“Caso Amin Nordine” - Moçambique para...

44
SAVANA Maputo 11.11.05 semanário independente TEMA A roleta dos PCA’s continua Vicente Veloso cai do poleiro eléctrico Próximas quedas poderão ser na TVM, EMOSE e GPZ Fonseca e Pequenino podem “sobreviver” a ofensiva organizacional por méritos de gestão… Por Luís Nhachote A procissão continua e confirma o que as imbatíveis fontes do SAVANA já haviam predito: a inevitável queda do ex- -presidente do Conselho de Administração (PCA) da Electricidade de Moçambique (EDM), Vicente Mebunia Veloso, anunciada, terça-feira, pelo Conselho de Ministros. Numa nomeação quase a papel químico da operação que culminou com a queda do veteraníssimo Solomone Cossa, dos Aeroportos de Moçambique (ADM), o novato Manuel João Cuambe é quem vai dirigir, nos próximos quatro anos, o futuro da EDM. Fontes ligadas ao processo indicam que as próximas mexidas imediatas deverão ocorrer na TVM e na EMOSE, numa operação que se espera que esteja concluída até finais do ano. O prenúncio do fim da era VV É verdade irrefutável que a estrutura directiva da EDM estava profundamente dividida, com as manifestações desse conflito a atingirem o extremo de três dos cinco membros que constituem o colégio do Conselho de Administração (CA) subscreverem um abaixo assinado, contestando as decisões algo arbitrárias de Vicente Mebunia Veloso, conforme fora oportunamente noticiado pelo SAVANA, em Maio deste ano. Os seus pares acusavam-no de gestão demasiado centralizada (e até certo ponto unilateralista) e uso abusivo de poder para fins alheios aos objectivos da EDM. “Era inevitável a queda de Veloso”, foi nestes termos que as nossas fontes descreveram a decisão do CM. Na hora de partida, Veloso enalteceu os feitos da sua administração. “Saio feliz, porque cumpri a missão para a qual fui confiado”. Na terça-feira, em alguns sectores na sede da EDM, suspirava-se de alívio com a saída de Veloso do comando da empresa. Contudo, outras fontes da empresa e próximas de VV aconselham alguma cautela para os que cantam vitória. Veloso, que esteve em Lisboa integrado na comitiva empresarial que acompanhou o Presidente Armando Guebuza na sua viagem triunfal a Portugal, é visto como tendo acumulado um know-how que lhe pode permitir integrar o quadro de gestão da gigantesca barragem Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB).

Transcript of “Caso Amin Nordine” - Moçambique para...

Page 1: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

SAVANA Maputo 11.11.05

semanário independente

TEMAA roleta dos PCA’s continuaVicente Veloso cai do poleiro eléctrico— Próximas quedas poderão ser na TVM, EMOSE e GPZ

— Fonseca e Pequenino podem “sobreviver” a ofensiva organizacional por méritos de gestão…

Por Luís Nhachote

A procissão continua e confirma o que as imbatíveis fontes do SAVANA já haviam predito: a inevitável queda do ex- -presidente do Conselho de Administração (PCA) da Electricidade de Moçambique (EDM), Vicente Mebunia Veloso, anunciada, terça-feira, pelo Conselho de Ministros.

Numa nomeação quase a papel químico da operação que culminou com a queda do veteraníssimo Solomone Cossa, dos Aeroportos de Moçambique (ADM), o novato Manuel João Cuambe é quem vai dirigir, nos próximos quatro anos, o futuro da EDM.

Fontes ligadas ao processo indicam que as próximas mexidas imediatas deverão ocorrer na TVM e na EMOSE, numa operação que se espera que esteja concluída até finais do ano.

O prenúncio do fim da era VVÉ verdade irrefutável que a estrutura directiva da EDM estava profundamente dividida, com as manifestações

desse conflito a atingirem o extremo de três dos cinco membros que constituem o colégio do Conselho de Admi-nistração (CA) subscreverem um abaixo assinado, contestando as decisões algo arbitrárias de Vicente Mebunia Veloso, conforme fora oportunamente noticiado pelo SAVANA, em Maio deste ano. Os seus pares acusavam-no de gestão demasiado centralizada (e até certo ponto unilateralista) e uso abusivo de poder para fins alheios aos objectivos da EDM.

“Era inevitável a queda de Veloso”, foi nestes termos que as nossas fontes descreveram a decisão do CM. Na hora de partida, Veloso enalteceu os feitos da sua administração. “Saio feliz, porque cumpri a missão para

a qual fui confiado”. Na terça-feira, em alguns sectores na sede da EDM, suspirava-se de alívio com a saída de Veloso do comando

da empresa. Contudo, outras fontes da empresa e próximas de VV aconselham alguma cautela para os que cantam vitória. Veloso, que esteve em Lisboa integrado na comitiva empresarial que acompanhou o Presidente Armando Guebuza na sua viagem triunfal a Portugal, é visto como tendo acumulado um know-how que lhe pode permitir integrar o quadro de gestão da gigantesca barragem Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB).

Espírito de equipaA Primeira-Ministra, Luísa Diogo, deverá ter tido em mente algumas das acusações de acção unilateralista que

pesavam sobre Veloso, quando na cerimónia de tomada de posse do seu substituto, Manuel Cuambe, ela aconselhou-o “a desenvolver o espírito de equipa” no processo de tomada de decisões e na administração daquela empresa que, pela natureza do serviço que presta, é das empresas públicas com um volume de negócios que representa milhões de dólares por ano.

O novo PCA da EDM fez a sua licenciatura em engenharia electrotécnica na Zâmbia – onde o pai, o falecido Julião Cuambe, trabalhava como embaixador de Moçambique – e este ano concluiu o mestrado em Administração de Negócios na África do Sul. Exercia até à data da sua última nomeação as funções de director nacional da área de redes da EDM.

E MOSE e TVM na berlinda Com esta operação, novas mexidas são antecipadas na seguradora pública EMOSE e na principal estação de

televesão também pública, a TVM.

Page 2: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

De facto, indagada sobre tais possibilidades, Luísa Diogo teria referido, na semana passada, que, no caso da TVM, o mandato do actual PCA, Arlindo Lopes, seria objecto de análise e posterior decisão do Conselho de Ministros, uma vez que o mesmo expirou.

Quanto à seguradora nacional, onde recentemente o ambiente azedou com a circulação de uma carta anónima denunciando alegadas irregularidades na gestão da empresa, é um dos assuntos que deverá constar da agenda das próximas reuniões de trabalho do CM.

“É preciso arrumar as casas desorganizadas”, dizem algumas fontes, sustentando que as medidas do CM, algo vistas como uma ofensiva organizacional, terão de estar concluídas antes de Armando Guebuza prestar o seu pri-meiro informe sobre o Estado da Nação, em Dezembro.

Prováveis mexidas deverão ocorrer em bloco em relação aos PCA’s da Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), Telecomunicações de Moçambique (TDM), Gabinete de Desenvolvimento do Vale do Zambeze (GPZ) e a em-presa Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM).

Para o GPZ, fala-se do agrónomo Paulo Zucula, antigo vice ministro da gricultura, e actual director executivo da FDC, para substituir Sérgio Vieira.

Zucula é considerado como um homem de elevadas capacidades técnicas, para além de que dada a localização daquele empreendimento, numa zona de forte influência da oposição, o seu pragmatismo poderá ajudar a impulsionar o inclusivismo necessário para que o projecto de desenvolva sem grandes dificuldades.

Contudo, em contacto com o SAVANA, Zucula dissera não saber do assunto, acrescentando: “Não fui abordado nesse sentido. Vocês devem saber mais do que eu”.

Mudanças guebuzianas e o efeito-surpresa A revolução que está a ser levada com a nomeação de novos PCA’s nas empresas públicas pelo executivo de

Guebuza suscita reflexões profundas.Das várias teses, avança- -se para as questões geracional e comportamental. No primeiro aspecto,

Muiuane, Cambaza e Cuambe são o tal sangue novo, em termos de idade. No segundo, exalta-se o serem discretos, de competência técnica, pouco mediáticos e por isso pouco dados à opulência.

É uma espécie de piscar de olho a uma geração de quadros com poucas cumplicidades com o topo do partido no poder, o que poderá, a curto e médio prazos, garantir-lhes certa independência, necessária para não entrarem na teia de corrupção que tem sido característica da maioria das empresas públicas.

HCB: as contas do negócioCom a entrega a Moçambique de 67% do capital da Hidroeléctrica de Cahora Bassa(HCB), a pergunta que

anda na boca de todos é como e onde arranjar os 950 milhões de dólares que terão de ser entregues a Portugal nos próximos 19 meses.

Economistas, consultores e partes potencialmente interessadas no negócio dizem que o “assunto não é complicado, agora que a parte política foi desbloqueada”.

Uma das tranches acordadas em Lisboa e a ser paga até Outubro do próximo ano sairá dos próprios cofres da HCB. São 250 milhões de dólares a desembolsar em duas prestações, a primeira das quais em Janeiro.

Depois, há 12 meses para entregar mais 700 milhões. Os 12 meses, a contar da data da assinatura do acordo formal (previsto para Dezembro), poderão ser estendidos para 18, desde que Moçambique entregue 350 milhões até Dezembro de 2006.

Aqui colocam-se vários cenários que, mais uma vez, Moçambique terá de decidir politicamente: vender para comprar, ou “engordar a galinha” para vender depois.

No primeiro cenário Moçambique pode desfazer-se de parte dos 85 porcento da sua posição accionista, vendendo a preços de mercado parte dos activos accionistas para realizar o encaixe necessário ao pagamento ao Tesouro Português.

Moçambique poderá ainda associar-se a uma operação de venda conjunta com 5 porcento das acções detidas por Portugal. Hipoteticamente esta operação poderia oferecer à Eskom – o cliente sul-africano da energia da HCB – uma participação de 10% ( 5% + 5%).

Na visão de “brokers” potenciais, uma aliança entre o principal accionista e o principal cliente da energia daria uma imagem “mais apetecível” ao negócio de tomada de novas posições no empreeendimento. O entendimento é que Moçambique, nessa estratégia, poderia alienar até 34% do capital (retendo 51%). Potenciais interessados na operação estarão a Geocapital de Stanley Ho e Almeida Santos (que acaba de resgatar os aviões da brasileira Varig com 62 milhões de dólares em dinheiro fresco) e as paraestatais angolanas, interessadas em entrar no xadrez do negócio da energia na África Austral na frente da oferta.

Um segundo cenário para o encaixe dos 700 milhões de dólares poderia vir da consignação de receitas futuras da HCB contra um empréstimo de um sindicato bancário. A favor desta opção joga a avaliação de um prestigiado grupo bancário europeu que estimou em 2004 os activos da HCB entre os 1300-1500 milhões de dólares e o facto de que, com as tarifas revistas, desde o ano passado que os resultados de exploração da hidroeléctrica deixaram o vermelho.

Estima-se em 100 milhões de dólares os lucros apurados em 2004, depois de expurgados dos acréscimos resultantes das diferenças cambiais verificadas no período em apreço. A operação de Lisboa acabou por atribuir um valor de 1418 milhões de dólares aos activos da HCB.

Page 3: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Restam perto de 900 milhões de dólares de que Portugal gostaria de se ver ressarcido (do controverso valor de 2300 milhões de dólares) e a que o ministro das Finanças de Lisboa remata com a categoria contabilística de “custos irrecuperáveis” e com uma outra de carácter político: o empresariado português passa a ter direito de preferência nos negócios da energia em Moçambique, nomeadamente na apetecível Central Norte de Cahora Bassa.

Tecnicamente tratou-se de uma operação harmónio invertida, a redução de capital com a diminuição de posição accionista. Aparentemente Bruxelas não deverá interferir na operação contabilística se esta for pacífica em termos do deficit das contas públicas de Portugal. F L

“Cahora Bassa terá efeitos multiplicadores estruturantes”Por F.Carmona e M.Machel

O conceituado economista moçambicano Prakash Ratilal não tem dúvidas que com a conversão do País em accionista maioritário da Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) esta “terá efeitos multiplicadores estruturantes

de alcance inimaginável” na economia e na sociedade moçambicanas. Para o antigo governador do Banco de Moçambique, Cahora Bassa pode ainda alterar significativamente o poder negocial de Moçambique com as

instituições financeiras internacionais ao mudar a natureza das receitas do nosso orçamento, que, no momento presente, dependem esmagadoramente de donativos.

Dr. Prakash Ratilal, que impacto terá na economia nacional a transferência da Cahora Bassa para as mãos de Moçambique?

Esta transferência tem um impacto de grande alcance. Podemos vê-lo no plano interno e no plano de dimensão inter -nacional. A HCB é o nosso segundo maior empreendimento depois da MOZAL e é o empreendimento maior onde a posição estatal é maioritária. No meu entender, no plano interno, a HCB traz um sentido de pertença nacional, orgulho nacional que foi demonstrado pelas várias reacções positivas a seguir à assinatura do acordo entre os dois governos. Isso é importante porque as pessoas identificaram-se de imediato com a Cahora Bassa. Para além deste orgulho nacional, a HCB é um instrumento que pode jogar um papel estruturante na economia, um papel similar ao que foi jogado e continua a ser jogado noutros países, como é o caso da Petrobrás no Brasil, da Petronas na Malásia, da Eskom na África do Sul, da Sonatrach na Argélia e da Sonangol em Angola. É uma empresa de tal dimensão que certamente será determinante para contribuir para realizar a política económica e social do nosso Estado e Governo. As empresas que citei são todas do ramo energético, são empresas pertencentes ao Estado, são bem geridas e possuem uma mus-culatura financeira de grande envergadura, detêm tecnologias e modelos de gestão do primeiro mundo. No caso da HCB, não estamos a falar de uma mercearia, nem de um supermercado. Estamos a falar de uma entidade moçambicana que opera com qualidade no quadro regional e que já tem moçambicanos altamente formados no seu corpo directivo. A presente unidade situada no Songo, em Tete, tem uma gestão sofisticada, os seus custos de exploração estão cobertos e já realizam lucros. Continuar com esta elevada qualidade de gestão é o desafio maior. Se se conseguir, a HCB pode servir muitos interesses e objectivos nacionais. A segunda dimensão é que a HCB neste momento está a vender energia na região austral numa base competitiva. É uma empresa que está ajustada no processo de globalização, por isso ela é requerida porque tem custos baixos comparativamente aos outros custos de oportunidade, seja pela produção de energia através da utilização de carvão, sejam centrais nucleares ou mesmo de estações gás.

Está a referir-se ao potencial inesgotável da energia de Cahora Bassa, relativamente a esses outros recursos naturais?

Sendo a HCB uma central hidroeléctrica, ela produz uma energia renovável, que é limpa e relativamente barata. A HCB pode ser o catalizador de novos negócios em Moçambique. Isto quer dizer que, primeiro, no próprio sector de energia, para além da construção da Central Norte de Cahora Bassa, onde se pode quase duplicar a capacidade de produção energética actual. Mas também a jusante, 60 km mais abaixo, há a possibilidade de se erguer uma nova barragem denominada Mpanda Nkuwa que pode gerar quantidades adicionais de energia com o recurso às águas provenientes da barragem de Cahora Bassa. Temos a HCB, Mpanda Nkuwa e Boroma, que, no conjunto, podem triplicar a capacidade de produção e de distribuição de energia, servindo as crescentes necessidades da África do Sul e de outros países da região e também para o desenvolvimento de Moçambique. Só na construção e apetrechamento destas novas barragens, isso significa um volume de negócios superiores a 5 biliões de dólares. Ora, investimento desta dimensão são duas Mozais na sua dimensão plena – é disto que se está a falar. Esta pode ser a consequência natural desta assinatura do acordo de entendimento em Lisboa. Este volume impressionante de investimento, concentrado no ramo energético naquela região de Tete, se for bem negociado, vai certamente gerar efeitos multiplicadores em toda a dimensão do País.

Pode desenvolver mais sobre essa multiplicidade de efeitos?Todos os sectores a nível social e económico precisam de energia. O efeito desta decisão permite desbloquear uma

série de oportunidades de investimento que referi. Onde é que um empreendimento destes pode fazer diferença? À volta deste empreendimento podem-se capacitar as empresas nacionais micro, para que elas possam servir e vender os seus serviços a estes empreendimentos. Elas podem ser o pólo de desenvolvimento de outras oportunidades de negócios colaterais e conexas a esta actividade principal, de MPME’s ou seja micro, pequenas e médias empresas, e também as grandes do País. Temos que encontrar o espaço para as empresas receberem o apoio técnico, científico, apoio de gestão com vista à sua modernização e competitividade. Só assim estas empresas poderão fornecer bens e serviços de qualidade a esses grandes projectos. Esta é uma oportunidade ímpar. Desenvolvendo empresas nacionais desta forma

Page 4: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

estaremos a fazer crescer a produção e a riqueza, estaremos a criar emprego e, como resultado, estaremos lutar contra a pobreza

Nova relação com Bretton WoodsEstamos a falar das PME’s (Pequenas e Médias Empresas) até então relegadas para o segundo plano? Exactamente. Estaremos a reduzir a pobreza, que é política do Estado através de geração de empregos e da criação

de riqueza. Este empreendimento torna-se assim estruturante para a economia nacional, estrutura o tecido empresarial nacional e isso vai certamente trazer benefícios e efeitos multiplicadores inimagináveis em toda a sociedade. Alguém dizia, há poucos dias, que este poderá ser o início da nossa independência económica. Relativizando-se naturalmente a palavra independência no quadro mundial de globalização. Por via da criação da riqueza e da capacitação das empresas, esta é a maneira sustentável para praticarmos a política de redução da pobreza. Doutra maneira, por via de donativos, não geramos produção, o que nos relega a continuarmos dependentes. A HCB nas mãos de moçambicanos gera uma oportunidade para reduzirmos a dependência relativamente a donativos.

