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A TEORIA DA ADAPTAÇÃO SUSTENTANDO O CUIDADO DE ENFERMAGEM EM HOSPITAL PEDIÁTRICO: UM ESTUDO DE CASO Regina Aparecida Tremarin 1 , Fabiane Gawleta 2 , Daniele Laís Brandalize Rocha 3 RESUMO: Estudo de caso realizado em um hospital pediátrico de grande porte em Curitiba-PR. O objetivo foi desenvolver cuidado de enfermagem sustentado pelo referencial da Teoria da Adaptação a uma criança hospitalizada e sua família. O estudo foi realizado durante as atividades de ensino clínico, da disciplina de Processo de Cuidar em Enfermagem I, de julho a novembro de 2007. Os modelos teóricos, ao serem utilizados pelos graduandos em Enfermagem como referenciais para a sistematização do cuidado, contribuem para o aprimoramento da prática e a organização, interpretação e análise do processo de cuidar, ampliando o nível de conhecimento na formação de profissionais e na pesquisa de enfermagem. Concluímos que o estudo de teorias de enfermagem e sua aplicação na prática por alunos de graduação devem ser incentivados pelas instituições formadoras para contribuir com a construção do conhecimento em enfermagem e aprimorar a assistência prestada. PALAVRAS-CHAVE: Teoria de enfermagem; Cuidados de enfermagem; Pediatria. THE ADAPTATION THEORY AS A FOUNDATION TO NURSING CARE AT A PEDIATRIC HOSPITAL: A CASE STUDY ABSTRACT: Grounded on the theoretical framework of the Adaptation Theory, we report a case study held at a large pediatric hospital in the city of Curitiba/Paraná State, Brazil, during the third-term nursing undergraduation clinical studies. The case study was carried out with a hospitalized child and its mother during the clinical teaching activities in the discipline Caring Process in Nursing I. The theoretical models, when used by nursing undergraduates as a framework for care systematization, contribute to practice refinement as well as organization, interpretation and analysis of the caring process, broadening knowledge level in professional education and nursing research. We concluded that the study of nursing theories and its practical use by undergraduates must be encouraged by educational institutions. KEYWORDS: Nursing theory; Nursing care; Pediatrics. LA TEORÍA DE LA ADAPTACIÓN SUSTENTANDO EL CUIDADO DE ENFERMERÍA EN HOSPITAL PEDIÁTRICO: UN ESTUDIO DEL CASO RESUMEN: Estudio de un caso realizado en un hospital pediátrico de gran porte en la ciudad de Curitiba-PR. El objetivo fue desarrollar cuidado de enfermería sustentado por el referencial de la Teoría de la Adaptación a un niño hospitalizado y su familia. El estudio fue realizado durante las actividades de enseñanza clínica, de la disciplina de Proceso de Cuidar en Enfermería I, de julio a noviembre de 2007. Los modelos teóricos, al ser utilizados por los estudiantes de Enfermería como referenciales para la sistematización del cuidado, contribuyen para el perfeccionamiento de la práctica y la organización, interpretación y análisis del proceso de cuidar, ampliando el nivel de conocimiento en la formación de profesionales y en la investigación de enfermería. Concluimos que el estudio de teorías de enfermería y su aplicación en la práctica por alumnos de graduación deben ser incentivados por las instituciones formadoras para contribuir con la construcción del conocimiento en enfermería y primorear la asistencia prestada. PALABRAS CLAVE: Teoría de enfermería; Cuidados de enfermería; Pediatría. 1 Acadêmica do curso de Enfermagem da Faculdades Pequeno Príncipe-FPP. 2 Acadêmica de do curso de Enfermagem da FPP. 3 Enfermeira. Mestre em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Paraná. Docente do Curso de Enfermagem da FPP. Autor Correspondente: Daniele Laís Brandalize Rocha Rua Wanda dos Santos Mullmann, 1266 - 83323-400 - Pinhais-PR E-mail: [email protected] Recebido: 04/02/09 Aprovado: 30/08/09 569 Cogitare Enferm 2009 Jul/Set; 14(3):569-74

