Capítulo 1 Introdução - estudogeral.sib.uc.pt Mestrado... · Os canais de sódio (Na+)...

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Capítulo 1 Introdução

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    Captulo 1 Introduo

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    1.1 O Sistema Nervoso Central

    O Sistema Nervoso divide-se em Sistema Nervoso Central, em ingls, Central

    Nervous System (CNS) e Sistema Nervoso Perifrico, em ingls, Peripheral Nervous

    System (PNS). Ao CNS chegam as informaes relacionadas com os sentidos (viso,

    audio, olfacto, paladar e tacto) e dele partem as ordens destinadas aos msculos e

    glndulas. Ele constitudo por encfalo (constitudo pelo crebro, cerebelo e tronco

    cerebral) e pela medula espinhal, que se situa dentro do canal raquidiano e a partir da

    qual se ramificam os nervos (figura 1).

    Figura 1- Sistema Nervoso Central [Fonte: www.images.com/image/281944/illustration-of-t...].

    http://www.images.com/image/281944/illustration-of-the-brain-spinal-cord-and-peripheral-nerves-anterior-view-shown-are-the-location-in-the-body-left-and-a-detail-of-the-brain-spinal-cord-and-upper-peripheral-nerves-right/?&results_per_page=1&detail=TRUE&page=57
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    No CNS existem a substncia cinzenta e a substncia branca. A substncia

    cinzenta corresponde s partes do CNS nas quais se concentram os corpos celulares e os

    dendritos das clulas nervosas, a substncia branca quase s constituda por axnios

    de clulas nervosas. O CNS tambm contm muitas outras clulas que pertencem ao

    tecido conjuntivo e em conjunto denominam-se glia ou neuroglia. H cinco tipos de

    clulas gliais: os astrcitos, os oligodendrcitos, as clulas de Schwann, clulas da

    microglia e clulas ependimrias. Estas clulas desempenham diversas funes, entre as

    quais, a formao da mielina (material lipoproteico que envolve as fibras e aumenta a

    velocidade de transmisso dos impulsos nervosos) e desempenham um papel importante

    nos processos imunitrios que tm lugar no CNS. Os nervos unem o encfalo e a

    medula espinhal (CNS) s regies perifricas. Os neurnios so clulas especializadas

    que intervm na obteno de sensaes, no processamento de informao, no processo

    cognitivo, bem como no controlo da actividade muscular e glandular. Cada neurnio

    (figura 2) formado por um corpo celular, ncleo celular, situado no interior do corpo

    celular e um ou vrios prolongamentos. Estes prolongamentos denominam-se dendritos,

    quando transmitem os impulsos para o corpo da clula ou axnios quando transmitem

    os impulsos para o exterior (Kahle et al, 1993; Garcia e Coelho, 2009).

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    Figura 2 - Neurnio. Impulso nervoso num nervo normal e num nervo lesado [Fonte:

    http://angola-africa.forum-ativo.com/o-nosso-corpo-f26/doencas-degenerativas-t107.htm].

    A comunicao entre os neurnios um processo rpido, graas ao revestimento

    dos neurnios com bainha de mielina e que requer energia. Existem nos axnios

    segmentos descontnuos de mielina, essenciais para a conduo rpida do impulso

    nervoso. Os canais de sdio (Na+) sensveis voltagem produzem impulsos nervosos e

    esto concentrados nos ndulos de Ranvier (pequenos segmentos de axnio

    desmielinizado que se encontram entre os interndulos de mielina individuais). O

    impulso nervoso propaga-se rapidamente de ndulo em ndulo, segundo um processo

    denominado conduo saltatria (Dutta et al, 2006). Quando h leso da mielina (figura

    http://angola-africa.forum-ativo.com/o-nosso-corpo-f26/doencas-degenerativas-t107.htm
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    2), ocorre uma lentificao na transmisso do impulso nervoso e a comunicao

    neuronal fica comprometida.

    1.2 A maquinaria mitocondrial como principal fonte de energia

    Os neurnios so altamente dependentes da energia do metabolismo oxidativo e

    os axnios em particular consomem quantidades significativas de adenosina trifosfato

    (ATP), o qual usado primeiramente para fornecer energia ao sdio/potssio ATPase

    (Na+/K

    +), para remover os ies de Na

    + que entram no axnio durante a passagem do

    impulso nervoso.

    Os nutrientes provenientes da dieta alimentar, nomeadamente os hidratos de

    carbono, so metabolizadas em piruvato, no citosol celular, que depois convertido, na

    matriz mitocondrial, em acetil-cenzima A, que processado por enzimas de fase aquosa

    no ciclo dos cidos tricarboxlicos (TCA) ou ciclo de Krebs. Este ciclo gera NADH e

    FADH2, intermedirios com elevado potencial redutor, que so dadores de electres

    para a Cadeia Respiratria Mitocondrial, em ingls, Mitochondrial Respiratory Chain

    (MRC), na membrana interna mitocondrial (Kid, 2005).

    As mitocndrias, para alm de serem consideradas uma espcie de centrais

    energticas das clulas, so tambm o local de um nmero importante de funes

    celulares, incluindo as vias essenciais do metabolismo intermedirio, biossntese de

    amino-cidos, metabolismo de esterides, controlo da concentrao do Ca2+

    e apoptose.

    Estes organelos possuem mltiplas cpias do seu prprio genoma e maquinaria de

    traduo, que funciona de forma semi-autnoma. O genoma mitocondrial humano

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    (mtDNA) consiste numa molcula circular de DNA em dupla hlice, com cerca de 16,6

    kb, que contm 37 genes codificantes para 13 polipeptdeos essenciais para o sistema da

    MRC, bem como 22 tRNAs e 2 rRNAs necessrios para a sntese proteica mitocondrial

    (Leonard et al, 2000). O nmero de mitocndrias por clula depende da necessidade

    energtica de cada tecido. A principal funo da mitocndria gerar energia,

    essencialmente na forma de ATP. A mitocndria gera mais de 90% das necessidades de

    ATP da clula (Kid, 2005) e contribui para a sinalizao e regulao intracelular,

    desempenhando tambm um papel central na manuteno da homeostase da composio

    inica da clula (Navarro et al, 2007).

    A mitocndria um organelo citoplasmtico delimitado por um sistema de dupla

    membrana: a membrana mitocondrial externa, em ingls, Mitochondrial Externe

    Membrane (MEM), que permevel a pequenas molculas e ies, as quais se movem

    atravs de canais transmembranares formados por uma famlia de protenas integradas

    na membrana, chamadas porinas. Estas protenas formam canais aninicos dependentes

    de voltagem, sensveis ao potencial da MEM, que permitem a troca de metabolitos entre

    a mitocndria e o citoplasma (Navarro et al, 2007). A membrana mitocondrial interna,

    em ingls, Mitochondrial Interne Membrane (MIM) apresenta invaginaes para o

    interior da matriz, formando cristas, onde se localizam os complexos multienzimticos

    I, II, III, IV e V, que, em conjunto com os transportadores intermedirios coenzima Q e

    citocromo c, formam o sistema da MRC, onde ocorre a fosforilao oxidativa,

    OXPHOS (Grazina, 2004). Neste processo (figura 3), os electres provenientes da

    oxidao dos substratos (aminocidos, carbohidratos e cidos gordos) so transferidos

    ao longo dos vrios componentes, ocorrendo o bombeamento de protes para o espao

    intermembranar, atravs dos complexos I (NADH desidrogenase, NQR), III (ubiquinol

    citocromo c reductase, QCR) e IV (citocromo c oxidase, COX), estabelecendo um

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    gradiente electroqumico que, ao ser dissipado atravs do complexo V (ATP sintetase),

    liberta energia usada para a sntese de ATP, a partir de adenosina difosfato (ADP) e

    fosfato inorgnico, catalisada por este complexo enzimtico.

    Figura 3- Representao esquemtica dos componentes da cadeia respiratria mitocondrial e da

    via da fosforilao oxidativa [adaptada de mips.gsf.de/proj/medgen/pictures/rescha_hm.gif].

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    Os diferentes substratos com potencial redutor cedem electres em locais

    diferentes da MRC. Por exemplo, o glutamato e o piruvato so metabolizados com

    produo de NADH, que oxidado ao nvel do complexo I, o succinato oxidado a

    fumarato ao nvel do complexo II (succinato desidrogenase), envolvendo o cofactor

    FADH2; a oxidao dos cidos gordos produz NADH, que oxidado no complexo I,

    mas tambm pode originar glicerol-3-fosfato (ou tambm pode ser proveniente da di-

    hidroxi-acetona-fosfato formada no processo da gliclise), cuja oxidao, pela glicerol-

    3-fosfato desidrogenase mitocondrial, produz FADH2, que cede os seus electres

    coenzima Q ou ubiquinona, transferindo electres ao complexo III. A ubiquinona um

    transportador intermedirio, que transfere os electres a partir dos complexos I e II para

    o complexo III. Este, por sua vez, reduz o citocromo c, o qual cede electres ao

    complexo IV, que catalisa a reduo de oxignio (O2), o aceitador final de electres da

    MRC, a gua (H2O) (Leonard et al, 2000). O complexo IV contm 2 tomos de Cu em

    adio aos tomos de Fe hmicos dos citocromos a e a3 (os tomos de cobre alternam

    entre os estados de oxidao Cu+ e Cu

    2+), o tomo de Fe do citocromo a3 est

    intimamente associado ao tomo de Cu(B), e o outro tomo de cobre Cu(A) est a uma

    curta distncia do heme do citocromo a. O citocromo c, uma protena que est inserida

    na superfcie exterior da membrana interna da mitocndria e transfere electres, um de

    cada vez, para o citocromo a e para o Cu(A). Na matriz mitocondrial, os electres so

    cedidos para o citocromo a3 e para o Cu(B). Estes shutles de electres permitem que 4

    electres e 4 protes sejam captados por molculas de O2 ligadas ao citocromo a3-Fe2+

    ,

    (Mckee T et al, 1999), formando-se ento 2 molculas de gua, segundo a equao 1.

    O2(g) + 4 H+ + 4e

    - 2H2O (aq) (1)

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    Estes complexos proteicos, excepto o CII, que codificado exclusivamente pelo

    DNA nuclear (nDNA), so constitudos por mltiplas subunidades codificadas por este

    genoma e pelo DNA mitocondrial, mtDNA (Taylor et al, 2005).

