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RESUMO (Caracterização fisionômico-florística e mapeamento da vegetação da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro, Brasil) Os tipos de vegetação ocorrentes na área da Reserva Biológica de Poço das Antas, estado do Rio de Janeiro, Brasil (22º30’ e 22º33’S; 42º15’ e 42º19’W) foram identificados, descritos e mapeados. Foram identificadas seis unidades fisionômicas, sendo duas florestais (floresta aluvial e floresta submontana) e quatro não florestais (formação pioneira com influência fluvial, capoeira aluvial, capoeira submontana e campo antrópico). As características fisionômicas e florísticas mais relevantes de cada unidade foram descritas e discutidas com base na análise comparativa entre as seis unidades fisionômicas e com outros trechos de mata atlântica. O mapeamento foi realizado com emprego de fotointerpretação analógica, em escala de 1:20.000. Na avaliação da cobertura vegetal atual foram estimados 2.608 hectares de remanescentes florestais em variados estados de preservação (floresta aluvial – 17,9% e floresta submontana – 34,3%), indicando a expressiva representatividade de formações não florestais com influência fluvial (20,0%) ou antrópica (27,9%). Palavras-chave: mapa de vegetação, mata atlântica, composição florística, fito-fisionomia ABSTRACT (Physiognomic-floristic characteristics and vegetation map of the Poço das Antas Biological Reserve, Silva Jardim, Rio de Janeiro, Brazil) Six vegetation types are described for Poço das Antas Biological Reserve, Rio de Janeiro State, Brazil (22º30’ e 22º33’S; 42º15’ e 42º19’W). Two forest formations (alluvial forest and submontane forest) and four non-forest formations (fluvial pioneer, alluvial scrub, submontane scrub and manmade grasslands) were identified. Relevant floristic and physiognomic characteristics of each unit are described and compared to analogous Atlantic Rain Forest formations. The vegetation was mapped using analog photo interpretation on a scale of 1:20,000. An estimated 2,608 ha of forest remnants in various states of preservation were detected (alluvial forest – 17.9%; submontane forest– 34.3%), plus a significant representation of non-forest formations with fluvial influence (20.0%) and manmade interference (27.9%). Key words: vegetation map, Atlantic Forest, floristic composition, physiognomy. Artigo recebido em 11/2005. Aceito para publicação em 05/2006. ¹Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Rua Pacheco Leão 915, 22460-030, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. [email protected] ²Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Haroldo C. de Lima¹, Solange de V. A. Pessoa¹, Rejan R. Guedes-Bruni¹, Luis Fernando D. Moraes², Sérgio V. Granzotto¹, Shoji Iwamoto¹ & Jorge Di Ciero¹ INTRODUÇÃO No estado do Rio de Janeiro a planície costeira é caracterizada por uma grande heterogeneidade da paisagem, possivelmente em muito influenciada por fatores físicos como variações na topografia – morros, colinas e planícies bem como no regime de inundação do solo. Estes ambientes distintos, capacitados a abrigarem populações de diferentes espécies, através do seu componente vegetal, responderiam por esta heterogeneidade, resultando, por sua vez, num mosaico vegetacional com alta diversidade e heterogeneidade florística (Guedes-Bruni 1998). Embora muito pouco se conheça sobre a cobertura vegetal original da bacia do Rio São João, pode-se admitir que a região ostentava exuberante floresta (IBDF/FBCN 1981). Um antigo relato do início do século XIX menciona que as ribanceiras estavam “bastante cobertas de arvoredo” (Luccock 1951). É provável que esta vegetação original tenha permanecido CARACTERIZAÇÃO FISIONÔMICO-FLORÍSTICA E MAPEAMENTO DA VEGETAÇÃO DA RESERVA BIOLÓGICA DE POÇO DAS ANTAS, SILVA JARDIM, RIO DE JANEIRO, BRASIL

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RESUMO

(Caracterização fisionômico-florística e mapeamento da vegetação da Reserva Biológica de Poço das Antas,Silva Jardim, Rio de Janeiro, Brasil) Os tipos de vegetação ocorrentes na área da Reserva Biológica de Poçodas Antas, estado do Rio de Janeiro, Brasil (22º30’ e 22º33’S; 42º15’ e 42º19’W) foram identificados, descritose mapeados. Foram identificadas seis unidades fisionômicas, sendo duas florestais (floresta aluvial e florestasubmontana) e quatro não florestais (formação pioneira com influência fluvial, capoeira aluvial, capoeirasubmontana e campo antrópico). As características fisionômicas e florísticas mais relevantes de cada unidadeforam descritas e discutidas com base na análise comparativa entre as seis unidades fisionômicas e comoutros trechos de mata atlântica. O mapeamento foi realizado com emprego de fotointerpretação analógica,em escala de 1:20.000. Na avaliação da cobertura vegetal atual foram estimados 2.608 hectares deremanescentes florestais em variados estados de preservação (floresta aluvial – 17,9% e floresta submontana– 34,3%), indicando a expressiva representatividade de formações não florestais com influência fluvial(20,0%) ou antrópica (27,9%).Palavras-chave: mapa de vegetação, mata atlântica, composição florística, fito-fisionomia

ABSTRACT

(Physiognomic-floristic characteristics and vegetation map of the Poço das Antas Biological Reserve, SilvaJardim, Rio de Janeiro, Brazil) Six vegetation types are described for Poço das Antas Biological Reserve, Riode Janeiro State, Brazil (22º30’ e 22º33’S; 42º15’ e 42º19’W). Two forest formations (alluvial forest andsubmontane forest) and four non-forest formations (fluvial pioneer, alluvial scrub, submontane scrub andmanmade grasslands) were identified. Relevant floristic and physiognomic characteristics of each unit aredescribed and compared to analogous Atlantic Rain Forest formations. The vegetation was mapped usinganalog photo interpretation on a scale of 1:20,000. An estimated 2,608 ha of forest remnants in various statesof preservation were detected (alluvial forest – 17.9%; submontane forest– 34.3%), plus a significantrepresentation of non-forest formations with fluvial influence (20.0%) and manmade interference (27.9%).Key words: vegetation map, Atlantic Forest, floristic composition, physiognomy.

Artigo recebido em 11/2005. Aceito para publicação em 05/2006.¹Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Rua Pacheco Leão 915, 22460-030, Rio de Janeiro, RJ, [email protected]²Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

Haroldo C. de Lima¹, Solange de V. A. Pessoa¹,Rejan R. Guedes-Bruni¹, Luis Fernando D. Moraes²,

Sérgio V. Granzotto¹, Shoji Iwamoto¹ & Jorge Di Ciero¹

INTRODUÇÃO

No estado do Rio de Janeiro a planíciecosteira é caracterizada por uma grandeheterogeneidade da paisagem, possivelmenteem muito influenciada por fatores físicos comovariações na topografia – morros, colinas eplanícies bem como no regime de inundação dosolo. Estes ambientes distintos, capacitados aabrigarem populações de diferentes espécies,através do seu componente vegetal,responderiam por esta heterogeneidade,

resultando, por sua vez, num mosaicovegetacional com alta diversidade eheterogeneidade florística (Guedes-Bruni 1998).

