Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

41
1 UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE DIREITO – NITERÓI CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO SDB – INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO II ADI 3592 - HISTÓRICO, FUNDAMENTAÇÃO, ACÓRDÃO DO STF Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade Caroline Rodrigues Érika Alcântara Jimes Milanez Juliane Genovez Simone Barros Suzana Antunes Professor: Evandro Carvalho Niterói Junho de 2011

description

Análise da ADI3592

Transcript of Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

Page 1: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

1

UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE DIREITO – NITERÓI

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

SDB – INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO II

ADI 3592 - HISTÓRICO, FUNDAMENTAÇÃO,

ACÓRDÃO DO STF

Captação de Sufrágio:

Entre a Cassação e a Inelegibilidade

Caroline Rodrigues

Érika Alcântara

Jimes Milanez

Juliane Genovez

Simone Barros

Suzana Antunes

Professor: Evandro Carvalho

Niterói

Junho de 2011

Page 2: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

2

SUMÁRIO

1. Objetivo 3

2. Direito Eleitoral e Corrupção 4

3. Antecedentes da ADI 3592 14

4. Fundamentação da Petição 24

5. Acórdão do STF 27

6. Conclusões 31

7. Desdobramentos do Caso 35

8. Bibliografia 39

Page 3: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

3

1. Objetivo

O presente trabalho tem por objeto analisar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)

3.592-4, doravante tratada aqui como “ADI 3592”, cujo requerente foi o Partido Socialista

Brasileiro (PSB), tendo sido relator do caso o Ministro Gilmar Mendes; a análise da petição e do

acórdão busca articular os elementos da disciplina de Introdução ao Estudo do Direito II,

associando-os à dinâmica do caso concreto aqui estudado. Assim, a partir da avaliação do acórdão

escolhido, busca-se demonstrar o raciocínio jurídico que o Supremo Tribunal Federal (STF)

desenvolveu para chegar à decisão de improcedência da ação, por unanimidade.

A escolha da referida ADI se deve, além de sua temática juridicamente acessível, sobretudo

à sua proximidade ao exercício da cidadania pela população como um todo, naquele que é um dos

pilares do Estado Democrático de Direito: a representação política legítima via liberdade de voto. A

ação do PSB questionava a constitucionalidade de relevante dispositivo da “Lei da Compra de

Votos” (Lei 9.840/99, que modificou a Lei Eleitoral 9.504/97, com o objetivo precípuo de impor

sanções à captação de sufrágio), uma lei de iniciativa popular, que é aqui analisada também sob a

ótica de um tema de frequente discussão pública em nosso país: a corrupção eleitoral, muito

discutida na recente eleição frente a uma outra lei de iniciativa popular, a Lei da Ficha Limpa.

Questionam-se ainda os antecedentes que levaram à ADI, os desdobramentos jurídicos e outros

fatos posteriores ao acórdão, bem como possíveis lições sobre aplicação oblíqua da lei, sua

instrumentalização por oportunistas e as complexas nuances com que o Direito se depara.

Page 4: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

4

2. Direito Eleitoral e Corrupção

O Direito Eleitoral é um desdobramento do Direito Público, uma especialização do Direito

Constitucional. Como preâmbulo à ADI 3592 em si, é mister para sua contextualização fazer um

breve arrazoado sobre a legislação eleitoral do país, sobre o livre exercício de direitos políticos e a

problemática que motivou a lei questionada no STF. Na seção seguinte do trabalho abordam-se

ainda antecedentes verossímeis que supostamente conduziram o PSB àquela ação.

Em uma democracia liberal moderna, a representação política desempenha inegável papel

central, frente às dificuldades materiais da atuação soberana direta de grandes contingentes

populacionais, objeto de amplo debate jurídico e filosófico nos séculos XVIII e XIX. A

convergência entre liberalismo e democracia foi obtida através de interpretação expansiva do

princípio da representação, com a igualdade formal de todos perante à lei e a gradual

universalização dos direitos políticos, de votar e ser votado.

No Brasil, a discussão igualmente remonta à época da monarquia, na qual o voto censitário,

de viés aristocrático, definia os titulares dos cargos políticos (sobretudo legislativos) previstos na

constituição imperial, sob forte influência das práticas coronelistas e clientelistas arraigadas desde

os tempos de colônia portuguesa. O censo pecuniário estabelecido na Constituição de 1824

restringia os direitos políticos a reduzido segmento da população, fato agravado em 1881 pela Lei

Saraiva, que embora trouxesse avanços nos direitos políticos quanto aos quesitos religião e

naturalização, instituiu censo literário, afastando o direito de voto dos analfabetos, só restabelecido

inequivocamente pela Constituição de 1988.

A Proclamação da República levou à abolição da maioria dos censos, perdurando no entanto

o literário e o de gênero. A República Velha configurou-se ainda em período de grandes fraudes e

corrupção eleitoral, de simulações e condicionamentos da vontade popular, aprofundados na fase da

“Política do Café com Leite”, culminando na Revolução de 1930. Ao mesmo tempo, movimentos

pelo voto feminino tomavam corpo pelo país, conquistando vitórias diversas na Justiça. Coube ao

governo de Getúlio Vargas então a tarefa de instituir um Código Eleitoral Brasileiro, eliminando as

muitas antinomias existentes e estendendo o direito de voto às mulheres, o que se concretizou com

Decreto nº. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, que criou ainda a Justiça Eleitoral e instituiu o

Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Desde aquele código, outros sobrevieram até o Código Eleitoral atualmente vigente, Lei

4.737/65, promulgado durante a fase inicial da ditadura militar, anterior portanto ao endurecimento

do regime e à ampla cassação de direitos políticos promovida. Com a redemocratização, o Código

Page 5: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

5

foi recepcionado em grande parte pela Constituição Federal de 1988, a “Constituição Cidadã”, que

garante e estende os direitos políticos, listando exaustivamente as hipóteses de elegibilidade e

inelegibilidade; para não engessar a atuação do legislador, delega no entanto a Lei Complementar o

estabelecimento de outras hipóteses de inelegibilidade, o que se consumou com a LC 64/90.

Além do Código Eleitoral, da CF/88 e da LC 64/90, surgiram nas duas últimas décadas

diversas leis extravagantes especializadas que versam sobre as eleições, destacando-se as “Leis

Eleitorais” (sendo a Lei 9.504/97 a mais recente dessas, largamente aplicada às eleições no país) e

as reformas e modificações efetuadas pelo legislador sobre essas quatro normas principais, na forma

de emendas constitucionais, novas leis complementares e novas leis ordinárias. Dentre essas,

destacam-se duas leis de iniciativa popular: a Lei da Compra de Voto (Lei Ordinária 9.840/99, que

modificou a Lei 9.504/97 e o CE/65), também conhecida como “Lei dos Bispos” (pela participação

decisiva da CNBB na coleta de assinaturas), e a Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010,

que modificou a LC 64/90).

Ambas as leis de iniciativa popular contaram com ampla participação e repercussão social,

materializando vontade do eleitor pela moralidade e lisura dos pleitos, como tentativas nobres de

endurecer o combate a fraudes e corrupção eleitoral, historicamente impunes, que maculam a

legitimidade de nosso sistema representativo. O presente trabalho, ao ter como objeto na ADI 3592,

que questiona a constitucionalidade de trecho do art. 41-A da Lei 9.504/97, incluído pela Lei

9.840/99, se detém a avaliar a temática de Captação de Sufrágio; analogias e considerações válidas

para a Lei da Ficha Limpa são tratadas nas Conclusões e na seção “Desdobramentos do Caso”,

incluindo curioso caso de inelegibilidade a posteriori que se contrapõe frontalmente à

fundamentação do acórdão pelo STF para a ADI aqui apreciada.

2.1 Legislação – Dispositivos Citados nos Autos

Código Eleitoral – Lei 4.737/65

art. 222. É também anulável a votação, quando viciada de falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o art. 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei.

Embora fale de anulação de votação, o art. 222 não aborda sanções ao candidato na esfera

eleitoral; melhor regulamentação só veio a ocorrer com eficácia com a Lei 9.840/99. Ver ressalva

mais adiante sobre o art. 299 do Código Eleitoral, que trata do crime eleitoral correlato.

Page 6: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

6

art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos.

§ 1º O eleitor é parte legítima para denunciar os culpados e promover-lhes a responsabilidade, e a nenhum servidor público. Inclusive de autarquia, de entidade paraestatal e de sociedade de economia mista, será lícito negar ou retardar ato de ofício tendente a esse fim.

§ 2º Qualquer eleitor ou partido político poderá se dirigir ao Corregedor Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, e pedir abertura de investigação para apurar uso indevido do poder econômico, desvio ou abuso do poder de autoridade, em benefício de candidato ou de partido político.

§ 3º O Corregedor, verificada a seriedade da denúncia procederá ou mandará proceder a investigações, regendo-se estas, no que lhes fôr aplicável, pela Lei nº 1579 de 18/03/1952.

A coibição à interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade

foram novamente positivados em diversos níveis, na CF/88, na LC 64/90 e na Lei 9.504/97,

substituindo-se a processualística do art. 237 do CE/65 e da Lei 1.579/52 por aquela prevista no art.

22 da LC 64/90 (ver abaixo), aproveitada também para a apuração de captação de sufrágio no art.

41-A da Lei 9.504/97, que é colocado no rol dos argumentos da petição do PSB.

art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo.Parágrafo único. A execução de qualquer acórdão será feita imediatamente, através

de comunicação por ofício, telegrama, ou, em casos especiais, a critério do presidente do Tribunal, através de cópia do acórdão.

Esse artigo sobre o efeito não-suspensivo é de grande importância para a discussão do

acórdão do STF, tendo sido usado para afastamento de uma das alegações de inconstitucionalidade

contidas na ADI. Deve-se no entanto perceber que se trata aqui de norma em lei ordinária, sendo-lhe

desfavorável ainda o critério cronológico, restando apenas a alegação da (relativa) especialidade do

Código Eleitoral sobre outras normas. Isso nos levará, mais adiante, à problemática da antinomia

não-trivial de HIERARQUIA x ESPECIALIDADE.

art. 262. O recurso contra expedição de diploma caberá somente nos seguintes casos:I - inelegibilidade ou incompatibilidade de candidato;II - errônea interpretação da lei quanto à aplicação do sistema de representação

proporcional;III - erro de direito ou de fato na apuração final, quanto à determinação do quociente

eleitoral ou partidário, contagem de votos e classificação de candidato, ou a sua contemplação sob determinada legenda;

IV - concessão ou denegação do diploma em manifesta contradição com a prova dos autos, nas hipóteses do art. 222 desta Lei, e do art. 41-A da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997. (Redação dada pela Lei n 9.840, de 28.9.1999)

Há aqui o tratamento específico a recursos contra expedição de diplomas, que em vários

outros momentos se confundirá com a cassação de registro eleitoral e com a ideia de

Page 7: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

7

inelegibilidade, que será afastada no acórdão do STF. Notar que a Lei da Compra de Voto modificou

o inciso IV, na intenção de reforçar a eficácia para o caso específico da captação de sufrágio (art.

41-A da referida lei), pois o art. 222 do CE/65 já a previa. Segue o inciso original:

IV - concessão ou denegação do diploma, em manifesta contradição com a prova dos autos, na hipótese do art. 222.