    Em resumo, a mitocndria utiliza oxignio para produzir ATP. Ao processo

    mitocondrial de transferncia de electres e sntese de ATP chamamos OXPHOS

    (Ghafourifar et al, 2008), que consiste numa via metablica, catalisada por protenas

    constitutivas da MIM que medeiam a transferncia de electres entre os complexos da

    MRC e na libertao vectorial de H+ para o espao intermembranar e reentrada de H

    +

    para a matriz atravs do F0 com sntese de ATP pela F1-ATP sintetase (Navarro et al,

    2007), conforme o esquema representativo da MRC apresentado na figura 3.

    1.2.1 Mitocndria: fonte e alvo de espcies reactivas

    A mitocndria desempenha diversas funes na clula, para alm da produo

    de ATP. de destacar o papel crucial que desempenha na regulao da apoptose,

    atravs de protenas pr- e anti-apoptticas, localizadas na membrana mitocondrial

    externa, bem como factores indutores da apoptose (AIFs), localizados na matriz

    mitocondrial, ou pela libertao de citocromo c da MRC/MIM. Desempenha ainda a

    funo de tampo celular de Ca2+

    e uma fonte importante de radicais livres (Turrens et

    al, 1985; Orth et al, 2001).

    Um radical livre qualquer espcie qumica que contenha um ou mais pares de

    electres desemparelhados, que alteram a reactividade qumica de um tomo ou

    molcula tornando-os mais reactivos do que o correspondente elemento ou composto e

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    conferem-lhe a capacidade de aceitar electres de outras molculas por um processo de

    oxidao-reduo. Os radicais livres celulares mais comuns so o radical hidroxilo

    (OH.), o radical superxido (O2

    -.) e o xido ntrico (NO

    .). Os radicais livres e outras

    molculas afins so muitas vezes classificados como espcies reactivas de oxignio

    (ROS) e so um sub-produto do metabolismo celular, que surge pelo facto de durante o

    processo de OXPHOS e em mitocndrias funcionais, 1 a 4% do O2 na mitocndria no

    ser completamente reduzido a H2O, surgindo assim as ROS em vrios locais da clula,

    mas so principalmente produzidos ao nvel da MRC (Grazina e Oliveira, 2001). Apesar

    da maior parte do oxignio ser reduzido a gua pelo complexo IV da MRC, uma fraco

    reduzida parcialmente a anio superxido ao nvel do complexo I ou da ubiquinona. A

    formao de O2-. aumenta com o incremento do fluxo de electres atravs da MRC,

    como por exemplo no consumo elevado de O2 ou pelo bloqueio do fluxo de electres

    quando h inibio do complexo I da MRC pela rotenona, ou do complexo III pela

    antimicina A.

    O NO., por si s, em concentraes fisiolgicas, no reactivo; contudo, pode

    ser facilmente convertido numa srie de molculas mais reactivas denominadas espcies

    reactivas de nitrognio (RNS) (Brown et al, 2002). Apesar de ser um radical livre e um

    poderoso oxidante apenas com 1 electro livre, desemparelhado, ele no reage

    prontamente com a maior parte das molculas orgnicas que, na sua maioria, possuem

    orbitais de valncia que esto totalmente preenchidas. Consequentemente, uma reaco

    que envolva NO., deixa a molcula orgnica com um electro desemparelhado,

    resultando da um radical orgnico intermedirio. Tais reaces tendem a possuir

    energia de activao elevada e so, geralmente, lentas. Contudo, o NO. pode reagir

    rpida e directamente atravs do electro desemparelhado, tanto com radicais orgnicos

    como com centros de oxignio, podendo da resultar uma variedade de intermedirios

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    extremamente reactivos. O NO. reage com o O2, uma vez que o oxignio molecular

    possui um tripleto no estado fundamental, contendo 2 electres desemparelhados com

    spins paralelos em orbitais separadas, uma de cada tomo de oxignio. As reaces

    prosseguem por passos de um electro, produzindo uma srie de espcies de oxignio

    parcialmente reduzidas, que so citotxicas. Estas espcies so o O2-., o HO

    . e o

    perxido de hidrognio (H2O2). O mecanismo geralmente aceite para a produo de

    radicais hidroxilo e peroxinitrito envolve a presena do O2-.segundo as reaces 2 a 5

    (Gilgun-Sherki et al, 2004; Rubbo et al, 2008).

    NO. + .O-O.

    .- ONOO

    - (2)

    ONOO-+ H

    + ONOOH

    (3)

    ONOOH .OH + NO2

    . (4)

    2H+ + O2

    . + O2

    . H2O2 + O2

    (5)

    O NO. reage rapidamente com metais de transio que tm estados de oxidao

    que diferem de um electro, como por exemplo, o io frrico (Fe3+

    ) e o io ferroso

    (Fe2+

    ). A maioria das aces fisiolgicas do NO. ocorre quando este se liga ao Fe

    2+ do

    grupo heme da guanilato ciclase causando activao da produo de guanosina

    monofosfato cclica, em ingls, cyclic guanosine monophosphate (cGMP) (Brown,

    2002).

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    A reaco do NO. com o anio superxido gera o anio peroxinitrito (ONOO

    -),

    um oxidante forte, capaz de danificar protenas, lpidos, membranas, DNA e organelos

    subcelulares (Cross et al, 1997).

    As mitocndrias so uma das principais fontes de ROS e RNS. Estima-se que 1 a

    4% do total do oxignio consumido na mitocndria convertido em ROS. O aumento

    de ROS pode modificar lpidos e protenas e causar alteraes significativas do

    potencial transmembranar mitocondrial, (Ghafourifar et al, 2008). As ROS tambm

    podem induzir um aumento da permeabilidade transitria mitocondrial, implicada no

    despoletar da morte celular por apoptose (Ghafourifar et al, 2008).

    Em condies normais, as clulas possuem vrios mecanismos de defesa contra

    os danos induzidos pelos radicais livres. Existem defesas antioxidantes capazes de

    degradar os radicais livres. O anio superoxido transformado, pela superoxido

    dismutase (SOD) em H2O2, que, por aco da catalase, convertido em gua. No

    entanto, o H2O2 em concentraes muito elevadas e na presena de Fe2+

    livre, pode

    levar formao de espcies ainda mais lesivas, tal como o radical HO., pela reaco de

    Fenton e de Haber-Weiss (Grazina e Oliveira, 2001; Ghafourifar et al, 2008). Quando

    existe produo excessiva de ROS e RNS ou o desequilbrio entre a sua produo

    celular e a capacidade das clulas para se defenderem destas espcies ocorre o processo

    denominado stresse oxidativo (Gilgun-Sherki et al, 2004; Mao et al, 2009), sendo este

    um dos mecanismos propostos para explicar a etiopatogenia de vrias doenas do CNS,

    incluindo a MS (Lutskii et al, 2007). O stresse oxidativo pode causar danos celulares e,

    subsequentemente, morte celular, uma vez que os ROS podem oxidar componentes

    celulares crticos, tais como lpidos, protenas e DNA, em especial o mtDNA, que tem

    sido implicado tanto no envelhecimento como no aparecimento de doenas

    neurodegenerativas (Jacobson et al, 2005; Grazina et al, 2006; Mao et al, 2009). Tal

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    como os aminocidos excitatrios e neurotransmissores, as ROS so particularmente

    activas no crebro e no tecido neuronal. Uma vez que a quantidade de ROS formada

    depende da quantidade de oxignio consumido, clulas como os neurnios, com

    actividade metablica mais elevada, ou segmentos neuronais enriquecidos em

    mitocndrias, tais como as sinapses, produzem nveis mais elevados de ROS.

    As RNS causam stresse nitrosilativo, que contribui para a destruio da mielina

    e das clulas da glia que participam na sua formao, os oligodendrcitos. Tem sido

    sugerida na literatura (Calabrese et al, 2002; Gilgun-Sherki et al, 2004; Ghafourifar et

    al, 2008) uma correlao directa entre o NO. e o bloqueio da conduo observado na

    MS, uma vez que os dadores de NO. causam uma obstruo reversvel na conduo,

    tanto em axnios normais como nos desmielinizados, quer no CNS, quer no PNS.

    Adicionalmente, a conduo em axnios desmielinizados e remielinizados

    particularmente sensvel ao bloqueio por NO., o que pode ser devido ao seu efeito

    directo sobre a neurotransmisso glutamatrgica. Foi demonstrado que o receptor N-

    metil-D-aspartato (NMDA) inactivado por nitrosilao e, para alm disso, observou-se

    que a formao de S-nitrosoglutationa (GSNO) pode causar diminuio dos nveis de

    glutatio reduzido (GSH) e, consequentemente, activar modificaes redox na

    sinalizao celular, bem como modificar enzimas intracelulares chave, tais como as que

    constituem os complexos da MRC (Shiva et al, 2001; Calabrese et al, 2002).

    Em condies patolgicas, as RNS so produzidos em grande quantidade,

    especialmente o NO., proveniente da microglia activada, por aco da sintetase do xido

    ntrico (NOS) induzida (iNOS) ou a partir das clulas endoteliais, por aco da NOS

    endgena (eNOS).

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    As principais fontes de espcies reactivas no processo inflamatrio so as

    mitocndrias danificadas e a microglia activada (Emerit et al, 2004).

    1.3 A Esclerose Mltipla

    Um crebro adulto contem de cerca de 1011

    - 1012

    neurnios, os quais so

    mantidos e protegidos por pelo menos o dobro de clulas da glia. Existem vrios tipos

    de clulas da glia, sendo os mais conhecidos, os oligodendrcitos, microglia e

    astrcitos. Durante muito tempo, foi considerado que as clulas da glia providenciavam

    apenas suporte estrutural para ajudar a proteger os neurnios, mais recentemente, foi

    sugerido que as clulas da glia, especialmente os astrcitos, exercem funes

    semelhantes s dos neurnios. Os oligodendrcitos tm como principal funo, elaborar

    uma bainha de constituio lipdica volta da maioria dos axnios que a atravessam, a

    bainha de mielina. A microglia o equivalente aos macrfagos-moncitos, no sistema

    nervoso. Os astrcitos participam na constituio da barreira hematoenceflica, em

    ingls, Blood-Brain Barrier (BBB), e encefaloliquididiana (Garcia e Coelho, 2009). O

    endotlio dos pequenos vasos sanguneos no crebro muito menos permevel a

    molculas do que outros endotlios vasculares, mas deixa passar pequenas molculas

    tais como a glucose e outras substncias lipossolveis, muitas outras so excludas do

    crebro pela BBB que tambm exclui os fagcitos, num crebro saudvel (Emerit et al,

    2004).

