Categorização de Generos músicais na Internet
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Referncia para citaes:
AMARAL, Adriana. Categorizao dos gneros musicais na Internet - Para uma etnografia virtual
das prticas comunicacionais na plataforma social Last.FM. In: FREIRE FILHO, Joo,
HERSCHMANN, Michael. (Org.). Novos rumos da cultura da mdia. Indstrias, produtos e
audincias. 01 ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2007, v. 01, p. 227-242.
Categorizao dos gneros musicais na Internet - Para uma etnografia virtual
das prticas comunicacionais na plataforma social Last.FM
Autora: Adriana Amaral1
Resumo:
O presente artigo tem como objetivo identificar processos comunicacionais utilizados nas prticas
de categorizao dos gneros musicais que ocorrem por conta dos usurios na Internet, no contexto
colaborativo da Web 2.0. As sociabilidades que emergem a partir de uma anlise netnogrfica
(Kozinets, 2002, Hine, 2000) do site Last.Fm (www.last.fm) so descritas em uma proposta de
folksonomia, em suas prticas de organizao, indexao, busca e categorizao dos gneros. Por
um lado, incorporam e remediam (Bolter, 1999) antigos hbitos da crtica musical, como a
construo e popularizao de termos e, por outro, permitem as relaes cybersubculturais (Caspary
e Manzenreiter, 2003, Amaral, 2007) atravs de tais afinidades, funcionando ora como
recomendaes (Anderson, 2006) ora como codificadores sintticos de um gnero ou subgnero,
tornando-se uma espcie de moeda corrente para uma reputao online e offline que visa ao
pertencimento naquele universo.
Palavras-chaves: comunicao; folksonomia; cibercultura; tags; gneros musicais; sociabilidade
Abstract: This papers goal is to identify communicational processes used in the practices of
tagging musical genres by Internet users inside Web 2.0s collaborative context. The sociabilities
that emerge from our nethnographic analisys (Kozinets, 2002, Hine, 2000) from the Last.Fm
(www.last.fm) social plataform are described as a folksonomy proposal, in its prcatices of
organization, indexation, search and tagging of genres. In one sense, they incorporate and re-
mediate (Bolter, 1999) critical music journalim old habits, such as the construction and the
popularization of tags and, on the other hand, it functiones as cybersubcultural (Caspary e
1 Doutora em Comunicao Social pela PUCRS com Doutorado Sanduche pelo Boston College, Estados Unidos (Bolsa CNPq). Professora e Pesquisadora do Mestrado em Comunicao da UTP-PR. Autora de Vises Perigosas uma arque-genealogia do cyberpunk (Ed. Sulina, 2006). Email: [email protected] Blog: http://palavrasecoisas.blogspot.com
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Manzenreiter, 2003, Amaral, 2007) relations throughout its affinities, working as recomendations
(Anderson, 2006) as also summarized codifiers of a genre or subgenre, emergind as a kind of coin
of exchange for the online and offline reputation of belonging into that particular universe.
Key-words: communication; folksonomy; cyberculture; tags; musical genres; sociability
Introduo
A explicao interpretativa (...) um sistemtico desfazer de malas no mundo conceptual (Geertz, 2000, p. 37)
A segmentao dos gneros e subgneros musicais em cenas um fenmeno que acontece
desde os primrdios do consumo da msica e das primeiras manifestaes culturais juvenis. Nos
ltimos anos tem-se observado que gneros como o rock e a eletrnica possuem uma tendncia
segmentao extrema, seja no cotidiano dos shows e clubs ou na construo de perfis e avatares nas
plataformas de redes sociais como Orkut, MySpace, Last.fm, etc. A proposta de apresentar como
funciona a folksonomia enquanto prtica e mtodo de categorizao colaborativa a partir do uso de
tags livremente escolhidas (Palmer, 2006) enquanto um processo comunicacional auxiliar
formao de gneros e subgneros musicais, proporcionado por plataformas sociais na Internet
como no caso do Last.fm, objeto das reflexes aqui descritas.