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A TEORIA DA ADAPTAÇÃO SUSTENTANDO O CUIDADO DE ENFERMAGEM EMHOSPITAL PEDIÁTRICO: UM ESTUDO DE CASO

Regina Aparecida Tremarin1, Fabiane Gawleta2, Daniele Laís Brandalize Rocha3

RESUMO: Estudo de caso realizado em um hospital pediátrico de grande porte em Curitiba-PR. O objetivo foi desenvolvercuidado de enfermagem sustentado pelo referencial da Teoria da Adaptação a uma criança hospitalizada e sua família. Oestudo foi realizado durante as atividades de ensino clínico, da disciplina de Processo de Cuidar em Enfermagem I, de julhoa novembro de 2007. Os modelos teóricos, ao serem utilizados pelos graduandos em Enfermagem como referenciais paraa sistematização do cuidado, contribuem para o aprimoramento da prática e a organização, interpretação e análise doprocesso de cuidar, ampliando o nível de conhecimento na formação de profissionais e na pesquisa de enfermagem.Concluímos que o estudo de teorias de enfermagem e sua aplicação na prática por alunos de graduação devem serincentivados pelas instituições formadoras para contribuir com a construção do conhecimento em enfermagem e aprimorara assistência prestada.PALAVRAS-CHAVE: Teoria de enfermagem; Cuidados de enfermagem; Pediatria.

THE ADAPTATION THEORY AS A FOUNDATION TO NURSING CARE AT A PEDIATRICHOSPITAL: A CASE STUDY

ABSTRACT: Grounded on the theoretical framework of the Adaptation Theory, we report a case study held at a largepediatric hospital in the city of Curitiba/Paraná State, Brazil, during the third-term nursing undergraduation clinical studies.The case study was carried out with a hospitalized child and its mother during the clinical teaching activities in thediscipline Caring Process in Nursing I. The theoretical models, when used by nursing undergraduates as a framework forcare systematization, contribute to practice refinement as well as organization, interpretation and analysis of the caringprocess, broadening knowledge level in professional education and nursing research. We concluded that the study ofnursing theories and its practical use by undergraduates must be encouraged by educational institutions.KEYWORDS: Nursing theory; Nursing care; Pediatrics.

LA TEORÍA DE LA ADAPTACIÓN SUSTENTANDO EL CUIDADO DE ENFERMERÍA ENHOSPITAL PEDIÁTRICO: UN ESTUDIO DEL CASO

RESUMEN: Estudio de un caso realizado en un hospital pediátrico de gran porte en la ciudad de Curitiba-PR. El objetivofue desarrollar cuidado de enfermería sustentado por el referencial de la Teoría de la Adaptación a un niño hospitalizado ysu familia. El estudio fue realizado durante las actividades de enseñanza clínica, de la disciplina de Proceso de Cuidar enEnfermería I, de julio a noviembre de 2007. Los modelos teóricos, al ser utilizados por los estudiantes de Enfermería comoreferenciales para la sistematización del cuidado, contribuyen para el perfeccionamiento de la práctica y la organización,interpretación y análisis del proceso de cuidar, ampliando el nivel de conocimiento en la formación de profesionales y enla investigación de enfermería. Concluimos que el estudio de teorías de enfermería y su aplicación en la práctica poralumnos de graduación deben ser incentivados por las instituciones formadoras para contribuir con la construcción delconocimiento en enfermería y primorear la asistencia prestada.PALABRAS CLAVE: Teoría de enfermería; Cuidados de enfermería; Pediatría.

1Acadêmica do curso de Enfermagem da Faculdades Pequeno Príncipe-FPP.2Acadêmica de do curso de Enfermagem da FPP.3Enfermeira. Mestre em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Paraná. Docente doCurso de Enfermagem da FPP.

