CARACTERIZAÇÃO GEOFÍSICA DE ÁREAS UTILIZADAS … · Em geral, a propagação de corrente...

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Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 119 Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette Revista Brasileira de Geociências 32(1):119-134, março de 2002 INTRODUÇÃO A crescente concentração populacional em áreas urbanas e o conseqüente aumento da produção de resídu- os domésticos e industriais vêm gerando muitos problemas relacionados a forma de disposição desses resíduos e consequentemente em relação à contaminação de solos e águas subsuperficiais. Por essa razão, as áreas de disposição de resí- duos, tanto sólidos quanto líquidos, têm merecido especial atenção por parte dos órgãos públicos e instituições de pesquisa relacionados ao meio ambiente, no sentido de avaliar o nível de poluição causado por estes resíduos e procurar estabelecer pro- cedimentos para minimizar seus impactos negativos. É impor- tante ressaltar que no Estado de São Paulo existem pelo menos 2000 sítios que foram ou estão sendo utilizados para disposição de resíduos, e poucos contam com alguma forma de controle ou investigação adequada. Dentro desse contexto, alguns métodos geofísicos vêm sen- do utilizados para detectar e monitorar a contaminação gerada por líquidos percolados dos depósitos de resíduos industriais e urbanos. Devido às características químicas desses resíduos, CARACTERIZAÇÃO GEOFÍSICA DE ÁREAS UTILIZADAS PARA DISPOSIÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS VAGNER ROBERTO ELIS 1 & LÁZARO VALENTIM ZUQUETTE 2 ABSTRACT GEOPHYSICAL CHARACTERIZATION OF URBAN WASTE DISPOSAL AREAS In recent years has been a steady increase in geoenvironmental engineering projects that deal with some kind of contaminant, leading to changes and enhancement in the site characterization techniques. One of the major concerns is the soil and water contamination caused by the waste disposal. In situ testing methods often provides good information about sites affected by groundwater contamination problem where stratigraphical, geotechnical, hydrogeological and other environmental informations are required on a specific and/or screening basis. Geophysical techniques is a good way to get some information required in a good site characterization program. This paper presents and compares results obtained by characterization programs carried out in a deactivated waste landfill and in the actual sanitary landfill areas, in Ribeirão Preto region, State of São Paulo, Brazil. In the first site domestic waste were inappropriate disposed in an area constituted by porous soils overlapping sandstones of Botucatu Formation. The actual sanitary landfill operates according to technical rules in a favorable area, composed by clayey residual soil from basalts of the Serra Geral Formation. The site characterization program included geoelectrical sounding and profiling surveys. The results showed that integrating this geophysical techniques and elaborating a rational planning it is possible to assess the volume of waste, flow path and evaluate the environmental impact caused by the waste disposal. Keywords: Applied geophysics; electrical resistivity; solid domestic wastes. RESUMO Nos últimos dez anos tem havido um aumento contínuo do número de projetos que envolvem a presença de algum tipo de disposição de resíduos contaminantes no solo o que tem levado a mudanças nas técnicas de investigação e caracterização. Para instalação de áreas de disposi- ção de resíduos é necessária a realização de estudos detalhados das características do meio físico, principalmente relacionadas à capacidade dos materiais em atenuar a carga de contaminantes e isolá-la de possíveis aqüíferos, bem como das águas de uma maneira geral. Para tanto é necessário conhecer os materiais geológicos e suas características geotécnicas, hidrogeológicas e físico-químicas, assim como seus arranjos espaciais. Uma fer- ramenta que tem utilização crescente para essa finalidade é a geofísica, principalmente os métodos elétricos, em especial a eletrorresistividade. Neste artigo apresentam-se e discutem-se resultados de estudos realizados no antigo depósito de resíduos sólidos urbanos e no aterro sanitário em ativida- de da Cidade de Ribeirão Preto, São Paulo. No primeiro local foram dispostos inadequademente resíduos urbanos em área de ocorrência de solos arenosos permeáveis e arenitos da Formação Botucatu. O atual aterro sanitário está instalado em área de solo argiloso originado de basaltos e ope- ra de acordo com normas técnicas estabelecidas para esse tipo de empreendimento. Os ensaios realizados foram sondagens e caminhamentos elétri- cos. Os resultados mostram que a aplicação dessas duas técnicas permite estudar o volume de resíduos, o fluxo das águas subsuperficiais e avaliar o nível de alteração causado pelos líquidos percolados no meio ambiente. Palavras-chave: Geofísica Aplicada; Resistividade elétrica; Resíduos sólidos urbanos. 1 Departamento de Geofísica – Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas - Universidade de São Paulo - Rua do Matão, 1226 CEP 05508-900 São Paulo – SP. Fax (11) 3818 5034. E-mail: [email protected] 2 Departamento de Geotecnia – Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo - Av. Trabalhador São Carlense, 400 CEP 13560-250 São Carlos – SP. Fax (16) 273-9509. E-mail: [email protected] que normalmente se refletem em um aumento da condutividade elétrica no local onde estão dispostos, utilizam- se principalmente os métodos elétricos com bons resultados (Benson et al., 1982). Desde o final da década de 60, vários pesquisadores, principalmente na América do Norte, demons- traram que o método da eletrorresistividade poderia ser usado para definir a profundidade e a extensão de um corpo de águas subsuperficiais contaminado, mostrando-se um procedimento mais rápido e de custos mais baixos que o método tradicional de definição da área contaminada pela análise de amostras de água coletada em poços de monitoramento (Stollar & Roux 1975). A aplicação desse método geofísico em estudos relaci- onados a contaminação de águas subsuperficiais, principal- mente por meio das técnicas de sondagem elétrica vertical e caminhamento elétrico, é amplamente relatada na literatura. Trabalhos recentes mostram a grande eficiência e versatilida- de da eletrorresistividade, fornecendo informações importantes em estudos ambientais e hidrogeológicos (Hyoung-Soo & Yeonghwa 1997, Gois et al. 1997, Kollmann & Supper 1997,

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Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 119

Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim ZuquetteRevista Brasileira de Geociências 32(1):119-134, março de 2002

INTRODUÇÃO A crescente concentração populacional emáreas urbanas e o conseqüente aumento da produção de resídu-os domésticos e industriais vêm gerando muitos problemasrelacionados a forma de disposição desses resíduos econsequentemente em relação à contaminação de solos e águassubsuperficiais. Por essa razão, as áreas de disposição de resí-duos, tanto sólidos quanto líquidos, têm merecido especialatenção por parte dos órgãos públicos e instituições de pesquisarelacionados ao meio ambiente, no sentido de avaliar o nível depoluição causado por estes resíduos e procurar estabelecer pro-cedimentos para minimizar seus impactos negativos. É impor-tante ressaltar que no Estado de São Paulo existem pelo menos2000 sítios que foram ou estão sendo utilizados para disposiçãode resíduos, e poucos contam com alguma forma de controle ouinvestigação adequada.

Dentro desse contexto, alguns métodos geofísicos vêm sen-do utilizados para detectar e monitorar a contaminação geradapor líquidos percolados dos depósitos de resíduos industriais eurbanos. Devido às características químicas desses resíduos,

CARACTERIZAÇÃO GEOFÍSICA DE ÁREAS UTILIZADAS PARA DISPOSIÇÃO DERESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS

VAGNER ROBERTO ELIS 1 & LÁZARO VALENTIM ZUQUETTE 2

ABSTRACT GEOPHYSICAL CHARACTERIZATION OF URBAN WASTE DISPOSAL AREAS In recent years has been a steady increase ingeoenvironmental engineering projects that deal with some kind of contaminant, leading to changes and enhancement in the site characterizationtechniques. One of the major concerns is the soil and water contamination caused by the waste disposal. In situ testing methods often provides goodinformation about sites affected by groundwater contamination problem where stratigraphical, geotechnical, hydrogeological and other environmentalinformations are required on a specific and/or screening basis. Geophysical techniques is a good way to get some information required in a good sitecharacterization program. This paper presents and compares results obtained by characterization programs carried out in a deactivated waste landfilland in the actual sanitary landfill areas, in Ribeirão Preto region, State of São Paulo, Brazil. In the first site domestic waste were inappropriate disposedin an area constituted by porous soils overlapping sandstones of Botucatu Formation. The actual sanitary landfill operates according to technical rulesin a favorable area, composed by clayey residual soil from basalts of the Serra Geral Formation. The site characterization program includedgeoelectrical sounding and profiling surveys. The results showed that integrating this geophysical techniques and elaborating a rational planning itis possible to assess the volume of waste, flow path and evaluate the environmental impact caused by the waste disposal.

