Carmen Silvia Bissoli da Silva - Nova LDB Trajetória Para a Cidadania_ 1

185
5/28/2018 CarmenSilviaBissolidaSilva-NovaLDBTrajetriaParaaCidadania_1-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/carmen-silvia-bissoli-da-silva-nova-ldb-trajetoria-para-a-c

Transcript of Carmen Silvia Bissoli da Silva - Nova LDB Trajetória Para a Cidadania_ 1

  • Trajetria para a cidadania?

    NOVA

    LDBLDB

  • CARMEM SILVIA BISSOLLI DA SILVALOURDES MARCELINO MACHADO

    (Organizadoras)

    1 9 9 8

    ngela Viana Machado FernandesCarlos da Fonseca Brando

    Carmem Silvia Bissolli da SilvaCelestino Alves da Silva Jr.

    Leonor Maria TanuriLourdes Marcelino Machado

    Maria Aparecida Viggiani BicudoMarinel Pereira Abbade

    Trajetria para a cidadania?

    NOVA

    LDBLDB

  • Editora Arte & CinciaRua dos Franceses, 91 Bela VistaSo Paulo SP - CEP 01329-010

    Tel/fax: (011) 253-0746 (011) 288-2676Na internet: http://www.arteciencia.com.br

    1998, by Editora Arte & Cincia

    Editor GeralHenrique Villibor Flory

    Editor Responsvel, Capa e Projeto GrficoAroldo Jos Abreu PintoDiretora Administrativa

    Luciana Ap. Wolff ZimermannEditorao Eletrnica

    Rejane RosaReviso

    Letizia Zini Antunes

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Biblioteca de FCL - UNESP/Assis)

    ndice para catlogo sistemtico:1. Diretrizes e Bases da Educao Nacional 370.26812. Lei de Diretrizes e Bases: Brasil 370.26813. Brasil: Educao 370.9814. Educao: Legislao: Brasil 379.815. Educao e Estado: Brasil: Leis e Regulamentos 379.12

    Nova LDB: trajetria para a cidadania? / Angela Viana MachadoFernandes...| et al. |; Carmen Silvia Bissolli da Silva, LourdesMarcelino Machado (organizadoras) So Paulo: Arte &Cincia, 1998.

    p.189; 21cm.

    Contedo: 1 parte: Nova LDB em discusso. 2 parte:Nova Legislao da Educao Brasileira: referncias bsicas.

    Vrios autores

    ISBN 85-86127-81-7

    1. Cidadania na Nova Lei de Diretrizes e Bases. 2.Educao Leis e legislao Brasil. 3. Educao e Estado Brasil. 4. Legislao do Ensino Brasil 1996. 5. Reforma doEnsino Brasil. I. Fernandes, ngela Viana Machado. II. Silva,Carmen Silvia Bissolli da. III. Machado, Lourdes Marcelino.

    CDD - 370.2681370.9810379.1200379.8100

    N935

  • Este livro dedicado a todosaqueles que se empenham em

    promover a conscincia do direito cidadania e que lutam, solidariamente,

    pela concretizao desse direito.

  • Sumrio

    APRESENTAO ................................................................................... 13PREFCIO .............................................................................................. 17Celestino Alves da Silva Jr.

    1 ParteNOVA LDB EM DISCUSSO

    1. A NOVA LDB: DO PROJETO COLETIVO PROGRESSISTA LEGISLAO DA ALIANA NEOLIBERAL ................................... 23Carmem Silvia Bissolli da Silva

    2. A NOVA LDB E A QUESTO DA ADMINISTRAOEDUCACIONAL ..................................................................................... 33Leonor Maria Tanuri

    3. A NOVA LDB: ALGUMAS OBSERVAES ..................................... 39Marinel Pereira Abbade

    4. COMENTRIOS MARGEM DA NOVA LDB ................................. 49Carlos da Fonseca Brando

    5. EDUCAO ESPECIAL E CIDADANIA TUTELADA NANOVA LDB .............................................................................................. 59Angela Viana Machado Fernandes

    6. EDUCAO SUPERIOR NA NOVA LDB: SEU IMPACTONA UNESP ............................................................................................... 75Maria Aparecida Viggiani Bicudo

  • 10

    7. PARMETROS CURRICULARES NACIONAIS: UMA DISCUSSOEM ABSTRATO ...................................................................................... 87Celestino Alves da Silva Jr.

    8. A NOVA LDB E A CONSTRUO DA CIDADANIA......................... 93Lourdes Marcelino Machado

    2 ParteNOVA LEGISLAO DA EDUCAO BRASILEIRA:

    REFERNCIAS BSICAS

    Organizadoras:Carmem Silvia Bissolli da SilvaLourdes Marcelino MachadoMarinel Pereira Abbade

    INTRODUO ...................................................................................... 1071. EMENTRIO DA LEGISLAO BSICA ...................................... 109

    1.1. Constituio Federal e Emendas Constitucionais ................... 1091.2. Leis Federais ............................................................................. 1091.3. Decretos Federais ...................................................................... 1101.4. Portarias do Ministrio da Educao e do Desporto (MEC) ... 1111.5. Resolues do Conselho Nacional de Educao (CNE) ......... 113

    1.5.1. Resolues do Conselho Pleno (CP) do CNE ............... 1131.5.2. Resolues da Cmara de Educao Bsica

    (CEB) do CNE ................................................................ 1141.5.3. Resolues da Cmara de Educao Superior

    (CES) do CNE ................................................................. 1141.6. Resolues do Fundo Nacional do Desenvolvimento da

    Educao (FNDE) do MEC ....................................................... 1151.7. Pareceres do Conselho Nacional de Educao (CNE) ............. 116

    1.7.1. Pareceres do Conselho Pleno (CP) do CNE ................... 1161.7.2. Pareceres da Cmara de Educao Bsica

    (CEB) do CNE ................................................................ 117

  • 11

    1.7.3. Pareceres da Cmara de Educao Superior(CES) do CNE ................................................................. 119

    2. TRANSCRIO DOS PRINCIPAIS DOCUMENTOS LEGAIS ....... 1232.1. Constituio da Repblica Federativa do Brasil:

    dispositivos sobre a Educao ................................................. 1232.2. Lei Fed. n 9.131, de 24 de novembro de 1995 ....................... 1292.3. Lei Fed. n 9.192, de 21 de dezembro de 1995 ........................ 1352.4. Lei Fed. n 9.394, de 20 de dezembro de 1996 ........................ 1372.5. Lei Fed. n 9.424, de 24 de dezembro de 1996 ........................ 167

    3. REPRESENTAES ESQUEMTICAS DE PRESCRIESDA LDB ................................................................................................. 177

    3.1. Nveis e modalidades de educao e ensino ............................ 1773.2. Responsabilidades das diferentes esferas de governo quanto organizao dos sistemas de ensino .......................... 1793.3. Incumbncias dos estabelecimentos de ensino e dos

    docentes quanto s atividades educativas da escola ............... 1833.3.1. Anexo: sugesto de roteiro para construo do

    projeto pedaggico coletivo .......................................... 184

  • 13

    APRESENTAOA dimenso assumida hoje pelas discusses a respeito da

    cidadania por certo no tem precedentes. Se pensarmos que o conceito decidadania um conceito que tem histria, encontraremos como traocomum, entre os significados atribudos ao longo do tempo, a incluso. Aincluso do indivduo nos direitos civis, no acesso aos direitos sociais eaos bens materiais, culturais, etc.

    Paradoxalmente, contudo, o tempo em que a cidadania figura comocentro das atenes o mesmo em que assistimos, impotentes, escaladavitoriosa da excluso social.

    No campo educacional, a nova Lei de Diretrizes e Bases maisconhecida por LDB recoloca no horizonte das preocupaes sociais aquesto da organizao da educao nacional, definindo, entre outros tantosaspectos, um novo desenho das relaes entre Estado e sociedade e entreas trs esferas de governo. Soluo ou novos problemas?

    Ao longo do texto, aqui e ali, est a referncia cidadania... Em quemedida, contudo, a incluso dos segmentos marginalizados socialmenteser facilitada ou viabilizada mediante a educao? Em que medida umaLDB muito pouco cidad na etapa final de sua tramitao e que, a despeitodo discurso descentralista, concentrou poderes no Ministrio, contribuirpara uma nova era educacional?

    A cavalgada da excluso segue adiante e j provoca manifestaesde preocupao entre trabalhadores que, ao perceberem as mudanasinexorveis no mundo da produo, vem seus postos de trabalhoameaados pelas novas tecnologias que exigem um novo padro dequalificao profissional, o que os faz sentir a necessidade de atualizao,de melhor educao para seus filhos, sem que consigam vislumbrar as reaispossibilidades para que isto se d.

    A

  • 14

    Hoje, a minha oficina j no consegue resolver os problemasdos carros novos... tudo eletrnico, meu servio diminuiu...Minha mulher e minha filha esto trabalhando para auxiliarno sustento da casa... Meu filho fez mecnica no SENAI etrabalha comigo, mas, sem aprender eletrnica, fica difcilmanter a oficina... Se ele conseguisse continuar os estudos,fizesse computao noite... A concorrncia est pesada...Essas mudanas todas vieram com muita velocidade e nssomos muito pobres para... (Sr. Dito, mecnico de automveisem Marlia, SP)

    Na fala desse trabalhador, at h pouco tempo autnomo e estvel,a ameaa dos novos processos de excluso... Em suas palavras, a esperanana educao e, ao mesmo tempo, a desconfiana em relao s suas prpriascondies em poder dela se beneficiar.

    provvel que a lucidez do Sr. Dito no seja uma caractersticapredominante dos brasileiros. A sua condio de pequeno proprietriotambm pode ser considerada como privilegiada, considerando-se osefeitos, no mundo do trabalho, do livre jogo da economia internacional demercado. Os novos excludos somam-se aos j anteriormente excludos eas estrias vividas, e muitas vezes no contadas, fazem das preocupaesdo Sr. Dito uma situao at invejvel.

    Considerando o contexto atual, ser a atual LDB um caminhopossvel para uma nova cidadania?

    essa a questo que permeia os trabalhos aqui reunidos, compondoa primeira parte desta coletnea. Embora produzidos para debates compblicos distintos em datas e locais tambm distintos, por meio deconferncias, mesas redondas, apresentao em congressos e mesmo aulas,essa preocupao comum dos autores permitiu a organizao da mesma.Assim, os textos apresentados procuram apontar as inquietaes dosautores e autoras em face do texto legal, tendo como foco principal ospercalos do processo histrico de elaborao da nova LDB e as dvidasquanto s reais possibilidades de transformao da educao nacional. Ainteno alertar os interessados em relao a alguns aspectos consideradoscruciais em termos de certos riscos e inconsistncias, bem como em relaoa possibilidades e avanos.

    Carmem Silvia Bissolli da Silva recorre trajetria da nova LDBpara demarcar a distino entre o momento histrico do incio e o do finaldesse processo. na contraposio entre as caractersticas desses dois

  • 15

    momentos que seu trabalho apresenta subsdios compreenso da lgicaque preside nova legislao, no quadro do projeto poltico-social queela representa.

    Leonor Maria Tanuri, historiando a questo da centralizao-descentralizao no desenvolvimento recente da administraoeducacional brasileira, oferece elementos para que se compreenda melhoro sentido da atual legislao no que diz respeito referida questo.

    Marinel Pereira Abbade recupera o histrico das leis de diretrizese bases da educao brasileira para ater-se, ento, atual LDB. A anlise dealguns de seus dispositivos inscreve o trabalho da autora entre os quealimentam o debate a respeito dos temas polmicos suscitados por essetexto legal.

