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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL DARLENE SERRA GOMES SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: uma análise da intervenção profissional do assistente social frente às expressões da questão social evidenciadas na realidade do Hospital Infantil Albert Sabin FORTALEZA 2014

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL

DARLENE SERRA GOMES

SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: uma análise da intervenção profissional do assistente social frente às expressões da questão social evidenciadas na realidade

do Hospital Infantil Albert Sabin

FORTALEZA

2014

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DARLENE SERRA GOMES

SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: uma análise da intervenção profissional do assistente social frente às expressões da questão social evidenciadas na realidade

do Hospital Infantil Albert Sabin

Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profa. Esp. Verbena Paula Sandy

FORTALEZA

2014

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DARLENE SERRA GOMES

SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: uma análise da intervenção profissional do assistente social frente às expressões da questão social evidenciadas na realidade

do Hospital Infantil Albert Sabin

Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profa. Esp. Verbena Paula Sandy

Data da defesa: ______________

Resultado: __________________

BANCA EXAMINADORA:

________________________________________

Profª. Esp. Verbena Paula Sandy (orientadora)

Faculdades Cearenses - FAC

________________________________________

Profª. Ms. Virzângela Paula Sandy Mendes

Faculdades Cearenses - FAC

________________________________________

Profª. Ms. Silvana Maria Pereira Cavalcante

Faculdades Cearenses - FAC

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À minha Mãe, Miriam Serra, com

todo o meu amor, por tudo o que ela

representa para mim.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, que por toda a minha vida segurou-me em seu colo protetor;

sustentou-me com seu cuidado e amor, restituindo-me a saúde, a fé e a esperança

em todos os momentos percorridos na estrada da vida.

À minha mãe, Miriam Serra, pelo dom da vida, pela educação desde o berço,

pela confiança e amor incondicional que tem me sustentado desde sempre.

Ao meu pai, José Ailton, pelos exemplos e correções dados ao longo da vida,

que serviram de base para que eu me tornasse a pessoa que sou hoje.

Às minhas irmãs, Danille Serra, Denise Serra, Danuza Serra, Dannytza Serra

e Dannyelle Serra, porque sempre estiveram ao meu lado, compartilhando dores e

amores.

Aos meus irmãos, José Mariano Neto e José Ailton Filho, e às suas lindas

famílias, que enchem de amor e alegria o meu coração.

A todos os meus sobrinhos e sobrinhas: Anderson, Andressa, Dayanne,

Matheus, João Lucas, Alex Filho, Maria Eduarda, Ana Caroline, Ana Vitória,

Giovanna, Mariana, João Victor, Luís Guilherme, João Gabriel, Paulo Filho, Vivian,

Viviane e Ana Luiza, simplesmente por existirem e darem sentido à minha vida.

À minha supervisora de estágio e amiga, Hildete Pimentel, pela inestimável

contribuição na minha formação e pela inspiração proporcionada em cada

intervenção profissional.

A todos e todas que compartilharam as lutas vivenciadas no Centro de

Assistência à Criança (CAC), em especial às assistentes sociais Mônica Souza e

Juliana Jesuíno, assim como à enfermeira “Val”, pelos momentos agradáveis

divididos em cada café.

Ao Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), por viabilizar não apenas a realização

deste trabalho, mas de um sonho que se tornou real.

A todos e todas que atuam no Centro de Estudos do HIAS, Dra. Regina

Moreno, Dr. Ronaldo Gonçalves, Gracinha Viana e Maryana Slane, pelo

imprescindível apoio durante o processo inicial do estudo em campo.

À Moema Guilhón, assistente social e coordenadora do Serviço Social do

HIAS, por me presentear com a possibilidade de conhecer e experimentar a prática

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profissional do assistente social no campo privilegiado do HIAS. Sem a sua ajuda,

essa pesquisa não seria possível!

Às minhas colegas de trabalho e amigas, Laricia Keury e Laete Araújo, pelo

apoio irrestrito em momentos decisivos na execução da pesquisa de campo.

Aos professores da Faculdade Cearense (FAC), que colaboraram com o meu

processo de aprendizagem com seus diferentes saberes nessa jornada acadêmica.

A todas as amigas e colegas de turma, que foram grandes companheiras nos

anos de faculdade, que me acolheram em diferentes semestres e trilharam esse

caminho junto comigo: Kelliane Jorge, Irlene Silva, Marquilene Rocha, Suzanne

Targino, Mônica Saraiva, Mikaella Alves, Tamara Leite, Marcela Ramos, Larissa

Souza, Rebeca Marques, Thalita Mayara, Mayara Melo, Ana Aline e Jane Maia.

Sempre que estive com vocês tudo se tornou mais fácil e agradável.

À amiga Tayane Stefane, pela cumplicidade acadêmica e extra-acadêmica;

pelo exemplo de solidariedade e amizade verdadeira que quero ter sempre presente.

Ao amigo Daniel Passos, pelo seu total apoio, respeito, cuidado, paciência e

amor dedicados durante tantos anos.

À Sven Bander, por ter trazido reencanto e paixão à minha vida... Pelo amor,

cuidado, paciência, e compreensão pelo tempo que precisei para me dedicar a este

trabalho, e por ter me ajudado significativamente na reta final deste percurso,

fazendo-me acreditar que daria tudo certo.

À minha querida orientadora, a professora Verbena Paula Sandy, pela

orientação, incentivos, abraços calorosos e por tão relevantes contribuições para a

construção deste trabalho.

À banca examinadora, composta pelas professoras Virzângela Sandy e

Silvana Cavalcante, por terem aceitado o convite e enriquecerem este trabalho com

importantes considerações, resultado de sua elaboração final.

E, especialmente, às assistentes sociais do HIAS, pela dedicação com a qual

executam o seu trabalho, tal como por me permitirem tão grandiosa experiência,

colaborando para uma análise crítica da profissão. Vocês deram sentido a esta

pesquisa!

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“Imagine que não há paraíso

É fácil se você tentar

Nenhum inferno abaixo de nós

Acima de nós, só o céu

Imagine todas as pessoas

Vivendo o presente

Imagine não existir países

Não é difícil imaginar

Nada pelo que lutar ou morrer

E nenhuma religião, também

Imagine todas as pessoas

Vivendo a vida em paz

Você pode dizer, eu sou um sonhador

Mas eu não sou o único

Eu espero que algum dia você se junte a nós

E o mundo será como um só

Imagine não ter posses

Imagino se você pode

Sem necessidade de ganância ou fome

Uma irmandade dos homens

Imagine todas as pessoas

Compartilhando o mundo todo

Você pode dizer, eu sou um sonhador

Mas eu não sou o único

Eu espero que algum dia você se junte a nós

E o mundo viverá como um só.”

(John Lennon)

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RESUMO

O objetivo central deste trabalho consiste em um esforço de apreender a atuação profissional do assistente social no âmbito da saúde frente às múltiplas expressões da “questão social” evidenciadas na realidade de um hospital pediátrico de alta complexidade. Neste cenário, encontramos um vasto campo a ser explorado, tendo em vista que a questão da saúde envolve todas as dimensões da vida humana. A presente pesquisa tem como objetivos específicos evidenciar como se expressam as refrações da “questão social”; elucidar como se dá o seu enfrentamento e as condições para o atendimento das demandas; identificar, sob a ótica do Serviço Social, como é tecida sua relação com os usuários, bem como com a equipe multiprofissional e, ainda, inferir de que maneira o Serviço Social contribui para a efetivação da saúde enquanto direito social na unidade hospitalar pesquisada. O trabalho realiza um retrospecto histórico da política de saúde brasileira e da inserção e intervenção profissional do Serviço Social na saúde no contexto atual, tendo em vista o conceito ampliado desta, do mesmo modo que analisa os determinantes sociais que interferem no processo saúde-doença, fatores econômicos, políticos e culturais materializados nas diferentes manifestações da “questão social” na vida dos usuários dos serviços de saúde. O estudo se apoia numa pesquisa de natureza qualitativa, de cunho exploratório, cujo percurso metodológico congrega uma análise do material coletado em campo por meio de entrevistas, observação participante e fundamentação teórica, consubstanciando a teoria e a prática do Serviço Social, que possui relevo no tocante ao reconhecimento dos fatores determinantes e condicionantes da saúde. Todo o processo da pesquisa respeitou os procedimentos éticos exigidos, sendo devidamente aprovada pelo Comitê de Ética da instituição. Os resultados principais sinalizam que o assistente social, por meio de sua intervenção profissional na saúde, depara-se com muitos limites e desafios. Contudo, consegue alcançar, no exercício profissional, respostas efetivas frente às sequelas da “questão social” na busca cotidiana da democratização das informações, com vistas à garantia dos direitos sociais, na luta constante pela promoção do acesso à saúde enquanto direito universal. PALAVRAS-CHAVE: Saúde. Questão Social. Intervenção Profissional.