Embora muito pouco se conheça sobre acobertura vegetal original da bacia do Rio SãoJoão, pode-se admitir que a região ostentavaexuberante floresta (IBDF/FBCN 1981). Umantigo relato do início do século XIX mencionaque as ribanceiras estavam “bastante cobertasde arvoredo” (Luccock 1951). É provável queesta vegetação original tenha permanecido

CARACTERIZAÇÃO FISIONÔMICO-FLORÍSTICA E MAPEAMENTO DA

VEGETAÇÃO DA RESERVA BIOLÓGICA DE POÇO DAS ANTAS,SILVA JARDIM, RIO DE JANEIRO, BRASIL

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pouco alterada até cerca da metade do séculoXX (Lamego 1946), quando tem início adestruição de amplos trechos de floresta nosmorros e nas planícies. Atualmente são rarosos trechos com vegetação natural, que emcontraste com grandes áreas alteradas, sãotestemunhos da drástica destruição pelasatividades antrópicas.

A Reserva Biológica de Poço das Antasapresenta hoje um aspecto fitofisionômicobastante empobrecido quanto a sua coberturavegetal primitiva. A ação antrópica,principalmente pela exploração seletiva deessências florestais e pelo fogo, além dadrenagem artificial e retificação dos rios,contribuiu para o desaparecimento de amplostrechos de formações florestais, sobretudo, nasplanícies de inundação. No mapeamento davegetação e análise dos aspectos florísticosrealizados no final da década de 70 (Carautaet al. 1978), a cobertura vegetal da área foireconhecida como, em geral, secundária e osremanescentes classificados como florestapluvial. Posteriormente, na diagnose elaboradapara subsidiar o plano de manejo (IBDF/FBCN 1981) foram reconhecidos e descritosquatro tipos de vegetação (florestal,campestre, brejal e aquático) existentes nestaunidade de conservação. Entretanto, face àsmudanças ocorridas na área, particularmenteem decorrência dos freqüentes incêndiosocorridos nos últimos anos, há necessidade deuma urgente reavaliação.

Em decorrência desta situação, torna-seimperativa a atualização de dados sobre avegetação desta unidade de conservação,prioritariamente no que concerne a suanatureza e extensão. Estas informações sãoimprescindíveis ao adequado manejo eimplementação de ações de restauraçãoecológica das áreas degradadas. São aindaurgentes para apoiar estratégias paraestabelecimento de medidas efetivas deproteção das áreas naturais remanescentes.Vale ressaltar que estudos desta natureza têmse mostrado ferramentas fundamentais paraintegrar diferentes disciplinas relacionadas àanálise ambiental, principalmente para subsidiar

o manejo em unidades de conservação (Noffs& Baptista-Noffs 1982;Oliveira & Porto 1999;Cardoso-Leite et al. 2005).

Tendo em vista tratar-se de um dosúltimos remanescentes de formação florestalde planície costeira no estado do Rio deJaneiro, embora já bastante fragmentada,foram implementados estudos no sentido delevantar dados para a caracterizaçãofisionômico-florística das áreas ocupadaspelos diversos tipos de cobertura vegetal,incluindo as áreas degradadas. Neste contexto,considerando ainda a necessidade urgente deum documento norteador das ações deproteção e manejo, priorizou-se a geração deum mapa temático que pudesse auxiliar: (1)na definição de áreas prioritárias para estudo;(2) na implantação de modelos para expansãode áreas florestadas ou mesmo de seuenriquecimento; (3) no monitoramento deprocessos que decorram em futuras, e nemsempre improváveis, modificações de suapaisagem, sobretudo em decorrência do fogo.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de estudo - Reserva Biológica dePoço das Antas (Rebio)

A Rebio encontra-se localizadapoliticamente na região das baixadas litorâneasdo estado do Rio de Janeiro, no município deSilva Jardim, e geograficamente em extensaplanície na região central do estado, outroradesignada baixada de Araruama (22o30’ e22o33’S; 42o15’ e 42o19’W), sob influência diretada bacia hidrográfica do rio São João e com áreaaproximada de 5.000 hectares (Fig. 1). Criadapelo Decreto n°  73.791 de 11.03.1974 (IBDF/FBCN 1981) a área da Rebio foi, no passado,como as demais áreas da bacia do rio São João,explorada pela retirada de madeira, implantaçãode atividades agrícolas, bem como pecuária(Cunha 1995, Primo & Volcker 2003).

As manchas de floresta remanescentessão resultantes dos processos sucessionais queali se deram, em diferentes épocas e distintosusos do solo, por ocasião da expansão agrícolaque ocorreu ao norte do Rio de Janeiro. Não só

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a construção da ferrovia Estrada de FerroLeopoldina, ligando o norte do estado à cidadedo Rio de Janeiro, interferiu na paisagem localcomo o aumento da exploração de madeira, paraabastecimento das fornalhas das locomotivas,acentuaram a supressão da floresta.

A construção da represa de Juturnaíba,por sua vez, ainda que situada em árealimítrofe, na sua porção sudeste, promoveuforte impacto sobre a cobertura vegetal daRebio. A obra foi iniciada no final da décadade 70 e concluída em 1984. As mudanças naaltura do lençol freático, bem como assucessivas retificações do canal do rio SãoJoão foram as que mais interferiram sobre oambiente biofísico (Cunha 1995).

A cobertura vegetal atual da Rebio, emboranitidamente fragmentada, representa umsignificativo remanescente florestal de baixadado estado do Rio de Janeiro, não só pelos

elementos típicos à esta fisionomia vegetal, comotambém por abrigar populações do mico-leão-dourado (Leonthopithecus rosalia rosalia L.),espécie ameaçada de extinção (Guedes-Bruni1998). As populações desta espécie presentesna Rebio dependem intimamente da ampliaçãode áreas de floresta, seja por processos naturais,seja por ações orientadas de restauraçãoecológica, como as implementadas peloPrograma Mata Atlântica do Jardim Botânicodo Rio de Janeiro desde 1993.

A topografia é predominantemente deplanície, com a presença de morros e morrotesde perfis arredondados, também chamados demeias-laranjas ou mamelonares, com alturasque variam de 19 a 200 metros, e que sãoseparados por várzeas de fundo achatado ealagadiças (Figs. 2 e 3) (IBDF/FBCN 1981).Takizawa (1995) reconheceu setecompartimentos geomorfológicos na Rebio:

Figura 1 - Localização geográfica da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

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faixa meândrica, várzea interna, várzeaexterna, alvéolos, morrotes baixos, morrotesaltos e morros. O rio São João é o principalcurso d’água da Rebio e seus afluentes(Aldeia Velha, Preto e Iguapé) percorremgrande parte da Reserva, inundando as áreasde várzea.

Os limites da Rebio encontram-se empleno domínio das planícies terciárias equaternárias, ocorrendo rochas datadas do

Pré-Cambriano, bem como rochas típicas doComplexo do Litoral Fluminense (IBDF/FBCN 1981).

As classes de solos (EMBRAPA 1999)estão distribuídas basicamente entre os solosde elevações, que são os Argissolos e osCambissolos; e os solos de várzea, que são osGleissolos, os Neossolos Flúvicos e osOrganossolos. Ocorre um predomínio de solosálicos e, à exceção dos Neossolos Flúvicos e

Figura 2 - Vista geral de trecho com morros e morrotes de perfis arredondados na Reserva Biológica de Poço das Antas,Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Figura 3 - Vista geral de um trecho de planície com morrotes isolados na Reserva Biológica de Poço das Antas, SilvaJardim, Rio de Janeiro.

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dos Organossolos, os demais possuem texturaargilosa (Takizawa 1995).

