua

aplicabilidade. Tais críticas serão úteis para o desenvolvimento de novos arcabouços teóricos assim

como futuras revisões do modelo original de Uppsala.

Uma das críticas defende que o modelo seria muito determinístico (REID, 1983;

TURNBULL, 1987; ROSSON, 1987), pois os estágios considerados no modelo seriam uma ordem

que necessariamente a empresas deveria passar. O argumento utilizado para sustentar tal crítica

seria de que a firma poderia optar por diferentes estratégias acerca do modo de entrada e expansão

no mercado. Reid (1983) argumenta que tal escolha dependeria das contingências associadas com

as condições do mercado em questão, e que o método de análise via custos de transação seria um

modelo processual melhor para explicar a diversidade e variações nos comportamentos da firma

durante o processo de internacionalização. De acordo com Johanson e Vahlne (1990), o argumento

é bem plausível, mas não seria necessariamente uma crítica que invalidaria o modelo de Uppsala,

mas que, sim, serviria como base para desenvolvimento e diferenciação do modelo.

Forsgren (1989) argumenta que o modelo teria mais relevância ao analisar as fases iniciais

de internacionalização da empresa em que conhecimento de mercado e recursos seriam fatores

Page 50: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

38

limitadores para a mesma. Sendo assim, quando a firma que já tivesse atividade em vários países

e tais fatores não fossem mais limitadores, esta poderia adotar uma estratégia de alocação de

recursos baseada em informações sobre o mercado ao invés de uma resposta ao desconhecido. Tal

crítica estaria consistente com o suporte empírico utilizado no desenvolvimento do modelo, pois

seriam empresas que se encontravam em fases iniciais do processo de internacionalização.

Nordstrom (1990), por sua vez, argumenta que o mundo como um todo estaria ficando mais

homogêneo e, consequentemente, a distância psíquica estaria se reduzindo. Sendo assim, novas

empresas estariam dispostas a entrar em mercados maiores mais cedo, o que faria com que a

distância psíquica perdesse poder explanatório no processo de internacionalização dessas

empresas. Além disso, outro aspecto que entraria na questão de mercados mais homogêneos seriam

as mudanças ambientais que modificam o contexto para internacionalização das empresas. Dentre

essas mudanças, é possível destacar os avanços na área de suprimentos, meios de comunicação

mais eficientes, mercados menos fragmentados, e aumento da ênfase em P&D (NORDSTROM e

VAHLNE, 1985).

Outra crítica seria que o modelo não levaria em consideração aspectos relacionados a

interdependência de mercados entre países (JOHANSON e MATTSSON, 1986). Tal crítica

apontaria um problema conceitual e um explanatório para modelo. Do ponto de vista conceitual, a

caracterização do nível de internacionalização da firma seria diferente ao considerar atuação em

mercados tido como distintos ou interdependentes, pois em casos de mercados interdependentes

seria razoável considerar a firma mais internacionalizada. Do ponto de vista explanatório, a

interdependência entre mercados impactaria de maneira considerável o processo de

internacionalização da firma

Outros estudos apontariam que o modelo de internacionalização proposto não seria válido

para a indústria de serviços. Um exemplo disso, seria um estudo de internacionalização baseado

em bancos suíços que sugere que o estabelecimento de subsidiárias no exterior não seria governado

por distância cultural (ENGWALL e WALLENSTAL, 1988). Contudo, o estudo de Tschoegl

(1982) acerca da entrada de bancos no Japão e na Califórnia apontou que o processo observado

teria sido incremental.

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39

Forsgren (2002) seguiu uma linha um pouco diferente ao considerar o modelo de Uppsala.

Ao invés de tentar testar o nível de aplicabilidade do modelo em casos reais e o processo descrito

de internacionalização, o autor tentou estabelecer críticas construtivas acerca de certas premissas

do modelo. O foco de sua análise foi principalmente a questão das formas de aprendizado e como

elas impactariam na percepção de incerteza sobre o mercado, nas decisões de comprometimento, e

na estrutura organizacional da empresa.

O autor argumenta que o modelo original de Uppsala teria um foco muito grande na questão

da experiência pessoal do agente e o caráter reacionário da tomada de decisão. Ao considerar isso,

o modelo negligencia o impacto no processo de internacionalização que outras formas de

aprendizado teriam, como: imitação do concorrente, incorporação de outras pessoas e

organizações, e a busca proativa de novas informações e soluções para os desafios encontrados.

Além disso, o próprio acúmulo de conhecimento através da questão experiencial apresentaria seus

problemas. O modelo supõe que as pessoas presentes nos ramos mais periféricos das organizações

seriam responsáveis pelas operações locais no exterior. Contudo, ao considerar a estrutura

organizacional de forma menos rígida, seria válido o questionamento acerca que qual agente seria

responsável pela interpretação do aprendizado e de quais preferências influenciariam os rumos da

organização, pois nesse cenário haveria a possibilidade que grupos/indivíduos dentro da

organização tivessem diferentes interesses. Outro aspecto seria o problema da permanência do

agente acumulador de conhecimento na empresa, pois o modelo implicitamente supões que haveria

a estabilidade do agente na firma (FORSGREN , 2002).

2.2 TEORIA DE REDES

Proposta por Johanson e Mattsson (1988), a teoria de redes suscitou uma nova forma de

avaliar o processo de internacionalização das empresas, pois cada firma avaliaria suas opções não

somente pelos recursos que detêm, mas também pelas oportunidades e vantagens provenientes dos

relacionamentos que a empresa constrói, sejam estes na rede em que a empresa atua ou pretende

atuar. O segundo aspecto representa o caráter inovador da abordagem para o processo de

internacionalização da firma, pois o processo de tomada de decisão assumiria um caráter mais

dinâmico e interdependente, tendo por foco a dinâmica desses relacionamentos. Baseando-se na

dinâmica desses relacionamentos e na sua relevância para a firma, a teoria introduz a possibilidade

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40

de multilateralidade no processo de tomada de decisão, pois o agente passa a ter a possibilidade de

ser influenciado a internacionalizar-se a partir de decisões tomadas por outras firmas. Além disso,

a teoria de redes introduz um aspecto conceitual novo que resultaria em um aumento no nível de

internacionalização da empresa. As visões mais tradicionalmente abordadas nas teorias são

representadas pela extensão internacional (atuar em um novo mercado), e pela penetração

internacional (aumentar participação). A chamada integração internacional introduz essa nova

forma de internacionalização, sendo descrita como o fortalecimento da posição da empresa na rede

através de uma maior integração das atividades da empresa em diferentes redes nacionais. Por fim,

o mapeamento de opções para o processo de tomada de decisão da firma está vinculado não

somente ao nível de internacionalização da empresa em questão, mas também ao nível de

internacionalização da rede de produção ao qual está inserida. Para entender de forma mais

completa o processo mencionado, é necessária uma análise da teoria por trás desse modelo.

O estudo da teoria de redes servirá para considerar a relevância dos relacionamentos no

processo de internacionalização da firma, além de servir como base teórica para o surgimento de

novos arcabouços teóricos considerados relevantes para o caso.

O suporte para o desenvolvimento do modelo (JOHANSON e MATTSSON, 1988) provém

de estudos empíricos na área de marketing, especialmente marketing industrial, que apontariam

aspectos interessantes sobre a interação entre uma empresa e seus agentes.

Alguns desses estudos apontaram a existência de um relacionamento de longo prazo entre

fornecedores e clientes. Uma das razões para a existência desses relacionamentos de longo prazo

seria a necessidade do desenvolvimento de um conhecimento mútuo entre fornecedores e clientes

para a condução de negócios (ex: detalhes sobre operação). A construção desses relacionamentos

ocorreria principalmente através da experiência direta proveniente da transação entre agentes, pois

muitas questões não poderiam ser previstas no processo de negociação. Sendo assim, visto a

relevância da obtenção da experiência direta para a construção de relacionamentos, este seria um

processo que demanda tempo e esforço de ambas as partes (JOHANSON e MATTSSON, 1988).

Além disso, outro estudo de um acadêmico proeminente (WEBSTER, 1979) destacou a

importância de ir além da questão do produto ou mercado atuante para considerar o entendimento

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41

dos aspectos estratégicos para a tomada de decisão da firma. Para o autor, o foco dessa análise

estaria ligado a aspectos dos relacionamentos existentes entre comprador-vendedor.

É possível observar que as ideias propostas aparentam estar ligadas à visão mais moderna

de marketing, pois apresentam uma perspectiva mais integrada de cadeia de valor tendo por foco a

relação cliente-fornecedor.

A partir de tais estudos, os autores (JOHANSON e MATTSSON, 1988) sugerem que assim

como as firmas, as indústrias estariam estruturadas de forma similar. A indústria como um todo é

abordada, pois a existência desses relacionamentos não estaria limitada pelas fronteiras de um país.

Sendo assim, a aplicação dessa visão para as indústrias permitiria uma descrição representativa de

verdadeiras redes, sendo destacado a característica de interdependência entre os agentes nelas

atuantes.

Baseando-se na visão descrita, Johanson e Mattsson (1988) descrevem os princípios

adotados para a formulação da teoria de redes.

A abordagem de sistemas industriais como redes de relacionamento permite entender que

esse meio envolve a interação de diversas empresas presentes na cadeia de valor de um produto,

pois tais relações estariam presentes nos aspectos de produção, distribuição, e uso de bens e

serviços. Há, portanto, certa divisão de trabalho dentro desses sistemas, sendo possível observar

que a relação entre os agentes adota um caráter de interdependência. No entanto, essas relações de

dependência variam de firma a firma, pois além do caráter de interdependência mais geral da

indústria, há também relações de interdependência específicas entre firmas. A relevância desse

aspecto será abordada pelos autores (JOHANSON e MATTSSON, 1988) ao avaliar o aspecto

posicional da firma.

Para o funcionamento harmonioso desse sistema algum tipo de ordem deveria existir, e

embora não haja um coordenador central, a coordenação interna desses relacionamentos ocorre de

forma multilateral entre as empresas. É um processo de troca entre os agentes, envolvendo variáveis

que vão além da questão do preço negociado (LINDBLOM, 1977). O entendimento de um conjunto

de variáveis mais abrangente é relevante, pois há diversos tipos de fatores que ligam as firmas em

um caráter mais direto ou indireto, por exemplo: legais, econômicos, técnicos, sociais, etc. Apesar

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42

disso, em alguns casos, algum tipo de coordenação direta pode ser implementado, como é o caso

de joint ventures, consórcios, entre outros arranjos cooperativos.

Conforme destacado previamente, a questão da complementaridade é um ponto chave para

o modelo. Contudo, as relações de competição também possuem papel relevante, pois através de

um processo de negociação seria possível ter acesso a certas vantagens de suas competidoras (ex:

comércio de tecnologias, acesso a mercados, entre outros) (JOHANSON e MATTSSON, 1988).

Em uma visão de redes, a entrada em um novo mercado, ou seja, redes em que a empresa

ainda não atua, dá-se através da introdução da firma na rede em questão. Esse processo ocorre pelo

estabelecimento de relacionamentos com agentes dentre desse novo mercado, podendo incluir o

desenvolvimento de relacionamentos pré-existentes, o rompimento de alguns, e a formação de

novos. Sendo assim, as redes possuem um caráter dual de estabilidade e mudanças, pois ao mesmo

tempo relacionamentos são fortalecidos através do tempo, novos relacionamentos são criados, e

até mesmo outros são desfeitos, caracterizando um processo de mudanças cumulativo para a firma

(JOHANSON e MATTSSON, 1988).

A partir desse caráter cumulativo de relacionamentos da firma e os diferentes graus de

dependência associados a esses relacionamentos, na abordagem de redes desenvolvida por

Johanson e Mattsson (1988), o conceito de posição é definido, sendo este de suma importância para

avaliar o processo de tomada de decisão da firma.

A análise da posição da firma é baseada em dois aspectos: micro-posição e macro-posição.

A micro-posição envolve uma comparação específica da firma a uma outra, levando em conta a

importância, seu papel, e a força de relacionamento entre os agentes. A macro-posição envolve

uma comparação bem similar a micro-posição no que se refere a análise da importância e papel.

Contudo, a base de comparação para a macro-posição é da firma com a rede em questão. Além

disso, na macro-posição são identificadas todas as empresas que a firma tem algum tipo de

relacionamento direto ou indireto na rede avaliando a força desses relacionamentos (JOHANSON

e MATTSSON, 1988).

Para que seja possível abordar a relevância desse aspecto posicional, é necessário entender

de que forma investimentos são realizados em redes conforme descrito pelos autores (JOHANSON

e MATTSSON, 1988). A partir da noção de interdependência numa rede, uma premissa base do

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43

modelo é que as empresas dependem de ativos controlados por outras firmas, sendo a rede o

ambiente em que uma firma pode negociar acesso aos ativos de uma outra. Para que seja possível

tal negociação, é necessário que haja uma troca de interesses nos relacionamentos. A “moeda de

troca” nesses relacionamentos é representada por dois conjuntos de ativos: os internos da firma, e

o chamado ativo de mercado. O primeiro refere-se aos ativos provenientes do comprometimento

de recursos para criar, construir ou adquirir ativos que possam ser utilizados no futuro, podendo

tais ativos ser tangíveis ou intangíveis. Já o segundo, está relacionado a um tipo de ativo intangível

que envolve um caráter relativo da posição da firma em relação a rede em questão. O ativo de

mercado é relevante para empresa principalmente pelo aspecto descrito de macro-posição da firma,

pois ele seria fonte de poder e influência dentro da rede.

Considerando o racional de investimento em redes e da análise de posição da firma, cada

firma analisa esses aspectos no seu processo de tomada de decisão para que seja possível mapear

oportunidades e restrições, e, posteriormente, traçar estratégias alinhadas com os objetivos

individuais de cada uma delas. Tais estratégias podem assumir aspectos de complementaridade ou

de competitividade em relação as demais firmas na rede (JOHANSON e MATTSSON, 1988).

De forma resumida, o arcabouço teórico de Johanson e Mattsson (1988) baseia-se em alguns

aspectos. Os mercados são considerados como uma rede de relacionamentos entre empresas.

Mudanças e desenvolvimentos de relacionamentos na rede são cumulativos e custosos. Cada firma

possui uma posição relativa na rede, e essas posições são diretamente impactadas pelo

desenvolvimento e uso dos ativos da firma (internos, e de mercado). Nesse contexto, decisões de

marketing podem estar relacionadas ao desenvolvimento de relacionamentos, construção de novos,

e até mesmo o rompimento de alguns. Por fim, é importante ressaltar que tais decisões terão um

caráter dinâmico, pois dependem da posição da empresa em um dado instante do tempo.

Antes de prosseguir, cabe fazer uma digressão sobre as subdivisões conceituais de uma

rede, pois tal aspecto será relevante para interpretar o processo de internacionalização da empresa

descrito mais à frente.

Foi definido que redes industrias são compostas de empresas que poderiam estar presentes

em diversos países. Tendo isso em mente, os autores (JOHANSON e MATTSSON, 1988)

assumem ser possível realizar subdivisões conceituais de uma rede em questão. Os exemplos mais

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44

relevantes de subdivisões são por fronteiras nacionais, e por área de produção. Uma rede nacional

seria uma delimitação da rede baseada nas fronteiras nacionais. Uma rede de produção seria a

delimitação de redes baseada na área de produção. Um exemplo de rede de produção citada pelos

autores seria a de caminhões pesados, que é composta de empresas ligadas a produção, distribuição,

manutenção, e uso desses caminhões. É importante ressaltar que dentro desse conceito é possível

a presença de empresas de diversos países, ou seja, é possível observar dentro da rede de produção

de caminhões pesados a presença de diferentes redes nacionais de produção como a alemã, italiana,

suíça, etc.

Com relação ao processo de internacionalização, e tendo por base a teoria descrita por

Johanson e Mattsson (1988), o fenômeno ocorreria através do estabelecimento e desenvolvimento

da posição da firma em relação as demais empresas em uma rede nacional estrangeira. Já um

aumento no nível de internacionalização poderia ser interpretado como uma elevação da “força

posicional” (ativo de mercado) que a firma ocupa em diferentes redes nacionais, e o quão

importante e integradas essas posições estão. A intuição do processo descrito fica mais fácil de

entender a partir das três formas de internacionalização utilizadas no modelo, sendo estas: extensão

internacional, penetração, e integração internacional.

Extensão internacional ocorre pelo estabelecimento da posição da firma em uma rede

nacional que a empresa ainda não atua. Penetração envolve o comprometimento de recursos

voltado para redes nacionais que a firma já tenha atuação. Integração internacional está relacionado

ao aumento da coordenação e integração das posições da firma em diferentes redes nacionais. É

interessante observar que embora interpretados de uma nova forma, extensão internacional e

penetração são situações amplamente abordadas na literatura. Já o processo de integração

internacional, envolve um caráter inovador do modelo de Johanson e Mattsson (1988), pois o

aumento do nível de internacionalização seria consequência de uma atitude de maior integração

das atividades internas da empresa em diferentes países.

Além do caráter de internacionalização da firma, o modelo de Johanson e Mattsson (1988)

permite considerar a internacionalização da rede em si. Para tal avaliação, é interessante avaliar a

diferença entre um maior nível de internacionalização da rede de produção com o de uma rede

nacional.

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45

Uma maior internacionalização de uma dada rede de produção refere-se a uma maior

integração das seções nacionais da rede de produção global em questão. No segundo caso, uma

maior internacionalização das redes nacionais refere-se a um aumento na integração entre

diferentes redes nacionais. Essa diferenciação é interessante, pois ao comparar um país A com um

país B, e tendo como base uma mesma rede de produção global, poderia ser observado diferentes

graus de internacionalização de suas redes de produção, o que, potencialmente, implicaria em

diferentes cenários estratégicos para empresas desses países que almejam internacionalizar-se.

Além disso, ao comparar redes nacionais em conjunto, por exemplo de um país C com um D, e de

um país C com um E, poderia ser evidenciado diferentes graus de internacionalização de suas redes

nacionais, o que poderia ser justificado pela existência de acordos comerciais entre os países em

questão (JOHANSON e MATTSSON, 1988).

Ao considerar o nível de internacionalização da firma e de sua rede de produção referente,

Johanson e Mattsson (1988) descrevem 4 cenários que trazem diferentes impactos nas decisões

estratégicas da firma ao internacionalizar-se levando em consideração as 3 modalidades de

internacionalização descritas no modelo (Figura 3).

Figura 3 - Internacionalização e o Modelo de Redes: Situações para Análise

Fonte: Adaptado de Johanson e Mattsson (1977), p. 26

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46

No cenário das “Early Starters”, as firmas possuem poucos e/ou irrelevantes

relacionamentos com firmas em outros países (baixo grau de internacionalização do mercado).

Além disso, outros agentes da rede de produção nacional não possuem relações internacionais

significativas (baixa internacionalização da rede de produção). Em tal situação, a firma não possui

conhecimentos sobre mercados no exterior e não pode contar com os relacionamentos existentes

no mercado nacional para obter tal conhecimento. Visto a necessidade de obtenção de

conhecimento para atuação em outros mercados, a empresa poderia optar por estratégias que

envolvam a aquisição de conhecimento direto e/ou construção de conhecimento próprio. Em tal

situação, a detenção de recursos possui papel relevante para a estratégia da firma. Em estudos

empíricos citados por Johanson e Mattsson (1988), observa-se que as firmas internacionalizam para

mercados mais próximos utilizando mais agentes do que subsidiárias. Tal atitude pode ser avaliada

como uma tentativa de reduzir a necessidade de construção de conhecimento, minimização da

necessidade de ajuste de recursos, e utilização de agentes que possuam posição estabelecida na

rede para sobrepor barreiras como a necessidade da construção de confiança. Além disso, as firmas

podem optar pela estratégia de investimentos “greenfield” no país que embora não tragam as

vantagens citadas, poderiam fortalecer a construção de conhecimento e possibilidades de maior

penetração em tais mercados no longo prazo. Por fim, a extensão internacional para outros países

tende a seguir aspectos relacionados a distância psíquica entre os países que a empresa já atua, e

possui relacionamentos passíveis de serem explorados (JOHANSON e MATTSSON, 1988).

Conforme a empresa aumenta seu grau de internacionalização ela passa de uma “Early

Starter” para uma “Lonely International”. Nesse cenário, levando em consideração a atuação da

empresa em diversos países, esta já teria acumulado conhecimento e expertise para lidar com

diferentes tipos de cultura, estruturas institucionais, mão-de-obra, etc. Além disso, possivelmente

já teria um controle mais preciso relacionado ao ajuste de recursos necessário para a atuação em

novos mercados. Sendo assim, já possuiria um conjunto de ferramentas disponíveis para lidar com

situações adversas de mercado, o que potencialmente reduziria a influência da necessidade de

existir similaridades entre mercados ao avaliar possíveis decisões de extensão internacional. Vale

ressaltar que é a combinação de ativos da firma com ativos de mercado (aspecto posicional) que

constroem o repertório de ferramentas disponíveis. Ao avaliar a firma com a rede de produção, as

decisões voltadas a questões de internacionalização seriam originadas majoritariamente pela firma

visto o baixo nível de internacionalização da rede de produção. Sendo assim, a firma

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47

internacionalizada poderia inclusive ser um agente promotor de internacionalização de sua rede de

produção. Além disso, a atuação em diversas redes nacionais, e a potencial dificuldade originada

pela baixa internacionalização da rede de produção, contribuem para aumentar a importância de

haver uma maior integração internacional das atividades da empresa (JOHANSON e MATTSSON,

1988).

No caso da “Late Starter”, a rede de produção já está altamente internacionalizada

(consumidores, clientes e competidores) e, embora a firma possua um baixo grau de

internacionalização, ela já possuiria relações indiretas com outras redes nacionais em função de

relacionamentos que agentes da rede nacional possuem. Em tal contexto, a firma poderia ser

impulsionada a internalizar-se por agentes na sua rede de produção e, levando em consideração a

utilização de conhecimentos que a rede de produção possuiria acerca da atuação em outros

mercados nacionais (rede altamente internacionalizada), a firma poderia adotar uma estratégia mais

agressiva no processo de internacionalização. Apesar disso, o alto nível de internacionalização da

rede de produção traria desafios a empresa, pois o ambiente competitivo seria mais agressivo.

Sendo assim, a coordenação assume um papel importante para que a firma consiga possa manter-

se competitiva frente a suas competidoras. Tal necessidade contribuiria para que a firma adote uma

estratégia mais agressiva e decida por estabelecer uma subsidiária mais rapidamente. Por fim, é

curioso observar o dilema enfrentado pela firma ao comparar uma “Early Starter” com um “Late

Starter”. No primeiro caso, há um ambiente competitivo menos agressivo e a possibilidade de

vantagens por ser uma pioneira, contudo haveria necessidade de gastos para geração de

conhecimento e construção de confiança com outros agentes. No segundo caso, a questão do

conhecimento e confiança poderia ser amenizado por relacionamentos prévios da rede, contudo o

ambiente competitivo mais agressivo e um mercado mais dinâmico seriam desafios que a empresa

enfrentaria, e impactariam nas decisões estratégicas a serem tomadas (JOHANSON e

MATTSSON, 1988).

Por fim, em um cenário de “International Among Others” a firma e sua rede de produção

estariam altamente internacionalizadas. Nesse contexto, a questão da integração internacional

ganha um papel ainda mais proeminente para mudanças na dinâmica competitiva da empresa na

rede de produção, pois novas extensões internacionais e uma maior penetração não provocariam

mudanças significativamente impactantes para posição da firma na rede de produção. Sendo assim,

Page 60: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

48

uma maior integração internacional poderia trazer mudanças mais significativas para a posição da

firma. No entanto, a firma poderia utilizar sua posição em diferentes redes nacionais como ponte

entre mercados com intuito de aumentar sua penetração ou realizar novas extensões. Um exemplo

disso poderia ser observado ao comparar uma “Early Starter” com uma “International Among

Others” na questão produtiva, pois enquanto no primeiro caso uma decisão por produção local

poderia ser resultado da necessidade de ajuste a demandas específicas do mercado local, no

segundo caso a firma poderia utilizar a produção em uma rede nacional como um excedente a ser

vendido em um outro mercado nacional. Além disso, as diferentes posições que a firma possuiria

em diferentes redes nacionais, e uma integração internacional eficiente, dão espaço para decisões

estratégicas que permitem uma certa “externalização”, ou seja, a firma poderia optar por

subcontratar certos aspectos relacionados a sua operação ou produção, por exemplo. Em tal cenário,

aspectos relacionados a similaridades de mercado e construção de conhecimento teriam menor

poder explicativo para as decisões estratégicas da empresa. Nesse caso, as forças impulsionadoras

e possíveis restrições à estratégia da firma estariam relacionadas a utilização de sua posição em

diferentes redes nacionais. Por fim, ao comparar a firma com seus competidores, ambos seriam

altamente internacionalizados o que contribuiria para que mudanças mais transformadoras da

posição da firma na rede sejam em função de joint-ventures, aquisições ou fusões (JOHANSON e

MATTSSON, 1988).

2.3 UPPSALA REVISITADO – TEORIA DE REDES

Os artigos de Johanson e Vahlne (2003; 2009) representam uma revisão do modelo original

de Uppsala com foco no conhecimento desenvolvido pela teoria de redes. Antes de prosseguir,

cabe destacar o porquê da revisão realizada pelos autores. Desde a formulação original do modelo

de Uppsala em 1977, o ambiente regulatório e econômico modificou drasticamente provocando

mudanças tanto no comportamento quanto no contexto analisado para o processo de

internacionalização das empresas. Adicionalmente, diversos conceitos e novas abordagens foram

desenvolvidas com intuito de explicar novos fenômenos observados em internacionalização. Sendo

assim, inspirados nessas novas idéias os autores decidiram reestruturar seu modelo com intuito de

incluir novas abordagens que acreditavam explicar de forma melhor o processo de

internacionalização das empresas.

Page 61: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

49

O estudo de Uppsala revisitado (2003) é interessante, pois serve de exemplo em como

teorias desenvolvidas pós formulação do modelo original podem ser assimiladas com este. Tal

assimilação enriquece o poder explicativo do modelo e ao mesmo tempo evidencia que muitas das

propriedades originais do modelo se mantém, mas sob uma nova ótica.

Para avaliar as mudanças que o pensamento em rede traz, inicialmente Johanson e Vahlne

(2003) clarificam o conceito de redes que utilizarão em seus estudos. Eles utilizam a definição

trazida por Anderson et al. (1994) de que redes de negócio são um conjunto de relacionamentos de

negócios interconectados, em que a troca existente em cada relacionamento dá-se a partir de um

pensamento de que firmas são atores coletivos. Com base nessa definição, antes de iniciar a

discussão é importante destacar a principal mudança de pensamento que a noção de redes traz, e

que vai nortear todos os outros aspectos do modelo a serem revistos. Na perspectiva de redes, os

problemas de entrada não estarão mais associados com noção de entrada em novos mercados

nacionais, mas sim com desenvolvimento de relacionamentos com clientes e fornecedores

específicos. Sendo assim, perde-se o sentido de considerar como diferentes os problemas de entrada

e expansão em um mercado, pois passam a ser o mesmo. O foco da discussão passa a ser o problema

gerencial associado com o desenvolvimento de relacionamentos com clientes e fornecedores. Em

outras palavras, internacionalização em uma visão de redes passa a ser uma expansão da empresa

tendo como base seus relacionamentos, não sendo afetada pela questão das fronteiras dos países.

A partir dessa nova abordagem do problema, as mudanças trazidas serão apresentadas a seguir e

comparadas com o modelo de Uppsala original (JOHANSON e VAHLNE, 2003).

Com relação ao comprometimento e a aprendizagem, cabe destacar que embora fronteiras

nacionais tornem-se irrelevantes o processo de internacionalização continua sendo uma questão de

interação entre o desenvolvimento de conhecimento e de comprometimento. A diferença é que

essas variáveis não levam em consideração países, mas sim os relacionamentos que a firma possui

e que potencialmente poderia desenvolver. Durante o desenvolvimento do relacionamento, a firma

gradativamente compromete recursos (financeiros, capital humano, tempo, etc.) e aprende acerca

de variáveis associadas ao parceiro em questão, e de outros aspectos aplicáveis a outros

relacionamentos. Os aprendizados envolvidos nessa interação podem ser separados em três tipos

(JOHANSON e VAHLNE, 2003).

Page 62: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

50

Ao lidar com um agente específico é possível aprender peculiaridades do agente em

questão, pois é observa-se as formas que o agente reage a certos tipos de ações, os papéis de cada

um dos indivíduos atuantes na empresa, e o grau de adaptabilidade do agente a cenários diversos.

Sendo assim, é possível que tais informações permitam estabelecer uma coordenação de atividades

mais eficiente entre os agentes, resultando em um desenvolvimento desse relacionamento e um

aumento no grau de comprometimento neste (JOHANSON e VAHLNE, 2003).

Outra forma de aprendizado está relacionada ao desenvolvimento de habilidades adquiridas

ao interagir no relacionamento, e que poderiam ser transferidas para outros relacionamentos. Esse

tipo de aprendizado serviria como base para estabelecer novas parcerias e desenvolver outras

existentes, pois tal aprendizado envolve um aspecto de acúmulo de experiência em se relacionar.

Sendo assim, esse aprendizado é extremamente útil particularmente em casos de similaridade entre

agentes tendo em vista questões como tamanho da firma, tecnologia, e contexto cultural e político

(JOHANSON e VAHLNE, 2003).

Por fim, ao interagir em um dado relacionamento, a firma é capaz de aprender formas mais

eficientes de coordenar atividades, do relacionamento em questão, com outras atividades de outros

relacionamentos que a firma possui. Um exemplo da aplicação desse aprendizado seria na

coordenação de fornecedores múltiplos como em casos de entregas “just-in-time”. Além disso,

outro importante exemplo de aplicação dessa coordenação seria a firma assumindo um papel de

"ponte" ao considerar a ligação entre os fornecedores da firma e seus clientes, pois tal coordenação

permite uma maior agilidade no processo (JOHANSON e VAHLNE, 2003).

A partir do conhecimento adquirido a empresa aprende a construir, desenvolver e conectar

suas redes de negócio frente aos desafios encontrados (JOHANSON e VAHLNE, 2003).

Ao considerar o desenvolvimento de relacionamentos, Johanson e Vahlne (2009) destacam

a importância da variável emocional confiança, pois embora possa ser entendida de forma implícita

na aprendizagem torná-la explícita é justificável. A decisão de incluir tal variável envolve três

aspectos essencialmente. Primeiro, há uma literatura considerável sobre a relevância de variáveis

como capital social, confiança, e conceitos similares, levando em consideração a presença de

elementos afetivos e cognitivos nestas. Segundo, a partir de estudos empíricos foi possível observar

a importância que dimensões afetivas exercem no entendimento dos relacionamentos. Por fim,

Page 63: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

51

confiança foi tida como uma variável importante no desenvolvimento de relacionamentos e em

redes de negócio. Com relação a sua relevância para o modelo de maneira mais prática, alguns

exemplos podem ser destacados. Confiança pode exercer um papel substituto ao conhecimento,

como em casos de empresas que não possuem conhecimento suficiente acerca de um mercado e

optam por confiar em um agente para a condução de seus negócios. Confiança também seria um

pré-requisito para o comprometimento visto que a existência de boa vontade e boas intenções entre

agentes fortalece o relacionamento. Além disso, confiança serve como uma forma de persuadir

agentes a compartilharem informações sendo útil principalmente nas fases iniciais do

desenvolvimento de um relacionamento.

Ao considerar a atuação em diferentes redes, alguns aspectos devem ser levados em

consideração, pois seriam desafios para o desenvolvimento de relacionamentos. A falta de

conhecimento institucional sobre um determinado mercado, ou seja, suas leis, regras, língua, etc.,

dificulta a atuação da empresa criando uma certa barreira que pode ser entendida como uma

distância psíquica, sendo caracterizada pelos autores como um risco de ser um forasteiro ao

mercado (liability of foreignness). Além disso, a falta de conhecimento sobre a condução de

negócios no mercado também seria uma barreira, pois é importante entender as formas como as

empresas se relacionam naquele mercado, e como as redes de relacionamento estariam estruturadas

(liability of outsidership) (JOHANSON e VAHLNE, 2009).

Com relação ao desenvolvimento de oportunidades, Johanson e Vahlne (2009) permanecem

com a ideia de que tal esse processo é uma interação entre conhecimento e comprometimento.

