Caixas de Som Em Igreja

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100 www.backstage.com.br ÁUDIO NAS IGREJAS Aldo Soares trabalha há 19 anos com áudio, é operador de PA, engenheiro projetista e educa- dor de áudio. [email protected] Sonorização de ambientes omo já escrevi, o objetivo é sono- rizar um ambiente fechado cobrin- do todo o local, alcançando todos os as- sentos e garantindo uma uniformidade de nível de pressão sonora desde os pri- meiros até os últimos assentos.Vimos que as características acústicas influen- ciam totalmente o resultado de qualquer tipo de sonorização em um ambiente fechado. Ambientes com altos tem- pos de reverberação serão complica- dos para sonorizar e manter níveis aceitáveis de inteligibilidade, enquan- to nos ambientes com baixos tempos de reverberação, os altos níveis de inteligibilidade são alcançados de for- ma bem mais fácil. Quando estiver- mos sonorizando nossa igreja modelo, demonstraremos essas diferenças. Também vimos a importância da re- lação sinal-ruído na sonorização, sendo esta determinante para o resul- tado final, inclusive, alterando dire- tamente e proporcionalmente o re- sultado da inteligibilidade final do sistema. E nesse ponto, em casos em que tudo esteja perfeito – acústica e sonorização – uma relação entre o si- nal direto e o ruído ambiente, seja lá qual ele for, estiver baixa, ele vai alte- rar diretamente o resultado final so- bre a inteligibilidade. Outro parâmetro importante é em relação à distância crítica, a relação C Sonorização entre os sons diretos e os sons indire- tos, sons reverberados. Essa relação é entre o quanto um espectador de um determinado assento está recebendo som direto, de uma caixa acústica, e o quanto ele está recebendo de som in- direto do ambiente, som reverberado. A distância crítica é exatamente onde essa relação passa a ser negativa de sons diretos e passa a ser positiva de sons indiretos. Hoje vamos falar sobre um conceito no qual a grande maioria dos técnicos tem dúvidas. Por que montar o sistema suspenso? (o sistema em “fly”, como ge- ralmente nos referimos ao tipo de mon- tagem). É interessante abordar essa questão, porque muitas vezes escutei a pergunta sobre se era mesmo importan- te ou melhor montar o sistema em “fly”. No mês passado começamos nossa abordagem sobre sonorização em ambientes fechados. Como o assunto não é tão simples, nessa fase abordaremos mais alguns conceitos que são importantes na hora de determinar como será essa sonorização. Em um próximo artigo, vamos sonorizar a nossa igreja modelo utilizando todas essas informações Parte II Ambientes com altos tempos de reverberação serão complicados para sonorizar e manter níveis aceitáveis de inteligibilidade

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Aldo Soares trabalha há 19 anos com áudio, é

operador de PA, engenheiro projetista e educa-

dor de áudio.

[email protected]

Sonorizaçãode ambientes

omo já escrevi, o objetivo é sono-rizar um ambiente fechado cobrin-

do todo o local, alcançando todos os as-sentos e garantindo uma uniformidadede nível de pressão sonora desde os pri-meiros até os últimos assentos.Vimosque as características acústicas influen-ciam totalmente o resultado de qualquertipo de sonorização em um ambientefechado. Ambientes com altos tem-pos de reverberação serão complica-dos para sonorizar e manter níveisaceitáveis de inteligibilidade, enquan-to nos ambientes com baixos temposde reverberação, os altos níveis deinteligibilidade são alcançados de for-ma bem mais fácil. Quando estiver-mos sonorizando nossa igreja modelo,demonstraremos essas diferenças.Também vimos a importância da re-lação sinal-ruído na sonorização,sendo esta determinante para o resul-tado final, inclusive, alterando dire-tamente e proporcionalmente o re-sultado da inteligibilidade final dosistema. E nesse ponto, em casos emque tudo esteja perfeito – acústica esonorização – uma relação entre o si-nal direto e o ruído ambiente, seja láqual ele for, estiver baixa, ele vai alte-rar diretamente o resultado final so-bre a inteligibilidade.Outro parâmetro importante é emrelação à distância crítica, a relação

C

Sonorização

entre os sons diretos e os sons indire-tos, sons reverberados. Essa relação éentre o quanto um espectador de umdeterminado assento está recebendosom direto, de uma caixa acústica, e oquanto ele está recebendo de som in-direto do ambiente, som reverberado.A distância crítica é exatamenteonde essa relação passa a ser negativade sons diretos e passa a ser positivade sons indiretos.

Hoje vamos falar sobre um conceito noqual a grande maioria dos técnicos temdúvidas. Por que montar o sistemasuspenso? (o sistema em “fly”, como ge-ralmente nos referimos ao tipo de mon-tagem). É interessante abordar essaquestão, porque muitas vezes escutei apergunta sobre se era mesmo importan-te ou melhor montar o sistema em “fly”.

