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70 5 Modelagem de processos de redução Atualmente, a modelagem de processos de redução deixou de ser inovação ou assunto acadêmico para tornar-se uma importante ferramenta de checagem operacional, análise de valor e competitividade, previsão de conseqüências decorrentes de alterações nos parâmetros de processo, auxílio no desenho de reatores entre outros objetivos diversos de checagem e previsão da performance técnica, econômica e ambiental. Um bom modelamento depende de vários parâmetros, entre os principais: Objetivo claro Técnica adotada Entendimento da geometria (1-D, 2-D, 3-D) Metodologia de discretização Premissas adotadas Entendimento do processo (Termodinâmica / Cinética / Fenômenos de transporte de massa e energia envolvidos) Com relação aos modelos termoquímicos especificamente, este pode ser global e/ou estagiado (discreto ou diferencial). No balanço global não importa o que ocorre no interior do processo, enquanto no balanço estagiado é feita uma análise de todas as etapas que ocorrem em cada região (estágio) do processo. Os pré-requisitos para a construção de um bom modelo termoquímico são: Conhecimento pleno do balanço de massa do processo Conhecimento dos estados físicos dos reagentes e produtos Conhecimento das temperaturas dos reagentes e produtos Reações globais envolvidas Escolha de uma temperatura de referência apropriada.

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5 Modelagem de processos de redução

Atualmente, a modelagem de processos de redução deixou de ser inovação

ou assunto acadêmico para tornar-se uma importante ferramenta de checagem

operacional, análise de valor e competitividade, previsão de conseqüências

decorrentes de alterações nos parâmetros de processo, auxílio no desenho de

reatores entre outros objetivos diversos de checagem e previsão da performance

técnica, econômica e ambiental.

Um bom modelamento depende de vários parâmetros, entre os principais:

• Objetivo claro

• Técnica adotada

• Entendimento da geometria (1-D, 2-D, 3-D)

• Metodologia de discretização

• Premissas adotadas

• Entendimento do processo (Termodinâmica / Cinética / Fenômenos de

transporte de massa e energia envolvidos)

Com relação aos modelos termoquímicos especificamente, este pode ser

global e/ou estagiado (discreto ou diferencial). No balanço global não importa o

que ocorre no interior do processo, enquanto no balanço estagiado é feita uma

análise de todas as etapas que ocorrem em cada região (estágio) do processo.

Os pré-requisitos para a construção de um bom modelo termoquímico são:

• Conhecimento pleno do balanço de massa do processo

• Conhecimento dos estados físicos dos reagentes e produtos

• Conhecimento das temperaturas dos reagentes e produtos

• Reações globais envolvidas

• Escolha de uma temperatura de referência apropriada.

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Normalmente escolhe-se a temperatura de referência como sendo 298 K

devido à facilidade de obtenção de dados tabulados. Todavia, para uma análise

quantitativa individualizada de cada termo do balanço estagiado, a temperatura de

referência deve ser a mais próxima possível da temperatura real em que o

processo esteja ocorrendo. A seguir são discutidos alguns aspectos relacionados

ao estado da arte da modelagem de reatores de redução de minério de ferro.

5.1 Modelamento de altos fornos

Por ser um reator convencional, com tecnologia de domínio público e

existir um bom entendimento das reações e mecanismos envolvidos, vários casos

de modelamento de altos-fornos são apresentados na literatura. De uma maneira

geral os modelamentos baseiam-se no modelo operacional desenvolvido pelo

IRSID (Instituto Francês de pesquisas siderúrgicas), que divide o alto-forno em

três zonas principais (36): Zona de Preparação (ZP), Zona de Reserva Térmica

(ZRT) e Zona de Elaboração (ZE), conforme figura 23 abaixo.

Figura 23 - Esquema do perfil de temperaturas dos gases e sólidos em um alto-forno

TEMPERATURA, °C

DIS

TAN

CIA

DA

S VE

NTA

NEI

RA

S, m

SÓLI

DO

S

GAS

8

6

4

2

0

10

12

14

16

18

20

0 500 1000 1500 2000

Zona de Reserva Térmica

Zona de Preparação

Zona de Elaboração

TEMPERATURA, °C

DIS

TAN

CIA

DA

S VE

NTA

NEI

RA

S, m

SÓLI

DO

S

GAS

8

6

4

2

0

10

12

14

16

18

20

0 500 1000 1500 2000

Zona de Reserva Térmica

Zona de Preparação

Zona de Elaboração

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Os pesquisadores do IRSID estabeleceram a divisão nas zonas acima após

análise de trabalhos envolvendo sondagens extensivas de altos-fornos que

mostraram os perfis de temperatura das fases condensadas e gases no interior do

forno. Nota-se pela figura que as zonas de preparação e elaboração são de intensa

troca térmica, enquanto que na zona intermediária (zona de reserva térmica)

praticamente não existe troca térmica (37).

