Capítulo 2 Exercícios Propostos Módulo 1 Módulo 2 Dos so ... · filosófica, da formação de...

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581Capítulo 1 Filoso� a: origens e temas ................................ 246

Capítulo 2 Filoso� a clássica (PARTE I) .............................. 262

Exercícios Propostos Módulo 1Origens e temas da � loso� a ........................268Módulo 2Dos so� stas a Sócrates ................................ 273

Gabarito dos Exercícios Propostos................ 278

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1 Filosofia: origens e temasNa mitologia grega, Atena, também conhecida como Pa-

las Atena, era a deusa da sabedoria, entre outras qualidades que lhes eram atribuídas pelos gregos antigos. Tales de Mi-leto, que viveu entre os séculos VII e VI a.C., é considerado o primeiro filósofo ocidental. As imagens, que são idealizações dessas personagens, ilustram um importante momento da história do conhecimento: a passagem da mitologia para a filosofia, da cosmogonia para a cosmologia.

1. Do mito ao logos: origens da filosofiaOs estudos de filosofia são, frequentemente, antece-

didos pela seguinte interrogação: o que é a filosofia? Uma resposta direta a essa questão, porém, não é capaz de ofe-

recer uma definição satisfatória dessa forma de conheci-mento. Afinal, a filosofia caracteriza-se por considerável amplitude e, de suas origens à atualidade, percorre uma história na qual se inscrevem significativas transforma-ções, com a constituição de diferentes áreas de pesquisa e sucessivas reorientações das tarefas pertinentes à ativi-dade filosófica. Sendo assim, se pretendemos atingir uma compreensão básica da filosofia, mais adequado do que a busca por sua definição preliminar é o exame gradual do seu surgimento, das perguntas que mobilizam a reflexão filosófica, da formação de seus campos temáticos e das relações entre o saber filosófico e as demais modalidades de conhecimento.

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A filosofia consiste em uma elaboração cultural da hu-manidade. No interior do próprio processo de humanização, desde os seus primórdios, os seres humanos se distinguem crescentemente como seres socioculturais: com sua inteli-gência, elaboram socialmente conhecimentos vinculados às necessidades práticas, desenvolvem recursos técnicos e pro-jetam-se além da condição que lhes é imediatamente apre-sentada pela natureza. Em outras palavras, produzem uma realidade propriamente humana, a cultura.

Cultura, em seu amplo significado antropológico, envol-ve não apenas um segmento específico das atividades hu-manas ou os equipamentos com os quais os seres humanos se relacionam com o meio natural, mas também a dimensão dos valores morais, dos símbolos, das normas sociais, dos padrões de comportamento e das visões de mundo social-mente construídas. Como seres sociais e culturais, os se-res humanos enfrentam questões que ultrapassam as exigências materiais de sua sobrevivência, perguntam-se sobre a origem do Universo, sobre os fenômenos naturais, sobre a vida.

As primeiras respostas socioculturais a essas questões são apresentadas na esfera do pensamento mítico, ou seja, nas mais remotas sociedades humanas, nas civilizações do Antigo Oriente – Egito, Mesopotâmia, Pérsia, dentre outras – e nos séculos iniciais da Antiguidade grega, em que predo-minam as narrativas mitológicas que conferem sentido ao conjunto da realidade cósmica, natural e social. Os relatos míticos são descrições que pretendem justificar a ordena-ção do Universo, os eventos da natureza e as relações so-ciais em bases sobrenaturais, quer dizer, nos domínios do pensamento mitológico, a realidade tem seu ponto de par-tida e fundamentação nas relações hierarquizadas entre os deuses e nas forças divinas que, supostamente, estabele-cem a ordem universal.

Didaticamente, podemos dividir os mitos em teogo-nias e cosmogonias. As teogonias, discorrendo sobre as genealogias dos deuses, realizam a exposição das relações hierárquicas entre os seres divinos, em seus conflitos e suas alianças, com os quais se originam os seres do mundo. As cosmogonias, por seu turno, relatam a ordenação do mundo precisamente a partir dos des-dobramentos das relações das divindades entre si, pro-curando, dessa forma, fundamentar os fenômenos que presenciamos no mundo.

Transmitidos através das gerações, os mitos são acei-tos sob o prisma da tradição cultural amparada na crença na supranaturalidade. Essa aceitação de seus relatos, me-diada por autoridades políticas e religiosas, não comporta atitudes críticas, pautadas por questionamentos aos seus conteúdos. Nesse contexto, os mitos cumprem a finalidade pedagógica de orientar os seres humanos, situando-os em um mundo presumivelmente regido por uma ordem fixada em planos divinos.

A prevalência sociocultural da mitologia se estende por muitos milênios em diferentes sociedades humanas, permanecendo absoluta até meados do século VI a.C., quando, na Grécia Antiga, desenvolveu-se uma forma de pensamento exterior ao mito e à religiosidade, instauran-do uma inovação cultural cujas repercussões seriam deci-sivas para a história da humanidade: trata-se do surgimen-to da filosofia.

A. O surgimento da filosofiaPara entender o surgimento da filosofia no mundo

grego, é preciso, inicialmente, examinar uma questão fun-damental: o que caracteriza a originalidade do emergente pensamento filosófico? Diferentemente das narrativas mi-tológicas, sustentadas pela crença na supranaturalidade, a atitude filosófica converte os temas da origem e da ordem do mundo à condição de problemas a serem resolvidos es-tritamente pela inteligência humana. A atividade filosófica compromete-se com a busca pelo conhecimento exclusiva-mente racional da realidade, sem recorrer, portanto, à credu-lidade prévia nos seres divinos e à aceitação de pressupos-tos sobrenaturais.

Os primeiros filósofos gregos dedicaram-se ao exame da physis, termo convencionalmente traduzido por natureza. Entretanto, é preciso notar que o teor semântico de physis é mais vasto e profundo, se comparado ao significado que nossa cultura contemporânea atribui à expressão ‘natureza’. Physis é o princípio originário, fundamento de tudo o que existe (a arqué), o princípio interno responsável pela geração e pela organização do cosmos e de seus diversos componentes. É a realidade subjacente à nossa experiência, ou seja, o que é pri-mário, fundamental e persistente, contrastando, então, com aquilo que é secundário, derivado e transitório. É a substân-cia de que são feitas todas as coisas, ao mesmo tempo que consiste no próprio processo de surgimento e de desenvol-vimento do conjunto da realidade. É a essência presente na pluralidade ou, dito de outra maneira, physis é a totalidade daquilo que é: céu, pedras, estrelas, seres humanos, enfim, a multiplicidade de elementos existentes pertencem à physis, uma vez que são a physis.

Esse entendimento mínimo sobre a noção grega de physis auxilia na compreensão da originalidade da postu-ra de Tales de Mileto (625-586 a.C.), identificado como o personagem inaugural da filosofia pela maioria dos histo-riadores. Tales afirma que a água é o princípio originário, a unidade primordial do cosmos e da diversidade que encon-tramos em seu interior. Para o primeiro filósofo, portanto, a água é a physis, o princípio fundamental, presente na tota-lidade daquilo que existe.

Uma asserção desse tipo parece pouco relevante e mes-mo extravagante sob o prisma contemporâneo, motivo pelo qual é necessário sublinhar o ineditismo de Tales. Ao declarar tal sentença, esse pensador esboça uma explicação racio-nal acerca do cosmos, excluindo os pressupostos divinos da ordenação do mundo e inaugurando a problematização filosófica. Dessa forma, Tales inicia a filosofia ao converter os temas tradicionais da mitologia em problemas para os quais se devem oferecer soluções racionais. Sua declaração de que a água é a unidade fundamental do cosmos contém, implici-tamente, a indicação de relevantes questionamentos filosófi-cos, tais como:

• Qual é o princípio originário do cosmos?• Como se processam a geração, o crescimento e a cor-

rupção dos seres?• O que permanece em meio às múltiplas transforma-

ções que observamos no mundo?Tais questões, pensadas rigorosamente como problemas

filosóficos, exigem a elaboração de respostas demonstradas de modo racional e, de maneira diversa dos mitos, cujo valor de verdade é postulado com base na autoridade da tradição,

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as teses autenticamente filosóficas – que pretendem se estabelecer como explicações racionais da realidade – são avaliadas de forma crítica sob a perspectiva da razão. O mito reivindica a veracidade de seus relatos na reverência aos an-cestrais, em seu viés religioso e na autoridade de quem os pronuncia, excluindo a postura crítica daqueles que acolhem seus ensinamentos. Já a tese filosófica sustenta-se unica-mente em sua racionalidade e, sendo assim, é passível de ser criticada de modo racional.

Uma afirmação filosófica como a de Tales, em razão de sua pretensão racional, é sujeita a críticas, a contra-argu-mentações, a reformulações e correções racionalmente su-geridas. A nascente atividade filosófica, portanto, introduz na cultura grega e, em sentido mais amplo, na cultura ocidental, um espaço crítico e racional de diálogos, debates e argumen-tações, isto é, a filosofia ultrapassa os limites do pensamento mitológico e realiza-se na esfera do logos.

Logos é o vocábulo grego que, de maneira muito re-sumida e condensada, é empregado nos dias atuais como sinônimo de razão. Em seu sentido originariamente grego, logos remete a significados diferentes e articulados entre si, tais como pensamento, linguagem, discurso, argumen-to, norma, conhecimento racional e ser ou realidade ínti-ma e essencial de algo.

A constatação das diferenças entre o mito e a filosofia são suficientes para concluir que entre pensamento filosó-fico e pensamento mítico verifica-se um corte radical – ou, entre ambos, haveria uma espécie de linha de continuida-de? Não há interpretação unânime ou consensual a res-peito da transição do mito ao logos entre os historiadores da filosofia. Destaca-se, isto sim, a divergência: há os que defendem a existência de vínculos essenciais entre narrati-vas míticas e discursos filosóficos e aqueles que atribuem à pesquisa filosófica uma ruptura completa em relação aos relatos míticos. Sob o ponto de vista da continuidade da fi-losofia com o mito, a filosofia não surge exatamente entre os gregos. Ela procede das antigas civilizações orientais nas quais se sistematizaram extensas narrativas mitológicas. Sob o ponto de vista do total rompimento da filosofia com o mito, a filosofia corresponde a uma criação plenamente original da cultura grega.

Entre os estudiosos que compreendem a filosofia como prolongamento do mito, ainda que sob forma notavelmente modificada, situam-se Werner Jaeger (1888-1961) e Francis Macdonald Cornford (1874-1943), para os quais a filosofia transfere as formulações míticas para o plano do discurso laico, quer dizer, consiste na progressiva racionalização dos conteúdos da mitologia. De acordo com essa perspectiva, a filosofia não se diferencia essencialmente do mito, pois os primeiros filósofos mantêm a estrutura das narrativas míticas e não submetem suas teses à experimentação e à prova, limi-tando-se a reelaborar os conteúdos míticos sob uma estrutu-ra discursiva abstrata.

A tese que concebe o pensamento filosófico como com-pleta ruptura em relação ao mito difunde-se amplamente com os escritos do intelectual britânico John Burnet (1863-1928),

para quem as diferenças entre a mitologia e a filosofia não são secundárias, mas sim essenciais. Segundo essa con-cepção, os mitos se restringem a narrativas pretéritas, pro-curando justificar a realidade em acontecimentos que teriam transcorrido no passado. Já a filosofia lança-se à busca da identificação de princípios explicativos que continuam atuando no tempo presente. Distinção ainda mais essencial procede da observação de que os relatos míticos são reple-tos de contradições, com as quais se reforça seu caráter supranatural e misterioso. A filosofia, ao contrário, procura suprimir racionalmente as contradições em um discurso coerente. Sob essa ótica, não há vínculos fundamentais en-tre mito e filosofia. Vigora, assim, uma nítida linha de conti-nuidade entre o conhecimento filosófico e o conhecimento científico, que se desenvolveria na era moderna. Além disso, afirma-se que a filosofia é uma criação absolutamente origi-nal dos gregos antigos, teoria que é conhecida como tese do milagre grego.

Atualmente, porém, predomina uma interpretação inter-mediária, que recusa os extremismos das teses anteriores. Um expoente desse pensamento é o historiador francês Jean-Pierre Vernant (1914-2007), que supera as concepções extremas com seu conceito de transformação qualitativa. Ele considera pertinentes os apontamentos sobre os elos entre mito e filosofia, bem como os registros acerca das influências das culturas orientais sobre os gregos antigos. Entretanto, rejeita a hipótese que reduz a filosofia a uma modalidade di-ferenciada da linguagem mítica. Vernant afirma que os pen-sadores gregos recolhem a herança mítica e cultural, trans-formando-a qualitativamente na elaboração de uma forma inédita de investigação da realidade. Trata-se, segundo esse historiador, do pensamento filosófico, cujas principais carac-terísticas são: a racionalidade como critério de verdade, a ne-cessidade de o discurso demonstrar a concepção defendida, a exigência de pesquisa racional dos problemas teóricos, a busca pela explicação das causas dos fenômenos, a análise crítica e a tendência à generalização.

B. As condições históricas do surgimento da filosofiaAo se considerar a origem grega da filosofia, emerge a se-

guinte questão: quais são as condições históricas que propor-cionam o contexto sociocultural favorável ao desenvolvimen-to do pensamento filosófico? São muitos os fatores históricos que costumam ser indicados como oportunos ao nascimento da filosofia: a humanização dos deuses gregos, as viagens marítimas, o desenvolvimento de uma economia comercial urbana, a utilização em larga escala da moeda, a criação de um calendário laico, o uso do alfabeto e a atividade política.

A projeção de traços humanos nas divindades gregas ou a concepção dos deuses à imagem dos seres humanos faci-lita a autonomia humana em relação à religiosidade, algo que constituiria importante aspecto da especulação filosófica. No mesmo sentido, atuam as viagens marítimas, que revelam a discrepância entre os relatos míticos e as observações geo-gráficas efetuadas, e a adoção de um calendário desvincula-do da religião, organizado com base em eventos humanos e regularidades da natureza. A economia comercial urbana, a circulação generalizada da moeda e o uso do alfabeto tam-bém contribuem para o desenvolvimento de um pensamento abstrato, por serem atividades que exigem, em si mesmas, razoável nível de abstração.

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A articulação entre esses aspectos históricos e sua participação no contexto sociocultural que explica o surgimen-to da filosofia apenas se tornam realmente compreensíveis no universo da pólis grega. Nos reinos orientais da Antigui-dade e no início da história antiga grega, o poder administrativo concentra-se na figura do monarca que, legitimado por sua suposta descendência dos deuses, exerce verticalmente sua autoridade e representa a noção de permanência da ordem social tecida pelas divindades. As cidades-Estado gregas, formadas no período arcaico e consolidadas em con-figurações democráticas ou oligárquicas na época clássica da Antiguidade helênica (séculos V a.C. e IV a.C.), instituem uma novidade histórica. Trata-se do surgimento da política, compreendida como corpo cívico no qual os cidadãos, em igualdade de condições, apresentam propostas, debatem e participam diretamente das decisões de sua comunidade.

Nas assembleias das cidades gregas, o discurso racional assume o plano principal dos debates, pois os temas da coletivi-dade são discutidos por cidadãos que, para a defesa de seus pontos de vista, dependem apenas da qualidade de suas argumen-tações. Neste domínio público da cidadania, com suas práticas de pensamento separadas da religiosidade, transcorre a racio-nalização das relações sociopolíticas e a constituição de uma cultura propensa à dessacralização do saber. Pode-se constatar que o surgimento da filosofia – investigação racional do cosmos e, posteriormente, das questões humanas – corresponde ao exercício da política na dimensão do logos.

01. Unioeste-PRAdvento da polis, nascimento da filosofia: entre as duas ordens de fenômenos, os vínculos são demasiado

estreitos para que o pensamento racional não apareça, em suas origens, solidário das estruturas sociais e mentais próprias da cidade grega. Assim recolocada na história, a filosofia despoja-se desse caráter de re-velação absoluta que às vezes lhe foi atribuído, saudando, na jovem ciência dos jônios, a razão intemporal que veio encarnar-se no Tempo. A escola de Mileto não viu nascer a Razão; ela construiu uma razão, uma primeira forma de racionalidade.

Jean Pierre Vernant

Sobre a filosofia, seguem as seguintes afirmações.I. Ela foi revelada pela deusa Razão a Tales de Mileto quando este afirmou que o princípio de tudo era a água.II. Ela foi inventada pelos gregos e decorre do advento da pólis, a cidade organizada por leis e instituições que, por meio

delas, eliminou todo tipo de disputa.III. Ela rejeita o sobrenatural, a interferência de agentes divinos na explicação dos fenômenos; problematiza, discute e

põe em questão até mesmo as teorias racionais elaboradas com rigor filosófico.IV. Surgiu no século VI a.C. nas colônias gregas da Magna Grécia e da Jônia e apenas no século seguinte deslocou-se

para Atenas.V. Ocupa-se com os princípios, as causas e as condições do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; põe

em questão e problematiza valores morais, políticos, religiosos, artísticos e culturais.Das afirmações feitas acima:a. I, III e V são corretas.b. I e II são incorretas.c. II, IV e V são corretas.d. todas são corretas.e. todas são incorretas.

ResoluçãoO texto de Jean-Pierre Vernant vincula o surgimento e o desenvolvimento inicial da filosofia às condições sócio-his-

tóricas das antigas cidades gregas, caracterizadas pela atividade política como esfera de argumentações e debates. As afirmações III e V versam sobre a atividade filosófica grega. A asserção IV descreve corretamente a localização geo-gráfica do surgimento da atividade filosófica e o posterior deslocamento de seu núcleo para Atenas. Os itens I e II são falsos. Observamos que a afirmação II torna-se falsa quando declara que leis e instituições eliminaram as disputas nas cidades gregas.

Alternativa correta: B

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2. A filosofia pré-socráticaAs especulações em torno da physis recebem o nome de cosmologia, por consistirem na investigação racional do cos-

mos, termo grego que significa o Universo ordenado, a ordem natural do mundo. Os primeiros filósofos gregos, os chamados pré-socráticos, pesquisam a origem do cosmos, a passagem do uno ao múltiplo, suas transformações, as causas dos fenô-menos naturais.

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A expressão pré-socráticos, consagrada na história da filosofia, procede da importância central que os his-toriadores atribuem ao ateniense Sócrates no curso do pensamento filosófico – alguns entendem, inclusive, que a filosofia realmente se inicia com a proposta socrática de investigação dialética da natureza humana. Cumpre des-tacar que o prefixo pré, neste caso, não possui sentido exatamente cronológico, uma vez que alguns dos deno-minados filósofos pré-socráticos foram contemporâneos de Sócrates.

É sabido que Tales de Mileto é considerado o fundador da filosofia. Ao declarar que a água é a arqué, a unidade primor-dial da physis – presente na diversidade ordenada do cos-mos –, Tales situa o princípio explicativo da natureza na pró-pria natureza. Dessa forma, descarta a concepção mítica de que o mundo supranatural seja o suporte do mundo natural ordenado, a ideia de uma natureza governada pelos deuses. Além disso, efetua a tentativa inaugural de reduzir a multipli-cidade percebida no mundo – os diferentes elementos e se-res existentes – à unidade exigida pela razão, comprometida com a revelação da essência originária do cosmos.

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Ao afirmar a água como arqué, Tales atribui à própria natureza o seu princípio explicativo.