    A Esclerose Mltipla, em ingls, Multiple Sclerosis (MS) uma doena do CNS

    mediada pelo sistema imunitrio. At data, a sua causa ainda pouco clara mas

    acredita-se que resulta de uma resposta anormal do sistema imunitrio a um ou mais

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    antignio de mielina, que se desenvolvem em indivduos geneticamente susceptveis,

    depois de expostos a agentes causais no definidos. Caracteriza-se por uma acumulao

    de macrfagos (microglia e crebro) e linfcitos, no CNS (massa branca e massa

    cinzenta), conduzindo desmielinizao, destruio dos axnios (Mao et al, 2009) e

    formao de placas esclerticas (Kalman et al, 1999).

    As principais caractersticas neuropatolgicas so a perda de oligodendrcitos,

    desmielinizao, diminuio neuroaxonal associada inflamao e, possivelmente,

    disfuno mitocondrial (Andrews et al, 2005; Kumleh et al, 2006; Dutta et al, 2006;

    Kalman et al, 2007; McQualter et al, 2007; Ghafourifar et al, 2008). O curso da doena

    resulta no seu agravamento, podendo ocorrer perodos sem manifestaes clnicas

    (remisses), que alternam com surtos da doena (exarcerbaes) (Andrews et al, 2005).

    Com o decorrer do tempo, os doentes podem desenvolver leses crnicas que

    promovem a leso axonal irreversvel, daqui resultando que a fase denominada

    relapsing-remitting (RRMS) evolui para uma fase secundria progressiva (SPMS), fase

    esta que caracterizada por no haver recuperao ou recuperao mnima (Mao et al,

    2009).

    A MS caracteriza-se por ser uma doena heterognea, com uma hereditariedade

    moderada e uma componente ambiental significativa. A complexidade desta patologia

    resulta do facto de no ser possvel prever a expresso do fentipo a partir do

    conhecimento dos efeitos dos factores etiolgicos individuais considerados por si s,

    sendo necessrio um estudo multidisciplinar para esta doena (Oksenberg et al, 2008).

    A MS uma patologia relativamente comum, afectando mais de 2 milhes de

    pessoas em todo o mundo. O risco da doena est associado latitude, sendo menor em

    crianas e velhos e maior nas mulheres e na populao caucasiana. A incidncia da MS

  • 16

    parece ter aumentado consideravelmente no ltimo sculo, com maior expresso nas

    mulheres (Oksenberg et al, 2008). possvel que alguns dos mltiplos factores

    envolvidos sejam defeitos ao nvel do DNA, tanto no genoma nuclear como no

    mitocondrial, infeces virais, hipoxia e stresse oxidativo, baixa exposio luz solar

    ou nveis insuficientes de vitamina D, nveis aumentados de macrfagos e linfcitos no

    crebro (Mao et al, 2009). A figura 4 sumariza as possveis causas para a MS.

    A prevalncia da MS maior na Escandinvia, Islndia, Ilhas Britnicas e

    Amrica do Norte (1 - 2: 1.000) do que no Sul da Europa (figura 5).

    De acordo com alguns observadores, esta distribuio geogrfica implica um

    agente patognico ambiental que se encontra distribudo de forma ubqua. Apesar desta

    distribuio geogrfica da MS poder tambm ser explicada, pelo menos em parte, por

    variaes regionais de factores de risco gentico, curiosamente sabe-se que a exposio

    residencial ou ocupacional de doentes com MS luz solar pode estar associada com

    uma baixa taxa de mortalidade, com a vitamina D a mediar o processo de abrandar a

    progresso da doena. Uma vez que a radiao ultravioleta o principal catalizador da

    sntese endgena da vitamina D3 nos humanos e que os nveis de vitamina D3 so mais

    baixos comummente nas latitudes a Norte do que a Sul, isto poder explicar a razo pela

    qual os pases do sul da Europa, tm taxas mais baixas de MS nas suas populaes (Mao

    et al, 2009).

  • 17

    Foram realizados vrios estudos para encontrar loci de susceptibilidade gentica

    associados MS, que apontam para o cromossoma 6p21.3, em particular do gene que

    codifica o antignio leucocitrio humano (HLA), bem como para os cromossomas 5p14

    e 17q22 (Kalman et al, 1999).

    Figura 4 - Factores que podem contribuir para o desenvolvimento e progresso da MS

    [Adaptado de Mao et al, 2009].

    Esclerose

    Mltipla

    Factores genticos

    Infeco viral

    Exposio

    solar

    reduzida

    (Vit D)

    Hip

    oxia

    Stresse o

    xid

    ativo

    Acumulao Macrfagos

    Linfcitos

    no crebro

  • 18

    Figura 5 Distribuio geogrfica da Esclerose Mltipla no mundo [Fonte:

    http://sofija.wordpress.com/2007/01].

    A hiptese mais antiga para a etiologia da MS a de doena infecciosa causada

    por um micro-organismo. Contudo, aps dcadas de pesquisa, no se encontrou nenhum

    agente infeccioso especfico na MS. Mesmo assim, muitos neurologistas e

    investigadores so da opinio de que o vrus Epstein-Barr e o Coronavrus podem estar

    envolvidos na patogenia da MS atravs do seu neurotropismo e ataque ao sistema

    imunitrio (Mao et al, 2009).

    A investigao de aspectos neuropatolgicos avaliados por imagiologia destaca a

    contribuio da inflamao na neurodegenerescncia que ocorre na MS (Kalman et al,

    2007). As leses resultantes da inflamao sugeriram a existncia de uma resposta auto-

    http://sofija.wordpress.com/2007/01
  • 19

    imune contra os componentes da mielina do CNS. Acredita-se que h muitas clulas

    envolvidas no processo da doena, tais como as clulas T CD4+ reactivas mielina, as

    clulas T CD25+ regulatrias, as quais podem controlar as clulas CD4+ auto-reactivas,

    as clulas B reactivas mielina, as clulas killer CD8+, macrfagos e a microglia do

    crebro. Estas clulas infiltram-se em reas discretas de tecido no CNS, onde vo

    provocar danos nos neurnios (leses nos axnios) e nos oligodendrcitos, que se

    traduzem em alteraes relacionadas com a desmielinizao, resultando da a formao

    de placas esclerticas. A desmielinizao pode conduzir a leses mais profundas nos

    axnios e perda neuronal, sendo estas as principais caractersticas da doena e, ao

    mesmo tempo, os factores principais responsveis pela progresso da doena e

    incapacidade do indivduo (Ziemssen et al, 2005).

    O ambiente intracelular, especialmente o balano inico, so crticos para a

    manuteno das funes neuronais. O desequilbrio inico uma das hipteses para

    explicar o mecanismo chave da fisiopatologia da MS.

    Durante a progresso da doena, os mediadores inflamatrios, incluindo

    citocinas, oxidantes e NO., so libertados pela microglia ou so gerados por hipoxia,

    fenmeno que se segue leso dos tecidos e que se acredita resultar numa disfuno do

    metabolismo oxidativo nos axnios desmielinizados. Estes mediadores diminuem a

    concentrao de ATP e perturbam a funo mitocondrial, causando falha na Na+/K

    +-

    ATPase, a enzima que responsvel pela correco rpida dos nveis de Na+ e K

    + e pela

    extorso do Na+ a partir do axnio, o que previne o influxo patolgico deste io tanto

    nos axnios em repouso como em actividade. Por sua vez, a hipoxia considerada um

    factor de stresse fisiolgico, que induz uma resposta de dano na replicao do DNA.

    Tambm induz a inibio da actividade da Na+/K

    +-ATPase e, para alm disso, as ROS

    tambm aumentam a degradao desta enzima. Quando as altas concentraes intra-

  • 20

    axonais de Na+ resultantes desta falha, causam aumento da actividade da bomba

    Na+/Ca

    2+, com o efluxo de Na

    +, a requerer um nvel mais elevado de influxo de Ca

    2+,

    activam-se as proteases intra-axonais, resultando na fragmentao do neurofilamento e

    perturbao do transporte e integridade do axnio, conduzindo, por ltimo,

    degenerescncia neuronal. De facto, a perda de actividade da ATPase Na+/K

    +parece ser

    que mais contribui para o contnuo declnio neurolgico nos estadios crnicos da MS

    (Mao et al, 2009).

    Tendo em conta a limitao existente, relativa aos mecanismos etiopatognicos

    da MS, foram desenvolvidos modelos experimentais com animais, em particular de

    encefalomielite autoimune experimental (EAE), com o objectivo de clarificar as causas

    e consequncias desta doena, determinar mecanismos de perda de axnios na MS e

    avaliar a eficcia de terapias neuroprotectoras. Este modelo tem sido muito usado para

    avaliar a eficcia de tratamentos imunomodulatrios na MS, que envolve a formao de

    uma resposta auto-imune na periferia imunolgica, imunizando animais com protenas

    de mielina. Neste modelo simplificado, a EAE pode ser induzida por imunizao dos

    animais susceptveis com um nmero de antignios de mielina, incluindo protena de

    mielina bsica (BMP), protena proteolipdica (PLP) e glicoprotena da mielina do

    oligodendrodendrcito (MOG) (Mao et al, 2009). A doena tambm pode ser passada

    de um animal afectado para um saudvel, transferindo clulas T reactivas mielina, os

    animais desenvolvem ento um padro patolgico que bastante diferente do humano

    mas onde se podem encontrar algumas marcas comuns MS humana, nomeadamente,

    leses inflamatrias focais no sistema nervoso (Ziemssen et al, 2005). Existem algumas

    limitaes em usar a EAE como modelo para estudar a MS: primeiro porque a MS

    uma doena espontnea enquanto a EAE induzida, depois porque a MS tem uma

    grande heterogeneidade gentica na populao humana. Por isso, para entender a

  • 21

    progresso e a patologia da MS em ratos, seria necessrio estudar mltiplos modelos

    que melhor se assemelhassem s caractersticas humanas (Mao et al, 2009).

