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    Apostila de Cardiologia UFPR

    Research · August 2015

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    Frederico Ramalho Romero

    Universidade Federal do Paraná

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    Available from: Frederico Ramalho Romero

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    CARDIOLOGIA - 1

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁCardiologiaEstenose mitral

    Anatomia

    É importante se ter uma noção da anatomia da valva mitral para que nós possamosentender a fisiopatologia da estenose mitral.

    A valva mitral encontra-se fixa ao óstio mitral, localizado entre o átrio e oventrículo esquerdos e é constituída por um anel fibroso e duas cúspides, uma anterior e outra

     posterior. Por isso, a valva mitral também é denominada de valva bicúspide.Aderidas as extremidades livres de ambas as cúspides, encontramos as cordas

    tendíneas primárias, secundárias e terciárias. Ao conjunto dessas cordas dá-se o nome decordoalhas tendíneas, que estão presas ao endocárdio pelos músculos papilares, doisanteriores e dois posteriores.

    Fisiopatologia

    Figura 1 - Anatomia da valva mitral

    Figura 2 - Fisiopatologia da estenose mitral

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    Quando a valva mitral se encontra aberta ela tem uma área de 4 a 6 cm². Comessa abertura, há uma boa vazão sangüínea do átrio para o ventrículo esquerdo.

     No ritmo sinusal normal, nós temos um ciclo pressórico nas cavidadescardíacas que se mantém mais ou menos constante.

     No ventrículo esquerdo, a pressão sistólica máxima é de120 mmHg, que é igual a pressão sistólica da aorta.

    Diferentemente da pressão diastólica da aorta que é decerca de 80 mmHg, a pressão diastólica inicial do ventrículoesquerdo (PD1) é próxima de 0 mmHg, enquanto a pressãodiastólica final (PD2), que corresponde a pressão máxima doventrículo esquerdo antes de se iniciar a sístole ventricular,varia de 12 a 15 milímetros de mercúrio.

    Como a pressão diastólica é exercida pelo acúmulo desangue proveniente do átrio esquerdo e das veias pulmonares,

    semelhantemente, a pressão diastólica nessas estruturastambém varia entre 12 e 15 mmHg.

    Contudo, essas são medidas de pressão normais, quandoa abertura da valva mitral é de 4 a 6 cm². Quando sua aberturafor inferior a essa medida, nós vamos ter caracterizada uma

    estenose mitral. Nessas condições, vai haver um acúmulo de sangue no átrio esquerdo e,

    conseqüentemente, um aumento da pressão diastólica nessa estrutura. A diferença de pressãoentre essa “nova” pressão atrial esquerda (> 15 mmHg) e o ventrículo esquerdo (12 mmHg <PD2 < 15 mmHg) recebe o nome gradiente de pressão. É esse gradiente que caracteriza aestenose mitral sob o ponto-de-vista hemodinâmico.

    Como resultado, vai haver tanto uma hipertrofia do átrio esquerdo quanto umaumento de pressão nos vasos pulmonares (hipertensão pulmonar), que vai ser tanto maiorquanto maior for o gradiente de pressão do átrio esquerdo.

    Em resposta a essa variação na pressão dos vasos pulmonares, o ventrículodireito, que normalmente tem uma pressão sistólica de cerca de 30 mmHg, também vai sehipertrofiar.

    Esse aumento de pressão pulmonar pode causar transudação dos capilares pulmonares, provocando edema intersticial e manifestando-se clinicamente por dispnéia progressiva aos esforços.

    Quando nós temos uma hipertensão pulmonar severa e crônica, já ao nível de

    80 mmHg  nas artérias pulmonares, pode-se desenvolver um espessamento dos capilares pulmonares com fibrose ao redor dos vasos, reduzindo a quantidade de edema intersticialagudo. Isso também ocorre devido aos vasos linfáticos estarem mais desenvolvidos edrenarem melhor este excesso de líquido.

    Esse espessamento fibrótico ocorre principalmente ao nível da camada médiados capilares e pode manifestar-se por cianose, além da dispnéia.

     Nessa fase da estenose mitral, onde existe doença vascular pulmonar associada,o prognóstico se torna muito ruim, mesmo que a estenose seja tratada.

    Os sintomas da estenose mitral geralmente aparecem após a área valvarreduzir-se cerca de 50% do normal e atingir 1,5 a 2 cm2. A dispnéia e as palpitações são asqueixas mais habituais. Elas podem ocorrer isoladamente ou coexistir em dado momento.

    Figura 3 - Ciclo pressóriconormal do coração

    6 mmHg 

    30 mmHg6 mmHg

    0 mmHg 

    120 mmHg12 mmHg 

    0 mmHg 

    12 mmHg 

    30 mmHg

    120 mmHg

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    Epidemiologia

    A estenose mitral tem uma maior incidência no sexo feminino numa proporçãode 60 a 70% dos casos.

    Etiologia

     No nosso meio, sua principal etiologia é adoença reumática (98%). Raramente, ela écongênita.

    A febre reumática é uma doença inflamatóriaaguda não supurativa, geralmente recorrente, queacomete principalmente crianças entre 5 e 15 anosque apresentaram uma infecção faringítica porestreptococos -hemolítico do grupo A de

    Lancefield. Nessa patologia, anticorpos contra o

    estreptococo agem também sobre o coração(reação cruzada), podendo provocar espessamentoe fusão comissural da valva mitral, resultando emconseqüente estenose mitral quando a aberturavalvar for inferior a 4 cm².

    A redução da abertura mitral é um processomuito lento que pode levar décadas.

    Complicações

    Dentre as principais complicações da estenose mitral nós temos odesenvolvimento de arritmias atriais (principalmente a fibrilação atrial), que ocorrem devidoao aumento do volume do átrio esquerdo.

     Na fibrilação atrial deixa de haver a sístole atrial, responsável por cerca de 20 a30% do volume do débito cardíaco. Desta forma, além da dispnéia, o paciente também vaiapresentar sintomas de fadiga ou cansaço.

    O aumento do átrio esquerdo cria condições favoráveis para o desenvolvimento

    de arritmias atriais devido ao estiramento das fibras musculares e dos feixes de condução.

    Figura 4 - Espessamento e fusão comissuralda valva mitral na febre reumática

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    A estenose mitral também propicia aformação de trombos no apêndice atrialesquerdo e, mais tardiamente, na parede atrial.Ao se desprenderem, esses trombos podemcausar acidentes vasculares cerebrais, infartos

    esplênicos, etc.Quando há hipertensão pulmonar podeocorrer ruptura das paredes arteriais quecomunicam-se com os alvéolos e que, então,são eliminadas juntamente com a tosse(hemoptise). Essa situação subentende que aárea valvar deve ter atingido valores cerca de1,1 cm2.

    Uma complicação que ocorre devido aoedema intersticial pulmonar é odesenvolvimento de bronco-infecções

     pulmonares.Ainda, a estenose mitral pode predispor ao

    desenvolvimento de endocardite infecciosa. Porém, das valvopatias reumáticas, a estenosemitral é a que tem menor incidência de endocardite infecciosa.

    Outra complicação que ocorre numa fase muito avançada e que, por isso, éextremamente incomum é o tromboembolismo pulmonar decorrente de trombose venosa

     profunda dos membros inferiores provocada pela estase venosa causada pela insuficiência doventrículo direito.

    Exame físico

     Na inspeção, pode-se observar umacaracterística da estenose mitral severa com doençavascular pulmonar, que é a fácies mitralis. A fáciesmitralis caracteriza-se por cianose perioral e edema malarcom hiperpigmentação.

    À palpação, pouco se obtém quando aestenose mitral é leve. Porém, na estenose moderada ou nasevera, pode-se palpar um frêmito diastólico quecorresponde a sensação tátil do sopro da estenose mitral.

    Se houver hipertensão pulmonar cominsuficiência do ventrículo direito, ele se desenvolve,dilata e hipertrofia-se, podendo ser palpável com a mãoem garra na borda esternal esquerda.

    Às vezes, a primeira bulha pode tambémser palpada, sugerindo uma mobilidade da cúspideanterior até certo ponto preservada.

     Na ausculta, nós vamos observarhiperfonese da primeira bulha, denotando persistência deflexibilidade das cúspides, ou então, o seu abafamento porcalcificação.

    Figura 5 - Trombos atriais

    Figura 6 - Fácies mitralis  

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    A segunda bulha também pode estar hiperfonética quando houver hipertensão pulmonar devido a pressão exercida pelos vasos pulmonares, que podem fazer a valva pulmonar se fechar muito mais bruscamente.

    Semelhantemente, a força exercida pelo ventrículo direito para abrir a valva pulmonar nesse regime de hipertensão pode gerar a ausculta de um clique de ejeção (estalido

     proto-sistólico).A valva mitral, por sua vez, devido ao seu espessamento, pode dar origem a umclique de abertura (estalido protodiastólico), que sucede a segunda bulha após intervalo detempo inversamente proporcional à hipertensão atrial esquerda e que também permite supormobilidade das cúspides de certa forma preservada, pois ele desaparece em caso decalcificação importante das mesmas.

    Finalmente, quando a abertura mitral for igual ou inferior a 1 cm² pode-seauscultar um ruflar (ou sopro) diastólico. Dependendo do tempo de duração desse sopro nós

     podemos caracterizar a gravidade da estenose, ou seja, quanto mais demorado for o sopro,mais severa é a estenose.

    O sopro da estenose mitral é audível no período mesodiastólico, logo após o

    relaxamento isovolumétrico e, às vezes, também está presente na fase pré-sistólica. Porém,como na estenose mitral geralmente ocorre fibrilação atrial, a sístole atrial não se processa e,conseqüentemente, não ocorre sopro nessa fase.

    Como a maior parte do sopro da estenose mitral é produzido por um fluxo passivo de sangue do átrio para o ventrículo esquerdo e a contração atrial tem uma intensidaderelativamente baixa, seu som é de baixa freqüência e, desta forma, é melhor auscultável com acampânula do estetoscópio.

    Ainda, na dependência da sístole atrial, a quarta bulha pode ser audível.Graficamente, o sopro diastólico da estenose mitral pode ser representado da

    seguinte maneira.