Por não examinar a transformação do princípio primordial na diversidade interna que caracteriza o cosmos, Tales de Mi-leto não respondeu à questão: como se realiza a passagem da arqué para todas as coisas que existem? Compondo um discurso racional que contempla a totalidade da physis, de sua arqué ao seu vir a ser, os primeiros filósofos que apresen-tam uma explicação sobre a passagem do uno ao múltiplo são Anaximandro de Mileto (620-547 a.C.), Anaxímenes de Mileto (585-528 a.C.) e os componentes da escola pitagórica. Para Anaximandro, o ápeiron, infinito espacial e qualitativo, é a uni-dade geradora do cosmos, o princípio do qual surge o mundo pela separação de contrários. Conforme sua concepção, a for-mação do cosmos inicia-se com a divisão entre quente e frio: dela surgem o sol, a lua a os astros, derivados do quente, e o céu, a terra e o mar, derivados do frio. Nesta permanente ten-são entre contrários, desenvolve-se a vida, dos seres aquáti-cos às suas formas mais sofisticadas. Anaxímenes de Mileto, por sua vez, afirma que o ar é a arqué, argumentando que sua ausência inicial de forma permite que se transforme na

imensa variedade de coisas existentes, por meio da conden-sação e da rarefação, fenômenos que constituem o Universo como um complexo ser vivo. Tese consideravelmente original é a desenvolvida pela escola pitagórica, fundada por Pitágo-ras de Samos (570-497 a.C.), na cidade grega de Crotona. O pitagorismo declara a harmonia inteligível como fundamen-to da harmonia sensível, sentenciando que o cosmos tem o número como arqué, ou seja, os princípios matemáticos são os elementos constitutivos do Universo. Para os pitagóricos, a arqué é o uno primordial imutável, que contém em si a pari-dade e a imparidade, das quais desdobram-se a totalidade da physis e os seres em sua pluralidade.

Com Heráclito de Éfeso (540-475 a.C.) e Parmênides de Eleia (530-460 a.C.), a filosofia pré-socrática atinge novo pa-tamar especulativo, estabelecendo-se o conflito entre as te-ses heraclitianas do devir e as teses parmenidianas do ser ou entre ser e devir, que exerceria profunda ascendência sobre os caminhos posteriores do pensamento filosófico.

Em Heráclito de Éfeso, a reflexão filosófica concentra-se no devir, pois, de acordo com esse pensador, o conjunto da realidade consiste no incessante vir a ser, o fluxo universal que produz a mudança ininterrupta de todas as coisas. Na mobilidade perpétua, um ser não permanece idêntico a si mesmo, desloca-se necessariamente em seu contrário. O dia converte-se em noite, o calor converte-se em frio, a saúde converte-se em doença, a vida converte-se em morte, a noite converte-se em dia, o frio converte-se em calor, a morte con-verte-se em vida. O devir é eterno e a estabilidade é ilusória. A imagem da eternidade do vir a ser é oferecida pelo próprio Heráclito, ao declarar que um mesmo homem jamais poderá entrar no mesmo rio, porque o ser humano já não seria idên-tico à sua anterioridade e outras seriam as águas do rio. Na perspectiva heraclitiana, a guerra é o fundamento de todas as coisas, a tensão dos contrários que se harmonizam por seus limites – por exemplo, a doença é que confere valor à saúde –, articuladas no princípio superior do fogo primordial. O fogo primordial é o logos, a racionalidade imanente ao Universo, que sustenta a multiplicidade na unidade de opostos, unida-de do movimento universal.

Se a filosofia de Heráclito se notabiliza por sua dedicação em revelar racionalmente o mundo dos fenômenos, o devir, Par-mênides de Eleia, em sentido contrário, rejeita a aparente mul-tiplicidade do vir a ser com sua afirmação racional da realidade exclusiva do ser. Comparativamente aos filósofos pré-socráticos anteriores, que se perguntavam pelo princípio da ordenação do cosmos, Parmênides propõe uma indagação absolutamente ori-ginal: o que é o ser? E sua resposta é surpreendente: o ser é. Em termos mais extensos, essa resposta adquire a formulação: o ser é (o que é é) e o não ser não é (o que não é não é).

Entende-se melhor essa solução teórica parmenidia-na ao observar que esse filósofo, pretendendo manter-se nos limites fixados pela coerência da razão, pensa o ser em si, sentenciando sua plena positividade e recusando a hipótese de transição do ser ao não ser e do não ser ao ser. Parmênides caracteriza o ser como uno, eterno, imu-tável, indivisível e pleno. O ser é uno, pois a admissão de uma pluralidade de seres implicaria a introdução do não ser no ser. É eterno porque a aceitação da noção de tempo-ralidade conduziria à afirmação de seu surgimento a partir do não ser. Da mesma forma, é imutável e indivisível, uma vez que a transformação deslocaria o ser para o não ser e

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a divisibilidade resultaria na multiplicidade no interior do ser. Por fim, o ser é pleno, dado que não se aceita racional-mente a existência do não ser.

Para Parmênides, portanto, o pensamento e a linguagem, corretamente conduzidos, exprimem necessariamente o ser – não se pode pensar o não ser, o nada. E o mundo da experiên-cia, dos fenômenos e do devir, aquilo que percebemos com os nossos sentidos, é desprezado por não se compatibilizar com o exame racional que esse filósofo realiza do ser.

Na questão proposta por Parmênides – o que é o ser? – e em suas teses filosóficas, anuncia-se um novo campo de reflexões filosóficas, antes apenas latente nos discur-sos cosmológicos, a metafísica ou ontologia. A metafísica versa sobre o ser enquanto ser, o ser em geral, o ser em si, além das aparências e das experiências físicas.

A ontologia de Parmênides é defendida pelos procedimen-tos argumentativos de Zenão de Eleia (490-430 a.C.), filósofo que refuta racionalmente os dados da experiência, preten-dendo demonstrar aos críticos da concepção parmenidiana as contradições de suas teses. Os paradoxos apresentados por esse pensador têm o propósito de esclarecer que noções como divisibilidade, mobilidade e multiplicidade, ou seja, o devir, não se sustentam em um discurso racional. Um dos ar-gumentos utilizados por Zenão é conhecido como o paradoxo de Aquiles. Aquiles é um importante personagem da mitologia grega e a velocidade é uma de suas importantes característi-cas. Entretanto, observa o filósofo, Aquiles não conseguiria su-perar uma tartaruga em uma corrida, desde que o animal saís-se à sua frente. Considerando a hipótese do espaço divisível, Zenão destaca que o herói mítico, desejando alcançar sua opo-nente, deveria, para começar, percorrer metade da distância entre ele e a tartaruga. Antes disso, contudo, deveria percor-rer metade dessa metade e assim sucessivamente, ou seja, Aquiles jamais atingiria a mesma posição de sua adversária, nunca a ultrapassaria. Com a exposição de paradoxos deste tipo, esse pensador defende o teor ilusório dos fenômenos recolhidos por nossas sensações e reafirma a confluência do pensamento com o ser, fixada racionalmente por Parmênides.

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Outro paradoxo utilizado por Zenão é o argumento do arco e da flecha. Repartindo o suposto movimento da flecha

em direção ao alvo em cada um de seus instantes, tem-se sempre a flecha parada. A ideia de movimento, conclui o

filósofo, não resiste à avaliação criteriosa da razão.

01. UEL-PRA Rainha Vermelha diz uma frase enigmática:

“Pois aqui, como vê, você tem de correr o mais que pode para continuar no mesmo lugar”.

CARROL, L. Através do espelho e o que Alice encontrou por lá. Rio de Janeiro: Zahar, 2009. p. 186.

Já na Grécia antiga, Zenão de Eleia enunciara uma tese também enigmática, segundo a qual o movimento é ilusório, pois, numa corrida, o corre-dor mais rápido jamais consegue ultrapassar o mais lento, visto o perseguidor ter de primeiro atingir o ponto de onde partiu o perseguido, de tal forma que o mais lento deve manter sempre a dianteira.

ARISTÓTELES. Física. Z 9, 239 b 14. In: KIRK, G. S.; RAVEN, J. E.; SCHOFIELD, M. Os pré-socráticos. 4.ed. Lisboa:

Fundação Calouste Gulbenkian, 1994, p. 284.

Com base no problema filosófico da ilusão do movi-mento em Zenão de Eleia, é correto afirmar que

a. se baseia na observação da natureza e de suas transformações, resultando, por essa razão, numa explicação naturalista pautada pelos sentidos.

b. confunde a ordem das coisas materiais (sensível) e a ordem do ser (inteligível), pois avalia o sensí-vel por condições que lhe são estranhas.

c. ilustra a problematização da crença numa verda-deira existência do mundo sensível, à qual se che-garia pelos sentidos.

d. mostra que o corredor mais rápido ultrapassará inevitavelmente o corredor mais lento, pois isso nos apontam as evidências dos sentidos.

e. pressupõe a noção de continuidade entre os ins-tantes, contida no pressuposto da aceleração do movimento entre os corredores.

ResoluçãoO paradoxo desenvolvido por Zenão problematiza as

noções que nos são fornecidas pelos sentidos, concluin-do que os fenômenos do devir devem ser descartados por sua irracionalidade.

Alternativa correta: C

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O contraste entre a filosofia de Heráclito e a concepção eleata do ser promove um impasse no pensamento filosó-fico e instaura um corte conceitual entre os fenômenos do devir e as exigências racionais do ser. Nesse contexto, os últimos filósofos pré-socráticos desenvolvem teses dedica-das à conciliação da realidade heraclitiana com o conceito parmenidiano de ser, ou seja, à conjugação entre cosmologia e metafísica. Em geral, essas filosofias conservam as noções de eternidade e de imutabilidade do ser, mas pensam o ser no plural e concebem o devir como composição e decompo-sição de seres eternos e indestrutíveis, e não como transi-ção do não ser ao ser e do ser ao não ser. Essa orientação filosófica, intitulada pluralista, tem seus representantes em Empédocles de Agrigento (483-421 a.C.), Anaxágoras de Cla-zômenas (500-428 a.C.) e nos atomistas Leucipo (provavel-mente 480-420 a.C.) e Demócrito de Abdera (460-370 a.C.).

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Empédocles de Agrigento afirma que os seres primordiais são a água, a terra, o fogo e o ar. Essa pluralidade de seres imu-táveis se articula sob o amor e o ódio, forças cósmicas, respecti-vamente, de atração e de dispersão, que definem o fundamento do devir. Anaxágoras de Clazômenas explica a physis por uma multiplicidade de elementos ou sementes originais, as homeo-merias, inicialmente agrupadas em uma totalidade que tem em si todos os diversos componentes do cosmos. Segundo Anaxá-goras, um princípio inteligente, o nous, é responsável pela dis-persão dessa unidade primordial e pelos arranjos que formam o Universo. Leucipo e Demócrito, por sua vez, compreendem a pluralidade dos seres em dimensão simplesmente quantitativa, e não qualitativa: trata-se de elementos indivisíveis, denomina-dos de átomos, que não se distinguem entre si por suas qua-lidades, possuindo apenas diferentes tamanhos e formas. Sob o ponto de vista do atomismo, a geração do cosmos e de sua diversidade interna corresponde às múltiplas combinações de átomos. O nascimento de algo não é a passagem do não ser ao ser, e a morte não é a transição do ser ao não ser: nascimento é reunião de átomos e morte é decomposição atômica.

Ao percorrer as origens da filosofia caracterizando-a em seu surgimento na Grécia Antiga como forma de pensamento distinta do mito, foram apresentadas, brevemente, as espe-culações filosóficas iniciais, a filosofia pré-socrática. Em sua etapa inaugural, a filosofia realiza-se como cosmologia e como metafísica, em um debate crítico e mobilizado por diferentes teses filosóficas. Foi assinalada a tensão conceitual entre ser e devir, delineada com as filosofias de Parmênides e de Herácli-to, e os esforços, ainda no horizonte da reflexão pré-socrática, de superá-la na articulação da cosmologia com a metafísica.

Esse problema filosófico, a relação entre ser e devir, pro-longa-se muito além da fase pré-socrática, permeando a tradi-ção filosófica até os dias atuais. Evidencia-se uma permanen-te herança pré-socrática, com suas questões e elaborações racionais constituindo o pressuposto das problematizações e dos desenvolvimentos teóricos subsequentes da filosofia.

Tal constatação não significa que a filosofia não tenha se modificado no curso do tempo. O pensamento filosófico prota-goniza sua própria história e transforma a si mesmo com sua história. Os filósofos de determinada época dialogam com os filósofos de outros períodos e dialogam também com o contex-to sociocultural de seu tempo: a filosofia exercita consistente diálogo com o passado e com o presente. No interior desse de-bate, problemas antes nucleares para a reflexão filosófica são transferidos para plano secundário, bem como desenvolvem-se diversificadas áreas temáticas para a pesquisa filosófica, susci-tadas não somente pelas iniciativas de alguns pensadores, mas em igual medida pelas mudanças das sociedades humanas.

Ainda na Antiguidade, no período clássico da filosofia gre-ga, sobrevém a primeira mudança de orientação temática no pensamento filosófico. Com os sofistas e, em especial, com Sócrates, a filosofia transita dos temas da physis para as per-guntas centradas no ser humano. Nessa conversão filosófi-ca, delimitam-se áreas específicas do saber filosófico, como a ética, a antropologia filosófica e a política, que receberiam tratamento sistemático nas teorias de Platão e de Aristóteles. Da filosofia antiga à filosofia contemporânea, prosseguem as transformações, consolidando-se diferentes campos da pes-quisa filosófica, tais como a teoria do conhecimento, a filoso-fia da mente, a filosofia da ciência, a estética, a filosofia da história e a filosofia da linguagem.

3. Temas de filosofia: o conhecimento como tema filosófico

A transição do pensamento mítico para o pensamento fi-losófico já foi descrita, evidenciando contraste nas diferentes formas de explicação do mundo. Assinalou-se o surgimento da filosofia como atividade racional de reflexão sobre a realidade, caracterizada pela argumentação, pelo confronto de ideias e pelo debate. Enquanto o mito se oferece como um conheci-mento pronto e definitivo sobre o cosmos, os fenômenos na-turais e os seres humanos, a filosofia se delineia como um per-curso reflexivo e discursivo que pretende atingir racionalmente o conhecimento, a verdade. No primeiro caso, não há margem para questionamentos; no segundo, diferentemente, a própria natureza racional da atividade filosófica exige uma postura crí-tica mediante as teses apresentadas pelos filósofos.

A dimensão dialógica da filosofia e as discordâncias dos filósofos pré-socráticos em torno da origem e da ordenação do Universo autorizam a exposição da seguinte pergunta: em que medida seria legítimo declarar a falsidade ou a verdade das divergentes cosmologias pré-socráticas? Essa indaga-ção não se limita a examinar o valor singular das diferentes proposições dos primeiros filósofos, ou seja, não se trata de inspecionar se esta ou aquela explicação sobre o cosmos é verdadeira ou falsa. Questiona-se, isto sim, o fundamento, a condição de possibilidade do conhecimento.

É imprescindível mencionar que os pensadores pré-so-cráticos não elaboram essa pergunta, entretanto o caráter especulativo de sua atividade intelectual concede à filosofia a oportunidade de exceder os temas cósmicos, naturais e hu-manos, problematizando a si mesma com esta interrogação: o que é o conhecimento?

Em sua história, a filosofia reflete sobre o conhecimento, transformando-o em tema específico de suas especulações, investigado em um horizonte de instigantes problemas como:

• O que realmente caracteriza o conhecimento?• Como se diferencia o conhecimento da simples opinião?• Quais critérios definem como verdadeira uma declara-

ção sobre a realidade?• Os seres humanos são capazes de conhecer comple-

tamente a realidade?• O conhecimento se inicia pela razão ou pelos sentidos?

OLEKSANDR TKACHUK | DREAMSTIM

E

O pensador, estátua em bronze do escultor

francês Auguste Rodin, de 1904. Na

atividade filosófica, o pensamento

questiona o próprio conhecimento,

refletindo sobre suas possibilidades e seus

hipotéticos limites.

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Na filosofia moderna, verifica-se a delimitação do conheci-mento como campo particular de investigações, área denomi-nada teoria do conhecimento, gnosiologia ou epistemologia. É possível observar, porém, que suas raízes remontam ao prin-cípio da filosofia na Antiguidade, uma vez que a compreensão do conhecimento como construção racional desdobra-se na problematização filosófica do próprio conhecimento.

É muito comum a utilização dos termos gnosiologia e epistemologia como sinônimos, ambos nomeando a teoria do conhecimento. Entretanto, em sentido rigoroso, a ex-pressão gnosiologia possui maior alcance semântico em relação à palavra epistemologia. Gnosiologia refere-se à pesquisa filosófica sobre o conhecimento em seu amplo conjunto de problemas, isto é, consiste na teoria do co-nhecimento. Epistemologia designa a reflexão filosófica centrada na ciência, examina especificamente os funda-mentos, os métodos e as práticas científicas.

Na filosofia pré-socrática, precisamente no discurso cos-mológico de Heráclito de Éfeso e na ontologia de Parmênides de Eleia, insinuam-se as primeiras reflexões acerca do co-nhecimento. Heráclito, assumindo o devir, fluxo de constan-tes transformações, como a essência do real, sentencia que os sentidos são fonte de confusões, o que conduz à ilusão da estabilidade, de que os seres permanecem idênticos a si mesmos quando, na realidade, estão em incessante conver-são para seus opostos. Parmênides, com sua concepção de que o pensamento é necessariamente pensamento do ser, ser uno, eterno, indivisível e imutável, declara como ilusórios os fenômenos de transformação identificados no mundo por meio dos sentidos. Tanto em Heráclito quanto em Parmênides, apesar do antagonismo radical entre suas teses filosóficas, nota-se uma dissociação entre aparência e realidade, bem como o desprezo pelos sentidos como fonte de conhecimen-to – e este teria seu verdadeiro ponto de partida na razão.

As questões concernentes ao conhecimento expan-dem-se em meados do século V a.C., com os sofistas e com Sócrates. Sofistas e Sócrates renunciam às especulações cosmológicas e transferem o ser humano para o centro das problematizações filosóficas. Na cidade de Atenas, no auge de sua organização sociopolítica democrática, os sofistas concentram-se nas temáticas éticas e políticas. Atuam como professores de retórica cuja tarefa é o desenvolvimento das habilidades discursivas entre os cidadãos, preparando-os para o exercício de suas atividades cívicas. A retórica dos sofistas não se compromete com a identificação de critérios universais de distinção entre o falso e o verdadeiro, com a busca de verdades universais que devem ser racionalmente admitidas por todos os seres humanos. Exemplar a esse res-peito são as antilogias do sofista Protágoras de Abdera. Elas consistem na apresentação de raciocínios diferentes e opos-tos sobre um mesmo tema, hipóteses igualmente racionais e que se excluem reciprocamente, sem que exista um critério externo para atestar a verdade de um argumento e a falsidade de outro. Ainda mais incisivas são as declarações do sofista Górgias de Leontinos, segundo as quais o ser não existe; se existisse, não poderia ser conhecido; e, se pudesse ser co-

nhecido, não seria passível de comunicação pela linguagem. Dessa forma, os sofistas colocam em dúvida a possibilidade de o conhecimento encontrar verdades universalmente acei-tas pela humanidade.

Diferente é a atitude filosófica de Sócrates. Para ele, os sofistas não realizam uma autêntica atividade filosófica, dado que esta, de acordo com a perspectiva socrática, define-se pela busca sistemática de verdades universais. Sua proposta filosófica, que articula a tentativa de readequação do logos ao ser com o esforço pela identificação da finalidade da vida humana, tem na aceitação inicial da ignorância o seu pressu-posto. Trata-se de um movimento de remoção dos falsos sa-beres, as opiniões convencionalmente expressas pelos seres humanos acerca de diferentes aspectos da realidade, com a intenção de lançar as bases para um saber verdadeiro, cons-truído mediante diálogos racionais.

A reflexão sobre o conhecimento recebe considerável es-paço nas teorias filosóficas de Platão (427-347 a.C.) e de Aris-tóteles (384-322 a.C.), filósofos que, inspirados pela propos-ta socrática, desenvolvem complexos sistemas metafísicos para explicar o conjunto da realidade. Nos textos de Platão, o problema do conhecimento é tratado na elaboração de sua Teoria das Ideias, com sua concepção ontológica articulada em dois níveis, o plano sensível e o plano inteligível. Sob o prisma platônico, o conhecimento pleno requer a superação dos sentidos em direção à contemplação racional dos seres em si, das ideias. A filosofia de Aristóteles, com suas proble-matizações sobre o conhecimento, efetua a análise metódica das formas de raciocínio existentes, iniciando os estudos de lógica, e classifica o conhecimento em ciências teoréticas (fí-sica e metafísica), ciências práticas (ética e política) e ciên-cias produtivas (técnicas).