Está a falar de uma possível nova relação entre Moçambique e as instituições da Bretton Woods e outros doa-dores?

Gradualmente isso vai acontecer. Conheço os bastidores do FMI e do Banco Mundial, estive nas negociações preli-minares de adesão a estas instituições. Acredito que, em 2025 e 2050, continuaremos a nos relacionar com estas ins-tituições e deveremos estar porque faz parte do concerto das nações. Mal de nós se saíssemos delas. Estas instituições desempenham um papel muito importante. Induzem maior rigor e transparência na gestão económica e financeira. Por vezes apresentam receitas amargas, mas isso é resultado da nossa dependência, que nos leva a negociar numa posição desvantajosa. O ponto principal é que uma unidade do tipo da HCB vai gerar receitas próprias para o Orçamento do Estado (OE) vai gerar mais empregos nos novos empreendimentos, serão mais impostos cobrados através de salários, pela venda de mais energia, etc.. Sendo assim, o OE fica menos dependente dos fundos provenientes de donativos. E, ao ficarmos menos dependentes, a balança comercial e de pagamentos do País tende a melhorar. Acontecendo isso, a natureza das receitas de Moçambique também muda, porque se trata de receitas próprias e não resultante de doações. Isso naturalmente altera as relações com as instituições e com os doadores. Isso não significa uma relação de confronto, em momento algum. Presentemente há uma relação de desigualdade, mas com uma empresa da dimensão da HCB tendemos a ficar mais fortes. Ao criarmos receitas próprias, através da HCB e outros empreendimentos semelhantes, criamos uma capacidade para podermos decidir sobre os nossos recursos, naturalmente que serão aplicações de forma transparente e responsável. Passando para Moçambique, a HCB tem que continuar a ter uma gestão isenta, mas qualita-tivamente superior.

Futuros interesses estran geiros Que estratégia de gestão defende para Cahora Bassa? No caso da HCB não creio que haja grandes problemas a nível da gestão. Não conheço os aspectos internos e as

relações entre os trabalhadores e a direcção. É uma empresa com capacidade tecnológica elevada. Creio que se deve ter muita prudência no processo de qualquer mudança interna. O que interessa é que a baragem produza e gere resultados positivos. Segundo o comunicado do Governo, Portugal continuará a participar na sociedade. O ponto essencial são os resultados que vão ser canalizados para o OE. Qualquer mudança deverá assegurar alto nível e qualidade da gestão.

Uma das melhores formas de pagar pela barragem é a entrada de outros accionistas. Pode ser. Há várias modalidades e dependerá também do mercado financeiro para atrair interesse de outros países,

esses outros interesses poderiam ser enquadrados no capital da sociedade e ajudariam a fortificar a capacidade de gestão. É uma dinâmica que se pode gerar com a participação de empresas, bancos e países dispostos a participar no empreendimento. Para além de factor de desenvolvimento, Cahora Bassa é também um instrumento de cooperação internacional. A energia de Cahora Bassa representa 8 a 10 porcento da energia consumida na África do Sul. A energia de Cahora Bassa é renovável e limpa, por isso interessa imenso à África do Sul, confrontada com neces sidades adicionais de energia no seu processo de crescimento agrícola e industrial e está constrangida a utilizar energia com base no carvão devido ao meio ambiente e aos custos elevados. Por isso, para além de Portugal, a África do Sul é naturalmente um parceiro natural deste grande empreendimento. Há outros como a China, a Noruega, os outros países nórdicos, países europeus e creio que também os EUA e Grã Bretanha. A posição agora detida por Moçambique fortalece a sua posição negocial em relação à África do Sul. Esta posição será mais fortalecida com o reforço de cooperação com Angola. Tudo isto é possível, mas antes temos que pagar a dívida assumida em Lisboa que é a condição de base para exercermos os nossos direitos de soberania e assim determinar o futuro.

Considera a HCB o petróleo de Moçambique? Quando está a falar de petróleo penso que está a falar da importância da geração de receitas para o OE. Este é o

primeiro empreendimento de tal magnitude que vai permitir o Governo dispor de um instrumento para alavancar outras iniciativas. Mas, também, há outros megaprojectos. A MOZAL ainda é maior que a HCB. Mas a HCB vai permitir o desenvolvimento de outros grandes projectos que estão constrangidos por não haver energia como é o caso das MOZAL III, das areias pesadas, da central de carvão de Moatize. Estou a ver efeitos a longo prazo, por isso não há dúvidas que o nosso Governo está de parabéns e também o Governo de Portugal. Neste momento, há muito trabalho para ser feito, mas temos a possibilidade de perspectivar um desenvolvimento assente na produção de riquezas nacionais, valorizar as riquezas adormecidas que estão no País. Moçambique precisava de uma alavanca e esta chama-se HCB.

Page 5: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Operadores acreditam nos 30 mil/USDMetical em derrapagem acelerada— “Estamos a tomar medidas para estancar estas tensões”, BM — “Deve haver mais cuidado na aplicação da política cambial”, Dipac Jaiantilal, especialista em moeda

Por Francisco Carmona

A depreciação da divisa moçambicana, em relação à chamada nota verde, entrou num ritmo acelerado, situação que o Banco de Moçambique (BM) atribui às incertezas, por parte dos agentes económicos, quanto a uma eventual escalada do preço do barril de petróleo no mercado internacional.

Contudo, segundo António Pinto de Abreu, um dos administradores do Banco Central, não há razões para “pânico”, dado que os fundamentos da economia, ou seja, os aspectos basilares em que se suporta a confiança dos agentes económicos no crescimento da economia e na estabilidade do sistema financeiro, não se encontram ameaçados.

“Os dados de que dispomos continuam a dar uma situação favorável para Moçambique”, entende de Abreu.

Mas a verdade é que, só em Outubro passado, o Metical teve uma depreciação de cerca de 8,0 porcento, e uma derrapagem acumulada de 42 porcento. Esta quinta--feira, o Metical era transaccionado a pouco mais de 28 mil meticais/Dólar no câmbio oficial e chegava a 29 mil noutras praças fora do controlo do Banco Central.

Operadores económicos acreditam que a moeda nacional deverá romper a barreira psicológica dos 30 mil meticais nos próximos dias.

Quem está a esfregar as mãos de contentamento são os funcionários que têm os seus soldos indexados em dólares e exportadores que deverão ver os seus produtos mais competitivos no mercado internacional, tudo a custa de um Metical penoso.

Razões da depreciação Num encontro, esta quarta-feira, com a imprensa nacional e estrangeira baseada em Maputo, António

Pinto de Abreu precisou que o risco da subida dos preços de petróleo no mercado internacional para uma economia como a de Moçambique foi o que determinou a actual derrapagem do Metical.

É que, segundo de Abreu, os agentes económicos anteciparam a aquisição de divisas para poderem competir “e isto pressiona o mercado cambial”, frisou.

Por outro lado, de Abreu salientou que os exportadores preferiram não se desfazerem das suas receitas, na expectativa de ter um preço melhor.

“Como foram dissipadas estas tendências acreditamos que eles vão mudar de atitude”, disse.A pressão por causa dos contratos assinados pelos importadores dos combustíveis numa altura em que

o preço do barril de petróleo estava alto concorreu, segundo de Abreu, para pressionar o mercado cambial.Aquele quadro sénior do BM apontou ainda o factor sazonalidade, que se resume no facto de, por estes

períodos, ser normal uma maior pressão no mercado cambial, pelo facto dos importadores terem a tendência de constituírem stocks por causa da quadra festiva.

“Esta sazonalidade acontece numa altura em que há outros factores especiais”, destacou.A estiagem, que está a abalar parte do País, fez com que o País importasse produtos que, em tempo

normal, poderiam ter sido produzidos localmente.MCI mais activo

Tornar o Mercado Cambial Interbancário (MCI) mais activo e flexível é uma das principais medidas tomadas pelo Banco Central para enfrentar a contínua depreciação da divisa moçambicana.

No tocante aos combustíveis, de Abreu indicou que, como o BM é conselheiro económico do Governo, a sua instituição está a trabalhar com o Executivo no sentido de aprimorar formas de aquisição do mesmo.

“Neste momento, estamos a respirar de alívio quando assistimos os preços de crude no mercado internacional a trilharem uma tendência de queda”, destacou.

Gestão da política cambial deve ser prudenteEm comentários ao SAVANA sobre o actual comportamento do Metical, o macroeconomista Dipac Jaiantilal considerou que a autoridade monetária deve enveredar por uma aplicação mais prudente da política cambial e por um comportamento mais pro-activo no domínio da informação e gestão de

Page 6: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

expectativas do que aquele que tem havido até agora, de modo a reduzir a grande volatilidade que se tem verificado no mercado cambial.

Um número considerado de analistas económicos que seguem de perto o desempenho do Banco Central en-

tendem que as autoridades monetárias pecam por terem uma atitude reactiva e não preventiva, o que, para eles, não permitem gerir devida e atempadamente as expectativas.     

Este é também o pensamento de Jaiantilal, um dos poucos especialistas em moeda em Moçambique, que defende que se as autoridades monetárias querem evitar este tipo de choques devem “agir na altura certa”.   

Factores internos No entender de Jaiantilal, as incertezas ligadas a causas internas explicam melhor a actual depreciação do

Metical, mais do que incertezas que têm a ver com situações externas, como é o caso do preço do petróleo no mercado internacional.

“São expectativas ligadas a fenómenos internos, mais do que os factores externos que podem explicar esta situação”, advoga.

Meticalização da economia O discurso sobre a “meticalização” da economia moçambicana, até aqui fortemente dolarizada, feito

recentemente poderá, segundo Jaiantilal, ter assustado alguns agentes económicos e financeiros. “Tem de haver uma melhor explicação sobre o que será isso na prática, e qual é o significado concreto disso

no valor dos activos que são detidos pelos mesmos. Caso contrário, podem registar-se comportamentos defensivos indesejados, mas naturais”, salienta. 

O eventual fraco entendimento da proposta lei de supressão dos três zeros ao Metical pode ser igualmente uma incerteza interna que, de acordo com o economista, poderá estar a enervar o mercado e contribuir para a actual derrapagem do Metical.

“É preciso que esta situação seja bem entendida porque incertezas e expectativas podem ter implicações reais na economia.”

Por outro lado, a Balança Comercial de bens e serviços é e continuará deficitária por mais alguns anos, e, ao contrário de algumas interpretações, ainda não se atingiu o ponto em que a moeda corre o risco de se apreciar com efeitos nefastos — a chamada Dutch Desease.

Jaiantilal salientou que o Banco de Moçambique (BM) tem estado a importar, anualmente, 500 milhões de dó-lares em notas vivas, o que, segundo o economista, é muito para um país como Moçambique.

“Isto leva-nos a crer que há procura excessiva de dólares em notas, que deve estar relacionada com acti-vidades pouco normais, fuga de capitais, ou mesmo operações que devem estar fora do controlo do próprio BM ligadas à actividades menos lícitas”, disse.

  Prosseguiu salientando que estas operações mostram igualmente que não se pode flexibilizar totalmente o Mercado Cambial Interbancário (MCI) sem antes conhecer e controlar devidamente estes fluxos.

“Inevitavelmente, isso vai levar a que a procura continue a registar aumentos e não vai ser suficiente para manter o valor do Metical, por mais dinheiro que se injecte no mercado”, entende.

Jaiantilal, que é igualmente docente de macro- -economia na Faculdade de Economia da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), é da opinião de que é praticamente inexistente a aplicação da lei de branqueamento de capitais em Moçambique.

Inflação e depreciação do Metical Para Jaiantilal, a actual depreciação da divisa Moçambicana, pela sua magnitude, vai ter implicações no

comportamento da inflação. Em 2005, o Governo prevê uma inflação anual em torno dos 8,0 porcento.Segundo o macro-economista, o cenário mostra que esta meta poderá ser ultrapassada ligeiramente, e, se a

situação não for controlada, o nível da inflação homóloga no princípio do próximo ano poderá aproximar-se dos dois dígitos.

No entanto, Pinto de Abreu defende que os dados económicos na posse do Banco Central mostram que a situação é favorável para Moçambique.

“Os dados indicam que é possível alcançar um crescimento do PIB entre os 7 e 8 porcento previamente defini-dos pelo Governo”, disse.

Para fundamentar a tese de uma “situação favorável”, de Abreu advogou que pelo décimo mês consecutivo Moçambique tem uma inflação acumulada abaixo dos níveis de 2004 e anual também abaixo da registada em idêntico período do ano passado.

Extracção de madeira

Page 7: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

O que faz o Fundo de Fomento Agrário com as taxas?

Por Rafael Bié

Quem visita o interior das províncias da Zambézia e Sofala é confrontado com uma exploração intensiva de madeira, mas sem que isso represente um benefício para as comunidades locais. São toneladas métricas que saem todos os dias.

As comunidades assistem à saída da madeira e a única coisa que conseguem obter é um empregozito inseguro a troco de algumas migalhas.

As escolas construídas a pau e pique e cobertas de capim — nestas áreas visitadas pela nossa reportagem há semanas — não têm carteiras.

O director da Escola de Nhanzuazua, no posto administrativo de Subué, em Maríngwè, província de Sofala, lamentava o facto de a madeira estar a sair, “mas os miúdos a sentarem no chão”.

Obrigação moral“Eles tiram madeira, mas nem sequer temos carteiras nas nossas escolas”, diz João Jone João, director da escola.

Nas zonas por nós visitadas não existem furos de água como também não há centros de saúde.Um e outro madeireiro coloca para as comunidades uma escola ou um furo de água. É apenas uma questão de

obrigação moral e não legal, ou seja, os madeireiros não são obrigados por lei a colocar nas áreas de onde tiram a madeira qualquer infra-estrutura.

Alguns madeireiros, quando questionados pelas populações sobre o facto de estarem a retirar madeira, mas sem que as comunidades recebam em troca algum benefício, dizem sentir-se embaraçados.

Um madeireiro, que pediu anonimato, disse ao SAVANA que “eu não sei porque é que pago ao Governo e as popu-lações vêm nos exigir que coloquemos infra-estruturas”.

“Eu pago, mas as populações não sabem que eu pago”, disse o madeireiro e acrescentou: “Estou aqui há mais de dez anos nas áreas de madeiras e já paguei muitos milhares de dólares, mas na minha zona (concessão) nunca vi o Go-verno a colocar lá uma única benfeitoria”.

“Afinal para onde é que vai o dinheiro que nós, madeireiros, pagamos?”, questiona a fonte.

O que a lei prevêO Decreto Nº. 12/2002 de 6 de Junho, que aprova o Regulamento da Lei nº. 10/99, de 7 de Julho (Lei de Florestas e

Fauna Bravia), tem um capítulo que se refere aos benefícios para as comunidades que vivem nas zonas de onde é retirada a madeira.

O artigo 102 do referido Decreto refere no capítulo “Benefícios para as comunidades locais” o seguinte: a) “Vinte porcento de qualquer taxa de exploração florestal ou faunística destinam-se ao benefício das comunidades locais da área onde foram extraídos os recursos (madeira).”

Também há uma outra taxa paga para o reflorestamento nas áreas de onde sai a madeira. Em todas as áreas por nós visitadas não vimos nenhum sinal de que se esteja a fazer reflorestamento. Um madeireiro diz que “não existe nenhuma comunidade que se beneficia com a saída da madeira”.

“As taxas da exploração da madeira têm estado a aumentar, mas as populações não se beneficiam disso.”“É verdade que se deve apoiar as comunidades, mas o mais importante é que se aplique a Lei. A Lei é clara, 20

porcento daquilo que nós, os madeireiros, pagamos deve ser usado para construir infra-estruturas”, disse uma fonte próxima da associação dos madeireiros.

Estima-se que só em taxas o Estado arrecada por ano, na província de Sofala, cerca de 12 biliões de meticais.Em 1998, por força do Decreto 38/98 de 18 de Agosto, foram fixadas novas taxas de exploração florestal, desactuali -

zadas desde 1965.

Licenças e quotas de explo ração Os operadores florestais, madeireiros em regime de licença simples e concessionários florestais, pagam anualmente

as taxas fixadas pelo Ministério de Agricultura mediante licenças cujo preço é estabelecido por cada metro cúbico de madeira cuja produção é autorizada.

O Decreto 38/98 fixou em 65.000 (sessenta e cinco mil) meticais o preço do metro cúbico para as licenças de espécies florestais de primeira classe e em cento e cinco mil meticais o preço do metro cúbico para as licenças de espécies florestais de madeira preciosa.

As taxas por licenças de espécies florestais registaram uma nova subida a partir de Junho de 2002, com a entrada em vigor do regulamento da lei de Florestas e Fauna Bravia, Decreto 12/2002.

A partir de 2002, as licenças para espécies de primeira classe passaram de 65.000 Mt a 500.000 meticais, registando uma subida de 769,2 porcento. Os madeireiros consideram que “isto é totalmente insustentável para o sector florestal”.

“Isto obriga a que muitos madeireiros desistam”, disse um ex-madeireiro.“Como se não bastasse, o novo regulamento florestal fixou em dois milhões de meticais o valor de cada metro cúbico

para as licenças de madeira preciosa, que sofreram uma subida de mil novecentos cinco porcento sobre o valor anterior-mente estabelecido”, acrescenta a fonte que pede anonimato.

Page 8: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Com estas taxas, os madeireiros dizem que o Ministério da Agricultura, instituição que cobra as licenças florestais através do Fundo de Fomento Agrário (FFA), passou a ser o primeiro beneficiário da exploração florestal, “pois, de facto, não tem que enfrentar os custos de produção”.

Aparentemente, o agravamento das taxas tinha o intuito de colectar mais apoios para as comunidades locais, onde é processada a exploração florestal.