Considerando uma visão de redes, são nestas que as firmas conseguem ter acesso a informações

privilegiadas acerca dos recursos, relacionamentos e outras redes de negócio que empresas

possuem. Sendo assim, a partir das interações entre os parceiros na rede relacionamentos são

desenvolvidos criando conhecimento, gerando confiança, e aumentando o nível de

comprometimento entre os agentes. Partindo do pressuposto da existência de uma forma básica de

alerta empreendedor, a criação desse conhecimento pode eclodir no desenvolvimento de

oportunidades visto que a geração desse conhecimento possui caráter único, pois foi possível

somente através do relacionamento. Cabe ressaltar que o reconhecimento de oportunidades pode

assumir um papel unilateral, quando um dos agentes ao conhecer aspectos de um outro agente

reconhece uma oportunidade, pode ser bilateral, quando em interação há a identificação conjunta

Page 64: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

52

da oportunidade, e até mesmo multilateral, quando a interação conjunta de diversas firmas gera a

identificação da oportunidade.

A partir de tais suposições, não há uma maneira prática de estabelecer quais países a

empresa escolhe expandir-se primeiro, pois barreiras específicas a um país não existem. Além

disso, a visão original do modelo de Uppsala (JOHANSON e VAHLNE, 1977) acerca da evolução

sequencialista das operações não é mais aplicável, pois o modelo original baseava-se na análise de

países específicos. Sendo assim, as suposições que poderiam ser feitas acerca de modos de entrada

da firma estão relacionadas a escolhas que esta faz com o objetivo de desenvolver, apoiar, e

coordenar seus relacionamentos. Visto que a construção de relacionamentos é algo custoso que

demanda recursos, acredita-se que escolhas de mercado, seja este nacional ou internacional, seriam

influenciadas em função de experiência adquirida em relacionamentos anteriores. Nesse contexto,

um exemplo de caso de expansão internacional seria o desenvolvimento de operações em resposta

a atitude tomada por uma empresa que o agente possui um relacionamento que considera

importante (JOHANSON e VAHLNE, 2003).

Baseado nas novas abordagem para o modelo de Uppsala, Johanson e Vahlne (2009)

apresentam a estrutura revisada do modelo (Figura 4). Nesta, muito da estrutura básica foi mantida

pelos autores, contudo algumas das variáveis foram mais elaboradas adotando dimensões um pouco

mais complexas do que as do modelo original. Sendo assim, a seguir será explicado um pouco

melhor as mudanças e seus impactos na mecânica do modelo.

Fonte: Adaptado de Johanson e Vahlne (2009), p. 1424

Figura 4 - Revisão do Modelo de Uppsala

Page 65: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

53

Com relação a variável de estado relativa ao conhecimento, a dimensão do reconhecimento

de oportunidades foi adicionada visto que oportunidades seriam um aspecto derivado do acúmulo

de conhecimento. Os autores destacam oportunidades, pois seria o principal elemento associado ao

acúmulo de conhecimento, e que seria um motor do processo. Além disso, cabe ressaltar outros

aspectos do conhecimento que são relevantes para o processo, como necessidades, capacidades,

estratégias, e redes de relacionamento que outras firmas possuem (JOHANSON e VAHLNE,

2009).

A segunda variável de estado deixa de ser comprometimento de mercado (modelo Uppsala

original) passando a ser a posição da empresa na rede. Essa mudança representa uma das principais

características da nova abordagem do modelo, pois o processo de internacionalização passa a

ocorrer dentro da rede. No novo contexto, as redes serão caracterizadas por relacionamentos que

possuem um determinado nível de conhecimento, confiança, e comprometimento entre as partes.

O nível em que tais variáveis apresentam-se para cada um dos agentes da rede em relação aos seus

parceiros é variado. Sendo assim, ao considerar as diversas configurações possíveis que podem

surgir a partir do conhecimento produzido nesses relacionamentos diversos caminhos para a

internacionalização podem ser criados (JOHANSON e VAHLNE, 2009).

Com relação as variáveis de mudança, a alteração da variável atividades correntes para

aprendizado, criação e construção de confiança, visa explicitar os aspectos produzidos em função

das atividades correntes. Tal alteração também visa apresentar uma mudança do escopo que

algumas dessas variáveis passam a assumir. No modelo original, as operações correntes da firma

eram a fonte de aprendizado experiencial, contudo a nova abordagem admite outras formas de

aprendizado existentes, embora o aprendizado experiencial seja mantido como o mais importante.

Além disso, a considerar construção de confiança no desenvolvimento do relacionamento visa

destaca a dimensão afetiva existente neste, assumindo assim um papel tão importante quanto o da

dimensão cognitiva. Por fim, a criação de oportunidade foi destacada, pois os autores acreditam

que o desenvolvimento desta seria algo crucial para o desenvolvimento do relacionamento

(JOHANSON e VAHLNE, 2009).

Por fim, a variável de mudança do modelo original de decisões de comprometimento foi

adaptada para assumir sua nova dimensão de decisões de comprometimento no relacionamento.

Essa mudança especifica que as decisões que a empresa toma referem-se a relacionamentos

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54

específicos ou redes de relacionamentos, ou seja, a empresa escolhe seu nível de comprometimento

com base na sua estratégia e dos impactos associados na sua rede de relacionamentos. Cabe

destacar que tais decisões podem assumir um papel de fortalecimento ou enfraquecimento dos

relacionamentos, pois ambos os cenários são possíveis de acordo com o objetivo da firma

(JOHANSON e VAHLNE, 2009).

A partir das alterações realizadas pelos autores, algumas implicações podem ser destacadas

acerca dos impactos que o modelo revisado tem para o processo de internacionalização das

empresas.

A internacionalização da empresa irá depender dos relacionamentos que a firma possui e

da rede que está inserida. Sendo assim, uma expansão internacional ocorreria em função da

perspectiva de encontrar oportunidades de negócios que sejam interessantes ou em função de um

parceiro importante que decide atuar no exterior e quer que a firma em questão a acompanhe. Com

relação a qual país a empresa irá atuar, genericamente seria em qualquer lugar que a firma ou seus

parceiros percebam a existência de oportunidades a serem exploradas, ou em países que as

empresas parceiras da firma já possuam uma posição mais forte. Caso a firma não possua parceiros

com posições relevantes em redes no exterior, a firma pode optar por uma localidade em que

perceba ser mais fácil estabelecer relacionamentos com empresas locais. Nesse caso a utilização

de intermediários como agentes e distribuidores pode ser um caminho para estabelecer o

relacionamento visado. Cabe destacar também que a relevância da distância psíquica não deixa de

existir, contudo ela passa a ser uma condição que apesar de facilitadora não é suficiente para

garantir a identificação e exploração de oportunidades. Por fim, os autores acreditam que a nova

abordagem do modelo que considera conhecimento como contextualmente específico, tornaria o

modelo aplicável igualmente para empresas menores quanto maiores (JOHANSON e VAHLNE,

2009).

2.4 EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL

Empreendedorismo internacional é um campo bem recente da literatura que estuda o

comportamento de empresas que desde sua criação possuem um elevado comprometimento em

relação ao mercado interacional. De acordo com a definição de McDougall (1989),

empreendedorismo internacional seria o estudo do desenvolvimento de empresas que desde sua

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55

criação engajam em negócios internacionais. Apesar de novo, é um campo extremamente amplo

de que possui diversas óticas de estudo, sendo assim a revisão será focada nos trabalhos seminais

acerca do tema com um aprofundamento na questão de empresas nascidas globais (Born Globals).

Para o presente caso, o estudo de empreendedorismo internacional torna-se relevante ao

considerar a importância das características do empreendedor no processo de internacionalização

da firma. Tal aspecto pode ser evidenciado em pesquisas iniciais realizadas tornando interessante

a consideração desse referencial teórico ao estudo.

Os trabalhos de McDougall (1989) representam o início do estudo no campo, pois visam

demostrar que existem diferenças significativas no comportamento de firmas criadas que visam

mercado internacional (International New Ventures) das que visam o doméstico (Domestic New

Ventures). Essa comparação foi algo que suscitou os trabalhos da autora, pois a análise das INV

representaria desafios tanto no campo do empreendedorismo quanto em negócios internacionais.

O campo do empreendedorismo visa explicar a criação e o desenvolvimento de “startups”

(MCDOUGALL, 1989) e, embora haja literatura acerca de estratégias para competição no mercado

internacional, ainda não haveria estudos que diferenciassem a competição de firmas que atuassem

especificamente no mercado doméstico daquelas que visam atuar no mercado internacional desde

sua criação (KOGUT, 1984). Já no campo de negócios internacionais, diversos estudos consideram

necessariamente a preexistência da firma no mercado doméstico como um passo anterior a sua

atuação no mercado internacional. Sendo assim, o estudo de INV seria um caso à parte visto que

representaria um desafio a essa visão sequencialista mais tradicional de negócios internacionais

(MCDOUGALL, 1989)

Inicialmente, Oviatt e McDougall (2004) definem o que seria INV para delimitar seu foco

de análise. Sendo assim, esses autores definem INV como organizações de negócio que, desde sua

criação, visam obter significativa vantagem competitiva através do uso de recursos e venda de

produtos para diversos países. Aprofundando mais a definição, a característica principal dessas

“startups” é a de que justamente desde sua criação elas podem ser consideradas internacionais visto

o significativo nível de comprometimento de recursos (materiais, pessoas, tempo, capital, etc.) em

mais de um país. Apesar disso, tais empresas não necessariamente detêm sob seu controle tais

recursos, pois formas alternativas de governança podem ser aplicados. Cabe ressaltar que o foco é

a idade em que a firma se internacionaliza, e não o seu tamanho. A partir de tal panorama, o aspecto

Page 68: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

56

curioso para os negócios internacionais da firma é que tais decisões devem ser tomadas

necessariamente no momento de sua criação.

Com base na definição estabelecida, a necessidade de criação de um modelo específico

visando explicar seu comportamento seria em virtude do desafio que elas apresentariam para as

teorias estabelecidas de negócios internacionais. No caso de Uppsala, a firma não se encaixaria no

comportamento incremental descrito por eles visto que desde sua criação já adotariam uma postura

mais agressiva com relação a presença em diversos mercados. Mesmo utilizando as exceções

consideradas por Johanson e Vahlne (1977; 1990) para explicar comportamentos mais agressivos

no processo de internacionalização seria o suficiente para explicar o comportamento das INV, pois

estas não possuiriam um volume grande de recursos iniciais, nem grande experiência prévia de

atuação em outros mercados, e não atuariam em mercados estáveis e homogêneos. Com relação ao

uso das teorias econômicas, o principal desafio acerca do seu poder explicativo seria pela questão

do tamanho das INV, pois em grande parte de teorias econômicas desenvolvidas o tamanho da

firma seria um requerimento necessário para o aproveitamento de vantagens como do poder de

oligopólio (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

É importante ressaltar que as teorias mencionadas foram desenvolvidas em cenários

econômicos distintos dos enfrentados nas últimas décadas, pois alguns aspectos modificaram a

dinâmica empresarial possibilitando o acesso de determinadas vantagens as pequenas e médias

empresas. Um exemplo disso foram os avanços tecnológicos consideráveis nas tecnologias de

comunicação e transporte tornando-as mais acessíveis e baratas. Sendo assim, é importante

ressaltar que os aspectos levantados não invalidariam as teorias de internacionalização passadas,

pois elas ainda se aplicariam para determinadas firmas e indústrias. Apesar disso, a autora defende

que tais teorias teriam um explicativo reduzido ao considerar empresas em contextos econômicos

mais associados a mudanças tecnológicas, de ambiente de mercado, e novas capacidades da firma

(OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Para a construção de seu modelo, Oviatt e McDougall (2004) utilizam fundamentos teóricos

extraídos de diversas áreas da literatura como: internalização de atividades associadas a exploração

de mercados imperfeitos tendo por base uma avaliação por custos de transação; idéias originadas

da teoria de empreendedorismo para avaliar de que forma a firma consegue influenciar em

atividades vitais sem necessariamente controlá-las diretamente; e, idéias extraídas do

Page 69: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

57

gerenciamento estratégico para entender de que forma a empresa consegue desenvolver vantagens

estratégicas sustentáveis. Levando em consideração esses elementos, os autores visam descrever

INV como sendo um tipo específico de empresa multinacional (MNE).

O modelo conceitual pode ser observado a seguir (Figura 5). Neste, os retângulos

representam transações econômicas de interesse para a análise e as setas os elementos que

distinguem as empresas no âmbito das transações que são realizadas. O modelo pode ser

interpretado como quatro elementos sequenciais que são suficientes e necessários para a existência

das empresas descritas. No âmbito das transações econômicas, o processo de internalização

separaria as transações que são governadas pelo mercado daquelas que ocorrem dentro das

organizações. Considerando as organizações, aquelas que são baseadas em estruturas de

governanças alternativas serviriam para separar as transações no âmbito de NV (New Ventures) das

que já seriam estabelecidas no mercado. Em seguida, a utilização de vantagens locacionais em

diferentes países separaria as INV das que seriam NV. Por fim, a detenção de ativos únicos

delimitaria INV de SINV (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Para entender melhor o modelo teórico construído pelos autores é necessário explicar o papel

de cada um dos elementos descritos.

Figura 5 - O Modelo Conceitual de Empreendedorismo Internacional

Fonte: Adaptado de Oviatt e McDougall (2004), p. 54

Page 70: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

58

O processo de internalização é um elemento tradicionalmente abordado por diversas teorias

de internacionalização, principalmente as de viés econômico, pois traz uma explicação para forma

como a firma avaliaria o dilema entre exercer uma atividade ou obtê-la a preço de mercado. Esse

dilema é gerado pela existência de mercados imperfeitos, principalmente em bens intermediários,

o que traria oportunidades para a existência de empresas que exerçam tais atividades de maneira

mais eficiente do que outras. Tais imperfeições seriam geradas por aspectos como mobilidade

imperfeita de fatores, custos ocultos, assimetria de informação, dentre outros, estudados pelas

teorias econômicas. Sendo assim, a firma avaliaria o dilema levando em consideração uma análise

por custos de transação, ou seja, comparar o custo associados a exercer tal atividade ou obtê-la a

preço de mercado (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Com relação ao uso de estruturas de governança alternativas, ao analisar NV, associá-las

com a detenção de baixo nível de recursos e poder é algo quase que universal, embora existam suas

exceções. Tais empresas carecem de recursos suficientes para o controle direto de diversos ativos,

o que resulta em uma pequena porcentagem de controle direto de atividades que seriam aquelas

associadas à sua sobrevivência. Sendo assim, os empreendedores precisam utilizar formas

alternativas de controle para seus ativos essenciais, e esse aspecto diferencia as NV de outras

organizações (OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Os trabalhos de Williamson (1991) descrevem

algumas dessas formas alternativas utilizadas como licenciamento e franqueamento, que são

estruturas híbridas alternativas ao uso de controle interno pela firma.

Apesar disso, tais estruturas apresentam potenciais riscos como o oportunismo por parte de

seus parceiros que poderiam apropriar-se dos recursos únicos que a firma possui. Tal aspecto é

evidenciado pelos contratos complexos que são elaborados para estabelecer o relacionamento entre

as partes. Outras alternativas que minimizam o uso de recursos pelas INV são evidenciadas através

da estrutura de redes. Nesse caso, os relacionamentos não são estabelecidos de maneira formal

através de contratos, e sim por contratos informais que estão associados a aspectos de confiança e

cooperação. A vantagem desse tipo de modelo seria principalmente pela questão da cooperação,

pois o oportunismo poderia ser vencido em função da reputação dos agentes estar em jogo. A

relevância dessa reputação é que ela teria potencial de afetar não somente o as atividades

econômicas envolvidas no relacionamento em questão, mas também em outras que o agente

possua. Sendo assim, uma importante característica que diferencia as INV de outras organizações

Page 71: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

59

estabelecidas é o baixo nível de internalização de suas atividades, e um maior uso de formas

alternativas de estruturas de governança para transações. Tal característica está, em geral,

relacionada com o baixo nível de recursos e poder devido a recente formação da empresa (OVIATT

e MCDOUGALL, 2004).

Outro elemento abordado em teorias de internacionalização, e utilizado pelo modelo

desenvolvido por Oviatt e McDougall (2004), é a questão da vantagem locacional. Essencialmente,

as firmas internacionalizam-se, pois percebem vantagens na transferência para outros países de

certos ativos móveis (ex: matéria-prima, conhecimento, produtos intermediários), e na sua

combinação com ativos imóveis, ou menos móveis, existentes no país hospedeiro (DUNNING,

1988). Apesar disso, as firmas ao atuarem em países estrangeiros encontram certas desvantagens

vis-à-vis firmas nativas desses países. Desvantagens como barreiras institucionais, falta de

conhecimento sobre as leis, práticas comercias e linguagem, são os desafios a serem superados.

Levando em consideração tal situação, ao analisar as empresas multinacionais é possível observar

que tais desafios são superados por vantagens associadas à produção de escala (OVIATT e

MCDOUGALL, 2004).

Ao considerar INV, tal alternativa passa a não ser a mais viável para todo e qualquer tipo

de ativo a ser transferido, visto a quantidade limitada de recursos e poder de tais empresas. Sendo

assim, o conhecimento privado passaria a ser uma alternativa mais intuitiva para esse processo,

pois possui propriedades bem interessantes. Levando em consideração os avanços na infraestrutura

de comunicação, é possível que o conhecimento produzido pelas firmas seja transferido entre países

a um custo marginal relativamente baixo. A combinação desse conhecimento privado com recursos

menos móveis locais permite que as empresas atuantes no exterior consigam superar desvantagens

frente às domésticas (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Tal aspecto aparentemente justificaria o porquê de indústrias intensivas em conhecimento

estarem se globalizando tão rapidamente (REICH, 1991), e também a razão de INV que possuam

conhecimento privado diferenciado serem impulsionadas a internacionalizar-se mais rapidamente

(OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Além disso, outro aspecto que impulsiona o processo de

internacionalização é que empresas competidoras tentarão copiar ou reproduzir o conhecimento

privado umas das outras para manterem-se competitivas. Sendo assim, tais NV precisam ser

internacionais desde a sua criação ou estarão sob o risco de enfrentarem competição de outras que

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60

já são internacionalizadas, e que escolham copiar ou reproduzir o conhecimento privado que as NV

possuam. Levando em consideração tal cenário, um catalisador desse processo seria o nível de

eficiência dos mercados internacionais, pois torna a competição entre empresas mais agressiva.

Sendo assim, os autores justificam que a prevalência de INV seria impulsionada pelo aumento da

eficiência dos mercados internacionais (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

A partir dos três elementos descritos previamente pelos autores, é possível estabelecer as

condições necessárias para a existência de uma INV. Apesar disso, tais elementos não garantem a

sobrevivência da firma visto que não apresentam condições suficientes para uma vantagem

competitiva sustentável (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

De acordo com Barney (1991), uma vantagem competitiva é sustentável quando a firma

possui recursos que sejam únicos. Sendo assim, uma INV enfrenta grandes desafios, pois seus

recursos móveis são intensivos em conhecimento, e o conhecimento é até certo ponto um bem

público, ou seja, passível de ser obtido ou reproduzido. Além disso, como a transferência de ativos

intensivos em conhecimento teria baixo custo, torna-se ainda mais atraente à apropriação por seus

competidores. Consequentemente, uma empresa pioneira internacional precisa limitar o uso desse

conhecimento para que continue mantendo seu valor (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Tal limitação pode ocorrer de algumas maneiras.

O conhecimento pode ser mantido como proprietário através de meios diretos como

patentes, direitos de reprodução, ou na forma de segredos de negócio, protegendo tal conhecimento

de imitações retardando o processo de desenvolvimento de substitutos. Apesar disso, patentes e

direitos de propriedade podem não ser respeitados em certos países o que tornaria tal limitação

pouco eficiente. Além disso, tais limitações poderiam impulsionar seus competidores na produção

de ativos alternativos ou até mesmo mais eficientes. Sendo assim, os autores destacam que

conhecimento seria melhor protegido na forma de um segredo de negócio (OVIATT e

MCDOUGALL, 2004).

Outra forma de tornar um conhecimento proprietário dá-se através da imitabilidade

imperfeita (BARNEY, 1991; SCHOEMAKER, 1990). Possuir uma história organizacional única,

complexos conhecimentos sociais, e uma ambiguidade na causalidade entre conhecimento e

vantagem competitiva associada, são exemplos de características que tornam o conhecimento

Page 73: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

61

imperfeitamente imitáveis. Os autores utilizam como exemplo ilustrativo dessa característica NV

que dizem apresentar esquemas de gerenciamento diferenciados. Ao considerar essa modalidade

de proteção é importante que a empresa considere o dilema de tais mecanismos, pois embora ajude

a reforçar a proteção ao conhecimento, esses tipos de arquivos intangíveis também poderiam

dificultar a transferência desse conhecimento (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Uma terceira forma de proteção ao conhecimento envolve o licenciamento. Nesse caso, a

estratégia envolve adotar políticas de preço que alinhem a capacidade de extrair retorno financeiro

e/ou direcionamento da disseminação do conhecimento a ser licenciado, e o período em que esse

conhecimento será tido como relevante. No caso de um conhecimento que acreditasse ter um

período de relevância mercadológica grande, pode ser adotado uma estratégia de limitação do preço

(baixo valor de licença) para desencorajar competidores ou influenciar na velocidade e

direcionamento que um conhecimento está sendo disseminado. Já em uma situação de grande

demanda por um tipo de conhecimento específico e uma baixa expectativa de duração de sua

relevância, altos valores para o licenciamento podem ser utilizados como forma de maximizar o

retorno financeiro (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

Por fim, uma quarta forma de proteção à propriedade intelectual está diretamente associada

com uma das formas alternativas de governança mencionadas, as redes de relacionamento. Embora

alianças com organizações complementares como produtores e outros agentes nos canais a jusante

aumentem o risco de apropriação, a estrutura da própria rede tende a controlar tal risco. Isso ocorre,

pois, além do aspecto associado a reputação mencionado previamente, muitos dos relacionamentos

existentes nas redes possuem alto nível pessoal e econômico, distanciando tais relacionamentos

daqueles típicos associados ao oportunismo comercial, o que ao menos inibiria tais atitudes

desleais. Os autores sugerem que para haver tais tipos de relacionamentos envolvendo agentes em

diferentes países faz sentido que a fundação de INV ocorra por empreendedores com experiência

internacional (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

A partir do modelo apresentado por Oviatt e McDougall (2004) é possível estabelecer as

condições básicas para a existência de uma INV. Apesar disso, estudos de casos realizados para

analisar tais empresas verificaram que os elementos descritos pelo modelo se apresentam em

diferentes formas. Estudos realizados por McDougall e Oviatt (1991) apontaram que algumas

empresas ativamente coordenam a transformação de recursos a partir de diversas partes do mundo,

Page 74: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

62

e vendem sua produção aonde a mesma for mais valorizada. Já Ray (1989), apontou que outras

empresas são primordialmente exportadoras que adicionam valor ao seu produto através da venda

em regiões onde são mais necessários. A partir de tais evidências, Oviatt e McDougall (2004)

constroem uma forma de classificação para INV utilizando como variáveis o número de atividades

coordenadas na cadeia de valor, e a quantidade de países em que a empresa atua (Figura 6).

Com relação a tal classificação, cabe ressaltar dois aspectos importantes. A tabela criada

identifica tipos particulares de empresas que se encaixam em dois extremos descritos, contudo

diversos tipos intermediários de empresas existentes poderiam ser classificados e analisados. Além

disso, com o passar do tempo e possíveis modificações de atividades das empresas, é possível que

uma mesma empresa mude de classificação (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).

O artigo de Oviatt e McDougall (2004) pode ser considerado como pioneiro sobre o estudo

do empreendedorismo internacional apresentando um certo direcionamento acerca do estudo do

campo, contudo existe uma extensa literatura sobre o tema devido à sua riqueza de aspectos a serem

abordados e estudados. Tamanha é a riqueza que após duas décadas de desenvolvimento, o campo

de estudo em empreendedorismo internacional foi criticado como fragmentado e inconsistente

(KEUPP e GASSMANN, 2009).

Figura 6 - Classificações de “International New Ventures”

Fonte: Adaptado de Oviatt e McDougall (1994), p. 57

Page 75: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

63

Com o intuito de estabelecer uma estrutura mais organizada acerca do tema, Jones, Coviello

e Tang (2011) realizaram uma revisão de literatura bem extensa para organizar os campos teóricos

e abordagens de diversos autores. A partir dessa organização, é possível estabelecer com mais

clareza as diferenças existentes nas pesquisas realizadas.

Assim, é possível observar que INV e empresas nascidas globais são classificações

utilizadas em teorias que abordaram empreendedorismo internacional com base na identificação

de tipos de empreendimentos, ou seja, o campo procura avaliar as características ou antecedentes

presentes nas estruturas organizacionais de empreendimentos que competem internacionalmente

(JONES, COVIELLO e TANG, 2011). Como foi mencionado anteriormente, INV foi inaugurado

pelos trabalhos de McDougall (1989) e classificado em quatro subtipos, sendo o mais radical deles

as “startups” globais (OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Sendo assim, de acordo com a

classificação de Jones et al (2011), a diferença existente entre startups globais e nascidas globais,

termo esse inaugurado por Rennie (1993) e utilizado em diversos trabalhos posteriores, é que a

primeira envolve empreendimentos que foram criados com a intenção de internacionalizarem

rapidamente, enquanto a segunda envolve empreendimentos que são definidos como tal devido ao

seu momento (timing) e velocidade de internacionalização. Tendo tal diferença em mente, o

conceito de nascidas globais será explicado a seguir.

O termo que classifica empresas como nascidas globais (Born Globals) foi utilizado por

Rennie (1993) para caracterizar empresas com rápido desenvolvimento internacional. O termo

surgiu a partir da pesquisa para o “Australian Manufacturing Council” conduzida pelos consultores

da McKinsey (RENNIE, 1993). O estudo baseou-se na análise de 310 empresas australianas, sendo

estas pequenas e médias empresas voltadas à produção de bens com alto valor agregado. A partir

do estudo, o autor pode identificar dois tipos de padrões de exportação. O primeiro é referente ao

comportamento mais tradicional de empresas com base doméstica que iniciavam seu processo de

exportações mais tardiamente, tendo como foco primário o mercado doméstico. Tais empresas

tradicionais iniciavam seu processo de exportações após o período de 27 anos e o total que as

exportações representavam da receita era de 20%, ambos em média. Já as empresas consideradas

nascidas globais, contavam com uma participação significativa de suas vendas voltada ao mercado

externo, em média 76% das vendas totais, e tal atividade deu-se após apenas dois anos depois de

fundadas. A base da estratégia utilizada envolvia proximidade ao consumidor como forma de

Page 76: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

64

criação de valor. Tais empresas buscavam entender e satisfazer da melhor forma possível as

necessidades particulares de um grupo de consumidores, ou seja, o foco era criar um tipo de

mercado em que estas fossem as líderes de atuação. Dessa forma, tipicamente tais empresas

competiam em nichos de mercados caracterizados por rápida flexibilidade.

A relevância do estudo de empresas nascidas globais não é somente por seu padrão

comportamental diferenciado, mas também porque são empresas que mesmo pequenas conseguem

competir com outras firmas estabelecidas, além de conseguirem se manter rentáveis em uma

indústria de agressiva expansão. Sendo assim, essas firmas seriam exemplos consideráveis do

potencial que pequenas e médias empresas (SME) poderiam assumir para o crescimento de

exportações de um país (RENNIE, 1993).

Baseados na classificação criado por Rennie (1993), diversos estudos posteriores foram

realizados para estudar o fenômeno de empresas nascidas globais. Sendo assim, para uma melhor

compreensão da evolução do conceito, será primeiro apresentado diferentes estudos que buscaram

entender as razões para o surgimento das empresas nascidas globais. Em seguida, será explicado a

evolução do conceito na literatura e os desafios encontrados para operacionalização do conceito.

O desenvolvimento dos mercados nos últimos 30-40 anos mudou muito a forma como os

negócios do dia-a-dia são conduzidos. Barreiras comerciais foram transpostas, a sociedade como

um todo tornou-se mais “internacionalizada”, os custos de transporte caíram, e o desenvolvimento

tecnológico aproximou as pessoas através da internet e outros meios de comunicação mais

eficientes. Todos esses fatores tiveram um efeito revolucionário no mundo dos negócios, afetando

a forma como os gestores pensam e agem nas empresas. Informações de mercado podem ser obtidas

de uma maneira mais simplificada visto o baixo custo para o seu armazenamento e formas mais

eficientes de compartilhamento. É importante ressaltar que essas oportunidades não estão restritas

apenas a questões relacionadas a marketing e vendas, pois também oferecem um acesso facilitado

na obtenção de capital humano, bem como capital financeiro. Há também o fortalecimento de um

conceito de “sociedade internacional”, pois cada vez mais funcionários possuem experiência

internacional que pode ser usado na condução de negócios da empresa. Tal conhecimento foi obtido

principalmente através da experiência, estando relacionadas a situações como viagens de negócios

e períodos de estadia mais longos em outros países (ex: estacionados em filiais). Todos esses fatores

somados criam uma mentalidade mais internacional acerca da possibilidade de negócios para a

Page 77: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

65

firma, sendo possível perceber uma espécie de contração do espaço mundial, de um ponto de vista

mais psicológico.

Os efeitos da globalização mencionados anteriormente apontam mudanças que trouxeram

um novo panorama para o comércio internacional. Sendo assim, tais mudanças também trouxeram

potenciais oportunidades que deram espaço para que pequenas empresas pudessem coexistir com

as grandes empresas no mercado internacional. Isso ocorre, pois, certos aspectos tidos como

vantagens exclusivas de grandes empresas multinacionais podem ser explorados por pequenas

empresas, como, por exemplo, ter uma logística de transporte eficiente e barata.

Nesse contexto, Rennie (1993) destaca algumas características que servem para entender

não somente empresas nascidas globais, mas o crescimento de pequenas e médias empresas como

um todo. A preferência dos consumidores modificou consideravelmente nas últimas décadas, pois

produtos padronizados estão cada vez mais dando espaço para a demanda por produtos

especializados e customizados. Sendo assim, os nichos de mercado estão se tornando importantes

oportunidades a serem aproveitada pela pequena empresa visto sua flexibilidade em de adaptar-se

mais rapidamente a demandas específicas, comparando com as grandes empresas. Além disso, até

os anos 60 era quase uma exclusividade das grandes empresas a possibilidade de aproveitamento

de baixo custo associado com economias de escala, mas com o advento de novas tecnologias de

processo as pequenas e médias empresas conseguiram ter acesso a tais vantagens, e competir com

grandes empresas em custo e qualidade. Um terceiro aspecto seria o avanço nas tecnologias de

informação que permitiram pequenas e médias empresas aproveitar de um fluxo mais eficiente de

dados, tanto de velocidade como custo. Por fim, a diminuição dos ciclos de vida dos produtos, em

função das mudanças das preferências dos consumidores, dando espaço a estratégias que permitam

maior flexibilidade e adaptabilidade, algo que seria mais facilmente aplicável em pequenas e

médias empresas.

Knight e Cavusgil (1996) delinearam seis fatores que dariam origem ao aparecimento de

empresas nascidas globais:

Aumento do papel dos mercados de nicho;

Avanços nas tecnologias de processos;

Os recentes avanços nas tecnologias de comunicação;

Page 78: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

66

Vantagens inerentes das pequenas empresas (o tempo de resposta mais rápido,

flexibilidade, adaptabilidade, etc.);

Meios mais acessíveis de internacionalização;

Redes Globais.

A relevância dos fatores apontados é que empresas classificadas como nascidas globais

poderiam utilizar-se de tais características como forma de gerar vantagem competitiva frente à

grandes empresas (KNIGHT e CAVUSGIL, 1996).

Andersson e Wictor (2003) desenvolveram uma estrutura conceitual muito semelhante à

proposta por Madsen e Servais (1997) ao organizar fatores que teriam influência para o surgimento

de Born Globals. Eles dividiram esses fatores em quatro grupos principais: empreendedor, redes,

indústria e globalização (Figura 7).

O empreendedor é um dos fatores apontados, pois sua experiência prévia é tida como

diferencial para desenvolvimento da empresa (ANDERSSON e WICTOR , 2003). Eles são

caracterizados por terem uma mentalidade global desde a fundação da empresa (OVIATT e

MCDOUGALL, 2004). Além disso, a o nível de experiência internacional do empreendedor estaria

correlacionada positivamente com o sucesso da criação de empresas nascidas globais

(ANDERSSON e WICTOR , 2003).