    A complementação do exame físico inclui o exame da tireóide, pois aconcomitância com hipertireoidismo deve ser sempre cogitada em casos de fibrilação atrial; a

     procura de hepatomegalia, edema de membros inferiores e ascite; e a propedêutica pleuro- pulmonar.

    Lesões associadas

    Associada a estenose mitral, pode ocorrer uma insuficiência tricúspide quegeralmente é funcional (não orgânica). Ela ocorre devido a dilatação do ventrículo direito comconseqüente dilatação do anel fibrótico da valva tricúspide, impedindo que seus folhetos se

    Figura 7 - Representação gráfica do sopro da estenose mitral

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    fechem adequadamente. Quando essa insuficiência é pequena, tratada a estenose mitral, ela pode regredir. Porém, quando ela for importante, faz-se necessário tratamento cirúrgico.

    O sopro sistólico dessa insuficiência tricúspide, audível ao nível da bordaesternal esquerda, deve ser diferenciado de uma insuficiência mitral associada. Um meio dediferenciá-los são as manobras de apnéia pós-inspiratória e pós-expiratória, que intensificam,

    respectivamente, o sopro da insuficiência tricúspide e o sopro da insuficiência mitral.Também devido a dilatação do ventrículo direito, os folhetos da valva pulmonar podem sofrer separação e não conseguir se fechar normalmente. Com isso, surgeum chiado característico causado pelo refluxo de sangue da valva pulmonar, ao qual se dá onome de sopro de Graham-Stiel.

    Como a principal causa da estenose mitral é a febre reumática, podeocorrer acometimento de outras valvas simultaneamente, especialmente da valva aórtica.

    Exames complementares

    Através do eletrocardiograma (ECG), pode-se detectar aumento doátrio esquerdo através do alargamento da onda P, aumento do ventrículo direito através dodesvio do complexo QRS para a direita, presença de arritmias atriais (principalmente afibrilação atrial), etc.

    Figura 8 - Eletrocardiograma de um paciente com estenose mitral

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     Na radiografia de tórax póstero-anterior (PA), nós observamos umdiscreto aumento da silhueta cardíaca principalmente devido ao aumento do ventrículo direito.Também pode ser observado um duplo contorno na altura do átrio direito, que ocorre devidoao crescimento do átrio esquerdo, cuja margem vai se aproximar da borda do átrio direito.

    Outras evidências do aumento do átrio esquerdo incluem presença de 4o

      arco na bordacardíaca esquerda e elevação do brônquio fonte esquerdo. Na radiografia torácica em perfil, pode-se observar o ventrículo

    direito encostando na borda esternal e, além disso, o Raio-X contrastado com bário podeevidenciar o deslocamento posterior do esôfago provocado pelo aumento do átrio esquerdo.

    Com relação a circulação pulmonar, além de identificar graus dedilatação da artéria pulmonar, muitas vezes já suspeitada pela ausculta do estalido proto-sistólico, o estudo radiográfico também pode mostrar uma redistribuição da circulação

     pulmonar e edema intersticial entre as fissuras dos lobos.

    O ecocardiograma é o examecomplementar mais específico para odiagnóstico da estenose mitral. Ele mostra aanatomia da valva mitral; o comprometimento

    do aparelho valvar e subvalvar (cordoalhastendíneas), que podem sofrer fibrose;dimensiona volumes e diâmetros das câmarascardíacas; estima pressões, bem como o grau dehipertensão arterial pulmonar; reconhecedisfunção ventricular esquerda; quantifica emcentímetros quadrados a área valvar mitral;revela trombos atriais; e identifica lesõesassociadas, como a valvopatia aórtica evegetações de endocardite infecciosa.

    Figura 9 - Raio-X de tórax, em PA e perfil, de um paciente com estenose mitral

    Figura 10 - Ecocardiograma unidimensional

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    O cateterismo cardíaco caiu em desuso com o advento daecocardiografia. Ele só é indicado para pacientes com indicação cirúrgica que necessitem deum estudo pormenorizado sobre suas coronárias.

    Diagnósticos diferenciais

    A hipertensão pulmonar primária idiopática pode ser confundidacom a hipertensão pulmonar da estenose mitral. Porém, um exame mais cuidadoso do

     precórdio, principalmente, vai ser capaz de fazer esse diagnóstico diferencial.

    O mixoma de átrio esquerdo éum tumor pediculado que se instala na parede atrial e

    desenvolve um tubérculo que dificulta o esvaziamentoquando ocorre a sístole atrial, mimetizando asintomatologia de uma estenose mitral.

    Existe também uma doençacongênita denominada cor triatriatum  na qual existe a

     persistência embrionária de uma terceira câmara atrial quetem um orifício de saída estenosado, funcionandoexatamente como uma valva mitral estenosada.

    Com o passar do tempo, esseorifício que não acompanha o crescimento normal docoração torna-se mais estreito, manifestando-seclinicamente ao redor da adolescência.

    O tratamento desta patologia é

    Figura 11 - Ecocardiograma bidimensional (IVS = Septo interventricular; RV = Ventrículo direito; AO= Aorta; AoV = Valva aórtica; LV = Ventrículo esquerdo; MV = Valva mitral; PW = Parede posterior;LA = Átrio esquerdo)

    Figura 12 - Mixoma atrial

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    cirúrgico, no qual se retira a membrana que separa essa 3 a câmara atrial do restante do átrioesquerdo.

    Tratamento

    O tratamento da estenose mitral é muito importante porque os pacientes quedesenvolvem hipertensão pulmonar e não são tratados têm uma sobrevida média de 2 a 5

    anos.Enquanto assintomático, o portador de estenose mitral necessita somente de

    medidas de profilaxia para doença reumática e para endocardite infecciosa.A presença de sintomas já admite a aplicação de medidas terapêuticas.A primeira recomendação é sempre de ordem higiênico-dietética e de controle

    de eventuais doenças associadas. Na evolução, a farmacoterapia inclui, mais comumente, areversão de fenômenos congestivos por diuréticos; o controle de taquicardia por -

     bloqueadores ou digitálicos; a reversão ou a prevenção de arritmias supraventriculares pordrogas como quinidina, amiodarona, digitálicos e -bloqueadores; e a prevenção de embolia

     pela anticoagulação oral ou por heparina, dependendo da situação.Cirurgicamente, existem basicamente três tratamentos para esta patologia.

    Quando nós temos uma estenose mitral com uma qualidade valvar boa, ou seja, sem fibroseou calcificação, pode-se realizar uma valvoplastia por cateter balão para se tentar corrigir essaestenose.

    Para realizar essa valvoplastia disseca-se a veia femoral e dirige-se até o interioro átrio direito. Então, perfura-se o septo interatrial próximo ao forame oval e insere-se ocateter no átrio esquerdo. A pequena CIA (comunicação interatrial) que é formada se fechanaturalmente.

     Na próxima etapa é inserido um fio guia pelo interior do cateter, que seráresponsável pelo direcionamento do balão (ainda desinsuflado) até o nível da valva mitralestenosada.

    Figura 13 - Cor triatriatum  

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    Finalmente, insufla-se o balão para se obter uma dilatação da abertura mitralalém da abertura crítica de 1,5 cm². Geralmente, quando se realiza uma valvoplastia porcateter balão, obtém-se uma média de abertura de 2,1 cm².

    Raramente se consegue uma abertura de 4 cm² numa valva uma vez estenosadadevido ao espessamento de seus folhetos e da fusão comissural. Contudo, uma estenose de 2 a

    4 cm² não apresenta sintomatologia.A mortalidade de uma valvoplastia por cateter balão é inferior a 1%.Porém, para a utilização do balão, nós temos que ter somente fusão comissural.

    Quando há fibrose ou calcificação do aparelho valvar ou subvalvar é necessário cirurgia porque o balão só age nos folhetos valvares.

    Por fim, quando a valva mitral está tão dura, tão estenótica, que não se conseguemais “consertá-la”, procede-se a colocação de uma prótese valvar.

    A abertura média das próteses é de 1,9 a 2,2 cm², o que é suficiente para mantero paciente assintomático.

    A taxa de mortalidade na colocação de próteses é de cerca de 8%.

    Figura 14 - Desenho esquemático da colocação de uma prótese valvar mitral

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁCardiologiaInsuficiência mitral

    Anatomia

    A insuficiência mitral é a falta de coaptação entre as cúspides da valva mitral, quenão se unem de forma harmônica.

    Epidemiologia

    Ao contrário da estenose mitral, a insuficiência mitral ocorre maisfreqüentemente nos homens.

    Figura 1 - Anatomia da valva mitral 

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    Etiologia

    A insuficiência mitral pode ser causada principalmente por:  Rompimento das cordoalhas tendíneas 

    A endocardite bacteriana, por exemplo,

     pode causar ruptura das cordoalhas tendíneas e levar a uma insuficiência mitralleve ou grave.

    O trauma pode provocar ruptura das

    cordas tendíneas causando uma insuficiência mitral geralmente leve, mas quetambém pode ser grave.

      Insuficiência coronariana A falta de irrigação de uma região com isquemia

    leve de um músculo papilar pode levar a um prolapso da cúspide valvar para oátrio esquerdo. Porém, isso pode ser revertido corrigindo-se a isquemia.

    A isquemia grave de um músculo papilar geralmente gera um infarto, o que pode levar a uma insuficiência mitral permanente.

    Caso o infarto seja agudo, comrompimento do músculo papilar, ocorre umquadro de insuficiência mitral grave, comedema agudo de pulmão, que é umasituação dramática e que constitui umaemergência cirúrgica.

    Figura 2 - Ruptura das cordoalhastendíneas causada por endocarditeinfecciosa

    Figura 3 - Rompimento do músculo papilar (seta)provocado por infarto agudo do miocárdio

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      Doença reumática 

    Cerca de 1/3 dasvalvopatias reumáticas manifesta-se

     por fibrose do aparelho subvalvar,

    com encurtamento, contração efusão das cordoalhas tendíneas econseqüente retração dos folhetosmitrais. Ou seja, cerca de 1/3  dasvalvopatias reumáticas apresenta-secomo uma insuficiência mitral.