O clima regional é do tipo megatérmicoúmido (B2A’) na classificação de Thornthwaite& Mather, correspondendo à designação detropical chuvoso com estação seca no inverno(As) de Köeppen (Bernardes 1952). Odiagrama ombrotérmico referente ao períodode janeiro de 1993 a dezembro de 2002 (Fig. 4)assinala os meses de junho a agosto comorepresentantes do período menos chuvoso e detemperaturas menos elevadas, correspondendoos meses de novembro a março ao período maischuvoso e de maiores temperaturas. Os demaismeses representam situações intermediáriasentre os dois períodos (Pessoa 2003).

Neste intervalo de dez anos, atemperatura média anual foi de 25,5°C, sendoregistrada no mês de julho a temperatura médiamais baixa de 21,8°C e a maior temperaturamédia durante os meses de janeiro e fevereiro(29°C). Em relação à precipitação, foiobservado no período um valor médio anualde 1994,9 mm, correspondendo ao mês dedezembro o maior índice (320 mm) e o menorvalor (38,9 mm) ao mês de julho.

Caracterização fisionômico-florística

Unidades fisionômicasPara os estudos sobre a vegetação foi

adotado o sistema de classificaçãofisionômico-ecológico proposto por Veloso &Goes-Filho (1982), que também foi usado comoreferência para o Mapa de Vegetação doBrasil (IBGE 1992). De acordo com o sistemae o mapa acima citados, a cobertura vegetalda Rebio representa um trecho de FlorestaOmbrófila Densa. Este tipo de vegetação foisubdividido em seis formações obedecendo auma hierarquia topográfica e fisionômica:floresta aluvial, floresta submontana, formaçãopioneira com influência fluvial, capoeira aluvial,capoeira submontana e campo antrópico. Combase nesta conceituação das formações, foramrealizados os estudos para reconhecimento,delimitação, mapeamento e descrição dasunidades fisionômicas da cobertura vegetal da

Rebio. Em acréscimo ao sistema adotado, foiconsiderado ainda uma terminologia própriapara o reconhecimento das áreas de vegetaçãosecundária em fases iniciais de regeneração.

Levantamento florísticoPara análise da composição florística das

diferentes fisionomias foram realizadosestudos de campo no período de 1993-1999,efetuando-se o levantamento e a coleta dematerial botânico das espécies maisrepresentativas de cada unidade fisionômica.Foram também colhidas informações comantigos moradores locais sobre os impactosantrópicos na área e documentadas, por meiode fotografia, as diferentes fisionomias naturaise alteradas e as espécies mais representativas.

Dados complementares sobre acomposição florística foram obtidos nosresultados dos estudos de campo dos váriosprojetos desenvolvidos pelo Programa MataAtlântica (PMA) na Rebio. Os estudos sobreestrutura e composição de trechos de florestaaluvial e submontana utilizaram unidadesamostrais de 1 hectare, subdivididas em parcelasde 25 × 50 m, onde foram inventariados osindivíduos com diâmetro a altura do peito (DAP)igual ou maior que 5 cm. Em trechos de

Figura 4 - Distribuição dos totais mensais de precipitaçãoe das temperaturas médias mensais, na série temporal de1993 a 2002 para a Reserva Biológica de Poço das Antas,Silva Jardim, Rio de Janeiro.

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vegetação arbustivo-herbácea, os estudosutilizaram o método de pontos (Mantovani1987). Estes dados estão armazenados noBanco de Dados do PMA e atualmentegerenciados pela equipe da Assessoria deInformática e Geoprocessamento do Institutode Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

MapeamentoA metodologia do mapeamento da

cobertura vegetal teve por base afotointerpretação. Após o levantamento dosrecobrimentos aerofotogramétricos disponíveise a seleção dos mais adequados, optou-se pelacobertura realizada em 1988 pela PROSPECS.A, com fotografias aéreas em escalaaproximada de 1:20.000. A delimitação da áreada unidade de conservação foi realizada sobreo foto-índice para identificação das fotografiasaéreas relevantes ao estudo.

O trabalho teve início com a delimitaçãodas áreas úteis de cada foto e a identificaçãodos diferentes padrões de cobertura e uso dosolo em papel poliéster transparente, o queresultou em um mapa preliminar na escala de1:20.000. Posteriormente, o mosaicoaerofotogramétrico e o mapa base decobertura e uso do solo foram ampliados paraescala 1:10.000 para realizar a análise dacobertura vegetal e uso do solo. Ascaracterísticas da paisagem analisadas para oreconhecimento dos padrões de cobertura euso do solo foram: fisionomia, altimetria, regimehídrico e grau de interferência antrópica.Dados complementares referentes àgeomorfologia, geologia, declividade e solosforam obtidos no Plano de Manejo (IBDF/

FBCN 1981) e no Levantamento Pedológicoe Zoneamento Ambiental (Takizawa 1995) daRebio. As bases cartográficas complementaresutilizadas foram as folhas topográficas doIBGE na escala de 1:50.000 (SF-23-Z-B-VI-1 – Silva Jardim; SF-23-Z-B-VI-2 – Morrode São João; SF-23-Z-B-III-3 – Quartéis).

Após a definição das diferentes unidadesfisionômicas, foram realizados estudos paracorrelação de campo, revisão dos limites dasunidades de cobertura vegetal, confecção domapa final (Anexo 1) e quantificação dasáreas mapeadas segundo as unidades delegenda (Tab. 1).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A paisagem atual na Rebio estárepresentada por áreas de cobertura vegetalnatural ou antrópica, cujas fisionomias demodo geral refletem, algumas mais outrasmenos, os processos antrópicos decorrentesde épocas pretéritas. De modo geral, estasituação é muito semelhante àquela já descritapor Carauta et al. (1978) e IBDF/FBCN(1981), principalmente em relação asmudanças promovidas pelos impactos daconstrução da Represa de Juturnaiba,

Embora situada na região fitoecológicada Floresta Ombrófila Densa (Veloso & Goes-Filho 1982; IBGE 1992), a cobertura vegetaldesta unidade de conservação, juntamente comgrande parte da bacia do Rio São João earredores, foi reconhecida como um trecho devegetação secundária e de atividades agráriasno mapeamento da vegetação na escala1:250.000 do Projeto RADAMBRASIL(Ururahy et al. 1983). A escala utilizada por

Tabela 1 - Área e percentual de cobertura das unidades fisionômicas ocorrentes na área daReserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Unidades fisionômicas Área (ha) Percentual de cobertura (%)

Floresta aluvial 894,5 17,9Floresta submontana 1714 34,3Capoeira aluvial 565 11,3Capoeira submontana 213 4,3Formação pioneira com influência fluvial 997,5 20,0Campo antrópico 616 12,3

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estes autores não permitiu a identificação dasáreas remanescentes da cobertura vegetalnesta região.

O estudo mais detalhado, com base nolevantamento aerofotogramétrico em escalade 1:20.000, evidenciou a presença defragmentos de vegetação natural sobre asplanícies de inundação e nos morros emorrotes dentro dos limites da Rebio. Com aaplicação do sistema de classificação devegetação de Veloso & Goes-Filho (1982),atualizado posteriormente em Veloso et al.

(1991), foi possível reconhecer e descreveras características fisionômicas e florísticasdestes fragmentos naturais, bem como dostrechos recobertos por vegetação antrópica.