A existência da zona de reserva térmica (ZRT) é função da reação de

Boudouard (CO2 + C → 2CO), que é uma das principais reações químicas que

ocorrem no alto-forno e que apresenta duas características:

• altamente endotérmica, fazendo com que muito calor seja consumido

durante a reação.

• alta energia de ativação, determinando a existência de uma temperatura

bem definida de início de reação. Essa temperatura de início de reação é

chamada de temperatura de reatividade e varia de material para material.

Por exemplo, para o caso do coque siderúrgico, a temperatura de

reatividade varia normalmente entre 900 e 950°C.

Com relação ao perfil de temperaturas do alto-forno, os gases quentes

oriundos da zona de combustão fornecem calor para o aquecimento das fases

condensadas e para as reações endotérmicas na Zona de Elaboração. Com isso a

temperatura dos gases diminui a medida que ascendem na região inferior do forno,

definindo o perfil da Zona de Elaboração. Quando os gases atingem a região da

isoterma que coincide com a temperatura de reatividade do combustível, a reação

de Boudouard deixa de ocorrer e como quase não existem outras reações

endotérmicas nesta região e a carga já se encontra próxima à temperatura dos

gases, a temperatura dos sólidos e gases permanece praticamente inalterada por

toda a zona de reserva térmica. Somente quando encontra uma carga mais fria em

regiões superiores do forno é que os gases passam a ceder calor e com isso abaixar

a sua temperatura, o que explica o perfil de temperaturas da zona de preparação.

O tamanho da zona de reserva térmica pode varia principalmente em

função do fator α, que é a razão térmica sólido/gás, definido pela equação:

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gpg

SpS

CmCm

,

,

.

.=α

onde:

ms = vazão mássica dos sólidos (kg.h-1)

mg = vazão mássica dos gases (kg.h-1)

Cp,s = calor específico dos sólidos (J.mol-1.K-1)

Cp,g = calor específico dos gases (J.mol-1.K-1)

Quando o valor do fator α é muito baixo, equivalente a um alto consumo

de carbono (kg.tgusa-1) e alto volume específico de gases, o perfil apresenta uma

grande zona de reserva térmica e vice-versa.

A divisão do alto-forno em zonas é extremamente útil para a modelagem

do processo, pois as zonas possuem características tão distintas que podem ser

tratadas como reatores individuais.

• Zona de Preparação: onde o carbono não reage, podendo ser tratado como

material inerte.

• Zona de Reserva Térmica: região normalmente desconsiderada nos

modelos termoquímicos, pois além de não haver troca de massa ou energia,

apresenta temperatura característica, comumente empregada como

temperatura de referência dos modelos.

• Zona de Elaboração: região onde o carbono incorpora no gusa, reage com o

ar na saída das ventaneiras fornecendo energia para o processo e reage com

o CO2, restituindo o poder redutor dos gases que serão utilizados nas

regiões superiores.

Pela descrição acima, pode-se afirmar que a reatividade do redutor exerce

influência sobre a caracterização de cada uma das zonas. Com a definição das

zonas acima e suas temperaturas características, descrevem-se os fenômenos

químicos envolvidos em cada região. A figura 24 a seguir mostra um exemplo da

identificação dos vários processos químicos ocorrendo em diferentes regiões do

alto-forno.

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Figura 24 – Processos químicos considerados em várias regiões de um alto-forno

Especificamente para o modelo IRSID, normalmente consideram-se as

seguintes reações químicas ocorrendo nas várias regiões do forno (Figura 25).