    Carlos da Fonseca Brando discute alguns dos dispositivosfirmados pela nova LDB. Provocativo por suas dvidas e questionamentos,o texto do autor pode ser considerado entre os que aquecem as discussessobre a mesma.

    Angela Viana Machado Fernandes, considerando a questo daresistncia quanto incluso dos diferentes pelas sociedades em geral,elege como eixo para anlise do atendimento educacional aos portadoresde necessidades especiais no Brasil, as categorias de cidadania tuteladaversus cidadania conquistada. nessa perspectiva que examina osavanos alcanados na nova LDB em relao ao assunto.

    Maria Aparecida Viggiani Bicudo, na condio de Pr-Reitora deGraduao da UNESP, ao voltar-se para os reflexos da nova legislaonessa instituio, questiona a concepo de universidade e discute os temasmais polmicos referentes organizao da Educao Superior segundoos dispositivos da nova LDB.

    Celestino Alves da Silva Jr., ao discutir um dos desdobramentosda nova legislao, os Parmetros Curriculares Nacionais (PCNs),transcende a mera avaliao dos contedos dos mesmos, elegendo questescomo: sua necessidade, sua autntica nacionalidade, sua oportunidade esua prpria viabilidade.

    Lourdes Marcelino Machado, a partir da considerao de que aorganizao escolar no obra pura da legislao, centra sua ateno naunidade escolar e, tendo por referncia os marcos traados pela nova LDB,indaga a respeito das perspectivas da efetiva transformao do espaoescolar em local de construo da cidadania.

    Uma segunda parte foi includa nesta coletnea visando doisobjetivos: facilitar o acesso do leitor aos documentos oficiais e oferecer

  • 16

    alguns recursos que pudessem auxiliar na compreenso dos mesmos.Organizada por Carmem Silvia Bissolli da Silva, Lourdes MarcelinoMachado e Marinel Pereira Abbade, apresenta um Ementrio daLegislao Bsica que disciplina a atual organizao da educao brasileira,seguido da reproduo integral de documentos legais consideradosfundamentais. Inclui representaes esquemticas de aspectos bsicos daorganizao da educao nacional e um roteiro como sugesto paraelaborao de projeto pedaggico.

    Os textos aqui apresentadas somam-se aos que tm sido veiculadosaps a aprovao da nova LDB, e o debate deve continuar...

    O que no se pode perder de vista o sentido da reordenao daeducao escolar iniciada em 1995, ou seja, de sua relao com a questoda cidadania. Pretendemos oferecer, com esta coletnea, alguns subsdiosque possam alimentar as reflexes a esse respeito.

    Cumpre-nos agradecer a todos aqueles que colaboraram para queeste texto viesse a pblico: Leonor Maria Tanuri e Celestino Alves daSilva Jr., pelo estmulo constante e sugestes; Curso de Ps-Graduao emEducao e Pr-Reitoria de Graduao, pela confiana e apoio; lide MariaFres Borges, pelo auxlio na reviso dos textos; Sylvia Helena MoralesHoriguela de Moraes, pela colaborao na normalizao bibliogrfica;Marilis Custdio de Lima Machado e Marco Antnio Machado, pelacolaborao nos trabalhos de digitao e diagramao dos originais.

    Marlia, setembro de 1998.Carmem Silvia Bissolli da Silva

    Lourdes Marcelino MachadoOrganizadoras

  • 17

    PREFCIOA discusso sobre a nova Lei de Diretrizes e Bases da

    Educao Nacional sugere uma reflexo sobre um questo que a antecede:qual , afinal, o sentido prtico de uma Lei, qualquer que ela seja, no pasdas Medidas Provisrias? O que um povo governado ou, melhor dizendo,regido por decises de ocasio pode esperar de um documento que tem afinalidade de ordenar a vida educacional de sua nao por um temposupostamente longo, capaz de consolidar diretrizes, clarificar rumos eassegurar alternativas? Entre as alternativas duradouras colocam-setambm aquelas potencialmente capazes de induzir alteraes na vidanacional ou a Lei apenas consagra e sedimenta vises e posies dedetentores eventuais de um Poder que se pretende sbio e clarividente eque, como tal, pretenderia tambm se perpetuar?

    At que se chegasse ao produto final LDB, um inicialmenteesperanoso percurso foi trilhado pelos educadores brasileiros que diretaou indiretamente se entregaram a essa discusso. Ao longo do tempo e docaminho as esperanas deram lugar s dvidas e essas s frustraes. Aofinal da trajetria a pergunta que d ttulo a este livro havia se tornadoobrigatria. Chegaremos cidadania pela via da LDB? Se a novaConstituio da educao brasileira no puder nos ajudar nessa travessia,a que ento, ela poder nos conduzir?

    Os textos reunidos nesta coletnea buscam prioritariamente re-sponder a essas questes. Por isso eles nos remetem aos cenrios e aosatores principais das situaes j vividas e daquelas que se apresentarocomo desdobramentos das disposies e, inclusive, das lacunas do textolegal. A tenso e a ateno dos educadores durante o processo de elaboraolegislativa, a contribuio de alguns parlamentares e a alienao de muitosdeles ao longo desse mesmo processo, o distanciamento da opinio pblica

    A

  • 18

    e a reduzida participao popular na discusso, o desalento que vai seapossando dos debatedores ante a evidncia do rolo compressor armadopor autoridades governamentais e acionado pela imprevidncia de umparlamentar/educador fragilizado pela doena e pela vaidade todosesses elementos e muitos outros compem o amplo painel impressionistasobre o qual necessrio centrar nossa reflexo.

    Como outras Universidades brasileiras certamente o tero feito,tambm a Unesp se debruou sobre esse painel em diversos momentos epelas mais diversas formas. Reunies, encontros, seminrios tiveram suasagendas total ou parcialmente reservadas para a anlise do prprio percursohistrico do Projeto at sua consubstanciao como Lei, para a reflexosobre a estrutura e as partes integrantes do texto da Lei, para busca daidentificao dos eixos presumidos ou proclamados do diploma legal,para a dissecao dos possveis substratos tericos em que a nova Lei seapoiaria, para indicao ou denncia dos interesses e compromissospolticos subjacentes ou explcitos no processo e no produto finalelaborado e implantado.

    As organizadoras deste livro, alm de sua contribuio pessoal aoseventos de que participaram, propuseram-se a reunir e organizar partesignificativa da produo de nossa Universidade sobre o tema LDB, nelaincludo um trabalho de docente de outra instituio apresentado em um doseventos promovidos pela Unesp. Chegou-se, assim, a uma amostrarepresentativa das discusses havidas e das preocupaes assinaladas. No setrata, como bvio, do pensamento da Unesp sobre a nova LDB, mas setrata, sem dvida, da reflexo crtica de um conjunto de pesquisadores que, luz de suas especialidades e de seus critrios de anlise, trazem a pblico suasreferncias para atribuio de significado a um momento representativo dahistria atual da educao brasileira.

    Se, de qualquer forma, uma Lei foi produzida, chegado o momentode nos organizarmos para sua fase de ps-produo. Entre o entusiasmoingnuo pela Lei imaginada e a amargura contida pela Lei sancionada,coloca-se a lucidez necessria ante a Lei a ser praticada. Da simples reao Lei h que se passar sua observncia e utilizao. Da anlise de suapotencialidade h que se chegar, sem que isso signifique rendio ouacomodao, ao preenchimento de seus vazios e superao de suasomisses.

    Se num primeiro momento nos perguntamos sobre a perspectiva daLei diante da realidade das Medidas Provisrias, parece ser este o momentode nos interrogarmos sobre a perspectiva das leis complementares face realidade da Lei estabelecida. As medidas que balizaro as interrogaes a

  • 19

    serem feitas, estas sim, nada podero ter de provisrias. Em sua formulaoe em sua inteno devero estar permanentemente vinculadas aocompromisso de interveno pblica em favor da coisa e da causa pblicas.Propor, indicar, representar, examinar, discutir, contrapor, resistir soalgumas das aes novamente em pauta. Ajudar a pensar a necessidade, alegitimidade e a viabilidade dessas aes constitui a sntese da contribuiodos autores aqui reunidos.

    Marlia, primavera de 1998.Celestino Alves da Silva Junior

  • 1 PARTE

    Nova LDBem discusso

  • 23

    1. A nova LDB: do projeto coletivo progressistaa legislao da aliana neoliberal1

    Carmem Silvia Bissolli da SILVA2

    Introduo

    O dia 20 de dezembro de 1996 foi marcante para a educaobrasileira. Despedimo-nos de nossa primeira LDB, a antiga Lei Federal n4024/61 que, mesmo reformada algumas vezes, orientou a organizaoescolar brasileira por 35 anos. J passava da hora de nos desvencilharmosdela, bem como de suas alteraes produzidas no bojo do Regime Militar:a Lei da Reforma Universitria a 5.540/68 e a Lei de Reforma doEnsino de 1 e 2 Graus a 5.692/71 que, por sua vez, tambm foialterada no que se referia ao Ensino Profissionalizante pela 7.044/82.Todavia, o alvio de nos descartarmos desse conjunto de textos legais nofoi acompanhado por um sentimento de euforia e nem mesmo de alegria pelo menos por grande parte da comunidade acadmica ao recebermosa nova LDB que inaugurava um outro perodo na histria da educaobrasileira. Pelo contrrio, o sentimento dominante entre os educadores eestudantes que se envolveram nos trabalhos que antecederam a aprovao

    O

    1 Texto apresentado na mesa redonda A LDB em Debate, em 25 de julho de 1997,

    por ocasio do Simpsio Multidisciplinar Internacional: O pensamento de MiltonSantos e a construo da cidadania em tempos de globalizao, realizado em Bauru/SP. Com algumas alteraes foi tambm apresentado em 21/10/97 no I Congresso deCincias da Educao, realizado em Araraquara, no perodo de 19 a 21 de outubro de1997. Verso revista.2 Departamento de Administrao e Superviso Escolar da Faculdade de Filosofia eCincias, UNESP 17525-900 Marlia SP.

  • 24

    da Lei Federal n 9.394/96 foi de frustrao. Mas, para que se entendam osmotivos dessa frustrao, preciso que nos reportemos ao incio da histriada nova LDB. E exatamente isso que pretendemos expor neste trabalho.

    Num primeiro momento procuraremos demonstrar que o conturbadoprocesso de tramitao da atual LDB no Congresso Nacional foi demarcadopor dois momentos distintos no que se refere ao contexto scio-econmico-poltico do pas e isso marcou a diferena entre os primeiros projetosencaminhados no final dos anos 80 e o texto final da Lei aprovado emdezembro de 1996. Num segundo momento, considerando o processo detramitao do projeto de LDB, procuraremos evidenciar as estratgiasutilizadas pelos parlamentares interessados em alinhar tal documento aocomando poltico-econmico do Brasil nos anos 90. ainda nessa segundaetapa e com base no histrico at ento apresentado que poderemos tecernossas reflexes a respeito do esprito, no apenas da nova LDB, mas doconjunto da legislao produzida no final do processo de disputa queenvolveu a tramitao da mesma. Num terceiro momento poderemos entoapresentar a contraposio existente entre a lgica que permeia a legislaovigente e a lgica contida nos projetos iniciais da LDB, projetos essesproduzidos em consonncia com o contexto scio-econmico-poltico dopas na segunda metade da dcada de 80. Por fim, com uma sntese destetrabalho, pretendemos ter apresentado os elementos que subsidiem areflexo sobre o sentido poltico-social da nova legislao e, tambm,sobre o que ela possa estar representando para uma boa parte dos principaisagentes do processo educativo, ou seja, para os educadores e estudantesbrasileiros.