Autor Correspondente:Daniele Laís Brandalize RochaRua Wanda dos Santos Mullmann, 1266 - 83323-400 - Pinhais-PRE-mail: [email protected]

Recebido: 04/02/09Aprovado: 30/08/09

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INTRODUÇÃO

A doença e hospitalização da criança sãomarcantes não somente para ela, mas para a famíliaque, juntamente com o filho, são separados do seumundo familiar e de sua rotina, e passam a conviverem um ambiente novo e desconhecido que é o hospital.Isto acarreta desgaste físico e psicológico para osfamiliares, os quais podem reagir de diferentes formas,tendo diferentes reações como o medo, a insegurança,entre outros(1). Durante a hospitalização, criança efamília se encontram fragilizados, propensos asofrerem com todas as alterações não somente donovo ambiente, mas também com as intervenções quesão realizadas visando o tratamento e cura da criança.Dessa forma, o cuidar em pediatria deve estardiretamente relacionado à criança e ao seu familiar,entendo-se este como extensão paciente e tambémalvo dos cuidados de enfermagem(2).

Entendemos que o cuidado de enfermagem deveser sistematizado através de um método, o qual deveser embasado em um referencial teórico que direcioneo olhar e fundamente cientificamente as ações doenfermeiro. Os referenciais teóricos ou modelosteóricos na enfermagem são chamados de Teorias deEnfermagem e representam, atualmente, os esforçoscoletivos e individuais dos enfermeiros para definir edirigir a profissão e proporcionar a base para umdesenvolvimento teórico continuado(3).

Ao escolher uma teoria de enfermagem parafundamentar e direcionar o cuidado deve serconsiderada a adequação e a aplicabilidade à situaçãode enfermagem em que será utilizado(3). Enquantoacadêmicas de enfermagem tivemos a oportunidadede conhecer, em sala de aula, algumas das principaisteorias de enfermagem e, desde o primeiro contato, aTeoria da Adaptação de Roy nos chamou a atenção enossa inquietação passou a ser como poderíamosaplicá-la em nossa prática de cuidado.

Durante nossa vivência no ensino clínico empediatria, tivemos a oportunidade de cuidar da criançadoente e hospitalizada e sua família, na qualpercebemos que, além da criança, esta necessitavade cuidados visando o atendimento de suasnecessidades e cura da doença. O familiar, maisespecificamente a mãe, ao permanecer ao lado dofilho durante a hospitalização, passava por essa vivênciade forma intensa, apresentando modificações em suavida pessoal e familiar, necessitando, assim, de cuidadosde enfermagem.

Escolhemos a Teoria da Adaptação de Roy paradirecionar o nosso cuidado à criança e família, enquantoacadêmicos de enfermagem, considerando nossaafinidade com seus principais conceitos e sua possívelaplicabilidade nesse contexto vivido. Sendo assim,conduzidas pelo referencial teórico adotado e peloobjetivo colocado para o desenvolvimento deste estudo,buscamos compreender os aspectos teórico-práticosda enfermagem, os quais são indispensáveis para odesenvolvimento do cuidado.

Consideramos que o conhecimento teóricoinfluencia a realidade e este adicionalmente nodesenvolvimento das teorias tornando-se importantepara guiar a educação, a pesquisa e a prática. Apesarde toda a evolução da ciência e, consequentemente,da enfermagem, ainda se percebe certa dificuldadepor parte dos enfermeiros em trabalhar com teorias,tanto no âmbito da assistência, quanto no do ensino oupesquisa. Com vistas à superação desta dificuldade,destaca-se a importância da iniciativa da aplicação demarcos teóricos durante o período acadêmico parauma melhor construção do conhecimento emenfermagem, no intuito de aprimorar a assistênciaprestada.