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ABSTRACT

The main objective of this work is an effort to grasp the professional practice of social workers within the health front the multiple expressions of the "social question" evidenced in the reality of a pediatric hospital of high complexity. In this scenario, we find a vast field to be explored, considering that the issue of health involves all dimensions of human life. This research has the following objectives highlight how they express the refractions of the "social question"; elucidate how is your coping and conditions to meet the demands; identify, from the perspective of social work, as is woven its relationship with users, as well as the multidisciplinary team and also infer how social work contributes to the realization of health as a social right in the hospital searched. The work makes a historical retrospective of Brazilian health policy and integration and professional intervention of social work in health in the current context, in view of the expanded concept of this in the same way that analyzes the social determinants that affect the health-disease process, economic, political and cultural factors materialized in the different manifestations of the "social question" in the lives of users of health services. The study is based on a qualitative research, exploratory, whose methodological approach brings together an analysis of the material collected in the field through interviews, participant observation and theoretical foundation, consolidating the theory and practice of social work, which has raised the regarding the recognition of the determining factors and determinants of health. All the research process complied with the required ethical procedures, and duly approved by the Ethics Committee of the institution. The main results indicate that the social worker, through his professional intervention in health, is faced with many limitations and challenges. However, achieves, in the practice, effective responses in the aftermath of the "social question" in everyday search democratization of information, in order to guarantee social rights, in the constant struggle for the promotion of access to health care as a universal right. KEYWORDS: Health. Social Issues. Professional Intervention.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEPSS Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social

ABESS Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social

APP Associação Peter Pan

BPC Benefício de Prestação Continuada

CAC Centro de Assistência à Criança Lúcia de Fátima R. G. Sá

CAPs Caixas de Aposentadorias e Pensões

CAPS Centro de Atenção Psicossocial

CEDEPSS Centro de Documentação e Pesquisa em Políticas Social e Serviço

Social

CEP Comitê de Ética e Pesquisa

CF Constituição Federal

CFESS Conselho Federal de Serviço Social

CNS Conselho Nacional de Saúde

CONASS Conselho Nacional de Secretários de Saúde

CPC Centro Pediátrico do Câncer

CRAS Centro de Referência de Assistência Social

DPVAT Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

FAC Faculdades Cearenses

HEMOCE Centro de Hematologia e Hemoterapia do Ceará

HIAS Hospital Infantil Albert Sabin

HIF Hospital Infantil de Fortaleza

IAPs Institutos de Aposentadorias e Pensões

INPS Instituto Nacional de Previdência Social

INSS Instituto Nacional do Seguro Social

LOAS Lei Orgânica da Assistência Social

LOS Lei Orgânica da Saúde

MCP Modo de Produção Capitalista

NAVI Núcleo de Apoio à Vida Infantil

NOEL Núcleo de Orientação e Estimulação ao Lactente

OMS Organização Mundial de Saúde

ONG Organização Não Governamental

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PAD Programa de Assistência Domiciliar

PAVD Programa de Assistência Ventilatória Domiciliar

PSF Programa Saúde da Família

RSB Reforma Sanitária Brasileira

SPA Serviço de Pronto Atendimento

SUS Sistema Único de Saúde

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................... 18 2.1 Procedimentos Metodológicos e Instrumental de Coleta de Dados .................... 18 2.2 Breve Histórico do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) ..................................... 25 2.3 Perfil das Assistentes Sociais Entrevistadas ....................................................... 27 3 SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL ................................................................................ 31

3.1 Os Caminhos e Descaminhos Trilhados Pela Saúde Brasileira .......................... 31 3.2 O Projeto de Reforma Sanitária e a Construção do SUS .................................... 36

3.3 Serviço Social e Saúde no Contexto Atual .......................................................... 43 3.4 O Conceito Ampliado de Saúde e o Serviço Social ............................................. 49 4 QUESTÃO SOCIAL E SERVIÇO SOCIAL ............................................................. 53 4.1 A “Questão Social” e suas Concepções: um Debate Necessário ........................ 53 4.2 “Questão Social” e sua Relação com o Serviço Social ....................................... 61

4.3 Saúde e “Questão Social”: a Intervenção Profissional do Assistente Social no Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) .......................................................................... 64 4.4 O Serviço Social e a Prática Profissional na Saúde: Limites, Possibilidades e Desafios .................................................................................................................... 84

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 100

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 104

APÊNDICE .............................................................................................................. 111

ANEXOS ................................................................................................................. 112

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1 INTRODUÇÃO

No presente trabalho monográfico tencionamos empreender uma análise da

intervenção profissional do assistente social mediada pelo debate teórico da saúde e

do Serviço Social. Descreveremos como a atuação profissional do assistente social

frente às diferentes expressões da “questão social” no âmbito da saúde se

apresentou como uma realidade a ser pesquisada. Contemplaremos ainda os

procedimentos metodológicos adotados para realização desta pesquisa.

A política de saúde no Brasil passou por várias modificações em seus

diferentes contextos, ganhando destaque no período final da década de 1970,

marcado pela organização de um movimento pela democratização da saúde, base

para a construção do Projeto de Reforma Sanitária (PRS), orientado pelo ideário de

uma saúde pública balizada pelos princípios da universalidade, integralidade e

equidade. Este processo de luta culminou na criação e implementação do Sistema

Único de Saúde (SUS), conquista do referido movimento e da sociedade. A partir da

Constituição Federal de 1988 e da criação do SUS, a saúde ganha um novo

significado, passando a ser considerada como direito de todos e dever do Estado,

com ênfase nos determinantes sociais indissociáveis ao processo saúde-doença,

sendo finalmente reconhecida como resultado das condições políticas, culturais,

sociais e econômicas.

Nesse sentido, esta pesquisa privilegia a análise da atuação do profissional

de Serviço Social na área da saúde frente aos determinantes sociais implicados no

processo saúde-doença, sendo direcionada para as intervenções profissionais

realizadas no âmbito de uma unidade hospitalar da rede pública estadual, no

município de Fortaleza, estado do Ceará.

A opção de estudar a atuação profissional do assistente social frente às

refrações da “questão social” evidenciadas no âmbito do Hospital Infantil Albert

Sabin (HIAS), hospital de referência no atendimento a serviços pediátricos no Ceará,

constitui o desafio de nosso estudo. Trata-se de um esforço de buscarmos

evidenciar respostas profissionais e elucidar a contribuição do Serviço Social para

efetivação da saúde enquanto direito social.

Tendo em vista que o Serviço Social se particulariza pelo seu trabalho com as

diferentes expressões da “questão social”. Na saúde, está posta ao assistente social

a função de identificar os aspectos sociais, econômicos, culturais e políticos que

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atravessam o processo saúde-doença vivenciado pelos usuários, mobilizando

estratégias para o enfrentamento dessas questões (MATOS, 2013).

Compreendemos, assim, a necessidade de buscar desvelar o que passa pelo

cotidiano de trabalho do assistente social na saúde, e como estes veem as

expressões da “questão social” que o permeia.

Os profissionais do Serviço Social no seu cotidiano de trabalho lidam com diferentes temas e questões que se corporificam nos diversos relatos de vidas que atendem. É no atendimento aos usuários que os assistentes sociais identificam contornos materiais das diferentes expressões da ‘questão social’ na vida da população (MATOS, 2013, p. 12).

Considerando a missão do hospital de prestar assistência terciária à criança e

ao adolescente de forma segura e humanizada, sendo instituição de ensino e

pesquisa1, podemos perceber a relevância deste estudo no processo de construção

do saber, dotado de uma postura ético-política pautada no Código de Ética do

Assistente Social, em seus valores e princípios, em consonância com os valores da

referida instituição: ética, humanização, compromisso e participação.

O envolvimento e interesse na temática abordada surgiram em meados 2005,

por meio da utilização dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e do contato

inicial com a prática profissional do assistente social na área da saúde, resultado de

uma experiência bastante positiva, que causou a motivação da escolha do curso de

Serviço Social alguns anos mais tarde.

Tal motivação foi sendo aprofundada no processo acadêmico, sobretudo

através da realização do Estágio Supervisionado I, II e III, ocorrido no Centro de

Assistência à Criança Lúcia de Fátima R. G. Sá (CAC), hospital público de atenção

secundária e média complexidade. Esta experiência proporcionou o conhecimento,

durante quase dois anos, da prática profissional do assistente social na área da

saúde, por meio da supervisora de campo, a qual atuou com excelência,

desempenhando seu trabalho com êxito, dotada de grande conhecimento teórico-

metodológico e de um posicionamento ético-politico condizente com os valores da

profissão, inspirando-nos em cada intervenção a pesquisar o exercício profissional

_____________ 1 Com o objetivo de consolidar e organizar a área de ensino do curso de pós-graduação em medicina,

ou seja, a Residência Médica em Pediatria, e aprofundar os conhecimentos dos profissionais de saúde, o Centro de Estudos foi criado em 1979. Com o passar dos anos, novos credenciamentos de vagas, cursos e especialidades foram surgindo a fim de atender a demanda. Fonte: http://www.hias.ce.gov.br/index.php/ensino-e-pesquisa/centro-de-estudos

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na saúde e nos impulsionando buscar desvendar as expressões da “questão social”

neste âmbito.