    Contextos demarcadores

    A histria da nova LDB comeou por volta da metade da dcada de80, no governo Sarney. Atravessou os governos de Collor e de Itamar,tendo sido aprovada na metade do governo do atual presidente FernandoHenrique Cardoso. Foi demarcada, portanto, por dois momentos bastantedistintos da sociedade brasileira: do fim dos anos 80 e da metade da dcadade 90. certo que ambos podem ser compreendidos dentro do perodo emque o neoliberalismo j se fazia presente no Brasil, porm at os anos 90seus efeitos pouco se faziam sentir se comparados com as transformaesoperadas na sociedade brasileira a partir de ento.

    As primeiras idias em relao nova LDB comearam a serdebatidas por educadores e estudantes no perodo correspondente ao dos

  • 25

    trabalhos da Assemblia Nacional Constituinte de 1987-88, antes mesmoda homologao da Constituio Federal de 1988. Encontrvamo-nos,nessa poca, em fase de grande ebulio social, na medida em que a transioentre o regime militar e a retomada da direo do pas pelos civis mobilizavaa sociedade em direo sua reorganizao. Na busca da nova ordemjurdica, interesses conflitantes e muitas vezes antagnicos entravam emjogo. Grupos polticos disputavam o controle dos movimentosdesencadeados nos diferentes setores da Nao. Valores eram revistos e aquesto dos direitos humanos ocupava lugar de destaque entre os interessesda poca. As disputas ideolgicas se acentuavam e, sendo mais veiculadaspelos meios de comunicao de massa, ofereciam maior visibilidade luta de classes. A dvida externa herdada do perodo anterior continuavaatrelando o pas ao controle dos organismos financeiros internacionais. Ahiper-inflao, aps duas tentativas de controle da economia pelo governoSarney, j fazia parte do nosso cotidiano. A crise do capitalismo se acentuava,porm as respostas de cunho neoliberal eram atenuadas pela resistncia deum pas em estado de efervescncia social, no qual a ala poltica consideradamais progressista era fortalecida pelos movimentos sociais. Assim, osproblemas sociais acentuados pela crise do capitalismo ainda eram vistoscomo sendo da alada do Estado, um Estado que se pretendia forte a pontode exercer algum controle interno em relao economia internacional demercado que ento se precipitava e forava as barreiras protetoras domercado nacional. O teor da Constituio de 88, mesmo tendo sidoamenizado pela atuao do Centro, expressa bem o contexto dessa poca,concebendo um Estado com caractersticas que mais se aproximavam deuma social-democracia portanto, nos termos da ideologia liberal quede um neoliberalismo.

    As eleies de 1989 refletiram bem as caractersticas desse perodona medida em que os dois candidatos que chegaram ao 2 turno Lula eCollor personificavam dois polos ideolgicos opostos, em disputa. Coma vitria de Collor, firmou-se a aliana do governo brasileiro com os pasescredores no sentido de realinhar a nao aos ditames da nova ordemmundial, encerrando-se, ento, um perodo em que o neoliberalismo noencontrava ainda as condies favorveis para avanar, pacificamente, ese impor, efetivamente. O perodo da reviso constitucional oportunizou,at onde foi possvel na poca, alguma preparao do aparato legal emfuno da insero do pas no livre jogo da economia internacional demercado que tem como base a lei da liberdade natural do mercado e dalivre concorrncia. Os ajustes no alcanados nesse perodo foram sendoretomados progressivamente, ao longo dos governos que se sucederam,

  • 26

    sobretudo no atual, atravs de Emendas Constitucionais. Da ascaractersticas dos anos 90, ao longo dos quais as alteraes vo sesucedendo, justificadas por um conjunto de idias que podem sersintetizadas, de forma simplificada, como as que seguem. O argumento o da modernizao para o ajuste do pas aos novos tempos. O princpio o da racionalizao dos recursos. O objetivo o da otimizao dascondies para a competio no mercado mundial. As implicaes para oEstado consistem em sua reduo a um mnimo, tanto no que se refere rea da produo quanto dos servios; da as privatizaes, asdesregulamentaes, as terceirizaes, as parcerias e as diferentes formasde descarte de parte de seus funcionrios. As implicaes para as empresasem geral so as de reviso da poltica de organizao do trabalho, degerenciamento, incluindo a de relaes de emprego; da a flexibilizaodo emprego, as terceirizaes, a qualidade total.

    Embora apresentado como uma necessidade de preparar o pas paraa competitividade no contexto do mercado internacional, o neoliberalismotem sido visto, pelos seus crticos, como uma forma engenhosa de lidarcom a crise do capitalismo, modificando as regras do jogo de tal formaque, lidando com o mercado em escala macro e apoiando-se nas atuaispossibilidades da tecnologia, ao mesmo tempo em que amplia as condiesde concentrao do capital, recupera a alternativa dos excludosintrojetarem a culpa pelo seu insucesso na competio. Ento, a conhecidafrase: As oportunidades esto a, eu que no soube aproveit-las passaa ser substituda pela: Eu no consegui me preparar bem para ser um dosmelhores. Mas a excluso crescente dos indivduos, de grupos e at mesmode classes sociais faria parte da lgica do capitalismo contemporneo namedida em que, com a reduo da esfera da produo e o crescimento dosetor tercirio ou de servios da economia, a nova forma de incorporaodos indivduos sociedade pelo consumo e pelos servios emsubstituio ao trabalho produtivo no daria conta de incorporar umaboa parte de seus membros. Alm disso, tendo o mercado como reguladordas relaes humanas, no haveria como preservar ou regular direitosfundamentais tais como os ligados sade, educao, cultura, alm deoutras reas.

    Mas, qualquer que seja a justificativa dada s mudanasempreendidas no pas a partir dos anos 90, importante reconhecer queelas esto a alterando nosso cotidiano, nossas relaes com as instituies,nossos projetos de vida, nosso projeto de pas. E por ocorrerem com talfora e rapidez e se refletirem nas prprias condies de organizao dostrabalhadores, parecem conduzir as pessoas e as instituies, em geral, a

  • 27

    um estado de torpor, de paralisao e, poderamos arriscar a dizer, dedepresso em virtude da constatao de uma desconstruo do que foiconquistado tanto individual quanto coletivamente. E mesmo tendo sado,nos ltimos anos, de um longo perodo de recesso econmica econseguido controlar a inflao, a situao grave no que se refere sameaas de perdas ou mesmo s perdas j efetivadas quanto s condiesde sobrevivncia em termos de pequenos, mdios e at grandes negciosnacionais, trabalho e salrios, sade, seguridade social, educao e cultura.Nessas circunstncias, movimentos sociais, tanto urbanos quanto rurais,tm despontado com reivindicaes que, muitas vezes, no se restringindoa aspectos econmico-corporativos, avanam na perspectiva dos elementostico-polticos. Diante do que presenciamos nos ltimos anos, podemosconsiderar que, nesta nova forma global de administrar a crise docapitalismo, o velho e o novo se mesclam e se entrecruzam de vriasmaneiras: a velha determinao de ampliar e concentrar o capital se abastecede novos patamares da cincia e da tecnologia; a velha lgica da exclusosocial se veste de novas roupagens; a velha prtica de ampliao do capi-tal se alimenta de novas formas de excluso social, etc. No caso brasileiro,essa mescla passou a ser personificada pelos grupos constitutivos do poder:novas personalidades que representam ideais modernizadores praticandoa velha aliana com os grupos representantes do capital internacionalpara o novo jogo determinado pela economia global; e, como o casoatual, partidos anteriormente considerados progressistas numa amplaaliana com partidos de tradio conservadora e com os organismos queadministram o novo jogo, determinado em funo do livre mercadointernacional.

    Foi nesse contexto, to distinto do momento em que travamos nossasprimeiras discusses e elaboramos nossas primeiras formulaes sobre oprojeto de LDB, que ocorreu a aprovao da Lei Federal n 9.394. Ficafcil entender, ento, por que uma concepo norteadora da educaoformulada naquela poca no poderia sustentar sua aprovao em anosmais recentes. Tambm fica fcil entender por que foi to conturbado oprocesso de tramitao do Projeto de LDB, sobre o qual podemos agorafazer uma breve retomada.

    Na travessia desses dois contextos distintos, as idias iniciais quese transformaram no 1 projeto de LDB foram se esvaziando e setransmutando atravs de substitutivos consecutivos at chegar versofinal. Nesse processo, entraram em cena alguns atores que desempenharampapel de maior relevo na disputa que passou a ser travada no mbito dasduas casas do Congresso Nacional: alguns parlamentares que se destacaram,

  • 28

    os Ministros de Educao como representantes dos vrios governos quese sucederam e o Frum em Defesa da Escola Pblica, representandocerca de 34 instituies cientficas e sindicais.

    Estratgias de descaracterizao

    importante observar que, na disputa ocorrida durante o processode tramitao do projeto de LDB, o velho e o novo tambm seentrecruzaram. O poder executivo, em articulao com parte do legislativo,adotou a velha prtica de fazer valer seu projeto de educao, dispensandoa velha forma de imposio de um documento elaborado em gabinete.Aplicou uma nova maneira de ir esvaziando o projeto que inicialmenteexpressava a vontade coletiva, ao mesmo tempo em que foi neleintroduzindo algumas alteraes. Dessa maneira, imps o seu projetoatravs de duas tcnicas fundamentais: a da sobreposio de seu texto aotexto do projeto coletivo e a da criao de lacunas a serem preenchidas porreformas setorizadas. Alguns desses vazios j foram sendo preenchidos,por iniciativa do executivo, mesmo antes da aprovao da nova LDB,iniciativa essa que vem sendo adotada tambm, sucessivamente, nos anossubseqentes a ela. Dessa forma, ao mesmo tempo em que se preservou aaparncia de um processo democrtico na tramitao do projeto de lei,buscou-se uma certa legitimidade social, na medida em que muitos doselementos do projeto coletivo foram mantidos na verso finalmenteaprovada, ainda que alguns dos dispositivos, em suas melhores partes,tenham sido transformados ou eliminados. Tais resultados foramviabilizados atravs da aliana do Ministrio da Educao comparlamentares que, ao mesmo tempo em que se prestaram a fazer o jogo dogoverno, se aproveitaram do prestgio decorrente dessa aliana para colocaralgumas de suas idias pessoais no projeto em tramitao. Tanto que, apartir da interveno mais decisiva do senador Darcy Ribeiro durante afase de tramitao do projeto de lei no Senado, o texto passou a serconhecido com a denominao Darcy-MEC, em aluso articulao doento parlamentar com o ministro da Educao, Paulo Renato Costa Souza.Essa situao pode ser vista como expresso de uma aliana mais ampla,que inclui os entendimentos do executivo com organismos internacionais,sobretudo com o Banco Mundial, no sentido de alinhar a educao sexigncias da realidade imposta pela nova ordem mundial.

    Apesar do empenho do Frum em Defesa da Escola Pblica, quedurante o trmite do projeto da LDB procurou preservar as orientaes doprojeto coletivo, percebe-se, no texto final, alguma mesclagem das

  • 29

    concepes em disputa. Com esse resultado, se no se pode considerar anova LDB, em si mesma, como expresso de uma concepo neoliberal,deve-se, a partir dos vazios deixados em seu texto, reconhec-la comoum instrumento que, pelo menos, no impede o realinhamento da educao essa orientao atualmente em hegemonia. Nesse sentido, o esprito danova LDB no pode ser apreendido a partir da anlise dela em si, mas daconsiderao do conjunto da legislao bsica que est sendo formuladano contexto da concretizao dos princpios do neoliberalismo no Brasil,marcando-o, ento, com a lgica da racionalizao de recursos e com aalterao do papel do Estado em relao aos seus deveres com a educao.