Figura 7 - Fatores de Influência ao Surgimento de Born Globals

Fonte: Adaptado de Andersson e Wictor (2003), p. 254

Page 79: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

67

As redes de relacionamento desempenham um papel significativo para o desenvolvimento

internacional de uma empresa, tanto em nível formal quanto informal. Relacionamentos com

fornecedores, financiadores e clientes são alguns exemplos de variáveis cruciais que uma nova

empresa “startup” precisaria desenvolver. Vale notar que a rede de relacionamentos já pode estar

presente mesmo antes da criação da empresa, pois há a possibilidade de aproveitar a rede pessoal

de relacionamentos a partir de trabalhos anteriores (ANDERSSON e WICTOR , 2003).

Características da indústria são importantes para a compreensão do desenvolvimento

internacional da empresa (ANDERSSON e WICTOR , 2003) visto que empresas nascidas globais

tendem a ser mais especializadas do que outras empresas (MADSEN e SERVAIS, 1997).

Por fim, a globalização é o quarto fator para a estrutura conceitual desenvolvida por

Andersson e Wictor (2003), estando relacionada a mudanças do mercado internacional visto o

desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação, transporte, além da diminuição de

barreiras comerciais.

Em uma questão mais conceitual, o trabalho de Gabrielsson et al. (2008) focou na tentativa

de esclarecer a definição do que seria uma empresa nascida global e quais seriam suas

características. Gabrielsson et al. (2008) acreditam que a abordagem “mecanicista” para definições

no passado, como por exemplo que estas empresas deveriam ter, em até 3 anos após sua fundação,

uma participação de pelo menos 25% de exportações sobre total de vendas, não captam de maneira

correta as variações contextuais relacionadas a fatores como: potencial do mercado doméstico,

produto, e receptividade do mercado a exportações. A partir da consideração de tais fatores, seria

possível questionar os valores absolutos e percentuais considerados no processo de classificação

de contexto econômico para outro. Cabe destacar que o estudo não sugere uma nova definição, mas

destaca a importância de alguns aspectos como: o papel do fundador da empresa e sua visão global,

inovação, estratégias de produtos, canais/rede, estratégias de operação e mercado, e aprendizagem

organizacional. Por fim, utilizando como base para seus estudos Grécia, Noruega, Finlândia e Itália,

Gabrielsson et al. (2008) apresentou uma descrição de três fases de como empresas nascidas globais

evoluiriam sendo elas introdução, crescimento, e acumulação de recursos. O estudo, assim como

muitos de seus antecessores, tinha por objetivo que a nova análise conceitual (abordagem baseada

em fases) auxiliaria pesquisadores na adoção de base comum no estudo de empresas nascidas

globais.

Page 80: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

68

Com relação a operacionalização do conceito, alguns autores e a forma que escolheram

aplicar o mesmo já foram mencionadas, contudo cabe ressaltar alguns aspectos mais gerais acerca

das concordâncias e divergências existentes. A relevância de tal debate é que há uma barreira no

sentido da aplicabilidade do conceito, pois conforme autores tentaram operacionalizá-lo houve uma

certa discussão relacionada a quais aspectos a serem utilizados visto diferentes ou até divergentes

formas de operacionalização. Dado tal contexto, a comparabilidade entre estudos tornou-se difícil

por causa das várias maneiras que pesquisadores definir empresas nascidas globais. Ainda hoje não

há uma base comum para a definição dessas empresas. Apesar disso, é possível destacar algumas

das principais características abordadas em estudos e na literatura. Tais características utilizadas

na categorização de empresas nascidas globais foram resumidas a seguir:

Velocidade de internacionalização

Escala de internacionalização

Escopo da Internacionalização

Diversidade Global

Objetivo da Internacionalização

Idade da Empresa

A seguir, será explorado um pouco melhor a discussão acerca de cada variável.

Uma das primeiras características a ser considerada por pesquisadores foi o tempo que

levava para as empresas se internacionalizarem, ou seja, velocidade de internacionalização. Ao

considerar a utilização dessa variável como forma de operacionalização do conceito, é possível

observar a existência de uma certa concordância acerca do período de tempo. Knight e Cavusgil

(1996) caracterizaram empresas nascidas globais como pequenas empresas, geralmente orientadas

para a área de tecnologia, e que exportam um ou vários produtos em até 2 anos após sua fundação.

Knight (1997) usou como definição empresas que iniciaram as atividades internacionais no prazo

de até 3 anos desde sua fundação, e que possuem pelo menos 25% de participação das exportações

sobre o total de suas vendas. Já em Oviatt e McDougall (1997), os primeiros 6 anos seriam os

cruciais para uma empresa alcançar um nível internacionalização considerado como razoável.

Encontrar uma escala de internacionalização considerável era outra questão que

apresentava um desafio na construção de uma definição operacional comum. A literatura apresenta

Page 81: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

69

diferentes maneiras de estabelecer o nível aceitável para a escala de internacionalização. Sendo

assim, ainda não há um certo consenso sobre o nível internacional aceitável que uma empresa deve

alcançar a fim de ser classificado nascida global. Apesar disso, a escala mais usada é de 25% de

participação das atividades internacionais sobre o total das vendas, mesmo levando em

consideração que Rasmussen e Madsen (2002) sugerem diferentes percentuais com base no

tamanho do mercado doméstico, pois para mercados menores 25% do total das vendas poderia ser

muito baixo.

É importante ressaltar que certas definições operacionais utilizadas incluiriam empresas que

já não poderiam ser consideradas uma “startup”. Por exemplo, o método de definição e

operacionalização usado por Knight (1997) considera como empresa nascida global aquelas

fundadas a partir de 1976, que começam as atividades internacionais em até 3 anos após sua

fundação, e que possuem um nível de participação das exportações sobre o total de vendas em pelo

menos 25%. Esta definição incluiria empresas que começaram a se internacionalizar muito cedo,

mas que só ampliariam essas atividades muito mais tarde. Tais empresas não estariam enfrentando

as mesmas circunstâncias que outras consideradas nascidas globais desde sua fundação

(HARVESTON e WAKKEE, 2003). Já a definição por Andersson e Wictor (2003) inclui um valor

de corte de 25% de participação das exportações sobre o total de vendas, mas estabelece um limite

de tempo de 3 anos para atingir tal valor, considerando sua fundação. Por outro lado, Gabrielsson

et. al. (2008) defende que esses 25% de participação seria um valor muito fácil de se chegar para a

maioria das empresas europeias em comparação com empresas americanas.

Além disso, cabe destacar que muitas das definições operacionais têm um forte foco em

vendas internacionais, contudo são poucos que incluem outras formas de atividades internacionais

como por exemplo, a captação de recursos com fornecedores no exterior. Outro ponto é destacado

por Rasmussen e Madsen (2002) ao defenderem que muito foco foi colocado na participação das

vendas externas para operacionalização do conceito, e que pesquisadores deveriam incluir também

outros aspectos, como a expansão internacional (número de países e regiões), penetração (modos

de entrada, estrutura organizacional), e integração (sourcing, coordenação).

O escopo de internacionalização diz respeito a quais atividades a empresa decide

internacionalizar. Knight (1997), por exemplo, utiliza vendas internacionais como sendo a unidade

caracterizadora de uma empresa nascida global.

Page 82: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

70

A diversidade global é uma variável por vezes não utilizada, ou não tendo uma

operacionalização bem definida. Apesar disso, os trabalhos de Harveston e Wakkee (2003) tentam

definir um número mínimo de países e regiões em que a empresa possuiria atividades.

O objetivo/finalidade da internacionalização para essas empresas é citado por diversos

autores (RENNIE, 1993; KNIGHT E CAVUSGIL, 1996; ANDERSSON E WICTOR, 2003) como

sendo o de ganhar uma vantagem competitiva significativa pela atuação em diversos mercados. O

empreendedor/fundador de uma empresa nascida global percebe o mundo como um grande

mercado único (RENNIE, 1993; KNIGHT e CAVUSGIL, 1996; MADSEN E SERVAIS, 1997;

HARVESTON e WAKKEE, 2003; ANDERSSON e WICTOR, 2003) e, normalmente, usa nichos

de mercado para ganhar uma vantagem competitiva.

Além disso, considerando a idade da empresa, um exemplo de limitação foi realizado por

Knight (1997) considerando como seu campo de pesquisa empresas fundadas depois de 1976.

Contudo, outros autores ressaltam que, levando em consideração os fatores ambientais

relacionados ao surgimento de empresas nascidas globais, não faria muito sentido considerar o

estudo de empresas nascidas globais antes da eclosão de certos aspectos, como: internet,

globalização, entre outros fenômenos mais recentes (KNIGHT, MADSEN e SERVAIS, 2004).

Por fim, após abordar a teoria de effectuation na seção seguinte, algumas considerações

acerca de sua aplicabilidade na teoria de empreendedorismo internacional serão realizadas.

2.5 TEORIA DE EFFECTUATION

A teoria de effectuation representa uma nova forma de se analisar a base do racional teórico

utilizado em diversos campos da literatura como estratégia, economia, finanças, administração, etc.

Essa mudança é uma consequência da introdução do conceito de racionalidade limitada do agente.

A partir dessa nova abordagem, uma revisão de literatura em effectuation consideraria diversos

temas de discussão dentro da teoria de administração, contudo a revisão será focada nos ramos do

empreendedorismo e negócios internacionais. Sendo assim, para iniciar a discussão do tema é

interessante apresentar em linhas gerais o racional comparativo de effectuation e causation, e em

seguida apresentar um modelo de effectuation e suas aplicações em negócios internacionais.

Page 83: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

71

No presente estudo, a teoria de effectuation pode ajudar a entender o processo de tomada

de decisão de empreendedores em cenários em alto nível de incerteza e/ou desprovido de

informações mais completas. Tal característica pode ser observada em estudos iniciais levando em

consideração que a firma é uma fazenda que se localiza numa região com dificuldade de acesso a

infraestrutura e tecnologia, além de não apresentar uma estrutura muito rígida acerca do controle

de informações geradas.

Sarasvathy (2001) define a diferença entre o processo de causation e effectuation. O

primeiro refere-se a um processo em que um determinado efeito é considerado como dado e o

agente escolheria os meios os quais seriam necessários para alcançar o efeito almejado. Já em um

processo de effectuation, os meios são considerados como dados e o agente selecionaria quais os

efeitos que poderiam ser alcançados a partir dos meios existentes. Essa distinção é relevante, pois

permite uma nova forma de entender a formação de objetivos. Em causation, uma meta é

estabelecida e o agente busca a otimização da utilização dos meios para atingir seu objetivo. Em

effectuation, a tomada de decisão envolve a otimização da aplicação dos meios tendo por base

diferentes efeitos possíveis, ou seja, o seu objetivo é construído ao longo das decisões a serem

tomadas. Cabe ressaltar que em ambos os casos as preferências pessoais do agente em questão são

utilizadas, contudo o racional que será diferente.

Além disso, causation e effectuation separam-se pela premissa em torno da racionalidade

do indivíduo, pois enquanto o primeiro considera o indivíduo perfeitamente racional, o segundo

assume uma premissa de racionalidade limitada. Essa diferença é relevante, pois estudos baseados

em racionalidade limitada trouxeram novas formas de avaliar o processo de tomada de decisão do

agente. Tais estudos revelaram que em certas circunstâncias o indivíduo não apresenta um

comportamento estritamente racional (SIMON, 1959), pois sua racionalidade estaria limitada por

fatores como limitações físicas em capacidade de processamento de informações (PAYNE,

BETTMAN e JOHNSON, 1993) além de limitações lógicas como vieses e falácias (BAR-HILLEL,

1980; TVERSKY E KAHNEMAN, 1982). Apesar disso, tais limitações não resultariam em um

comportamento irracional por parte do agente, pois os tomadores de decisão utilizam-se da

heurística (formas de simplificação de um problema) e da lógica indutiva como artifícios que

frequentemente resultam em decisões eficazes (GIGERENZER, HELL e BLANK, 1988).

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72

Em linhas gerais, com base na literatura acerca de tomada de decisão, é possível estabelecer

os princípios que envolvem cada uma das abordagens descritas.

De forma mais completa, com base na literatura acerca de tomada de decisão é possível

estabelecer os princípios que envolvem cada uma das abordagens descritas. Em um processo de

causation, teríamos (SARASVATHY, 2001):

Um objetivo a ser atingindo ou uma decisão específica a ser tomada (normalmente algo

bem estruturado e específico);

Um conjunto de meios a se considerar que poderiam ser gerados no processo decisório;

Limitações associadas a tais meios (essencialmente ambientais);

Um critério para selecionar o melhor conjunto de meios (ex: maior retorno esperado).

Já em um processo envolvendo effectuation, teríamos (SARASVATHY, 2001):

Um conjunto de meios tidos como dados (consiste em características/circunstâncias

relativamente não passíveis de alteração relacionadas ao agente tomador da decisão);

Um conjunto de efeitos associados que poderiam ser gerados pelo processo decisório;

Possíveis limitações associadas a tais efeitos (ex: ambientais, contingenciais, quantidade

e variedade de meios);

Um critério de seleção para os efeitos possíveis (ex: perdas aceitáveis).

A partir da análise comparativa, é importante ressaltar que ambos os processos estão

presentes simultaneamente no campo da decisão do agente não havendo uma questão de escolha

da abordagem que seria superior. A autora aponta que entender as desvantagens e vantagens de

cada um dos processos seria um trabalho para estudos empíricos do tema. Contudo, certas

situações poderiam dar mais espaço ao entendimento da decisão do agente através do uso de uma

abordagem em detrimento a outra, sendo exemplificada a seguir (SARASVATHY, 2001).

No âmbito da discussão estratégica empresarial, de um ponto de vista econômico, uma

determinada decisão é baseada em construtos tidos como existentes, e que ao mesmo tempo

orientam e limitam o contexto da decisão a ser tomada pelo agente. Contundo, de que forma seria

possível tomar decisões pressupondo que possíveis construtos não seriam existentes, ou seja, de

que forma flexibilizar a avaliação do agente em uma circunstância em que certas variáveis não

Page 85: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

73

fossem claras. A relevância dessa questão, embora pareça puramente filosófica, pode ser entendida

a partir da análise do empreendedor enquanto agente tomador de decisão na criação da firma. De

acordo com uma visão mais econômica, caso fosse claro o objetivo da empresa criada e/ou mercado

a se explorar, simplesmente pela aplicação de teorias existentes seria possível prever a criação da

empresa, pois afinal os agentes seriam inteiramente racionais. Apesar disso, há casos em que

empreendedores criam suas empresas sem uma visão clara do seu objetivo, pois inicialmente

poderiam pensar apenas na obtenção de lucros, ou que visam atuar em um segmento de mercado

que sequer é existente (fruto de uma nova tecnologia por exemplo) (SARASVATHY, 2001).

Tentar entender o processo de tomada de decisão em contextos como esse motivaram

Sarasvathy (2001) no desenvolvimento teórico do empreendedorismo através de uma visão de

effectuation. Cabe ressaltar que a autora propõe a construção de um modelo cujo foco não é possuir

um poder explicativo superior aos demais, mas sim propor uma forma alternativa de avaliar o

processo de tomada de decisão do agente.

Antes de iniciar a explicação do modelo, cabe destacar as características do espaço do

problema em análise. De acordo com March (1978) uma escolha racional envolve os aspectos

preditivos acerca da incerteza de consequências futuras e de incerteza sobre futuras preferências.

A primeira característica remete-se a incerteza de Knight, pois seria impossível calcular com

precisão as futuras consequências da escolha do agente. A segunda envolve a questão de

ambiguidade de objetivos, pois as preferências do agente não seriam tidas como dadas nem bem

ordenadas. Além disso, tem um terceiro aspecto a se considerar no espaço do problema que é a

isotropia. Esta refere-se ao aspecto do processo de tomada de decisões que envolve a seguinte

questão: visto que há incerteza das consequências das decisões do agente ex-ante, quais seriam as

informações que o agente deveria focar ou não sua atenção (SARASVATHY, KUMAR, et al.,

2014).

Cabe ressaltar que entender esses três aspectos ajuda a compreender o desenvolvimento do

modelo, assim como os subterfúgios utilizados na consideração dessas questões. Sendo assim, o

modelo desenvolvido pela autora é baseado em cinco princípios.

O princípio do passarinho na mão envolve a questão mencionada das diferentes utilizações

dos meios que o agente dispõe, lembrando que estes já seriam dados, para a produção de diferentes

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74

efeitos. Ao considerar as categorias de meios, o agente dispõe dos seguintes: quem ele é (identidade

do agente); o que ele sabe (o conhecimento que possui); e quem ele conhece (as redes sociais que

faz parte) (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Entender tais categorias abre uma discussão interessante acerca das escolhas do

empreendedor, pois, conforme a autora aponta, há extensa literatura acerca da relevância no

processo de tomada de decisão do conhecimento prévio e do estabelecimento das redes sociais.

Contudo, a questão da identidade do empreendedor seria uma discussão interessante, pois haveria

pouca literatura sobre sua relevância. É possível questionar que a identidade do agente nada mais

do que seria uma forma de ordenar suas preferências levando em consideração as consequências

associadas. Contudo, conforme March (1994) aponta, a utilização da identidade do agente na

avaliação do processo de racionalização poderia separar o nexo causal entre ação e consequência.

Em outras palavras, identidade consistiria em um conjunto de preferências particulares que

estariam vinculadas a determinada escolha de tipos de processos e decisões, e não necessariamente

da consequência associada (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014). Para entender tal aspecto, a

autora exemplifica que, não pensando na consequência de cada ação, mas o julgamento individual

por trás da ação, em circunstâncias idênticas envolvendo alguma lesão a um agente, um indivíduo

com identidade machista pode escolher um caminho que siga a vingança enquanto um de

identidade cristão seguiria o perdão. A relevância dessa questão é que a partir da utilização de

critérios de decisão associados com aspectos da identidade, o empreendedor conseguiria tomar uma

decisão específica escapando da questão das incertezas acerca das consequências no futuro

(incerteza de Knight). Cabe destacar que a identidade do agente está associada a aspectos de seu

conhecimento e rede social, pois cada categoria possuiria um aspecto de influência sobre as outras

(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Segundo, o agente assume preferências utilizando o princípio de perdas aceitáveis ao invés

de retornos esperados. Nos modelos baseados em causation, assume-se que o agente escolhe a

estratégia tido como ótima com o intuito de tomar a decisão que maximiza os retornos esperados.

Já em effectuation, o indivíduo determina o que ele considera como perdas aceitáveis, algo que

pode depender entre circunstâncias e idade do agente, e foca em um processo que visa experimentar

diferentes estratégias possíveis utilizando os recursos limitados que possui e mantendo-se nos

limites de perdas aceitáveis. Após cada combinação, o indivíduo avalia o cenário referente e

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75

escolhe a estratégia que cria um maior número de opções para este no futuro. A vantagem desse

tipo de processo é que minimiza a necessidade de prever aspectos do futuro para tomar sua decisão.

Além disso, também pode-se destacar o caráter de estímulo a métodos criativos na decisão, pois o

agente precisa avaliar sua escolha a partir do conjunto limitado de meios que possui

(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Terceiro, nos modelos que utilizam causation há uma ênfase na construção de estratégias

baseadas em análise competitiva dos agentes. Já em effectuation, há a ênfase na construção de

alianças estratégicas e ações de comprometimento frente a parceiros (stakeholders, agentes que

influenciam diretamente ou indiretamente nos negócios da firma) com o intuito de reduzir e/ou

eliminar incertezas, além de gerar possíveis barreiras de entrada. O interessante nesse princípio

chamado de colcha de retalhos (patchwork quilt) é que o agente não escolheria firmar alianças de

comprometimentos com base em seleção prévia ou conforme os objetivos do empreendimento,

pelo contrário, a escolha por parceiro (stakeholder) seria por qualquer um que optasse em

ativamente participar do processo de modelagem e influência nos processos da firma. Inclusive, o

princípio defende que a escolha pelas alianças não deve levar em consideração o custo de

oportunidade da possibilidade de outras alianças futuras que poderiam, ou não, ser firmadas com

demais parceiros (stakeholders). Através dessas decisões redes de relacionamentos são construídas.

Além disso, o comprometimento com os parceiros (stakeholders) e a formação de contratos com

estes justificam o porquê da diminuição da incerteza e da geração de barreiras à entrada, pois o

futuro passa a ser visto como um conjunto de contratos firmados. Por fim, pode-se destacar que ao

avaliar as características desse princípio conjuntamente com o de perdas aceitáveis é possível

entender como que empreendedores conseguiriam aplicar uma idéia em prática utilizando uma

limitada quantidade de recursos (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Quarto, o princípio da limonada (quando a vida lhe dá limões...) diz que o agente em um

modelo baseado em effectuation busca aproveitar a existência de incertezas como potenciais

oportunidades a serem exploradas, ao invés de pensá-las como fatores a serem previstos e

contingenciados (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014). A justificativa seria que agentes, em

uma lógica de effectuation, tem uma noção de objetivo mais maleável, tornando possível a

utilização de um planejamento incremental, e esse tipo de lógica permite utilizar a existência de

incertezas e contingências como recursos a serem utilizados em seus objetivos (LINDBLOM ,

Page 88: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

76

1959). Sendo assim, ao tratar incerteza como um recurso e um processo a ser explorado, o agente

pode aproveitar o efeito cumulativo das consequências de suas escolhas, e incertezas associadas a

estas, como uma singularidade integrada em seu empreendimento (SARASVATHY, KUMAR, et

al., 2014)

Por fim, o princípio do piloto no avião afirma que o agente em um processo de effectuation

visa controlar aspectos de um futuro tido como imprevisível, ao invés de tentar prever aspectos

desse futuro. Em modelos que utilizam causation, tentar prever aspectos do futuro é uma forma

metafórica de tentar controla-lo. Já em effectuation, o foco se torna em tentar controlar aspectos

associados a esse futuro, pois o objetivo é tentar controlar o futuro em si, e não prevê-lo. A

justificativa para isso pode ser entendida ao analisar os outros princípios em conjunto e suas

consequências, pois as diversas decisões tomadas ao longo da dinâmica do processo trariam formas

de controle ao agente. Importante ressaltar que as decisões individuais durante o processo também

foram tomadas sem tentativa de previsão de suas consequências (SARASVATHY, KUMAR, et

al., 2014).

A partir dos princípios descritos, Sarasvathy, Kumar et. Al. (2014) explicam a dinâmica do

modelo. Inicialmente, o "effectuator" traça as linhas de ação a partir do conjunto de meios que

dispõe (quem você é, o que você sabe, e quem você sabe). Com base em tal racional, uma das

primeiras coisas que faz é interagir com outros agentes, pois algumas dessas interações resultam

em comprometimentos com o novo empreendimento. Esses novos parceiros (stakeholders)

agregam no empreendimento, pois trazem ao agente um novo conjunto de meios e de objetivos.

Sendo assim, cada novo comprometimento produz ciclos subsequentes de expansão (novos meios)

e conversão (novos objetivos). Uma forma de entender tais ciclos seria que, novos meios

permitiriam uma reavaliação do processo de effectuation o que levaria a essa expansão do ciclo, já

novos objetivos produzem novas interações entre agentes no mercado permitindo a exploração de

Page 89: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

77

oportunidades na forma representativa de um novo mercado (Figura 8) (SARASVATHY,

KUMAR, et al., 2014).

A partir da nova abordagem descrita, foi possível que autores introduzissem novos

conceitos em diversas áreas da literatura em administração. Isso foi possível, pois embora o modelo

construído por Sarasvathy (2008) possua foco no processo de tomada de decisão do empreendedor

durante a criação da firma, a autora infere que a teoria geral de effectuation poderia ser aplicada

por empreendedores com o objetivo de melhorar as operações da firma, seja por eficiência ou

crescimento (SCHWEIZER, VAHLNE e JOHANSON, 2010). Nesse contexto, em relação a área

de negócios internacionais, Schweizer et al. (2010) sugerem ajustes ao modelo de Uppsala

(JOHANSON e VAHLNE, 2009) como forma de atualizá-lo com base em aspectos relacionados a

relevância do empreendedor no processo. Para efetuar tal revisão, além dos conceitos abordados

de effectuation, os autores também utilizarão avanços em outros ramos da literatura em

administração.

Figura 8 - Dinâmica do Modelo de Effectuation

Fonte: Adaptado de Sarasvathy (2008), p. 101

Page 90: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

78

Uma aplicação do modelo de effectuation é destacada nos trabalhos de Sarasvathy et al.

(2014), pois os autores realizam a tentativa de promover explicações para questões presentes na

teoria de empreendedorismo internacional.

De acordo com Jones, Coviello e Tang (2011), o consenso acerca dos principais tópicos de

interesse em empreendedorismo internacional seriam o empreendedorismo cruzando fronteiras (ex:

internacionalização empresarial), e estudos comparativos acerca do empreendedorismo em

diferentes países. Com relação aos estudos em internacionalização empresarial (entrepreneurial

internationalization), os autores apontam que existem poucos cuja ênfase estaria no âmbito de

teorias em empreendedorismo. Sendo assim, eles destacam a importância de incluir nos estudos

aspectos da cognição empresarial, juntamente com a visão dinâmica de redes, o conhecimento, e

as capacidades da firma.

Com base na crítica estabelecida pelos autores, Sarasvathy et al. (2014) propõem a

aplicação de princípios de effectuation, e do seu modelo em empreendedorismo, para resolver três

questões chaves. A incerteza ao cruzar fronteiras (cross-border uncertainty) é uma das questões,

pois a condução de negócios além das fronteiras gera incerteza para firma, mesmo considerando

empresas bem estabelecidas e a atuação em mercados maduros. Sendo assim, mesmo empresas

sem foco em empreendedorismo precisariam ser mais "empreendedoras" ao lidar com a condução

de negócios em outros países. Outro aspecto seria a questão de recursos limitados em

empreendedorismo internacional, pois embora a operação em contextos com múltiplos riscos (ex:

políticos, econômicos, socioculturais, etc.) seja um tópico importante considerado na literatura de

negócios internacionais e empreendedorismo internacional, a consideração desse desafio em um

contexto de recursos limitados traz problemas singulares em empreendedorismo internacional. Por

fim, a dinâmica de redes seria outro aspecto, pois considerar a criação, manutenção,

desenvolvimento, e gerenciamento das redes, sejam pessoais ou organizacionais, torna-se um

desafio ainda maior em vista da distância geográfica e cultural, tornando a comunicação ainda mais

complexa.

Com relação a incerteza entre fronteiras, os modelos em empreendedorismo internacional

consideram conhecimento, experiência, e redes como características que antecedem o processo de

internacionalização, ou seja, agentes com certos tipos de conhecimento e redes pessoais

influenciariam na probabilidade de internacionalização da empresa. Considerando tais aspectos sob

Page 91: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

79

uma ótica de effectuation, não seria somente possível verificar que diferentes tipos das três

variáveis resultariam em internacionalização, mas também o "como" e "quão veloz” seria tal

processo (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014). O modelo desenvolvido por Oviatt e

McDougall (2005) é um exemplo de teorização que segue esse rumo, pois ao explicar a velocidade

de internacionalização da empresa consideram as percepções do empreendedor de tecnologia,

competição, e oportunidade como sendo influenciadas pelo conhecimento e redes que possuem.

Tais variáveis sob uma ótica em effectuation assumiriam aspectos ligeiramente diferentes, pois

promoveriam dinamismo e endogeneidade ao modelo visto que tecnologia, competição e

oportunidade poderiam ser modeladas não somente como variáveis que antecedem ao processo,

mas também recursos para o processo empreendedor. Esse aspecto pode ser entendido da seguinte

forma, visto que a identidade do empreendedor (passarinho na mão) e o ambiente que atua é

transformado por suas ações (piloto no avião), ao longo do processo de internacionalização

empreendedores modificam suas percepções sobre tecnologia, competição e oportunidades, assim

como as variáveis si, tendo em vista suas ações e interações com parceiros (ciclos de expansão e

conversão) (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Com relação a utilização de recursos, entender o porquê de algumas firmas serem capazes

de internacionalizarem-se tão veloz e rapidamente sempre fora uma questão desafiadora na

literatura de empreendedorismo internacional. Na busca por uma resposta, há a visão dicotômica

entre as teorias que utilizam a visão baseada em recursos (RBV), e as que se baseiam nas

capacidades dinâmicas. A primeira defende que haveria uma necessidade de recursos

especializados, enquanto a outra justifica que as capacidades poderiam ser desenvolvidas em

condições de recursos escassos. Na segunda visão, argumenta-se que, embora em alguns casos

possuir recursos adicionais possa ser necessário e vantajoso, algumas características dos recursos

que a firma já possui (ex: fungibilidade) poderiam possibilitar usos alternativos, resultando na

possibilidade de firmas internacionalizarem sem possuir necessariamente uma quantidade grande

de recursos. Para entender tal questão, cabe ressaltar que empreendedores sob uma ótica em

effectuation consideram os recursos como fungíveis, pois seria uma consequência da estratégia da

"limonada" em situações contingenciais. Nessas situações, empreendedores seriam capazes de criar

atributos novos aos recursos em consequência de uma necessidade de adaptação a um ambiente em

particular. Sendo assim, utilizando uma abordagem em effectuation, ao considerar o que os agentes

conseguem fazer com seus recursos como algo mais relevante do que os atributos inerentes destes,

Page 92: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

80

seria resolvido a questão conflituosa entre quantidade versus qualidade (fungibilidade) dos recursos

como condições necessárias para uma veloz e rápida internacionalização da firma

(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Com relação a dinâmica em redes, a abordagem em effectuation poderia aprofundar ainda

mais o papel e a dinâmica das redes visto que diversos estudos consideram a importância de capital

social e redes sociais no processo de internacionalização das empresas (SARASVATHY,

KUMAR, et al., 2014). Um exemplo deste é o estudo realizado por Ellis (2011) que demonstrou

a influência de idiossincrasias da natureza das ligações sociais como direcionadores do processo

de internacionalização das empresas. Embora tais estudos demonstrem evidências consideráveis

acerca da relevância da variável "quem você conhece" (passarinho na mão), é deixado de lado um

aspecto crucial da dinâmica em relacionamentos do ponto de vista em effectuation, pois não seriam

os atributos inerentes da rede em si como sendo o único aspecto relevante, mas sim o que os

empreendedores seriam capazes de realizar com base em suas redes. Sendo assim, a argumentação

acerca da utilização de recursos pelo agente também é aplicável no contexto das redes

(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

Por fim, Sarasvathy et al. (2014) apresentam idéias interessantes acerca de pesquisas futuras

no terreno do empreendedorismo internacional que poderiam utilizar ser exploradas através de uma

abordagem em effectuation, o que potencialmente poderia resultar no desenvolvimento das teorias

existentes, e até mesmo de novas teorias. Dentre estas, destacam-se duas a seguir.

Há um fenômeno que tem despertado bastante o interesse na pesquisa em

empreendedorismo, os chamados empreendimentos sociais (social ventures). O interesse nessas

organizações está associado ao fato de que são empresas que teriam uma visão que iria além de

retornos financeiros, pois teriam agendas voltadas a questões como sustentabilidade,

responsabilidade social, problemas sociais, etc., além de serem caracterizadas por uma presença

internacional. Sendo assim, a abordagem em effectuation poderia estabelecer uma ponte entre esse

fenômeno e a literatura de empreendedorismo internacional, pois aspectos associados a identidade

do agente, relacionamentos, e redes poderiam servir de base para entendê-los. Além dos

empreendimentos sociais, há também outras formas inovadoras do ponto de vista organizacional

para as empresas. Levando tais aspectos em consideração, os autores propõem que seria

interessante a inclusão da forma organiciaonal como variável dependente ou independente nos

Page 93: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

81

modelos de empreendedorismo internacional, o que faria as teorias serem mais generalizáveis para

outras áreas da literatura (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).

A segunda possibilidade visa estabelecer uma crítica construtiva acerca do

desenvolvimento teórico na área, pois as ciências empíricas geralmente ignoram os outliers durante

esse processo. A consideração de outliers seria oportuna, pois os autores destacam que a lógica em

effectuation poderia ser aplicada em empreendedorismo internacional não somente para cenários

observáveis, mas também no estudo de cenários hipotéticos. Esse tipo de cenário hipotético poderia

ser exemplificado pelo projeto de criação de uma estação para empresas a 12 milhas náuticas da

costa de São Francisco (Blueseed), que estaria localizado em águas internacionais e traria desafios

associados a que tipos de leis e regulamentações tais empresas estariam submetidas. Em casos

hipotéticos como esse seria possível a utilização da abordagem em effectuation para sua análise e

promover a criação de conhecimentos em diversos ramos da literatura (SARASVATHY, KUMAR,

et al., 2014).

2.6 UPPSALA REVISITADO (2013, 2014)

Os artigos de Vahlne e Johanson (2013 e 2014) apresentam uma nova revisão do modelo

de Uppsala (2003). O novo modelo visa apresentar uma conciliação com o paradigma eclético de

Dunning para explicar a evolução das empresas multinacionais (MNE). Sendo assim, os autores

realizam uma avaliação na possibilidade de fundir esses dois modelos, assim como suas

implicações.