    1.4 Mecanismo molecular da inflamao

    A MS uma das doenas do CNS que possui maior componente de inflamao,

    desmielinizao, astrogliose e danos nos axnios (Rejdak et al, 2008). Nesta doena, o

    sistema imunitrio destri as bainhas de mielina das fibras das clulas nervosas do

    crebro e medula espinal (Adibhatla et al, 2008). A BBB responsvel pelo transporte

    selectivo de molculas e clulas, da circulao para o CNS. Durante o estado de doena,

    como por exemplo na MS, torna-se permevel e permite a infiltrao de molculas e

    muitas clulas perifricas no crebro. Algumas dessas clulas so as clulas T e B, que

    ficaram activas durante o processo inflamatrio e que passaram a BBB, indo alojar-se

    no local da leso. A, as clulas T so reactivadas pelos antignios da mielina, libertam

    citocinas e activam a microglia, que comea a destruir a bainha de mielina. A

    desmielinizao conduz disfuno, primeiro reversvel, depois irreversvel, dos

    axnios, cujas propriedades de conduo vo ficar deterioradas e contribuir para os

    sintomas clnicos associados a remisses (Ziemssen et al, 2005). As clulas T podem

    induzir a expresso de iNOS nas clulas da glia ao estabelecer contacto com elas (Saha

    et al, 2006). A penetrao da BBB envolve inicialmente a captura de leuccitos pelas

    clulas endoteliais atravs das selectinas. Os leuccitos aderem ao endotlio atravs de

    interaces ligando-receptor das molculas de adeso celular, e as quimiocinas

    produzidas localmente conduzem a migrao direccionada atravs do endotlio. O

    Antignio-1 Associado a Funo Leucocitria, do ingls, leucocyte function-associated

  • 22

    antigene-1 (LFA-1) e o Antignio-4 Muito Tardio, do ingls, very late antigen-4 (VLA-

    4) so membros das molculas de adeso do tipo integrinas, que esto envolvidas no

    trfego e extravaso dos leuccitos. O LFA-1 expresso exclusivamente nos leuccitos

    e interage com os seus ligandos, com as molculas de adeso-1/-2/-3, para promover

    uma variedade de eventos de adeso celular necessrios para o sistema imunitrio, quer

    em casos normais quer patolgicos. O VLA-4 expresso maioritariamente nos

    linfcitos, moncitos e eosinfilos e interage com o seu ligando, a molcula-1 vascular

    de adeso celular, durante a inflamao crnica (MCQualter et al, 2007). Est bem

    documentado que, na MS, as molculas de adeso, tais como as selectinas-E, e a

    molcula-1 de adeso celular, so expressas durante as leses activas do CNS, nas

    clulas endoteliais dos microvasos. Qualquer clula T activada, que expresse molculas

    de adeso, pode ligar-se s molculas de adeso correspondentes na superfcie do

    endotlio, iniciando assim, a travessia do primeiro componente da BBB. Segue-se a

    extravaso da camada endotelial e as clulas T activadas que se dirigem ao tecido

    perivascular devem passar atravs da membrana basal endotelial composta por

    colagnio tipo IV. As clulas T utilizam enzimas da matriz, conhecidas por

    metaloproteinases, e outras capazes de degradar a matriz, que fazem clipes selectivos

    nos componentes da matriz extracelular, para facilitar a transmigrao da lmina basal.

    O colagnio tipo IV marcado selectivamente pelas metaloproteinases 2 e 9 da matriz,

    as quais podem ser detectadas em doentes com MS. Uma vez passada a BBB, outras

    clulas inflamatrias, tais como as clulas T CD4+ e CD8+, macrfagos, granulcitos e

    clulas B, invadem rapidamente o CNS em resposta ao estmulo quimiotctico e

    disseminam-se na substncia branca (McQualter et al, 2007).

    A figura 6 resume o processo da imunopatogenese da MS. Em (A), mostra-se o

    conceito patognico da MS baseado na predisposio genmica, em que os doentes

  • 23

    herdam traos que conduzem a uma resposta imunitria alterada. Quando encontram um

    agente infeccioso, surge uma resposta imunitria das suas protenas no sistema linftico

    perifrico. Os antignios especficos das clulas T e B activados atravessam a BBB e

    atingem os prprios antignios expressos pelos oligodendrcitos e neurnios. Em

    concertao com a resposta imunitria inata no CNS, as clulas T e B causam danos

    inflamatrios. A susceptibilidade dos oligodendrcitos e neurnios aos danos

    inflamatrios e a capacidade de reparao e reorganizao do CNS, determinam a

    extenso e as consequncias funcionais dos danos inflamatrios. Em (B) apresenta-se o

    esquema da imunopatologia da leso na MS. Um certo nmero clulas de imunitrias e

    do CNS esto envolvidas no desenvolvimento das leses e na sua reparao. As clulas

    T e B e os macrfagos infiltram-se nas leses. As clulas T CD4+ encontram-se

    localizadas na bainha perivascular. Estas clulas tornam-se reactivadas pelos antignios

    presentes nas clulas dendrticas e nas clulas da microglia, libertando localmente

    citocinas e outros mediadores inflamatrios e, desse modo, atraindo os macrfagos para

    as leses. As clulas T CD8+ infiltram-se no parnquima e, para alm de libertarem

    outros mediadores inflamatrios, atacam directamente as clulas que expressam

    antignio leucocitrio humano classe I, tais como neurnios e oligodendrcitos. As

    clulas B encontram-se no espao perivascular e meninges, onde libertam anticorpos

    IgG. Estes anticorpos ligam protenas, que se expressam na superfcie de

    oligodendrcitos e neurnios. Os anticorpos ligados podem fixar o complemento

    iniciando assim a cascata do complemento ou induzindo macrfagos fagocitose

    mediada pelo anticorpo. Os macrfagos activados por sua vez, tambm libertam

    molculas txicas e inflamatrias (ex: NO.), as quais vo danificar predominantemente

    oligodendrcitos e neurnios. Os astrcitos reactivos vo induzir a gliose na fronteira da

  • 24

    leso, seguindo-se o dano inflamatrio, os oligodendrcitos proliferam e remielinizam

    os axnios danificados (Hemmer et al, 2006).

    Figura 6- Imunopatognese da MS [Fonte: Hemmer et al, 2006].

  • 25

    Foram feitos vrios estudos em humanos, tanto em colheitas ps-mortem como

    em bipsias de tecido cerebral, tendo-se verificado que ocorrem precocemente leses

    significativas nos axnios, denominadas leses desmielinizantes, e que h uma

    correlao directa entre o grau de leso axonal aguda e a magnitude da resposta

    inflamatria. Os dados da literatura permitiram sugerir que, na MS, as leses axonais

    agudas so secundrias ao surgimento de uma variedade de mediadores inflamatrios

    txicos incluindo o TNF, o Interfero e o NO., sendo este ltimo, um dos principais

    candidatos a mediador txico primrio dos danos agudos observados nos axnios. Na

    fase aguda da MS, o NO. encontra-se presente em nveis elevados, ao mesmo tempo que

    a actividade dos axnios decai na sua presena. Fizeram-se experincias que

    confirmaram esta vulnerabilidade, apoiando a hiptese de que os axnios apresentam as

    fases iniciais da degenerao, quando esto a conduzir impulsos nas frequncias

    fisiolgicas enquanto esto expostos ao NO., mesmo que seja a baixas concentraes

    (Smith et al, 2001).

    Os estudos por espectroscopia de ressonncia magntica (MRS) in vivo so

    consistentes com as marcas neuropatolgicas das leses que ocorrem precocemente nos

    axnios de doentes com MS. Esta tcnica permite medir um marcador especfico do

    neurnio, o N-acetilaspartato (NAA), o qual sintetizado na mitocndria e expresso

    pelos neurnios de um crebro adulto e um dos ndices mais especficos da densidade

    e da integridade dos axnios na substncia branca. A flutuao, ou a descida, do nvel

    de NAA, indica uma disfuno mitocondrial presente no incio da doena e indica a

    perda neuroaxonal em leses crnicas. O NAA est diminudo nas leses agudas da MS

    e parcialmente reversvel na recuperao. Esta reversibilidade correlaciona-se com a

    fase de remisso da MS enquanto a reduo permanente de NAA foi observada na fase

    de exacerbao (Andrews et al, 2005; Kalman et al, 2007).

  • 26

    1.5 Stresse oxidativo e desmielinizao

    Existem mltiplos factores que podem precipitar a ocorrncia de stresse

    oxidativo, envolvendo diferentes vias e conduzindo degenerescncia neuronal e

    (Gilgun-Sherki et al, 2004). O CNS contm grandes quantidades de lpidos,

    essencialmente nas membranas celulares, sendo, por isso, muito susceptvel

    peroxidao lipdica, em ingls, lipid peroxidation, (LPO). Este um dos processos

    reguladores mais importantes do metabolismo das principais biomolculas e est

    subjacente a fenmenos de plasticidade celular, podendo influenciar o suporte

    energtico das clulas e do corpo como um todo (Lutskii et al, 2007). Por exemplo, a

    cardiolipina um fosfolpido que se encontra exclusivamente na membrana

    mitocondrial e essencial para o bom funcionamento da MRC (Adibhatla et al, 2008).

    Se as membranas da clula sofrerem distrbios ao nvel funcional ou estrutural,

    em resultado da aco de elevadas concentraes de ROS e de produtos da peroxidao

    lipdica resultantes do stresse oxidativo, esto criadas as condies de base para o

    desenvolvimento de patologia. O stresse oxidativo encarado como um dos

    mecanismos subjacentes patogenia de vrias doenas do CNS, incluindo a MS

    (Lutskii et al, 2007;Ghafourifar et al, 2008).

    A desmielinizao deve-se, primariamente, ao facto da mielina ser uma

    membrana lipoproteica constituda por mais de 80% de fosfolpidos, glicolpidos e

    esterides, sendo por isso susceptvel LPO. Por outro lado, deve-se tambm s

    caractersticas do CNS, nomeadamente capacidade insuficiente dos sistemas de defesa

    antioxidante, perante condies de stresse oxidativo intenso.

