Carvalho - Mentes Perigosas na Academia: sobre plágios, responsabilidades, diagnósticos e estigmas
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7/28/2019 Carvalho - Mentes Perigosas na Academia: sobre plgios, responsabilidades, diagnsticos e estigmas
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jurisprudncia.Revista do Advogado 118/35.
(5) TJPR,HC909975-6, 2. Cm. Crim., Rel. Lilian Romero, j. 14.06.2012.
(6) STF,HC86.879/SP, j. 21.02.2006.
(7) oliveira, Luiz Renato. Reexes sobre os crimes tributrios.RBCCRIM86/222,set.-out., 2010.
(8) O simples fato de ser scio ou administrador de empresa no autorizaa instaurao de processo criminal por crimes praticados no mbito dasociedade, se no restar comprovado, ainda que com elementos a serem
aprofundados no decorrer da ao penal, a mnima relao de causa e efeitoentre as imputaes e a sua funo na empresa, sob pena de se reconhecera responsabilidade penal objetiva (STJ,HC17872, 5. T., Rel. Min. GilsonDipp, j. 27.09.2005). No mesmo sentido, ainda exemplicativamente: STJ,
HC32116, 5. T., Rel. Min. J. Arnaldo da Fonseca,DJ06.12.2004, p. 342 eSTJ,HC86718, 5. T., Rel. Min. Flix Fischer,DJ03.12.2007, p. 348.
(9) STF, Recebimento da Denncia 3898-3, Rel. Min. Gilmar Mendes,j. 26.08.2009.
Gabriel Bertin de AlmeidaMestre e Doutor em Filosofa pela USP.
Proessor de Direito Penal e Processual Penal nos cursos deGraduao e Ps-graduao em Direito da PUC-PR.
Advogado.
Mentes perigosas na academia:sobre plgios,responsabilidades, diagnsticos e estigmas(*)
Salo de Carvalho
Os psicopatas so os vampiros da vida real(...).Podemos consider-los
autnticas criaturas das trevas, possuem um extraordinrio poder de
nos importunar e de nos hipnotizar com o objetivo maquiavlico de
anestesiar nosso poder de julgamento e nossa racionalidade. Com
histrias imaginrias e falsas promessas nos fazem sucumbir ao seu jogo
e, totalmente entregues sorte, perdemos nossos bens materiais e somos
dominados mental e psicologicamente.
Tenha absoluta certeza: o problema so eles. So vampiros humanos
ou, se preferir, predadores sociais. Eu adoraria dizer que encontr-los
por a algo raro e improvvel, mas se assim eu o zesse, estaria agindo
como um deles: mentindo, omitindo a verdade, impossibilitando-o de se
precaver contra as suas maldades e perversidades (Silva, 2008: 42).
1. A psiquiatra, autora dos best-sellersMentes perigosas, Mentes
ansiosas e Bullying: mentes perigosas na escola ttulo que inspiraeste artigo , est sendo acusada de plgio. A originalidade de vrias
das suas obras foi contestada na Justia por colegas investigadores
nas reas da Psiquiatria e Neurocincias. Isso signica, em termos
jurdico-penais, que existe contra a autora, consultora da roteirista
Glria Perez para construo de personagens psicopatas protagonistas
de soap operas nacionais, uma imputao de crime contra a propriedade
intelectual (violao de direitos do autor, art. 184 do Cdigo Penal).
Segundo reportagem daFolha de S. Paulo, o livroMentes ansiosas
foi retirado do mercado a partir de deciso judicial que, em sede liminar,
concluiu: a anlise das duas obras revela semelhanas notrias, sendo
que ambas apresentam diversos excertos longos com praticamente o
mesmo contedo, simplesmente com alteraes no estilo da escrita
(Folha de S. Paulo, 01.03.2013).
A tentao de fazer um diagnstico da autora a partir dos elementos
trazidos pela reportagem grande, confesso.
