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187 CAPÍTULO 7 - O Caso Throttleman A Throttleman (TH) é uma rede de comércio de vestuário a retalho, fundada em 1991, no Porto. Em 1993, a empresa iniciou uma estratégia de crescimento através de unidades franqueadas. Com o início do processo de internacionalização, em 1996, esta estratégia foi ainda mais reforçada. Em 2001, no seguimento de problemas com a expansão internacional, tomou posse uma nova administração que traçou um novo rumo para a organização. A empresa redireccionou a sua atenção para o mercado interno e regressou a uma estratégia de crescimento através de unidades próprias. Actualmente, a Throttleman tem 55 unidades, 45 das quais se encontram integradas na empresa e as restantes 10 são franqueadas. No exterior, existem apenas 3 unidades próprias em Madrid. Apesar de, inicialmente, a empresa se dedicar apenas à comercialização de vestuário masculino, hoje, apresenta também colecções direccionadas aos segmentos feminino e infantil. Tal como no caso anterior, e tendo como objectivo a elaboração de um estudo longitudinal, dividiu-se a narrativa inicial em dois períodos. Os principais acontecimentos na vida da empresa, em cada um desses períodos, encontram-se registados cronologicamente na Tabela 8 e são descritos na primeira parte do caso. Em seguida, apresentam-se algumas características importantes da rede, nomeadamente, a gestão das unidades franqueadas, as rotinas de replicação das unidades e dos procedimentos, os mecanismos de supervisão e controlo e a gestão da reformulação do conceito dentro da rede. Finalmente, tendo em conta os objectivos propostos para este trabalho, elabora-se uma análise ao caso, focalizando-nos no papel das competências na emergência, desenvolvimento, manutenção e termo dos relacionamentos inseridos nesta rede.

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CAPÍTULO 7 - O Caso Throttleman

A Throttleman (TH) é uma rede de comércio de vestuário a retalho, fundada em

1991, no Porto. Em 1993, a empresa iniciou uma estratégia de crescimento através de

unidades franqueadas. Com o início do processo de internacionalização, em 1996, esta

estratégia foi ainda mais reforçada. Em 2001, no seguimento de problemas com a

expansão internacional, tomou posse uma nova administração que traçou um novo rumo

para a organização. A empresa redireccionou a sua atenção para o mercado interno e

regressou a uma estratégia de crescimento através de unidades próprias.

Actualmente, a Throttleman tem 55 unidades, 45 das quais se encontram

integradas na empresa e as restantes 10 são franqueadas. No exterior, existem apenas 3

unidades próprias em Madrid. Apesar de, inicialmente, a empresa se dedicar apenas à

comercialização de vestuário masculino, hoje, apresenta também colecções

direccionadas aos segmentos feminino e infantil.

Tal como no caso anterior, e tendo como objectivo a elaboração de um estudo

longitudinal, dividiu-se a narrativa inicial em dois períodos. Os principais

acontecimentos na vida da empresa, em cada um desses períodos, encontram-se

registados cronologicamente na Tabela 8 e são descritos na primeira parte do caso. Em

seguida, apresentam-se algumas características importantes da rede, nomeadamente, a

gestão das unidades franqueadas, as rotinas de replicação das unidades e dos

procedimentos, os mecanismos de supervisão e controlo e a gestão da reformulação do

conceito dentro da rede. Finalmente, tendo em conta os objectivos propostos para este

trabalho, elabora-se uma análise ao caso, focalizando-nos no papel das competências na

emergência, desenvolvimento, manutenção e termo dos relacionamentos inseridos nesta

rede.

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Tabela nº8 - Periodização do Caso Throttleman

Período Acontecimentos Relevantes Número UP

Número UF

Número Unidades no Exterior

1991 – Lançamento da marca Boxer Shorts

1993 – Início do franchising 3 I

(1991 1996 – Internacionalização da marca Throttleman

3 17 6

A 1997 - Crescimento através de UF 7 31 14 2001) 1998 - Crescimento através de UF 2 23 ?

1999 - Crescimento através de UF 9 38 23 2000 - Crescimento através de UF

5 39 18

2001 – Nova Gestão

22

20

11

II 2002 - Crescimento através de UP 25 18 8 (2001 2003 - Crescimento através de UP 28 18 7

A 2004 - Crescimento através de UP 32 17 6 2006) 2005 - Crescimento através de UP 44 12 4

2006 - Crescimento através de UP

45 10 3

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7.1. Descrição do Caso

7.1.1. Período I - de 1991 a 2001: A Fundação e o Franchise da

Rede

A Boxer Shorts surgiu em 1991, no Porto, fundada por quatro sócios. A empresa

dedicava-se à comercialização de camisas, gravatas e boxer shorts, tendo como

segmento alvo a classe média alta. A imagem da marca procurava combinar elementos

que traduzissem uma mensagem clássica mas, simultaneamente, um pouco irreverente,

apelativa aos jovens executivos portugueses. Para esse efeito, a empresa combinava

uma oferta de camisas e gravatas clássicas com boxer shorts elaborados com o mesmo

padrão das camisas ou com motivos ‘divertidos’. Num espaço de tempo relativamente

curto, a Brasopi, SA, empresa detentora da marca, abriu três lojas próprias, no Grande

Porto. Neste período, o negócio cresceu de forma muito rápida. Dois anos após o início

da actividade, em 1993, a empresa iniciou uma estratégia de crescimento através de

unidades franqueadas, sendo o recrutamento dos franqueados realizado a partir dos

contactos pessoais dos membros da direcção da empresa. Segundo o entrevistado, Pedro

Pinheiro, um dos administradores actuais da empresa, a opção esteve relacionada com a

necessidade de capital para crescer.

Em 1996, a empresa iniciou a expansão internacional. Esta decisão estratégica

influenciou definitivamente o futuro da empresa. Em primeiro lugar, a empresa viu-se

obrigada a mudar o nome da marca, para entrar no mercado inglês. A legislação inglesa

não permitia registar a marca Boxer Shorts, por se tratar do nome de um produto.

Assim, a empresa teve que adoptar uma nova marca, Throttleman. De forma a manter a

uniformidade, a empresa iniciou o processo de substituição da marca em Portugal, com

a utilização de uma marca transitória, Boxer Shorts by Throttleman, até deixar cair

totalmente em desuso a marca inicial e passar a utilizar apenas a nova marca. Neste

período, a gestão da empresa adicionou um conjunto de novos artigos ao leque de

produtos iniciais. Entre os novos produtos, destacam-se, por exemplo, os acessórios de

vestuário masculino, como os cintos, os sapatos, os suspensórios e os botões de punho,

bem como os artigos de viagem, as malas, os necessaires e os chinelos de quarto e,

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ainda, outros artigos como os pijamas, os calções e as toalhas de praia.