Para garantir a exclusão de antinomias ocultas ou mesmo brecha legislativa via modificação

do art. 222, a lei de iniciativa popular incluiu expressamente a hipótese diretamente no art. 262.

art. 270. Se o recurso versar sôbre coação, fraude, uso de meios de que trata o art. 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei dependente de prova indicada pelas partes ao interpô-lo ou ao impugná-lo, o relator no Tribunal Regional deferi-la-á em vinte e quatro horas da conclusão, realizado-se ela no prazo improrrogável de cinco dias. (Redação dada pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

§ 1º Admitir-se-ão como meios de prova para apreciação pelo Tribunal as justificações e as perícias processadas perante o juiz eleitoral da zona, com citação dos partidos que concorreram ao pleito e do representante do Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

§ 2º Indeferindo o relator a prova , serão os autos, a requerimento do interessado, nas vinte e quatro horas seguintes, presentes à primeira sessão do Tribunal, que deliberará a respeito. (Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

§ 3º Protocoladas as diligências probatórias, ou com a juntada das justificações ou diligências, a Secretaria do Tribunal abrirá, sem demora, vista dos autos, por vinte e quatro horas, seguidamente, ao recorrente e ao recorrido para dizerem a respeito. (Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

§ 4º Findo o prazo acima, serão os autos conclusos ao relator. (Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

Esse artigo e demais artigos correlatos do Código tratam dos Recursos Eleitorais (Título III

do Código Eleitoral – Dos Recursos), em termos de disposições gerais, de recursos perante as juntas

e juízos eleitorais, de recursos nos tribunais regionais (caso deste art. 270) e de recursos no tribunal

superior (o art. 280 estende a aplicação do art. 270 também para este). Embora continuem

formalmente válidos, sua aplicação como um todo tem sido afastada na Justiça Eleitoral em favor

da aplicação do rito normatizado no art. 22 da LC 64/90.

Enfim, quanto ao mencionado art. 299, sobre crime eleitoral de compra e venda de voto:

art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

O art. 299, elencado entre os crimes eleitorais, tem caráter penal, não estabelecendo vínculo

objetivo com o conceito de “captação de sufrágio” do art. 222 que seria “vedado em lei” (No

Page 8: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

8

próprio Código? Por que o legislador não se referiu no art. 222 diretamente ao art. 299? Eis brechas

indesejáveis para sua efetiva aplicação). Tratava-se, portanto, de artigo de baixa eficácia, de

incidência usualmente afastada pela Justiça por falta de prova, também não prevendo a cassação de

registro, diploma ou inelegibilidade: vai direto à pena, com as consequências indiretas de tal sanção.

Sem a aplicação da pena de reclusão, ou mesmo com sua aplicação (seguida de ampla defesa e

muitos recursos), restava apenas o pagamento de multa, enquanto o candidato corruptor/corrupto

continuava normalmente no pleito, sem nenhuma apuração ou sanção eleitoral para afastá-lo.

Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988

O Título I versa sobre os Princípios Fundamentais, com a escolha pela democracia:

art. 1o Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

O Título II trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, abordando em seus Capítulos I a V

os Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, os Direitos Sociais, a Nacionalidade, os Direitos

Políticos, os Partidos Políticos. No Capítulo IV, Dos Direitos Políticos, o art. 14 afirma:

art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

I - plebiscito;II - referendo;III - iniciativa popular.

Os parágrafos 1o e 2o do art. 14 tratam do alistamento eleitoral, enquanto do 3o ao 8o são

enumeradas as hipóteses de elegibilidade e inelegibilidade. Em seguida, menciona-se a delegação

do estabelecimento de outras hipóteses de inelegibilidade a lei complementar e os dois parágrafos

seguintes sobre o processo de impugnação de mandato/diploma:

§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994)

§ 10 - O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.

§ 11 - A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé.

Page 9: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

9

A Lei Complementar em questão é a LC 64/90, discutida a seguir. Os parágrafos 10 e 11 são

apresentados pelo PSB em sua ADI; a questão do prazo da representação para impugnação é um dos

problemas discutidos na Justiça após a Lei da Compra de Votos e é melhor abordada na seção

seguinte. Mencione-se ainda o art. 16, de fundamental importância no julgamento da Lei da Ficha

Limpa, com a discussão sobre o que é exatamente “alterar o processo eleitoral”, mas que também

teve relevância para a Lei 9.840/99, embora indireta (a lei foi editada em 28 de setembro de 1999,

portanto pouco mais de um ano antes das eleições de 2000):

art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 4, de 1993)

Durante o trâmite da ADI foi promulgada outra lei, que endureceu a hipótese de compra de

votos, ao restringir as permissões a brindes de campanha. Isso será tratado melhor adiante.

Lei Complementar 64/90

Estabelece, de acordo com o art. 14, § 9º da Constituição Federal, casos de inelegibilidade,

prazos de cessação, e determina outras providências.

Além de reafirmar hipóteses de elegibilidade e inelegibilidade, a LC 64/90 elenca outras,

além de dispor sobre prazos de cessação e o processo de investigação judicial eleitoral, que

substitui na prática os artigos equivalentes do Código Eleitoral. Esta é ainda a lei alvo da Ficha

Limpa, uma vez que a nova LC 135/2010 é basicamente um pacote de emendas à LC 64/90, criando

diversas hipóteses novas de inelegibilidade, entre outras medidas.

Quanto ao processo de representação e investigação eleitoral (redação da lei à época da ADI;

também o art. 22 foi modificado pela Lei da Ficha Limpa), segue o rito definido:

art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

I - o Corregedor, que terá as mesmas atribuições do Relator em processos judiciais, ao despachar a inicial, adotará as seguintes providências:

a) ordenará que se notifique o representado do conteúdo da petição, entregando-se-lhe a segunda via apresentada pelo representante com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 5 (cinco) dias, ofereça ampla defesa, juntada de documentos e rol de testemunhas, se cabível;

b) determinará que se suspenda o ato que deu motivo à representação, quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficiência da medida, caso

Page 10: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

10

seja julgada procedente;c) indeferirá desde logo a inicial, quando não for caso de representação ou lhe faltar

algum requisito desta lei complementar;II - no caso do Corregedor indeferir a reclamação ou representação, ou retardar-lhe a

solução, poderá o interessado renová-la perante o Tribunal, que resolverá dentro de 24 (vinte e quatro) horas;

III - o interessado, quando for atendido ou ocorrer demora, poderá levar o fato ao conhecimento do Tribunal Superior Eleitoral, a fim de que sejam tomadas as providências necessárias;

IV - feita a notificação, a Secretaria do Tribunal juntará aos autos cópia autêntica do ofício endereçado ao representado, bem como a prova da entrega ou da sua recusa em aceitá-la ou dar recibo;

V - findo o prazo da notificação, com ou sem defesa, abrir-se-á prazo de 5 (cinco) dias para inquirição, em uma só assentada, de testemunhas arroladas pelo representante e pelo representado, até o máximo de 6 (seis) para cada um, as quais comparecerão independentemente de intimação;

VI - nos 3 (três) dias subseqüentes, o Corregedor procederá a todas as diligências que determinar, ex officio ou a requerimento das partes;

VII - no prazo da alínea anterior, o Corregedor poderá ouvir terceiros, referidos pelas partes, ou testemunhas, como conhecedores dos fatos e circunstâncias que possam influir na decisão do feito;

VIII - quando qualquer documento necessário à formação da prova se achar em poder de terceiro, inclusive estabelecimento de crédito, oficial ou privado, o Corregedor poderá, ainda, no mesmo prazo, ordenar o respectivo depósito ou requisitar cópias;

IX - se o terceiro, sem justa causa, não exibir o documento, ou não comparecer a juízo, o Juiz poderá expedir contra ele mandado de prisão e instaurar processo s por crime de desobediência;

X - encerrado o prazo da dilação probatória, as partes, inclusive o Ministério Público, poderão apresentar alegações no prazo comum de 2 (dois) dias;

XI - terminado o prazo para alegações, os autos serão conclusos ao Corregedor, no dia imediato, para apresentação de relatório conclusivo sobre o que houver sido apurado;

XII - o relatório do Corregedor, que será assentado em 3 (três) dias, e os autos da representação serão encaminhados ao Tribunal competente, no dia imediato, com pedido de inclusão incontinenti do feito em pauta, para julgamento na primeira sessão subseqüente;

XIII - no Tribunal, o Procurador-Geral ou Regional Eleitoral terá vista dos autos por 48 (quarenta e oito) horas, para se pronunciar sobre as imputações e conclusões do Relatório;

XIV - julgada procedente a representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3 (três) anos subseqüentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico e pelo desvio ou abuso do poder de autoridade, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e processo-crime, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;

XV - se a representação for julgada procedente após a eleição do candidato serão remetidas cópias de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11 da Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral.

Este é o processo para apuração de captação de sufrágio indicado pelo art. 41-A da Lei

Eleitoral, incluído pela Lei da Compra de Votos. Observar a menção a “declaração de

inelegibilidade” no inciso XIV como um dos fundamentos de ADIs contra o art. 41-A, inclusive da

ADI 3592, bem como as referências feitas pelo inciso XV à Constituição e ao Código Eleitoral,

sobre formalismos processuais a serem observados caso a representação seja julgada procedente

Page 11: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

11

após a eleição do candidato. Em seu acórdão, o STF afastou a aplicação desses dois incisos para

representações em casos de captação de sufrágio, declarando que seriam aplicáveis apenas os

incisos I a XIII, seguidos de cassação sumária (voto do Ministro relator Gilmar Mendes).

Ressaltem-se ainda os prazos de recursos e vistas marcados no inciso I, alínea a), e inciso

XIII, que geraram discussão no TSE por ocasião do Recurso Ordinário 748 em 2005 sobre a

necessidade de “paridade de armas” entre o representante e o representado (se este e o Procurador

Eleitoral têm prazo limitadíssimo para apresentar defesa após tomarem conhecimento da

representação, também aquele deveria ter prazo para representar após o conhecimento do fato

original, de modo a evitar representações intempestivas e oportunistas), seguida por vigoroso debate

se o TSE, ao fixar prazo e extinguir a lacuna deixada pela lei, estava assumindo função expressa de

legislador ou não (seção seguinte).

Lei 9.504/97 – “Lei Eleitoral”

Estabelece normas para as eleições

Lei 9.840/99 – “Lei da Compra de Voto”

Altera dispositivos da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997, e da Lei no 4.737, de 15 de

julho de 1965 – Código Eleitoral.

A Lei Eleitoral, como lei ordinária extravagante bastante extensa, foi editada com o intuito

de regulamentar diversas situações não previstas pelo Código Eleitoral, com o objetivo de melhor

organizar as eleições e tentar moralizá-las, por exemplo ao definir o que é gasto de campanha (art.

26). Trata-se de lei também “especializada” quanto às eleições, de mesma hierarquia, porém mais

recente que o Código Eleitoral.

A Lei da Compra de Voto, embora também inclua a sanção de “cassação de registro ou

diploma” para candidatos beneficiados por atuação de agentes públicos, tem como principal

objetivo enquadrar a captação de sufrágio, incluindo o art. 41-A na Lei Eleitoral:

art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999)

Este é o artigo que motiva a ADI 3592 do PSB perante o Supremo. A Petição é analisada em

mais detalhes adiante, assim como o acórdão proferido pelo Pleno do Tribunal.

Page 12: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

12

Algumas ressalvas importantes e interessantes se fazem necessárias. Primeiro, quanto ao art.

26, que fala do que pode ser considerado licitamente “gasto de campanha”. Como era um artigo

com incisos “exemplificativos” e não “exaustivos”, permitindo ainda expressamente “brindes” de

campanha, abria à época algumas brechas para interpretações judiciais com afastamento da

incidência do art. 41-A; por outro lado, temperava o rigor da expressão demasiado severa (e

elástica) “bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza”, ampliando a discricionariedade do juiz

para julgar com equidade (mas também para absolver certos tipos de compra de voto). Mencione-se

que o art. 26 foi modificado em 2006 por lei editada pouco antes do julgamento da ADI pelo STF e

consequente acórdão; a lei tornou-o um artigo com enumeração exaustiva de hipóteses, revogou a

permissão para brindes serem lançados como despesa de campanha e endureceu a eficácia do art.

41-A a partir das eleições de 2008, ao ampliar a esfera do ilícito. A discricionariedade do juiz

eleitoral passou a se dar sobre a expressão “bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza” e sua

hermenêutica, o que possibilita maior rigor, mas também maior margem de manobra para armações

mal-intencionadas (não que estas não acontecessem antes) e judicialização do processo eleitoral.

A ressalva seguinte diz respeito à remessa ao art. 22 da LC 64/90 (já apresentado) para fins

procedimentais; notar que o art. 41-A não faz restrições a incisos específicos, mas sim invoca o

artigo na totalidade. O art. 41-A configura-se como uma norma primária, de CONDUTA-SANÇÃO,

delegando a função de norma processual, secundária, ao art. 22 da LC referida.