Em estudos recentes (Amaral, 2007a, 2007b) problematizei o uso do termo cena e do termo
cybersubcultura em relao s apropriaes dos mesmos nas plataformas de redes sociais na
Internet, como por exemplo, o MySpace (www.myspace.com), analisando as especificidades da
chamada subcultura electro-goth ou electro-industrial. O presente artigo d continuidade a essas
pesquisas, em busca de um mapeamento dos perfis de consumo de seus participantes a partir de
suas prticas comunicacionais nas plataformas sociais, tensionando a anlise netnogrfica (ou
etnografia virtual) e os estudos ps-subculturais com as teorias da cibercultura.
A chegada da Internet colocou um desafio significante para a compreenso dos mtodos de pesquisa. Atravs das cincias sociais e humanidades as pessoas se encontraram querendo explorar as novas formaes sociais que surgem quando as pessoas se comunicam e se organizam via email, websites, telefones mveis e o resto das cada vez mais mediadas formas de comunicao. Interaes mediadas chegaram dianteira como chave, na qual, as prticas sociais so definidas e experimentadas. 2
2 Traduo da autora: The coming of the Internet has posed a significant challenge for our understanding of research methods. Across the social sciences and humanities people have found themselves wanting to explore the new social formations that arise when people communicate and organize themselves via email, web sites, mobile phones and the rest of the increasingly commonplace mediated forms of communication. Mediated interactions have come to the fore
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(Hine, 2005, p.01)
Esse texto um relato emprico- descritivo, advindo das observaes anotadas no dirio de
campo durante os meses de junho, julho e agosto das interaes via Last.Fm dos participantes dessa
mesma cybersubcultura3 no contexto brasileiro e a partir das intervenes e trocas entre os
informantes da pesquisa4 e a pesquisadora via rede. Os contatos aconteceram tanto no online;
atravs de mensagens no prprio site em questo como em outros perfis de outros sites, listas de
discusso (em especial as listas Rejekto5, Sinthetique e A Industrya), blogs especficos, emails e
chats via msn, etc como no offline em alguns espordicos encontros como por exemplo no
Industrial Noise Fest6.
Tais prticas foram observadas no contato dirio da pesquisa a partir do perfil construdo
pela prpria pesquisadora7, que funcionou como um dos primeiros contatos com os informantes da
netnografia e possibilitou algumas trocas iniciais, estabelecendo a relao de confiana mtua e
reciprocidade. Esse texto constitudo basicamente de apontamentos retirados do dirio de campo
da pesquisa, elemento essencial para qualquer etnografia, e que, nos domnios do ciberespao e da
etnografia virtual, encontra-se disperso em descries, anlises, levantamentos de hipteses e
questionamentos fragmentados escritos em blogs, fruns, listas de discusses e perfis em websites
de plataformas sociais na Internet.
Netnografando os aplicativos do Last.fm: etiquetagem, rastreamento e distintivos
O estudo interpretativo da cultura representa um esforo para aceitar a diversidade entre as vrias maneiras que seres humanos tm de construir suas vidas no processo de viv-las. (Geertz, 2000, p. 29)
O presente artigo, de cunho essencialmente descritivo-interpretativo apresenta nossa entrada
em campo ou entre cultural (Kozinets, 2002), conforme proposta por diversos etngrafos, o
momento no qual descrevemos algumas prticas comunicacionais utilizadas pelos participantes da
subcultura electro-industrial atravs do site Last.fm (www.last.fm). Essa entrada em campo se d a
partir da anlise da construo dos seus perfis e, principalmente, dos usos de uma gama de recursos as key ways in which social practices are defined and experienced. (Hine, 2005, p.01)
3 Para uma compreenso mais descritiva da cybersubcultura em questo ver Amaral, 2007a e 2007b4 Sejam eles produtores, DJs, artistas, participantes em geral, jornalistas, etc. 5 http://rejekto.com 6 O primeiro Festival Industrial/noise de Curitiba foi realizado nas datas 29 e 30 de junho de 2007 no Poro Rock Club. Foram duas noites s com a temtica industrial/noise/eletrnica alternando discotecagem e bandas se apresentando. As informaes completas sobre o evento foram disponibilizadas somente no online, a partir de scraps e da comunidade no Orkut, disponvel no endereo http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=28313171 Acesso 12/07/2007. 7 Disponvel em http://www.last.fm/user/AdriAmaral
