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A EVOLUO DO PENSAMENTO ECONMICO UM PASSEIO A MARGEM DO CAOS

SUMRIO Agradecimentos. Prefcio.... PARTE ismo. PARTE 3 : A EVOLUO DO PENSAMENTO ECONMICO 4 Voando em cu de brigad MUNDO DAS FINANAS 8 A lgica do irracional.. 9 O ponto de vista complexo

3 O bater de uma nica asa de borboleta hoje produz uma minscula alterao no estado da a tmosfera. Aps certo tempo, o que esta efetivamente faz diverge do que teria feito , no fosse aquela alterao. Assim, ao cabo de um ms, um ciclone que teria devastado o litoral da Indonsia no acontece. Ou acontece um que no iria acontecer. James Gleick, Caos Dedicado a memoria de meu pai e ao nascimento de minha filha

4 AGRADECIMENTOS Vrias pessoas, de uma forma ou de outra formam responsveis por me fazer querer ent ender o mundo que nos cerca. Ao meu editor, Paul Cristoph, por acreditar. Ao meu irmo Marcelo, por me mostrar os caminhos da Cincia e comentar o manuscrito. Meu p ai Izaac, e minha me La, por me ensinarem que o plantar de uma rvore, o escrever de um livro e o nascimento de um filho so trs coisas fundamentais na vida um homem. Ao Prof. Jos Scheinkman, pela inspirao. Aos amigos Marcelo Fernandes, Carlos Viana e Rodrigo de Toledo, pelas contribuies. E finalmente minha querida esposa Paula pe la generosidade e dedicao `a nossa famlia durante estes dois anos de trabalho, alem da pacincia de ler, reler, comentar e corrigir o manuscrito que deu origem a est e livro. Qualquer erro ou omisso de minha total responsabilidade.

5 PREFCIO Em Busca de um novo Paradigma O ser humano tem uma curiosidade natural, uma paixo por tentar entender o mundo. Essa curiosidade natural ou paixo por encontrar respostas tem movido a humanidade desde seus primrdios. As perguntas so to diversas quanto os meios utilizados para chegar a concluses. Queremos compreender todas as foras da natureza e como cada um a delas interage. Uma das formas de descrever estas relaes atravs do uso de equaes ma temticas. Ns observamos os acontecimentos e tentamos explic-los com o uso de teoria s que deveriam ser consistentes, intuitivas e sujeitas a rigorosas demonstraes mat emticas. A cincia ocidental herdou dos gregos da antiguidade sua metodologia calca da em axiomas. Neste mtodo, a prova de uma teoria comea com uma hiptese e chega a u ma concluso, usando um conjunto de regras lgicas simples, at que a prova seja demon strada. Toda a teoria ou proposio construida a partir de uma determinada hiptese de ve ser provada desta forma. Assim, garante-se que o acumulo de conhecimento seja consistente e no contraditrio. O grau de acurcia e preciso dos modelos que descreve m o comportamento real dos sistemas diretamente proporcional ao nosso conhecimen to das foras que esto por trs destes sistemas, causando os fenmenos que observamos. Caso o nosso conhecimento destas foras seja parcial, ou o peso relativo que certa s foras tem no sistema seja incompleto, nossos modelos tambm o sero. Na prtica, tend emos a considerar somente os fatores cujos efeitos so significativos, desprezando aquelas foras menos relevantes. Esse o caso da economia, onde tendemos a agregar os agentes econmicos em classes como por exemplo,

6 unidades domiciliares, governos ou empresas. O comportamento destes agregados deve ser conhecido de forma geral, no importando as excees. O que interessa entende r ou prever o comportamento da mdia dos agentes econmicos. A viso clssica, ou newton iana, sugere que podemos entender as leis que governam um sistema na medida em q ue soubermos escrever o conjunto de equaes que contenham as variveis e os fatores q ue determinam o comportamento de tal sistema. Neste caso, se medirmos as condies i niciais de um sistema e us-las nas equaes, podemos saber o estado do sistema em qua lquer momento futuro. Esta viso tipicamente reducionista, pois afirma que o conhe cimento das partes individuais do sistema leva ao conhecimento do sistema como u m todo. Contudo, atravs da histria, a pesquisa e o experimento percebemos que o co mportamento econmico/social, muitas vezes tende a ser mais complexo do que a simp les aplicao de mtodo reducionista pode prever. Certos sistemas podem exibir proprie dades que emergem da interao entre suas partes. Nesse caso, a soma das partes j no m ais igual ao todo e a idia de se entender um sistema desmembrando suas partes ind ividuais no se aplica neste contexto. O estudo da Teoria do Caos/Complexidade foi um passo importante para o reconhecimento de que no mundo da economia as coisas so consideravelmente mais complexas do que a viso clssica do determinismo newtonia no. Sistemas dinmicos complexos so modelados matematicamente por equaes nolineares qu e exibem certas propriedades, como por exemplo dependncia `as condies iniciais ou e feito feedback. Os sistemas que descrevem nossa realidade

7 econmica podem ser compostos por um nmero muito grande de equaes que por sua vez so compostas por um nmero muito grande de variveis, cada uma com um peso especfico qu e pode ser fixo ou variar com o tempo. As prprias variveis que formam as equaes, por sua vez, podem deixar de ser relevantes, mudando a estrutura do sistema. Alm dis so, deve ser levado em considerao as inter-relaes entre os diferentes sistemas econmi cos que esto interagindo a nvel global e so interdependentes. Tentar modelar estes sistemas econmicos de forma mecnica, como Newton modelou o movimentos dos planetas , sem dvida ajudou os economistas do passado. Porm, esse mtodo deixa de lado aspect os importantes do processo econmico, tais como retornos crescentes, equilbrios mlti plos, trajetrias dependentes, tecnologia e instituies. As descobertas relativamente recentes que foram em parte possveis graas ao estudo de sistemas dinmicos complexo s, sugerem uma mudana de paradigma, ou uma alterao na forma de perguntar e responde r problemas relativos a economias de mercado. Vale lembrar que neste contexto, a definio de complexidade no se refere a algo apenas complicado e difcil de resolver, e sim a sistemas que apresentam algum tipo de ordem que emerge espontaneamente da interao entre os diferentes fatores econmicos. Quanto mais acumulamos informao e c onhecimento, mais percebemos que talvez certas perguntas deveriam ter sido feita s de forma mais apropriada desde o comeo. Por essa razo, deve-se olhar o fenmeno ec onmico como um sistema evolutivo e dinmico, ao invs de um sistema em busca do cresc imento equilibrado estvel. Para sistemas dinmicos complexos, equilbrio igual a mort e, o fim de sua evoluo. Para se adaptar e evoluir, o sistema deve estar `a

8 margem do caos, o ponto onde mais criativo, flexvel e gil, sem perder sua estrut ura. Neste livro veremos como o pensamento econmico evoluiu atravs dos tempos at ch egarmos a atualidade, onde a economia interpretada como um sistema dinmico comple xo. No como uma mquina perfeita, como um relgio, mas como algo orgnico, em desenvolv imento, dependente de seu passado, como um caleidoscpio vivo onde novos padres esto continuamente sendo criados. Esta viso vai buscar na Biologia suas metforas e na Matemtica sua linguagem. uma viso nova, em sua infncia e ainda em fase de criao. Na t entativa de entender o mundo que nos cerca, a economia est evoluindo e, em um cer to sentido, amadurecendo como cincia.

9 PARTE 1 CAOS

10 1 Uma Nova Viso Econmica Uma nova percepo, um mundo diferente. O meio em que estamos inseridos, a cultura, a religio, a formao que escolhemos, tudo modifica a maneira como visualizamos cada detalhe de nossas vidas. Nossa viso depende do paradigma em que vivemos, do modelo ou padro que seguimos. Quando uma grande descoberta cientifica feita, antigas ver dades so questionadas, regras so quebradas e surge a oportunidade de frmulas estabe lecidas serem repensadas. Uma revoluo em diversas reas do conhecimento cientfico, um a legio de pesquisadores unidos em prol de um nico objetivo : a busca por um novo paradigma. A Teoria do Caos Determinstico um conceito relativamente novo em Cincia que transforma a maneira como percebemos o que est a nossa volta. A palavra Caos significa, segundo o dicionrio Aurlio, um vazio obscuro e ilimitado que antecede e teria propiciado a gerao do mundo, o Caos Primordial a que o Gnesis se refere. Em uma segunda definio seria uma grande confuso e desordem. O termo Caos Determinstico aparentemente paradoxal. Como algo pode ser catico e determinstico ao mesmo tempo ? Porm, a teoria busca entender a ordem que surge espontaneamente por trs da desor dem. Essa

11 desordem superior, que sempre foi um enigma para o homem, o levou a questionar a estrutura do mundo a sua volta, que, por vezes, revelava uma coerncia nascida a partir do imprevisvel, da prpria desordem. A reflexo sobre essas questes provoca, i nevitavelmente, uma enorme necessidade de se encontrar respostas. Respostas para questes como o que rege o clima, o curso de um rio, as batidas de um corao, ou sej a, as leis da natureza, inclusive a humana. O longo caminho para entender a desor dem, utilizando a Teoria do Caos Determinstico, comeou a ser traado por cientistas a mericanos e europeus no inicio da dcada de 60 com a difuso dos computadores eletrni cos. Mas a exploso se deu quando os cientistas ganharam estaes de trabalho em suas mesas, que permitiram, a custos baixos, uma enorme expanso na velocidade de clculo s. Os cientistas puderam comear a ver a evoluo dos sistemas de forma acelerada e is to levou a uma diferente viso de Cincia e do mundo. Aos poucos, foi se descobrindo uma nova teoria : o Caos Determinstico. Atravs da matemtica foi provado que dentro da prpria desordem podemos encontrar padres. Existe ordem dentro da desordem. Ess a descoberta fez com que estudiosos de vrios campos reavaliassem suas teorias e s uas verdades. A Teoria do Caos estuda o comportamento de sistemas que apresentam c aractersticas de previsibilidade e ordem, apesar de serem aparentemente aleatrios. Pequenas variaes nas condies iniciais tem um grande impacto em suas trajetrias futur as. Por exemplo, vistas de forma individual, as transaes feitas em um mercado no si gnificam nada, mas quando observadas e analisadas estatisticamente, apresentam s imilaridades e padres de

12 comportamento dinmico no linear, da mesma natureza que um regime de chuvas, ou as batidas de um corao. Outro exemplo seria o corpo humano. O crebro um sistema dinm ico, podendo em certos momentos apresentar comportamento equilibrado e racional, e em outros, imprevisvel e irracional. Como o homem no um tomo, suas formas de org anizao social no podem ser compreendidas atravs do uso de um paradigma reducionista. As sociedades no so como laboratrios onde experincias podem ser repetidas para se c omprovar a validade de uma teoria. Suas formas de organizao, neste caso suas Econo mias de Mercado, podem ser vistas como conseqncia natural da essncia no-linear do co mportamento humano. Teorias econmicas que partem do pressuposto de um estado de e quilbrio so uma tentativa de simplificar a realidade econmica. Dependem de hipteses como investidores racionais e mercados eficientes, como veremos posteriormente. So, portanto, solues particulares de sistemas que contem equilbrio ( ordem) mas tambm o desequilbrio necessrio para que haja evoluo, a destruio criadora se referiu o economista austraco Joseph Shumpeter.