Por último, desempenhando ainda um papel central no raciocínio jurídico do acórdão do

STF, o artigo 41-A em si fala de “cassação de registro ou diploma”, não de “inelegibilidade”,

obviamente reservada a Lei Complementar, o que suscita a necessidade de melhor delimitação dos

conceitos. No entanto, a referência a “declaração de inelegibilidade” no inciso XIV do art. 22 da LC

64/90 implica em uma antinomia, que é resolvida pelo STF com interpretação corretiva.

2.2 Ainda sobre Captação de Sufrágio e seus efeitos legais

Os pré-requisitos para candidaturas a cargos eletivos foram instituídos na Constituição,

através do seu artigo 14, que dispõe que somente aqueles que tiverem nacionalidade brasileira, o

pleno exercício dos direitos políticos, alistamento eleitoral, domicílio eleitoral na circunscrição,

filiação partidária e idade mínima, dependendo do cargo concorrido, poderão ser candidatos a

cargos políticos. Entretanto, conforme demonstrado, além do candidato ter os requisitos

supracitados, deve seguir certas condutas durante o período eleitoral, como o art. 41-A da Lei

Eleitoral, principal norma discutida neste trabalho.

Ressalte-se todavia, para que não restem dúvidas, que a infração eleitoral da captação ilícita

Page 13: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

13

de sufrágio também corresponde ao crime de corrupção eleitoral, previsto no art. 299 do Código

Eleitoral (não só para o político, mas inclusive para o eleitor que vende seu voto, como polo ativo

ou passivo); as práticas referidas no art. 299 (doar, oferecer, prometer), além de já serem

criminosas, com a Lei da Compra de Voto também passaram a ser infração eleitoral para o político,

de eficácia imediata, passível de punição com cassação de registro ou diploma. Eis o objetivo da Lei

da Compra de Voto, dar sanção e eficácia eleitoral àquilo que já era crime (com sanção penal,

embora esteja no Código Eleitoral); os demorados processos penais na justiça, as discussões sobre

jurisdição, os recursos, etc. possibilitavam ao réu, quando processado, continuar com o ilícito e

mesmo gozar normalmente de seu mandato, caso eleito.

Quanto à inovação da lei Lei 9.840/99, o Professor Thales Tácito Pontes Luz de Pádua

Cerqueira1 também destaca que "para haver multa e a cassação do registro ou diploma, são

necessários os seguintes elementos: a) elemento subjetivo, qual seja, a intenção de captar votos; b)

elemento objetivo consistente em dar, oferecer, prometer ou entregar bem ou qualquer vantagem de

cunho pessoal, inclusive emprego ou função pública, salvo as exceções legais previstas no art. 26 da

Lei nº 9.504/97". Assim, a decisão pela cassação deve observar com atenção a existência

comprovável de ambos os elementos, pois de outro modo poderá atuar não a favor da vontade do

eleitor, mas contra, ao viabilizar armações eleitorais por candidatos que visem tirar proveito da lei

por via oblíqua, que instrumentalizem o interesse público em seu próprio.

Após a promulgação da Lei 9.840/99, já houve diversos candidatos condenados por cometer

a ilicitude enquadrada no artigo 41-A da lei 9.504/97. Podemos citar como exemplos o candidato a

deputado estadual pelo PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) em 2006, Álvaro

Lins, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, sendo acusado de prometer cargos públicos em

troca de votos, segundo gravações de reuniões com excedentes do concurso da Polícia Civil do Rio

e também o prefeito de Maceió Jean Fábio Braga Cordeiro (Partido Progressista-PP) que teve seu

mandato impugnado por compra de votos da eleição de 2008. Segundo o Ministério Público, ele foi

flagrado por fiscais eleitorais fornecendo transporte a eleitores no dia da eleição e, além disso,

comprando seus votos por cem reais.

1 in Direito Eleitoral Brasileiro. Doutrina. Jurisprudência e Legislação. 2ª edição revista, atualizada e ampliada. Editora Del Rey. Pág. 1013.

Page 14: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

14

3. Antecedentes da ADI 3592

O Partido Socialista Brasileiro, através de seu advogado, Leonardo Pinheiro Lopes,

instaurou em 28/09/2005 o pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.592, em face da

expressão “cassação do registro ou do diploma”, contida no art. 41-A da Lei das Eleições

(9.504/97), com a alegação principal de que o dispositivo, ao se valer ainda do art. 22 da Lei

Complementar 64/90, teria criado nova hipótese de inelegibilidade, afrontando, assim, o art. 14 § 9º

da Constituição Federal, que expressamente reserva a lei complementar o tratamento de tal assunto,

bem como violando, também, os §§ 10 e 11 do artigo constitucional.

A polêmica que se forma reside no fato de que o Partido Socialista Brasileiro buscou

desqualificar lei de iniciativa popular de intenção moralizante, a Lei da Compra de Voto, alegando

que esta afrontava princípios constitucionais. Queriam excluir, por inconstitucionalidade, a cassação

de registro e do diploma do art. 41-A, removendo-lhe a eficácia, tentando equipará-los ao conceito

de inelegibilidade (questão de hermenêutica e sentido das palavras).

Deixando de lado a hipótese de validade formal por um momento, teria sido a motivação do

PSB, em mover a ADI, justa, legítima? Considerando-se o papel de um partido político, de

congregar partidários de uma dada corrente ideológica para fins de representação democrática,

tendo como meio principal para sua afirmação no cenário político a conquista de eleitores e

consequentemente a eleição de seus candidatos, não seria esta ADI uma espécie de confissão de

intenções espúrias, possivelmente compartilhadas por outros partidos, de que tudo é válido para

vencer as eleições, ou de que, no mínimo, os fins justificariam os meios?

Importante frisar que a controvérsia apresentada está relacionada ao fato de que nem sempre

a questão foi pacífica na esfera do judiciário, muito menos na doutrina (muitos veem a cassação de

registro ou diploma como uma variante de inelegibilidade, de curto prazo), o que significa dizer que

vários Tribunais Eleitorais do país já consideraram a matéria em foco como inconstitucional.

Todavia, mesmo à época da ADI, era pacífico o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, no

sentido de que as sanções de cassação de registro ou de diploma não constituem novas hipóteses de

inelegibilidade, como os trechos2 a seguir claramente demonstram:

“[...]. A jurisprudência deste Tribunal Superior está consolidada quanto à constitucionalidade do art. 41-A da Lei nº 9.504/97. [...].”(Ac. nº 25.227, de 21.6.2005, rel. Min. Gilmar Mendes.)

“[...]. III – A jurisprudência da Corte está consolidada quanto à constitucionalidade do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, que não estabelece hipótese de inelegibilidade e possibilita a

2 http://temasselecionados.tse.gov.br/temas/captacao-de-sufragio/constitucionalidade-do-art.-41-a-da-lei-9.504-97/

Page 15: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

15

imediata cassação de registro ou diploma (precedentes-TSE). [...]."(Ac. de 29.4.2004 no RCEd nº 612, rel. Min. Carlos Velloso; no mesmo sentido o Ac. de 3.6.2003 no REspe nº 21.248, rel. Min. Fernando Neves; o Ac. de 19.8.2004 no Ag nº 4.659, rel. Min. Peçanha Martins; o Ac. de 17.2.2005 no RCEd nº 613, rel. Min. Carlos Velloso; e o Ac. de 7.3.2006 no AgRgREspe nº 25.214, rel. Min. Cesar Asfor Rocha.)

“Recurso especial. Abuso do poder econômico e captação ilícita de sufrágio. Violação ao art. 41-A da Lei nº 9.504/97. [...]. Inconstitucionalidade afastada. O escopo do legislador é o de afastar imediatamente da disputa aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo ‘captação ilegal de sufrágio’. A cassação do registro ou do diploma, cominados na referida norma legal, não constitui nova hipótese de inelegibilidade. [...].”(Ac. nº 21.221, de 12.8.2003, rel. Min. Luiz Carlos Madeira.)

Adicionalmente, em paralelo à ADI do PSB, já corria no Supremo Tribunal Federal outra, a

ADI 3305 impetrada pelo Partido Liberal – PL em 16/09/2004, questionando o art. 77 da Lei

9.504/97, sobre participação de candidatos em inauguração de obras públicas a menos de três meses

da eleição, com acórdão proferido em 13/09/2006, pouco antes do acórdão da ADI 3592 do PSB.

Conforme a redação do artigo à época (a Lei 12.034/2009 incluiu a sanção de cassação do diploma

junto à cassação do registro no Parágrafo Único):

art. 77. É proibido aos candidatos a cargos do Poder Executivo participar, nos três meses que precedem o pleito, de inaugurações de obras públicas. Parágrafo único. A inobservância do disposto neste artigo sujeita o infrator à cassação do registro.

Em sua fundamentação, o PL falava da mesma questão da inconstitucionalidade de lei

ordinária tratar de inelegibilidade (conforme art. 14 § 9o da Constituição), supostamente embutida

na cassação do registro mesmo que em variante mais branda. Arrolava ainda o princípio da

igualdade, conforme o art. 5o caput e inciso I da Constituição, pois o art. 77 questionado previa

tratamento diferenciado, mais rigoroso, aos candidatos a cargos do Executivo que do Legislativo.

O relator, Ministro Eros Grau, entendeu e fundamentou amplamente que a sanção de

cassação de registro da candidatura não trata de nova hipótese de inelegibilidade, sendo sua

fundamentação mencionada pelo Ministro Gilmar Mendes em seu voto no acórdão da ADI 3592.

Mencione-se que, em trecho do relatório da ADI 3305 também citado por Mendes, o relator afastara

ainda o argumento de tratamento desigual, uma vez que o Executivo, como gestor da Administração

Pública, é quem decidiria sobre a realização de obras e, portanto, justificaria-se o maior rigor:

“[...] desde Platão, o princípio da igualdade consiste em dar tratamento igual aos iguais e desigual aos desiguais.”

Todavia, não se pode esquecer da possibilidade de interpretação equivocada ou mau posta

pelos juízes e tribunais. Justamente por haver controvérsia política sobre esse entendimento, a

Page 16: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

16

mesma Lei 12.034/2009 também estendeu a eficácia da proibição a candidatos de qualquer cargo.

Devem ser lembradas as emendas legislativas ao orçamento, frequentemente tratando de obras em

suas bases eleitorais, assim como a participação de candidatos a cargos no legislativo em

inaugurações de obras justamente para faturar politicamente sobre o fato.

Pleitos dos partidos à parte, tomando como ponto de análise a falibilidade material do

legislador e da decisão judicial, não caberia uma análise crítica da possível instrumentalização de

leis bem-intencionadas para fins espúrios, conforme já mencionado no presente trabalho? Não

poderia suceder um “desvirtuamento” da Lei da Compra de Votos, utilizada com oportunismo, em

um contexto de ações e representações com motivação política para atacar adversários (ainda

candidatos ou mesmo já eleitos)?

Voltamos primeiro à problemática dos elementos subjetivo e objetivo necessários à

comprovação do ilícito, com temperança e cautela, da validade das provas apresentadas, sua

razoabilidade e respeito ao princípio da proporcionalidade, do eventual julgamento sumário por

veículos de mídia partidarizados, com base em interpretação literal do “bem ou vantagem pessoal

de qualquer natureza” constante do art. 41-A da Lei 9.504/97. Conforme trecho da recente Ação

Cautelar no Recurso Especial Eleitoral nº 36.335 no TSE:

“[...]. Captação ilícita de sufrágio. art. 41-A da Lei nº 9.504/97. Prova robusta. Inexistência. Provimento. 1. Para caracterizar a captação ilícita de sufrágio, exige-se prova robusta de pelo menos uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, da finalidade de obter o voto do eleitor e da participação ou anuência do candidato beneficiado, o que não se verifica na espécie. [...].”(Ac. de 15.2.2011 no REspe nº 36335, rel. Min. Aldir Passarinho Junior.)