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como o social tagging8, o scrobbling e os widgets . Vejamos brevemente as funes de cada um:
Social Tagging: Sistemas de etiquetagem social, como ns nos referimos a eles, permitem
que os usurios compartilhem suas tags como recursos particulares. Alm disso, cada tag serve
como um link para recursos adicionais etiquetados da mesma forma pelos outros9.(Marlow et al
2006, Online);
Scrobbling:10 Plug-in de rastreamento dos softwares de leitura de arquivos de msica (mp3,
wav) que esto na mquina do usurio a partir dos programas de udio como o Windows Mdia
Player, o Winamp, iTunes, etc. De acordo com o FAQ11 do Last.fm,
Scrobbling (Rastrear) uma cano significa que quando voc a escuta, o nome da cano enviado ao Last.fm e adicionado ao seu perfil musical. Uma vez que voc tenha entrado e baixado o plug-in, voc pode rastrear as canes que voc escuta no seu computador ou iPod automaticamente. Comece voc a rastrear e veja quais artistas voc escuta mais. As canes que voc ouve tambm aparecero no seu perfil para que os outros vejam. Milhes de canes so rastreadas todos os dias. Esses dados ajudam o Last.fm a organizar e recomendar msicas s pessoas; ns tambm o utilizamos para criar estaes de rdio personalizadas, e muito mais alm disso12.
Widgets: De acordo com o Longman Dictionary of Contemporary English um termo
informal utilizado para se referir: 1) a uma pequena pea de equipamento que no sabemos o nome
2) a um produto imaginrio que uma companhia poder vir a produzir13. No campo da informtica,
ele adquire um sentido diferente, existindo diversos tipos como de interface grfica, de mecanismo
ou da web.
Segundo a Wikipdia, o Webwidget, que o caso aqui utilizado no site Last.fm um
pedao porttil de cdigo que pode ser instalado e executado dentro de qualquer pgina de web
8 Optamos por no traduzir nenhum dos recursos descritos, mas o mais aproximado seria etiquetagem social. 9 Traduo da autora: Social taggin systems , as we refer to them, allow users to share their tags for particular resources. In addition, each tag serves as a link to additional resources tagged the same way by others. (Marlow et al 2006, Online)
10 No h similar em portugus para essa palavra, especfica da Internet, utilizaremos a palavra rastreamento apenas para compreenso didtica do termo. 11 Frequently Asked Questions = Questes mais perguntadas.12 Scrobbling a song means that when you listen to it, the name of the song is sent to Last.fm and added to your music profile.Once you've signed up and downloaded Last.fm, you can scrobble songs you listen to on your computer or iPod automatically. Start scrobbling yourself, and see what artists you really listen to the most. Songs you listen to will also appear on your Last.fm profile page for others to see. Millions of songs are scrobbled every day. This data helps Last.fm to organise and recommend music to people; we use it to create personalised radio stations, and a lot more besides. Disponvel em: http://www.last.fm/help/faq/ Acesso em 10/08/2007 13 LONGMAN, 2005, p. 1886.
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baseada em HTML separada por qualquer usurio sem requerer compilao14 adicional. Eles so
derivados a partir da idia de cdigo re-utilizvel que existe h anos. Por exemplo, o primeiro
produto a usar o termo foi um produto comercial de 1995, chamado Web Widgets15, que eram
plugins ou extenses que permitiam aplicaes no desktop de acesso web. Atualmente outros
termos so usados para descrever os web widgets, incluindo: gadget, distintivo, mdulo, cpsula,
snippet, mini e flake. Web widgets quase sempre usam as linguagens de programao Adobe Flash
ou JavaScript. Usurios finais podem utilizar Web Widgets para aumentar o nmero de servidores
baseados na Web ou alvos. A serem atingidos. Categorias de alvos a serem atingidos incluem redes
sociais, blogs, wikis e pginas pessoais16.