13 2 O Q UE EXATAMENTE C AOS D ETERMINISTICO ? A palavra gs foi usada pela primeira vez pelo qumico holands J. B. Van Helmont em sua obra Ortus Medicinae, de 1632, numa aluso deliberada a palavra grega caos. Sua esc olha foi muito interessante pois foi na fsica dos gases que aleatoriedade e deter minismo se encontraram pela primeira vez. A Teoria do Caos Determinstico uma form a de se aproximar um pouco mais do desconhecido e chegar cada vez mais perto de entender a realidade de nosso mundo. De compreendermos melhor os fenmenos naturai s e o comportamento do prprio homem. De forma simples, a idia de que se pode obter resultados aparentemente aleatrios a partir de simples equaes matemticas. Mas na Te oria do Caos tambm se encontra o oposto : possvel achar ordem onde aparentemente s h aleatoriedade. Uma definio um pouco mais precisa do ponto de vista cientifico ser ia : a Teoria do Caos o estudo de comportamentos instveis e aperidicos em sistemas dinmicos determinsticos no lineares, como veremos neste capitulo.

14 Quando cientistas concentram seus esforos em tentar entender uma coleo de objeto s e processos que se interrelacionam, a este conjunto eles chamam de sistema. Um s istema pode ser o sol e seus satlites, um conjunto de clulas no organismo humano, a economia brasileira, uma turbina de avio, a populao de iguanas que habitam a terr a ou ainda mais especificamente as que so encontradas apenas em Galpagos. Alguns a spectos de um sistema podem ser de relevncia cientifica e admitem descrio matemtica. Segundo a fsica newtoniana, especificando-se numericamente a posio e volocidade de todos os intergrantes de um dado sistema, possvel obter sua posio em um momento fu turo ou passado. Tal descrio, dada em termos de uma ou mais variveis do sistema, ch amada de estado do sistema. Um sistema pode ser descrito por uma equao ou conjunto d e equaes. Portanto, dado o estado de um sistema em um determinado momento do tempo e conhecendo-se as equaes que descrevem este sistema, pode-se calcular o seu esta do para qualquer momento (passado ou futuro). Entre os sistemas dinmicos temos du as categorias, os lineares e os no lineares. Um sistema linear seria aquele em qu e a relao de causa e efeito entre as variveis pode ser prevista com preciso, como po r exemplo um carro que viajando a 90km/h em duas horas estar a 180 km de distanci a, ou seja, a resposta a um determinado distrbio diretamente proporcional a inten sidade desse distrbio. Os no lineares so aqueles cuja resposta a um determinado dis trbio no necessariamente proporcional a intensidade desse distrbio, ou seja, um peq ueno distrbio pode causar uma grande alterao no estado do sistema.

15 Os sistemas dinmicos com caracterstica no linear so objeto de estudo da Teoria do Caos. As no-linearidades surgem quando tenta-se modelar fenmenos do tipo : atrito do ar em um carro, limites para o crescimento biolgico de uma populao ou o crescim ento econmico em ciclos. Explicando atravs da matemtica, es sistemas de duas varivei s x e y, expresses do tipo 5xy seriam exemplos de termos no lineares. Esta no linea ridade que leva a impossibilidade de se encontrar uma soluo fechada (ou exata) par a estes sistemas. Portanto, pesquisadores destes ramos, ao invs de tentar buscar prever exatamente os estados futuros destes sistemas, buscam explicaes para o comp ortamento geral das solues do sistema em um perodo de mais longo prazo atravs de sim ulaes. Ele se perguntam : que caractersticas comuns o conjunto de todas as solues do s istema apresentara? Quando um sistema deixar de apresentar solues com tais caracterst icas para apresentar solues com outro tipo de comportamento? Varias questes podem se r levantadas a respeito de qualquer sistema dinmico. A Teoria do Caos foca em cer tos tipos de comportamento - o comportamento instvel e aperidico. O comportamento instvel significa que pequenos distrbios perturbam o equilbrio do sistema de forma permanente, o contrario de um sistema marcado por estabilidade. Por exemplo, o s istema econmico, de acordo com a Teoria do Equilbrio Geral, quando afetado por um choque exgeno de demanda ou oferta tende a dissipar este choque e posteriormente volta a situao anterior de equilbrio. Na parte sobre Economia, veremos com mais pro priedade as caractersticas do modelo econmico de Equilbrio Geral Neoclssico e porque , sob a tica da Teoria do Caos e Complexidade, este

16 modelo falha em descrever a realidade econmica ao descrever uma realidade idea lizada. O comportamento aperidico ocorre quando as variveis que descrevem o estado do sistema no apresentam repetio regular de valores. Um comportamento aperidico ins tvel altamente complicado : ele nunca se repete e continua manifestando o efeito de pequenas perturbaes por um certo perodo de tempo. Tal comportamento impossibilit a a realizao de previses com boa acuracia e produz um conjunto de solues que parece a leatrio. O melhor exemplo para um processo instvel e aperidico o processo histrico d o Homem. A pesar de podermos notar padres de ascenso e destruio de civilizaes, eventos histricos nunca se repetem exatamente - a Histria aperidica. Os livros de Histria e sto cheios de exemplos de eventos menores que levaram a grandes mudanas no curso d as relaes humanas. A gota dagua que deu incio a Primeira Guerra Mundial foi o assass inato do arquiduque Francisco Ferdinando de Habsburgo, herdeiro do trono austrohngaro, cometido em Sarajevo no dia 28 de junho de 1914, por um nacionalista Srvio . O confronto regional entre o imprio Austro-hngaro e a Srvia acabou ocasionando a guerra que envolveu vrios pases do mundo. Os exemplos padro de sistemas que apresen tam comportamento instvel aperidico sempre envolvem grandes aglomerados de unidade s interativas. Os sistemas podem ser compostos por molculas de gs colidindo entre si ou agentes humanos interagindo sob a forma de um mercado. Uma caracterstica ma rcante deste sistemas, e grande parte responsvel pelo interesse que gera para seu s pesquisadores, o fato de que este comportamento

17 instvel aperidico pode ser encontrado em sistemas de equaes matematicamente simples, como veremos em seguida ao estudarmos a Equao Logstica. Po rtanto, a Teoria do Caos explora modelos matematicamente simples mas que apresen tam um comportamento to complexo ao ponto de parecerem aleatrios.

18 Efeito Borboleta (Sensibilidade `as Condies Iniciais) QUANDO O CAOS FOI DESCOBERTO PELA PRIMEIR A VEZ ? O primeiro a examinar explicitamente sistemas caticos foi um meteorologista ameri cano chamado Edward Lorenz, que por volta de 1960, trabalhou em estudos de previ so do tempo no MIT (Massachusetts Institute of Technology). Lorenz formou-se em 1 938 em matemtica pura pelo Dartmouth College, renomada universidade na costa lest e dos Estado Unidos. Durante a Segunda Guerra Mundial, atuou nas foras armadas am ericanas prevendo o tempo e depois acabou se estabelecendo neste ramo. Na dcada d e 60, a previso do tempo era considerada pelos cientistas um trabalho de menor si gnificado. Os prprios meteorologistas no gostavam de atuar neste campo. O uso de c omputadores no estava amplamente difundido e no eram muito confiveis. Lorenz, desde pequeno, se entretia com as mudanas de temperatura atmosfrica e as formas dos cic lones, que, apesar de respeitar uma rigorosidade matemtica, nunca se repetiam. El e estava em busca de entender o padro com que as mudanas atmosfricas aconteciam. Co m esse objetivo, construiu em sua sala no MIT, um imenso computador cheio de vlvu las e barulhento, chamado Royal McBee. Um dia no inverno de 1961, trabalhando em um problema de previso de tempo, seu computador estava programado com um conjunt o de doze equaes que formavam um modelo simplificado de variaes em padres climticos. Tentando repetir uma seqncia de dados, Lorenz digitou a (mesma seqncia) em seu compu tador visando dar as condies iniciais do problema. Para economizar tempo, cortou o s ltimos trs dgitos dos nmeros da srie de dados

19 que pretendia copiar, ligou o programa e saiu para tomar um caf. Ao invs de dig itar 0,506127, digitou apenas 0,506. Uma hora depois, quando voltou, o sistema h avia produzido uma srie de dados que no comeo parecia similar a anterior, mas que depois evoluiu de forma a se descolar completamente, terminando de forma diverge nte da inicial. Evoluo dos dados : divergncia aps um certo perodo de tempo Em um primeiro momento Lorenz achou que o problema era do computador, ou que hav ia algum erro no sistema. Aps muitas pesquisas, chegou a uma concluso que mudou os rumos da cincia. Estava tudo certo, a nica diferena eram os trs ltimos dgitos que ele havia cortado. Naquela poca, um cientista poderia considerar-se sortudo caso pud esse medir seus experimentos com tamanha preciso. Os trs dgitos finais eram apenas um luxo, um detalhe, que quando deixados de lado, tiveram um impacto maior do qu e o esperado. Lorenz mostrou que a idia de que pequenas diferenas nas condies inicia is tem um pequeno efeito no resultado final, estava errada. Descobriu o que mais tarde ficou conhecido como Efeito Borboleta, onde pequenas diferenas nas condies i niciais de um sistema dinmico podem ter um efeito enorme no resultado final deste sistema. Esta uma caracterstica de sistemas dinmicos no lineares, com comportament o catico determinstico como exemplifica Lorenz :

20 O bater de uma nica asa de borboleta hoje produz uma minscula alterao no estado da atmosfera. Aps certo tempo, o que esta efetivamente faz diverg e do que teria feito, no fosse aquela alterao. Assim, ao cabo de um ms, um ciclone q ue teria devastado o litoral da Indonsia no acontece. Ou acontece um que no iria ac ontecer. O efeito borboleta ficou conhecido com o nome tcnico de

sensibilidade/dependncia as condies iniciais e chocou o meio acadmico da poca o fato de que tal comportamento complexo poderia ser descrito por um sistema relativame nte simples, com apenas 12 equaes. Contudo, Lorenz, em seu artigo Deterministic Non periodic Flow de 1963, concluiu que devido a este efeito, seria impossvel prever o tempo com total preciso, mas o levou a descobrir outros aspectos do que mais tar de formaram o arcabouo terico da Teoria do Caos. O estudo de sistemas dinmicos no li neares envolve o estudo de sistemas em estado de turbulncia. Mais precisamente, o estudo da transio de um estado de estabilidade para outro turbulento o que mais i nteressa ao pesquisador. Este fenmeno pode ser observado em toda a parte. Imagine a fumaa de um cigarro que sobe at se dissipar por inteiro, o creme que se dissolv e ao ser colocado numa xcara de caf quente ou a gua que ferve numa panela. O curios o que o fenmeno da turbulncia, por incrvel que parea, no pode ser modelado pelos mtod s tradicionais da fsica newtoniana, publicados oficialmente em Julho de 1687, qua ndo Isaac Newton lanou sua grande obra Philosophiae naturalis principia mathemati ca, uma das maiores obras cientificas jamais concebidas pela mente humana. A fsic a newtoniana pode predizer quanto tempo falta para que o