Ao longo da formação foram realizadas importantes pesquisas na área da

saúde, destacando-se um estudo realizado para a disciplina de Serviço Social e

Saúde, em abril de 2013, no Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), cujo objetivo foi

apresentar a organização e o funcionamento da instituição, bem como a atuação do

profissional de Serviço Social. O resultado da realização desta pesquisa decorreu na

busca de aprofundá-la no referido campo.

A criança/adolescente, principal usuária(o) do serviço, desde o momento em

que chega à unidade hospitalar, durante o tratamento até a alta, necessita de

cuidados especiais, ou seja, o processo de melhora ou cura depende, além da

equipe médica, da ação conjunta de uma variedade de profissionais. Para o

assistente social é uma conquista ocupar espaço neste grupo multiprofissional,

encontrando, desta forma, uma nova dimensão no seu exercício profissional na área

da saúde.

Outro aspecto preponderante para a escolha deste tema foi a realização do

pré-projeto de pesquisa durante o 4º semestre do curso, por abordar a mesma

temática, embora com um viés diferenciado. Serviu-nos, pois, de ponto de partida

para o aprofundamento das bases teórico-metodológicas para o desenvolvimento do

projeto de pesquisa.

O presente estudo justifica-se principalmente pela necessidade de

compreender a atuação do assistente social frente às múltiplas expressões da

“questão social” presentes no cotidiano profissional do HIAS, na busca de identificar

como esta se materializa; como é tecida do ponto de vista do Serviço Social a sua

relação com os usuários e equipe interdisciplinar atuantes na instituição. É

importante afirmar que também auxilia a inferir de que forma o Serviço Social

contribui para a efetivação da saúde no HIAS.

Tomar como objeto a intervenção profissional do assistente social justifica-se

ainda por não contarmos com muitos estudos envolvendo a temática na região

pesquisada, mas, sobretudo, por ser o assistente social na saúde um dos principais

articuladores das equipes multiprofissionais, o que poderá propiciar uma visão mais

ampla do conjunto dessas práticas (VASCONCELOS, 2012).

A relevância social do problema a ser investigado se apresenta,

principalmente, pela importância dos determinantes sociais que constituem o

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processo saúde/doença nas refrações da “questão social”; esta por sua vez,

representa a matéria-prima, a razão de ser do Serviço Social.

Pesquisar o cotidiano profissional do assistente social na área da saúde

constitui um desafio e uma necessidade, exigindo a busca por estratégias concretas

de fortalecimento da ação profissional e visando a garantia de direitos dos usuários.

Pretendemos então, com esta pesquisa, mostrar a importância do papel do

assistente social no hospital, identificando as particularidades de seu trabalho neste

espaço sócio-ocupacional, tendo como objetivo dar maior visibilidade ao Serviço

Social na instituição. Principalmente pelo fato de a saúde constituir-se como direito

social, sendo o assistente social reconhecido legalmente como profissional da

saúde, tendo como principal função social neste âmbito viabilizar os direitos sociais

via políticas públicas.

Considerando a finalidade deste estudo, fez-se necessária uma densa

abordagem teórica acerca da temática. Desta forma, a presente pesquisa está

ancorada nas seguintes categorias de análise: Saúde e Serviço Social, Questão

Social e Intervenção Profissional, temáticas que vêm despertando interesse por

parte de muitos teóricos da área. Assim, trabalharemos a partir de importantes

concepções.

No âmbito da saúde e do Serviço Social, destacamos as análises de Maria

Inês Souza Bravo (2009), Ana Maria de Vasconcelos (2012), Marilda Villela

Iamamoto (2012), Maurílio Castro de Matos (2013), dentre outros.

Como já citado anteriormente, está consolidado no Serviço Social que as

sequelas da “questão social”, objeto da intervenção profissional, constituem-se na

matéria-prima sobre a qual o exercício profissional vai se realizar. Dada a sua

dimensão estrutural, a “questão social” atinge a vida dos sujeitos nas suas

requisições pela garantia de direitos civis, sociais, políticos e humanos (GUERRA et

al., 2007).

São as diferentes manifestações da “questão social” que chegam para os

assistentes sociais, como demandas cotidianas de moradia, alimentação, trabalho,

leitos hospitalares, transporte etc. Neste sentido, reforçamos que a profissão tem

nos seus fundamentos históricos as formas de enfrentar a “questão social”.

E é no âmbito da atuação profissional do assistente social que

problematizamos um importante assunto: como se dá a intervenção profissional do

assistente social frente às múltiplas expressões da “questão social” presentes na

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realidade do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS)? Na busca de responder a este

questionamento, este estudo propõe-se a contribuir para futuras pesquisas no

campo da atuação profissional do assistente social na área da saúde, como parte

constitutiva do exercício profissional, bem como demonstrar sua importância, no

sentido de dar mais visibilidade ao caráter, à qualidade, à organização e à

operacionalização do trabalho profissional dos assistentes sociais no HIAS, visando

ainda ampliar a legitimidade da intervenção do Serviço Social na saúde.

A presente monografia constitui-se, além desta introdução e das

considerações finais, de mais três capítulos, que abordam também as principais

categorias de nosso estudo antes elencadas.

O segundo capítulo é dedicado aos caminhos percorridos para a realização

da pesquisa, explicitaremos os procedimentos metodológicos adotados, bem como

os instrumentais de coleta de dados utilizados em campo. Contemplando um breve

histórico do lócus estudado, traçando ainda o perfil dos sujeitos pesquisados.

No terceiro capítulo faremos um breve retrospecto histórico da saúde no

Brasil até a sua constituição como política pública e de direito, caracterizando a

política de saúde, o Projeto de Reforma Sanitária, a construção do SUS, seus

avanços, retrocessos e desafios. Abordaremos também o conceito ampliado de

saúde, a inserção e a intervenção profissional do assistente social nesta esfera.

No quarto capítulo problematizaremos a “questão social” em suas diferentes

concepções, tendo esta enquanto objeto da intervenção profissional do assistente

social. Ainda nesta parte do trabalho, apresentaremos os resultados obtidos e

análise realizada, tendo como base os discursos dos sujeitos entrevistados a partir

de suas experiências profissionais, fazendo sempre uma articulação com o

arcabouço teórico referenciado. Nas considerações finais teceremos algumas

reflexões acerca da pesquisa e seus resultados.

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2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

2.1 Procedimentos metodológicos e instrumental de coleta de dados

Neste capítulo inicial contemplaremos o percurso metodológico traçado no

processo de construção da pesquisa, destacando seus procedimentos, técnicas e

instrumentais de coleta de dados. Realizamos uma breve caracterização do campo

de pesquisa, bem como do perfil dos sujeitos pesquisados.

O universo da pesquisa foi construído por assistentes sociais que atuam no

Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS); logo, as informações que serão trabalhadas

visam, como já exposto, demonstrar algumas situações que perpassam a

intervenção profissional do Serviço Social na área da Saúde. Para elucidar tais

questões, foi preciso trazermos algumas discussões como, por exemplo, breve

histórico e reflexão da Saúde e Serviço Social, da “questão social2” e da Intervenção

Profissional nesta esfera.

Para a realização de nossa pesquisa de caráter investigativo, fez-se

necessário delimitarmos tanto o campo no qual ocorreu a coleta dos dados como os

sujeitos selecionados a participarem do estudo. Este, por sua vez, foi planejado de

acordo com a disponibilidade dos sujeitos pesquisados durante um período de

quatro meses, conforme estabelecido no cronograma do projeto.

É interessante salientarmos que, inicialmente, o lócus da pesquisa estava

previsto para ser o Centro de Assistência à Criança Lúcia de Fátima R. G. Sá

(CAC)3, local de realização dos Estágios Supervisionados I, II e III. Todavia, no

período de realização do último estágio, fomos informados que o CAC estaria

implantando seu Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), mas que não teria previsão

para sua efetivação, o que tornaria a pesquisa ainda mais complexa e burocrática,

tendo em vista que a Faculdades Cearenses (FAC) também não possui um CEP.

_____________

2 O conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que têm uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos se mantém privada (IAMAMOTO, 2012, p. 27). 3 Hospital público de atenção secundária mantido pela Prefeitura de Fortaleza para atendimento exclusivamente infantil, referência para o tratamento de doenças epidérmicas (de pele), entéricas (que afetam o aparelho digestivo) e respiratórias, como asma, rinite, pneumonias e rinofaringites. Disponível em: <http://www.fortaleza.ce.gov.br/sms/centro-de-assistencia-crianca>.

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Assim, a análise e aprovação da pesquisa ficariam a cargo da Plataforma Brasil4,

podendo comprometer os prazos estabelecidos, o que acabou nos levando a pensar

em um novo campo para concretização do estudo. Após realização de pesquisa

acadêmica no Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), conforme mencionamos

anteriormente, optamos por este novo e privilegiado campo de pesquisa.