No caso do Last.fm, a maior parte dos widgets oferecidos so do tipo badge (distintivo) para
ser disponibilizado no blog (LiveJournal, Blogger, Wordpress), pgina pessoal, fotolog, perfil em
outros sites (MySpace, FaceBook) com as msicas mais ouvidas do ms ou as msicas que esto
sendo ouvidas em tempo-real e at mesmo a possibilidade de disponibilizar uma rdio online com
as msicas favoritas e/ou escolhidas pelo usurio. H possibilidade desses widgets serem
atualizados via RSS ou XML. O site tambm permite integrao com o sistema de micro-blogging
Twitter17.
14 Um compilador um programa de computador (ou um conjunto de programas) que traduz texto escrito em linguagem de computador (a linguagem fonte) para outra linguagem de computador (a linguagem do alvo). http://en.wikipedia.org/wiki/Compiler
15 http://www.v-graph.com/vgraphinc/Webwidget.htm 16 Traduo da autora: A web widget is a portable chunk of code that can be installed and executed within any
separate HTML-based web page by an end user without requiring additional compilation. They are derived from the idea of reusable code that has existed for years. For example, the first product to use that term was a commercial product from 1995, called Web Widgets [1], which were plugins or extensions that allowed desktop applications to access the web. Nowadays other terms are used to describe a web widget including: gadget, badge, module, capsule, snippet, mini and flake. Web widgets often but not always use Adobe Flash or JavaScript programming languages. End users can utilize Web Widgets to enhance a number of web-based hosts, or drop targets. Categories of drop targets include social networks, blogs, wikis and personal homepages . Disponvel em: http://en.wikipedia.org/wiki/Web_widget Acesso 12/08/2007.
17 http://twitter.com
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Printscreen do Gerador de Widget do Last.fm em 30/08/0718
Print Screen da disponibilizao do widget de playlist do last.fm direita no blog mentecapto.com19
Uma breve arqueologia do compartilhamento de perfis musicais no Last.fm
Aps observamos ento alguns de seus principais aplicativos, passamos a uma breve
arqueologia do site e do comportamento de compartilhamento dos perfis disponveis observados.
Em princpio, meu primeiro contato com o mesmo aconteceu em meados de 2004, quando o site
ainda se chamava Audioscrobbler e no qual criei um perfil. A senha desse perfil foi perdida e minha
antiga mquina formatada, posteriormente deletei o antigo perfil. O Last.fm foi fundado em 2002 na
Inglaterra e uma das maiores plataformas sociais de msica com 15 milhes de usurios ativos em
mais de 232 pases. Em 30 de maio de 2007, ele foi adquirido pela CBS Interactive pelo valor de
280 milhes de dlares, considerada a maior compra europia at o momento20.
Para ingressar no site preciso criar uma conta/perfil, enfatizando os estilos e gostos
musicais e, efetuar o download do plugin (o audioscrobbler) que, uma vez instalado rastreia todas as
msicas escutadas e as disponibiliza online, para compartilhamento das listas e tags com outros
usurios do programa. A partir dessa anlise do artista/nome da msica, o site indica uma gama de
informaes como o nome do lbum, data, fotos, releases e outros artistas similares (todas essas
informaes construdas a partir dos dados e tags disponibilizadas pelos prprios usurios da
18 http://www.last.fm/widgets/ 19 http://mentecapto.com/ 20 Informaes provenientes da Wikipedia http://en.wikipedia.org/wiki/Last.fm Acesso em 15/08/2007
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plataforma). O Last.fm como conhecemos atualmente foi uma fuso de duas fontes diferentes que
aconteceu em 2005: entre o plugin audioscrobbler (criado pelo estudante de cincias da computao
ingls Richard Jones) e a plataforma social Last.fm (uma espcie de rdioweb construda pelos
austracos e alemes Felix Miller, Martin Stiksel, Michael Breidenbruecker e Thomas Willomitzer),
cujo nome mais sonoro acabou batizando oficialmente a comunidade21, cujo slogan a prxima
revoluo social22.