As questões sobre o conhecimento persistem nas escolas filosóficas da época helenística e recebem nova orientação na filosofia medieval, sob a ascendência da cultura cristã. O pri-mado cultural do cristianismo impõe a filósofos como Agosti-nho de Hipona (354-430) e Tomás de Aquino (1225-1274), a necessidade de se examinarem as relações entre saber reve-lado e saber racional. As teorias filosóficas medievais procu-ram conciliar o saber revelado com o conhecimento racional, ou seja, as verdades da teologia com as verdades atingidas por intermédio da atividade filosófica.

No contexto da filosofia moderna, as interrogações filo-sóficas em torno do conhecimento são situadas no diálogo com as práticas científicas dedicadas a identificar experi-mentalmente as leis da natureza. O britânico Francis Bacon (1561-1626) e o francês René Descartes (1696-1650) lan-çam-se à busca de fundamentos sólidos para o desenvolvi-mento de conhecimentos seguros da realidade e, para tanto, investigam as causas dos enganos, dos apenas aparentes saberes humanos.

Descartes, embora reconheça o rebuscamento intelec-tual legado pela cultura filosófica precedente, rejeita seu valor de verdade, diagnosticando que as diferentes filoso-fias não produziram conhecimentos sólidos e efetivamente úteis para a humanidade. Segundo esse filósofo, a verdade não reside também nas diferentes tradições culturais das sociedades humanas, sendo necessário, isto sim, conduzir corretamente o pensamento para a obtenção de ideias cla-ras, de conhecimentos fundamentados em certezas sobre o mundo.

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Bacon, por seu turno, explica os erros humanos no tocan-te ao conhecimento em sua teoria dos ídolos, falsas noções sobre a realidade, discriminadas em ídolos da tribo, ídolos da caverna, ídolos do foro e ídolos do teatro. Os ídolos da tribo procedem da natureza humana, com sua inclinação a reduzir a complexidade à simplicidade, na suposição de que o inte-lecto é capaz de identificar regularidades na natureza com base no que é imediatamente percebido pelos sentidos. Essa postura constitui a fonte de superstições como a astrologia, que submete a observação dos fenômenos da natureza à confirmação de suas previsões. Os ídolos da caverna reme-tem à compreensão das coisas de forma muito particular pelos seres humanos individuais, com sua propensão a inter-pretar a realidade com base em suas crenças, suas preferên-cias, suas pré-noções e seus preconceitos, a saber, confor-mam os objetos investigados às suas expectativas pessoais. Os ídolos do foro são provenientes das relações interpessoais e da ambiguidade imanente à linguagem: a mesma palavra pode ter significados distintos para sujeitos diferentes e, além disso, frequentemente se confunde o que se diz com o que existe. Quanto a esse último aspecto, o intelecto elabora termos abstratos que se referem a elementos inexistentes, imergindo em investigações que o afastam da realidade. Por fim, os ídolos do teatro compreendem os sistemas filosóficos, que, para Bacon, são abstrações conceituais sem relações genuínas com a realidade do mundo: são ficções intelectuais, assim como o são os textos teatrais. Francis Bacon propõe, então, a substituição dos ídolos por uma experiência escritu-rada e metodicamente conduzida para a formação de conhe-cimentos verdadeiros acerca da natureza.

Como destacado anteriormente, na filosofia moderna a teoria do conhecimento se estabelece como área própria de pesquisas filosóficas, à medida que, nas reflexões de muitos dos filósofos desse período, concede-se prioridade ao pro-blema do conhecimento. Dito de outra forma, considera-se o tema do conhecimento como prioritário em relação às de-mais questões pertencentes ao repertório investigativo da filosofia. De maneira geral, os filósofos especializados em gnosiologia afirmam que o inglês John Locke é o verdadeiro fundador da teoria do conhecimento porque, em seu estudo intitulado Ensaio acerca do entendimento humano, examina detalhadamente a capacidade humana de conhecimento, questionando seus limites e os aspectos relativos à origem, à essência e à certeza do conhecimento.

A. A caracterização filosófica do conhecimentoA teoria do conhecimento versa sobre o conhecimento

propositivo, o conhecimento de algo, capaz de relatar como algo é, exprimindo-se, assim, em uma declaração a respeito do objeto do seu conhecimento. O conhecimento propositivo distingue-se do conhecimento referente a como fazer algo, que se relaciona com uma habilidade procedimental perti-nente à realização de determinada tarefa.

No âmbito da gnosiologia, predomina a compreensão do conhecimento propositivo como uma relação entre sujeito cognoscente e objeto cognoscível, isto é, entre sujeito capaz de conhecer e objeto passível de ser conhecido. O sujeito, pensado não sob o ponto de vista do sujeito individual, mas sim da consciência humana em sua capacidade de conheci-mento, relaciona-se com objetos reais que se apresentam à sua experiência a partir de sua existência efetiva e exterior

– como os seres e acontecimentos da natureza – e com ob-jetos ideais, exclusivamente pensados como as estruturas matemáticas e as figuras geométricas. Em uma relação de conhecimento, o sujeito apreende conceitualmente o objeto, representa-o em seu pensamento tal como ele é. Em uma ver-dadeira relação de conhecimento, com seus diferentes graus de profundidade e de extensão, o objeto é pensado pelo sujei-to como ele efetivamente é.

Sendo assim, o conhecimento realiza-se na correspon-dência do sujeito com o objeto, ou melhor, na concordância do conteúdo do pensamento com a realidade do objeto. Sob essa ótica, somente há conhecimento perfeito ou completo quando o sujeito assimila a realidade de seu objeto em sua máxima extensão e profundidade. Pode-se dizer que quem explica de maneira apropriada as razões das diferentes es-tações climáticas tem um conhecimento parcial da natureza. Um conhecimento completo ou perfeito da natureza exige que o sujeito conheça o conjunto dos fenômenos naturais, a multiplicidade de seres vivos e suas relações, as supostas causas fundamentais de toda a dinâmica natural, a essência da natureza, enfim, exige a apreensão conceitual da natureza em sua extensão e profundidade máximas. Afirmar, portanto, que a humanidade conhece plenamente a natureza não é algo plausível, apesar da longa tradição filosófica e dos mo-dernos conhecimentos científicos.

A concepção filosófica tradicional de conhecimento, amparada pelos textos de Platão sobre o tema, entende que crença, justificação e verdade são elementos impres-cindíveis do conhecimento ou, em outras palavras, define o conhecimento como a crença justificada e verdadeira. Uma crença consiste em uma espécie de representação mental da realidade, a convicção a respeito de algo. A crença é aspec-to indispensável do conhecimento – seria uma contradição afirmar, por exemplo, saber da existência da lei da gravidade e, no entanto, não acreditar que a lei da gravidade realmente exista. A crença isolada, entretanto, não proporciona garantia de conhecimento. Para ser conhecimento, uma crença deve ser justificada e verdadeira. A justificação de uma crença con-siste em um conjunto suficiente de indícios racionais e empí-ricos, de evidências fornecidas pela razão e pela experiência, que sustentem a sua validade. Uma crença justificada será verdadeira se o pensamento do sujeito representar correta-mente a realidade do objeto do seu conhecimento.

A análise tradicional do conhecimento também admite a existência de uma crença falsa, mas justi-ficada. Com efeito, esse tipo de crença parece mui-to comum. No passado, era justificável que muitos cressem que a Terra é plana. A crença deles era errada, como sabemos, mas, dadas as melhores informações de que então dispunham, tinham ra-zões justificadas para sustentar essa crença. [...] Muito embora eles atendessem à condição de crença e à condição de justificação, não atendiam à condição de verdade para terem conhecimento.

MOSER, Paul K.; MULDER, Dwayne H.; TROUT, J. D. A teoria do conhecimento: uma introdução temática.

São Paulo: Martins Fontes, 2004. p. 19.

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A definição do conhecimento como crença justificada e verdadeira, embora bastante difundida nos círculos filosófi-cos, não é unânime entre os estudiosos, inexistindo sequer o consenso sobre a noção de verdade. Afinal, o que é a ver-dade? Esse problema filosófico, fundamental na gnosiologia, mobiliza reflexões e interpretações muito divergentes entre si. Correspondência, relativismo e pragmatismo são algumas das teses filosóficas sobre a verdade.

B. Diferentes concepções filosóficas da verdadeNa caracterização tradicional de conhecimento, a tese

da verdade foi mencionada como correspondência entre su-jeito e objeto. É a concepção de que a verdade se realiza na confluência entre o pensamento e as características reais do mundo, da adequação entre o intelecto e a realidade. De acordo com essa noção, uma proposição é verdadeira se ex-prime uma representação mental exata do objeto, isto é, se retrata conceitualmente o objeto como ele é de fato. Em sen-tido contrário, uma proposição é falsa se atribui ao objeto do conhecimento características que não são suas, quer dizer, se não apresenta de forma discursiva o objeto como ele efe-tivamente é.

Diversa é a concepção relativista de verdade. O relativis-mo posiciona a verdade nos sujeitos humanos individuais e nos grupos humanos, recusando o caráter de universalidade da verdade. Em termos mais claros, recusa a ideia de que as verdades se estabeleçam em uma dimensão universal, exi-gindo sua aceitação por todos os seres humanos que utilizam apropriadamente sua capacidade de conhecimento. Sob o ponto de vista relativista, diferentes sujeitos, pautando-se pelos mesmos critérios para conhecer o mundo, podem atin-gir diferentes conclusões sobre a realidade.

Precursor do relativismo é o sofista Protágoras, com sua observação de que o ser humano individual é a medida de todas as coisas, das que são e das que não são. Assim, uma única proposição é verdadeira para alguns, enquanto é falsa para outros. Expandida para o plano cultural, as verdades de uma sociedade humana podem ser falsidades para outras culturas. Na perspectiva relativista, portanto, não há nenhum elemento exterior aos seres humanos que se constitua como critério de verdade, ou seja, não há verdades universais e ab-solutas, mas sim verdades relativas.

Entre filósofos contemporâneos como William James (1842-1910), John Dewey (1859-1952) e Richard Rorty (1931-2007), desenvolve-se a filosofia pragmatista, que desloca a verdade para a dimensão de suas consequências práticas na vida social. Considerando o ser humano como ser cuja vontade é orientada para a prática e, assim sendo, no qual o intelecto está subordinado à ação, o pragmatismo compreende a verdade na convergência do pensamento com o que é vantajoso, benéfico e útil à sociedade. Nesse sentido, algo é verdadeiro quando torna melhor a vida huma-na, articulando os múltiplos interesses que se manifestam na sociedade – a verdade não tem um conteúdo eterno e imutável; ao contrário, é produzida e modificada na dinâmica social da humanidade.

C. Dogmatismo e ceticismoAs discussões filosóficas em torno da verdade relacio-

nam-se com o problema das possibilidades e dos limites do conhecimento humano. Pode-se conhecer efetivamente a

realidade? Os indivíduos são capazes de conhecer total ou apenas parcialmente a realidade? As respostas a essas per-guntas são diversas, compondo um arco que se estende do pressuposto de que a humanidade pode conhecer perfeita-mente o conjunto do real até a concepção de que os seres humanos jamais atingem um conhecimento verdadeiro de qualquer aspecto do mundo. Entre essas posturas extre-mas, elaboram-se perspectivas intermediárias, conforme as quais o conhecimento contempla alguns fenômenos do mundo, ao mesmo tempo que não se aplica a outros níveis da realidade. Por exemplo, seria possível conhecer determi-nadas leis naturais, mas não seria possível explicar a essên-cia da natureza.

Em seu início pré-socrático, a filosofia não conside-ra possíveis limites para o conhecimento, depositando absoluta confiança na capacidade humana de conhecer a physis. Pode-se afirmar que os primeiros momentos da filosofia, em que pese sua natureza crítica e dialógica, são marcados pelo dogmatismo. A atitude dogmática, no senti-do mais usual da expressão, define-se pela noção de que há verdades indiscutíveis, que não se prestam ao exame racional – exemplares, a esse respeito, são os dogmas re-ligiosos, pontos doutrinários de uma religião, que devem ser simplesmente acatados na pressuposição de sua ver-dade. No vocabulário filosófico, o dogma consiste na pré-via convicção de que não existem limites cognitivos para a humanidade. Dito de outra forma, o dogma consiste na ausência de problematização do conhecimento. No século XVIII, o filósofo alemão Immanuel Kant utiliza a expressão dogmatismo em referência a todas as filosofias que não examinam a própria razão e seus limites, muitas vezes ex-trapolando para temáticas metafísicas que não se situam ao verdadeiro alcance do conhecimento.

Muito diferente do dogmatismo é o ceticismo, que nega a capacidade humana de conhecimento. Em sua versão abso-luta, o ceticismo declara que os seres humanos jamais atin-gem uma verdade sobre o mundo. A manifestação primor-dial do ceticismo está nas declarações do sofista Górgias: o ser não existe; se existisse, não poderia ser conhecido; se pudesse ser conhecido, não poderia ser comunicado. É na época helenística da filosofia grega que o ceticismo se pronuncia mais claramente como pensamento de uma escola filosófica, destacando-se a atuação de Pirro de Élis (360-270 a.C.). Para o ceticismo pirrônico, as opiniões dos seres humanos jamais são falsas ou verdadeiras, não se pode atestar a verdade ou a falsidade das diferentes propo-sições sobre o mundo. Com essa tese, a escola cética não apenas recusa a condição de possibilidade do conhecimen-to, o critério de distinção entre o falso e o verdadeiro, como pretende, ainda, evitar a objeção apresentada ao ceticismo: a contestação de que a afirmação da não existência da ver-dade implica, contraditoriamente, uma verdade: a verdade não existe.

Na história da filosofia, o ceticismo assume formas mo-deradas ou parciais, como é o caso de muitos filósofos mo-dernos que asseguram a possibilidade de conhecimento de determinadas dimensões da realidade – os fenômenos da natureza, por exemplo – e negam o conhecimento de temas metafísicos, situados além de nossa experiência observá-vel, tais como as hipóteses acerca de uma causa primeira do mundo e de imortalidade da alma humana.

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É imprescindível notar que, independentemente de se concordar ou não com a postura cética, o ceticismo contribui para a atividade filosófica ao exigir dos filósofos que procuram a verdade um exame mais atento de seus métodos e o desenvolvimento de sólidas justificativas para suas teorias. Emblemático quanto a esse aspecto é o ceticismo metódico utilizado pelo filóso-fo René Descartes em sua busca por verdades seguras. Com o propósito de encontrar ideias comprovadamente verdadeiras, Descartes exercita de forma radical a dúvida, considerando de início falso tudo aquilo que é minimamente sujeito à dúvida. A proposta desse filósofo, então, diferencia-se bastante do ceticismo, porque tem como fim a elucidação de conhecimentos autênticos e inquestionáveis. Para encontrar essas verdades, ele se apropria do ceticismo como ponto de partida, convertendo--o na aplicação sistemática da dúvida, procedimento este que aceita como verdade evidente aquilo que se revela indubitável. Com esse ceticismo metódico, Descartes observa que, inegavelmente, existe um ser que duvida de tudo, ou seja, atinge sua primeira verdade, expressa nos seguintes termos: penso, logo existo.

01. UEL-PRLeia o texto a seguir.

Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei em princípios tão mal assegurados não podia ser senão mui duvidoso e incerto; de modo que me era necessário tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões a que até então dera crédito, e começar tudo novamente desde os funda-mentos, se quisesse estabelecer algo de firme e de constante nas ciências.

DESCARTES, R. Meditações metafísicas. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. 93. (Os pensadores)

O desejo de evitar o erro, o caos e buscar a certeza, a ordem, por meio de um método de conhecimento, são marcas distintivas da modernidade. A respeito do problema do conhecimento e do método em René Descartes, assinale a alter-nativa correta.

a. A decisão de tentar desfazer-se das opiniões duvidosas e incertas ampara-se em uma revelação divina, pois, ao pen-sar, o homem encontra Deus na origem do próprio pensamento, sendo Ele a primeira certeza fundadora da ciência.

b. A dúvida é uma espécie de afecção episódica que toma conta dos que pensam demasiadamente no problema dos fundamentos do conhecimento, mas cuja concepção e prática possuem uma importância limitada.

c. A dúvida metódica pretendia inviabilizar a metafísica, uma vez que certezas científicas e verdades metafísicas, além de possuírem âmbitos de vigência distintos, também dizem respeito a domínios excludentes do conhecimento.

d. O método é um procedimento por meio do qual os dados da experiência são acolhidos, tratados cientificamente e, após o processo de depuração e de crítica, são recolocados em sua relação com o mundo, transformando nossos juízos.

e. A decisão inaugural a ser radicalizada pela dúvida, tornada metódica, por meio da qual surgirá a certeza, é o ponto de partida da crítica à tradição, seja na figura dos conhecimentos incertos ou das falsas opiniões.

ResoluçãoDesapontado com os supostos saberes tradicionais, René Descartes se dedica a identificar a condução adequada do

pensamento em direção à verdade. Em sua busca por ideias claras e distintas, ou seja, por conhecimentos verdadeiros, uti-liza a dúvida de forma extensa e radical, aplicando-a sobre o conjunto da realidade e seus elementos. Trata-se do ceticismo metódico, a saber, o ceticismo que tem por finalidade encontrar algo cuja verdade seja evidente, resistente ao exercício da dúvida ou, em outros termos, aquilo sobre o que não se pode realmente duvidar.

Alternativa correta: E.

APRENDER SEMPRE 31

D. A discussão sobre a fonte do conhecimentoAspecto central nas reflexões gnosiológicas, a questão sobre a verdadeira fonte do conhecimento humano consiste em tema

controverso na história da filosofia. Afinal, qual a origem do conhecimento? O conhecimento é proveniente da razão? É apriorísti-co, anterior às experiências formadas pelos sentidos? O conhecimento procede dos sentidos? É a posteriori, necessariamente an-tecedido pela experiência? Em torno desses problemas, desenvolveram-se concepções contrárias, o racionalismo e o empirismo.

Para o racionalismo, tese defendida por filósofos como Platão e Descartes, o conhecimento reside em princípios apriorís-ticos da razão, ou seja, na intelecção logicamente anterior a qualquer experiência produzida pelos sentidos. Sob a ótica racio-nalista, as ideias que contêm a realidade dos seres são inatas, estão originariamente presentes nos seres humanos e, dessa forma, não são aquisições da vida social ou derivações daquilo que recepcionamos com os nossos sentidos, das experiências proporcionadas pela visão ou pelo tato, por exemplo. Os sentidos são compreendidos, isto sim, como fonte de enganos, de falsas interpretações da realidade. Isso não significa que o racionalismo despreze completamente os sentidos; aliás, é muito comum entre os filósofos racionalistas a admissão de que os fenômenos sensoriais contribuem, de forma complementar, para a efetivação do saber previamente contido nos seres humanos, na mente humana.

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Para o racionalismo, os sentidos não são confiáveis, não são o ponto de partida do conhecimento.

Em perspectiva oposta, o empirismo rejeita a existência de princípios de conhecimento apriorísticos e desvinculados do campo sensorial, declarando que o verdadeiro conheci-mento é necessariamente a posteriori, a saber, fundamenta-do na experiência sensitiva. Para os empiristas, os elementos recolhidos do mundo pelos nossos sentidos são a base das ideias desenvolvidas pelo intelecto humano. Em outras pala-vras, o empirismo reconhece nos seres humanos a capacida-de racional de elaborar os dados provenientes dos sentidos em pensamentos referentes à realidade do mundo. Com sua origem na filosofia antiga, a tese gnosiológica empirista difun-de-se e desenvolve-se consideravelmente na filosofia moder-na, sendo Francis Bacon, John Locke e David Hume alguns de seus principais representantes.