21 cometa Halley passe novamente perto da Terra, mas no pode predizer qual ser a t emperatura depois de amanh no Rio de Janeiro com preciso. A fsica newtoniana baseia -se em 3 leis: Se nenhuma forca atua sobre um corpo, ele permanece em repouso ou se move uniformemente em linha reta; Sua acelerao proporcional a fora que esta atu ando; A toda ao corresponde sempre uma ao igual em sentido contrario; O relgio o smbolo supremo da fsica newtoniana. Os seus componentes se integram perf eitamente e em harmonia. Sabemos que um pequeno choque pode provocar um pequeno atraso no relgio, que voltar a bater precisamente aps alguns instantes. Este um sis tema em equilbrio, o exemplo mximo da Era do Determinismo e da viso mecanicista do Ho mem. O poder do clculo matemtico era to grande que Pierre Simon de Laplace chegou a afirmar em seu Ensaio filosfico sobre as probabilidades : Se pudermos imaginar um a conscincia superior que saiba a exata velocidade e posio de todos os objetos do u niverso em um determinado instante, assim como as foras que neles atuam, possvel c alcular o passado e o presente pelas leis de causa e efeito. No paradigma determi stico, o atual estado das coisas funo direta dos acontecimentos passados, e o que ir acontecer no futuro depender do que acontecer agora. Passado, presente e futuro esto interligados diretamente por uma relao de causa e efeito. Simetria e equilbrio so as principais caractersticas da era newtoniana. Porm, em se tratando de sistema s dinmicos no lineares, a prpria fsica newtoniana percebeu seus limites. Ela pode ex plicar

22 perfeitamente como dois corpos interagem, mas no pode prever a interao de trs cor pos. O problema de interao de trs corpos ocupou o meio acadmico por boa parte do scul o 19. Finalmente, Henry Poincar, um grande matemtico francs que viveu no sculo XIX, considerado por muitos o ltimo dos tradicionalistas e o primeiro dos modernos (fo i um dos criadores da Topologia), notou que o problema no poderia ter uma nica sol uo devido as no linearidades inerentes ao sistema, provenientes das sensibilidades as condies inicias. Efeito Feed-Back

Um sistema dinmico no linear inerentemente imprevisvel no longo prazo. Esta imprevi sibilidade ocorre devido a dois fatores : primeiro, sistemas dinmicos so susceptvei s ao efeito feedback, ou seja, em uma equao, o resultado (output) volta a ser a con dio inicial (input) na prxima iterao. Iterar uma equao significa repeti-la recursivame te, ou seja, fazer com que o resultado final da primeira rodada seja a condio inic ial da segunda (loop). Input Sistema Output Feedback Loop O resultado final da segunda a condio inicial da terceira e assim po r diante. Esta tcnica conhecida como Analise de Feedback ou Iterativa. Este proce sso o que dar origem as figuras fractais que veremos mais adiante. como um

23 microfone que apita quando colocado perto da caixa de som. O som entra em loo p e faz um barulho terrvel devido ao efeito feedback. Sistemas com feedback so com o taxas de juro compostas, sua transformao exponencial, ou seja, so elevados a um e xpoente maior do que um (ex : x2). Qualquer diferena nas condies iniciais, crescero exponencialmente, como vimos no caso de Lorenz e como veremos nos modelos de Ret ornos Crescentes de W. Brian Arthur.

24 Nveis Crticos (Criticalidade)

Uma segunda caracterstica dos sistemas dinmicos no lineares seria a existncia de nvei s crticos. Nveis crticos so nveis a partir dos quais um sistema sai da posio de equil o, sendo que esta mudana de estado foi causada por um pequeno incremento. Como em um castelo de cartas, por exemplo. Ao adicionar uma nica carta a um castelo com cinqenta cartas, tudo pode ruir e ele ir ao cho. Um outro exemplo seria a fumaa de um cigarro. A fumaa sai do cigarro e comea a subir em linha quase reta. De repente , esta coluna de fumaa se quebra e se dissipa. Algo parecido com bolhas especulat ivas em mercados financeiros super-alavancados ou as reaes repentinas observadas e m manadas de animais selvagens. Coluna de fumaa em transio de estabilidade para caos.

25 Como vimos, algumas caractersticas de sistemas dinmicos no lineares so: sensibilidad e as condies iniciais, nveis crticos e como veremos mais adiante, a dimenso fractal. Uma parte importante para o entendimento destes sistemas analisar graficamente o conjunto de solues das equaes, dados diferentes valores das variveis em questo. A ins peo visual dos dados e dos resultados fundamental para entendermos outros conceito s relacionados a Teoria do Caos.

26 Espao de Fase O Espao de Fase talvez seja a mais importante arena para o entendimento do estudo de Sistemas Dinmicos. Ele nada mais do que uma construo matemtica conceitual onde c ada dimenso corresponde a uma varivel do sistema. Se o sistema possui duas dimenses , basta desenharmos as duas variveis, x e y em um grfico cartesiano ou de coordena das. Portanto, a cada ponto do Espao de Fase corresponde uma descrio completa do si stema em um de seus possveis estados. A evoluo do sistema se manifesta, ao desenhar mos sua trajetria no Espao de Fase. Esta metodologia muito til porque possibilita o estudo das caractersticas geomtricas desta trajetrias. O Espao de Fase pode ser ent endido como o nmero total de combinaes disponveis para o sistema. Quando jogamos car a ou coroa, s podemos ter estes dois estados. O nmero de estados cresce rapidament e em sistemas mais complexos. Se jogarmos 100 moedas para o alto, as combinaes pod em ser arranjadas de 1,000,000,000,000,000,000,000,000,000,000 formas diferentes . Cada moeda pode ser vista como um parmetro ou dimenso do sistema. Ento, cada arra njo seria equivalente a 100 nmeros binrios (cada um indicando um 1 para cara ou 0 para coroa para cada moeda). Generalizando, todo sistema tem uma dimenso no Espao de Fase para cada varivel. Mutao ou adaptao ao meio pode mudar uma ou mais variveis do sistema, movendo-o pequenas distancias no Espao de Fase.

27 Atratores

O atrator seria uma posio preferida pelo sistema dentro do espao de fase, de modo t al que se outra posio for a inicial, o sistema evolui em direo ao atrator caso no haj a maiores interferncias de foras externas; ou seja, a trajetria do sistema fica con finada aos limites do atrator. Um atrator pode ser um ponto (o centro de uma bac ia esfrica contendo uma bolinha de gude), uma trajetria regular (a orbita dos plan etas), uma serie complexa de estados (o metabolismo de uma clula) ou uma seqncia in finita (chamada de atrator estranho). Todos os tipos de atratores se referem a u ma rea restrita do Espao de Fase. Uma rea maior do Espao de Fase ao largo do atrator chamada de bacia de atrao. Vejamos trs tipos bsicos de atratores que so importantes para a compreenso da Teoria do Caos. O mais simples seria o atrator pontual. Um pn dulo que vai parando devido ao ao atrito com o ar o melhor exemplo. Quando se d o impulso inicial, o pndulo comea a balanar. O balano vai se tornando mais e mais bra ndo, at que o pndulo pare. As variveis relevantes neste caso so a velocidade e a pos io do pndulo. Se desenharmos um grfico da velocidade ou da posio em funo do tempo, ve os uma curva cuja amplitude vai diminuindo gradualmente at chegar a zero. O pndulo esta parado.

28 Atrator Pontual Se o espao de fase for desenhado como posio versus velocidade, veremos uma linha es piral que acaba na origem, aonde o pndulo finalmente para. Retrato do Espao de Fase de um Atrator Pontual

Podemos dizer que o pndulo atrado para a origem, independentemente da fora que coloc da no inicio. A origem onde o sistema se encontra em equilbrio. Este tipo de atra tor um atrator estvel pois se perturbado o sistema volta a origem. Ele possui doi s atratores, o movimento para frente e para trs, que um atrator peridico, e o movi mento 0, ou seja, quando o pndulo esta parado no ponto de origem. Dai o termo atr ator pontual, pois representado no Espao de Fase por um ponto. Imagine agora um m undo onde no h atrito. O grfico da velocidade ou da posio em funo do tempo seria uma o da em forma de sino, conhecida como senide.

29 Atrator de Ciclo Limitado J o grfico do espao de fase teria a forma de um crculo fechado, uma vez que o pndulo nunca pararia. Espao de Fase de um Atrator de Ciclo Limitado Este tipo de atrator conhecido como ciclo limitado e pode ser entendido como um si stema com periodicidade regular. O ltimo tipo de atrator seria o atrator catico, o u estranho como conhecido no mundo acadmico. Imagine desta vez, que a cada volta da ramos um peteleco na bolinha do pndulo com foras diferentes. Como o peteleco dado c om fora aleatria a cada volta, a velocidade e a posio do pndulo sero diferentes a cada vez. O espao de fase parece aleatrio e catico, porem limitado a um certo intervalo (a amplitude mxima do pndulo). Um outro atrator deste tipo seria o que Lorenz des cobriu a partir das equaes que usou em seu modelo de previso do tempo. O seu sistem a de equaes parecia gerar resultados completamente aleatrios, contudo, quando desen hados em um espao de fase, algo surpreendente acontecia. Os resultados sempre

30 ficavam dentro de uma regio que parecia ser uma espiral dupla, figura que fico u conhecida como atrator de Lorenz. Atrator de Lorenz O atrator no era, pontual ou peridico e sim aperidico, ou seja, o comportamento do sistema nunca se repetia, a pesar do atrator apresentar uma estrutura geomtrica f inita dentro do Espao de Fase. Neste sistema, previses de curto prazo poderiam ser feitas, mas quando eram feitas tentativas de previses a longo prazo, pequenos er ros cresciam exponencialmente inviabilizando assim o poder de previso do modelo. Este resultado foi publicado por Lorenz em 1963

31 em um jornal especializado em Meteorologia, e por estar bem a frente de seu t empo, seu trabalho s foi reconhecido anos mais tarde. Os atratores pontuais e per idicos so bons representantes do tipo de fsica que se fazia na era de Newton. Os at ratores estranhos, por sua vez, representam resultados mais recentes da fsica no-l inearidade. Sua imprevisibilidade produto da assincronia e interatividade das va riveis que o atrator representa. O movimento de uma varivel pode gerar movimentos no proporcionais em outras. Por exemplo, um nico gro de areia adicionado a uma pilh a de gros pode no ter nenhum efeito, assim como pode precipitar uma avalanche. O c omportamento no-linear imprevisvel. O exemplo de uma avalanche em um montinho de a reia ilustra bem isso. Ser que cada novo gro ir aumentar o montinho ou provocar um deslizamento? Se for um deslizamento, de que tamanho ser? Esta incerteza observad a no comportamento de atratores estranhos funo de dois fenmenos : sensibilidade as condies iniciais, como j vimos e ao que Poincar chamou de ressonncia. Toda partcula, a rgumentou, possui energia cintica (que a fonte do movimento corrente) e energia p otencial (fonte de possveis movimentos futuros). O movimento de partculas isoladas pode ser facilmente mensurado atravs do uso de frmulas. J o movimento de um conjun to de partculas muito prximas umas das outras vai liberar energia potencial de for ma imprevisvel. Isto causar um efeito de imprevisibilidade na trajetria das partcula s. como no exemplo dado por Ian Stewart no livro Ser que Deus joga dados? : [] Suponh a que voc tem um instrumento capaz de rastrear o movimento de um nmero razovel de molculas individuais de gs. O que voc veria? Concentre sua ateno nu equeno grupo de molculas. Elas seguem trajetrias retilneas por um

32 certo tempo, depois comeam a se chocar umas com as outras de uma maneira que era possvel prever a partir da geometria anterior das trajetrias. Quando voc mal esta c omeando a ver o padro do movimento, eis que surge uma nova molcula, que vem zunindo de fora e se choca com seu grupo to bem organizado, rompendo o padro. E antes que voc possa apreender o novo padro, surge uma outra molcula, e outra, e mais outra Em certo sentido, esse mesmo mecanismo que torna a cincia social to difcil. No possvel estudar uma economia real, ou uma nao ou uma mente, pelo isolamento de uma pequena parte [] Podemos fazer uma metfora entre um atrator estranho e um sistema social. Ambos so estveis mas seus comportamentos nunca se reptem. Partculas individuais (pessoas) i nteragem umas com as outras e seus comportamentos so afetados por essa interao. Ima gine, a nvel macro, uma grande rede de relaes interpessoais, com causalidade bidire cional. Comeamos a ver onde a Teoria do Caos pode nos levar no entendimento de fe nmenos sociais. Assim como comportamentos sociais, atratores estranhos podem muda r com o tempo. Modas vo e vem, mercados sobem e descem, nossas relaes com as instit uies se alteram, nossa definio de famlia se transforma. Atratores sociais ocasionalme nte apresentam mudanas radicais. A dissoluo da Unio Sovitica no final da dcada de 80, o crack da bolsa americana em 1929, ou a falncia do imprio Inca que no passado flo resceu na Amrica do Sul so alguns exemplos mais bvios avalanches catastrficas.