Em 24 de janeiro de 2007, criei um novo perfil j com inteno de anlise do site, e a partir
dele comecei a estabelecer algumas anotaes e anlises acerca dos comportamentos e experincias
geradas nos perfis para fins netnogrficos como pesquisadora e participante23 da cena electro-
industrial. O perfil do Last.fm que exibido online (existe um painel dashboard com
configuraes exclusivas do usurio no ser analisado aqui) igual para todos os seus membros
(no so permitidas alteraes de cores e layout, ao contrrio do MySpace, por exemplo) e
constitudo do perfil no qual so inseridos os dados/fotos no canto esquerdo da tela; ao centro as
ltimas msicas rastreadas, logo abaixo as msicas mais ouvidas da semana e as mais ouvidas em
geral (desde o incio da conta). No perfil recebemos a mensagem de quantas msicas foram
rastreadas ao total e, a possibilidade de ingressar em grupos/comunidades de estilos como
Industrial, EBM, Techno, Indie Rock, etc. Abaixo do perfil h a lista de tags favoritas do usurio,
categorizando os artistas a partir dos gneros e subgneros escolhidos por ele/ela.
Perfil bsico do usurio do Last.fm wandeclayt
No canto superior direito temos uma shoutbox (espcie de bloco de recados onde os usurios
21 Mais detalhes em http://en.wikipedia.org/wiki/Last.fm 22 Mais uma vez observamos que o discurso das tecnologias como revolucionrias usado como slogan de marketing. 23 As fronteiras entre pesquisador-pesquisado ainda no esto sendo colocadas em questionamento nesse momento da
pesquisa, mas j foram pontuadas para futuras contribuies epistemolgicas e ticas.
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podem se comunicar em tempo real caso estejam online). Logo abaixo disso, existem os perfis dos
amigos e mais abaixo, os vizinhos, que aparecem randomicamente a partir da compatibilidade
musical com o perfil em questo. Tambm desse mesmo lado h um Gostmetro (Taste-o-meter)
onde possvel calcular o grau de compatibilidade musical com qualquer usurio da plataforma,
que tambm mede os principais artistas em comuns.
Alm dos widgets produzidos pelo prprio site, os grupos de usurios tambm produzem os
seus prprios aplicativos. Entre os mais recentes est o Mainstream-o-meter24, o medidor de
porcentagem do quo mainstream o seu perfil e no qual a anlise calculada de acordo com o
aparecimento de determinados artistas mais populares (ou comerciais) naquela semana.
O fato dos usurios do site construrem uma ferramenta que permite visibilizar tais
caractersticas, eminentemente valorativas, aponta para a dicotomia entre mainstream ou
underground25, parecendo bem sintomtico das configuraes e construes de informaes
musicais que constituem os perfis que se apresentam na plataforma, enquanto valores a serem
medidos e compartilhados com os outros na cultura das redes. Esse fator serve para demonstrar
como na msica popular massiva h uma tenso entre o sistema de produo/circulao das grandes
companhias musicais (mainstream) e sua contrapartida, o consumo segmentado (underground) que
acaba sendo uma espcie de espao mtico na trajetria de expresses musicais (Cardoso Filho e
Janotti Jnior, 2006, p. 18)
Alm disso, a plataforma dispe de recursos como a construo de um blog26, agenda de
shows e eventos, caixa de emails privada (recurso no muito utilizado pelo que constatamos em
uma primeira anlise), recomendaes musicais que podem ser enviadas a outros usurios, vdeos
que podem ser disponibilizados em outros perfis ou blogs do usurio, grupos/comunidades de
discusso, rdios online, widgets (com a disponibilizao das tabelas, grficos e outros recursos)
entre outras ferramentas.
24 Disponvel em http://mainstream.vincentahrend.com/ Acesso em 20/08/07. 25 As discusses acerca das tenses underground versus mainstream no sero abordadas nesse artigo por escapar ao
escopo de nossa anlise no momento, centrada na questo das importncias das tags na categorizao dos gneros musicais na Internet. No entanto, voltaremos a esse debate nos prximos artigos. Para mais referncias ver Amaral (2007a) e Cardoso Filho e Janotti Jnior (2006).
26 Observamos que, por um lado, esse recurso muito mais utilizado para postagem de dicas musicais, indicaes, recomendaes de shows, artistas e, de outro lado, como espao para postagem de press-releases sobre os artistas e datas de shows (esse caso especfico ocorre quando o perfil do usurio tambm um instrumento de divulgao do trabalho artstico-musical do mesmo. Por exemplo: perfis de integrantes de bandas , Djs, produtores musicais, etc.