A revisão do modelo é útil, pois permite mais uma vez considerar de que forma a evolução

das teorias em administração podem modificar a abordagem de modelos tidos como estabelecidos.

Além disso, acredita-se que o modelo revisitado de Uppsala (2013 e 2014) poderia ser mais rico

na maneira de explicar o processo de internacionalização da empresa em análise, considerando uma

abordagem comportamental.

Inicialmente, os autores avaliam um dos pilares do paradigma (OLI), a teoria de

internalização, chegando à conclusão que na visão de um mercado como uma rede de

relacionamentos perde-se o sentido em tratar das vantagens de internalização como forma de

explicar o processo de internacionalização das empresas. Isso ocorre, pois é possível explorar

recursos sem controlá-los diretamente, visto a existência dos relacionamentos e suas vantagens

Page 94: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

82

associadas. Internalização de certas atividades pode ser um meio de obter vantagem, mas é apenas

uma das diversas formas de explorar oportunidades (VAHLNE e JOHANSON, 2013).

Levando em consideração tal conclusão e outros aspectos discutidos no artigo, os autores

concluem que uma fusão dos modelos é extremamente difícil, pois suas premissas seriam

fundamentalmente diferentes. Sendo assim, Vahlne e Johanson (2013) propõem que essa

aproximação poderia ser alcançada pelo desenvolvimento do modelo de Uppsala (2003) a luz das

teorias de capacidades dinâmicas, teoria do empreendedorismo e teoria de gestão de incertezas.

A utilização da teoria de capacidades dinâmicas permite ampliar a forma como

conhecimento e o reconhecimento de oportunidades são tratados, pois leva em conta de que forma

estes seriam capazes de produzir vantagens competitivas para as empresas. Além disso, passa a

descrever um papel mais proativo no desenvolvimento de conhecimento.

A teoria de capacidades dinâmicas é fundamentada na visão baseada em recursos (RBV)

em que tais capacidades funcionariam como motores na geração de vantagens competitivas para a

empresa. Neste contexto, em contraponto com as capacidades operacionais da firma que

determinam sua eficácia produtiva das operações correntes, as capacidades dinâmicas

determinariam a habilidade de uma firma em ajustar-se ao ambiente em questão, ou seja, realizar

mudanças estratégicas, o que contribuiria para impulsionar as capacidades operacionais da mesma.

Em um contexto de empresas multinacionais (MNE), os processos organizacionais da firma seriam

os mecanismos pelos quais as capacidades dinâmicas seriam implementadas e criadas, levando em

consideração um foco em processos organizacionais voltados para o aprendizado e para a inovação.

(VAHLNE e JOHANSON, 2013).

Dentre as capacidades dinâmicas, os autores chamam a atenção para a as capacidades

empreendedoras da firma. Levando em consideração o clima de incerteza existente em um mercado

de constantes mudanças em que os agentes proativamente buscam formas de melhor atender seus

clientes (capacidades dinâmicas), as capacidades do empreendedor (corporativo) em tomar

decisões em tais ambientes assume um caráter singular no gerenciamento empresarial. Nesse

contexto, Vahlne e Johanson (2013) caracterizam o processo empreendedor pelas descrições de

effectuation realizadas pelos trabalhos de Sarasvathy (2001). Através da utilização do princípio de

perdas aceitáveis, torna-se possível mitigar as incertezas desses cenários, pois o gerenciamento de

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83

oportunidades é realizado tendo como “rede de segurança” uma perda máxima aceitável, ou seja,

seria perseguida enquanto as perdas não assumissem um nível estabelecido. Além disso, ao

considerar o contexto da empresa multinacional (MNE) e da existência de uma certa

descentralização que dá uma independência aos agentes na empresa, as próprias firmas passam a

ser consideradas como redes em si (VAHLNE e JOHANSON, 2013).

Levando em consideração tais características, os Vahlne e Johanson (2013 e 2014) propõem

a seguinte atualização ao modelo de Uppsala (Figura 9).

O quadrante das decisões de comprometimento passa a utilizar o princípio de perdas

aceitáveis considerando investimentos (tangíveis e intangíveis) de maneira interna e/ou externa à

firma. Exemplos disso poderiam ser ações de comprometimento entre uma subsidiária e um

parceiro, sede e um parceiro, ou até mesmo sede com uma subsidiária, visto que todos os casos

considerados seriam redes. Os investimentos intangíveis seriam ações informais que sinalizassem

o comprometimento entre agentes (ex: um agente relevante da uma sede aprovando a atitude de

um tomador de decisão na subsidiária). Já os investimentos tangíveis, são considerados as

dimensões de “volume” (ex: recursos financeiros) e “grau” (dificuldade na adaptação a uso

alternativos) nas ações de comprometimento. Considerando as dimensões de “volume” e “grau” na

avaliação das decisões de comprometimento e utilizando um linguajar operacional das firmas, têm-

Fonte: Adaptado de Vahlne e Johanson (2014), p. 170

Figura 9 - Estrutura do modelo de Uppsala para a evolução da empresa multinacional (MBE)

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84

se as expressões “reconfiguração” e “mudanças na coordenação de sistemas” para representar

respectivamente a realocação desses recursos (VAHLNE e JOHANSON, 2013).

Os processos de aprendizado, criação de oportunidades, e construção de confiança através

da experiência direta de negociação entre os agentes nas redes de relacionamento é mantido

destacando-se sua relevância no caráter entre diferentes firmas. Ele é destacado, pois, embora seja

reconhecido a construção dessas características em um contexto dentro da organização (rede), o

caráter entre diferentes organizações seria o mais relevante (VAHLNE e JOHANSON, 2014).

A posição na rede passa a assumir três dimensões consideradas. A posição na rede externa

(external network position) seria uma avaliação da posição da rede em relação a redes

competidoras. A posição na rede interna (internal network position) considerada a posição da firma

em relação a outras firmas presentes na mesma rede em que está inserida. Por fim, a posição na

rede em foco (focal network position) consideraria a unidade em análise em relação ao “corpo” ao

qual faz parte (ex: subsidiária em relação as outras da mesma firma) (VAHLNE e JOHANSON,

2014).

Com relação às capacidades, a abordagem mais refinada do conhecimento considera a

empresa em suas capacidades operacionais, ligadas à eficácia produtiva das operações correntes da

firma, e das dinâmicas, explicadas a seguir. A capacidade de internacionalização, essencial no

desenvolvimento da empresa multinacional (MNE), seriam as capacidades em aproximação e

desenvolvimento em diferentes mercados com base em circunstâncias adversas. As capacidades de

redes de relacionamento seriam as habilidades de construir, desenvolver e coordenar

relacionamentos nas redes. As capacidades de desenvolvimento de oportunidades, crítica para o

processo de desenvolvimento da firma, estaria associada a habilidade de identificar oportunidades

e mobilizar recursos relevantes, tanto dentro da firma em questão como fora da firma (VAHLNE e

JOHANSON, 2013). Com relação ao desenvolvimento de oportunidades, Johanson e Vahlne

(2014) realizam uma subdivisão como forma de exaltar a importância das capacidades

institucionais do agente. Sendo assim, ela passa a considerar as capacidades empreendedoras,

formas proativas de melhora na unidade em análise, e as capacidades institucionais, relacionadas

aos ajustes às instituições, sejam elas dentro ou fora da firma (VAHLNE e JOHANSON, 2014).

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85

Por fim, cabe destacar que a estrutura proposta considera as diferentes dimensões de rede

consideradas (entre redes, entre empresas, dentro da empresa) ao considerar a análise de todas essas

variáveis, ou seja, é possível aplicar o modelo tanto na lógica de uma empresa multinacional quanto

empresas em fase de internacionalização mais iniciais.

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86

3. Método de pesquisa

O método utilizado para o estudo é de base qualitativa fundamentado em um estudo de caso

único. A seguir, serão abordados os aspectos acerca do problema de pesquisa, perguntas de

pesquisa, método de pesquisa, procedimentos metodológicos, e limitações para o método.

3.1 PROBLEMA DE PESQUISA

O foco da análise é entender o processo de internacionalização da empresa “Fazenda Ninho

da Águia” tendo por base uma abordagem das teorias comportamentais mencionadas na presente

revisão. Sendo assim, serão consideradas as seguintes perguntas de pesquisas:

1. Quais fatores motivaram a empresa a se internacionalizar?

2. Qual foi a relevância dos relacionamentos no processo de internacionalização?

3. Qual a relevância do papel do empreendedor no processo de internacionalização?

4. Quais aspectos influenciaram na ordem dos territórios internacionais que a empresa

passou a atuar?

5. Quais aspectos influenciaram o modo de entrada escolhido para os países em questão?

3.2 MÉTODO DE PESQUISA

Conforme mencionado, será utilizado uma abordagem qualitativa fundamentado em um

estudo de caso único.

Flick (2009, p. 12) defende que a pesquisa qualitativa tem ganhado espaço no estudo de

relações sociais tendo em vista o novo contexto caracterizado pela pluralização dos mundos de vida

(pluralization of life worlds). O argumento utilizado pela autora está alinhado com uma forma de

pensar pós-modernista, pois tipos de generalizações mais amplas estariam dando espaço a estudos

mais locais dos agentes e seus respectivos contextos. A partir dessa nova abordagem, o problema

enfrentado pelos pesquisadores seria mais desafiador tendo em vista a pluralidade de contextos e

perspectivas no processo de desenvolvimento teórico. Nesse contexto, a autora defende que os

métodos dedutivos de pesquisa não seriam próprios para a realização de estudos em cenários de

tamanha diferenciação do objeto. Sendo assim, a utilização de métodos indutivos de pesquisa

estaria ganhando espaço ao lidar de maneira mais personalizada com as variáveis em análise.

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87

Dentre outras propriedades, o método qualitativo permite uma maior flexibilidade no estudo

de assuntos complexos, pois permite uma maior aproximação do objeto de estudo e da construção

de significados ao longo do processo tornando possível uma análise holística e ampla do objeto de

estudo. Outra característica do método qualitativo é sua capacidade de captar diferentes

perspectivas com relação ao objeto de estudo, pois há uma diversidade de opiniões a coletar. Tal

diversidade é tamanha que opiniões contrárias podem coexistir em um mesmo estudo. Além disso,

o pesquisador passa a ser um agente reflexivo a respeito do processo, pois passa a ser um ator na

construção das interpretações acerca do que está sendo estudo. Por fim, o método qualitativo

permite a utilização de diversas abordagens e métodos para a condução do estudo a ser realizado

(FLICK, 2009, p. 15-16).

Gunther (2006) também explora aspectos da pesquisa qualitativa e a importância que o

entendimento de características contextuais influenciaria na análise da pesquisa realizada. Por um

lado, avaliar o fenômeno no ambiente em questão poderia aumentar a complexidade do estudo do

objeto, visto que não haveria controle de variáveis que possivelmente interfeririam no estudo. Por

outro lado, segundo o autor, a análise contextual do objeto em seu ambiente natural poderia

promover uma interação interessante entre este e o pesquisador.

Flick (2004) aborda a questão de interação indo além do momento da entrevista, o que daria

um espaço à questão da circularidade do processo em detrimento de um modelo mais linear de

pesquisa. O autor inclusive destaca a vantagem do uso desse método, pois levaria o pesquisador a

"refletir constantemente sobre todo o processo de pesquisa e sobre etapas específicas à luz das

outras etapas" (FLICK, 2004, p. 60). De maneira mais objetiva, seria possível solicitar do

entrevistado um esclarecimento maior acerca de perguntar previamente realizadas que não tenham

ficado claras.

Apesar dos aspectos positivos abordados, Flick (2009) aponta alguns desafios acerca da

garantia de qualidade em pesquisas qualitativas.

A plausibilidade seletiva é uma das questões abordadas, pois o pesquisador poderia utilizar

a seleção de trechos e citações que estivessem alinhados com o tipo de análise intencionada (p.

384). Outro aspecto estaria relacionado aos critérios de confiabilidade para avaliação da pesquisa

(ex: quixotica, diacrônica, sincrônica), assim como daqueles relacionados aos procedimentos (p.

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88

385-386). Além disso, há a questão da validade do estudo tendo em vista erros causados por

interpretações do pesquisador acerca de dados e procedimentos (p. 387). Por fim, um critério não

muito abordado levando em consideração que poderia não fazer sentido em um método

interpretativo, há a questão da objetividade do estudo também mencionada pela autora (p. 391).

Levando em consideração alguns dos desafios mencionados, Flick (2004) cita a importância

do "princípio da abertura", ou seja, estar aberto às diferentes informações fornecidas pelo

entrevistado. A relevância desse princípio no caso do entrevistador poderia ser observada em

situações que o levantamento bibliográfico realizado e/ou um preconceito acerca do problema de

pesquisa o induziria no momento da coleta de dados, ou seja, poderia gerar uma certa parcialidade

do entrevistador acerca das informações coletadas.

Com relação às diferentes abordagens em pesquisa qualitativa, estudo de caso tem sido

amplamente utilizado por diversos pesquisadores (THOMAS, 2011). A pesquisa através do estudo

de caso envolve a investigação e análise de um, ou mais casos, com o objetivo de capturar a

complexidade do objeto em estudo. Com relação a elaboração do estudo, um estudo de caso seria

definido mais pelo interesse de estudo no caso (s) em questão do que pelo método de

questionamento utilizado (STAKE, 1995).

Levando em consideração os desafios de qualidade em pesquisa qualitativa e algumas

abordagens em estudo de caso, críticas foram realizadas acerca da falta de uma estrutura

metodológica mais sólida. Hallberg (2013) aponta que estudos de casos com insuficientes

informações sobre o planejamento do estudo e do racional nos aspectos chaves das decisões

metodológicas poderia levar a pesquisa ser interpretada como de pouca qualidade e credibilidade.

Além disso, leitores poderiam ser confundidos pelo uso impróprio ou inconsistente de termos

utilizados na descrição da abordagem e método de pesquisa, o que poderia atrapalhar na

consideração das conclusões do estudo (SANDELOWSKI, 2000). Sendo assim, Meyer (2001)

justifica que o uso de uma base teórica sólida para guiar os estudos de caos poderia ser uma forma

de melhorar sua consistência, rigor e confiabilidade dos estudos.

Com base em tais críticas, Yin (2003) propõem uma abordagem para estudo de caso que

possua um protocolo cuidadoso nos aspectos relacionados a validade do estudo e potenciais vieses

com o objetivo de garantir que os elementos no caso sejam mensurados e descritos de forma

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89

adequada. Para o autor, a escolha pelo método de estaria associada com o tipo de perguntas de

pesquisa, o controle do pesquisador acerca dos comportamentos dos eventos em estudo, e o foco

em eventos contemporâneos em contrapartida a eventos históricos. Sendo assim, ele defende que

a escolha pelo estudo de caso estaria alinhada com questões relacionadas ao "como" e "por que",

em uma situação que o investigador teria pouco controle sobre os eventos, e com foco em

fenômenos contemporâneos. Sendo assim, a escolha pelo método estaria alinhada com o estudo de

caso único a ser realizado da empresa "Fazenda Ninho da Águia".

Em linhas gerais, a abordagem do método descrito por Yin (2003) possui algumas

características. O estudo possui cinco componentes: as perguntas de pesquisa; as proposições

referentes nas considerações teóricas; a (s) unidade (s) de análise; a lógica para estabelecer a relação

entre os dados e proposições; e o critério para interpretação dos achados. A partir disso, o autor

propõe uma forma sistemática de planejamento e condução do estudo. Neste são considerados a

preparação para a coleta de dados, a coleta de evidências em si, a análise das evidências, e a

composição dos relatos do estudo de caso.

Durante o processo de coleta de dados o foco dá-se nas habilidades do pesquisador que

incluem habilidades como realizar perguntas de forma clara, ouvir de forma cuidadosa, adaptar-se

a circunstâncias que possam surgir, direcionar os tipos de questões abordadas, e identificar vieses

pessoais. Além disso, a coleta de dados também deve considerar a obtenção de fontes múltiplas de

evidências de tal forma a criar-se uma base dados sobre o estudo de caso, e estabelecer uma

cronologia acerca dos eventos. O uso de fontes múltiplas de evidências tem por intuito garantir que

o pesquisador abranja de forma ampla a questão em estudo assim como desenvolver linhas de

raciocínio coerentes durante a análise dos dados encontrados (triangulação). Já a base de dados,

visa garantir uma maior organização para o pesquisador ao mesmo tempo que aumentaria a

credibilidade do seu estudo (YIN, 2003).

Com relação a análise de dados, seria considerada a seguinte linha de raciocínio para a

garantia de uma forma mais estruturada de análise. As proposições teóricas serviriam para conduzir

a análise do estudo de caso e manter o foco acerca dos dados em estudo. Em seguida, diferentes

explicações seriam consideradas acerca do fenômeno considerado. Por fim, uma estrutura

descritiva bem fundamentada deve ser utilizada para organizar as argumentações (YIN, 2003).

Page 102: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

90

Com relação a apresentação dos achados do estudo, diferentes configurações podem ser

adotadas para a descrever o caso em estudo, contudo deve-se ter em mente que o pesquisador

precisa abordar todos os tópicos considerados em sua pesquisa de forma que não incorra no risco

de estabelecer vieses (YIN, 2003).

Apesar da abordagem mais estruturada proposta por Yin (2003), o estudo de caso,

principalmente em caso único, traz desafios e desvantagens como a mencionada por Gil (1989) da

impossibilidade da generalização de dos resultados obtidos. Alves-Masotti (2006) reforçam essa

questão afirmando que pesquisadores poderiam analisar o caso de maneira isolada, ou seja, como

um fenômeno à parte, deixando assim de contribuir para a construção de conhecimento em geral.

Por outro lado, conforme Ventura (2007) aponta, uma vantagem do uso do estudo de caso

seria a possibilidade de análise mais profunda de diferentes dimensões na situação em questão, seja

em um estudo de caso único ou múltiplo.

3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Inicialmente foi realizado uma revisão de literatura acerca das teorias comportamentais

sobre o processo de internacionalização das empresas. A revisão de literatura já foi algo até

questionado acerca de sua necessidade na composição de um estudo qualitativo tendo em vista o

ideal defendido de que esse tipo de pesquisa teria como objetivo novos campos do conhecimento,

contudo seria algo pouco cuidadoso considerar que não houve qualquer menção ao campo de

estudo em questão levando em conta o tamanho e diversidade de literatura existente (Flick, 2009,

p. 48). Ventura (2007) também destaca a importância da revisão bibliográfica com o intuito de

enriquecer a argumentação utilizada pelo pesquisador assim como a utilização de critérios para a

elaboração de perguntas de pesquisa, objetivos do estudo, e conclusões. Gil (2008, p. 50-51)

também aponta a importância dessa pesquisa como forma de ampliar a capacidade analítica do

pesquisador sobre o fenômeno, contudo ele atenta para que sejam escolhidos trabalhos confiáveis

e de qualidade para que não haja reprodução de erros cometidos pelo tratamento equivocado de

dados secundários por outros autores.

Uma segunda etapa do estudo baseou-se no levantamento de dados como documentos e

publicações com o objetivo de aprofundar o conhecimento acerca do setor de café “gourmet” no

Brasil, e aprofundar o conhecimento acerca de possíveis políticas no ambiente internacional que

Page 103: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

91

pudessem influenciar nas atividades de internacionalização das empresas. Na consideração desses

dados secundários, Gil (2008, p. 51) destaca que essa fase seria semelhante ao da pesquisa

bibliográfica, contudo o volume de dados seria muito maior. Nesse contexto, haveria dois tipos de

dados a se considerar: "os documentos de primeira mão que não receberam tratamento analítico

como documentos oficiais, reportagens, cartas, etc."; e "documentos de segunda mão, que de

alguma forma foram analisados como relatórios, tabelas estatísticas, etc.".

A terceira etapa foi o levantamento de dados primários através condução de entrevistas com

os principais empreendedores representantes da empresa “Fazenda Ninho da Águia” com o intuito

de explorar o processo de internacionalização e criação da empresa. Yin (2003, p. 112-113)

argumenta que as entrevistas são as principais fontes de informação para o estudo de caso sendo

possível obter interpretações e opiniões pessoas acerca do objeto de estudo. Nestas, o respondente

é entrevistado durante um dado período de tempo assumindo um caráter espontâneo e informal

sobre os assuntos abordados. Por outro lado, o entrevistador também segue uma linha de perguntas

com o objetivo de abranger os diversos tópicos de pesquisa em questão. Além disso, Flick (2009,

p. 154) também destaca que o sucesso para condução de entrevistas está relacionado com as

habilidades do entrevistador, e em sua abordagem de perguntas que ao mesmo tempo sejam amplas

e aprofundadoras sobre os tópicos em questão. Por fim, cabe destacar que ao mesmo tempo que

essas percepções e interpretações são obtida, é necessário buscar fontes que corroborem ou

contrariem a opinião do respondente de tal forma a escapar da armadilha de permanecer somente

nas interpretações do respondente (YIN, 2003, p. 112-113).

O roteiro de pesquisa adotado está presente no apêndice A. Tal roteiro foi elaborado a partir

da revisão de literatura realizada e do levantamento de dados secundários. As questões abordadas

na pesquisa e a forma como serão analisadas são apresentadas a seguir (Tabela 8).

Page 104: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

92

Dimensão

Principais Variáveis

Aporte Teórico

Internacionalização

Gradual

- Modo de entrada no mercado

internacional

- Primeiro mercado no exterior

- Sequência da expansão internacional

- Importância dos indivíduos

- Ritmo da expansão internacional

JOHANSON E VAHLNE (1977)

JOHANSON E VAHLNE (2003 e 2009)

VAHLNE E JOHANSON (2013 e 2014)

Redes

- Relacionamentos anteriores (sociais

e/ou profissionais)

- Existência de parcerias no exterior

(formais e/ou informais)

- Papel das redes na expansão

internacional da empresa

- Posição da empresa dentro das redes

JOHANSON E MATTSON (1988)

Empreendedorismo

Internacional

- Processo de criação da empresa;

- Processo de busca pelo mercado

internacional;

- Escolha do mercado no exterior;

- Tempo decorrido entre a criação da

empresa e a efetivação do 1º negócio

no exterior;

- Estrutura de governança adotada

- Ênfase dada ao mercado doméstico /

internacional

OVIATT E MCDOUGALL (2004)

RENNIE (1993)

Effectuation

- Perfil do empreendedor

- Lógica de tomada de decisão

- Visão de futuro do empreendedor

- Posicionamento frente ao risco x

oportunidade

- Adaptabilidade da empresa a cada

mercado

SARASVATHY (2001)

SARASVATHY (2008)

SARASVATHY (2014)

Tabela 8 - Dimensão das Variáveis em Análise na Pesquisa

3.4 LIMITAÇÕES DO MÉTODO

O estudo de caso é um método que estaria inserido no âmbito de pesquisas qualitativas.

Sendo assim, incialmente seria possível apresentar que as limitações ao método poderiam ser

Fonte: Elaborado pelo autor com base em proposições teóricas abordadas no capítulo 2 desta

dissertação

Page 105: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

93

àquelas apresentadas anteriormente como critérios de qualidade em uma pesquisa qualitativa por

Flick (2009).

Yin (2003) apresenta dois aspectos que seriam problemáticos acerca do estudo de caso.

O primeiro é uma preocupação acerca da validade interna, pois o estudo de caso envolve a

realização de inferências. Quando algum evento não pode ser diretamente observado, o pesquisador

realizará algum tipo de inferência com o intuito de explorar a ocorrência de um determinado evento.

Em outras palavras, ele tentará explicar um fenômeno a partir das entrevistas e documentários

realizados ao longo do caso. O problema desse tipo de inferência seria a forma de julgá-la como

correta ou não, pois depende da qualidade de análise do pesquisador e de sua capacidade de

exploração de possibilidades diferentes. Embora haja formas de tornar tais análises melhor

estruturadas, não há uma forma clara de identificar todas as utilizadas pelo pesquisador (YIN, 2003,

p. 58)

Além disso, também há o problema referente a validade externa e das possibilidades de

generalizações do estudo. Nesse contexto, é importante entender a separação entre a generalização

estatística da generalização analítica. Tendo em vista a quantidade limitada de casos em estudo é

problemático a tentativa de realizar inferências acerca de uma população de agentes maior. Sendo

assim, é argumentado que a generalização possível estaria mais associada a capacidade de

extrapolar o instrumental teórico do estudo como forma de observá-lo em situações similares. A

vantagem desse tipo de argumento é que aprendizados pontuais realizados em estudos de caso

podem estimular o surgimento de novas teorias no âmbito da literatura em questão (YIN, 2003, p.

58).

Page 106: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

94

4. Estudo de Caso

Nesse tópico será abordado o estudo de caso realizado com a empresa “Café Fazenda Ninho

da Águia”. A empresa é uma propriedade rural produtora de cafés especiais localizada em Alto

Caparaó, interior de Minas Gerais na divisa com Espírito Santo.

O estudo será dividido em 4 grandes tópicos: “História da Empresa”, “Processo de

Internacionalização”, “Empresa Hoje”, e “Futuro da Empresa”. O tópico “História da Empresa” irá

tratar das a história da empresa desde a sua criação até os dias de hoje (2016), e será dividido em

dois subtópicos para contrastar dois momentos distintos vividos pela empresa. O tópico “Processo

de Internacionalização” irá tratar em mais detalhes o processo de internacionalização vivido pela

empresa assim como considerar aspectos como desafios enfrentados. Em “Empresa Hoje”, será

retratado a sua atual situação e será apresentado algumas perspectivas de seus empreendedores. Por

fim, “Futuro da Empresa” tratará dos rumos futuros desta.

4.1 HISTÓRIA DA EMPRESA

A seguir, será apresentado a história da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”,

considerando uma ordem cronológica dos eventos. O tópico será dividido em dois períodos

históricos, pois a chegada de um novo empreendedor representaria um novo rumo para o futuro da

empresa. Cabe ressaltar que ao longo do texto serão utilizadas formas reduzidas para referir-se à

empresa. Por fim, um resumo dos principais acontecimentos será exposto (Figura 10).

4.1.1 ANTES DE 1996

A história da fazenda Ninho da Águia começa propriamente em 1969, quando seu atual

proprietário, Aídes Gomes Monteiro, comprou a mesma de seus familiares.

Aídes Gomes Monteiro nasceu em 1939 no interior de Minas Gerais, na cidade de Alto

Caparaó. É uma pessoa de vida simples que faz parte de uma grande família (25 primos). A região

em que cresceu era bem simples faltando elementos como educação básica (escola). Ainda garoto,

para que ele e outras crianças da região pudessem ter uma educação básica, foi realizada uma união

financeira ("vaquinha") com apoio de uma igreja adventista local para contratar uma professora

que viria do Rio de Janeiro. Já em sua vida adulta, sua educação foi complementada com um curso

por correspondência para a Aeronáutica Brasileira (Cadetes do Ar).

Page 107: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

95

Antes de entrar em mais detalhes acerca da vida de Aídes e sua relevância para a fazenda,

é necessário estabelecer um contexto acerca da propriedade e da região em questão, pois ajudará a

compreender melhor o processo de tomada de decisão realizado ao longo de sua história.

No início dos anos 60, Aídes relata que um estudioso de Carangola (MG) visitou a região

de Alto Caparaó para realizar uma avaliação da região. Após estudos, formulou uma proposta para

a criação de um parque nacional, o atual “Parque Nacional de Caparaó”, com o objetivo de

promover a preservação ambiental da região, visto a riqueza de recursos hídricos, fauna, e flora

local. Nessa época, o futuro presidente Jânio Quadros tomou conhecimento da proposta e, após

eleito, criou o "Parque Nacional do Caparaó" pelo decreto federal número 50.646, em 24 de maio

de 1961.

(Aídes) Um senhor, muito inteligente, dessa região de Carangola veio para

cá e começou a estudar a região. Ele fez o projeto para criar o parque e o

Jânio Quadros passou a fazer campanha política aqui. Em seguida, o

estudioso foi até Jânio e entregou o projeto de criação do parque: "Oh,

doutor Jânio, se o senhor ganhar a presidência da república, assina um

decreto criando o parque nacional. Vamos preservar a riqueza que nós

temos lá em cima. São mais de 1.000 nascentes de água que tem naquela

montanha. Vamos preservar aquilo". Jânio olhou e falou: "Se eu ganhar

vou assinar". Botou aquilo no bolso e foi embora.

Paralelamente a inauguração do parque, Aídes buscava uma maneira de legitimar terras que

pertenciam a membros de sua família nos arredores do “Pico da Bandeira”, marco este contido

dentro do então criado “Parque Nacional do Caparaó”. Esse era um procedimento legal necessário,

pois, embora fossem áreas ativamente utilizadas e de posse de sua família há anos, devido às

limitações de infraestrutura legal da região e da época, tais documentos ainda não haviam sido

obtidos. No início dos anos 60, tendo em vista que um parente de Aídes era alta patente na

Aeronáutica e amigo pessoal de Jânio Quadros, a legitimação das terras foi realizada. Após a

legitimação, a propriedade que futuramente seria conhecida como "Fazenda Ninho da Águia", ficou

em posse de diversos membros da família de Aídes.

Voltando para a história de Aídes, em 1960 ele se mudou para São Paulo. Uns anos depois,

abriu uma pequena loja de comércio de produtos diversos (roupas, brinquedos, papelaria, etc.)

localizada no Brooklyn, em São Paulo. Apesar disso, Aídes relata que tinha um desejo de voltar

para Alto Caparaó, pois mantinha um apreço muito grande pela região considerando sua beleza

natural, clima, e pessoas do local. Após juntar uma quantia considerável de recursos próprios, em

Page 108: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

96

1969 comprou de seus familiares os direitos por uma parcela da propriedade, iniciando o cultivo

de café nos anos de 1969-70. As demais parcelas da propriedade foram compradas ao longo dos

10 anos seguintes, também por recursos próprios.

(Aídes) Comecei a trabalhar nos anos de 64, 65 (em São Paulo). Juntei e

comprei em 69 uma parte, uma outra mais uns 5,6 anos depois, e outra

mais uns 4,5 anos após isso. A propriedade era bastante grande e estava

um pouco dividida na mão de herdeiros que já a estavam usando.

Com relação a escolha pelo cultivo de café, cabe ressaltar que nem a propriedade nem a

região possuíam tradição nesse cultivo. A propriedade sempre fora utilizada, em sua maior parte,

para o cultivo de cabeças de gado. Já a região, apresentava dois desafios para o café. Primeiro,

havia um fator climático histórico que prejudicava o cultivo do café, pois, por ser uma região mais

fria. O segundo desafio era uma imagem denegrida do local, pois a região seria considerada como

a de pior café do Brasil, em termos de qualidade. Mesmo levando em consideração esses desafios,

o preço de venda do café estava muito atraente na época, razão pela qual o cultivo foi o escolhido

para a fazenda.

Durante aproximadamente as duas primeiras décadas sob o controle de Aídes (1969-96), a

responsabilidade pela produção e manutenção das mudas de café era realizada pelo seu irmão. Dois

aspectos teriam influenciado para tal decisão. Primeiro, Aídes estava morando em São Paulo

enquanto seu irmão já era um residente local de Alto Caparaó. Segundo, não havia alguma

estratégia ou ambição maior acerca do destino da propriedade, somente um desejo de mantê-la

rentável sem que fosse necessário aportar recursos externos para mantê-la. Cabe ressaltar que a

relação de trabalho estabelecida não representava uma sociedade na posse da fazenda, sendo um

acordo informal entre as partes.

(Aídes, sobre a fazenda) Não. Não. Sempre minha. A única sociedade que

eu dava é que eu dava uma parte do café e a “meia” para ele. Ele tomava

conta para mim ficando uma parte do café produzido para ele e outra parte

para mim.

(Aídes) Isso, para não precisar ter que trazer dinheiro de fora. Minha

intenção era produzir para manter, crescer e desenvolver a propriedade

com recursos da própria propriedade.

Durante essa fase inicial do cultivo de café (1970-90), Aídes comenta alguns dos desafios

enfrentados, a forma que lidou com eles, e alguns facilitadores. Antes de comentar tais desafios, é

Page 109: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

97

relevante fazer uma pequena digressão acerca das características do cultivo do café para facilitar o

entendimento da questão.