Simultaneamente, a empresa adoptou também um design mais moderno e jovem para as

lojas. As cores e materiais utilizados foram substituídos. Por exemplo, a cor verde

escura inicial foi substituída pelo verde-água e a madeira utilizada na construção dos

móveis da loja foi também trocada por uma de aspecto mais leve. A frente das lojas,

localizadas em centros comerciais, foi alterada para que não existisse qualquer

obstáculo na entrada dos clientes na loja. Para isso, a empresa optou por eliminar as

montras e as portas, transformando toda a loja numa enorme montra e toda a frente da

loja numa grande porta. Desta forma, o início da loja pouco se distinguia do fim do

corredor.

O projecto de internacionalização exigiu um investimento elevado por parte da

empresa, o que fez com que, em 1998, se tenha verificado uma alteração da estrutura

accionista, com a entrada da empresa de capital de risco do BPI e do FIEP. Nesse

mesmo ano, a empresa decidiu franquear as unidades, anteriormente integradas

verticalmente. Segundo o entrevistado, o principal objectivo do franchise dessas

unidades foi aliviar a empresa da preocupação com a gestão das lojas localizadas em

território nacional. Em Portugal, nesse período, a Brasopi manteve apenas uma das

unidades na sua propriedade. Esta unidade, localizada no Aeroporto Francisco Sá

Carneiro, era considerada a montra da marca e a unidade piloto onde as novas ideias

iam sendo testadas. No exterior, nessa fase, a empresa detinha directamente a maior

parte das unidades. Esta opção resultou de constrangimentos de ordem legal, pois, em

alguns países, a legislação não permitia que uma empresa iniciasse as operações em

franchising, sem que antes tivesse operado verticalmente durante algum tempo. Por

outro lado, o desconhecimento da marca no exterior também dificultava o franchise

desta, nessa fase inicial do processo.

Como foi referido, nesta fase, em Portugal, a empresa apostou fortemente no

crescimento através de franchising. Assim sendo, entre 1998 e 2000, a empresa

participou nas feiras de promoção de venda de franchises e fez publicidade nos Guias

de Oportunidades em Franchising. É exactamente neste período, que a empresa

franqueadora Brasopi S.A., iniciou o seu relacionamento com a empresa Hozar

Portugal, Lda., que adquiriu o direito a explorar uma das unidades da rede, situada no

centro comercial GaiaShopping em Vila Nova de Gaia. O relacionamento entre as duas

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empresas surge através da relação de amizade existente entre um dos sócios da Hozar

Portugal e o Responsável pelo Franchising da Throttleman. Em dois anos, a Hozar

Portugal adquiriu o franchise de mais 5 lojas da marca, localizadas no Porto, Lisboa,

Cascais, Aveiro e Braga, tornando-se no principal franqueado da rede.

7.1.2. Período II - de 2001 a 2006: Regresso à Integração Vertical A partir de 2000, a Brasopi começou a sentir algumas dificuldades no projecto

de expansão. As vendas nas unidades do exterior não atingiam os objectivos, os custos

eram superiores ao esperado e os resultados negativos avolumavam-se. Os accionistas

da empresa procuravam soluções e começaram a ponderar a hipótese de encontrar

compradores para a marca. Nessa altura, a gestão da Hozar Portugal apercebeu-se que

se encontrava extremamente dependente do que poderia acontecer com a empresa

franqueadora. Apesar de explorar outros negócios, a maior parte do seu volume de

vendas dependia da facturação das lojas da rede da Throttleman e uma boa parte do seu

investimento tinha sido realizado nesses franchises. Assim, neste processo, a empresa

franqueada acabou por adquirir 51% da empresa franqueadora e assumir a gestão da

empresa. Mais recentemente, a estrutura accionista voltou a modificar-se com a saída do

Capital de Risco do BPI e a entrada Grupo Regojo, um dos maiores grupos de retalho,

que detém marcas como, por exemplo, a Massimo Dutti. A empresa Hozar Portugal

continua a gerir e a deter a marca Throttleman.

A nova administração adoptou uma perspectiva estratégica diferente da seguida

pela anterior gestão. A focalização estratégica da empresa redireccionou-se para o

mercado nacional, restringindo o investimento no estrangeiro. Assim, a nova gestão

iniciou uma estratégia de recompra dos principais franchises existentes, nomeadamente

as lojas localizadas no Grande Porto e na Grande Lisboa. A gestão da Throttleman

alterou mais uma vez a imagem da marca e introduziu produtos novos, de forma a

alargar a oferta ao total look. Mais recentemente, a linha de senhora e de criança foram

também introduzidas. Esta ampliação da gama de produtos teve consequências ao nível

da dimensão das lojas que, em termos médios, aumentou significativamente.

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Com a nova gestão, a empresa regressou à integração vertical como estratégia

preferencial. Apesar do crescimento através de franchising continuar a ser uma

estratégia seguida pela empresa, a gestão deixou de procurar activamente franqueados.

Quando decide abrir numa determinada localização, não está dependente da existência

de potenciais candidatos a franqueados. Se, por acaso, existir um potencial parceiro e

este tiver as qualidades consideradas relevantes para que se inicie o relacionamento,

então a Throttleman abre uma loja franqueada, caso contrário, abre uma loja própria.

Segundo Pedro Pinheiro, as características principais que esta empresa procura

encontrar num potencial franqueado é que este “consiga aceitar e perceber a nossa

forma de gerir, que aceite os procedimentos que propomos, para que a rede toda

funcione como deve”1.

Não publicitando a venda do franchise, a procura por parte de potenciais

franqueados resulta, na opinião do entrevistado, quer da reputação do franqueador,

enquanto contraparte no relacionamento de franchising, quer da notoriedade da marca.

Na opinião do entrevistado, contudo, a notoriedade do conceito está mais relacionada

com a experiência pessoal que os potenciais franqueados têm com a marca, enquanto

consumidores, do que com o facto da Throttleman aparecer (à data das entrevistas) na

lista dos TOP30 do Instituto Português de Franchising. Isto é, o que determina o

interesse do candidato a franqueado pelo início do relacionamento com a Throttleman, é

a opinião que este forma sobre o conceito, quando vai a uma das suas lojas e simpatiza

com o serviço prestado pelos vendedores e com o design e qualidade dos produtos

oferecidos. Ainda de acordo com Pedro Pinheiro, a reputação do franqueador é mais

apreciada pelos franqueados que já têm experiência no franchising, do que por aqueles

que procuram iniciar um relacionamento deste tipo pela primeira vez. Finalmente, a

empatia gerada entre os potenciais parceiros durante a fase de negociação é também um

aspecto importante a considerar.

1 Pedro Pinheiro, entrevista em 19/12/2005.

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7.1.3. As Unidades Franqueadas na Throttleman

Tal como noutras redes de franchising, na Throttleman, o franqueador realiza as

actividades relacionadas com a concepção e marketing do produto. Ao franqueado,

cabe-lhe a gestão do ponto de venda, destacando-se a gestão da carteira de clientes, a

gestão de stocks, a gestão de pessoal e a gestão administrativo-financeira da unidade.