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Tags e a co-produo na folksonomia de gneros musicais
No entanto, o elemento hierarquicamente que mais se destaca no funcionamento da
folksonomia e na dinmica social da plataforma, bem como para a gerao, busca e resgate das
informaes musicais a tag.
A web 2.0 traz uma nova forma de registro, organizao e recuperao de informaes que funciona com base no hipertexto, subverte antigas formas de taxonomia e converge com os ideais de cooperao derivados da noo de web 2.0: a folksonomia, que traduz o neologismo entre os termos folk e taxonomia. (...) Trata-se de um sistema de indexao de informaes que permite a adio de tags (etiquetas) que descrevem o contedo dos documentos armazenados. Baseada na livre organizao, a folksonomia traz um novo tipo de link, a tag, criada pelos prprios usurios da web, que assim, de forma coletiva registram, organizam e recuperam os dados na Rede. (Aquino, 2007, online)
Essas tags construdas completamente pelos usurios do site (em contraponto ao sistema do
MySpace, que, por exemplo, possui um nmero fixo de tags oferecidas) que permitem a criao e
a co-produo de um imenso banco de dados sobre os artistas, gneros, subgneros, a partir dos
algoritmos desenvolvidos pelos programadores do site (cuja sede fsica est em Londres).
O Last.fm apia o tagging ou rotulao de artistas, lbuns e faixas pelos usurios finais para criar uma ampla folksonomia de msica. Os usu-rios podem buscar via tags, mas o mais importante benefcio a tag de r-dio, que permite aos usurios tocar a msica que foi etiquetada de uma certa maneira. Esse tagging pode ser feito por gnero (garage rock), humor , ca-racterstica do artista ou qualquer outra forma de classificao definida pelo usurio (como por exemplo, vi ao vivo). Entretanto, uma vez que o tag-ging no moderado, possvel a manipulao pelos usurios do site, quase sempre resultando em discordncia de gneros entre os usurios ou empur-rando certos artistas para promover certas tags (o exemplo mais conhecido foi ter colocado Paris Hilton no topo da tag de death metal brutal)27.
27 Traduo da autora: Last. Fm supports user-end tagging or labeling of artists, albums, and tracks to create a site-wide folksonomy of music. Users can browse via tags, but the most important benefit is tag radio, permitting users to play music that has been tagged a certain way. This tagging can be by genre ("garage rock"), mood ("chill"), artist characteristic ("baritone"), or any other form of user-defined classification ("seen live"). However, since the tagging is not moderated, it is prone to manipulation by the site's users, most often resulting in genre disagreements among users or pushing certain artists higher up certain tags (the most well known example of this is boosting Paris Hilton to the top of the "brutal death metal" tag). Disponvel em http://en.wikipedia.org/wiki/Last.fm#Tags Acesso em 15/08/07.
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Essa co-produo entendida aqui no sentido da inspirao dos escritos antropolgicos
sobre etnografia em mltiplos lugares, um processo de produo em conjunto disparada por vrios
atores sociais que pode abranger os hyperlinks como suas expresses. Esse conceito de co-
produo ecoa o trabalho de natureza distribuda da cognio. (...) co-produo enquanto um
processo de mltiplos atores criando um repertrio cultural que pode ser baseado nos atores
singulares (Forte, 2005, p. 97)28.
A possibilidade de co-produo altera a indexao, as buscas e a prpria organizao da web
e vista positivamente pela comunidade. Em uma entrada recente no blog insitucional do Last.fm29,
um dos membros da equipe agradece a colaborao dos taggers (os usurios que produzem as
tags). As tags no precisam necessariamente estar vinculadas com o gnero/estilo musical em si e,
podem, agregar valores subjetivos como breakfast radio (rdio do caf da manh), msicas que
eu amo, etc. No caso especfico da cenas electro-goth/industrial, temos os estilos base como EBM,
electro, industrial, gothic rock, synthpop e fuses e apropriaes entre duas ou mais tags como
electro-industrial, TBM (Techno Body Music ou Terror Body Music), industrial-rock (industrial +
rock), dark-electro (darkwave + electro), gothabilly (goth + psychobilly), etc. As discusses sobre a
natureza e autenticidade dos subgneros acaba sendo discutida em vrios fruns e no apenas no
Last.fm apontando uma multiplicidade de um determinado grupo em desdobrar-se em distintos
locais e redes.