Não estaríamos em algumas situações passando do problema da compra de votos ao da

compra de depoimentos, de provas forjadas, sob o manto da legitimidade de uma lei de iniciativa

popular, na ânsia de punir, confundindo sanções jurídicas com sanções sociais? O que pensar sobre

a realidade política em rincões do interior do país, não só de clientelismo mas também de

coronelismo, onde disputas nem sempre limpas têm lugar, com eventual corrupção inclusive na

própria máquina do Estado (promotores, juízes, corregedores cooptados)?

Um outro aspecto a ser impreterivelmente ressaltado é o risco da institucionalização do

“tapetão”, isto é, após o veredicto das urnas candidatos perdedores ingressarem com representações

e mais representações eleitorais, com suspeitas de compras de voto, para forçar um “terceiro turno”

na Justiça – ou, talvez pior, representações feitas logo antes da eleição, para que não haja tempo

hábil de defesa do acusado enquanto o dano é consumado via pré-julgamentos nos meios de

comunicação, frequentemente de políticos ou de laranjas. Uma avalanche de recursos

Page 17: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

17

intempestivos, frequentemente pós-eleitorais, judicializando as eleições, não podem consistir em

um estupro à vontade do eleitor, em vez de resguardá-la?

A necessidade de fixação de prazo para representação eleitoral, de modo a evitar recursos

intempestivos às vésperas da eleição ou após as mesmas, evitando oportunismo, foi amplamente

discutida no Recurso Ordinário 748 do TSE, julgado em 24/05/2005 (antes, portanto, do julgamento

da ADI 3592 pelo Supremo Tribunal Federal). A discussão se deu especificamente, no caso concreto

sob análise, para a apuração de condutas vedadas pelo art. 73 da Lei 9.504/97:

art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: […]§ 5o Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos I, II, III, IV e VI do caput, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma. (Redação dada pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999)

Notar que a sanção de cassação do registro ou do diploma no § 5o foi incluída pela Lei

9.840/99, justamente a lei que incluiu o art. 41-A na Lei 9.504/97 (estas são justamente as duas

modificações efetuadas na Lei Eleitoral pela Lei 9.840/99, que ficou conhecida como Lei da

Compra de Voto pelo clamor popular ter sido sobretudo pela matéria regulada pelo art. 41-A,

embora a mudança de redação do art. 73 § 5o desempenhe papel igualmente moralizante, evitando o

uso da máquina pública para campanha eleitoral).

Durante o julgamento do recurso pelo TSE foi levantada Questão de Ordem acerca da

intempestividade do recurso, tendo sido fixado pelo Tribunal o prazo de 5 dias para representação

(em possível antinomia com o § 10 do art. 14 da Constituição), como textualmente no acórdão:

Vistos, etc.Acordam os Ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, em resolver questão de ordem no sentido de fixar em cinco dias o prazo para ajuizamento das representações pertinentes às condutas vedadas pela Lei nº 9.504/97, vencidos os Ministros Caputo Bastos, Marco Aurélio, Cesar Asfor Rocha, e, no mérito, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos das notas taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante desta decisão.Sala de Sessões do Tribunal Superior Eleitoral.Brasília, 24 de maio de 2005.Ministro GILMAR MENDES, vice-presidente no exercício da PresidênciaMinistro LUIZ CARLOS MADEIRA, relator

Além de haver fundamentação jurídica da necessidade de tal prazo para afastar usos

oportunistas da lei, por ter a Questão de Ordem levantado grande polêmica sobre a pertinência ou

não da fixação do prazo pelo TSE, explicitamente para cobrir lacuna da legislação, o que guarda

grande relação com o objeto de estudo da Teoria do Ordenamento Jurídico, seguem trechos

Page 18: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

18

relevantes da sessão, conforme suas notas taquigráficas:

QUESTÃO DE ORDEMO SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): [...] Não há prazo para a propositura da representação. Todavia, aguardar que as eleições se realizem, sob tamanha e pública influência, desqualifica a representação, que se faz abusiva e desconectada do interesse público.[...] Tenho presente a Representação nº 443/DF, quando se estabeleceu o prazo de 48 horas para ajuizamento da reclamação para o exercício do direito de resposta. Previne-se a exorbitância do direito, que não se coaduna com o princípio da boa-fé. [...] Proponho seja definido o prazo para o ajuizamento das representações pertinentes às condutas vedadas a que se refere a Lei nº 9.504/97 [...]

VOTOO SENHOR MINISTRO CAPUTO BASTOS: [...] Vale dizer, se a parte tem 48 horas para se defender, é convir que, pelo princípio da igualdade e da isonomia, deveria corresponder o prazo de 48 horas para ajuizar as respectivas representações.[...]

VOTO-VISTA (Questão de ordem)O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO: [...] A lei não prevê prazo. Há precedente que nega pudesse a Corte estabelecê-lo em termos de decadência, adotando analogia com prazo de resposta, que não seria pertinente, dadas a assimetria e a distinção dos casos (REspe nº 15.322, rel. Min. Eduardo Ribeiro). Parece, contudo, haver hoje consenso na Corte quanto à necessidade de fixação de prazo.[...]O SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): O fundamental é que se fixe o prazo para evitar oportunismo.[...]O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO: Sim. Daí surge a necessidade de não permitir que essas situações permanentes continuem. Se o fato é público, o interessado toma conhecimento, fica silencioso, se omite, a impressão é de que não vê nenhum risco à igualdade de oportunidades, que sua situação parece, pois, invulnerável. Se, amanhã ou depois, vem a perder a eleição, recorre? Se o faz, o procedimento é oportunista, não compatível com a finalidade dos remédios processuais.O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: A lei em si não assina prazo?O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO: Não assina prazo nenhum.O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Neste caso, estaríamos criando prazo, considerado o vácuo?O SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): Tem precedente, que cito na questão de ordem, no sentido de que o Tribunal já criou o prazo.[...]O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: […] A dificuldade que encontro é a de atuar nesse vazio deixado pelo legislador e criar um prazo, como se legislador fosse, e o fazer inclusive em cima de caso concreto. Não se trata de uma resolução para disciplinar as eleições em si: Tenho muita dificuldade em partir para a fixação do prazo.[...]O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Mas a Lei está em vigor desde 1997 e em 2005 vamos nela inserir um prazo?[...]O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Tomou-se de empréstimo o mesmo prazo para a defesa. Neste caso seria levar às últimas conseqüências a paridade de armas.O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO: Se a Corte não estabelece prazo nenhum incentiva o uso oportunistíco das representações.O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Há de levar-se em conta a atuação do Ministério Público, Sr. Presidente, não apenas de interessados, de partidos, de coligações. Estabelecido prazo ele será linear para todos.[...]O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Penso que, de lege ferenda, é interessante haver prazo. Mas esse prazo não foi fixado em 1997. A lei já foi aplicada em várias eleições

Page 19: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

19

e jamais se cogitou de prazo para ter-se a providência do art. 73 da Lei nº 9.504/97.[...]

VOTO (Questão de ordem - vencido)O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Senhor Presidente, perdoem-me os colegas o arroubo de retórica - ainda não estou no Congresso Nacional, peço vênia para não caminhar no sentido de fixar prazo. Ocorre, no caso, uma verdadeira fixação de prazo. Não somos convocados para aplicar a lei, porque a lei a respeito é silente, e o Tribunal sempre a observou, tal como ela se contém hoje. Eleger e pinçar por este ou aquele critério, ainda que repousando na razoabilidade, um prazo, é passo demasiadamente largo. Peço vênia para entender que não cabe ao Tribunal a fixação, sob pena de olvidar-se a separação de poderes e veja envolvimento de matéria constitucional no caso.

VOTO (Questão de ordem)O SENHOR MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Senhor Presidente, parece-me extremamente razoável a observação do Ministro Cezar Peluso.Em verdade, não se trata de estabelecer o prazo, mas simplesmente de presumir que, ultrapassado aquele tempo razoável para se fazer a representação, que se tem como desinteressante, ou como inexistente, prejuízo ao representante.Peço vênia ao eminente Ministro Marco Aurélio para acompanhar o Ministro Cezar Peluso.

VOTO (Questão de ordem)O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (vice-presidente no exercício da Presidência): [...] Pedindo vênia à dissidência, acompanho a maioria encetada pelo Ministro Cezar Peluso, resolvendo a questão de ordem no sentido da fixação do prazo de cinco dias.

ESCLARECIMENTOO SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: A representação foi tempestiva?[...]O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Senhor Presidente, nesse caso, deu entrada dentro dos cinco dias?O SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): Não.O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Fixa-se não tendo em conta o caso concreto?O SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): Não. Só a questão de ordem.O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Senhor Presidente, estou mais perplexo ainda, porque simplesmente surge prazo que nada tem a ver com o processo.Fui informado pelo relator que, muito embora o Ministério Público tenha entrado tempos após o acontecimento glosado pelo art. 73, não haverá aplicação nesse caso. Isso só informa que se passa a atuar no campo legiferante, porque não se está interpretando a lei para aplicação no caso concreto. Estar-se-á realmente legislando sobre o tema e acho perigosíssimo da parte do Tribunal fazer isso sem que seja, sequer, via resolução para disciplinar as eleições. Uma coisa seria a atuação do Tribunal, no exame global, no exame em tese da matéria. Mas, apregoado o processo, no caso concreto, atuar em tese?O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO: No caso concreto, eu não conheceria da representação.O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Vejam, no exame do caso, segundo o relator, a matéria não é necessária à definição do recurso.Imagine-se que a questão de ordem, a definição, seja indispensável ao julgamento. Mas será algo conflitante, em passo seguinte, dizer-se que o que decidido na questão de ordem não guarda adequação com a situação concreta, porque, caso contrário, haveria a retroação da deliberação do Tribunal. Isso demonstra que a deliberação surge com contornos normativos.O SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): V. Exa. me permite? Vim preparado para, se não vingasse a questão de ordem, votar o recurso. Essa foi a confusão que fiz agora.O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (vice-presidente no exercício da Presidência): Imagino que V. Exa. suscitou a questão de ordem exatamente para saber qual seria o prazo aplicável.

Page 20: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

20

ESCLARECIMENTO[...]O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Ou seja, Sr. Presidente, o que precisamos definir é a natureza do prazo que foi apontado, como de cinco dias. É prazo para a representação? A representação foi formalizada posteriormente? E se há um recurso ordinário impugnando o acórdão que julgou improcedente a representação, caminha-se para o conhecimento e desprovimento, ou o não-conhecimento do recurso.O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO: Se V. Exa. me permite, vou externar meu ponto de vista. É exatamente isso. Por isso é que me fixei na questão do interesse. Em outras palavras, seria o fundamento para manter o acórdão impugnado, porque, na verdade, aquela representação seria uma questão sem interesse jurídico. Portanto, a decisão fica mantida. Por isso a pertinência da questão de ordem, porque, na verdade, se o Tribunal fixasse, como fixou, a necessidade de um prazo para a demonstração do interesse, o fato de não ter sido observado esse prazo significa que o representante não tinha interesse na representação e, portanto, o Tribunal local, ao determinar que a representação era inconseqüente, tem toda a razão.

VOTO (Mérito)O SENHOR MINISTRO LUIZ CARLOS MADEIRA (relator): Senhor Presidente, então, conheço do Recurso Ordinário, mas nego-lhe provimento, por entender intempestiva a representação.

3.1 – Caso João e Janete Capiberibe (PSB/AP)

Nas eleições de 06/10/2002, o casal João Capiberibe e Janete Capiberibe, do PSB do Amapá,

foram eleitos respectivamente senador e deputada federal. Em 22/10/2002, dezesseis dias após a

realização do pleito, foi apresentada ao Tribunal Regional Eleitoral representação contra o casal

pelo PMDB/AP, em nome de Gilvan Borges (terceiro colocado na eleição para dois senadores,

ligado ao senador José Sarney, também senador pelo Amapá), sob a alegação de captação de

sufrágio. Naquele interstício, a mídia local, controlada pelas oligarquias amapaenses e oposicionista

aos Capiberibe, fizera amplo alarde sobre supostas compras de voto pelos candidatos do PSB.

Como a representação foi proposta após a eleição, seguindo o inciso XV da LC 64/90 foram

remetidas cópias ao Ministério Público Eleitoral, para observação do art. 14 §§ 10 e 11 da

Constituição. O Ministério Público Eleitoral não acatou a denúncia do PMDB e a Ação de

Investigação Judicial Eleitoral junto ao Tribunal Regional Eleitoral os declarou inocentes.