A gestão do relacionamento com o cliente é a principal competência que o

franqueador procura obter no franqueado. Na verdade, na óptica deste franqueador,

presentemente, esta é a principal vantagem decorrente do relacionamento de

franchising. O entrevistado considera que o conhecimento sobre o mercado local se

pode dividir no ‘conhecimento relativo ao cliente’ e no ‘conhecimento relativo ao

produto’. A este nível, o franqueador dá especial importância ao primeiro tipo de

conhecimento, o relativo ao cliente. O franqueador define este know-how como a

capacidade de atrair o cliente e mantê-lo fiel à marca. Nesse sentido, é fundamental

existir um atendimento personalizado do cliente.

O segundo tipo de conhecimento local, que este franqueador denomina ‘relativo

ao produto’, diz respeito às preferências do cliente relativamente ao produto oferecido

pela marca. Como consequência deste conhecimento, o franqueado tem também um

papel relevante no desenvolvimento do produto. Durante o processo de

desenvolvimento da colecção para o ano seguinte, os franqueados são chamados a

participar, contribuindo com o seu conhecimento local relativo às preferências dos

clientes.

Em contrapartida, a gestão de stocks das unidades é a principal preocupação do

franqueador, que gostaria de a poder realizar. A gestão operacional dos stocks das

unidades da rede é um dos factores que mais influenciam a sua rendibilidade. Para esse

efeito, a empresa franqueadora dispõe de um software que permite realizar previsões

das vendas semanais, por unidade, a partir dos valores históricos. Com base nos

resultados obtidos, a empresa envia, semanalmente, uma sugestão de encomenda para as

unidades franqueadas. No caso das unidades próprias, essa previsão é vinculativa e

determina os produtos que são enviados para a unidade. Nas unidades franqueadas, o

gestor local pode alterar essa estimativa e realizar a sua própria encomenda.

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Nesse ponto, os franqueados divergem, alguns mantém a sugestão do

franqueador, outros decidem alterá-la. Alguns franqueados, temendo que alguns

produtos que se encontram no topo das vendas esgotem, sobredimensionam as suas

encomendas. Outros franqueados, receosos de não efectuarem as vendas de todos os

artigos em stock, subdimensionam-na. Ambas as situações são contraproducentes.

No primeiro caso, as estimativas resultantes da aplicação do software de gestão

de stock saem também sobredimensionadas. Como o franqueador gere o seu próprio

stock tendo em conta essas previsões, a rede como um todo acaba por ser prejudicada,

pois as existências em armazém aumentam significativamente, traduzindo-se num

aumento do fundo de maneio necessário, o que tem, obviamente, custos financeiros para

a empresa.

O segundo caso, resulta, muitas vezes, no mau desempenho da unidade que,

evidentemente, não pode vender produto que não tem em armazém. O facto de o nível

de stocks da unidade aumentar, possibilita, imediatamente, um acréscimo das vendas.

De acordo com o franqueador, o desempenho da unidade está fortemente relacionado

com uma boa gestão dos stocks. Normalmente, quando um franqueado está descontente

com a performance da sua unidade, e se este estiver de acordo, a primeira medida

tomada pela empresa franqueadora é assumir a gestão de stocks dessa unidade, tal como

se fosse uma unidade própria. Em média, as vendas sobem 20%.

Actualmente, “em casos muito específicos”, o franqueador identifica benefícios

associados a algumas unidades franqueadas. Estes são, para o franqueador, “exemplos

de bons franqueados, que contribuíram com aquilo que é essencial para a cadeia, que é

ter uma clientela fidelizada e ter um bom atendimento. […] Mas, vem com um preço. E,

o preço é a partilha do poder que está na rede. Isso é necessário gerir e ter a consciência

que vai sempre haver atritos e problemas”2.

Na opinião do franqueador, o relacionamento com o franqueado não é muito

fácil, pois o franqueado nunca está satisfeito. As vendas na sua unidade podem estar a

crescer significativamente, mas o franqueado encontra sempre motivos para protestar,

muitas vezes por coisas que, na opinião do franqueador, são pouco significativas, como

por exemplo o facto de um certo e particular produto não ter sido entregue. Esta

situação gera um desgaste no relacionamento entre o franqueador e o franqueado e

2 Pedro Pinheiro, entrevista em 19/12/2005.

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obriga a que a empresa franqueadora tenha de consumir recursos na resolução de

conflitos, que de outra forma poderiam estar alocados a outras funções mais rentáveis.

Na verdade, o franqueador encontra, ainda, outros problemas nos

relacionamentos em franchising. Em primeiro lugar, existe um problema de natureza

jurídico-legal que se traduz na dificuldade de vincular as partes envolvidas num

contrato de franchising, recorrendo aos tribunais portugueses. Este constrangimento

leva o franqueador a procurar mecanismos alternativos, para se proteger relativamente a

comportamentos desviantes do franqueado. A forma encontrada consiste em deter a

propriedade do imóvel onde se encontra o estabelecimento franqueado ou,

alternativamente, o contrato de arrendamento desse espaço, repassando esse direito ao

franqueado. Apesar de dispor desta ferramenta, considerada pelo franqueador como

muito poderosa, a empresa não a utiliza para expulsar os franqueados sem que haja uma

razão válida.

Segundo, o franqueador considera que não existe uma partilha do risco do

investimento entre o franqueador e o franqueado. Nas poucas vezes em que um

investimento não se traduziu nos resultados esperados, devido, por exemplo, a uma má

localização, a Throttleman assumiu a maior parte do prejuízo.

Em terceiro lugar, existe um problema relacionado com a devolução, no final da

época, dos artigos da colecção. A gama de produtos oferecidos pela marca divide-se em

dois tipos, os produtos contínuos que estão sempre à venda na loja e os produtos da

colecção relativa a uma estação específica. Estes últimos encontram-se à venda apenas

durante a época em causa. No fim da estação, são recolhidos e substituídos pelos da

nova colecção. No caso das unidades franqueadas, isto traduz-se, em termos financeiros,

na devolução de mercadoria ao fornecedor. Esta mercadoria tem, nessa fase, um valor

de mercado muito inferior ao que teve durante a época transacta, pois não pode ser

vendida através dos pontos de venda normais. Esta dificuldade torna-se tanto mais

difícil de gerir, quanto maior o número de unidades franqueadas. Na maior parte das

vezes, o franqueado tem um ciclo de tesouraria positivo, pois compra a prazo a

mercadoria ao franqueador e vende a pronto pagamento ao cliente final. Assim, tende a

aplicar os fluxos de tesouraria excedentários, resultantes do ciclo de exploração, em

artigos da colecção que, caso não sejam vendidos durante a época normal, poderão ser

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devolvidos no final. Do lado do franqueador, fica o problema de gerir essa mercadoria

devolvida.

Finalmente, o poder de reacção da rede é menor. Não só, e como se verá, quando

surge uma nova localização para uma unidade já existente que se pretende ampliar, mas,

também, quando o franqueador pretende lançar, rapidamente, uma campanha

promocional. Por exemplo, se houver problemas com as vendas das gravatas, a sede da

Throttleman poderá decidir realizar uma campanha em que “na compra de uma gravata

se oferece outra”. Contudo, nas lojas franqueadas, é muito difícil, moroso e complicado

introduzir uma campanha deste estilo, porque a primeira reacção do franqueado é a de

discutir quem irá abdicar da margem.