A oposição entre racionalismo e empirismo não esgota o debate em torno da origem do conhecimento – o criticismo de Immanuel Kant (1724-1804) consiste em profundo em-preendimento filosófico disposto a superá-la. Tampouco é certo dizer que essa disputa teórica esteja filosoficamente decidida na atualidade. Prosseguem as investigações e as discussões na filosofia contemporânea, não apenas a respei-to dessa questão, mas de todos os problemas contemplados pela teoria do conhecimento.

4. Temas de filosofia: ética e políticaNa antiga filosofia grega, em meados do século V a.C., a

transferência dos seres humanos para o primeiro plano do pensamento especulativo anuncia a ética e a política como campos temáticos nucleares da atividade filosófica. Ética e fi-losofia política são áreas de pesquisa diretamente vinculadas ao mundo da prática, à realidade dos seres humanos em so-ciedade, com seu universo de valores, suas relações de poder, suas noções de justiça e suas formas de organização social.

A ética é o estudo filosófico da moral, dos seres humanos como seres morais. A moral é imanente à vida humana em sociedade, regida por valores que orientam as ações indivi-duais e instituem normas de conduta no âmbito das relações sociais. Compreende valores como bem e mal, certo e errado, justo e injusto, valores estes que concernem aos comporta-mentos humanos, em suas intenções e em seus desdobra-mentos sociais. Esses princípios valorativos manifestam-se em juízos de valor, positivos ou negativos, acerca das práticas individuais em suas implicações sociais e fornecem os con-teúdos das regras de convivência, normas que prescrevem as formas supostamente apropriadas de comportamento huma-no em sociedade.

Muitas vezes utilizado como sinônimo de moral, o ter-mo ética, em sua acepção filosófica predominante, nomeia a reflexão teórica sobre os problemas morais. A ética con-siste no estudo filosófico dos fundamentos da moral, exa-minando racionalmente as questões que lhe são pertinen-tes. Qual a origem dos valores morais? O que é o bem? Os valores morais possuem existência objetiva ou são apenas convenções da vida em sociedade? O que caracteriza o ato moral? O que caracteriza a articulação entre individual e coletivo nos domínios da moralidade? O que é virtude? In-dagações dessa natureza formam o repertório especulativo da ética.

A política, em sua definição geral, refere-se ao exercício do governo em uma sociedade ou, em linguagem contem-porânea, às relações entre Estado – o poder político insti-tucionalizado – e a sociedade. A filosofia teoriza a política com base no questionamento dos seus fundamentos. Os humanos são seres naturalmente políticos ou as sociedades políticas são construções artificiais de um contrato social? O poder político é sempre legítimo? Há formas justas e formas injustas de organização política? Qual a relação entre poder político e desigualdades sociais? A política visa ao bem co-mum ou trata-se de atividade essencialmente regulada pelo domínio de determinado grupo sobre o conjunto da socieda-de? Os conflitos sociais são inerentes à dinâmica política ou o poder político autêntico realiza a harmonia social? Em torno desses problemas, desenvolvem-se diferentes teorias no ho-rizonte da filosofia política.

Ética e filosofia política são áreas distintas do saber filosófico. A filosofia moral versa sobre motivações indivi-duais e relações pessoais, a esfera privada da vida, que não são, pelo menos diretamente, envolvidas pela política. A filosofia política, por sua vez, investiga relações de poder vigentes em um uma dimensão pública que não se restrin-ge aos fenômenos da moralidade. Apesar dessas diferen-ças, são notáveis os pontos de confluência entre esses campos de reflexão filosófica, a intersecção entre ética e filosofia política. Ambas incidem na antropologia filosófi-ca, à medida que localizam as bases da moral e da política em digressões sobre a natureza humana e as possibilida-des de realização do ser humano. Com igual intensidade, especulam acerca de conceitos como bem e justiça, assim como as recíprocas interferências entre relações pessoais e os círculos públicos da vida em sociedade. Em certo sen-tido, uma concepção ética deriva em proposições acerca da forma justa de organização política da sociedade e, da mesma forma, uma teoria política implica determinadas noções éticas.

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Ética e filosofia política são áreas da pesquisa filosófica diretamente articuladas à vida dos seres humanos em sociedade.

A. A filosofia e as questões moraisOs fenômenos morais realizam-se na articulação entre

o social e o individual, a sociedade e os indivíduos. O que confere teor moral à ação de um indivíduo é sua repercussão social, o modo como sua prática afeta, de forma positiva ou negativa, a vida de outras pessoas, e os comportamentos dos seres humanos são moralmente avaliados segundo os parâmetros dominantes em um grupo social ou sociedade. Para que uma conduta possa receber uma valoração moral, é necessário existir uma margem, ainda que mínima, de ini-ciativa individual. É preciso que o sujeito que realiza um ato específico tenha estado, antes da efetivação de sua conduta, diante de alternativas, isto é, que sua ação seja resultado de uma escolha individual.

A liberdade, portanto, é precondição da moralidade. Na sua ausência, torna-se inconcebível a existência de sujeitos moralmente autônomos e responsáveis por si mesmos e por suas ações. Recusando a noção de liberdade, encontra-se o determinismo absoluto, teoria defendida por alguns filóso-fos materialistas franceses do século XVIII, como D’Holbach (1723-1789) e La Mettrie (1709-1751). Essa versão do ma-terialismo identifica o conjunto da realidade natural e huma-na com uma completa e complexa conexão de causalidades, sucessivas relações de causa e efeito que explicam a tota-lidade dos acontecimentos da natureza e da humanidade, acontecimentos, portanto, necessários, que em nada pode-riam ser diferentes do que são. Sob essa ótica determinista, uma ação humana não decorre exatamente de uma decisão individual, sendo, ao contrário, um efeito necessário de uma longa série causal. Para o determinismo absoluto, então, não há sujeitos definidos por sua livre vontade, capazes de efe-tuar escolhas.

A ideia de liberdade é indispensável para as teorias éti-cas. O filósofo grego Aristóteles, em seu livro Ética a Nicôma-co, discrimina as ações humanas em involuntárias e voluntá-rias. Involuntárias são as ações que não têm sua causa como seu protagonista, ou seja, sua origem é externa ao agente – por exemplo, em situações em que alguém é completamente coagido por outras pessoas, sendo obrigado a fazer algo que não é consoante à sua vontade. Ações voluntárias são as que realmente procedem do seu agente, originam-se do sujeito

que as pratica. Para esse filósofo, porém, nem todas as ações voluntárias expressam escolhas. São voluntárias as condutas que procedem predominantemente das paixões e dos afetos de um ser humano individual – por exemplo, uma conduta agressiva, proveniente de sua ira –, mas não são escolhas. Escolha, no vocabulário filosófico aristotélico, corresponde ao plano da racionalidade. É a ação voluntária procedida pela deliberação, pelo exame racional das possibilidades apresen-tadas por uma situação particular. Dessa forma, apenas os se-res humanos são, de fato, livres; apenas a humanidade existe na esfera da moralidade.

Na filosofia moderna, a teoria ética do alemão Immanuel Kant (1724-1804) procura conciliar determinismo e liberda-de. Para Kant, os seres humanos, em sua condição de seres naturais, são parcialmente submetidos às leis da natureza. Com sua inteligência, porém, projetam-se além da natureza, afirmam sua liberdade em relação às determinações naturais. De forma diversa dos seres irracionais, que existem sob a he-teronomia das leis naturais e cujos comportamentos, con-sequentemente, são absolutamente regidos por causas que lhes são exteriores, os seres humanos compõem um reino dos fins, instituído por regras ditadas pela razão. Como seres racionais, os seres humanos são capazes de identificar leis morais de alcance universal – denominadas pelo filósofo de imperativos categóricos –, leis que devem prevalecer sobre as inclinações sensíveis do indivíduo.

No sistema filosófico de Friedrich Hegel (1770-1831), a liberdade não é pensada sob o ponto de vista estrito dos indivíduos ou da humanidade, mas sim na dimensão da tota-lidade realizada pelo espírito, a razão. De acordo com Hegel, a história humana exprime o movimento dialético da razão, marcado por contradições e superações, em direção à sua forma absoluta. O Estado contemporâneo é a finalidade para a qual tende o espírito universal: é a explicitação da razão no mundo. Conjugando interesses particulares e interesses ge-rais, a moderna forma de organização sociopolítica suprime a oposição entre liberdade e necessidade, estabelecendo uma eticidade que assegura a confluência entre vontade objetiva e vontade subjetiva. A liberdade efetiva-se plenamente na identidade entre a vontade dos seres racionais e as leis fixa-das pelo Estado.

No século XX, a liberdade recebe um conteúdo acen-tuadamente existencialista com o filósofo Jean-Paul Sartre (1905-1980). Em sua obra O existencialismo é um huma-nismo, Sartre sentencia que o ser humano é condenado à liberdade. Rejeitando a concepção criacionista, segundo a qual o ser humano é uma criação divina, esse filósofo des-carta também a ideia de uma natureza humana universal, quer dizer, uma essência ou substância previamente pre-sente em todos os seres humanos. Em sentido inverso às antropologias filosóficas tradicionais, centradas na noção de uma essência de humanidade que se realizaria em todos os seres humanos individuais, Sartre declara que a existência precede a essência: cada ser humano é inteiramente respon-sável por construir a si mesmo, elaborar o seu ser, em suas escolhas. Em relação às escolhas morais, não compete aos indivíduos recorrer a parâmetros exteriores, critérios exter-nos que justifiquem suas decisões: trata-se de uma escolha exclusivamente sua e com a qual, porém, ele escolhe toda a humanidade, considerando seu projeto existencial pertinen-te a todos os seres humanos.

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01. UPELeia o texto a seguir, referente à liberdade:

Afinal, “o homem é livre ou determinado?” A questão assim colocada gera um falso pro-blema. Na verdade, o homem é determinado e livre. É preciso considerar os dois polos contra-ditórios, superando o materialismo mecanicista, bem como a tese da liberdade incondicional.

ARANHA, Maria Lúcia. Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1996. p. 299. Adaptado.

Com relação a esse assunto, é correto afirmar que:a. ser livre é agir da forma que se quer, desconside-

rando qualquer determinação causal. O homem é detentor do livre-arbítrio.

b. o conceito de liberdade é simples: podemos fazer tudo o que queremos, somos artífices de nossa vontade.

c. a liberdade é condicionada, é infinita ou absolu-tamente determinada por uma série de valores preestabelecidos.

d. o fator preponderante que restringe a liberdade é ser o indivíduo criado no seu isolamento.

e. a liberdade não é gratuita. A liberdade resulta de uma árdua tarefa que o homem deve conquistar.

ResoluçãoA solução da questão deve se basear no conteúdo

de seu texto de referência, que considera a articulação entre o ser humano como ser, sob certos aspectos, de-terminado e simultaneamente capaz de projetar-se livre-mente, acima de suas determinações específicas. Nesse sentido, a liberdade é pensada como permanente con-quista humana.

Alternativa correta: E

APRENDER SEMPRE 32

Essa posição de Sartre, que se diferencia sutilmente do relativismo moral, remete a um debate presente na ética des-de suas origens gregas: os valores morais existem objetiva-mente ou são simples convenções da vida em sociedade?

A postura sofística inicia o relativismo moral ou o subjeti-vismo axiológico – axiologia é sinônimo de teoria dos valores –, conforme o qual o bom, o justo e o moralmente certo, assim como seus correlatos negativos, o mal, o injusto e o moral-mente errado, são pura e simplesmente criações dos seres humanos em sociedade, ou seja, não existem independente-mente dessas convenções. Em termos morais, bem e mal se resumem ao que é definido de forma consensual no interior de um grupo social e de uma sociedade e que, no curso do tempo, pode ser modificado pelos seres humanos em suas relações sociais. Práticas moralmente condenáveis em uma sociedade são consideradas moralmente positivas em ou-tros povos, da mesma forma que, em uma mesma sociedade, condutas que recebem valor moral negativo em uma época determinada tornam-se moralmente positivas em um perío-do histórico posterior. Para os sofistas, não se trata apenas de constatar a diversidade moral vigente nas sociedades

humanas, mas de compreender que não há um critério exte-rior pelo qual esses diferentes conjuntos morais possam ser avaliados, isto é, não se aspira a uma moral universal, única para toda a humanidade. Sendo assim, os sofistas entendem que a areté – palavra grega traduzida como virtude, excelên-cia humana – consiste no desenvolvimento das habilidades argumentativas dos cidadãos e em sua atuação em um corpo cívico no qual se elaboram as decisões mais pertinentes às circunstâncias históricas da sociedade.

Afirmar filosoficamente a existência objetiva de valores morais significa acreditar que, apesar da diversidade que se constata nas sociedades humanas, nas quais historicamente as noções valorativas de bem e mal comportam diferentes conteúdos, a inteligência humana tem condições de identifi-car princípios de moralidade imutáveis e universalmente váli-dos, concernentes a todos os seres humanos. Segundo essa postura filosófica, o objetivismo axiológico, os conceitos de bom, de justo e de moralmente certo existem em si mesmos. É tarefa dos seres humanos encontrá-los de modo racional e, consequentemente, aplicá-los às suas condutas na vida em sociedade. Sócrates, com seu projeto filosófico de eliminação dos saberes aparentes e de persistente construção da verda-deira sabedoria, inaugura a tradição filosófica que intenciona alcançar o conhecimento pleno do bem. A filosofia socrática, caracterizada pela proposta de identificação da finalidade da vida humana, atribui o erro à ignorância e situa o conhecimen-to como condição necessária e suficiente para o ser humano conduzir-se de forma moralmente autônoma, em conformida-de com sua natureza e com valores morais absolutos.

A filosofia de Platão, inspirada pelo projeto filosófico de Sócrates, apresenta a primeira teoria ética sistemática pauta-da em sua tese de que a natureza humana, com sua faculda-de racional, é capaz de superar o plano sensível da realidade e conhecer as ideias – os seres em si, imutáveis e perfeitos –, das quais os seres corruptíveis, perecíveis, são reproduções imperfeitas. Na esfera inteligível, localizam-se os valores mo-rais plenos que devem regular a organização política e social dos seres humanos. O bem é a ideia suprema, condição fun-damental da inteligibilidade e do conjunto do real.

O bem é o valor fundamental e nuclear nas filosofias morais, conforme rege os diferentes comportamentos mo-rais valiosos, todos aspirando à sua realização. Sua concei-tuação é objeto de controvérsias entre os teóricos da moral, que divergem sobre a delimitação de sua natureza. Exemplos expressivos dessa discordância são as teses de Aristóteles e de Immanuel Kant. O primeiro considera a felicidade como o bem supremo, e o segundo declara a boa vontade como o bem incondicional.

Em sua concepção filosófica teleológica, que concede primazia à finalidade para a qual tendem os seres, Aristóte-les posiciona o bem como aquilo para o qual tudo é feito, e o bem excelente, supremo, completo é autossuficiente, um fim em si mesmo, jamais um meio para a efetivação de outra finalidade. Esse bem absoluto é a felicidade. Afinal, observa o filósofo, pode-se afirmar que muitos seres humanos pro-curam a satisfação de seus apetites, as riquezas materiais e o prestígio social como caminhos para a felicidade – ain-da que esses não sejam meios verdadeiros para obtê-la, mas não seria plausível dizer o contrário, que muitos seres humanos utilizam a felicidade como bem intermediário para atingir a saciedade dos desejos corporais, a riqueza e a honra.

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A felicidade é o fim almejado pelos seres humanos, a finali-dade da vida humana. Em que consiste a felicidade? De acor-do com Aristóteles, felicidade é o exercício ativo da alma em conformidade com seu princípio racional e com as virtudes, é a realização da natureza humana virtuosa no horizonte da sociedade política.

Immanuel Kant, em seu livro Fundamentação da me-tafísica dos costumes, define a boa vontade como um bem incondicionado e ilimitado. A boa vontade, compreendida basicamente como a disposição racional de agir por dever, é o único valor moral autorreferenciado, o único bem em si, independentemente de fatores externos ou de condições cir-cunstanciais que a envolvam. O filósofo sustenta essa afirma-ção na constatação de que todas as qualidades humanas que possamos identificar – coragem, inteligência e prudência, por exemplo – não são em si mesmo virtuosas, sendo moralmen-te valiosas somente se regidas pela boa vontade. Na teoria moral kantiana, a boa vontade é, então, o princípio moral supremo. Correspondendo à identificação racional do dever, isto é, à capacidade de atingir leis morais fixadas pela razão, a boa vontade não se origina na experiência. O princípio moral incondicional, a boa vontade, possui dimensão deontológica, não se circunscreve ao que de fato é, remetendo, isto sim, ao que deve ser.

B. A filosofia e as questões políticasA sociedade política é uma realização da natureza hu-

mana ou é o produto de um contrato social, ou melhor, é uma realidade natural ou artificial? Esse problema percorre as teo-rias políticas que se dividem entre aquelas que concebem a sociabilidade política como um dado natural da humanidade e as que conceituam a hipótese de uma natureza humana anterior e exterior ao universo das relações sociopolíticas. Em filósofos como Aristóteles e, em certo sentido, Karl Marx (1818-1883), a política existe como realidade natural dos seres humanos. Em filósofos como os contratualistas moder-nos, Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704) e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), a política provém de um pacto social que ultrapassa a condição de natureza.

Política: tudo aquilo que diz respeito aos cida-dãos e ao governo da cidade, aos negócios públi-cos. A filosofia política é, assim, a análise filosó-fica da relação entre os cidadãos e a sociedade, as formas de poder e as condições em que este se exerce, os sistemas de governo, e a natureza, a validade e a justificação das decisões políticas.

JAPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 1991, p. 197.

Aristóteles, nas primeiras páginas de seus escritos inti-tulados A política, registra em termos incisivos sua tese de que a sociedade política encontra-se inscrita na natureza hu-mana, ao sublinhar que não se pode conceber a humanidade senão no interior da vida social. Este filósofo declara que o ser humano, fora da sociedade política, não é precisamente um ser humano, mas sim um bruto ou um deus. Em sua filosofia, a vida na pólis é anterior, logica e ontologicamente, aos seres

humanos individuais: o ser humano é um ser naturalmente destinado a efetivar sua humanidade na política. Deve-se entender essa afirmação sob a ótica teleológica da filosofia aristotélica, que estabelece o primado do fim para o qual se dirigem os seres, ou seja, os seres humanos são seres cuja finalidade é a vida virtuosa em sociedade, que realizam sua natureza racional nas relações políticas.

Karl Marx, filósofo cuja preocupação principal é o conhe-cimento profundo da moderna sociedade capitalista, de suas contradições e das possibilidades de sua superação por uma forma igualitária de organização social, adota como premissa de suas reflexões o que considera empiricamente observável: os seres humanos nos modos pelos quais se relacionam uns com os outros e pelos quais efetuam seu intercâmbio com a natureza. Para Marx, não há uma natureza humana além do tempo, da sociedade e da história, a saber, a essência do ser humano é sua própria condição de ser social e histórico. Me-diante a atividade coletiva de transformação do meio natural, o trabalho, os seres humanos estão em permanente relação entre si, desenvolvendo-se historicamente a divisão da so-ciedade entre proprietários e não proprietários dos meios de produção, as classes sociais. Nesse processo sócio-histórico, o poder político institucionaliza-se no Estado, que é o instru-mento de realização dos interesses sociopolíticos da classe dominante. Para Marx, a luta de classes é o princípio explicati-vo das transformações históricas e sua filosofia prognostica o seu desfecho em uma sociedade sem classes, na qual o Esta-do desapareceria e o poder político assumiria a forma de um poder público exercido diretamente pela sociedade.