33 A Equao Logstica Um sistema de equaes com padro de comportamento no-linear muito utilizado em diversa s reas de conhecimento a equao logstica. Neste livro, vamos utiliza-la com um exempl o aplicado ao mercado, mas a mesma equao poderia ser usada para descrever, por exe mplo, o problema de previso do crescimento de populaes, como fez o bilogo Robert May . Para ilustrar a explicao, nada melhor que um sistema no-linear simples. Suponha q ue o preo (Pt) de uma ao que custa normalmente R$1,00 est sendo vendida por R$ 0,50 . Neste caso, vrios compradores entraro no mercado e o excesso de demanda elevar o preo a uma determinada taxa, que na equao aparece representada por a. O valor futuro de Pt no tempo t+1 ser ento : Pt+1 = aPt (2.0) A equao assume que s existem compradores. Para tornar o modelo mais realstico, devemos adicionar o efeito dos vendedores. Supondo ento que enquanto os preos cre scem a taxa aPt, as vendas reduzem o preo a taxa aP2t. A equao fica ento : P t+1 = aPt - aP2t ou P t+1 = aPt *(1-Pt) (2.1)

34 Este modelo no realstico mas ele explica que a presso para compra eleva o preo a uma taxa a e a presso para venda reduz o preo a uma taxa aP t. A baixos nveis de pres so compradora, o preo cai para zero e o sistema morre. A altos nveis de presso comprad ora (mas no muito alta) o preo converge para seu valor de equilbrio. Supondo ento qu e a presso compradora resulte numa taxa de crescimento de a = 2, e P0 = 0,3. Iter ando a equao o preo justo de 0,5 e observamos que a um volume moderado de transaes o preo converge para um nico valor , como nos mostra o Grfico abaixo . 0,5 0,45 0,4 0,35 0,3 1 26 51 76 101 # d e Ite ra e s A Equao Logstica : convergncia do preo; a = 2 Contudo, se a taxa de crescimento (volu me de transaes) subir para a = 3,1, teremos dois possveis preos justos e o sistema o scilar entre ambos (Grfico abaixo).

35 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1 26 51 76 101 # d e Ite ra e s

A Equao Logstica : a = 3,1 ; dois preos de equilbrio Isto acontece porque a este nvel crtico, compradores e vendedores no esto entrando no mercado igualmente. Quando o p reo chega em seu nvel mais baixo, existem mais compradores do que vendedores no me rcado e o preo sobe. A recproca verdadeira quando o preo alcana seu mximo. Temos ento dois preos de equilbrio : um para quando h mais vendedores que compradores e outro para quando h mais compradores do que vendedores. Quando a taxa de crescimento ch ega a a = 4, um nmero infinito de valores de equilbrio possvel (Grfico abaixo). 1 0,8 0,6 0,4 0,2 0 1 26 51 76 101 # d e Ite ra e s

36 A Equao Logstica : a = 4 ; mltiplos preos de equilbrio O Grfico abaixo o diagrama bifurcao. Nele podemos observar os valores crticos da taxa de crescimento a, enquant o o nmero de preos de equilbrio aumenta. Quando a = 3,75 temos uma faixa de estabili dade. Se magnificarmos uma pequena parte da figura, esta tambm apresentar uma faixa de estabilidade e assim por diante a escalas cada vez menores. Esta caracterstica conhecida como auto-similaridade nas escalas e um fator de muito interesse no es tudo da Geometria Fractal. Esta auto-similaridade, ou seja, o fato de uma copia exata do diagrama de bifurcao se repetir a escalas cada vez menores um importante aspecto da Teoria do Caos. O diagrama de bifurcao o conjunto de todas as possveis s olues da equao logstica. Estatisticamente, na regio catica, os pontos no possuem a me probabilidade de ocorrerem. Podemos ver que em algumas regies, como na tarja neg ra por exemplo, temos infinitas solues possveis contidas num espao finito. Diagrama de Bifurcao Faixa de Estabilidade a uma escala menor

37 Na geometria euclidiana, quanto mais perto olhamos um objeto, mais simples es te fica. Uma linha, se magnificada uma de suas partes ad infinitum chega a um po nto. Na natureza, quanto mais perto olharmos um objeto, este se mostra com mais detalhes.

38 Geometria Fractal Fractais, por definio, so objetos onde as partes se relacionam de alguma forma com o todo. Fractais so auto-referenciais ou auto-similares. A geometria da natureza fractal na medida em que em varias formas naturais nuvens, rvores, linhas costeir as, folhas e etc, - partes menores so similares as partes maiores. A natureza esta cheia de exemplos de auto-similaridade nas escalas Foto de Ansel Adams Estes objetos naturais no podem ser perfeitamente representados utilizando-se ele mentos da tradicional geometria euclidiana, como por exemplo tringulos, crculos, o u quadrados. Na natureza, o formato de pedras, nuvens, montanhas e rvores, de fat o, so mais complicados do que a geometria euclidiana poderia representar. Montanh as no so cones, nuvens no so esferas, a linha costeira de uma ilha no um circulo, um rio no uma linha reta e uma trovo no em forma de Z.

39 Tempestade de troves e o delta do Rio Ganges : exemplos de formas fractais na nat ureza. Normalmente, quando uma criana desenha um rio, o faz de forma aproximativa, utili zando uma linha reta, quando muito meio curva. Um rio, na verdade, como uma rvore , ou seja, uma estrutura cheia de ramificaes como podemos ver na figura abaixo, qu e representa uma simulao de arvore. Cada ramo, se visto de forma individual se ass emelha com a rvore como um todo. Assim como o pulmo humano, uma rvore de tubos cada vez menores e mais finos composta por brnquios, bronquiolos e alvolos, e o sistem a cardiovascular, uma rede de artrias, veias, vasos e capilares. Fractais so estru turas que se repetem a escalas cada vez menores. Sabemos que a Geometria euclidi ana oferece uma boa aproximao da realidade, mas a verdadeira geometria da natureza a geometria fractal.

40 Arvore Fractal : Cada ramificao se assemelha a rvore como um todo Sistema Cardiovas cular como exemplo de fractal

41 O desenvolvimento da geometria fractal um dos mais importantes acontecimentos cientficos do sculo XX. Com o uso de fractais, os cientistas podem descrever form as naturais com o uso de simples equaes matemticas, calculadas de forma recursiva e m seus computadores. Sistemas dinmicos no lineares com comportamento catico determi nstico geram figuras fractais (como vimos no Diagrama de Bifurcao), dai o interess e no estudo destas formas. Atravs do uso de computadores com programas que permit am gerar grficos de equaes no lineares possvel simular figuras de nuvens ou montanhas de forma perfeita. Simulao de paisagem feita com um programa que se utiliza de geometria fractal. Figuras fractais geradas por computadores so consideradas por muitos uma forma de arte. Sua popularidade foi to grande que na dcada de 80 at calendrios e camisetas j foram feitos com estas figuras. Muitas pessoas tiveram seu interesse pela Teoria do Caos despertado, em um primeiro momento, pela

42 beleza das figuras fractais. Algumas delas respondem a estas figuras de forma at mesmo emocional. Umas as adoram, outras as detestam. Na pratica, as figuras f ractais geradas por computadores so muito mais interessantes do que as figuras fr ias e chatas geradas pelas rguas e compassos euclidianos (sem querer desmerecer a sua importncia). Auto-similaridades nas escalas O Mandelbrot Set se repete conforme a figura magn ificada por computador a escalas cada vez menores. Euclides, na verdade, formalizou geometricamente a viso de mundo dos antigos greg os, utilizando-se de leis desenvolvidas separadamente por Aristteles, Pitagoras e outros e fazendo delas um sistema. No mundo platonico, criado por uma entidade superior, somente formas simetricas e perfeitas eram permitidas. Neste mundo tud o deveria ser perfeito. Esta era a Primeira Natureza. O mundo em que vivemos, de acordo com sua viso, era a Segunda Natureza, ou seja, uma representao imperfeita d a Primeira Natureza e criada por uma entidade menos poderosa do que a que criara a Primeira Natureza. Neste outro mundo, formas menos perfeitas eram permitidas.

43 Contudo, a geometria euclidiana no representava estas formas. O problema era a imperfeio do mundo e no da geometria. Benoit Mandelbrot esta para a Geometria Frac tal assim como Euclides esta para a Geometria Clssica. A palavra fractal foi inve ntada por Mandelbrot, ao folhear o dicionrio de latim de seu filho a procura de u m nome para as figuras que descobrira e que iria publicar em seu brilhante livro The Fractal Geometry of Nature, publicado em 1975. Sua origem vem do adjetivo f ractus e do verbo frangere, ou quebrar em fraes, fraturar. Benoit Mandelbrot Mandelbrot, o grande cientista francs que usava a geometria para a resoluo de seus problemas um revolucionrio, um dos pioneiros da Teoria do Caos. Ele ensinou econo mia em Harvard, engenharia em Yale, fisiologia no Instituto Einstein de Medicina , entre outras coisas. Sempre que lhe davam um problema matemtico para resolver, ele iria tentar desenhar o problema de forma geomtrica. Ele tem uma intuio especial e uma necessidade de visualizar o problema, para depois resolve-lo. Mandelbrot nasceu em Varsvia em 1924 numa famlia de judeu lituanos, seu pai era vendedor de r oupas e sua me, dentista. Devido a guerra, sua famlia se

44 mudou para Paris em 1936, onde j se encontrava Szolem Mandelbrojt, seu tio e m atemtico. Aps a guerra, Mandelbrot entrou para a Ecole Polytechnique de Paris, uma das mais prestigiosas escolas de matemtica da Frana. Contudo, se deparou com o mo vimento Bourbaki. Este movimento vinha a ser uma espcie de seita secreta a favor do rigor matemtico na Cincia. A analise lgica era central. Um matemtico deveria comea r as demonstraes de um teorema com princpios slidos, e deduzir todo o resto a partir dai. A seita tambm tinha como fundamento a primazia da matemtica em relao a toda e qu alquer Cincia. Seus resultados no necessariamente deveriam ter uma utilidade na vi da pratica das pessoas. O que interessava era o estudo da lgica para fins apenas tericos. Portanto, o uso de desenhos ou formas geomtricas no era muito bem visto ne ste contexto. A Geometria no era confivel por no ser pura, formal e elegante. Os me lhores matemticos da poca pertenciam a este movimento e portanto seu domnio se espa lhou com facilidade entre os professores e alunos das demais escolas do continen te europeu. Este movimento veio em parte como resposta a Poincar, que no sculo XIX costumava dizer que : se algo estava certo, para que provar?, ou seja, ele no esta va muito preocupado com o rigor matemtico. Na opinio dos Bourbaki, Poincar havia co m isso deixado uma base no muito slida aos pilares da matemtica. Anos mais tarde, c om o advento do computador, a visualizao de sistemas matemticos ficou mais fcil, o q ue levou o abstracionismo Bourbaki a decadncia. Contudo, Mandelbrot no esperou par a ver o fim do movimento e mudou-se para os Estados Unidos, onde recebeu uma pro posta de trabalho no Thomas J. Watson Research Center da IBM em 1958.