Keywords: Applied geophysics; electrical resistivity; solid domestic wastes.

RESUMO Nos últimos dez anos tem havido um aumento contínuo do número de projetos que envolvem a presença de algum tipo de disposiçãode resíduos contaminantes no solo o que tem levado a mudanças nas técnicas de investigação e caracterização. Para instalação de áreas de disposi-ção de resíduos é necessária a realização de estudos detalhados das características do meio físico, principalmente relacionadas à capacidade dosmateriais em atenuar a carga de contaminantes e isolá-la de possíveis aqüíferos, bem como das águas de uma maneira geral. Para tanto é necessárioconhecer os materiais geológicos e suas características geotécnicas, hidrogeológicas e físico-químicas, assim como seus arranjos espaciais. Uma fer-ramenta que tem utilização crescente para essa finalidade é a geofísica, principalmente os métodos elétricos, em especial a eletrorresistividade. Nesteartigo apresentam-se e discutem-se resultados de estudos realizados no antigo depósito de resíduos sólidos urbanos e no aterro sanitário em ativida-de da Cidade de Ribeirão Preto, São Paulo. No primeiro local foram dispostos inadequademente resíduos urbanos em área de ocorrência de solosarenosos permeáveis e arenitos da Formação Botucatu. O atual aterro sanitário está instalado em área de solo argiloso originado de basaltos e ope-ra de acordo com normas técnicas estabelecidas para esse tipo de empreendimento. Os ensaios realizados foram sondagens e caminhamentos elétri-cos. Os resultados mostram que a aplicação dessas duas técnicas permite estudar o volume de resíduos, o fluxo das águas subsuperficiais e avaliaro nível de alteração causado pelos líquidos percolados no meio ambiente.

Palavras-chave: Geofísica Aplicada; Resistividade elétrica; Resíduos sólidos urbanos.

1 Departamento de Geofísica – Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas - Universidade de São Paulo - Rua do Matão, 1226 CEP 05508-900 SãoPaulo – SP. Fax (11) 3818 5034. E-mail: [email protected]

2 Departamento de Geotecnia – Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo - Av. Trabalhador São Carlense, 400 CEP 13560-250 São Carlos– SP. Fax (16) 273-9509. E-mail: [email protected]

que normalmente se refletem em um aumento dacondutividade elétrica no local onde estão dispostos, utilizam-se principalmente os métodos elétricos com bons resultados(Benson et al., 1982). Desde o final da década de 60, váriospesquisadores, principalmente na América do Norte, demons-traram que o método da eletrorresistividade poderia ser usadopara definir a profundidade e a extensão de um corpo de águassubsuperficiais contaminado, mostrando-se um procedimentomais rápido e de custos mais baixos que o método tradicionalde definição da área contaminada pela análise de amostras deágua coletada em poços de monitoramento (Stollar & Roux1975). A aplicação desse método geofísico em estudos relaci-onados a contaminação de águas subsuperficiais, principal-mente por meio das técnicas de sondagem elétrica vertical ecaminhamento elétrico, é amplamente relatada na literatura.Trabalhos recentes mostram a grande eficiência e versatilida-de da eletrorresistividade, fornecendo informações importantesem estudos ambientais e hidrogeológicos (Hyoung-Soo &Yeonghwa 1997, Gois et al. 1997, Kollmann & Supper 1997,

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Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

Nascimento et al. 1999).Dessa forma, o método da eletrorresistividade, que mostra-

se eficiente e de baixo custo operacional, caracteriza-se comouma ferramenta adequada ao estudo de áreas de disposição deresíduos, principalmente em países em desenvolvimento, comoo Brasil, onde os problemas ambientais gerados por essa ativi-dade são grandes. Exemplo desse tipo de problema ocorre nacidade de Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, onde até algunsanos os resíduos urbanos foram dispostos de forma inadequa-da, em área constituída por rochas e materiais inconsolidadosarenosos que constituem a principal fonte de água para o con-sumo humano e industrial. Nesse trabalho são apresentados ecomparados os resultados obtidos pela aplicação do método daeletrorresistividade na caracterização da antiga área de dispo-sição de resíduos urbanos, atualmente desativada, e do aterrosanitário em atividade, instalado em local mais apropriado eem operação com supervisão técnica apropriada.

ÁREAS DE ESTUDO A cidade de Ribeirão Preto encon-tra-se na porção nordeste do estado de São Paulo, Brasil (Fig.1), com uma população atual ao redor de 650 mil habitantes,

residuais e retrabalhados (colúvios) com espessuras que variamde 1 a 40 m.

Cerca de 30% da área é caracterizada como zona de recargadireta do aquífero Botucatu que apresenta poços profundos comvazões de até 300 m3/hora. No restante da área os arenitos doaquífero Botucatu encontram-se recobertos por um pacote debasaltos muito fraturados com espessuras variáveis entre 20 e300m, em condição parcialmente confinada. Nesta porção exis-te exploração das águas tanto do aquífero poroso (arenitos)quanto do fraturado (basaltos). No caso do aquífero fraturado,o mesmo está recoberto por um pacote de material inconsoli-dado argiloso que funciona como uma zona de transferência.

A partir dos anos 40 os resíduos produzidos pela ocupaçãourbana e industrial foram dispostos em 4 locais diferentes, sen-do que os dois mais recentes (números 1 e 2) apresentados nomapa da Figura 2 foram estudados por meio de métodosgeofísicos.

Lixão desativado de Ribeirão Preto - Local n° 1 O Localn° 1 é caracterizado como um lixão e foi utilizado a partir dosanos 74/75 até meados do ano de 1989, com uma disposiçãodiária de até 300 toneladas de resíduos oriundos dos mais di-ferentes tipos de fontes. Os resíduos foram dispostos em 2 va-las separadas por uma faixa de 10 m de largura e abertas semnenhum critério técnico.

Considerando as características geológico-geotécnicas utili-zadas por Zuquette et al. (1994) para classificação de áreasquanto à adequabilidade para disposição de resíduos, pode-serelacionar alguns atributos da área em questão que a classifi-cam como desfavorável ou restritiva, de acordo com a Tabela 1.

Aterro Sanitário de Ribeirão Preto – Local n° 2 O Ater-ro Sanitário em atividade, localizado a oeste da cidade, emzona de ocorrência de basaltos, foi implantado em local previ-amente avaliado por meio de estudo de impacto ambiental.Atualmente são dispostos somente os resíduos urbanos, en-quanto os originários dos serviços de saúde são devidamenteincinerados.

O substrato geológico é representado por basalto da Forma-ção Serra Geral, que está recoberto pelo manto de alteração esolos desenvolvidos a partir dessa rocha. Os ensaios diretosrealizados por ocasião da elaboração do estudo de impactoambiental (sondagens SPT, poço piezométrico) forneceram oseguinte perfil para a área:

· Solo + manto de decomposição com espessuras de 15 a 17m até atingir o saprolito. Os solos da área são classifica-dos pedologicamente como latossolos roxos, sendo carac-terizados por textura argilosa (mais de 70% de finos).

· Saprolito (rocha parcialmente decomposta) atingindo pro-fundidades de 20 a 30 m.

· Basalto (rocha fresca) com o topo ocorrendo a profundida-des superiores a 20 m. Apresenta-se como uma camadacompacta, pouco fraturada.

O nível estático estava situado, em maio de 1988, em tornode 19,5 m de profundidade.

De acordo com a classificação proposta por Zuquette et al.(1994) quanto à adequabilidade da área para disposição de re-síduos urbanos, a maioria dos atributos são considerados favo-ráveis a esse tipo de utilização, sendo que apenas a capacida-de de troca catiônica é enquadrada como moderadamente favo-

Fig. 1 – Mapa de localização da cidade de Ribeirão Preto.

44 o

52 o

21 o

25 o

23o

Coberturas C enozóicas

Bacia do Paraná

Em basam ento C rista lino BRASIL

São Paulo

++

+ +

++

+

+

+++

+

+

+

+

+

++

+

+ +

+

+

++

++

M ATO G R O S SOD O SU L

PA R A N Á

M IN A S G ER AIS

OCEANO ATLÂNTICO

Ribeirão Preto

produzindo diariamente em torno de 400 ton de resíduos urba-nos, 15 ton de resíduos relacionados aos serviços da saúde, 100ton de resíduos sólidos industriais e em torno de 1.000 m3 deresíduos líquidos industriais.