Na caracterização e mapeamento dacobertura vegetal da Rebio foramidentificadas, delimitadas e descritas seisunidades fisionômicas: floresta submontana,floresta aluvial, formação pioneira cominfluência fluvial, capoeira submontana,capoeira aluvial e campo antrópico (Anexo 1).Os percentuais observados para as diferentesunidades fisionômicas encontram-seapresentados na Tabela 1. Tais percentuaispermitem aferir, como cobertura florestalremanescente circunscrita à Rebio, uma áreade 2.608,5 hectares, ou seja, 52 % de sua áreatotal. Outra porção muito representativa daárea é composta por extensos trechos comcobertura não florestal natural ou resultantesda ação antrópica, expressas por formaçõespioneiras, capoeiras e campos antrópicos. Nacaracterização florística de cada unidadefisionômica foram indicados os táxons maisrepresentativos ou aqueles que se destacampelo porte, sempre que possível na categoriade espécies (Tab. 2).

É importante destacar que os percentuaisatuais das diferentes fisionomias foram, e aindacontinuam sendo, influenciados pelos impactosda construção da Represa de Juturnaiba. Asmudanças impactaram, ou até mesmoextinguiram, grandes faixas de florestasaluviais nativas. Alguns trechos foram entãoinundados, em decorrência do represamento,

e, ainda hoje, se mantêm permanentementealagados. Nestes locais, as árvores mortas, quemantidas ainda eretas e áfilas, sem qualquerpresença de vegetação de sub-bosque ao seuredor, podem ser observados comotestemunhos das alterações ocorridas. Emvários trechos a jusante da barragem, áreas deflorestas e brejos ressequidas sofreramgradativo desaparecimento de sua coberturaoriginal, e vêm ao longo das últimas décadassendo substituídas por capoeiras e camposantrópicos. Outros trechos com fisionomiascampestres são ainda o resultado dos impactosdos freqüentes incêndios – facilitados em grandeparte pela natureza do solo turfoso – queinterferem periodicamente na paisagem e nosprocessos naturais de recuperação da área.

Floresta AluvialUnidade fisionômica típica das planícies

aluviais sujeitas à influência fluvial, em geralocupando as áreas de várzeas (Fig. 5) e faixasmeândricas do rio São João (Fig. 6). Estaformação abrange uma área de 894,5 hectares,representando 17,9% da Rebio (Tab. 1).

Os ambientes de floresta aluvialapresentam tipos de solo e condições deinundação bastantes variáveis. Em geral sãoambientes muito heterogêneos, formandomosaicos de locais com diferentes níveis deinundação, onde conforme a quantidade e otempo de permanência da água, a fisionomiapode variar quanto ao porte, ao adensamentodos indivíduos e às espécies características.

Figura 5 – Floresta aluvial em área de várzea na ReservaBiológica de Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

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Tabela 2 - Lista das espécies mais representativas ou que se destacam na composição florísticade cada unidade fisionômica da vegetação da Reserva Biológica de Poço das Antas, Rio deJaneiro. Floresta Aluvial (FA); Floresta Submontana (FS), Capoeira Aluvial (CA), CapoeiraSubmontana (CS), Formação Pioneira com Influência Fluvial (FP) e Campo Antrópico (CP).

Espécie Nome vulgar Unidade fisionômica

Acacia lacerans Benth. Arranha-gato FS,CSActinostemon verticillatus (Klotzsch.) Baill. FSAeschynomene sensitiva Sw. Corticeira CA,FP,CPAlchornea triplinervia (Spreng.) M. Arg. Tapiá FA,FSAnaxagorea dolichocarpa Sprague & Sandwith FSAndira anthelmia (Vell.) Macbr. Angelim FA,CA,CPAndropogon bicornis L. Capim-rabo-de-burro CPAnnona cacans Warm. Araticum FSApuleia leiocarpa (Vog.) J.F. Macbr. Garapa FSAstrocaryum aculeatissimum (Schott) Burret Irí FSAttalea humilis Mart. Pindoba FS,CSBaccharis dracunculifolia DC. Alecrim CA,CPBactris setosa Mart. Tucum FA,FP,CABlechnum serrulatum Rich. Samambaia CA,CPCabomba aquatica Aubl. Cabomba FPCalophyllum brasiliense Cambess. Guanandí FACariniana estrellensis (Raddi) Kuntze Jequitibá FSCariniana legalis (Mart.) Kuntze Jequitibá-rosa FSCasearia sylvestris Sw. Café-do-mato FSCecropia glazioui Snethlage Embauba CA,CS,FP,FSCecropia lyratiloba Miq. Embauba; embaubinha CA,CPChondodendron platiphylla (A. St.-Hil.) Miers Abuta; cipó-bala FSCladium jamaicense Crantz Capim-navalha FPClethra scabra Pers. Carne-de-vaca FSClidemia biserrata DC. Pixirica CPCostus spiralis (Jacq.) Roscoe Cana-do-brejo CACyperus ligularis L. Tiririca-do-brejo FPDalbergia frutescens (Vell.) Britton Cipó-de-estribo FS,CS,CPDiplotropis incexis Rizz. & Mattos F. Sucupira FSEichhornia crassipes (Mart.) Solms. Aguapé FPEriotheca pentaphylla (Vell.) A. Robyns Imbiruçu FA,FSEuterpe edulis Mart. Palmito FSGenipa americana L. Genipapo FAGochnatia polimorpha (Less.) Cabrera Cambará CSGuarea guidonia (L.) Sleumer Carrapeta FS,CS,CPGuarea macrophylla Vahl Carrapeta FSHedychium coronarium Koern. Lirio-do-brejo CA,FPHenriettea saldanhaei Cogn. Pixiricão FA,FSHyparrhenia rufa (Nees) Stapf Capim-jaraguá CPImperata brasiliensis Trin. Sapé CA,CS,CPInga edulis Mart. Ingá-cipó FA,FS

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Espécie Nome vulgar Unidade fisionômica

Inga laurina (Sw.) Willd. Ingá-mirim FA,CAInga thibaudiana DC. Ingá FA,FSInga vera Willd. Ingá-do-brejo FALantana camara L. Camará CPLonchocarpus cultratus (Vell.) Az.-Tozzi & H.C. Lima Embira-de-sapo FA,FS,CA,CPLudwigia quadrangularis (Mich.) H. Hara Cruz-de-malta CALygodium volubile Sw. Abre-caminho CPMabea fistulifera Mart. Canudeiro FSMargaritaria nobilis L.f. Figueirinha FAMartiodendron mediterraneum (Mart. ex Benth.) Köppen FSMelinis minutiflora P. Beauv. Capim-gordura CS,CPMiconia albicans (Sw.) Triana Pixirica CS,CPMiconia cinnamomifolia (DC.) Naudin Jacatirão FSMiconia staminea (Desr.) DC. Pixirica CPMoldenhawera polysperma (Vell.) Stellfeld Caingá FSMonstera adansonii Schott Imbé FSMyrcia anceps (Spreng.)O. Berg Cambuí FA,FSNectandra oppositifolia Nees Canela-louro CSNidularium procerum Lindm. Gravatá FAPanicum maximum Jacq. Capim-colonião CA,CP,FPPera glabrata (Schott) Baill. Tabocuva FA,FSPiptadenia adiantoides (Spreng.) J.F. Macbr. Arranha-gato FSPlatymenia foliolosa Benth. Vinhático FSPlatymiscium floribundum Vog. Sacambu FAPolygonum acuminatum Kunth. Erva-de-bicho CA,CPPourouma guianensis Aubl. Uvaia FA,FSPseudopiptadenia contorta (DC.) G.P. Lewis & M.P. Lima Angico FSPsidium guineense Sw. Araçá CS,CP,FSPteridium aquilinum (L.) Kuhn Samambaia CS,CP,FPRauvolfia grandiflora Mart. ex A.DC. Pau-leite CASabicea aspera var. glabrescens (Benth.) Schum. CPSalvinia auriculata Aubl. Lentilha d’água FPSchinus terebinthifolius Raddi Aroeirinha CA,CP,FSSenefeldera verticillata (Vell.) Croizat Sucanga FSSiparuna guianensis Aubl. Nega-mina CSSiparuna reginae (Tul.) A. DC. Nega-mina FA,FSSparattosperma leucanthum (Vell.) K. Schum. Cinco-chagas CS,FSSymphonia globulifera L.f. Guanandí FA,CATabebuia cassinoides DC. Ipê-tamanco FA,CATibouchina granulosa (Desv.) Cogn. Quaresmeira CSTovomitopsis paniculata (Spreng.) Planch. & Triana Guanadirana FA,CA,FSTrema micrantha (L.) Blume Crindiuva CA,CS,FP,FSTypha dominguensis Pers. Taboa FPVataireopsis araroba (Aguiar) Ducke Angelim-araroba FSXylopia sericea A. St-Hil. Imbiu-pimenta FS