O PMDB não se conformou com a decisão, ingressando com Recurso Especial Eleitoral no

TSE. O Recurso Especial foi acolhido como Recurso Ordinário, conduzindo a novo julgamento,

que culminou na cassação dos mandatos de ambos no dia 27 de abril de 2004, com base apenas no

depoimento de duas eleitoras, que alegaram ter recebido R$ 26,00 cada. O Ministro Celso de Mello,

que foi voto vencido, entendeu que não havia provas concludentes sobre o envolvimento do casal

nos ilícitos, invocou o princípio da presunção da inocência e afirmou: “É um terreno movediço

demais para se adotar uma decisão tão drástica que é a cassação de mandatos”.

Page 21: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

21

ACORDÃO No 21.264 - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 21.264 - CLASSE 22a - AMAPÁ (Macapá).

Relator: Ministro Carlos Velloso.Recorrente: Diretório Regional do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e outro.Advogado: Dr. Osvaldo Flavio Degrazia e outros.Recorrido: João Alberto Rodrigues Capiberibe e outros.Advogados: Drs. Antônio Tavares Vieira Netto, José Antônio Almeida e outros.Assistente: Diretório Nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB). Advogado: Dr. Paulo Saraiva da Costa Leite e outros.

EMENTA:ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO: PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA PELO ART. 41-A DA LEI N° 9.504/97, ACRESCENTADO PELO ART. 1o DA LEI No 9.840, DE 28.9.99: COMPRA DE VOTOS.I - Recurso interposto anteriormente à publicação do acórdão recorrido: tempestividade. Precedentes do TSE.II - Tratando-se de matéria que possibilita a perda de mandato eletivo federal, o recurso para o TSE é ordinário: CF, art. 121, § 4o, IV. Conhecimento de recurso especial como ordinário.III - Impedimento e suspeição de juízes do TRE: não acolhimento.IV - Prática de conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97, acrescentado pelo art. 1o da Lei n. 9.840/99: compra de votos. Há, nos autos, depoimentos de eleitoras, prestados em juízo, que atestam a compra de votos.V - Para a configuração do ilícito inscrito no art. 41-A da Lei n° 9.504/97, acrescentado pela Lei n° 9.840/99, não é necessária a aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral. Ademais, para que ocorra a violação da norma do art. 41-A, não se torna necessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo próprio candidato; é suficiente que, sendo evidente o beneficio, do ato haja participado de qualquer forma o candidato ou com ele consentido: Ag n. 4.360/PB, Min. Luiz Carlos Madeira; REspe n. 21.248/SC, Min. Fernando Neves; REspe n. 19.566/MG, Min. Salvio de Figueiredo.VI - Recurso especial conhecido como ordinário e provido.

ACÓRDÃOVistos, etc., Acordam os Ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em conhecer do recurso como ordinário, rejeitar as preliminares, vencido o Ministro Francisco Peçanha Martins quanto ao impedimento da Juíza Stella Ramos, e, no mérito, por maioria, dar provimento ao recurso para cassar os registros e diplomas expedidos, impondo multa de 15 mil Ufirs para cada um dos recorridos, vencidos os Ministros Fernando Neves e Celso de Mello, nos termos das notas taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante desta decisão.

Sala de Sessões do Tribunal Superior Eleitoral.Brasília, 27 de abril de 2004.

Ministra ELLEN GRACIE, vice-presidente no exercício da PresidenciaMinistro CARLOS VELLOSO, relatorMinistro CELSO DE MELLO, vencidoMinistro FERNANDO NEVES, vencido

O casal Capiberibe recorreu da decisão, sendo-lhes negado o efeito suspensivo, a partir do

que interpuseram junto ao STF a Ação Cautelar 509, distribuída ao Ministro Eros Grau. Este

concedeu-lhes a liminar em 17/11/2004, confirmada pelo tribunal em 01/12/2004, para que

Page 22: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

22

pudessem permanecer em seus mandatos até o julgamento do Recurso Extraordinário contra a

decisão do TSE.

AÇÃO CAUTELAR. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO DA COMPETÊNCIA DA CORTE. MEDIDA LIMINAR. DEFERIMENTO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO FUMUS BONI IURIS E DO PERICULUM IN MORA. MANDATO ELETIVO. CASSAÇÃO. LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DA EXIGÊNCIA DO TRÂNSITO EM JULGADO PARA A SUA EXECUÇÃO. RELEVÂNCIA DA MATÉRIA.[...]2. Suposta prática de captação de votos, ocorrida entre a data do registro da candidatura até o dia da eleição. Representação eleitoral julgada procedente após a eleição, diplomação e posse do candidato. Mandato eletivo. Cassação. Observância do disposto no artigo 15 e nos incisos XIV e XV do artigo 22 da LC 64/90. Plausibilidade da tese jurídica sustentada e viabilidade do recurso extraordinário. Medida liminar deferida e referendada pelo Pleno da Corte.

Em seu despacho, o Ministro Eros Grau afirma que "no que tange à fumaça do bom direito,

tenho-a como presente e aparentemente não há coesão nos depoimentos", assim como concede o

efeito suspensivo "em face da duvidosa constitucionalidade do artigo 41-A da Lei nº 9.504/97,

relativo ao sufrágio". Observe-se que a fundamentação de Eros Grau não diz respeito ao artigo 41-A

constituir exatamente nova hipótese de inelegibilidade, mas de que a cassação de diploma difere

daquela do registro, conforme os incisos e artigos indicados na ementa, ressaltando que a

representação eleitoral foi julgada procedente após a diplomação e posse do casal em seus

mandatos, devendo ser respeitado o devido processo legal.

De acordo com o despacho de Eros Grau, o TSE já recusou denúncias como essa, relacionadas ao art. 41-A, exatamente por não existirem provas suficientes que vinculem os candidatos aos benefícios denunciados em troca de votos. Diante disso, a jurisprudência do próprio TSE seria desprezada, conforme o Ministro, trazendo como conseqüência grave ameaça à legitimidade dos mandatos populares, que poderiam ser desfeitos com base em ilações ou presunções, e não em prova produzida.3

O julgamento do mérito ocorreu em 22/09/2005, quando o Pleno não conheceu do recurso,

sendo mantida assim a decisão anterior do TSE, mesmo com o estabelecimento do prazo de cinco

dias para as representações pelo próprio TSE, em 24/05/2005, no Recurso Ordinário 748, que levou

à derrubada daquela outra representação eleitoral, na origem, por intempestividade. Ressalte-se que

alguns dos Ministros do Supremo Tribunal Federal também eram Ministros do TSE, mas

supostamente preferiu-se não levar adiante aquela regra duvidosa no âmbito do STF.

O questionamento da constitucionalidade do art. 41-A pelo Ministro Eros Grau na Ação

3 STF garante, temporariamente, mandato do casal Capiberibe – Agência Senado, 17/11/2004 in http://www.direito2.com.br/asen/2004/nov/17/stf-garante-temporariamente-mandato-do-casal-capiberibe

Page 23: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

23

Cautelar 509 é o ponto de partida para a ADI 3592 do PSB, datada de 27/09/2005 (cinco dias após o

julgamento do caso Capiberibe pelo Pleno) e ajuizada no STF no dia seguinte, 28/09/2005, com

pedido de liminar, supostamente na esperança de salvar seus mandatos. Retomando pergunta

anterior, seria portanto popularmente legítima a ADI do PSB? A primeira impressão sobre a ADI era

de que o PSB desejava derrubar uma lei “justa”, correta, de iniciativa popular; mas até que ponto as

brechas da lei não a tornam um risco à lisura das eleições, se aplicada sem temperança, como parece

ser o caso da cassação do casal Capiberibe?

Page 24: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

24

4. Fundamentação da Petição

O instrumento utilizado pelo PSB foi a Ação Direta de Inconstitucionalidade, que tem como

escopo retirar a eficácia no ordenamento jurídico da norma submetida ao controle direto de

constitucionalidade. O objetivo da Ação Direta é declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato

normativo, não necessariamente visando, a princípio, solucionar nenhum caso concreto, ressalva

feita ao caso dos Capiberibe na seção anterior, nítida motivação da presente ADI 3592.

O Requerente da Ação é o próprio Partido Socialista Brasileiro, através de seu advogado,

sendo Intimados a Presidência da República e o Congresso Nacional, representados no processo

pelo Advogado-Geral da União, sendo dadas vistas ainda à Procuradoria-Geral da União; foi

designado relator o Ministro Gilmar Mendes. O principal critério apresentado na petição é o

HIERÁRQUICO, de lei ordinária supostamente regulando matéria reservada pela Constituição a lei

complementar, assim como imputando sanção via rito sumário, em desacordo com o processo

previsto em lei complementar e na própria Constituição. Há, portanto, duas supostas

inconstitucionalidades questionadas no bojo da ação.

4.1 – Da Petição Inicial

O Partido Socialista Brasileiro (PSB), partido político com registro definitivo e com

representação nas duas Casas do Congresso Nacional, por meio de seu advogado Leonardo Pinheiro

Lopes, ajuizou, no uso da qualidade que lhe confere o inciso VIII, do art. 103, da Constituição

Federal e com fundamento no permissivo da alínea a, do inciso I, do art. 102 da C.F., uma Ação

Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3592) com o objetivo de retirar do art. 41-A da Lei 9.504/97,

com redação dada pelo art.1º da Lei 9.840/99, a expressão “cassação do registro ou do diploma”,

prevista como sanção aos candidatos que captaram ilicitamente votos.

I – Da legitimidade do Partido Socialista Brasileiro (PSB) para propor ação direta de

inconstitucionalidade.

art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual

e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; (Redação dada

Page 25: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

25

pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela emenda constitucional nº 45, de 2004)

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

II – Segundo o Partido Socialista Brasileiro (PSB), o artigo 41-A da Lei 9.504/97 cria uma

nova hipótese de inelegibilidade violando o disposto no art.14, § 9º, 10 e 11 da Constituição

Federal.

Consoante o entendimento do partido, ao criar uma situação de inelegibilidade por lei

ordinária e não por via de lei complementar, viola-se o disposto no § 9º, do art. 14 da Constituição

Federal, assim como a perda imediata de mandato por captação de sufrágio por aplicação do art. 41-

A fere materialmente os §§ 10 e 11 do referido art.14.

De acordo com o requerente, o art. 22 da Lei Complementar 64/90 em seus incisos XIV e

XV prevê ainda um rito processual para a investigação judicial eleitoral, não tendo previsto a

cassação direta de diploma ou mandato para os condenados nesta ação se o julgamento ocorrer

depois da diplomação (salvo hipótese do art. 14 § 10 da Constituição). Sustenta que a lei ordinária

9.840/99 não poderia ter estendido a sanção para a cassação direta do diploma; declara que não se

pode anular o diploma expedido regularmente, sem que antes seja interposto o recurso contra

expedição do diploma (art. 262 do Código Eleitoral, pelo MPE), ou cassar o mandato, sem que

antes seja proposta a ação constitucional de impugnação de mandato eletivo (art. 14 §§ 10 e 11).

O partido julga não haver qualquer restrição ao exercício do direito de ser votado que

não passe pelos institutos de elegibilidade e da inelegibilidade. A cassação imediata do registro

ou diploma, com a consequente perda do mandato, determinada pelo art. 41-A, não encontra

amparo na Constituição ou na Lei Complementar 64/90, pois a perda do mandato dá-se antes

mesmo do trânsito em julgado da sentença condenatória.

4.2 – Comentários sobre a petição

A argumentação seguiu pelo caminho de definir a expressão questionada do art. 41-A como

“inelegibilidade cominada simples” (sanção de perda de elegibilidade para “essa eleição”), usando

doutrina de 2000 e 2001 e decisões de Tribunais Regionais já superadas/reformadas à época da ADI

pelo TSE, onde o entendimento sobre a questão já era pacífico. Assim, questionou-se frontalmente a

jurisprudência consolidada do TSE no STF, o que acabou por condicionar o conteúdo do acórdão.