“Efectivamente, para evitar manipulações dos operadores, o Ministério de Agricultura armou-se em juiz de paz, com-prometendo-se a distribuir os 20 porcento do valor total das licenças entre as comunidades locais, o que nunca realizou desde 2002”, diz um investidor estrangeiro do sector igualmente sob anonimato.

“Isto é preocupante para nós que temos que pagar estas taxas e ainda temos que enfrentar as reclamações das comunidades que exigem aos madeireiros os valores que nós já pagamos ao Ministério de Agricultura”, diz.

Responsabilidade da Agri cultura A situação alcança níveis “insustentáveis na província de Sofala, donde muitos operadores florestais que pagaram

religiosamente os valores das licenças, os fundos destinados às populações em 2004 foram impedidos de aceder à produção em 2005, alegadamente por não terem” cumprido com as promessas realizadas às comunidades. Isto parece uma tentativa por parte do Governo provincial de atirar areia aos olhos e confundir a opinião pública, por ser o Estado e não os operadores, quem não aplica os fundos depositados a favor das comunidades como reza a lei”.

Entretanto, o Ministério da Agricultura tem a sua versão sobre os 20 porcento. Eurico Cruz, da Direcção Nacional de Florestas e Fauna Bravia no Ministério da Agricultura, explica: “Os 20 porcento

é o que o Estado dá às comunidades e não é o que os madeireiros dão àquelas”. Como decorre o processo, quisemos saber. “O dinheiro pago pelos madeireiros é depositado nos cofres do Estado e

as Direcções Provinciais de Agricultura (DPA”s) deverão requisitar o dinheiro para a conta-comunidade”, explica Cruz. Este refere que contas há que foram abertas e que as DPAs pedem às finanças para que estas depositem dinheiro

nessas contas. Explica: “As comunidades têm que estar organizadas em comités ou associações locais, têm que ter uma conta

bancária. Uma vez tendo esta conta, o dinheiro das DPA’s que tem a ver com a exploração de madeira naquelas comuni-dades é que é canalisado àquelas contas das comunidades”.

O dinheiro, segundo a fonte, não chega ainda às comunidades, porque estas não estão organizadas. Para solução, as DPA’s procuram parcerias com organizações não-governamentais de modo que estas ajudem as

comunidades na abertura de contas.

RESUMO SEMANAL

Maputo aos 118 anosMaputo comemorou, ontem, 10 de Novembro, 118 anos desde a sua elevação ao estatuto de cidade.

Uma Sessão Cultural de Gala na quarta-feira e a deposição de flores na Praça dos Heróis, na manhã de ontem, quinta-feira, marcaram oficialmente a efeméride. Para uns Maputo nunca deixou de ser Kanpfumo, em outros tempos já foi Lourenço Marques.

Hoje, entre a zona alta com sumptuosas mansões e ambientes turísticos ditos cosmopolitas e a histórica e moribunda zona baixa, a capital do país perdeu o glamour de Cidade das Acácias e tresanda a lixo. Dias antes, o actual presidente do Município de Maputo, Eneas Comiche, apresentou um plano de desenvolvimento que visa reestruturar e requalificá-la para o futuro, para a modernidade.

MISAU e FDC juntos na vacinação O Ministério da Saúde (MISAU) e a Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC) assinaram, na

manhã de ontem, um memorando de entendimento. O mesmo permitirá a consolidação do programa de logística de distribuição de vacinas de apoio ao Programa Alargado de Vacinação nas províncias de Cabo Delgado e Nampula. Participaram no acordo, para além do MISAU e FDC, Village Reach (baseado nos Estados Unidos da América), Governo da Holanda e a empresa VidaGás.

Angolanos comemoram 30 anos de independência

A República de Angola comemora hoje, sexta-feira, 11 de Novembro, o 30º aniversário da sua independência. No âmbito das festividades, os angolanos em Moçambique inauguraram, na passada terça-feira, no Centro de Estudos Brasileiros, uma exposição fotográfica alusiva à data.

Guia de compras em Maputo Um guia de compras e lazer denominado “Maputo, o Bazar da Cidade” foi ontem lançado em Maputo. Portátil,

o guia é constituído por 100 páginas de formato A5. A directiva é da iniciativa de uma firma denominada Rodam Design. O lançamento do guia inseriu-se nas efemérides dos 118 anos da cidade de Maputo, que se assinala no dia 10 de Novembro de cada ano.

Page 9: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Distrito como Polo de Desenvolvimento A Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC) e o Grupo Moçambicano da Dívida (GMD)

organizaram, na passada quarta-feira, um debate sobre o lema “Implicações do Processo de Descentralização do Poder Para o Alcance da Tese: Distrito como Polo de Desenvolvimento”.

O evento decorreu no Instituto de Formação das Telecomunicações de Moçambique em Maputo.

Mundo celebra Dia da Ciência Celebrou-se ontem, 10 de Novembro, o Dia Internacional da Ciência. Esta data foi instituída pela UNESCO

visando dar maior visibilidade à ciência e sublinhar a sua importância para o desenvolvimento da humanidade. A celebração para este ano está consagrada à Física.

Vigília Nacional da Juventude O Conselho Nacional da Juventude (CNJ), em parceria com o Conselho Cristão de Moçambique, Conselho

Islâmico e Aliança Inter-Religiosa para Advocacia e Desenvolvimento Social, organiza uma Vigília Nacional da Juventude. A cerimónia decorre de 30 de Novembro a 1 de Dezembro, no pavilhão da Maxaquene, em Maputo, sob o lema “Uma Só Juventude, Uma Só Fé e Uma Só Esperança”.

OPINIAOEDITORIAL

Maputo aos 118No momento em que a cidade de Maputo completa o seu 118º aniversário, talvez faça sentido pararmos

um pouco para reflectirmos sobre o tipo de cidade que temos e aquilo que pretendemos que a nossa capital seja.

A beleza arquitectónica de Maputo é alvo de muitos comentários elogiosos que temos recebido de muitas pessoas que nos visitam de fora do País; uma cidade que deixa muitas das suas congéneres do nosso continente com certa inveja.

Mas esta faceta de brilho da cidade fica completamente ofuscada pelo estado de desorganização, de anarquia e quase abandono em que a capital moçambicana se encontra. Muito embora se deva reconhecer que com a actual administração de Eneas Comiche alguns exageros do passado já não passam mais despercebidos.

A cidade continua ainda muito longe daquilo que muitos de nós desejaríamos que ela fosse. Um visitante dizia o seguinte: “Vocês (moçambicanos) têm uma bela capital. Só se pintassem os vossos prédios…”.

Mas há muito mais. É que alguns desses prédios, de tanto abuso por hábitos rurais translocados para um meio urbano por parte dos seus próprios habitantes, perante uma impunidade virada cumplicidade da parte das autoridades, estão hoje num estado de degradação que deve ser deplorável para qualquer mente sã.

O lixo, esse velho e pereno problema, continua sem nenhuma solução que se possa idealizar nos tempos mais próximos.

As estradas esburacadas, os passeios totalmente quebrados, os semáforos envolvidos numa aparente campanha de poupança de energia, e a contínua ocupação desregrada e anárquica do espaço municipal continuam a ser algumas das preocupações dos residentes desta cidade.

Apesar de promessas que temporariamente terão dado espaço para o optimismo durante a campanha eleitoral de 2003, as coisas geralmente continuam na mesma situação.

Perante os nossos protestos, a resposta? A mesma de sempre: não há dinheiro, o dinheiro não chega. Como se algum dia o dinheiro vai chegar para todas as nossas necessidades.

Para justificar as grandes montanhas de lixo que co-habitam a cidade connosco, os responsáveis municipais vão dizendo, com muita naturalidade e incredulidade, que as contribuições dos residentes, através da taxa de lixo cobrada nas facturas de electricidade, não são suficientes para cobrir as despesas de recolha destes resíduos sólidos.

Oblívios que devem estar, certamente, do facto de que essas contribuições são isso mesmo; contribuições cuja função é apenas suplementar aquilo que devem ser os recursos legalmente instituídos para a gestão dos assuntos do município.

Nunca foi ideia de que essas contribuições fossem resolver a totalidade das necessidades do município, e por isso é absurdo que os dirigentes municipais hoje venham a público justificar a sua incapacidade pelo facto das taxas cobradas aos munícipes não serem suficientes para as suas actividades.

Page 10: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

O município deve ter outras fontes de receitas, para além dos recursos que recebe do fundo de compensação autárquica, que ou não estão a ser devidamente exploradas ou se estão, as receitas estão a ser mal aplicadas.

Das autoridades municipais não ouvimos falar do enorme potencial que durante a campanha eleitoral se dizia que representavam as taxas diárias cobradas nos diversos mercados da cidade.

Tão menos dos sanitários públicos que se prometia que seriam erguidos para evitar que os citadinos libertassem o seu ácido úrico em lugares públicos.

Seria errado concluir que todos os problemas que Maputo enfrenta são produto de incompetência da sua direcção. Eneas Comiche pode estar rodeado de lenha seca, resultado de alguns compromissos partidários que lhe poderão ter sido impostos, mas a incompetência não é a sua marca.

O que pode estar a acontecer pode ser resultado de todo um sistema em que, independentemente do nível de competência de um indivíduo, não existem condições objectivas para que essa competência brilhe.

Este é um sistema onde perfilham compromissos de variada índole e níveis, onde decisões colectivas e lógicas esbarram sempre com interesses políticos que não são de um, dois ou três, mas de muitos grupos, cada um com as suas nefastas ligações, cuja acção é tornar todo o sistema desfuncional. Nesse ambiente vai andando Maputo, com as suas barracas erguidas em locais impróprios, mas para a remoção das quais ninguém tem coragem. Não se tem coragem precisamente por tudo o que foi dito neste texto. É só fazer um inventário e ver quem são os donos das bancas nessas barracas.

Atalhe de Foice Por Machado da Graça

A floresta e as árvoresA senhora Primeira Ministra foi ao Parlamento responder às perguntas dos senhores deputados. E usou o

velho subterfúgio de esconder algumas árvores, misturando-as com a floresta.Fez isso como resposta a quem lhe perguntava quando é que a Assembleia da República poderia ter

conhecimento dos resultados dos inquéritos e auditorias a entidades como o INSS ou o Ministério do Interior.Disse Luisa Diogo que o governo não pode estar a levar ao parlamento os resultados de todos os inquéritos e

auditorias que se fazem no país. E nisso estou perfeitamente de acordo.A questão é, no entanto, totalmente outra. O que os deputados queriam não era o resultado de todos os

inquéritos e auditorias, mas sim os resultados de um determinado número, claramente identificados.E se é verdade que não é possivel levar todos os resultados à Assembleia, não parece nada dificil levar

aqueles que os senhores deputados pediram.Ninguém pediu a floresta, dra Luisa Dioga. Foram pedidas só algumas árvores. Poucas mas escolhidas.Mas o mais preocupante não é o facto de a Primeira Ministra ir ao Parlamento fazer jogos de palavras. O mais

preocupante é que esse jogo de palavras foi feito para evitar que o governo apresentasse publicamente resultados de inquéritos e auditorias que a sociedade moçambicana quer conhecer. Tem o direito de conhecer.

O mais preocupante é que o jogo de palavras da senhora Primeira Ministra parece significar que o governo não está preparado para divulgar esses resultados. Parece significar que o governo vai abafar, vai esconder esses resultados.

Se as minhas suspeitas se confirmarem, mais uma vez o manto pesado do silêncio cúmplice vai baixar sobre situações escandalosas envolvendo altos quadros do governo e do partido Frelimo.

E isso acontece hoje, como acontecia ontem, no tal tempo do deixa-andar.Qual é a diferença, então. Ao que me parece, nenhuma.A Força da Mudança nada mudou. A montanha nem sequer um rato pariu. Nem uma barata. Talvez uma

formiga, e das mais pequenas...O Presidente da República diz aos senhores magistrados que a justiça deve ser célere para o povo acreditar

nela. Pelo seu lado a Ministra da Justiça diz que os processos têm que ser lentos para evitar que os criminosos sejam absolvidos no tribunal. Mas, ao fim das contas, a verdade é que nenhum processo, no âmbito do combate à corrupção, anda para a frente. Nem um só, para amostra.

E isso só pode significar que não há vontade política de que as coisas andem, por muito que os discursos digam o contrário. Não será pelas palavras que a História julgará os dirigentes de hoje. Será pelos seus actos. Ou pela falta deles.

Page 11: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Divulgar os resultados dos inquéritos e auditorias significaria, muito provavelmente, ter que abrir processos criminais contra as pessoas que estavam à frente daquelas instituições onde foram cometidos crimes e desmandos.

E não me parece que o governo esteja interessado nisso. Na melhor das hipóteses Armando Guebuza quer fazer a sua omolete sem ter que quebrar alguns ovos. O que, qualquer cozinheiro lhe pode explicar, não é possivel.

E, enquanto ele andar a tentar encontrar maneira de fazer isso, o resultado é que não temos omolete. Ao fim de cerca de um ano continuamos à espera da omolete prometida mas nada dá a entender que ela esteja para breve. E a mudança que houve de cozinheira para cozinheiro só veio atrasar mais as coisas. Se é que não veio pôr-lhes, simplesmente, o ponto final.

Depois das promessas da campanha e dos discursos do inicio do mandato, tudo voltou ao mesmo.Business as usual dizem os ingleses...

Os Demais Sina!sPor Afonso dos Santos

Os aromas e as mãosOs aromas e as mãos assinaladas, /Que nesta oriental praia africana /E nas terras desde há muito já

lavradas, /Ajudam a evitar a mente insana, /Sobre isso escreverei com toda a arte, /Se o meu ínfimo engenho me der sorte.

Estes são os versos iniciais dum livro chamado “Os Luisíadas”, e que recebeu esse título a partir do nome do seu autor.

Alto aí! O que é que se passa aqui? Parece que tudo isto é uma grande confusão. Ou talvez não! Isto não é mais do que um exemplo virtual daquilo que poderia vir a ser, num futuro não muito distante, o saber

internáutico, em substituição do saber adquirido através dos livros, esses objectos que têm aromas, e que se transformam, por efeito das marcas - ou dos sina!s - que as mãos neles imprimem. Por isso um livro, tal como um corpo com os seus sulcos, tem sempre uma história nele inscrita, para além da história que dentro dele vem escrita.

Entretanto, há quem pense que os livros de papel são objectos em vias de extinção, e - “muito em breve”, dizem eles - serão substituídos pelo livro electrónico. Isso pressupõe que, “muito em breve”, em todas as aldeias e aglomerados populacionais haverá electricidade, e que, além disso, haverá, lá, computadores ao alcance de todos; e que as crianças, no ensino primário, assim como os adultos não alfabetizados, passarão a aprender a ler em computadores.

Se não é esse o pressuposto, então está por detrás disto uma outra ideia profundamente maligna, a ideia de que a espécie humana passará a estar dividida em duas castas: uma que é a casta dos seres pensantes e tecnocratas; a outra, a casta dos seres executantes e primitivos, cuja função é apenas a de produzirem os bens materiais para o bem-estar dos predestinados.

Assim se vê que, apesar de terem acesso à internet, estes intelectuais virtuais têm uma visão do mundo muito limitada, já que ignoram uma vasta dimensão da realidade, que é a produção dos bens materiais; mas jamais as tecnologias de informação poderão vir a produzir arroz, tomate, milho, mandioca ou algodão. Nem bicicleta, nem automóvel, nem avião.

A internet, se, por um lado, é uma preciosa fonte de informação, por outro lado ela é também uma grande lixeira. É um espaço de navegação enxameado de piratas, pois qualquer indivíduo, sem a mínima competência reconhecida por instituições científicas ou culturais, pode inscrever nele as suas efabulações erráticas, medíocres e plagiárias. E qualquer navegante que, sem bússola, por esses mares se atreva, cada vez mais se embrulhará na treva. Pois é na bússola é que está o busílis.

Parece que na mente de algumas pessoas predomina a ideia de que fazer referência à internet é uma demonstração de modernismo e de garantia científica.

No que diz respeito ao modernismo, ele fica logo desmascarado, quando as pessoas nem são capazes de referir correctamente a fonte de algum texto, indicando apenas que é da internet. Ora, isso é equivalente a fazer uma citação dum livro, e, sem referir nem o nome do autor, nem o título do livro, indicar apenas que a fonte é... a biblioteca. Qualquer texto consultado na internet tem sempre um autor e um título e foi recolhido num determinado sítio que deve obrigatoriamente ser referido (por exemplo: www.resistir.info).

Quanto à garantia científica, ela fica logo desacreditada, quando se observa a quantidade de erros de ortografia e de sintaxe que figuram no texto. Se a pessoa é tão negligente e inepta no uso do instrumento de comunicação do conhecimento – que é a língua – que crédito podem merecer as suas ideias, ou os seus conhecimentos supostamente científicos?

Page 12: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Há também a questão do plágio (por vezes designado copy and past), que consiste em copiar um texto e fingir que ele é da sua autoria. Mas é muito fácil detectar isso: primeiro, porque, ao exigir que a fonte bibliográfica da internet seja indicada na íntegra, pode-se ir lá verificar se há plágio; segundo, porque a quantidade de erros presente em muitos desses textos permite logo supor donde vêm; terceiro, porque a linguagem é tão enfatuadamente académica, que basta pedir ao plagiador que explique o que lá está escrito, que ele não é capaz.

Um outro motivo contribui para que a internet seja tão altamente apreciada: é por ser muito mais fácil fazer uns cliques e carregar numas teclas do que folhear exaustivamente um livro. Essa busca do que é fácil é a atitude típica daqueles que pretendem realizar a sua formação cultural ou científica substituindo o estudo duma bibliografia, que é sempre vasta e desenvolvida, pela leitura rápida de pequenos textos elementares, de três ou quatro páginas.