Neste estudo tivemos como objetivodesenvolver o cuidado de enfermagem sustentado peloreferencial da Teoria da Adaptação a uma criançahospitalizada e sua família.

A TEORIA DA ADAPTAÇÃO DE ROY

De acordo com Roy, a pessoa, como um sistema,tem a capacidade de se adaptar e criar mudanças nomeio ambiente. Sendo um sistema, a pessoa recebeestímulos, dentre eles o focal, que é o estímulo internoou externo que constitui o maior grau de mudança,gerando um forte impacto. Os estímulos contextuais,que são todos os outros estímulos presentes na situaçãoque contribuem para o efeito do estímulo focal e osestímulos residuais, que são os fatores cujos efeitosna situação atual não são centrais e a pessoa podenão ter consciência da influência destes fatores. Sãofatores descentralizados da situação atual, mas que ainfluenciam. A vivência dos estímulos é simultânea,ocorrem sem uma ordem aparente, podem ocorrer aomesmo tempo, sem que a pessoa se dê conta que estãoatuando(4).

No contexto de doença e hospitalização, criançae familiar recebem estímulos, em que o principalestímulo, o focal, que gera o maior impacto, é a própria

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doença; os estímulos contextuais são todos os outrosfatores, como mudança de ambiente e rotinas de vida,separação dos demais familiares. O conhecimento quese tem da doença, o apoio que criança e familiarrecebem, entre outros, que vão acentuar ou atenuaros efeitos do estímulo focal, na criança e no familiarque a acompanha. Os estímulos residuais serão osdemais estímulos, os quais não se relacionamdiretamente com a vivência atual da doença ehospitalização, mas têm influência sobre ela, comoexperiências anteriores com hospitalização, doença nafamília.

De acordo com a Teoria da Adaptação de Roy,cada pessoa, como um sistema adaptativo, tem umnível de adaptação, o qual é determinado por processosde controle, também chamados de mecanismos deenfrentamento reguladores (fisiológico) e cognatos(sentimentos e mobilizações emocionais) os quais sãosubsistemas da pessoa como um sistema adaptativo.Sendo assim, ao receber estímulos (focal, contextuaise residuais), iniciam-se, na pessoa, processos decontrole, em que os mecanismos de enfrentamentoirão determinar os comportamentos a serem expressos,podendo ser adaptáveis ou não(4).

Acreditamos que, criança e familiar, como umsistema, têm a capacidade de se adaptar à novasituação, a qual é permeada pela ocorrência deinúmeros estímulos. O comportamento apresentadopor ambos, frente aos mesmos estímulos, dependerádos mecanismos de enfrentamento ou processos decontrole individuais e nem sempre, consegue-se chegarà adaptação, tendo-se inúmeros comportamentosineficazes.

A investigação do comportamento da pessoapode ser realizada nos quatro modos adaptativosidentificados por Roy, os quais resultam dosmecanismos de controle reguladores e cognatos, sãoeles: fisiológico, autoconceito, função de papel einterdependência. A mobilização dos quatro modos deadaptação é que configuram a intensidade dessavivência da criança e familiar, pois se alteram de acordocom a experiência singular de cada um com maior oumenor intensidade(4).

O modo de adaptação fisiológico é facilmentepercebido, pois envolve as necessidades básicas dosubsistema regulador, porém os demais modos sãosubjetivos e vivenciados de maneira diferente, mesmodiante do mesmo estímulo. O modo de autoconceitoestá relacionado aos aspectos psicológicos e espirituaisda pessoa, envolve o eu físico e o eu pessoal; o modo

de função de papel envolve os padrões de interaçãosocial e o modo de interdependência, osrelacionamentos interpessoais, as necessidadesafetivas, como valor humano, afeição, amor,afirmação(4).

O objetivo dos cuidados de enfermagem àcriança e familiar nessa vivência deve ser promover aadaptação e ajudá-los a lidar com os problemas deadaptação gerados. Suas ações devem visar controlaros estímulos focais, contextuais ou residuais que estãosobre eles. O enfermeiro deve agir preparando-os paraas mudanças antecipadas através do fortalecimentodos mecanismos de enfrentamento regulador ecognitivo individuais(5).