Seria possvel, utilizando a escala PCL-R (Hare Psychopathy Checklist
Revisited) desenvolvida por Robert Hare para anlise de transtornos de
personalidades antissociais (TASP), utilizada pela autora em seu estudo
Mentes perigosas: a psicopatia mora ao lado ,(2) dizer que Ana Beatriz
(1.) altamente sedutora ao apresentar, em palestras, entrevistas e aulas,
as ideias desenvolvidas em seus livros; que (2.) desenvolveu uma grande
autoestima a partir da popularizao das suas obras; que, no entanto, (3.)
apresenta um grau elevado de mentira (mentira patolgica) ao sustentar
como as suas pesquisas de outros pesquisadores, situao que (4.) indiciaria
elementos notrios de esperteza e manipulao; que (5.) inegvel a falta
de remorso e de culpa da autora, o que seria possvel comprovar na reiterada
negao do fato (plgio), ou seja, que no demonstraria qualquer tipo de
arrependimento pela usurpao de obra alheia; que (6.) apresentaria sinais
de supercialidade emocional ao persistir no uso de trabalhos de terceiros
mesmo aps as denncias (inmeras obras so acusadas de apropriao
de trabalhos alheios, segundo a reportagem), fato que (7.) revelaria um
nvel alto de insensibilidade e de falta de empatia; e, sobretudo, que (8.)
a autora falha em aceitar a responsabilidade decorrente dos seus erros.
No h na reportagem qualquer dado sobre a infncia de Ana Beatriz,
sugerindo a prtica de agresses contra animais. Mas segundo os dados
fornecidos pelo peridico, este seria o nico item da escala 1 do PCL-R em
que haveria alguma espcie de dvida quanto aos critrios para denio
de uma personalidade marcada pelo narcisismo agressivo.
Alm disso, seria possvel perceber na acusada dos sucessivos crimes
contra a propriedade intelectual alguns sinais de estilo de vida socialmente
desviante (escala 2), como (1.) comportamento parasitrio mediante a
manuteno do seu status em decorrncia do trabalho dos seus manipulados
(autores plagiados); (2.) incapacidade de enxergar as consequncias dassuas aes no futuro (processos criminal e civil de responsabilizao);
(3.) impulsividade; (4.) irresponsabilidade.
Registro, porm, para que nenhuma dvida exista acerca da ironia do
artigo, que a livre manipulao desta escala, no caso Ana Beatriz, serve
apenas como uma metfora, uma espcie de licena cientca para tratar
de temas recorrentes (diagnsticos, estigmas e responsabilidades) nesta
complexa relao entre os campos ius epsi. Deixo explcito, portanto,
desde o princpio, que no acredito na pertinncia tica e na validade
cientca destas escalas de medio do mal, fundamentalmente
porque entendo que este tipo de tcnica opera a partir de perspectivas
causais-deterministas e essencialistas, pouco adequadas aos padres
epistemolgicos da contemporaneidade. Ademais, fundamental referir
que, assim como qualquer outra perspectiva cientca, esta tcnica
carrega e sustenta um projeto poltico (no caso um projeto poltico-
criminal) muito bem denido e que produz, na atualidade, um volumeinominvel de pessoas vulnerveis criminalizao, tanto pela excluso
formal em crceres e em manicmios, quanto pela excluso simblica
que se concretiza no cotidiano atravs dos estigmas e preconceitos.
2. A tentao de propor uma avaliao que permita perceber na autora
atitudes insensveis voltadas exclusivamente obteno de status, poder
e prazer (traos indicativos de uma personalidade antissocial), a partir
dos dados colhidos pela reportagem, decorre do fato de Ana Beatriz
atuar exatamente dessa forma em inmeras entrevistas. Em vrias
oportunidades, sobretudo em programas de grande audincia, a acusada
tem realizado diagnsticos de personalidades nocivas, pessoas
incapazes de ter afeto, predadores da vida real, personalidades
ms em sua essncia nesse sentido, por exemplo, conferir os
programas Happy Hour (GNT, 05.11.2008); Sem Censura (TVE,
06.11.2008); Alternativa Sade (GNT, 01.04.2009); Mais Voc
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(Globo, 14.03.2011), todos disponveis na web. Nos shows televisivos
mencionados, a psiquiatra, em inmeras oportunidades, diagnostica
pessoas a partir de elementos genricos narrados pelos ncoras ou pelos
jornalistas. Aps a narrativa, a expertrealiza o enquadramento do sujeito
idealizado nas categorias de psicopatia leve, moderada e severa.