Aliás, parece estar na moda uma nova função, quando se trata de actividades de estudo e de aprendizagem: a função de facilitador. Acontece que a única forma de facilitar a aquisição dos conhecimentos – que é sempre árdua e lenta - consiste em reduzir o volume e a profundidade dos mesmos, criando um saber completamente superficial, que serve apenas para formar cidadãos sem pensamento próprio e crítico; basta que sejam bons consumidores de ideias feitas e de mercadorias mais ou menos supérfluas. Em suma, cidadãos desprovidos da sensibilidade para os prazeres dos aromas e das mãos.

Há, por fim, uma suprema essencialidade: de ambas as mãos navegando nos aromas dum corpo, floresce a sensualidade.

Missa PagãPor Fernando Manuel

Half jackOs engenhosos cultores do terrível vício de consumir aguardente caseira, de melaço ou solução de

bateria, deram-lhe um nome bonito, sugestivo e por demais poderoso: half jack!O half jack é uma medida de um quarto de litro de aguardente de primeira - tem de ser de primeira

(sndere) - senão nada - que, mormalmente, se bebe sem companhia, contriamente ao que é norma para as outras medidas, sejam de primeira, segunda ou terceira.

Nos quintais da zona urbana da cidade de Maputo, um half jack custa dois contos. Na periferia, um conto e meio.

Pois bem: naquela madrugada de sexta para sábado choveram canivetes: cats and dogs. A chuva caia em catadupas, as gotas de água feitas projécteis que ambatiam no asfalto e no cimento

dos passeios com um impacto seco, metálico e lívido de ira.Tomado de insónias e atraído pela grandeza do espectáculo, enfiei a minha velha camisola de algodão e

fui à varanda ver: nem carro, nem peóes, nem bebêdos tresnoitados, nem prostitutas crepusculares, nem meninos da rua: apenas o silêncio gritado da chuva a cair.

Por volta das seis da manhã, a chuva abrandou.Continuava, porém, o impetuoso rio das suas águas descendo avenida abaixo, berma a berma, rumo ao

subúrbio das Lagoas, à Mafalala, ao Stala Mati. Senti-me deprimido, imaginando o trágico e cíclico destino dos milhres de seres iguais a mim, àquela hora, naqueles bairros.

Iguais a mim não propriamente: eu estava no resguardo da minha varanda de primeiro andar, agasalhado, se desse uma volta iria para o aconchego das minhas mantas, o halo quente da minha consorte, um chá, em querendo, o What a Wonderful World de Louis Armstrong, em querendo!

Voltei em pontas dos pés para o quarto, ela ronronava auave e compassadamente, meti-me num par de calças de flanela pretas, botas, a camisola seria a mesma.,abri a porta e fui, quase a correr, para as Bananeiras.

Bananeiras é o nome de um sub bairro que fica entalado entre as avenidas Acordos de Lusaka, Marien Ngouabi e a rua Milagre Mabote.

É uma espécie de zona tampáo, anexamente com a defunta e de má memória Praça da Paz.A água chegava-me aos joelhos. A terra, barrenta e saturada de água que já não pode, de há muito, absorver, escorregava sob os meus

pés. Tinha que caminhar devagar, os pés o mais fastados possível para aumentar o eixo do equilíbrio.À volta, o espectáculo miserável do destino miserável de centenas de famílias entregues à tarefa ingente

e inglória de acarretar em latas, em bidons sem o tampo, em jarras de plástico, a água que se tinha infiltrado para dentro do casebres.O quintal dela era uma lagoa de águas barrentas, suadas.

Page 13: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Cheguei de sorriso triste, mas ela estava vivaz e firme. Tinha que transmitir confiança aos seus clientes, confortá-los. Estavam sentados sobre grandes ou pequenos blocos de pedra, em pequenos grupos, como sempre, mas em silêncio, tiritando, contrariamente ao que era norma, no meio de cada grupo uma garrafa de exportação ou média, o maquinista a distribuir o álcool, que se bebia pelo mesmo copo, de plástico que ia passndo da boca para o maquinista, das mãos deste, depois de cheio, para o consumidor seguinte.

Ninguém me olhou. Ali ninguem presta atenção a ninguém.De pé, disse-lhe: “ vô Matilde: dá-me lá um hâfo jâck “.- “ Certemente, filho. Não te sentas ? A água está a correr, ainda és capaz de cair “.A Matilde, com mais anos de cheias do que o Sahara de seca, tinha, ao longo do tempo, montado zonas

altas nos cantos do quintal com recurso a entulho de origem diversa. Era nessas ilhas que se acomodavam os seus clientes naquela manhã de borrasca.

Embuti uma taça de hâfo jack, de pé e senti como que um esticão provocado por uma elevação repentina do corpo, por efeito de um gancho sob a nuca, enfiado numa roldana. A coluna distendeu-se-me, os músculos ficaram tensos como um arco com a flecha pronta a varrer o ar. Embuti o segundo e tudo voltou gradualmente ao estado de relaxamento total.

Half jack!...Circunvaguei então o olhar pelo quintal: velhos aposentados que à noite fazem de guardas na cidade de

cimento para disfarçar o complexo de inutilidade social, estivadores na eterna espera do barco das Américas a caminho das Ásias, jovens desactivados da sociedade depois de fazer - ou mesmo antes - o ensino secundário e não caberem no mercado do emprego, velhas e desencantadas viúvas a quem os filhos, com formação superior, renegam por anafabetas e desconhecedoras de como se usa o garfo e a faca à mesa - “ senhor doutor, como está a senhora sua mâe ? “. “Ah! Náo soube? Ela morreu.” - na verdade essa está morrendo a cada momento no quintal da vô Matilde, de cirrose, com doses diárias industriais de tontonto:

- “ Vô Matilde. Dá lá mais um hâfo. Daqui a meia hora tenho que estar na oficina “.Cheguei à oficina, assinei o ponto, arranjei um canto e fui dormir, sonhando chuva!

Espinhos da MicaiaPor Fernando Lima

E agora, Mr. Guebuza?Vi o Presidente no seu regresso de Lisboa e não vinha com aqueles fatos de cores berrantes e

brilhantes dos cartomantes, mágicos e ilusionistas. Mas verdade se diga, o Presidente jogou bem as cartas antes e durante a visita à antiga capital do império. Não foi preciso bater com o sapato em cima da mesa à Krutchev, mas o coelho saiu mesmo da cartola em forma de barragem lá para os lados de Tete.

O Presidente, a quem não são reconhecidos especiais méritos na área das relações internacionais, jogou forte no trunfo cooperação de futuro com Portugal e teve como resposta um verdadeiro poker de ases.

O sorriso do regresso mantinha-se na cerimónia da fundação do antecessor — a que fez questão em comparecer – não fosse ele um vencedor. Ironicamente, outro dos trunfos da era Guebuza jogou--se também na frente externa. A isenção de vistos para a África do Sul, Suazilândia, Botswana, Zâmbia e Tanzânia é daqueles pequenos passos que qualquer cidadão reconhece. No coração e sobretudo no bolso.

O orgulho de Cahora Bassa de volta faz-nos esquecer o aumento do preço dos combustíveis, o seu efeito cascata e a não menos dramática desvalorização do Metical que já vai em 51%, depois da surrealista apreciação pré-eleitoral. A situação agora não deixa de ser menos absurda, uma vez que com tal derrapagem não se compreende que os valores macro--económicos para o crescimento e inflação permaneçam estáveis e com a bênção formal de Bretton Woods.

A energia positiva de Cahora Bassa atira de algum modo para o lado com a agenda interna que desde o Conselho de Ministros alargado voltou a dar sinais de intranquilidade, desgaste e clivagens. Argumentam os entendidos que esse é o preço da transição e que só pode ser resolvido, de algum

Page 14: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

modo, com o congresso do partidão em que o novo timoneiro terá poderes e espaço para dispor melhor as suas peças no xadrez com que se cose a política nacional.

Se é assim e já que é na frente externa que se têm colhido as melhores fruições, porquê não consolidar a “frente angolana”, agora que também somos parceiros na área energética e temos água e electricidade a oferecer à África do Sul, o paraíso que José Eduardo dos Santos não desdenha, mas desconfia.

E depois há o furúnculo zimbabweano. Dá dó ver o desemprego e a ociosidade na Beira, a cidade que respira oposição e deixou de contar com o emprego natural vindo dos serviços prestados ao Zim-babwe. Mais uma vez, é um problema de bolso e votos.

Talvez Mr. Guebuza deva fazer um exercício de agenda com o pragmático homónimo tswana, Festus Mogae, e darem um empurrão à diplomacia punhos de renda de Mbeki.

No fim do dia – e é assim que reza a actual cartilha política – os verdadeiros compromissos são com aqueles que nos elegem e nos dão os votos.

SAVANA NO INFORMALPor Fernando Manuel

Velho é o trapo. Bandeira, portanto...

Ela disse: “Pai, essa conversa tá por demâ convensada. Falando outra coisa, pai”. “Tipo como qual, filha?”“A minha mãe”, pediu-me ela, anelante.Fiquei um eterno segundo em silêncio olhando para a bruma dos seus profundos olhos de menina negra.

Nácar de pele castanha cor de chocolate e respondi-lhe, quase sem interesse.— Eu vivi bem.— Viver bem, pai, é viver sob a bota do colono?— Não!— Então é o quê?. Pai, cê é saudosista.— Não sou saudosista. Tenho é saudades.— Saudades de quê, pai?— Do tempo em que eu andava na escola de meninos pobres, de pais pobres, na escola primária

missionária de São Miguel do Bairro Indígena da Munhuana.— O que é que isso tem de especial?— O que tem de especial não é nada, Filipa.— Então porque é que o pai tá sempre a falar, falar.— Estou a falar, Filipa, porque nesse tempo não havia um abismo tão profundo entre pobres e ricos. Eu

andava na escola primária do Bairro Indígena da Munhuana, não se ria porque passaram polé nomes ilustres como o Juvenal Bucuane, que é agora mestre de obras da Associação dos Escritores de Moçambique, o Eusébio da Silva Ferreira, o Aldino Muianga, o Noel Langa, o Ruy Ngoca. E nós, Filipa, filhos pobres de pais pobres, tínhamos, mesmo assim, no recreio grande de vinte minutos, um sconne e uma garrafa de meio litro de masse, um campo de desporto multifacético, no liceu eu lanchava na mesma cantina escolar onde lanchava a filha do advogado mais famoso e rico de Lourenço Marques, a Helene Ney Ferreira, com a diferença de que ela pagava, porque podia, dois escudos e cinquenta centavos por uma sandes mista de queijo e fiambre enquanto eu pagava um escudo.

Lado a lado, Filipa, na mesma cantina escolar.— Quem cobria a diferença, pai?— Era a cantina escolar.— Significando o quê, isso de cantina?— Significando Estado.— O que é, afinal, pai, Estado?

Page 15: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

— Lá onde o sol se põe significa gente. Gente que trabalha e paga impostos e quer ver o seu dinheiro em coisas boas: passeios limpos, iluminação nas ruas, condutas de lixo sem lixo, pessoas de telemóvel na mão sem medo de serem khuadssissadas, emprego seguro, reforma não compulsiva, mas voluntária, seja por idade ou idade de serviço, uma idade madura digna a vender, para oferecer afecto aos filhos, netos, bisnetos...

— Pai, achas que não temos isso tudo? Não seja tão amargo.— Eu não sou amargo, Filipa. A vida só me tem oferecido fel.— Quando o que nós queremos é mel. Né, pai?— É, Filipa.— Pai: diz-me uma coisa: porque é que a feira nacional está a descambar?— Porque, Filipa, Muecate, em Nampula, não é Nação. É distrito. E nos distritos desta mátria não há

símbolos. Só há gente. A pé ou de moto. Mas sempre de capacete. Já nos chega Montepuez e Mocímboa da Praia.

— Obrigada, pai. Gosto muito das rugas do teu rosto. Fazem-te parecer o que és: um velho sábio.— Bigada, filha: o que eu gosto em ti é a bandeira do teu país: esfarrapada,em queda livre, livre, livre,

livre, livre...

Tribuna do EditorHCB: uma negociação espinhosa, um acordo “histórico”

Em certas ocasiões defendemos, nas páginas deste jornal, que Cahora Bassa era uma questão política, cujo desfecho final dependia de um acordo político entre Moçambique e Portugal, mas muito mais da vontade das autoridades portuguesas de abrir o caminho para o encerramento de um longo dossier colonial.

Esse desfecho, que é o produto de complexas negociações desde que Moçambique se tornou independente há mais de trinta anos, está agora mais próximo do que longe de ser concretizado.

O memorando de entendimento assinado na semana passada em Lisboa, durante a primeira visita do Presidente Armando Guebuza a Portugal, obriga as duas partes a concluírem um acordo final até ao fim deste ano, colocando a Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) firmemente sob controlo do Estado moçambicano.

Por esta transacção, Moçambique pagará a Portugal 700 milhões de dólares, enquanto que a empresa HCB deverá ao Estado português 250 milhões de dólares.

Tornou-se claro, portanto, que, longe de se tratar de uma transacção meramente financeira, como certos cír-culos da opinião pública portuguesa defendiam e continuam a defender, Cahora Bassa era, de facto, um assunto que só os políticos poderiam resolver. Mesmo que para isso Moçambique agora tenha que abrir os cordões à bolsa, e num prazo máximo de 18 meses encontrar os 700 milhões de dólares que irão definitivamente selar o negócio.

O valor total da dívida de Cahora Bassa ao Estado português é de cerca de 2,6 biliões de dólares. Este montante resulta de um empréstimo de cerca de 1,2 bilião de dólares contraído nos anos 60 pelas autoridades portuguesas para a construção da barragem, junto de um consórcio de bancos europeus. A este montante acrescem-se os juros de mora, e ainda os custos de reparação das linhas de transmissão para a estação Apollo, na África do Sul, destruídas durante a guerra em Moçambique.

A liquidação da dívida de Portugal deveria ser feita a partir das receitas que a barragem iria arrecadar com a venda de energia eléctrica à África do Sul, segundo rezava um acordo então assinado entre este país e Portugal.

Portugal só construiu a barragem com a obrigação da África do Sul consumir a sua energia eléctrica a um preço fixo.

Mas com a destruição das linhas de transmissão de energia, a barragem ficou inactiva durante a maior parte do decorrer da guerra em Moçambique. Entretanto, com a entrada de Portugal para a Comunidade Económica Europeia (hoje União Europeia), em 1985, exigia-se que aquele país se libertasse de todas as dívidas que tinha. Isso era para impedir que, com o serviço dessas dívidas, Portugal não pudesse cumprir com as metas que são exigidas a todos os países membros da organização, no que diz respeito aos limites de défice orçamental permi-tido anualmente.

Tendo Portugal liquidado a dívida de Cahora Bassa junto dos seus credores, passava a barragem a ser deve-dora junto do Estado português.

Na lógica financeira, para que assumisse o estatuto de maioritário, Moçambique deveria pagar a Portugal o valor comercial correspondente às acções com que ficaria, qualquer coisa como 2,21 biliões de dólares, para os 85 porcento que agora passará a deter.

Este foi o ponto central das negociações que se arrastaram por todo este período. Não se sabe ao certo quanto é que Moçambique oferecia, mas há indicações de que eram 500 milhões de dólares.

Aparentemente Portugal, hoje com um défice orçamental de cerca de 5 porcento (muito acima do que é exigido ao nível da União Europeia), teria eventualmente aceite baixar o preço para 900 milhões de dólares. Mas isso ainda representava 80 porcento acima do que Moçambique se oferecia a pagar.

Page 16: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Quando todos os sinais indicavam que, com base nas declarações prestadas pelos governantes moçambi-canos e portugueses, só se estava próximo, mas que não seria desta vez que se alcançaria o acordo final, a viragem radical no curso das negociações terá ocorrido durante as conversações mantidas entre o Presidente Armando Guebuza e o Primeiro-Ministro José Sócrates, seguidas de almoço entre as duas delegações, em Sintra, uns quarenta quilómetros fora de Lisboa.

Nessas conversações, Guebuza terá, segundo fontes próximas do encontro, acordado em aumentar a oferta de Moçambique em 200 milhões de dólares, se a parte portuguesa aceitasse reduzir pelo mesmo valor a sua proposta.

Estava selado um acordo que Sócrates classificou de “histórico”. Moçambique terá que pagar o valor acordado em 12 meses a contar da data da assinatura do acordo final, que

se prevê que seja em Dezembro. Com apenas uma ressalva: “Em circunstâncias excepcionais”, diz o memo-rando, este prazo “poderá ser prorrogado por um máximo de seis meses…”.

Mas, ao pedir tal prorrogação, Moçambique terá que ter pago 50 porcento do valor acordado.Com o novo quadro, Portugal fica desvinculado de um acordo tripartido envolvendo também Moçambique e a

África do Sul, no que se refere às modalidades de fornecimento da energia de Cahora Bassa para a África do Sul. Tal pressupõe um novo acordo bilateral entre Moçambique e a África do Sul.

Por outro lado, Moçambique poderá solicitar a Portugal para que este aliene até 5 porcento do seu capital social a novos parceiros indicados pelo Governo de Moçambique. Contudo, uma tal operação deverá estar condicionada a que Moçambique também coloque à venda parte do seu capital.

Um acordo “histórico”, é verdade, em que os ganhos de Portugal foram acautelados por uma cláusula que re-conhece a preferência de empresas portuguesas em futuros projectos energéticos em Moçambique, que serão detalhados em futuras negociações (ver também entrevista com Freitas do Amaral).

Mas para Moçambique, talvez mesmo contra a sua vontade, o acordo poderá significar o compromisso de se avançar primeiro para a construção da Central Norte de Cahora Bassa, antes da projectada barragem de Mpanda Ncua, quarenta quilómetros à jusante, ao longo do rio Zambeze.