    Durante a fase aguda da MS, os nveis de produtos resultantes do stresse

    oxidativo encontram-se aumentados e/ou os nveis de enzimas ou outras defesas

  • 27

    antioxidantes encontram-se diminudos, quer no sangue, quer no liquido

    encefalorraquidiano, em ingls, cerebrospinal fluid, (CSF) (Sayer et al, 2008). O stresse

    oxidativo na MS pode ser uma consequncia dos nveis elevados de ROS e RNS,

    resultantes da reaco inflamatria, que reflectem maioritariamente a falha do sistema

    energtico da microglia activada. Foi observado que, nos doentes com MS, as clulas

    mononucleares activadas produziam quantidades elevadas de ROS e RNS e foram

    descritos danos oxidativos no DNA, incluindo o mtDNA, em associao com a

    inflamao das placas crnicas activas (Sayer et al, 2008). Sabe-se que os macrfagos e

    a microglia expressam metaloproteinases e geram ROS na substncia branca. Estudos

    recentes que envolvem o cortex cerebral na MS, indicam que a produo microglial de

    ROS tambm est provavelmente envolvida na desmielinizao cortical (Mao et al,

    2009).

    1.6 Disfuno da mitocndria como causa da neurodegenerescncia na MS

    A investigao actual aponta para o envolvimento de anomalias especficas, ao

    nvel mitocondrial, no desenvolvimento e progresso da MS, nomeadamente: 1)

    defeitos ao nvel do mtDNA, 2) expresso anormal dos genes mitocondriais, 3)

    actividade enzimtica mitocondrial anormal, 4) actividade reparadora do DNA

    mitocondrial deficiente e 5) disfuno mitocondrial (figura 7).

  • 28

    Figura 7- Anomalias mitocondriais em doentes com MS. Modelo proposto por Mao et

    al, 2009, com base na investigao mais recente [Esquema adaptado de Mao et al, 2009].

    Neste modelo proposto por Mao et al, 2009, para alm da dinmica anormal da

    mitocndria (aumento da fisso e diminuio da fuso em neurnios afectados pela

    MS), os autores tambm propem que as anomalias mitocondriais e a falha energtica

    mitocondrial possa ter implicaes noutras vias celulares, incluindo o aumento da

    Mudanas

    estruturais da

    mitocndria

    Expresso gnica

    anormal

    Reparao deficiente

    do mtDNA

    Anomalias mitocondriais na MS

    Defeitos no

    mtDNA

    Aumento

    de ROS

    e danos oxidativos

    Actividade

    enzimtica

    mitocondrial

    anormal

  • 29

    desmielinizao e inflamao em neurnios e tecidos que se encontram afectados na

    MS.

    Desde que a sequncia total do mtDNA foi publicada, em 1981, tm surgido

    cada vez mais descobertas de mutaes do mtDNA associadas a doenas (Grazina,

    2004, Grazina et al, 2006). O mtDNA constitui a pequena parte extra nuclear do

    genoma humano. As mutaes deletrias, incluindo variaes de sequncia ou delees

    do mtDNA afectam frequentemente o funcionamento do CNS.

    Existem diversos estudos na literatura que apontam para o possvel

    envolvimento do mtDNA na MS, principalmente devido ao facto de se ter constatado

    com mais frequncia uma transmisso da doena de me para filho do que de pai para

    filho. Alm disso, foi observada uma associao da MS com uma doena mitocondrial

    Neuropatia ptica Hereditria de Leber (LHON). Estudos moleculares recentes, ao

    nvel do mtDNA, mostraram a presena de variaes de sequncia primrias de LHON

    (patognicas) nos nucletidos 3460 e 11778, em doentes com MS que apresentavam

    neurite ptica proeminente (PON). Foi tambm observada, na MS, uma frequncia

    superior de variaes de sequncia secundrias de LHON (polimorfismos no-

    patognicos per se), marcadores de haplogrupos nos nucletidos 13708G>A, 4216T>C

    e 4917A>G. Existem outros estudos que demonstraram a ausncia de alteraes do

    mtDNA em doentes com MS. Concluiu-se ser necessrio fazer um estudo em larga

    escala de doentes e controlos no sentido de apresentar concluses mais concretas e

    definitivas sobre o envolvimento das variaes de sequncia, polimorfismos e

    haplotipos do mtDNA na MS (Kalman et al, 1999).

    O mtDNA muito susceptvel aos radicais livres devido ausncia de histonas

    protectoras e baixa capacidade de reparao. Quando aumentam os danos oxidativos

  • 30

    no mtDNA, ocorrem variaes de sequncia que podem alterar, de forma severa, as

    funes mitocondriais, incluindo a OXPHOS, com diminuio da velocidade de

    transferncia de electres, actividades enzimticas e, por ltimo, dos nveis energticos

    na clula (Andrews et al, 2005; Ghafourifar et al, 2008).

    A hiptese de que a mitocndria deve desempenhar um papel importante na

    etiopatogenia da MS, foi apoiada pela observao de danos oxidativos no mtDNA, em

    placas esclerticas crnicas de doentes com esta patologia (Andrews et al, 2005).

    Em 2000, Lu et al propuseram que a mitocndria disfuncional pode conduzir ao

    processo inflamatrio na MS. Estes autores demonstram que a reduo na actividade do

    complexo I, observada nas placas esclerticas crnicas, estava associada leso

    oxidativa do mtDNA (11). O mecanismo subjacente a estes danos poder envolver uma

    deficincia energtica, provocada pela inibio da MRC por NO., em que este entraria

    em competio pelo local de ligao do O2 inibindo o complexo IV, ou, quando em

    maiores quantidades, poderia causar inibio dos complexos I e IV por aco do

    ONOO- (8). Como o complexo IV est envolvido no bombeamento de protes para o

    espao intermembranar, que essencial para a sntese de ATP, foi proposto (Andrews,

    2005) que ocorria uma falha ao nvel da Na+/K

    +- TPase dependente de energia, o que

    conduziria a um aumento secundrio de Na+ intra-axonal e, subsequentemente, a um

    aumento do Ca2+

    intra-axonal via trocador Na+/Ca

    2+ (figura 8).

    Foi proposto que o aumento da concentrao intracelular de ies Ca2+

    , resultante

    da reduo na concentrao de ATP, pode levar degenerescncia dos axnios por

    activao de vrias enzimas degradativas. Colocou-se, ento, a hiptese de que a morte

    neuronal possa surgir em resultado da exposio dos axnios a NO., em particular

    devido sobrecarga de ies Na+ resultante do impulso nervoso (Smith et al, 2001).

  • 31

    Figura 8- Fluxos inicos axonais durante a transmisso do impulso nervoso. Sequncia

    hipottica de eventos em situao: (a) normal; (b) de dfice energtico, com depleo de ATP

    [Adaptado de Andrews et al, 2005].

    A inibio da MRC por NO. pode ocorrer por duas vias distintas: (i) inibio por

    NO., rpida, selectiva, reversvel, do complexo IV; (ii) inibio por RNS lenta, no-

    selectiva, irreversvel, de diversos componentes mitocondriais. A via de inibio

    reversvel (i) da COX por NO. ocorre para nveis de concentrao na ordem dos

  • 32

    nanomolar, de tal modo que o NO., produzido localmente na mitocndria pela NOS,

    um potencial regulador da MRC. Pode ligar-se ao local de ligao do oxignio de dois

    modos diferentes, bloqueando a ligao do O2 em qualquer deles. Este local do

    complexo IV constitudo por dois metais, o ferro do grupo heme a3 e o cobre do centro

    CuB, em que o oxignio se liga entre eles e rapidamente reduzido. O NO. tanto pode

    ligar-se ao citocromo a3, originando citocromo a32+

    -NO, ou ao CuB2+

    surgindo CuB+-

    NO, em que o NO pode sofrer hidratao rapidamente para formar nitrito (NO2-

    ). Estas

    reaces de inibio podem ocorrer simultaneamente, pelo menos in vitro, mas a

    primeira favorecida para nveis elevados de citocromo reduzido e baixos nveis de

    oxignio, enquanto a segunda favorecida para as condies opostas (Brown et al,

    2002).

    Observou-se que o NO. produzido endogenamente pode causar a inibio da

    MRC em alguns tipos de clulas, geralmente por competio com o oxignio; de tal

    modo, que o NO. pode aumentar muito a Km aparente da respirao por oxignio.

    Concluiu-se que o NO. pode induzir a entrada das clulas em hipoxia, mesmo com

    nveis relativamente elevados de oxignio, e induzir leso tecidular. Quando a

    inflamao activada e a expresso de iNOS estimulada em diversos tipos de clulas,

    como macrfagos, microglia, astrcitos e clulas endoteliais, produz-se NO. suficiente

    para inibir, no apenas a sua prpria MRC mas tambm a das clulas circundantes, via

    inibio reversvel da COX.

    Observou-se que, em clulas de cultura expostas a NO., aps ter ocorrido

    inibio reversvel da COX, algumas horas aps a exposio, surgiu uma inibio

    irreversvel (ii) da MRC, em mltiplos locais, provavelmente devido converso do

    NO. em RNS. Um dos efeitos que surgia mais rapidamente era a inactivao do

    complexo I, possivelmente devido S-nitrosilao deste complexo, seguindo-se a

  • 33

    inibio da aconitase do TCA e do complexo II da MRC, provavelmente devido

    remoo de ferro dos centros de ferro-enxofre, sob condies nas quais pode ocorrer a

    formao de peroxinitrito. Este pode inibir os complexos I, II/III, IV (Mahad et al,

    2008) e V da MRC, a aconitase, a SOD mitocondrial, dependente de mangansio (Mn-

    SOD), a creatina cinase e provavelmente muitas outras protenas. O peroxinitrito um

    poderoso oxidante que tambm pode causar danos no DNA, induzir peroxidao

    lipdica e aumentar a permeabilidade da mitocndria aos protes (Brown et al, 2002).