Embora se saiba que estudos na área da saúde sejam complexos e

desafiadores — tendo em vista que a pesquisa envolvendo seres humanos na área

deva atender aos fundamentos éticos exigidos pela Plataforma Brasil —, mesmo

com todos os percalços que encontramos durante o processo, em nenhum momento

pensamos em desistir, considerando que a temática escolhida foi a motivação maior

para ingresso no curso de Serviço Social.

Assim, todos os caminhos trilhados visaram a atender a tais exigências,

iniciando pela apresentação do trabalho à coordenação do Núcleo de Pesquisa e

Desenvolvimento do HIAS, representado por um profissional da Medicina, que

inicialmente nos deu algumas sugestões de alterações nos objetivos propostos.

Porém, após longo diálogo recebemos do mesmo parecer favorável para execução

da pesquisa. Vale salientar que a autorização se deu sem nenhuma alteração no

projeto.

Com muito empenho e total apoio da equipe do Centro de Estudos do HIAS, o

projeto fora incluso na reunião seguinte agendada do CEP, e dentro de um mês fora

aprovado com louvor, sendo solicitado apenas o acréscimo de um parágrafo no

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), documento que apresenta

explicações acerca dos procedimentos éticos adotados no estudo explicitando os

possíveis riscos e os benefícios da pesquisa. Após inclusão de texto a respeito da

gravação dos dados das entrevistas armazenados em áudio, conforme solicitado,

logo fomos autorizadas a dar início às entrevistas em campo.

Considerando a temática abordada – Serviço Social e Saúde –, bem como o

seu objetivo central de analisar a atuação do assistente social frente às múltiplas

expressões da “questão social” presentes na realidade de um hospital pediátrico de

alta complexidade, foi preciso traçar a metodologia a ser empregada para só então ir

a campo.

_____________ 4 A Plataforma Brasil é um sistema eletrônico criado pelo Governo Federal para sistematizar o

recebimento dos projetos de pesquisa que envolvam seres humanos nos Comitês de Ética em todo o país. Disponível em: <http://www.ufal.edu.br/cep/submissao-de-projetos/plataforma-brasil>.

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20

Para Minayo (2013, p. 14), a metodologia inclui simultaneamente a teoria da

abordagem (o método), os instrumentos de operacionalização do conhecimento (as

técnicas) e a criatividade do pesquisador (sua experiência, sua capacidade pessoal

e sua sensibilidade). Portanto, trata-se da organização, dos caminhos a serem

percorridos para se realizar uma pesquisa, assim como a definição dos melhores

instrumentos e técnicas utilizados para o alcance dos objetivos.

Para Goldenberg (2004), os instrumentos da pesquisa devem ser corrigidos e

adaptados durante o seu processo; contudo, não se pode iniciá-la sem prever os

passos que deverão ser dados. Assim, cada procedimento adotado neste percurso

foi planejado metodologicamente.

O campo privilegiado para a realização da pesquisa foi o Hospital Infantil

Albert Sabin (HIAS)5. A referida instituição de saúde está localizada na Rua

Tertuliano Sales, nº 544, bairro Vila União, Fortaleza/CE.

Por tratar-se de campo de realização de pesquisas durante a formação

acadêmica e local de trabalho da pesquisadora, tivemos uma inserção facilitada,

mas respeitaram-se todas as questões éticas com o pedido de autorização e

aprovação do CEP do hospital, visando realizar a pesquisa de acordo com as

regularidades e exigências propostas para pesquisas envolvendo pessoas na área

da saúde, conforme já explicitado mais acima.

Tendo em vista as vivências e a experiência social obtida durante pesquisas

acadêmicas e trabalho desenvolvido na instituição, a interação com os sujeitos

pesquisados se deu de forma processual e contínua, objetivando sempre facilitar o

acesso aos atores sociais envolvidos e obter as informações necessárias ao longo

da pesquisa no campo.

Na busca principal de atingir os objetivos propostos, empregamos em nossa

pesquisa o método descritivo-exploratório, de natureza qualitativa. À luz de

Goldenberg (2004), compreendemos que a pesquisa qualitativa não se preocupa

com representatividade numérica, mas sim com o aprofundamento da compreensão

de um grupo social, organização ou instituição.

_____________

5 O Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) um órgão da administração pública estadual, subordinado à Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, que tem como missão: “[...] prestar assistência terciária à criança e ao adolescente, de forma segura e humanizada, sendo instituição de ensino e pesquisa”. Regido por valores como ética, humanização, compromisso, participação, valorização profissional, eficiência e credibilidade, o hospital tem como visão de futuro “[...] ser excelência internacional pediátrica em assistência quaternária, ensino e pesquisa, com responsabilidade socioambiental”. Disponível em: <www.hias.ce.gov.br>.

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21

Por meio da pesquisa qualitativa foi possível percebermos uma compreensão

mais ampla da realidade estudada, buscando sempre o diálogo essencial entre

teoria e prática, levando em conta que estas constituem uma unidade.

A pesquisa qualitativa depende ainda da biografia do pesquisador, das

opções teóricas, do contexto mais amplo e das imprevisíveis situações do dia a dia

da pesquisa (GOLDENBERG, 2004, p. 55).

Minayo (2004) concorda ao afirmar que na abordagem qualitativa é possível

um maior aprofundamento e abrangência da compreensão, seja de um grupo social,

de uma organização ou de uma política. Desta forma, o seu critério não é numérico,

de modo que a amostra ideal é aquela que representa o grupo social mais relevante.

Conforme Minayo (2004), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de

significados, aspirações, crenças, valores e atitudes, correspondendo a um espaço

mais profundo das relações, e dos fenômenos e não podem ser reduzidos a

operacionalização de variáveis.

Pesquisa qualitativa, além de permitir a utilização de técnicas e recursos

instrumentais adequados à compreensão dos valores culturais e das representações

sociais de um determinado grupo, permite saber como se dão as relações entre os

atores que atuam numa temática específica (MINAYO, 2004; GIL, 2008).

Os procedimentos de coleta de dados para esta pesquisa foram sendo

definidos de acordo com o perfil e disponibilidade dos sujeitos pesquisados.

Goldenberg (2004) alerta-nos para o fato de que o bom pesquisador deve lançar

mão de todos os recursos disponíveis que possam auxiliar a compreensão do

problema.

Para colhermos os dados necessários por meio das informações dos sujeitos

participantes foi necessário nos utilizarmos da pesquisa de campo, acerca desta, as

teóricas Marconi & Lakatos (1996) afirmam ser uma fase realizada depois do estudo

bibliográfico, para que o pesquisador tenha um bom referencial e conhecimento da

temática pesquisada, pois é nesta etapa que irá decidir definitivamente os objetivos,

meios de coleta de dados, e a forma de análise destes.

Após pesquisa bibliográfica, inserção no campo pesquisado e pesquisa

documental, determinamos como técnicas de coletas de dados a observação

participante, o diário de campo e a entrevista semiestruturada.

Foi realizado em nosso estudo um levantamento bibliográfico para

consubstanciar a nossa pesquisa, no qual foram utilizados livros de metodologia da

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pesquisa, obras clássicas do Serviço Social e saúde, publicações, como revistas,

artigos, ensaios, documentos oficiais, leis, dentre outros. Isto foi realizado com a

finalidade de conhecer melhor o que a literatura discute sobre o assunto para

fundamentação de nossos argumentos, ampliação dos nossos conhecimentos e

sustentação teórica acerca da temática para, posteriormente, associá-la à prática.

A pesquisa bibliográfica é considerada mãe de toda pesquisa,

fundamenta-se em fontes bibliográficas; ou seja, os dados são obtidos a

partir de fontes escritas, portanto, de uma modalidade específica de

documentos, que são obras escritas, impressas em editoras,

comercializadas em livrarias e classificadas em bibliotecas (GERHARDT;

SILVEIRA, 2009 p. 69).

Já a pesquisa documental é caracterizada por Gil (2008) como aquela que se

fundamenta na exploração das fontes documentais que não receberam qualquer

tratamento analítico. Incluem os documentos conservados em arquivos de órgãos

públicos e instituições privadas, tais como associações científicas, sindicatos,

partidos políticos etc., bem como fontes documentais que já foram analisadas,

relatórios de empresas, entre outros.

Gerhardt e Silveira (2009) também versam acerca dessa definição, afirmando

que a pesquisa documental é aquela realizada a partir de documentos,

contemporâneos ou retrospectivos, considerados cientificamente autênticos. Esta

tem sido largamente utilizada nas ciências sociais a fim de descrever/comparar fatos

sociais, estabelecendo suas características ou tendências. Nesse tipo de coleta de

dados, os documentos são tipificados em dois grupos principais: fontes de primeira

mão (aqueles que não receberam qualquer tratamento analítico, tais como:

documentos oficiais, reportagens de jornal, cartas, contratos, diários, filmes,

fotografias, gravações, gravuras etc.) e fontes de segunda mão (são os que de

alguma forma já foram analisados, a saber: relatórios de pesquisa, relatórios de

empresas, tabelas estatísticas, manuais internos de procedimentos, pareceres de

perito, entre outros).