    Lgicas em disputa

    Pelo exposto at o momento, pode-se depreender que a frustraodo segmento da comunidade acadmica mais comprometido com o projetocoletivo decorre do sentimento das perdas no apenas em relao a ele,mas sobretudo em relao ao projeto social que representava. Foi comotirar das mos da comunidade educativa a possibilidade de construo deum sistema democrtico de educao pblica, construo essa colocadacomo responsabilidade do Estado, com a colaborao da sociedade. Aindaque fossem reconhecidas algumas de suas limitaes, tratava-se, ento, deum projeto elaborado pelos inconformados com a forte reproduo dadiscriminao social, ainda realizada pelo sistema escolar brasileiro, osquais entendiam que, com base na lgica do direito educao, as diretrizese as bases da educao no deveriam se subordinar aos recursos disponveismas, ao contrrio, caberia ao Estado, em colaborao com a sociedade,promover as condies para o atendimento desse direito. O projeto,justamente por considerar a situao de carncia educacional da populaobrasileira, ao invs de subordinar as novas diretrizes e bases precariedadeexistente, buscava, ao contrrio, a elevao dos patamares a serem oferecidos populao. Dessa forma, concebia a educao, no seu todo, comoprioridade, no se enquadrando, ento, idia de estabelecimento de estritasprioridades em matria de educao em funo dos recursos disponveis.Essa proposta caminhava em consonncia com o movimento dedemocratizao da sociedade no qual ganhava expresso a consideraodo atendimento aos direitos humanos. Da, no pode haver dvida que,nestes termos, tal projeto no poderia vingar no contexto do Brasil dosanos 90.

    No entanto, a legislao educacional elaborada a partir de 1995encontra-se totalmente compatvel com o projeto de sociedade firmado a

  • 30

    partir da. E no necessrio conhecer muito dos estudos sobre as relaesentre educao e sociedade para que possamos fazer tal afirmao. A prprialgica nos levaria a ela.

    Como j vimos, percebe-se no texto da nova LDB uma srie devazios que o MEC, mesmo antes de sua aprovao, tem tomado ainiciativa de preencher. Alm de conter tais omisses, essa Lei se caracteriza,tambm, por dispositivos que deixam uma grande parte dos temas emaberto, indicando apenas possibilidades a serem escolhidas pelos diferentesnveis da administrao pblica. Somando-se, ento, o alto grau deflexibilidade encontrada no texto para utilizar o termo com que estaquesto apresentada pela voz oficial com as omisses, representadaspelos vazios, h uma grande margem de indefinies que devero ser,assim como j vm sendo, resolvidas, sem sombra de dvida, emconsonncia com a lgica do contexto. E essa lgica, como j se sabe, algica do mercado em funo da concentrao do capital que, por sua vez,se apoia em mecanismos de excluso. No aceitar esse raciocnio significaentender que a lgica dos direitos humanos teria o poder de se sobrepor lgica do mercado. E j dispomos de experincia suficiente parasuperarmos tal ingenuidade. Prevalecendo, ento, a lgica do mercadoatual, que traz embutida a lgica da racionalizao de recursos, e do Estadomnimo, o novo e o velho tambm se entrelaam no processo demercantilizao da educao, expressando-se no conjunto da legislaoda educao de cunho neoliberal. Assim, as novas formas previstas para aorganizao do sistema escolar a parceria, a privatizao, adesconcentrao, a descentralizao, a municipalizao, a flexibilizao,a participao, a redistribuio de recursos, a avaliao de cursos e deinstituies, a coordenao e integrao dos diferentes sistemas, alm dacolaborao entre eles acabam por funcionar como mecanismos da velhalgica de excluso dos alunos do sistema escolar. Mesmo que se possamaceitar, no todo ou em parte, algumas das medidas reformadoras daeducao no Brasil hoje, os efeitos devastadores da economia livre e glo-bal de mercado dariam conta de transformar as idias propostas emmecanismos de excluso. Nesse sentido, no haveria projeto que pudesseresistir aos seus efeitos, na medida em que a competitividade e aseletividade, ou seja, o darwinismo social, fazem parte natural de sualgica.

    Pelo exposto, a legislao da aliana neoliberal pode ser vista, deforma geral, como um instrumento de retrao do Estado em relao aosseus deveres com a educao. Tendo como referncia os recursosdisponveis, o Estado no reconhece a educao como prioridade, no

  • 31

    assumindo, como de sua responsabilidade, o atendimento das necessidadesem todos os nveis de ensino. Dessa forma, estabelece estritas prioridadesa serem atendidas efetivamente pelo Estado e, assim mesmo, submetendoas diretrizes e as bases da educao aos patamares das j precrias condiesda realidade brasileira. Estabelece relaes de mercado com as instituieseducacionais e terceiriza servios educacionais atravs das instituiesparticulares. Enfim, mercantiliza o trato das questes educacionais.

    Em sntese e em concluso...

    Em 1996, ano em que a nova LDB foi aprovada, o contexto scio-poltico-econmico configurava-se de uma maneira muito distinta, quandocomparado com o do final dos anos 80, fase em que os primeiros projetosforam encaminhados, e isso marcou a diferena entre eles. Inauguradocomo expresso da vontade coletiva e marcado pela lgica do direito educao e do dever do Estado em atend-lo, o projeto inicial foi sendoesvaziado em funo das exigncias de uma nova realidade que passou ase configurar a partir da insero mais intensa do pas no livre jogo daeconomia de mercado cada vez mais global e, consequentemente, da revisodo papel do Estado em funo dos parmetros da nova ordem mundial.Regulado pelos ditames dos organismos internacionais, o texto da LDBdifere do projeto inicial no tanto pelo que est escrito, mas pelo que foiexcludo do mesmo, deixando muitos vazios que, por iniciativa do poderexecutivo em sincronia com o legislativo, em parte foram sendopreenchidos paralelamente prpria tramitao da Lei no Congresso e, emparte, vm sendo completados aps a aprovao da mesma. Assim, o espritoda nova LDB no pode ser apreendido a partir da anlise dela em si, masda considerao do conjunto da legislao bsica que est sendo formuladano contexto da concretizao dos princpios do neoliberalismo no Brasil,marcando-a ento com a lgica do mercado.

    Diante dos contrastes apresentados entre os perodos demarcadoresda nova LDB, podemos concluir que no haveria como contar com a euforiados educadores quando do desfecho desse longo processo de disputa.

    Bibliografia consultadaARROYO, M. G. Reinventar e formar o profissional da educao bsica.

    In: BICUDO, M. A. V., SILVA JR., C. A. da. (Orgs.). Formao doeducador: dever do Estado e tarefa da Universidade. So Paulo: Editorada UNESP, 1996.

  • 32

    BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Brasil (CF/88).Coordenador: Maurcio Antonio Ribeiro Lopes. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 1997.

    BRASIL. Lei n. 9.394, 20 dez. 96. Estabelece as diretrizes e bases daeducao nacional. Dirio Oficial da Unio, v.134, n.248, p.27833-41,1996.

    CHAU, M. Em torno da universidade de resultados e de servios. RevistaUSP, Dossi Universidade-Empresa, So Paulo, n.25, p.54-61, 1995.

    CORAGGIO, J. L. Desenvolvimento humano e educao: o papel dasONGs latino-americanas na iniciativa da educao para todos. SoPaulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 1996.

    COSTA, M. V. (Org.). Escola bsica na virada do sculo: cultura, poltica eeducao. So Paulo: Cortez, 1996.

    FAUSTO, B. Histria do Brasil. So Paulo: Ed. da USP, Fundao doDesenvolvimento da Educao, 1995.

    FRIGOTTO, G. Educao e a crise do capitalismo real. So Paulo: Cortez,1996.

    GHIRALDELLI JR., P. (Org.). Infncia, educao e neoliberalismo. SoPaulo: Cortez, 1996.

    LAUGLO, J. Crtica s prioridades e estratgias do Banco Mundial para aEducao. Cadernos de Pesquisa, So Paulo, n.100, p.11-36, mar.1997.

    OLIVEIRA, R. P. de O. (Org.). Poltica educacional: impasses e alternativas.So Paulo: Cortez, 1995.

    SAVIANI, D. A nova lei da educao: trajetria, limites e perspectivas.Campinas: Autores Associados, 1997.

    UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA. Pr-Reitoria de Graduao. VCircuito PROGRAD: As atividades de seu curso atendem ao perfil doprofissional a ser formado? So Paulo: PROGRAD, 1996.

  • 33

    2. A nova LDB e a questo daadministrao educacional1

    Leonor Maria TANURI2

    Para falar das Diretrizes da Educao Nacional importantelembrar que foram os educadores dos anos vinte e incio dos anos trintaque batalharam para que a Unio fixasse as diretrizes gerais e as grandeslinhas de um sistema nacional de educao. Em face do absentesmo daUnio relativamente ao ensino popular e do centralismo normativo quantoao ensino secundrio e superior, queriam os educadores daquele momentoque se superasse esse dualismo ento vigente e que a Unio assumisse opapel que lhe cabia de coordenao da ao educativa em todo o pas e dedefinio das diretrizes maiores da educao nacional. Pretendiam aindaaqueles educadores que os Estados tivessem a liberdade de organizar osseus sistemas de ensino como um todo, seguindo diretrizes centralmentefixadas.

    Como se sabe, tais idias foram vencedoras, vindo a consubstanciar-se em artigos da Constituio de l934 que, entretanto, no chegaram a sercolocados em prtica imediatamente devido ao centralismo estabelecidopela Constituio Estadonovista. Na vigncia desta, a Unio imps, paratodos os nveis e modalidades de ensino, modelos nicos de organizao,currculos, programas e avaliao.

    No movimento pendular que marcou o desenvolvimento

    P

    1 Este texto constitui uma verso modificada daquele apresentado na Mesa Redondasobre As Diretrizes da Educao Nacional, realizada a 10/07/96, na 48a. Reunio daSBPC, So Paulo.2 Assessora da Pr-Reitoria de Graduao da UNESP 01419-901 So Paulo

    SP.

  • 34

    administrativo da educao nacional, o pndulo comea a voltar-se para osentido oposto. A diviso de atribuies, entre o poder central e os Estados,consagrada em l934, retomada na Constituio de l946, dando-se Unioa competncia de fixar as diretrizes e bases da educao nacional e, aosEstados, a atribuio de organizar os seus respectivos sistemas de ensino.A morosidade e as atribulaes do processo legislativo concorreram paraque a primeira Lei de Diretrizes e Bases tivesse uma longa tramitao de13 anos, s conseguindo aprovao em 1961. No h dvida, entretanto,de que ela logrou considervel avano na questo administrativa. Iniciava-se, pela primeira, vez uma relativa descentralizao do sistema como umtodo, concedendo-se considervel margem de autonomia aos Estados edando-lhes as linhas gerais a serem seguidas na organizao e administraode seus sistemas.

    Importante decorrncia da descentralizao prevista pela primeiraLDB (Lei 4.024/61) foi a separao entre rgos com funesessencialmente normativas e rgos com funes executivas. Assim, o MECe as Secretarias de Educao deixavam de absorver ambas as funes,criando-se, para o exerccio das funes normativas, o Conselho Federalde Educao (CFE) e os Conselhos Estaduais de Educao (CEEs).