Page 26: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

26

Todas as partes que se manifestaram (Relator, Presidência, Congresso Nacional, AGU, PGR) foram

nesse sentido, de reafirmar a jurisprudência consolidada do TSE.

Ao conduzir a fundamentação da ADI quanto às duas supostas inconstitucionalidades (uma

de sanção, outra de processo) para a mera discussão hermenêutica de “elegibilidade” e

“inelegibilidade”, negando ou ignorando aquela vasta jurisprudência do TSE em sentido contrário, o

PSB deixou de questionar mais incisivamente a questão processualística presente sobretudo no

inciso XV do art. 22 da LC 64/90. Como o próprio inciso XIV diferencia a sanção da

inelegibilidade daquela da cassação do registro, ao tratar esses dois incisos sempre em conjunto

abriu-se assim caminho para a interpretação ab-rogativa de ambos pelo STF, como se verá na seção

5, por entender-se que o art. 41-A questionado não implica em nova hipótese de inelegibilidade,

bastando os incisos de I a XIII. Porém, o inciso XV tratava de maneira tácita, pelo seu contexto, não

apenas da inelegibilidade, mas também da cassação de diploma/mandato, já que parte da premissa

de julgamento de representação eleitoral depois das eleições, não mais surtindo efeito cassar

meramente o registro, que era a hipótese do inciso XIV, prévia às eleições.

Em resumo, em vez de rediscutir a temática “cassação de registro ou diploma” x

“inelegibilidade”, a fundamentação poderia ter focado melhor na diferença entre “processo de

cassação de registro” e “processo de cassação de diploma ou mandato”, que foi a linha de raciocínio

utilizada pelo Ministro Eros Grau na Ação Cautelar 509. Isto é, colocar em campos opostos os

incisos XIV e XV, demonstrando que um permite rito sumário e o outro não, uma vez que no

segundo há observância de rito especial estabelecido pela Constituição e pelo Código Eleitoral, com

efeitos vinculantes sobre o processo de aplicação da sanção do art. 41-A da Lei Ordinária 9.504/97.

A inconstitucionalidade estaria portanto não no art. 41-A, mas no afastamento do inciso XV nas

ações de investigação de captação de sufrágio pela Justiça Eleitoral, que vinha aplicando rito

sumário também para cassação de diploma ou mandato.

A partir de tal constatação, pode-se questionar inclusive o instrumento utilizado, a ADI, uma

vez que poderia ser mais adequada uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) para

reafirmar a incidência obrigatória do inciso XV do art. 22 da LC 64/90 para a cassação de

DIPLOMA no caso de subsunção do art. 41-A , por estar embasado sobretudo nos §§ 10 e 11 do art.

14 da Constituição. Para o aparente propósito do PSB, de salvar os mandatos de João e Janete

Capiberibe, essa abordagem no entanto não teria a mesma eficácia que a derrubada do artigo da lei,

pois ambos já estavam cassados em definitivo pelo STF por ocasião do ajuizamento da ADI e a

ADC já não teria serventia em seu caso.

Page 27: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

27

5. Acórdão do STF

Tendo sido distribuída a ação ao relator Ministro Gilmar Mendes, este invocou o art. 12 da

Lei 9.868/99, que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da

ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, para submeter a ADI

diretamente ao Pleno do Tribunal:

art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

Devido ao longo trâmite dos autos entre as várias partes, que não honraram os prazos4, a

liminar restou prejudicada, sendo julgada a ADI apenas em 26/10/2006, mais de um ano depois de

seu ajuizamento.

Todas as partes consultadas seguiram pela fundamentação hermenêutica e jurisprudencial

(inclusive aludindo à ADI 3305 do Partido Liberal, já julgada naquele momento) de que as sanções

de cassação do registro ou do diploma previstas pelo art. 41-A da Lei n° 9.504/97 não

constituem novas hipóteses de inelegibilidade, não havendo portanto o conflito de hierarquia

alegado na ADI. Quanto à questão da apuração das representações de captação de sufrágio, o relator

Gilmar Mendes em seu voto entendeu que a norma secundária invocada pelo art. 41-A, o art. 22 da

LC 64/90, consistiria aqui apenas de seus incisos I a XIII, uma vez que os dois últimos incisos

versariam sobre declaração de inelegibilidade (sanção, não aplicável para a compra de votos).

O Supremo Tribunal Federal julgou, por unanimidade, a ADI como improcedente.

ADI 3592 / DF - DISTRITO FEDERALAÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADERelator(a): Min. GILMAR MENDESJulgamento: 26/10/2006 Órgão Julgador: Tribunal Pleno

Parte(s)REQTE.(S) : PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO - PSBADV.(A/S) : LEONARDO PINHEIRO LOPESREQDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICAADV.(A/S) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃOREQDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL

EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. art. 41-A da Lei n° 9.504/97. Captação de

4 ADI 3592 - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - ANDAMENTOS http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2326256

Page 28: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

28

sufrágio. 2. As sanções de cassação do registro ou do diploma previstas pelo art. 41-A da Lei n° 9.504/97 não constituem novas hipóteses de inelegibilidade. 3. A captação ilícita de sufrágio é apurada por meio de representação processada de acordo com o art. 22, incisos I a XIII, da Lei Complementar n° 64/90, que não se confunde com a ação de investigação judicial eleitoral, nem com a ação de impugnação de mandato eletivo, pois não implica a declaração de inelegibilidade, mas apenas a cassação do registro ou do diploma. 4. A representação para apurar a conduta prevista no art. 41-A da Lei n° 9.504/97 tem o objetivo de resguardar um bem jurídico específico: a vontade do eleitor. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

DecisãoO Tribunal, à unanimidade, julgou improcedente a ação direta, nos termos do voto do Relator. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello, Cezar Peluso e a Senhora Ministra Cármen Lúcia. Falou pelo Ministério Público Federal o Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, Vice-Procurador-Geral da República.Plenário, 26.10.2006.

Outro ponto possivelmente questionável do acórdão é que em seu voto o Ministro Gilmar

Mendes invoca ainda o art. 257 do Código Eleitoral, de que os recursos eleitorais não têm efeito

suspensivo, sem entrar no mérito da avaliação de sua constitucionalidade para o caso de cassação de

mandatos ou diplomas já constituídos.

"Por isso, a decisão fundada no art. 41-A da Lei no 9.504/97, que cassa o registro ou o diploma do candidato, tem eficácia imediata, não incidindo, na hipótese, o que previsto no art. 15 da LC no 64/90, que exige o trânsito em julgado da decisão para a declaração de inelegibilidade do candidato. Os recursos interpostos contra tais decisões são regidos pela regra geral do art. 257 do Código Eleitoral, segundo a qual os recursos eleitorais não tem efeito suspensivo. Assim, não há necessidade de que seja interposto recurso contra a diplomação ou ação de impugnação de mandato eletivo para o fim de cassar o diploma."

Ressalte-se, nesse sentido, que a petição não trazia em sua fundamentação o art. 15 da LC

64/90, mas o processo legal dado pelo inciso XV de seu art. 22, que remete a artigos da

Constituição (em comum, o inciso XV e o artigo 15 só tem o número); segundo, o art. 257 do

Código Eleitoral de 1965, como regra de caráter geral, não poderia ser apresentado como

mandatório, pois cronologicamente, hierarquicamente e em critério de especialidade está em

posição desfavorável. Não se trata aqui de mero "recurso" pelo mandatário com diploma julgado

cassado, mas da forma do processo prevista na Constituição de 1988 e na Lei Complementar 64 de

1990 (o rito a ser seguido pelo Ministério Público para a cassação do diploma ou mandato).

A propósito, para melhor exemplificação, o recurso eleitoral contra o casal Capiberibe

impetrado pelo PMDB no TSE em 2003 (após o TRE inocentá-los) é que não teve efeito

suspensivo, conforme preceitua aquela norma do Código Eleitoral. De tal forma, exerceram seus

mandatos até a cassação pelo TSE em abril de 2004 e, com a medida cautelar deferida pelo STF

com base no periculum in mora, até a decisão definitiva pelo Tribunal Pleno em setembro de 2005.

Page 29: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

29

Mencione-se ainda a longa exposição teleológica feita pelo relator com base em doutrina

alemã a respeito dos princípios expressos no art. 14 da Constituição Federal, de que sua preservação

exige medidas do Estado para oferecimento de garantias ao eleitor e ao próprio processo

democrático: estaria implícita no art. 14 caput o princípio fundamental da liberdade do voto, de que

voto secreto é inseparável da ideia de voto livre. Com base no arrazoado, coloca a lisura do pleito e

a vontade do eleitor como valores importantes a proteger, de imediato, distinguindo a apuração de

compra de votos da investigação judicial eleitoral comum.

"O rito sumário previsto nos incisos I a XIII do art. 22 da LC no 64/90, assim como a possibilidade de execução imediata da decisão que cassa o registro ou o diploma do candidato que pratica captação ilícita de sufrágio, traduzem salutar inovação em nossa legislação, pois permitem a rápida apuração e consequente punição daqueles que atentam contra a incolumidade da vontade do eleitor."

5.1 – Estrutura do Acórdão

Primeiramente, além de detalhar para o Pleno do que se trata a petição da ADI 3592, o

relator procura fundamentar quais são os objetivos do art. 41-A. Trazendo a defesa exposta pelo

Presidente da República, baseada na doutrina e na jurisprudência eleitoral, relata que:

“A intenção desejada pela norma guerreada é a de que o processo eleitoral transcorra da forma mais correta possível, ou seja, que os candidatos captem o voto dos eleitores por meio das propagandas eleitorais, dos debates, das divulgações das propostas, etc.; e não por meio de subterfúgios que quebrem a lisura da disputa e que torne a vontade dos eleitores viciada. (...) Nesse sentido, cumpre destacar, ainda, que a cassação prevista no dispositivo questionado não configura hipótese de inelegibilidade. Pois, conforme acima afirmado, não é verdadeiro concluir que quaisquer circunstâncias que impliquem na impossibilidade de ser votado configura imperiosamente na hipótese inelegibilidade. (...) De fato o art. 41-A comina na pena de cassação de mandato, e estabelece sanção de natureza pecuniária, que, em ambas as hipóteses, não configuram inelegibilidade, uma vez que o apenado continua na plenitude do gozo de seus direitos políticos e, por conseqüência, pode disputar quaisquer eleições subseqüentes.”

Em seguida, relata as disposições do Congresso Nacional, nas quais sustenta que:

“A norma do art. 41-A não criou situação nova inelegibilidade. A menção feita no art. 22 da Lei Complementar nº 64 do ano de 1990 diz respeito unicamente à esfera procedimental, e portanto não enseja confusão meritória entre a cassação de registro ou diploma por captação de sufrágio e a investigação judicial eleitoral.”

Apresenta ainda o parecer da Advocacia-Geral da União, que manifestou-se pela

improcedência do pedido formulado (fls 202-217), e que a Procuradoria-Geral da República é pela

Page 30: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

30

constitucionalidade do dispositivo impugnado (fls 219-226).

O relator cita também expressamente no acórdão a jurisprudência do TSE a respeito:

“Com o advento da Lei 9.840/99, que introduziu o artigo 41-A da Lei 9.504/97, surgiram na doutrina e na jurisprudência de alguns tribunais eleitorais teses sobre a inconstitucionalidade desse dispositivo, por se tratar de nova hipótese de inelegibilidade criada por lei ordinária e não por lei complementar, como exige o art. 14, §9o da Constituição. Atualmente, todavia, o Tribunal Superior Eleitoral já possui jurisprudência consolidada no sentido de que as sanções da cassação de registro ou de diploma, prevista por diversos dispositivos da Lei das Eleições não constituem novas hipóteses inelegibilidade. Ou seja, a sanção da cassação de registro ou do diploma não se confunde com a declaração de inelegibilidade diante da ocorrência de algumas das hipóteses definidas no art. 14 da Constituição e na Lei Complementar nº 64/90.”