Compreender a experiência da criança doentee hospitalizada e familiar que a acompanha apontapara um cuidado de enfermagem que contemple acriança e familiar, tendo em vista o ser humano comoum ser integral, com sentimentos, conflitos e vivênciae considerando o impacto que essa vivência gera emambos(6). Acreditamos que é responsabilidade doenfermeiro ajudá-los nessa adaptação, pelaidentificação do nível de adaptação e da necessidadede intervenção de enfermagem nos quatro modos deadaptação. Esta intervenção deve ser realizada peloenfermeiro por meio da aplicação do Processo deEnfermagem, o qual, conforme o modelo de adaptaçãode Roy consiste em seis passos: avaliação doscomportamentos, avaliação dos estímulos, diagnósticosde enfermagem, estabelecimento de objetivos,intervenções e avaliação(4).

Acreditamos que a Teoria da Adaptação de Royaplica-se a essa realidade e direcionar o processo deenfermagem embasando-se cientificamente nessateoria possibilita ao enfermeiro a auxiliar criança efamiliar a apresentar comportamentos eficazes, quecontribuam para a sua adaptação.

METODOLOGIA

Após o estudo da teoria e embasados em seusconceitos, procuramos aplicá-la em nossa prática,durante os momentos de ensino clínico da disciplinade Processo de Cuidar em Enfermagem I, do 3º períododo Curso de Graduação em Enfermagem, ocorridonos meses de julho a novembro de 2007. Realizou-seo processo de enfermagem de acordo com o modeloda Teoria de Adaptação de Roy, em uma criançadoente e hospitalizada e seu familiar, maisespecificamente a mãe, que a acompanhava em uma

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unidade de internação clínica de um hospital pediátricode grande porte de Curitiba. A escolha por estessujeitos deveu-se à aleatoriedade, pois, ao realizarmosas ações de cuidado durante o ensino clínico nosaproximamos desta criança e sua mãe e realizamos oprocesso de enfermagem, orientados pela professorasupervisora de estágio.

No desenvolvimento deste trabalho foramrespeitados o Código de Ética profissional e a Resoluçãon.º 196/96 que levam em conta princípios éticos básicosque devem orientar os estudos envolvendo sereshumanos(7). O estudo iniciou-se após o consentimentoda instituição, oficializado pela coordenação da disciplinade Processo de Cuidar em Enfermagem I, do Curso deGraduação em Enfermagem de uma Faculdadeparticular na cidade de Curitiba.

O cuidado à criança e à mãe foi sustentado naTeoria da Adaptação de Roy e percorreu todas asfases do processo de enfermagem conforme propostopela teoria, o qual passamos a descrever:

No primeiro passo do processo de enfermagemo enfermeiro deve recolher dados sobre oscomportamentos da criança e familiar e o estado atualda adaptação. O comportamento é o único indicadorde como estão se adaptando às mudanças. O convívioe a proximidade permitem ao enfermeiro avaliar,detectar necessidades diante de distintos estímulos aque estão expostos. Na segunda fase o enfermeirodeve avaliar os estímulos externos e internos que estãoinfluenciando os comportamentos em cada modoadaptável. Depois de identificados os estímulos, elesdevem ser classificados em focais, contextuais eresiduais. Na terceira fase, os dados comportamentais,uma vez reunidos, devem ser interpretados. Nestainterpretação o enfermeiro deverá considerar oscomportamentos juntamente com os outros fatores,isto é, os estímulos que afetam o seu comportamentoe estabelecer os diagnósticos de enfermagem.