45 Em seus primeiros anos de trabalho, Mandelbrot no possua ainda um computador. P ossua apenas um aglomerado de imagens em sua cabea, que desenhadas no papel no gera vam a credibilidade necessria. Convenceu ento seus parceiros de trabalho a montare m um pequeno computador para que ele pudesse lhes demonstrar suas criaes. Uma vez desenhados pelo computador, seus sonhos geomtricos passaram a ser acreditados. Mand elbrot estudou a fundo o fenmeno da auto-similaridade em escalas espaciais e tambm temporais atravs de trabalhos aparentemente desconexos : freqncia de palavras em l ingistica, periodicidade de rudos em liga es telefnicas, turbulncia, aglomerados de ga lxias, o nvel do Rio Nilo e flutuaes de preos de commodities. Uma das reas de seu inte resse era a flutuao de preos do algodo. Independentemente de como eram analisadas, a serie de preos no se enquadrava `a distribuio normal. Ao estudar a srie de preos desd e 1900, afirmou1 : Os nmeros que produziam aberraes do ponto de vista da distribuio no rmal, produziam simetria do ponto de vista de escala. Cada variao particular do pr eo era aleatria e imprevisvel. Mas a seqncia de variaes era auto-similar em diferentes escalas de tempo : curvas para variaes de preos dirias ou mensais, se pareciam perfe itamente. Por incrvel que parea, analisadas desta maneira, o grau de variao permanec eu constante (no caso, a volatilidade das series dirias e mensais) 1 Mandelbrot, Benoit B. [1963]- The Variation of Certain Speculative Prices - Journa l of Business 36, pp 394 - 419.

46 atravs de um perodo de 60 anos, mesmo na presena de duas Grandes Guerras e uma d epresso. Mandelbrot analisou tambm outros fenmenos, como por exemplo o comprimento d e uma linha costeira. Uma histria muito contada por ele data novamente do tempo d os antigos gregos e sua dificuldade para definir tamanhos. Como navegadores, os gr egos costumavam rodear de barco as ilhas de Siclia e Sardenha. Uma volta completa em torno de Sardenha demorava mais do que em torno de Siclia. Concluso, Sardenha era maior do que Siclia. Por outro lado, sabe-se que o oposto verdadeiro. Portant o, a resposta para a pergunta Qual o verdadeiro comprimento da costa da Sardenha ? depende do observador. Se o observador estiver em um barco de 80 ps, o tamanho ser menor do que se o observador estiver em um caiaque. Em um caiaque, o observad or pode entrar pelas pequenas baias e medir o comprimento com mais preciso, fazen do com que o seu tamanho aumente. Se o observador estiver caminhando pela costa, o seu comprimento ficar ainda maior. Se o observador chegar ao limite de medir t odas as micro baias existentes entre cada gro de areia o comprimento da costa tal vez chegar a um fim, mas o comprimento ser to grande que tender a infinito. Um matemt ico sueco que conseguiu capturar muito bem esta idia com uma construo matemtica foi Helge von Koch, j em 1904. Para criar a Curva de

47 Koch (ou Floco de Neve de Koch) imagine um tringulo equiltero. Adicione outro t ringulo equiltero no meio de tringulo anterior. Teremos ento uma estrela de David co m seis tringulos equilteros menores. Repita o processo, ou seja, adicione outros t ringulos equilteros em cada um dos seis outros tringulos, ad infinitum. Curva de Koch De acordo com Mandelbrot este seria um modelo aproximado de um linha costeira. A magnificao de uma parte menor da Curva de Koch parece exatamente como uma curva d e Koch original. Temos uma figura auto-similar, assim como a magnificao de um pedao de uma linha costeira continuar parecendo uma linha costeira (porm neste caso a a uto-similaridade apenas qualitativa). Linha Costeira : exemplo de auto-similaridade nas escalas Linha costeira gerada por computador A Curva de Koch apresenta um paradoxo interessante. Cada vez que um novo tringulo adicionado `a figura, o comprimento da linha aumenta. O

48 comprimento da linha pode ser entendido como 3 x 4/3 x 4/3 x 4/3 infinitament e. Contudo, se desenharmos um circulo ao redor da Curva de Koch, chegamos a uma r ea da Curva menor do que a rea do circulo. Porem, o comprimento da linha menor do que a area da Curva de Koch, que por sua vez uma linha de comprimento infinito, circundando uma rea finita (a rea interna da curva). Para superar esta dificuldad e, os matemticos Felix Hausdorff e A.S Besicovitch inventaram o que ficou conheci do como dimenso fractal. Dimenso Fractal Como nos ensinou a Geometria Euclidiana, um ponto adimensional, uma linha tem um a nica dimenso, um plano tem duas e um solido tem trs. Ns vivemos em trs dimenses, mas se considerarmos o tempo (j uma inovao einsteiniana), vivemos em quatro. A dimenso da Curva de Koch 1.26. A Curva de Koch no uma linha, mas tambm no preenche o plano. Neste caso, faz sentido que a dimenso seja algo entre um e dois, assim como a di menso de uma linha costeira ou de uma srie de preos de aes (como veremos mas adiante) . A dimenso do Tringulo de Sierpinski 1.58.

49 Tringulo de Sierpinski Para construir um Tringulo de Sierpinski, comece novamente com um tringulo equilter o. Desta vez, ao invs de adicionar outros tringulos, remova o tringulo equiltero de dentro do tringulo anterior. Repita por 10,000 vezes este processo. O resultado f inal o que se v na figura (d). Um figura com infinita complexidade, dentro de um espao finito e gerada por uma simples regra.

50

A dimenso fractal uma medida da irregularidade, ou rugosidade de um objeto. Em ob jetos fractais, o grau de irregularidade permanece constante mesmo a escalas dis tintas. Mais uma vez, a Natureza surpreende por sua regular irregularidade, como a firma James Gleick em seu notvel livro Caos - Uma Nova Cincia. Alguns autores atri buem a inveno da noo de dimenso fractal, `a mesma importncia da inveno do nmero zero matemticos medievais islmicos ou dos nmeros negativos, por matemticos hindus.

51 Sumrio Neste captulo, apresentamos as idias bsicas que formam o arcabouo da Teoria do Caos e da Geometria Fractal. A Teoria do Caos uma tentativa relativamente recente de entendermos fenmenos naturais e sociais que apresentam comportamento aparentement e aleatrio, mas que se analisados de forma estatstica so gerados por sistemas deter minsticos. Este paradoxo foi o que motivou cientistas em diversas reas de conhecim ento a entender o que esta por trs do comportamento apresentado pelos sistemas em suas reas de interesse. Este livro se limitar a analisar o comportamento de siste mas caticos determinsticos na reas das cincias econmicas e das finanas. Vale lembrar q ue o objetivo no chegar a uma formula mgica que nos permita prever quando ser o com eo e o fim do prximo ciclo econmico, nem tampouco quando ser o prximo crash da bolsa de valores. Oferecemos aqui uma nova forma de olhar os fenmenos econmicos e financ eiros, fazendo uso dos conceitos acima citados. Um passeio atravs das varias teor ias de economia e finanas, com intuito de fazer uma crtica construtiva e apresenta r os modelos que foram desenvolvidos, tomando por base mtodos no-lineares.

52 PARTE 2 COMPLEXIDADE

53 3 Patinando na Beira do Abismo Caos e complexidade so fenmenos interconectos porem distintos. Existe um certo deb ate em relao ao significado tcnico e campo de influencia dos dois fenmenos. Alguns a rgumentam que Caos uma teoria geral que engloba o estudo de sistemas complexos. Outros argumentam exatamente o oposto, ou seja, que Teoria do Caos uma aplicao esp ecifica de uma teoria maior que estuda os sistemas dinmicos, a Cincia da Complexid ade. Outros no vem nenhuma diferena entre os dois. A definio mais aceita a de que os dois fenmenos so complementares uma vez que o estudo da complexidade o oposto do e studo do caos. o estudo de como um sistema de equaes muito complicadas podem gerar padres de comportamento bastante simples para certos valores dos parmetros. Como vimos, a Teoria do Caos estuda como equaes no-lineares simples geram comportamento complexo. Portanto, Caos no Complexidade. Fenmenos complexos ocorrem precisamente no ponto crtico onde a transio para o caos acontece (quando o a da Equao Logstica igual a 3,7 por exemplo). Um sistema em estado complexo esta no limiar do Caos (The Edge of Chaos) , na borda entre um comportamento peridico previsvel e o comportamento catico.

54 A Cincia da complexidade busca encontrar o que h de comum entre questes dos mais diversos tipos. Mitchell Waldrop, comea o seu livro Complexidade : A Cincia Emerg ente no Limiar da Ordem e do Caos2, com as seguintes perguntas : [] Porque a Bolsa de Valores americana caiu mais de 500 pontos em um nico dia, a famosa segunda-fe ira negra de Outubro de 1987? Como a sopa primordial de amino-acidos e outras si mples molculas se transformaram na primeira clula viva a aproximadamente quatro bi lhes de anos atras? Porque clulas individuais comearam, a aproximadamente 600 milhes de anos atras, a formar alianas que dariam origem a organismos multicelulares ta is como algas marinhas, insetos e eventualmente seres humanos? Ser que a incrvel e precisa organizao encontrada nas criaturas vivas somente resultado de meros acide ntes evolutivos? Ou ser que havia algo mais acontecendo nestes ltimos quatro bilhes de anos, algo que Darwin no sabia? A final de contas, o que a vida, e o que a me nte? [] A resposta para estas perguntas : ningum sabe. O que sabemos que todos os exemp los acima citados so casos de sistemas complexos onde grande nmero de agentes inde pendentes interage ativamente. [] Pense nas inmeras reaes qumicas entre as protenas, l ipdios e cidos nucleicos que formam uma clula viva, ou nos bilhes de neurnios interco nectos que formam um crebro ou 2 Waldrop, Mitchell [1992] Complexity : the emerging science at the edge of order a nd chaos New York, New York : Published by Simon & Schuster.