De acordo com informações de Aídes e Clayton, o cultivo do café inicia-se pelo plantio de

uma muda no solo, que necessita de cuidados especiais para que não morra. Durante os primeiros

2-3 anos, a muda cresce verticalmente assumindo o formato de uma "árvore". Após isso, começa a

dar frutos cerca de 3-4 vezes ao ano, período esse denominado “florada”. O número de floradas

pode variar ligeiramente dependendo de diversos fatores, mas em geral mantem essa média ao

longo toda a vida útil da planta, que pode chegar a viver inúmeras décadas (pelo menos uns 25

anos). Quando uma dessas "árvores" está muito "velha" (critério do agricultor) ela pode ser cortada

e replantada, reiniciando seu ciclo. Com relação as propriedades do café, diversos são os fatores

que afetam seu sabor e qualidade, dentre eles: nível de "terroir" do solo, microclima da região, água

utilizada na irrigação, exposição ao sol, e adubo utilizado. A influência desses fatores é tão

significativa que, em certas circunstâncias, dentro de um raio inferior a 1 km, ou até menos, pode-

se encontrar cafés com propriedades significativamente diferentes na mesma propriedade. Além

disso, outro fator que influencia na qualidade do produto final é o tratamento pós-colheita, sendo

explicado em mais detalhes em um momento posterior (Apêndice B).

Voltando a questão dos desafios ao cultivo do café na região de Alto Caparaó, o clima frio

e úmido da região aliado ao formato acidentado do relevo apresentavam-se como um desafio, pois

a geada acabava destruindo muito das mudas plantadas. Sendo assim, bananeiras foram plantadas

em diversas partes da fazenda para reduzir a velocidade dos ventos e amenizar os efeitos do frio.

Outro desafio relatado seria a dificuldade no acesso a uma orientação técnica relacionada ao

cultivo, pois haveria uma carência de órgãos nesse sentido. Inclusive, segundo Aídes, essa carência

permanece até os dias de hoje.

(Aídes) Você não tinha uma orientação técnica para saber a maneira que

tinha de plantar o café.

(Aídes) No começo a gente perdeu muita muda de café porque era muito

frio, caía muita geada. Começamos até a fazer umas barreiras com

bananeira. Em volta (do café) a gente plantava bananeira para segurar um

pouco o vento, segurar um pouco o frio.

Ironicamente, a dificuldade de manter as mudas vivas nos primeiros anos acabou de certa

forma beneficiando a produção de café, pois, tendo em vista que estas foram plantadas em carreiras

Page 110: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

98

mais longas e com pés mais afastados uns dos outros, a produtividade dessas árvores era mais

elevada, visto uma maior exposição à luz solar. Além disso, outro ponto positivo para o cultivo foi

o próprio solo, pois, sendo muito fértil, reduziu o esforço necessário para manter as mudas, além

de aumentar sua produtividade.

De maneira resumida, o panorama geral do plantio de café não apresentou consideráveis

mudanças durante o período de 1969 a 1996. Entretanto, a participação de seu filho, Clayton, no

final da década de 90, trouxe profundas mudanças ao processo produtivo e escopo comercial da

fazenda. Sendo assim, será explicado a seguir tais mudanças e a trajetória profissional de Clayton.

4.1.2 DEPOIS DE 1996

Clayton Barrosa Monteiro, filho de Aídes Gomes Monteiro, morou a maior parte de sua

juventude no Brooklyn, São Paulo, perto de onde seu pai possuía a loja de comércio diverso.

Durante esse período, teve um contato frequente com o dia a dia da loja de seu pai. Aos 16, mudou-

se para o litoral de São Paulo, pois, dentre outros aspectos, buscava uma proximidade do oceano

para praticar surfe, algo que sempre gostou e pratica até os dias de hoje. Permaneceu no litoral de

São Paulo por cerca de 4 anos sendo que, durante esse período, serviu no exército por cerca de 1

ano e 4 meses no forte em Itaipu, Praia Grande. Após seu período no exército, Clayton voltou para

a cidade de São Paulo. A saída do serviço militar representou um momento de transição na vida de

Clayton, pois estava avaliando diferentes rumos profissionais e pessoais. O resultado desse

processo de reavaliação seria justamente a escolha por trabalhar na fazenda de café de seu pai, no

lugar do irmão de Aídes.

Com relação a decisão tomada, dois aspectos teriam influenciado bastante. Primeiro, café

não era uma novidade na vida de Clayton. Durante sua juventude, seu pai costumava levá-lo todo

ano para a lavoura de café. Nessas viagens, destacava a importância dos lavradores no processo de

manutenção do café, pois eram pessoas dedicadas suportando todo tipo de dificuldades. Sendo

assim, desde pequeno foi acostumando-se com a região e criando um certo vínculo afetivo com o

lugar e as pessoas. Além disso, tendo em vista seu gosto pela leitura, a admiração pela região e o

cultivo realizado serviram de estímulo para que manter-se atualizado em assuntos relacionados ao

mercado de café.

Page 111: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

99

(Clayton) O que eu tinha de cultura era da leitura (sobre o café). Sempre

me interessei muito pelos assuntos de café, variedades, mercado, o que as

pessoas estão tomando, como são os cafés que vão lá para fora.

Segundo, enquanto estava em São Paulo refletindo sobre suas escolhas, em uma conversa

com um de seus tios, foi aconselhado a ir para a região de Alto Caparaó trabalhar com café. De

acordo com o tio, "café você (Clayton) trabalha 6 meses e os outros 6 você fica sem fazer nada".

Esse cenário era muito atraente para Clayton, pois poderia ficar 6 meses trabalhando na fazenda e

6 meses praticando o surfe. Sendo assim, como próprio Clayton descreve, decidiu por "fazer o

caminho inverso" de seu pai, ou seja, optou por uma vida no interior em detrimento da capital.

(Clayton) Meu tio que estava lá (São Paulo) passando um final de ano. Na

época eu estava meio perdido sem saber o que fazer da vida. Ele falou:

"Por que você não vai lá para Caparaó que seu pai tem umas terras e planta

café? Café você trabalha 6 meses e os outros 6 você fica sem fazer nada".

Pensei, “opa, era tudo que eu estava precisando, pois, sendo surfista, fico

6 meses na fazenda e 6 meses na praia”.

De maneira resumida, a “bagagem” cultural que Clayton levava consigo quando decidiu

trabalhar na fazenda em 1996 era de um segundo grau completo, um gosto pela leitura e

aprendizado, um apreço pelos trabalhadores e pela região, uma experiência com o padrão

organizacional militar, e uma certo conhecimento da a área de negócios.

Levando esses aspectos em consideração, a chegada de Clayton por si só representaria uma

visão "fresca" para o gerenciamento da fazenda, pois suas experiências profissionais e pessoais

seriam bem distintas daquelas do irmão de Aídes.

Antes de entrar em detalhes das mudanças introduzidas por Clayton, para facilitar o

entendimento das comparações realizadas mais à frente é necessário realizar duas digressões.

Primeiro, detalhar o sistema produtivo que atuava na fazenda, sistema esse que, de acordo com

Clayton, também era utilizado pela maioria das fazendas da região. Segundo, abordar as variáveis

que afetam na qualidade final do café, além daquelas descritas previamente (nível de "terroir" do

solo, microclima da região, água utilizada na irrigação, exposição ao sol, adubo utilizado).

De acordo com Aídes, as fazendas funcionavam em um sistema de misto de parcerias entre

o proprietário e os lavradores. Uma parcela do terreno ficava sob total responsabilidade do

proprietário, e a outra funcionava em um sistema de “meias”. De maneira geral, no sistema de

"meias" o proprietário cede (autorização apenas) uma parte do terreno para que o lavrador,

Page 112: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

100

doravante conhecido como "meeiro", a cultive. Em contrapartida, o meeiro cede uma parcela do

que ele produz ou 100% do produzido, ficando neste último caso com uma parte do faturamento

da venda. Com relação aos trabalhos realizados, o proprietário pode ajudar em aspectos secundários

da manutenção da "meia", por exemplo: fornecer equipamentos, pagar uma parcela dos adubos,

apoio técnico, etc. Apesar disso, fica sob responsabilidade do "meeiro" a manutenção (mão-de-

obra) da lavoura, e possivelmente aspectos da colheita. Na maioria dos casos, o meeiro também é

morador da própria "meia", construindo uma casa para ele e sua família.

De acordo com Aídes e Clayton, no caso da fazenda “Ninho da Águia”, uma grande parte

ficava sob total responsabilidade do proprietário (preparo, manutenção, colheita e beneficiamento),

mas uma boa parte (não há dados disponíveis) ficava sob o sistema de "meias", operando da

seguinte forma: o proprietário preparava o terreno com as mudas de café até o momento que

começavam a ser produtivas, ajudava no pagamento dos adubos para a manutenção (50%),

fiscalizava práticas que eram utilizadas na manutenção, dava algum apoio técnico no sentido de

equipamentos para a colheita, e ficava sob total responsabilidade da pós-colheita (beneficiamento).

Já o meeiro, ficava com a responsabilidade da manutenção (mão-de-obra), realizava a colheita

(poderia ter auxílio em certos casos), ficava com uma parte da produção, e poderia morar na "meia"

utilizando a parcela não produtiva do terreno para outras destinações (leite, ovos, pêssegos, etc.).

Clayton relata que no caso das outras fazendas da região, elas utilizavam um sistema de

"meias" similar, cultivando quase que em sua totalidade café. O importante a destacar dessas outras

propriedades era a presença de famílias que praticavam o cultivo há diversas gerações, mas que

possuíam uma certa limitação técnica e educacional acerca do próprio cultivo. Em outras palavras,

eram famílias que dominavam práticas do que "funcionava", ou não, na hora de cultivar, mas que

desconheciam variáveis técnicas que influenciavam na eficiência produtiva e na qualidade final do

produto. Por outro lado, cabe ressaltar que até o início dos nos 2000 não havia uma predominância

muito grande acerca de uma cultura de “qualidade” no café (cafés especiais), mas sim de uma

cultura de produção (“commodity”).

(Clayton) Achei muito estranho quando cheguei aqui porque a cultura

local era que eles iam produzindo e vendendo sem critério.

(Clayton) O nosso produtor até hoje sabe muito pouco de café, muito

pouco.

Page 113: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

101

Com relação ao café, além das características mencionadas, há outros fatores que

influenciam na qualidade final e nas nuâncias de sabores. Levando isso em consideração, há

aspectos da colheita e pós-colheita (beneficiamento) que devem mencionados. Durante a colheita,

misturar grãos de café em estágios de amadurecimento diferentes afeta o sabor final quando

moídos, pois o café maduro é mais adocicado enquanto o menos maduro pode ser extremamente

amargo. Além disso, no pós-colheita, os tipos de secagem e torrefação afetam também na qualidade

e no sabor final do produto.

Voltando a questão da história da fazenda, durante o período inicial, de 1996 a 2002, pode-

se dizer que Clayton estava em um período de adaptação no gerenciamento da propriedade, pois

passou a envolver-se em todas as etapas do processo produtivo, desde o cultivo até a venda.

(Clayton) Eu não tinha nem ideia do que eu ia fazer. Eu comecei a trabalhar

e.… ainda não se falava tanto em qualidade de café, então minha ideia

inicial era produção. Você plantava e cuidava para produzir cada vez mais.

Com relação a parte administrativa, Clayton passou a gerenciar o seguinte processo

produtivo. Levando em consideração que muitos dos pés de café continuam produtivos por vários

anos, a maior parte da manutenção era direcionada ao manejo de poda. O sistema de irrigação

utilizado era o de "Papai do Céu", como Clayton descreve, pois o regime de chuvas regularia de

forma suficiente a necessidade de água das plantas. A colheita é realizada de forma manual,

chegando a usar escadas (pés de café são surpreendentemente grandes), podendo ser contratado

trabalhadores temporários (Apêndice C). O pós-colheita (beneficiamento) pode passar por

diferentes processos, mas sempre passa por algum tipo de secagem (secador de café, terreiro

suspenso, estufa, etc.) ou até mesmo uma sequência destes. Cada forma de secagem atribui um

aroma diferente ao café, além do aroma diferente que pode existir dentro de uma mesma colheita

por fatores climáticos previamente abordados, sendo devidamente verificados através do "teste de

xícara" (literalmente o que significa). O resultado desse processo é o chamado "café verde" (na

verdade tonalidades de verde e amarelo são possíveis, mas esse é o nome atribuído). Por fim, o

café pode ser comercializado "verde" ou passar por um processo adicional de torrefação, sendo

comercializado como café “torrado”.

Levando em conta a observação desse processo produtivo, desde o início, de acordo com

Clayton, já notava alguns aspectos que o fizeram repensar sobre a forma que o café estava sendo

cultivado, colhido e vendido.

Page 114: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

102

Ele percebeu que muitos dos lavradores locais estavam colhendo o café de maneira única,

ou seja, colhiam diversos frutos que estavam em estágios diferentes de amadurecimento

(economizar trabalho) e colocavam todos juntos para serem vendidos "verdes" (nome dado ao café

vendido em grãos depois de secado). Sendo assim, embora aumentasse o trabalho, Clayton optou

por uma coleta mais seletiva dos grãos para que não houvesse tal mistura.

(Clayton) Porque o café é o seguinte, nós estragamos o café na colheita e

na torra. Lá no pé ele é 100 (pontos). Quando ocorre o manuseio, você

começa a estragar ele.

(Aídes) Se você botar um grão verde no meio do maduro você estraga o

café, pois o verde é amargo. A qualidade do café perde totalmente. Fica a

tal de "bebida dura" que eles falam, o café ruim. O café que amadurecia

primeiro eles ficavam esperando. Quando o segundo também amadurecia,

eles apanhavam juntos.

Outra decisão foi a de acabar com a utilização de agrotóxicos no cultivo, transformando em

um cultivo que fosse 100% orgânico. Por fim, percebeu que era uma prática local deixar os piores

grãos de café para consumo pessoal, algo que para ele não fazia sentido. Sendo assim, passou a

fazer justamente o oposto, pois assim seria possível entender a qualidade do café que está sendo

produzido.

(Clayton) O pior café que tinham era o que deixavam para beber em casa.

Então eu passei a fazer exatamente ao contrário, sempre escolhia o lote

mais bonito e deixava para beber aqui em casa.

(Clayton) ...desde que vim para cá decidi de não usar agrotóxico.

Com relação às ações implementadas por Clayton, estas teriam sido em função dele

acreditar que seriam práticas melhores, e não necessariamente com uma visão estratégica mais

abrangente. Além disso, algo que teria facilitado implementar tais mudanças seria o bom

relacionamento entre Clayton e seu pai, pois sempre mantiveram um diálogo informal no processo

de tomada de decisão da fazenda, não sendo necessário algum tipo de documento formal ou

obrigação contratual entre as partes.

(Clayton) A gente conversa, até mesmo com o pessoal que está

trabalhando para definir mais ou menos o que vai fazer, mas a decisão final

é a gente mesmo. É uma coisa mais informal mesmo.

Levando em consideração as mudanças realizadas, foi possível aumentar a qualidade do

café produzido na fazenda. Apesar disso, ainda não havia impactos significativos no resultado da

empresa. De acordo com Clayton, em retrospecto daquela época, dois aspectos contribuíram para

Page 115: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

103

tal resultado. Primeiro, uma carência de demanda por cafés especiais no Brasil. Segundo, com

relação ao custo, a decisão do não uso de agrotóxicos aumentava a necessidade de utilização de

mão-de-obra.

(Clayton) Você não vai usar herbicida, não vai usar nada que você pudesse

economizar no custo da mão-de-obra, então a nossa mão-de-obra é bem

pesada, dá muito serviço todo dia, tem um custo alto.

(Clayton) ...era muito difícil porque não tinha mercado (mercado nacional

para cafés especiais).

Tal cenário foi lentamente sendo modificado com a chegada das cafeterias especiais,

principalmente em São Paulo, no início dos anos 2000. As cafeterias foram importantes, pois

introduziram de forma mais eficiente a cultura do "tomar um cafezinho" focado mais na questão

da qualidade do café. Segundo Clayton, dois aspectos teriam influenciado isso. Primeiro, as

cafeterias e seus “baristas” (especialistas em café) selecionavam cafés especiais produzidos

nacionalmente e internacionalmente, apresentando-os de forma instrutiva a seus clientes. Sendo

assim, as cafeterias estariam "educando" seu público alvo sobre as características de um bom café.

Segundo, seriam um canal de venda importante, pois não era tão simples encontrar cafés especiais

vendendo em supermercados e outras lojas. Além disso, a relevância ainda maior das cafeterias

para a fazenda “Ninho da Águia” teria sido na forma como suscitaram Clayton a vislumbrar um

novo mercado. Isso ocorreu, pois, quando Clayton começou a experimentar os cafés especiais

nesses estabelecimentos, percebeu que o café que produzia era, na maioria das vezes, tão bom

quanto ou superior ao que ali tomava. Sendo assim, Clayton decidiu que este seria o mercado que

gostaria de atuar.

(Clayton) Depois dessa época, 2002, 2003, começou a abrir umas

cafeterias, começou a se falar de café especial. Eu ia, provava esses cafés

e falava: "poxa, aqui a gente tem um café especial. Então vamos focar

nisso aí". Mas demorou até isso virar (se referindo à apreciação por cafés

especiais no mercado).

O interesse de Clayton teria sido pela receita maior dos cafés especiais representava, visto

o markup mais elevado em comparação ao café “commodity”, e por perceber no potencial de

qualidade que a região de Alto Caparaó possuía para tal cultivo. Levando em consideração que o

mercado nacional de cafés especiais ainda era muito embrionário, Clayton optou por focar na

atuação no mercado internacional.

Page 116: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

104

Apesar disso, o mercado internacional apresentava duas barreiras principais. Primeiro,

localizar os clientes apropriados para a venda do produto. Segundo, mesmo após encontrar tais

clientes, o custo para exportação direta (container fechado) era muito elevado, tornando necessário

a prática de "dividir" custos do container com outros exportadores. Essa prática é utilizada, entre

outros exemplos, por associações de fazendeiros em que há uma divisão dos custos de maneira

“pro rata” ao volume do container.

A necessidade de dividir tais custos juntamente com a vontade de Clayton em desenvolver

a região fez com que propusesse aos fazendeiros locais a criação de uma associação focada na

exportação de cafés especiais. Apesar disso, a associação foi recusada.

Levando em consideração o caráter mais humilde das famílias que residem na região e a

mentalidade da época focada em quantidade de café produzido, a proposta não parecia fazer sentido

aos fazendeiros. Além disso, não davam credibilidade a Clayton considerando sua recente atuação

na produção de café, pois, enquanto Clayton possuía nem 10 anos de experiência de café, havia

produtores com décadas de experiência.

(Clayton) Tentei fazer uma associação com os outros produtores porque

eu era pequeno naquela época e isso que eu faço agora de vender micro

lote, de vender café aqui dentro do Brasil para cafeteria, isso não existia,

então tinha-se que pagar um container para exportar.

(Aídes, sobre a resposta dos fazendeiros) “Não vamos perder tempo com

isso não, com um surfista sonhador, está chegando aqui agora e quer

inventar coisa. Nós que estamos aqui há 100 anos mexendo com café”.

Clayton ficou bastante desanimado na perspectiva de atuar nesse mercado, ainda mais

porque sua fé e apreço pela região não teriam sido correspondidos pelos fazendeiros locais. Apesar

do desapontamento inicial, o apoio de seu pai, que havia voltado a morar em Alto Caparaó no ano

2000, teve um caráter revigorante na perseverança de Clayton, pois o fez perceber que essas

barreiras iniciais fazem parte do processo de todo empreendedor. Além disso, Aídes disse que uma

forma de ganhar credibilidade seria justamente provar na prática que produzir cafés especiais era

lucrativo. Sendo assim, Clayton continuou na tentativa de atuar no mercado internacional de cafés

especiais.

(Aídes, sobre o conselho que deu a seu filho) Meu filho, é isso mesmo.

Você está chegando agora e nunca mexeu com café. Como que eles vão

acreditar em você? Mas nós vamos fazer um café bom e na hora que nós

fizermos vão passar a acreditar que aqui dá café bom, que compensa fazer.

Page 117: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

105

Levando em consideração o foco definido, o período do início dos anos 2000 até 2010 seria

marcado pelo aprendizado e na tentativa de entrada no mercado internacional de cafés especiais.

Do ponto de vista produtivo, o processo de gerenciamento e cultivo na fazenda promoveu

vários "insights" que possibilitaram implementar técnicas diferentes no plantio. Cabe ressaltar que

tais aprendizados foram pela experiência direta no cultivo, ou seja, via tentativa e erro.

O mais relevante desses "insights" teria sido aprender as nuâncias dos sabores de cafés

dentro da própria fazenda, tendo em vista o conjunto de características previamente abordados.

Além disso, a comercialização no mercado brasileiro de café também ajudou para que conhecesse

melhor os agentes nele atuantes, além de sua mecânica de funcionamento.

(Clayton) A gente foi descobrindo que pegando esses cafés e secando

separadamente, anotando e tal, a gente tinha uma diversidade grande de

sabores de cafés, tudo da mesma propriedade, às vezes até na mesma

variedade.

Com relação a atuação no mercado internacional, Clayton tentou buscar o reconhecimento

que obteria caso "provadores de café" brasileiros aprovassem seu café. Esse reconhecimento era

importante, pois era uma forma de atrair a atenção de potenciais clientes, levando em conta que há

uma quantidade grande de fazendas de café no Brasil. Contudo, encontrou dificuldades para atrair

os provadores, pois seu café possuía características que não estavam no "padrão de qualidade"

nacional, que era o cereja descascado. Ironicamente, justamente as características intrínsecas do

café da fazenda que não estavam nesse "padrão de qualidade" seriam responsáveis pelo seu sucesso

no futuro, mas isso será detalhado mais à frente.

(Clayton) A gente tinha uma dificuldade muito grande porque nosso café

a maior parte é natural, e os cafés naturais não estavam no padrão de

qualidade que era o padrão aqui do Brasil, o cereja descascado. Então o

provador tinha dificuldade de vir aqui para provar esses cafés.

Cabe ressaltar que esse processo ativo de busca por um espaço no mercado nacional e

internacional foi algo demorado, pois, além de não haver um amparo muito eficiente do Estado

para os pequenos fazendeiros, a educação e infraestrutura de acesso a informação era extremamente

limitada.

(Clayton) A gente não tem internet na fazenda. Até 2012 eu não tinha nem

telefone celular, nem e-mail. Meus amigos de São Paulo diziam: "até índio

tem...", eu respondia, "poxa, mas eu não uso. Eu moro na fazenda, aqui

não tem, o trabalho que eu faço não precisa de internet (risos)”.

Page 118: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

106

(Clayton) Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.

A dificuldade em atrair provadores fez com que Clayton buscasse outras formas de

aumentar o reconhecimento da fazenda. Segundo o empresário, levando em consideração as

melhorias implementadas ao longo da primeira década de 2000 e um acúmulo de conhecimento

acerca do mercado de café, Clayton decidiu, em 2011, certificar a fazenda através de um selo

chamado "Certifica Minas" da EMATER-MG.

A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER-

MG) é a maior empresa pública do setor agrícola no Brasil. De acordo com o site da empresa, ela

tem por finalidade promover o desenvolvimento sustentável, por meio de assistência técnica e

extensão rural, assegurando a melhoria de qualidade de vida da sociedade mineira. O selo "Certifica

Minas" é essencialmente uma certificação do "uso sustentável" da propriedade agrícola, além de

registrar informações acerca da fazenda que originou o café. De forma mais completa, é um selo

direcionado a: identificar propriedades produtoras de café, inclusive orgânico, visando à

rastreabilidade, manutenção e melhoria da qualidade como instrumento de valorização dos cafés

mineiros; manutenção e conquista de novos mercados por meio da qualidade; manutenção e

ampliação dos empregos gerados e aprimoramento do atendimento, manutenção e recuperação das

reservas legais, e manejo adequado de solo. Sendo assim, o selo atribuía um caráter mais

"profissional" ao café produzido na fazenda, pois ao mesmo tempo possuía informações de

rastreabilidade do produto e garantia um uso sustentável do terreno, ambas características de

extrema relevância para o mercado internacional.

(Aídes) ...Tivemos que certificar a propriedade para caracterizá-la como

livre de agrotóxicos... O certificado se chama, "Certifica Minas", da

EMATER.

Além disso, no mesmo ano que decidiu certificar a fazenda, participou do concurso regional

de café de Manhuaçu (MG). A participação em concursos envolve o envio de pelo menos uma

amostra de café para ser avaliada por uma diversidade de critérios, dentre eles o teste sensorial

(“teste de xícara”). Clayton enviou duas amostras e, embora muito esperançoso, não conseguiu

ficar entre os primeiros lugares do concurso. Ficou extremamente decepcionado, pois acreditava

ter preparado o café com todos os cuidados necessários. Ironicamente, ao perguntar a alguns

jurados do concurso o porquê de seu café não ter performado entre melhores, recebeu a resposta

de que acharam seu café “o melhor de todos”, contudo a umidade estava acima dos padrões

Page 119: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

107

considerados "normais", o que fez cair a nota do café. Em outras palavras, teria sido um critério

técnico que o separou dos primeiros lugares.

(Aídes sobre o concurso) O café foi muito bem, mas não ficou nos

primeiros lugares. Ele (Clayton) ficou meio decepcionado, mas ao

conversar com os juízes, eles disseram: "O melhor café que veio aqui foi

o seu, mas estava com a umidade acima do normal"

Em 2012, participou no mesmo concurso regional, enviando duas amostras, uma em nome

dele e outra no nome de Aídes. Obtiveram primeiro e segundo lugar, respectivamente. Apesar de

feliz com o excelente resultado, eles próprios acreditavam ter sido uma coincidência alcançar os

dois primeiros lugares.

Levando em consideração o resultado obtido no concurso, mandaram as amostrar para o

regional de Minas, concurso da EMATER-MG, obtendo uma das amostras o primeiro lugar. O

resultado foi muito animador tanto para Clayton quanto para seu pai, pois, finalmente, sentiram um

reconhecimento pelo trabalho duro e dedicado que haviam fazendo.

(Aídes) Mandamos para o geral de Minas, era Minas Gerais inteiro

mesmo, mais de 1.400 amostras, todas fazendas tops do estado estavam lá.

O café dele continuou em primeiro lugar como o melhor café de Minas

Gerais, e o meu passou para terceiro.

Nesse momento, de acordo com Aídes, os fazendeiros locais começaram a dar mais

credibilidade ao trabalho de Clayton.

(Aídes) Teve a foto com o governador na fazenda entregando para ele o

troféu do melhor café de Minas, muito orgulho. Após isso, o pessoal já

começou a acreditar que aqui dava café bom.

Mais importante do que o reconhecimento e credibilidade, foi que, ao longo do concurso

da EMATER-MG, tomaram conhecimento de um evento denominado "Semana Internacional do

Café". A Semana Internacional do Café (SIC) é um encontro de cafeicultores, torrefadores,

classificadores, exportadores, compradores, fornecedores, empresários, baristas, proprietários de

cafeterias e apreciadores. Ele ocorre em Belo Horizonte e é uma das principais ações de promoção

do café brasileiro em nível nacional e internacional. As principais finalidades do evento são:

desenvolver o mercado brasileiro de café; divulgar a qualidade dos cafés nacionais para o mercado

interno e para os países compradores; e potencializar ao máximo o resultado econômico e social

desse setor. Além disso, durante a SIC ocorre um concurso com os melhores cafés, chamado de

"Coffee of the Year Brazil" (COTYB).

Page 120: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

108

(Clayton) Foi no ano que coloquei o café nesse concurso que descobrimos

essa feira que se chama "Semana Internacional do Café". Vem gente do

mundo inteiro para o Brasil. Ali que eu descobri que tinha um mundo

fascinante de possibilidades para cafés especiais, e que a gente aqui na

roça não tinha a mínima ideia.

Em 2013, além de alcançar o primeiro lugar no regional de Manhuaçu e o segundo lugar no

concurso estadual da EMATER-MG, Clayton enviou amostras e participou da SIC. Uma das

amostras obteve o sexto lugar no concurso. Isso foi importantíssimo, pois trouxe mais ânimo para

Clayton, além de colocar a fazenda “Ninho da Águia” no "mapa" dos principais cafés do Brasil.

(Aídes falando sobre Clayton) Meu filho pensou: “Se eu conseguir uma

amostra no meio dessas 10 vai ser uma vitória, pois todas as fazendas mais

importantes do Brasil estão no concurso. ” Em seguida, a amostra que ele

mandou no meu nome ficou em sétimo, e a dele ficou em primeiro lugar,

foi muito animador.

O resultado obtido na SIC combinado com a oportunidade de conhecer “cara a cara”

potenciais compradores de café, teria sido um ganho ainda maior. A partir dessa aproximação,

Clayton realizaria a primeira venda internacional de toda a história da fazenda, sendo esta para a

Austrália, através de uma parceria informal com a “Minas Hill Coffee”, empresa australiana

distribuidora de café verdes brasileiros para ao mercado australiano.

(Clayton) O cliente que provou o café nessa feira. A feira é legal porque

você encontra todo mundo que precisa no mesmo lugar. Você vai ter a

possibilidade de conhecer maquinário novo, provar cafés de outras

regiões, e conhecer os clientes que provavelmente vão ser os compradores

do seu café.

(Clayton sobre a primeira venda internacional) Foi através da Minas Hill

Coffee que eu mandei para Austrália.

Detalhes sobre esta e outras parcerias serão abordados de forma mais completa no tópico

"Processo de Internacionalização".

Reconhecimento e aumento no volume de negócios não foram os únicos ganhos para a

fazenda. A SIC permitiu que Clayton tivesse um aprendizado acerca de melhores práticas

produtivas, considerando a troca de informações realizada ao longo da conferência. Além disso,

Clayton também observou as características dos cafés que ficaram em primeiros lugares e,

combinando melhores práticas produtivas com o conhecimento adquirido acerca das nuâncias de

sabores dos cafés que plantava, preparou-se melhor para a SIC de 2014.

Page 121: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

109

(Aídes) Ter contato com os estrangeiros possibilitou que ele (Clayton)

aprendesse a ver café de alta qualidade.

A partir da primeira participação na SIC, os anos de 2014 e 2015 seriam os mais importantes

em toda a história da fazenda, principalmente para oportunidades internacionais.

Em 2014, além de novamente ganhar o prêmio regional de Manhuaçu, o grande sucesso

veio com obter o primeiro e sétimo lugares no COTYB. O prestígio e reconhecimento de ter o

melhor café do Brasil trouxe ainda mais oportunidades comerciais para Clayton.

Antes de entrar na descrição de tais oportunidades, vale citar o caso de um dos compradores

que, durante a SIC, ficou tão entusiasmado com o café que chegou a pedir para visitar a Fazenda

“Ninho da Águia”, pois queria tomar o café de Clayton no Pico da Bandeira. Esse comprador, um

norueguês com relevância no mercado cafeeiro, impulsionaria significativamente os negócios da

fazenda, pois atraiu muita atenção na mídia após veicular em redes sociais fotos com a descrição

de que estava “tomando o melhor café do Brasil na montanha mais bonita do Brasil".

(Aídes) Um norueguês ficou tão entusiasmado com nosso café, por causa

da alta qualidade, que fez questão de vir aqui. Chamou meu filho e disse

"Quero que você me leve no Pico da Bandeira que quero fazer seu café lá

no Pico da Bandeira".

Sendo assim, a partir da notoriedade e reconhecimento, Clayton firmaria, em 2014, uma

nova parceria informal com a Fazenda Ambiental Fortaleza (FAF), uma empresa que, de acordo

com o site da mesma, além de possuir uma produção de cafés especiais também tem por objetivo

divulgar e difundir a cultura de Cafés Especiais e da Agricultura Sustentável em todo o país.

Através da parceria com a FAF e pelo contato direto com potenciais compradores na SIC, Clayton

passou, já em 2014, a exportar para Alemanha, França, Japão, Inglaterra e EUA.

(Clayton) O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés.

Através deles mandamos para Alemanha, França, Noruega, Estados

Unidos.

Em 2015, a fazenda “Ninho da Águia” ganhou novamente o primeiro lugar na COTYB,

confirmando o compromisso com a qualidade do seu café e demonstrando que ganhar no ano

anterior não teria sido mera coincidência.

Além da notoriedade no mercado internacional, os anos de 2014 e 2015 também foram

muito positivos para a atuação da empresa no mercado nacional.

Page 122: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

110

Clayton percebeu que o mercado nacional de cafés especiais já havia amadurecido bastante

desde 2000. Além de apresentar uma demanda por cafés especiais considerável, o mercado

nacional tinha a vantagem geográfica de um custo logístico menor. Sendo assim, considerando

esses aspectos com os resultados obtidos a partir de 2014, Clayton já passaria a comercializar uma

quantidade considerável de cafés especiais no mercado nacional.