Todavia, neste ponto creio importante no avanar na irnica e
metafrica propositura de um diagnstico inclusive porque no sou
prossional da rea e seguir o alerta da prpria Ana Beatriz de que sejam
cuidadosas quaisquer avaliaes precipitadas, notadamente porque o PCL
uma complexa ferramenta cuja utilizao clnica somente deve ser feita
por prossionais ou servios qualicados (...); e que muitas pessoas
podem ser sedutoras, impulsivas, pouco afetivas ou at mesmo terem
cometido atos ilegais, mas nem por isso so psicopatas (Silva, 2008: 68).
A propsito Hoenisch, Pacheco e Cirino demonstram o equvoco
que o de julgar-se capaz de falar (analisar) sobre um discurso que
no se escutou, no caso do produzido pelo sujeito acusado. Assim,
indagam os autores, como podemos, na condio de (re)produtores
de um conhecimento que se busca legtimo acerca do humano, falar
sobre um caso a partir de notas de jornais, ou fragmentos de entrevistas
televisivas? (hoeniSch, Pacheco & cirino, 2009: 86).
Nesse sentido, para alm do extremo cuidado no uso desta
ferramenta de preciso questionvel, entendo que propor um diagnstico
de Ana Beatriz representaria uma inominvel ofensa tica porque no justicvel, sob hiptese alguma, que algum seja avaliado, rotulado e
exposto publicamente , e constituiria um grave equvoco dos pontos de
vista terico e metodolgico. Do ponto de vista conceitual, o conjunto
de erros refere-se dubiedade das categorias utilizadas para enquadrar o
comportamento desviante; do ponto de vista metodolgico, diz respeito
forma tcnica para apreender este contedo altamente malevel.
3. A primeira questo diz respeito aos equvocos tericos. No diz
respeito, portanto, aos critrios utilizados pelo expert para aferir se o
sujeito sedutor, esperto, manipulador, insensvel, supercial
emocionalmente e impulsivo ou se apresenta ausncia de remorso,
incapacidade de culpa, falta de empatia, comportamento
parasitrio; mas ao signicado e aos limites na interpretao dessas
categorias (anlise conceitual).
A anlise dos critrios expostos nas escalas do tipo PCL-R critriosque so utilizados como referenciais em inmeras percias e laudos no
processo penal (por exemplo, laudos criminolgicos, exames de cessao
de periculosidade e avaliao de inimputabilidade) revela no apenas
dubiedade e volatilidade conceituais como possibilita julgamentos
marcadamente morais que acabam por substituir valoraes de fatos
por juzos de valor indemonstrveis (por exemplo, seduo, esperteza,
manipulao e insensibilidade afetiva). Nota-se, ainda, que o contedo
de muitas destas categorias se confunde ou permite uma dupla (ou tripla)
valorao do mesmo elemento de fato (bis in idem) o fato de o sujeito
no admitir o erro, por exemplo, pode ser considerado um indcio de
que insensvel, mas, ao mesmo tempo, permite aferir que supercial
emocionalmente e incapaz de culpa, circunstncia que produz, sob uma
mesma base emprica (inadmissibilidade do erro), valoraes mltiplas
na mesma escala de avaliao.
Outrossim, se tais valoraes so possveis (cabveis) no mbito
da Psiquiatria e da Psicologia ortodoxas (positivistas), em termos
jurdico-processuais so invlidas em decorrncia do seu contedo
moral (limite material) e da impossibilidade de refutabilidade e de
exerccio do contraditrio (limite processual). Nos termos expostos por
Ferrajoli (1998), uma prova processual somente vlida se passvel de
refutao emprica, ou seja, quando baseada em fatos e no em juzos
ou impresses. A valorao judicial deve ser feita, portanto, a partir de
dados concretos e no realizada sobre outras valoraes (metavalorao
ou valorao de valorao). Ademais, os fatos a serem analisados devem
ter estreita relao (nexo de causalidade) com o fato imputado (no caso, o
delito). Por este motivo, na novela de Camus (1991), Meursault deveria ter
sido julgado exclusivamente pelo assassinato do rabe e no pelo fato de
no ter chorado no enterro da me. Do contrrio, estar-se-ia legitimando
um modelo de Direito Penal do autor, vedado nos sistemas democrticos
de Direito Constitucional (carvalho, 2008; carvalho, 2013).