Para este franqueador, os franqueados são heterogéneos, diferindo, sobretudo, na

atitude que têm para com a empresa franqueadora. Designadamente, os franqueados

diferenciam-se pelo “grau de obediência às instruções” dadas pelo franqueador. Os

franqueados distinguem-se também no acompanhamento dado ao seu ponto de venda, o

que origina desempenhos diferentes. Alguns franqueados são muito presentes e estão

frequentemente no ponto de venda, outros vêem o franchise como um investimento por

onde passam de vez em quando, finalmente, há ainda os franqueados que se demitem

completamente da gestão da sua unidade.

Entre os franqueados da rede, o franqueador destaca um em particular. Este

franqueado é considerado pelo franqueador como um caso exemplar. De tal forma que,

quando abriu um novo centro comercial numa determinada localização, a Throttleman

procurou este seu franqueado, que vamos denominar X, para que este aí abrisse uma

loja. No entanto, o franqueado X mostrava pouco interesse nessa perspectiva. Contudo,

o franqueador desejava abrir essa loja com a cooperação desse franqueado, a quem

reconhecia “competências extraordinárias de relacionamento com os clientes”. Assim,

como forma de o convencer a cooperar, a Throttleman propôs-lhe a constituição de uma

nova sociedade franqueada, cujo capital é detido pela empresa franqueadora e pela

antiga empresa franqueada.

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7.1.4. Replicação: Uniformização da Imagem

O franchising numa rede de retalho pressupõe a replicação de um determinado

modelo nas diferentes lojas. Teoricamente, o cliente entra numa loja e ela é igual, ou

muito semelhante, a uma outra que está num outro ponto do país. No entanto, o

franqueador da Throttleman considera que a replicação perfeita das unidades é

impossível. Na verdade, existe uma grande diversidade dentro da rede. À medida que o

conceito foi evoluindo, foram introduzidos novos produtos e o design e a dimensão das

lojas foi mudando. As novas lojas foram adoptando a nova imagem e os franqueados

foram sendo convencidos a investir na remodelação da sua unidade, nomeadamente

através da pressão exercida pela possibilidade da não renovação do contrato, mas

também pela demonstração da rendibilidade e valor gerados pelo investimento. No

entanto, subsistem, ainda, lojas com estilos de decoração anteriores ao actual e com

diferentes dimensões. Por exemplo, a última loja aberta pela rede tem 180 metros

quadrados e o último modelo de decoração, enquanto que a mais pequena tem apenas 5

metros quadrados e ainda o primeiro tipo de decoração da marca. Mesmo em termos do

produto oferecido, não existe homogeneidade entre as lojas da rede. Tendo em conta a

sua dimensão e localização, algumas lojas vendem apenas roupa de homem e criança.

Outras vendem só a linha funny, uma linha de t-shits e boxers com bonecos.

Esta constatação, no entanto, não significa que não exista uma preocupação, por

parte do franqueador, quanto à uniformização da imagem e do serviço prestado aos seus

clientes. No caso da Throttleman, tal como em todas as redes que operam na área do

retalho, esta uniformidade é, em primeiro lugar, garantida pela estratégia de marketing

decidida centralmente. Apesar de eventuais disparidades locais, todos os produtos

oferecidos pelas unidades da rede fazem parte da colecção da marca e são vendidos ao

mesmo preço. Por outro lado, todos os artigos da marca são vendidos exclusivamente

pelas lojas da rede. A promoção da marca é, também, realizada a nível central,

destacando-se a publicidade realizada em outdoors, muppies e nos meios de

comunicação social. Além disso, existem eventos pontuais a que a marca se associa,

procurando ganhar notoriedade, como o patrocínio de determinados actores em

programas televisivos ou campanhas de lançamento das novas colecções com a

presença de celebridades nacionais ou modelos internacionais.

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Nesta rede, existem ainda ‘rotinas de replicação’ que garantam a coerência da

imagem da marca. O processo de abertura de uma nova unidade é semelhante ao de

outras redes replicadoras e não é muito diferente se se tratar de uma unidade franqueada

ou própria. Este processo envolve a selecção da localização, a construção e o arranque

do funcionamento de uma nova loja. Estas três fases são acompanhadas de perto pelo

franqueador. Em primeiro lugar, esta decisão é sempre alvo de um estudo relativo à

viabilidade económica do investimento, em determinado local. Apenas se se demonstrar

rentável, e independentemente de se tratar de uma loja própria ou franqueada, o projecto

passará para a fase de construção. Nesta fase, existe um conjunto de elementos que

deverão ser respeitados, destacando-se, em primeiro lugar, o projecto arquitectónico e,

ainda, os materiais de construção (por exemplo, o pavimento a utilizar ou a tinta a

aplicar nas paredes), o mobiliário e a decoração da loja. No dia anterior à inauguração, o

stock inicial é enviado para a unidade, onde é colocado nos expositores e registado no

software de gestão de existências da unidade. Este processo é acompanhado pelos

funcionários da sede.

Após o arranque do funcionamento da unidade, para tentar assegurar a

uniformidade da imagem, nomeadamente da exposição do produto, do atendimento e da

gestão da loja, a empresa franqueadora recorre, sobretudo, aos responsáveis pela

supervisão das unidades. Além do departamento de supervisão, existe também um

departamento de merchandising que define as montras, isto é, determina qual a

decoração e que produtos deverão estar expostos. Os vitrinistas do franqueador

deslocam-se às unidades para ajudar na preparação da montra.

O franqueador reconhece que estes mecanismos poderiam ser complementados

através da formação dos colaboradores das várias unidades próprias, dos franqueados e

seus empregados. No entanto, nesta rede, normalmente, a formação é realizada, apenas,

no período de abertura de uma nova unidade. Na primeira semana de funcionamento da

unidade, é fornecida formação ao franqueado relativa à gestão de stocks e formação on-

the-job aos restantes funcionários. Não havendo mais formação e dada a grande

rotatividade dos vendedores, normalmente, passado um ano, já não se encontram

funcionários formados pela marca, a trabalhar na loja. Os novos empregados são

formados quer pelos franqueados, quer pelos gestores das unidades próprias. Ainda que

reconhecendo que esta é uma área onde a gestão da marca poderia melhorar, a empresa

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franqueadora considera difícil a implementação de formação adicional. Por um lado,

após a inauguração, os funcionários trabalham por turnos nas lojas, muitas das quais

abertas 14 horas por dia, 7 dias por semana, o que torna difícil encontrar disponibilidade

para realizar formação adicional. Por ouro lado, o próprio investimento nessa formação

pode não se demonstrar rentável, dada a grande rotatividade de pessoal.

7.1.5. Sistemas de Informação e Supervisão A actividade de supervisão assume um papel fundamental nesta rede. Além da

função controlo, que ajuda a garantir a uniformidade entre as diferentes unidades, é

também considerada como sendo uma forma de excelência, para transmissão de

informação entre a sede e as unidades e vice-versa.