Além disso, o mercado nacional começava a apresentar um aspecto ainda mais atraente para

Clayton, pois, diferente dos países para onde exportava, conseguia comercializar cafés nas formas

“verdes” e “torrados”. Isso seria importante, pois os cafés comercializados “torrados” possuem um

markup consideravelmente mais elevado do que esse mesmo café comercializado “verde”. Sendo

assim, embora não haja números precisos acerca disso, gradativamente o mercado nacional passaria

a representar uma parcela cada vez maior no faturamento da empresa o que representaria um marco

para que Clayton repensasse qual seria o futuro da empresa (Apêndice D).

(Clayton) É que o custo para você exportar os cafés é muito alto então o

café chega (com um preço) muito alto lá fora. Às vezes eu consigo vender

melhor aqui do que o que vai lá para fora. Porque lá para fora tem todo

esse problema do custo de exportação. Aqui no Brasil temos vendido uns

cafés com preço muito bom, pois você acaba vendendo para a pessoa que

vai servir na xícara. Essa é a pessoa vai ganhar mais, sendo assim ele pode

pagar mais.

(Clayton) A gente está com um mercado muito bom aqui no Brasil que é

a de cafeterias de café especial. Hoje já consomem bastante, e estão

crescendo cada vez mais.

(Clayton) Tem aumentado muito a minha venda de café torrado, eu estou

vendo a hora que quase vou passar a virar só um produtor que torra o café

e vende no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais valor.

Do ponto de vista turístico, cabe comentar que, também durante esse período, a fazenda

“Ninho da Águia” começaria a receber visitas crescentes de turistas estrangeiros e nacionais.

Por fim, em 2016, embora ainda não concretizado, a empresa já possui pedidos para Itália

e Chile. Além disso, Clayton está em processo de implementação de uma loja online com produtos

da fazenda.

(Clayton) A gente tem um site, que está meio desatualizado, mas agora a

gente vai pegar firme e vai fazer a loja online também..

Page 123: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

111

1996 20162011

CERTIFICAÇÃO DA FAZENDA (EMATER-MG) CONCURSO REGIONAL DE MANHUAÇÚ

(UMIDADE ELEVADA DO CAFÉ)

2012

CONCURSO ESTADUAL DE MG – 1O LUGAR

DESCOBERTA DA SIC

1996

VINDA DE CLAYTON PARA A FAZENDA

1996 - 2000

FASE DE ADAPTAÇÃO

2000

VINDA DE AÍDESPARA A FAZENDA

2000 - 2002

EXPANSÃO DAS CAFETERIAS ESPECIAIS EM SÃO PAULO

2002 - 2010

TENTATIVA EM ATRAIR POVADORES

2013

COTYB – 6O LUGAR PARCERIA FIRMADA COM A

MINAS HILL COFFEE EXPORTAÇÃO PARA A AUSTRÁLIA

2014

COTYB – 1O LUGAR PARCERIA FIRMADA COM A FAF

EXPORTAÇÃO PARA: ALEMANHA, FRANÇA, JAPÃO, INGLATERRA, EUA

2015

COTYB – 1O LUGAR

2016

EXPORTAÇÃO PARA:ITÁLIA E CHILE

Figura 10 - Linha do tempo resumida da empresa "Café Fazenda Ninho da Águia"

Fonte: Elaborado pelo autor com base nas informações presentes no caso.

Page 124: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

112

4.2 PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO

A seguir, será apresentado o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda

Ninho da Águia”. Sendo assim, serão detalhados os aspectos mencionados no tópico “História da

Empresa”, considerando uma ordem cronológica dos eventos e sob uma ótica mais empresarial.

Com o objetivo apresentar de forma mais didática o processo de internacionalização, é

possível dividir o processo em duas fases. A divisão é interessante, pois a primeira fase pode ser

representada de maneira mais simplificada enquanto a segunda necessita de mais aprofundamento.

Com relação a segunda fase, ela será fragmentada para apresentar os contrastes nela existentes.

A primeira fase, de 1969 até 1996 (chegada de Clayton), a fazenda estava sob "gerência

operacional" do irmão de Aídes havendo um acompanhamento pontual do proprietário acerca do

andamento da fazenda. Nesse período, a preocupação maior acerca do futuro da fazenda era de sua

viabilidade econômico-financeira. Em outras palavras, o foco estava em aumentar a produção para

gerar receita.

A segunda fase da empresa, de 1996 até os dias de hoje, o ingresso de Clayton na gerência

da fazenda trouxe profundas mudanças para o seu rumo. Diferentemente da primeira fase, a

segunda possui diversas mudanças ao longo de sua história, sendo necessário uma análise mais

detalhada, que será subdividida em etapas.

Na etapa inicial, durante o período de 1996 a 2003, o ingresso de Clayton já provocou

algumas mudanças acerca do processo produtivo da fazenda. Por ser um período inicial, foi uma

fase de adaptação em que Clayton tomou conhecimento das atividades operacionais da fazenda.

Apesar disso, já realizou mudanças baseadas no que acreditava ser melhor para os rumos da

fazenda, embora este ainda não estivesse claro.

Do ponto de vista de processos produtivos, passou a adotar uma política de não utilização

de agrotóxicos, pois acreditava que um cultivo mais “natural” poderia aumentar a qualidade de seu

café. Apesar disso, tal medida acarretaria na elevação de gastos com manutenção. Uma outra

medida foi mudar o costume de consumir os piores lotes produzidos, passando a fazer exatamente

o oposto, pois seria uma forma de entender melhor a qualidade do café produzido.

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113

Com relação ao aprendizado, absorveu conhecimento acerca da mecânica de funcionamento

do mercado de cafés no Brasil, assim como os agentes neste envolvidos. Além disso, em razão da

região de Alto Caparaó ser pequena, pela mentalidade de Clayton mais amigável, e a proximidade

com a região e os fazendeiros, foi lentamente criando relacionamentos fazendeiros e compradores.

No que diz respeito a estratégia, embora Clayton não tivesse uma visão clara acerca do

futuro da empresa ou do mercado que gostaria de atuar, as medidas implementadas tinham como

objetivo aumentar a qualidade do café produzido.

Com relação ao processo decisório, a chegada de Aídes, pai de Clayton, no ano 2000 não

teria sido muito impactante em termos de mudanças na tomada de decisão na fazenda. Isso ocorreu,

pois, embora proprietário, dava muito apoio a seu filho, e as decisões que tomavam na fazenda era

de forma conjunta, não havendo um critério de "opinião mais importante" nas discussões.

Após essa primeira etapa, o estabelecimento das cafeteiras especiais em São Paulo no início

dos anos 2000 despertaria o interesse de Clayton no mercado de cafés especiais, tendo em vista o

preço mais elevado de venda.

Com base nessa decisão, Clayton passou a buscar informações sobre o mercado de cafés

especiais. A partir disso, Clayton chegou a 3 conclusões. Primeiro, levando em consideração que

o mercado brasileiro de cafés especiais era muito embrionário, o empresário decidiu que o espaço

que queria buscar seria no mercado internacional. Segundo, com o objetivo de introduzir o café no

mercado internacional, seria necessário atrair provadores brasileiros para que validassem a

qualidade do café produzido na fazenda. Terceiro, tendo em vista o custo logístico associado a

exportação, seria interessante buscar meios de baratear esse custo. Considerando esses aspectos,

durante a primeira década de 2000, Clayton dedicaria esforços para buscar formas de explorar esse

mercado.

Com relação a busca por informações, esta deu-se ao longo da primeira década dos anos

2000, sendo as principais fontes de conhecimento leituras (revistas, jornais, etc.) e interação com

os diversos agentes no mercado cafeeiro. Além disso, foi um processo de absorção lenta que

requereu tempo e esforço, pois, ao mesmo tempo que Clayton geriu a fazenda, tentou buscar

agentes (indivíduos, associações ou empresas) no mercado de cafés especiais que poderiam

fornecer tais informações e/ou darem apoio.

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114

(Clayton) A gente tinha uma dificuldade muito grande porque nosso café

a maior parte é natural, e os cafés naturais não estavam no padrão de

qualidade que era o padrão aqui do Brasil, o cereja descascado. Então o

provador tinha dificuldade de vir aqui para provar esses cafés.

(Clayton) Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.

Além disso, Clayton mencionou algumas das dificuldades enfrentadas para obter tais

informações, como: carência de um apoio estatal mais eficiente para empresas que buscassem atuar

nesse mercado, infraestrutura precária para veiculação de informações na região de Alto Caparaó

(internet e telefonia ruins ou inexistentes), mercado brasileiro de cafés especiais pouco estruturado.

Por volta de 2010, Clayton decidiria modificar sua abordagem e buscar tal prestígio através

da participação em concursos de café.

Considerando a nova abordagem, para que pudesse aumentar o prestígio da fazenda e

preparar-se para o concurso regional de Manhuaçu em 2011, nesse mesmo ano, certificou a fazenda

com o selo "Certifica Minas" da EMATER-MG. Apesar disso, pela questão de a umidade do café

estar mais elevada, não obteve o resultado esperado no concurso, embora os juízes tenham

considerado como “o melhor café do concurso”. Sendo assim, para se preparar melhor para os o

concurso do próximo ano, precisou medir de forma mais controlada a exposição do café à água, ao

invés de só contar com a irrigação natural da montanha.

Com Clayton melhor preparado, em 2012, o café da fazenda “Ninho da Água” ganhou o

concurso regional de Manhuaçu, e o estadual da EMATER-MG. Além do prestígio ganho em 2012,

o mais importante foi que Clayton tomou conhecimento da "Semana Internacional do Café" (SIC),

evento esse que reunia diversos agentes nacionais e internacionais do mercado de café.

De maneira resumida, constata-se que essa segunda fase (2000-2013) foi marcada pelas

seguintes características: estratégia de atuar no mercado internacional de cafés especiais;

aprendizado sobre as dificuldades de atuar nesse mercado; tentativa de associação local; busca por

provadores que validassem a qualidade do café; participação em concursos como forma alternativa

de "validação" do café; adaptação no processo produtivo para participar de concursos (umidade do

café).

Em 2013, a participação da empresa na SIC representaria o início de uma nova fase

(terceira), pois seria a primeira oportunidade da empresa de ter contato direto com mercado

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internacional de cafés especiais. Além disso, o concurso que acontece ao longo da SIC, o “Coffee

of the Year Brazil” (COTYB), coloca em destaque os principais cafés brasileiros. A relevância

desse concurso é que, por ser uma disputa entre os “melhores do Brasil”, traz grande prestígio para

suas respectivas fazendas, além de atenção dos potenciais clientes e provadores nas feiras. Com

relação ao prestígio. as feiras permitem que fazendas menores ganhem visibilidade pela qualidade

do café que produzem, visibilidade esta que em situações normais de mercado enfrentaria

dificuldades, tendo em vista a baixa produção e falta de prestígio de pequenas propriedades. Por

outro lado, a reunião de diversos agentes do mercado de cafés especiais em um lugar só

possibilitava o desenvolvimento de relações comerciais e absorção de conhecimento técnico.

(Clayton) A feira é legal porque você encontra todo mundo que precisa no

mesmo lugar, então ali que você vai ter a possibilidade de conhecer

maquinário novo, provar cafés de outras regiões, e conhecer os clientes

que provavelmente vão ser os compradores do seu café.

O resultado final da feira seria a parceira informal firmada a partir de uma iniciativa da

“Minas Hill Coffee”, uma boutique australiana localizada em Melbourne, Austrália, que se

especializa na importação, distribuição, e revenda de cafés especiais "verdes" brasileiros para

clientes australianos.

A parceria seria importante, pois permitiria que a fazenda “Ninho da Águia” realizasse, em

2013, sua primeira exportação de café "verde", sendo esta para a Austrália. Cabe ressaltar que a

empresa escolhe os cafés não somente pelo padrão de qualidade que possuem, mas também pela

forma ética e ambientalmente sustentável que são plantados. Com relação a troca existente na

parceria, existem aspectos interessantes a serem considerados.

Para “Minas Hill Coffee”, era uma questão mais financeira e de prestígio, pois seriam

responsáveis por introduzir os melhores cafés brasileiros no mercado australiano.

Para Clayton, diversos aspectos da parceria seriam benéficos.

Na parte logística, permitiu que Clayton superasse o desafio relacionado ao custo de

transporte em containers, pois, após o café "verde" ser levado por um funcionário da fazenda até

um representante da “Minas Hill Coffee” no Brasil, era alocado em um container com outros cafés

importados pela empresa, sendo posteriormente enviados para Austrália. Sendo assim, permitia

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116

que o preço negociado entre as partes considerasse apenas o proporcional do volume ocupado em

container.

Com relação a tecnologia do produto, “Minas Hill Coffee” destacou a necessidade do

processamento do café em uma peneira eletrônica para que pudesse ser exportado. Isso era

importante, pois dessa forma os "melhores" grãos (critério do mercado internacional) seriam

separados no pós-colheita. A questão da peneira eletrônica foi solucionada pela "aproximação"

(parceria informal) que Clayton realizou ao longo da vida com outros produtores maiores de café,

tendo visto que possuíam tal maquinário.

(Clayton) Os cafés que são direcionados para exportação ou para a venda

de cafeteria, a gente vai ter que preparar esses cafés porque tem que ser

uma peneira uniforme, tipo peneira 16 ou acima, e tem que ser o grão todo

padronizado, café sem defeito nenhum.

(Clayton) Eu não tenho maquinário por enquanto aqui na fazenda. Esse

ano que a gente vai montar um galpão para beneficiar a produção 100%

aqui na fazendo. Acabo levando em alguns parceiros que têm catação

eletrônica para preparar os cafés e exportar.

Com relação ao mercado australiano de cafés especiais, “Minas Hill Coffee” trouxe

potenciais clientes para o produto, operando em um sistema misto de venda direta e indireta com

Clayton. A venda direta envolvia o contato prévio entre Clayton e um cliente em potencial, uma

cafeteria por exemplo, em que eles posteriormente negociavam os detalhes da venda e a “Minas

Hill Coffee” atuava como intermediário logístico. Esse contato direto teria sido realizado, na

maioria das vezes, durante a SIC. Por outro lado, havia a possibilidade da venda indireta pela

atuação da “Minas Hill Coffee” como revendedora para clientes australianos, ou seja, Clayton não

teve um contato direto prévio com o cliente final. Embora não pareça fazer diferença à primeira

vista, a questão da escolha de clientes é importante, pois visa manter a integridade da qualidade do

café no momento de consumo. Levando em consideração que o café "perde qualidade" (modifica

o sabor) no momento da torra, o café era exportado "verde” para os clientes no exterior havendo

posteriormente uma torra. Sendo assim, escolher criteriosamente as melhores cafeterias era

essencial para que o produto não fosse "estragado" por uma torra ruim. Em outras palavras, a venda

indireta envolvia a construção de uma confiança, e até amizade, de acordo com Clayton, pois a

“Minas Hill Coffee” teria o poder de escolha de seus clientes.

Page 129: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

117

(Clayton) Esse mercado é um nicho. A gente tem um cuidado só de

escolher as melhores cafeterias e os melhores torradores, pois o café você

acaba com ele na torra.

(Clayton) Além de parceiros (os executivos da FAF e da Minas Hill

Coffee) acabaram virando amigos. O mundo de cafés especiais ainda é

muito pequeno, então você acaba ficando amigo de seus clientes e

parceiros diretos... é um mercado bem justo e honesto, fair trade mesmo

de verdade. E um “direct trade”, pois a gente faz a venda direta também.

Por fim, a “Minas Hill Coffee” contribuiria para aumentar o prestígio internacional da

fazenda, de Clayton, e da região de Alto Caparaó, pois os cafés sendo certificados vão com as

informações do produtor, fazenda, região e coordenadas geográficas de onde foi produzido

(Apêndice E).

(Clayton) Esses cafés vão todos identificados com o nome da fazenda, da

região, do produtor, etc. A pessoa está lá do outro lado do mundo tomando

um café, mas sabendo que é daqui...é importante a rastreabilidade.

No ano seguinte, em 2014, a participação na SIC e os prêmios de primeiro e sétimos lugares

no COTYB trouxeram dois aspectos muito importantes para negócios da empresa, além de um

terceiro abordado mais à frente.

Primeiro, a visibilidade mundial por ser eleito o melhor café brasileiro trouxe um prestígio

muito grande, o que ganhou grande atenção de clientes internacionais. O prestigio foi tamanho que

chegou a atrair a vinda de um estrangeiro para a própria fazenda, pois desejava degustar o produto

na região do “Pico da Bandeira”. Além disso, o resultado também foi positivo no sentido de

desenvolver ainda mais negócios com a “Minas Hill Coffee”.

Segundo, seria a aproximação realizada pela "Fazenda Ambiental Fortaleza" (FAF), sendo

transformada em uma parceria informal, até mesmo amizade, de acordo com Clayton.

A "Fazenda Ambiental Fortaleza" (FAF) é uma empresa localizada no distrito de Igaraí,

interior do estado de São Paulo, que tem como principal atividade a produção e comercialização

de cafés especiais, seja no Brasil ou no mundo. Apesar disso, seu foco não é somente no retorno

financeiro, pois sua missão também é a de divulgar e difundir a cultura de cafés especiais e da

agricultura sustentável para o Brasil e o mundo. Para atingir tal objetivo, a empresa conta com uma

rede de agricultores parceiros que exportam integralmente ou parcialmente através da FAF, um

centro de estudos de café na cidade de São Paulo, e uma empresa de exportação.

Page 130: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

118

Com relação a parceria informal entre Clayton e a FAF, ela seria extremamente positiva

para ambos.

Para FAF, era uma questão financeira, pois seriam responsáveis por comercializar os

melhores cafés brasileiros no Brasil e no mundo, e de princípios, tendo em vista a missão da

empresa.

Para Clayton, diversos aspectos da parceria seriam benéficos.

Com relação a tecnologia de produto, o centro de pesquisas que a FAF possui poderia ser

utilizado para realizar análises químicas do café com o objetivo de controlar a sua pontuação (a

mesma utilizada em concursos). A utilidade disso seria para efeitos de negociação na venda e,

levando em conta a experiência prévia da FAF em outros mercados regionais, no direcionamento

do produto para as regiões do mundo que o café seria mais demandado. Além disso, a empresa

também tem acesso a uma peneira eletrônica, facilitando a questão da separação pós-

beneficiamento.

(Clayton) A FAF seleciona os melhores cafés aqui, faz uma prova, análise

sensorial, pontuação, e direciona a venda para Europa e outros lugares. Já

conhecem o pessoal.

Com relação ao mercado, de acordo com Clayton, a FAF possuía conhecimento sobre a

comercialização de cafés especiais tanto Brasil como no mundo.

Na questão da venda, o sistema seria o mesmo misto utilizado com a "Minas Hill Coffee",

o que envolveria a questão da construção de confiança. Diferentemente da “Minas Hill Coffee”,

devido a missão abertamente divulgada pela FAF e uma maior proximidade desta com Clayton, a

venda seria conduzida de uma forma mais "especial" no caso da venda indireta.

(Clayton) Eles (FAF) pegam as cafeterias mais tops e são nelas que vai

entrar nossos cafés. Sou tratado como se fosse um jogador que fica no

banco de reserva para a hora que precisar mesmo... o nosso (café) entra

nessa finalização para "fazer um barulho”.

Com relação a exposição no mercado, levando em conta a propriedade certificada e pela

própria missão da FAF, a parceria também seria importante para divulgar mundialmente a fazenda,

Clayton e a região de “Alto Caparaó”.

Page 131: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

119

Na parte logística, ela teria a mesma utilidade da "Minas Hill Coffee", mas em proporções

muito maiores, pois é uma empresa que comercializa em diversos países. Em outras palavras,

Clayton teria a possibilidade de exportar para todos os países que a FAF já fazia negócios. Sendo

assim, o resultado dessa parceria foi o início das exportações, ainda em 2014, para Alemanha,

Japão, França, e Estados Unidos.

(Clayton) O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés.

Através deles mandamos para Alemanha, França, Japão, Estados Unidos.

Considerando a questão da negociação com os representantes desses países, Clayton relata

que foi extremamente parecida, pois a forma de tratar cafés especiais no mercado internacional

seria similar. Em outras palavras, não teria sido necessário modificar aspectos do produto, pós-

colheita, etc., para que fosse possível realizar a venda.

Em 2015, o primeiro lugar novamente na COTYB serviu para fortalecer a presença da

fazenda no mercado internacional. Sendo assim, embora não tenha exportado para novos países em

2015, este período foi importante para desenvolver o relacionamento com os clientes e parceiros já

existentes.

Uma forma que isso pode ser observada seria a separação de micro lotes na fazenda, pois

Clayton já direcionava os cafés produzidos pensando nas preferências locais de nuâncias do café.

Um exemplo disso seria o mercado Australiano, pois haveria uma preferência por cafés com tons

frutados.

(Clayton) Por exemplo, o australiano gosta mais de café frutado, então

hoje a gente já direciona para eles.

Com relação as parcerias, houve um desenvolvimento no relacionamento com a “Minas

Hill Coffee” e a FAF. Em especial, destaca-se a importância da aproximação com a FAF, pois seu

conhecimento técnico e de mercado teriam sido bem úteis no desenvolvimento dos relacionamentos

já existentes dos clientes de Clayton.

Com relação a forma de exportação, manteve-se a mesma, ou seja, exportação de café

"verde" usando o sistema misto de venda (direta e indireta) com seus dois parceiros.

Page 132: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

120

Paralelamente a questão do mercado internacional, o prestígio que Clayton atingiu com o

primeiro lugar no COTYB em 2014, e posteriormente em 2015, serviria para trazer um terceiro

aspecto importante para os negócios da empresa.

Considerando a visibilidade pelos prêmios obtidos, custo logístico menor, possibilidade de

negociação de cafés “torrados” (markup maior em comparação ao verde), conhecimento do

mercado brasileiro (FAF e Clayton), aumento na demanda entre 2000 e 2015, e uma maior

educação no mercado brasileiro acerca de cafés especiais, Clayton passou a vislumbrar o mercado

nacional como mais interessante do que o internacional.

(Clayton) É que o custo para você exportar os cafés é muito alto então o

café chega (com um preço) muito alto lá fora. Às vezes eu consigo vender

melhor aqui do que o que vai lá para fora. Porque lá para fora tem todo

esse problema do custo de exportação. Aqui no Brasil temos vendido uns

cafés com preço muito bom, pois você acaba vendendo para a pessoa que

vai servir na xícara. Essa é a pessoa vai ganhar mais, sendo assim ele pode

pagar mais.

(Clayton) A gente está com um mercado muito bom aqui no Brasil que é

a de cafeterias de café especial. Hoje já consomem bastante, e estão

crescendo cada vez mais.

(Clayton) Tem aumentado muito a minha venda de café torrado, eu estou

vendo a hora que quase vou passar a virar só um produtor que torra o café

e vende no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais valor.

Em outras palavras, Clayton começou a observar que poderia ter retornos maiores no

mercado interno do que no externo. Tal aspecto foi gradativamente refletindo nos resultados

financeiros da empresa. Inclusive, embora em 2016 a empresa já tenha pretensões de venda para

dois novos mercados (Itália e Chile), de acordo com estimativas de Clayton, o faturamento da

empresa já passou a ser majoritariamente na comercialização no mercado nacional. Sendo assim,

Clayton repensa os diferentes rumos que a fazenda “Ninho da Águia” poderia tomar.

4.3 A EMPRESA HOJE

Antes de considerar a situação atual, cabe ressaltar que ao longo dos anos não houve um

controle muito rígido acerca das informações geradas pela empresa. Isso foi em parte modificado

com a certificação em 2011, pois exige que a empresa esteja "em dia" com dados trabalhistas,

sociais e ambientais. Apesar disso, dados financeiros, relatórios, e afins, ainda não se encontram

devidamente apurados.

Page 133: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

121

Com relação a estrutura da empresa, ela não possui funcionários no exterior. No Brasil, é

composta de 6 funcionários que trabalham diretamente com Clayton, além de um conjunto de

meeiros que fazem a parte de manutenção das suas "meias". De acordo com Clayton, esses 6

funcionários ficam alocados em áreas que estão mais alinhadas com seu potencial, mas que podem

variar dentro de sua função. Considerando funcionários alocados de maneira mais "exclusiva" em

suas áreas, há o Marcos, um barista responsável pela parte de atendimento ao cliente e da venda de

cafés torrados, e o Vinícius, um recém-chegado na parte de gestão de empresas que estaria

justamente tentando colocar "em dia" os dados da fazenda ainda não estruturados. Com relação a

Clayton, ele declara que basicamente é um "faz tudo" da empresa, pois gere desde aspectos da

produção até venda e comercialização. Com relação a tomada de decisões, apesar de Clayton ser a

pessoa mais ativa no sentido de gestão da empresa, ele e seu pai têm um processo decisório não

estruturado, ou seja, as decisões da empresa são tomadas através de uma conversa informal entre

eles.

(Clayton) A gente tem umas 6 pessoas que trabalham direto cuidando.

Cada um acaba se especializando mais num setor, e vamos direcionando

cada pessoa que trabalha aqui para onde tem mais potencial. Tem o

Vinícius que veio ajudar na parte mais da gestão, pois estamos começando

a organizar mais essas coisas aqui. Na verdade, viramos uma empresa,

então a gente tem que tem que estar tudo em dia na parte ambiental, social,

trabalhista. Tem uma equipe que trabalha direto aqui que são esses que

tem um contrato de parceria (os meeiros). Um outro, o Marcos, que fica

em Manhuaçu, ele fica conectado direto e fica na parte de atendimento ao

cliente do café torrado. Ele é barista, quando a gente vai para eventos ele

que serve os cafés, mas também faz parte de atendimento ao cliente.

(Clayton) A gente conversa, até mesmo com o pessoal que está

trabalhando para definir mais ou menos o que vai fazer, mas a decisão final

é a gente mesmo. É uma coisa mais informal mesmo.

Com relação a aspectos produtivos, a empresa produz café especiais com sementes 100%

Arábicas. O processo produtivo de cafés mantém a estrutura dos anos anteriores, ou seja, uma parte

realizada por meeiros e outra diretamente por Clayton. Vale lembrar que embora a produção de

cafés possua essa estrutura, o pós-colheita é realizado 100% por Clayton e seus funcionários. Sendo

assim, a equipe de Clayton cuida da parte de secagem e separação dos cafés. Após esse processo,

o produto pode tomar dois caminhos. Primeiro, o café pode ser diretamente ensacado e direcionado

para seus parceiros, sendo comercializado "verde". Segundo, após colhido e secado, ele passa por

um processo adicional de torrefação, sendo posteriormente ensacado, tudo na própria fazenda.

Page 134: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

122

Depois de ensacado, o café “torrado” é direcionado para os clientes utilizando os parceiros da

“Ninho da Águia”.

Com relação às vendas, no Brasil, a empresa vende cafés "verdes" e “torrados”. No exterior,

somente o "verde" é comercializado. Com relação a estrutura da venda, tanto no mercado nacional

como no internacional ela opera naquele sistema "misto" em que os parceiros podem realizar a

venda (venda indireta) ou que funcionam como um operador logístico (venda direta). Apesar disso,

Clayton sempre privilegia realizar a venda de forma direta para que tenha contato com os clientes.

Com relação a dados de faturamento, de acordo com estimativas anuais de Clayton, no

Brasil são comercializadas cerca de 150 sacas de café "verdes", com um valor médio de R$

1.000,00 a saca, e cerca de 50 sacas de café “torrado”, com um valor médio de R$ 3.000,00 a saca.

No mercado externo, seriam comercializadas cerca de 50 sacas com um valor médio de R$ 1.500,00

a saca. Sendo assim, pode-se concluir que a empresa possuiria um faturamento anual de R$

375.000,00 dos quais 60% seriam pela comercialização de cafés "verdes", 40% relativo ao interno

e 20% externo, e 40% de cafés torrados, sendo todos vendidos no mercado interno. Em outras

palavras, atualmente, 80% do faturamento da empresa provem da comercialização no Brasil.

Com relação aos mercados atuantes, Clayton considera que comercializa praticamente com

todos os estados no Brasil, enquanto no mercado externo a empresa exporta para Austrália,

Alemanha, França, Japão, Inglaterra, EUA, Itália e Chile (dois últimos ainda em fase de

negociação).

Com relação a presença digital, a empresa possui uma página no Facebook, criada em maio

de 2014, e um site da fazenda, criado em 2015. A página no Facebook tem como função a

divulgação promocional da fazenda, comentando características do processo produtivo e de ações

sociais da fazenda com populações da região. Já o site, em versões português e inglês, serve

principalmente para apresentar os principais os dados referentes a fazenda, como: prêmios, história,

localização, etc. Apesar da presença digital, elas ainda não possuem caráter expressivo

considerável nem assumem uma estratégia para a empresa.

Com relação a um caráter turístico, tendo em vista a proximidade com o “Pico da Bandeira”

e o “Parque de Caparaó”, além da visibilidade com os prêmios de 2014 e 2015 no COTYB, a partir

de 2014 a fazenda passou a receber um número crescente de turistas brasileiros e estrangeiros.

Page 135: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

123

A seguir, serão tratados alguns aspectos relacionados às percepções de negócios por parte

de seus empreendedores. Cabe ressaltar que as perspectivas são mencionadas pelo nome de

Clayton, mas são compartilhadas por seu pai.

Comparando as diferenças no mercado de cafés especiais no Brasil e no exterior, Clayton

considera que a forma de negociação dentro do mercado de cafés especiais é muito semelhante,

pois os clientes buscam um "padrão de qualidade" que seria universal. Além disso, Clayton também

diz que não haveria barreiras culturais significativas, pois no mercado de cafés especiais os clientes

"sabem o que querem" e possuem um tom mais informal, até mesmo amigável, na forma de lidar

com os produtores de cafés.

(Clayton) Além de parceiros (os executivos da FAF e da Minas Hill

Coffee) acabaram virando amigos. O mundo de cafés especiais ainda é

muito pequeno, então você acaba ficando amigo de seus clientes e

parceiros diretos... é um mercado bem justo e honesto, fair trade mesmo

de verdade. E um “direct trade”, pois a gente faz a venda direta também.

(Clayton, sobre o processo de negociação) É bem parecido... Aqui a gente

tem todo um charme de fazer divisa com o parque nacional, tem toda uma

história que contamos junto que ajuda a vender os cafés. Além disso, por

ter a qualidade de ser um café premiado você já faz a venda.

Cabe ressaltar que essa é uma percepção da realidade atual, pois no início dos anos 2000,

Clayton percebia o mercado nacional como “embrionário”.

Por outro lado, haveria um aspecto que facilitaria a negociação, principalmente no exterior,

tendo em vista o preço estável do mercado de cafés especiais. Isso é relevante, pois, levando em

consideração o intervalo de tempo entre a negociação da venda e a colheita, poderiam existir

flutuações nos preços internacionais de cafés especiais, e essa variação poderia dificultar a

negociação tanto para o lado do produtor como o do cliente.

Com relação a relevância dos dois mercados, Clayton percebe mais vantagens em atuar no

mercado nacional tendo em vista a proximidade geográfica que permitiria conhecer melhor os

clientes que poderiam pagar um valor mais elevado pelo café. Tal aspecto reflete-se no faturamento

da empresa, pois, de acordo com estimativas atuais de Clayton, 80% seria oriundo do mercado

nacional. Apesar disso, Clayton acredita que essa importância estaria bem equilibrada por questões

que vão além do faturamento, mas com a tendência de o mercado nacional passar a assumir uma

importância maior com o tempo.

Page 136: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

124

(Clayton) Eu acho muito importante (o mercado internacional) por estar

divulgando a região, pois acho que o trabalho vai muito além do café, pois

aqui é um lugar turístico. Tem toda uma propaganda da nossa região aqui.

(Clayton) Está bem equilibrado, mas o brasileiro quase que ganhando, pois

está crescendo muito e é mais rentável.

Com relação a importância da internet, apesar de ainda não muito utilizada, Clayton

comenta que é uma ferramenta que pode facilitar muito no sentido de divulgar a região e ajudar

nas vendas da empresa. Por outro lado, ele acredita que o “boca-a-boca” e as premiações é que

fazem a diferença no sentido de obter a venda, pois clientes atuais não deixariam de realizar

negócios caso a fazenda não possuísse uma presença digital.

(Clayton) É superimportante. Não tem nem dúvida. É uma ferramenta que

bem usada facilita a sua vida.

(Clayton acerca da continuidade de negócios sem internet) Acho que

continuariam. Aqui o nosso foco principal é sempre trazer o cliente na

fazenda. Ele vai sentir realmente como que é feito o trabalho, vai conhecer

a nossa história de verdade. Sendo assim, vai valorizar muito mais o café

a partir desse momento que ele vir aqui na fazenda visitar.