55 nos bilhes de indivduos mutuamente interdependentes que formam a sociedade huma na. []

56 Entropia A Segunda Lei da Termodinmica postula que em sistemas fechados para a troca de ma tria e energia com o meio ambiente, uma medida de desordem chamada entropia tende a aumentar. O conceito de entropia foi definido em 1865 por Rudolf Julius Claus ius. Em grego, entropia simplesmente significa evoluo. De acordo com a Segunda Lei da Termodinmica, processos irreversveis no tempo produzem entropia ou seja, a prpr ia passagem do tempo aumenta a entropia. Por exemplo, uma gota de tinta azul esc uro pingada em um copo com gua tende a se dispersar at que toda a gua do copo fique azul claro. Seria praticamente impossvel retroceder temporalmente o processo e o bter a gota de tinta azul escuro de volta pois o processo de mistura da tinta na gua irreversvel. Por outro lado, em processos reversveis como os vislumbrados por Laplace, a entropia se mantm constante. De acordo com Clausius, a energia do Unive rso constante, se considerarmos o Universo um sistema isolado. A entropia do Uni verso crescente. Este aumento da entropia devido aos processos irreversveis que fo rmam o Universo. Um corolrio da Segunda Lei que a desorganizao estaria aumentando n o Univero. Como poderamos explicar ento a magnifica organizao de nossa biosfera e de nossos sistemas sociais? Na opinio de Ilya Prigogine, prmio Nobel de Qumica e um d os fundadores da Teoria da Complexidade, a viso de mundo descrita pelo Determinis mo Newtoniano, onde a seta do tempo poderia ser revertida, muito idealizada, lon ge do mundo instvel e evolutivo em que vivemos. Para ele, a passagem do

57 tempo no produz um aumento da desordem e sim da ordem, como mostram recentes d escobertas feitas no mbito de sistemas qumicos e fsicos em situaes distantes do equilb rio. As implicaes de tais descobertas so profundas. Como explica Prigogine3 : O imp ortante papel atribudo ao conceito de irreversibilidade ainda mais marcante em si tuaes distantes do equilbrio onde o no-equilbrio leva a novas formas de coerncia. Nos aprendemos que justamente atravs de processos irreversveis associados a passagem d o tempo que a Natureza atinge suas formas mais delicadas e estruturas mais compl exas. A vida s possvel em um Universo fora do equilbrio. O no-equilbrio leva a concei tos tal como Organizao Espontnea e Estruturas Dissipativas4. Para que a Segunda Lei da Termodinmica pudesse ser aplicada, o sistema em questo deveria ser fechado para a troca de energia, informao ou materiais com o meio. A resposta que a nvel local ou micro, por exemplo na relao entre compradores e vendedores de um determinado me rcado, Sistemas Complexos se auto-organizam para poderem evoluir trocando inform ao com o meio ambiente. Neste caso eles seriam considerados sistemas abertos. Pore m, a nvel global, ou macro, ou seja, quando se considera o conjunto de todos os m ercados de bens ou ativos, o conjunto de todos compradores e vendedores que atua m nestes mercados, e os demais fatores que influenciam na mudana dos preos e reaes d os agentes, tem-se um sistema fechado. A Segunda Lei foi postulada para sistemas qumicos e fsicos e seria um pouco de cientificismo tentarmos aplica-la as cincias sociais. Alm disso, sistemas abertos so mais apropriados para o 3 4 Prigogine, Ilya (1996) The end of certainty : time, chaos, and the new laws of na ture New York, NY The Free Press. Prigogine definiu sistemas que exportam continu amente entropia de forma a manter sua organizao como Estruturas Dissipativas.

58 estudo da complexidade. Como vimos, sistemas abertos trocam informao e energia com o meio para melhor poder se adaptar a novas circunstancias. As foras primaria s que motivam o sistema advm do meio-ambiente, ou seja, o ambiente o que determin a a estrutura interna e organizacional, alm de ditar as mudanas. Contudo, em siste mas complexos a dinmica interna do sistema tambm tem grande importncia na elaborao da estrutura, mudana e adaptabilidade do sistema. Sistemas complexos so mais resiste ntes a perturbaes causadas pelo meio. Eles conseguem reter sua estrutura devido a sua capacidade de mapear as informaes do meio de reagir de acordo com o que aprend eram no passado. Devido a sua capacidade de mapear a informao do meio para referen cia futura, relaes persistentes podem evoluir ou se autoorganizar. Organizao Espontnea O funcionamento de um sistema complexo depende da natureza e arranjo entre as pa rtes e pode mudar caso novas partes sejam adicionadas, eliminadas ou rearranjada s. Tais sistemas possuem propriedades que so emergentes pois no so encontradas intr insecamente em nenhuma de suas partes individuais e existem somente a nveis mais altos de observao. Qualquer comportamento atribudo ao sistema como um todo e que no pode ser encontrado nas suas partes individuais um exemplo de uma propriedade em ergente. Por exemplo, um carro uma propriedade emergente de suas partes intercon ectas. Para o bilogo Stuart Kauffman, um dos criadores da Cincia da Complexidade, a vida um fenmeno

59 que emerge devido `a juno de rgos individuais. Esta propriedade desaparece se as partes individuais forem separadas. Neste caso, o todo maior que a soma das part es. O estudo de sistemas dinmicos complexos no pode ser feito de forma reducionist a pois ao se separar as partes, o sistema perde suas caractersticas, que s podem s er observadas de forma holistica. Interao Local , Emergncia Global Da interao entre as partes individuais a nvel local emerge algum tipo de propriedad e global, que no poderia ser prevista com o que se sabe sobre as partes individua is. Esta propriedade global (output), por sua vez, volta a ser um dos inputs do sistema, em forma de feed-back. Assim, as partes individuais afetam o comportame nto do sistema como um todo, mas tambm so afetadas por ele. O efeito feed-back ento responsvel pela adaptabilidade do sistema ao meio.

60 Um tipo de propriedade que emerge em sistemas complexos a Organizao Espontnea ou Auto-organizao. Exemplos clssicos de auto-organizao so : A Economia Capitalista co midores individuais tentando satisfazer suas necessidades materiais atravs de ato s de compra e venda se organizam sob a forma de um mercado, sem que haja a inter veno de um planejador central como se guiados por uma mo invisvel, como j dizia o econ mista escocs Adam Smith, que veremos em detalhe mais para frente. Uma passarada p assaros individuais, quando migrando de um lugar para o outro, se organizam inco nscientemente em forma de flecha para aproveitar a aerodinmica de seus vizinhos A diferenciao das clulas os genes de um embrio em desenvolvimento se organizam de um jeito para formarem uma clula de corao e de outro para formarem uma clula de crebro. Em todos os casos o que vemos so agentes individuais se organizando sem qualquer interferncia de um planejador central e adquirindo propriedades coletivas tais como vida, conscincia ou propsito, propriedades estas que nunca seriam possudas pelas p artes individuais. Sistemas complexos desenvolvem uma ordem global apesar de a nv el local as interaes entre os agentes parecerem ser livres e incertas. esta liberd ade entre as conexes do sistema que permite que este se adapte as novas circunsta ncias do meio. Apesar de livres e descentralizadas, todas as partes do sistema e sto indiretamente conectadas. Cada um dos agentes possui conhecimento de uma part e do sistema, mas nenhum dos agentes individuais possui conhecimento do sistema como um todo.

61 De onde surge ento esta ordem global? A explicao tradicional para esta ordem a t eoria darwiniana de seleo natural. Um processo gradual que na base da tentativa e erro faz com que os mais bem adaptados ganhem os recursos necessrios para a sobre vivncia e reproduo. Ter um bico maior, em certas circunstncias, pode aumentar as cha nces de uma certa espcie vis--vis a outras. Alem disso, dentro da mesma espcie, uns pssaros podem ter bicos maiores do que outros. Os pssaros com bicos maiores iro pa ssar para seus herdeiros estas caractersticas. Em algumas geraes, os pssaros de bico maior dominaro a populao de pssaros por serem melhor adaptados ao meio do que os pss aros com bicos menores, desta forma a evoluo acontece. O grande sucesso da teoria de Darwin pode ser atribudo ao fato de que sua teoria permitia aos cientistas exp licar estruturas sem a interveno de uma causa supernatural. Estruturas seriam resu ltado de uma srie de mutaes aleatrias das quais as mais efetivas sobrevivem. Desta f orma, a seleo natural poderia ser entendida como uma peneira que separa a ordem da desordem. Uma espcie que desenvolve os mais eficientes atributos vence a competio, a umentando assim as chances de sua estrutura sobreviver. O que vemos um processo de feed-back onde algumas variaes tendem a se reinforar e outras a se reduzir. Ambo s os tipos de feedback, tanto o negativo quanto o positivo, alimentam a seleo natu ral. Contudo, para Kauffman, o processo de seleo natural tem um papel secundrio na formao de ordem em sistemas dinmicos complexos. Para ele a ordem emerge da fsica da in terao. Sem que haja maiores esforos ou qualquer fora puxando o processo evolutivo la deira acima, a ordem emerge de graa. O termo

62 por ele cunhado em ingls Order for Free, ou seja, a ordem simplesmente acontece. Em sua opinio, as chances de somente o processo de seleo natural atravs de mutaes ale atrias ter gerado a ordem observada no mundo remota. O Darwinismo sugere, por exe mplo, que os 100,000 genes humanos evoluram atravs de mutao cega at formarem os 250 ti os de clulas que compem o corpo humano. Porem, 100,000 genes podem apresentar 1030 .000 combinaes de possveis estados ativos5. Isto excede o nmero de molculas de hidrogn io no Universo ! Kauffman argumenta que seria ingenuidade acreditar que somente o processo de seleo natural poderia ter guiado a evoluo dos 1030.000 possveis estados do sistema para eventualmente chegar aos 250 desejados. Atravs do uso de simulaes por computador, Kauffman demonstrou que existe ordem de graa, uma cristalizao espontne a de ordem nos sistemas dinmicos complexos, sem a interferncia do processo de seleo natural ou qualquer outra fora externa. A auto-organizao seria uma propriedade emer gente dos sistemas dinmicos complexos. Auto-organizao, ou Organizao Espontnea seria en to o processo onde a organizao de um sistema aumenta espontaneamente sem que este a umento seja controlado por qualquer fora externa ao prprio sistema. Imagine que ge nes fossem arrumados como em uma rede, cada um com a possibilidade de estar liga do ou desligado dependendo do input vindo dos outros genes. Agora, imagine que o s genes fossem interligados de forma aleatria. Seria difcil imaginar que qualquer tipo de ordem emergiria deste tipo de sistema. Mas foi isso que Kauffman demonst rou. Processos deste tipo so conhecidos como 5 Os anos 60 foram de especial importncia para o estudo da biologia molecular. Dois pesquisadores franceses, Francois Jacob e Jacques Monod fizeram uma descoberta revolucionaria que os deu o Prmio Nobel. Eles descobriram o mecanismo que regula a atividade dos genes. Uma espcie de mecanismo binrio onde os genes podem estar li gados ou desligados.