A malha urbana ocupa mais de 50% da extensão territorialdo município e apresenta uma taxa de crescimento popula-cional variando de 1,5 a 2% por ano. Uma característica fun-damental está relacionada ao fato que a totalidade da águaconsumida pela cidade para fins residenciais, industriais e como sistema de saúde é de origem subsuperficial, extraída pormeio de poços profundos que apresentam profundidades vari-ando de 40 a 500 m.

Na região afloram os basaltos da Formação Serra Geral e osarenitos da Formação Botucatu, e em áreas restritas, os arenitosda Formação Pirambóia (Fig. 2). Estes tipos rochosos normal-mente estão sotopostos a pacotes de materiais inconsolidados

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rável, como pode ser observado na Tabela 2.

MÉTODO DE LEVANTAMENTO GEOFÍSICO O mé-todo da eletrorresistividade é provavelmente mais utilizado,principalmente a técnica de sondagem elétrica, devido a possi-bilidade de aplicação nos mais diversos campos de estudo,como Mineração, Geologia de Engenharia, Hidrogeologia eestudos ambientais. A resistividade elétrica relaciona-se aosmecanismos de propagação de corrente elétrica nos materiais.Em geral, a propagação de corrente elétrica em solos e rochasse dá devido ao deslocamento de íons dissolvidos na água con-tida nos poros e fissuras, sendo afetada principalmente pelacomposição mineralógica, porosidade, teor em água e quanti-dade e natureza dos sais dissolvidos. Dentre esses fatores, osmais importantes são, sem dúvida, a quantidade de água con-tida e a salinidade dessa água. O aumento do teor de umidadee da quantidade de sais dissolvidos causa uma diminuição dosvalores de resistividade. Essa condição é que permite a imen-sa possibilidade de aplicação do método em estudos ambientaise hidrogeólogicos, onde a presença de água da zona saturada eo aumento da quantidade de contaminantes ricos em sais po-dem ser investigados.

A variedade de técnicas de aplicação de ensaios que possi-bilitam a investigação no sentido vertical (sondagem elétrica)ou lateral (caminhamento elétrico) e uma variedade ainda

Figura 2 – Mapa geológico da região de Ribeirão Preto e a localização das áreas utilizadas para disposição de resíduos.

maior de arranjos de campo (Schlumberger, Wenner, dipolo-dipolo, polo-dipolo, Lee, entre outros) conferem ao métodouma grande versatilidade. Na Figura 3 observa-se as configu-rações de campo de sondagem elétrica e de caminhamentodipolo dipolo. Essas várias possibilidades de aplicação de en-saios de campo permite que a utilização de técnicas e arranjosdiferentes atendam às necessidades de investigação dos maisvariados parâm geológico-geotécnicos para a caracterização daárea e determinação da zona contaminada.

A aplicação de caminhamento elétrico dipolo-dipolo tevepor objetivo o mapeamento da zona contaminada (posição dosresíduos e frente de contaminação) e as sondagens elétricascom arranjos Schlumberger e dipolar a determinação da pro-fundidade da zona saturada e da espessura dos materiaisinconsolidados, além da espessura da camada de resíduos. Esseconjunto de informações é fundamental na caracterização deáreas utilizadas para disposição de resíduos urbanos, em vistadas necessidades de monitoramento para o acompanhamentodos problemas ambientais.

ENSAIOS E RESULTADOS Lixão desativado de Ribei-rão Preto Nesta área foram realizados, entre março de 1995e agosto de 1998 uma série de ensaios geoelétricos cuja locali-zação na área em estudo é apresentada na Figura 4, sendo: 10sondagens elétricas verticais arranjo Schlumberger, com

C entro u rbano (R ibeirã o P reto )

C idade

0 5 10 15 20 K m

ES CALA G R Á FICA

Á reas de es tudo

R ibeirão P reto

Bon fim P aulista

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Cruz das Posses

SP-334

SP

-330

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R io P ard o

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47 55'

21 15'

1

2

1

Q a - C obertu ra A luv inar

JK sg - B asaltos e D iabás ios Fo rm ação S erra G eral

TR Jb - A ren itos F orm aç ão B o tucatu

TR Jp - A ren itos F orm aç ão Piram bó ia

F alha G eo lóg ic a

D renagens

R odov ias

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Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

Tabela 1 – Características da área do Lixão desativado

Tabela 2 – Características geológico-geotécnicas da área do Aterro Sanitário de Ribeirão Preto

Figura 3 – Configuração dos ensaios de sondagem elétrica vertical (a) e caminhamento elétrico dipolo dipolo (b).

I

I

N = 1

N = 2

Níve is teóricos deinvestigação

dipolo transm issor

E

N = E/2

Investigação lateral de vá rios níveis teóricos

S entido do cam inham ento

Inve

stig

ação

vert

ical

empr

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dida

de

A M O N B

a ) Sondagem Elétrica b) Caminhamento E létr ico

E spaçam ento entre eletrodos A e B aum enta a profundidade de investigação

O = ponto de atribuição do ensa io

dipolo receptor

x nx x

A B M 1 N 1

M 2 N2

espaçamento AB máximo de 300 m, denominadas de SEV1 aSEV10; 1 sondagem dipolar axial, com espaçamento E de 100m, denominada de SD11; 9 linhas de caminhamento elétricodipolo-dipolo com espaçamento 10 m, denominadas de C1 aC9; repetição, em períodos diferentes, dos ensaios nas linhasC3 e C4; e 4 linhas de caminhamento elétrico dipolo-dipolocom espaçamento 20 m, denominadas de C1a a C4a.

As SEVs executadas podem ser divididas, basicamente, emdois conjuntos: um representado pelos ensaios realizados den-

tro das cavas preenchidas com resíduos e outro pelos executa-dos fora das cavas. A SEV 7 pode ser considerada como umcaso intermediário, pois foi executada no espaço entre as duascavas, onde há forte influência dos resíduos.

As SEVs 6, 8 e 9, realizadas dentro das cavas, possibilita-ram a definição da espessura da camada de resíduos, comresistividades muito baixas (2,4 a 11 ohm.m), e consequente-mente a base do aterro, definida por valores de resistividademais elevados (367 a 937 ohm.m). Na Tabela 3 são apresenta-

A tr ib u to C a rac te r ís t ica loca l C lasse L ito lo g ia A ren ito F m B o tu catu N ão fav o ráv e l Tex tu ra d o so lo P red . a ren o so N ão fav o ráv e l Va r iação d o p e rf i l h e te ro g ên ea M o d erad a P erm eab i lid ad e d o so lo 1 0-6 a 1 0-4 cm /s M o d erad a a fav o ráv e l C T C < 5 a 7 m eq /1 0 0 g N ão fav o ráv e l a m o d erad a N ív e l d a zo n a sa tu rad a (ab a ix o d a b ase d o a te rro ) 7 a 1 0 m e tro s M o d erad a Á g u as su b te rrân eas Á rea d e reca rg a N ão fav o ráv e l R e lev o D iv iso r to p o g rá fico N ão fav o ráv e l m eq - m iliequiva lente

A tr ib u to C a rac te r ís t ica loca l C lasse L ito lo g ia B asa ltos S e rra G era l M o d erad a a fav o ráv e l P ro f. d o to p o ro ch o so > 2 0 m e tro s F av o ráv el Tex tu ra d o so lo P red . a rg i lo so F av o ráv el Va r iação d o p e rf i l h o m o g ên ea N ão fav o ráv e l P e rm eab i lid ad e d o so lo 1 0-5 cm /s F av o ráv el C T C 7 m eq /1 0 0 g M o d erad a N ív e l d a zo n a sa tu rad a (ab a ix o d a b ase d o a te rro )

> 1 2 m e tro s F av o ráv el

R e lev o E n co s ta su av e (d ec l iv id ad e 5 % ) F av o ráv el m eq - m iliequiva lente

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Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette

Figura 4 – Mapa de localização dos ensaios geofísicos noLixão de Ribeirão Preto.