Conforme já mencionado, a principal fonte de coleta de dados que utilizamos

foi a entrevista semiestruturada. As entrevistas foram realizadas com as assistentes

sociais, a fim de conhecer melhor o cotidiano sócio-ocupacional e a prática

profissional, tratar as questões voltadas para a interpretação teórico-metodológica e

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ético-política, e melhor condensar os dados para uma análise mais precisa. Gerhardt

e Silveira (2009) caracterizam a entrevista da seguinte maneira:

[...] constitui uma técnica alternativa para se coletarem dados não documentados sobre determinado tema. É uma técnica de interação social, uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes busca obter dados, e a outra se apresenta como fonte de informação. Na entrevista semiestruturada o pesquisador organiza um conjunto de questões (roteiro) sobre o tema que está sendo estudado, mas permite, e às vezes até incentiva, que o entrevistado fale livremente sobre assuntos que vão surgindo como desdobramentos do tema principal (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p. 72).

Triviños (1987) sustenta que a entrevista semiestruturada valoriza, a um só

tempo, a presença do investigador e oferece perspectivas possíveis para que o

informante alcance liberdade, o que enriquece a investigação. As entrevistas foram

previamente agendadas, gravadas com a permissão das profissionais e

posteriormente transcritas para análise que apresentaremos.

Para Minayo (2004), a entrevista — compreendida no sentido amplo da

comunicação verbal e no sentido restrito de coleta de informações sobre

determinado tema científico — é a técnica mais usada no processo de trabalho de

campo.

Marsiglia (2009) segue esta mesma linha de pensamento ao afirmar que as

entrevistas são os instrumentos mais usados nas pesquisas sociais, porque além de

permitirem captar melhor o que os pesquisados sabem e pensam, permitem também

ao pesquisador, observar a postura corporal, a tonalidade da voz, os silêncios etc.

Cabe destacarmos aqui os cuidados que tivemos durante todo o processo da

pesquisa de campo, sobretudo por tratar-se de um estudo acerca da atuação

profissional, no qual cada procedimento foi bastante planejado e cada ação pautada

na ética acadêmica e profissional. A identidade dos sujeitos pesquisados ficará

resguardada em sigilo, conforme estabelecido no TCLE. Ao utilizarmos da técnica de

entrevista, tivemos em mente as limitações desse recurso, como, por exemplo, o

constrangimento que poderia ser causado às pesquisadas, pelo fato de ter suas

informações gravadas. Esta foi uma “negociação” feita inicialmente a fim de

minimizar o problema.

Nesse sentido, foi utilizado também o diário de campo para os registros

detalhados das informações obtidas nas entrevistas e observações planejadas.

Minayo (2004) sublinha que o diário de campo deve conter observações sobre

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conversas informais, comportamentos, instituições, gestos e expressões a respeito

do tema pesquisado.

O uso da técnica da entrevista foi essencial para nosso estudo, tendo em

vista que enriqueceu a construção deste trabalho, por meio das falas dos sujeitos

pesquisados, suas percepções da intervenção profissional frente às refrações da

“questão social” na saúde, razão de existir deste trabalho monográfico.

A observação participante é definida por Minayo (2004) como um processo

pelo qual se mantém a presença do observador numa situação social com a

finalidade de realizar uma investigação científica. Nela o observador está em relação

face a face com os observados, ao participar da vida deles. No seu cenário cultural,

colhe dados e se torna parte do contexto sob observação, ao mesmo tempo

modificando e sendo modificado por este.

A intenção inicial, no que tange ao rico momento da observação participante,

seria usufruir minimamente do espaço/setor de atuação de cada entrevistada.

Contudo, em meio aos agendamentos para realização das observações, as salas do

Serviço Social entraram em reforma, o que acabou por comprometer o atendimento

das profissionais, bem como o pretendido acompanhamento. Conseguimos ainda

realizar observação participante no Ambulatório, no Centro Pediátrico do Câncer e

na Coordenação do Serviço Social, sendo esta última destacada em nossa análise.

Para analisar, compreender e interpretar o material qualitativo, fez-se

necessário superarmos a tendência ingênua de acreditar que a interpretação dos

dados nos seria mostrada espontaneamente; foi preciso penetrarmos nos

significados que os atores sociais compartilham na vivência de sua realidade.

Segundo Goldenberg (2004), os dados qualitativos consistem em descrições

detalhadas de situações com o objetivo de compreender os indivíduos em seus

próprios termos. Estes dados são padronizáveis e obrigam o pesquisador a ter

flexibilidade e criatividade tanto no momento de coletá-los quanto de analisá-los.

Por meio da pesquisa qualitativa pôde-se observar como os sujeitos

pesquisados experimentam concretamente a realidade estudada. A análise do

material coletado em campo resultou na construção de categorizações, a partir do

tratamento dos dados obtidos, buscando comparar seus resultados e selecionar as

respostas que mais se adequaram à realidade de nosso objeto, destacando

semelhanças e diferenças nas perspectivas, relacionando as concepções dos

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teóricos que fundamentaram nosso estudo, do mesmo modo que a nossa percepção

enquanto pesquisadores.

No próximo item, teceremos breves considerações históricas sobre o campo

pesquisado, buscando situar, embora superficialmente, o surgimento do Serviço

Social na instituição nesse contexto e na atualidade.

2.2 Breve histórico do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS)

O Hospital Infantil de Fortaleza (HIF) foi inaugurado em 1952 como o primeiro

Hospital Infantil do Estado do Ceará. Em 1976, inaugurou-se o novo HIF com

mudança de endereço para a atual sede e ampliação dos serviços. No ano seguinte,

após uma visita do cientista polonês Dr. Albert Sabin na unidade, ocorreu a

mudança do nome para Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). (AGENDA HIAS, 2014).

O surgimento e implantação do Serviço Social na instituição data ainda do

antigo HIF, acompanhando sua implementação e expansão até tornar-se HIAS.

Assim, o Serviço Social inicia suas atividades contando com cerca de três

assistentes sociais, sendo a primeira delas Sandra Libório. Posteriormente, a equipe

foi crescendo e contando com o apoio de Fátima Barroso e Zélia Pinho, sendo esta

última a responsável pela implantação do Serviço Social no setor de Oncologia, bem

como pelos primeiros projetos de humanização do HIAS, tais como ABC+saúde e o

de apadrinhamento.

O hospital surgiu pequeno e modesto; foi sendo ampliado ao longo dos anos

não somente no que tange à sua área física, como também no aumento do quadro

de profissionais e na qualidade dos serviços ofertados. Muitos projetos especiais são

desenvolvidos na busca por um atendimento integrado à criança e ao adolescente,

tornando-o um hospital de referência no atendimento à criança e ao adolescente em

todo o Ceará, algumas vezes ultrapassando os limites geográficos do Estado.

Dentre os projetos6 do HIAS, destacamos: ABC+saúde, Recantos das Mães,

Cidade da Criança, Cirurgia sem Medo, Comissão de Maus Tratos, Programa de

Assistência Domiciliar (PAD) / Programa de Assistência Ventilatória Domiciliar

_____________

6 Disponível em: < http://www.hias.ce.gov.br/index.php/categoria-4?cssfile=principal4.css>. Acesso

em: 09.11.2014

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(PAVD), Núcleo de Apoio à Vida Infantil (NAVI) / Núcleo de Orientação e

Estimulação ao Lactente (NOEL), dentre outros.

Hoje, o Serviço Social do HIAS é composto por uma equipe de 31

profissionais que atua em vários setores na instituição, quais sejam: Ambulatório,

Internamento (atendimento aos blocos A, B, D1, F, D2, 3º e 4º andares) Serviço de

Pronto-atendimento (SPA) - Urgência e Emergência; nos programas ambulatoriais:

Núcleo de Orientação e Estimulação ao Lactente (Noel) / Núcleo de Assistência à

Vida Infantil (NAVI), na Coordenação e Onco-hematologia (CPC).

No ano 2000, inaugurou-se o Hospital Dia Peter Pan, caracterizado como

uma casa-hospital para tratamento humanizado do câncer infantil, nesse mesmo ano

é implantado o Centro de Referência em Diagnóstico do câncer infantil, ampliado e

transformado em 2010, no Centro Pediátrico do Câncer (CPC), um anexo do HIAS.

É interessante salientarmos que o CPC/HIAS possui uma parceria com a

Associação Peter Pan (APP), entidade sem fins lucrativos, sem caráter religioso ou

político que luta contra o câncer infanto-juvenil, mantida por meio de parcerias com o

poder público, empresas e sociedade, através de doações e trabalhos voluntários,

desenvolve ações que envolvem tratamento médico especializado, atendimento

humanizado, diagnóstico precoce por meio de projetos sociais7.