      Miocardiopatias 

    A miocardiopatia dilatada pode levar a uma dilatação dosanéis átrio-ventriculares causando uma insuficiência que pode ser mitral e/outricúspide.

     Nessa patologia não ocorre uma alteração anatômica nosaparelhos valvares e subvalvares, mas apenas uma inadequada coaptação entresuas cúspides. Por isso, pode-se dizer que essa insuficiência é funcional.

    A miocardiopatia hipertrófica também pode gerar umainsuficiência mitral leve por provocar uma hipertrofia dos músculos papilares econseqüentemente um processo isquêmico crônico, com fibrose e retraçãodesses músculos.

     

    Doenças congênitas  Defeito do coxim endocárdico;  Fibroelastose endocárdica;  Valva mitral em pára-quedas;  Outras.

      Estiramento das cordoalhas tendíneasComo ocorre algumas vezes após uma

    micose aguda, que pode levar a uma síndrome do prolapso da valva mitral, naqual um dos folhetos, geralmente o posterior, fica frouxo e pode everter para o

    átrio esquerdo. Nesse caso, geralmente ocorre uma insuficiência mitral leve semtendência a evolução.

      Outras causas  Calcificação idiopática do ânulo mitralOcorre principalmente em mulheres

    idosas e pode ter causa degenerativa;   Lupus Eritematoso Sistêmico;  Artrite Reumatóide;  Espondilite Anquilosante.

    Figura 4 - Fibrose do aparelho subvalvar nafebre reumática

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    Fisiopatologia

     Na insuficiência mitral, como suas cúspides não se unem de forma harmônicadurante a sístole ventricular, ocorre regurgitação de sangue para o átrio esquerdo.

    Esse refluxo gera uma redução do esvaziamento para a aorta, ou seja, umaredução da fração de ejeção, por dois fatores.

    Primeiro, obviamente, porque há uma perda do sangue ventricular para o átrioesquerdo e, segundo, porque vai ocorrer uma diminuição da pressão sistólica nesse ventrículo

    devido a essa abertura na cavidade ventricular.Ao longo dos anos, pode ocorrer uma adaptação do coração esquerdo com

    aumento progressivo do átrio esquerdo e com hipertrofia ventricular e posterior dilatação. Na insuficiência mitral aguda, que decorre, por exemplo, da ruptura de um

    músculo papilar por infarto ou trauma, como o átrio vai estar com sua complacência normal,vai ocorrer um aumento de pressão no sistema pulmonar de maneira muito rápida, com edemaagudo de pulmão e, clinicamente, uma dispnéia súbita e inexplicada.

     Na insuficiência mitral crônica, seu desenvolvimento ao longo dos anos vai promover uma dilatação do átrio esquerdo, que vai ter, então, sua complacência aumentada, preservando o sistema pulmonar.

     Neste caso, muitas vezes, quase não há sintomatologia por um longo período

    de tempo. A doença reumática freqüentemente causa esse tipo de insuficiência.Várias situações podem causar uma insuficiência mitral intermediária em

    relação a essas duas anteriores, dependendo da complacência do átrio esquerdo em cada umadelas.

    Além disso, a insuficiência mitral também pode ser classificada eminsuficiência mitral com leve, moderado ou grave refluxo.

    Clinicamente, em função dessa situação de adaptação do átrio esquerdo nasinsuficiências mitrais crônicas, o paciente pode evoluir de uma insuficiência leve para umainsuficiência grave sem apresentar sintomas.

    Geralmente, a sintomatologia só vai se manifestar quando ocorredescompensação.

    Figura 5 - Fisiopatologia da insuficiência mitral

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    CARDIOLOGIA - 15

     Nesse caso, pode ocorrer dispnéia rapidamente progressiva devido ao aumentogradual da pressão pulmonar, ao contrário da estenose mitral, na qual ocorre um quadro dedispnéia lentamente progressiva.

    Contudo, apesar da dispnéia da insuficiência mitral evoluir mais rapidamente,como, em geral, o coração tolera melhor a sobrecarga de volume do que a de pressão, sua

    sintomatologia pode permanecer muito mais tempo ausente do que a da estenose.Também, como na descompensação o ventrículo esquerdo já está na fase dedilatação e o débito cardíaco não está mais eficiente, o paciente pode relatar fadiga muscular.

     Numa fase mais avançada da doença, a hipertensão pulmonar pode causar umainsuficiência cardíaca direita e uma conseqüente sintomatologia congestiva. Porém, comoessa evolução é muito longa, essa situação só ocorre raramente.

    Exame físico

     Na inspeção, o ictus cordis pode ser visível.

    À palpação, podemos detectar um frêmito sistólico normalmente localizado noápice do ventrículo esquerdo.

    Às vezes pode-se palpar a 3a e a 4a bulhas cardíacas. Contudo, deve-se registrarque as bulhas são melhor auscultadas do que palpadas.

    Caso haja hipertensão pulmonar também é possível se palpar a impulsãosistólica do ventrículo direito através da manobra da mão em garra na borda esternal esquerda.

     Na ausculta, geralmente se observa um sopro holossistólico que pode serclassificado em 1, 2, 3 ou 4 cruzes, de acordo com a sua intensidade.

    Quanto maior a sua intensidade, mais severa é a insuficiência mitral.Graficamente, o sopro da insuficiência mitral pode ser representado da seguinte

    maneira:

    Ao contrário do que normalmente ocorre, como as cúspides mitrais estãoinsuficientes e não se fecham adequadamente, o componente tricúspide pode estar mais fortedo que o mitral, principalmente nas insuficiências severas.

     Na presença de hipertensão pulmonar também é possível se auscultar um soprode ejeção ao nível do foco pulmonar, provavelmente devido a dificuldade que o ventrículodireito encontra para ejetar seu sangue contra esse novo gradiente de pressão entre o sistema

     pulmonar e ele. Na insuficiência mitral crônica severa, pode-se auscultar a 3a bulha, devido ao

    maior volume de sangue que vai para o ventrículo na fase de enchimento ventricular rápido,

    Figura 6 - Representação gráfica do sopro da insuficiência mitral

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    associada a um aumento da freqüência cardíaca, caracterizando o “ritmo em galope” e

    indicando uma insuficiência cardíaca esquerda.A 4a bulha, correspondente a sístole atrial, é melhor auscultada na insuficiência

    mitral aguda.

    Uma característica importante do sopro da insuficiência mitral que pode

    auxiliar no diagnóstico diferencial do sopro da estenose aórtica é a sua irradiação. Na estenose aórtica ocorre uma irradiação principalmente para os vasos da

     base, enquanto que na insuficiência mitral a irradiação ocorre predominantemente no sentidoda região axilar posterior, porque esta é a região de melhor projeção do átrio esquerdo.

    Por isso, nós ainda podemosintensificar o sopro da insuficiência mitral

     posicionando o paciente em decúbito lateralesquerdo porque nós vamos estaraproximando o átrio esquerdo da paredetorácica.

    Outra maneira de intensificar osopro da insuficiência mitral é através damanobra de apnéia pós-expiratória. Destaforma, nós vamos estar aumentando a pressãointrapulmonar e determinado um maior fluxode sangue para o átrio e, conseqüentemente,

     para o ventrículo esquerdo, que vai então,intensificar o som desse sopro.

    Exames complementares

    Devido ao aumento de volume do átrio esquerdo, ocorre umestiramento das fibras e dos feixes miocárdicos, facilitando a ocorrência de arritmias atriais,

     principalmente a fibrilação atrial.

    Através doeletrocardiograma, nós podemosdetectar uma onda P bífida, indicandodilatação atrial esquerda, ou nos casoscom maior grau de evolução, aausência de onda P, que é substituída

     por ondulações irregulares, de pequena

    Figura 8 - Ausculta do precórdio em decúbitolateral esquerdo

    Figura 9 - Eletrocardiograma demonstrando ausência deondas P e presença de ondas f, características de FibrilaçãoAtrial

    Figura 7 - Diferenciação entre o sopro de uma insuficiência mitral crônica severa, à esquerda, e de umainsuficiência mitral aguda, à direita

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    amplitude, chamadas ondas f, demonstrando uma fibrilação atrial.Ainda, outros tipos de arritmias atriais que pode ser visualizadas pelo

    ECG são o flutter atrial, no qual as ondas P são substituídas por ondulações em “dente -de-serra”, regulares e mais amplas que as ondas da fibrilação atrial, chamadas de ondas F; e a

    extra-sístole atrial.

    A sobrecarga ventricular esquerda pode ou não ser demonstrada,sendo eventualmente acompanhada de alteração da repolarização ventricular.

    A radiografia do tórax em incidência póstero-anterior(PA) nos mostra um aumento da silhueta cardíaca devido

     principalmente ao aumento do átrio esquerdo, que pode servisualizado através do duplo contorno do átrio direito, da

     presença do 4o  arco na borda cardíaca esquerda e daelevação do brônquio-fonte esquerdo.

    O aumento ventricular esquerdo pode ser visto principalmente através da inserção do ápice cardíaco sobre odiafragma.

    Ainda em PA, observa-se um aumento do calibrevascular pulmonar, especialmente nas porções superiores do

     pulmão, devido a redistribuição da circulação pulmonar.Em perfil, pode-se observar aumento atrial esquerdo

     principalmente quando contrastado pela ingestão de bário; e,na insuficiência mitral descompensada com hipertensão

     pulmonar, um aumento do ventrículo direito.

    Figura 10 - Eletrocardiograma de um paciente com insuficiência mitral

    Figura 11 - Radiografia torácicaem PA na insuficiência mitral

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    O ecocardiograma contribui nodiagnóstico da insuficiência mitral ena sua provável etiologia; no grau dehipertensão pulmonar e dainsuficiência cardíaca; na presença

    de trombos intracavitários; etc.O cateterismo cardíaco entrouem desuso com a ecocardiografia e,atualmente, só é usado na pesquisade insuficiência coronariana em

     pacientes acima dos 45 anosindicados para cirurgia.

    Tratamento clínico

    Recomenda-se uma diminuição da ingestão de sal e auxilia-se naexcreção de sódio com a administração de diuréticos.

    Quando há insuficiência cardíaca, trata-se-a com digitálicos, principalmente para os casos com fibrilação atrial; e vasodilatadores.

