Carta teste8ano

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Carta Minha querida Emília Estamos aqui com um tremendo calor. Trinta graus à sombra na sala. Tenho saudades do mar, e dos pinhais de Paris-Plage. Arranjei o jardim para o usar como campo: mas faz lá mais calor do que dentro de casa, e os mosquitos abundam. A minha vida segue solitária e laboriosa – mas, graças a Deus, com saúde, a saúde costumada, uma mediania. Somente, com a enervação deste calor, tenho uma tal preguiça de estômago, que só posso jantar das 9 para as 10 da noite – às vezes em casa, Quelque chose de froid, outras vezes num restaurante do bairro. Não posso por isso acompanhar o Rosa, que janta sempre fora, mas a horas cristãs. Ele almoçou cá com o Falcão antes de ontem, para se fazerem grandes fotografias da Maria Teresa. Infelizmente o Falcão apareceu sem a máquina, que na véspera se desmanchara, depois de violentos trabalhos sobre o mar e sobre a terra (Dieppe, etc.). Rosa parte para Trouville para a semana elegante. Noto o que dizes no teu bilhete de hoje sobre o Hotel. Porque não mudas? Agora que a estação já avança, talvez achasses um melhor Hotel, pelo mesmo preço, ou talvez ainda por melhor cómodo. Sobretudo tu que projectas estar um mês. A casa avança com lentidão na sua limpeza. Antevejo com susto despesas inevitáveis. Assim, a Mme. Mars pretende que a nossa batterie de cuisine está fora de uso! Também me parece impossível deixar o office naquela imundície. E o quarto dos brinquedos precisaria bem papel e prateleiras. Mas tudo isso demanda reflexão. Já devo carta à Marie e ao Zézé – mas enquanto me não desembaraçar da Revista, que é quase todo feito por mim e que me apanhou em veia, não tenho tempo para prazeres. Têm feito fotografias? Mando uma carta da Benedita. Mil e mil beijos aos queridos meninos e para ti também larga dose do teu José Eça de Queirós, Correspondência (texto com cortes) VOCABULÁRIO: quelque chose de froid - alguma coisa fria batterie de cuisine - trem de cozinha office - escritório I O texto é uma carta informal, e como tal, destina-se a manter a comunicação, à distância com familiares e amigos. 1. Identifica o remetente e o destinatário.

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CartaMinha querida Emília

Estamos aqui com um tremendo calor. Trinta graus à sombra na sala. Tenho saudades do mar, e dos pinhais de Paris-Plage. Arranjei o jardim para o usar como campo: mas faz lá mais calor do que dentro de casa, e os mosquitos abundam. A minha vida segue solitária e laboriosa – mas, graças a Deus, com saúde, a saúde costumada, uma mediania. Somente, com a enervação deste calor, tenho uma tal preguiça de estômago, que só posso jantar das 9 para as 10 da noite – às vezes em casa, Quelque chose de froid, outras vezes num restaurante do bairro. Não posso por isso acompanhar o Rosa, que janta sempre fora, mas a horas cristãs. Ele almoçou cá com o Falcão antes de ontem, para se fazerem grandes fotografias da Maria Teresa. Infelizmente o Falcão apareceu sem a máquina, que na véspera se desmanchara, depois de violentos trabalhos sobre o mar e sobre a terra (Dieppe, etc.). Rosa parte para Trouville para a semana elegante.Noto o que dizes no teu bilhete de hoje sobre o Hotel. Porque não mudas? Agora que a estação já avança, talvez achasses um melhor Hotel, pelo mesmo preço, ou talvez ainda por melhor cómodo. Sobretudo tu que projectas estar um mês.A casa avança com lentidão na sua limpeza. Antevejo com susto despesas inevitáveis. Assim, a Mme. Mars pretende que a nossa batterie de cuisine está fora de uso! Também me parece impossível deixar o office naquela imundície. E o quarto dos brinquedos precisaria bem papel e prateleiras. Mas tudo isso demanda reflexão.Já devo carta à Marie e ao Zézé – mas enquanto me não desembaraçar da Revista, que é quase todo feito por mim e que me apanhou em veia, não tenho tempo para prazeres.Têm feito fotografias? Mando uma carta da Benedita. Mil e mil beijos aos queridos meninos e para ti também larga dose do teuJosé

Eça de Queirós, Correspondência(texto com cortes)

VOCABULÁRIO:quelque chose de froid - alguma coisa friabatterie de cuisine - trem de cozinhaoffice - escritório

I

O texto é uma carta informal, e como tal, destina-se a manter a comunicação, à distância com familiares e amigos.

1. Identifica o remetente e o destinatário.

2. Que relação familiar haverá entre estas duas pessoas. Justifica a tua resposta.

3. Refere dois temas, que fazem parte do assunto da carta.

4. Transcreve duas frases do texto que mostram a preocupação do remetente com a destinatária.

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5. Qual a profissão do remetente. Explica-a com expressões do texto.

6. Refere duas marcas autobiográficas presentes na carta.

7. Explica o sentido das seguintes expressões:· “a minha vida solitária e laboriosa”;

· “a saúde costumada”;

· “despesas inevitáveis”.

8. Refere três diferenças entre uma carta informal e uma formal.

II

1. Classifica morfologicamente as palavras a negrito na seguinte frase: “a casa avança com lentidão na limpeza”.

2. Escreve de novo a frase “Antevejo com susto despesas inevitáveis”, com o verbo no:- Pretérito Imperfeito do Indicativo;- Futuro Imperfeito do Indicativo.

3. Explica o processo de formação das palavras: “inevitáveis” e “lentidão”.

4. Identifica dois conectores na frase: “Não posso por isso acompanhar Rosa, que janta sempre fora, mas a horas cristãs”.

III

Nos nossos dias o telemóvel veio de certo modo, substituir outros meios de comunicação interpessoais, quer orais, quer escritos. Contudo, em determinadas situações, impõe-se o registo escrito.Imagina que foste incumbido da tarefa de escrever uma carta a um familiar que, tendo emigrado para a Austrália, pretende adquirir uma vivenda, na cidade que abandonou há duas décadas. Nessa carta, procura descrever a casa, a localização, o preço e acrescentar que toda a família pensa que é um bom negócio e está muito satisfeita com regresso.