Existem 4 funcionários responsáveis por visitar as lojas, mensalmente. A

atribuição das unidades a cada um dos supervisores é realizada com base na sua

distribuição geográfica e não na propriedade da unidade. Assim, existe um responsável

pela supervisão e quatro supervisores, dois responsáveis pela zona Norte e dois pela

zona Sul. Ao visitar as lojas, os supervisores preocupam-se em verificar se a unidade

está organizada de acordo com o pretendido. Isto é, por exemplo, se as montras, os

artigos expostos nas prateleiras, o número e a apresentação dos vendedores estão de

acordo com o definido pela sede. Nas lojas próprias, estes supervisores verificam,

também, os stocks, os gastos em telefone e a realização dos depósitos. Para o

franqueador, o negócio corre bem numa unidade própria, quando as vendas estão a

alcançar os objectivos, a loja está bem organizada, não há desvio de stocks ou de

depósitos, nem há custos demasiado elevados com telefones e telemóveis.

Além da função controlo, estas visitas têm, também, um papel importante a nível

da transmissão de informação do franqueador para as unidades e vice-versa. No fundo,

estes desempenham um papel de ligação entre a sede e as unidades locais. Por exemplo,

a informação sobre campanhas novas ou directrizes relativamente a certos produtos são

enviadas da sede para as lojas, através dos supervisores. Também antes do início das

campanhas de pré-saldos, é necessário informar todas as lojas que certos clientes, a

quem foi enviado um postal, terão direito a comprar a preço de desconto, num

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200

determinado período de tempo. O mesmo acontece sempre que há uma campanha de

muppies, pois as lojas terão que reforçar as encomendas. Finalmente, os supervisores

transmitem, também, às unidades informações de carácter mais operacional, por

exemplo de recursos humanos, como as férias ou os horários.

Além do acompanhamento de supervisão mensal já referido, nas unidades

franqueadas, o controlo incide na avaliação das vendas da unidade. De acordo com a

empresa franqueadora, o controlo não incide directamente sobre a gestão da unidade,

mas sobre os seus resultados. Se o volume de vendas for abaixo do esperado, então o

franqueador assume que o problema reside na gestão da unidade. Pelo contrário, se as

vendas forem superiores ao previsto, o franqueador atribui esse resultado a uma boa

gestão a nível local.

O controlo financeiro dos pagamentos devidos por estas unidades é muito

simples. Em primeiro lugar, os franqueados usam o mesmo programa de facturação do

franqueador, que tem acesso on-line às suas vendas, tal como às das lojas próprias.

Segundo, os franqueados pagam um fee fixo mensal pelas montras e serviços de

marketing, mas, este fee é, de facto, uma percentagem muito pequena do ganho. A

maior parte do lucro proveniente das unidades franqueadas está na margem do produto.

Finalmente, como as unidades franqueadas só vendem o produto que lhes foi fornecido

pelo próprio franqueador, é simples, para este, controlar quanto é que as unidades

próprias estão a facturar.

7.1.6. Gestão da Inovação: Criação e Difusão de Conhecimento Nesta rede, cabem ao franqueador as actividades de geração de ideias e de

definição estratégica que depois são transmitidas ao franqueado. Este é sempre descrito

como alguém que o franqueador quer que seja muito passivo. Do lado do franqueado, o

franqueador espera o input dos conhecimentos locais e a participação na escolha da

colecção. Existem duas reuniões por ano, onde todos os franqueados se reúnem com o

franqueador. Nesses dias, os franqueados deslocam-se às instalações da sede da

Throttleman e reúnem-se com designers, responsáveis comerciais, membros da

administração e outros colaboradores da empresa franqueadora. Estas reuniões têm

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201

como principal objectivo a transmissão de informação entre o franqueador e o

franqueado. Em particular, o franqueador apresenta as propostas para a colecção do ano

seguinte e recebe o feedback dos franqueados quanto ao que estes consideram ser as

preferências locais dos seus clientes. Mas, a participação do franqueado, no processo de

inovação, não excede esta contribuição. Na Throttleman, não há registo de, alguma vez,

uma ideia de um franqueado ter introduzido valor na rede como um todo. O

franqueador diz ter uma atitude de resignação, pois não espera que o franqueado tenha

boas ideias, como, de facto, considera que este poderia ter, por estar mais próximo do

mercado.

O franqueador reconhece que a reformulação do conceito pode levantar

problemas difíceis de resolver numa rede franqueada. No entanto, há um factor

importante que tem contribuído para a difusão das inovações na rede, que reside no

facto desta dispor de muitas unidades próprias, e, portanto, nunca pedir ao franqueado

para realizar um investimento que ainda não tenha sido testado e aprovado. Este foi, por

exemplo, o caso da introdução da linha de senhora que se demonstrou uma boa aposta e,

como tal, foi simples convencer os franqueados a iniciar a sua comercialização, apesar

de isso se traduzir num maior investimento a nível do fundo de maneio necessário. No

entanto, o facto de a marca vender um leque mais alargado de produtos, tornou

necessário o aumento da dimensão média das unidades. Na maioria dos casos, isto

traduz-se no abandono da loja antiga e na abertura de uma nova, ainda que na mesma

localização. No entanto, o franqueador não tem tido grande dificuldade em convencer o

franqueado a investir na remodelação das lojas, pois tem conseguido demonstrar-lhes

que ficam a ganhar se o fizerem. De qualquer forma, o franqueador utiliza sempre a

possibilidade da não renovação do contrato como uma forma de pressão. Caso o

franqueado não pretenda realizar o investimento de expansão, o franqueador espera até

ao fim do contrato ou negocia a antecipação do fim do contrato e investe directamente.

O único problema que o franqueador encontra é a capacidade de reacção ser

mais lenta. Por exemplo, quando o franqueador pretende expandir uma das suas lojas

localizadas num centro comercial, tem que esperar até que surja uma loja para arrendar.

Se a loja nesse centro comercial for franqueada, torna-se então necessário convencer o

franqueado a trocar o espaço antigo pelo novo espaço. Se este processo de negociação

com o franqueado for demasiado prolongado, a loja pode ser arrendada a um terceiro e a

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empresa franqueadora perde a oportunidade de ampliar a actividade nessa localização.

Assim, por vezes, a Throttleman negocia com o franqueado a antecipação do fim do

contrato, permitindo alterar a loja, tal como o pretendido, e sem que o franqueado se

sinta penalizado. Esta situação cria alguns entraves à eficiência da rede como um todo.