Figura 25 – Modelo operacional do alto-forno

TEMPERATURA, °C

DIS

TAN

CIA

DA

S VE

NTA

NEI

RA

S, m

ZONA QUÍMICA INATIVA

REDUÇÃO DIRETAE ZONA DE FUSÃO

DA ESCÓRIA E FERRO

3 Fe2O3 + CO = 2Fe3O4 + CO2

Fe3O4 + CO = 3FeO + CO2

FeO + CO = Fe + CO2CaCO3 = CaO + CO2

CO2 + C = 2COMnO + C = Mn + CO

P2O5 + 5C = 2P + 5COSiO2 + 2C = Si + 2CO

S + CaO + C = CaS + CO

RES

EVAT

ÉRM

ICA

ZON

A D

E R

EDÇ

ÃO IN

DIR

ETA

GAS de topo; 100 - 250° C10 a 20 % CO2 + 20 a 30 % CO + REST N2

PR

EH

EA

TIN

G

ZON

E

RED

ÃO IN

DIR

ECT

ZO

NA

DA

WU

STIT

A

FeO + CO = Fe + CO2

+FeO NÃO REDUZIDO

GASSOLIDOS

8

6

4

2

0

10

12

14

16

18

20

0 500 1000 1500 2000

TEMPERATURA, °C

DIS

TAN

CIA

DA

S VE

NTA

NEI

RA

S, m

ZONA QUÍMICA INATIVA

REDUÇÃO DIRETAE ZONA DE FUSÃO

DA ESCÓRIA E FERRO

3 Fe2O3 + CO = 2Fe3O4 + CO2

Fe3O4 + CO = 3FeO + CO2

FeO + CO = Fe + CO2CaCO3 = CaO + CO2

CO2 + C = 2COMnO + C = Mn + CO

P2O5 + 5C = 2P + 5COSiO2 + 2C = Si + 2CO

S + CaO + C = CaS + CO

RES

EVAT

ÉRM

ICA

ZON

A D

E R

EDÇ

ÃO IN

DIR

ETA

GAS de topo; 100 - 250° C10 a 20 % CO2 + 20 a 30 % CO + REST N2

PR

EH

EA

TIN

G

ZON

E

RED

ÃO IN

DIR

ECT

ZO

NA

DA

WU

STIT

A

FeO + CO = Fe + CO2

+FeO NÃO REDUZIDO

GASSOLIDOS

8

6

4

2

0

10

12

14

16

18

20

0 500 1000 1500 2000

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Tendo-se então definido o balanço de massa do processo, os estados

físicos dos reagentes e produtos, temperaturas dos reagentes e produtos, reações

globais envolvidas e a temperatura de referência apropriada, pode se realizar o

balanço termoquímico do processo de alto-forno. Os resultados gerais do balanço

termoquímico do alto-forno hoje são bem conhecidos e indicam os seguintes

pontos principais:

• A Zona de Elaboração é deficiente termicamente, sendo dependente da

temperatura do ar de sopro para fechamento do balanço térmico;

• A Zona de Preparação apresenta excesso de energia térmica, sendo

dependente da temperatura dos gases de topo para fechamento do balanço

térmico. Ademais, a temperatura e composição dos gases de topo indicam a

eficiência do reator (baixas temperaturas de topo indicam alto

aproveitamento da energia térmica dos gases no interior do reator).

Existem vários modelos feitos para altos-fornos, inclusive modelos

cinéticos 3D que tratam não apenas do balanço de massa e energia, mas também

do efeito “tempo” sobre a operação do reator. Com isso, parâmetros de

produtividade, tempo de residência dos materiais, vetores velocidade dos gases no

interior do reator, entre outros fatores podem ser determinados.

As figuras a seguir mostram exemplos de resultados de modelos cinéticos

aplicados ao processo de alto-forno.

Figura 26 – Arranjo da malha para modelagem 3D do alto-forno (38)

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Figura 27 – Distribuição de temperaturas para um alto-forno operando com e sem injeção de gás na cuba (°C) (38)

Figura 28 – Fluxo tridimensional de líquidos no cadinho de um alto-forno (39).

5.2 Modelamento de processos alternativos

Como a maioria dos processos emergentes de redução de minério de ferro

não se encontra em estágio comercial, são poucas as referências de modelamentos

destes processos na literatura. Os principais processos em fase de consolidação

TG220021002000180016001400120011001000700300

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industrial são o processo HIsmelt de fusão-redutora, o processo ITmk3 baseado

em um forno de soleira rotativa e que utiliza aglomerados auto-redutores como

carga, o processo Finex que utiliza uma combinação de reatores de leito fluidizado

para redução do minério de ferro e um forno de fusão/gaseificação e o processo

Tecnored™, em fase final de implantação de sua unidade industrial. Para o

processo Finex não foram encontrados dados na literatura sobre sua modelagem.