63 Redes Booleanas. Roger Lewin, em seu livro Complexity : Life at the Edge of Ch aos explica : [] A rede vai de um estado para outro. Em um determinado instante, c ada elemento examina os sinais que chegam atravs de suas ligaes com outros elementos da rede. El es ficam ativos ou inativos de acordo com suas regras de reao aos sinais. A rede e nto procede para o prximo estado, e assim sucessivamente. Em certas circunstancias , a rede pode apresentar todos os estados possveis sem que nenhum estado se repit a. Na prtica, contudo, a rede encontra uma srie de estados que se repetem ciclicam ente. Conhecidos como ciclo limites, esta srie de estados de fato um atrator no s istema. A rede pode ser entendida como um sistema dinmico complexo com possivelme nte vrios atratores. Fazendo simulaes em seu computador, Kauffman demonstrou que uma rede interativa co m 100.000 unidades se ligando ou desligando como em uma cadeia de genes ir gravit ar em torno de um pequeno nmero de estados estveis. Ele estava convicto que suas s imulaes com as redes Booleanas eram uma boa analogia para a formao de clulas no embrio . Foi ento que Kauffman comeou a trabalhar com redes com duas conexes, ou seja apen as duas conexes em cada ndo. Para sua surpresa, o nmero de estados estveis era aprox imadamente a raiz quadrada do nmero de elementos do sistema, uma regra conhecida como Lei de Potncia. Uma rede com 100 elementos, tinha 8 estados estveis, ou atrat ores, uma com 1000 tinha 33 e uma com 100.000 (aproximadamente o nmero de genes n o genoma humano) tinha 370. O interessante era que os 370 estados estveis eram um nmero muito prximo dos 254 tipos de clula no organismo humano. Tanto suas redes Bo oleanas quanto os genomas possuem a mesma Lei de Potncia. Sistemas que se sujeita m a uma Lei de Potncia exibem a mesma estrutura em diferentes escalas. Esta auto-

64 similaridade, tambm vista nas figuras fractais, tpica de sistemas que se autoor ganizam. Kauffman estava convencido de que uma propriedade bsica destes sistemas era que regras locais, como o nmero de inputs que cada gene recebe e as regras de r esposta para estes inputs, geram uma ordem global no sistema. Estas regras so as limitaes que governam o comportamento do sistema evitando que eles entrem em estad o catico durante o processo de adaptao a novas condies do meio. Uma propriedade emerg ente, uma ordem de graa. A nvel micro, a interao entre os agentes individuais ou os g enes pode parecer catica, mas a nvel macro, uma ordem se manifesta. Exemplo de uma Bacia de Atrao em uma Rede Booleana

65 Adaptabilidade Outra caracterstica importante deste tipo de sistemas a sua capacidade de se adap tar ao meio. Um rio turbulento um exemplo de um sistema complexo, porem no um exe mplo de um sistema complexo adaptativo. Sistemas complexos adaptativos (SCA) ten tam sempre tirar proveito das mudanas do meio. O crebro humano, por exemplo, esta sempre organizando e reorganizando suas bilhes de conexes neurais para melhor apre nder com a experincia passada. Como explicou Murray Gell-Mann, ganhador do Prmio N obel de Fsica pela descoberta dos Quarks, em uma palestra no Santa F Institute no Novo Mxico : Na evoluo biolgica, a experincia do passado esta codificada na mensagem gentica no DNA . No caso das sociedades humanas, a experincia esta nas instituies, costumes, tradies e mitos. Estes so de fato os DNAs culturais. Sistemas complexos adaptativos esto sempre em busca de padres. Eles interagem com o meio, aprendem com a experincia e se adaptam como resultado. Neste caso, a histria, ou o passado, interessam para que possamos entender o comp ortamento futuro de um sistema complexo adaptativo. Diferentemente de um sistema totalmente aleatrio, onde a histria do sistema pouco importa pois os eventos so in dependentes. Quando jogamos cara ou coroa, por exemplo, pouco importa se o resul tado anterior foi cara ou coroa para prevermos qual ser o prximo resultado. A prxim a jogada independe da anterior.

66 Assim como as espcies evoluem para melhor se adaptarem ao meio, as corporaes e a s industrias tambm. Elas podem ser entendidas com SCAs neste contexto. O mercado esta sempre mudando em funo da mudana de estilos de vida, moda, imigrao, desenvolvime nto tecnolgico, preo dos insumos bsicos ou novas regras impostas pelo Governo. SCAs tem um propsito superior, que em geral a sua prpria sobrevivncia. Mas o interessan te que o conjunto destas industrias, seus consumidores e o Governo apresentam um a propriedade emergente chamada Economia. A Economia, apesar da grande diversida de de decises e aes a nvel microeconmico, apresenta uma certa estabilidade estrutural a nvel macro. Durante anos ou ate mesmo dcadas, sistemas socioeconmicos se mantm fii s a um certo padro de estrutura macro-dinmica, mesmo que haja variaes conjunturais n a atividade econmica. Esta estabilidade estrutural que emerge da interao das varivei s econmicas a nvel microeconmico o que possibilita a modelagem e a analise macroeco nmica. A grande dificuldade de se prever ou modelar a Economia advm do fato de que sistemas dinmicos complexos possuem nveis crticos, ou seja, sempre existe a possib ilidade da quebra desta estabilidade estrutural. Sistemas Auto-Catalisadores Stuart Kauffman descreveu a dinmica de sistemas com propriedades emergentes. Seu objetivo era explicar como a vida surgiu da sopa pr-bitica de elementos qumicos que um dia existiu neste planeta. A sua teoria, na verdade, pode ser utilizada para explicar a emergncia de muitos fenmenos, incluindo

67 fenmenos sociais. Ele chamou esta dinmica de interao auto-catalizadora. Um catali sador algo que acelera um processo que poderia ter ocorrido, mas que demoraria m uito mais tempo para acontecer ou que no aconteceria sem ele. Em outras palavras, um catalisador faz com que as coisas aconteam mais rpido. Autocatalise um process o no qual o evento A catalisa o evento B, o evento B catalisa o evento C, o even to C catalisa o evento D e o evento D (talvez numa combinao com o evento B e/ou C) catalisa o evento A. O evento A rapidamente catalisou o desenvolvimento do even to D, que por sua vez catalisou o desenvolvimento do evento A. Aqui os catalisad ores so os prprios beneficirios do processo ao invs de serem apenas intermedirios. En quanto isso, o evento C pode estar catalisando o evento F, que esta catalisando o evento G. F e G podem catalisar mais do evento C e assim por diante. fcil notar como tal processo pode se desenvolver como um incndio em floresta de eucaliptos criando novos catalisadores e formando uma rede de conexes que se autoreinfora e c atalisa seu prprio crescimento. Mais uma vez, ordem aparecendo espontaneamente do caos molecular e se manifestando como um sistema que cresce e se desenvolve na medida em que a rede de interligaes vai aumentando e ficando cada vez mais complex a. No limite, tal processo pode ter sido o processo de formao do primeiro DNA e re sponsvel pela criao de vida na Terra, caso a sopa primordial fosse rica o suficiente. A vida teria se cristalizado (emergido) espontaneamente. Desta forma, alega ele, a vida no teria como no ter acontecido. Alem disso, no haveria a necessidade de se acreditar que a vida fruto de uma mera coincidncia de fatores.

68 Exemplo de Sistema Auto-Catalizador com 4 eventos Kauffman faz uma analogia muito interessante entre sistemas auto-catalisadores e sistemas econmicos. Um sistema auto-catalisador uma rede que transforma molculas da mesma forma que uma economia uma rede que transforma bens e servios. O sistema auto-catalisador extrai matria prima (a sopa primordial de molculas) e as transfo rma em algo til (mais molculas para o sistema). Alem disso, um sistema auto-catali sador pode alavancar sua prpria evoluo (da mesma forma que uma economia) ficando ma ior e mais complexo com o tempo. Se as inovaes so resultado de novas combinaes de ant igas tecnologias, ento o nmero de inovaes pode crescer muito rapidamente caso mais t ecnologias fiquem disponveis. De fato, a partir de um certo nvel de complexidade p ode se esperar uma espcie de transio de fase do mesmo tipo da que deu origem ao DNA . Abaixo de certo nvel de complexidade, pode-se esperar pases que dependem de um p equeno nmero de grandes industrias e suas economias so frgeis e estagnadas. Neste c aso, no importa o montante de investimentos que possa vir a ser feito que o pais em questo ira continuar frgil e estagnado. Se um pais s produz bananas, com mais in vestimento tudo o que ira

69 acontecer um aumento na produo de bananas. Mas se um pais conseguir diversifica r sua industria e aumentar sua complexidade acima de um certo nvel critico, ento p ode se esperar um explosivo aumento no crescimento e inovao. A existncia de uma tra nsio de fase tambm pode ajudar a explicar o porque a presena de comercio entre pases to importante para a prosperidade. Suponhamos que dois pases cujas economias no sej am muito desenvolvidas comecem a negociar livremente. Suas economias se conectaro para formar uma nica rede mais complexa de transaes e o nvel critico para o desenvo lvimento acelerado pode ser atingido. Alem disso, um sistema auto-catalisador po de presenciar o mesmo tipo de booms e crashes que uma economia. Injetando um nov o tipo de molcula na sopa primordial, o resultado poderia ter sido muito diferent e. Injetando um novo tipo de tecnologia em uma economia, como por exemplo a subs tituio do cavalo pelo carro, o resultado foi muito diferente, gerando um boom de p rosperidade.

70 Vida Artificial

Assim como o telescpio e o microscpio nos deram uma perspectiva diferente sobre no s mesmos, eventualmente, mundos artificiais dentro dos computadores faro o mesmo. Diferente das simulaes com equaes, a linguagem utilizada neste remo da computao a or entada para o objeto e com ela podemos ser capazes de observar a evoluo de sistema s artificiais qumicos, ecolgicos, sociais, econmicos, organismos e vida artificial. Quando pensamos em computadores normalmente pensamos em programas que foram lab oriosamente desenvolvidos para performar tarefas absolutamente previsveis. Este no foi o caso de Chris Langton, que por volta de 1978 tentava ser aceito para um c urso de Doutorado para trabalhar no tema de Autmatas Celulares. De dia Chris trab alhava como marceneiro e a noite programava seu computador Apple de 64 kilobites na tentativa de desenvolver um programa que exibisse um comportamento com propr iedades vitais, tais como reproduo, sexualidade e evoluo. Na verdade, Chris estava t entando capturar as bases para o entendimento dos processos evolutivos, da mesma forma que os estudiosos de Inteligncia Artificial estavam tentando capturar os c onceitos chave para o entendimento da Neuropsicologia. Ele no estava tentando for mular um modelo que replicasse a evoluo dos rpteis por exemplo e sim um modelo abst rato de evoluo no computador para poder fazer experimentos e testes. Evoluindo pop ulaes de programas de computador for milhes de geraes, Chris pode ver a diversidade d o fenmeno evolutivo. Pode observar espcies serem criadas e

71 extintas, mutaes e adaptaes em uma escala de tempo observvel em tempo humano. Em s ua opinio, podemos capturar qualquer fenmeno biolgico em computadores se dominarmos a tecnologia da vida. Por mais irnico que parea, a primeira conferencia sobre est e tema foi realizada em Los Alamos, onde a primeira bomba atmica, ou seja, tecnol ogia da morte foi desenvolvida. Mas o que um Autmata? A maior parte das pessoas r elaciona a palavra com algum tipo de brinquedo mecnico que emula um comportamento aparentemente humano. No contexto de Sistemas Complexos, um Autmata qualquer sis tema que possua um nmero de estados internos e que se mova entre estes estados se guindo regras definidas. Isto uma forma de mapeamento (input-output) similar a d e programas de computador. Um Autmata tambm um agente pois interage com o meio e n ormalmente pode alterar o seu prprio estado como resultado desta interao. Se reunir mos uma coleo destes Autmatas e deixlos interagir, temos um sistema de Autmatas. Chri s ficou bastante animado com o rumo de suas pesquisas ao descobrir que na dcada d e 40, o grande matemtico John Von Neumann havia se interessado pelo tema de autoreproduo em mquinas programveis. No tempo de Von Neumann, a grande questo era : ser qu e mquinas podem ser programadas para fazer cpias de si mesmas? Von Neumann no tinha a menor dvida de que a resposta era positiva. A final de contas, pensou ele, as p lantas e o animais estavam se reproduzindo a bilhes de anos e a nvel bioqumico eram como mquinas seguindo as mesmas lei naturais que as estrelas e planetas6. Para resp onder a grande pergunta, ele precisou reduzir o processo de reproduo a sua essncia, a sua forma lgica 6 Von Neumann, John [1966] Theory of Self-Reproducing Automata - Completed and edite d by Arthur Burks. ChampaignUrbana: University of Illinois Press.