A partir do recurso das widgets, essas playlists podem ser disponibilizadas nos sites,
blogs, fotologs, perfis em outros sites como no MySpace, Facebook, entre outros, permitindo trocas,
conexes e interaes entre as diferentes redes, perfis e usurios (seja de uma mesma cena ou de
uma cena diferente), convergindo gostos e funcionando como elemento de auto-apresentao e
auto-promoo (Hine, 2000).
Uma questo intrigante o fato dessa auto-apresentao estar ou no de acordo com outros
traos distintivos dos prprios perfis seriam essas manifestaes de autnticos participantes das
cybersubculturas? - como leituras, filmes, locais freqentados, festas, shows, estilo visual das fotos
inseridas. Esse agir de acordo ou dever ser do participante offline com o perfil/avatar
construdo aponta para a questo das hierarquias e das autenticidades dentro das cenas
28 Traduo da autora: This concept of co-production echoes work on the distributed nature of cognition.(...) co-production as a process of multiple actors creating a cultural repertoire that can then be drawn upon by singular actors. (Forte, 2005, p. 97)
29 disponvel em http://blog.last.fm/ Acesso 24/08/07.
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(detalhadamente analisadas por Caspary & Manzenreiter na cena noise japonesa e por Thornton na
cena clubber inglesa dos anos 90, respectivamente).
Um exemplo de que esse tipo de comportamento est intimamente relacionado aos usos dos
dispositivos tecnolgicos encontra-se no fato de que muitos usurios desligam o audioscrobbler
(rastreador) quando vo escutar alguma msica/artista que parece no combinar com o perfil
desejado. Essa informao surgiu em momentos distintos atravs de comentrios na minha
shoutbox (caixa de recados) feito por dois informantes de dentro da cena: me alertando para o fato
de um artista que havia recm sido escutado no ter nenhuma relao com o resto de meu perfil
musical e um outro comentando que eu deveria utilizar o recurso de desligar o plugin.
A era das recomendaes - remediando a crtica musical
No incio de nossa explorao etnogrfica eu falava da importncia do processo de
categorizar gneros, subgneros e cenas em palavras-chaves ou etiquetas pelos usurios-
participantes para podermos compreend-las e mantermos uma espcie de briefing mental do estilo
procurado.
Recommendations are calculated using a collaborative filtering algorithm so users can browse and hear previews of a list of artists not listed on their own profile but which appear on those of others with similar musical tastes. The page also lists music that has been directly recommended to the user and groups the user belongs to, journals written by users about artists the user listens to, and other users who have listened to similar music recently. There is also a 'recommendation radio' station which will play music specifically filtered based on the user's last week of listening. Last.fm also permits users to manually recommend specific artists, songs or albums to other users on their friends list or groups they belong to, providing the recommendation in question is included in the Last.fm database30.
A possibilidade de recomendao, quando vinda de participantes da cena (ou mesmo de um
algoritmo que calcula as recomendaes desses membros, adquire um status mais forte que a
recomendao de um veculo de mdia massiva ou mesmo um veculo segmentado. Nesse sentido, a
proposta de Anderson (2006) de que o marketing e o consumo na cauda longa da Internet funciona
na base das recomendaes, a partir de quem constri a credibilidade dentro dos nichos e subnichos,
pde ser observado a partir do momento que meu perfil no Last.fm foi construdo. medida que os
contatos com os informantes aumentam e que minha participao nas discusses e debates em 30 http://en.wikipedia.org/wiki/Last.fm#Features
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foruns, blogs e listas vai sendo ampliada, perceptvel o aumento de adies de perfis de amigos ao
meu, por conta de membros dos mesmos grupos (as listas rejekto, sintethique e a visita alguns blogs
musicais por exemplo). Alm disso, as prprias recomendaes do site (como descritas no
pargrafo acima) corroboram esse fato.