5.2.1 Processo HIsmelt

HIsmelt é uma tecnologia de fusão-redutora (bath smelting) onde a

redução dos óxidos de ferro e a gaseificação do carvão ocorrem no banho

metálico. Os materiais são injetados por lanças submersas e não pelo topo do

reator. O processo utiliza ar pré-aquecido (1200°C) enriquecido com oxigênio e

utiliza como carga finos de minério (-6mm) e carvão. Por operar com escória

básica e rica em “FeO”, o processo é capaz de remover quase todo fósforo do

metal. A figura 29 mostra esquematicamente o reator.

Figura 29 – Reator HIsmelt de fusão-redutora

• Modelamento do processo

São dois os modelos matemáticos construídos para o processo HIsmelt

disponíveis na literatura pesquisada (40, 41). No primeiro, realizado pela

COAL & ORE COAL & ORE

HOT AIR BLAST1200 C

(OXYGEN ENRICHED)

SLAGMETAL

OFFGASWATER-COOLED PANELS IN TOPSPACE

REFRACTORY LINED HEARTH

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universidade de Greenwich, os autores dividiram o processo em três regiões

(Figura 30).

Figura 30 – Divisão do reator HIsmelt para modelagem (40)

Pela figura acima, nota-se que as três zonas escolhidas pelos pesquisadores

foram Zona de banho (região onde o banho metálico e a escória líquida formam

uma fase contínua); Zona de transição (região onde o gás é a fase contínua,

todavia com significativa presença de líquidos) e Zona dos gases (região com a

presença de gases somente).

O modelo foi construído levando-se em conta aspectos de vazão dos

fluidos e processos de transferência térmica na região superior do reator (zona de

gás e de transição). Entre outros achados, os autores constataram que o uso de

jatos com alto poder de turbilhonamento resulta em fluxo reverso no centro do

jato, aumentando a sua área superficial promovendo as reações químicas entre as

espécies, otimizando o processo.

As figuras abaixo mostram alguns resultados gráficos desta modelagem.

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Figura 31 – Malha tridimensional do reator HIsmelt (40)

Figura 32 – Perfil térmico (esquerda) e de velocidades (direita) após modelagem do processo HIsmelt. (40)

Em outro trabalho de modelamento, os pesquisadores discutem as técnicas

de fluido-dinâmica computacional ou CFD1 aplicadas desde meados de 1980 para

entender os mecanismos fluidodinâmicos envolvidos no processo (41).

Neste caso os autores dividiram o reator em duas regiões principais (banho

e topo) com uma zona intermediária comum às duas regiões (zona intermediária),

de maneira que diferentes modelos de fluxo fossem aplicados a cada zona. Os

autores reportam que a idéia de dividir o reator em duas zonas foi de fundamental

importância, pois diferentes técnicas de modelamentos puderam ser aplicadas para

1 CFD é a sigla em inglês para Computational Fluid Dynamics

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cada metade do processo. A figura 33 a seguir mostra a geometria utilizada no

modelo da região do banho com as principais espécies envolvidas.

Figura 33 – Geometria e espécies consideradas na modelagem (41)

Os autores afirmam que os resultados do modelo foram aplicados durante

a fase de planta piloto e extensivamente usados no projeto do forno industrial que

envolveu um aumento de escala do diâmetro de 2,7 m (forno piloto) para 6 m

(forno industrial). Como exemplo, os autores mostram aspectos que sofreram

alterações em função dos resultados encontrados na modelagem (Figura 34).

Figura 34 – Correção passo-a-passo do projeto do reator HIsmelt utilizando resultados de modelagem matemática CFD. (41)

Ponto de partida:Projeto original (sem

modelagem)

Revisão 1:Elevar altura da

lança

Revisão 2:Reduzir diâmetro do vaso

Problema:Baixa índice de pós-combustão (42-45%)

Melhoria:Aumento do índice de

pós-combustão (52%)

Melhoria:Menor área de

refrigeração e maior facilidade no projeto

das lanças

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5.2.2 Fornos de soleira rotativa

Nestes processos, aglomerados auto-redutores são utilizados num forno de

soleira rotativa, no qual a energia é fornecida pela queima de combustível e gases

de processo, realizada acima de um leito de pequena espessura (uma a três

camadas de pelotas). Nesta categoria estão agrupados os processos ITmk3,

Redsmelt, Maumee, Fastmet, Inmetco e IDI. A figura 35 abaixo mostra um

esquema de um forno de soleira rotativa.