Na quarta fase do processo, enfermeiroestabelece os objetivos, que é a determinação deafirmações claras de resultados comportamentaisesperados a partir dos cuidados de enfermagem. Oobjetivo geral das intervenções de enfermagem é manterou aumentar o comportamento adaptável e modificar ocomportamento ineficaz tornando-o adaptável. Na quintafase, logo após estabelecer os objetivos relativos aoscomportamentos que irão promover a adaptação, oenfermeiro deverá determinar como intervir para auxiliarpara que criança e familiar atinjam estes objetivos. Aintervenção de enfermagem irá determinar como os

objetivos estabelecidos serão obtidos. Por fim, na últimafase do processo de enfermagem, o enfermeiro verificaa eficácia da intervenção de enfermagem em relaçãoao comportamento, isto é, se o objetivo estabelecido foiatingido.

RESULTADOS

O cuidado à criança e mãe foi realizadoconforme as fases do processo de enfermagemproposto por Roy, conforme descrevemos a seguir:

Na primeira fase, que é a avaliação doscomportamentos, investigamos o comportamento dacriança e mãe nos quatro modos de adaptação. No modofisiológico observamos as respostas que ambosapresentavam: relacionadas à nutrição, sono e repouso,eliminação; no modo do autoconceito, buscamosdescobrir como estavam se sentindo frente a essasituação e se essas questões geraram alguma forma dedistúrbio tanto no seu eu físico, relacionado à sua imagemcorporal, quanto no seu eu pessoal, relacionado às suaspróprias características, expectativas e valores; no modode função do papel, procuramos identificar comoestavam se relacionando com as pessoas ao seu redor,como se conformava a rede de apoio familiar e social,se de alguma forma a doença e hospitalização geroualgum déficit em seu relacionamento social. E no modode interdependência, buscamos descobrir se asnecessidades afetivas estavam sendo preenchidas, sehouve déficit de afeição, amor e afirmação, sentimentosde tristeza ou depressão, ou se estavam passando porperíodos de isolamento, solidão e alienação.

Após a avaliação dos comportamentos, passamospara a segunda fase, que é a avaliação dos estímulos.Para a avaliação do estímulo focal, procuramos analisaro impacto, na criança e mãe, desde o primeiro dia dehospitalização, com os sentimentos que forammobilizados, a trajetória percorrida desde a descobertada doença até a hospitalização e tratamento da criança,a expectativa futura sobre a sua recuperação.

Na avaliação do estímulo contextual,procuramos o que mais estava a contribuir para o efeitodo estímulo focal e fizemos questões sobre a cultura(nível sócio-econômico, etnia, sistema de crenças), afamília (estrutura, tarefas), estado de desenvolvimentoda criança (idade, sexo, tarefas, hereditariedade efatores genéticos), eficácia cognitiva (percepção,conhecimento, qualidades) e considerações ambientais(mudanças no ambiente externo e interno). Naavaliação dos estímulos residuais buscamos os demais

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fatores que estavam influenciando indiretamente asituação atual, como experiências passadas desituações similares já vivenciadas.

Após a avaliação dos comportamentos eestímulos, passamos para a terceira fase, na qualrealizamos os diagnósticos de enfermagem. De acordocom o proposto na Teoria de Adaptação de Roy, umadas formas estabelecidas para a definição de umdiagnóstico de enfermagem envolve posicionar ocomportamento juntamente com os estímulos maisrelevantes e foi dessa forma que procuramos elaborartodos os diagnósticos de enfermagem.

Por exemplo, na avaliação da criança:apresentava face em forma de lua (comportamento),consequente ao uso de corticóides (estímulo). Dessaforma o diagnóstico de enfermagem formulado foi:Face em forma de lua relacionada ao uso decorticoides. Na avaliação da mãe: apresentavaagitação, insônia, nervosismo e apreensão(comportamentos). Todos estes comportamentosindicam a ansiedade e resultam de um estímulo focal,que é a vivência da doença e hospitalização do filho.Dessa forma o diagnóstico de enfermagem formuladofoi: Ansiedade relacionada à vivência da doença ehospitalização do filho. Assim, foram formulados todosos diagnósticos de enfermagem relacionados aoscomportamentos da criança e mãe e aos estímulosque os influenciavam.