Nesse sentido, observamos que o fortalecimento dos laos e relaes online se d por uma
diversidade de plataformas que vo sendo construdas nos interstcios entre online e offline, nas
afinidades entre os perfis que vo sendo desveladas ao adicionar e ser adicionado em uma
comunidade, lista ou num comunicador instantneo. Dessa forma, todos os participantes-usurios da
cena assumem potencialmente e num determinado limite de espao-tempo o papel de crtico
musical e daquele que pode fazer as recomendaes musicais a partir da subjetividade do gosto
pessoal e das afinidades de gneros musicais, no mais dependendo da mdia especializada para tais
observaes, mas sim optando pela co-produo atravs de espaos de recomendao e interesses.
Assim, nos processos de social tagging apontados nessa explorao netnogrfica inicial do
site Last.fm observamos as trocas entre os participantes da cena electro-industrial a partir do
intercmbio de links em formas de tags que servem como proposies de categorias para os
diferentes gneros musicais a ela associados (como synthpop/futurepop, EBM/TBM, electro,
industrial, electro-industrial, industrial rock, etc).
Essas prticas comunicacionais ao mesmo tempo em que constituem novas formas de
sociabilidade, alm de tomarem para si em um espao e tempo determinado, o papel de formadores
de opinio e indicadores de novidades ou clssicos a serem compartilhados, alm de disseminar
e/ou popularizar termos desconhecidos da audincia comum. Por outro lado, elas incorporam
mediaes previamente conhecidas, dentro das noes de autenticidade, legitimidade e hierarquia
dentro das cybersubculturas.
Algumas consideraes finais:
A partir dessas primeiras constataes, observamos que a plataforma social Last.fm
proporciona experincias comportamentais interativas cujo elemento central a co-produo de
tags. As mltiplas sociabilidades nela contidas (atravs de seus espaos e ferramentas disponveis
como, widgets, tabelas, playlists, recomedaes, caixas de dilogos, entre outros) merece uma
anlise detalhada das relaes entre suas ferramentas e dispositivos e os processos comunicacionais
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por eles gerados nas trocas entre os seus usurios.
Tambm proponho como hiptese de trabalho que essa auto-rotulao - e uso rtulo aqui
no sentido classificatrio das tags como etiquetas/marcadores que funciona como identificador e
organizador das informaes no contexto da rede, incorpora e remedia (Bolter e Grusin) os velhos
hbitos do jornalismo e da crtica musical (afinal, em sua maioria, foram os crticos que
popularizaram e/ou criaram termos hoje to desgastados como punk rock, indie, electro entre outros
gneros e subgneros musicais) agora em um outro contexto: dos usurios-produtores de contedo,
participantes da cybercena31. No entanto uma hiptese que ainda merece uma maior riqueza de
detalhes e aproximao com a questo da crtica musical enquanto gnero per se.
Por um lado esses marcadores didticos (como electro, breakbeat, psy-trance, space-disco,
por exemplo) funcionam como codificadores sintticos de um gnero ou subgnero que nos remete
a determinadas sonoridades caracteristicamente definidas e que, contextualizadas culturamente
trazem consigo cdigos, comportamentos, rituais, roupas, gestos, grias, etc o que acaba sendo
importante para a construo e desconstruo de identidades e subjetividades, seja na vida offline
ou na vida online32.
Apresentamos aqui, apenas alguns apontamentos iniciais de uma netnografia em curso, cuja
proposta de folksonomia dos gneros musicais procura dar conta da importncia dos processos
colaborativos no contexto da Web 2.0, a partir de um olhar culturalista, que privilegia no apenas a
tecnologia em si, mas os usos e apropriaes das mesmas em seus significados sociais e coletivos e
que, influenciam e so influenciados por uma esttica do estar-junto na contemporaneidade..
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31 Cada espao de apresentao tecnolgica de autoapresentao e autopromoo das subculturas (sites oficiais e no-oficiais dos artistas, fruns de discusso, blogs, fotologs, perfis e comunidades no Orkut e no MySpace, etc). 32 Para alguns autores como Orgad (2005, p. 51), a anlise emprica passa por dois estgios dentro da entre cultural, a primeira em que o contato com os informantes se estabelece primeiramente no online, mas depois prescinde de contatos online e offline.
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