O HIAS é órgão de administração pública estadual e tem como missão: “[...]

prestar assistência terciária à criança e ao adolescente, de forma segura e

humanizada, sendo instituição de ensino e pesquisa” (HIAS, 2014).

Podemos considerar o HIAS como um dos maiores Hospitais de atendimento

infantil (pediatria) do Estado do Ceará pertence à Secretaria do Estado, referência

em atendimento de alta complexidade, que, segundo Paim (2009), são

procedimentos que envolvem alta tecnologia ou alto custo, objetivando propiciar à

população acesso aos serviços qualificados. Podemos citar como exemplos as

especialidades do HIAS: cirurgia cardíaca, neurológica, ortopédica e de deformidade

de lábio leporino e fissura palatal. É referência também no atendimento do câncer

infantil, além de dar atenção à saúde da criança relacionada às doenças

ocasionadas na infância.

_____________ 7 Disponível em: <http://app.org.br/historia/>10 nov. 2014

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Há 62 anos, o HIAS tem um importante papel em prestar assistência segura e

de qualidade, segundo as diretrizes do SUS, conforme estabelecido no Art. 1988 da

Constituição Federal do Brasil. É o único hospital infantil terciário do Estado que é

referência no atendimento a crianças e adolescentes com doenças graves e de alta

complexidade e reconhecido como instituição de ensino e pesquisa. Atualmente, o

HIAS é formado por 516 pediatras divididos em 28 especialidades médicas, além de

2.184 funcionários, entre servidores públicos e terceirizados. Em média, mais de 19

mil pacientes são atendidos por mês no hospital9.

2.3 Perfil das assistentes sociais entrevistadas

Nesse momento de explicitação do nosso objeto de estudo, é mister

esclarecermos previamente como se deram as entrevistas, as limitações e desafios

encontrados para a sua realização.

Após os trâmites de aprovação da pesquisa no Comitê de Ética do HIAS, o

contato inicial para agendamento das entrevistas foi feito com a coordenadora do

setor de Serviço Social, que nos foi bastante solícita e atenciosa durante todo o

processo de pesquisa no campo. A fim de planejarmos as ações da coleta de dados,

construímos um cronograma com dados das especificações das profissionais, cujo

formulário constava: nome, setor atuante, dias e horários dos plantões, telefone para

contato e data de agendamento da entrevista. O mesmo cronograma foi usado para

realização das observações participante.

Tendo como foco ainda os objetivos do presente estudo, definimos como

sujeitos de nossa pesquisa as assistentes sociais que atuam no HIAS.

Estabelecemos previamente como parâmetro a participação de pelos menos seis

assistentes sociais, sendo três profissionais veteranas e três profissionais novatas, e

pelo menos uma de cada grupo deveria ter especialização na área da saúde,

mestrado e/ou doutorado.

No que tange ao estabelecido no perfil previsto, não foi possível o

alcançarmos completamente, tendo em vista que a instituição só possui uma

_____________

8 Descentralização, com direção única em cada esfera de governo; atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas; participação da comunidade. (BRASIL, 1988). 9 Disponível em: <http://intranet.hias.ce.gov.br/o-hias/>. Acesso em: 10.11.2014

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profissional novata. Assim, além desta, entrevistamos cinco veteranas. Do grupo de

entrevistadas, três possuem especialização na área da saúde, conforme

estabelecemos.

Ao serem abordadas e convidadas a participarem do estudo, as profissionais

foram devidamente esclarecidas sobre os princípios éticos reguladores da pesquisa,

conforme estabelecido na Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde

(CNS), que regulamenta pesquisas na área da saúde envolvendo seres humanos no

Brasil. Isto feito, todas assinaram o TCLE. Somente uma das seis convidadas

demonstrou resistência inicialmente; contudo, posteriormente contribuiu

significativamente para a realização de nossa pesquisa.

A entrevista direcionada às profissionais foi pré-elaborada, contendo

questionamentos acerca da saúde, da “questão social” e da intervenção profissional,

conforme detalhamento no Apêndice.

As entrevistas aconteceram no mês de agosto, na sala de coordenação do

Serviço Social no HIAS e na sala do Serviço Social no terceiro andar do CPC.

Dispomos de gravador e celular para registro de áudio, bem como anotações em

diário de campo. As conversas tiveram uma duração média de trinta minutos a uma

hora. Como as entrevistas ocorreram durante o horário de trabalho, tivemos algumas

interrupções por parte de profissionais, usuários e, principalmente, telefone. Após

conclusão das entrevistas, estas foram transcritas fielmente, chegando a

aproximadamente cinquenta páginas, sistematizadas posteriormente para análise

embasada teoricamente.

A fim de traçarmos um perfil das profissionais entrevistadas, as mesmas

foram indagadas inicialmente acerca de alguns dados, tais como: nome, idade, ano

de formação, especialização, tempo de instituição e o vínculo empregatício. Os

dados foram pedidos para que pudéssemos identificar, embora de forma superficial,

o nível de formação profissional.

Todas as entrevistadas tratam-se de mulheres, assistentes sociais, com a

seguinte faixa etária: a primeira, 26 anos; a segunda, 35; a terceira não informou; a

quarta, 56; a quinta, 56 e, finalmente, a sexta, contando com 61 anos de idade. Os

anos de formação das mesmas são 2010, 2001, 1970, 1981, 1978 e 1979,

respectivamente. Das seis entrevistadas, somente uma é novata na instituição, com

apenas 3 meses. Identificamos ainda outra profissional com apenas 2 anos e 8

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meses, e todas as demais já estão na unidade há bastante tempo. O vínculo

empregatício de todas é de servidora pública estadual, exceto a última contratada,

que tem o vínculo como terceirizada. Das seis, quatro possuem especialização,

sendo três destas na área da saúde. Os setores de atuação das entrevistadas são:

Ambulatório; Emergência; Internamento; Núcleo de Orientação e Estimulação ao

Lactente (Noel) / Núcleo de Assistência à Vida Infantil (Navi), e Onco-hematologia,

este último, no Centro Pediátrico do Câncer (CPC).

É importante esclarecermos que a identificação das entrevistadas ao longo

das análises se dará por nomenclaturas de flores (Íris, Tulipa, Violeta, Amarílis, Dália

e Girassol), para que assim possamos preservar suas identidades, conforme critério

estabelecido nos procedimentos éticos. Salientamos ainda, que as profissionais

deram seu consentimento para realização deste trabalho por meio do documento

TCLE.

Para melhor compreensão da realidade do espaço sócio-ocupacional

privilegiado que tivemos como campo de pesquisa, e sobre a atuação profissional na

área da saúde, buscamos apreender a partir das respostas obtidas como ocorrem as

intervenções profissionais realizadas no cotidiano do HIAS. As reflexões das

profissionais acerca de sua atuação comprovam em parte seu embasamento

teórico-metodológico em relação, sobretudo, ao campo da saúde, assim como da

Assistência Social10.

Em grande parte das indagações realizadas, percebemos que as respostas

dadas pelas entrevistadas foram semelhantes, havendo pequenas diferenças entre

uma e outra. As divergências nas perspectivas foram percebidas de forma mais

enfática nas análises das assistentes sociais que tiveram a sua formação após o ano

2000.

Sabemos que as pesquisas em si são sempre desafiantes aos seus

pesquisadores. Em se tratando de pesquisas relacionadas à atuação profissional, o

desafio se tona ainda maior. No caso — específico da categoria pesquisada —, as

profissionais do Serviço Social, torna-se não somente um desafio, mas uma

necessidade, considerando que após levantamento das pesquisas na Biblioteca do

_____________

10 A Assistência Social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas (BRASIL, 1993).

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Centro de Estudos do HIAS, não localizamos nenhum estudo com a referida

temática. Logo, nossa finalidade de contribuir para futuras pesquisas como parte

constitutiva do exercício profissional do assistente social certamente será alcançada.

Assim, podemos antecipar que nosso estudo apresenta-se de grande relevância

social para a Instituição.

Dada a relevância desta dimensão, no próximo capítulo apresentamos os

caminhos trilhados pela saúde brasileira até a sua constituição como política de

direito, considerando seu conceito ampliado, que impactará de forma significativa na

intervenção profissional do assistente social na contemporaneidade.

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3 SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL

3.1 Os caminhos e descaminhos trilhados pela saúde brasileira

Neste capítulo fazemos um breve resgate da trajetória da política de saúde no

Brasil em seus diferentes contextos: dos antecedentes da ação do Estado até a

criação do Sistema Único de Saúde (SUS), apresentando seus principais limites e

possibilidades, sua legislação e tendências atuais, bem como o Serviço Social e sua

inserção profissional na área da saúde, o Projeto de Reforma Sanitária e sua relação

com o Projeto Profissional do Serviço Social, a intervenção profissional do assistente

social nesta esfera, seu arcabouço jurídico-político no setor e os desafios da

categoria na área da saúde no atual contexto. Tudo isto levando em consideração o

conceito ampliado de saúde.