SE V1L inh a d e C a m in h a m e n to E lé tric o ( D = 1 0 m ) S o n d ag e m E lé tric a Vertic a l

C a v a s c o m re s íd uo s

Legenda:

C 1aL inh a d e C a m in h a m e n to E lé tric o ( D = 2 0 m ) e IP ( D = 1 0 m ) SD 11 S o n d ag e m D ip o la r

O bs. As se tas ind icam o sen tido das lin has de c am inham e nto e lé tric o

C 4detL inh a d e C E d e ta lh e (e s pa ç a /o 2 m )

0 5 0 1 0 0 1 5 0 2 0 0

Escala G ráfica (m etros)

0 50 100 150 200 250 300 350 400

C 1

C 2

C 3

C 4

C 5

C 6

C 7

SE V1

SE V2

SE V4

SE V5

SE V6

SE V8

SE V9 SE V10

SE V3

SE V7

N

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

550

Rib. Preto

Serrana

SD 11

C 1a/C 8

C 2a

C 3a

C 4a

C 4det

C 9

P 1 P o ç o s d e m o n ito ra m e n to

P 1

P 2

P 4 P 3

P 6 P 5

A ltitu d e (m )

Tabela 3 – Modelo geoelétrico das SEVs realizadas sobre cavas.

dos os resultados do modelo geoelétrico obtido para esse pri-meiro conjunto de sondagens.

O posicionamento da zona saturada, além de informações arespeito dos materiais presentes, foram obtidos por meio dainterpretação das sondagens 1, 2, 3, 4, 5 e 10, executadas foradas cavas (exemplo de sondagem pertencente a esse conjuntoé a SEV 5, apresentada na Figura 5). Nessa sondagem, a cama-da com 2328 ohm.m representa o solo residual arenoso queocorre, também, como base do aterro, porém com valores deresistividade bastante inferiores, o que sugere que existe umapercolação de chorume por este material. Os valores de

resistividade elétrica obtidos para a zona saturada variaram de20 a 88 ohm.m. Os resultados obtidos para as SEVs pertencen-tes a esse grupo são apresentados de forma sintética na Tabe-la 4. Os menores valores para a camada 2 ocorrem onde hámaior teor de argila em função da presença de coberturacoluvionar mais espessa.

Os resultados das SEVs mostraram uma grande hetero-geneidade nos modelos geoelétricos obtidos, sobretudo em re-lação às camadas mais superficiais. Essa heterogeneidade elé-trica reflete a intensa mistura de materiais que caracterizam acobertura coluvionar existente na área, resultante de solos re-siduais arenosos (Formação Botucatu) e residuais argilosos eargilo-siltosos (Formação Serra Geral), além da menor oumaior influência da presença de líquidos contaminados.

A sondagem dipolar axial foi realizada com o objetivo deobter a profundidade da zona saturada abaixo das cavas preen-chidas com resíduos. Essas cavas têm cerca de 200 m de com-primento, e por meio de SEVs convencionais não foi possívelatingir a zona saturada sem colocar os eletrodos fora das cavas,o que é desaconselhável devido a possíveis efeitos deheterogeneidade lateral, que poderiam introduzir erros nosresultados da sondagem. O resultado dessa sondagem é apre-sentado na Figura 6, que mostra a posição dos resíduos (3,3ohm.m), a base do aterro (63 ohm.m) e a zona saturada (2ohm.m). A baixa resistividade da zona saturada abaixo da cavaem relação aos valores obtidos nas SEVs executadas fora dosresíduos (20 a 88 ohm.m) denota a percolação do chorume apartir da base do aterro (material residual arenoso de permea-bilidade alta) e contaminação do aquífero.

A realização dos ensaios de sondagem elétrica permitiu de-finir, além das relações entre os resíduos e o meio geológico,algumas características quanto as variações das camadas desolo e, principalmente, a posição da zona saturada. Conside-rando os dados obtidos para a profundidade da zona saturadafoi elaborado o mapa de fluxo das águas subsuperficiais, apre-sentado na Figura 7, que mostra que o sentido do fluxo é pre-dominantemente NE, contrário ao fluxo regional esperado parao Aquífero Botucatu.

As seções de resistividade aparente obtidas nos ensaios decaminhamento elétrico mostraram um forte contraste entre aszonas preenchidas com resíduos (valores de resistividade apa-rente inferiores a 20 ohm.m), as afetadas pela contaminação(valores entre 20 e 200 ohm.m) e o terreno natural (em geral,valores superiores a 200 ohm.m), permitindo assim identificaros locais mais afetados. Essas seções foram interpretadas emodelos 2D foram gerados, possibilitando uma análise maisdetalhada das relações entre os materiais naturais e os resídu-os. É importante ressaltar que os resultados das sondagens elé-tricas serviram de base para a criação de um primeiro modelode cada seção de caminhamento elétrico, que posteriormentefoi refinado por meio de software de modelagem 2D.

C am ad a E sp essu ra (m ) R esist iv id ad e (oh m .m ) In terp re tação 1 0 – 3 ,8 5 8 – 8 7 C o b ertu ra d e ate rro 2 0 – 5 ,3 8 – 11 R esíd u o s 3 7 ,4 – 1 0 ,2 2 ,4 – 7 R esíd u o s + líq u id o s p e rco lad o s 4 - 3 6 7 – 9 3 7 B ase d a cav a

124 Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002

Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

Figura 5 – Curva de campo e interpretação da SEV 5.

Tabela 4 – Modelo geoelétrico obtido para as SEVs realizadas fora das cavas preenchidas com resíduos.

Figura 6 - Interpretação da Sondagem Dipolar (SD11).

Lixão de Ribe irão Preto SEV5

10

10 0

10 00

10 00 0

1 10 10 0 10 00

AB /2 (m )

Rho

(ohm

.m)

0 -

5 -

10 -

15 -

20 -

25 -

30 -

3 14 a 17 24 oh m .m S o lo su pe rf ic ia l

2 24 a 23 28 oh m .mS o lo a rg i lo -areno soe a ren os o seco s

8 8 o hm .mzo n a s atu ra d aS ed . A ren oso s F m B otuca tu

9 08 oh m .m S o lo a re no so ac im a d o N .A .

Lixão de Ribeirão Preto SD11

1

10

10 0

10 0 0

0 ,1 1 10 10 0

n (x 10 m)

Rho

(ohm

.m)

0 -

5 -

10 -

15 -

20 -

25 -

30 -

5 2 o hm .m C ob er tu ra d o a te r ro

3 ,3 o h m .mR esídu o s + ch o ru m e

2 0 8 oh m .mB ase d o a te rroS o lo a ren o so F m B otu ca tu

2 o h m .mz on a satu ra d aS e d. A ren oso s F m B otu ca tu

C am ad a E sp essu ra (m ) R esist iv id ad e (oh m .m ) In terp re tação 1 1 ,6 – 5 ,2 6 1 – 5 6 0 5 S o lo su p e r fic ia l 2 7 ,6 – 1 9 ,5 1 7 1 – 1 8 2 9 2 S . resid u a l / co b e r tu ra

co lu v io n a r (seco s) 3 1 ,2 – 1 3 , 9 9 7 - 1 2 0 0 S o lo res id u a l ac im a d a zo n a

sa tu rad a 4 - 3 1 ,7 2 0 – 8 8 Z o n a sa tu rad a (so lo res id u a l

a ren o so / a ren ito ) 5 - 3 9 5 6 D iab ás io *

*O co rre apenas na SEV 2 .

Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 125

Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette

Figura 7 - Mapa de direção do fluxo subsuperficial definido com base nas SEVs.

A linha C4, apresentada na Figura 8, intercepta as duascavas transversalmente e mostra claramente as posições ocupa-das pelos resíduos (6,7 a 8 ohm.m), a zona de percolação dechorume na base das cavas com resistividade bem inferior (80ohm.m) àquela apresentado pelo solo residual arenoso fora daárea de influência da contaminação (2330 ohm.m). A zonacontaminada dentro do aquífero livre (11 ohm.m) e a zonasaturada não contaminada dentro dos sedimentos arenosos(152 ohm.m) também são individualizadas.

As linhas de ensaio posicionadas fora das cavas preenchidas

S olo s upe rfic ia l - 32 4 ohm .m

S olo a re nos o 23 30 oh m .m

L inha C 4 - C am inham ento E létrico (d ipo lo 10 m etros)m arço de 19 95 - p erío d o de chu vas

Pro

f.Te

óri

ca(m

)

R esis tiv idad e Ap aren te (ohm .m )

Ele

vaçã

o(m

etro

s)

D istânc ia (m etros)

N.A.

