Catálogo da exposição individual Onde Não Pensamos de Marcelo Leães

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ONDE NÃO PENSAMOS

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Realizada na Galeria dos Arcos da Usina do Gasômetro, via edital público, entre os dias 04 de outubro e 04 de novembro de 2012 em Porto Alegre (RS - Brasil)

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ONDE NÃO PENSAMOS

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ONDE NÃO PENSAMOS

BsAs (2011) 100cm x 91cm, fotografia digital

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Sem título (2012)140cm x 70cm, aço e vidro

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De modo espontâneo, a fotografia permeia minha pesquisa acerca do mundo. Quando comecei a buscar de onde vinha o meu despertar pelas imagens descobri que, desde pequeno, me interessavam as paisagens, as formas geométricas, as expressões do ser humano. Lembro-me do meu interesse por uma velha máquina fotográfica. Aos 9 anos de idade ganhei uma Polaroid que testemunhava, principalmente, alguns instantes do meu cotidiano. Com máquinas fotográficas analógicas passei a fotografar viagens que fazia com a escola, um show musical de música folclórica, viagens de campeonatos de padel e viagens ao exterior.

Já maior, passei a me interessar pelo fragmento do mundo em que vivemos e que, em forma de edição, elegemos para ser capturado pela máquina fotográfica. Fui movido pela vontade de construção de uma lembrança, de um arquivo imagético com a pretensão de que essas fotografias me ajudassem a evocar novas lembranças ao serem revisitadas. Situações especiais e que poderiam sucumbir ao esquecimento. Amigos, pessoas, objetos, lugares, clima, tempo: tudo isso cativava a conduta de carregar uma máquina fotográfica compacta digital ou analógica e, mais tarde, profissional. Descobri, mais tarde que essa escolha, esse fragmento-recorte do mundo, não é aleatório. Fotografo aquilo que me instiga no mundo e que diz respeito a uma experiência emocional, um acontecimento.

Freud, em seu texto “O Eu e o Id” - de 1923 - nos coloca que o pensar em imagens se acha mais próximo dos processos inconscientes e é mais antigo, ontogenética e filogeneticamente, do que o pensar em palavras. Em certa medida, o olhar se antecipa à apreensão da palavra no desenvolvimento do ser humano e a experiência emocional do indivíduo já nos acompanha desde o nosso nascimento.

Elegemos uma das partes para onde se direciona nossa atenção no cotidiano. Somos educados para isso. Na mostra Onde Não Pensamos apresento uma instalação em vidro e aço e 13 imagens em que enfatizo esse instante radical de condensação de cenas. E no registro fotográfico esses dois instantes - condensados - formam, então, um único. Assim, fragmenta a questão da objetividade da fotografia em registrar apenas aquilo que se situa diante do espectador. Nessa série fotográfica está representado o que está à frente do fotógrafo e também o que está diagonal a ele. A fotografia entra em crise. O espectador se depara, percebe e, como em um abismo entre a imagem e a palavra, constrói o que é o seu significado. O significado para si-mesmo. Daí parte meu interesse em trabalhar essas

Por que fotógrafo?

fotografias: não a respeito do conteúdo ou da representabilidade dos elementos que as compõem. Trata-se da questão de uma nova forma que o registro fotográfico cria nessa nova imagem. São instantes fotográficos. Experiência comum a todos nós. Não se trata de duas imagens diferentes que são, por meio eletrônico ou por dupla exposição, sobrepostas. São instantes.

A captura das fotografias se dá através da deriva. Um processo inserido na multiplicidade dos lugares da cidade. A instalação se propõe a trazer a experiência da condensação para dentro do espaço expositivo.

A estrutura de três vidros de mesmas dimensões, posicionados de forma paralela, permite ao espectador ver-se em sua imagem difusa, condensada em novas imagens de si mesmo.

São imagens que considero peculiares, que comumente não selecionamos ao estarmos imersos na racionalidade do cotidiano. O psiquismo adquire uma limitação quando consideramos a percepção racional. Somos, antes disso, seres de desejos, movidos por processos para além do pensar racional, somos sujeitos de processos de “onde não pensamos”.

Kitchen (2011) 100cm x 71cm, fotografia digital

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Sem título (2012)100cm x 67cm, fotografia digital

Bustop (2011)100cm x 73cm, fotografia digital

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Tania Rivera*

Imagem sobre imagem. Na fotografia de Marcelo Leães as imagens urbanas da vida cotidiana duplicam-se, abrindo súbitas janelas sobre elas mesmas que as transformam e remetem para outra coisa que não está lá (seria isso o inconsciente? O real?).