Figura 35 – Vista superior (esquerda) e seção transversal (direita) de um RHF (42)

São poucos os modelamentos realizados para estes processos com

informações disponíveis na literatura pesquisada.

Fortini (43) construiu um modelo “caixa-preta” usado para prever a

produtividade e demandas energéticas de um forno de soleira rotativa. O autor

avaliou o efeito da temperatura de operação, propriedades do leito, tamanho das

pelotas e tipo de carbono utilizado como agente redutor sobre a produtividade do

forno e consumo de energia.

Segundo o autor, os resultados do modelo construído mostraram boa

correlação com os dados disponíveis na literatura, apesar das várias simplificações

adotadas. Como exemplo ele cita os tempos de residência previstos pelo modelo

de 5 a 7 minutos, comparados com 6 minutos encontrados na literatura para uma

camada de pelota no forno. Para duas camadas o autor encontrou tempos de

residência da ordem de 10 a 16 minutos, enquanto dados de literatura mostraram

tempos variando entre 12 a 18 minutos. A produtividade do reator também foi

modelada e o autor encontrou números da ordem de 70 a 80 kg.m-2.hr-1, contra 70

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a 90 kg.m-2.hr-1 encontrados na literatura. O autor verificou pelo modelo

construído que a produtividade do reator sofre influência do número de camadas

de pelotas e da temperatura de operação. Esta última afirmação sem dúvida

confirma os achados de autores de que o processo de auto-redução é fortemente

dependente da temperatura.

Através do seu trabalho o autor afirma que o uso de carvão vegetal ao

invés de carvão mineral como agente redutor nas pelotas auto-redutoras pode

resultar em ganhos de produtividade de até 50%, considerando os efeitos

combinados de cinética química e transferência de calor. Por fim, o autor

determinou o consumo mínimo de carbono do processo como sendo 178

kgC.t_DRI-1 para operação com uma camada de pelotas auto-redutoras (carvão

mineral como redutor), produzindo pelotas com 70% de metalização. A figura 36

mostra a divisão feita pelo autor para construção do modelo de produtividade.

Figura 36 – Divisão do forno RHF usado no modelo de produtividade

Calor Gás

Gás Gás Gás Gas Gas

Combustível O2/AR

Gas de topo

Pelotas auto-redutoras

DRI

Leito Leito Leito

Zona de pré-aquecimento

Zona de pré-redução

Zona final da redução

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Tanaka(44) a partir de um modelo termoquímico para o forno de soleira

rotativa do processo ITmk3 determinou como seria o balanço energético de um

forno de soleira rotativa operando em condições industriais (Figura 37).

Figura 37 – Balanço energético do processo ITmk3

Conforme se observa pela figura acima, a maior parte da energia térmica

necessária para o processo é fornecida pela combustão do carbono do aglomerado,

com o restante sendo fornecido pelo combustível externo e pelo calor sensível do

ar de combustão. As saídas de energia do processo referem-se às reações de

redução e fusão da carga (exigência termodinâmica), perdas térmicas e ao calor

sensível dos produtos e gases de saída do processo. A partir do modelo

termoquímico o autor sugere uma recuperação adicional do calor sensível dos

gases de topo para aumentar a eficiência do processo.

5.3 Modelamento do processo Tecnored™

O processo Tecnored™ iniciou o seu desenvolvimento a partir de meados

da década de 70 e desde então foram realizados várias estudos fundamentais e

fenomenológicos de processo, através de testes de bancada com diferentes tipos

de aglomerados, tipos de matérias-primas e condições operacionais. Além disso,

foram realizados ao longo do desenvolvimento diferentes tipos de modelagem do

processo com propósitos específicos conforme discutido a seguir:

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5.3.1 Modelagem da cuba superior

Este foi o primeiro modelamento da tecnologia Tecnored™, e foi realizado

em meados da década de 90 quando o desenvolvimento da tecnologia em fornos

circulares parecia ter chegado a um limite (45). O modelo foi desenvolvido para a

zona de auto-redução do forno (cuba superior), simulando o comportamento da

descida de uma pelota auto-redutora (46, 47). A metodologia adotada foi a da

solução numérica discreta, devido à sua intrínseca flexibilidade que permitiu,

inclusive, a introdução continuada de vários progressos obtidos no

desenvolvimento da tecnologia.