    O tratamento cirúrgico deve ser indicado no momento adequado, quandonós observamos que a cirurgia vai trazer mais benefícios do que riscos para o paciente. Paraisso, nós devemos acompanhar de perto o desenvolvimento da insuficiência mitral com oauxílio dos exames complementares. Quando começar a haver deteriorização do ventrículo

    esquerdo, pode-se indicar uma plastia mitral ou uma troca por prótese biológica ou metálica.

    Figura 12 - Ecocardiograma unidimensional, acima, e ecodopplercardiograma, abaixo, demonstrando orefluxo atrial esquerdo da insuficiência mitral (RV = Ventrículo direito; LV = Ventrículo esquerdo; AoV= Valva aórtica; LA = Átrio esquerdo)

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁCardiologiaEstenose aórtica

    Anatomia e fisiologia

    Macroscopicamente, as cúspides aórticas têm uma consistência bastantedelgada e funcionam abrindo adequadamente durante a sístole.

    Ao espaço existente entre as cúspides e a parede da aorta dá-se o nomede seios aórticos ou de Valsalva. O preenchimento sangüíneo desses seios, na diástole,

     provoca o fechamento da valva aórtica, resultando o componente aórtico da segunda bulha e o

    suprimento sangüíneo das artérias coronarianas.

    Etiologia

    A estenose aórtica pode ser congênita ou adquirida.

    As estenoses congênitas podem ocorrer emuma valva unicúspide, que geralmente semanifesta na criança; numa valva bicúspide, que éuma valvopatia congênita muito comum e que

     pode apresentar certo grau de estenose na 4a ou 5a décadas de vida; ou numa valva tricúspide, que jánasce estenosada e, por isso, manifesta-se

     predominantemente na lactância.Alguns autores excluem da definição de

    estenose aórtica congênita as valvas bicúspide eunicúspide congênitas por elas não causaremestenose funcional ao nascimento mas uma maiorsusceptibilidade a estenose numa idade maisavançada.

    Figura 1 - Anatomia da valva aórtica

    Figura 2 - Estenose aórtica congênita porvalvas bicúspide e tricúspide

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    As estenoses aórticas adquiridas podemser causadas pela doença reumática, quando elasestão virtualmente sempre acompanhadas porestenose mitral e apresentam fusão comissural com

     posterior calcificação.

    Outra causa das estenoses aórticasadquiridas é o envelhecimento. Com o processo evolutivo da idade pode ocorrer umespessamento das cúspides com calcificação

    ao nível do anel aórtico. Ao contrário da estenose aórtica reumática, neste tipo de estenose,denominado estenose aórtica degenerativa calcificada, não ocorre fusão comissural.

    Ainda, outros fatores que raramente podem causar estenose aórtica são ahipercolesterolemia familiar, o Lupus Eritematoso Sistêmico, a doença reumatóide e possíveisvalvulites de origem viral ou causadas por ricketsias.

    Fisiopatologia

     Normalmente, a abertura da valva aórtica tem uma área variando entre 2,5 a 3,5cm². Quando sua área de abertura apresenta medidas inferiores a estas, nós dizemos que existeuma estenose aórtica.

    Ainda em relação a área de abertura da valva aórtica, nós podemos classificar aestenose aórtica em leve, quando essa área está entre 1 e 2,5 cm²; moderada, quando sua áreamede entre 0,75 e 1 cm²; ou severa, quando a área de abertura é inferior a 0,75 cm².

    Essa classificação, contudo, não é estanque. Com a estenose aórtica, vai haveruma obstrução gradual e evolutiva, em termo de décadas, ao nível do ventrículo esquerdo,com conseqüente hipertrofia compensatória (os miócitos podem aumentar em até 5 ou 7 vezes

    seu diâmetro normal) e diminuição do seu diâmetro interno. Isso ocorre com a finalidade demanter constante o débito cardíaco e pode ser demonstrado pela lei de LaPlace.

    A lei de LaPlace diz que a tensão no interior de uma cavidade é igual a pressãoexercida em suas paredes multiplicada pelo seu diâmetro e dividida pelo dobro da suaespessura.

    P  D2  E

    Logo, para manter o débito cardíaco constante, como a valva de saída doventrículo esquerdo está estenosada e a pressão no seu interior está elevada, suas paredessofrem um espessamento (hipertrofia) e, assim, também diminuem de diâmetro.

    Figura 3 - Fusão da cúspide aórtica direitacom a cúspide posterior em um pacientecom doença reumática

    Figura 4 - Estenose aórtica degenerativacalcificada

    T = (1) 

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    Esses mecanismos compensatórios vão trazer algumas alterações prejudiciaisao organismo. Por exemplo, o relaxamento muscular do ventrículo esquerdo e,conseqüentemente, sua complacência vão estar diminuídos.

    Desta forma, nós podemos observar que a pressão diastólica final (PD2) desseventrículo vai estar aumentada, dificultando a passagem do sangue que vem do átrio esquerdo

     para o respectivo ventrículo.Assim, ocorre também um aumento de pressão ao nível do átrio esquerdo, queresulta primeiramente numa hipertrofia da musculatura atrial, para tentar manter o enchimentoventricular constante, e caso essa hipertrofia seja insuficiente, numa hipertensão pulmonar,com edema intersticial e dispnéia.

    Desta forma, o desenvolvimento da hipertrofia ventricular acarreta numamudança do padrão de enchimento, que vai ser menor durante a fase de enchimentoventricular rápida e maior durante a sístole atrial.

    Compreende-se, desta forma, que pacientes portadores de estenose aórticaimportante podem apresentar grave deterioração hemodinâmica e edema pulmonar caso se

     perca a contribuição atrial para o enchimento ventricular como, por exemplo, por ocasião de

    uma fibrilação atrial.Outro mecanismo que visa manter o débito cardíaco do coração normal é o

    aumento do período sistólico, em detrimento do período diastólico.Esse mecanismo também pode causar alterações indesejáveis no organismo.A primeira dessas alterações que pode ser observada é que, diminuindo o

    tempo do período diastólico, o enchimento ventricular, que já está diminuído pela redução dorelaxamento e da complacência ventricular, vai se tornar ainda mais diminuído.

    Outro fator que pode se mostrar prejudicado é o enchimento coronariano, queocorre durante o período diastólico.

    E isso é especialmente importante porque esta é uma condição em que oconsumo de oxigênio está aumentado principalmente pela hipertrofia do ventrículo esquerdo,

     pelo aumento da pressão sistólica e pelo tempo de ejeção aumentado, situações que têm umademanda metabólica maior e que, desta forma, necessitam de uma maior oxigenação.

    Em contraste, além do enchimento coronariano estar diminuído pela reduçãodo período diastólico, o aumento da pressão do ventrículo esquerdo provoca uma compressãocoronariana, reduzindo ainda mais a oferta de oxigênio para as fibras cardíacas.

    A soma desses fatores leva a isquemia miocárdica, que é responsável por umdos sintomas clássicos da estenose aórtica, a angina pectoris, que pode ocorrer mesmo naausência de doença coronariana concomitante.

    Os outros dois sintomas que compreendem a tríade clássica da estenose aórticasão a síncope ou tontura aos esforços e a dispnéia.

    A síncope após esforço físico é explicada pela vasodilatação periférica, quetransfere o sangue da circulação cerebral para os músculos. Normalmente, haveria umaquantidade suficiente tanto para o cérebro como para os músculos devido ao aumento dodébito cardíaco. Porém, na estenose aórtica o aumento do débito cardíaco ocorre de maneirainapropriada.

    A dispnéia, como já foi explicado, ocorre devido ao acúmulo de sangue noventrículo esquerdo, no átrio esquerdo e nos vasos pulmonares, ou seja, em decorrência dainsuficiência cardíaca esquerda.

    O acúmulo de sangue no coração esquerdo provoca, obviamente, um gradientede pressão entre o ventrículo esquerdo e a aorta.

    Sob o ponto-de-vista hemodinâmico, quando essa diferença de pressão for

    superior a 50 mmHg, nós vamos ter uma estenose aórtica crítica, ou seja, assim como quando a

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    área de abertura da valva aórtica for inferior a 0,75 cm², nós vamos ter a manifestaçãosintomatológica da doença.

    Muitas vezes, porém, o paciente passa anos assintomático, sendo sua estenoseaórtica detectável somente pelo exame físico de rotina e pelos exames complementares.

    Quando o ventrículo esquerdo não for mais capaz de compensar o débito

    cardíaco, ou seja, a pressão no seu interior for superior ao mecanismo compensatório dehipertrofia ventricular e de redução do seu diâmetro, vai haver uma redução da contratilidademiocárdica com redução ainda maior do débito cardíaco e do tempo de ejeção, associada auma redução do gradiente pressórico entre o ventrículo esquerdo e a aorta, entrando o coraçãonuma disfunção sistólica ventricular, com dilatação e morte.

    Desta forma, para a adequada quantificação do grau de estenose é importanteque se recorde que caso haja disfunção ventricular e redução do débito cardíaco pode haverredução do gradiente pressórico transvalvar, mesmo em casos de estenose grave com reduçãoextrema do orifício aórtico.

    Assim, o gradiente pressórico é bom indicador do grau de estenose em pacientes que apresentam débito cardíaco normal, mas pode subestimar o grau de estenose

    quando houver disfunção ventricular.

    Exame físico

     Na estenose aórtica, o pulso carotídeo, se comparado com o pulso normal,apresenta-se com um amplitude baixa e uma duração prolongada, ao qual se costumadenominar de pulso parvus et tardus.

    A baixa amplitude é decorrente do menor fluxo sangüíneo que passa pela valvaaórtica estenosada e a duração prolongada ocorre em decorrência do período sistólico

     prolongado, na tentativa de manter o débito cardíaco normal. Na inspeção, habitualmente se observa a pulsação do ictus  cordis  um pouco

    deslocada inferior e lateralmente.À palpação, nós vamos observar um ictus  propulsivo e sustentado em

    decorrência da hipertrofia compensatória ventricular. Na estenose moderada ou severa, pode-se palpar um frêmito sistólico no foco

    aórtico e na fúrcula esternal, que corresponde a sensação tátil do sopro da estenose aórtica. Na ausculta, nós podemos identificar um sopro na fase meso-sistólica, em

    forma de diamante, que às vezes é precedido por um clique de abertura da valva aórtica, principalmente quando ela for leve ou moderada.