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Associados a esta fisionomia foramobservados Gleissolos, Neossolos Flúvicos,Planossolos e, em menor escala, Organossolos(classes modificadas a partir de Takizawa1995). Esses quatro tipos de solo sãoassociados a situações na paisagem onde adrenagem ao longo do perfil é imperfeita. Namaior parte desses solos há um maior acúmulode matéria orgânica nas camadas superficiais,que se decompõe mais lentamente emcondições de hidromorfismo.

É um tipo de vegetação que apresentafisionomia arbórea dominante, formando umdossel fechado e relativamente uniforme, comraros exemplares emergentes. As árvores dodossel atingem de um modo geral alturas entre15-18 metros, enquanto as emergentesalcançam nos trechos mais preservados emmédia 20-27 metros. Nas áreas de várzeas háum predomínio de ipê-tamanco (Tabebuia

cassinoides), guanandí (Symphonia

globulifera) e guanandirana (Tovomitopsis

paniculata), embora outras espécies arbóreastambém sejam comuns no dossel. Entre elasdestacam-se Alchornea triplinervia,Platymiscium floribundum, Genipa

americana, Eriotheca pentaphylla, Myrcia

anceps, Calophyllum brasiliense e Pera

glabrata. Nas faixas meândricas as espéciesarbóreas dominantes são Margaritaria nobilis,Andira anthelmia e várias espécies de Inga

(I. edulis, I. laurina, I. thibaudiana e I. vera).

No sub-bosque é freqüente o domínio deindivíduos jovens de ipê-tamanco, guanandí eguanandirana. São ainda comuns nas áreaspouco perturbadas espécies de MyrtaceaeMelastomataceae, Palmae, Rubiaceae,Leguminosae, Meliaceae, Moraceae,Euphorbiaceae, entre outras. Arbustos earvoretas típicas deste estrato ocorremjuntamente com indivíduos jovens de espéciesarbóreas do dossel, em processo derecrutamento. No estudo das espécies deMelastomataceae da Rebio (Baumgratz et al.

2006), foi apontado que a família é maisdiversificada no sub-bosque, onde estárepresentada por elementos dos gênerosClidemia, Leandra, Ossaea, Miconia eTibouchina e pela espécie Henriettea

saldanhaei. Este autores destacam ainda quemuitas espécies são comuns tanto em morrotesquanto em áreas alagadas.

Em trechos permanentemente inundadosocorrem populações adensadas de tucum(Bactris setosa), enquanto o solo encharcadoé coberto por extensas formações de gravatás,sobretudo da espécie Nidularium procerum.Ervas de folhas largas, principalmente espéciesde Marantaceae, Heliconiaceae e Costaceaesão também muito comuns no estratoherbáceo. A riqueza de epífitas é outracaracterística notável desta unidadefisionômica, representada principalmente porespécies de Bromeliaceae (Aechmea spp.,Bilbergia spp., Vriesea spp. e Tillandsia spp.),Orchidaceae, Araceae (Monstera adansonii)e Cactaceae (Rhipsalis spp.).

No estudo fitossociológico realizado emum trecho de 1 ha desta unidade fisionômica(Guedes-Bruni et al. 2006a) foram amostradas97 espécies, subordinadas a 31 famílias, cujoíndice de diversidade de Shannon (H´) foi de3,98 nats/ind, enquanto a eqüabilidade (J) foide 0,87. Estes valores de riqueza ediversidade são bastante expressivos, emboramais baixos quando comparados com aquelesobservados no estudo realizado em um trechode floresta submontana da Rebio (Guedes-Bruni et al. 2006b).

Figura 6 - Floresta aluvial em faixa meandrica do rio SãoJoão na Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim,Rio de Janeiro.

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Rebio de Poço das Antas: Fisionomia, florística e mapeamento da vegetação

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Em decorrência da construção da Represade Juturnaíba, a situação atual da floresta aluvialna Rebio reflete as diferentes mudançasocorridas na altura do lençol freático. Em váriostrechos observa-se alterações na composiçãoflorística, particularmente no predomínio ou naelevada mortalidade de certas espécies. Comodemonstrado por Scarano et al. (1997), essasvariações locais na composição e na estruturadeste tipo de floresta podem estar associadascom as diferentes estratégias no estabelecimentodas espécies, principalmente em relação atolerância à duração da inundação.

Floresta SubmontanaEsta unidade fisionômica reveste as áreas

elevadas não sujeitas a influência fluvial dasencostas dos morros e morrotes mamelonares.Na compartimentação da paisagem da Rebiosobressai uma elevação central formada poruma série de morros e morrotes, cuja altitudevaria entre 100 e 200 metros. Morrotes isoladosestão distribuídos no entorno dessa elevação,principalmente na porção sudeste onde seexpande a planície aluvial. Esta formaçãoabrange uma área de 1714 hectares,representando 34,3% da Rebio (Tab. 1).

Associados a esta fisionomia foramobservados principalmente Argissolos(associação que cobre aproximadamente 30%da área total da Reserva de Poço das Antas),álicos a moderados, com textura variando deargilosa a muito argilosa. Cambissolo ocorreapenas no Morro da Portuense, o ponto maisalto da Rebio (Takizawa 1995), e há ainda umaassociação dessa fisionomia (somente 2% daárea total da Reserva) com gleissolos, na unidadegeomorfológica denominada de alvéolo(Takizawa 1995), localizada entre as encostasdos morrotes e as várzeas internas. Aocorrência desses gleissolos explica-se peladrenagem imperfeita da água nessecompartimento, que por sua vez recebe todaargila carreada dos pontos mais altos dapaisagem: gleissolos são solos acinzentados pelascondições de hidromorfismo e com alto teor deargila nas camadas superficiais (Embrapa 1999).

Nos locais em bom estado depreservação apresenta fisionomia arbóreadominante, formando um dossel fechado epouco uniforme e ocorrência de árvoresemergentes (Fig. 7). As árvores do dosselatingem alturas entre 17 e 23 metros,enquanto as emergentes alcançam até cercade 30 metros. Entre as espécies que mais sedestacam pelo porte muito elevado estão:jequitibá (Cariniana legalis e Cariniana

estrellensis), garápa (Apuleia leiocarpa),figueira (espécies de Ficus), caingá(Moldenhawera polysperma) e vinhático(Platymenia foliolosa). Destacam-se aindapelo grande número de indivíduosSenefeldera verticillata, Siparuna reginae,Mabea piriri, Casearia sylvestris, Clethra

scabra e Pseudopiptadenia contorta. Emalguns trechos, principalmente em grotasúmidas, são ocasionais os adensamentos de

Figura 7 – Floresta submontana bem preservada na Rebiode Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Figura 8 - Floresta submontana degradada na Rebio dePoço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

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palmito (Euterpe edulis). Em áreas comhistórico de perturbação (Fig. 8),principalmente em florestas secundárias emestados médio a avançado de regeneração,o dossel em geral atinge 10-12 m e, entre asespécies que predominam, sobressaemcarrapeta (Guarea macrophylla), jacatirão(Miconia cinnamomifolia), uvaia(Pourouma guianensis) e imbiú-pimenta(Xylopia sericea).

