CAP 28 - OS FLUXOS MIGRATÓRIOS E A ESTRUTURA DA POPULAÇÃO II (1)

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OS FLUXOS MIGRATÓRIOS E A ESTRUTURA DA POPULAÇÃO II As atividades econômicas Tradicionalmente, é comum classificar as atividades secundárias (industriais e de construção civil) e terciárias (comércio, serviços e administração pública) como urbanas, e as atividades primárias (agrícolas, garimpo, pesca artesanal) como rurais. Hoje em dia, porém, graças à modernização dos sistemas de transportes e de comunicações, verificada em extensas áreas do planeta, ampliaram-se as possibilidades de industrialização e oferta de serviços no campo. Por exemplo, nas modernas agroindústrias, é maior o número de pessoas que trabalham operando e cuidando da manutenção de máquinas diversas, planejando estratégias de divulgação e vendas, organizando a administração e informatizando a empresa do que o número de pessoas que trabalham em atividades tipicamente primárias, como preparo do solo, cultivo e colheita. Em outras palavras, nas modernas agroindústrias, as atividades industriais e de serviços empregam mais pessoas do que as atividades agrícolas ou primárias. Também o setor industrial, ou secundário, passou por muitas transformações ao longo das últimas décadas. Até o fim dos anos 1970 e começo dos 1980, a maioria dos trabalhadores das indústrias trabalhava na linha de montagem, operando e cuidando da manutenção das máquinas, embalando produtos e realizando diversas outras atividades mecânicas e repetitivas. Atualmente, nas indústrias de ponta, a linha de montagem tem elevados índices de robotização e informatização da produção utilizando um número reduzido de trabalhadores. Já as atividades administrativas, jurídicas, de publicidade, vendas, alimentação, segurança, limpeza e várias outras empregam um número crescente de trabalhadores. Assim, a maioria dos empregados das indústrias de ponta está, na realidade, prestando serviços. Devido à crescente imbricação das atividades econômicas, as estatísticas que mostram a distribuição da população economicamente ativa nos três setores da economia (primário, secundário e terciário), ainda muito utilizados, já não dão conta da complexidade da realidade atual, fato materializado nos complexos agroindustriais e em muitos setores industriais. Considerando essas mudanças, muitos institutos de pesquisa que coletam dados em escala mundial agrupam as atividades econômicas em três ramos: agropecuária, indústria e serviços, como podemos observar na tabela a seguir: DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA (PEA) EM PAÍSES SELECIONADOS — 2002 País PEA total (em milhões de pessoas) Agropecuári a (%) Indústri a (%) Serviços (%) Reino Unido 30,3 1,3 24,2 74,3 Estados Unidos 147,9 2,5 21,1 76,4 Alemanha 41,0 2,6 32,0 65,4 Japão 66,9 4,7 29,7 65,7 África do Sul* 17,2 9,3 32,8 55,8 Brasil* 80,7 23,4 20,1 56,5 China* 763,2 47,5 21,7 34,9 Índia* 460,5 66,7 12,9 20,3 Nigéria* 51,6 36,6 7,5 55,8 Irã* 20,4 23,0 30,7 44,5 *Dados referentes a 2001

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OS FLUXOS MIGRATÓRIOS E A ESTRUTURA DA POPULAÇÃO II

As atividades econômicasTradicionalmente, é comum classificar as atividades secundárias (industriais e de construção civil) e terciárias (comércio,

serviços e administração pública) como urbanas, e as atividades primárias (agrícolas, garimpo, pesca artesanal) como rurais. Hoje em dia, porém, graças à modernização dos sistemas de transportes e de comunicações, verificada em extensas áreas do planeta, ampliaram-se as possibilidades de industrialização e oferta de serviços no campo. Por exemplo, nas modernas agroindústrias, é maior o número de pessoas que trabalham operando e cuidando da manutenção de máquinas diversas, planejando estratégias de divulgação e vendas, organizando a administração e informatizando a empresa do que o número de pessoas que trabalham em atividades tipicamente primárias, como preparo do solo, cultivo e colheita. Em outras palavras, nas modernas agroindústrias, as atividades industriais e de serviços empregam mais pessoas do que as atividades agrícolas ou primárias.

Também o setor industrial, ou secundário, passou por muitas transformações ao longo das últimas décadas. Até o fim dos anos 1970 e começo dos 1980, a maioria dos trabalhadores das indústrias trabalhava na linha de montagem, operando e cuidando da manutenção das máquinas, embalando produtos e realizando diversas outras atividades mecânicas e repetitivas. Atualmente, nas indústrias de ponta, a linha de montagem tem elevados índices de robotização e informatização da produção utilizando um número reduzido de trabalhadores.