    Entretanto, durante o regime militar ocorreriam duros golpes naproposta descentralizadora da LDB, evidenciando-se uma progressivacontramarcha no apenas iniciado processo de descentralizao. OPlanejamento da Educao, que era incumbncia do CFE, transfere-se paraos rgos executivos, como reflexo da hegemonia absoluta do poderexecutivo sobre o legislativo; os Conselhos Federal e Estaduais tmas suas funes normativas e deliberativas esvaziadas, limitando-se a umaao casustica; as Leis de Diretrizes e Bases aprovadas na vigncia daEmenda Constitucional de 1969 (Leis 5.540/68 e 5.692/71) refletiram atendncia centralista, tanto pela sistemtica com que foram aprovadas,como pelo contedo e pela regulamentao minuciosa de alguns assuntosque antes ficavam sob o encargo dos Estados. A propsito, importantelembrar o quanto essa legislao mereceu a rejeio dos meios acadmicos,especialmente dos educadores, cujos trabalhos centraram-se na crtica e nadenncia de seus aspectos mais destacados (como a profissionalizao noensino de segundo grau).

    Aprovada a nova Constituio sob a bandeira da redemocratizao,as esperanas centraram-se numa nova LDB como instrumento capaz demodificar a educao nacional, livrando-a das mazelas do perodo militar.As associaes de educadores se mobilizaram, procurando mediar pressesde diversos setores da sociedade, no sentido de incorporar ao projeto seus

  • 35

    interesses especficos, por vezes ambiciosos e minuciosamente expressos.Da porque, introduzido no Congresso em 1988, o projeto passaria por umlongo processo de tramitao, desenvolvido com a participao deentidades do setor educacional, que contriburam para seu aperfeioamentonas sucessivas verses apresentadas pelos relatores Otvio Elsio, JorgeHage, ngela Amin na Cmara e, j no Senado, Cid Sabia de Carvalho.Na forma do substitutivo Cid Saboia, o projeto originrio da Cmara logrouaprovao na Comisso de Educao do Senado, em novembro de 1994,com apoio das entidades e sindicatos da rea de educao.

    Entretanto, a histria de um outro projeto desenvolve-separalelamente. J em 1992, sem esperar que os trabalhos da Cmara fossemconcludos e seu projeto enviado ao Senado, o senador Darcy Ribeiroapresentou projeto de sua autoria no Senado. No conseguindo aprovaonaquele momento, esse projeto passou por novas verses at que, em abrilde 1995, mediante um expediente regimental, foi reintroduzido no cenriodas discusses, vindo a ser finalmente aprovado pelo Senado em fevereirode 1996. Assim, aps apreciar por quase trs anos o Projeto de Lei oriundoda Cmara (n 1.258 de l988), o Senado acabou por aprovar um novoprojeto, o substitutivo Darcy Ribeiro. Coube Cmara a deciso final deescolher o texto que se transformaria na nova LDB, escolha que acaboupor recair no substitutivo Darcy Ribeiro.

    Nesse rpido quadro que acabamos de traar, importante fazeralguns destaques:

    1) O texto da Cmara foi resultado de longo processo de trabalhocoletivo dos educadores e profissionais da educao e de sua atuaojunto a parlamentares e lideranas partidrias. Essa participao direta desetores organizados da sociedade civil junto ao Congresso Nacional, paraa aprovao de uma lei, , sem dvida, de fundamental importncia para aconstruo da democracia. Assim, a favor do projeto da Cmara, na formado substitutivo Cid Sabia, estiveram presentes as principais entidades esindicatos da rea de educao. J o projeto de Darcy Ribeiro, elaborado eaperfeioado quase que exclusivamente no mbito do Senado emboracontemplado com a contribuio de inmeras emendas por parte deeducadores contou com o apoio do Governo e estava identificado comsuas diretrizes.

    2) Um segundo ponto a destacar que houve incorporaesrecprocas entre os dois projetos, ou seja, o originrio da Cmara e aqueleaprovado pelo Senado. Embora persistissem algumas diferenasfundamentais entre eles, no h dvida de que foram incorporando inmerasdisposies comuns, ressalvando-se a forma mais compacta do projeto

  • 36

    aprovado pelo Senado e o tratamento por vezes excessivamente minuciosodo projeto oriundo da Cmara. Apesar das trocas entre os dois projetos,no se modificou o quadro de adeses, o que se explica pela histria e pelaforma de construo dos projetos em tela.

    3) A longa tramitao, as grandes dificuldades de negociao, amorosidade e as vicissitudes do processo legislativo acabaram por levar aum desgaste no processo de participao dos profissionais da educao, diminuio de seu interesse e a uma certa apatia relativamente matria. Oimpacto causado quando da aprovao do projeto no Senado nos pareceupraticamente nulo em comparao com situaes anteriores. Seria isso oreflexo da divulgao de trabalhos acadmicos em mbito internacionalacerca da inoperncia das reformas educativas e de seu carterdesmobilizador? Ou seria o resultado de nossas mazelas polticas, dodistanciamento entre sociedade civil e poder legislativo, maisespecificamente da insensibilidade do Senado em acolher projeto alheio comunidade educacional, ao invs de tomar como ponto de partida aqueleproduzido pelo trabalho participativo, ainda que corrigindo os seusexcessos de regulamentao, de centralizao, de reivindicaescorporativas?

    Sem dvida a ltima hiptese mencionada parece mais plausvelpara explicar o esvaziamento do interesse nos meios educacionais a respeitoda LDB. No menos importante o fato de que, ao mesmo tempo em que sedelongava o processo de tramitao da LDB e as entidades educacionaiscentravam-se na defesa de suas posies, o governo federal lanou mo davelha ttica de realizar reformas atravs do Executivo. Assim, algumas dasquestes chaves da educao, que constituem matria diretivo-basilar, fo-ram sendo contempladas antes da aprovao da LDB, primeiramentemediante Medidas Provisrias, depois consubstanciadas na Lei 9.131, de24/11/95, a qual alterou dispositivos da Lei 4.024/61, e mediante a Lei9.192, de 21/12/95, que alterou o art. 16 da Lei 5.540/68.

    A sistemtica para aprovao dessas leis evidenciava processo decentralizao, uma vez que ambas tratam de matria oriunda do Executivoe, no caso da primeira, prescrita mediante Medida Provisria. Na prtica,as alteraes efetuadas pela Lei 9.131/95 resultaram na extino doConselho Federal de Educao e na criao do Conselho Nacional deEducao (CNE), regulamentando-se sua organizao e atribuies. Emboraestas sejam semelhantes s do extinto rgo, no h dvida de que foramampliadas consideravelmente as competncias do Ministrio da Educao,restringindo-se as funes normativas e deliberativas do Conselho eampliando-se as suas atribuies de assessoria ao Ministrio. Palavras fra-

  • 37

    cas definem as atribuies do CNE subsidiar, emitir pareceres, assessorar e, com frequncia, a partir de propostas do Ministrio da Educao.Este, por sua vez, assume funes normativas, cabendo-lhe, alm dasfunes executivas, formular e avaliar a poltica nacional de educao.Ademais, regulamenta-se o processo de avaliao das instituies e cursosde nvel superior, conferindo-se ao Ministrio da Educao e do Desportoa competncia para a sua realizao. Entre os procedimentos para aavaliao, a Lei 9.131 j prescreve exames nacionais baseados noscontedos mnimos fixados para cada curso. Foi dada nova estruturaorganizacional ao Ministrio da Educaco e do Desporto (Dec. 1.917, de27/05/96), ajustando-o s novas atribuies. Finalmente, a segunda Leimencionada (9.192/95) regulamenta o processo de escolha dos dirigentesuniversitrios, prescrevendo o peso mnimo de 70% para a manifestaodo pessoal docente em relao s demais categorias.

    Em suma, os assuntos contemplados foram aqueles que permitiamao Ministrio concentrar poderes e centralizar em suas mos o controle daelaborao e da implementao da poltica educacional, em especial dapoltica relativa ao ensino superior.

    Em tais circunstncias, compreende-se porque a questo LDB jno atraa mais tanta ateno na fase final de tramitao do projeto. Ademais,o projeto aprovado pelo Senado conformava-se s medidas tomadas,abstendo-se de contemplar os assuntos j disciplinados pelas mencionadasleis e atribuindo todas as competncias da esfera federal inespecificamente Unio o que, no quadro de referncias ento criado, passou asignificar Ministrio. Ao rgo normativo foi reservado um nicopargrafo, parcimoniosamente formulado: Na estrutura nacional, haverum Conselho Nacional de Educao, com funes normativas e desuperviso e atividade permanente, criado por lei (art. 9, pargrafo l).

    Assim, a grande conquista da LDB de l961 a distino entrergos essencialmente normativos e rgos essencialmente executivos fica, no mnimo, enfraquecida. E o centralismo continua a fazer-se presentecomo fora dominante, mesmo num momento em que a descentralizaoaparece como bandeira.

    Frustravam-se as expectativas de que a Cmara no descartasse nemsubestimasse a atuao dos educadores e profissionais da educao, quepor oito anos contriburam para o aperfeioamento do projeto de LDB.Sendo eles os responsveis pela ao educativa e, portanto, pelaimplementao da nova Lei, seria importante que estivessemcomprometidos com ela. Nas atuais circunstncias, de se temer o retornoa uma fase em que os esforos se canalizam para a mera denncia da poltica

  • 38

    educacional, em detrimento de uma ao construtiva em prol de umaeducao competente, compatvel com as conquistas da modernidade eadequada aos interesses da Nao.

  • 39

    3. A nova LDB: algumas observaes1

    Marinel Pereira ABBADE2

    Apresentao

    A sociedade brasileira recebeu, aps oito anos de estudo edebates, a sua segunda Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional(LDBEN), que afeta diretamente quem trabalha com educao no Pas.A partir de 20 de dezembro de 1996, atravs de aprovao do CongressoNacional e sano do presidente da Repblica, passou a vigorar a LeiFederal n. 9.394, denominada Lei Darcy Ribeiro. Esta lei, comodiretriz, trata de questes como educao e ensino no processo escolarbrasileiro; dos princpios e fins da educao nacional; das competnciase responsabilidades do poder pblico, dos estabelecimentos de ensinoe dos docentes; dos sistemas de ensino e suas funes; das formas pelasquais os cidados exercem seus direitos e deveres relativos educao;da formao dos profissionais da educao para atuar nos diferentesnveis e modalidades de ensino; dos mecanismos adequados aoatendimento de segmentos sociais ou de indivduos com necessidadesespeciais; das fontes, da destinao e do uso dos recursos financeirosdo poder pblico em matria de educao.

    O objetivo deste estudo apresentar um histrico das leis dediretrizes e bases na educao brasileira; a cronologia das discusses noCongresso Nacional da atual Lei Darcy Ribeiro no perodo de 1988 a

    A

    1 Texto apresentado ao I Congresso de Cincias da Educao. UNESP. Araraquara,outubro de 1997. Verso revista.2 Departamento de Educao da Universidade So Marcos So Paulo SP.

  • 40

    1996; delimitar a estrutura da lei aprovada; destacar alguns aspectoscontidos nesse texto e tecer algumas consideraes sobre as inovaes,dificuldades e polmicas que podero ser introduzidas no sistema escolarbrasileiro com sua implantao. Para a redao deste texto, foram utilizadasidias formuladas a propsito da educao brasileira por educadores,pesquisadores e intelectuais e como tal percebidas.