O sub-bosque geralmente é ralo, ondedominam espécies de Myrtaceae, Rubiaceae,Rutaceae, Euphorbiaceae e Melastomataceae,exceto nos locais com histórico de degradaçãoonde aparecem populações adensadas depindoba (Attalea humilis) e iri (Astrocaryum

aculeatissimum). Entre os arbustos e arvoretasmais freqüentes destacam-se as espécies dosgêneros Psychotria, Geonoma, Leandra,Miconia, Actinostemon e Piper. As lianas sãoabundantes, podendo formar emaranhados nosbordos de mata e clareiras, sendo representadasprincipalmente por Chondodendron

platiphyllum (Menispermaceae) e espécies deSapindaceae (principalmente de Serjania) eLeguminosae (Acacia lacerans, Piptadenia

adiantoides e espécies de Machaerium).O estrato herbáceo é pouco denso,

ocorrendo esparsamente espécies deMarantaceae, Heliconiaceae, Graminea eCyperaceae, além de Pteridófitas. As epífitas sãoocasionais e bem menos representadas nestaunidade vegetacional do que na floresta aluvial.

Guedes-Bruni et al (2006b) em estudofitossociológico realizado em um trecho de 1hectare desta unidade fisionômica encontraram174 espécies, subordinadas a 45 famílias,obtendo valores de 4,549 nats/ind para o índicede diversidade de Shannon (H´), enquanto aeqüabilidade (J) foi de 0,88. Estes valores sãobastante elevados quando comparados com osdados de riqueza e diversidade obtidos no estudode um trecho de floresta aluvial na Rebio.Segundo os autores estes valores também sãomuito expressivos quando comparados aosobtidos por estudos em outros trechos de MataAtlântica (Guedes-Bruni et al 2006a).

A floresta submontana sobre os morrotesde baixa altitude e isolados na extensa planíciealuvial mostra um aspecto mais seco,apresentando maior grau de deciduidade noperíodo de junho a agosto. Na composiçãoflorística destacam-se as espécies arbóreasSenefeldera verticillata, Actinostemon

verticillatus, Anaxagorea dolichocarpa eAnnona cacans (Pessoa 2003). Algumasespécies, tais como Martiodendron

mediterraneum, Vataireopsis araroba eDiplotropis incexis, até o momento só foramencontradas nestas áreas de morrotes isolados.Estas espécies têm preferência por florestasestacionais (Lima 2000), mostrando quefuturos estudos poderão indicar diferenças nacomposição florística de florestas sobremorrotes isolados.

Embora algumas espécies tenham sidoencontradas apenas em florestas de morrosmais baixos e isolados, variações nacomposição florística e na estrutura nogradiente altitudinal da Rebio não sãoexpressivas. Estudos realizados emtoposequência na região da Bacia do Rio SãoJoão (Borém & Ramos 2001; Borém &Oliveira-Filho 2002), mostraram poucadiferenciação ao longo da toposequência econfirmam essa observação.

Em decorrência da forte ação antrópica empassado recente, os ambientes com estafisionomia mostram-se atualmente como ummosaico de áreas em diversos estádiossucessionais. As áreas mais preservadas estãoem geral localizadas nas encostas de alguns morrose morrotes com maior dificuldade de acesso.Porém, devido ao histórico de exploração demadeira da área, particularmente a extraçãode lenha e carvão (IBDF/FBCN 1981), éprovável que mesmo estes trechos em melhorestado de preservação tenham sofridoperturbações antrópicas.

Neves (1999) analisou dois trechos dediferentes idades (20 e 40 anos) em florestasubmontana da Rebio. Apesar das diferençasna composição e estrutura da comunidadearbóreo-arbustiva, foi evidenciada a alta

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Rebio de Poço das Antas: Fisionomia, florística e mapeamento da vegetação

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capacidade de regeneração nas duas áreas.A autora sugeriu ainda que trechos deflorestas secundárias precisam no mínimo40 anos para obter as característicasflorísticas mais próximas de florestaspreservadas. Considerando estes resultados,embora reconhecendo que as áreas noslimites da Rebio ainda sofram impactosantrópicos, pode-se admitir que boa partedas florestas secundárias sobre morros emorrotes estão avançando no processo desucessão natural. É provável que para istoestejam contribuindo os fragmentosflorestais em bom estado de preservação.

Capoeira AluvialUnidade fisionômica resultante de

processos naturais de sucessão, após asupressão total ou parcial, por açõesantrópicas, da cobertura arbórea em áreasde floresta aluvial, podendo ocorrer árvoresremanescentes da vegetação primária. Afisionomia varia conforme o estádiosucessional, sendo ainda fortementeinfluenciada pela intensidade nas mudançasocorridas nas condições locais, principalmentepelas alterações no regime hídrico.

Aos ambientes de capoeira aluvial, demodo semelhante à floresta aluvial, estãoassociados os Gleissolos, Planossolos,Neossolos Flúvicos e Organossolos (Takizawa1995). Portanto, as diferenças florísticas eestruturais dessa fisionomia com a florestaaluvial resultam de ações antrópicaspretéritas e, de modo geral, não devem serassociadas aos tipos de solos. Esta formaçãoabrange uma área de 565 ha, representando11,3% da Rebio (Tab. 1).

Os elementos arbóreos variam entre 3e 5 metros de altura, observando-se variadospadrões fisionômicos de acordo com asespécies dominantes (Figs. 9 e 10).Adensamentos de indivíduos jovens de ipê-tamanco (Tabebuia cassinoides), ouguanandí (Symphonia globulifera), outucum (Bactris setosa), ou embaubinha(Cecropia lyratiloba) são os padrões mais

comuns. Além dessas espécies arbóreas,com certa freqüência são observadosexemplares de Inga laurina , Andira

anthelmia e Rauvolfia grandiflora. Emplanícies aluviais com grande extensão deáreas degradadas, que foram submetidas adrásticas mudanças no regime hídrico, estesadensamentos homogêneos de espéciesacima citadas distribuem-se em mosaicos.Nos locais mais impactados podem serpercebidas manchas diferenciadas, ondepredominam Schinus terebinthifolius ,Trema micrantha e Cecropia glazioui.

Entre as plantas arbustivas mais comunsdestacam-se espécies de Rubiaceae(Psychotria spp.), Melastomataceae(Leandra spp., Clidemia biserrata, Miconia

Figura 9 – Capoeira aluvial com adensamento de ipê-tamanco (Tabebuia cassinoides) na Rebio de Poço dasAntas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Figura 10 – Capoeira aluvial com embaubinha (Cecropia

lyratiloba) na Rebio de Poço das Antas, Silva Jardim,Rio de Janeiro.