A concepção da política como realidade artificial, expres-são que a designa como instituição que excede a condição natural da humanidade, é claramente desenvolvida pelos chamados filósofos contratualistas modernos, Hobbes, Locke e Rousseau. Para Hobbes, a natureza humana é essencial-mente agressiva e ambiciosa, sendo que o ser humano indivi-dual, com sua pretensão infinita de poder, percebe os demais seres da espécie como obstáculos ao seu desejo. A condição de natureza, então, caracteriza-se pela propensão à guerra generalizada, situação em face da qual os seres humanos renunciam à sua liberdade e transferem suas pretensões de poder a um ser artificial, o Estado, poder absoluto e garantia da vida humana. Para Locke, os seres humanos são natural-mente proprietários de si e reconhecem racionalmente esse direito natural em seus semelhantes. Entretanto as eventuais disputas entre os indivíduos e as paixões delas derivadas produzem inconveniências significativas na condição de na-tureza. O contrato social, portanto, surge para preservar o que se encontra ameaçado na natureza, quer dizer, a legitimida-de do Estado repousa na defesa institucional dos direitos individuais. Para Rousseau, a natureza humana é definida pela identificação entre os seres da espécie, o sentimento natural de comiseração, que não se estende, porém, em vínculos sociais duradouros. O poder político, por sua vez, desdobra-se do domínio humano sobre a natureza e do de-senvolvimento de inclinações egoístas nos indivíduos da sociedade civilizada.

É certo que são notáveis as diferenças entre as teses desses filósofos, contudo, entre suas teorias, há semelhan-ças que configuram um núcleo comum de reflexões filosófi-cas: a conceituação de uma natureza humana exterior à vida em sociedade e a concepção de que a sociedade política é

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fundada por um contrato entre os seres humanos. As teorias contratualistas separam os conceitos de natureza humana e de sociedade política. Conforme o pensamento desses filóso-fos, os seres humanos não são seres naturalmente dispostos à convivência sociopolítica e a realidade social e política de-corre de um acordo estabelecido diante de dificuldades conti-das no estado de natureza.

A natureza da atividade política também é um tema im-portante para a filosofia. A política se define essencialmente pela busca do bem comum ou tem por meta central o exer-cício do poder? As relações políticas genuínas instituciona-lizam a harmonia do conjunto social ou os conflitos sociais são a verdadeira base da realidade política? As teorias que discorrem sobre esses questionamentos não produzem ne-cessariamente explicações unilaterais, que acolhem unica-mente um dos termos dessas questões. Entretanto é possível constatar diferentes tendências na apreciação do problema. Nos sistemas filosóficos de Platão e Aristóteles, por exemplo, predomina a noção de que, na legítima sociedade política, prevalecem a harmonia e o bem comum. Já Nicolau Maquia-vel (1469-1527), considerado pelos historiadores da filosofia o primeiro teórico moderno da política, compreende a política como expressão institucional dos conflitos sociais e como atividade centrada no exercício do poder.

Platão, em seu diálogo denominado A república, expla-na sobre a forma justa de sociedade política na descrição do governo dos filósofos, racionalmente capazes de discernir os verdadeiros valores morais e de exercer o poder em bene-fício da sociedade em seu todo, de sustentar a supremacia da razão na vida social. Formas de poder político distintas da república dos filósofos são, na perspectiva platônica, moda-lidades degeneradas de organização sociopolítica. Na teoria política de Aristóteles, formas de governo virtuosas são as que realizam o bem-comum – monarquia, aristocracia e república – e desvirtuadas ou corrompidas são aquelas que contemplam os interesses de um grupo social específico – tirania, oligar-quia e democracia.

Nicolau Maquiavel, cujo texto mais conhecido é O prínci-pe, classifica de idealistas as teorias filosóficas como as de Platão e Aristóteles, teses que versam sobre sociedades polí-ticas que jamais existiram realmente. Diferenciando-se dessa

suposta idealização, Maquiavel propôs um realismo político, uma reflexão política pautada pelas experiências sócio-histó-ricas da humanidade. Essa reflexão seria delineada pelo exa-me da política em sua efetividade, e não por projeções sobre como deveria ser organizado o poder político em uma socie-dade. De suas observações, esse pensador extrai a inferência de que a virtude do estadista consiste na utilização de todos os recursos úteis à preservação e à extensão de seu poder, independentemente de suas ações serem, sob o ponto de vista mais amplo da sociedade, moralmente condenáveis. A política, em sua efetividade, não visa prioritariamente ao bem comum, mas sim ao exercício do poder. E o poder político ex-prime a institucionalização dos conflitos sociais, ou melhor, consiste em uma espécie de guerra institucionalizada, o que evita a beligerância explícita e preserva a unidade social.

Um aspecto temático que recebe atenção ampliada no fi-nal da filosofia moderna e na filosofia contemporânea é o pro-blema da desigualdade e da igualdade social. No campo do liberalismo político, iniciado pela teoria de John Locke, enfa-tiza-se a igualdade de direitos dos indivíduos, historicamente expressa na reivindicação da igualdade jurídica e na primazia dos direitos individuais fundamentais. Rousseau, em suas críticas à sociedade civilizada, contesta a intensidade das desigualdades socioeconômicas, propondo, como solução filosófica para a vida sociopolítica, um contrato social fixado pelos interesses comuns da humanidade. Karl Marx destaca as contradições da sociedade capitalista e indica o futuro de uma sociedade sem classes, de plena realização humana.

Essa discussão temática prossegue na filosofia con-temporânea, sob o influxo de novos fenômenos históricos, como o totalitarismo nazifascista, o socialismo real, as guer-ras mundiais e as transformações do capitalismo. Nas filo-sofias políticas mais atuais, nota-se a tendência de investi-gar as possibilidades de constituição de uma esfera pública que concilie direitos sociais e direitos individuais, assim como se observa a intensificação da intersecção entre a fi-losofia moral e a filosofia política, propiciada pela emergên-cia de temas que mobilizam conjuntamente essas áreas da reflexão filosófica, tais como os problemas ecológicos, os impactos sociais das tecnologias digitais e as questões no campo da bioética.

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IME Filosofia clássica (PARTE I)2

1. Dos sofistas a SócratesAs questões cosmológicas mobilizaram as especula-

ções iniciais da filosofia, caracterizando o Período Pré-So-crático da filosofia grega, visto no capítulo 1. Em meados do século V a.C., verifica-se uma importante transformação no interior da cultura filosófica, com a projeção dos seres huma-nos para o centro temático das investigações racionais. Os sofistas e Sócrates são os protagonistas dessa inflexão de pensamento, que substitui as indagações sobre o conjunto da physis pela problematização da humanidade. A filosofia antiga adquire sentido antropológico, examinando, priorita-riamente, o ser humano em suas dimensões natural, social e política. Nos complexos sistemas teóricos construídos por

Platão e por Aristóteles, reaparecem as teses cosmológicas em bases metafísicas. Permanece, contudo, a humanidade no plano principal da preocupação filosófica. Neste arco his-tórico que se estende da atividade pedagógica dos sofistas às pesquisas aristotélicas, delimita-se a época clássica da filosofia grega.

A filosofia estabelece problemas e reflexões cuja relevân-cia a despeito das transformações históricas das sociedades humanas persiste. Em tal perspectiva, é lícito afirmar que o projeto filosófico socrático, pautado pela pretensão racio-nal de conquista da autonomia moral pelos seres humanos, mantém sua importância na atualidade. Também é correto notar que as pesquisas filosóficas relacionam-se com seus

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contextos sócio-históricos específicos ao recepcionarem as influências culturais em que se desenvolvem.

Dessa forma, assim como o surgimento da filosofia arti-cula-se com a formação cívica das cidades gregas, o desloca-mento temático do pensamento filosófico, das investigações sobre a natureza para o exame do ser humano corresponde às modificações socioculturais da civilização helênica no século V a.C. Registra-se o aprofundamento da experiência política na igualdade democrática entre os cidadãos, na ex-pansão dos valores democráticos em detrimento da tradicio-nal cultura aristocrática. Nos círculos aristocráticos, a areté – virtude, excelência humana – é a condição inscrita pela linhagem familiar, a descendência de ancestrais míticos, isto é, qualidade exclusiva e inata dos aristocratas; na cultura de-mocrática, a vida virtuosa é compreendida como a aquisição no universo da cidadania, possibilidade de todos os cidadãos, independentemente de sua condição de nascimento.

Nesse período, a cidade-Estado de Atenas consolida-se como centro econômico, político, cultural e filosófico do mundo grego, favorecendo as práticas pedagógicas dos sofistas. Estes, em geral, eram estrangeiros, procedentes de outras cidades helênicas que, mediante remuneração, dedicavam-se à prepa-ração dos cidadãos para a atuação na vida pública. Os sofistas foram, então, pedagogos na democracia ateniense, profissio-nais da oratória que ministraram ensinamentos de retórica, isto é, realizavam palestras para demonstrar os procedimentos pertinentes à construção dos discursos e estimular o desenvol-vimento de habilidades argumentativas. Eram protagonistas da paideia vinculada às exigências da cidadania. Paideia é o vocá-bulo grego que se refere ao cultivo da natureza humana para a sua excelência, a realização de suas melhores possibilidades em uma existência plena de virtude: é sinônimo de educação. Sob o prisma da sofística, paideia consiste no cultivo dos seres humanos para o competente exercício do civismo.

A. Os sofistasÉ preciso destacar que as atividades dos sofistas não se

restringem ao campo educacional, implicando também con-cepções filosóficas consoantes às suas atividades pedagógi-cas. Com a sofística, iniciam-se as especulações em torno da moral e da política. Anunciam-se, assim, a ética e a filosofia política como campos específicos do conhecimento filosófi-co. Os sofistas pretendem demonstrar que, sobre uma única questão, é possível a elaboração de argumentos contrários e, com a mesma intensidade, racionalmente sustentáveis. Essas exibições expressam, simultaneamente, um desafio à moralidade vigente na sociedade e uma postura bastante original no tocante ao problema do conhecimento.

O confronto com a moral vigente, especialmente em rela-ção à herança aristocrática que a situa em pressupostos divi-nos, é feito pela inspeção racional dos valores. Esta, por sua própria natureza investigativa, recusa o pretenso valor abso-luto da moralidade fixada pela tradição cultural ateniense. Ao atribuírem idêntica validade racional a teses contrárias sobre temas morais e políticos, os sofistas revelam sua orientação predominantemente relativista sobre o saber e rejeitam a pro-cura pelo conhecimento de valores universais e definitivos.

Para os sofistas, noções como bem e mal, certo e erra-do, justo e injusto não são objeto de conhecimento absoluto capaz de discernir conteúdos morais universalmente ver-dadeiros e prescritíveis a todos os humanos de diferentes

sociedades. A sofística compreende essas valorações como convenções da vida em sociedade, como criações consen-suais dos seres humanos, com o propósito de regular suas relações sociais. Os sofistas não se limitam a constatar que sociedades distintas concebem diferentes preceitos morais e políticos – comportamentos avaliados como moralmente po-sitivos por um grupo são, simultaneamente, reprovados por outros –, mas afirmam a realidade exclusiva dessa diversida-de sociocultural: a impossibilidade de se atingir de forma ra-cional uma tábua de moralidade universalmente válida. Essa concepção dos sofistas torna-se mais clara na exposição das teses de seus principais representantes, Protágoras de Abde-ra e Górgias de Leontinos.

Muitas vezes se aduz como uma das causas do novo humanismo a ampliação de horizontes mediante aumento de contatos com outros po-vos, na guerra, nas viagens e na fundação de co-lônias. Estes deixaram cada vez mais claro que costumes e modos de comportamento que antes tinham sido aceitos como absolutos e universais, e de instituição divina, eram, de fato, locais e re-lativos. [...] A história de Heródoto é típica dos meados do século V pelo entusiasmo com que coleta e descreve os costumes dos citas, persas, lídios, egípcios e outros, indicando suas diver-gências do uso grego. Se se pedisse a todos os homens, diz ele, que mencionassem as melho-res leis e costumes, cada um escolheria os seus próprios; e o ilustra pela história de Dario, que mandou vir à sua Corte alguns gregos e hindus e perguntou primeiramente aos gregos por que consideração eles consentiriam comer seus pais falecidos. Quando estes responderam que não fariam isso por nada, ele se voltou para os hindus (de uma tribo que normalmente comia os corpos de seus pais) e lhes perguntou se algo poderia persuadi-los a queimar seus pais (como os gre-gos faziam), ao que eles protestaram pela mera menção de tal impiedade.

GUTHRIE, William Keith Chambers. Os sofistas. São Paulo: Paulus, 1995. p. 20, 21.

Protágoras de Abdera (492-422 a.C.) declara o princípio do homem-medida, densamente contido em sua sentença segun-do a qual “o homem é a medida de todas as coisas, das que são pelo que são e das que não são pelo que não são”. É imprescindí-vel registrar que a referência de Protágoras, em seu enunciado, não é o ser humano como sujeito universal do conhecimento, a espécie humana que encontra em si mesma conhecimentos idênticos e acessíveis a todos os indivíduos. Trata-se do ser hu-mano singular, individual, o que significa que o verdadeiro para um indivíduo pode ser falso para outro. Constata-se, assim, uma atitude gnosiológica relativista desse filósofo.

Protágoras não desenvolveu um estudo sistemático sobre a natureza do conhecimento e suas condições de possibilidade. Sua tese relativista envolve um problema que veio a receber am-pla e profunda atenção dos estudos filosóficos na área de gno-

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siologia: há um critério absoluto e exterior aos indivíduos para se delimitar a distinção objetiva entre a verdade e a falsidade?

A resposta de Protágoras a essa questão é negativa, pois, para esse filósofo, o conhecimento tem dimensão estritamente individual, ou seja, assenta-se em diferentes sensações, per-cepções e ideias, referentes unicamente aos indivíduos. O relati-vismo desse sofista pronuncia-se com igual intensidade em seu agnosticismo, contido no seguinte fragmento: “Sobre os deuses não tenho possibilidade de afirmar que são, nem que não são”. Nessa declaração de Protágoras, evidencia-se a tese de que é plausível a concatenação de argumentos favoráveis à existên-cia dos deuses e, na mesma medida, de raciocínios contrários à existência de seres divinos, sem que se possa atestar a verda-de absoluta de uns e a completa falsidade de outros. Sob esse prisma, realizam-se os seus ensinamentos retóricos, situações nas quais Protágoras explora as controvérsias em torno de dife-rentes discursos, sustentando hipóteses contrárias e, contudo, admitidas como igualmente legítimas. Em suas exposições di-recionadas à formação de cidadãos, empenha-se em destacar que um ponto de vista frágil de início pode ser racionalmente convertido no argumento mais forte em uma discussão.

Com essas considerações, nota-se que Protágoras nega a dimensão ontológica da moral. Ele entende que os valores que regem a vida em sociedade consistem em consensos socialmente produzidos, legítimos apenas na sociedade em que vigoram. Essas regras podem se transformar no curso do tempo, conforme as circunstâncias e de acordo com novas deliberações sociais instituídas pelo corpo de cidadãos.

O sofista Górgias de Leontinos (485-380 a.C.), em seus escritos intitulados Sobre a natureza e sobre o não ser, expli-cita suas concepções filosóficas, que devem ser compreen-didas em sua radical oposição à tradição ontológica eleática, inaugurada pelo pré-socrático Parmênides, para a qual o ser é, e o não ser não é. Esse sofista rejeita integralmente a cos-mologia parmenidiana, mediante a articulação de três teses: o ser não existe; caso o ser existisse, não seria cognoscível; e caso o ser fosse objeto de conhecimento, não seria possível comunicá-lo pela linguagem.

Ao examinar a ontologia dos eleatas, Górgias extrai uma inu-sitada conclusão das proposições de Parmênides. Observando que o não ser não é, assinala que o não ser é o inexistente, quer dizer, o não ser é o nada. Considerando que o ser é e que o não ser é – o nada –, esse sofista infere que o ser é o não ser: o ser não é, não existe, é o nada. Ainda que o ser existisse, prosse-gue Górgias, não poderia ser pensado, uma vez que, acolhendo a hipótese de conhecimento do ser, deveríamos assumir como efetivamente existentes todas as coisas absurdas que se mani-festam em nosso pensamento. Por fim, mesmo que o ser fosse pensado, não seria transmitido pela linguagem, posto que as palavras são simplesmente palavras, jamais transportam os conteúdos das coisas a que se referem, jamais comunicam as próprias coisas. Essas teses de Górgias são precursoras da re-flexão amplamente desenvolvida na história da filosofia sobre as complexas relações entre ser, pensar e dizer.

Durante longo tempo, os historiadores da filosofia não con-cedem relevo aos sofistas, muitos sequer aceitam sua condi-ção de filósofos, reduzindo-os a oradores descompromissados com a busca filosófica da verdade. Em tempos mais recentes, verifica-se a tendência ao reconhecimento da importância da sofística para a especulação filosófica, sobretudo por sua posi-ção precursora no âmbito do relativismo gnosiológico e cultural.

As concepções de conhecimento instauradas pelos sofistas prenunciam problemas fundamentais para a gnosiologia. Suas teses seguramente podem ser recusadas pela maioria dos filó-sofos posteriores – como, de fato, o são –, mas não são ignora-das, pois exigem dos pensadores envolvidos com a procura de verdades universais a justificação de seus métodos e o rigor de suas demonstrações racionais. Essas exigências já se manifes-tam em um contemporâneo dos sofistas: Sócrates.

A conceituação negativa dos sofistas na história da filosofia é fixada pelos textos de Platão, que, dedicado a demarcar as diferenças entre a mera retórica e o autên-tico compromisso com a conquista do conhecimento filosófico, descreve depreciativamente a sofística, consi-derando-a, em muitas passagens de seus escritos, como sinônimo de antifilosofia.

B. O projeto filosófico socráticoSócrates (470-399 a.C.) é considerado um pensador

fundamental na tradição filosófica ocidental, sendo que alguns estudiosos entendem que sua atitude investigativa representa o verdadeiro início da história da filosofia. Essa repercussão da proposta filosófica socrática se explica pelo aprofundamento dos problemas antropológicos em suas re-flexões e por sua dedicação ao delineamento de um método adequado para atingir o conhecimento.

Assim como os sofistas, Sócrates descarta as narrativas cosmológicas dos primeiros filósofos. De acordo com seu pon-to de vista, as teses dos pré-socráticos anulam-se reciproca-mente e não oferecem verdadeiros princípios explicativos da realidade. Além disso, ignoram aquela que deveria ser a ver-dadeira tarefa da filosofia: o exame da vida humana. O projeto filosófico socrático não se circunscreve no desenvolvimento de habilidades discursivas, como fazem os sofistas. Pretende, isto sim, superar a multiplicidade de opiniões por verdades ra-cionalmente identificadas, explicitando a natureza humana e a finalidade da existência dos seres humanos. A filosofia, para Sócrates, tem a meta de conquistar a autonomia moral do ser humano, fundada no autêntico conhecimento da humanidade.

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A postura filosófica de Sócrates é um marco fundamental na história do pensamento filosófico.

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É importante assinalar o problema da historicidade de Só-crates. Dos pré-socráticos e dos sofistas restam fragmentos de textos que, estudados conjuntamente aos comentários de outros filósofos sobre o seu pensamento – as menções realizadas por Platão e Aristóteles, por exemplo –, permitem a reconstituição de seus discursos filosóficos. Em relação a Sócrates, a situação é diferente, pois esse filósofo dedica-se exclusivamente à oralidade filosófica, sem registrar sequer uma linha escrita de seu pensamento. O acesso à sua filoso-fia é indireto, feito apenas por textos de autores que versam sobre Sócrates e sua proposta filosófica.

Nosso conhecimento a respeito de Sócrates é prove-niente especialmente dos testemunhos de seus contempo-râneos, Aristófanes, Xenofonte e Platão. Aristófanes (447--385 a.C.) é um autor teatral grego, que transforma Sócrates em personagem central de sua comédia As nuvens. Nesse texto, Sócrates é representado como um misto de filósofo da physis e de sofista, no sentido pejorativo da expressão: ele especula sobre o cosmos e ensina a converter o pior ar-gumento na melhor solução para uma questão. Xenofonte (430-355 a.C.) apresenta-se como discípulo de Sócrates e retrata-o em seus escritos, como no texto denominado Me-moráveis. Oferece-nos, contudo, a imagem de um filósofo plenamente resignado às convenções de sua sociedade, in-tensamente submetido à moralidade prevalecente entre os atenienses. Aceitar essa imagem torna difícil a compreen-são das razões pelas quais a postura filosófica socrática perturbou a sociedade de Atenas. Platão (427-347 a.C.) é o autor que, em seu conjunto de escritos, apresenta a ativida-de filosófica de Sócrates em sua fecundidade e prodigalida-de, relatando minuciosamente o método socrático e o viés ético de sua filosofia.