72 abstrata. Comeou com o seguinte experimento : imagine uma mquina flutuando na s uperfcie de um lago junto com vrios outros pedaos de mquina. Imagine agora que esta mquina o construtor universal, ou seja, dada a ela a descrio que qualquer mquina, su a funo montar outras mquinas com os pedaos que esto flutuando no lago. Caso a ela fos se dada uma descrio de si prpria, ela montaria outra de si. Contudo, o problema da auto-reproduo ainda no estava resolvido pois as novas mquinas montadas, por no possure m uma descrio de si prprias, no poderiam montar uma outra gerao de mquinas. Portanto, on Neumann postulou que a Criadora Universal deveria fazer copias de sua descrio e colocalas nas novas mquinas de forma que estas pudessem se reproduzir indefinida mente. Alguns anos depois, quando Watson e Crick revelaram a estrutura molecular do DNA notou-se que a descrio de Von Neumann do Criador Universal possua as mesmas caractersticas do DNA. A capacidade de codificar as instrues para a montagem de ou tras clulas e a habilidade de transmitir as instrues para que estas outras clulas re produzissem mais de si prprias. Como um grande matemtico que era, Von Neumann no es tava satisfeito como a analogia da mquina no lago. Ele queria algo que fosse comp letamente abstrato e formal. A soluo veio de seu colega Stanislas Ulam, um matemtic o polons que estava trabalhando no Laboratrio de Los Alamos. Stanislas sugeriu o q ue eventualmente ficou conhecido pelo nome de Autmata Celular e que vinte anos ma is tarde se popularizou como Jogo da Vida. O Jogo da Vida viria a ser um caso pa rticular dos Autmatas Celulares de Stanislas. O Jogo da Vida, na verdade, no

73 era exatamente um jogo e sim um tipo de simulao de um mini universo que evolua n a tela do computador. No comeo do jogo, a tela do computador mostra um retrato de ste universo. Um quadrado dividido em quadrados menores. Cada clula do quadrado (o nosso universo) poderia estar preta, se estivesse viva ou branca, se estivesse m orta. A disposio inicial das clulas no universo poderia ser qualquer uma. Uma vez q ue o jogo comeasse, as clulas iriam morrer ou viver de acordo com regras simples. Cada clula, em cada gerao, iria olhar ao seu redor, ou melhor, para os seus oito vi zinhos imediatos. Se muitos destes vizinhos estivessem vivos, a clula morreria de superpopulao. Se muitos estivessem mortos, ela morreria de solido. Mas se o nmero d e clulas fosse o correto, ou seja, se duas ou trs clulas estivessem vivas, ento na p rxima gerao o quadrado central estaria vivo. Ele sobreviveria se j estivesse vivo ou nasceria caso contrrio. Com estas simples regras, a tela do computador parecia t omar vida prpria conforme as geraes iam passando. Vrios tipos de formaes surgiriam e d esapareciam, como micrbios em um microscpio. Chris Langton passava suas noites em um velho computador no laboratrio da universidade tentando desvendar os mistrios d a vida com simulaes deste tipo. Gerao 0 Gerao 22 Gerao 52 Gerao 139

74 Nas figuras acima, quanto mais claras as cores das clulas mais jovens elas so. As clulas ficam pretas aps 10 geraes e morrem. Von Neumann, por sua vez, antes de morrer, demostrou matematicamente (e sem a aj uda de computadores) que existia um determinado padro de Autmata Celular que poder ia se auto-reproduzir. Este padro era extremamente complicado para que Chris pude sse reproduzi-lo com preciso com seu Apple de 64 kilobites. Eram 29 diferentes es tados por clula. Mas somente o fato de tal padro existir animava Chris a continuar sua busca. Dois meses aps a leitura do artigo Teoria dos Autmata Auto-Reprodutveis , uma coletnea dos textos de Von Neumann editada em 1966, Chris depois de muita t entativa e erro, finalmente conseguiu o que queria. Conseguiu simular em seu com putador o primeiro Autmata Celular auto-reprodutvel. Em sua tela, as clulas formava m loops em torno de si prprias para formarem outras clulas idnticas ad infinitum. A gora que ele havia criado o primeiro Autmata Celular auto-reprodutvel, Chris queri a que os Autmatas performassem algum tipo de tarefa antes de se reproduzirem, do tipo acumular recursos. Alm disso, ele queria construir populaes inteiras de Autmata s e deixar que eles competissem por estes recursos. Ele teria de dar aos Autmatas a habilidade de se moverem e sentirem o meio. Teria de permitir a presena de mutaes e erros de reproduo. Chris queria simular a evoluo no mundo de Von Neumann. Em meado s da dcada de 80, o estudo do comportamento dos Autmata Celulares se transformou e m um tema quente entre estudantes de Fsica por

75 possuirem uma estrutura matemtica rica e grandes similaridades com Sistemas Di nmicos no-lineares. Stephen Wolfram, ento uma jovem estrela em ascenso no departamen to de Fsica de Caltec (uma prestigiosa universidade na Califrnia) definiu o compor tamento (regras) dos Autmata Celulares em quatro classes. Classe 1 Regras que faz iam o sistema morrer em uma ou duas geraes. Em termos de Sistemas Dinmicos, o siste ma convergiria para um atrator pontual. A tela do computador ficava de uma cor s. Classe 2 Estas regras davam aos Autmatas um pouco mais de vida, mas no muita. O s istema desenvolvia comportamentos peridicos que se repetiam continuamente. Era co mo se os Autmatas fossem atrados por um atrator peridico ou de ciclo limitado. Nas classes 1 e 2, era como se o sistema estivesse congelado ou cristalizado. Classe 3 O sistema ficava vivo demais. To vivo que ficava catico, aperidico e mudando con tinuamente de forma imprevisvel, como molculas de vapor em uma panela em ebulio. A t ela do computador ficava borbulhando. Era como se os Autmatas fossem atrados por um atrator estranho. Classe 4 Estas regras no produziam caos nem tampouco um comport amento esttico. Elas produziam estruturas coerentes que se propagavam, cresciam, se separavam, recombinavam de uma forma maravilhosamente complexa e computaciona lmente rica, como no Jogo da Vida e quando o a da Equao Logstica igual a 3,7. Uma boa analogia seriam molculas em estado liquido.

76 Chris gostou da forma como Wolfram definiu o problema e tentou entender as re laes entre as diferentes classes. Descobriu ento que elas se davam na seguinte orde m : 1e243 Do ponto de vista de Sistemas Dinmicos era como se o sistema apresentasse o seguinte padro de comportamento : Ordem Complexidade Caos onde Complexidade seria o surpreendente tipo de comportam ento encontrado nas regras da Classe 4. Este tipo de comportamento Chris chamou de Margem do Caos. As regras produziam um comportamento de sublime balano entre e stabilidade e instabilidade.

77 Margem do Caos

Os estudiosos de fenmenos complexos definem um sistema como um grupo de partes qu e interagem, funcionando como um todo e separadas de seu meio por fronteiras bem delineadas. Existem vrios tipos de sistemas no que diz respeito a interao entre su as partes: por um lado as interaes entre as partes podem ser fixas, como em uma tu rbina de avio, por exemplo, ou no extremo oposto, elas podem ser ilimitadas, como em um grupo de molculas de gs. Os sistemas que mais nos interessam so aqueles que esto no meio termo, com uma combinao entre interaes fixas e variveis, como uma clula o uma firma como veremos um pouco mais adiante. Na turbina de um avio, pequenas fl utuaes so rapidamente absorvidas. A cada vo, a presso do ar ou a temperatura ambiente podem ser diferentes mas estas diferenas no representam muito para a turbina como um todo pois o seu sistema estvel e mantm o seu propsito. As molculas de gs, por out ro lado, amplificam qualquer pequena diferena nas condies do ambiente. Elas se adap tam a pequenas variaes na temperatura alterando seu curso drasticamente. Portanto, a instabilidade das molculas de gs mostra que elas no possuem um propsito. Elas sim plesmente reagem a mudanas no meio ambiente de forma extremamente imprevisvel. Um sistema complexo adaptativo no pertence a nenhum destes extremos. No sistema estve l (a turbina) no ha espao para a chance (ainda bem!). O sistema se mantm estvel enqu anto as flutuaes do meio forem pequenas, mas colapsa se as flutuaes forem grandes. T odos podem imaginar o que acontece quando

78 um pssaro sugado por uma turbina. Sistemas randomicos (as molculas de gs) se ada ptam a mudanas mas so instveis. Os sistemas complexos (clulas ou firmas) que vemos a o nosso redor esto entre estes dois extremos. Eles so estveis e se adaptam at mesmo a grandes perturbaes aleatrias. Estes esto `a margem do caos : o ponto onde chance e necessidade coexistem. Para Stuart Kauffman, sistemas `a margem do caos so capaz es de sobreviver e se adaptar mais efetivamente em ambientes turbulentos por est arem em sua melhor forma. Para ele, a vida existe `a margem do caos, ou seja, um meio termo entre estabilidade e caos. O exemplo clssico de um sistema `a margem d o caos so os montinhos de areia que os fsicos tericos Per Bak, Chao Tang e Kurt Wie nsfeld desenvolveram. Atualmente, Per Bak considerado um dos pais da cincia da co mplexidade. O exemplo simples. Imagine uma mesa e um aparelho capaz de soltar um gro de areia por vez, no mesmo ponto, de cima para baixo a uma velocidade consta nte. Eventualmente, um montinho comear a crescer at o ponto onde avalanches de arei a mantero a inclinao do montinho aproximadamente constante. O ponto onde as avalanc hes comeam a acontecer o nvel crtico do sistema. A diferena entre este exemplo e o e xemplo do castelo de cartas que vimos anteriormente que no caso do castelo de ca rtas, ao se adicionar mais uma carta, o sistema todo pode ruir e voltar para o e stad