Determinadas valoraes (juzos) so processualmente invlidas nos
modelos de Direito Penal do fato porque impedem que os argumentos
sejam empiricamente refutados (contraditados), exatamente por
serem sustentadas em hipteses e no em dados objetivos. Tome-se,
por exemplo, os casos de atribuio de insensibilidade moral,
esperteza ou seduo a determinada pessoa. Qualquer armao
(positiva ou negativa) acerca dessas imputaes decorre muito mais de
um valor atribudo pelo intrprete, sempre a partir do seu cdigo moral,
do que propriamente da anlise de dados relativamente objetivos que
possam ser confrontados com outros elementos empricos. No por
outra razo vedado na instruo penal que a testemunha manifeste
suas apreciaes pessoais, salvo quando inseparveis da narrativa do
fato (art. 213 do Cdigo de Processo Penal).
No entanto, no campo jurdico-penal, em inmeras situaes (laudos
na execuo das penas e das medidas de segurana, por exemplo), as
apreciaes dos experts das reas psi, materializadas no processo de
interpretao e de atribuio de signicado do contedo destas categorias
abertas, ingressam judicialmente como argumentos de autoridade.
A qualidade de percia tcnica possibilita, pois, em vrias situaes
processuais, que determinados juzos (morais) enunciados pelos experts
sejam reconhecidos como prova cientca. Trata-se, porm, de um
procedimento de manipulao com a nalidade de validao de umaprova invlida. Invlida porque se estas mesmas categorias de anlise
(categorias psiquitricas) integrassem tipos penais incriminadores
(elementares tpicas), dicilmente subsistiriam a um rgido controle de
constitucionalidade, exatamente em razo da sua vagueza, ambiguidade
e impreciso (tipos penais lacunares e contraditrios). Assim, o que se
h em termos jurdicos uma anlise de circunstncias extratpicas e de
elementos acerca da individualidade/identidade do acusado, o que, em
decorrncia do fato de estarem para alm dos horizontes do tipo penal
imputado, no podem ser valorados sob pena de ofensa aos princpios da
legalidade penal e da secularizao do direito. No demasia lembrar
que o Direito Penal, nos Estados Democrticos de Direito, responsabiliza
as pessoas por fatos que ofendem bens jurdicos palpveis (Direito Penal
do fato); no criminaliza ou pune estados ou condies pessoais (Direito
Penal do autor) (carvalho, 2008; carvalho, 2013).
4. A segunda questo diz respeito ao equvoco metodolgico,
normalmente perceptvel no fato de grande parte das pesquisas sobre
comportamento criminal ter como objeto de investigao grupos
previamente selecionados como criminosos lembre-se, por exemplo,
da proposta de pesquisa neurolgica com adolescentes em conito com
a lei no Rio Grande do Sul h alguns anos.
Ao operar sobre um grupo previamente selecionado (criminalizado)
mesmo havendo estudo e aplicao das mesmas escalas em populaes de
controle, ou seja, em grupo de indivduos considerados no delinquentes ,
o resultado desta escolha metodolgica acaba sendo inuenciado por
uma varivel que pode ser denida como profecia que se autocumpre
(self-fulllling-prophecy), na tradicional construo de Lemert (1967) e
Schur (1971), quando lanadas as bases do paradigma do etiquetamento
(labelling approach). Neste cenrio de eleio prvia da populao
delinquente, o pesquisador j parte de uma hiptese consolidada: o objetode investigao um criminoso; ou o criminoso um psicopata.