Basicamente, o modelo discreto considerou a análise e quantificação do

comportamento dos aglomerados na carga como uma descrição fenomenológica

para as transferências de calor e reações químicas envolvidas. O modelo baseou-

se em um único aglomerado, que a cada tempo reside em alguma das fatias

horizontais em que a zona superior do forno foi dividida. A espessura adotada das

fatias foi da ordem da dimensão característica dos aglomerados.

O tempo de residência dos aglomerados nos elementos corte (fatias) foi

determinado pela velocidade de alimentação da carga. No modelo o aglomerado é

dividido em cascas concêntricas, cuja espessura é definida pela difusividade

térmica, sendo esta uma função dos vários materiais constituintes. Estas cascas

são usadas pelo modelo para dimensionar o progresso da conversão química

dentro do aglomerado. Adicionalmente o fluxo total de gás é distribuído

igualmente entre os aglomerados em cada corte horizontal em obediência às

condições operacionais da zona do forno.

Em ordem de etapas, a arquitetura do algoritmo do modelo, escrita em

Turbo-Pascal, obedeceu à seguinte rotina:

• aglomerado entra no elemento z do forno vindo de “z-1”;

• cálculo de todas as propriedades do gás na temperatura do elemento “z-1”

do forno ( densidade, massa molecular, calor específico, viscosidade, etc. );

• cálculo da distribuição das frações mássicas do gás entre os aglomerados no

elemento “z” do forno de acordo com o perfil de fluxo do gás;

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• determinação dos parâmetros termais do sistema (coef. de filme convecção,

condutividade termal efetiva, etc.) à temperatura do elemento “z-1”;

• avaliação do calor trocado por convecção na casca externa do aglomerado;

• cálculo dos calores conduzidos entre as cascas internas do aglomerado;

• correção da composição do aglomerado por meio da cinética reacional,

avaliação do perfil de temperatura e do balanço de massa do aglomerado no

elemento “z”;

• determinação, por meio do balanço térmico nos sólidos da nova

temperatura do aglomerado ( Ts em “z” ), a ser usada nos cálculos para o

elemento “z+1”;

• avaliação do balanço de massa do gás para o elemento “z” do forno levando

em conta que a metodologia de cálculo deve obedecer ao fato que o fluxo

de gás é de contracorrente;

• cálculo do balanço térmico do gás, levando em consideração as

transferências de calor e perdas, para determinação da nova temperatura do

gás ( Tg em “z” ) a ser usada nos cálculos para o elemento “z+1”.

Algumas hipóteses operacionais foram feitas para a construção do modelo:

• os fluxos no leito reacional são considerados unidimensionais e de natureza

pistonada;

• os aglomerados são assumidos como sendo pelotas exibindo arranjo no

leito do tipo cúbico de face centrada;

• os gases possuem comportamento ideal e por último, por convenção, os

processos de convecção, condução e reação química são considerados na

modelagem sequencialmente.

O diagrama esquemático mostrado na Figura 38 abaixo resume o esquema

de cálculo e a figura 39 mostra um resultado do software, baseado em dados

operacionais simulados do forno. A área ampliada detalha o significado das

principais linhas do gráfico.

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Figura 38 – Interpretação 3D do modelamento da cuba superior do forno Tecnored™

Figura 39 - Exemplo básico dos resultados do software.

temperatura do gás

temperatura do núcleo temperatura da superfícietemperatura das cascas internas

Aglomerados descendo a uma velocidade ua

O gás ascendente a uma velocidade ug é dividido

entre os aglomerados

Elemento z do forno

∆t é o tempo de residência

em z

z Durante ∆t o elemento de gás transfere calor aos aglomerados e perde uma fração do seu calor para o exterior

Durante ∆t os aglomerados recebem calor, q conv, transmitem-no e reagem

∆r = √ α∆t qconv

∑ q ∑ q

aglomerado cascas filme gasoso

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De acordo com o exemplo mostrado acima, o grau de redução no final da

Zona de Redução (ZR) foi de 93,6% em 27,3 minutos, confirmando a rapidez das

reações que ocorrem no processo Tecnored™. Além disso, uma zona de reserva

térmica devida à reação endotérmica de Boudouard para um redutor de alta

reatividade apresenta-se claramente. Como previsto pelos testes de bancada, um

gradiente térmico dentro do aglomerado é também indicado pelo modelo,

atestando a importância do mecanismo de transferência de calor no processo

global. Finalmente, no canto inferior esquerdo do gráfico, o modelo prediz o

estado final do aglomerado reduzido, podendo indicar fusão primária de escória,

final da redução, ou como mostrado no exemplo, fusão da fase metálica.