O Sócrates incorporado pela tradição filosófica é aquele relatado nos textos de Platão, entretanto o Sócrates presen-te nos diálogos escritos por Platão ultrapassa a sua histori-cidade, sendo, muitas vezes, a personagem que pronuncia conceitos pertencentes à filosofia platônica e que, portanto, não seriam elaborações efetivas do Sócrates histórico. Preci-samente por considerar sua teoria filosófica em estrita con-tinuidade com o projeto socrático, Platão não se preocupa em discriminar com exatidão, em seus textos, a efetividade histórica de Sócrates e as conceituações procedentes do próprio platonismo. Sem um recorte nítido entre o Sócrates histórico e o Sócrates platônico, os estudiosos inclinam-se a classificar os diálogos da juventude e alguns dos textos da maturidade de Platão como os escritos mais próximos da historicidade realmente socrática, ou melhor, da proposta filosófica original de Sócrates, a despeito de seus desdobra-mentos na filosofia platônica.

A compreensão do método socrático requer a menção ao episódio em que a sacerdotisa do Oráculo de Delfos declara que Sócrates é o mais sábio entre os seres humanos. Consi-derando-se um ignorante, Sócrates é arrebatado pela perple-xidade com essa revelação. Intensifica, então, seus contatos com poetas, políticos, artesãos, enfim, com seres humanos que, supostamente, possuem conhecimentos reais e des-frutam da reputação de sábios na sociedade. Conclui, com base nesses contatos, que o conhecimento desses sábios é apenas aparente, posto que se julgam portadores de saberes que, de fato, não possuem. Os pretensos sábios são, portan-to, duplamente ignorantes: nada sabem e desconhecem a

própria ignorância. Então, o motivo pelo qual se afirma a su-perioridade de Sócrates é o fato de que ele é ciente de sua ignorância, pois sabe que nada sabe.

A informação de que a atividade filosófica de Sócrates é, em certo sentido, estimulada por uma espécie de reve-lação religiosa pode parecer incongruente com o fato de o pensamento filosófico grego se consolidar, em larga me-dida, por seu distanciamento em relação à religião. Deve-mos, entretanto, observar que a ruptura da filosofia helêni-ca com a religião não é absoluta e, ainda que os filósofos se afastem da simples crença religiosa, eles permanecem, em muitos casos, pelo menos parcialmente receptivos à influência de uma cultura marcada pela religiosidade.

O reconhecimento da ignorância é o ponto de partida do método especulativo de Sócrates, a precondição da aspira-ção ao saber. Evidentemente, a máxima socrática “só sei que nada sei” não se estende a todos os aspectos da realidade. Reporta-se a questões filosóficas fundamentais, quanto ao discernimento da finalidade da vida humana e ao discerni-mento dos valores morais universais. Sócrates tem ciência, por exemplo, de que é um homem e um cidadão ateniense. Alguns historiadores da filosofia interpretam a proclamada ignorância socrática unicamente como um artifício investi-gativo para a remoção dos falsos saberes e a definição do itinerário filosófico na busca pela verdade. Seja essa igno-rância inicial uma declaração sincera ou somente um recur-so metodológico, é a partir dela que esse filósofo desenvolve seu método.

Sócrates compreende seu método como um expediente intelectual que pode ser utilizado por todos os homens em seu percurso para o conhecimento e considera o conheci-mento acerca da humanidade como o objetivo essencial da atividade filosófica, sucintamente indicado na frase “conhe-ce-te a ti mesmo”. Esse método é denominado de dialético ou dialógico e, em linhas gerais, consiste em um diálogo com-posto por sucessivas interrogações, sistematicamente con-duzidas, sobre uma temática específica, com o propósito de gradual eliminação das hipóteses que não resistem à inquiri-ção racional e de construção de um conhecimento definitivo, um conceito do tema em questão.

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As interrogações socráticas pretendem ultrapassar as opiniões em direção às verdades filosóficas.

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Esse método dialético é formado por dois momentos, a exortação (protréptico) e a indagação (elenkhos). Sócrates, distintamente dos sofistas, não ministra longas preleções para uma plateia atenta. De forma coerente com sua reconhecida ignorância, ele convida, exorta um interlocutor a apresentar sua definição sobre um tema, por exemplo, coragem, virtude, justiça. Com a exortação, o interlocutor discorre sobre o tema proposto, expondo fluentemente seu presumido conhecimen-to acerca do assunto. Após essa exposição, inicia-se o segundo momento do método socrático, subdividido em ironia e maiêu-tica. A ironia inicia-se com o aparente acolhimento socrático da explicação apresentada, seguida pela introdução de questões expostas por Sócrates, uma sequência encadeada de indaga-ções, cujo exame, expresso em comentários críticos, incide na revelação da fragilidade da tese declarada pelo interlocu-tor. Realiza-se, assim, a refutação, consentida racionalmente por todos os participantes do diálogo, da definição proposta de início, havendo a constatação de que o pretenso saber do interlocutor nada é além de uma opinião distante da verdade. Dessa forma, exortação e ironia conjugam-se na eliminação de um falso conhecimento e, com a supressão do saber equivo-cadamente suposto, estão todos prontos para se lançarem em direção ao verdadeiro conhecimento. Esse percurso dialógico para a verdade é denominado de maiêutica, parto de ideias.

O método dialógico é concebido por Sócrates como o em-preendimento necessário à identificação racional de um pro-pósito para a vida humana e à consequente conquista da au-tonomia moral pelos seres humanos. Esse filósofo vincula a felicidade ao aperfeiçoamento da alma, aprimoramento este que se realiza pelo conhecimento. Em alguns dos diálogos especificamente socráticos de Platão, Sócrates diferencia os bens da alma dos bens do corpo e dos bens exteriores.

01. UFU-MGO trecho faz uma referência ao procedimento investi-

gativo adotado por Sócrates.

O fato é que nunca ensinei pessoa nenhuma. Se alguém deseja ouvir-me quando falo ou me encontro no desempenho de minha missão, quer se trate de moço ou velho [...], me disponho a responder a todos por igual, assim os ricos como os pobres ou, se o preferirem, a formular-lhes perguntas, ouvindo eles o que lhes falo.

PLATÃO. Apologia de Sócrates. Belém: Edufpa, 2001. p. 33 a-b.

Marque a alternativa que melhor representa o mé-todo socrático.

a. Sócrates nada ensina porque apenas transmite aquilo que ouve de seu daímon. Seu procedimen-to consiste em discursar, igualmente para qual-quer ouvinte, longos discursos demonstrativos retirados da tradição poética ou perguntas que levem o interlocutor a fazer o mesmo.

b. A profissão de ignorância e a ironia de Sócrates fazem parte de seu procedimento geral de refu-tação por meio de perguntas e respostas breves

APRENDER SEMPRE 33

(o élenkhos) e constituem um meio de reverter o argumento do interlocutor para fazê-lo cair em contradição. A refutação socrática revela a presun-ção de saber do adversário, pela insuficiência de suas definições e pela aporia.

c. Sócrates nunca ensina pessoa nenhuma, porque a profissão de ignorância caracteriza o modo pelo qual encoraja seus discípulos a adquirirem sabedoria diretamente do deus do oráculo de Delfos. A ironia socrática é uma dissimulação que, pela zombaria, revela as verdadeiras disposições do pequeno nú-mero dos que se encontram aptos para a filosofia.

d. Sócrates nunca ensina pessoa nenhuma antes de testar sua aptidão filosófica por meio de perguntas e respostas. Seu procedimento consiste em des-truir as definições do adversário por meio da ironia. A ignorância socrática encoraja o adversário a reve-lar suas opiniões verdadeiras que, pela refutação, dão a medida da aptidão para a vida filosófica.

ResoluçãoO método socrático pode ser adequadamente resu-

mido na identificação das contradições da tese apresen-tada pelo interlocutor de Sócrates, conduzindo-o, median-te interrogações criticamente examinadas, à constatação de uma aporia, a impossibilidade de solução filosófica da questão, segundo a explicação apresentada, e à busca de um conceito verdadeiro para o tema contemplado.

Alternativa correta: B

Coragem, prudência e memória são listados entre os bens da alma. Bens do corpo são a saúde, a beleza e a força; bens exteriores são as riquezas materiais, a glória e a reputação so-cial. Todos esses bens distintos, entretanto, não são bens em si, mas somente bens condicionados, quer dizer, são realmen-te bens se conduzidos corretamente, virtuosamente, uma vez que, para Sócrates, a virtude é o único bem incondicional. É nesse horizonte que se situa o “conhece-te a ti mesmo” socrá-tico, pois a autonomia moral é necessariamente atingida com o conhecimento da natureza humana, da alma, compreendida como sede do pensamento. Em sua natureza de ser pensante, o ser humano é capaz de distinguir racionalmente o bem e o mal, de aprimorar a si mesmo no conhecimento de sua alma, que coincide com a realização da felicidade.

Identidade entre virtude e conhecimento, ignorância como motivo do mal e unidade das virtudes são aspectos centrais na proposta ética socrática. Para Sócrates, o saber é condição necessária e suficiente da vida virtuosa, pois co-nhecimento da virtude proporciona o paradigma dos compor-tamentos moralmente corretos. Com a intenção de justificar essa proposição, o filósofo procede a uma analogia entre o conhecimento moral e os saberes técnicos, como a medi-cina, a navegação e a marcenaria. Nos diferentes ofícios, o conhecimento é necessário para que a finalidade específica de uma ação seja atingida: para que o médico contribua com o restabelecimento da saúde de seu paciente, é preciso que tenha acesso ao saber medicinal; para um comandante con-duzir corretamente sua embarcação pelos mares, é preciso que conheça as técnicas de navegação; e para um marcenei-ro produzir uma mesa de boa qualidade, são imprescindíveis

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os conhecimentos de marcenaria. Da mesma forma, para agir com virtude, é necessária a sabedoria da virtude. As escolhas humanas pelas ações justas, corretas, enfim, moralmente apropriadas são possíveis quando se conhece o bem.

Contudo, nas áreas técnicas, o saber não é garantia de que a atividade se realize com pleno êxito. É possível que o médico não pretenda a cura do doente, que o comandante queira, por um motivo qualquer, desviar-se do trajeto correto e que o mar-ceneiro esteja decidido a executar sua obra com muitas falhas. Neste ponto, situa-se o limite da analogia entre os saberes técni-cos e o conhecimento moral, pois, segundo Sócrates, o conheci-mento da virtude é condição necessária e suficiente para a vida virtuosa, ou seja, aquele que conhece a virtude sempre conduz virtuosamente sua vida, uma vez que nenhum ser humano pro-cura decididamente o que é um mal para si – e a virtude, con-vém reafirmar, é o bem incondicional. Conhecimento do bem e prática do mal são noções antagônicas, porque a alma humana, conhecendo a virtude, jamais se equivoca em suas escolhas.

Sob o prisma socrático, o saber moral é o conhecimento supremo, sendo essa sabedoria a própria virtude. Justiça, pru-dência, piedade, isto é, os bens da alma não são rigorosamente diferentes virtudes, mas sim expressões da virtude, do conhe-cimento. No diálogo denominado Protágoras, encontra-se um

exemplo oferecido por Sócrates acerca da unidade das virtu-des, quando esse filósofo afirma que coragem não é sinônimo de destemor, consistindo, na realidade, no conhecimento sobre a necessidade de recuar em razão de um risco ou de enfrentar uma situação de perigo, quer dizer, a coragem, assim como to-das as expressões virtuosas, é essencialmente sabedoria.

A atividade filosófica de Sócrates provocou desconforto nos círculos sociopolíticos dominantes na cidade de Atenas, especialmente pela profundidade de seus questionamentos, que desafiavam os saberes socialmente estabelecidos. Esse fato resultou no julgamento de Sócrates pelo tribunal ate-niense, sob a acusação de corrupção da juventude – muitos jovens acompanhavam o filósofo em suas atividades espe-culativas – e de impiedade – descrença nos deuses da pólis. De acordo com o relato de Platão, em seu texto Apologia de Sócrates, o filósofo, diante de seus julgadores, não efetuou a própria defesa, mas a defesa da pesquisa filosófica, o que é coerente com seu entendimento de como se deve viver: filo-soficamente. O desfecho do julgamento foi a condenação de Sócrates à morte. Seu projeto filosófico, porém, persiste nas investigações de Platão e de Aristóteles; mais do que isso, persiste na tradição filosófica que se constrói da Antiguidade grega aos tempos atuais.

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Módulo 1Origens e temas da filosofiaEXERCÍCIOS PROPOSTOS

ROTE

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DE E

STUD

OS

Leia com atenção Capítulo 1 – Tópicos 1, 1.A, 1.B, 2, 3, 3.A, 3.B, 3.C, 3.D, 4, 4.A e 4.B

Exer

cíci

os

Série branca 01 03 04 05 11 13 16 19

Série amarela 02 06 07 08 15 16 18 19

Série roxa 07 08 09 10 16 18 19 20

Foco Enem 03 06 07 08 13 14 15 18

01. UPETomando-se como base o pensamento mitológico, colo-

que V nas afirmativas verdadeiras e F nas falsas.( ) O pensamento mítico narra não apenas a origem

do mundo, do homem, dos deuses, mas também de todos os acontecimentos primordiais, porque o homem se tornou aquilo que é hoje: um ser mortal, sexuado, organizado em sociedade, obrigado a tra-balhar para viver e trabalhando de acordo com de-terminadas regras.

( ) O mito é uma narrativa que comunica e transmite a tradição oral, que preserva a memória e garante a continuidade da cultura.

( ) O pensamento mítico é uma forma espontânea de o homem situar-se no mundo.

( ) A narrativa do mito se apoia numa intuição sensível e ex-plica a realidade em sua concretude, conferindo ordem a um mundo de aparência caótica e desorganizada.

( ) No período histórico do pensamento mítico, o mito faz parte da vida cotidiana, porém como uma instância dispensável da reflexão sobre o existir do homem.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta.a. V – V – V – V – Fb. V – F – F – V – Vc. F – V – F – F – Vd. F – F – F – V – Ve. V – V – F– F – V

02. UPEA atitude filosófica inicia-se dirigindo indagações

ao mundo que nos rodeia e às relações que mante-mos com ele. Pouco a pouco, porém, descobre que essas questões se referem, afinal, à nossa capacida-de de conhecer, à nossa capacidade de pensar.

CHAUI, Marilena. Convite à filosofia, 1996, p. 14.

Sobre isso, é correto afirmar que a filosofiaa. pode ser entendida como aspiração ao conhecimento

sensível, lógico e assistemático da realidade natural e humana.

b. é tão somente uma forma consciente e acrítica de pensar e de agir.

c. é uma forma crítica e incoerente de pensar o mundo, produzindo um entendimento de seu significado e formulando uma concepção específica desse mundo.

d. designava, desde a Grécia Antiga, a particularidade do conhecimento sensitivo, desenvolvido pelo homem.

e. como forma consciente e crítica de compreender o mundo e a realidade, não se confunde, de maneira al-guma, com o fato de estar ‘investida’ inconscientemen-te de valores adquiridos com base no ‘senso comum’.

03. C1-H3Antes do nascimento da filosofia, os educadores

[...] dos gregos foram os poetas, sobretudo Home-ro, cujos poemas foram, como se disse com justiça, quase a Bíblia dos gregos, no sentido de que a pri-mitiva grecidade buscou alimento espiritual essen-cial e prioritariamente essencial e prioritariamente nos poemas homéricos, dos quais extraiu modelos de vida, matéria de reflexão, estímulo à fantasia e, portanto, todos os elementos essenciais à própria educação e formação espiritual.

REALE, Giovanni. História da filosofia antiga. São Paulo: Loyola, 1993, v. I, p. 19.

Esse trecho, escrito pelo historiador da filosofia Giovanni Reale, destaca

a. a importância pedagógica e social do mito na antiga cultura grega.

b. a amplitude do mito em relação à especificidade do pensamento filosófico.

c. a rigorosa continuidade entre relatos míticos e ativida-de filosófica.

d. a natureza estritamente racional da especulação dos primeiros filósofos.

e. a capacidade do mito em expressar a verdade filosófi-ca por meio de metáforas.

04. UEM-PRAo contrário de seus contemporâneos – como Par-

mênides –, Heráclito não rejeitava as contradições e queria apreender a realidade na sua mudança, no seu devir. Todas as coisas mudam sem cessar, e o que te-mos diante de nós em dado momento é diferente do que foi há pouco e do que será depois: ‘Nunca nos ba-nhamos duas vezes no mesmo rio’, pois, na segunda vez, não somos os mesmos, e também as águas muda-ram. Para Heráclito, o ser é múltiplo [...] por ele estar constituído de oposições internas. O que mantém o fluxo do movimento não é o simples surgimento de novos seres, mas a luta dos contrários [...]. É da luta que nasce a harmonia, como síntese dos contrários.

ARANHA, M. L. de A. Filosofar com textos: temas e história da filosofia. São Paulo: Moderna, 2012. p. 287.

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Com base nessa afirmação sobre a filosofia de Heráclito, assinale o que for correto.

01. O princípio motor do movimento é a tensão de forças contrárias entre si.

02. Na Grécia arcaica ou pré-socrática, o curso dos rios não estava estabelecido, razão pela qual eles muda-vam de lugar de um dia para outro.

04. O princípio do devir ou da transformação contínua visa compreender a ordenação cosmológica do mundo.

08. O surgimento de novos seres é explicado pela inter-mediação divina, criadora ex nihilo.

16. A multiplicidade do real é pensada a partir do princípio lógico de não contradição entre o ser e o não ser.

05. UFU-MG (adaptado)Parmênides não nega que se possa perceber

pelos sentidos o movimento no mundo, porém este movimento ou devir de todas as coisas não permite conhecer o que o ser é, verdadeiramente. Nas palavras do próprio filósofo: “Necessário di-zer e pensar que só o ser é; pois o ser é, e o nada, ao contrário, nada é: afirmação que bem deves considerar. [...] Jamais se conseguirá provar que o não-ser é; afasta, portanto, o teu pensamento desta via de investigação, e nem te deixes arras-tar a ela pela múltipla experiência do hábito, nem governar pelo olho sem visão, pelo ouvido ensur-decedor ou pela língua.

BORNHEIM, G. A. Os filósofos pré-socráticos. São Paulo: Cultrix, 1993, p. 55.

A respeito do pensamento de Parmênides, marque para as afirmativas (V) verdadeira ou (F) falsa.

1. ( ) Podemos dizer que, para Parmênides, o ser é e o não ser não é.

2. ( ) Para Parmênides, podemos pensar o ser, mas nunca o não ser.

3. ( ) O ser também está sujeito ao devir, ou seja, não é como era antes e não será como é no momen-to atual.

4. ( ) O ser, tal como todas as coisas, está sujeito às mudanças e, de certa forma, também está sujeito ao nascimento e à morte.

06. UEG-GOCostuma-se considerar a filosofia um tipo de conheci-

mento-investigação que surge naquele momento em que abandonamos nossas certezas cotidianas, histórica e social-mente herdadas, e de nada dispomos para substituir nossas certezas abaladas. O mundo, a história, a sociedade e nós mesmos tornamo-nos estranhos, levando-nos ao espanto e a perguntar o porquê e o para quê de nossas ideias, valores e ações. Dessa forma, a filosofia

a. preocupa-se em se afastar das questões cotidianas, tratando apenas dos grandes temas da humanida-de, sendo produzida somente por grandes pensado-res e eruditos.

b. procura oferecer ao homem certezas e verdades que orientem o comportamento teórico e prático, evitando assim a dúvida e as angústias próprias da existência humana.

c. volta-se preferencialmente para momentos de crise no pensamento, na linguagem e na ação, colocando a exigência de uma nova fundamentação para nosso comportamento teórico e prático.

d. surge na Grécia do séc. VII a.C., com o objetivo de con-solidar dogmas, crenças e valores impostos por uma sociedade autoritária que desconhecia o poder da ra-zão na resolução dos conflitos.