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203

7.2. Análise do Caso

7.2.1. O Papel das Competências no Relacionamento

A abordagem do franchising, sob o prisma das Competências Organizacionais

em Redes de Relacionamentos, implica, em primeiro lugar, a identificação das

competências existentes em cada um dos lados do relacionamento. Do lado do

franqueador da Throttleman, verifica-se a existência de competências na gestão da

marca e do conceito de negócio, o que inclui o know-how relativo à sua definição,

manutenção e desenvolvimento. Encontram-se, também, presentes competências

relativas à captação de franqueados, replicação de rotinas, criação, codificação e difusão

do conhecimento através da rede. Do lado dos franqueados, encontra-se o know-how

relativo à gestão corrente da unidade e ao mercado local. Os franqueados da

Throttleman são responsáveis pela gestão do ponto de venda, evidenciando-se, entre as

tarefas que desenvolvem, a gestão dos relacionamentos com os clientes como a

principal competência que o franqueador procura obter nos franqueados. A esse nível, o

franqueador dá especial importância à capacidade dos franqueados para atrair os

clientes e mantê-los fiel à marca. Um outro tipo de conhecimento local, também

importante para o franqueador, diz respeito às preferências dos clientes relativamente ao

produto oferecido pela marca. Como consequência deste conhecimento, os franqueados

participam no processo de desenvolvimento do produto.

Assim, verifica-se que as empresas pertencentes a esta rede acedem aos recursos

e às competências das suas contrapartes (Axelsson e Easton, 1992). Por um lado, os

franqueados acedem às competências do franqueador, enquanto que, por outro lado, o

franqueador acede ao know-how dos seus franqueados. Verifica-se, também, que tanto

cada participante na rede, quanto os relacionamentos que se estabelecem entre eles, têm

características únicas (Hakansson e Snehota, 1995). O franqueador reconhece que os

franqueados da rede são heterogéneos, diferindo no “grau de obediência” às suas

instruções e no acompanhamento dado ao seu ponto de venda, o que origina

desempenhos diferentes nas várias unidades franqueadas.

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204

Contudo, a análise deste caso não demonstrou que as competências dos

franqueados dessem um contributo significativo na explicação da emergência do

franchising ao nível do negócio. Na verdade, a análise deste caso permite-nos concluir

que, nesta rede, o início dos relacionamentos em franchising parece encontrar-se

associado à restrição de recursos. Numa primeira fase, a expansão da empresa implicou

uma necessidade de capital que esta não podia suprir de forma imediata. Na fase

seguinte, o forte crescimento do número de unidades franqueadas encontrou-se

associado à necessidade de libertar os recursos humanos da sede para se dedicarem ao

novo projecto de internacionalização. Finalmente, neste caso, também não se encontrou

suporte empírico para a Teoria da Agência do Franchising. Estas conclusões serão

analisadas em maior detalhe nos parágrafos seguintes.

Na primeira fase, em 1993, a empresa adoptou uma estratégia de crescimento

através de unidades franqueadas, como forma de contornar constrangimento de recursos

financeiros, em linha com o proposto por Caves e Murphy (1976). Mais tarde, em 1998,

a empresa decidiu franquear as unidades próprias localizadas em território nacional,

tendo como objectivo libertar a empresa da sua gestão. Nesse momento, dada a entrada

do BPI e do FIEP no seu capital social, a empresa não sofria de constrangimentos de

natureza financeira. No entanto, esta decisão estava relacionada com a falta de recursos

humanos de gestão. Esta constatação está de acordo com o proposto por Penrose (1959)

que explica como os recursos humanos de gestão impõem um limite à taxa de

crescimento da empresa. A disponibilidade de gestores experientes, que não podem ser

adquiridos no mercado, limita a expansão que se pode planear e realizar, dentro de um

determinado período de tempo, na medida em que a coerência da organização depende

deles. Esta é também a explicação encontrada por Thompson (1994) que considera que

o franchising surge por ser mais fácil obter ‘bons franqueados’ do que ‘recrutar gestores

talentosos’. Por último, tal como o referido anteriormente, este caso não dá suporte

empírico à Teoria da Agência do Franchising. Esta perspectiva poderia explicar o

franchise das unidades no exterior, onde os custos de supervisão são superiores por se

encontrarem mais distantes da sede, mas não o franchise das unidades em Portugal.

Nesta rede, existem mais dois factores que não se enquadram na perspectiva de

Agência. O primeiro tem a ver com o facto de se encontrarem unidades detidas

verticalmente na proximidade de unidades franqueadas. O segundo tem a ver com a

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atribuição de várias unidades, com localizações distantes entre si, a um só franqueado.

Por um lado, Minkler (1990) refere que a Teoria da Agência não justifica a existência

de unidades integradas e unidades franqueadas em localizações próximas. Da mesma

forma, é difícil compreender, à luz da Teoria da Agência, o mix organizacional da

Throttleman. Por exemplo, em 1999, a uma distância de 20 km da sede, encontravam-se

uma unidade própria e cinco unidades franqueadas. Entre 20 e 100 km a partir da sede,

localizavam-se uma unidade própria e duas franqueadas. A mais de 100 km da sede,

encontram-se sete unidades próprias e trinta e uma franqueadas.

Por outro lado, de acordo com Kaufmann e Lafontaine (1994), por vezes, os

franqueadores atribuem mais do que uma unidade a um franqueado, como forma de os

recompensar seu pelo esforço na gestão do ponto de venda. Contudo, as unidades

atribuídas ao mesmo franqueado deverão localizar-se em áreas muito próximas. Assim,

sob um ponto de vista de agência, parece estranho que, no caso particular desta rede,

entre 1998 e 1999, a empresa tenha atribuído a um único franqueado 6 unidades

localizadas em seis cidades diferentes, as mais afastadas distando entre si mais de 300

km. Tal como referem Brickley e Dark (1987), se numa unidade franqueada, a

propriedade e a gestão estão separadas, então existe um nível adicional de problemas de

agência. Na verdade, a atribuição a um único franqueado de mais do que um ponto de

venda pode originar duplicação dos problemas de agência do franchising, se o

franqueado deixar de assumir o papel de proprietário- gestor. Se o franqueado não for o

gestor das unidades, ele terá que contratar gestores para cada um dos pontos de venda.

Essa situação implicará problemas de prevaricação por parte dos gestores das unidades.

No entanto, a eliminação dessa prevaricação apresenta-se como a grande vantagem do

franchising, na perspectiva da agência.

No entanto, ao nível da unidade, a decisão relativa ao tipo de propriedade de

uma unidade parece, pelo menos em certos casos, ser influenciada pelas competências

necessárias para gerir essa unidade e pelo modo como essas competências se podem

combinar com as outras competências existentes na rede. Esta situação é exemplificada

pelo caso do franqueado X. Abrindo uma excepção relativamente à sua estratégia, o

franqueador abriu algumas unidades em parceria com este franqueado. Esta excepção

resulta do facto de o franqueado X possuir “competências extraordinárias de

relacionamento com os clientes”. Esta perspectiva poderá também ajudar-nos a

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206

compreender porque razão a empresa franqueadora concordou em vender o franchise de

6 unidades a um único franqueado. Tal como foi referido, esta situação não se enquadra

numa perspectiva de agência. Mas numa perspectiva de competências, a empresa poderá

optar por essa via, pois pretende utilizar as competências de um franqueado em

particular, a quem reconhece competências importantes na gestão do ponto de venda.