Para uma melhor compreensão dos caminhos tecidos pela organização da

saúde brasileira, consideramos relevante traçar alguns eixos históricos que

concorreram para a construção da política de saúde no país, evidenciados nas

análises de Bravo (2009):

No século XVIII, a assistência médica era pautada na filantropia e na prática liberal. No século XIX, em decorrência das transformações econômicas e políticas, algumas iniciativas surgiram no campo da saúde pública. [...] nos últimos anos do século, a questão saúde já aparece como reivindicação no nascente movimento operário. [...] No início do século XX, surgem algumas iniciativas de organização do setor de saúde, que serão aprofundadas a partir de 30 (BRAVO, 2009, p. 90).

Numa retomada à organização sanitária no país antes da criação do Sistema

Único de Saúde (SUS), situamos, à luz de Paim (2009), que desde o Brasil Colônia

ao Império inexistia qualquer tipo de atenção à saúde. Com a vinda da família real,

no século XIX, iniciou-se uma intervenção mínima dos serviços de saúde. Ao final do

Império, a organização da saúde era rudimentar e centralizada, incapaz de

responder as epidemias e de assegurar a assistência aos doentes (PAIM, 2009, p.

27).

Destarte, compreendemos que nesse período não havia assistência médica

pública, havendo uma segregação social, tendo em vista que aqueles que

dispunham de recursos recorriam aos médicos particulares, ao passo em que o

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atendimento aos mais pobres ficava por conta das casas de misericórdia, da

caridade e da filantropia.

É interessante resgatarmos os estudos de Ponte (2010), que demonstram que

a preocupação do Estado em intervir nos problemas sociais se fortaleceu devido ao

péssimo quadro de saúde que o país apresentava, com mortalidade elevada e a

presença de diversas doenças que poderiam comprometer a ordem econômica do

país.

País agroexportador, sua economia dependia quase que exclusivamente do comércio externo, o que acabava por agravar ainda mais as consequências do seu quadro sanitário, já que muitas companhias de navegação se recusavam a estabelecer rotas que passassem pelos portos brasileiros. Conhecido como túmulo dos estrangeiros, o país encontrava dificuldade para atrair migrantes para as fazendas de café, carentes de mão de obra desde o fim da escravidão. Herdeiro de um passado escravista e colonial, o Brasil de então se via frente ao desafio de promover medidas capazes de alterar suas condições de saúde e de acabar com as epidemias, tendo em vista defender a vida de seus habitantes e a economia do país (PONTE, 2010, p. 49).

Com base nestas concepções, podemos perceber que no final do século XIX

a saúde no Brasil clamava por mudanças; as condições sanitárias eram lastimáveis,

ameaçando não apenas a economia, mas a vida da população brasileira.

Paim (2009) salienta que bem antes da existência do SUS, a organização dos

serviços de saúde no Brasil era bastante confusa. O que havia era um não sistema

que separava as ações de saúde pública e a assistência médica hospitalar. As

ações eram isoladas e voltadas para doenças específicas, em outras palavras, a

organização da saúde vivia em eixos separados:

[...] de um lado, as ações voltadas para a prevenção, o ambiente, a coletividade, conhecidos como saúde pública; de outro, a saúde do trabalhador, inserida no Ministério do Trabalho; e, ainda, as ações curativas e individuais, integrando a medicina previdenciária e as modalidades de assistência médica liberal, filantrópica e progressivamente, empresarial (PAIM, 2009, p. 31).

Cabe salientarmos que a saúde emerge como “questão social” no Brasil no

início do século XX, no bojo da economia capitalista exportadora cafeeira, refletindo

a emergência do trabalho assalariado (BRAVO; PAULA, 1986 apud BRAVO, 2009).

Na mesma linha de pensamento, Paim (2009) afirma que nesse período, a saúde

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despontava como “questão social”, ou seja, como um problema que não se restringe

ao indivíduo, passando a exigir respostas da sociedade e do poder público.

No alvorecer deste século, três grandes flagelos assolavam as principais

cidades do país: a varíola, a febre amarela e a peste bubônica (PONTE, 2010).

Nesse cenário, o Brasil e outros países buscaram desenvolver e aprofundar

pesquisas e estudos de novas técnicas de combate às doenças. Ocorreram

campanhas sanitárias lideradas por Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e outros, além de

um importante movimento pela mudança na organização sanitária, integrado por

diversas frações de classe; contudo, as ações eram pontuais e paliativas (PAIM,

2009).

De acordo com as discussões de BRAVO (2009), na década de 1920, do

Século XX, há tentativas de estender os serviços de saúde pública por todo o país

com a reforma Carlos Chagas (1923). Nesse período, são evidenciadas questões de

higiene e saúde do trabalhador. Esta conjuntura revela ações de proteção social,

marcando o início da Previdência Social no Brasil, que se deu com as Caixas de

Aposentadorias e Pensões (CAPs), conhecida como Lei Elói Chaves. Vinculadas a

grandes empresas, financiadas pela União, as CAPs forneciam serviços de

assistência médica aos trabalhadores assalariados, em troca de contribuições

mensais pelos empregados e empregadores. Estas caixas que se organizavam em

torno de categorias profissionais estratégicas para economia do país, como

ferroviários e marítimos, foram substituídas posteriormente pelos Institutos de

Aposentadorias e Pensões (IAPs).

É interessante salientar que os “benefícios” previdenciários só foram

alcançados por categorias específicas e pelas grandes empresas. A maior parte dos

assalariados estava excluída, precisando recorrer à precariedade dos serviços

filantrópicos e públicos, aos profissionais liberais ou as formas de medicina popular

(BRAVO, 2013, p. 123).

Paim (2009) concorda ao afirmar que a saúde não estava vinculada à

condição de cidadania, pois somente os trabalhadores que estavam ligados ao

mercado de trabalho, com carteira assinada e contribuições pagas à previdência

social tinham garantido o direito à assistência médica. Cabia aos indivíduos a

responsabilidade de resolver seus problemas de doença e acidentes.

As transformações socioeconômicas e políticas ocorridas na década de 1930,

do Século XX, com o processo de industrialização e com a redefinição do papel do

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Estado possibilitaram o surgimento de políticas sociais em resposta às

reinvindicações da massa trabalhadora, que teve acelerado crescimento com

condições deploráveis de saúde, moradia e higiene. Em 1930 foi criado o Ministério

da Educação e Saúde, assim como organizada uma política de saúde a partir de

dois eixos, conforme nos ressalta Bravo (2009):

O subsetor de saúde pública e o de medicina previdenciária. O subsetor de saúde pública será predominante até meados de 60 e se centralizará na criação de condições sanitárias mínimas para as populações urbanas e, restritamente, para as do campo. O subsetor de medicina previdenciária só virá sobrepujar o de saúde publica a partir de 1966 (BRAVO, 2009, p. 91).

Notamos que o modelo de previdência implantado com os institutos era

limitado e desigual, visava ampliar o rol de categorias correspondentes, mas seu

interesse maior estava no acúmulo financeiro, servindo também como estratégia de

controle das classes trabalhadoras.

A partir de 1945, as mudanças de conjuntura mundial, devido ao fim da

Segunda Guerra, influenciaram no conceito de saúde elaborado em 1948 junto à

Organização Mundial de Saúde (OMS)11. Reconhecendo que a saúde não tem

somente implicação física e biológica, as influências das questões sociais e

econômicas passam a ser consideradas, de modo que a saúde passa a ser definida

como um completo bem-estar físico, mental e social, e não somente ausência de

doenças (BRAVO; MATOS, 2004 apud SARRETA, 2009).

O período demarcado entre 1945 e 1964, portanto, apresentou mudanças e

algumas melhorias nas condições sanitárias, contudo, não eliminou a situação de

doenças graves infecciosas e os altos índices de mortalidade. Com a ditadura militar

os problemas sociais se aprofundaram. O Estado repressivo ampliou a assistência,

objetivando amenizar as tensões de classe e legitimar o regime. Presenciamos,

nesse contexto, a criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), em

1966, unificando os antigos IAPs. A saúde pública declinou, ao passo em que a

medicina previdenciária cresceu, privilegiando a produção privada e excluindo

grande parte da população. No período compreendido entre 1974 a 1979, a política

_____________ 11

O conceito da OMS, divulgado na carta de princípios de 7 de abril de 1948 (desde então o Dia Mundial da Saúde), implicando o reconhecimento do direito à saúde e da obrigação do Estado na promoção e proteção da saúde, diz que “Saúde é o estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade”. SCLIAR, M. História do Conceito de Saúde. PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 2007.

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social objetivava efetivar o enfrentamento à “questão social”, a fim de conter as

pressões populares que se acirravam (BRAVO, 2009).

Nesse contexto, podemos constatar o desenvolvimento da saúde privatista,

comprovando a ineficácia do Estado que desprestigiou os serviços públicos,

priorizando o capital industrial da saúde privada:

Entre dirigentes e burocratas dos institutos, prevaleceu a opção de comprar serviços médico-hospitalares do setor privado para os segurados da previdência, ao invés de investir em serviços próprios, de modo a ampliar a infraestrutura pública de serviços de saúde. Esta política, conhecida como privatização, foi intensificada nos governos militares (PAIM, 2009, p. 34).

