Caracterizacao Das Capacidades Motoras

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro Departamento de Desporto Licenciatura em Educação Física e Desporto Treino das Capacidades Motoras I 2º Ano Caracterização Das Capacidades Motoras Documento de circulação interna Francisco Saavedra Vila Real, Fevereiro de 2005

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Departamento de Desporto

Licenciatura em Educação Física e Desporto

Treino das Capacidades Motoras I 2º Ano

Caracterização

Das Capacidades Motoras

Documento de circulação interna

Francisco Saavedra

Vila Real, Fevereiro de 2005

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1. CARACTERIZAÇÃO DAS CAPACIDADES MOTORAS

O desenvolvimento da capacidade de rendimento, está intimamente relacionado com

o crescimento e desenvolvimento do homem. Deste modo, as diferentes etapas de formação

desportiva (iniciação, orientação e especialização), devem estar estruturadas de forma a

permitirem o seu integral e harmonioso desenvolvimento.

As capacidades motoras, baseiam-se em pré - disposições genéticas e

desenvolvem-se através do treino. Não são qualidades do movimento, mas sim

pressupostos para que ele exista (Grosser, 1981).

As Capacidades Motoras indispensáveis para a execução das acções motoras

compreendem essencialmente dois tipos: as quantitativas (condicionais) e as qualitativas

(coordenativas).

As capacidades condicionais são essencialmente determinadas pelos mecanismos

que conduzem à obtenção e transformação de energia, isto é, os processos metabólicos nos

músculos e nos sistemas orgânicos. Portanto nelas predomina a condição física. São

essencialmente determinadas pelas componentes energéticas, por isso têm carácter

quantitativo. São: resistência e força.

Nas capacidades coordenativas predomina a coordenação. Relacionam-se com os

processos de controlo do movimento dependentes do sistema nervoso central, por isso têm

carácter qualitativo. Estas capacidades “permitem que o atleta consiga dominar de forma

segura e económica as acções motoras, tanto em situações previsíveis (estereótipos), como

imprevisíveis (adaptação). É através destas capacidades que o atleta consegue aprender

relativamente depressa gestos motores, bem como regular eficazmente a tensão muscular

no tempo e no espaço”.

As suas formas de manifestação são: equilíbrio, observação, controlo motor,

reacção motora, antecipação, expressão motora, representação, ritmo, diferenciação

cinestésica, coordenação e orientação espacial.

Há ainda quem considere que algumas capacidades dependem das duas dimensões

e por isso as designam por coordenativo/condicionais: velocidade, flexibilidade e

destreza.

Ao nível de desenvolvimento das capacidades motoras chama-se condição física.

Esta pode ser melhorada e desenvolvida através do treino ou preparação física. O seu

desenvolvimento é a garantia para a aprendizagem e para a realização eficaz dos

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movimentos desportivos, pois intervém em maior ou menor grau em todas as

actividades físicas, individuais ou colectivas.

Figura 1 – Capacidades motoras (adaptado de Grosser, 1981).

1.1. As capacidades condicionais e coordenativas no desporto

Capacidades Condicionais

Essencialmente a força e a resistência e as suas formas especificas de

manifestação. Determinam a quantidade de um movimento, são caracterizadas pelos

processos de obtenção e transformação de energia.

1.1.1. Força

Força é a energia que permite deslocar objectos e vencer resistências externas, ou

mesmo as do nosso próprio corpo, independentemente do factor tempo. Permite, assim,

superar ou contrariar as resistências ao movimento, com base em forças internas

(produzidas por contracção muscular, acções dos tendões e ligamentos) e forças externas

(gravidade, atrito, oposição).

Em síntese, força é a capacidade de reagir contra uma resistência através dos

processos metabólicos e de enervação da estrutura muscular.

COORDENATIVO CONDICIONAIS

(determinadas pelos factores energéticos e pelo SNC)

Força máxima; Força rápida; Resistência.

Equilíbrio; Precisão; Ritmo; Fluidez; Encadeamento; Constância do

movimento.

Velocidade de reacção; Força velocidade; Velocidade cíclica

máx.; Velocidade Acíclica max.; Flexibilidade.

Resistência aeróbia; Resistência anaeróbia.

Destreza (agilidade e habilidade) = capacidade de condução e de

adaptação.