EW

0 100 200 300

630 -

610 -

590 -

50 10 0 15 0 20 0 25 0 30 0

-30

-20

-10

0

0 5 10 20 50 10 0 15 0 20 0 50 0 10 00> oh m .m

R esíduo s6,7 oh m .m

R esíduo s - 8 oh m .m

S olo s upe rfic ia l - 32 4 ohm .m

S olo a re nos o 23 30 oh m .m

Zo na sa tu ra da - 1 52 oh m .m Zo na co n tam in ada - 11o hm .m

Zo na de p erco laçã o de cho ru m e - 80 o hm .m

Figura 8 – Seção interpretada da linha C4, no sentido transversal às cavas.

com resíduos foram executadas visando detectar a presença dapluma de contaminação nas cercanias das cavas. Na linha C8,apresentada na Figura 9, observa-se a presença de zona conta-minada dentro da camada saturada (resistividade de 7 ohm.m),que denota o desenvolvimento de uma frente de contaminaçãono sentido NNE. A presença de contaminação aparece desen-volvendo-se do centro para o leste da seção. Nas seçõesposicionadas fora das cavas, pode ser observada a grande vari-ação textural dos solos, desde materiais com maior percentualde argila (valores de resistividade de 91 a 221 ohm.m) a areno-

600 C o ta d o N .A . (m )

L im ites d as p ro p r ied ade s v iz in h as

L im ites d as cav as

LE G E N D A :

0 50 100 150 200 250 300 3500

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

M apa de F luxo das Á guas S ubsuperfic ia is

S en tid o d o F lu x o su bsu per f ic ia l

N

0 50 100 150

P 1 P o ço s de m on ito ra m ento

P 1

P 2

P 6 P 5

P 4 P 3

E SC ALA (m etros )

126 Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002

Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

sos com valores de até 5247 ohm.m, que como já referido an-teriormente, é reflexo da presença da cobertura coluvionar ori-ginada da mistura das rochas básicas e do arenito.

Com o objetivo de analisar a influência de variaçõespluviométricas na área, ensaios foram repetidos em algumaslinhas em diferentes condições de umidade. Esses ensaiosmostram uma relação entre a época de aplicação do ensaio(chuvas ou estiagem) e os valores de resistividade aparente.Como pode ser observado na Figura 10, que apresenta as se-ções de resistividade aparente da linhas C4 obtidas em diferen-tes períodos, a maior pluviosidade nas estações chuvosas estárelacionada a uma diminuição dos valores de resistividade den-tro da zona contaminada, indicando que o conseqüente aumen-to do volume de líquido favorece a sua infiltração, atingindo ascamadas inferiores. Esse comportamento pode ser observadoclaramente nos ensaios executados na Linha C4 em estaçõesclimáticas consecutivas durante o ano de 1995. Um ensaioexecutado nessa mesma linha no de 1998, em período de seca,indica que a área mantém esse comportamento, com o local dosresíduos apresentando valores de resistividade aparente supe-riores aqueles obtidos nas épocas de chuvas.

O conjunto de dados de caminhamento elétrico de março de1995 foi utilizado para a elaboração de mapas de resistividadeaparente dos níveis teóricos 10, 20 e 30 m, os quais possibili-taram uma análise do comportamento da contaminação espa-cialmente. Considerando a zona saturada a cerca de 20 m deprofundidade, o mapa referente ao nível 10 m (Fig. 11) mostrao formato da zona contaminada acima do nível da zonasaturada. Os valores de resistividade aparente inferiores a 200ohm.m podem ser considerados como representativos de con-taminação, pois tem-se em geral nas zonas fora do Lixão valo-res de background sempre superiores, chegando até a 2000ohm.m. Pode-se observar que a contaminação, em geral, ficarestrita a área das cavas, exceto no sentido W, onde aparece

Linha C8 - Caminhamento Elétrico (dipolo 10 metros)m arço de 1995 - pe ríodo de chuvas

Pro

f.Te

óri

ca(m

)E

leva

ç ão

( met

r os)

D is tâ n c ia (m etro s )

N.A.

EW620 -

610 -

600 -

590 -

0 100 200 250

Zona Sa turada - 83 ohm.m

S olo superficial - 500 ohm .m

S olo (contam inado / + argila ?) 98 ohm .m

S olo residua l arenoso - 1000 ohm .m S olo residua l arg ilo-arenoso - 155 ohm .m

Zona con tam inada - 18 ohm .m

50 100 150 200 250

-30

-20

-10

0

Figura 9 – Seção de resistividade elétrica interpretada da linha C8.

uma zona com valores entre 100 e 200 ohm.m. De acordo comos dados do ensaio realizado nesse local, ocorre uma faixa maiscondutora superficial (91 ohm.m) interpretada como uma por-ção mais argilosa ou solo superficial contaminado.

O mapa do nível teórico 30 m caracteriza a zona saturada epossibilita uma visualização do desenvolvimento de uma frentede contaminação a partir das cavas. Esse mapa mostra umaárea com valores de resistividade aparente inferiores a 200ohm.m que caracteriza a zona contaminada se desenvolvendoainda no sentido norte-nordeste (Figura 12). A disposição dosvalores de resistividade aparente para esse nível, sugere, então,que não existem mais resíduos enterrados a essa profundidade,porém ocorre migração vertical da carga contaminante (líqui-dos percolados). Essa situação também é bem caracterizada naseção da linha C4 (vide Fig. 8), bem como nas sondagens elé-tricas executadas diretamente sobre os resíduos. Assim, a con-taminação atinge a zona saturada, e como no nível 20 m, mos-tra a frente se desenvolvendo principalmente no sentido do flu-xo subsuperficial.

Entretanto, apesar desses resultados obtidos pelas técnicasgeofísicas, análises realizadas em águas coletadas em 1991 nospoços de monitoramento existentes (18 anos após a instalaçãodo lixão e 1 ano após sua desativação) e localizados a norte enoroeste (poços n.o 1 e 2) e a leste (poços n.o 3 e 4) das cavaspreenchidas com lixo não apresentaram variações nos parâmmedidos que caracterizassem seguramente contaminação. Es-ses poços têm 20 m de profundidade, suficiente para atingir aparte mais superior do nível d’água. Somente o poço n.o 2apresentou valores anômalos em relação aos demais quanto àsconcentrações dos íons Na+, Cu2+ e Mn++ e valor mais alto decondutividade. Este poço está locado em uma posição, que,segundo os dados geofísicos, estaria sob efeito de contaminação(as localizações dos poços de monitoramento podem ser obser-vadas nas Figuras 11 e 12).

Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 127

Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette

50 10 0 15 0 20 0 25 0 30 0

D istância (m )

-3 0

-2 0

-1 0

0

Pro

f.(m

)

50 10 0 15 0 20 0 25 0 30 0

D istância (m )

-3 0

-2 0

-1 0

0

Pro

f.(m

)Lixão de R ibeirão Preto (SP)

Seções de Resistividade Aparente - Linha C4 (D ipolo 10 m etros)

09.03 .19 95 - P eríodo C hu vo so (chuvas na se m ana ante rio r)

15 .09 .1 995 - P eríodo E s tia gem(se m chuvas na sem an a anterio r)

24 .11 .19 95 - P eríodo C huvo so(se m chuvas na sem an a anterio r)

50 10 0 15 0 20 0 25 0 30 0

Distância (m )

-30

-20

-10

0

Pro

f.(m

)

10 .08 .19 98 - F ina l p eríodo d e es tiage m (chuvas b ran das há do is d ias)

Va lores de res is tiv idade aparente

50 10 0 15 0 20 0 25 0 30 0

D istância (m )

-3 0

-2 0

-1 0

0

Pro

f.(m

)

0 5 10 20 50 10 0> ohm .m

Figura 10 – Seções de resistividade aparente da linha C4 para períodos secos e chuvosos.

Essa situação sugere que se os ensaios geofísicos fossemrealizados de forma regular e anterior a instalação desses po-ços, certamente estes seriam locados e dimensionados maisracionalmente e uma análise mais cuidadosa das suas águaspoderia levar a outros resultados, que seriam de grande utilida-de na avaliação da contaminação. A anomalia condutora exis-tente no mapa de resistividade indica que existe uma frente decontaminação desenvolvendo-se a partir dos resíduos e cami-nhando no sentido nordeste, seguindo o fluxo subsuperficial.