Reitera ainda trechos do parecer do Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando

Barros e Silva de Souza, para reforçar a diferença entre inelegibilidade e óbices à participação em

uma eleição, como por exemplo em:

“Com efeito, o Ministro Moreira Alves destaca que “estas hipóteses se caracterizam como impedimentos que são afastados por quem preencha os pressupostos de elegibilidade, lhe obstam concorrer as eleições ou – se supervenientes ao registro ou de natureza constitucional – servem de fundamento à impugnação de sua diplomação, se eleito.” Verifica-se, portanto, que distintas são as situações de inelegibilidade e de captação ilícita de sufrágio, porquanto esta impõe uma sanção que decorre de prática eleitoral, enquanto aquela impõe um impedimento, um obstáculo que não se caracteriza como sanção, embora dela possa resultar.”

O relator apresenta também um recente julgamento, da ADI 3305 em 13/06/2006, relator

Ministro Eros Grau, em que o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 77

da Lei 9.504/97, entendendo que tal dispositivo, ao cominar a sanção de cassação do registro da

candidatura, não trata de nova hipótese de inelegibilidade.

O relator cita depois acórdãos do TSE sobre investigação de compra de votos frente aos

incisos XIV e XV do art. 22 da LC 64/90, com o entendimento de que tais incisos não se aplicariam

à apuração da conduta descrita no art. 41-A da Lei 9.504/97. Faz um arrazoado doutrinário sobre a

necessidade de proteção imediata à liberdade do voto e acrescenta que:

“Os resultados obtidos pela aplicação do art. 41-A da Lei n. 9.504/97 pela Justiça Eleitoral em todo país têm demonstrado a importância de mecanismos processuais céleres para a proteção eficaz da liberdade do eleitor, o que só tem contribuído para o aperfeiçoamento da democracia.”

E conclui com seu voto pela improcedência da ADI, no que é seguido em unanimidade pelos

demais ministros presentes.

Page 31: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

31

6. Conclusões

A Lei Eleitoral (Lei 9.504/97), cujo artigo questionado foi incluído pela Lei 9.840/99, é uma

lei ordinária, embora especializada, que em função do princípio adotado pelo nosso ordenamento

jurídico de superioridade da Constituição, bem como da característica adotada desta ser escrita e

rígida, está submetida a controle de constitucionalidade. Deve a lei infraconstitucional, portanto,

respeitar os princípios e regras traçados na Constituição Federal, bem como o processo

constitucionalmente previsto para a sua formação. A lei infraconstitucional desconforme, tanto do

ponto de vista formal quanto do material, deverá ser declarada inválida e excluída do ordenamento,

no todo ou em parte, dependendo do caso, pois a Constituição é norma hierarquicamente superior às

demais normas do ordenamento jurídico brasileiro.

A Constituição brasileira outorgou ao Supremo Tribunal Federal a competência para

fiscalizar se as normas infraconstitucionais contrariam ou não o texto constitucional. No caso

analisado, o controle de constitucionalidade realizado pelo STF foi feito via Ação Direta de

Inconstitucionalidade (ADI), utilizada nos casos em que as leis ou os atos normativos primários

estão desconformes à Carta Magna. A carta de 1988 ampliou o rol de legitimados a instaurar o

controle de constitucionalidade via ADI, que antes era monopólio do Procurador-Geral da

República; dentre os legitimados estão os partidos políticos com representação no Congresso

Nacional (Constituição Federal, art.103, VIII).

O Partido Socialista Brasileiro por entender que o art. 41-A da Lei 9.504/97, que aplica a

sanção de cassação do registro ou do diploma, nos casos de captação ilegal de sufrágio, criou nova

hipótese de inelegibilidade – tendo em vista que o estabelecimento de novas hipóteses de

inelegibilidade somente é possível por Lei Complementar5 (CF/88, art. 14, § 9) –, sendo ele um dos

legitimados, propôs a ADI, para ab-rogar não a lei 9.504/97, mas para invalidar somente trecho do

art. 41-A da referida lei, a saber, a expressão “cassação do registro ou do diploma”. A disposição

prevista no art. 14, § 9 implica em norma geral exclusiva, pois exclui do ordenamento outras

hipóteses de estabelecimento de inelegibilidade que não sejam por meio de lei complementar.

Da recepção do pedido de declaração de inconstitucionalidade, coube ao Ministro Gilmar

Mendes, relator do caso, pedir informações aos órgãos ou às autoridades das quais emanou a lei ou

o ato normativo impugnado, no caso o Presidente da República e o Congresso Nacional.

Manifestaram-se também a Advocacia-Geral da União e Procurador-Geral da República. Todos

5 A diferença material entre lei ordinária e lei complementar é que esta aborda matérias já previstas na Constituição Federal, enquanto aquela trata matérias que nela não foram abordadas. Formalmente, a lei complementar é aprovada por maioria absoluta e a lei ordinária por maioria simples.

Page 32: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

32

julgaram o pedido improcedente por entenderem que a cassação de mandato prevista no art. 41-A da

Lei 9.504/97 não configura nova hipótese de inelegibilidade, uma vez que o apenado continua a

gozar plenamente de seus direitos políticos, podendo disputar as eleições subsequentes. Nesse

sentido não haveria um conflito entre a norma ordinária e a constitucional.

Desconstruindo os argumentos do PSB, ressalvas feitas no trabalho à parte, baseado nas

normas do ordenamento jurídico brasileiro, o raciocínio jurídico do STF aplicado ao caso julgou a

ação direta de inconstitucionalidade improcedente, por entender que o dispositivo impugnado estava

conforme a finalidade da lei constitucional, cujo interesse de valor – que não pode ser

compreendido isoladamente, mas sim como parte indissociável do ordenamento jurídico como um

todo – é o de garantir a lisura do processo eleitoral, impedindo que os candidatos a cargos eleitorais

interferiram ilicitamente na vontade livre de escolha do eleitor.

A proteção à vontade do eleitor, coibindo subterfúgios como “doação, oferecimento,

promessa ou entrega de bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive, emprego

ou função pública” não pretendia, portanto, criar hipótese de inelegibilidade, mas proibir conduta

“desde o dia do registro da candidatura até o dia da eleição”; deduz-se daí que o objetivo do

dispositivo efetivamente é proteger o período eleitoral em questão, colaborando para a tentativa de

recuperar-se o sentido etimológico de “candidato”: aquele que não tem máculas, cândido, ilibado.

De forma geral, analisando os casos concretos, podemos perceber que esse instituto é

benéfico para as eleições brasileiras, já que por um longo tempo estas foram marcadas por

corrupções, fraudes, uso ilegal da máquina estatal e abuso do poder econômico, onde havia

exploração das carências e da miséria do povo. Permitia-se que maus políticos permanecessem no

poder através do uso das necessidades de pessoas, que não tinham condição de bem discernir a

importância do voto.

Cabe ressaltar que esta lei é a primeira lei de iniciativa popular aprovada no Brasil, tendo

criado instrumento para reforçar a eficácia do combate à corrupção eleitoral. Esta lei foi apresentada

na Câmara de Deputados, com mais de um milhão de assinaturas com o apoio de várias instituições

como a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil e a Ordem de Advogados do Brasil.

Por outro lado, como não há lei perfeita, não se olvidem as hipóteses de uso oblíquo da lei

por oportunistas, judicializando as eleições com representações intempestivas ou pouco sólidas, em

um denuncismo barato que vise tirar proveito do processo célere para macular a imagem de

adversários, instrumentalizando o interesse público em seu próprio. A flexibilidade hermenêutica da

lei implica na estrita observância da necessidade de provas robustas e da presença dos elementos

objetivo e subjetivo na constatação do ilícito, frente aos riscos de interpretações literais quanto ao

que pode ser enquadrado como “bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza”.

Page 33: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

33

Além da questão do crivo sobre a validade das provas apresentadas, é prudente refrisar a

importância da temperança na subsunção da lei, observando-se os princípios da presunção da

inocência, da razoabilidade, da proporcionalidade, da ampla defesa e do devido processo legal,

mesmo que submetidos a rito abreviado, lembrando da metáfora do Ministro Celso de Mello de

tratar-se de “terreno movediço”. Ou que, como na anedota de Fernando Sabino, talvez a preferida

dos rábulas chicaneiros, “dura lex sed latex”.

Ressalte-se também que, com a ab-rogação do inciso XV do art. 22 da LC 64/90 pelo

acórdão da ADI 3592 para a hipótese da compra de votos, o rito sumário de apuração de

representações efetuadas após as eleições torna-se fértil terreno para os chamados “tapetões”, tendo

o poder de derrubar diplomas e mandatos via denúncias feitas por interessados diretos no cargo,

exacerbando a judicialização da política e criando graves riscos à soberania do voto popular, em vez

de defendê-la. O terceiro turno é na Justiça Eleitoral?

Para o caso de cassação de registro, antes da eleição, o próprio art. 22 já falava em execução

imediata pelo tribunal eleitoral, uma vez que ainda não há mandatário escolhido pelo povo e todos

os candidatos estariam em situação de relativa igualdade. Discussões sobre a “justiça”

(axiologicamente falando) ou não dessa situação, de rito sumário acarretando “tapetão” preventivo,

necessitaria de discussão na esfera legislativa, uma vez que se trata de norma válida e

constitucional. Há aqui no entanto uma diferença política fundamental: o eleitor tem o poder de

punir um “interessado direto na cassação” nas urnas, o que não é o caso de decisões da Justiça

Eleitoral que cassaram o primeiro colocado e empossaram em seu lugar o segundo.

Enfim, fica a ponderação de até que ponto a lei pode se tornar um risco à lisura das eleições

se aplicada sem temperança, como parece ser o caso da cassação do casal Capiberibe em 2005 pelo

TSE. Remontamos assim ao questionamento filosófico, ou ideológico, de nossa tradição jurídica

romano-germânica, influenciada pelo Constitucionalismo e cada vez mais por instrumentos da

Common Law: a ponderação dos valores de certeza e justiça, de técnica e equidade, da delegação de

maior discricionariedade aos juízes.

O argumento apontado pelo relator Ministro Carlos Velloso no processo no TSE, de que

haveria nos autos provas suficientemente robustas a atestar a compra de votos pelos Capiberibe (os

testemunhos de duas eleitoras que afirmavam ter recebido R$26,00 cada uma), assim como a não

apreciação do mérito pelos Ministros do STF no julgamento do recurso, mantendo a cassação pelo

TSE, deixou a impressão que nossa Justiça ficou anacrônica. Privilegia, em matéria deixada

flagrantemente flexível pelo legislador, uma suposta técnica positivista, de preciosismos

hermenêuticos gramaticais: um positivismo instrumentalizado pelo Judiciário, às avessas?

Dois dias depois da cassação de João e Janete Capiberibe, pela suposta compra de votos

Page 34: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

34

totalizando R$ 52,00, baseada em prova testemunhal, após Recurso Eleitoral impetrado por parte

interessada, o PMDB/AP, o mesmo TSE, com o mesmo relator Ministro Carlos Velloso, absolveu o

governador reeleito do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB/DF), da acusação de abuso de poder

econômico em sua campanha à reeleição, também em 2002, em processo movido pelo Ministério

Público Eleitoral. De acordo com a denúncia do MPE, o governador teria usado a máquina

administrativa e R$ 28 milhões dos cofres públicos na campanha. Segundo o Vice-Procurador-Geral

Eleitoral, Roberto Gurgel, houve “escandaloso abuso de autoridade” por parte do governador. O

entendimento do tribunal foi que as provas apresentadas pelo Ministério Público eram apenas

indícios e não poderiam servir para a cassação do mandato.6

6 Após cassar Capiberibe, TSE absolve Roriz - Correio Forense, 30/04/2004http://www.correioforense.com.br/noticia/idnoticia/1947/titulo/Apos_cassar_Capiberibe_TSE_absolve_Roriz.html

Page 35: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

35

7. Desdobramentos do Caso

Esta seção adicional vem trazer alguns fatos juridicamente relevantes que se sucederam após

o trânsito em julgado do acórdão da ADI 3592, em 09/02/2007, que guardam relação com o caso

estudado no trabalho, inclusive modificando suas esferas de validade e eficácia.