CAPACIDADES MOTORAS

CONDICIONAIS (determinadas quantitativamente pelo

factores energéticos)

COORDENATIVAS (determinadas qualitativamente pela

condução dos estímulos)

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Para além de ser necessária para o movimento, a força aplica-se também:

• Na “resistência muscular”, que mais não é do que o uso prolongado desta

capacidade;

• Na “resistência à fadiga”, que depende fundamentalmente da quantidade de

sangue bombeado pelo coração em cada contracção sistólica;

• Na “velocidade”, que não seria possível sem níveis de força adequados.

A força tem como variantes:

• A força máxima;

• A força rápida ou potência;

• A força resistente.

Pode ainda ser:

• Geral, quando é visada a potenciação de todos os grupos musculares;

• Específica, se pretendemos desenvolver um ou vários grupos musculares

característicos dos gestos desportivos de uma determinada modalidade.

1.1.1.1. Treino da força

Para que esta capacidade seja correctamente treinada é preciso saber que a fibra

muscular se contrai de acordo com a «lei do tudo ou nada», isto é, ou não se contrai, ou,

quando o faz, é sempre no limite máximo das suas possibilidades. Por isso o treino desta

faculdade neuromuscular tem de visar a estimulação dos grupos musculares perto dos seus

limites máximos e tendo em consideração os seguintes princípios: (i) esforços de curta

duração com cargas elevadas; (ii) intervalos prolongados (recuperação total); (iii) número

pequeno de repetições.

Este é o método que permite estimular o maior número de unidades motoras (sendo

cada uma destas o conjunto que integra um determinado número de fibras musculares e o

neurónio sobre o qual este actua) e, consequentemente, um maior desenvolvimento da

força.

No treino da força utilizam-se três tipos de cargas:

• Carga máxima – onde só se consegue uma ou duas repetições e todas as

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fibras musculares são solicitadas, sendo o factor preponderante a

resistência máxima a vencer;

• Carga sub máxima com muitas repetições – procura-se o nível de

resistência de força (quando as fibras utilizadas se fatigam são substituídas

por outras, até que todas estejam cansadas), sendo os factores

preponderantes o volume e a duração;

• Carga sub máxima com velocidade máxima – a velocidade vai solicitar o

trabalho de todas as fibras, sendo o factor preponderante a velocidade de

execução do movimento.

De acordo com o trabalho muscular, a força pode revestir-se essencialmente de

duas formas:

• Trabalho isotónico, ou contracção dinâmica (lançamentos, ciclismo, etc);

existe movimento durante a produção de energia muscular. É o mais vulgar e

pode apresentar dois tipos distintos de contracção:

o Concêntrica – quando o esforço muscular vence a resistência. Por

exemplo, quando, em suspensão numa barra, se faz flexão de braços;

o Excêntrica – quando a resistência vence a força muscular empregue.

Por exemplo, quando em suspensão numa barra, de braços flectidos e

queixo ao nível da barra, somos puxados para baixo por uma força

que não conseguimos vencer, e baixamos lentamente.

• Trabalho isométrico, ou contracção estática (luta, cristo nas argolas, etc);

trabalho muscular sem produção de movimento: o músculo não altera o

comprimento e o trabalho produzido é nulo, a resistência e a contracção são

iguais, portanto não há movimento;

Assim, sendo o objectivo o aumento da força física do atleta, é indispensável utilizar

todos os movimentos capazes de aumentar o número de fibras em regime de esforço,

provocando uma múltipla contracção, e também aumentar a frequência das transmissões de

impulsos nervosos às fibras musculares, com a finalidade de as manter em constante

tensão. É para alcançar estes objectivos que se utiliza o sistema de repetições e rapidez no

exercício.