O resto ficará a cargo do tempo. Por agora, os cínicos deverão manter-se na defensiva para ver o que o futuro nos traz.

PAÍSDenunciam ex-trabalhadoras saneadas do Externato IlundyReclamar direitos é proibido!— A direcção já foi multada em mais de 100 milhões de meticais por atropelos à Lei de Trabalho

Por Robben Jossai

Em Moçambique, a Lei do Trabalho é considerada bastante protectora do proletariado. No entanto, quatro ex-trabalhadoras do Externato Ilundy vieram ao SAVANA clamar que neste estabelecimento privado de ensino é proibido reclamar pelos seus direitos. Acusam a direcção de Ilídio Madivádua de as ter saneado por terem ousado escrever uma carta em que exigiam a observância de alguns dos seus direitos consagrados na Lei de Trabalho.

Maria Isabel Mboa, Hermínia da Graça Manave, Ana António Chiluvane e Lídia Mazivila João são peremptórias em afirmar que “Não há outra coisa: estamos a ser injustiçadas pelo Externato Ilundy”. A falta de revisão de salários e o não envio das suas contribuições para o Ins tituto Nacional Segurança Social (INSS) são algumas das reclamações das ex-trabalhadoras.

Em resposta, contam as trabalhadoras, Ilídio Madivádua convocou Hermínia Manave para um encontro. Longe de esperar, Manave diz ter sido avisada que iria “chutar latas” alegadamente por ser “agitadora”.

Visita da Inspecção…Após o encontro, Hermínia Manave informou às restantes colegas que tinham assinado a carta que

o director desprezou as suas reivindicações. Acto contínuo, elas recorreram à direcção do Trabalho da Cidade de Maputo, através de uma carta.

Page 17: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Uma equipa de Inspecção deslocou-se ao Externato Ilundy, em Julho do ano em curso, e apurou irregularidades. Dois dias depois, contam as ex- -trabalhadoras do Ilundy, Madivádua convocou um encontro com todos os trabalhadores. Neste, revelam, o director terá dito que estava nos seus planos reduzir algumas micaias que não ajudam o Externato Ilundy, numa indirecta às sindicalistas.

“Nunca quisemos prejudicar o externato nem a ele. Apenas queríamos que observasse a Lei do Trabalho e ele tratou-nos de micaias”, salientam, visivelmente revoltadas.

…Atiradas para o desem prego A 2 de Agosto passado, foram formalmente informadas que o desemprego seria o seu próximo em-

prego. O externato, em cartas remetidas às ex-trabalhadoras, usou deste argumento: “Iremos res-cindir o contrato, unilateralmente, por motivos de reorganização administrativa”.

Quando ainda digeriam o teor das cartas, as ex- -trabalhadoras que subescreveram a reclamação recebem, a 28 de Outubro último, nova correspondência. Assunto: rescisão de contratos a partir de 1 de Novembro corrente.

Outrossim, elas questionam os critérios usados pela administração do externato para calcular o valor das indemnizações: “o dinheiro que vamos receber é pouco”, consideram.

Segundo soube o SAVANA, cada uma daquelas ex-trabalhadoras tem um salário de 1300 mil meticais, 50 contos acima do salário mínimo. “Reclamamos porque queríamos ver as nossas condições melhoradas”, diz Lúcia João.

“Não tenho razões para retaliar”- Diz o Ilídio Madivádua

Ilídio Madivádua, o director daquele estabelecimento de ensino, negou que estivesse a fazer alguma retaliação. “Estaria a retaliar o quê? Não tenho razões para retaliar. Não são só aquelas trabalhadoras que foram dispensadas. São sete, incluindo um motorista”, explica.

Diz que a desvinculação dos 7 trabalhadores está enquadrada na necessidade de tornar a empresa sus-tentável. “Não trabalho com esse tipo de situações. O que eu disse é que há necessidade de reduzir a força de trabalho porque os encarregados de educação perderam a capacidade de pagamento das mensalida-des”, justifica.

Prosseguindo, o director do Externato acrescenta que “se for necessário vamos reduzir ainda mais os trabalhadores até que a empresa seja sustentável”, salienta, frisando que as pessoas estão livres de fazer as suas interpretações. Sobre as indemnizações, Madivádua diz terem sido calculadas na base da Lei.

Madivádua conta-nos que a sua direcção observou, para a desvinculação dos trabalhadores, aspectos: primeiro, o desempenho individual; segundo, comportamento, pontualidade e assiduidade, bem como o nível de relacionamento para com os outros dentro da empresa.

Neste momento, informou, o Externato Ilundy conta com 140 trabalhadores, tendo iniciado a sua activi-dade com apenas cinco trabalhadores, em 1996.

Sobre o pagamento das indemnizações em seis prestações mensais, aquele responsável diz que deve-se ao facto de a empresa não ter disponibilidade financeira que permita o pagamento de uma só vez. “Essa é que foi a razão. Desde Agosto que a escola tem um défice muito grande”, concluiu.

Externato multado em mais de 100 milhõesO inspector-chefe na Direcção do Trabalho na Cidade de Maputo, Alberto Novela, disse esta quarta-feira

ao SAVANA que o caso daquelas trabalhadoras já deu entrada na sua instituição.Segundo Novela, a equipa de Inspecção que trabalhou no Externato Iluny constatou várias

irregularidades como a falta de observância da Lei do Trabalho, o que culminou com uma multa de mais de 100 milhões de meticais.

Entre outras situações, o externato não canalisava as contribuições dos trabalhadores ao INSS, funcionava sem regulamento interno, não tinha seguro colectivo contra acidentes de trabalho para além de ter um estrangeiro que trabalhava sem autorização pela ministra do Trabalho, conforme a lei prevê.

Relativamente às indemnizações, Novela diz que, com base no salário de um milhão e 300 contos, Hermínia Manave, por exemplo, devia receber 11 milhões e 700 mil meticais pelo período de 5 anos de serviço e não os 7 milhões e 800 mil meticais calculados pelo externato. “Se for esse o salário”, observa, Manave tem direito a pelo menos quase três salários mínimos.

Page 18: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Quanto ao pagamento em prestações, aquele responsável deixou claro que “a lei não prevê” essa modalidade, podendo se entrar, no entanto, em acordo entre as partes, o que neste caso não aconteceu. Mais um TPC para o Trabalho, mais uma dor de cabeça para o Ilundy.

No Parque Nacional do LimpopoFurtivos escapam de leão e de leopardo

Por António Elias*

O aumento de efectivos de animais bravios no Parque Nacional do Limpopo desaconselha a continuidade da população humana nas zonas com maior potencial para a multiplicação das diferentes espécies faunísticas, como a bacia do rio Singuedzi, onde se deram os casos em que um caçador furtivo viu um leão escapar da armadilha e ferrá-lo. Outro furtivo teve a sorte de os seus cães afugentarem o leopardo quando o animal também venceu por fúria a armadilha em que estava aprisionado, enquanto o homem se aproximava para dar cabo do animal armadilhado.

Artur Chaúque, natural e residente na aldeia de Machamba, no interior do Parque Nacional do Limpopo, esca-pou da morte, no final de Agosto último, quando procurava abater um leão preso na sua armadilha, para aprovei-tamento de troféus do animal.

Atente-se, no entanto, à justificação fabricada pelo homem, após entregar-se aos fiscais do Parque Nacional do Limpopo, por necessidade de socorro.

Melhor é seguir este insólito nas palavras do próprio furtivo, Artur Chaúque.“Era um domingo, dia 23 de Agosto. Estávamos eu e companheiros meus a pescar no rio Madonce (afluente

do rio Singuedzi). Ia para as cinco da manhã. De repente, vi o meu burro a fugir. Afinal estava a ser perseguido por um leão. Havia mais burros no local. Quando vi aquilo, larguei o fio de pesca para afugentar o leão. Aí, o leão virou-se de imediato contra mim, e atacou-me. Não tentei nenhuma resistência. Acaso é possível lutar contra um bicho como leão?”

De que forma te atacou?Perdi a cabeça antes de sofrer efectivamente qualquer golpe do bicho. Atacou-me ao mesmo tempo. As outras

pessoas que estavam comigo acorreram em meu socorro com gritos para afugentar o leão, mas eu já estava do-minado. Nem me apercebi do barulho que essas pessoas fizeram em meu socorro. Lembro-me somente que, de repente, estava já no chão e o bicho sobre as minhas costas. Penso que foi na sequência do barulho das pessoas que acorreram em meu socorro que o leão fugiu, mas eu já estava inconsciente. Não reconheci se se tratava de macho ou fêmea. Mas não tinha crias. Ao recuperar, vi- -me banhado em sangue.

E depois?Fui transportado de bicicleta para casa, era domingo. Na minha aldeia, não havia nenhum carro. Cheguei ao

hospital (Centro de Saúde de Massingir) no dia seguinte, graças à prontidão dos fiscais do parque, que comunicaram via rádio a sua sede. Veio um carro do parque levar-me ao hospital. Tenho cinco semanas aqui no hospital.

E como se sente agora?Continuo a sentir dores nas partes do corpo em que sofri golpes e ferimentos. Ainda não posso ir para casa.

Tenho que me apresentar todos os dias no hospital para tratamentos. Pedi para sair da enfermaria, porque tenho familiares aqui na vila de Massingir.

À minha chegada ao hospital não conseguia fazer nada. Para entrar no carro foi um problema sério. Estava com muitos ferimentos. Só dias depois recuperei a consciência de tanto sofrimento pelo grande arrepio que a situação me causou.

Por que vão pescar numa zona frequentada por animais ferozes?Na zona em que estavámos a pescar não é habitual aparecerem leões. Tem sido frequente surgirem elefantes.Artur Chaúque diz ter apenas trinta anos (por desconhecer a idade). Tem duas mulheres e oito filhos. Tem

mais de dez cabeças de gado. Mais de 50 caprinos.

Onze anos depois Continuadores em campo de férias

Por Salane Muchanga Mais de 400 crianças dos 10 a 15 anos de idade, representantes de todas as províncias do País, vão participar

entre os próximos dias 1 a 10 de Dezembro num acampamento de férias, que se vai realizar em Maputo.

Page 19: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

O evento, organizado pela Organização Continuadores de Moçambique, está orçado em mais de seis biliões de meticais. A iniciativa visa criar um espaço onde as crianças possam trocar experiências em todos os níveis, destacando-se o cultural e educaional.

“Sendo a nossa missão educar a criança para o seu desenvolvimento são, com o acampamento desejamos criar um espaço onde possamos transmitir a todas as crianças a importância da unidade, solidariedade, amor com o próximo”, disse Beleza Fernandes, secretária-geral da Continuadores.

A iniciativa insere-se nas comemorações do vigésimo aniversário da fundação da organização, assinalado no passado dia 25.

Cada distrito será representado por duas crianças seleccionadas em escolas, núcleos, centros de acolhimento de crianças órfãs e deficientes. As crianças seleccionadas participarão no evento acompanhadas dos seus representantes. A capital do País estará mais representada com um total de dez crianças.

Para participar no evento, a criança deve ser criativa, dinâmica, disciplinada e com bom aproveitamento escolar. Serão também seleccionados os menores que não tenham problemas de saúde e que sejam autorizados pelos pais ou encarregados de educação a participar no acampamento.

Fernandes disse igualmente que, durante os dez dias que as crianças se juntarão em Maputo, para além de fomentar amizade, vão visitar os locais de interesse histórico, cultural e económico do País.

Este é o segundo acampamento nacional de férias a ser realizado no País. O primeiro que também juntou crianças de diferentes classes sociais e zonas de Moçambique realizou-se em 1994.

“Depois da boa experiência que verificámos há sensivelmente 11 anos e passados 20 anos da criação da orga-nização, sentimos, uma vez mais, a necessidade de desenvolver a actividade de campismo por forma a despertar no seio da criança o sentido patriótico e moral para um bom desenvolvimento da sua cultura”, disse a fonte.

A versão do parqueApós um trabalho de investigação por uma equipa de fiscais, apurou-se a falsidade da versão de Artur

Chaúque.O fiscal Viriato Mahule, que liderou a equipa de investigação no local do incidente, conta que o leão encontrou

um cudo armadilhado: “Na tentativa de possuir o cudo, o leão acabou ficando aprisionado numa outra armadilha próxima da do local do cudo. Quando o dono da armadilha se aproximava, o leão conseguiu libertar-se da armadilha e atacou o homem. Este homem e seus companheiros queriam matar o leão aprisionado para se apoderarem de troféus do animal. Essa versão de que o leão ia atacar o burro é completamente falsa. Onde estava o burro não há nenhuma pegada de leão. Depois do sucedido, este homem foi transportado pelos amigos para a aldeia. Ele tem medo de dizer a verdade. Quando voltou à aldeia, viu-se que era necessário informar os fiscais para lhe salvar, levar-lhe ao hospital devido à gravidade dos ferimentos que sofrera. Se não tivesse sido ferido com gravidade teriam sonegado o caso. E provavelmente não teria chegado ao nosso conhecimento. Teriam curado o homem através de meios tradicionais. Contactaram os fiscais por medo de ver o homem perder a vida nas suas mãos. Nós sabemos que há casos de furtivos que eles sonegam”.

Mahule diz que eram dois casais de furtivos: “Eles estavam acampados muito próximo do local do incidente. Pelos sinais deixados no local, depreende-se que permaneceram ali entre três a quarto dias. Deixaram sinais como restos de fogueira e palhotinhas. O local em que haviam montado as armadilhas é um ponto em que os animais vão beber água. Faz tempo que este homem armadilhava animais bravios”.

“Furtivos da aldeia de Artur Chaúque estão revoltados comigo. Dizem que ando a vasculhar os locais em que montam armadilhas, e que os fiscais do parque não trabalham devidamente, por estarem a dificultar a prática de caça. Dizem que eu tenho estado a denunciar aqueles que fazem a caça. Mas respondi-lhes que é precisamente esse o meu trabalho. Vasculhar armadilhas no mato. Tanto eu como todos os outros fiscais queremos que os animais vivam em paz dentro do parque. Não vamos permitir a persistência de caça, seja por qual for o motivo. Onde este homem foi ferido é muito longe da aldeia. Da aldeia para o local do incidente são mais de seis horas de caminha acelerada. Trata-se de um local que tem muitos animais perigosos como leões e leopardos, que caçam as suas presas no local. Eles todos sabem que há ali muitos leões e leopardos.”

Como esse furtivo escapou de um leão?Eu também fiz-lhe essa pergunta. Respondeu-me ter sido graças ao pronto socorro dos seus amigos, que

vieram de imediato afugentar o leão. Ele teve sorte. Não é fácil escapar a um ataque de leão. Eu nasci e vivi sempre nesta zona que hoje faz parte do parque. Nunca acompanhei que alguém saiu vivo debaixo de um leão”. *colaboração

O caso do leopardoO líder da aldeia de Makandezulu, Sebastião Maluleque, relata o caso do homem que foi agredido por um

leopardo, em Junho último: “Foi difícil eu denunciar o caso aos fiscais do parque”, diz o líder local, e prossegue: “Ele teve medo de ir ao hospital, por saber que foi ele quem cometeu a infracção, por ter colocado armadilhas. Aí todo o animal pode pisar. Desta feita, o animal que pisou a armadilha foi um leopardo. Não denunciei porque me é difícil fazer isso. Não é minha função fazer denúncias”.

Page 20: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

“Houve muita especulação em como teria sido eu a mandar aquele homem caçar leopardos, e essa acusação deixou-me muito perturbado. Tive que chamar esse homem para lhe confrontar com essa especulação. Ele confessou que montou armadilhas por sua conta e risco. O problema é da inteira responsabilidade dele”.

O homem que escapou de um leopardo está em sua casa. Foi feito o auto e imposta a multa, só que ainda não procedeu ao seu pagamento.

O leopardo arrebentara a armadilha ao ver o homem aproximar-se. Atacou o homem, mas o animal acabou fugindo devido à intervenção dos cães do caçador. O homem estava muito ferido. Ele está a ser curado com base em medicamentos locais, plantas e raízes.

CENTRAIS

Reversão da HCB e as relações Moçambique — Portugal“Agora podemos abrir uma nova agenda bilateral”

Por Fernando Gonçalves

O currículo do Prof. Doutor Diogo Freitas do Amaral, 64 anos, fala por si. Figura incontornável da política portuguesa e da academia no universo da Lusofonia, Freitas do Amaral é um dos gurus da escola portuguesa do Direito, foi na década de 90 presidente da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Hoje chefe da diplomacia portuguesa, Freitas do Amaral partilhou com o SAVANA, entre outras, a sua visão sobre o futuro das relações Moçambique —Portugal no pós-memorando de reversão da Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) para o controlo moçambicano. “Agora, sim, há condições para abrirmos uma nova agenda bilateral entre Portugal e Moçambique”, diz, categórico.