Esse modelo foi de fundamental importância no desenvolvimento da

tecnologia e gerou os seguintes resultados principais:

• O modelo evidenciou as altíssimas velocidades reacionais atingidas na

redução dos aglomerados auto-redutores, que é a principal característica

desta tecnologia;

• A simulação do processo confirmou a existência de uma pequena zona de

reserva térmica no forno Tecnored™, com intensidade extremamente

dependente da reatividade do redutor usado;

• A modelagem indicou a importância dos mecanismos de troca de calor na

zona superior do forno devido à existência de gradientes térmicos entre a

superfície e o núcleo dos aglomerados, confirmando assim os experimentos

de bancada;

• A importância da pós-combustão interna do CO pelo sopro secundário foi

evidenciada pelos valores dos índices de metalização e pelos principais

fatores que afetam a formação da zona coesiva.

5.3.2 Análise de elementos finitos do forno industrial

O reator industrial da tecnologia Tecnored™ foi projetado a partir dos

dados de processo levantados em planta piloto. Para suportar o projeto mecânico e

estrutural do reator foi realizada uma modelagem que utilizou a técnica de

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elementos finitos para determinar as solicitações térmicas e mecânicas atuantes na

carcaça do forno. Esta modelagem foi de fundamental importância para garantir

um projeto seguro e otimizado do reator industrial, considerando o aspecto de

modularidade, ou seja, que o reator pode ser aumentado em determinado momento

posterior, através do aumento do seu comprimento.

As figuras abaixo mostram alguns exemplos de resultados desta

modelagem.

Figura 40 – Análise de elementos finitos da carcaça do reator Tecnored™ (entrada do alimentador de combustível)

Figura 41 – Análise de elementos finitos da carcaça do reator Tecnored™ (vista lateral)

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5.3.3 Modelamento 3D multifásico multicomponentes

Esta modelagem encontra-se em andamento e visa realizar uma

modelagem 3D multifases e multicomponentes do forno Tecnored™.

A proposta do modelo é formular os fenômenos que ocorrem no interior do

reator como um sistema de duas fases que interagem entre si transferindo

momentum, massa e energia. Como tal, o sistema pode ser formulado em termos

de equações de transporte, sendo resolvidas em um domínio discretizado através

da técnica de volumes finitos. De modo geral, os fenômenos de transferência de

calor, momentum e massa no interior da cuba superior do forno são representados

pela equação geral de transporte.

Nesta equação os chamados termos fontes representam as iterações com as

outras fases, seja através de transferência de momentum, energia e massa por

processos envolvendo reações químicas. O coeficiente de transferência ( Γ )

assume diferentes significados conforme a equação a ser resolvida. No termo

fonte ( S ) introduzem-se todos os termos não inclusos no lado esquerdo da

equação. A equação é uma típica equação resolvida pelo método de volumes

finitos. No termo fonte, portanto estão contemplados os acoplamentos entre as

fases tais como transferência de momentum, energia e massa.

O modelo prevê a evolução das variáveis de estado pressão, temperatura e

composição química das fases presentes. Adicionalmente, o modelo prevê

aspectos relevantes do escoamento do gás através da carga e tempo de residência

dos sólidos no interior do reator. Parâmetros operacionais tais como

produtividade, temperatura do gás de topo e composição química dos produtos

obtidos são calculados a partir do modelo. Os primeiros resultados confirmam

algumas características importantes do processo, tais como alta produtividade

presente na cuba superior (35 t.m-3.dia-1).

( ) ( ) ( )( )kiki

SgraddivVdivt kikiiii

kiii,, ,,

,φφ φφερ

φερ+Γ=+

∂ r

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As figuras a seguir mostram alguns resultados preliminares da modelagem.

Figura 42 - Evolução das temperaturas do gás (esquerda) e sólidos (direita) no interior do forno de auto-redução

Figura 43 - Evolução dos óxidos de ferro para as diversas etapas de auto-redução

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Figura 44 - Evolução da formação de ferro metálico para as diversas etapas de auto-redução

Figura 45 - Condições internas de redução no forno de cuba com carga auto-redutora

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