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1.1.1.2. Os testes de condição física

Os testes de condição física que podem ser usados nas aulas são:

1. Força rápida de pernas – sem corrida de balanço, salto horizontal a pés juntos,

com a extensão do corpo e a ajuda do movimento dos braços;

2. Força rápida de braços – lançamento de uma bola à distância máxima, em pé, em

posição fixa;

3. Força resistente de braços (1) – deitado de costas no solo e agarrando com as

mãos uma barra colocada ao alcance dos braços estendidos, executar o maior

número possível de flexões de braços em 30 segundos;

4. Força resistente de braços (2) – deitado facialmente no solo, executar o maior

número de flexões de braços em 30 segundos, tendo as mãos apoiadas no

banco sueco ou no plinto;

5. Força resistente abdominal – deitado de costas no solo e de pernas flectidas e

unidas, fazer o maior número possível de flexões do tronco em 30 segundos;

6. Força resistente dorsal – deitado de frente ou facialmente no solo, com os pés

presos no espaldar, realizar o maior número possível de elevações do tronco em

30 segundos;

7. Força resistente de pernas – em 30 segundos, dar o maior número possível de

saltos a pés juntos, de frente, saltitando entre cada salto sobre um banco sueco.

1.1.2. Resistência

A resistência é a capacidade de um desportista resistir física e psiquicamente à

fadiga. É uma capacidade revelada pelo sistema muscular que permite realizar esforços de

longa duração, resistindo à fadiga e permitindo uma rápida recuperação depois dos

esforços, evitando a perda de eficácia motora. É pela adaptação do sistema cardio-pulmonar

que se torna possível vencer a fadiga. Esta pode ser considerada um limite para lá do qual o

rendimento decresce ou pára totalmente. Uma vez que o esforço leva à fadiga, devem

distinguir-se variantes destes dois conceitos.

Quanto ao esforço:

• Esforço absoluto � é um esforço que, por ser muito intenso, não

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possibilita a recuperação no seu decurso. Um exemplo prático são as

provas de velocidade.

• Esforço relativo � é um esforço com uma intensidade moderada e por isso

é possível a recuperação relativa durante a sua realização. Por exemplo,

nas provas de distância.

Quanto à fadiga:

• Fadiga local � é aquela que se revela somente nos músculos que foram

utilizados no esforço efectuado, tornando-os incapazes de realizar

eficazmente uma acção, como acontece com as cãibras.

• Fadiga geral � esta variante revela-se nos planos muscular e cardio-

pulmonar, sendo mais ou menos proporcional ao grau de intensidade do

esforço realizado. Pode manifestar-se pelo aparecimento de tonturas,

aceleração e arritmia das frequências cardíacas e respiratórias, transpiração,

etc. Origina-se na incapacidade orgânica em satisfazer as necessidades

energéticas ao nível muscular, quando extremamente solicitado.

Quadro 1 – Diferentes formas de expressão de resistência. Formas de manifestação de resistência

Em função da massa muscular solicitada

Em função da modalidade desportiva

Em função da mobilização bioenergética (1)

Em função da duração do esforço

•Resistência geral ( ≥ 2/3)

•Resistência regional (1/3 a 2/3)

•Resistência local ( ≤ 1/3)

•Resistência geral

•Resistência específica

•Resistência aeróbia

•Resistência anaeróbia

•Resistência de curta duração

•Resistência de média duração

•Resistência de longa duração

(1) De acordo com processos de obtenção de energia, a resistência apresenta como

variantes:

• Resistência aeróbia – equilíbrio entre o oxigénio que está a ser requisitado

para o trabalho muscular e o que é transportado pela circulação até esse tecido;

• Resistência anaeróbia – onde há falta de oxigénio e a energia é produzida

através da fermentação. Dentro desta última existem outras duas variantes:

� resistência anaeróbia aláctica (nos esforços de pequena duração,

quando a energia é obtida a partir da fosfocreatina, não se formando

muito ácido láctico);

� resistência anaeróbia láctica (quando os esforços são mais

prolongados e se usa o açúcar de reserva do nosso organismo – o

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glicogénio, formando-se grandes quantidades de ácido láctico no

sangue).

Figura 2 – A resistência e as suas subdivisões.

1.1.2.1. Treino da resistência

É fundamental desenvolver a resistência geral para se poder atingir um bom nível na

resistência específica de um desporto, qualquer que ele seja. Se a resistência geral for

baixa, o treino não será muito eficaz, pois o aparecimento precoce da fadiga impossibilitará

a sua intensidade.

Para desenvolver esta capacidade convém praticar repetidamente exercícios de

média intensidade ou séries de corridas relativamente curtas, rápidas ou, em certos casos,

com variações de velocidade.

1.1.2.2.Teste da condição física

Teste da resistência aeróbia (teste de Cooper) – consiste em correr 12 minutos à

volta de um percurso estabelecido pelo professor, tentando percorrer a maior distância

possível a um ritmo constante.