Do ponto de vista do sucesso da empresa e de seus concorrentes, Clayton relata que o

principal diferencial de seu café seria os prêmios ganhos em concursos nas feiras. Isso foi

importante, pois, ao estar disputando com fazendas superpremiadas, o café ganhou muita

visibilidade, passando uma imagem de “qualidade garantida” para potenciais clientes. Com relação

a competitividade, Clayton diz que não há um concorrente direto visto que o cliente apreciador de

café quer provar uma variedade de sabores de café. Sendo assim, Clayton relata que os produtores

na verdade seriam parceiros, pois poderiam estar trazendo uma variedade de cafés para os clientes

de maneira conjunta.

(Clayton) Esse mercado não tem um concorrente direto, pois a pessoa que

é apreciador de café especial quer provar vários cafés, então, na verdade,

somos parceiros. A gente não chega a ser concorrente. Eu quero tomar o

café dele, ele quer tomar o meu. É um mercado light. Ainda não tem aquele

sangue no olho de que não pode mostrar isso, não pode mostrar aquilo.

Acho que até vai chegar a ter essa concorrência futuramente, mas vai

demorar um pouco ainda. Por enquanto a gente está tudo amigo.

Por fim, com relação a entrada em novos mercados nacionais, Clayton diz que se sente mais

preparado, pois, além de seu conhecimento sobre o mercado de café, a fazenda está sendo

estruturada cada vez mais para poder atender às demandas de seus clientes.

Page 137: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

125

4.4 FUTURO DA EMPRESA

Com relação a gestão da empresa, Clayton pretende estruturar melhor a fazenda no sentido

de registrar e organizar dados financeiros, custos, etc., para que possa ser realizado um

planejamento melhor.

No que se refere à produção de cafés especiais, Clayton pretende especializar-se mais na

eficiência produtiva do que no aumento da produção, pois sua meta é melhorar cada vez mais a

qualidade do café que produz, além de produzir uma variedade maior de sabores. Além disso, quer

montar uma espécie de "centro de estudos" para que possa testar variedades que seriam mais

eficientes na região de “Alto Caparaó”. Segundo Clayton:

(Clayton) Nós não temos a ideia de crescer muito em produção. Queremos

focar na qualidade e cada vez ter uma diversidade maior de sabores de

café, de variedades de café. Estamos fazendo um centrinho de pesquisa

para plantar diversas variedades e ir testando o que funciona melhor aqui.

Isso vai servir até mais para frente para os outros produtores, pois saberiam

quais variedades que funcionariam melhor aqui. Além disso, serviria para

ensinar a maneira correta de provar café.

Com relação às formas de cafés vendidos, Clayton acredita que irá se tornar um produtor

que vende quase 100% de cafés torrados, tanto para o mercado nacional como o internacional. A

vantagem que ele percebe, além da financeira, é que divulgaria melhor a região. Uma forma de

realizar isso seria seu plano em estruturar melhor o site da empresa, inclusive abrindo uma loja

online que aceitaria cartões de crédito. Através dessa loja e com o desenvolvimento de

relacionamento com os atuais clientes, ele acredita que seria possível realizar 100% de venda direta.

Por outro lado, acredita que sempre existirá alguma comercialização de cafés "verdes" no mercado

internacional como forma de divulgar a região, tendo em vista a existência de clientes que

demandassem somente a forma “verde”.

(Clayton) Estou vendo a hora em que eu vou passar a ser só um produtor

que torra o café, e vendo só no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais

valor. Acho interessante fazer algumas vendas (internacionais de café

verde), pois você consegue abranger um número de pessoas que acabam

conhecendo o café e a região. Você pega Austrália, Berlin, Paris, Tóquio,

Estados Unidos, vários... então tem gente do mundo inteiro tomando seu

café.

Com relação a questão logística no mercado internacional, Clayton estaria buscando

alternativas para tornar-se mais independente de seus parceiros. Um exemplo disso seria a

Page 138: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

126

pretensão de direcionar um de seus funcionários, o Marcos, a fazer um curso do SEBRAE chamado

"Exporta Fácil".

Com relação a questão turística, Clayton tem planos de construir "casinhas" na fazenda para

que seja possível realizar o chamado turismo de "vivência". No Brasil, esse turismo ainda é pouco

conhecido, mas no exterior é chamado de "origin trip". A essência da ideia é a pessoa realizar uma

viagem de origem para o lugar onde o café foi produzido, aprendendo nessa experiência a história

e os processos pelos quais o café passou, desde a colheita até o seu consumo na xícara. Essas

"casinhas" permitiriam que os turistas pudessem permanecer na fazenda inclusive com a

possibilidade de participar dos trabalhos de colher, secar, torrar, etc. Além do potencial turístico

para a fazenda e a região, a possibilidade de trazer potenciais clientes para realizar uma experiência

dessas é bem atraente, pois ajuda a construir toda uma venda "contextual" desse café, o que o

valoriza.

(Clayton) A pessoa que tem uma cafeteria lá na Europa quer vir aqui na

fazenda, eles falam "origin trip". Eles querem vir na fazenda para contar

toda a história daquele café que está sendo servido na cafeteria deles, pois

vai influenciar na xícara que ele está vendendo ali. O cliente dele vai pagar

melhor e vai sair supercontente com aquela história toda com ele.

(Clayton) A gente está com a ideia de fazer umas suítes aqui para fazer

aquele turismo de vivência. A pessoa vem vir para cá e vai passar alguns

dias aqui, vai colher café, vai ajudar a secar o café, etc.

Com relação à questão social e desenvolvimento da região, uma das preocupações de

Clayton, o mesmo pretende disponibilizar para outros produtores de café, de forma gratuita, todos

os conhecimentos adquiridos em seu "centro de estudos" assim como promover palestras nas

escolas locais com temas relacionados ao café.

Page 139: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

127

5. Análise do Caso

No presente capítulo será realizada a análise do estudo de caso da empresa “Café Fazenda

Ninho da Águia”. A análise usará como base as teorias abordadas ao longo deste trabalho para

compreender o processo de internacionalização dessa empresa. Sendo assim, as teorias serão

confrontadas com os aspectos abordados no capítulo anterior (capítulo 4). Além disso, a análise

visa responder às perguntas que orientam o presente estudo, abordadas na metodologia (capítulo

3).

5.1 PERSPECTIVA DE UPPSALA

O modelo original de Uppsala (1977) descreve o processo de internacionalização como

ações incrementais de comprometimento em que o conhecimento, principalmente experiencial,

explicaria a atitude incremental. Além disso, o modo de entrada assumiria um processo sequencial

que envolveria desde exportações não estruturadas até operação local.

No caso da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, a atitude incremental pôde ser

observada, pois o modo de entrada envolveu exportações pouco estruturadas e o uso de

representantes locais (FAF e Minas Hill Coffee). Além disso, a experiência proveniente da

negociação direta serviria para que houvesse um ganho de conhecimento por parte do principal

agente envolvido em tais negociações, ou seja, Clayton. Tendo em vista que este seria o principal

agente envolvido com as operações da empresa, o processo de tomada de decisão e descoberta de

oportunidades segue o descrito pelo modelo, pois seria realizado pelo agente com maior acúmulo

de conhecimento experiencial.

Por outro lado, a escalabilidade do modo de entrada não seguiu o processo sequencial

descrito no modelo como resultado da interação entre percepção de incerteza, nível aceitável

máximo de exposição ao risco e decisões de comprometimento. As negociações realizadas por

Clayton, seja pela entrada em novos mercados (extensão internacional) ou aumento no

comprometimento (penetração), foram em função de oportunidades que surgiram ao longo de sua

interação no mercado, e não de atitudes de comprometimento com base em riscos e incertezas.

Nesse sentido, o modelo revisado de Uppsala (2009), baseado na teoria de redes, permite

análises adicionais que explicam tal comportamento.

Page 140: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

128

No modelo revisitado de Johanson e Vahlne (2009), os mercados são vistos como redes de

relacionamento em que as oportunidades de investimentos, inclusive internacionalizações, são

criadas em função da interação em tais relacionamentos.

Ao aplicar tal visão ao caso, pode-se observar diretamente a criação de oportunidades em

função dos relacionamentos desenvolvidos pela empresa. As parcerias com as empresas “Fazenda

Ambiental Fortaleza” (FAF) e “Minas Hill Coffee” ao mesmo tempo tornaram economicamente

viável a exportação de café e trouxeram clientes para empresa. As dimensões do aprendizado

presentes em Johanson e Vahlne (2009) contribuem de forma significativa para tal entendimento.

Através do processo de negociação direta é possível que aprendizados sejam desenvolvidos

e que possam ser utilizados tanto no desenvolvimento do relacionamento em questão quanto no

desenvolvimento dos demais relacionamentos. Ao interagir em um dado relacionamento, a firma é

capaz de aprender formas mais eficientes de coordenar atividades utilizando recursos das empresas

no relacionamento (JOHANSON e VAHLNE, 2009). Tal aprendizado tornou viável

economicamente as exportações da fazenda Ninho da Águia, pois esta passou a utilizá-las como

intermediário logístico nesse processo. Por outro lado, a negociação direta entre a fazenda Ninho

da Águia com as duas empresas parceiras possibilitou um aumento no comprometimento das

atividades entre elas. Isso pode ser verificado na declaração de Clayton:

A FAF seleciona os melhores cafés aqui, faz uma prova, análise sensorial,

pontuação, e direciona a venda para Europa e outros lugares. Já conhecem

o pessoal.

Com relação aos clientes, destaca-se a importância da dimensão “confiança” incluída por

Johanson e Vahlne (2009) em seu modelo revisitado. As parcerias com a FAF e a “Minas Hill

Coffee“ também abriu possibilidades de venda do café da fazenda para clientes de outros países,

com os quais a empresa não possuía contato direto. Apesar disso, essa negociação só foi possível

pela formação de confiança entre Clayton e os empreendedores das empresas parceiras, pois a

escolha dos clientes finais era importante para que a qualidade final do produto consumido não

fosse comprometida. Sendo assim, a falta de conhecimento de Clayton sobre o mercado local foi

substituída pela confiança construída com seus parceiros, tornando a venda indireta possível. Os

seguintes trechos do depoimento de Clayton endossam essa observação:

Page 141: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

129

Esse mercado é um nicho. A gente tem um cuidado só de escolher as

melhores cafeterias e os melhores torradores, pois o café você acaba com

ele na torra.

Além de parceiros (os executivos da FAF e da Minas Hill Coffee)

acabaram virando amigos. O mundo de cafés especiais ainda é muito

pequeno, então você acaba ficando amigo de seus clientes e parceiros

diretos... é um mercado bem justo e honesto, fair trade mesmo de verdade.

E um “direct trade”, pois a gente faz a venda direta também.

Com relação ao desenvolvimento de oportunidades, a mudança do problema gerencial de

extensão e penetração internacional para o desenvolvimento de relacionamentos (JOHANSON e

VAHLNE, 2009) contribui para explicar o processo de internacionalização da empresa, além da

escolha sobre quais territórios nacionais atuar.

Mesmo após a entrada de Clayton, em 1996, e a mudança no gerenciamento da fazenda

“Ninho da Águia”, a empresa levou mais de uma década antes de realizar sua primeira venda para

o mercado internacional, que aconteceu em 2013. Clayton passou por um longo processo de

acúmulo de conhecimento acerca do mercado de cafés especiais, além de entender os papéis dos

agentes nele atuantes. Durante essa fase, buscou diferentes formas de reconhecimento da qualidade

do café que produzia, enfrentado dificuldades para atrair potenciais agentes relevantes nesse

mercado (provadores de café). Tal reconhecimento só foi obtido através da participação e do êxito

em concursos. Além disso, tais concursos possibilitaram a interação entre Clayton e diversos

agentes, nacionais e internacionais, do ramo de cafés especiais. A partir de tal interação, os

relacionamentos forma construídos e as oportunidades de negociação foram geradas.

No ponto de vista de relacionamentos e de acordo com a teoria de Johanson e Vahlne

(2009), Clayton estaria enfrentando barreiras associadas a ser um forasteiro do mercado de cafés

especiais (liability of foreignness) assim como de não conhecer a estrutura interna e outros aspectos

da negociação presentes dentro da própria rede (liability of outsidership). Mais ainda, ao longo do

processo de negociação direta, Clayton relata a redução na dificuldade de negociação em momentos

posteriores com demais parceiros da rede, ou seja, as barreiras citadas tiveram sua influência

reduzida após acúmulo de conhecimento provenientes dos aprendizados. Nas palavras do

empreendedor, em diferentes trechos da entrevista concedida para a realização deste estudo:

A gente tinha uma dificuldade muito grande porque nosso café a maior

parte é natural, e os cafés naturais não estavam no padrão de qualidade que

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130

era o padrão aqui do Brasil, o cereja descascado. Então o provador tinha

dificuldade de vir aqui para provar esses cafés.

Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.

Teríamos que certificar a propriedade para caracterizá-la como livre de

agrotóxicos... O certificado se chama, "Certifica Minas", da EMATER.

Especificamente sobre sua dificuldade em se legitimar frente aos outros produtores de café

da região, Aídes verbaliza o ceticismo dos mesmos diante das ideias inovadoras de seu filho

Clayton para formar uma associação:

“Não vamos perder tempo com isso não, com um surfista sonhador, está

chegando aqui agora e quer inventar coisa. Nós que estamos aqui há 100

anos mexendo com café”.

Em linha com o modelo de Johanson e Vahlne (2009), o modo de entrada e a escolha por

quais territórios nacionais atuar também foi influenciada diretamente pelos relacionamentos

envolvidos. As empresas parceiras mencionadas já realizavam atividades comerciais para diversos

países no mundo. Sendo assim, Clayton pôde explorar essa oportunidade para que pudesse realizar

transações comerciais para esses países, influenciando na escolha sobre quais territórios nacionais

a fazenda “Ninho da Águia” poderia atuar. Por outro lado, a venda indireta, a partir da utilização

do conhecimento de mercado que os parceiros possuíam, também expandiu a possibilidade de

transações em países onde a empresa não havia tido um contato direto. Sendo assim, o

reconhecimento de oportunidades assume o caráter multilateral descrito no modelo, pois transações

foram realizadas a partir da iniciativa de Clayton e da iniciativa das parceiras. Nas palavras de

Clayton:

O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés. Através

deles mandamos para Alemanha, França, Noruega, Estados Unidos.

E continua:

Foi através da Minas Hill Coffee que eu mandei para Austrália.

Com relação às decisões de comprometimento, algumas características não estariam muito

bem alinhadas com o descrito em Johanson e Vahlne (2009). O modelo descreve ações de

comprometimento em relacionamentos como consequências de um processo de tomada de decisão

que envolveria uma análise da posição da empresa na rede, recursos dos agentes na rede, e dos

impactos que mudanças no relacionamento poderiam ocasionar. Apesar disso, de acordo com a

Page 143: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

131

descrição do caso, as decisões foram tomadas em função de oportunidades que surgiram no

mercado, não havendo necessidade de avaliações mais profundas acerca dos impactos de novos

relacionamentos para os demais existentes da firma. Um exemplo seria a formação de parceria com

a FAF sem uma avaliação de possíveis consequências para o relacionamento com a “Minas Hill

Coffee”, ou até mesmo do impacto que essas duas parcerias teriam com outras parcerias futuras.

Outro exemplo seriam os movimentos recentes da empresa, pois Clayton estaria buscando

alternativas de exportação que não utilizassem outras empresas como intermediárias.

O modelo de Johanson e Vahlne (2009) auxilia no entendimento do caso de forma

considerável ao adotar a ótica de relacionamentos. Por outro lado, considerações mais

contemporâneas do modelo em Vahlne e Johanson (2013 e 2014) contribuiriam para entender

movimentos mais recentes da firma em relação ao mercado internacional e nacional, assim como

enriquecem na explicação do processo de internacionalização da firma.

A teoria de capacidades dinâmicas, incluídas no modelo em Vahlne e Johanson (2013 e

2014), permite compreender a importância das capacidades empreendedoras e da capacidade de

formação de relacionamentos para explicar as mudanças ao longo da história da empresa.

A relevância da capacidade de buscar proativamente formas de melhor atender o mercado

(capacidades empreendedoras) fica evidente com a mudança na gerência da empresa. Depois de

quase 30 anos desde a criação da fazenda (1969-1996) em que essencialmente produzia-se café

commodity para venda sem perspectivas de alterações, a vinda de Clayton, em 1996, trouxe uma

nova mentalidade para a fazenda Ninho da Águia que seria refletida em termos de seu futuro. Além

disso, durante a primeira década sob sua gerência, Clayton continuou a buscar formas de elevar a

qualidade do café que produzia, fora as tentativas de aumento de reconhecimento da fazenda, sejam

por provadores ou prêmios em concursos. Em outras palavras, em um pouco mais de uma década

foi possível sair de uma situação em que se produzia café commodity em uma região com imagem

denegrida para a produção de café especial e transformá-la em uma região que o mundo inteiro

passaria a conhecer pela excelência na produção de café. Esse processo se evidencia nas palavras

de Clayton:

Depois dessa época, 2002, 2003, começaram a abrir umas cafeterias,

começou a se falar de café especial (no Brasil). Eu ia (nessas cafeterias),

Page 144: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

132

provava esses cafés e falava: "poxa, aqui a gente tem um café especial.

Então vamos focar nisso aí”.

A gente foi descobrindo que pegando esses cafés e secando

separadamente, anotando e tal, a gente tinha uma diversidade grande de

sabores de cafés, tudo da mesma propriedade, às vezes até na mesma

variedade.

Por exemplo, o australiano gosta mais de café frutado, então hoje a gente

já direciona para eles.

Durante o processo descrito, as capacidades de construir, desenvolver e coordenar

relacionamentos nas redes (capacidades de redes de relacionamento) também foi outro ponto chave

para o sucesso da empresa, pois permitiu a realização de venda no mercado internacional e na

aproximação com clientes, conforme previamente descrito e verbalizado por Aídes:

Um norueguês ficou tão entusiasmado com nosso café, por causa da alta

qualidade, que fez questão de vir aqui. Chamou meu filho e disse "Quero

que você me leve no Pico da Bandeira que quero fazer seu café lá no Pico

da Bandeira".

Por outro lado, essas duas capacidades também explicariam os movimentos mais recentes

da firma. A partir dos relacionamentos desenvolvidos, das capacidades de gerenciar tais

relacionamentos, e das capacidades empreendedoras, Clayton poderia modificar a orientação

estratégica da empresa tanto no plano nacional quanto internacional. Do ponto de vista

internacional, o empreendedor percebeu que seria capaz de exportar diretamente aos seus clientes

sem a necessidade de uma parceria, razão pela qual pretende orientar um de seus funcionários a

participar do curso “Exporta Fácil” do SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas

Empresas. Por outro lado, também notou que a receita com a venda de cafés torrados era mais

elevada em comparação a de cafés “verdes”, razão pela qual também pretende focar nesse mercado.

Do ponto de vista nacional, Clayton também busca formas de aumentar a participação das vendas

domésticas sobre o faturamento total da empresa, tendo em vista um menor custo logístico e um

mercado em expansão. Segundo Clayton:

Estou vendo a hora em que eu vou passar a ser só um produtor que torra o

café, e vendo só no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais valor.

Acho interessante fazer algumas vendas (internacionais de café verde),

pois você consegue abranger um número de pessoas que acabam

conhecendo o café e a região. Você pega Austrália, Berlin, Paris, Tóquio,

Estados Unidos, vários... então tem gente do mundo inteiro tomando seu

café.

Page 145: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

133

Com relação às capacidades dinâmicas institucionais e de internacionalização, elas podem

ser observadas, mas assumem um papel mais secundário durante o processo de internacionalização

da empresa. Ao utilizar parceiros para lidar com as questões logísticas no mercado internacional,

isso diminuiu a necessidade de Clayton em desenvolver tais habilidades, embora, atualmente, esteja

buscando desenvolver as capacidades institucionais da empresa, que se manifesta através de seu

interesse em cursos oferecidos pelo SEBRAE.

Com relação ao critério de perdas aceitáveis nas decisões de comprometimento, há dois

lados que poderiam ser considerados.

Ao longo da história da empresa até a atualidade, esse princípio pode ser percebido, embora

de forma velada. Na primeira década em que Clayton realizou mudanças no cultivo (não uso de

agrotóxicos), na colheita (seletiva) e buscou ativamente participar no mercado internacional de

cafés especiais, ele se valeu de sua intuição e conhecimento para alocar recursos financeiros (custo

de mão-de-obra mais alto, participação em concursos, atração de provadores) sem garantias de

retornos.

Por outro lado, ao considerar tal lógica no comprometimento em relacionamentos, não

houve critérios muito claros nesse sentido para avaliar impactos em relacionamentos presentes ou

futuros. Cabe destacar que Vahlne e Johanson (2013 e 2014) especificam que a lógica em

effectuation atuaria principalmente em cenários com altos níveis de incerteza, o que não se aplicaria

ao caso em questão de acordo com a descrição de Clayton.

Porque esse mercado de café especial não é um mercado que oscila como

o mercado de commodity. Você já tem meio que uma tabela de preços que

já pode se programar.

Apesar de algumas características serem melhor compreendidas em Vahlne e Johanson

(2013 e 2014), outras não se apresentaram conforme especificadas pelo modelo.

Além da questão do impacto em relacionamentos, previamente abordada, que não condiz

com a descrição no modelo, Vahlne e Johanson (2013 e 2014) descrevem os processos

organizacionais como o ambiente em que as capacidades dinâmicas são implementadas e

desenvolvidas. Apesar disso, a empresa do caso em questão não apresenta uma estrutura

Page 146: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

134

organizacional bem fundamentada e condizente com tal afirmativa, ficando explícito nas palavras

de Clayton:

A gente não tem internet na fazenda. Até 2012 eu não tinha nem telefone

celular, nem e-mail. Meus amigos de São Paulo diziam: "até índio tem...",

eu respondia, "poxa, mas eu não uso. Eu moro na fazenda, aqui não tem,

o trabalho que eu faço não precisa de internet (risos)”.

... Tem o Vinícius que veio ajudar na parte mais da gestão, pois estamos

começando a organizar mais essas coisas aqui.

Levando em consideração as análises realizadas, percebe-se que o modelo de Uppsala

Revisitado (2013 e 2014) explica várias características do processo de internacionalização da

empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, pois sua atuação no mercado internacional, seja por

modo de entrada ou escolha por territórios, deu-se de forma muito associada à questão das

oportunidades desenvolvidas nas redes de relacionamento. Além disso, as capacidades dinâmicas

da empresa ajudam a compreender de que forma o conhecimento adquirido nos relacionamentos

serviu para criar vantagens competitivas para a empresa.

5.2 PERSPECTIVA DE REDES

A teoria desenvolvida em Johanson e Mattsson (1988) descreve mercados como redes de

relacionamento em que o processo de internacionalização da empresa ocorre através do

desenvolvimento de relacionamentos e no fortalecimento da posição da firma em relação a uma

rede nacional estrangeira. Nesse contexto, as escolhas realizadas ao longo do processo de

internacionalização envolvem ativos (da firma e de mercado) que estão sob o controle da firma em

questão e de outras na rede. Além disso, o mapeamento de oportunidades leva em consideração o

nível de internacionalização tanto da firma em análise como da rede em questão.

Johanson e Mattsson (1988) descrevem a entrada em um novo mercado como a introdução

na rede em questão. Tal aspecto pode ser observado pelos esforços realizados por Clayton ao longo

da primeira década de gestão, pois, embora almejasse atuar no mercado internacional de cafés

especiais, estava tendo dificuldades para introduzir-se nesse mercado. Essa dificuldade estaria

alinhada com aspectos mencionados no modelo, pois envolveria o desenvolvimento de

relacionamentos com empresas que atuam em tal mercado (rede).

Page 147: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

135

No âmbito do desenvolvimento de relacionamentos e a inserção no mercado em questão,

destaca-se a importância das feiras internacionais pela oportunidade que representam em reunir

diversos agentes no mercado de cafés especiais. Através da “Semana Internacional do Café” (SIC),

Clayton conseguiu desenvolver relacionamentos com agentes dessa rede. Neste sentido, Clayton

destaca:

O cliente que provou nosso café nessa feira. A feira é legal porque você

encontra todo mundo que precisa no mesmo lugar. Você vai ter a

possibilidade de conhecer maquinário novo, provar cafés de outras

regiões, e conhecer os clientes que provavelmente vão ser os compradores

do seu café

Além disso, a teoria de redes em Johanson e Mattsson (1988) ajuda a compreender o modo

de entrada e os territórios nacionais em que a empresa escolheu atuar.

O modelo também descreve quatro cenários possíveis para uma dada empresa de acordo

com o nível de internacionalização da firma e da rede de produção. Nesse sentido, a empresa

poderia ser enquadrada como uma “entrante tardia” (Late Starter). Através dos relacionamentos

desenvolvidos com a FAF e a ”Minas Hill Coffee”, a empresa passou a ter uma relação indireta

com diversos países no mercado internacional de cafés especiais. Em tal contexto, o nível de

internacionalização dessas duas empresas foi importante, pois promoveu a possibilidade de

comercialização entre a fazenda “Ninho da Águia” e clientes internacionais, levando em

consideração o processo de venda indireta. Mais ainda, os mercados nacionais escolhidos estariam

alinhados com os países para os quais a FAF e a “Minas Hill Coffee” comercializavam, o que

também estaria alinho com o descrito no modelo.

Por outro lado, apesar do cenário apresentado ajudar a compreender o mapeamento de

oportunidades e o processo de internacionalização da firma, alguns aspectos não estariam alinhados

com a teoria descrita por Johanson e Mattsson (1988).

Primeiro, mudanças nos relacionamentos são descritos como processos custosos que

passam por um processo de avaliação da empresa em função de seus impactos futuros. Apesar

disso, a escolha por parceiros realizadas por Clayton teria sido mais em função de oportunidades

de negócio desenvolvidas do que uma avaliação da posição da firma na rede.

Page 148: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

136

Segundo, o modelo descreve o mapeamento de oportunidades dependendo do nível de

internacionalização da firma e da rede de produção. Nesse sentido, é possível perceber que no caso

em questão o mapeamento de oportunidades foi mais em função do nível de internacionalização da

empresa parceira do que da rede de produção como um todo. Mais ainda, o nível de

internacionalização da rede de produção não apresentou impactos nas oportunidades

desenvolvidas.

Levando em consideração a análise realizada, o modelo desenvolvido por Johanson e

Mattsson (1988) ajuda a compreender as dificuldades encontradas ao longo da história da empresa

para atuar no mercado de cafés especiais, pois a carência de relacionamentos com agentes desta

rede representariam a principal barreira. Mais ainda, o nível de internacionalização das empresas

envolvidas nos relacionamentos contribui para compreender a escolha daqueles territórios

nacionais nos quais Clayton iria atuar.

5.3 PERSPECTIVA DE EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL

Os trabalhos de Oviatt e McDougall (1989) representam o início do estudo em

empreendedorismo internacional, pois visam demostrar que existem diferenças significativas no

comportamento de firmas que, desde sua criação, buscam atuar no mercado internacional

(International New Ventures). Nesse sentido, Oviatt e McDougall (2004) constroem um modelo

com o objetivo de explicar o processo de internacionalização dessas empresas, levando em

consideração aspectos levantados por estudos no campo, como: empreendedores com experiência

internacional, detenção de produtos ou serviços diferenciados, orientação estratégica da empresa,

e estruturas de governança alternativas.

Ao se avaliar o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”

sob a perspectiva do modelo de Oviatt e McDougall (2004), não seria possível constatar diversas

características fundamentais descritas no modelo, embora a empresa tenha tido um foco no

mercado internacional influenciado pela visão de Clayton.

Os autores definem que as INV seriam organizações que, desde sua criação, visam obter

significativa vantagem competitiva através do uso de recursos e venda de produtos para diversos

países (OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Ao considerar o período da empresa antes da chegada

Page 149: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

137

de Clayton (1969-1996), a organização, em nenhum momento, demonstrou esse tipo de interesse.

Além disso, mesmo após 1996, sob a gestão de Clayton, a visão de venda do produto para o

mercado internacional ocorreu por uma questão circunstancial, pois o mercado nacional de cafés

especiais não estava atraente, conforme declaração do empreendedor:

...era muito difícil porque não tinha mercado (mercado nacional para cafés

especiais).

Com relação a velocidade e momento (timing) de internacionalização (RENNIE, 1993), a

empresa passou por um processo longo até que fosse possível realizar as primeiras vendas para o

mercado internacional. Considerando o período desde sua criação (1969), a fazenda “Ninho da

Águia” levou cerca de 44 anos até sua primeira venda internacional. Mesmo considerando a entrada

de Clayton como um “novo começo”, esse período passa ser de 17 anos. Sendo assim, a

classificação da empresa como “nascida global” (Born Global) também não é apropriada.

Com relação a vantagem locacional, que envolve a combinação de recursos móveis com

recursos menos móveis ou imóveis no exterior, a empresa também não apresentou avanços nesse

sentido, pois seu produto não possibilitava uma transferência devido à alta especificidade

relacionada ao processo produtivo.

Além disso, ao considerar a evolução da empresa no contexto do modelo de Oviatt e

McDougall (2004), o faturamento da empresa e as decisões ao longo dos últimos 5 anos também

não estariam alinhadas com o modelo.

Pelo lado do faturamento, embora não haja detalhes históricos sobre o mesmo, o

empreendedor estima que no ano de 2016 80% seja originário do mercado nacional, o que seria até

certo ponto contraditório com uma empresa teria foco no mercado internacional. Com relação às

decisões dos últimos 5 anos, a empresa estaria reduzindo sua participação no mercado internacional

em detrimento do mercado nacional, tendo em vista receitas superiores, o que novamente não

estaria alinhado com uma INV ou uma “nascida global”.

Por outro lado, algumas considerações da teoria de empreendedorismo internacional em

Oviatt e McDougall (2004) seriam interessantes para entender razões para o sucesso da empresa

no mercado internacional.

Page 150: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

138

Primeiro, a empresa possui um produto que é altamente diferenciado, sendo esta uma

característica fundamental para a construção de vantagens competitivas no mercado internacional,

de acordo com o modelo de Oviatt e McDougall (2004). Mais ainda, devido a especificidade do

processo produtivo e da impossibilidade de transferência de certos insumos (solo, irrigação,

microclima regional), é um produto que é muito difícil de ser imitado por outros concorrentes.

Mesmo que fosse possível quebrar os “segredos” por trás do processo produtivo utilizado na

fazenda, replicar o produto final ainda é muito difícil, como é possível depreender das declarações

de Clayton:

A gente foi descobrindo que pegando esses cafés e secando

separadamente, anotando e tal, a gente tinha uma diversidade grande de

sabores de cafés, tudo da mesma propriedade, às vezes até na mesma

variedade.

Irrigação aqui é só o papai do céu que faz... Aqui chove na medida.

E que é corroborado por seu pai, Aídes:

O café é exatamente igual aos vinhos, pois é o microclima, microrregião,

e o "terroir". O café dá ali, mas se você pegar 1 Km para baixo você não

vai fazer o mesmo café. Por causa do microclima.

Segundo, a utilização de estruturas de governanças alternativas em conjunto com a

construção de redes de relacionamento permitiu que Clayton utilizasse dos recursos logísticos de

outras empresas sem que houvesse a necessidade de controle direto sobre a atividade. Em suas

palavras:

O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés. Através

deles mandamos para Alemanha, França, Noruega, Estados Unidos.

Foi através da Minas Hill Coffee que eu mandei para Austrália.

Terceiro, os avanços tecnológicos nos sistemas de informação e logística também seriam

benéficos para o caso de Clayton, um pequeno agricultor do interior de Minas Gerais. Por um lado,

os avanços nas tecnologias de informação deram possibilidade para que a empresa tivesse acesso

a mecanismos de rastreamento de produto que permitem o cliente final acessar informações

detalhadas acerca de sua origem em qualquer lugar do mundo (Certificado EMATER-MG). Por

outro lado, o barateamento nos custos logísticos permitiu que empresas menores, como a FAF e a

“Minas Hill Coffee”, fornecessem serviços logísticos para parceiros ainda menores sem que

acarretasse em um preço proibitivo, conforme se observa no testemunho de Clayton:

Page 151: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

139

Esses cafés vão todos identificados com o nome da fazenda, da região, do

produtor, etc. A pessoa está lá do outro lado do mundo tomando um café,

mas sabendo que é daqui...é importante a rastreabilidade.

Levando em consideração o segundo e o terceiro ponto, eles foram, do ponto de vista

financeiro e logístico, as variáveis que permitiram que Clayton pudesse realizar atividades com

clientes estrangeiros.