07. Unioeste-PR (adaptado) A proposição de Tales de que a água é o abso-

luto ou, como diziam os antigos, o princípio, é filo-sófica: com ela, a filosofia começa porque, através dela, chega à consciência de que o um é a essência, o verdadeiro, o único que é em si e para si. Come-ça aqui um distanciar-se daquilo que é em nossa percepção sensível; um afastar-se deste ente ime-diato - um recuar diante dele. [...]. Isto gera em nós a representação da pura criação pela fantasia — animação infinita e universal, figuração, sem uni-dade simples. Com essa proposição está aquietada a imaginação selvagem, infinitamente colorida, de Homero; dissociar-se de uma infinidade de prin-cípios, toda esta representação de que um objeto singular é algo que verdadeiramente subsiste para si, que é uma força para si, autônoma e acima das outras, é sobressumida e assim está posto que só há um universal, o universal ser em si e para si, a intuição simples e sem fantasia, o pensamento de que apenas um é.

HEGEL, Friedrich. Preleções sobre a história da filosofia. In:Pré-socráticos. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 15. (Os pensadores)

De acordo com esse texto do filósofo Friedrich Hegel, so-bre a origem da filosofia,

a. a proposição de Tales é filosófica, mas não constitui uma resposta racional que pretende organizar o mun-do para além da ordem mitológica ou do ente imediato.

b. ao afirmar que a água é o princípio de tudo, Tales insti-tui mais uma perspectiva para o mito, mas agora como uma verdade sobre o que é a realidade.

c. o advento da filosofia não distingue os gregos de seus contemporâneos ou daqueles que os antecederam, apenas acrescenta uma nova noção, a noção de ser, à história da cultura.

d. a representação que temos do mundo, formada pela fantasia e pelo mito, guia a razão à essência do real e motiva os primeiros filósofos em suas reflexões.

e. a filosofia, ao surgir, impulsiona a razão a se perguntar se aquilo que observamos através de nossa percepção sensível constitui a verdadeira essência da realidade.

08. C3-H11A escola – ou melhor, o conjunto de tendências

filosóficas – que sucedem o eleatismo e o heracli-tismo tem como principal problema a existência ou inexistência do uno e do múltiplo, do ser e do de-vir, da imobilidade e do movimento. O século V a.C. vê, assim, surgirem filosofias ou cosmologias que já não podiam pensar com a mesma ingenuidade com que pensavam os antecessores de Parmênides e de

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Heráclito, mas que não podiam aceitar a interdição eleata de investigar o mundo que vemos e no qual vivemos, pois, reduzido ao núcleo duro, o eleatismo se limita a conceder que pensemos e digamos ape-nas e exclusivamente que o ser é e o não ser não é. Seria o mundo visível apenas ilusão, mera “opinião de mortais”?

CHAUI, Marilena. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 86-87.

As informações do texto exprimema. a solução oferecida pelas escolas pluralistas à tensão

filosófica entre ser e devir.b. a desconfiança de Heráclito e de Parmênides em rela-

ção aos sentidos humanos.c. a importância das teses de Parmênides e Heráclito na

história da filosofia.d. a preservação parcial da ontologia parmenidiana pelo

pensamento filosófico posterior.e. a transição da cosmologia e da ontologia para a antro-

pologia filosófica.

09. UPE Atente ao texto a seguir.

Os animais vivem em harmonia com sua própria natureza. Só o homem é transformador da natureza, e o resultado dessa transformação se chama cultura.

ARANHA, Maria Lúcia; MARTINS, Maria Helena. Temas de filosofia. São Paulo: Moderna, 1992, p. 28-29.

Marque a alternativa correta no que tange à cultura humana.a. Na cultura humana, a linguagem simbólica é condição

ímpar no processo de transformação da natureza.b. A dimensão simbólica no humano é condição secun-

dária nas mudanças que ocorrem na natureza.c. Na cultura humana, o trabalho é prescindível no pro-

cesso de transformação do mundo natural.d. Só o homem é transformador da natureza, ao passo

que o trabalho é uma atividade tipicamente animal.e. A cultura é o trabalho humano na ação direcionada por

finalidades inconscientes; o resultado dessa ação de-nomina-se aculturação.

10. O confronto entre a cosmologia de Heráclito, concen-

trando o real no devir, e a ontologia de Parmênides estabe-lece a tensão conceitual entre ser e devir no pensamento filosófico pré-socrático. Explique a oposição entre as teses de Heráclito e de Parmênides e caracterize as primeiras ten-tativas de conciliá-las.

11. Sob o ponto de vista filosófico tradicional, o conhecimen-

to é definidoa. pelo pressuposto de que a realidade, desprovida de

objetividade exterior à mente, consiste unicamente nas elaborações mentais do sujeito.

b. como um conjunto de sucessivas aproximações entre sujeito e objeto, entre os quais, contudo, jamais se ve-rifica pleno acordo.

c. na articulação entre crença, justificação e verdade, ou seja, consiste em uma crença verdadeira e racional-mente justificada.

d. como a crença que, por seu sentido de legitimação existencial, dispensa procedimentos intelectuais cri-ticamente elaborados.

e. na articulação entre processos imaginativos e abstra-ções intelectuais, com a qual os seres humanos con-figuram a realidade.

12. UEG-GOA teoria do conhecimento é uma disciplina fundamental

no âmbito da filosofia e trata da origem, possibilidade e es-sência do conhecimento humano. Em relação à possibilidade do conhecimento, pode-se afirmar que:

a. tanto o dogmatismo quanto o criticismo de Kant refor-çam as bases sociológicas do conhecimento humano, caindo em um relativismo que afirma haver apenas opiniões e não a verdade.

b. para os céticos, concordando com a sociologia do conhe-cimento, o saber é algo socialmente construído e, portan-to, o conhecimento só é possível nas ciências sociais.

c. o criticismo kantiano e o dogmatismo consideram que a verdade, embora inacessível à razão humana, pode ser percebida diretamente pelos sentidos.

d. os dogmáticos afirmam a existência da verdade e confiam na capacidade da razão em conhecê-la, en-quanto os céticos duvidam que haja alguma verdade acessível à razão humana.

13. Enem C1-H4Texto I

Experimentei algumas vezes que os sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar in-teiramente em quem já nos enganou uma vez.

DESCARTES, R. Meditações metafísicas. São Paulo: Abril cultural, 1979.

Texto IISempre que alimentarmos alguma suspeita de

que uma ideia esteja sendo empregada sem nenhum significado, precisaremos apenas indagar: de que impressão deriva esta suposta ideia? E se for impos-sível atribuir-lhe qualquer impressão sensorial, isso servirá para confirmar nossa suspeita.

HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento. São Paulo: Unesp, 2004. Adaptado.

Nos textos, ambos os autores se posicionam sobre a na-tureza do conhecimento humano. A comparação dos excertos permite assumir que Descartes e Hume

a. defendem os sentidos como critério originário para considerar um conhecimento legítimo.

b. entendem que é desnecessário suspeitar do significa-do de uma ideia na reflexão filosófica e crítica.

c. são legítimos representantes do criticismo quanto à gênese do conhecimento.

d. concordam que conhecimento humano é impossível em relação às ideias e aos sentidos.

e. atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento.

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14. Sendo a atitude do homem ingênuo, o dogma-

tismo é, tanto psicológica quanto historicamente, o primeiro e mais antigo dos pontos de vista. No pe-ríodo inicial da filosofia grega, ele predominou de modo quase generalizado. As reflexões epistemoló-gicas estão, de modo geral, afastadas do pensamen-to dos pré-socráticos [...].

HESSEN, Johannes. Teoria do conhecimento. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 30.

Com a leitura do texto, constata-se quea. as discussões gnosiológicas se iniciam com os sofis-

tas e com Sócrates.b. o discurso cosmológico é um impedimento lógico ao

debate gnosiológico.c. a teoria do conhecimento é incompatível com a espe-

culação filosófica.d. a filosofia pré-socrática não examina as condições de

possibilidade do conhecimento.e. o dogmatismo tem na filosofia pré-socrática sua pri-

meira manifestação histórica.

15. Se empregarmos essa definição da verdade

como correspondência, não seremos relativistas. Segundo essa concepção, a verdade não é ver-dade em relação a esta ou àquela pessoa. Antes, provém de como as coisas realmente são no mun-do, independentemente, talvez, das crenças dos seres humanos.

MOSER, Paul K; MULDER, Dwayne H; TROUT, J. D. A teoria do conhecimento: uma introdução temática. São Paulo: Martins Fontes, 2004. p. 73.

O texto versa sobre a noção de verdade como correspon-dência, destacando que essa concepção gnosiológica

a. concebe a existência de verdades universais.b. exclui a existência de conhecimentos úteis aos se-

res humanos.c. reelabora a tese relativista de verdade.d. incorpora metodologicamente o ceticismo.e. concilia empirismo e racionalismo.

16. UPEDesde suas origens entre os filósofos da antiga Grécia, a

ética é um tipo de saber normativo, isto é, um saber que pre-tende orientar as ações dos seres humanos. A moral também é um saber, que oferece orientações para a ação.

Com relação a esse assunto, é correto afirmar que a(o)a. palavra ética procede do latim e significa “maneira de

se comportar regulada pelo uso”, pelo costume.b. ética ou filosofia moral é a parte da estética que se

ocupa com a intuição a respeito das noções e dos prin-cípios que fundamentam a vida moral.

c. palavra “ética” procede do grego, e significava origi-nariamente “morada”, mas, posteriormente, passou a significar o caráter, o “modo de ser”, que uma pessoa ou um grupo vai adquirindo ao longo da vida.

d. termo “moral” procede do grego; em sentido bem am-plo, moral é o conjunto das regras de conduta admiti-das, em determinada época, por um grupo de homens.

e. ética é um conjunto de normas, aceitas livre e cons-cientemente, que regulam o comportamento indi-vidual e social dos homens. Trata da prática real das pessoas que se expressam por costumes.

17. É possível falar em comportamento moral so-

mente quando o sujeito que assim se comporta é responsável pelos seus atos, mas isto, por sua vez, envolve o pressuposto de que pôde fazer o que queria fazer, de que pôde escolher entre duas ou mais alternativas, e agir de acordo com a decisão tomada.

VÁZQUEZ, Adolfo S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 18.

O conteúdo do texto remete diretamente à necessária re-lação entre

a. liberdade e moralidade.b. individualidade e objetividade dos valores.c. normas morais e coação social.d. moral e política.e. sociedade e normas jurídicas.

18. Enem C5-H23Na ética contemporânea, o sujeito não é mais

um sujeito substancial, soberano e absolutamente livre, nem um sujeito empírico puramente natural. Ele é simultaneamente os dois, na medida em que é um sujeito histórico-social. Assim, a ética adquire um dimensionamento político, uma vez que a ação do sujeito não pode mais ser vista e avaliada fora da relação social coletiva. Desse modo, a ética se entrelaça, necessariamente, com a política, entendi-da esta como a área de avaliação dos valores que atravessam as relações sociais e que interliga os in-divíduos entre si.

SEVERINO. A. J. Filosofia. São Paulo: Cortez, 1992. Adaptado.

O texto, ao evocar a dimensão histórica do processo de formação da ética na sociedade contemporânea, ressalta

a. os conteúdos éticos decorrentes das ideologias polí-tico-partidárias.

b. o valor da ação humana derivada de preceitos metafísicos.c. a sistematização de valores desassociados da cultura.d. o sentido coletivo e político das ações humanas individuais.e. o julgamento da ação ética pelos políticos eleitos

democraticamente.

19. UPELeia o texto a seguir.

As relações entre os homens não são mais apenas relações de troca entre iguais, mas relações de poder que pressupõem e consolidam situações de desigual-dades entre as pessoas. Emerge assim a esfera do político, no sentido estrito. Esse poder que impreg-na todo o tecido do social vai se institucionalizando através de instâncias específicas, de natureza polí-tica, jurídica e administrativa: são os aparelhos de governo cujo exemplo mais significativo é o Estado.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Filosofia. São Paulo: Cortez, 1994. p. 164-165.

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Sobre isso, coloque V nas afirmativas verdadeiras e F nas falsas.

( ) A esfera política se configura na existência da harmo-nia entre a dimensão privada e a pública.

( ) O Estado, na perspectiva da teoria marxista, é um ins-trumento de dominação de classe.

( ) O Estado democrático objetiva o valor da vontade de um único indivíduo, diferente do Estado autoritário, que sinaliza o livre-arbítrio na forma de expressar a vontade da cidadania.

( ) Diferentemente das teorias socialistas, nas teorias con-tratualistas, o Estado tem por finalidade garantir que os interesses particulares possam coexistir em harmonia.

( ) Na instância de poder, está presente uma relação entre quem exerce e aquele sobre o qual o poder é exercido. Discutir política é referir-se ao poder.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta.a. F – V – F – V – Vb. V – V – F – F – Vc. F – V – V – F – Fd. V – F – V – F – Ve. F – F – V – V – V

20. Discorra sobre as diferenças e sobre a confluência entre

a ética e a filosofia política.

Veja o gabarito desses exercícios propostos na página 278.

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Módulo 2Dos sofistas a SócratesEXERCÍCIOS PROPOSTOS

ROTE

IRO

DE E

STUD

OS

Leia com atenção Capítulo 2 – Tópicos 1, 1.A e 1.B

Exer

cíci

os

Série branca 21 22 23 24 31 32 33 34

Série amarela 25 26 27 28 35 36 37 38

Série roxa 27 28 29 30 34 36 38 40

Foco Enem 22 23 24 28 32 33 34 38

21. Unimontes-MGOs sofistas eram homens que tinham feito longas via-

gens e por isso mesmo tinham conhecido diferentes siste-mas de governo. Eles entendiam que os costumes e leis das cidades-Estado podiam variar enormemente. Sob esse pano de fundo, inicia-se, em Atenas, uma discussão sobre a impor-tância da educação e da política. Sobre os sofistas, é incorre-to afirmar que

a. tiveram papel fundamental nas transformações cultu-rais de Atenas.

b. dedicaram se à questão do homem e de seu lugar na sociedade.

c. foram os primeiros a compreender que o “homem é a medida de todas as coisas”.

d. eram interesseiros e só visavam ao lucro e ao dinheiro na arte de ensinar.

22. UFU-MGEm um importante trecho da sua obra

Metafísica, Aristóteles se refere a Sócrates nos se-guintes termos: Sócrates ocupava-se de questões éticas e não da natureza em sua totalidade, mas bus-cava o universal no âmbito daquelas questões, tendo sido o primeiro a fixar a atenção nas definições.

ARISTÓTELES. Metafísica. Tradução de: PERINE, Marcelo. São Paulo: Loyola, 2002. A6, 987b, p. 1, 3.

Com base na filosofia de Sócrates e no trecho supracita-do, assinale a alternativa correta.

a. O método utilizado por Sócrates consistia em um exercício dialético, cujo objetivo era livrar o seu interlocutor do erro e do preconceito − com o prévio reconhecimento da própria ignorância −, e levá-lo a formular conceitos de validade universal (definições).

b. Sócrates era, na verdade, um filósofo da natureza. Para ele, a investigação filosófica é a busca pela arché, pelo princípio supremo do cosmos. Por isso, o método socrático era idêntico aos utilizados pelos filósofos que o antecederam (pré-socráticos).

c. O método socrático era empregado simplesmente para ridicularizar os homens, colocando-os diante da própria ignorância. Para Sócrates, conceitos univer-sais são inatingíveis para o homem, por isso, para ele, as definições são sempre relativas e subjetivas, algo que ele confirmou com a máxima “o homem é a medi-da de todas as coisas”.

d. Sócrates desejava melhorar os seus concidadãos por meio da investigação filosófica. Para ele, isso implicava não buscar “o que é”, mas aperfeiçoar “o que parece ser”. Por isso, diz o filósofo, o fundamento da vida moral é, em última instância, o egoísmo, ou seja, o que é o bem para o indivíduo num dado momento de sua existência.

23. C5-H23Acredito que, com “perfeição da alma”, Sócrates

queria se referir ao que poderíamos chamar de perfei-ção espiritual. É nisto que ele localizava a verdadeira preocupação humana; e, ao deixar de lado as espe-culações sobre a origem e a constituição do mundo, considerando-as “inúteis”, ele se referia ao fato de que o conhecimento dessas coisas, mesmo que pu-desse ser obtido, não lançaria luz sobre a natureza da perfeição espiritual ou sobre os meios de atingi-la.

CORNFORD, Francis M. Antes e depois de Sócrates. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 34.

A leitura desse texto permite constatar que a atitude filo-sófica de Sócrates caracteriza-se

a. pela natureza essencialmente dialógica do seu méto-do de busca filosófica da verdade.

b. pela dependência do saber cosmológico em relação ao saber antropológico.

c. pela vinculação entre o conhecimento e o aprimora-mento moral dos seres humanos.

d. pela defesa de valores espirituais que antecipam pon-tos doutrinários do cristianismo.

e. pela identificação racional das ideias como fonte se-gura do comportamento moral.

24. PUC-PRLeia a estrofe do texto a seguir e, em seguida, assinale a al-

ternativa que corresponde ao verdadeiro sentido das acusações contra Sócrates.

O que vós, cidadãos atenienses, haveis sentido com o manejo dos meus acusadores, não sei; o certo é que eu, devido a eles, quase me esquecia de mim mesmo, tão persuasivos foram. Contudo, não disseram nada de verdadeiro. Mas, entre as muitas mentiras que divul-garam, uma, acima de todas, eu admiro: aquela pela qual disseram que deveis ter cuidado para não serdes enganados por mim, como homem hábil no falar.

PLATÃO. Apologia de Sócrates. São Paulo: Nova Cultural, 1987. p. 33. (Os pensadores).

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a. Para Aristóteles, principal acusador de Sócrates, o pro-blema consiste nas falácias que o filósofo ensina como conhecimento verdadeiro para os jovens de Atenas, os quais acabam por fazer de Sócrates uma espécie de ídolo em contraposição aos verdadeiros deuses.

b. De acordo com o próprio Sócrates, nesse seu texto auto-biográfico, as acusações contra ele têm caráter eleitoral, visto que seus acusadores estavam interessados nas próximas eleições, mais do que no próprio julgamento.

c. A acusação contra Sócrates é, para Platão, um proble-ma de relacionamento afetivo entre o acusado e seus acusadores; na verdade, tratou-se de uma questão passional ligada ao amor de Alcebíades por Sócrates.

d. O principal motivo das acusações contra Sócrates diz respeito à suposta revelação feita pelo Oráculo de Del-fos de que ele seria o homem mais sábio da Grécia, o que acabou causando muita inveja a Meleto, que al-mejava tal status de sábio.

e. Sócrates não está sendo acusado simplesmente porque não respeita o culto aos deuses ou por perverter a juven-tude, mas sim pelo fato de estar incomodando a aristo-cracia ateniense ao denunciar seus vícios baseados na ignorância e defender a busca da verdade e da virtude.

25. UFU-MGLeia o trecho a seguir, que se encontra na Apologia de Só-

crates, de Platão, e traz algumas das concepções filosóficas defendidas pelo seu mestre.

Com efeito, senhores, temer a morte é o mesmo que se supor sábio quem não o é, porque é supor que sabe o que não sabe. Ninguém sabe o que é a morte, nem se, porventura, será para o homem o maior dos bens; todos a temem, como se soubessem ser ela o maior dos males. A ignorância mais conde-nável não é essa de supor saber o que não se sabe?

PLATÃO. Apologia de Sócrates, 29 a-b, Apud HADOT, P. O que é a filosofia antiga? São Paulo: Loyola, 1999. p. 61.