    Um breve histrico

    A idia de uma diretriz sobre a educao nacional permeou odiscurso liberal desde o final do sculo passado, podendo ser detectadanas palavras de Rui Barbosa ao tratar sobre a educao nacional.Perpassou as discusses da Conferncia Nacional de Educaorealizadas na dcada de 20 pela ABE. Apresentou-se claramenteexplicitada no Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova (1932),refletindo-se na Constituio Federal de 1934, que buscou indicar oscontornos das diretrizes e bases da educao nacional a serem traadospela Unio. Os eventos sociais e polticos da dcada, que resultaram naimplantao do Estado Novo (1937), acabaram retardando aconcretizao das propostas de diretrizes para a educao brasileira.Na vigncia do Estado Novo, a educao recebeu um tratamentobaseado numa doutrina compatvel com os fins da educao do regime:propostas conservadoras e elitistas para a formao das jovens geraes.A Carta outorgada subvertia, explicitamente, os princpios democrticosno tocante infncia e adolescncia, no mais consideradas em p deigualdade no que se refere s oportunidades educacionais, masdistribudas em classes mais ou menos favorecidas.

    O retorno do pas normalidade democrtica, nos meados da dcadade 40, levou ao reaparecimento do dispositivo constitucional que conferia Unio o dever de legislar sobre as diretrizes e bases da educao nacional.A proposta de uma Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional teveseu primeiro anteprojeto elaborado por uma comisso presidida pelo pro-fessor Loureno Filho (Villalobos, 1969, p.23), contando ainda com aparticipao de outros representantes do Manifesto de 1932. Em outubrode 1948, um anteprojeto foi encaminhado ao Congresso Nacional peloexecutivo, atravs de exposio de motivos subscrita pelo ento ministroda Educao e Sade, Dr. Clemente Mariani. Inmeros percalos estariamreservados ao projeto antes que o mesmo se transformasse em lei. Teses eestudos foram elaborados sobre sua prolongada tramitao com durao

  • 41

    de quase catorze anos, que resultou na nossa primeira Lei de Diretrizes eBases, em 20 de dezembro de 1961.3

    A lei de 1961 sofreu inmeras alteraes durante sua vigncia.Captulos inteiros foram revogados, especialmente durante o perodo degoverno militar: em 1968, houve uma alterao substancial no seu textocom a edio da Lei n. 5.540, ao estabelecer novas normas para ofuncionamento do ensino superior; em 1971, sofreu nova modificaopela Lei n. 5.692, agora voltada para as diretrizes do ensino de 1 e 2graus. Os equvocos na implantao da reforma de 1971, especialmente naparte referente profissionalizao compulsria do ensino mdio,conduziram a nova alterao pela Lei 7.044/82; em outubro de 1994, a Lein. 4.024/ 61 sofreu outra mudana com a extino do Conselho Federalde Educao. A Lei n. 9.131/95 alterou os artigos da Lei 4.024/61 referentesao papel do Ministrio da Educao e do Conselho Federal de Educao.4

    A promulgao da Constituio de 1988, reafirmando a competnciaprivativa da Unio para legislar sobre as diretrizes e bases da educaonacional, deu origem a outro processo de discusso no Congresso Nacionalsobre uma nova LDBEN. Desta vez, o projeto de diretrizes nacionais temsua origem em iniciativa do legislativo. A comisso da Cmara dosDeputados encarregada de analisar o projeto da nova LDBEN buscou ouvirsetores da sociedade envolvidos com a educao para que nele se refletissea educao brasileira, repensando seus problemas, limites, desafios epossibilidades.

    Cronologia das discusses da nova Lei

    Tomando como referncia as disposies do Art. 22, inciso XXIV daatual Constituio, o deputado Otvio Elseo apresentou um anteprojetopara unificar as diretrizes e bases da educao do pas. A verso desteprojeto substitutivo recebeu o n. 1.258/A - 88, na Cmara dos Deputados.

    No ano seguinte, 1989, um grupo de trabalho, coordenado pelosaudoso deputado Florestan Fernandes, foi encarregado de ouvir e discutircom entidades representativas dos setores educacionais um texto de3 Podemos imaginar que a data de sancionamento da Lei Federal n. 9.394/96 no foi

    obra do acaso.4 Esta ltima alterao configurou uma situao deveras curiosa: as disposies finais

    da atual LDBEN deixam de revogar a Lei 4.024/61 na parte referente s competnciasdo Ministrio da Educao e do Conselho Nacional de Educao. Ou seja, carregandonas tintas do quadro da legislao nacional, temos uma nova lei de diretrizes e basesque mantm parte da anterior; um quadro com conotaes muito surrealistas.

  • 42

    LDBEN que refletisse os anseios e necessidades da sociedade em relao educao. Apresentou-se um projeto substitutivo desenvolvido a partir dediscusses com deputados e representantes de entidades ligadas a atividadeseducacionais, dando origem a um outro projeto catalogado sob o n. 2.405/89. Este substitutivo continha 172 artigos bastante detalhados em relao educao do pas.

    Encaminhado Mesa da Cmara dos Deputados, em 1990 o projetofoi aprovado pela Comisso de Educao e remetido Comisso deFinanas e Tributao. A demora no andamento das discusses do projetofoi agravada pelo processo de escolha de nova legislatura e de eleio donovo presidente da Repblica. Em janeiro de 1991, o projeto foi aprovadopela Comisso de Constituio e Justia e encaminhado Mesa da Cmarados Deputados, onde ficou aguardando a posse dos deputadosrecm-eleitos.

    A entrada do projeto na ordem do dia no Plenrio da Cmara trouxenovas dificuldades para sua tramitao. Com a nova legislatura, at maiode 1991, o substitutivo recebera 1.263 emendas, retornando Comissode Educao, Comisso de Finanas e Tributao e Comisso deConstituio e Justia (todas com novos representantes), para apreciaotcnica das alteraes. O grande nmero de emendas fez com que, at ofinal do ano de 1991, fossem discutidos apenas os 9 primeiros captulos(cerca de 50 artigos dos 172 propostos).

    Em 1992, o andamento do projeto da LDBEN na Cmara ficouainda mais lento. A CPI que resultou no impeachment do PresidenteCollor (1993) retardou as discusses do projeto de lei da educao.

    Ao mesmo tempo, no Senado, houve a apresentao de um projetosubstitutivo pelo senador Darcy Ribeiro (RJ), cujo relator era o ento senadorFernando Henrique (SP). Passaram, portanto, a tramitar no CongressoNacional, a partir de 1992, dois projetos de LDBEN: um com origem naCmara dos Deputados e outro, no Senado.

    O projeto da Cmara dos Deputados foi aprovado em 1993 eremetido ao Senado para sua reviso. Recebeu como relator o senador CidSabia de Carvalho que, aps anlise e parecer, props seuencaminhamento Comisso de Educao do Senado, sob a denominaode PLC n. 101/93. O parecer do senador Cid Sabia foi aprovado pelaComisso de Educao em novembro de 1994. Novamente, a ocorrnciade eleies gerais no pas veio alterar a composio da Cmara dosDeputados e do Senado. A no reeleio do senador Cid Sabia levou escolha de um outro relator. Uma srie de manobras regimentais efetuadasno Senado resultou no arquivamento do PLC n. 101/93. Em abril de 1995,

  • 43

    o senador Darcy Ribeiro, tambm membro da Comisso de Educao doSenado, apresentou um outro projeto substitutivo, sob a forma de umaminuta. A quinta verso do projeto substitutivo do senador Darcy Ribeirofoi aprovada pela Comisso de Constituio e Justia do Senado em 31/08/95.

    No incio de 1996, o Parecer do Senado Federal n. 30, de 13 defevereiro aprovou o texto do Projeto de LDBEN apresentado pelo senadorDarcy Ribeiro. O Parecer n. 72, de 29 de fevereiro de 1996, introduziuduas substituies na redao dos artigos 59 e 82 contidos no dispositivoanexo ao Parecer n. 30/96, oferecendo o texto final do substitutivo,conforme publicao no Dirio do Senado de 1/03/96. No final dessemesmo ano, 20 de dezembro de 1996, o projeto foi sancionado pelopresidente da Repblica, gerando a Lei Federal n. 9.394, que estabeleceas diretrizes e bases da educao nacional.

    Estrutura da Lei

    A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, n. 9 394/96, possui 92 artigos, distribudos em 9 ttulos. Atende s normas gerais datcnica legislativa, apresentando a seguinte estrutura:

    TTULO ASSUNTO ARTIGOS N. deartigos

    I Da Educao Art. 1 1II Dos Princpios e dos Fins da Art. 2 e 3 2

    Educao NacionalIII Do Direito Educao e do Art. 4 ao 7 4

    Dever de EducarIV Da Organizao da Educao Art. 8 ao 20 13

    NacionalV Dos Nveis e das Modalidades

    de Educao e EnsinoCAPTULO I - Composio dos Art.21 1Nveis EscolaresCAPTULO II - Da Educao BsicaSeo I - Das Disposies Gerais Art. 22 ao 28 7

  • 44

    Seo II - Da Educao Infantil Art. 29 ao 31 3Seo III - Do Ensino Fundamental Art. 32 ao 34 3Seo IV - Do Ensino Mdio Art. 35 e 36 2Seo V - Da Educao de Jovens Art. 37 e 38 2e AdultosCAPTULO III - Da Educao Art. 39 ao 42 4ProfissionalCAPTULO IV - Da Educao Superior Art. 43 ao 57 15CAPTULO V - Da Educao Especial Art. 58 ao 60 3

    VI Dos Profissionais da Educao Art. 61 ao 67 7VII Dos Recursos para a Educao Art. 68 ao 77 10VIII Das Disposies Gerais Art. 78 ao 86 9IX Das Disposies Transitrias Art. 87 ao 92 6

    O quadro acima nos permite a visualizao do nmero de artigosvinculados aos temas tratados na Lei, induzindo a considerar que algunsdeles esto mais contemplados ou mais privilegiados no seu texto. Ouseja, o ensino fundamental, consagrado como direito de todos e dever doEstado e nica modalidade de ensino de escolarizao obrigatria,encontra-se proposto em apenas 3 artigos especficos; j o ensino superior,cujo funcionamento est voltado para parcela reduzida da populao, nosendo configurado nem como dever ou direito, tem cerca de 15 artigosrelacionados especificamente ao tema.

    Algumas observaes

    A Lei Darcy Ribeiro considerada mais enxuta em sua redao queos textos dos projetos substitutivos que a precederam. Suprimiu muitosdetalhes, especificaes, definies e normas operacionais do substitutivodo senador Cid Sabia, oriundo da Cmara dos Deputados. Permaneceramno texto aprovado os princpios j consagrados de gratuidade eobrigatoriedade do ensino fundamental, possibilitando inclusive aampliao de sua durao.

    Quanto organizao dos sistemas de ensino, o princpio dadescentralizao articulada retomado, possibilitando aos municpiosorganizarem seus prprios sistemas de ensino. O artigo 11 praticamentedefiniu a municipalizao do ensino fundamental, que foi reforada com a

  • 45

    legislao do Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do Ensino Fun-damental e de Valorizao do Magistrio. Neste aspecto, a LDB cumpre opapel de ancorar as polticas educacionais do governo federal. No sepode esquecer que a Lei deve ser compreendida no contexto da polticaeducacional inserida na poltica mais ampla do atual governo, fortementeaglutinado em torno de um projeto neoliberal, com critrios norteadoresde suas aes baseados na minimizao do papel do Estado em relao squestes sociais.