Que balanço é que se pode fazer das relações entre Moçambique e Portugal?O balanço tem de ser feito desdobradamente em duas fases; até 2004, as relações embora corressem

bem, e não terem conhecido uma crise séria, foram decaindo lentamente, e quase que pararam em alguns sectores. A partir de 2005, elas entram num novo capítulo, que é marcado fundamentalmente por dois factos: primeiro, a tomada de posse do novo Governo em Portugal, que já deu sinais de querer elevar o nível das relações bilaterais com Moçambique, e por outro lado, o êxito extraordinário da visita do Presidente Guebuza a Portugal. Foi uma visita muito bem sucedida, quer no plano estritamente diplomático, quer também no plano popular. O Presidente teve a oportunidade de contactar com a comunidade moçam-bicana em Portugal, com empresários portugueses que investem em Moçambique, e com empresários moçambicanos que investem em Portugal. E contou-me ele, pessoalmente, no último dia, no jantar que nos ofereceu aqui em Lisboa, ter ficado verdadeiramente emocionado com a forma calorosa, afectiva e ca-rinhosa com que foi recebido pelo povo português em Castanheiro de Pêra, um conselho do interior, que poucas vezes aparece nos jornais ou na televisão, mas onde ele teve a oportunidade de contactar. Eu senti na forma como o Presidente Guebuza se referiu a esses contactos e a toda a sua visita, que ele próprio tinha ficado tocado por conhecer melhor uma realidade que não conhecia. Acontece que a visita dele foi também grande oportunidade para se fechar um dossier que estava aberto desde 1975, e que sucessivos governos tentaram negociar e concluir, mas não conseguiram. Antes de nós só houve um momento em que se avançou um passo importante, que foi no governo do Dr. Durão Barroso, com a negociação das novas tarifas. E agora, desde que chegámos ao Governo, todos nós nos empenhamos para que, de facto, se che-gasse a um acordo.

E quando se verificou que as posições já estavam tão próximas, e que bastava um pequeno empurrão para se fechar o acordo, todos fizemos o nosso melhor para que isso acontecesse durante a visita do Presidente Guebuza.

Qual foi esse empurrão?Foram uns pequenos esforços. Foi uma conversa minha com a Srª. ministra dos Negócios Estrangeiros,

foi uma conversa entre o nosso ministro das Finanças e o vosso ministro da Energia, foi a primeira conversa dos dois Presidentes da República, e foi, finalmente, o ponto decisivo, a conversa em Sintra, entre o Presidente Guebuza e o Primeiro-Ministro José Socrates. Aí finalmente se fechou o acordo. Depois, durante a tarde, ainda houve que redigir umas frases, mas a decisão final foi fechada entre o Presidente Guebuza e o Primeiro-Ministro Sócrates, ladeados, respectivamente, pelos ministros dos Negócios Estran-geiros dos dois países e pelos chefes das delegações, ou seja o ministro das Finanças português e o ministro de Energia moçambicano. Antes já tinha havido dois sinais importantes de que, com o actual Governo, as coisas estavam a mudar. O primeiro sinal foi o aumento substancial das verbas para a coope-ração, que, em 2005, foram de 14 milhões de euros, e passam para 19,2 milhões de euros em 2006. E, em

Page 21: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

segundo lugar, o anúncio feito aqui durante a visita do Presidente Guebuza, mas já decidido antes, de um apoio especial de Portugal no valor de 300 mil euros para ajudar a combater a seca em Moçambique, e também um acordo de uma ajuda especial de Portugal para apoio ao orçamento do Estado de Moçambique com a verba de 4,5 milhões de dólares, a repartir entre 2004 e 2006. Estamos, portanto, a virar uma página, e isso é o mais importante. A Srª. ministra dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Presidente tiveram a gentileza de me convidar a ir a Moçambique em visita oficial no início de 2006, e eu aceitei imediatamente, e estou disposto a ir em Fevereiro ou Março, conforme o que convier mais às duas partes. Eu não quis ir (a Moçambique) antes de estar concluído o acordo sobre Cahora Bassa, porque agora, quando for, já po-demos falar de muitas outras coisas que há para falar. Se eu fosse antes, só se falaria de Cahora Bassa. Agora, sim, há condições para abrirmos uma nova agenda bilateral entre Portugal e Moçambique.

UM BOM ACORDO PARA OS DOIS PAÍSES

O que é que efectivamente ficou acordado, para além de que Moçambique passa a deter 85 porcento das acções, e Portugal 15 porcento?

As linhas gerais sobre o acordo final ficou combinado que serão assinadas até ao final do ano. O que ficou acordado foi o quadro que define como é que tudo se vai passar. Basicamente, será a troca de posições accionistas, tornando-se Moçambique maioritário. Portugal fica com os seus 15 porcento, que poderá alienar. Se Moçambique vender uma parte de capital a terceiros, Portugal está disposto também a vender 5 porcento, nas mesmas condições e a alguém que o Governo moçambicano nos indicar; nós não vamos vender a pessoas que não sejam do agrado do Governo moçambicano. Chegou-se a um valor, que são 700 milhões de dólares por parte do Estado de Moçambique, e 250 milhões de dólares que sairão dos rendimentos da própria empresa, que agora, uma vez que as tarifas foram aumentadas, tem um cash flow positivo todos os anos.

Outros pontos do acordo são a expressão de uma preferência em relação às empresas portuguesas na construção de novas hidroeléctricas, de acordo com os planos do Governo moçambicano, e se forem projectos que passem por um concurso público. O Governo moçambicano explicou-nos que, pelo menos num caso, terá a intenção de vir a fazer uma adjudicação directa no caso de um outro país que irá dar ajuda directa a Moçambique, e naturalmente que aí nós não iremos interferir.

Há outros pormenores, tipo em quantas prestações serão feitos os pagamentos, em que situação irão ficar os trabalhadores portugueses que têm contratos com a empresa. São questões importantes, mas que não têm a mesma dificuldade que durante trinta anos impediu que se chegasse a um acordo que, como o Primeiro-Ministro José Sócrates disse, trata-se de um acordo histórico. Não posso deixar de sublinhar que, em sete meses, este Governo (português) conseguiu fazer aquilo que outros não conseguiram em mais de 25 anos.

Mas certos círculos da opinião pública portuguesa dizem que o Governo português fez um mau acordo, e que o fez debaixo de uma forte pressão exercida por Moçambique. Que resposta é que dá?

Não houve pressão. E mesmo que tivesse havido, uma pressão durante trinta anos, já não é pressão. Nós achamos que foi um excelente acordo. Se pensarmos que o anterior Governo do partido socialista, que tinha como Primeiro-Ministro o Engenheiro António Guterres, esperava obter desta troca a volta de 500 milhões de dólares, e agora conseguimos 950 milhões de dólares, é evidentemente um bom acordo para Portugal.

E porque é que não é um mau acordo para Moçambique? É porquê hoje a empresa vale muito mais do que valia há cinco anos. As tarifas subiram, e portanto a empresa, que estava a ficar quase descapitalizada, hoje está bem financeiramente, e tem saldos positivos todos os anos.

Porém, Portugal ficará sem as receitas que antes recebia de Cahora Bassa. Isso não terá um impacto no orçamento português de tal modo que Portugal não conseguirá manter os seus compromissos com a União Europeia, quanto ao nível do seu défice?

Vamos deixar de ter os dividendos correspondentes a 82 porcento do capital que tínhamos, mas vamos continuar a receber o que corresponde aos 15 porcento que passamos a ter.

O resto será tudo do Estado moçambicano. Mais tarde, se o Estado moçambicano resolver vender uma parte, essa parte também receberá os seus dividendos. Mas julgo saber que a intenção do Governo moçambicano é de manter a maioria do capital.

“NÃO QUEREMOS TER INFLUÊNCIASOBRE MOÇAMBIQUE”

Fora da questão de Cahora Bassa, há a dívida de Moçambique, que são cerca de 385 milhões de dólares em relação a Portugal. Portugal aceitou já, em princípio, o perdão total dessa dívida. Porém, ainda não foi tomada uma decisão final em termos de um acordo definitivo. Quais são os problemas que impedem que tal aconteça?

Page 22: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

A decisão política do perdão total da dívida de Moçambique está anunciada, quer pelo Governo quer pelo nosso Parlamento. Só ainda não se executou essa decisão porque nós estamos a negociar com Bruxelas uma forma de esse perdão da dívida não prejudicar um outro exercício que estamos a fazer em concertação com Bruxelas, que é a corecção do défice orçamental excessivo que Portugal tinha no início deste ano. É só para que isto não vá desequilibrar o orçamento quando nós estamos a tentar equilibrá-lo. Mas é um problema puramente contabilístico; quando encontrarmos com o Eurostat, que é o organismo de estatísticas da União Europeia, uma fórmula estatística para podermos concretizar aquilo que já está decidido, de uma forma que não prejudique o esforço orçamental que estamos a fazer, imediatamente o perdão será concretizado.

Tem alguma ideia sobre quando é que isso irá ocorrer?Não tenho o calendário, mas estou convencido de que isto é uma questão só de meses. A intenção do

Governo português é que isso se verifique até ao final deste ano. Se não for Dezembro será Janeiro, mas será só uma coisa de alguns meses.

A redução do capital português na HCB não significará que Portugal passa a perder a sua influên-cia sobre Moçambique?

Nós não queremos ter influência sobre Moçambique; nós gostamos de estar presentes em Moçambique, e ajudar Moçambique naquilo que nos pede. Nesse âmbito, assinámos agora em Sintra o Plano Anual de Cooperação (PAC)-2006, que atinge 19,2 milhões de euros, dos quais 40 porcento vão para a educação e cultura, 24 porcento para a boa governação, e depois outras rubricas tais como água, recursos naturais, desenvolvimento comunitário e rural, etc.. Por outro lado, há cada vez mais empresários portugueses a investir em Moçambique, e a concorrer em concursos para obras públicas em Moçambique. E nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português a cada vez mais afirmar a sua presença e interesse na relação económica com Moçambique. Temos também um esforço a fazer para incrementar as relações turísticas; é muito importante para mantermos e aprofundarmos a amizade entre o povo moçambicano e o povo português, que haja mais turismo entre as duas partes, que haja mais portugueses a irem a Moçambique e mais moçambicanos a virem a Portugal.

Isso implicaria, naturalmente, o aumento da frequência de voos, que neste momento é muito pouca. Como resolver isso?

Há um acordo recente que visa triplicar o número de voos da TAP para Moçambique, em parceria com a LAM.

Do ponto de vista das relações económicas entre Portugal e Moçambique, apesar de todo o optimismo que está a desenhar, o facto é que há cada vez menos investimentos portugueses em Moçambique, sendo que Portugal neste momento encontra-se em quarto lugar na lista dos princi -pais países que investem em Moçambique.

Posso lhe dizer uma coisa que para nós é muito triste, mas que é verdade; é que há cinco anos que a economia portuguesa está estagnada. Não há capacidade de investimento em Portugal, nem há capa-cidade de investimento fora de Portugal. E aquilo que nos está a dizer de Moçambique, também nos penaliza muito certamente com os outros países onde tradicionalmente nós investimos. Agora, nós temos confiança em que, por um lado, a economia europeia melhore; não se esqueça que a economia alemã está em crise, que a economia francesa está em crise, que a economia europeia, de um modo geral, está em crise. A nossa economia depende muito do factor europeu. Também estamos a tomar medidas específica-mente nacionais para relançar o investimento, e se tudo correr bem, dentro de dois ou três anos, a nossa economia já estará a trabalhar com os motores mais aquecidos, já poderá atingir uma velocidade maior, e daí ocorrerá também o regresso ao aumento dos investimentos.

Abolição dos vistos na CPLP“Se fosse por vontade política, já estava feito”

Relativamente à CPLP. Tem-se falado da necessidade de abolição de vistos, mas, até aqui, nada aconteceu, e muitos cidadãos, especialmente dos países africanos de língua oficial portuguesa, queixam-se muito das dificuldades de entrada em Portugal. Para quando a abolição de vistos?

Se fosse apenas uma questão de vontade política, já estava feito. O problema é que não é. Nós estamos inseridos na União Europeia, que tem a sua política de vistos. E dentro da União Europeia há um clube mais restrito, que é o conjunto de países que fazem parte do acordo de Shengen, do qual Portugal faz parte, com a total abertura de fronteiras dentro desse espaço. Isso significa que há um controlo um pouco mais rigoroso. Isso cria problemas a Portugal, relativamente aos PALOP, ao Brasil e a outros países amigos, porque ao entrarem em Portugal estão a entrar no espaço Schengen. Mas há-de haver um momento em que nós vamos conseguir conciliar as coisas e facilitar a vida das pessoas. O Primeiro-Ministro anunciou que, até ao final do ano, os aeroportos portugueses passarão a ter uma entrada só para cidadãos da CPLP.

Para os poucos que conseguem o visto nos consulados de Portugal?Não são tão poucos assim…

Page 23: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Mas tem havido muitas queixas de estudantes que vêm desses países, com exigências que se podem considerar de ridículas…

Eu estou aberto a resolver esse problema, só que ninguém até aqui nos veio apresentá-lo.

Revolução pacífica nas relações culturaisAinda no contexto da CPLP, há um acordo que está sendo desenhado e que poderá permitir que

cidadãos deste espaço, residentes fora dos seus países, possam participar em actos eleitorais nos países de acolhimento. Acha que é um acordo viável?

Nós temos na nossa constituição o princípio de que sempre que haja reciprocidade… estamos abertos até a ir mais longe do que isso; estamos abertos ao princípio da dupla nacionalidade. A nossa posição de princípio é de abertura, mas quando se trata da concessão de direitos políticos em princípio reservados aos cidadãos de um certo país, a extensão desses direitos políticos a outros países depende da reciprocidade.

Mas os laços culturais ao nível da CPLP são muito baixos, e não se pode ir para uma cooperação a esse nível nessas condições. Não seria necessário primeiro ultrapassar essas dificuldades?

A situação das relações culturais entre Portugal e Moçambique não é satisfatória, e temos que dar uma grande volta a isto. Há mesmo quem diga uma revolução. Pacífica, naturalmente. Temos que tentar rever toda essa matéria, e é um dos pontos que eu tenciono abordar com o Governo de Moçambique quando for em Fevereiro ou em Março na minha visita oficial. Uma maior e mais intensa cooperação entre o Instituto Camões e as instituições de Moçambique, designadamente as universidades pedagógicas, a Universidade Eduardo Mondlane e algumas universidades privadas que eventualmente o Governo de Moçambique nos indique como merecendo também o nosso apoio. Há depois dos leitorados, das cátedras de português, que não é apenas língua; é a língua, a cultura, a história, isso é do nosso interesse. Temos também um pedido a fazer, e naturalmente que eu farei, na altura própria, porque a escola portuguesa de Maputo, que me parece que é uma boa escola, ainda está à espera de uma formalidade que é necessária para o reconhecimento oficial. Sabemos que não é um problema que se resolve facilmente, mas para nós seria importante.

Ao contrário de portugueses que só conhecem MaputoConheço muitos pontos

de MoçambiquePessoalmente, o senhor ministro não é visto com bons olhos em certos círculos moçambicanos,

devido às suas posições que são conotadas com a extrema direita. Pensa em mudar?Eu gostaria de enviar um abraço de muita amizade, muito afecto e carinho ao povo moçambicano. Não é

verdade aquilo que alguns dos meus adversários políticos têm dito a meu respeito, quer em Moçambique quer noutros países de língua oficial portuguesa, que dizem que eu nunca lá fui, não tenho lá amigos, não me interesso pelos problemas de África. É tudo ao contrário; primeiro, Moçambique foi, de todas as antigas colónias portuguesas, o país que eu visitei primeiro. Segundo, eu tenho lá muitos e bons amigos, não só portugueses como moçambicanos. Terceiro, antes de entrar para o Governo, concretamente em 2002 e 2003, fui duas vezes a Maputo na minha qualidade de professor universitário fazer conferências. Estive lá, fiz conferências numa universidade privada, o ISCTEM, estive também na Universidade Eduardo Mondlane a convite da Associação dos Estudantes, com o anfiteatro cheio. Conheço muitos pontos de Moçambique, ao contrário de alguns portugueses que acham que conhecendo Maputo conhecem Moçambique. Eu conheço a Beira, Nampula, a Ilha de Moçambique e o Parque Nacional da Gorongosa… peço aos nossos irmãos moçambicanos que não acreditem nas críticas que a oposição faz mais por obrigação do ofício do que por convicção, e que saibam que têm em mim um grande amigo e admirador do povo moçambicano e dos esforços notáveis que tem feito a partir do momento que entrou em paz e se lançou com muito afinco no desenvolvimento.

O senhor ainda está disposto a continuar os seus esforços para a realização de uma cimeira África-Europa?

Não só estou disposto, como já só em seis meses fiz mais por essa cimeira do que todos os meus antecessores juntos. No dia 21 de Novembro, em Bruxelas, esse assunto será discutido, mais uma vez agendado a pedido de Portugal.

Sobre os equívocos de Paul Fauvet“Ouve o conselho e recebe a correcção, para que sejas sábio nos teus últimos dias.”

Provérbios 19:20

Por Luís Nhachote

Page 24: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Em inusitado e inglório esforço de debater os factos trazidos à superfície pelo pesquisador João Cabrita, no seu livro A morte de Samora Machel, o colega Paul Fauvet virou os canos para o autor destas linhas, a quem acusa na praça pública sem argumentos lúcidos e convincentes de “escrever a história a partir dos restos do apartheid”.

Paul Fauvet, no seu equívoco primeiro, atribui-me a autoria do artigo publicado na edição de 21 de Outubro, quando na verdade vem escrito COMPILAÇÃO de Luís Nhachote.

Antes de autopsiar os outros equívocos e epítetos que o amigo Fauvet atribui- -me, dizer-lhe que com -pilação, segundo o dicionário Universal da Porto Editora, é “(do Lat. Compilatore), s.f. acto ou efeito de compilar; recompilação; colecção; reunião de extractos de diversos escritos sobre um assunto”.

Algo inconfessável deverá ter norteado a ira dos canos de Fauvet para que o alvo fosse o humilde e pacato jornalista que teve a honestidade de COMPILAR e atribuir a César o que é de César.

Para sustentar os seus equívocos, algo como crença dogmática, Fauvet explana que “... Em vez de escutar fontes moçambicanas, em vez de ler, por exemplo, os artigos que Cardoso escreveu em 1986/87, Nhachote preferiu fazer a sua história a partir da lata de lixo do apartheid.