Com base no trecho apresentado e na filosofia de Sócra-tes, assinale a alternativa incorreta.

a. Sócrates prefere a morte a ter que renunciar à sua mis-são, qual seja: buscar, por meio da filosofia, a verdade, para além da mera aparência do saber.

b. Sócrates leva o seu interlocutor a se examinar, fa-zendo-o tomar consciência das contradições que traz consigo.

c. Para Sócrates, pior do que a morte é admitir aos outros que nada se sabe. Deve-se evitar a ignorância a todo custo, ainda que defendendo uma opinião não devi-damente examinada.

d. Para Sócrates, o verdadeiro sábio é aquele que, colo-cado diante da própria ignorância, admite que nada sabe. Admitir o não saber, quando não se sabe, define o sábio, segundo a concepção socrática.

26. UEM-PRProtágoras de Abdera (480-410 a.C.) é considerado um

dos mais importantes sofistas. Ensinou por muito tempo em Atenas, sendo atribuída à sua autoria a seguinte máxima da filosofia: “O homem é a medida de todas as coisas”.

Sobre Protágoras e os sofistas, assinale o que for correto.01. De forma semelhante a pensadores contemporâ-

neos, os sofistas problematizam a multiplicidade de perspectivas do conhecimento.

02. O relativismo de Protágoras pode ser defendido filo-soficamente com base na percepção do movimento, tese já defendida anteriormente por Heráclito.

04. Platão e Aristóteles contrapuseram-se aos sofistas, ao não defenderem o homem como medida de todas as coisas.

08. Em razão de seu humanismo, atribui-se a Protágoras a inversão copernicana, isto é, a tese de que não é o Sol que gira em torno da Terra, mas a Terra que gira em tor-no do Sol.

16. O saber contido na frase de Protágoras é prático, além de teórico, ou seja, mobiliza o campo da filosofia para a retórica.

27. UFU-MG (adaptado)Muito do que se sabe sobre a vida e sobre a filosofia de

Sócrates foi transmitido pelos diálogos escritos por seu discí-pulo mais importante, Platão. Em um desses diálogos, lemos a seguinte passagem:

Sócrates: − E nunca ouviste falar, meu graceja-dor, que eu sou filho de uma parteira famosa e im-ponente, Fenarete?

Teeteto: − Sim, já ouvi.Sócrates: − Então já te contaram também que

exerço essa mesma arte?Teeteto: − Isso, nunca.Sócrates: −Pois fica sabendo que é verdade [...].

A minha arte obstétrica tem atribuições iguais às das parteiras, com a diferença de eu não partejar mulher, porém homens, e de acompanhar as almas, não os corpos, em seu trabalho de parto.

PLATÃO. Teeteto – Apologia de Sócrates. Tradução de: NUNES, Carlos Alberto. Belém: UFPA, 1988. p. 149-150.

Com base na filosofia de Sócrates e no trecho supraci-tado, marque, para as afirmativas a seguir, (V) verdadeira ou (F) falsa.

01. Sócrates exercia a arte das parteiras, isto é, a arte da maiêutica. Essa arte consistia em interrogar os seus interlocutores em busca da verdade, conduzindo a investigação para além de toda aparência de saber que os homens, em geral, trazem consigo.

02. Sócrates se dizia um parteiro de almas. No entanto, o próprio Sócrates se dizia incapaz de dizer a verdade que tentava encontrar nos interlocutores.

03. Sócrates interrogava as pessoas em praça pública para humilhá-las, colocando-as diante da própria ignorância. Segundo ele, “o homem é a medida de todas as coisas”, por isso a verdade depende do que se pode extrair de cada homem.

04. Sócrates se dizia o mais sábio entre todos os ho-mens, porque só ele conhecia as verdades que os outros não eram capazes de encontrar. Com a arte maiêutica, Sócrates demonstrava a superioridade do seu saber diante das falsas opiniões cultivadas pe-los cidadãos de Atenas.

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28. C1-H2O sofista é um professor de técnicas, de políti-

ca, de virtude e de sabedoria, portanto alguém que julga possuir conhecimentos e ser capaz de trans-miti-los. Eis porque as preleções dos sofistas eram aulas onde alguma coisa era ensinada, um conteúdo era transmitido já acabado, pronto [...]. Além disso, os sofistas eram céticos. Para eles, tudo é por con-venção e tudo é opinião [...]. Diferentemente dos sofistas, Sócrates não se apresenta como professor. Pergunta, não responde. Indaga, não ensina. Não faz preleções, mas introduz o diálogo como forma da busca da verdade.

CHAUI, Marilena. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 142.

Mencionando a atividade dos sofistas e a atitude filosófi-ca de Sócrates, o texto destaca

a. as contradições dos discursos sofísticos e a coerência da filosofia socrática.

b. as teses relativistas dos sofistas e o uso socrático do relativismo para atingir o saber.

c. as narrativas cosmológicas dos sofistas e a antropolo-gia da filosofia de Sócrates.

d. as preocupações dos sofistas com o ensino e o des-prezo de Sócrates pela educação.

e. as diferenças entre a pedagogia dos sofistas e o méto-do dialético de Sócrates.

29. Unioeste-PRO Oráculo de Delfos teria declarado que Sócrates

(470-399 a.C.) era o mais sábio dos homens. Essa profecia marcou decisivamente a concepção socrática de filosofia, pois sua verdade não era óbvia.

Logo ele, sem qualquer especialização, ele que estava ciente de sua ignorância? Logo ele, numa ci-dade [Atenas] repleta de artistas, oradores, políticos, artesãos? Sócrates parece ter meditado bastante tempo, buscando o significado das palavras da pito-nisa. Afinal, concluiu que sua sabedoria só poderia ser aquela de saber que nada sabia, essa consciência da ignorância sobre as coisas que era sinal e começo da autoconsciência.

J. A. M. Pessanha

É incorreto afirmar quea. a filosofia de Sócrates consiste em buscar a ver-

dade, aceitando as opiniões contraditórias dos ho-mens; quanto mais importante era a posição social de um homem, mais verdadeira era sua opinião.

b. a sabedoria de Sócrates está em saber que nada sabe, enquanto os homens em geral estão impreg-nados de preconceitos e noções incorretas, mas não se dão conta disso.

c. o reconhecimento da própria ignorância é o primei-ro passo para a sabedoria, pois, assim, podemos nos livrar dos preconceitos e abrir caminho para a verdade.

d. após muito questionar os valores e as certezas vi-gentes, Sócrates foi acusado de não respeitar os deuses oficiais (impiedade) e corromper a juventu-de. Foi julgado e condenado à morte por ingestão de cicuta.

e. o caminho socrático para a sabedoria deve ser trilhado pelo próprio indivíduo, que deve por ele mesmo reconhecer seus preconceitos e opiniões, rejeitá-los e, por meio da razão, atingir a verdade imutável.

30. Unioeste-PRA ignorância mais condenável não é essa de su-

por saber o que não se sabe? É talvez nesse ponto, senhores, que difiro do comum dos homens; se nal-guma coisa me posso dizer mais sábio que alguém, é nisto de, não sabendo o bastante sobre o Hades, não pensar que o saiba.

Platão

Nesse texto, Platão apresenta a concepção socrática de filosofia. Sobre ela, seguem as seguintes afirmações.

I. A verdade torna o homem melhor, pois tem como re-sultado ultrapassar o homem comum.

II. Saber que nada se sabe é o primeiro passo para se atingir a verdade.

III. O método socrático (a maiêutica) é irônico, porque pressupõe saber que nada se sabe.

IV. O saber que nada se sabe permite ao indivíduo livrar--se dos preconceitos e abrir caminho até o conheci-mento verdadeiro.

V. O constante questionamento deve ser a atividade fun-damental do filósofo.

Das proposições feitasa. apenas II e IV são corretas.b. apenas I, II e V são corretas.c. apenas II, III e IV são corretas.d. todas elas são corretas.e. todas elas são incorretas.

31. UEM-PROs sofistas são conhecidos por serem os “anti-

filósofos”, os adversários preferidos dos primeiros filósofos gregos. Entre as acusações a eles endereça-das estava que “aboliram o critério, porque afirmam que todas as aparências e todas as opiniões são ver-dadeiras e que a verdade é algo relativo, pois que tudo o que é aparência ou opinião para um indivíduo existe [deste modo] para ele.”

MARQUES, Marcelo Pimenta. Os sofistas: o saber em questão. In: FIGUEIREDO, Vinicius (Org.). Filósofos na sala de aula.

São Paulo: Berlendis & Vertecchia, 2007. v. 2, p.31.

Sobre a atitude filosófica dos sofistas, é correto afirmar que01. os sofistas não desejam a busca da verdade, pois

essa era uma tarefa dos filósofos.02. os sofistas não negavam a verdade, apenas aponta-

vam os problemas relativos à sua aquisição.04. os sofistas apresentavam, com suas contra-argu-

mentações, problemas relevantes para os filósofos.

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08. filósofos e sofistas perfazem duas personagens rele-vantes da filosofia na Grécia Antiga.

16. os sofistas pretendiam desmascarar os filósofos na sua capacidade de desvirtuar e iludir a juventude.

32. PUC-PRLeia o trecho de Platão, extraído do diálogo Apologia de

Sócrates.[…] descobrem uma multidão de pessoas que

supõem saber alguma coisa, mas que na verda-de pouco ou nada sabem. […] e afirmam que existe um tal Sócrates […] que corrompe a ju-ventude. Quando se lhes pergunta por quais atos ou ensinamentos, não têm o que responder; não sabem, mas para não mostrar seu embara-ço apresentam aquelas acusações que repetem contra todos os que filosofam: ‘as coisas do céu e o que há sob a terra; o não crer nos deuses; fazer prevalecer o discurso e a razão mais fraca’. Isso porque não querem dizer a verdade: terem dado prova de que fingem saber, mas nada sabem.

Com base na leitura do texto de Platão que faz alusão às características filosóficas de seu mestre Sócrates, assinale a opção que apresenta a afirmação que resume corretamente o pensamento socrático.

a. “Eu só sei que nada sei”.b. “Conhece-te a ti mesmo”.c. “Quem comete uma injustiça é sempre mais infeliz

que o injustiçado”.d. “Uma vida não questionada não merece ser vivida”. e. “O fim último do homem é a felicidade”.

33. C5-H23Todos os sofistas levantaram e aprofundaram, de

diferentes maneiras, problemas morais ou ligados estruturalmente com a moral, mas não souberam al-cançar, no nível temático, o princípio do qual todos dependem. Esse princípio, como sabemos, consiste na precisa e razoável determinação da essência do ho-mem. Nenhum dos sofistas nos disse expressamente, isto é, tematicamente, o que é o homem e, por conse-quência, nenhum dos sofistas fez ver, conscientemen-te, como as várias doutrinas que professavam conju-gavam-se numa determinada concepção do homem.

REALE, Giovanni. História da filosofia antiga. São Paulo: Loyola, 1993. v. 1, p. 240.

De acordo com o historiador da filosofia Giovanni Reale, os sofistas não desenvolvem plenamente a reflexão ética, porque

a. não realizam uma profunda antropologia filosófica.b. não ultrapassam as especulações pré-socráticas.c. não adotam a teoria platônica das ideias.d. não admitem contestações aos seus discursos.e. não enfrentam os valores morais fixados pela aristocracia.

34. Identifique a alternativa que se refere corretamente ao

pensamento do sofista Górgias de Leontinos.

a. Górgias declara que o não ser é relativo e que o ser é absoluto.

b. Górgias declara que o homem é a medida das coisas que são.

c. Górgias declara que o ser é o constante vir a ser do devir.d. Górgias declara que a humanidade é o sujeito univer-

sal do conhecimento.e. Górgias declara que o não ser é o nada e que o ser é

o não ser.

35. Explique as articulações entre o contexto político e cul-

tural da cidade de Atenas e as transformações verificadas na filosofia durante o século V a.C.

36. Disserte sobre as diferenças da proposta filosófica socrá-

tica em relação à filosofia pré-socrática e aos sofistas.

37. Tanto a postura dos sofistas quanto a atitude filosófica de

Sócrates apresentam riscos à moralidade ateniense de proce-dência aristocrática. Explique as razões pelas quais sofistas e Sócrates consistem em contestações à moral aristocrática.

38. C5-H23Parece que Sócrates admitiu implicitamente exis-

tir em todos os homens um desejo inato do bem. É também nesse sentido que se apresentava como um simples parteiro, cujo papel limitava-se a fazer que seus interlocutores descobrissem suas possibilida-des interiores.

HADOT, Pierre. O que é a filosofia antiga? São Paulo: Loyola, 1992. p. 62.

O texto de Pierre Hadot refere-se diretamentea. ao vínculo entre o individualismo e a ética socrática.b. ao vínculo entre a maiêutica socrática e a vida virtuosa.c. ao vínculo entre o método socrático e a teoria platôni-

ca das ideias.d. ao vínculo entre o relativismo dos sofistas e a éti-

ca socrática.e. ao vínculo entre a democracia e o aperfeiçoamento

intelectual socrático.

39. UFF-RJA Apologia de Sócrates é o relato da defesa de Sócrates

escrito pelo seu discípulo Platão, diante do tribunal de Atenas. Um dos assuntos abordados nessa obra é a relação entre ig-norância e conhecimento. Sócrates sentiu-se constrangido quando o Oráculo de Delfos o proclamou como o “mais sábio de todos os homens”, já que ele se achava, ao contrário, muito pouco sábio. Mas, ao conversar com pessoas que atribuíam a si mesmas muita sabedoria e ao constatar que elas eram tão ou mais ignorantes que ele, concluiu que devia ser mesmo o mais sábio, pois, ao menos, ele tinha consciência de sua própria ig-norância. Comente a declaração de Sócrates de que a pior igno-rância é não ter consciência dela e de que o primeiro passo no caminho do conhecimento é reconhecer a própria ignorância.

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40. UFU-MGHá um abismo imenso que separa esta escala de valores que Sócrates proclama com tanta evidência e a escala

popular vigente entre os gregos e expressa na famosa canção báquica antiga: O bem supremo do mortal é a saúde; O segundo, a formosura do corpo; O terceiro, uma fortuna adquirida sem mácula; O quarto, desfrutar entre amigos o esplendor da juventude.

JAEGER, Werner. Paideia. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 528-529.

a. O que é o homem para Sócrates?b. Qual é a relação entre o que define o homem e a máxima délfica “Conhece-te a ti mesmo”?

Veja o gabarito desses exercícios propostos na página página 278.

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GAB.

Gabarito dos Exercícios PropostosFILOSOFIA 581

Módulo 101. A

02. E

03. A

04. 05 (01 + 04)

05. V – V – F – F

06. C

07. E

08. C

09. A

10. A concepção filosófica de Herá-clito de Éfeso concentra-se no devir porque, de acordo com esse filósofo, na mobilidade perpétua, um ser não permanece idêntico a si mesmo e desloca-se necessariamente em seu contrário. Parmênides de Eleia, em sentido contrário, rejeita a aparente multiplicidade do vir a ser a partir de sua afirmação racional da realidade exclusiva do ser. Parmênides caracte-riza o ser como uno, eterno, imutável, indivisível e pleno. Ainda no período pré-socrático da filosofia grega, sur-gem as primeiras tentativas de com-patibilizar a ontologia de Parmênides com a noção heraclitiana do devir. Em geral, essas filosofias conservam as noções de eternidade e de imutabi-lidade do ser, mas pensam o ser no plural e concebem o devir como com-posição e decomposição de seres eternos e indestrutíveis, e não como transição do não ser ao ser e do ser ao não ser.

11. C

12. D

13. E

14. D

15. A

16. C

17. A

18. D

19. A

20. Ética e filosofia política são áreas distintas, porém profundamente in-terseccionadas, do saber filosófico. A ética examina motivações individuais e relações pessoais, a esfera privada da vida, que não são, pelo menos di-retamente, tematizadas pela política. A filosofia política investiga relações de poder vigentes em uma dimensão pública que não se restringe aos fe-nômenos da moralidade. Ambas inci-dem na antropologia filosófica, à me-dida que localizam as bases da moral e da política em digressões sobre a

natureza humana e as possibilidades de realização do ser humano. Com igual intensidade, especulam acer-ca de conceitos como bem e justiça, assim como as recíprocas interfe-rências entre relações pessoais e os círculos públicos da vida em socieda-de. Em certo sentido, uma concepção ética resulta em proposições acerca da forma justa de organização políti-ca da sociedade, e, da mesma forma, uma teoria política implica determi-nadas noções éticas. Em linguagem sucinta, podemos sentenciar que as reflexões morais abrangem também questões políticas, assim como a fi-losofia política necessariamente exa-mina temas da moralidade.

Módulo 221. D

22. A

23. C

24. E

25. C

26. 23 (01 + 02 + 04 + 16)

27. V – V – F – F

28. E 29. A 30. D

31. 14 (02 + 04 + 08)

32. A 33. A 34. E

35. Considerando que as pesquisas filosóficas se relacionam com seus contextos sócio-históricos específicos, recepcionando as influências cultu-rais em que se desenvolvem, devemos compreender o deslocamento temático do pensamento filosófico, das investi-gações sobre a natureza para o exame do ser humano, no interior das modi-ficações socioculturais da civilização helênica no século V a.C., com o apro-fundamento da experiência política na igualdade democrática entre os cida-dãos. Nesse período, a cidade-Estado de Atenas consolida-se como centro eco-nômico, político, cultural e filosófico do mundo grego, favorecendo as práticas pedagógicas dos sofistas, normalmen-te estrangeiros, procedentes de outras cidades helênicas, que, mediante re-muneração, dedicam-se à preparação

dos cidadãos para a atuação na vida pública. Também é correto observar que o teor antropológico do projeto filosófico de Sócrates é favorecido pela cultura ateniense, com a valorização dos temas propriamente humanos.

36. Sócrates rejeita as especulações cosmológicas dos chamados filósofos pré-socráticos, alegando que suas te-ses se anulam mutuamente e que o co-nhecimento sobre o cosmos não ofere-ceria contribuições efetivas para a vida humana. Assim, desloca a reflexão filo-sófica para as interrogações diretamen-te concernentes ao ser humano. O viés antropológico da filosofia de Sócrates diferencia-se das práticas dos sofistas, uma vez que ele rejeita o relativismo e entende a filosofia como a busca de ver-dades universais. Além disso, enquanto os sofistas ministram ensinamentos mediante palestras, Sócrates estabele-ce o diálogo como caminho para o saber.

37. A moral aristocrática relaciona-se com o pensamento mítico, concebendo a excelência moral como elemento atri-buído aos melhores por nascimento, os próprios aristocratas, e não admitindo a discussão racional em torno dos valo-res morais. A atividade pedagógica dos sofistas consiste na contestação aos valores aristocráticos, ao considerar a vida virtuosa como passível de aquisi-ção por todos os cidadãos e ao iniciar o debate acerca da moralidade, acom-panhado do relativismo ético. Sócrates, por sua vez, ao propor a conquista da autonomia moral pelo conhecimento racionalmente sustentado, posiciona-se de forma contestatória em relação aos parâmetros morais convencionais da aristocracia.

38. B

39. O reconhecimento da ignorância, segundo Sócrates, é o passo inicial para os seres humanos se libertarem dos falsos saberes e dos seus preconceitos, iniciando, então, o longo e sistemático itinerário em busca do conhecimento verdadeiro. A admissão da ignorância possibilita o método dialógico socrá-tico, com sua exortação para que seu interlocutor discorra sobre um tema,

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explanação esta seguida por sucessivas interrogações em torno da temática de-batida, com o propósito de se alcançar uma definição racionalmente assentida por todos os participantes do diálogo.

40. a. Sócrates não define a essência humana nas manifestações de seu corpo ou em sua exterio-ridade, mas sim em sua alma,

compreendida como sede de pensamento, ou seja, para esse filósofo o ser humano é essen-cialmente um ser pensante.

b. O "conhece-te a ti mesmo" é assumido por Sócrates como a busca pelo conhecimento da natureza humana, da fina-lidade da vida humana. Em sua concepção do ser humano

como ser pensante, esse filó-sofo entende que o conheci-mento de sua própria humani-dade assegura ao ser humano o seu aprimoramento moral e uma vida de acordo com a sua natureza. Essa máxima con-densa a articulação entre filo-sofia e vida humana na pers-pectiva socrática.

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AnotaçõesLI

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