Aterro Sanitário de Ribeirão Preto Na área do aterro sa-

nitário em atividade de Ribeirão Preto, foram realizados, entrejulho de 1995 e julho de 1998, os seguintes ensaios: 6 linhas decaminhamento elétrico dipolo-dipolo com espaçamento de 10m, denominadas de C1 a C6, e em períodos diferentes, as li-nhas C1, C4 e C7 foram repetidas; dez sondagens elétricasverticais, arranjo Schlumberger, com AB máximo de 300 m,denominadas de SEV1 a SEV10; 1 sondagem dipolar axial,com abertura “n” de 200 m, denominada de SD11; e 3 linhasde caminhamento elétrico dipolo-dipolo com espaçamento de20 m, denominadas de C1, C3 e C7 (as linhas C1 e C3 são asmesmas para os arranjos com espaçamentos 10 e 20 m).

128 Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002

Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

0

10

20

50

100

150

200

500

1000

Rho Aparen te (ohm .m )

N

L im ites das Cavas

Cercas (lim ites das p ropriedades viz inhas)

Poços de M on ito ram en toP 1

0 50 100 150 200 250 300 350 400

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

550

P 1

P 2

P 3P 4

P 6 P 5

0 50 100 150 200

E SC A LA (m etro s)

LE G E N D A

Figura 11 – Mapa de resistividade aparente do nível 10 m,mostrando a área de baixa resistividade que caracteriza aárea de influência dos resíduos acima da zona saturada.

0

10

20

50

100

150

200

500

1000

Rho Aparente (ohm .m )

L im ites das Cavas

L im ites das p ropr iedades viz inhas N

Poços de M on itoram en toP 1

0 50 100 150 200 250 300 350 400

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

550

P 1

P 2

P 4

P 6 P 5

P 3

0 50 100 150 200

E SC A LA (m etros)

LE G EN D A

Figura 12 – Mapa de resistividade aparente do nível 30 m,mostrando uma área de baixa resistividade que caracteriza acontaminação gerada pelos resíduos dispostos atingindo azona saturada.

A localização desses ensaios na área em estudo é apresenta-da na Figura 13 e as SEVs podem ser divididas, assim como naárea do Lixão de Ribeirão Preto (Local no 1), em dois conjun-tos: o primeiro representado pelas sondagens executadas nocorpo do aterro (SEVs 4, 5 e 6) e outro representado pelos en-saios realizados fora dos resíduos.

A definição da espessura da camada de resíduos, comresistividades baixas (5 a 16 ohm.m) e da base do aterro, comvalores de resistividade mais elevados (79 a 760 ohm) foi dadapelas SEVs executadas no corpo dos resíduos, que encontram-se na Tabela 5.

A grande variação dos valores de resistividade obtidos paraa base do aterro sanitário pode ser devida a uma maior influ-ência dos líquidos percolados, pois a SEV que apresentou omenor valor (SEV 5 - 79 ohm.m) está posicionada muito pró-xima do local onde os líquidos são re-infiltrados para recircu-lação nos resíduos.

O outro grupo, representado pelas sondagens posicionadasnos entornos do aterro sanitário, possibilitou a caracterizaçãodos diversas camadas de solo e das posições do nível da zonasaturada e do topo basalto inalterado, sendo que os resultadosestão apresentados de forma resumida na Tabela 6.

Na época de realização dos ensaios (julho de 1995) a zonasaturada estava posicionada entre 15,1 e 20,4 m de profundi-

dade, caracterizado por valores de resistividade entre 2,5 e 57ohm.m. Alguns valores muito baixos podem caracterizar a in-fluência de contaminantes na zona saturada, principalmente sefor levado em consideração que as sondagens onde ocorreramos valores mais baixos (SEVs 3 e 10) estão praticamente nasbordas do aterro sanitário. Porém, mesmo que alguma conta-minação esteja atingindo as águas subsuperficiais, o desenvol-vimento de uma frente de contaminação não está evidente nosresultados geofísicos, como será mostrado mais adiante. Alémdisso, devido a textura argilosa do solo, que com a presença deágua apresenta valores de resistividades baixos, existe a possi-bilidade de uma pequena quantidade de íons ser suficiente paracausar uma sensível diminuição da resistividade elétrica.

O topo do basalto inalterado está posicionado em torno de30 m de profundidade, e é representado por valores de resistivi-dade entre 185 e 1900 ohm.m. Essa variação nos valores deresistividade provavelmente ocorre em função de variação dograu de fraturamento e de alteração da rocha. As profundida-des obtidas para o nível da zona saturada e o topo rochoso sãobastante coerentes com aquelas definidas pelo poço piezo-mé-trico existente na área.

A sondagem dipolar axial foi realizada com o mesmo obje-tivo do área do lixão de Ribeirão Preto, ou seja, definir a posi-ção da zona saturada sob a área preenchida com resíduos (Fi-

Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 129

Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette

gura 14), que tem forma aproximadamente quadrada com cer-ca de 300 x 300 m, e por meio de SEVs convencionais não foipossível atingir a zona saturada. Com a sondagem dipolar,novamente o problema foi resolvido, e a zona saturada estavaposicionada a cerca de 8 m abaixo da base do aterro, situaçãopróxima da favorável (mínimo de 10 m) de acordo com a pro-posição de Zuquette et al. (1994) para áreas favoráveis à insta-lação de aterros sanitários.

Com a definição da posição da zona saturada pelas sonda-gens elétricas foi elaborado o mapa de fluxo subsuperficialapresentado na Figura 15, onde pode ser observado que o sen-tido principal do fluxo local é para norte.

Os ensaios de caminhamento elétrico dipolo-dipolo possibi-litaram determinar as relações entre os resíduos e os materiaisgeológicos naturais. Como ocorreu na área do Lixão de Ribei-rão Preto, os locais preenchidos com resíduos apresentaramvalores de resistividade aparente muito inferiores aos obtidospara os materiais geológicos, possibilitando a definição dasáreas afetadas e da estrutura espacial do aterro sanitário.

Na Figura 16 é apresentada a seção C1 (dipolo 10 m), quemostra as relações espaciais entre a área preenchida com resí-duos (4,5 ohm.m), a base do aterro (solo residual de basalto,

com 185 ohm.m), a zona saturada (24 ohm.m) e a rocha inal-terada (450 ohm.m). Nessa seção, pode ser observada a espes-sura máxima da camada de resíduos na época, de cerca de 20m, e o nível d’água encontrava-se a cerca de 26 m de profun-didade nessa posição.

A seção C4, executada fora da área do aterro (no sentido dofluxo subsuperficial) não mostrou zonas de baixa resistividadena zona saturada que poderiam caracterizar efeitos da contami-nação. Essa seção está apresentada na Figura 17, onde podemser observadas as relações entre os vários materiais existentese, inclusive, a presença do túnel que dá acesso ao aterro sani-tário sob a faixa de rolamento da rodovia.

O conjunto de dados obtidos possibilitou delimitar as áreasocupadas pelos resíduos e as posições das camadas de solo,zona saturada e rocha sã, que constituem atributos importantesno estudo de áreas utilizadas para disposição de resíduos.

De forma análoga ao que foi feito na área do lixão, algumaslinhas foram executadas em períodos distintos, e mostraramvariação dos valores de resistividade aparente para a área ocu-pada pelos resíduos. Na linha executada fora da área do ater-ro sanitário (C4), a variação é sensível apenas para os níveisteóricos menos profundos (10 e 15 m). Observando os períodosem que foram executados os ensaios e as condições de chuvasna época, os resultados sugerem uma relação entre o aumentoda quantidade de água e uma diminuição dos valores deresistividade aparente dentro dos resíduos, como observa-se naFigura 18.

Esses ensaios realizados em períodos distintos na linha C1mostram um aumento da área de baixa resistividade (menorque 20 ohm.m) e uma diminuição dos valores de resistividadedentro dessa área (intervalo de 0 a 10 ohm.m) nas estações cli-máticas de maior pluviosidade, e principalmente, em seguidaa períodos chuvosos. Esse contexto mostra que a infiltração deáguas pluviais é um fator indesejável, pois o aumento do volu-me infiltrado ocasiona um incremento na geração de chorume,e consequentemente uma potencial contaminação das águassubsuperficiais.