Já as atividades administrativas, jurídicas, de publicidade, vendas, alimentação, segurança, limpeza e várias outras empregam um número crescente de trabalhadores. Assim, a maioria dos empregados das indústrias de ponta está, na realidade, prestando serviços.

Devido à crescente imbricação das atividades econômicas, as estatísticas que mostram a distribuição da população economicamente ativa nos três setores da economia (primário, secundário e terciário), ainda muito utilizados, já não dão conta da complexidade da realidade atual, fato materializado nos complexos agroindustriais e em muitos setores industriais. Considerando essas mudanças, muitos institutos de pesquisa que coletam dados em escala mundial agrupam as atividades econômicas em três ramos: agropecuária, indústria e serviços, como podemos observar na tabela a seguir:

A observação dos dados da tabela permite chegar a algumas conclusões sobre a economia dos países. Se o número de trabalhadores na agropecuária for elevado, correspondendo, por exemplo, a 25% da população economicamente ativa, isso indica que a produtividade do setor é baixa, já que um quarto dos trabalhadores abastece a si mesmo e os outros 75% estão alocados em outras atividades. A relação na população economicamente ativa é, nesse caso, de um trabalhador agrícola para três em outros setores.

Por outro lado, se o número de trabalhadores for baixo, por exemplo, 5%, a produtividade no setor é alta, já que eles abastecem a si mesmos e aos outros 95%; a relação é de um trabalhador agrícola para cada 19 em outros setores. Podemos afirmar que esse país apresenta uma atividade agropecuária com elevada utilização de adubos, fertilizantes, sistemas de irrigação e mecanização, o que amplia a produtividade e reduz o percentual da população economicamente ativa no setor. Nos países desenvolvidos, a agropecuária ocupa de 1% a 8% da mão-de-obra.

As condições econômicas refletidas na distribuição da mão-de-obra por atividade econômica, salvo em casos excepcionais, como em áreas desérticas ou montanhosas, devem ser analisadas sempre tendo como base a agropecuária. A participação da população economicamente ativa em atividades industriais não reflete a produtividade e o tipo de indústria recenseada. Por exemplo, com a simples informação de que 20% ou 30% da população trabalha em indústrias, não sabemos se esse percentual produz computadores ou goiabada, aviões ou chinelos. Mas se as atividades agrícolas apresentam alta produtividade, podemos concluir que a indústria do país, caso este seja industrializado, é predominantemente moderna, já que é ela que provavelmente fornece os adubos, os fertilizantes, os sistemas de irrigação, as máquinas e os tratores utilizados no campo.

A modernização da agropecuária é induzida por vários fatores: processo de industrialização urbanização, competitividade no setor de exportação, concorrência de produtos importados, necessidade de preservação das condições ecológicas e de utilização racional dos recursos naturais (desenvolvimento sustentável).

Distribuição da rendaCom a análise da distribuição da renda, continuamos o estudo da estrutura da população e suas possibilidades de aplicação

ao planejamento, tanto governamental quanto privado. Não basta consultar a pirâmide etária e saber quantas crianças atingirão

DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTEATIVA (PEA) EM PAÍSES SELECIONADOS — 2002

País PEA total (emmilhões de pessoas) Agropecuária (%) Indústria (%) Serviços (%)

Reino Unido 30,3 1,3 24,2 74,3Estados Unidos 147,9 2,5 21,1 76,4

Alemanha 41,0 2,6 32,0 65,4Japão 66,9 4,7 29,7 65,7

África do Sul* 17,2 9,3 32,8 55,8Brasil* 80,7 23,4 20,1 56,5China* 763,2 47,5 21,7 34,9Índia* 460,5 66,7 12,9 20,3

Nigéria* 51,6 36,6 7,5 55,8Irã* 20,4 23,0 30,7 44,5

*Dados referentes a 2001

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a idade escolar no próximo ano para programar o número de vagas nas escolas da rede pública. É necessário saber, também, como será a distribuição dessas crianças pelas redes pública e privada, o que envolve a análise não apenas da qualidade do ensino oferecido pelo Estado, mas também de quantas crianças têm condições econômicas de estudar. Por exemplo, no caso do Brasil, com a queda da taxa de natalidade está diminuindo o número de estudantes que ingressam no ensino fundamental, ao mesmo tempo que, por causa do aumento da escolaridade, estão aumentando significativamente as matrículas no ensino médio.