Capacidades Coordenativas

Assentam nos processos funcionais do sistema nervoso central (SNC). Pressupostos

para a aprendizagem da técnica desportiva assumem um papel decisivo na estrutura do

movimento (Exemplos: equilíbrio; precisão; ritmo; fluidez; encadeamento; constância do

RESISTÊNCIA

GERAL OU DE BASE Aeróbia, a necessidade de O2 é praticamente compensada. Objectivo de treino: Aumento do consumo de O2.

ESPECIAL Preponderantemente anaeróbia; trabalho em divida de O2. Objectivo de treino, aumento da capacidade da divida de O2.

RESISTÊNCIA DE

SPRINT

(100, 200 m)

RESISTÊNCIA DE

VELOCIDADE

(400 A 1500 m)

RESISTÊNCIA MUSCULAR

LOCAL (dinâmica; estática).

Int. Fraca/média Int. Sub máxima Int. Máxima Int. Fraca a máx.

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movimento).

Equilíbrio – um corpo está em equilíbrio quando as forças exteriores (gravidade,

inércia e atrito) que sobre ele agem; quer esteja imóvel ou em movimento; se compensam

reciprocamente (patinagem, esqui, ginástica artística, etc).

Fluidez do movimento – capacidade de através de acções motoras de travagem e

inversão coordenar de forma óptima a condução específica do movimento de acordo com

respectivos efeitos de força (saltos em profundidade e corrida), (Meinel/Schnabel, 1976).

Precisão do movimento – ou exactidão do movimento, entende-se a concordância

dos movimentos previstos com os realizados (desportos colectivos, descida esqui, ginástica,

etc).

Constância do movimento – grau de concordância de gestos executados de forma

repetida – cíclico (corrida, natação, ciclismo, esqui fundo, etc); rítmicos (remo, dança, etc) e

acíclicos (lançamentos).

Ritmo do movimento – comportamento espaço temporal característico de um

movimento (cíclico - corrida, natação, ciclismo, esqui fundo, etc.; rítmicos - remo, dança, etc.

e acíclicos - lançamentos). É a capacidade de compreensão, acumulação e interpretação de

estruturas temporais e dinâmicas pretendidas ou contidas na evolução do movimento.

Ligação do movimento – ou transmissão do movimento, sequência visível de um

movimento e a correlação entre as suas fases.

-Transferência do impulso;

-Transposição temporal das fases do movimento;

-Formas de utilização do tronco;

-Função condutora da cabeça.

Capacidade de observação – percepção sobre o desenvolvimento de um

movimento, dos colegas de equipa ou dos adversários ou dos objectos móveis, tendo como

referência os objectos imóveis. Também pode ser a observação de uma corrida ou do

adversário nos desportos de combate.

Controlo motor – resposta ás exigências de elevada precisão nos movimentos, do

ponto de vista temporal, espacial e dinâmico.

Reacção motora – reagir o mais rápido e correctamente possível a um determinado

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estímulo.

Capacidade de antecipação – capacidade de prever o desenvolvimento e o

resultado de uma determinada acção que se está a desenrolar, para que assim o desportista

possa preparar a sua própria acção.

Expressão motora - capacidade de criar os próprios movimentos de uma forma

estética e artística.

Capacidade de representação – é a capacidade de representar mentalmente

situações bem determinadas de acordo com as informações disponíveis.

Diferenciação cinestésica – é a capacidade de diferenciar as informações

provenientes dos músculos, tendões e ligamentos, que nos informam sobre a posição do

nosso corpo num determinado momento e espaço e que nos permite realizar as acções

motoras de uma forma correcta e económica, conseguindo assim a coordenação dos

movimentos.

Coordenação motora – é a capacidade de adequar de forma correcta uma

combinação de acções que se desenrolam de uma forma sequencial ou ao mesmo tempo.

Orientação espacial – a capacidade de reagir a um estímulo externo em termos de

deslocação ou de estabilização da postura.

1.3.1. Treino das capacidades coordenativas

É especialmente durante os primeiros anos de escolaridade (1º e 2º ciclos) que estas

capacidades devem ser treinadas, pois é dos 6 aos 12 anos que elas se desenvolvem

intensamente, estagnando ao atingir a puberdade. Isto leva a que esta aprendizagem

motora tenha que ser rápida e com exercícios e movimentos que possam ser executados

nessas idades.