Como pode ser observado nas seções geoelétricas, a variaçãodos valores de resistividade aparente sugerem que a infiltraçãodas águas pluviais no maçico de resíduos contribui de formasignificativa para o aumento do volume de líquidos contami-nantes. Um outro aspecto que deve ser levado em consideraçãonessa análise é que, por se tratar de um empreendimento emoperação, ocorre um aumento progressivo do volume de resídu-os dispostos, sendo os perfis topográficos nas seções relativosà época de aplicação dos ensaios. Esse aumento do volume deresíduos pode também ter uma parcela de influência nessa va-riação dos valores de resistividade, mas o aumento da grau desaturação dentro dos resíduos é o fator mais importante.

Os ensaios de caminhamento elétrico dipolo dipolo fornece-ram dados para a elaboração de mapas de resistividade aparen-te para várias profundidades, as quais possibilitaram umavisualização do comportamento da área contaminada. Dessaforma, foram elaborados mapas com os dados obtidos em junhoe setembro de 1995, os quais mostram que a zona contamina-da fica mais restrita à área do aterro sanitário, não sendo for-te a indicação de uma frente de contaminação evoluindo nazona saturada. De acordo com os resultados das SEVs os ma-pas dos níveis 20 e 30 m estão representando profundidadesabaixo da zona saturada (parcialmente, no mapa 20 m, pois nocentro do aterro a zona saturada está mais distante da superfí-cie, devido a maior espessura de resíduos). Dessa forma, o

Lim ites do A terro

Sondagem Schlum berger

Sondagem Dipola r

Linha de Cam inham ento D ipo lo-d ipo lo

1

11

C2

LEGENDA

N

Rib. Preto

Dumont

1

2

3

4

5

6

11

7

8

9

10

C1

C2

C3

C4

C5

C6

C70 50 100 150 200 250 300 350 400 450

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

550

O bs: As se tas indicam o sentido das linhas de cam inhamento elétrico

0 50 100 150

Escala Grá fica (m etros)A ltitude (m )

ATS4

ATS5

ATS7

ATS5 Poços de m onito ram en to

605

Figura 13 - Localização dos ensaios geofísicos realizados noaterro sanitário de Ribeirão Preto.

130 Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002

Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

Tabela 5 – Modelo geoelétrico das SEVs realizadas sobre osresíduos.

Tabela 6 – Resultados das SEVs executadas fora da área ocupada pelos resíduos.

C am a da E spessu ra (m ) R esist iv idade (ohm .m ) In terp reta ção 1 0 ,7 – 3 ,1 11 - 1 7 C o b e r tu ra d e a te r ro

(+ res íd u o s ? ) 2 1 0 ,8 – 2 2 ,4 5 - 1 6 R es íd u o s + ch o ru m e 3 7 9 - 7 6 0 S o lo d e b asa lto (b ase d o a te rro )

C am ad a E sp essu ra (m ) R esist iv id ad e (oh m .m ) In terp re tação 1 0 ,7 – 1 ,8 3 9 – 6 2 * 1 5 3 -9 2 6 S o lo su p e r fic ia l 2 1 ,7 – 1 0 ,7 1 4 – 1 3 2 * 6 4 7 - 5 4 3 9 S o lo res id u a l seco 3 2 ,7 – 1 5 ,4 5 0 – 4 8 0 S o lo res id u a l ac im a d a zo n a

sa tu rad a 4 - 8 ,3 – 1 8 ,5 2 ,5 - 5 7 Z o n a sa tu rad a (so lo res id u a l

d e b asa lto / sap ro l ito ) 5 - 1 8 5 - 1 9 0 0 B asa lto

Aterro Sanitário de Ribeirão Preto SD11

1

10

100

1000

0,1 1 10 100

n (x 10 m)

Rho

(oh

m.m

)

Perfil Geoelétrico

0 -

5 -

10 -

15 -

20 -

25 -

30 -

14 ohm .m Cobertura do aterro + resíduos

7 a 14 ohm .mResíduos + chorum e

1123 ohm .mBase do aterroSo lo/saprolito Fm S erra Gera l

10 ohm .mzona sa tu radaSo lo/saprolito Fm S erra Gera l

Figura 14 – Curva de sondagem dipolar (SD 11) e interpretação.

mapa do nível 30 m é o mais indicado para análise da ocorrên-cia de contaminação. Esse mapa, apresentado na Figura 19,caracteriza principalmente a zona saturada e como citado an-teriormente, não indica estar havendo migração da frente decontaminantes, pois os valores de resistividade aparente infe-riores a 50 ohm.m ficam restritos à área ocupada pelos resídu-os. Pode ser observado que os valores de resistividade aparentemenores que 10 ohm.m não ocorrem mais, como acontecia nosníveis superiores, indicando que nessa profundidade a influên-cia dos resíduos ou de líquidos percolantes é menor.

Por outro lado, em algumas sondagens elétricas posicio-nadas nas bordas do aterro sanitário, os valores de resistividadeobtidos para a zona saturada foram bastante baixos (menoresque 10 ohm.m), sugerindo a presença de contaminantes. Então,de acordo com os resultados obtidos pelos ensaios geofísicos,

nessa área, embora pudesse estar ocorrendo a entrada de líqui-dos percolados em pontos abaixo e muito próximos do aterro,na época ainda não parecia estar ocorrendo migração dessacontaminação nas águas subsuperficiais. Isso é confirmadopelos dados dos poços de monitoramento existentes na área doaterro que, em análise de parâm físico-químicos das águas dejulho de 1998, realizada pelos responsáveis pelo aterro sanitá-rio, mostravam resultados dentro das normas (Tabela 7).

CONCLUSÕES Os resultados obtidos mostram que a apli-cação dos ensaios geoelétricos permitem a obtenção de dados,que criteriosamente interpretados, levando-se em consideraçãoa geologia local e observando-se as limitações das técnicas,fornecem uma gama de informações para o estudo de áreascontaminadas pela disposição de resíduos urbanos. A utiliza-ção das técnicas de sondagem elétrica e caminhamento elétri-co mostram o grande potencial de aplicação dos métodos elé-tricos no estudo da contaminação gerada por áreas de disposi-ção de resíduos. Os resultados obtidos pelos ensaios geofísicospermitiram uma avaliação das áreas de disposição de resíduosquanto às características do meio físico (nível d’água, fluxosubterrâneo, espessura dos materiais inconsolidados, presençade fraturas) e quanto às relações entre os resíduos e o local dedisposição (detecção e delimitação da zona de influência e ava-liação da intensidade de contaminação).

Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 131

Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette

Os resultados obtidos no Lixão de Ribeirão Preto possibili-taram determinar que:

- o sentido local do fluxo das águas subterrâneas, que apresentaduas tendências: para norte-nordeste, principalmente, epara norte-noroeste. Essa disposição é confirmada pelosmapas de resistividade aparente, que mostram a plumadesenvolvendo-se, principalmente, no sentido norte-nor-deste.

- a contaminação atinge a zona saturada, que está posicionadaentre 7 e 10 m abaixo da base das cavas.

- Nos períodos chuvosos, os valores de resistividade para azona contaminada decrescem sensivelmente, indicando

que a maior quantidade de chuva causa um aumento nageração de chorume.

- Os mapas de resistividade aparente mostram o desenvolvi-mento de uma pluma de contaminação, e que os poços demonitoramento estão mal posicionados. Os dados da aná-lise físico-química das águas desses poços mostram alte-ração apenas no poço de número 2, que de acordo com osdados geofísicos está localizado na área de influência dapluma. Esse fato vem fortalecer a idéia de que o posicio-namento dos poços de monitoramento foi planejado ina-dequadamente.

No aterro sanitário de Ribeirão Preto, os resultados obtidosmostram que:

- No local há apenas um sentido de fluxo subsuperficial, queé para norte;

- Os resultados geofísicos não indicam que os contaminantesestejam migrando até a zona saturada, embora em algu-mas sondagens elétricas posicionadas nas bordas do ater-ro, os valores de resistividade obtidos para o nívelsaturado foram bastante baixos (menores que 10 ohm.m),sugerindo a presença de contaminantes.

- Os mapas de resistividade aparente mostram que a zona con-taminada fica mais restrita à área do aterro, sugerindo nãoexistir uma frente de contaminação evoluindo na zonasaturada.

- Nos períodos chuvosos, da mesma forma que ocorreu para aárea do Lixão, os valores de resistividade para a zonacontaminada decrescem sensivelmente, indicando que amaior quantidade de chuva causa um aumento na geraçãode chorume.