Esta situação demonstra que, mesmo numa rede, como a Throttleman, onde o

franqueador vê os franqueados como actores passivos que deverão obedecer às suas

instruções, as competências dos franqueados assumem, por vezes, uma função

importante. Este ponto será explorado em seguida.

Foi já anteriormente argumentado que a diversidade de franqueados poderá ser

uma questão importante, especialmente no que diz respeito à criação de conhecimento

(e.g. Cliquet e Ngoc, 2003). As diferentes localizações, as experiências e os percursos

passados dos vários franqueados, poderão torná-los em fontes importantes de

competências dinâmicas da rede. No entanto, aparentemente, os franqueadores parecem

negligenciar este papel potencial dos franqueados (e.g. Langenham 2003) e procurar

obter o controlo da rede. Contudo, o controlo da rede poderá ser prejudicial, pois impõe

um limite à heterogeneidade e, portanto, à criação de conhecimento e inovação

(Hakansson e Snehota, 1995). Este parece ser o caso da empresa em estudo.

De facto, constatamos que, neste caso, as características principais que a

Throttleman procura num potencial franqueado são a obediência e a passividade. Nesta

rede, o franqueador tem a actividade de definição estratégica, de geração de ideias que

depois são transmitidas aos franqueados. Trata-se um relacionamento do estilo “top-

down”, onde “o franqueado é percepcionado como sendo um bom franqueado, se fizer o

que o franqueador deseja”, tal como Elango e Fried (1997, pp. 76) descrevem. Os

franqueados utilizam o conhecimento e expertise do franqueador e não são capazes de

contribuir para o sistema. Neste caso, não há registo de algum franqueado ter

acrescentado valor à rede através da geração de inovações. Mais ainda, o franqueador

não espera que os franqueados contribuam com boas ideias. Os franqueados são vistos

como “a antítese do empreendorismo e do pensamento estratégico” (Croonen, 2003, pp.

8).

A análise do caso permitiu-nos, ainda, confirmar a importância das

competências indirectas do franqueador para o início e manutenção dos

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relacionamentos. Tal como já foi referido, de acordo com Loasby (1998), as

competências indirectas são aquelas que permitem a uma empresa aceder às

competências de outras. Assim, as competências indirectas do franqueador parecem

reflectir o seu know-how para captar bons franqueados, criar um conceito atractivo, criar

e manter uma boa reputação no mercado, codificar e difundir conhecimento e replicar

rotinas.

Numa fase inicial do franchise, as principais competências indirectas do

franqueador, que facilitaram o início dos relacionamentos, traduziram-se na sua

capacidade para motivar os franqueados a aderirem a um conceito ainda muito jovem

que ainda não tinha desenvolvido uma imagem forte. Por isso mesmo, em 1993, quando

a empresa iniciou a estratégia de crescimento através de unidades franqueadas, o

recrutamento dos franqueados realizou-se com base nos contactos pessoais dos

membros da direcção da empresa. Mais tarde, depois da Throttleman se ter já afirmando

no mercado, as competências relativas à criação e manutenção da reputação no mercado

ganharam preponderância. Nesse sentido, entre 1998 e 2000, a empresa participou nas

feiras de promoção de venda de franchises e fez publicidade nos Guias de

Oportunidades em Franchising. A partir de 2001, a Throttleman deixou de procurar

activamente franqueados. Não publicitando a venda do franchise, a procura por parte de

potenciais franqueados resulta quer da reputação do franqueador, enquanto contraparte

no relacionamento de franchising, quer da notoriedade da marca, resultante da

experiência pessoal dos potenciais franqueados enquanto consumidores. Também

importantes para a manutenção do relacionamento são as competências relativas à

replicação das unidades e as relativas à sua supervisão.

7.2.2. A Dependência do Percurso e a Dinâmica do mix UP/UF

A análise do trajecto da Throttleman, desde 1991 até ao momento presente,

ilustra a presença de uma dependência do percurso que determina as suas competências

e os seus relacionamentos, bem como a evolução do mix de unidades próprias e

unidades franqueadas, ao longo do tempo.

A empresa iniciou a sua actividade em 1991 e, em apenas dois anos, abriu três

lojas próprias. Num espaço de tempo relativamente curto, a Throttleman desenvolveu

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competências associadas à gestão da marca e do conceito de negócio, destacando-se,

por exemplo, as competências relativas ao posicionamento e imagem da marca e à

escolha do leque de produtos oferecidos. Simultaneamente, nesse mesmo período, a

Throttleman desenvolveu competências de replicação e de gestão de rede, de onde se

destaca o know-how relativo à escolha das características a replicar nas várias unidades

(Winter e Szulanski, 2000), à transferência e difusão de conhecimento dentro da rede e

à supervisão das unidades após a replicação.

Apesar se ter divido a trajectória da empresa, até ao momento presente, em dois

períodos, encontram-se três diferentes fases quanto ao posicionamento da rede

relativamente aos relacionamentos de franchising. A primeira fase inicia-se em 1993.

No seguimento de constrangimentos de natureza financeira (Caves e Murphy, 1976), a

empresa iniciou uma estratégia de crescimento através de unidades franqueadas, tirando

partido das competências de replicação, entretanto adquiridas, e iniciando o

desenvolvimento das competências indirectas (Loasby, 1998) que lhe permitiriam

aceder aos recursos e competências dos seus franqueados. Nesta fase, tal como já foi

referido, tiveram particular importância as competências indirectas do franqueador que

lhe permitiram vender um conceito ainda muito recente e, portanto, pouco testado e

desenvolvido.

Em 1996, a empresa iniciou a estratégia de expansão internacional. Esta decisão

influenciou de forma significativa o trajecto posterior da empresa. A internacionalização

da marca foi extremamente exigente em termos do consumo do tempo dos gestores da

sede. A empresa viu-se obrigada a mudar o nome da marca, a adicionar um conjunto de

novos artigos ao leque de produtos iniciais e a adoptar um novo design nas lojas.

Finalmente, tendo em conta a sua elevada exigência financeira, este projecto fez com

que a administração da empresa procurasse financiamento, o que teve como

consequência a entrada do BPI e do FIEP no capital social da empresa. Todas estas

circunstâncias conduziram à necessidade de reorganizar a empresa. Segundo o

informante, “ao iniciarem o processo de internacionalização, quiseram, na prática,

livrar-se da gestão das lojas cá”, como forma de permitir um maior enfoque de todos os

recursos humanos de gestão da empresa no novo projecto (tal como em Penrose, 1959).

Assim, a internacionalização da marca surge associada à segunda fase de crescimento

através do franchising. Neste período, a empresa desenvolve as competências relativas à

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criação e manutenção da reputação no mercado, importantes na captação de

franqueados. Nesse sentido, a empresa participou nas feiras de promoção de venda de

franchises e fez publicidade nos Guias de Oportunidades em Franchising.