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spp. e Tibouchina spp.), Piperaceae (Piper

spp.), Compositae (Baccharis dracunculifolia)e Leguminosae (Aeschynomene sensitiva). Oestrato herbáceo em geral é dominado porespécies ruderais, entre as quais predominamPolygonum acuminatum, Blechnum

serrulatum, Imperata brasiliensis e Panicum

maximum. Em locais geralmente sujeitos ainundação permanente observa-se a ocorrênciade Hedychium coronarium, Costus spiralis eLudwigia quadrangularis.

As condições de inundação, como járeferido para floresta aluvial, estão entre osprincipais fatores limitantes ao estabelecimentodas espécies nesta unidade fisionômica. Éinteressante ressaltar que algumas espéciesutilizam a reprodução vegetativa pararecolonizar trechos degradados sujeitos ainundação. Esta estratégia foi observada porScarano et al. (1997) em Tabebuia

cassinoides e Tovomitopsis paniculata.

Capoeira SubmontanaUnidade fisionômica resultante de

processos naturais de sucessão, após asupressão total ou parcial, por açõesantrópicas, da cobertura arbórea em áreasde floresta submontana, podendo ocorrerárvores remanes-centes da vegetaçãoprimária. Apresenta grande variaçãofisionômica, que é influenciada principalmentepelo estado sucessional e pela forma de vidadas espécies dominantes. Associados a estafisionomia foram observados principalmenteArgissolos, álicos a moderados, com texturavariando de argilosa a muito argilosa(Takizawa 1995). É importante ressaltar que,no caso de áreas que sofreram impactosantrópicos, como as capoeiras submontanas,o alto teor de alumínio pode prejudicar oprocesso de regeneração, interferindo noprocesso de decomposição da matériaorgânica do solo e dificultando oestabelecimento de um número maior deespécies arbóreas. Esta formação abrangeuma área de 213 ha, representando 4,3% daRebio (Tab. 1).

Os elementos arbóreos variam entre 3 e7 metros de altura, observando-se variadospadrões fisionômicos de acordo com asespécies dominantes. Adensamentos dasespécies pixirica (Miconia albicans) epindoba (Attalea humilis) são os padrões maiscomuns em trechos degradados em encostasde morros e morrotes.

Locais com histórico de pertubação maisrecente em geral são ocupados por fisionomiaarbustiva monodominante de pixirica (Miconia

albicans) (Fig. 11). Ainda não se temconhecimento se a alta incidência dessaespécie pode estar associada a um fatoralelopático que dificulta o estabelecimento deoutras espécies. Entre as espécies queocorrem ocasionalmente nesta formaçãoforam observadas Psidium guineense,Clidemia biserrata e Baccharis

dracunculifolia. Raros exemplares decambará (Gochnatia polimorpha) foramobservados nos bordos de capoeiras comadensamento de pixirica, porém não existemestudos sobre o processo sucessional.

Áreas com adensamento de cambará(Gochnatia polimorpha) apresentamfisionomias que variam desde arbustiva atéarbórea (Fig. 12). Em geral ocorremformações monodominantes, porém emmuitos trechos são observados exemplaresarbustivos ou arborescentes dispersosassociados com capim gordura (Melinis

minutiflora). Esta situação parece ser a faseinicial do processo sucessional destascapoeiras. Neves (1999) mencionou que estaespécie é muito eficiente na colonização deambientes alterados, viabilizando oestabelecimento de outras espécies. Em fasessucessionais mais avançadas, outrasespécies, tais como Nectandra oppositifolia,Tibouchina granulosa, Sparattosperma

leucanthum e Siparuna guianensis, são tãocomuns quanto o cambará.

A presença de capoeiras comadensamento de pindoba (Attalea humilis)geralmente é observada em áreas abertas notopo de elevações, em geral próximo a bordos

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Rebio de Poço das Antas: Fisionomia, florística e mapeamento da vegetação

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de fragmentos florestais. Esta ocorrênciapossivelmente é influenciada pela altaincidência de incêndios que proporcionam ascondições ideais para o desenvolvimento destaespécie, ou seja, ambientes abertos comabundância de luz. Na Rebio a palmeira Attalea

humilis pode ser encontrada tanto em ambientede clareira de floresta como em locais perturbados(Souza & Martins 2004). Esta também é apreferência da embaúba (Cecropia glazioui),outra espécie muito comum nas capoeirassubmontanas da Rebio.

Formação pioneira com influência fluvialVegetação herbácea ou arbustiva de

planícies fluviais e depressões aluviais comopântanos e lagoas, sujeitas a inundaçõesperiódicas e/ou permanentes. Esta formaçãoabrange uma área de 997,5 ha, representando20,0% da Rebio (Tab. 1).

Associados a esta fisionomia foramobservados principalmente Organossolos eGleissolos, que ocorrem em áreas alagadiças emvárzeas extensas e ao longo de córregos e dosrios São João e Aldeia (Takizawa 1995). Ambosos solos dificultam a colonização por um númeromaior de espécies lenhosas, seja pela acidezacentuada do solo (Takizawa 1995), seja pelacondição de alagamento mais duradouro. Osbaixos valores de pH dos Organossolos daRebio têm origem tiomórfica, devido à drenagemartificial em muitos trechos da região.

É um complexo vegetacional com grandevariação na fisionomia conforme a altura dalâmina da água e tempo de permanência desta.As comunidades de plantas aquáticas natantesou submersas são constituídas principalmentepor aguapé (Eichhornia crassipes), cabomba(Cabomba aquatica) e lentilha-d’água(Salvinia auriculata). Estas plantas ocorremnas várzeas permanentemente alagadas e emalguns trechos, em geral meandros muitopronunciados, do rio São João (Fig. 13).Algumas áreas alagadas, em geral no entornoda barragem, foram invadidas por gramíneasaquáticas, principalmente algumas espécies dogênero Brachiaria.

Em comunidades de plantas aquáticasgraminóides, geralmente fixadas no substrato,predominam a tabôa (Typha dominguensis) evárias espécies de Cyperaceae, entre as quaispredominam Cladium jamaicense e Cyperus

ligularis (Fig. 14). Associadas a este complexode vegetação de áreas alagadiças, ocorremtrechos de turfeiras formadas principalmentepor Sphagnum sp. Comunidades de plantasarbustivas lenhosas ocorrem, geralmente, naperiferia de locais inundados, onde domina otucum (Bactris setosa).

Na região sudeste da Rebio, abaixo daRepresa de Juturnaíba, encontra-se umagrande planície de inundação, onde este tipode formação apresenta sua maior extensão,circundando pequenos morrotes e algunstrechos de capoeiras aluviais. Alguns trechos

Figura 11 – Capoeira submontana com adensamento depixirica (Miconia albicans) na Rebio de Poço das Antas,Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Figura 12- Capoeira submontana com adensamento decambará (Gochnatia polimorpha) na Rebio de Poço dasAntas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

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desta região foram alterados por impactosantrópicos, particularmente onde dominamvárias espécies de gramíneas, principalmentePanicum maximum e Imperata brasiliensis,bem como densos agrupamentos dasamambaia Pteridium aquilinum. As espéciesarbóreas Cecropia glazioui e Trema

micrantha podem ocorrer dispersas ouformando pequenos aglomerados,normalmente caracterizados unicamente pelapresença de apenas uma destas ou de ambasas espécies (Silva-Matos et al. no prelo).