    Podemos considerar que o princpio da descentralizao atingiutambm o nvel tcnico-pedaggico ao estabelecer que as instituiesescolares devem elaborar a sua proposta pedaggica (artigos 12 e 13).

    A formulao de projetos nas escolas uma inovao quetem sido introduzida com objetivo de descentralizar edemocratizar o processo de tomada de decises, de buscarnveis de participao da comunidade e comprometimentode todos seus membros com as solues dos problemas dainstituio escola. (Miranda, 1994, p. 28)

    A mesma observao poderia ser feita relativamente aos critrios deorganizao do ensino fundamental, ao instituir o regime de reclassificaodos alunos, tanto dos oriundos da prpria instituio escolar como para osrecebidos por transferncia ou para aqueles sem escolaridade anterior.Flexibiliza o aproveitamento de estudos dos alunos ao instituir a progressocontinuada de estudos para o ensino fundamental e a progresso parcial deestudos na educao bsica.

    A formao dos profissionais da educao outro aspecto danova Lei a suscitar inmeros questionamentos, desde os referentes aoressurgimento do curso normal para a formao de professores paraeducao infantil e sries iniciais do ensino fundamental, ao mesmotempo em que prope uma escola normal de nvel superior; os ligados proposta de criao dos institutos superiores de educao, cujo papelno se encontra explicitado; aos relacionados organizao dos cursosde Pedagogia; aos encontrados na contradio entre o princpio deflexibilidade que permeia a Lei e o tratamento especfico com quetrata alguns temas. Assim, ao mesmo tempo em que atribui s escolas aresponsabilidade pela elaborao de seu projeto pedaggico, impe,no que se refere aos cursos de formao de professores da escola bsica,a determinao das 300 horas de Prtica de Ensino, desconsiderando asdiversidades existentes entre as escolas brasileiras, bem como o

  • 46

    princpio do pluralismo pedaggico o qual, inclusive, consta comoum dos princpios da prpria LDB.

    Outra questo importante diz respeito aos recursos financeiros paraa manuteno da educao. Pode-se atribuir ao texto da Lei o mrito de terdefinido no apenas o que o poder pblico deve considerar como despesascom manuteno e desenvolvimento do ensino, mas tambm o que nodeve ser a considerado. Deixa, porm, de explicitar se o pagamento deaposentados e pensionistas do magistrio est includo entre os gastoscom educao.

    A anlise dos trabalhos e artigos que comentam a nova LDBENrevela a existncia de posies divergentes em relao ao assunto. H oscticos e os crdulos. A demora na sua aprovao (cerca de 8 anos) interpretada, pelos cticos, como descaso pela educao por parte dogoverno federal que no se interessaria por um ensino de qualidade. Dentreos crdulos, alguns justificam a lentido das discusses atravs doargumento da relevncia da questo da educao para a sociedade e onecessrio cuidado na anlise do projeto de lei que trata de suas diretrizese bases; outros a justificam, apelando para o esforo de se buscar a melhorsoluo poltica e a melhor alternativa tcnica para a lei.

    Finalizando, podemos dizer que a edio de uma nova LDBENrepresenta apenas uma sinalizao dos caminhos a percorrer. Sua funo abrir perspectivas. Deve ser tomada no s como um instrumento que norteiaas atividades da educao escolar, mas principalmente como umcompromisso de luta dos educadores no sentido de exigir medidas efetivaspara a valorizao dos profissionais da educao, dentro de uma polticaeducacional que privilegie a escola pblica de qualidade.

    Referncias bibliogrficasMIRANDA, V. A construo coletiva de projetos pedaggicos. In:

    MARQUES, M. O projeto pedaggico da escola. Braslia: MEC/SEF,1994. p.27-30. (Atualidades pedaggicas).

    VILLALOBOS, J. E. Diretrizes e bases da educao: ensino e liberdade.So Paulo: Pioneira, 1969.

    Bibliografia consultadaABREU, M. A tramitao do projeto de LDB no Congresso Nacional a

    partir de novembro de 1992. Educao & Sociedade, Campinas, v.2,n.42, p.368-78, 1993.

  • 47

    ALVES, J. R. M. A educao distncia na nova lei de diretrizes e bases daeducao nacional. Revista Brasileira de Educao Distncia, Rio deJaneiro, v.3, n. 14, p.5-23, 1996.

    AZEVEDO, J. C. de A. Sem diretrizes e bases. Folha de S. Paulo, SoPaulo, 20 out. 1995. p.I.

    BRASIL. Senado Federal. Anexo ao Parecer n. 72, de 29/02/96. Redaofinal do substitutivo do Senado ao PLC n. 101/93 (n. 1.258/88 naCasa de origem). Estabelece as Diretrizes e Bases da Educao Nacional.Dirio do Senado Federal, 01 mar. 1996.

    BRASIL. Senado Federal. L.D.B.: Lei de Diretrizes e Bases da EducaoNacional. Revista Carta, Braslia, n.16, p.1, 1996.

    BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional. Estudos, Braslia,v.14, n.17, dez. 1996.

    CONSTITUIO do ensino vai reta final. Folha de S. Paulo, So Paulo,06 out. 1996. Cad.3, p.7.

    DORNAS, R. A nova lei do ensino: LDB. Braslia: COFENEN, s.d. 15 p.HAGE, J. Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional: texto aprovado

    na Comisso de Educao e Cultura e Desporto. So Paulo: Cortez/ANDE, 1996. p. 83-93.

    JORNAL DA APASE. So Paulo, fev./mar./abr./mai./1996.MACEDO, A. R. de. A propsito da LDB. Folha de S. Paulo, So Paulo, 20

    out. 1995. Cad. I, p.3.MENDES, V. Aps 6 anos, governo ainda tenta aprovar LDB. O Estado de

    S. Paulo, So Paulo, 26 jun. 1995. Cad.A, p.14.MINTO, C. A., MURANAKA, M. A. S. A nova lei de diretrizes e bases e a

    cidadania. In: SEMINRIO ESTADUAL SOBRE EDUCAO,TRIBUTAO E CIDADANIA, 1, 1995, So Paulo. Anais... So Paulo:Secretaria da Fazenda/APT/DIPLAT, 1995. p.95-108.

    NA LUTA pela LDB democrtica. Jornal dos Professores, So Paulo, ago.1996. p.6.

    PINO, I. A trama da LDB na realidade poltica nacional. Educao &Sociedade, Campinas, v.1, n.41, p.156-85, 1992.

    PROJETO da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional. Riode Janeiro: Instituto de Pesquisas Avanadas em Educao, 1996.(Mimeogr.).

    PROPOSTA a defender. O Estado de S. Paulo, So Paulo, jul.1995. Notase Informaes, Cad. A, p. 3.

  • 48

    RAMA, L. M. J. S. Legislao do ensino: uma introduo ao seu estudo.So Paulo: EPU/EDUSP, 1987.

    SOUSA, P. N. P. de. A polmica da LDB. Jornal do Mantenedor, So Paulo,v.10, n.108, maio 1996. p.2.

  • 49

    4. Comentrios margem da nova LDB1

    Carlos da Fonseca BRANDO2

    O presente trabalho possui como objetivo discutir algunspontos da nova Lei da Educao Nacional, os quais consideramos de sumarelevncia para o entendimento das modificaes que a educao brasileiraj est sofrendo em seu funcionamento e que, talvez, venha a sofrer emsuas estruturas.

    Passemos ento discusso desses pontos, procurando explicitar asrespectivas dvidas e questionamentos. Poderamos levantar questes arespeito de muitos deles, porm, optamos por, nos pargrafos seguintes,analisar apenas alguns, os quais consideramos essenciais para o incio deuma discusso sobre a atual poltica educacional brasileira.

    Dvidas e questionamentos

    O texto da nova LDB, em seu artigo 3, inciso I, quando faz aluso competncia do Estado no que se refere a propiciar aos seus cidadoscondies de igualdade de acesso e permanncia na escola, o faz enquantoprincpio e no como obrigatoriedade. Temos claro que o fato de constarda nova lei o princpio de que o Estado deve propiciar aos seus cidadosiguais condies de acesso e permanncia na escola por si s positivo.

    O ponto a ser questionado refere-se ao fato de que no projeto ante-

    O

    1 Este ensaio foi publicado originalmente como: BRANDO, C. F. Idias e intenescontidas na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei 9.394/96).Filosofia, Sociedade e Educao, v. 1, 1997. Verso revista.2 Departamento de Educao da Faculdade de Cincias e Letras, UNESP 19800-000 Assis SP.

  • 50

    rior, que foi votado e aprovado pelo plenrio da Cmara dos Deputados etambm aprovado pela Comisso de Educao do Senado, o Estado poderiaser responsabilizado em trs situaes: caso no oferecesse educao paratodos, caso essa educao no fosse de boa qualidade e, ainda, caso oEstado no conseguisse condies adequadas para a manuteno de nossascrianas na escola. Da forma como ficou estabelecido na legislao atual,caso o Estado no oferea ensino pblico de boa qualidade para todos,no h como responsabiliz-lo por isso.

    Nesse mesmo artigo 3, no inciso VI, abordada a questo dagratuidade do ensino nos estabelecimentos oficiais, tambm enquanto umprincpio. Ter a questo da gratuidade do ensino nas escolas oficiais comoum princpio na legislao tambm significa um grande avano, mas, namedida em que essa mesma gratuidade no obrigatria, pode denotaruma inteno velada de, no futuro, privatizar todos os nveis de ensinoque forem possveis.

    Esse enfoque de nossa anlise pode ser justificado, ainda,exatamente pelo fato da expresso vedada a cobrana de taxas escolaresnos estabelecimentos oficiais de ensino, posta pelo projeto anterior,no constar da nova lei, elaborada pelo governo de Fernando HenriqueCardoso, o qual, num passado no muito remoto, assinou manifestoque tinha por base e prncipio a defesa da escola pblica, gratuita e deboa qualidade.3

    Com relao questo da gratuidade do ensino, a nova lei a garantepara os nveis de educao infantil (creches e pr-escolas) e ensino funda-mental. No caso da educao infantil, preciso lembrar que, apesar deconstar da lei como um dever do Estado, tal dever atribudo, total eexclusivamente, ao poder pblico municipal, ou seja, s prefeituras.

    A nova lei, por outro lado, quando trata da gratuidade do ensino denvel mdio, especificamente no inciso II do artigo 4, prev a progressivaextenso da gratuidade para o ensino mdio, enquanto dever do Estado, oque um ponto positivo enquanto inteno, mas no consta na mesmanenhum tipo de previso ou de compromisso para a efetivao dessamedida.4

    Com relao questo do ensino profissional, o chamado ensinotcnico, a nova lei extremamente omissa por no tratar da questo daobrigatoriedade da gratuidade da educao profissional e, tambm, por

    3 GHIRALDELLI JR. Histria da educao, p.139-60.4 Cf. Lei n 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Dirio Oficial da Unio, n.248, 23/12/96, artigo 4, inciso II.

  • 51

    no conter referncias de qualquer natureza questo da equivalnciadeste nvel de ensino com o 2 grau (agora denominado ensino mdio).Temos ento que essa nova legislao educacional, por um lado, possibilitacriar cursos tcnicos de curta durao, comprometendo, talvez, seu nvelde qualidade e, por outro lado, obriga o aluno do curso tcnico a fazertambm, se desejar ou se tiver condies para tal, um curso simultneo denvel mdio, caso queira obter um diploma de 2 grau que lhe possibilitetentar o ingresso em qualquer curso de nvel superior.5

    A equivalncia do ensino profissional com o ensino mdio ficarestrita s escolas tcnicas federais, porm o Ministrio da Educao, atravsda Portaria 646/97 e do Decreto 2.208/97, j alterou a estrutura curriculardessas escolas bem como a forma de ingresso nelas (incluindo apossibilidade da adoo de um sistema de cotas, ou seja, reserva demercado), com intuito de adequ-las a um nico objetivo, isto , o desomente formar profissionais de nvel mdio, tentando assim no ter, emseus quadros discentes, alunos que, depois de formados, possam pleitear oingresso no ensino superior.