Esse conjunto de informações obtidas mostra que os méto-dos elétricos constituem-se em uma ferramenta eficiente no

0 50 10 0 15 0 20 0 25 0 30 0 35 0 40 0 45 00

50

10 0

15 0

20 0

25 0

30 0

35 0

40 0

45 0

50 0

55 0

N

L im ites do A te rro S an itá rio

S entido do fluxo

0 50 100 150 200

E SC A LA (m etros)

602 C ota da zona sa turada

LEG EN D A

Mapa de Fluxo Subterrâneo (definido através de SEVs)

Figura 15 – Mapa de fluxo subsupeficial na área do Aterrode Ribeirão Preto.

Figura 16 – Seção modelada de resistividade elétrica da Linha C1.

Linha C1 - Caminham ento Elétrico(dipolo 10 m etros) Ju lho de 1995 - P e ríodo de E s tiagem

Pro

f.Te

óric

a(m

)

D is tância (m )

620 -

610 -

600 -

590 -

580 -

Ele

vaçã

o(m

)

SSE NNW

0 100 200 300 400

Resíduos - 4,5 ohm.m

Solo superficial - 80 ohm .m

Solo residual - 185 ohm.m

Zona saturada - 24 ohm.mBasalto - 450 ohm.m

N.A.

50 100 150 200 250 300 350 400

-30-20-10

0

0 5 10 20 50 100> ohm .m

132 Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002

Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

Figura 17 – Linha C4, executada a norte do aterro sanitário, fora da área com resíduos.

Linha C 4 - C am inham ento E létrico(d ipo lo 10 m etros) Ju lho de 1995 - P eríodo de Es tiagem

Pro

f.Te

óric

a(m

)

Z ona sa turada - 35 ohm .m

S olo - 707 ohm .m

S olo supe rfic ia l - 184 ohm .m

B as a lto - 1500 ohm .m

T úne l (a r) - 50 .934 ohm .m

D istância (m )

610 -

600 -

590 -

580 -

Ele

vaçã

o(m

)

N.A.

0 100 200 300 350

N E SW

50 100 150 200 250 300

-30

-20

-10

0

Valores de resistiv idade aparente em ohm.m

Linha C1 (19.07.1995)

Aterro Sanitário de Ribeirão P reto (SP)S eç õ es d e R e s is tiv id a d e A p are n te - L inh a C 1 (D ip o lo 1 0 m etro s)

5 0 1 00 1 50 2 00 2 50 3 00 3 50 4 00

D is tâ ncia (m )

-30-20-10

0

Pro

f.(m

)

5 0 1 00 1 50 2 00 2 50 3 00 3 50 4 00

D is tâ ncia (m )

-30-20-10

0

Pro

f.(m

)

L inha C 1 (23.06.1996)

Período Estiagem

Período de Estiagem (sem chuvas na sem ana anterio r)

5 0 1 00 1 50 2 00 2 50 3 00 3 50 4 00

D is tâ ncia (m )

-40-30-20-10

0

Pro

f.(m

)

L inha C 1 (05.11.1996)Iníc io do Período Chuvoso (chuvas na sem ana anterior)

0 5 1 0 2 0 5 0 1 00 1 50 2 00 3 00 > 50 0 oh m .m

Valores de resistiv idade aparente

Figura 18 – Seções de resistividade aparente da Linha C1 executadas em diferentes períodos climáticos.

Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002 133

Vagner Roberto Elis & Lázaro Valentim Zuquette

NL im ite s da Á rea

0

10

20

50

100

150

200

300

500

700

1000

R ho A p .(ohm .m )

0 50 100 150 200 250 300 350 400 4500

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

550

0 50 100 150

E SC A LA (m etros)

ATS4

ATS5

ATS7

ATS4 P oços de M on ito ram en to

Figura 19 - Mapa de resistividade aparente para o nível teó-rico 30 metros.

Tabela 7 - Dados da análise físico-química das águas dos poços do Aterro Sanitário (Fonte DURSARP – Depto de Urbaniza-ção e Saneamento de Ribeirão Preto)

P arâm etros P oço AT S.4 (07 .1998 ) P oço AT S 5 (07 .1998 ) P oço AT S 6 * (07.1998) p H 5 .4 0 5 .3 8 6 .1 0 C o r ap a ren te (P tC o ) 1 1 3 3 1 1 2 T urb id ez (N T U ) 2 2 ,2 3 ,4 2 ,9 C o n du tiv id ad e (m h o ’s/cm ) 5 .6 3 x1 0-5 8 .7 3 x1 0-5 7 .1 5 x1 0-5 S ó lid o s to tais d isso lv. (m g /l) 5 2 .0 0 6 9 .0 0 9 1 .0 0 S ó lid o s s usp en sos 5 6 4 S ó lid o s s ed im en táv e is < 0,1 0 ,1 < 0,1 N itra to N O3

- (m g /l N ) 0 .0 0 1 0 .0 8 4 1 .0 5 2 N itr i to N O 2

-(m g /l N ) 0 .0 0 1 0 .0 0 2 0 .0 0 1 N H 4 + (m g /l N ) 0 .0 1 2 0 .0 0 1 0 .0 0 9 S O4

- (m g /l ) 3 ,3 8 3 ,2 9 3 ,6 6 O x ig ên io C o n su m id o (m g /l ) < 1 < 1 < 1 O x ig ên io D isso lv id o (m g/ l) 4 ,0 4 ,0 3 ,8 C l- (m g /l ) 1 .0 0 9 .0 0 1 .0 0 P O4 (m g /) < 0,00 1 < 0,00 1 < 0,00 1 D u reza To ta l (m g /l C aC O3) 2 1 3 0 2 9 A lc . C a rbo n ato (m g/l C aC O3) 0 0 0 A lc . H id róx ido (m g /l C aC O3) 0 0 0 A lc . B ica rb o na to (m g/l C aC O3)

2 4 2 0 2 4

S u rfac tan tes (m g /l) < 0,01 < 0,01 < 0,01 Ó leo s e g rax as (m g /l) < 1 < 1 < 1 F enó is (m g /l) < 0,00 1 < 0,00 1 < 0,00 1 M n (m g /l) 0 ,0 1 0 0 ,3 3 0 0 ,0 0 4 A l (m g/l) < 0,00 1 < 0,00 1 < 0,00 1 Z n2 + (m g /l ) 0 .0 1 3 0 .0 0 7 0 .0 0 3 P b+ + (m g /l ) 0 .0 0 1 0 .0 0 1 0 .0 0 1 F e3 + (m g /l ) 0 .3 1 9 0 .3 4 9 0 .3 3 5 C a2 + (m g /l ) 6 .3 5 6 .0 1 8 .7 3 M g 2 + (m g /l ) 2 .3 2 2 .3 9 2 .5 7 C o li fo rm es To ta is (N M P / 1 00 m l) 3

< 2 < 2 < 2

* Localizado fora da área do Aterro, cerca de 400 m etros a leste do ATS5. 1 P tC o: m g/l de m istura de platina e cobalto (padrão de cor) 2 NTU: unidade nefelom étrica de turbidez 3 NM P/100m l: n. m ais provável de coliform es para 100m l de am ostra

estudo de áreas de disposição de resíduos. Os atributos anali-sados nas duas áreas de estudo denotam a importância da ins-talação desse tipo de empreendimento em locais adequados doponto de vista geológico e geotécnico. No Lixão estudado, quefoi implantado sem critérios técnicos em ambiente geológicoinadequado, existe uma pluma de contaminantes migrandodos resíduos para a zona saturada. No caso do aterro sanitário,instalado em local mais apropriado e em operação orientadapor critérios técnicos, os resultados indicam que os contami-nantes estão restritos a área ocupada pelos resíduos, não ocor-rendo migração até as águas subsuperficiais.

Agradecimentos Agradecemos à FAPESP pela auxílio con-cedido para a realização do projeto de pesquisa e ao CNPq pelofinanciamento do trabalho de doutorado do primeiro autor.Aos autores da RBG pelas sugestões aos manuscritos.

134 Revista Brasileira de Geociências, Volume 32, 2002

Caracterização geofísica de áreas utilizadas para disposição de resíduos sólidos urbanos

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Manuscrito A-1257Recebido em 20 de setembro de 2001

Revisão do autor em 20 de dezembro de 2001Revisão aceita em 24 de dezembro de 2001