Por fim, a chegada de Clayton como um novo empreendedor na empresa teria provocado

mudanças consideráveis no rumo estratégico desta, tendo em vista que ele teria sido o visionário

acerca das possibilidades promissoras do mercado de cafés especiais no exterior. Nesse contexto,

isso poderia ser observado no modelo de Oviatt e McDougall (2004), pois a importância do

empreendedor no processo de internacionalização da firma é destacado. Por outro lado, o modelo

aborda empreendedores com experiência internacional, o que não é o caso de Clayton. O

conhecimento “internacional” que Clayton possuía não teria sido em função de sua experiência,

mas sim de leituras e conhecimento acumulado, conforme declara o empreendedor:

Depois dessa época, 2002, 2003, começou a abrir umas cafeterias,

começou a se falar de café especial. Eu ia, provava esses cafés e falava:

"poxa, aqui a gente tem um café especial. Então vamos focar nisso aí".

Mas demorou até isso virar (se referindo à apreciação por cafés especiais

no mercado).

Levando tais aspectos em consideração, observa-se que o poder explanatório do modelo

desenvolvido por Oviatt e McDougall (2004) para entender o processo de internacionalização da

fazenda “Ninho da Águia” é restrito, pois diversos aspectos fundamentais do referido modelo não

estão presentes nesta. Por outro lado, algumas variáveis do modelo ajudam a entender o sucesso

obtido no mercado internacional e mudanças realizadas durante a história da empresa, como:

características do empreendedor, uso de estrutura de governança alternativa em conjunto com a

formação de relacionamentos, produto diferenciado, e avanços tecnológicos.

5.4 PERSPECTIVA DE EFFECTUATION

A perspectiva do racional humano na lógica effectuation trouxe uma nova forma de avaliar

o processo de tomada de decisão do agente. Nesse sentido, a racionalidade limitada apresenta-se

como principal fator para explicar de que forma um agente cerceado nas capacidades de

processamento e lógicas (vieses e falácias) consegue adotar medidas racionais através do uso da

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140

heurística e indução. Partindo desses pressupostos e questões, Sarasvathy (2001) constrói um

modelo, que chamou de effectuation que busca explicar o processo de tomada de decisões em

organizações empreendedoras.

O uso do modelo desenvolvido por Sarasvathy (2001) para entender o desenvolvimento da

empresa “Café Fazenda Ninho da Águia” é interessante, pois permite compreender aspectos do

processo de tomada de decisão realizados tanto antes quanto após o ingresso de Clayton, em1996,

na gestão do negócio.

Durante a primeira fase da empresa (1969-1996), Aídes não possuía um objetivo bem

definido acerca do futuro da empresa. Apesar disso, a decisão por plantar cafés e as demais decisões

tomadas foram suficientes para que mantivesse seu desejo inicial de mantê-la rentável. Nesse

sentido, a utilização dos princípios do “passarinho na mão” e de perdas aceitáveis permite

compreender como tal decisão foi tomada sem que houvesse um planejamento mais elaborado.

Aídes aproveitou um momento em que o preço do café estava atraente associado a possibilidade

de seu plantio (“o que ele sabe”) e a disponibilidade do seu irmão em trabalhar na fazenda (“quem

ele conhece”). Sendo assim, decidiu por investir no cultivo de café tendo como única restrição um

mínimo de rentabilidade para que não fossem necessários aportes financeiros pessoais (“perdas

aceitáveis”). Conforme relata Aídes:

É o seguinte: tinha uma parte que era de gado, e eu falei: "vou plantar um

pouco de café aqui porque tem períodos em que o café fica muito bom de

preço"... teve no governo de 1960 e um pouco para cá, foi 66, que

mandaram erradicar todo o café velho aqui para baixo porque dava doença.

Então o café ficou muito bom de preço e o pessoal começou a ganhar

bastante dinheiro com o café então a gente viu que era um setor lucrativo.

A análise da segunda fase da empresa (1996 em diante) apresenta algumas características

que podem ser compreendidas pelo modelo de Sarasvathy (2001) enquanto outras nem tanto.

Com relação a atitude de querer desenvolver a região e da tentativa de formar uma

associação, a dimensão do meio “quem você é” considerada no modelo é interessante para entender

tal comportamento. A identidade de Clayton ligada a princípios de retornos sociais e econômicos

na região foi um grande motivador para que quisesse ter sucesso em seu empreendimento. Tal

característica estaria presente até mesmo em suas intenções futuras, pois o empreendedor manifesta

seu objetivo de desenvolver e compartilhar pesquisas que tragam retornos à região. Além disso, a

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141

identidade de Clayton também atuou no sentido das decisões iniciais do não uso de agrotóxicos,

pois não foi baseada em análises de retornos financeiros, e sim no que ele julgava ser o mais correto

para o plantio. Nesse sentido, também é possível argumentar que tal decisão foi tomada a partir de

conhecimento prévio relacionado a leituras que fazia (“o que você sabe”), mas, tendo em vista que

tal decisão não apresentou uma consideração de retornos financeiros, é possível entender que a

dimensão da identidade do agente possa ter sido a maior influenciadora. Isso pode ser

exemplificado por um trecho da entrevista de Clayton:

Nós não temos a ideia de crescer muito em produção. Queremos focar na

qualidade e cada vez ter uma diversidade maior de sabores de café, de

variedades de café. Estamos fazendo um centrinho de pesquisa para

plantar diversas variedades e ir testando o que funciona melhor aqui. Isso

vai servir até mais para frente para os outros produtores, pois saberiam

quais variedades que funcionariam melhor aqui. Além disso, serviria para

ensinar a maneira correta de provar café.

Com relação a visão de mercado, Clayton sempre manteve uma percepção de possibilidades

de parcerias e aproximações ao invés de um ambiente competitivo mais “selvagem”. Além disso,

em linha com o descrito por Sarasvathy (2001), a realização de parcerias foi concretizada a partir

de oportunidades que foram surgindo, sem levar em consideração o impacto dessa parceria em

parcerias futuras. Por outro lado, a motivação não teria sido diminuir incertezas ou criar barreiras

de entrada conforme no modelo, mas sim o aproveitamento de oportunidades de negócio. Nas

palavras de Clayton:

Esse mercado não tem um concorrente direto, pois a pessoa que é

apreciador de café especial quer provar vários cafés, então, na verdade,

somos parceiros. A gente não chega a ser concorrente. Eu quero tomar o

café dele, ele quer tomar o meu. É um mercado light. Ainda não tem aquele

sangue no olho de que não pode mostrar isso, não pode mostrar aquilo.

Acho que até vai chegar a ter essa concorrência futuramente, mas vai

demorar um pouco ainda. Por enquanto somos todos amigos.

Com relação ao processo de desenvolvimento de meios, parte do que se observou no caso

estaria em linha com os ciclos de expansão de recursos descritos no modelo, pois a interação com

outros agentes e as ações de comprometimento deram espaço para a formação de novos

aprendizados (“o que você sabe”) e de novos relacionamentos (“quem você conhece”).

Já com relação ao processo de desenvolvimento da empresa, verifica-se a predominância

da lógica causation, em detrimento da lógica effectuation. A realização do potencial de qualidade

superior do café produzido e a consequente decisão dos gestores da “Ninho da Água” de atuar no

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142

mercado internacional apresentou uma lógica predominantemente em causation, pois, tendo como

base tal objetivo, Clayton passou a reunir os meios necessários para tornar isso possível (tentativa

de atrair provadores, certificações, participação em feiras, parcerias). Por outro lado, é possível

argumentar que tais decisões teriam utilizado um critério de perdas aceitáveis, embora de uma

forma velada, conforme pode ser verificado nos depoimentos dos gestores do empreendimento:

Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.

Teríamos que certificar a propriedade para caracterizá-la como livre de

agrotóxicos... O certificado se chama, "Certifica Minas", da EMATER.

Levando tais aspectos em consideração, a análise da empresa através das proposições de

Sarasvathy (2001) permite compreender a lógica utilizada do processo de tomada de decisão

durante a fase inicial da empresa. Além disso, a identidade do empreendedor como uma

característica que influencia no próprio racional do agente, também foi útil para compreender certas

atitudes adotadas por Clayton, tanto no campo de parcerias como na sua visão de mercado. Apesar

disso, o processo de desenvolvimento da empresa teria sido mais caracterizado pelas decisões em

linha com a lógica causation do que com a lógica em effectuation.

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143

6. Conclusões e Recomendações

6.1 CONCLUSÕES

No presente estudo, foi realizada a análise do processo de internacionalização de uma

fazenda produtora de cafés especiais localizada no estado de Minas Gerais, tomando-se como base

as teorias comportamentais de internacionalização, com especial foco na teoria de Uppsala, teoria

de Redes de Relacionamento, Empreendedorismo Internacional, e na lógica Effectuation. Além

disso, para promover um contexto acerca do ambiente que a empresa está inserida, foi realizado

um estudo setorial do setor cafeeiro brasileiro, com especial destaque para o mercado de cafés

especiais.

Para a realização de tal pesquisa, o método foi escolhido com base no objetivo de estudo,

que seria analisar os fatores que influenciaram o processo de internacionalização da empresa “Café

Fazenda Ninho da Águia”, tendo por base as proposições teóricas que buscam explicar o fenômeno

da internacionalização de empresas, acima referidas. Sendo assim, optou-se pelo método de

pesquisa qualitativo com o estudo de caso único. Conforme explicitado no capítulo referente à

metodologia, esse método é apropriado no contexto de considerações do tipo “como” e “por que”.

Com relação a coleta de dados, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os dois

principais empreendedores da fazenda, Aídes Gomes Monteiro, dono da fazenda desde 1969, e

Clayton Barrosa Monteiro, filho de Aídes e responsável pelo dia a dia das operações da empresa.

De forma complementar e com o objetivo de permitir a triangulação das informações –

confirmações e checagens, fez-se coleta dados secundários com base em portais das associações

específicas do setor cafeeiro, como: ABIC, APEX, BICC, BRASIL GOV, BSCA, CECAFÉ,

CONAB, CNC, ICO e SEBRAE. Por fim, as informações foram organizadas e analisadas, tendo

como pano de fundo as teorias em questão.

Para a realização do estudo, cinco perguntas de pesquisa foram utilizadas como forma de

estruturar a análise realizada. As perguntas buscaram incluir as dimensões abordadas nas teorias

de internacionalização comportamentais, sendo essas os fatores que motivaram a empresa se

internacionalizar, a relevância dos relacionamentos no processo de internacionalização, a

relevância do papel do empreendedor, os fatores que influenciaram na ordem dos territórios

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144

nacionais que a empresa escolheu atuar, e os aspectos que influenciaram no modo de entrada. Sendo

assim, ao responder tais perguntas de pesquisa, é possível compreender de uma forma mais

completa o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”.

A primeira pergunta de pesquisa foi: “Quais fatores motivaram a empresa a se

internacionalizar? ”. Para responder tal pergunta, é necessário observar o processo histórico da

empresa antes e após o ano de 1996. Até 1996, a principal pessoa responsável pelo gerenciamento

da fazenda era o irmão de Aídes. Durante esse período, a fazenda basicamente produzia e vendia

no mercado nacional, não havendo avanços significativos na qualidade do café produzido. Já em

1996, a chegada de Clayton para assumir a gerência da fazenda trouxe uma nova mentalidade na

forma como os processos da fazenda eram realizados. Com base em seu conhecimento prévio

adquirido, principalmente através da leitura de publicações especializadas, e de observações

realizadas, percebeu que a forma única que o café era colhido não fazia muito sentido, além da

prática comum entre os produtores/comercializadores brasileiros de deixar os piores cafés para o

consumo de suas famílias. Além disso, Clayton decidiu não utilizar agrotóxicos no plantio. Tais

medidas contribuíram para que a qualidade do café produzido na “Ninho da Águia” aumentasse

consideravelmente.

Paralelamente a isso, no início dos anos 2000, cafeterias de cafés especiais começaram a

ser criadas em São Paulo. Após Clayton frequentar algumas dessas cafeterias e comparar o café

servido nestas com o que ele produzia na fazenda, percebeu que possuía um café com qualidade

tão boa quanto àqueles servidos, até mesmo superior. Sendo assim, vislumbrou a possibilidade de

atuar no setor de cafés especiais tornando-a como um objetivo em seu negócio. Apesar disso, de

acordo com Clayton, o mercado nacional de cafés especiais seria muito embrionário em

comparação com o mercado internacional, razão pela qual resolveu por focar neste último.

Levando tais aspectos em consideração, pode-se perceber que a decisão pela

internacionalização da empresa estudada estaria associada à dimensão da capacidade dinâmica de

empreendedorismo descrita em Vahlne e Johanson (2013 e 2014), pois o empreendedor possuiria

um processo ativo de buscar formas de explorar o mercado e melhor atender seus clientes. Além

disso, fatores ambientais também contribuíram para tal escolha, pois, de acordo com a percepção

de Clayton à época, o mercado nacional de cafés especiais não seria atraente.

Page 157: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

145

A segunda pergunta de pesquisa que orientou este estudo foi: “Qual foi a relevância dos

relacionamentos no processo de internacionalização da empresa? ”. Quando se analisa o caso da

“Ninho da Águia” em perspectiva, observa-se que os relacionamentos foram de extrema

importância para seu processo de internacionalização. Através das parcerias estabelecidas com a

“Fazenda Ambiental Fortaleza” (FAF) e com a “Minas Hill Coffee” foi possível tornar viável

economicamente as exportações da pequena empresa, tendo em vista os custos logísticos elevados

associados às operações portuárias, transportes em diversos modais, serviços aduaneiros e outros,

dentre os quais foi citado pelo empreendedor o “aluguel” de um container para acondicionar seus

produtos para a exportação. Além disso, essas duas empresas trouxeram clientes para Clayton.

Nesse sentido, cabe destacar a dimensão da construção de confiança entre os agentes, pois através

desta foi possível a realização da modalidade de venda indireta, ou seja, utilizando os parceiros

como agentes no mercado internacional. Por fim, o conhecimento institucional das parceiras foi

importante para a negociação no mercado internacional, pois estas ficavam responsáveis por toda

a operação logística do café vendido por Clayton ao exterior, seja por venda direta ou indireta.

Ainda na relevância dos relacionamentos, destaca-se a importância das feiras

internacionais, em especial a “Semana Internacional do Café” (SIC), pois foram os ambientes que

permitiram a aproximação de Clayton tanto de com seus clientes estrangeiros como com seus dois

parceiros mencionados.

A terceira pergunta de pesquisa foi: “Qual a relevância do papel do empreendedor no

processo de internacionalização? ”. Além da orientação estratégica no sentido de atuar no mercado

internacional abordado na primeira pergunta, também é possível destacar outras características da

relevância do empreendedor no processo. Nesse sentido, observa-se a capacidade dinâmica das

redes de relacionamento presente no modelo de Vahlne e Johanson (2013 e 2014), pois a habilidade

de Clayton em desenvolver tais relacionamentos e coordená-los foi importante para que

conseguisse usar recursos de outras empresas sem a necessidade de controlá-los diretamente,

conforme descrito na segunda pergunta. Além disso, a identidade do empreendedor considerada na

dimensão “quem ele é” no modelo de Effectuation de Sarasvathy (2001) contribuiu para criar uma

visão de mercado como um ambiente mais cooperativo do que competitivo, o que direcionaria sua

busca por parcerias e alianças.

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146

A quarta pergunta de pesquisa foi: “Quais aspectos influenciaram na ordem dos territórios

internacionais que a empresa passou a atuar? ”. Em um primeiro momento, os mercados

estrangeiros que a empresa atuou estavam associados aos relacionamentos construídos com clientes

ao longo das feiras internacionais, tendo em vista os mercados que as empresas parceiras já

possuíam atividades. Em um segundo momento, os mercados foram influenciados de maneira mais

direta pelas parceiras, tendo em vista a possibilidade da venda indireta em que as parceiras

funcionariam como agentes.

A quinta pergunta foi: “Quais aspectos influenciaram o modo de entrada escolhido para os

países em questão? “. Dois aspectos influenciaram diretamente no modo de entrada escolhido.

Primeiro, sendo uma empresa pequena com recursos e poder limitados, ela não tinha a possibilidade

de controlar recursos no exterior que permitissem formas mais diretas de negociação com o cliente

final. Segundo, tendo em vista o primeiro aspecto e a formação das redes de relacionamentos como

forma de usar recursos de outros agentes sem a necessidade de controlá-los diretamente, o modo

de entrada basicamente ficou atrelado às opções disponibilizadas pelos parceiros, ou seja,

exportações diretas em que eles funcionariam como operadores logísticos ou a venda indireta em

que eles exerceriam um papel similar ao de um agente.

Conclui-se, portanto, que cada uma das teorias abordadas no estudo de caso da empresa

“Café Fazenda Ninho da Águia” contribui para adicionar dimensões diferentes para o entendimento

do seu processo de internacionalização. Apesar disso, percebe-se que a teoria de Vahlne e

Johanson, proposta em seu artigo de 2013 e refinada em sua publicação de 2014, seria a que

apresenta o maior poder explanatório sobre o fenômeno analisado, tendo em vista alguns fatores.

Primeiro, a abordagem sobre capacidades dinâmicas permite compreender as mudanças realizadas

de maneira proativa pelos empreendedores da fazenda “Ninho da Águia” que resultaram na

construção de vantagens competitivas para a empresa. Segundo, a importância das redes de

relacionamento no processo de criação de oportunidades associado à utilização de estrutura de

governanças alternativas, permite compreender a lógica por trás da busca de parceiros, do modo de

entrada, e dos territórios nacionais que a empresa escolheu atuar. Por fim, a estrutura de redes

também permite entender as dificuldades enfrentadas ao longo do processo de internacionalização

da empresa em um momento que a empresa estaria fora dessas redes.

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147

6.2 RECOMENDAÇÕES PARA PESQUISAS FUTURAS

Kiss et al (2012) apontam que são raros os estudos sobre empreendedorismo internacional

realizados no Brasil, tornando esse campo bastante promissor em termos de investigações e

explorações futuras, considerando os diferentes segmentos de atividades econômicas

desenvolvidas no Brasil.

Além dessa recomendação de caráter genérico, que envolve a investigação sobre o

fenômeno do empreendedorismo internacional no Brasil, sugere-se, em particular, que outros

estudos sejam conduzidos no setor rural brasileiro. Tais estudos poderiam investigar a ocorrência

dessa nova configuração de organização, com o intuito de melhor exemplificar e, em sua

acumulação, sistematizar o conhecimento sobre um fenômeno que pode apresentar características

peculiares de uma economia em desenvolvimento como a do Brasil, e que é distinta daquelas nas

quais os atuais modelos e proposições teóricas foram configurados.

Levando-se em conta que o Brasil é o maior produtor mundial de café, sugere-se que esse

setor seja objeto de outros estudos, tanto qualitativos quanto quantitativos, pois seus achados

seriam extremamente úteis tanto para os produtores de café, na concepção de suas estratégias,

quanto para os governos, quanto da formulação de políticas para o desenvolvimento do setor

cafeeiro brasileiro.

Por último, mas não menos importante, sugere-se voltar à fazenda “Ninho da Águia” dentro

de alguns anos, para investigar, numa perspectiva longitudinal, os desenvolvimentos do

empreendimento tanto em termos operacionais quanto estratégicos.

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CECAFÉ (2014). “Exportações Brasileiras de Café - Dezembro 2014”. Disponível em:

<http://www.cncafe.com.br/ba/file/CECAF%C3%89_-_Resumo_das_Exporta%C3%A7%C3%

B5es_de_Caf%C3%A9_DEZEMBRO_2%20014.pdf>. Acesso em 28/07/2015

CECAFÉ (2015). “Exportações Brasileiras de Café - Junho 2015”. Disponível em:

<http://www.cncafe.com.br/ba/file/CECAF%C3%89%20-%20Resumo%20das%20Exporta%C3

%A7%C3%B5es%20de%20Caf%C3%A9%20JUNHO%202015.pdf>. Acesso em 28/07/2015

CONAB (2014). “Acompanhamento da Safra Brasileira – Café Dezembro 2014”. Disponível em:

<http://conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/14_12_22_09_53_55_boletim_dezembro_2014

.pdf>. Acesso em 28/07/2015

CONAB (2015). “Acompanhamento da Safra Brasileira – Café Junho 2015”. Disponível em:

<http://conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/15_06_09_09_02_31_boletim_cafe_junho_201

5.pdf>. Acesso em 28/07/2015

CNC (2015). “Café do Brasil - Características Agronômicas”. Disponível em: <http://www.cncafe.

com.br/site/interna.php?id=26>. Acesso em 28/07/2015

ICO (2015). “Coffee Trade Statistics Infographic”. Disponível em: <http://www.ico.org/

monthly_coffee_trade_stats.asp>. Acesso em 28/07/2015

ICO (2015). “ICO Indicator Prices - june 2015”. Disponível em: <http://www.ico.org/prices/p1-

June.pdf>. Acesso em 28/07/2015

ICO (2015). “Total production by all exporting countries”. Disponível em: <http://www.ico.org/

prices/po-production.pdf>. Acesso em 28/07/2015

Page 169: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

157

ICO (2015). “World coffee consumption”. Disponível em: < http://www.ico.org/prices/new-

consumption-table.pdf>. Acesso em 28/07/2015

SEBRAE (2015). “Conheça as Categorias de Certificação de Café”. Disponível em: <http://www.

sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/Conhe%C3%A7a-as-categorias-de-certifica%C3%A7%

C3%A3o-do-caf%C3%A9>. Acesso em 28/07/2015

Page 170: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

158

LISTA DE APÊNDICES

APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA

Data: ___/___/___ Entrevistador: _________________________________________

Empresa: ______________________________________________________________________

Endereço: _____________________________________________________________________

Telefone: _________________Fax: _____________e-mail: ______________________________

Informações sobre o Respondente

Nome: ______________________________ Cargo: ___________________________________

Nacionalidade: ________________________

Há quanto tempo desempenha esta função na empresa: ____________anos.

Formação acadêmica:

Graduação: (curso e instituição) ____________________________________________________

Pós-Graduação: (curso e instituição) _________________________________________________

Experiência profissional anterior: ___________________________________________________

______________________________________________________________________________

Alguma etapa de sua formação acadêmica foi adquirida no exterior?

( ) Não

( ) Sim. Qual? (tipo, duração, país) __________________________________________________

Número médio de viagens ao exterior por ano (a trabalho e a lazer): _________________________

Alguma fase de sua experiência prévia contribuiu especialmente para a execução das suas

atividades atuais?

Page 171: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

159

Como estava sua vida na época que você criou a empresa?

Como que foi o processo que envolveu a criação da empresa? Tiveram barreiras? Quais foram?

Tiveram facilitadores? Quais foram?

Houve algum tipo de apoio ou incentivo externo para a criação? Governamental, familiar,

locacional, etc.?

Quais metas ou objetivos você tinha em mente para a empresa?

Você queria abrir a empresa sozinho ou buscou sócios?

Informações sobre a Empresa

Ano de fundação: ______

Ramo de atividade: ______________________________________________________________

Principais produtos comercializados por sua empresa:

Produtos (por ordem de importância no faturamento)

No Brasil No Exterior

1 1

2 2

3 3

4 4

Número de funcionários no Brasil: ________

Número de funcionários no exterior, incluindo aqueles que, mesmo estando no Brasil dedicam-se

às atividades de comércio no exterior: _______________________

Existe alguma instalação no exterior? Se sim, de que tipo (escritório comercial, centro de

distribuição, fábrica, etc)? ______________________________________

Faturamento total anual: R$ _______________________

Page 172: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

160

Faturamento referente à comercialização dos produtos no exterior, como % do faturamento total:

___%

Possui esse dado segmentado por país de atuação? Se sim, como se dá essa distribuição (em

porcentagem e por produtos mais vendidos)?

Qual o público-alvo dos produtos comercializados pela empresa? Como se dá essa segmentação?

Informações sobre as Operações no Exterior

Qual foi o primeiro país para o qual a empresa exportou ou iniciou operação internacional:

__________________

Em que ano em essa primeira venda ou operação aconteceu? ____

Qual foi o principal motivo que, no seu entender, levou a empresa a iniciar operações no exterior,

especificamente neste primeiro país?

( ) solicitação de um cliente no Brasil que estava operando nesse país;

( ) pedido de um cliente localizado nesse país;

( ) oportunidade no mercado externo identificada através de pesquisa de mercado;

( ) oportunidade no mercado externo por meio de contato em feira específica do setor.

( ) incentivos governamentais para estender as operações para esse país;

( ) por ser geograficamente próximo;

( ) para sobreviver às pressões do mercado interno;

( ) porque executivos da empresa já conheciam esse país:

a. por ter relações familiares e visitá-lo com frequência ( )

b. por ter estudado (graduação ou pós-graduação) nesse país ( )

c. por ter trabalhado anteriormente nesse país ( )

d. por dispor de relações profissionais estabelecidas anteriormente ( )

Page 173: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

161

( ) Por outro motivo:

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Esse modo inicial foi alterado com o passar do tempo na expansão para os outros países?

( ) sim ( ) não

Caso positivo, que tipo de alteração (ões) foi (ram) feita (s)?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Sequência e modos de entrada

Quais os mercados em que atua, o ano de entrada, o modo de entrada (exportação, escritórios,

licenciamento/franquia, investimento direto) e o tipo de propriedade (se for investimento direto,

controle integral, majoritário ou minoritário). Em caso de investimento direto, se é investimento

novo (greenfield) ou aquisição.

Mercado

Ano

Modo de Entrada

Investimento Direto

– Tipo de Controle

Investimento Direto –

Tipo de Investimento

Houve alguma complicação ou obstáculo na entrada em algum(ns) desses países mencionados? Se

sim, poderia mencioná-las?

Page 174: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

162

Avanço sequencial

Em que momento percebeu que a empresa estava pronta para entrar em um novo mercado? Que

fatores levaram a essa decisão? E nos mercados seguintes? A empresa adotou uma estratégia passo

a passo, ou uma estratégia mais agressiva? Houve algum cálculo ou estudo acerca do risco de

entrada?

O ritmo de entrada em novos países se manteve ou se alterou conforme a experiência nos novos

mercados?

Distância Psíquica

Quais as percepções que tinha quanto a esses mercados e em que medida essas percepções se

modificaram? Qual a sua percepção de semelhanças e diferenças entre o Brasil e os países em que

atua? Por ocasião da entrada no mercado e à medida que adquiriu conhecimento do mercado?

(Houve mudanças de percepção?)

Aquisição de Conhecimento sobre os Mercados

Tinha conhecimento prévio do mercado? Fez algum estudo ou pesquisa antes de entrar em cada

mercado? E depois? Já tinha trabalhado ou estado no local previamente? Isso ajudou? Ou foi

adquirindo conhecimento com as operações? Qual foi, em sua opinião, a melhor forma de adquirir

conhecimento sobre o mercado? Pedir exemplos.

Acredita que o conhecimento do mercado ou a experiência prévia de processo de entrada em

diferentes países influenciou na performance da empresa na expansão para os novos mercados?

Comprometimento

A atitude da empresa com relação ao primeiro mercado, por ocasião da decisão de atuar naquele

mercado, era vista como definitiva ou exploratória? E hoje, para o conjunto de mercados

mencionado anteriormente, mudou alguma coisa?

Page 175: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

163

Pessoas

Quem são as pessoas responsáveis por dirigir as atividades internacionais (nome, cargo, há quanto

tempo estão na empresa, se já tinham experiência internacional prévia e como a adquiriram)?

Qual a função dessas pessoas no exterior? Elas residem nos mercados-alvo?

Alianças e Parcerias

A empresa estabeleceu alguma parceria com outras empresas em sua trajetória internacional? ( )

sim ( ) não

Caso positivo:

Essa(s) empresa(s) eram brasileira(s) ou estrangeira(s)?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

A iniciativa para a formação dessa parceria foi da sua empresa ou da empresa no exterior?

______________________________________________________________________________

Que tipo(s) de benefício(s) essa parceria trouxe para a sua empresa?

( ) adicionou tecnologia ao meu produto

( ) trouxe conhecimento sobre as práticas comerciais naquele mercado

( ) trouxe clientes potenciais para o meu produto

( ) permitiu à empresa ultrapassar barreiras legais para atuar naquele mercado

( ) outra contribuição: ____________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Com que tipo(s) de benefício(s) a sua empresa contribuiu para essa parceria?

Page 176: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

164

( ) adicionou tecnologia ao produto/serviço do parceiro

( ) permitiu à parceira oferecer outro produto/serviço aos seus clientes já existentes

( ) permitiu à parceira aumentar a sua competitividade, oferecendo um produto/serviço equivalente

por um preço menor

( ) outra contribuição: ____________________________________________________________

Existia algum relacionamento prévio de sua empresa com esse parceiro antes de estabelecer alguma

relação comercial com o mesmo?

( ) Não

( ) Sim, existia um relacionamento social (amizade, parentesco etc.)

( ) Sim, existia um relacionamento profissional (fornecedor, cliente etc.)

( ) Sim, executivos desse parceiro haviam sido colegas de trabalho de executivos de nossa empresa

anteriormente

Essa parceria se restringiu ao desenvolvimento de mercado(s) no exterior ou também para o

mercado doméstico?

______________________________________________________________________________

A parceria foi estabelecida através de um documento formal (contrato) ou os negócios aconteceram

de maneira informal? Como essa relação é coordenada?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Com o passar do tempo, essa parceria foi ampliada? De que maneira?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Essa primeira parceria continua existindo, ou ela se esgotou? Por quê?

Page 177: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

165

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Após essa primeira parceria, a sua empresa buscou estabelecer relações com outros parceiros no

exterior?

( ) sim, no mesmo país

( ) sim, em outro país

( ) não

Caso positivo, de que maneira se deu essa busca? (através de participações em feiras ou congressos

internacionais, através de indicações recebidas de clientes da empresa no Brasil ou no exterior,

através de recomendações de parceiros já estabelecidos, através de instituições do governo

brasileiro etc.)

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Existia uma relação de confiança entre os parceiros? Se sim, cite um exemplo de situação em que

isso foi demonstrado.

Planejamento estratégico

Existe um planejamento em relação à comercialização de produtos diferenciados para o mercado

externo?

Quais os canais de distribuição utilizados no exterior? E o processo de precificação dos produtos,

como é realizado?

Há algum investimento em Marketing específico para os diferentes países? Se sim, como se dá a

distribuição desse investimento?

Informações de ordem geral

Page 178: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

166

Como vê a importância dos mercados externos para a empresa? Sua percepção quanto a esta

importância mudou no decorrer do tempo, desde o início da atuação internacional até agora?

Atualmente, a empresa prioriza o mercado externo ou interno?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Qual a importância você considera que o governo (programas ou incentivos) dê para o

desenvolvimento de novos mercados para seus negócios no exterior?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Caso a resposta seja pouca ou nenhuma importância, perguntar se conhece algum programa

governamental que auxilie no processo de internacionalização.

Qual a importância desses programas do governo para a manutenção de seus negócios no exterior?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Em sua percepção, a rentabilidade que a empresa obtém no exterior:

( ) é superior àquela obtida no Brasil

( ) é inferior àquela obtida no Brasil

Porque:________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Em sua percepção, quais as vantagens que seu produto oferece aos clientes no exterior, em relação

aos seus concorrentes diretos? (preço, desempenho etc.)

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167

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

E quais seriam as desvantagens?

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Fazendo um balanço geral, as vantagens de atuação no exterior se sobrepõem às dificuldades

encontradas? ( ) sim ( ) não

A empresa possui planos para continuar a crescer no exterior? ( ) sim ( ) não

Caso positivo, quais seriam as principais diretrizes que orientariam esse crescimento?

(aprofundamento da presença no(s) país(es) em que já tem presença atualmente, expansão para

outros países que oferecerem oportunidade, ou que tenham afinidade política e/ou cultural, ou que

sejam próximos geograficamente, ou que apresentem bom potencial de mercado para os produtos

da empresa etc.)

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________

Existe alguma outra informação ou assunto que não tenha sido abordado, mas deva ser discutido

para facilitar a compreensão do processo de internacionalização da empresa?

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168

APÊNDICE B - “ÁRVORE” DE CAFÉ E SUAS “FLORES”

Page 181: CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE …

169

APÊNDICE C - DIMENSÃO DA ALTURA DE UM PÉ DE CAFÉ (PESSOA NA FOTO POSSUI

189 CM DE ALTURA)

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170

APÊNDICE D - CAFÉS VERDES E TORRADOS PRODUZIDOS NA FAZENDA DE

CLAYTON

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171

APÊNDICE E - EMBALAGEM UTILIZADA NA EXPORTAÇÃO ATRAVÉS DA MINAS

HILL COFFEE