    Para alm da inibio da respirao, o NO. tem outros efeitos na mitocndria,

    relevantes no desencadeamento de morte celular: 1) aumento da produo de ROS e

    RNS; 2) induo do poro de transio mitocondrial (MPT) pelas RNS (Brown et al,

    2002), estando o envolvimento de ambos proposto na etiopatogenia da MS.

    Os antioxidantes podem retardar ou anular os efeitos do stresse oxidativo e

    proteger as clulas e os tecidos contra o efeito deletrio das ROS e RNS. Contudo, nos

    doentes com MS podem desenvolver-se dfices ao nvel das defesas antioxidantes

    durante o decurso da doena, em resultado da inflamao crnica, acompanhada pelo

    aumento do stresse oxidativo. Estes eventos moleculares acompanham a alterao da

    funo mitocondrial, ocorrendo perturbaes ao nvel da homeostase do clcio, levando

    por sua vez reduo dos nveis de ATP (Smith et al, 2006; Ghafourifar et al, 2008),

    como j foi referido anteriormente. Estas alteraes bioqumicas esto associadas

    apoptose dos neurnios da retina, crebro e da medula espinal (Kalman et al, 2007).

    O desenvolvimento de estratgias que permitissem reverter o metabolismo

    anormal e restaurar o funcionamento normal e a sobrevivncia dos neurnios

    constituiriam a abordagem teraputica ideal na MS, sendo actualmente uma realidade

    distante.

  • 34

    Captulo 2 Materiais e mtodos

  • 35

    2.1 Materiais

    Todos os reagentes usados so do mais elevado grau de pureza comercialmente

    disponvel.

    2.2 Amostragem

    Os doentes descritos neste estudo foram seguidos na consulta especializada de

    Neurologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra. Todos eles tinham uma histria

    clnica de MS com mais de 5 anos de durao. Adicionalmente, foram recolhidas

    amostras de indivduos saudveis, sem qualquer doena neurodegenerativa conhecida,

    voluntrios, para servirem de controlo. Todos os indivduos mencionados neste estudo

    deram o seu consentimento informado para a realizao do estudo.

    Na avaliao da actividade enzimtica dos complexos da MRC entraram: i) 50

    indivduos controlo com uma mdia de idades de 31,7 anos (21 49) (mnimo

    mximo), sendo 18 indivduos do sexo masculino e 32 do sexo feminino (Grazina,

    2004); ii) 50 indivduos doentes MS com uma mdia de idades de 40,56 anos (22 61)

    (mnimo mximo), sendo 15 indivduos do sexo masculino e 35 do sexo feminino.

    Nos estudos genticos foi usada a seguinte amostragem: i) 216 indivduos

    controlo com uma mdia de idades de 51,7 anos (1 90) (mnimo mximo), sendo 82

    indivduos do sexo masculino e 134 do sexo feminino (Oliveira, 2007); ii) 87 indivduos

    doentes, com MS, com uma mdia de idades de 43,3 anos (22 63) (mnimo

    mximo), sendo 26 indivduos do sexo masculino e 61 do sexo feminino.

    Usou-se a Escala de Kurtzke ampliada, em ingls, Extended Disability Status Scale

    (EDSS), para avaliao da severidade na MS de todos os doentes que foi de, na altura da

    anlise, 3,7 2,3 (mdia desvio padro), numa gama de (1 8) (mnimo mximo),

  • 36

    sendo a mdia de durao da doena em anos 11,3 8,7 (mdia desvio padro) numa

    gama de (1 39) (mnimo mximo).

    2.3 Mtodos

    2.3.1 Isolamento de linfcitos

    Partindo de 10 ml de sangue venoso colhido para tubos com EDTAK3 a uma

    concentrao de 0,34 M, fez-se uma diluio de 1:1 em soluo salina de tampo fosfato

    PBS (phosphate-buffered saline: NaCl 120 mM, KCl 2,7 mM, SIGMA), a 10 mM e

    pH=7,4 a 25C. A soluo diluda foi cuidadosamente colocada sobre um volume de 10

    ml de Ficoll (Ficoll-Paque Plus; GE Healthcare Bio-Science AB Uppsala, Sweden),

    num tubo cnico de 50 ml (tipo Falcon). O tubo foi centrifugado a 800 g durante 20

    minutos a 20C (Centrifuga SIGMA 302 K, com rotor 11133). A camada superior do

    plasma e o anel de linfcitos foram retirados cuidadosamente e transferidos para um

    novo tubo de centrifugao, ao qual adicionmos 10 ml de PBS. Fez-se nova

    centrifugao a 800 g durante 10 minutos a 20 C para obter o sedimento celular. O

    sobrenadante foi removido e os linfcitos foram ressuspensos em 100 - 200 l de PBS,

    consoante o rendimento celular.

  • 37

    2.3.2 Medio da actividade enzimtica dos complexos da MRC

    Foi utilizada a tcnica de espectrofotometria de absoro molecular para medir a

    actividade enzimtica dos complexos da MRC. A espectroscopia no ultravioleta visvel

    (UV/VIS) envolve a espectroscopia de fotes (espectrofotometria). Esta tcnica utiliza

    luz na faixa do visvel, do ultravioleta (UV) prximo e do infravermelho prximo. Para

    se obter informao sobre a absoro de uma amostra, ela inserida no caminho ptico

    do aparelho, a a luz UV e/ou visvel num certo comprimento de onda (ou uma faixa de

    comprimentos de ondas) passada pela amostra. O espectrofotmetro mede a

    quantidade de que luz foi absorvida pela amostra.

    A absorvncia (A) a quantidade de luz absorvida por uma soluo. Atravs dela,

    chegamos ao valor da concentrao (c), atravs da Lei de Beer- Lambert (equao 6),

    onde I0 a radiao incidente no composto, It a radiao transmitida, o coeficiente

    de extino molar e l o percurso da radiao que atravessa a amostra (dada pela

    espessura do tubo de reaco em cm). Para a medir com preciso, necessrio eliminar

    a disperso da luz e na ausncia de turbidez, A igual densidade ptica (DO), assim

    sendo, convencionmos usar A em vez de DO.

    (6)

    A actividade enzimtica dos diferentes complexos da MRC medida atravs da

    absoro selectiva de radiao a determinado comprimento de onda (), por diversos

    compostos especficos em soluo na cuvette.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Espectrofotometriahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Luzhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Espectro_vis%C3%ADvelhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Radia%C3%A7%C3%A3o_ultravioletahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Radia%C3%A7%C3%A3o_infravermelha
  • 38

    O espectrofotmetro utilizado (SLM Aminco 2000) permite a monotorizao

    espectral de A em condies de nico ou duplo comprimento de onda, em funo do

    tempo. Quando em duplo comprimento de onda, permite monitorizar A por ter a

    capacidade de fazer passar dois feixes de luz monocromtica com 2 comprimentos de

    onda diferentes, ao mesmo tempo, por uma nica cuvete contendo a amostra e o meio

    de reaco com o cromforo. A um dos monocromadores (monocromador 2) fica

    atribudo o comprimento de onda de referncia (ref) (usualmente o ponto isobstico no

    espectro de absoro do cromforo) e ao outro (monocromador 1) fica atribudo o

    comprimento de onda da amostra (amostra), associado a um pico (ou vale) vizinho do

    ponto isobstico no espectro de absoro do cromforo. O valor da DO ao ref

    permanece constante e a medio da amostra corresponde diferena de DO entre os

    dois comprimentos de onda. Este mtodo permite monitorizar a cintica de pequenas

    alteraes de A, as quais normalmente no seriam detectadas, devido absoro e

    disperso elevadas. J que ambos os feixes atravessam a mesma poro de uma nica

    cuvete, os efeitos de sedimentao e disperso da amostra so cancelados.

    O registo espectral exibido no monitor, observando-se os eixos de acordo com

    escalas pr definidas a partir do painel de controlo e traado, ao mesmo tempo, num

    registador Graphtee Pen Plotter MP 4400 ligado ao espectrofotmetro.

    Todas as medidas so adquiridas no espectrofotmetro em duplo comprimento de

    onda, medindo a variao da diferena de absorvncia dos 2 comprimentos de onda, ao

    longo do tempo, a 37C. O protocolo foi seguido de acordo com Rustin et al (1994),

    com algumas modificaes (Grazina, 2004).

    Os linfcitos isolados a partir do sangue perifrico foram usados para a avaliao

    espectrofotomtrica das actividades dos complexos II (succinato desidrogenase, SDH,

    EC1.6.5.1), III (ubiquinol citocromo c reductase, QCR, EC1.10.2.2), IV (citocromo c

  • 39

    oxidase, COX, EC1.9.3.1), II+III (succinato-citocromo c oxiredutase, SCCR,

    EC1.3.99.1), e CS (citrato sintetase, CS, EC 4.1.3.7). A citrato sintetase usada como

    enzima marcadora mitocondrial (Grazina, 2004).

    Os meios usados foram: Tampo 1 - KH2PO4 10 mM, BSA 1 mg/ml, pH=6,5 e

    Tampo 2 EDTA, KH2PO4 10 mM, BSA 1 mg/ml, pH=7,8.

    Todos os reagentes usados so SIGMA, excepto ditionito de sdio (Na2S2O4) e

    Cianeto de potssio (KCN), que so MERCK.

    2.3.3 Complexo II

    A SDH medida a 600 nm pela reduo do 2,6-diclorofenol indofenol (DCPIP)

    80 mM, iniciada pelo succinato 5M, em tampo 2. Inibe-se com a reaco com

    malonato 5 mM.

    2.3.4 Complexo II+III e complexo III

    A SCCR medida a 550 nm seguindo a reduo do citocromo c 60 mM pelo

    complexo III acoplado oxidao do succinato 5 mM, em tampo 2. A actividade do

    complexo III avaliada na presena de decilubiquinol (DUQH2) 80 mM.

  • 40

    2.3.5 Complexo IV

    A citocromo c oxidase medida velocidade mxima, seguindo a oxidao do

    citocromo c reduzido 10 mM em tampo 1, a 550 nm, usando o dodecilmaltoside 1,25

    mM como detergente permeabilizante da membrana externa mitocondrial com o

    objectivo de facilitar a entrada do citocromo c reduzido, sem comprometer a integridade

    membranar.