     Na estenose severa, esse clique geralmente desaparece porque os folhetos

    aórticos praticamente não se movimentam, a intensidade do sopro aumenta e pode-seidentificar o desdobramento paradoxal da segunda bulha.A segunda bulha tem dois componentes, um que é constituído pelo fechamento

    da valva aórtica e outro formado pelo fechamento da valva pulmonar.Fisiologicamente, o componente aórtico da segunda bulha ocorre antes do

    componente pulmonar porque o nível pressórico intra-aórtico, sendo mais alto do que o pulmonar, faz com que haja uma inversão do gradiente de pressão mais precocemente no ladoesquerdo do coração.

     Na estenose aórtica severa, no entanto, há um mecanismo compensatório dodébito cardíaco que prolonga o período sistólico e, com isso, retarda o fechamento da valvaaórtica, que vai ocorrer paradoxalmente depois do fechamento da valva pulmonar. A essa

    inversão na ordem de ocorrência dos componentes da segunda bulha dá-se o nome dedesdobramento paradoxal da segunda bulha.

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     Na prática, é possível diferenciar-se os ruídos aórtico e pulmonar pelaintensidade, que é maior na valva aórtica.

    A primeira bulha costuma ser normal ou abafada e precedida da quarta bulha,correspondente a sístole atrial.

    Graficamente, nós podemos representar os elementos auscultáveis na estenose

    aórtica da seguinte maneira.

    Pode ocorre irradiação desse sopro da estenose aórtica para a fúrcula esternal e para os vasos da base.

    A intensidade do sopro pode diminuir nos casos graves em que haja disfunçãoventricular, podendo mesmo desaparecer.

    Exames complementares

    Através do eletrocardiograma nós conseguimos detectar asobrecarga do ventrículo esquerdo, através do índice de Sokolow-Lyon (S de V1 + R de V5 ouV6 > 35 mm), que ocorre em 85% dos pacientes com estenose importante. Também podeexistir alterações do segmento ST, que corresponde ao tempo que decorre do fim dadespolarização até o começo da repolarização da musculatura ventricular, comdesnivelamentos que ultrapassam 1,5 mm; e, às vezes, uma inversão da onda T determinada

     pela isquemia miocárdica. Essas alterações ocorrem principalmente na hipertrofia severa.Ocasionalmente, pode haver desaparecimento de ondas R, em

    derivações precordiais direitas, com padrão eletrocardiográfico de “pseudo-infarto” ântero-

    septal. Em 80% dos pacientes há sinais de sobrecarga atrial esquerda. A ocorrência defibrilação atrial é incomum.

    Além disso, em 5% dos pacientes com estenose aórtica calcificada pode-se encontrar diversos graus de bloqueio átrio-ventricular e bloqueios intraventricularese, também, a ocorrência de arritmias ventriculares complexas.

    Figura 5 - Representação gráfica do sopro da estenose aórtica

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    O Raio-X de tórax com incidência póstero-anterior (PA) não nosmostra muita coisa porque não existe um grande aumento do ventrículo esquerdo e, assim, aárea cardíaca se apresenta normal, observando-se com freqüência apenas discreta dilatação daaorta ascendente como única anormalidade.

    Aumentos da área cardíaca costumam aparecer quando hádisfunção ventricular.O achado de aumento da imagem do átrio esquerdo faz suspeitar da

     presença de insuficiência mitral.Em perfil, pode-se observar calcificações na topografia da área

    aórtica.

    Figura 6 - Eletrocardiograma

    Figura 7 - Raio-X de tórax em PA e perfil

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    Com o ecocardiograma, nós podemos ter informações completassobre a anatomia valvar e cavitária e podemos também analisar o fluxo sangüíneo através davalva aórtica.

    O método permite ainda a identificação de anomalias congênitas, aavaliação do grau de hipertrofia ventricular, análise da função muscular e do padrão de

    enchimento diastólico, etc.

    Figura 8 - Ecocardiograma unidimensional

    Figura 9 - Ecocardiograma bidimensional (IVS = Septo interventricular; RV = Ventrículo direito; AO= Aorta; AoV = Valva aórtica; LV = Ventrículo esquerdo; MV = Valva mitral; PW = Parede posterior;LA = Átrio esquerdo)

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    O cateterismo, hoje em dia, serve principalmente para a avaliaçãodas artérias coronarianas nos pacientes acima de 45 anos que são indicados para cirurgia.

    Suas outras funções, como a determinação da severidade daobstrução, a avaliação da função ventricular e a pesquisa de outras valvopatias associadastambém podem ser realizadas pelo ecocardiograma, que tem a vantagem de não ser invasivo.

    Tratamento

     No paciente com estenose aórtica assintomática, nós devemos vigiar oaparecimento de sintomas. Isso é importante porque o paciente pode ficar anos assintomático.Porém, a partir do momento em que o portador de uma estenose aórtica começa a apresentaros sintomas seu prognóstico piora muito, com uma sobrevida de 60% em 3 anos, 50% em 5anos e 20% em 10 anos caso ele não seja tratado.

     No paciente assintomático com estenose leve, deve-se fazer seu controle num período de 2 em 2 anos. O indivíduo com estenose aórtica moderada ou severa é recomendado

    a realizar os exames eletrocardiográfico, radiográfico e ecocardiográfico em intervalos de 6 a12 meses. Deve-se também alertá-lo quanto a atividades físicas intensas e orientá-lo quanto a

     profilaxia da endocardite infecciosa.

    A cirurgia de troca valvar é indicada quando aparecem os sintomas na estenoseaórtica severa e quando um paciente assintomático apresenta progressão com redução doventrículo esquerdo e cardiomegalia, porque esse indivíduo vai apresentar sintomatologia emquestão de meses se não for tratado cirurgicamente.

    Figura 10 - Cirurgia de troca valvar aórtica

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    Os fatores de risco que mais aumentam a mortalidade no tratamento cirúrgico daestenose aórtica são:

      Classe funcional;  Função ventricular esquerda;  Arritmias ventriculares;

     

    Insuficiência aórtica associada;  Idade avançada e  Coronariopatias associadas.

    A média de duração das próteses valvares é de oito anos, ou seja, esses pacientestem que ser freqüentemente reoperados e, a cada vez, a anatomia vai ficando mais difícil, comcada vez mais fibrose, o que torna os resultados cada vez piores.

    Desta forma, a troca valvar não é uma medida curativa e, sim, paliativa que, porém, aumenta sobremaneira a sobrevida do paciente e permite uma qualidade de vidamelhor.

    A valvoplastia por cateter-balão é útil em crianças com estenose aórtica

    congênita justamente pelo fato de serem necessárias repetitivas cirurgias para a troca de uma prótese valvar, mas também é indicada quando o paciente recusa o tratamento cirúrgico ouquando o risco da cirurgia é extremo.

     Nas estenoses aórticas calcificadas, a utilização da valvoplastia por cateter-balãoé inútil porque em 50% dos pacientes a valva aórtica reestenosa em 6 meses.

    Prognóstico

    A insuficiência cardíaca congestiva é indício de péssimo prognóstico. Contudo,de acordo com vários trabalhos clínicos, o aparecimento de qualquer das três manifestações

     principais da doença (dispnéia, angina ou síncope) é indicativo de sobrevida média de 2 a 5anos.

    Aproximadamente 15 a 25% dos pacientes morrem subitamente, dos quais 3 a5% apresentam a morte súbita como primeira manifestação da doença.

    A cirurgia de troca de valva aórtica provê uma sobrevida de aproximadamente80% em cinco anos e 60% em 10 anos.

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ  CardiologiaInsuficiência aórtica

    Etiologia

    Basicamente, nós podemos dizer que a insuficiência aórtica pode ser aguda oucrônica e suas causas podem ser de origem valvar ou da raiz da aorta.

    As principais etiologias de origem valvar são:  Febre reumática Que é muito comum; 

      Endocardite infecciosa Que pode ser causa de insuficiência aórtica tantoaguda quanto crônica; 

      Valva bicúspide congênita Que pode dar origem a uma estenose ou a umainsuficiência aórtica; 

      Desalinhamento do folheto não-coronariano. 

    Figura 1

    Figura 2

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    CARDIOLOGIA - 29

    As principais etiologias de origem na raiz aórtica são:  Dilatação da raiz da aorta 

      Síndrome de Marfan

      Hipertensão arterial de longa duração  Aneurisma da aorta ascendente;

      Necrose cística da camada média da aorta e   Processos infamatórios crônicosRaramente causam insuficiência aórtica 

      Aortite sifilítica  Artrite reumatóide

     

    Espondilite anquilosante  Síndrome de Reiter.

    Fisiopatologia

    Para nós podermos entender a insuficiência aórtica nós também podemosutilizar a lei de LaPlace.

    Recordando, ela diz que a tensão no interior de uma cavidade é igual a pressãoexercida em suas paredes multiplicada pelo seu diâmetro e dividida pelo dobro da suaespessura.

    Assim, com o fechamento inadequado das cúspides aórticas vai haver umasobrecarga de volume no ventrículo esquerdo.

    Isso porque além do enchimento ventricular normalmente proporcionado peloátrio esquerdo, vai ocorrer também uma regurgitação sangüínea da aorta, pela valvainsuficiente, durante o período diastólico.

    Contudo, essa sobrecarga vai aumentar apenas discretamente a pressãointraventricular na insuficiência aórtica crônica porque lentamente ocorre um mecanismocompensatório com hipertrofia miocárdica excêntrica, que difere da hipertrofia concêntrica daestenose aórtica, onde os miócitos chegam a ter 7 vezes o seu diâmetro normal, por apresentarum alongamento das fibras miocárdicas predominantemente no sentido longitudinal; e umconseqüente aumento na espessura da parede ventricular. Assim, a relação parede/cavidade é

    mantida pois ao mesmo tempo que ocorre um aumento do volume cardíaco intracavitário,ocorre também um aumento na espessura da sua parede.