Em geral distribuída nas áreas limítrofesda Rebio, esta fisionomia encontra-se bastantesujeita a incêndios, particularmente nosperíodos mais secos, e sua cobertura vegetal

fortemente influenciada por sua ação. Silva-Matos et al. (no prelo) apontam a fragilidadedos elementos arbóreos deste ambiente.Embora apresentando diferentes estratégiasem resposta à ação do fogo, seja através daemissão de grande quantidade de plântulas(Trema micrantha) ou da emissão de rebrotos(Cecropia glazioui), ambas se mostramincapazes de competir com a rápida e eficienteregeneração das gramíneas e samambaias.Vale ressaltar a baixa resistência de T.

micrantha a condições extremas dealagamento que, via de regra, ocasionam amorte dos indivíduos.

Campo antrópicoUnidade fisionômica resultante da ação

antrópica, prioritariamente, pelo uso da terra paraatividades agropecuárias, abrangendo grandesextensões de solos empobrecidos, ao mesmotempo que bastante vulneráveis à ação do fogo(Figs. 15 e 16). Estes ambientes campestres estãoassociados majoritariamente com Argissolos, nasáreas de morrote, e com associações entreNeossolos Flúvicos, Planossolos e Gleissolos(Takizawa 1995), nas unidades geomorfológicasde deposição aluvional, como as várzeas. Estaformação abrange uma área de 616 hectares,representando 12,3% da Rebio (Tab. 1).

Nestas áreas predominam, principalmente,plantas invasoras como sapé (Imperata

brasiliensis), capim-gordura (Melinis

minutiflora), capim-colonião (Panicum

maximum) e samambaia (Pteridium

aquilinum). Algumas espécies arbustivas, maistolerantes à luz e à seca, ocorrem consorciadasàs gramíneas: alecrim (Baccharis spp), araçá(Psidium guineense), pixirica (Miconia

albicans e Clidemia biserrata), camará(Lantana camara), embaúba (Cecropia

lyratiloba) e aroeirinha (Schinus

terebinthifolius).Vieira & Pessoa (2001) estudando esta

fisionomia em área de várzea, apontam adistribuição espacial de algumas espécies sobreforte influência das condições edáficas. Aespécie Hedychium coronarium, por exemplo,

Figura 14 - Formação pioneira com influência fluvialcom plantas aquáticas graminoides na Rebio de Poço dasAntas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Figura 13 - Formação pioneira com influência fluvialcom plantas aquáticas natantes na Rebio de Poço dasAntas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

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Rebio de Poço das Antas: Fisionomia, florística e mapeamento da vegetação

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forma agrupamentos densos onde o soloapresenta maiores teores de umidade podendopermanecer, muitas vezes, alagado emdeterminados períodos do ano. Andropogon

bicornis, Imperata brasiliensis,Hyparrhenia rufa e Panicum maximum

predominam em áreas mais secas enquantooutras espécies, a exemplo de Polygonum

acuminatum e Aeschynomene sensitiva, sãotípicas de áreas mais úmidas, porém nãoencharcadas. As autoras destacam também,o predomínio de espécies de gramíneas,Imperata brasiliensis, Hyparrhenia rufa,Panicum maximum e de ervas perenes, aexemplo de Sabicea aspera var. glabrescente,Clidemia biserrata e Scleria sp. e de algumassamambaias como Lygodium volubile eBlechnum serrulatum. Estes grupos (gramíneas,ervas perenes e samambaias) apresentamcaracterísticas que atuam fortemente noprocesso sucessional da comunidade, e

Figura 15 - Campo antrópico com domínio de sapé(Imperata brasiliensis), capim-colonião (Panicum

maximum) e alecrim (Bacharis dracunculifolia) na Rebiode Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro.

Figura 16 - Campo antrópico com domínio de capim-gordura (Melinis minutiflora) na Rebio de Poço das Antas,Silva Jardim, Rio de Janeiro.

representam obstáculos à ocorrência demudanças que propiciem a formação de umacobertura florestada na paisagem.

Um outro aspecto observado por Vieira& Pessoa (2001) refere-se à estratégia derestauração da cobertura vegetal destesambientes. Indivíduos lenhosos uma vezconseguindo ultrapassar a camada degramíneas, e se estabelecendo no terreno, comoexemplares de Miconia staminea, Andira

anthelmia, Dalbergia frutescens,Lonchocarpus cultratus e Guarea guidonia

acabam por constituírem, pequenosaglomerados de uma ou mais espécies dandoinício a formação de moitas. Estas, à medidaem que ocorre seu crescimento em tamanho,acabam por favorecer o estabelecimento destase de outras espécies arbustivas e arbóreas.

CONCLUSÕES

O mapeamento da vegetação daRebio, realizado por meio defotointerpretação e usando fotografiasaéreas na escala 1:20.000, mostrou-se muitoeficiente para uma análise detalhada dasdiferentes fito-fisionomias. Foramdelimitados, respectivamente, 2.608hectares de áreas com florestas em variadosestádios sucessionais, 997,5 hectares deformação pioneira com influência fluvial e1.232 hectares com cobertura não florestalresultantes da ação antrópica, expressas porcapoeiras e campos antrópicos. Esteresultado é uma primeira aproximação dasituação atual da vegetação desta unidadede conservação, que poderá ser utilizadocomo marco para futuras avaliações emonitoramento.

A despeito do histórico de uso e dosimpactos ocorridos em anos recentes,particularmente a alta freqüência deincêndios, ainda é significativo o montante de52% de cobertura florestal remanescente. Oque por um lado torna relevante estepercentual, por outro ressalta a fragilidade emque os mesmos se encontram, face apresença de áreas antropizadas no entorno

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desta unidade de conservação. Os resultadosdo mapeamento, em especial a delimitaçãodas áreas com vegetação natural, subsidiama execução de ações emergenciais queminimizem situações de risco.

O reconhecimento das áreas em melhorestado de preservação se constituirá emferramenta fundamental para os projetos depesquisa em realização, ou a seremimplementados. Por outro lado, a delimitaçãodas áreas degradadas será de grande utilidadepara dimensionar o esforço necessário emestratégias de recuperação dessas áreas.Considerando ainda que a Rebio possui umrepresentativo remanescente de formaçõesflorestais da Bacia do Rio São João, revela-seo alto potencial da área para o estabelecimentode matrizes arbóreas para acompanhamentofenológico, coleta de sementes e produção demudas de espécies nativas.

Por último destaca-se a necessidade decontinuidade de monitoramento da coberturavegetal, fazendo os ajustes necessários eadequando os resultados para o uso de técnicasde sensoriamento remoto. Isto permitirá oacompanhamento de mudanças commetodologia de maior precisão e ampliará acapacidade de previsibilidade de futuroscenários no processo de regeneração das áreasdegradas da Rebio.

AGRADECIMENTOS

Ao Jardim Botânico do Rio de Janeiropelo apoio ao Programa Mata Atlântica; a TheJohn D. and Catherine T. MacArthurFoundation e à Petrobras, cuja alocação derecursos financeiros de longo prazo propiciama execução dos objetivos do Programa MataAtlântica do JBRJ; aos colegas do ProgramaMata Atlântica que, valendo-se de um objetivocomum, através de suas diferentes linhas depesquisas, auxiliaram no processo de obtençãode dados no campo e interpretação de algunsresultados obtidos; aos especialistas querevisaram as identificações do materialbotânico procedente dos vários projetosdesenvolvidos na Rebio; à Dorothy S. D.

Araújo pela revisão do abstract; aosfuncionários do IBAMA, em especial aDionisio M. Pessamiglio, Whitson José daCosta Jr. e Rafael Puglia Neto pelo apoio àsatividades de campo e disponibilização devários documentos sobre a Rebio.

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Anexo 1 - Mapa da Vegetação da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, Rio de Janeiro