No mês passadocomeçamos nossaabordagem sobresonorização emambientes fechados.Como o assunto não étão simples, nessafase abordaremosmais alguns conceitosque são importantesna hora de determinarcomo será essasonorização. Em umpróximo artigo, vamossonorizar a nossaigreja modeloutilizando todas essasinformações

Parte II

Ambientes com altostempos de

reverberação serãocomplicados parasonorizar e manterníveis aceitáveis de

inteligibilidade

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O Brasil passou por uma grande trans-formação nesse sentido, a montagemem fly. Do fim da década de 80 se es-tendendo por toda a década de 90 fo-ram muitas as dúvidas a esse respeito.Muitas lendas foram criadas, defendi-das e inventadas até que se tornoualgo natural. Lembro-me bem das dú-vidas sobre a importância ou não deter um sistema desse e principalmen-te, se era ou não era melhor. A ques-tão sempre era do “para que isso? Se osistema funcionava bem sem sersuspenso, por que inventar moda?”.Muitas pessoas acreditavam que era onovo modismo, a nova “onda” do mo-mento. Algumas empresas começa-ram a usar os sistemas simplesmenteporque a concorrência os usava. Ou-tros ficaram firmes com as suas “pare-des” de caixas montadas a partir dochão, sem se importar com os porquêsde se utilizar o sistema suspenso. Hoje,a grande maioria das empresas utilizasistemas suspensos, sabendo ou não dasua importância, ou, até mesmo en-tendendo porque isso tudo começou.E afinal, por que tudo isso começou?

Vamos por partes. Começaremos aexplicar algumas das razões pelasquais é importante se suspender umsistema de sonorização.A primeira razão pela qual se suspendeum sistema de sonorização é aumentar adistância entre o sistema de sonorizaçãoe os primeiros ouvintes alcançados porele. A segunda razão é direcionar o siste-ma de cima para baixo, evitando que aspróprias pessoas sejam as “barreiras” im-pedindo a propagação das freqüências,absorvendo-as logo nos primeiros me-tros, principalmente as freqüências al-tas. A terceira é a distribuição melhor dasonorização pelo ambiente. Com o sis-tema suspenso pode-se alcançar uma

extensão maior do perímetro, tanto nahorizontal quanto na vertical. A quarta époder direcionar as caixas diretamentepara a platéia e evitar ao máximo a inci-dência de sons nas paredes. Algo que deveser perseguido de toda a forma possível,principalmente em ambientes com altostempos de reverberação.Essas são apenas as principais razões, pelomenos as mais importantes. E, somentecom essas razões, temos um conjunto deargumentos que devidamente colocadosem prática se tornam audivelmenteinquestionáveis pelos resultados alcança-dos. Não que não venhamos a encontraruns e outros que ainda não queiram ques-tionar, mas, pelo menos vão precisar emuito de argumentos.Agora vamos fundamentar a primeirarazão de se suspender um sistema desonorização, a de aumentar a distânciaentre o sistema de sonorização e os pri-meiros ouvintes alcançados por ele.Entre os anos de 1665 e 1666 a ciênciapôde se deliciar com um grande núme-ro de descobertas nas áreas da matemá-tica, óptica, mecânica e na teoria dagravitação. Mesmo sendo divulgados e

trazidos ao conhecimento público anosdepois, os feitos de Isaac Newton influ-enciaram e influenciam até hoje omundo. Uma dessas descobertas, quena verdade foi uma constatação, foi aLei do Inverso do Quadrado, que afirmaque o “esforço que um planeta faz emsua órbita para se afastar do sol é pro-porcional ao inverso do quadrado dadistância entre o planeta e o sol”. Isso,depois de muitos estudos foi aplicado àóptica, por exemplo, e assim foi possí-vel determinar, pela quantidade de luzcaptada, a distância de uma estrela.No caso dos sons, que emitem ondas es-féricas, a mesma lei se aplica. Como ossons emitidos por uma caixa acústica sãoesféricos, eles decrescem com o quadra-do de sua distância em relação à caixaacústica. A questão fundamental é que aenergia emitida pela caixa acústica vaiser dispersa radialmente em todas as di-reções (veja figura 1). Com isso as perdassão consideráveis. A partir do ponto deirradiação da energia sonora, pela caixaacústica, cada vez que a distância dobra aenergia é reduzida em -6dB. Por exem-plo: Uma caixa acústica que produz 110

Figura 1

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dB SPL a 1 metro, depois de 8 metros depropagação a energia sofrerá uma quedade -18dB e nesse ponto, a energia origi-nal estará em 92dB!