    Figura 3

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    Desta forma, o ventrículo esquerdo passa a ser uma bomba de altacomplacência capaz de abrigar grandes volumes de sangue sem elevar muito a pressão.

    Tais mecanismos adaptativos permitem que o ventrículo esquerdo mantenhadesempenho sistólico normal, com valores da fração de ejeção em geral superiores a 0,50.

    A partir do momento que essa dilatação não consegue mais manter o débito

    cardíaco, ocorre uma série de conseqüências.Como o ventrículo esquerdo vai estar descompensado, ele não vai mais sercapaz de ejetar o sangue nele alojado, aumentando o volume diastólico final e o volumesistólico final.

    O aumento do volume sistólico final leva à dilatação da aorta ascendente, que pode agravar a insuficiência aórtica por afastamento adicional dos folhetos.

    Além disso, grandes dilatações ventriculares com freqüência determinamdilatação do anel mitral, com aparecimento de insuficiência mitral associada.

    A dispnéia, a ortopnéia e a dispnéia paroxística noturna podem surgir peladisfunção ventricular e elevação da pressão venocapilar pulmonar.

    Também, devido a diminuição da fração de ejeção vai ocorrer uma dilatação

    cardíaca ainda maior, com diminuição da relação parede/cavidade e, segundo a lei de LaPlace,aumento da tensão sistólica da parede ventricular.

    Obviamente, esse desenvolvimento é crônico e, da mesma maneira que naestenose aórtica, esses pacientes podem ficar anos assintomáticos.

    Também da mesma maneira que ocorre na estenose aórtica, a hipertrofiaventricular da insuficiência aórtica resulta em um aumento do consumo aeróbico pelasmiofibrilas cardíacas.

    Porém, como durante a diástole, fase em que ocorre o enchimento coronariano,as valvas aórticas insuficientes permitem um refluxo aórtico para o interior do ventrículoesquerdo, o fluxo das artérias coronarianas torna-se menor, manifestando-se clinicamente porangina pectoris.

     Neste caso, não há sincope ou tontura porque na fase compensada da doença odébito cardíaco é suficiente, mesmo aos esforços.

     Na insuficiência aórtica aguda, há um aumento abrupto de sangue no interiordo ventrículo esquerdo com conseqüente aumento de pressão.

    Esse aumento de pressão pode fazer com que o átrio esquerdo tenhadificuldade de esvaziar seu sangue durante a diástole.

    Chega a um ponto que ocorre fechamento prematuro da valva mitral e ela permanece fechada durante grande parte do período diastólico.

    Como conseqüência, nós podemos ter hipertensão pulmonar e edema agudo de pulmão.

    Em alguns casos, o ventrículo esquerdo se apresenta tão cheio de sanguedurante a diástole que, no momento da sístole atrial, apesar da valva mitral estar fechada emdecorrência da pressão diastólica ventricular elevada, ocorre uma transmissão pressórica doátrio esquerdo para o ventrículo esquerdo, aumentando ainda mais a pressão no interior destee produzindo um afastamento dos folhetos da valva aórtica.

    Esse fenômeno é raro, mas pode acontecer e, por isso, está representado noesquema a seguir.

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    Exame físico

     Na insuficiência aórtica, a clínica varia de acordo com o tipo e o grau deinsuficiência. O pulso carotídeo, no exame físico, se comparado com o pulso normal, tem uma

    amplitude alta devido a grande pressão diferencial decorrente tanto do aumento da pressãosistólica, causada pelo maior volume de sangue ejetado; quanto da diminuição da pressãodiastólica, decorrente da própria lesão da valva aórtica. Esse pulso tem também um tempo deduração inferior ao do pulso normal e é denominado na prática médica de “pulso martelod’água” (ou pulso de Corrigan) e sua pulsação visível à inspeção é descrita nos livros como

    “dança das carótidas”. Existem alguns sinais que podem ser observados numa fase avançada da

    insuficiência aórtica. São eles:  Sinal de Musset 

    O paciente apresenta um movimento pendular da cabeça para frente e para trás, que ocorre juntamente com o pulsar das carótidas e

    decorre da pressão exercida sobre os músculos esternoclidomastóideos pelo pulsar carotídeo.

      Sinal de Traube É a manifestação auditiva do “pulso martelo d’água”

    quando se posiciona o diafragma do estetoscópio sobre a artéria femoral. Osom auscultado assemelha-se aos sons produzidos por “tiros de pistola”. 

      Sinal de Müller O paciente apresenta um movimento pendular da úvula ao

    exame da cavidade oral.

      Sinal de Duroziez

    Figura 4

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    É a ausculta do sopro sisto-diastólico quando secomprime a artéria femoral com o estetoscópio.

      Sinal de Quincke É a visualização da pulsação capilar arterial quando se

    realiza uma compressão ungueal ou através da transiluminação das polpasdigitais.

    Ao exame físico cardiológico, na inspeção, pode-se observar a localização doictus cordis, que em geral vai estar desviado para a esquerda e inferiormente devido adilatação ventricular esquerda.

    Pode-se também observar pulsação do oco esternal e, às vezes, da artériasubclávia esquerda.

    À palpação, observa-se um ictus propulsivo e não sustentável, ao contrário doictus  da estenose aórtica. Dependendo do grau de insuficiência pode-se palpar um frêmitodiastólico no foco aórtico.

     Na ausculta, observa-se um sopro diastólico precoce de alta freqüência, porisso melhor auscultado com o diafragma do estetoscópio, e decrescente (ou aspirativo).

    Essa característica decrescente do sopro da insuficiência aórtica ocorre devidoa uma diminuição no gradiente de pressão entre a aorta e o ventrículo esquerdo a medida queeste recebe maior volume sangüíneo durante a diástole.

    O sopro da insuficiência aórtica é melhoraudível no segundo espaço intercostal, na região paraesternal àdireita, e no terceiro ou quarto espaço intercostal à esquerda,estando o paciente sentado, em expiração e com o tóraxinclinado para a frente.

    Pode também haver um sopro sistólico nainsuficiência aórtica que tem origem a partir do grande volumeejetado do ventrículo esquerdo, fazendo com que haja uma“estenose relativa” da valva aórtica. 

    A esse componente sistólico do sopro dainsuficiência aórtica dá-se o nome de sopro sistólico dehiperfluxo.

    Ainda, graças ao aumento da pressãoventricular que ocorre na insuficiência aórtica aguda e quediminui tanto a área quanto o tempo de abertura da valva

    mitral durante a diástole, pode ocorrer um sopro de baixafreqüência, produzido por essa estenose funcional, chamado desopro de Austin-Flint.

    Quando esse sopro ocorre, pode ser difícil de diferenciar uma insuficiênciaaórtica aguda de uma insuficiência aórtica crônica severa com uma estenose mitral associada.

    Graficamente, nós podemos representar o sopro sistodiastólico da insuficiênciaaórtica da seguinte maneira.

    Figura 5 - Posição ideal para a

    ausculta do sopro dainsuficiência aórtica

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    A gravidade da lesão, que na estenose aórtica é determinada pela intensidadedo sopro, na insuficiência aórtica se associa mais com a sua duração. Nas formas muito leves,o sopro é audível apenas durante aproximadamente metade da diástole, tornando-seholodiastólico nas formas mais graves.

    Todas as condições que aumentam a pressão periférica também aumentam osopro da insuficiência aórtica como, por exemplo, os vasopressores, a posição de cócoras,exercício isométricos, etc.

    Da mesma maneira, a redução da pressão periférica diminui o sopro dessa patologia. Como exemplo dessas situações nós temos a ingestão de nitrito de amilo e a fase deesforço da manobra de Valsalva.

    A primeira bulha costuma ser fraca, abafada, enquanto que a segunda é deregra hiperfonética, tornando-se abafada nas formas graves.

    Exames complementares

     No eletrocardiograma, nós podemos identificar sobrecarga doventrículo esquerdo, semelhantemente a estenose aórtica mas com a diferença que, nesta,geralmente as ondas T (repolarização ventricular) estão mais negativas do que nainsuficiência aórtica.

    Figura 6 - Representação gráfica do sopro da insuficiência aórtica

    Figura 7 - Eletrocardiograma 

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    O aparecimento de infradesnivelamento de ST e de inversões deonda T constitui-se em indicador de mau prognóstico, freqüentemente associado à disfunçãoventricular.

    O ritmo é quase sempre sinusal, observando-se raros casos defibrilação atrial, especialmente quando existe aumento importante do átrio esquerdo por

    insuficiência mitral.

    O Raio-X em PA mostra aumentoda silhueta cardíaca às custas do aumento do ventrículoesquerdo e da aorta ascendente e pode mostrar sinais deaumento atrial esquerdo, tais como duplo contorno, presençade quarto arco cardíaco e desvio do brônquio fonte esquerdo.

    Em perfil, pode-se visualizar oaumento do átrio esquerdo quando se faz um Raio-Xcontrastado com bário.

    O ecocardiograma confirma o

    diagnóstico da insuficiência aórtica e permite-nos medir ovolume do ventrículo esquerdo. Além disso, ele nos forneceimportantes informações que com freqüência permitem odiagnóstico da sua etiologia.

     No ecodopplercardiograma, além da detecção de fluxo retrógrado, pode-se detectar a severidade da insuficiência aórtica pela variação da velocidade do refluxoaórtico.

    Figura 8 - Raio-X de tórax em PA

    Figura 9 - Ecocardiograma bidimensional (IVS = Septo interventricular; RV = Ventrículo direito; AV= Valva aórtica; LV = Ventrículo esquerdo; MV = Valva mitral; PW = Parede posterior; LA = Átrioesquerdo)

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    Por exemplo, quando a variação da velocidade dorefluxo é alta significa que a valva aórtica estáamplamente aberta e, em conseqüência, a insuficiênciaaórtica é severa.

    Quando, porém, sua variação de velocidade é baixa, há apenas uma pequena abertura na valva aórtica,indicando que a sua insuficiência é apenas leve.

    O cateterismo é indicado principalmente para pacientes acima de 45 anos indicados para cirurgia paraavaliação da sua função coronariana.