Assim, cabe ao expertreconstruir a histria de vida do investigado e
colher aqueles elementos parciais que apontam e comprovam o ato nal
(crime). Trata-se, portanto, sempre de um diagnstico retrospectivo:
a partir de uma hiptese (o sujeito criminoso ou o criminoso um
psicopata), so cuidadosamente selecionados eventos da sua vida que,
primeiramente, indiciam ou sugerem, e, posteriormente, comprovam
aquele comportamento criminal (neste sentido, conferir hoeniSh, 2002;
Pacheco, 2011). Por outro lado, a populao de controle em pouco
auxilia na compreenso da hiptese. Pelo contrrio, atua sempre como
um instrumento ou uma varivel de comprovao da tese central, pois o
mesmo procedimento realizado, s que em sentido inverso ou seja,
so selecionados eventos parciais da vida das pessoas que compem o
grupo de controle que indicam no serem criminosos e/ou psicopatas.(3)
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Alm disso, por mais representativa que seja a amostra do grupo de
pesquisa (amostra e populao de controle), as variveis acerca da
seletividade do sistema punitivo e das cifras ocultas expostas pela
criminologia crtica sempre marcaro uma diferena radical entre as
formas de interpretao do fenmeno: o foco na criminalidade como
um dado da natureza (paradigma etiolgico, criminologia ortodoxa);
a anlise da criminalizao como uma construo poltico-criminal
(paradigma do conito, criminologia crtica).
Em termos processuais penais, este diagnstico retrospectivo pode
ser aproximado daquilo que Franco Cordero (1986) designa como
primado das hipteses sobre os fatos, a forma mentis que caracteriza
o estilo inquisitorial de reconstruo da verdade. Neste procedimento,
o inquisidor arma previamente uma hiptese e depois reconstri ou
manipula os dados (provas, eventos ou circunstncias) com o objetivo
da sua comprovao. Assim, a profecia se autocumpre, mas de forma
inversa; no do presente para o futuro, mas de determinado passado para
o presente (e, logicamente, em momento posterior, para o futuro, em
termos de periculosidade).
Jock Young (2002) denomina esta tcnica de excluso de
essencializao do crime e do criminoso. Toda a histria de vida do
sujeito interpretada como um momento preparatrio do grande evento
que o crime; momento de regresso atvica ao estado de barbrie que
o criminoso no conseguiu superar e atingir a maturidade civilizatria(carvalho, 2013). A essencializao aprisiona, portanto, tanto o passado
(que apenas um momento preliminar) quanto o futuro (que vive da
expectativa da repetio) do desviante. A no repetio apenas um
estado de ebulio, pois a potncia (delitiva) inexoravelmente ser
transformada em ato. Se a recidiva no se manifestar, decorrncia da
ausncia de tempo suciente para apotentia criminalis emergir.
5. A falha mais grave, porm, em todo este procedimento de anlise
e etiquetamento de mentes perigosas, a de natureza tica, pois o
pesquisador que opera esta tcnica aniquila a pessoa; substituindo a
sua identidade pelo rtulo inextirpvel do sujeito perigoso. Assim,
concretizada a essencializao, a leitura da histria de vida do sujeito e
a expectativa quanto ao seu comportamento futuro so reduzidas a um
estigma xo e imutvel que o aprisiona: o crime. O sujeito anulado,
subsistindo apenas a imagem idealizada no rtulo (ou no dado estatstico,
se a preocupao for restrita lgica gerencialista).
Exatamente por isso no eticamente justo e cienticamente vlido
aplicar contra Ana Beatriz esta tcnica de excluso e de aniquilamento
do ser. A autora, como todo mundo, merece ser preservada neste
momento de fragilidade e somente poder ser responsabilizada, civil
ou criminalmente, aps enfrentar um devido processo, respeitados o
contraditrio, a ampla defesa e, sobretudo, a presuno de sua inocncia.
No obstante, ao nal, o que interessa ao campo jurdico para aferir
responsabilidade pelo crime a (in)existncia de provas concretas de que
Ana Beatriz se apropriou do trabalho intelectual dos seus colegas. Nada
mais. Sobretudo porque no deve inuenciar na responsabilizao ou
na punio o fato de Ana Beatriz no ter derramado lgrimas no velrio
de sua me. Metfora que pode ser concretizada no sensacionalismo,
na virulncia e na agressividade com a qual a acusada, em seus textos
e entrevistas, se refere, invocando pnicos morais queles sujeitos querotula como vampiros da vida real ou criaturas das trevas.
Referncias BibliogrcascaMuS, Albert. O estrangeiro. 3. ed., Rio de Janeiro: Record, 1999.
carvalho, Salo.Antimanual de criminologia. 5. ed., So Paulo: Saraiva, 2013.