Formulados os diagnósticos de enfermagem,passamos para a quarta fase do processo, que é oestabelecimento de objetivos. Nessa fase fizemos adeterminação de afirmações claras de resultadoscomportamentais que esperávamos, a partir doscuidados de enfermagem para ambos. O objetivo geralpara as intervenções de enfermagem é manter ouaumentar o comportamento adaptável e modificar ocomportamento ineficaz tornando-o adaptável.

Por exemplo, para os diagnósticos deenfermagem acima citados, o objetivo esperado doscuidados de enfermagem foi o de minimizar o impactoque a doença, hospitalização e as alterações nacondição física da criança provocaram na mãe (comoa alteração no formato da face da criança).

Formulados todos os objetivos para os cuidadosde enfermagem, passamos para a quinta fase doprocesso, que é o estabelecimento de intervenções.Nesta fase, procuramos alterar, aumentar, diminuir,remover ou manter os estímulos, visando aumentar acapacidade da criança e mãe em responderpositivamente, apresentando respostas adaptáveis.

Seguindo o exemplo acima citado, de imediato não sepode remover o estímulo focal, que é a própria doençada criança, mas pode-se trabalhar com os estímuloscontextuais e residuais que estão a influenciá-los. Porexemplo, conversar com a mãe, ouvir suas dificuldadese expectativas, motiva-la a sentir-se fortalecida;esclarecer as dúvidas e inseguranças que a mãe temem relação ao estado de saúde da criança; permitirque a mãe faça a troca com outro familiar noacompanhamento da criança, para que possadescansar; promover o brinquedo terapêutico, cuidandoda criança a partir do lúdico, entre outros.

Por fim, chegamos à última fase do processoque é a avaliação. Finalizando o exemplo já seguidoanteriormente para ilustrar nosso cuidado, utilizamos aobservação da criança e a conversa com a mãe paraavaliar a eficácia das intervenções que havíamosrealizado, já que tivemos a oportunidade de voltar àunidade de internação no dia seguinte. Percebemos queos cuidados/intervenções que havíamos realizado coma criança e mãe haviam sido positivos, já que ambosforam receptivos a nós, a mãe apresentava-se menosansiosa e segura, sendo que o seu relacionamento coma criança ficou fortalecido, já que ela não apresentavamais a insegurança citada anteriormente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que a adoção de um referencialteórico para realizar a assistência de enfermagem sefaz necessária para o aprimoramento da qualidade docuidado. A utilização da Teoria da Adaptação de Roynos permitiu acessar de forma mais individualizada,organizada e integral as necessidades individuais dacriança e sua mãe em seu próprio contexto e nascircunstâncias de vida no momento da hospitalização.

Após o término do estudo, verificamos que ahospitalização, a qual traz consequências à criança eà sua mãe, pode ser caracterizada como um períodode grande investimento de energia para enfrentar eadaptar-se ao novo papel que o adoecer estabelece.A criança hospitalizada habita o mundo hospitalar,vivencia sentimentos muitas vezes desconhecidos, entreeles o de dor e de angústia e, neste contexto, aparticipação familiar, em especial da mãe, é muitoimportante. Porém, nesta vivência, a mãe tambémpassa por enfrentamentos, mudanças na vida cotidiana,além de surgirem inúmeros questionamentos sobre adoença e recuperação do filho hospitalizado. Dessaforma, os sistemas adaptativos da criança e mãe, muitas

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vezes não são suficientes para que ambos enfrenteme respondam positivamente aos estímulos.

Neste sentido, percebemos o papel fundamentaldo enfermeiro que, ao se embasar na Teoria deAdaptação de Roy no cuidado das crianças doentes ehospitalizadas e seus familiares, ao desenvolverintervenções, pode auxiliar na adaptação à condiçãoque lhes foi imposta.