O rendimento das capacidades coordenativas dependerá sempre:

• Da capacidade dos órgãos dos sentidos (órgãos analisadores) que dão

informações actuais sobre o meio e sobre o próprio corpo;

• Da mobilidade e plasticidade do sistema nervoso e dos dados que nele estão

armazenados (memória);

• Da qualidade das ligações existentes entre os músculos, que recebem a

ordens, e as vias nervosas, que as canalizam.

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Capacidades Coordenativo – Condicionais

São tanto quantitativo energéticas como qualitativas e dependentes dos processos

de condução do SNC.

1.1.4. Velocidade

A velocidade é a capacidade motora de; com base nos processos neuro-musculares

e um óptimo desenvolvimento da força; executar movimentos no mais curto espaço de

tempo. Permite a máxima rapidez de execução de um movimento (acção motora) ou de uma

série de movimentos.

Movimentos rápidos são determinados por duas componentes:

- Coordenação;

- Força muscular.

Figura 3 – Velocidade e as suas subdivisões.

VELOCIDADE

Velocidade Máxima Acíclica

(Vel. Acção)

Velocidade Máxima Cíclica

(Vel. de base)

Velocidade de Reacção

Estimulo - tempo de reacção, incluindo o tempo latente (Ex: partida de blocos).

Movimentos cíclicos contra pequenas resistências. (Ex: sprint).

Contra grandes resistências

VELOCIDADE - FORÇA

Capacidade de aceleração – força inicial (Ex: lançamentos, saltos, etc).

Movimentos acílcicos contra pequenas resistências. (Ex: boxe).

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A realização de movimentos rápidos, depende de: Velocidade de enervação;

coordenação inter e intramuscular; grau de dificuldade da técnica especifica; velocidade de

contracção da musculatura; massa muscular; ritmo do movimento; flexibilidade; destreza;

pré tensão da musculatura; temperatura dos músculos, componentes ambientais e

componentes psíquicas.

0 28/36 60/90 100

Velocidade de reacção Velocidade Força Velocidade Máxima Cíclica Resistência de Sprint

Figura 4 – Corrida de 100 m, como exemplo para as formas de velocidade (seg. Grosser, 1976).

A velocidade tem como variantes:

Velocidade de reacção ou de resposta a estímulos sensoriais ou volitivos. Pode

medir-se tendo em conta o intervalo que decorre entre o estímulo e a resposta motora, a

que chamamos «tempo de reacção». A velocidade de reacção pode ser voluntária ou

involuntária (“reflexos”).

O «tempo de reacção» da velocidade voluntária depende:

o Da velocidade de percepção própria de cada órgão sensorial;

o Da capacidade que os centros nervosos possuem de tratar ou transformar

informação (recepção dos estímulos sensoriais) em impulsos motores

adequados;

o Da rapidez de contracção dos músculos em causa.

Na velocidade involuntária, o comando motor parte, não dos centros cerebrais

(caminho mais longo), mas da espinal-medula (caminho mais curto). Assim, a informação

recebida e a resposta dada processam-se mais rapidamente. É exemplo disto o «arco

reflexo», mecanismo biológico de defesa, segundo o qual o tempo de resposta motora a um

estímulo considerado perigoso é encurtado ao mínimo tempo possível.

Velocidade de contracção – toda a acção motora depende da capacidade de

encurtamento (contráctil) das fibras musculares. A velocidade de contracção depende do

grau de coordenação neuromuscular e da condição fisiológica da musculatura e tem a ver

com vários aspectos: tipo e dimensão das alavancas muscularmente accionadas, velocidade

de reacção motora ao estímulo nervoso, nível de coordenação neuromuscular e condição

em que se encontram os músculos solicitados.

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Outras formas de manifestação:

� Velocidade de aceleração; Velocidade de execução; Velocidade de

resistência; Velocidade de repetição.

1.1.4.1. Treino da velocidade

Tendo a ver com aspectos orgânicos, funcionais e estruturais, inatos e hereditários,

só dentro de certos limites, a velocidade, especialmente a contráctil, pode evoluir (um jovem

estruturalmente lento nunca será decerto um campeão de velocidade). Porém, pode ser

beneficiada por exercícios de potenciação física próprios para desenvolver as qualidades

musculares.