    Tratamento

    Os pacientes com insuficiência aórtica leve ou moderada que são assintomáticosdevem fazer acompanhamento clínico e ecocardiográfico a cada 6 ou 12 meses. Além disso,devem ser alertados quanto a prática de esportes vigorosos e educados sobre a profilaxia daendocardite infecciosa.

    Os pacientes com lesão severa que forem assintomáticos e que tiverem umafunção ventricular esquerda normal devem ser tratados conservadoramente.

    Porém, os pacientes assintomáticos que tiverem um decréscimo constante da suafunção ventricular devem ser tratados cirurgicamente porque os sintomas não tardarão em

    aparecer.Aqueles pacientes com insuficiência aórtica grave sintomática, ou seja, que

    apresentam dispnéia por insuficiência cardíaca esquerda e, às vezes, angina pectoris, tambémdever ser tratados cirurgicamente.

    Vasodilatadores orais, como a hidralazina, podem determinar reduções da fraçãode regurgitação e do volume ventricular, conseguindo-se protelar a indicação cirúrgica.

    Os digitálicos e os diuréticos estão indicados quando houver insuficiênciacardíaca, de preferência associados a vasodilatadores.

    A insuficiência aórtica aguda em geral é severa e exige tratamento cirúrgicoimediato. Na espera, recomenda-se a utilização de inotrópicos como a dopamina e adobutamina, para aumentar a força contratio  do miocárdio, e de vasodilatadores como onitroprussiato.

    A troca da valva aórtica determina reduções nas dimensões ventriculares emelhora da capacidade física. A redução da dimensão da câmara ventricular é mais

     pronunciada no pós-operatório precoce, continuando a se processar, mais lentamente, duranteaté sete anos após a cirurgia. Apesar de haver redução das dimensões do ventrículo esquerdo,a fração de ejeção não costuma melhorar após a cirurgia.

    Após a operação, os pacientes portadores de próteses mecânicas devem sermantidos em esquema de anticoagulação oral indefinidamente. Para as próteses biológicas,em vários serviços, a anticoagulação é mantida apenas durante aproximadamente dois meses.

    Figura 10 - Ecocardiograma unidimensional

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁCardiologiaInsuficiência cardíaca

    Introdução

    A insuficiência cardíaca é uma doença que tem aumentado sua incidênciadrasticamente na última década.

    Há uma certa dificuldade em se definir a insuficiência cardíaca porque como ocoração tem uma modificação constante na sua atividade frente a diversas situaçõesmetabólicas distintas, é difícil estabelecer um parâmetro de quando ele está insuficiente.

    Contudo, a insuficiência cardíaca pode ser definida como uma incapacidade docoração em se adequar a essas diversas condições metabólicas do organismo.

    Para efeitos práticos, nós podemos dividir o coração em direito e esquerdo e,conseqüentemente, a insuficiência cardíaca em direita e esquerda. Às vezes, nós também

     podemos ter uma associação dessas duas.A insuficiência cardíaca esquerda, cuja principal manifestação clínica é a

    dispnéia, é mais freqüente que as outras especialmente porque as patologias sistêmicasatingem mais freqüentemente o coração esquerdo.

    A insuficiência cardíaca direita, que causa congestão venosa sistêmica, deve-se namaior parte dos casos ao paciente com insuficiência cardíaca esquerda.

    Obviamente, porém, as doenças pulmonares também podem causar insuficiênciacardíaca direita através do cor pulmonale.

    Quando nós temos ambas as insuficiências, nós dizemos que o paciente tem umainsuficiência cardíaca global ou uma insuficiência cardíaca congestiva.

    A insuficiência cardíaca também pode ser descrita como de alto ou de baixodébito, aguda ou crônica, anterógrada ou retrógrada e sistólica ou diastólica.

    Existe ainda uma situação na qual o bombeamento cardíaco está normal mas nóstemos sintomas muito semelhantes aos da insuficiência cardíaca.

    Essa situação ocorre muito nos centros de terapia intensiva (CTI), devido ainfusão rápida de líquidos, e nos casos de insuficiência renal aguda e é chamada de estadocongestivo.

    De maneira crônica, o estado congestivo pode ocorrer nas anemias.A insuficiência cardíaca também deve ser distinguida das causas não-cardíacas de

    débito sangüíneo inadequado, como o choque hipovolêmico e a redistribuição do volumesangüíneo.

    Fisiopatologia

    Para se entender a fisiopatologia da insuficiência cardíaca, é preciso saberquais os fatores que determinam o bombeamento cardíaco normal.

    O bombeamento cardíaco normal, também chamado de débito cardíaco, édiretamente proporcional ao volume de ejeção e a freqüência cardíaca e pode ser expressonumericamente entre 2,5 e 3,5 litros por minuto e por metro quadrado de superfície corporal.

    Débito cardíaco = Volume de ejeção  Freqüência cardíaca (2)

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    Assim, nós estamos saindo de conceitos instáveis e tornando a função cardíacamais palpável, com números que vão facilitar o nosso conceito de insuficiência cardíaca.

    Porém, o débito cardíaco não é determinado rotineiramente nos pacientesambulatoriais, nos quais nós usamos parâmetros clínicos, como a dispnéia e o edema, para

    fazer o diagnóstico de insuficiência cardíaca; mas em algumas situações nós podemosdeterminar o débito cardíaco do paciente através do cateter de Swan-Ganz, a partir do princípio de Fick de termodiluição.

    O volume de ejeção, que é um fator que colabora com o débito cardíaco,depende principalmente de três fatores:

    1. Pré-carga;2. Pós-carga e3. Contratilidade miocárdica.

    A pré-carga corresponde a distensão das fibras ventriculares no final dadiástole e é representada através do volume de líquido no interior do ventrículo.

    Porém, como não é fácil obter nem um nem outro desses dados, nós podemosdizer que a pré-carga é diretamente proporcional a pressão diastólica final (PD2) dosventrículos que, no lado direito, varia entre 6 e 12 mmHg e, no lado esquerdo, entre 12 e 15mmHg.

    Existe um mecanismo de calcular a pressão diastólica final do ventrículoesquerdo através do ventrículo direito.

    Utilizando-se o cateter de Swan-Ganz, faz-se sua introdução através de umaveia, geralmente no braço, e insufla-se seu balão guia ao nível da veia subclávia para que eleseja carreado para o interior do átrio direito.

    Seguindo a circulação cardíaca, o cateter vai ser guiado para o interior doventrículo direito e, através do tronco pulmonar, até os pequenos ramos da artéria pulmonar.

    Relembrando o ciclo cardíaco, nós vamos observar que durante a diástole,quando nós medimos a pressão diastólica final do ventrículo esquerdo, a valva mitral vai estarsemi-aberta e, conseqüentemente, nesse exato momento, a pressão atrial esquerda vai ser iguala pressão diastólica final do ventrículo esquerdo.

    Semelhantemente, como as veias pulmonares são isentas de valvas, a pressãoatrial esquerda vai ser muito semelhante a pressão nas veias pulmonares.

    Concluindo, como a pressão pulmonar é muito baixa, a pressão dos capilaresarteriais pulmonares, onde vai estar localizado o cateter de Swan-Ganz, é bem próxima à

     pressão dos capilares venosos pulmonares e, conseqüentemente, a pressão diastólica final doventrículo esquerdo.

    Pode-se então, através desse método, determinar a pré-carga do ventrículoesquerdo, com duas exceções. No enfisema pulmonar, a resistência pulmonar está elevada eas pressões capilares vão, então, estar muito diferentes. Na estenose mitral, devido adificuldade de abertura da valva mitral, as pressões no interior do átrio esquerdo e doventrículo esquerdo também vão divergir, impossibilitando a determinação da pressãodiastólica final por este processo.

    Rotineiramente, nós avaliamos a pré-carga através do retorno venoso com oexame de enchimento das jugulares ou através da determinação da pressão venosa central(PVC).

    Quanto maior a pressão diastólica final do ventrículo esquerdo, maior é a sua pré-carga. Em conseqüência, como a pré-carga é um fator diretamente proporcional ao

    volume de ejeção e este, por sua vez, está diretamente ligado ao débito cardíaco, quanto maiora pré-carga, maior o débito cardíaco.

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    Mas isso só é verdade até um certo limite, pois a partir de então, o aumento da pressão ventricular não é mais acompanhado por um débito adequado e o coração podedescompensar, dilatar e levar o paciente ao óbito.

    Outro fator do qual o débito cardíaco depende é a pós-carga.A pós-carga pode ser definida como a resistência do sistema vascular a ejeção

    de sangue, ou arteriolar pulmonar, ou arteriolar periférico.A pós-carga oferecida pelo sistema vascular arteriolar pulmonar pode seravaliada pelo ecodopplercardiograma através da pressão pulmonar. A pós-carga esquerda, porsua vez, pode ser avaliada com a medida da pressão arterial.

    Trazendo esses conceitos para o dia-a-dia nós podemos dizer que um pacienteque tem hipertensão arterial tem uma pós-carga aumentada.

    Desta forma, nós concluímos que quanto maiores as pressões arteriais periférica ou pulmonar, menor o volume de ejeção ventricular, ou seja, menor o débitocardíaco.

    Se não houver alterações na pré ou pós-cargas, é a contratilidade cardíaca (ou

    inotropismo) que vai determinar o débito cardíaco.A contratilidade miocárdica depende da liberação de adrenalina e pode ser

    avaliada pela fração de ejeção ventricular, que é calculada pelo volume de sangue ejetadodividido pelo volume de sangue no final da diástole.

    Volume de sangue ejetadoVolume diastólico final

    A fração de ejeção ventricular pode ser avaliada por três maneiras.

    A maneira mais simples de se avaliar a fração de ejeção ventricular é pelaecocardiografia, verificando-se o tamanho cavitário na sístole e na diástole.

    As outras duas maneiras são através de rádio isótopos e da ventriculografia porcontraste.

     Normalmente, a fração de ejeção ventricular esquerda é igual a 0,55, o quesignifica que 55% do volume diastólico final é ejetado.

    Porém, 30% dos pacientes com insuficiência cardíaca têm a fração de ejeçãoventricular normal, ou seja, têm contratilidade normal.