Primeiramente, uma curiosidade: lei superveniente durante a ADI, já mencionada no texto,

modificou o art. 26 da Lei Eleitoral (Lei 9.504/97), que trata dos gastos de campanha. A Lei 11.300,

de 10 de Maio de 2006, dispõe sobre propaganda, financiamento e prestação de contas das despesas

com campanhas eleitorais, conhecida também como minirreforma eleitoral; trocou a exemplificação

de gastos do art. 26 por enumeração, modificou comícios, revogou a permissão de gastos com

cachês de artistas e animadores de eventos, assim como excluiu os brindes. O endurecimento do art.

26 estendeu a esfera do ilícito para a incidência do artigo de captação de sufrágio, uma vez que este

exclui de sua eficácia os gastos permitidos. Distribuir brindes, não sendo mais permitido como

gasto de campanha, pode ser enquadrado como compra de voto, trazendo novamente a questão da

razoabilidade e temperança na aplicação da lei, por considerar bens e vantagens pessoais “de

qualquer natureza”.

Outros questionamentos variados de constitucionalidade da lei da compra de voto e da

cassação de registro ou diploma em geral continuaram a chegar ao TSE – derrubados agora também

pela jurisprudência do STF na ADI 3592 sobre a distinção entre inelegibilidade e cassação de

registro ou diploma, como por exemplo:

“[...]. 5. Não há falar em inconstitucionalidade do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, tese, inclusive, rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal no recente julgamento da Adin nº 3.592, relator Ministro Gilmar Mendes. [...].”(Ac. de 21.11.2006 no AgRgREspe nº 25.258, rel. Min. Caputo Bastos.)7

Em 29/09/2009 entrou em vigor a Lei 12.034/2009, conhecida também como a Lei contra

Fraudes no Voto Eletrônico, embora não verse apenas sobre esse tema, tratando-se mais claramente

de uma segunda minirreforma eleitoral, alterando a Lei 9.096, de 19 de setembro de 1995 - Lei dos

Partidos Políticos; a Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições,

e a Lei 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral. Entre suas modificações mais relevantes,

está a inclusão de várias normas de natureza interpretativa, como a previsão de parágrafos no artigo

41-A da Lei 9504/97, que é o artigo sobre a definição de captação de sufrágio e sua pena de

cassação de registro ou diploma; ver abaixo. O §1o visa tipificar melhor a conduta ilícita, o §2o

7 http://temasselecionados.tse.gov.br/temas/captacao-de-sufragio/constitucionalidade-do-art.-41-a-da-lei-9.504-97

Page 36: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

36

estende a aplicação das sanções a ameaças e atos de violência (embora não sejam “compra” de voto,

são outras formas de captação de sufrágio), o §3o estabelece prazo limite para representação contra

as condutas vedadas no caput até a data da diplomação e o §4o estabelece prazo para recurso contra

decisões proferidas com base no artigo 41-A (decisões através de rito sumário, conforme discutido

amplamente). De forma geral são boas modificações que visam melhorar a aplicação do artigo.

“Art. 41-A. ...................................................................... § 1o Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.§ 2o As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. § 3o A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. § 4o O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.” (NR)

Ainda em 2009, antes da minirreforma eleitoral, fora publicada a Lei Complementar 131, de

27 de Maio de 2009, conhecida como Lei da Transparência, ou “Lei Capiberibe”, de autoria do

senador cassado em 2004 João Capiberibe, do PSB/AP. Preconiza a transparência dos gastos

públicos, que devem ser publicados na internet, em tempo real, para acesso aos cidadãos; sua

inspiração tem origem em época em que Capiberibe era prefeito de Macapá, em que instituiu mural

público de gastos da prefeitura, experiência depois estendida ao Estado do Amapá, quando

governador, com a transição do mural para um portal eletrônico, cuja ideia posteriormente foi

adotada pelo Governo Federal. O projeto de lei visava estender a ideia para os demais Estados e

Municípios da Federação, o que finalmente se concretizou em 2009 com a LC 131, mesmo após a

cassação do senador em 2004 sob suspeita de compra de votos, baseado apenas em prova

testemunhal de duas eleitoras.

De todos os fatos posteriores ao acórdão que com ele guardem relação, talvez o mais

relevante seja a promulgação da Lei Complementar 135/2010, a Lei da Ficha Limpa, criada também

por iniciativa popular, com o objetivo de proteger a probidade administrativa e a moralidade no

exercício do mandato. Elenca novas hipóteses de inelegibilidade e seus prazos de cessação, via

modificação da LC 64/90, como por exemplo negar registro aos candidatos condenados em segunda

instância. Após ampla polêmica sobre sua validade nas eleições de 2010, o STF decidiu pela

aplicação do Art. 16 da Constituição Federal à mesma, ou seja, que não pode alterar o processo

eleitoral lei editada a menos de um ano das eleições. Diversos políticos tiveram suas candidaturas

barradas pela Justiça Eleitoral antes da decisão do STF, outros concorreram com liminar judicial;

com o afastamento de sua aplicação nas eleições de 2010, os candidatos ditos “Fichas-Sujas”

pleiteiam sua condução aos cargos, muitos dos quais já empossados.

Page 37: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

37

Quanto à ADI 3592 e seu acórdão, o fato mais importante é a inclusão de alínea específica

no art. 1o inciso I da LC 64/90 transformando a captação ilícita de sufrágio em hipótese de

inelegibilidade, derrubando toda a jurisprudência do Art. 41-A da Lei Eleitoral acerca de sua sanção

exclusivamente de cassação de registro ou diploma. A partir da Ficha Limpa, passa também a ser

hipótese expressa de inelegibilidade, via Lei Complementar, como exige a Constituição.

j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)

De forma geral, a Ficha Limpa suscitou grande polêmica sobre seu possível efeito retroativo,

o que seria inconstitucional se for entendida como pena ao candidato, o que ainda perdura quanto à

sua eficácia para as próximas eleições, em 2012. Outra discussão que retoma força é aquela se

inelegibilidade é realmente um tipo de pena, ou sanção de outra natureza.

No caso da captação de sufrágio, a nova lei parece criar inelegibilidade temerária,

lembrando do rito sumário de aplicação do Art. 41-A. E quem foi condenado por captação de

sufrágio anteriormente, como o casal Capiberibe, é “Ficha Suja”? Mesmo que decisão do Supremo

Tribunal Federal tivesse afirmado que não configurava hipótese de inelegibilidade, como na ADI

3592, razão pela qual muitos recursos foram julgados improcedentes, impedindo a aplicação de rito

menos sumário aos condenados com a cassação de seus mandatos, diplomas ou registros?

Podendo retroagir, não seria uma aplicação de nova sanção a quem já havia sido sancionado

pelo Art. 41-A, violando o princípio da coisa julgada? Algumas hipóteses de inelegibilidade se

devem a condenações realmente graves, mas como proceder diante de condenações leves, muito

subjetivas? A linha que separa um “Ficha Limpa” de um “Ficha Suja” pode ser muito tênue. Não

seria o processo de apuração de captação de sufrágio uma forma de sujar a ficha dos outros?

Sui generis mesmo é a situação do casal Capiberibe, que teve aplicada contra si a Lei da

Ficha Limpa em 2010 pelo TSE, invocado por seus adversários, tendo seus nomes excluídos da lista

de eleitos do Amapá (embora tenham sido escolhidos pela vontade popular), por conta daquele

processo questionável de apuração de captação de sufrágio da eleição de 2002. Não fosse a decisão

final do Supremo no voto do Ministro Luiz Fux, o mesmo PMDB/AP que representou contra eles,

se beneficiando da cassação de seu mandato à época, novamente seria conduzido aos cargos, pelo

mesmo caso, só que agora pela inelegibilidade prevista na Lei da Ficha Limpa. Trata-se de um caso

exemplar sobre as complexas nuances que o Direito comporta.

Page 38: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

38

“Uma das formas mais graves de afronta à Justiça, como valor fundamental da

humanidade, é a utilização desonesta dos meios institucionais implantados para a

promoção da Justiça, utilizando-os para a satisfação de interesses essencialmente injustos.

Quando isso ocorre, a própria idéia de Justiça se corrompe, porque se confunde com

simulação, e os órgãos que se pressupõe serem guardiões da Justiça se desmoralizam,

porque já ninguém acredita em sua autenticidade”.

Dalmo de Abreu Dallari

Page 39: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

39

8. Bibliografia

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Maria Celeste Leite

Cordeiro dos Santos. 6ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1995.

CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. Direito Eleitoral Brasileiro. Doutrina.

Jurisprudência e Legislação. 2ª edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Del

Rey. Pág. 1013

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF:

Senado Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui

%C3%A7ao.htm. Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Lei Complementar nº. 64, de 18 de maio de 1990. Estabelece, de acordo com o art. 14,

§ 9º da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, prazos de cessação, e determina outras

providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp64.htm>,

Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Lei Complementar nº. 135, de 04 de junho de 2010. Altera a Lei Complementar no 64,

de 18 de maio de 1990, que estabelece, de acordo com o § 9o do art. 14 da Constituição Federal,

casos de inelegibilidade, prazos de cessação e determina outras providências, para incluir

hipóteses de inelegibilidade que visam a proteger a probidade administrativa e a moralidade no

exercício do mandato. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp135.htm>, Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Lei nº. 4.737, de 15 de julho de 1994. Institui o Código Eleitoral. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L4737.htm>, Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Lei nº. 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9504.htm>, Acesso em: 30 de maio de

2011.

Page 40: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

40

_______. Lei nº. 9.840, de 28 de setembro de 1999. Altera dispositivos da Lei no 9.504, de 30

de setembro de 1997, e da Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9840.htm>, Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Lei nº. 9.868, de 10 de novembro de 1999. Dispõe sobre o processo e julgamento da

ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o

Supremo Tribunal Federal. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9868.htm>, Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Lei nº. 12.034, de 29 de setembro de 2009. Altera as Leis nos 9.096, de 19 de

setembro de 1995 - Lei dos Partidos Políticos, 9.504, de 30 de setembro de 1997, que estabelece

normas para as eleições, e 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12034.htm>, Acesso em: 30

de maio de 2011.

_______. Supremo Tribunal Federal. Ação Cautelar 509 Amapá. Decisão Monocrática. Relator:

Ministro Eros Grau. 17 de novembro de 2004. Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?

numero=509&classe=AC&codigoClasse=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M>.

Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3592-4 Distrito

Federal. Petição Inicial. Requerente: Partido Socialista Brasileiro. 27 de setembro de 2005.

Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEle

tronico.jsf?seqobjetoincidente=2326256>. Acesso em: 17 de maio de 2011.

_______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3592-4 Distrito

Federal. Acórdão. Relator: Eros Grau. 13 de setembro de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=392168>. Acesso em:

30 de maio de 2011.

_______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 3305-1 Distrito

Page 41: Captação de Sufrágio: Entre a Cassação e a Inelegibilidade

41

Federal. Acórdão. Relator: Ministro Gilmar Mendes. 26 de outubro de 2006. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=402370>. Acesso em:

17 de maio de 2011.

_______. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral nº 21264 – Macapá – Amapá.

Acórdão. Relator: Ministro Carlos Mário Da Silva Velloso. 27 de abril de 2004. Disponível em:

<http://www.tse.gov.br/sadJudSjur/pesquisa/actionBRSSearch.do?

configName=SJUT&toc=false&sectionServer=TSE&sectionNameString=avancado&livre=@D

OCN=000019291>. Acesso em: 30 de maio de 2011.

_______. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral nº 36335 (43820-

51.2009.6.00.0000) – Classe 32 – Sena Madureira – Acre. Acórdão. Relator: Ministro Aldir

Passarinho Júnior. 15 de fevereiro de 2011. Disponível em:

<http://www.tse.gov.br/internet/jurisprudencia/inteiro_teor.htm>. Acesso em: 30 de maio de

2011.

_______. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Extraordinário nº 748 – Belém – Pará. Acórdão.

Relator: Ministro Luiz Carlos Lopes Madeira. 24 de maio de 2005. Disponível em:

<http://www.tse.gov.br/sadJudSjur/pesquisa/actionBRSSearch.do?

configName=SJUT&toc=false&sectionServer=TSE&sectionNameString=avancado&livre=@D

OCN=000023886>. Acesso em: 30 de maio de 2011.