Para os seus artigos sobre Mbuzini Cardoso ganhou o prémio sobre o jornalismo investigativo da Organização Nacional de Jornalistas (ONJ). É pena que nos dias de hoje esses artigos tenham caído no esquecimento. É indicativo da baixa qualidade do livro de Cabrita que Carlos Cardoso e a AIM não sejam citados como fontes — embora sejam, de longe, as fontes mais importantes devido à sua tese de que o desastre foi provocado pelos militares do apartheid ...(SIC)”.

Para quem leu os artigos que Fauvet resgata, e os dados contidos na obra de Cabrita, há-de muito rapi -damente concluir que ambos – Cardoso e Cabrita – socorreram-se do mesmo relatório da comissão de Inquérito, não sendo, portanto, imperativo recorrer ao espólio da Agência de Informação de Moçambique (AIM).

Quem outorgou a Fauvet o direito de auto-avaliação de quem são de longe as fontes mais importantes?Fauvet aqui parece ter recorrido ao processo de afirmação por negação dos outros, um truque muito comum,

infelizmente, nos dias que correm. Nhachote é apenas o “bode expiatório” no complemento da tríade – ZAMBEZE e STV — escolhida por Fauvet

que talvez não saiba que os restos do inimigo também servem para fazer história quando são analisados pelos métodos adequados na história.

No artigo por mim compilado (antes de obter um exemplar do livro), cuja introdução está disponível no sítio www.samora ma chel.com , tomei a liberdade, depois de uma leitura minuciosa do mesmo, de catapultar para título que Chissano teria golpeado Marcelino dos Santos a liderança da FRELIMO, e posteriormente a presidência do País. Sobre esse dado, o autor do livro socorre-se de cartas a que eventualmente o colega Fauvet não teve acesso e fundamenta deste modo:

“…Finalmente, a questão de sucessão. A ideia de que Chissano golpeou Marcelino dos Santos só pode con-vencer alguém que não estava em Moçambique (Cabrita) ou era jovem demais para recordar o ambiente daquela altura (Nhachote). Na realidade, Chissano era o sucessor evidente. Eu me lembro bem de discussões informais entre jornalistas, anos antes de Mbuzini: ninguém duvidava: Chissano seria o próximo Presidente. Assim, a decisão rápida da FRELIMO depois da morte de Samora de eleger Chissano Presidente não tomou ninguém de surpresa (em Maputo pelo menos, embora talvez não nas hostes do apartheid)...” ( SIC).

Felizmente, como ainda não fui atingido pelo perigoso vírus da amnésia colectiva, lembrar a Fauvet que este ano, em entrevista – que deu polémica — à novíssima STV, o veteraníssimo Marcelino dos Santos disse a plenos pulmões que contaria um dia as razões que o levaram a não tomar o poder após a morte de Samora Machel.

Na verdade, Fauvet deve saber que Marcelino dos Santos é tido nos dados recentes da reconstrução da pantanosa história da FRELIMO como o “pai do golpe palaciano”, ao formar o triunvirato que afastou Uria Simango da liderança deste movimento após a morte de Eduardo Mondlane, ao pontapear os estatutos que diziam que, em caso da morte do presidente, o vice-presidente assumia a liderança.

Lembra-se, Fauvet? Antes de me retirar, acenar a Henri Lefreve e Augustina Bessa Luís que, em dias do século passado, concluíram que “A história é uma sequência de factos sem encadeamento” e “A história é uma ficção controlada”.

PS: Convido o amigo e colega Fauvet a tomarmos juntos um chá esta tarde.

DESPORTOTaça Moçambique mCel

Alta tensão!Por Paulo Mubalo

Page 25: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Costa do Sol — Matchedje e Ferroviário da Beira — Maxaquene são as partidas agendadas para as meias finais da Taça Moçambique mCel, a segunda mais importante prova do calendário futebolístico nacional.

As duas partidas, isto em função dos pergaminhos das equipas intervenientes por um lado e pela especificidade da prova — pela primeira vez movimenta valores consideráveis — são susceptíveis de produzir resultados pouco esperados. Daí que só seguirá em frente quem apresentar melhores argumentos nas 4 linhas.

Os canarinhos, em face de uma época marcada por altos e baixos, e os militares, que passarão a jogar na Divisão de Honra, têm motivos de sobra para ganhar por forma a reencontrarem- -se com a sua massa associativa. Aliás, especialmente para o Matchedje, uma vitória obrigaria a sua direcção a repensar seriamente no futuro, porque o mais provável é que alguns jogadores influentes procurem continuar no Moçambola, o que passa por mudança para outras formações de primeiro plano.

Já em relação ao outro dérbie, se a história reza que o Maxaquene tem conseguido, nos últimos tempos, suplantar o seu adversário, os locomotivas da Beira, que deixaram os seus créditos em mãos alheias não justificando o investimento que os CFM fazem, dizíamos, tudo farão para contrariar o favoritismo da turma da capital.

E deve ficar bem claro aos pupilos de Chiquinho Conde que não vão ter tantas facilidades como no jogo do último sábado quando golearam, sem dó nem piedade, o Sporting de Nampula por 4 bolas sem concorrência.

De qualquer das maneiras e olhando para os jogos desta semana, há mais probabilidades de a final da taça mCel ser corporizada por duas equipas da capital, isso, claro, se o Maxaquene triunfar no Chiveve.

Nota positiva: a promoção que a “orgulhosamente moçambicana” tem feito serve de catalizador para que muita gente acorra aos campos, nalguns casos superando alguns jogos do Moçambola que eram assistidos por algumas dezenas de espectadores. O exemplo mais notável aconteceu no jogo entre o Ferroviário e o Costa do Sol, porquanto, apesar da ameaça de chuva e do provável adiamento da partida, muita gente se fez presente ao estádio. É, realmente, a festa do futebol e dos prémios.

O OrdálioPor Paulo Mubalo

MJD: decisão metafísica!Não deixa de ser estranha a posição do ministro da Juventude e Desportos, Dr. David Simango, de candidatar a

província de Sofala para acolher o CAN 2010. Justamente pelo facto de, aquando da apresentação do desejo de Moçambique de organizar o evento, uma explanação, diga-se, a justificar nota 20, ter dado a entender que Maputo, Chimoio e Nampula eram as cidades escolhidas.

A reviravolta que se deu não deixa de alimentar as mais díspares opiniões e, quiçá, as más línguas. Com efeito, se Sofala deve se candidatar porquê então as outras províncias não devem fazer o mesmo por forma a se dar mais transparência ao acto?

Mas se partir da presunção de que, à semelhança de outras coisas, o desporto é um fenómeno social com implicações a níveis económicos, políticos, etc., etc., então pode se pensar que o segundo factor terá ditado a mudança de posição.

Ipso facto, a justificação do governo da província de que até 2010 Sofala possuirá duas linhas férreas, estradas melhoradas, empresas de transportes de calibre só serve para entreter os menos atentos.

Creio que não haverá nenhuma província que de agora até lá não vai conhecer crescimento. A província de Niassa há 5 anos não é igual a dos tempos do governador Simango, porque o trabalho que fez é visível a olho nu. A não ser que defenda o contrário!

Causa maior estranheza ainda a posição do ministro, sobretudo para quem não esteve no dia em que convidou os órgãos de informação para dar informe dos próximos passos de Moçambique. Homem com inteligência acima da média e conhecedor da área, Simango fez uma divagação metáfísica: o ser uma coisa e não ser ao mesmo tempo.

Vou escalpelizar: disse, depois de apresentar alguns cenários, que a questão de locais ainda não está esclarecida, mas que vão ser construídos estádios nas zonas Sul, Norte e Centro, isso era uma verdade. E logo a seguir através do retroprojector mostrou a planta de futuros estádios a serem erguidos em Maputo, Chimoio e Nampula! Quer dizer, não conhece o local a serem construídos os tais “elefantes brancos” como alguém sugeriu, mas também conhece onde serão construídos! Senhor ministro, ser e não ser auto excluem, de tal modo que o senhor ministro não pode ser ministro e não ministro ao mesmo tempo!

Page 26: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Pode parecer distracção da sua parte, mas não creio que seja o caso. A não ser que tenha pretendido fazer surpresa.De qualquer das formas, seja Chimoio ou Beira o estádio será bem-vindo tanto assim que cada província tem as suas

especificidades que se acabam complementando. Construir uma proposta não é coisa que se faça de dia para noite, como se de mudar de fraldas se tratasse, pois exige vários estudos. E nesse vagar o tempo vai passando.

Acaso quanto tempo se levou para Moçambique preparar o dossier, apesar de muitos cérebros que nele tomaram parte?

Camarão que dorme, diz o velho ditado, a onda leva. Deixe, sr. ministro, as candidaturas provinciais e dê primazia ao trabalho. O tempo é de trabalho e não de fazer política.

Obras do 1º de MaioConclusão aguarda financiamento

A conclusão das obras de reabilitação do campo do 1º de Maio, infra-estrutura sob gestão da FMF, está condicionada a novos financiamentos. Segundo apurámos, aquela estrutura gimnodesportiva continua a recorrer a fundos próprios para a sua reabilitação contrariamente ao que se chegou a aventar. A mesma fonte explicou também que a federação nunca recebeu da FIFA o correspondente a um milhão de dólares.

“O primeiro montante para a reabilitação do campo do 1º de Maio foi disponibilizado pelo Fundo de Promoção Desportiva sendo o restante da própria federação. Estamos parados neste momento porque não temos investimentos”, disse.

Sabe-se que o centro de medicina e a vedação estão quase concluídos, mas faltam trabalhos de recuperação da bancada central.

“Se o campo está nas condições em que se encontra é fruto do nosso dia-a-dia e dos patrocínios de algumas empresas além do dinheiro que provém da bilheteira.”

A previsão para a conclusão dos trabalhos de reabilitação está para breve.“O campo do 1º de Maio passará a acolher jogos das selecções e do beneficiário principal, o

próprio clube. Estamos a falar das selecções das camadas inferiores, e jogos amigáveis da própria selecção nacional”.

Sobre a Academia Mário Coluna, a fonte observou que “é bom entender que uma coisa é reabilitar e a outra diz respeito ao próprio funcionamento das instalações, sobretudo porque tem custos na fase da implementação. Até ao momento foram gastos 500 mil dólares, sendo que 400 mil via projecto golo.

“Que eu saiba, nenhum estádio se constrói com 500 mil dólares a não ser um relvado com pequenas fileiras de bancadas.”

Abriu um parenteses para deplorar a falta de respeito de algumas pessoas relativamente à figura de Coluna.

“Isto é fruto da falta de conhecimento e de respeito pelo Monstro Sagrado e tal acontece mais no seio da juventude e da própria imprensa que para tudo o critica. Já viajei com Co luna e fiquei maravilhado pelo enorme respeito, orgulho e gratidão que todos prestam por ele”, enfatizou.

PM

“Africano” de basquetebol Responsabilidades acrescidas

A fase final da taça dos clubes campeões africanos em basquetebol, na categoria de seniores mas-culinos, inicialmente agendada para a capital do País, será realizada, nos finais deste mês, na Nigéria, obe-decendo o sistema de todos contra todos.

O nosso País far-se-á representar apenas pela formação da Académica, vencedora da Taça de Moçam-bique que vai ombrear com as equipas do 1º de Agosto, Inter e Petro, todas de Angola, além dos re-presentantes de Egipto, Camarões, Senegal e do país anfitrião, seguramente colossos de bola ao cesto.

De qualquer das formas, as responsabilidades serão realmente acrescidas para a turma moçambicana por ser a única a representar o país.

Femininos “adormecidos” Iniciou já a contagem decrescente da nossa selecção feminina rumo à participação no “afrobásquete” a

decorrer, igualmente na Nigéria, entre os dias 21e 29 de Dezembro passado.

Page 27: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Porém, mesmo depois de anunciada a pré-convocátoria, o combinado nacional continua a dormir à sombra da bananeira em termos de preparação para o certame, o que poderá dificultar a estratégia da equipa técnica. De princípio, perspectiva-se a vinda do técnico Nelson Isley, o qual levou Moçambique à final do afrobásquete 2003, realizado em Maputo.A.Langa

Da capital à cidade da Matola Amigoas da Saúde marcham

Um grupo de professores de Educação Física, denominado Amigos da Saúde, de diversas escolas da cidade e província de Maputo, está a organizar uma marcha a realizar-se amanhã, sábado.

A caminhada terá como ponto de partida a Estátua de Samora Machel, em frente ao jardim Tunduro, às 6 horas, e como ponto de chegada o Parque Municipal da Cidade da Matola.

Paulo Nhamusso, coordenador do evento, disse ao SAVANA que a ideia da realização desta marcha, que movimentará mais de 500 pessoas, surgiu do sucesso que tiveram na caminhada por eles organizada há três meses no mesmo percurso.

“A experiência que tivemos há três meses foi boa, daí que sentimos a necessidade de, mais uma vez, organizar a marcha no sentido das pessoas que habitualmente exercem actividade de ginástica e não só possam em conjunto desenvolver as suas práticas”, ajuntou.

Nhamusso disse que a realização da marcha conta com o apoio de certas pessoas de boa vontade que lhes têm disponibilizado água e assistência médica.

“Já temos quase todas as condições principais reunidas para a realização da marcha, como a assistência médica, segurança ao longo da caminhada, entre outras.”

SM

PAG 24 ECONOMIABM abate três dígitos no Metical

Uma medida que visa facilitar as transacções, a divisa moçambicana deverá perder três dígitos, operação que será desencadeada logo após a aprovação pela Assembleia da República (AR) da proposta de lei que cria e fixa o valor da Taxa de Conversão do Metical para o chamado “Metical da nova família”.

Para o efeito, novas notas e moedas com diferentes valores faciais vão ser emitidas dentro dos próximos 10 meses pelo Banco de Moçambique (BM).

“O que irá acontecer será a coabitação, por um período entre oito e 10 meses, do novo valor da taxa de conversão do Metical e a actual sem se observar um período de interrupção da circulação da moeda dentro e fora do País”, sublinhou Chang.

Segundo Manuel Chang, ministro moçambicano das Finanças, a operação de supressão dos três zeros na divisa nacional será feita sem nenhum prejuízo ao Metical em termos de perda do seu actual peso face às moedas externas.

Esta operação, de acordo com Chang, não irá implicar a redução ou aumento do salário dos trabalhadores e preço dos produtos.

Após a (des)informação sobre a matéria posta a circular com pompa e circunstância por um canal televisivo privado sintonizado em Maputo, muitos cidadãos acreditavam que a medida iria aumentar o poder de compra.

A verdade é que, depois da supressão dos três zeros, um artigo que custava 15 mil meticais, pode ser adquirido pagando-se 15 meticais.

(F.C.)

CULTURAL

Terça-feira no CCFM

Page 28: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

A estreia de “O Grande Bazar”O filme de ficção moçambicano “O Grande Bazar”, realizado por Licínio Azevedo, com 56

minutos de duração, terá, na próxima semana, em Maputo, a sua estreia nacional e internacional. O filme será projectado no Centro Cultural Franco-Moçambicano, na terça-feira, dia 15, às 19 horas, numa sessão para convidados e imprensa. No dia 16, quarta--feira, na mesma hora e mesmo local, terá a sua estreia para o público.

“O Grande Bazar”, a mais recente produção cinematográfica da Ébano Multimedia, tem como cenário principal o Mercado Vulcano, em Maputo, onde a equipa de filmagem, constituída exclu-sivamente por artistas e técnicos nacionais, permaneceu por cerca de quatro semanas em gra-vações diurnas e nocturnas, utilizando muitas vezes os vendedores e utentes do mercado como actores improvisados. Com um forte conteúdo dramático, mas, também, muito divertido, o filme é dirigido a um público de todas as idades. A narrativa centra-se na história de dois meninos que se conhecem no mercado e se tornam amigos, apesar de as suas trajectórias e objectivos serem completamente opostos: um procura trabalho para recuperar o que lhe foi roubado e poder voltar a casa; o outro não olha a meios e até rouba, para não ter que viver com a família. A amizade vai levá-Ios a correrem riscos e a enfrentarem um perigoso inimigo comum.

As duas personagens principais de “O Grande Bazar” são interpretadas por Edmundo Mondlane e Chano Orlando, ambos de 12 anos, estudantes, seleccionados entre dezenas de outros candidatos. Com muito talento, segundo o realizador, fazem neste filme a sua estreia na sétima arte contracenando com alguns nomes conhecidos no cenário artístico moçambicano, os músicos Chico António e Paíto Tcheco, protagonistas importantes no enredo.

Chico António é também o compositor da trilha musical, incorporada de maneira visual dentro do filme, através da personagem que ele interpreta (um lenhador que aparece em algumas ce-nas a tocar a sua gaita de boca). Neste filme, Chico António e Licínio Azevedo dão continuidade a uma parceria que já deu bons resultados em outras obras do realizador, tais como os docu-mentários “A Ponte”, “Night Stop”, “Acampamento de Desminagem”, que receberam inúmeros prémios em festivais internacionais. Digno de referência, ligado ao processo de criação e produção desta obra, é o facto de “O Grande Bazar” ter sido concebido e escrito pelo realizador há 15 anos. Impedimentos de ordem financeira, normais em produções cinematográficas, leva-ram a que só recentemente fossem criadas as condições para a concretização do projecto. Licínio Azevedo vê nesta longa gestação um lado positivo: fez “O Grande Bazar” com mais ma-turidade, mais experiência (factor preponderante no relacionamento com os actores) e maiores conhecimentos técnicos.