O estudo ora desenvolvido nos permitiu um olharreflexivo e crítico sobre a utilização de teorias deenfermagem e contribuiu para o desvelar de umarealidade até o momento pouco conhecida para nós, ocuidar em pediatria. Durante esta experiência, buscamostranspassar as barreiras e limitações próprias de alunosda graduação em enfermagem, ou seja, a timidez diantedo paciente, a falta de destreza na realização deprocedimentos e técnicas, como a de exame físico dacriança. Além disso, lançar o olhar sobre a realidade decuidado tendo como direcionador uma teoria deenfermagem não foi fácil e exigiu de nós leituras ereleituras da teoria e seus principais conceitos, a fim denos revestirmos dela, incorporarmos sua proposição,para que, ao nos depararmos com a realidade do cuidado,pudéssemos refletir e estar aptos a iniciar a associação,tão esperada, da teoria com a prática.

Acreditamos que, ao compartilhar esteexercício, podemos contribuir para que os demaisacadêmicos de enfermagem e os enfermeirosenvolvidos no tratamento da criança e sua famíliareflitam sobre a sua prática de cuidar, engajando-sena busca constante de maneiras e perspectivas parauma assistência de enfermagem holística e científica.

Enquanto acadêmicos de enfermagem,concluímos que, realizar um estudo à luz de uma teoria,especificamente a Teoria da Adaptação de Roy, veioenriquecer nosso conhecimento técnico-científico,tendo aprofundado nossos conceitos e nos levado arefletir sobre o cuidado dispensado a criançahospitalizada e sua família. Os modelos teóricos, aoserem utilizados pelos graduandos em Enfermagemcomo referenciais para a sistematização do cuidado,contribuem para o aprimoramento da prática e aorganização, interpretação e análise do processo decuidar, ampliando o nível de conhecimento na formaçãode profissionais e na pesquisa de enfermagem.

Acreditamos que esse estudo pode contribuirpara a melhoria da qualidade do cuidado de enfermagemà criança enquanto hospitalizada, a partir da identificaçãode comportamentos ineficazes desta, propiciando acriação de intervenções que facilitem a sua convivência

no hospital e aprimorando orientações a seremfornecidas para a mãe, visando a sua adaptação. Sendoassim, o estudo de teorias de enfermagem e suaaplicação na prática por alunos de graduação devemser incentivados pelas instituições formadoras.

REFERÊNCIAS

1. Forte TL, Sato CM. Programa família participante: ahumanização hospitalar como resgate da dignidade,exercício da cidadania e transformação da gestãohospitalar. Curitiba: Associação Hospitalar de Proteçãoa Infância Dr. Raul Carneiro/ Hospital Pequeno Príncipe,2006.

2. Cordeiro CCK. O cuidado de enfermagem à família decrianças hospitalizadas diante da cronificação dadoença [monografia]. Curitiba (PR): Instituto de EnsinoSuperior Pequeno Príncipe; 2006.

3. Westphalen MEA, Carraro TE, organizadores.Metodologias para assistência de enfermagem:teorizações, modelos e subsídios para a prática. Goiânia:AB; 2001.

4. Roy SC, Andrews HA. Teoria da enfermagem. O modelode adaptação de Roy. Lisboa: Instituto Piaget; 2001.

5. George JB, Belcher JR, Bennett AM, Crane MD, CrossJR, Falco SM, et al. Teorias de enfermagem: osfundamentos à prática profissional. 4ª ed. Porto Alegre:Artmed; 2000.

6. Brandalize DL. O Cuidado de enfermagem à mãe navivência do processo de transição de saúde-doençado filho com cardiopatia congênita [dissertação].Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná; 2007.

7. Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde.Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa emseres humanos. Resolução nº 196, de 10 de outubro de1996. Brasília; 1996.

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