    Sua sintomatologia é causada por uma deficiência no relaxamento miocárdicodurante a diástole, quer dizer, por causa de uma diminuição da pré-carga, que pode sercausada por hipertrofia ventricular, como ocorre na hipertensão arterial sistêmica e naestenose aórtica; por isquemia miocárdica; ou por causa de doenças infiltrativas, como aamiloidose.

    Figura 1

    Fração de ejeção ventricular = (3) 

    Volumesistólico 

    Volumesistólico 

    Pré-carga Pós-carga 

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    Esse grupo de insuficiência é denominado insuficiência cardíaca diastólica e éimportante porque esses pacientes não necessitam usar drogas inotrópicas (como osdigitálicos) terapeuticamente mas, sim, drogas que aumentem o relaxamento miocárdico,aumentando a pré-carga e conseqüentemente o débito cardíaco.

    Mecanismos de compensação

    Os mecanismos de compensação da insuficiência cardíaca sãoos mesmos que o organismo usa no dia-a-dia para a suas necessidades metabólicas normais,

     porém, eles são exacerbados na sua intensidade e na sua duração.É importante enfatizar que, na insuficiência cardíaca leve, tais

    mecanismos compensatórios quase sempre são capazes de restaurar ao normal a pressãoarterial, a perfusão orgânica e o débito cardíaco em repouso e até mesmo durante o exercíciofísico moderado.

    Inicialmente, ocorre um aumento na atividade simpática, que

    contribui com a contratilidade miocárdica e resulta em um aumento da freqüência cardíaca(taquicardia). Essa taquicardia pode aumentar o débito cardíaco em até 3 vezes.

    Porém, freqüências cardíacas muito altas, acima de 180 bpm,causam uma redução do débito cardíaco por falta de enchimento ventricular.

    Além do aumento da freqüência cardíaca, a atividade simpática promove uma vasoconstrição periférica que tem 3 conseqüências principais.

    A primeira é o aumento do retorno venoso, que tende aaumentar o volume de ejeção ventricular pelo aumento da pré-carga.

    A segunda conseqüência é o aumento da resistência vascular periférica, que tende a reduzir o débito cardíaco pelo aumento da pós-carga.

    A outra é o desvio do fluxo sangüíneo procurando preservar ocoração e o cérebro. Em contrapartida, esse desvio de fluxo diminui a perfusão da pele,músculos esqueléticos, órgãos esplâncnicos e rins.

    Desta forma, nós observamos que, como todo mecanismocompensatório, esses mecanismos apresentam condições benéficas e condições deletérias aoorganismo, sendo responsáveis por muitos dos sintomas e disfunções orgânicas, até mesmo oóbito, que ocorrem nos pacientes com insuficiência cardíaca.

    Outro mecanismo compensatório que pode ocorrer nainsuficiência cardíaca é a dilatação, acompanhada de um surpreendente aumento na sua pré-carga e, conseqüentemente, no débito cardíaco.

    Todavia, a partir de determinado tamanho a dilatação também

    se torna deletéria, principalmente porque os sarcômeros se afastam e impossibilitam a suacontração.A nível das fibras miocárdicas, um dos principais ajustes do

    coração é a hipertrofia, que pode ser basicamente de 2 tipos.A hipertrofia por sobrecarga de pressão é do tipo concêntrica,

    como ocorre na estenose aórtica. Nesses casos há um aumento na espessura da paredeventricular, mas não há aumento no seu diâmetro.

    As sobrecargas de volume fazem hipertrofia do tipo excêntrica,com aumento do tamanho das fibras predominantemente no sentido longitudinal, como ocorrena insuficiência aórtica. Esse tipo de hipertrofia aumenta a espessura e o diâmetro interno doventrículo proporcionalmente.

    Conseqüentemente, como efeito deletério nós temos aisquemia dessas fibras hipertrofiadas por uma necessidade metabólica aumentada e,

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    eventualmente, um fluxo sangüíneo reduzido por perda de enchimento coronariano ou poruma coronariopatia associada, que se manifesta clinicamente por dor pré-cordial (angina

     pectoris).Quando ocorre hipertrofia, principalmente a excêntrica, pode

    haver também uma dilatação ventricular com o objetivo de manter uma tensão sistólica

    adequada (lei de LaPlace). Porém, nos quadros agudos, freqüentemente a dilatação ocorre deforma isolada.Outro mecanismo compensatório das insuficiências cardíacas é

    aumento do volume plasmático e da pressão capilar provocados pelos rins. Isso ocorre emdecorrência da queda da pressão glomerular, causada pela redução do débito cardíaco, quesimula uma hipovolemia e ativa o sistema renina-angiotensina-aldosterona, provocando umaretenção de sódio e água pelos túbulos renais.

    A principal evidência desse mecanismo compensatório dos rinsé a formação de edema e derrames intracavitários.

    Manifestações clínicas

    Como vimos, a insuficiência cardíaca se caracteriza por umacongestão venosa pulmonar e/ou sistêmica, associada a um débito cardíaco diminuído, sendo

     possível considerar separadamente a insuficiência ventricular direita e a insuficiênciaventricular esquerda.

    Também acabamos de ver que dentro de certos limites o organismolança mão de mecanismos compensadores capazes de manter a perfusão celular em níveisadequados.

    Quando é ultrapassada essa capacidade de compensação eclode oquadro clínico da insuficiência cardíaca.

    De uma maneira geral, o coração tolera melhor a sobrecarga devolume do que a de pressão. É por isso que a insuficiência aórtica pode permanecer váriosanos sem causar sintomas enquanto a sobrecarga provocada pela estenose aórtica determinasinais e sintomas de insuficiência cardíaca mais precocemente.

    Da mesma forma, as sobrecargas que se instalam progressivamentesão mais bem toleradas do que as sobrecargas agudas. Por exemplo, a insuficiência mitralcausada por lesão reumática pode perdurar muitos anos sem desencadear insuficiênciamiocárdica enquanto a insuficiência mitral produzida por ruptura de cordoalha tendínea

     precipita uma rápida e intensa insuficiência cardíaca.Os sinais e sintomas da insuficiência cardíaca compreendem um grupo

    de sintomatologia atribuível ao próprio coração e um grupo extracardíaco.Essas manifestações extracardíacas devem ser interpretadas dentro docontexto clínico do paciente pois elas não são necessária e exclusivamente decorrências dainsuficiência cardíaca.

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    As manifestações clínicasda insuficiência ventricular esquerda originam-sefundamentalmente da congestão venocapilar

     pulmonar, decorrente, por sua vez, daincapacidade contrátil desse ventrículo e

    compreendem dispnéia progressiva aos esforçosque, por ser subjetiva, é difícil de serquantificada; ortopnéia, quase sempre umamanifestação que surge mais tardiamente que adispnéia de esforço; dispnéia paroxística(noturna); palpitações, que traduzem o aumentoda freqüência cardíaca; tosse, que acompanha ousubstitui a dispnéia; expectoração hemoptoica;crepitações pulmonares, que são os sinais mais

     precoces de congestão pulmonar; e, às vezes,respiração sibilante decorrente do broncoespasmo

    causado por essa congestão venocapilar.Além desses, há também

    os sinais originados do próprio coração como ataquicardia, que é o mecanismo compensadormais elementar de que o organismo pode lançarmão para tentar manter o débito cardíaco emníveis adequados; o ritmo em galope, que decorreda audição da terceira bulha cardíaca e é quase

     patognomônico de insuficiência cardíaca; aalternância cardíaca, que consiste na sucessão deum batimento forte e um fraco; e a convergência

     pressórica, que decorre tanto da diminuição da pressão arterial sistólica em conseqüência daredução da força de contração do ventrículo esquerdo, quanto do aumento da pressãodiastólica pela hiperatividade periférica do sistema simpático, que aumenta a resistênciavascular.

    Ainda, como conseqüência da diminuição do débito podem surgirsintomas decorrentes da má oxigenação cerebral e de outros órgãos tais como irritabilidade,cefaléia, insônia, confusão mental, anorexia, fatigabilidade e astenia.

    A sintomatologia da insuficiência ventricular direita é menor do que ada insuficiência ventricular esquerda e se restringe a astenia; dor no hipocôndrio direito por

    distensão da cápsula de Glisson provocada pela hepatomegalia congestiva; anorexia, dorabdominal difusa quando há ascite; diarréia devido a estase do tubo intestinal; e oligúriadevido a retenção de sódio e água pelos rins.

    Os sinais atribuíveis ao próprio coração são a taquicardia e o ritmo emgalope, tal qual na insuficiência ventricular esquerda.

    Figura 2 - Paciente com insuficiência cardíacaesquerda

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    Ao exame físico, encontra-se geralmenteingurgitamento jugular, hepatomegalia, edema,derrames cavitários e cianose periférica,resultante da lentidão circulatória que leva a ummaior consumo de oxigênio ao nível da pele nas

    extremidades.A intensidade do edema cardíaco pode irde um discreto edema, restrito as extremidadesinferiores, até a anasarca.

    Contudo, na grande maioria dos casosencontram-se sinais e sintomas de insuficiênciade ambos os ventrículos, falando-se então eminsuficiência cardíaca global ou congestiva.

    Isso porque, em geral, as doenças queafetam o coração provocam inicialmente afalência de um ventrículo e, posteriormente, do

    outro.Tanto é verdade que a causa mais comum

    da insuficiência ventricular direita é ainsuficiência esquerda, ocorrendo melhora dadispnéia a medida que o débito cardíaco doventrículo direito diminui e, ao mesmo tempo,aumenta a congestão venosa sistêmica.

    Figura 3 - Paciente com insuficiência cardíacadireita

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁCardiologiaTratamento da insuficiência cardíaca

    Tratamento clínico 

    Em um período de quatro anos, 50% dos pacientes diagnosticados cominsuficiência cardíaca vão a óbito. Portanto, a nossa prioridade não é o tratamento sintomáticoda insuficiência cardíaca mas a correção da causa básica que a provocou.

    Todavia, num número importante de pacientes a remoção da causa básicanão é possível, principalmente porque muitas vezes a doença é miocárdica e, portanto,irreversível. Nesses casos, nós vamos fazer o tratamento sintomático da insuficiênciacardíaca.

     Nossa segunda prioridade é a remoção dos fatores que podem desencadearou precipitar a ins