    2.3.6 Citrato sintetase

    A citrato sintetase responsvel pela reaco de condensao da acetil-CoA com

    o oxaloacetato, que ocorre ao nvel da matriz mitocondrial e a primeira reaco do

    ciclo de Krebs. Este ensaio segue a reaco do cido 5-ditiobis 2-nitrobenzoico 0,4 M

    (DTNB), com a coenzima A, a qual formada a partir da reaco da acetil-CoA 0,2 mM

    e oxalaoacetato 8 mM catalizada pela citrato sintetase e medida a 412 nm em tampo 2,

    usando Triton X-100 a 20% como detergente que permite a permeabilizao das

    membranas mitocondriais.

    2.3.7 Concentrao de Protena

    O teor proteico das amostras foi determinado pelo mtodo de Bradford

    (Bradford, 1976). Este mtodo baseia-se na alterao de cor de um corante (Brilliant

    Blue G) em resposta s vrias concentraes proteicas. Efectuou-se uma curva padro

  • 41

    com albumina plasmtica bovina (BSA) a 0.4%. Depois de obter a curva padro

    procede-se determinao da quantidade de protena da amostra, diluda com Triton X-

    100 a 2% e H2O mili-Q, na porporo de 1:6. A medio foi feita a 595 nm.

    Os resultados espectrofotomtricos so convertidos em nmol de substrato

    oxidado/minuto/mg de protena.

    2.4 Critrio de deficincia para a MRC

    A actividade enzimtica considerada deficiente quando tem valores abaixo de

    40% de actividade, considerando o valor mdio normalizado para a CS (Grazina, 2004).

    2.5 Anlise estatstica

    Os resultados so apresentados como mdia desvio padro, mnimo e mximo

    do grupo indicado. Os dados seguem uma distribuio gaussiana, ou seja, passam o

    teste da normalidade quando p0,05. A significncia estatstica, para os resultados

    bioqumicos, determinada usando o teste t de Student no emparelhado, sempre que o

    teste de normalidade apresente p0,05. No caso dos resultados no passarem este teste,

    ser aplicado o teste de Mann-Whitney.

    Os testes de qui-2 e exacto de Fisher para as probabilidades so realizados para

    esclarecer se h diferenas estatisticamente significativas nas frequncias genticas

  • 42

    observadas entre doentes MS e o grupo controlo, tanto para haplogrupos como para

    alteraes do mtDNA.

    Uma diferena considerada estatisticamente significativa quando p

  • 43

    Captulo 3 Resultados e discusso

  • 44

    3.1 Anlise Bioqumica da MRC

    3.1.1 Resultados

    Analismos a actividade enzimtica dos complexos da MCR em linfcitos de 50

    doentes com MS.

    Na tabela I esto sumariadas as caractersticas desse grupo.

    Tabela I Caracterizao dos doentes com MS.

    Nmero de indivduos 50

    Sexo F/M 35F/15M

    Idade mdia (anos) SD (mn-mx) 40,6 10,9 (2261)

    EDSS mdia (anos) SD (mn-mx) 4,5 2,3 (18)

    Idade de incio mdia (anos) SD (mn-mx) 29,8 10,5 (15-52)

    Durao mdia da doena (anos) SD (mn-mx) 13,4 8,4 (2-34)

    Legenda F: feminino; M: masculino; EDSS: Escala de Kurtzke ampliada; (Mdia (SD:

    Desvio padro); (mn-mx): (mnimo mximo).

    Na tabela II apresentam-se os resultados para a actividade especfica (valor

    mdio desvio padro (SD)) dos complexos II, III, IV e do segmento II + III da MRC,

    expressos em nmol/min/mg prot.

    Todos os valores passaram no teste da normalidade, excepto para o CIV no

    grupo MS (p* = 0,0447).

    Na tabela III apresentamos os quocientes (valor mdio desvio padro) entre a

    actividade especfica para cada complexo e a actividade da CS. Ao normalizar os

    valores para a citrato sintetase corrigem-se, no apenas as diferenas na densidade

    celular e composio das amostras, mas tambm uma potencial diferena no nmero de

    mitocndrias.

  • 45

    Tabela II Actividade enzimtica especfica para os complexos II, III, IV e segmento

    CII+III da MRC de controlos e doentes.

    Actividade enzimtica (nmol/min/mg prot) (mdia SD) (mn-mx)

    C II C III C IV C II+III CS

    Controlos

    (n=50)

    30,43 13,79

    (12,0-77,32)

    78,10 43,48

    (18,60-177,0)

    133,5 40,67

    (6,10-249,0)

    26,58 12,88

    (1,79-56,27)

    76,79 23,56

    (40,45-176,3)

    Doentes MS

    (n=50)

    22,51 12,61

    (8,42-66,46)

    105,1 63,39

    (17,16-340,1)

    75,98 50,55

    (10,01-212,3)

    *

    39,49 22,87

    (8,6-109)

    100,6 58,45

    (44,43-406,0)

    Legenda Mdia Desvio padro: (SD); (mn-mx): (mnimo mximo).

    Tabela III Actividade enzimtica dos complexos II, III e IV segmento CII+III da

    MRC, corrigido para a CS.

    Actividade enzimtica da MRC corrigida para a CS mdia SD (mn-mx)

    C IV/CS C II/CS C III/CS C II+III/CS

    Controlo

    (n=50)

    1,69 1,01

    (0,53-5,27)

    0,35 0,22

    (0-1,32)

    0,93 0,77

    (0-3,6)

    0,55 0,37

    (0,14-1,84)

    Doentes MS

    (n=50)

    0,75 0,34

    (0,18-1,59)

    0,23 0,07

    (0,07-0,52)

    1,17 0,80

    (0,20-4,49)

    0,40 0,14

    (0,11-0,86)

    Legenda . Mdia Desvio padro: (SD); (mn-mx): (mnimomximo).

    Todos os valores passaram no teste da normalidade.

    A anlise de comparao das mdias das actividades dos vrios complexos para os

    dois grupos de estudo, doentes e controlos, pelo teste t de Student ou pelo teste de

    Mann-Whitney (quando os resultados no passaram o teste de normalidade), mostrou

    que existia uma diferena significativa na actividade dos complexos II (p*=0,0114), IV

    (p**=0,0050) , II+III (p***=0,0008) e da CS (p**=0,0088), em valor absoluto, no

    grupo dos doentes. Aps correco para a CS, apenas a actividade do complexo IV

  • 46

    apresentou reduo significativa nos doentes (p*=0,0189). No entanto, foi necessrio

    verificar para cada doente se tinha ou no dfice da MRC.

    Os resultados da Tabela IV e figura 9 so relativos ao grupo MS, para averiguar os

    dfices ao nvel dos complexos da MCR, para cada doente.

    Tabela IV Resultados da avaliao dos dfices especficos na actividade dos

    complexos da MRC, nos doentes com MS.

    MS (%)

    N 52

    Def. Isolado IV 40

    Def. Isolado III 2

    Def. Isolado II 0

    Def Isolado II+III 2

    Def Combinado (IV+II+(II+III)) 0

    Def Combinado (IV+II) 0

    Def. Combinado (IV+(II+III)) 4

    Legenda N: percentagem de indivduos MS com apresentao Normal; Def: dfice; Def.

    Isolado: percentagem de indivduos com dfice isolado de um complexo especfico; Def.

    Combinado: percentagem de indivduos com dfice combinado de dois ou mais complexos.

    Figura 9 Representao grfica dos resultados da avaliao de dfices da MRC nos doentes

    com MS. Def.: dfice.

  • 47

    Considerando que existe dfice num complexo se a sua actividade for inferior a

    40% da mdia da actividade de referncia normalizada para a CS, verificmos que 44%

    dos doentes apresentavam deficincia em apenas um complexo e 4% dos doentes

    apresentam mais do que um complexo com deficincia.

    Dos dados apresentados na tabela IV, podemos concluir que os dfices mais

    frequentes so do complexo IV da MRC em 44% dos doentes avaliados, seguida pela

    deficincia do segmento II+III em 6% dos indivduos, quer na forma isolada, quer na

    forma combinada. No foram encontrados dfices isolados do complexo II, o que est

    de acordo com o facto de o CII ser codificado no genoma nuclear. Os dfices isolados

    do complexo III esto presentes em 2% dos doentes. Os dfices combinados dos

    complexos IV e II+III encontram-se presentes em 4% dos doentes MS.

    3.1.2 Discusso

    Segundo a literatura, a formao do NO. pode contribuir para a diminuio de

    energia e para a morte celular neuronal (Heales et al, 1999). A anlise do CSF de

    doentes com MS indica a presena de actividadade da NOS (Calabrese et al, 2002;

    Rejdak et al, 2008; Sayre et al, 2008).

    Nos dados por ns analisados verificmos que o dfice mais frequente na MRC

    ao nvel do complexo IV (Tabela IV e figura 9), o que est de acordo com trabalhos

    anteriores (Duncan et al, 2005; Beltrn et al, 2000; Shiva et al, 2001; Brown et al,

    2002). Segundo estes autores, o complexo IV o local de aco do NO. na mitocndria

    mais bem caracterizado. O NO. compete com o O2 para se ligar ao centro de Cu

    2+ da

    COX. Esta ligao reversvel e competitiva aumenta o Km aparente do complexo IV

  • 48

    para o O2. Consequentemente, mesmo nveis fisiolgicos relativamente baixos de NO.

    resultam na inibio da enzima citocromo c oxidase.

    Verificmos tambm que 2% dos doentes com MS apresentam o complexo III

    deficiente (Tabela IV). O trabalho de Dutta et al (2006) refere uma diminuio de 40%

    na actividade do complexo III em fraces enriquecidas em mitocndrias isoladas de

    crtex de doentes MS ps-mortem, quando comparadas com um grupo controlo. Eles

    verificaram que nestes doentes, a MCR ficava com uma capacidade diminuda para

    trocar electres ao nvel dos complexos I e III. Brown et al (2005) referem a inibio do

    CIII pelo peroxinitrito. A formao deste composto comea quando o O2 no

    totalmente reduzido a H2O pelos complexos I e III, e, em vez disso, reduzido a O2-.. O

    NO e o O2- combinam-se para formar ONOO

    -. A disfuno do complexo I e III conduz

    tanto deficincia bioenergtica como ao aumento crnico na produo de ROS e RNS

    (Beretta et al, 2004).