_______.Pena e garantias. 3., ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
cordero, Franco. Guida alla procedura penale. Torino: Utet, 1986.
ferrajoli, Luigi.Diritto e ragione: teoria del garantismo penale. 5. ed., Roma:Laterza, 1998.
hoeniSch, Julio. Div de procusto: critrios para a percia criminal no
Rio Grande do Sul. Dissertao (Mestrado) apresentada ao Programa dePs-Graduao em Psicologia da PUCRS, 2002.
_______; Pacheco, Pedro; cirino, Carlos. Transgresso, crime, neurocincias:impasses aos saberes da psicanlise?Estudos de Psicanlise, n. 32, 2009.
leMerT, Edwin. Human deviance, social problems and social control.New Jersey: Prentice-Hall, 1967.
Morana, Hilda. Identicao do ponto de corte para a escala PCL-R(Psychopathy Checklist Revised) em populao forense brasileira .Tese (Doutorado) apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Psiquiatriada USP, 2003.
Pacheco, Pedro. Pesquisas do crebro e psicopatias: a potencialidade docriminoso justicada por saberes cientcos. Tese (Doutorado) apresentadaao Programa de Ps-Graduao em Psicologia da PUC-RS, 2011.
Schur, Edwin. Labeling Deviant Behavior: its sociological implications.New York: Harper & Row, 1971.
Silva, Ana Beatriz Barbosa. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado.Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.
YounG, Jock.A sociedade excludente: excluso social, criminalidade e diferenana modernidade recente. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
Ns:
(*) Agradeo a Carolina dos Reis, Felipe Oliveira, Julio Hoenish, Lilian Reolon,Marcelo Mayora, Mariana Garcia, Mariana Weigert e Renata Costa pelaleitura e pelas contribuies.
(2) Com esse instrumento [PCL-R], o diagnstico da psicopatia ganhouuma ferramenta altamente convel que pode ser aplicada por qualquer
prossional da rea da sade mental (...).
O PCL examina de forma detalhada diversos aspectos da personalidadepsicoptica, desde os ligados aos sentimentos e relacionamentosinterpessoais at o estilo de vida dos psicopatas e seus comportamentosevidentemente antissociais (transgressores) (Silva, 2008: 67).
(3) Veja-se, por exemplo, a seleo da amostra e do grupo de controle deuma das pesquisas de validao da escala PCL-R no Brasil: os sujeitosde experimentao foram avaliados no Instituto de Medicina Social e de
Criminologia do Estado de So Paulo (IMESC); ou estavam cumprindopena na Penitenciria do Estado de So Paulo; no centro de ObservaoCriminolgica (SP); Casa de Custdia de Taubat (SP), Hospital deCustdia Andr Teixeira Lima (Cidade de Franco da Rocha, SP) ou aindana Penitenciria de Ita (SP) (Morana, 2003: 77).
Todos estes indivduos cumpriam pena em diversos presdios no Estadode So Paulo, exceto um deles, que foi selecionado em ambulatrio (...).Uma amostra de 30 indivduos sem antecedentes criminolgicos ou
psiquitricos, que no preencheram critrios para TAS, foi usada comocontrole (Morana, 2003: 78).
Foram selecionados [para a populao de controle] sujeitos conhecidosda autora e da psicloga auxiliar da pesquisa, assim como parentes eamigos que, devido ao longo convvio (em mdia 10 anos), sabia-se da vida
pregressa isenta de transtornos, quer sejam psiquitricos, psicolgicos ouda esfera judicial (negativos para registro criminal no Frum CriminalCentral Mario Magalhes) (Morana, 2003: 82).
Salo de CarvalhoDoutor em Direito (UFPR).
DirEtoria ExECutiva
Presdente: Marngela Gama de Magalhes Gomes1 Vce-Presdente: Helena Regna Lobo da Costa2 Vce-Presdente: Crstano Avla Maronna1 Secretra: Helosa Estellta2 Secretro: Pedro Luz Bueno de Andrade1 Tesourero: Fbio Tofc Simantob2 Tesourero: Andre Pres de Andrade KehdDretora Naconal das Coordenadoras Regonase Estaduas: Eleonora Rangel NacfAssessor da Presdnca: Rafael Lra
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