“O Grande Bazar” tem a sua primeira apresentação fora de Moçambique prevista para Janeiro de 2006 no FIPA-Festival Internacional de Produções Audiovisuais, em Biarritz, França, onde há três anos outra ficção do mesmo realizador, “Desobediência”, uma longa-metragem de 90 minutos, recebeu o troféu de prata

Do Alto da ColinaPor Luis Nhachote

ConfissãoJá não sei mais o que fazer. A penúltima semana, para mim, foi o mais avassaladora em toda a minha

existência. Todo um investimento foi abaixo devido ao infortúnio que se abateu sobre a minha criação. A maldita gripe das aves visitou a minha capoeira, e os patos, com os quais contava ficar rico, em passos

desordenados, cruzaram com a morte. Eram 200 patinhos, em estado avançado de crescimento. Chorei. Como uma criança a quem tiram o pão.

A minha mulher tentou me consolar. A minha filha, não sei se de emoção, alinhou no coro do pranto, deitando lágrimas que encheram a sala.

Page 29: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

A única vez que a minha sala estivera cheia de água foi em 2000, aquando das cheias. “Vizinho, o que se passa?”, perguntou preocupado Damião que acabava de entrar deropante. Não lhe respondi, pois enxugava as lágrimas.“Os patos dele morreram”, disse, finalmente, a minha mulher. “Parece que foi da gripe das aves”.“Isso não é motivo para alarme”, disse Damião. “Mesmo na Europa, a situação está caótica”.“Não te metas na minha vida. Acaso sabes que a maior fortuna deste país veio da criação de patos?”Ele olhou algo estupefacto, baixou a cabeça e bateu silenciosamente em retirada. Ciente das dificuldades que daí adviriam, e para controlar o barco familiar – como chefe, claro — jurei para a

minha mulher e filha que não mais choraria e que pediria empréstimo ao banco para repor a criação que nos daria tranquilidade no futuro.

As missivas que deram entrada nos três principais bancos comerciais, seguido do estudo de viabilidade, obteve a contundente resposta:

“Lamento vos informar, mas os estudos levados a cabo pelos nossos gestores indicam que o mesmo é de risco, portanto, não há financiamento. Atenciosamente, o PCA.”

Fiquei de rastos. Mas não chorei, conforme tinha prometido às miúdas. Nas duas semanas que se seguiram, procurei parceiros, estabeleci conexões na região austral, mas a

unanimidade, nas respostas, era claríssima como as águas da fonte de Namaacha.“Esse negócio não tem viabilidade. Se fossem frangos a coisa era outra”. Outros, não empreendedores,

alinhavam no mesmo diapasão com o exemplo de que o país do samba, futebol e novelas estava a exportar frangos para todos os cantos do mundo. “Para onde pensas exportar os teus patos?”, perguntavam alguns, e eu, como resposta, dizia que estava à espera de saber aonde o criador-mor da espécie enviara para poder segui-lo.

As pessoas passaram a ridicularizar-me, mas, até hoje, tenho crença na viabilidade do negócio. Os dias passaram, e, ao amanhecer desta segunda-feira, imbuído de um sentimento nacionalista do passado,

recitei uns versos escritos por um poeta-presidente ao longo da revolução onde tombaram vários camaradas: As minhas mãos/ mais as tuas mãos/ vão pegando em armas/ a minha força/ mais a tua força/ vão vencer o

imperialismo/ o meu sangue/ mais o teu sangue/ vão regar a vitória..A caminho do serviço, gritava para todos quantos me perscrutavam com olhares tentaculares a secular frase

límpida: A LUTA CONTINUA. Juro que confessei…

Boss AC e Wanda Baloy aquecem MaputoO rapper Boss AC e a afro-fusion Wanda Baloy são os grandes atractivos para dois concertos a rea-

lizarem--se na discoteca Cocunuts este fim-de-semana na capital moçambicana.Há quem designe Boss AC por o “grande poeta urbano” ou o “maior rapper português da actualidade”,

mas, independentemente das opiniões, a certeza é que ele é um artista polivalente e multifacetado, que tem como característica principal o facto de ser irreverente e acutilante nas suas letras e na música, um verdadeiro artista que tem dado cartas em Portugal, no capítulo da música hip hop.

Depois do álbum “Mandachuva” (1998) e “Rimar contra a maré” (2002), Boss AC assinou, este ano, o seu terceiro álbum, disco de prata em Portugal — “Ritmo, Amor e Palavras” —, uma colectânea de declarações de amor, expressa na diversidade de palavras e ritmos com que constrói a sua música.

A sua reputação ultrapassou fronteiras, tanto assim que foi um dos poucos artistas de Portugal nomeados nos MTV Europe Music Awards, evento de grande projecção internacional, recentemente realizado em Lisboa.

A boa reputação de Boss AC, enquanto MC e poeta urbano, ficou provada este ano, com o seu último álbum “Ritmo, Amor e Palavras”. Finalizado em Nova Iorque, o disco conta com a participação de artistas consagrados como De La Soul, Da Weasel, Sam The Kid, Gutto, Débora, Rita Reis, Kevin Mercer e Kalú, entre outros.

Enquanto isso, Wanda Baloi, filha de moçambicanos – é filha de Jaco Maria –, cujas performances vale-ram-lhe a nomeação para melhor voz feminina do “African Video Music Awards” em 2004, um evento organizado pela Channel 0 e M-Net, duas grandes cadeias televisivas de impacto transnacional.

Sendo as suas músicas catalogadas como afro-fusion, Wanda Baloy tem conseguido, desde que emer-giu na cena musical sul-africana, criar o seu estilo próprio, o que a tem feito brilhar, a par de outros nomes igualmente consagrados como Jimmy Dludlu, outro moçambicano que dispensa qualquer tipo de apresen-tação.

Nascida e residente na África do Sul, e filha de pais moçambicanos, Wanda conseguiu, numa das suas músicas que gravou em 2003, “Voices/ Across The Fence”, expressar profundamente o difícil quotidiano dos imigrantes, resultante da sua vivência no país que tem acolhido milhares de nossos compatriotas.

Algumas das composições de sucesso, cantadas por Wanda, são brilhantes “remakes” de músicos con-sagrados, como Miriam Mabeka, Jimmy Dludlu, Bheki Ngcabo e Eddie Vulani Maluleke.

Page 30: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Estes espectáculos estão inseridos nos vastos programas culturais, desportivos e sociais que estão a ser levados a cabo pela primogénita da telefonia móvel no País.

Boss AC actua às 22.30 de sábado, enquanto Wanda baloy irá ao palco às 18.30 de domingo. RJ

A Esquina do TempoPor Luis Patraquim

Sobre David Mestre nos trinta anos da independência de AngolaEvocação que leva como epígrafe uns “Alimentos Morais”, em exortação contida de Mestre David

Mestre, cuja dita exortação corre assim, a páginas 51 do seu “Subscrito a Giz”:

“Enluarados companheiros/erguei vossas magias/em volta /sob o arco sombreado como a frutapinha./Arma ou cantil?//Lugar aberto a escopro/ um pequeno nada fora do alcance do inimigo.//As munições/o pão e a água: ei-los/alimentos morais”.

E, pois então, como (não) diria outro Mestre, o Tamoda, eis que me enluei de afoitezas para evocar a medo este meu amigo Luís, sorridental e ledo.

Se alguma utilidade me cabe nesta falagem é a de expor as mais veementes razões para estar aqui, nesta crónica. Atiro-vos à consciência o poema do Brecht, o daquela figura à “Carlinhos, o homem do povo”, como diria Carlos Drummond de Andrade, que entra no bar e desenha riscos no chão e os bebedolas riem e ele insiste na notícia feérica, no desejo patético, de lhes falar na amada - que se foi, partiu, chegou, nunca se saberá - e volta a sair embrulhado em desarticulações, maningues risos e perde-se na solidão da rua.

É, pois, eloquentemente inútil, esta minha tarefa. Só me cabe demonstrá-la. Deu-se o caso de este seu David Mestre, senhor de um único ofício, embora de muitas deambulações e demais afazeres contigentes, se ter dado ao divertimento mui lúcido de coligir as “Lusografias Crioulas”, de ser o autor do “Subscrito a Giz” e de já se ter anoitecido antes deste strinta anos. E amargamente como sabem alguns.

Confesso que a minha primeira lembrança do David é por carta. Sem saudosismos precoces - que eles chegam sempre, garanto-vos - isso foi no tempo dos tamarindos, de uma tal “Crónica do Guetho”, de numa tarde de sábado o Eugénio Lisboa dele nos ter dado notícia, sentados todos à conversa na redacção do jornal “A Voz de Moçambique”.

Isso faz tanto tempo, ó nêga fulô. É o fantasma do Jorge de Lima adejando sobre esta memória. Da sua obra, da revelação que foi na chamada “geração de 70” em Angola, outros, tantos, já falaram,

situaram, compararam, valorizaram. De Eugénio Lisboa a Ana Mafalda Leite, de Fernando Martinho a Francisco Soares, de Carmo Vaz ao saudoso Manuel Ferreira.

Lembro só e aqui que leiam e releiam sua obra. Não me vou ater à noção mais ou menos rigorosa do que será isso de crioulo, das mestiçagens tão “à la mode” e “à la carte”, que vêm dando movimentos, congressos, estados de espírito, açambarcamentos políticos, poemas épicos - basta lembrar Derek Walcott. Não o faço, pelas simples razão de que não tenho pachorra e porque, melhor do que eu, na escolha dos autores, no olhar atento à obra e aos percursos, no rigor afectuoso de as compreender, na coragem, na capacidade de indignação, na iconoclastia saudável e lúcida, anda desde há muito o David Mestre.

Ler até lhe arderem os olhos o texto de honesto estudo e o percurso de angústia que se plasmou em Mário António de Oliveira, intitulá-lo de “Nostalgia e Desagravo”, fazê-lo contra a conjura de silêncio, derrubando muros, conveniências menores, dirigismos e jdanovismos que marcaram e marcam o infantilismo e a perversidade de processos que tão bem conhecemos, é soltura de espírito, liberdade livre como diriam Rimbaud, Éluard ou/e Ramos Rosa.

Podia citar outros ensaios, ou tão só acenos apertados de afecto que se espraiam num discurso crítico de leitor atento - sem nenhum labéu de impressionista, que tanto eriça a pele dos pós ou anti tudo: pó talco, pós-moderno, anti-humanismo, pós- pós-moderno - e ele há muitos.

Não foi e não é comum entre os escreviventes das nossas literaturas de há só um século a surgirem, este ofício de cronista poético dos autores e das obras, em prosa que faz pena não se abalançar pelos muitos géneros dessa coisa que pende e se eriça quando tocada pelo sopro do vero talento e a que chamamos literatura.

Nem tais propostas desonestas me atrevo a fazer. Ele é Poeta e só os Poetas deviam falar dos Poetas. O que David Mestre faz e bem.

Page 31: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

Conceitos a fio de prumo, ou não fosse caboclo de bué de leituras, muita comparação e bissetrizes, sabendo, como dizia no gozo, Grabato Dias, que o “poema cristaliza no sistema cúbico”, David Mestre continua inteiro, rouco e encharcado de emoção como seu verso é, Sísifo a segurar dos amigos o fígado ferido, afanoso na última magia, na implorante aproximação ao poema iniciático que restitua o sangue ao Seripipi e o ale ao céu da infância, ou irónico, impiedoso de bisturi para dizer o que lhe compete de real valor de certas obras e autores por mais monumentais que se apresentem.

Para completar este despropósito, confesso só que li estas “Lusografias Crioulas” com o mesmo prazer com que um dia, ainda a sair da adolescência, tropecei nos textos de Álvaro Lins, convivi com a peste e bebi da prosa do Eugénio Lisboa - ele desculpará este abuso de confiança - e , ao raio e à tempestade, se há ou não lusofonias, CPLPês de gravata e mercedes - que nunca se aventurem pelo túnel da Alma! - que a nós, desde há muito que nos deu o tranglomango , fosse no odor a cajú e iodo a mirar o poente na Cabaceira Grande, no coruscante púbis que uma tarde se confundiu com as algas na restinga mais recôndita da nossa memória, desarmados e nús para as invernias que hoje nos rondam, ele e nós, que somos do mato, de impérios naufragados e sonhos perdidos, aqui, como se estivessemos em parte nenhuma que é a parte toda, por milagre deste meu parente, o David Mestre, que bem merecia mais um copo.

Que de poética anda ele muito bem servido.

ULTIMA

A hora do fecho

José Mucavel recusou, segundo fontes, fazer parte do júri do Fama Show, o tal programa da espectaculosa televisão que roubou audiência à Nossa Televisão (TVM). Há quem diga que José Mucavel, um defensor da cultura genuína e do tradicional, não quis ver a sua imagem usada para promover génios da imitação e legitimar a fórmula ocidental de reality show que promete desvirtuar a nossa cultura.

Anda por aí um editor aflito desde que morreu um proprietário de uma discográfica… O tal editor, dizem as fontes, descobriu um unificador de castas.

O ministro tsunami vive um grande dilema. O povo ficou impressionado com as visitas-relâmpago a hospitais e aos telemóveis e carros arrancados na capital da nação. Mas os doadores desesperam porque vai tudo afunilar na secretária do ministro e o dinheiro não sai. Dizem que a execução orçamental não anda longe dos 10 porcento.

Agora que a bola da HCB está em Moçambique, aguarda--se com expectativa o posicionamento de Alec Erwin, o poderoso ministro das Empresas Públicas da África do Sul, o patrão indirecto da Eskom. Será que a dona Lulu já lhe telefonou?

Com as quedas dos primeiros PCA’s assiste-se a um frenesim só visto com a dança das cadeiras ministeriais em Janeiro. Jornalistas são solicitados a dar conselhos telefónicos e, num jornal da moda, há PCA’s em queda que tentam uma derradeira lavagem a ver se passam à fase seguinte. Como no Fama Show.

A roleta dos PCA’s continua a fazer vítimas, próxima paragem será no gigante estatal da área de seguros, lá para as bandas da baixa da cidade. Vai haver limpeza geral em todos os órgãos sociais, ninguém vai escapar, nem mesmo as figuras de proa do partido que dirigem ou fazem parte desses órgãos.

Em voz baixa

Um ministro, aliás, um vice-ministro nosso, muito trabalhador, ficou algumas horas a contas com as autoridades policiais sul-africanas. Este ministro do tio Guebas já foi governador na terra da

Page 32: “Caso Amin Nordine” - Moçambique para todosmacua.blogs.com/moambique_para_todos/files/savana_618.doc · Web viewE nós vamos tomar medidas para incentivar o sector privado português

laranja, lá pelas bandas do Centro do País. Confundiu as coisas. Saiu daqui a correr para encerrar umas contas da sua instituição na RAS. Não o conheciam e nem tinha mandato bastante para encerrar tais contas. Pensou que bastava chegar lá e dizer “I’m the boss of those guys” e tinha o assunto resolvido.

Chissano lança sua fundaçãoCom o intuito de promover a paz e desenvolvimento nas comunidades mais desfavorecidas, o antigo Presidente

moçambicano, Joaquim Chissano, lançou, esta semana, a sua fundação. A cerimónia teve lugar no Centro de Conferências Joaquim Chissano, onde várias personalidades se fizeram

presentes, como são os casos de embaixadores ocidentais e o Presidente da República, Armando Guebuza. O ex-chefe de estado moçambicano considerou que a promoção da cultura de paz no seio das comunidades, a eleva-

ção do conhecimento e valorização da cultura, bem como a afirmação da identidade cultural moçambicana e africana são factores fundamentais para o desenvolvimento das sociedades.

A fundação, que leva o nome do ex-chefe de estado moçambicano, pretende participar no fortalecimento dos alicerces do desenvolvimento futuro do País, da região da África Austral bem como do continente africano e mundo fora.

No que concerne ao desenvolvimento, Chissano disse que o principal alvo a atingir é a juventude, em particular a rapariga.

Defendeu que a mulher merece atenção da fundação devido às dificuldades que ela atravessa para o seu desen-volvimento tanto a nível escolar, na sociedade e até na família. “Olhamos mais para a rapariga porque é preciso trazer uma maior participação desta para dar mais espaço para o seu desenvolvimento, uma vez que é limitada a oportunidades”.

Para o funcionamento da FJC, o patrono conta com um conselho executivo a ser presidido por Leonardo Simão. Fazem parte dos sectores de administração e finanças individualidades como Verónica Macamo, Jamisse Taimo, Bento Balói, Castigo Langa, Tomás Mabuiangue, Carlos dos Santos, Fernando Pateguane, Carlos Tembe, Lourenço do Rosário, David Abílio, Neuza Matos, Daniel Gabriel, Fernanda Teixeira, entre outras personalidades.

No entanto, Chissano fez saber que, no que concerne à parte financeira para o funcionamento da fundação, ainda não existe algum valor disponível. “Para desenvolver as nossas acções contamos com parceiros nacionais e inter-nacionais que, à medida que formos a desenhar os nossos projectos, irão disponibilizando os fundos”, esclareceu.

Homenagens a Chissano Uma declaração audiovisual de Nelson Mandela, antigo Presidente sul-africano, apresentada por ocasião do lan-

çamento da fundação, destacou as qualidades de Joaquim Chissano, pessoa que Mandela considera “ser um homem de paz”.

“O Presidente Chissano mostrou há muito ser um homem de paz e preocupado com os outros”, disse Mandela na sua declaração. Ao conduzir o País para a paz, o Presidente Chissano estava a mostrar o seu inconformismo perante a si-tuação de falta de paz que impedia o seu desenvolvimento”, acrescentou Mandela.

“Chissano mostra, com esta fundação, que não precisa de estar no poder para se ser útil”, disse Mandela. Também foi lida uma mensagem do secretário geral das Nações Unidas, Kofi Annan, amigo incondicional de Joaquim

Chissano. “Estou muito satisfeito em saber que o meu amigo Joaquim Chissano está a promover a paz e o desenvolvimento nesta sua fundação”, lê-se na mensagem de Annan.

SM e RB