Assim sendo, se o planejamento governamental não considerar a distribuição da renda nacional, suas políticas de educação, saúde, habitação, transporte, abastecimento, lazer etc. estarão condenadas ao fracasso. Da parte da iniciativa privada, o planejamento de atendimento às demandas do mercado tem, necessariamente, de levar em conta não apenas o número, o sexo e a idade dos consumidores, mas principalmente seu poder aquisitivo.

A análise dos indicadores de distribuição mostra que nos países subdesenvolvidos e em alguns emergentes há grande concentração da renda nacional em mãos de pequena parcela da população, enquanto nos desenvolvidos a riqueza nacional está mais bem distribuída. O que ocasiona isso?

Além dos baixos salários que vigoram no mundo subdesenvolvido e da dificuldade de acesso a qualquer tipo de propriedade urbana ou rural, há basicamente dois fatores que explicam a concentração de renda: o sistema tributário e a inflação, esta nunca repassada integralmente aos salários. Se os preços das mercadorias subirem, sem que esse índice seja repassado aos salários, aumenta a taxa de lucro dos empresários e diminui o poder aquisitivo dos assalariados, com o conseqüente processo de concentração de renda.

O sistema tributário constitui o modo como são arrecadados os impostos - que podem ser diretos ou indiretos - em um país, além de ser um poderoso mecanismo de distribuição de renda, principalmente na forma de serviços públicos.

O imposto direto é aquele que recai diretamente sobre a renda ou sobre a propriedade dos cidadãos. É considerado o mais justo, pois pode ser cobrado de maneira progressiva, ou seja, quem ganha maiores salários ou possui mais propriedades paga parcelas maiores também, enquanto os que têm poucas posses pagam menos ou até ficam isentos. O governo, que arrecada de forma diferenciada parte da renda nacional, pode distribui-Ia na forma de escolas e hospitais eficientes, financiando a aquisição de casa própria, subsidiando setores econômicos que gerem empregos, investindo em saneamento básico etc.

Já os impostos indiretos estão incluídos no preço das mercadorias e dos serviços que a população utiliza em seu cotidiano. Podem ser considerados injustos quando assumem proporções elevadas, já que é cobrado sempre o mesmo valor do consumidor, não importando a sua faixa de renda. Por exemplo, um operário que ganha um salário mínimo e compra um litro de leite paga o mesmo valor de impostos indiretos que um advogado que compra o mesmo litro de leite e ganha 50 salários mínimos. A diferença é que, para o operário, esse valor corresponde a x% do seu salário e, para o advogado, a (x + 50)%. É, por isso, um imposto que pesa mais no bolso de quem ganha menos, pois não há possibilidade de aplicar a progressividade na arrecadação e, portanto, de distribuir a renda..

Em muitos países subdesenvolvidos, a carga de impostos indiretos é elevada, enquanto nos países desenvolvidos o maior volume de recursos arrecadados pelo governo recai sobre os impostos diretos. Outro fator preponderante é que, nos subdesenvolvidos, os serviços públicos são muito precários. Filhos de trabalhadores de baixa renda dificilmente têm acesso a sistemas eficientes de educação, constituindo, na maioria dos casos, mão-de-obra sem qualificação e, como conseqüência, mal-remunerada.

Atualmente, com a globalização da economia, a situação dos trabalhadores assalariados está se deteriorando ainda mais. Intensificam-se a abertura ou a transferência de filiais de empresas para países onde os salários são mais baixos e a legislação trabalhista é mais flexível em detrimento dos trabalhadores. Nesses países os assalariados têm uma participação menor na renda nacional auferida e podem ser despedidos sem encargos muito grandes para as empresas. A mais-valia é hoje extraída em escala mundial e não apenas local, o que vem diminuindo a oferta de postos de trabalho e, até mesmo, os salários pagos nos países desenvolvidos.

Acrescente-se a isso o desemprego estrutural, verificado em países cujas empresas investem em informatização e robótica, que tende a fragilizar a ação dos sindicatos e a diminuir a força dos empregados em processos de negociação salarial. Conclui-se dai a necessidade de se combater o desemprego mundial. O assunto tem dominado as últimas discussões em encontros do G-8, do Fórum Econômico Mundial (reunião de lideranças empresariais, políticas, sindicais e cientificas que ocorre anualmente na cidade de Davos, na Suíça) e de várias cúpulas patrocinadas pela ONU, que têm forte influência nas diretrizes econômicas, nos financiamentos gerenciados pelo FMI e pelo Banco Mundial e nas determinações da Organização Mundial de Comércio (OMC).