Para melhorar a velocidade de qualquer tipo de movimento é necessário:

o Pôr em condições o músculo envolvido na tarefa;

o Executar o movimento desejado à máxima velocidade possível, de

acordo com o princípio que velocidade gera velocidade;

o Aperfeiçoar a coordenação dos movimentos;

o Estar atento ao relaxamento.

Portanto o treino deve processar-se dentro dos seguintes princípios:

1. Esforços – curtos, intensos à máxima velocidade de execução possível;

2. Intervalos – que possibilitem uma boa recuperação entre os esforços;

3. Repetições – as possíveis, desde que a fadiga não surja como inibidora

do desempenho da velocidade.

Todo o tipo de acções explosivas, que impliquem respostas rápidas a estímulos

variados, passando de posturas estáticas a dinâmicas, de formas de movimento lento ou

moderado a outras velozes ou em aceleração, partidas em velocidade, saltos e lançamentos

são outros exercícios específicos que permitem o correcto desenvolvimento desta

capacidade.

1.1.4.2. Testes de condição física

1. Velocidade de execução – realizar uma corrida de 40 metros, no menor tempo

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possível;

2. Velocidade de repetição – realizar uma corrida de 150 a 200 metros, no menor

tempo possível.

1.1.5. Flexibilidade

A flexibilidade é também designada como «mobilidade articular», é a capacidade

motora que permite executar todo o tipo de movimentos articulares de um modo o mais

descontraído possível e com a maior amplitude articular. Isto é realizado através da

elasticidade muscular e da mobilidade articular. Capacidade de executar movimentos com

grande amplitude em determinadas articulações; é um pressuposto para a execução

qualitativa e quantitativa de um movimento.

Depende, essencialmente dos seguintes factores:

(i) Dos limites possíveis de mobilidade articular, considerando sobretudo as

estruturas ósseas que integram a articulação em causa, assim como os grupos

musculares opostos ao movimento;

(ii) Da área das superfícies cartilaginosas, que podem ser aumentadas, quando

se efectuam movimentos de um modo amplo, ou reduzidas, no caso contrário;

(iii) Do comprimento do sistema ligamentoso de sustentação, susceptível de

aumento através do exercício;

(iv) Dos níveis de descontracção e comprimento dos grupos musculares opostos

ao movimento.

A flexibilidade, pode dividir-se em diferentes variantes:

- Flexibilidade Geral;

- Flexibilidade Especial (uma só articulação);

- Flexibilidade Activa (sem ajuda);

- Flexibilidade Passiva (com ajuda).

1.1.5.1. Treino da flexibilidade

Trata-se de uma capacidade motora que facilita a execução dos movimentos, mas

não deve ser trabalhada em excesso – a não ser que a prestação desportiva assim o exija

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(Ginástica Artística, Ginástica Rítmica, Saltos para a Água, etc) – para não provocar

deformações das articulações e dos ligamentos. Com o avanço da idade vai-se

irremediavelmente perdendo.

O seu treino assenta na repetição, de modo descontraído, de movimentos

progressivamente mais amplos, efectuando insistências, ou forçando mesmo, no sentido de

obter uma maior amplitude articular e o alongamento dos grupos musculares que se opõem

ao movimento.

1.1.5.2. Testes de condição física

1. Flexibilidade geral (1) – sentado, de pernas unidas e estendidas, flexão do tronco à

frente, medindo a distância alcançada com os dedos das mãos;

2. Flexibilidade geral (2) – partindo da posição de deitado dorsal, realizar a ponte,

aguentando aposição em amplitude máxima durante três segundos.

1.1.6. Destreza

Agilidade ou habilidade, capacidade complexa que permite a adaptação rápida a

acções motoras de difícil execução, como também aprender rapidamente novas acções

motoras.

CAPACIDADE DE ADAPTAÇÃO

CAPACIDADE DE CONDUÇÃO

Sentido de tempo Capacidade de equilíbrio

Sentido de

espaço

DESTREZA

Habilidade/agilidade Flexibilidade

Antecipação Capacidade de reacção

Noção de movimento Fluidez

CAPACIDADE DE APRENDIZAGEM MOTORA

Figura 5 – Algumas das capacidades que compõem a capacidade Destreza.