Em 1998, a empresa Hozar Portugal adquiriu o direito a explorar uma das

unidades da rede, anteriormente detida pela empresa franqueadora, situada no centro

comercial GaiaShopping, em Vila Nova de Gaia. O início do relacionamento surge

através da relação de amizade pessoal existente entre o Director de Franchising da

Throttleman e um dos sócios da Hozar Portugal. Esta situação evidencia a importância

das relações sociais e extra-profissionais no início dos relacionamentos inter-

organizacionais (Hakansson e Snehota, 1995). Entre 1998 e 1999, a Hozar Portugal

adquiriu outros 5 franchises da marca, tornando-se no principal franqueado da

Throttleman. Esta situação resulta de vários factores. Em primeiro lugar, a Hozar

Portugal pretende crescer e vê no relacionamento com este franqueador a possibilidade

de atingir esse objectivo. Segundo, a empresa franqueadora deseja prosseguir o seu

plano de expansão a nível nacional, através de unidades franqueadas. No entanto, tendo

em conta o número e a urgência com que necessita obter franqueados para as diferentes

lojas já existentes, assim como as que ainda pretende abrir em Portugal, a empresa não

consegue realizar uma selecção criteriosa de novos e diferentes franqueados. Neste

contexto, a Hozar Portugal apresenta-se como um franqueado que o franqueador

conhece e em que reconhece as competências necessárias para a realização de uma boa

gestão desses pontos de venda. Finalmente, a relação de amizade extra-profissional já

referida entre os dois membros pertencentes a cada uma das duas organizações poderá

também ter contribuído para solidificar o relacionamento entre as duas empresas

(Hakansson e Snehota, 1995), nomeadamente pelo seu efeito nas percepções do

franqueador, quer quanto aos custos de transacção dinâmicos, quer aos benefícios

relativos à utilização das competências desse franqueado na gestão dessas unidades.

O facto de possuir 6 lojas da rede fez com que ao Hozar Portugal ficasse a

conhecer muito bem o negócio do franqueador. Na verdade, em 2000, quando a gestão

da empresa franqueadora começou a sentir algumas dificuldades no projecto de

expansão, a Hozar Portugal já detinha as competências específicas relativas ao negócio.

Adicionalmente, a Hozar Portugal detinha também competências relativas à criação e

manutenção de um conceito franqueado, à replicação de unidades e de gestão de rede.

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Estas últimas competências foram desenvolvidas pela Hozar Portugal através da

criação, replicação e franchise de um conceito novo, a rede de restauração Storia del

Caffe. De facto, a empresa Hozar Portugal tinha mais do que um negócio. Além de

explorar as 6 lojas da Throttleman, a empresa explorava também, em regime de

franchising, três lojas da marca suíça de relógios Swatch e tinha ainda criado e

desenvolvido um novo conceito de negócio, um café temático, Storia del Caffe.

Dado o elevado nível de envolvimento da Hozar Portugal na rede da

Throttleman, o que se traduzia num investimento elevado em activos específicos, e

tendo em conta que este franqueado dispunha já das competências que lhe permitiriam

gerir essa rede, a empresa franqueada foi, de alguma forma, empurrada para a aquisição

da empresa franqueadora. Assim, no seguimento dos problemas enfrentados pela

Brasopi, a empresa franqueada acaba por adquirir 51% da empresa franqueadora e

assumir a sua gestão. Com a nova gestão, a empresa regressou à integração vertical

como estratégia preferencial. A focalização estratégica da empresa redireccionou-se

para o mercado nacional, restringindo o investimento no estrangeiro. A nova gestão

alterou mais uma vez a imagem da rede e introduziu produtos novos.

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7.3. Conclusões

A análise deste caso permitiu verificar que a Throttleman é uma rede de

empresas heterogéneas que interagem no sentido de partilhar recursos e competências

(Hakansson e Snehota, 1995). Por um lado, os franqueados acedem às competências do

franqueador, relativas à sua gestão da marca e ao conceito de negócio. Por outro lado, o

franqueador acede ao know-how dos seus franqueados relativo à gestão corrente da

unidade e ao mercado local. Em particular, a gestão do relacionamento com os clientes

é a competência mais valorizada pelo franqueador. Esta competência traduz-se na

capacidade dos franqueados para atrair os clientes e mantê-los fiéis à marca. O

contributo dos franqueados é também importante no que diz respeito às preferências dos

clientes relativamente ao produto oferecido pela Throttleman. Assim sendo, os

franqueados participam no processo de desenvolvimento do produto.

Apesar desta constatação, verificou-se também que, nesta rede, o relacionamento

existente entre o franqueador e os franqueados é do estilo “top-down”, onde “o

franqueado é percepcionado como sendo um bom franqueado, se fizer o que o

franqueador deseja” (Elango e Fried, 1997, pp. 76). O franqueador tem a actividade de

definição estratégica, de geração de ideias que depois são transmitidas aos franqueados.

Os franqueados utilizam o conhecimento e expertise do franqueador mas não são

capazes de contribuir para o sistema.

Verificou-se, também, que tanto cada participante na rede, quanto os

relacionamentos que se estabelecem entre eles, têm características únicas (Hakansson e

Snehota, 1995). O franqueador reconhece que os franqueados da rede são heterogéneos,

diferindo no “grau de obediência” às suas instruções e no acompanhamento dado ao seu

ponto de venda, o que origina desempenhos diferentes nas várias unidades franqueadas.

Contudo, a análise deste caso não demonstrou que as competências do

franqueador e dos franqueados dessem um contributo significativo na explicação da

emergência do franchising ao nível do negócio. Na verdade, a análise deste caso

permite-nos concluir que, nesta rede, o início dos relacionamentos em franchising se

encontra associado à restrição de recursos (e.g. Oxenfeldt e Kelly, 1969). Finalmente,

neste caso, também não se encontrou suporte empírico para a Teoria da Agência do

Franchising (e.g. Brickley e Dark, 1987).

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No entanto, ao nível da unidade, a decisão relativa ao tipo de propriedade de

unidade, parece, pelo menos em certos casos, ser influenciada pelas competências

necessárias para gerir essa unidade, e de como essas competências se podem combinar

com as outras competências, existentes na rede. Esta situação demonstra que mesmo

numa rede, como a Throttleman, onde o franqueador vê os franqueados como actores

passivos que deverão obedecer às suas instruções (e.g. Elango e Fried,1997), o papel as

competências dos franqueados assume por vezes uma função importante.

A análise do caso permitiu-nos ainda confirmar a importância as competências

indirectas (Loasby, 1998) do franqueador quer para o início quer para a manutenção dos

relacionamentos. Mais ainda, este caso evidenciou a importância dos relacionamentos

extra-profissionais existentes entre os membros das empresas envolvidas no

relacionamento como um factor influenciador do início e desenvolvimento do

relacionamento (Hakansson e Snehota, 1995) de franchising.

Finalmente, a análise do trajecto da Throttleman, desde 1991 até ao momento

presente, ilustra a presença de uma dependência do percurso que determina as suas

competências e os seus relacionamentos (e.g. Mota e de Castro 2004), bem como a

evolução do mix de unidades próprias e unidades franqueadas, ao longo do tempo.