    No que diz respeito ao nosso grupo de estudo, apenas 2% dos doentes MS

    apresentam dfice ao nvel do segmento II+III (Tabela IV), enquanto os complexos II e

    III no parecem mais afectados. O ensaio do segmento II+III requer quinona endgena,

    Poderoso, 1996 sugeriu no seu trabalho que o NO. e possivelmente, o ONOO

    - reagem

    directamente com o ubiquinol e Heales et al (1999), concluiu que esta descoberta podia

    sugerir uma explicao para a perda irreversvel da actividade do segmento II+III, que

    ocorre logo a seguir exposio do ONOO- e sugere que a perda oxidativa da

    ubiquinona possa ocorrer, sob certas condies, in vivo.

    Os dfices combinados dos complexos IV, III e II esto presentes em 4% dos

    doentes com MS, conforme os dados da Tabela V. A diminuio da actividade

    enzimtica dos complexos da MRC podero ser uma consequncia tanto da inibio

  • 49

    enzimtica causada pelas ROS ou pelas RNS, como pela diminuio da expresso

    proteica, devido a alteraes genticas.

    3.2 Estudos genticos

    3.2.1 Resultados

    Comparmos os resultados obtidos da anlise do mtDNA de linfcitos em 216

    controlos e 87 doentes. Os dados demogrficos e as caractersticas das doenas

    encontram-se sumarizadas na tabela V.

    Tabela V Caracterizao dos doentes com MS.

    Nmero de indivduos 87

    Sexo F/M 61 F/26 M

    Idade (anos) SD (mn-mx) 43,3 10,8 (22-63)

    EDSS (anos) SD (mn-mx)) 3,7 2,3 (1-8)

    Idade de incio (anos) SD (mn-mx)) 31,9 10,7 (15-57)

    Durao da doena (anos) SD (mn-mx)) 11,3 8,7 (1-39)

    Legenda F: feminino; M: masculino; EDSS: Escala de Kurtzke ampliada; (Mdia (SD:

    Desvio padro); (mn-mx): (mnimo mximo).

  • 50

    3.2.1.1 Haplogrupos mitocondriais

    A caracterizao dos haplogrupos mitocondriais foi feita por PCR-RFLP, de

    acordo com o protocolo previamente descrito (Oliveira, 2007). Foram usados primers

    especficos para amplificar, por PCR, os fragmentos que contm as caractersticas

    polimrficas da cada haplogrupo (H, JT, I, X), sendo os grupos menos frequentes na

    populao europeia (V, U, HV, O, L, K, PV e T) classificados como outros. O

    nmero de indivduos em cada haplogrupo foi determinado pela presena ou ausncia

    do respectivo polimorfismo no mtDNA.

    Os resultados do nosso laboratrio, no que diz respeito distribuio dos

    haplogrupos mitocondriais, para controlos e doentes MS, encontram-se na tabela VI.

    Tabela VI Frequncia dos haplogrupos mitocondriais para controlos e doentes MS e

    anlise estatstica (teste exacto de Fisher).

    Haplogrupo

    Controlos

    (n=216)

    frequncia

    (percentagem)

    Doentes MS

    n=(87)

    frequncia

    (percentagem)

    p OR

    H 85/216 (39,4%) 27/87 (32,1%) 0,1536 1,4770

    JT 37/216 (17,2%) 20/87 (22,9%) 0,2570 0,6925

    I 8/216 (3,7%) 3/87 (3,4%) 1,0000 1,0770

    X 6/216 (2,8%) 6/87 (6,9%) 0,1099 0,3857

    Outro 80/216 (37%) 31/87 (34,7%) 1,0000 1,0310

    Legenda OR: odds ratio.

  • 51

    A frequncia global dos haplogrupos nos dois grupos de estudo no

    significativamente diferente, apesar das diferenas de distribuio dos haplogrupos entre

    os controlos e os doentes (figura 10).

    Figura 10 Distribuio dos haplogrupos mitocondriais entre doentes MS controlos normais.

    As principais diferenas entre os dois grupos esto no halpogrupo H, onde a

    distribuio de 39,4% nos controlos vs. 32,1% nos doentes (p=0,1536), no haplogrupo

    JT onde a distribuio de 17,2% nos controlos vs. 22,9% nos doentes (p=0,2570) e no

    haplogrupo X onde a distribuio 2,8% nos controlos vs 6,9 % nos doentes

    (p=0,1099).

  • 52

    3.2.1.2 Variaes de sequncia do mtDNA

    No nosso laboratrio foi analisado o DNA de 50 indivduos no grupo controlo e

    de 87 indivduos no grupo de doentes MS para as variaes de sequncia do mtDNA

    nas posies dos nucletidos 3460, 4216, 4917, 11778, 13708, 14459, 14484 e 15257,

    conforme descrito anteriormente (Grazina, 2007), com o objectivo de verificar as

    distribuies para as variaes primrias e secundrias de LHON. As mutaes

    patognicas 3460, 11778, 14459 e 14484 no foram detectadas em nenhuma amostra.

    Tabela VII Frequncia de ocorrncia das variaes de sequncia do mtDNA para

    controlos e doentes MS e anlise estatstica pelo teste de Fisher.

    Variao de sequncia do mtDNA Controlos

    (n=50)

    frequncia

    (percentagem)

    Doentes MS n=(87)

    frequncia

    (percentagem)

    p OR

    ausente 43/50 (86%) 38/87 (43,8%) ***0,0001 7,921

    13708 G>A 0/50 (0%) 5/87 (5,7%) 0,1582 0,1485

    4216 T>C 1/50 (2%) 0/87 (0%) 0,3650 5,303

    4216 T>C, 13708 G>A 1/50 (2%) 10/87 (11,5%) 0,0558 0,1571

    4216 T>C, 13708 G>A, 15257 G>A 0/50 (0%) 4 /87(4,6%) 0,2963 0,1837

    4216 T>C, 4917A>G 1/50 (2%) 10/87 (11,5%) 0,0558 0,1571

    4917A>G 1/50 (2%) 0/87 (0%) 0,3650 5,303

    O 2/50 (2%) 0/87 (0%) 0,1315 9,021

    Legenda N: indivduos sem variaes de sequncia secundrias de LHON; O: outras alteraes;

    OR: odds ratio.

  • 53

    Pela anlise dos dados com o teste de 2, observamos que existe significncia

    estatstica (2 = 25,87 com p*** =0,0005) para a distribuio das frequncias entre os

    dois grupos.

    A variao do nucletido 13708G>A foi observada em 5,7% dos doentes,

    estando ausente nos controlos. A combinao das variaes dos nucletidos 4216T>C,

    13708G>A est presente em 6,9% dos doentes e em 2% dos controlos. O nmero de

    indivduos com as variaes do mtDNA pesquisadas ausentes significativamente

    superior no grupo controlo (p=0,033; tabela VII): 88% vs. 71,3%.

    3.2.2 Discusso

    No nosso estudo no encontrmos qualquer associao entre a presena de um

    haplogrupo em particular e a ocorrncia de MS. Isto est de acordo com estudos

    anteriores (Mihailova et al, 2006) apesar de outras investigaes mostrarem que h

    associao entre os haplogrupos J e X ou JT e o desenvolvimento de MS,

    respectivamente (Otaegui et al, 2004; Houshmand M et al, 2005). Contudo em estudos

    comparativos deve ser dada ateno seleco dos controlos e importncia ao passado

    gentico da populao, para poder obter concluses vlidas.

    3.2.3 Correlao Bioqumica Gentica

    Fomos analisar, pelo teste de 2, se existiria associao tanto entre os

    haplogrupos H e JT como entre os indivduos com ou sem variaes de sequncia ao

  • 54

    nvel do mtDNA e os dfices ao nvel da MRC identificados no grupo de doentes MS.

    Da anlise resultou que 2 = 4,857 e p=0,0881, no sendo a diferena estatisticamente

    significativa, sugerindo que no existe associao entre as variveis dos estudos

    bioqumicos e genticos dos haplogrupos mitocondriais, na amostragem analisada de 50

    doentes, em cujas amostras se analisou a MRC.

    Tabela VIII Distribuio dos haplogrupos H e JT em doentes com MRC com dfice

    ou normal e anlise estatstica (teste exacto de Fisher).

    Haplogrupo MRC com dfice MRC Normal Teste exacto de

    Fisher

    H 4/50 (8%) 10/50 (20%) p = 0,478

    JT 8/50 (16%) 3/50 (6%) p = 0,1997

    Outros 38/50 (76%) 37/59 (74%) p = 1,0000

    Por outro lado, quando testmos a associao entre os haplogrupos H, JT e

    outros para os doentes com MRC deficiente ou normal, com o teste exacto de Fisher,

    verificmos que no existem diferenas estatisticamente significativas.

    Fomos ento verificar se existia associao entre dfice da MRC e a presena de

    variaes de sequncia do mtDNA. Apresentamos os resultados estatsticos na tabela

    IX.

  • 55

    Tabela IX Distribuio de doentes com ou sem alteraes ao nvel do mtDNA no

    grupo de doentes com MRC deficiente e normal.

    mtDNA MRC Normal MRC com Dfice Teste exacto de Fisher

    Sem alteraes 24/26 (92,3%) 14/24 (58,3%) p** = 0,0074

    Com alteraes 2/26 (7,7%) 10/24 (41,7%) OR = 8,571

    RR = 3,789

    Legenda: **p

  • 56

    MS (Xinhua et al, 2008), sendo estas ideias reforadas pelos resultados obtidos no

    presente trabalho.

  • 57

    Captulo 4 Concluses

  • 58

    Os resultados obtidos com o presente trabalho reforam a hiptese da disfuno

    mitocondrial como resultado de leso oxidativa. Num futuro prximo, esperamos poder

    dar novas contribuies para elucidar este aspecto com mais pormenor.

    Dado o papel central da mitocndria em tantas funes celulares importantes,

    incluindo a produo de energia, razovel que a sua disfuno seja um contributo

    chave no processo neurodegenerativo desta doena. Consequentemente os tratamentos

    dirigidos mitocndria e os tratamentos neuroprotectores, ou a combinao de

    neuroprotectores e imunomodeladores poderiam representar uma abordagem mais

    racional terapia da MS.