A fotografia revela então sua verdade: ela não é uma mera projeção da realidade em um plano bidimensional. Antes, ela desfolha o real e faz ver sua surpreendente pluralidade. A realidade talvez consista em uma montagem complexa de infinitas facetas – para a maioria das quais, de hábito, nos cegamos, na exigência de unificar o mundo. Até que, de repente, as condensações de Leães abrem nossos olhos para a apresentação de um breve instante nesse belo e complexo jogo de sobreposições, nessa escrita em móvel palimpsesto.

Como dizia Walter Benjamin, a fotografia implica um “inconsciente ótico”. Ali “onde não se pensa”, olha-se.

Se a imagem se reflete, é na medida em que, como mostra a etimologia de reflexo, algo nela dobra-se, repetidamente. Não há passagem direta entre o mundo e a imagem, mas sim uma certa inflexão, uma quebra capaz de desdobrar a própria realidade (como um vidro). No surpreendente espaço que essa dobra constroi dentro de si, nesse transparente intervalo, sou por um momento convidada a alojar-me entre imagens. “Penso onde não sou, logo sou onde não penso”, dizia Lacan reformando Descartes. Ou melhor: Olho onde não se pensa, logo ali aconteço, diriam as imagens de Leães.

O Lugar da Transparência

A condensação é o mais importante mecanismo do trabalho inconsciente, ao lado do deslocamento, do qual Freud se ocupa bem menos. Ela consiste em sobrepor ou unir diferentes pensamentos em um mesmo elemento do sonho, formando pontos em que sua trama torna-se mais densa e mostra-se impossível de interpretar. São justamente essas zonas opacas que levam Freud a falar em “umbigo do sonho”, ponto em que ele mergulha na obscuridade e convoca o corpo e a ligação ao outro (a metáfora do umbigo é loquaz) a se materializar em imagem.

A condensação talvez seja um momento de estranho encontro de si, nas imagens do mundo. Com André Breton, podemos afirmar que essas fotografias nos lembram que “nada do que nos cerca nos é objeto, tudo nos é sujeito”.

*Tania Rivera é psicanalista, ensaísta e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF).Sem título (2011)

100cm x 66cm, fotografia digitalSem título (2012)

100cm x 67cm, fotografia digital

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Crossing II (2012)100cm x 74cm, fotografia digital

Crossing (2012)100cm x 72cm, fotografia digital

Bloco mágico (2011)100cm x 66cm, fotografia digital

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Esguio (2012)100cm x 87cm, fotografia digital

Sunsets (2012)100cm x 66cm, fotografia digital

Bloco mágico II100cm x 66cm, fotografia digital

Crossing III (2012)100cm x 67cm, fotografia digital

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Nascido em Porto Alegre/RS (1981), o artista vive e trabalha em Porto Alegre, onde desenvolve seu trabalho de fotógrafo e psicanalista. Formou-se em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e realiza formação em Psicanálise no Centro de Estudos Psicanalíticos de Porto Alegre (CEPdePA).

Exposição individual: “Onde Não Pensamos” (Galeria dos Arcos da Usina do Gasômetro, Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Porto Alegre/RS, 2012).

Exposição coletiva: “Bienal B” com o projeto A Fotografia em uma pesquisa-intervenção com o coletivo de jovens da Vila Bom Jesus de Porto Alegre. (Casa do Budha Khe Rhi, Porto Alegre/RS, 2008).

Paulo Ernesto Leães, Maria da Graça Lubisco Leães, Luciano Lubisco Leães, Nathalia García, Gerson Marques, Leo Felipe, Guilherme Dable, Paula Ramos, Lurdes Krás, Marcus Mello, Bernardo Jose de Souza, Juliana Costa, Fábio Cabral, Cristiano Soares, Luiz Antonio Camargo, Beto Santos, Julio Cesar Conte, Sueli Santos, Danilo Christidis, Anderson Astor, Marcos Sari, Bel Cestari, Frederico Vittola, Marcel Dallagnol, Gabriel Pereyron, Prefeitura Municipal de Porto Alegre e Guarda Municipal.

Apoio: Realização:

Marcelo Lubisco Leães

Agradecimentos

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