É muitas vezes designada por coordenação neuromuscular e consiste na acção

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harmoniosa entre todos os grupos musculares que intervêm, directa ou indirectamente,

em movimentos complexos, permitindo que estes sejam precisos, ágeis e sem hesitações –

todos os grupos musculares actuam no momento exacto, com os níveis de velocidade e

intensidade requeridos, como que fazendo uma síntese prática das várias capacidades

motoras, quer condicionais, quer coordenativas.

À capacidade de mútuo controlo entre os vários grupos musculares no sentido de dar

ao movimento, quer o timing, quer a precisão devidos, dá-se o nome de sinergia.

1.1.6.1. Treino da destreza

O desenvolvimento desta capacidade implica a repetição sistemática e

sistematizada dos movimentos desejados, numa primeira fase, tomando consciência dos

mesmo, e depois, visando a sua progressiva automatização, libertando a intervenção

cerebral para outros fins. Obtém-se assim uma melhoria em termos de velocidade, eficácia,

precisão e conservação de energia em movimentos complexos.

Desenvolve-se também pela prática de movimentos simétricos, assimétricos e

combinados.

1.1.6.2. Teste de condição física

Destreza geral – num percurso constituído por duas linhas de nove metros, tendo

em cada uma das extremidades um quadrado desenhado, partir do ponto inicial para ir

apanhar o objecto que está no quadrado e trazê-lo para a partida, colocando-o no outro

quadrado. Fazer o percurso duas vezes sem parar, cronometrando o tempo gasto.

1.1.7. Conclusão

As capacidades motoras apresentadas, são pressupostos do rendimento para a

aprendizagem e realização dos movimentos desportivos. Permitem ao treinador dividir e

estruturar os movimentos desportivos e o rendimento em determinados pormenores e assim

deduzir o grau de importância de determinados exercícios de treino, diagnosticando e

posteriormente aperfeiçoar o rendimento global da sua disciplina desportiva.

Estes testes práticos devem ser realizados periodicamente, para que, pela

comparação dos resultados obtidos, se possa verificar a evolução da condição física de

cada indivíduo, depois do treino a que foi submetido durante esse espaço de tempo.

Nunca se deve descurar o desenvolvimento da condição física de cada um, sendo

conveniente treinar num ginásio as capacidades condicionais e as coordenativo/condicionais

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que se pode, pois como John F. Kennedy disse, a aptidão física é “uma das mais

importantes chaves para se ter um organismo sadio”, e também “a base da actividade

intelectual criativa e dinâmica.”

Quadro 2 - Comparação do desenvolvimento das capacidades físicas básicas.

Capacidade Cargas Repetições Intervalos Modo de execução

Velocidade Intensas Médias (5 a 10) Médios (2 a 3 min) Muito rápido

Força Máximas ou sub máximas Poucas (1 a 5) Prolongados (3 a 5 min) Lenta

Potência Intensas Médias (5 a 10) Médios (2 a 3 min) Rápida

Resistência Médias Bastantes (8 a 20) Curtos (1 a 2 min) Rápida

Capacidade aeróbia Leves Contínuas (20 a 30) Curtos ou inexistentes Descontraída

Nota: a flexibilidade e a destreza, cujo desenvolvimento apresenta as características particulares já referidas, não são susceptíveis de figurar neste quadro.

Quadro 3 – Fases sensíveis de desenvolvimento das capacidades motoras. Períodos críticos de desenvolvimento das capacidades motoras na Ginástica Artística

IDADE 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

Capacidade de aprendizagem

Capacidade de diferenciação

Capacidade de reacção

Capacidade de orientação

Capacidade de ritmo

Capacidade de equilíbrio

Resistência

Força

Velocidade

Flexibilidade

Page 18: Caracterizacao Das Capacidades Motoras

UTAD – Educação Física e Desporto, Documento de circulação interna Treino das Capacidades Motoras I – 2º ano – Caracterização das Capacidades Motoras

Francisco Saavedra P. 18

Fase sensível ou Período Crítico – momentos em que o organismo reage melhor à

estimulação externa. Fase sensível não corresponde ao início da estimulação, mas sim ao

período onde a estimulação pode ser aumentada relativamente aos períodos anteriores.