    Ao analisarmos os dois pargrafos anteriores, conclumos que, naquesto do ensino profissionalizante, a poltica educacional pretendidapelo atual governo contraditria em relao ao discurso oficial proclamado,quando o tema a busca de uma melhor qualidade para a educao nacionalem sua totalidade.

    Essa contradio se explicita quando constatamos que, ao invs dese investir na melhora do ensino fundamental e mdio, tendo-se, porexemplo, como referncia o excelente nvel de qualidade das escolastcnicas federais, reconhecido pelo prprio Ministro da Educao, faz-se aopo por modificar o segmento educacional que consideradopublicamente como de boa qualidade, tanto na parte tcnico-profissionalquanto na parte propedutica. Se alguns dos alunos das escola tcnicasfederais, ou mesmo a maioria, depois de adquirirem uma profisso de nvelmdio, ainda conseguirem tentar o ingresso em cursos de nvel superior,isso s indica que o ensino de boa qualidade. Em vez de modificarefetivamente os segmentos educacionais que possuem baixa qualidade, oatual governo est fazendo a opo de mexer justamente naqueles que jpossuem boa qualidade.

    Ainda com relao questo da qualidade do ensino, a nova leiretirou a exigncia de que os diferentes nveis (fundamental, mdio e su-perior) do ensino noturno sejam ministrados com a mesma qualidade do5 Idem. Cap. III - Da Educao Profissional (artigos 39 a 42).

  • 52

    ensino diurno.6 Enquanto a nova lei exige que o ensino fundamental sejaministrado com uma jornada escolar mnima diria de 4 (quatro) horas detrabalho efetivo em sala de aula, tempo este que dever serprogressivamente ampliado, podendo chegar at ao ensino de tempointegral, o ensino noturno dispensado dessas mesmas exigncias.7

    Com as instituies de ensino privado a nova lei de uma extremacondescendncia: por um lado, desobriga-as da exigncia de possuremuma proposta pedaggica e institucional; por outro, no institui aobrigatoriedade da participao da comunidade docente na definio dasorientaes pedaggicas, o que, em termos de poltica educacional,significaria um considervel avano.

    Essa condescendncia com que a nova lei de diretrizes e bases trataas instituies de ensino privado acaba afetando, de maneira direta, nocampo do ensino superior, a questo da formao do professor. Atualmente,sendo essas instituies responsveis por uma grande parte do total deprofessores que so formados, essa liberdade que a nova lei confere aoensino privado no garante o ensino de boa qualidade e, portanto, umaformao adequada. Ao mesmo tempo, a nova lei totalmente omissa porno definir as responsabilidades diretas do Estado no que tange questoda capacitao, atualizao e aperfeioamento dos professores.

    Quando se trata da questo da avaliao, a nova lei institucionalizae normatiza o chamado provo, ou seja, um processo nacional deavaliao de todos os nveis de ensino que, proposto pelo atual governo,no contou com a participao, durante o processo de elaborao de taisavaliaes, das escolas, dos docentes ou de algum outro segmento dasociedade brasileira. Especificamente no caso do ensino superior, esseprocesso, denominado Exame Nacional de Cursos, foi implantado de cimapara baixo, atravs de, inicialmente, Medida Provisria, sendo que o maiscurioso que quem escolhe as reas de conhecimentos a serem avaliadas acada ano o prprio Ministro da Educao.8

    Um exemplo de como determinadas idias de pessoas iluminadas,

    6 Cf. SAVIANI. A nova lei da educao, p.72. Quando falamos que a nova lei retiroudeterminadas questes, estamos tomando por referncia o projeto elaborado e discutido,durante oito anos, por deputados e diversos setores da sociedade civil interessados naquesto da educao nacional.7 Ibidem, p.173.8 Cf. Lei n 9.131 de 24 de novembro de 1995. Dirio Oficial da Unio, n.225-A, 25/11/95, artigo 3, pargrafo 7. Apesar de tratar-se de outra lei, torna-se necessrioesclarecer que a nova lei de diretrizes e bases da educao nacional (Lei 9.394/96) norevoga a lei citada acima, a qual tambm trata da constituio, composio e atribuiesdo novo Conselho Nacional de Educao.

  • 53

    quando convertidas em leis sem a prvia discusso e participao dacomunidade interessada, geram graves distores, pode ser visto com aimplantao do chamado provo. Como um dos pontos de avaliao dasinstituies de ensino superior pblico e privado no Exame Nacional deCursos a qualificao do corpo docente, medida atravs da titulao decada um dos seus docentes, recentemente, uma faculdade privada da cidadede So Paulo, aps ter tido o pior conceito neste item, no primeiro provo,realizado em novembro de 1996, demitiu todos os docentes que nopossuam o ttulo mnimo de mestre. Assim, no prximo provo, o nvelda titulao geral dos docentes de seus cursos aumentar, em relao aototal de docentes, fazendo com que a instituio receba um conceito melhorna avaliao do MEC, sem que tenha tomado nenhuma medida no sentidode melhorar a qualificao dos seus docentes. o atual governo, com suasidias iluminadas, ajudando a aumentar a taxa de desemprego, nestecaso, da cidade de So Paulo.

    Na proposta do governo, agora lei, no consta mais a obrigatoriedadedo poder pblico de promover o acesso e a permanncia dos trabalhadoresna escola mediante a atuao junto s empresas, deixando claro que aconcepo de uma educao pblica comprometida com a classetrabalhadora, enquanto poltica educacional, no se constitui em prioridadepara este governo.

    Tambm no campo da poltica educacional, no que se refere operacionalizao, fiscalizao e normatizao do ensino, o atual governo,atravs de uma outra nova lei (Lei 9.131/95), no revogada pela novaLDB, transfere para o presidente da Repblica a prerrogativa de escolhertodos os membros do Conselho Nacional de Educao.9

    Na proposta rejeitada, o Conselho Nacional de Educao teria 12membros indicados pela sociedade civil ligados educao (inclusivetrabalhadores em educao) e outros 12 membros escolhidos pelo governo,sendo ento representativo, legtimo e paritrio. Na lei aprovada, opresidente da Repblica escolhe todos os membros, ainda que afirme quemetade deles ser escolhida por intermdio de consultas a entidades dasociedade civil.

    No artigo 52, incisos II e III, quando se refere s universidadespblicas e privadas, a nova lei permite que apenas um tero dos docentestrabalhe no regime de tempo integral e que tambm apenas um tero dosdocentes possua mestrado concludo, como grau mnimo de qualificao.Para que as universidades pblicas e privadas consigam atingir a proporo

    9 Cf. nota anterior.

  • 54

    apresentada nessas duas ltimas questes, a nova lei oferece um prazo deat 8 (oito) anos, facilitando sobremaneira a organizao e a administrao,especialmente financeira, das universidades privadas, na medida em quelhes permitem trabalhar com um corpo docente, em sua maioria esmagadora,pouco qualificado.10

    Talvez o ponto mais grave a ser abordado nesta discusso refira-seao fato de a nova lei ferir, de maneira explcita, o princpio constitucionalda autonomia universitria11 ao atribuir, no pargrafo nico do artigo 56,o peso de 70% aos docentes, quando da composio de todas as comissesuniversitrias e, tambm, quando da escolha dos dirigentes universitrios,12distorcendo, dessa maneira, a idia de gesto democrtica na universidadebrasileira.

    A questo da gesto democrtica da escola pblica de ensino fun-damental e mdio aparece na lei aprovada de maneira dbia. Se, por umlado, a proposta aprovada constitui os Conselhos Escolares comrepresentao da comunidade, assegura a prestao de contas naadministrao dos recursos financeiros e refora a participao de pais ealunos nos processos de gesto administrativa, admitindo a escolha dedirigentes das escolas pblicas, por outro, no estabelece a eleio dediretores, transferindo, a regulamentao dessa questo para os sistemasde ensino estaduais.13

    Outra questo importante, o financiamento da educao, secundarizada na nova lei, em funo da Emenda Constitucional n 14,promulgada em dezembro de 1996 pelo Congresso Nacional,14 a qualinstitui o que chama de funo redistributiva. Com a promulgao dessaEmenda Constitucional, a principal modificao que Estados, DistritoFederal e municpios devero aplicar na educao fundamental (antigo 1grau) o equivalente a 15% dos recursos vinculados educao, nosprximos dez anos. Com tais recursos, cada Estado criar um fundo para

    10 A proposta anterior exigia 50% dos docentes com titulao mnima de Mestre, metaa ser alcanada num prazo mximo de 5 (cinco) anos. Cf. OS PRINCIPAIS... AdunespInforma, v.2, n.2, abril/96, p.3.11 O preceito constitucional da autonomia universitria est no artigo 207 da ConstituioFederal. Cf. BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do. Braslia, p.138.12 Cf. Lei n 9.192 de 21 de dezembro de 1995. Dirio Oficial da Unio, n.245, 22/12/95. Aqui, como no caso da questo da composio do novo Conselho Nacional deEducao, trata-se de outra lei no revogada pela Lei 9.394/96.13 Cf. MONLEVADE & VIERA. LDB: Projeto Darcy Ribeiro. In: Subsdios para osencontros regionais de educao, APEOESP, 1996, p.22.14 Essa emenda constitucional foi promulgada pelo Congresso Nacional no dia 12/09/96, e foi regulamentada pela Lei 9.424, de 24 de dezembro de 1996. Cf. APROVADO...Folha de S. Paulo, 13/09/96, Cad. 3, p.1 e Dirio Oficial da Unio, 24/12/96.

  • 55

    financiamento da educao, cujo montante ser distribudo entre as redesde ensino do Estado e dos municpios de acordo com o nmero de alunosmatriculados no ensino fundamental, em cada uma dessas redes.

    Do total desses recursos, dever ser aplicados no pagamento dosprofessores o equivalente a 60%. O governo federal fixou um gasto mnimoanual por aluno de 1 grau, comprometendo-se a complementar comrecursos prprios os fundos estaduais (e do Distrito Federal), nos casos emque os mesmos no alcancem, por aluno, esse valor mnimo definidonacionalmente. Os municpios atuaro prioritariamente no ensino funda-mental e na educao infantil, ficando para os Estados e Distrito Federal aobrigao de atuarem prioritariamente no ensino fundamental e no ensinode nvel mdio.

    O governo federal tambm fica obrigado a aplicar no ensino funda-mental e na erradicao do analfabetismo pelo menos 30% da verba mnimada educao (18% da receita resultante dos impostos), o que se constituiem claro retrocesso, j que anteriormente a Constituio determinava queo gasto mnimo para o combate ao analfabetismo teria que ser de 50% dooramento da educao.15 Ponto positivo ou no, esta uma questo emaberto, pois depende de uma srie de fatores, como por exemplo, o grau dedependncia do oramento do municpio em relao ao valor do ICMSrecebido por transferncia externa.

    Aparentemente, muitos prefeitos ainda no consideraram vantajosaa idia da funo redistributiva, fazendo com que o governo, atravs daLei 9.424, tomasse duas atitudes para estimular a implantao dessesistema: permit