Inclusive, aqui vale um comentário im-portante, mais à frente veremos qual opapel das cornetas em nossa sonori-zação, porém, o detalhe é que como eleredireciona essa emissão de energia porreflexões em seu corpo, ela introduz um

ganho adicional à energia original. Umganho acústico!Agora, a questão importante é quequando posicionamos um sistema desonorização sobre o palco, por exemplo,próximo ao espectador, nós estamosconcentrando uma grande massa deenergia sobre todos que estarão nos pri-meiros metros, tornando a experiênciauma tanto traumática (e quem aindanão passou por isso?), e sofrendo paraconseguir que essa mesma energia al-cance o fundo da platéia. (veja figura 2).Na figura 3 você poderá ver um gráfi-co que determina a relação entre adispersão e suas perdas em relação àenergia originalmente produzida.Quando posicionamos uma caixa sus-pensa, como na figura 4, mudamos a re-lação entre o primeiro espectador e afonte da energia. Eram 2 metros e agoraa altura passou para 5 metros. Quandoconseguimos alocar essa distância den-tro de uma janela em que haverá a me-

nor variação de energia, alcançamos, deuma forma bem simples, uma distribui-ção de energia melhor.E veja que ainda não estamos consi-derando os ângulos de dispersão daenergia sonora que a caixa acústicapossui, fundamentais para determi-narmos em qual ângulo será montadaa caixa dentro do arranjo “array” e,em qual ângulo o próprio arranjo de-verá ser montado. Essa característica,os ângulos de dispersão das caixasacústicas, que ainda voltaremos aabordá-los, é fundamental para con-seguirmos a tão “sonhada” coberturauniforme da nossa sonorização.Vejamos os cálculos e vamos compa-rá-los para esclarecer melhor aindaessa questão.Vamos determinar que a área a qual anossa sonorização deve cobrir se estendeaté 20 metros das caixas acústicas. Emnosso primeiro exemplo, a caixa estavaposicionada a 2 metros do primeiro es-pectador e com uma altura de 2 metros.Como vimos na figura 2, a distância en-tre o espectador (sentado e com a cabeça1,2 m) e a fonte sonora é de 2,16 metros.Nesse ponto podemos calcular a perdaem função dessa distância em – 6,7 dB.(20.Log

10(distância em metros)) Con-

siderando que o último espectador está a20 metros, perdas de -26dB, podemosencontrar praticamente três variaçõesde perdas relativas à posição desse espec-tador (veja na figura 3 o gráfico de perdase suas “janelas” de variações).Já na figura 4, a distância entre o espec-tador e a fonte sonora é de 4,44 metros.As perdas em relação à fonte sonoraagora são de -12,9dB. Considerando a

Figura 2

Quando posicionamosuma caixa suspensa,como na figura 4,

mudamos a relação entreo primeiro espectador e afonte da energia. Eram 2metros e agora a alturapassou para 5 metros

Figura 3

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e-mail para esta coluna:

[email protected]

posição do último espectador a 20metros com perdas de -26dB, a diferen-ça é menor. Com isso conseguimos“alocar dentro de uma janela” em quesó teremos duas variações de energia.Imagine você quando conseguimosalocar o primeiro espectador a uma dis-tância próxima ou maior que 8 metros!A variação seria menor ainda. Conclu-são: ao utilizarmos o nosso sistema desonorização suspenso, poderemos dis-tribuir ou alocar de uma forma melhoressas variações de energias propagadas. Eisso, meus caros leitores, é utilizar umpouco do conhecimento da física para fa-cilitar o nosso trabalho. Perceba que nes-se primeiro argumento são fortíssimos oselementos que fundamentam tal teoria,que os sistemas suspensos são melhorespara sonorizar uma platéia, isso, claro, nagrande maioria das situações.Outro ponto importante a frisar é ocomportamento da lei do inverso doquadrado em ambientes fechados.Em ambientes fechados, temos ainteração dos sons emitidos pelas cai-xas acústicas com a acústica do ambi-ente, como já falamos várias outras

vezes. Essa interação não afeta a lei,mas altera a relação de perdas com oquadrado da distância.Quando uma distância dobra em rela-ção a sua fonte, a energia sonora de-cresce os -6dB, como já falamos. Emambientes fechados, a acústica do am-biente incrementa um “ganho acústi-co” que altera esse valor, assim comonos casos de acoplamento da cornetaao driver, que também incrementa umganho acústico ao mesmo.O cálculo para determinar qual seráesse valor envolve o conhecimento devários parâmetros da acústica e dascaixas que serão usadas dentro desseambiente. O resultado sempre seráuma perda menor que -6dB, justamen-te pelo incremento do ganho da acús-tica do ambiente. Veremos isso quan-do sonorizarmos nossa igreja modelo.No próximo mês continuaremos aabordagem sobre a sonorização deambientes fechados.Até a próxima!

Figura 4