Paim (2009) nos descreve de maneira detalhada os desdobramentos dessa

política no país, caracterizando os tipos de medicina que surgiram: na medicina

liberal, o profissional tinha ampla autonomia, que foi reduzida com a ampliação dos

custos e substituída pela medicina empresarial, numa relação comercial de compra

e venda dos serviços. Paralela a essa medicina, permanecia a medicina filantrópica,

que além da liberação dos impostos e contribuições por parte do Estado, recebia

subsídios, investimentos públicos e pagamento por serviços prestados.

O desenvolvimento industrial fortaleceu a expansão da assistência médico-

hospitalar em detrimento da saúde pública, na segunda metade da década de 1960,

com a criação da medicina de grupo, atuais cooperativas médicas, que apresentou

grande crescimento na década de 1970. Do mesmo período até a década de 1980

foram se desenvolvendo as empresas de seguro saúde, vendendo planos de saúde

no mercado. O setor de saúde suplementar12, espaço de crescimento da saúde

privada no Brasil, constituiu-se de modalidades da medicina empresarial:

autogestão, medicina de grupo, cooperativas médicas e seguro saúde. Todas

baseadas no pré-pagamento, ao contrário da medicina liberal, que se caracteriza

pelo pagamento no ato do serviço (PAIM, 2009).

A seguir faremos uma abordagem acerca do Projeto de Reforma Sanitária,

apresentando suas premissas e resultados, que culminaram na criação do Sistema

_____________ 12

A saúde suplementar é composta pelos serviços financiados pelos planos e seguros de saúde, sendo predominante neste subsistema. Este possui um financiamento privado, mas com subsídios públicos, gestão privada regulada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Os prestadores de assistência são privados, credenciados pelos planos e seguros de saúde ou pelas cooperativas médicas, serviços próprios dos planos e seguros de saúde, serviços conveniados ou contratados pelo subsistema público, que são contratados pelas empresas de planos e seguros de saúde que fazem parte de sua rede credenciada (BRASIL, 2007 apud PIETROBON et al 2008).

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Único de Saúde (SUS), apresentando os principais limites, possibilidades e desafios

para sua efetivação.

3.2 O Projeto de Reforma Sanitária e a construção do SUS

Podemos inferir, mediante contexto apresentado no tópico anterior, que a

política de saúde no Brasil passou por várias modificações até meados de 1988,

justamente no momento em que a economia crescia o país enfrentava uma crise na

saúde:

Ao mesmo tempo em que acontece a ampliação das políticas sociais, no regime militar autoritário, por um processo acelerado de privatização nos setores de bem de consumo coletivo, como é o caso da saúde [...] a partir de meados da década de 1970, o país assiste a um movimento de vários setores da sociedade civil para a democratização da saúde (SARRETA, 2011, p. 144).

Nos anos 1980, processo de redemocratização política no Brasil, ocorreu a

construção do Projeto de Reforma Sanitária13, cuja preocupação principal foi a

concepção de um Estado democrático e de direito, responsável pelas políticas

sociais e pela saúde. (BRAVO, 2013).

Para enfrentar os problemas e democratizar a saúde no Brasil, o movimento

foi organizado por segmentos populares, intelectuais, estudantes, partidos e

profissionais da saúde que propôs a Reforma Sanitária e a implantação do SUS. Ou

seja, foi um movimento que nasceu a partir da sociedade civil, que lutava para uma

mudança de estado ditatorial para democrático. Defendendo a democratização da

saúde e a reestruturação do sistema de serviços, com vistas à obtenção do direito

de cidadania.

A 8ª Conferência Nacional de Saúde14, ocorrida em 1986, configurou-se como

um marco na história da sociedade brasileira para a confirmação do SUS. Bravo

(2009) salienta em suas discussões que, neste evento, a questão da saúde

_____________ 13

Como princípios deste projeto ressaltam-se: democratização do acesso, universalização das ações, descentralização, melhoria da qualidade dos serviços com adoção de um novo modelo assistencial pautado na integralidade e equidade das ações e a participação popular através de mecanismos como os conselhos e conferências de saúde. Sua premissa básica consiste na saúde como direito de todos e dever do Estado (BRAVO, 2013, p. 177). 14

Segundo Bravo (2012), a 8ª Conferência Nacional de Saúde é considerada como a pré-constituinte da saúde, sendo a primeira com participação popular, contando com presença ampla de diversos segmentos da sociedade civil, com o tema “Democracia e Saúde”, reuniu cerca de quatro mil e quinhentas pessoas, significando o momento de sedimentação do projeto da Reforma Sanitária brasileira, expresso no seu relatório final.

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ultrapassou a análise setorial, referindo-se a sociedade como um todo, propondo

não apenas o Sistema Único, mas a Reforma Sanitária.

Falleiros e Lima (2010, p. 24) mencionam que os prestadores de serviços

privados foram os grandes ausentes nos debates travados nessa Conferência,

considerada o maior evento de discussão dos problemas enfrentados pela saúde

pública brasileira.

O relatório final do evento inspirou o capítulo ‘saúde’ da Constituição, desdobrando-se posteriormente, nas leis orgânicas da saúde (8.080/90 e 8.142/90), que permitiram a implantação do SUS. Na medida em que essas propostas nasceram da sociedade e alcançaram o poder público, mediante a ação dos movimentos sociais e a criação de dispositivos legais, é possível afirmar que o SUS representa uma conquista para o povo brasileiro (PAIM, 2009, p. 40).

Dessa forma, com a Constituição de 1988, a saúde passou a ser reconhecida

como um direito social, ou seja, inerente à condição de cidadania, cabendo ao poder

público a obrigação de garanti-lo. A partir de então, os serviços de saúde prestados

são remunerados pelo SUS e financiados pela sociedade por meio dos impostos e

contribuições. Constatamos também que o SUS foi conquistado, e que essa

conquista política e social pode ser atribuída a diversas lutas e esforços

empreendidos pelo movimento da Reforma Sanitária entre 1976 e 1988. Com essa

grande vitória, o país avançou significativamente em termos de direitos sociais,

frente à sua realidade historicamente desigual.

O processo constituinte e a promulgação da Constituição de 1988 representou, no plano jurídico, a promessa de afirmação e extensão dos direitos sociais em nosso país frente à grave crise e as demandas de enfrentamento dos enormes índices de desigualdade social. A Constituição Federal introduziu avanços que buscaram corrigir as históricas injustiças acumuladas secularmente, incapaz de universalizar direitos, tendo em vista a longa tradição de privatizar a coisa pública pelas classes dominantes (BRAVO, 2009, p. 97).

Com isto, fica perceptível tamanha relevância da Constituição de 1988 para o

Brasil, sobretudo no que tange à Seguridade Social nela contida, que compõe o tripé

Saúde, Assistência Social e Previdência Social, estabelecendo um sistema

abrangente, que assegura direitos universais, configurando um passo

importantíssimo no processo de construção da cidadania ao conceber a assistência

social e a saúde como política universal e não contributiva.

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Portanto, a saúde foi uma das áreas em que os avanços constitucionais foram

mais significativos. Certificada como “[...] um direito de todos e dever do Estado”

(BRASIL, 1988), as ações e serviços públicos passam a integrar uma rede

regionalizada e hierarquizada, constituindo o Sistema Único de Saúde (SUS),

organizado com diretrizes de descentralização, integralidade e participação15 (id.).

A partir de então, conforme salienta Bravo (2009), a mudança das práticas

institucionais foi realizada através de algumas medidas que visaram o fortalecimento

do setor público e a universalização do atendimento, a redução do papel do setor

privado na prestação de serviços, a descentralização política e administração do

processo decisório da política de saúde.

Como uma das proposições da Reforma Sanitária, o SUS foi regulamentado

em todo território nacional pela Lei Orgânica da Saúde16 (LOS), de n° 8.080/1990,

que compreende como dever do Estado garantir a saúde como direito fundamental

do ser humano, devendo prover as condições necessárias para tanto e sendo

responsável pela formulação e execução das políticas econômicas e sociais que

assegurem acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua proteção,

promoção e recuperação (BRASIL, 1990).

O SUS, segundo a LOS (Art. 4º), é definido como o conjunto de ações e

serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais,

municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder

Público. A iniciativa privada pode participar do SUS, em caráter complementar,

mediante contrato regido pelo direito público. Os serviços privados e filantrópicos

contratados funcionam como se públicos fossem.

No mesmo período da LOS, objetivando a sua complementação, foi

promulgada a Lei sobre a participação da comunidade na gestão do SUS (n°

_____________

15 Descentralização: É o processo de transferência de responsabilidade de gestão para os municípios, atendendo as determinações constitucionais e legais que embasam o SUS, definidor de atribuições comuns e competências específicas à União dos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; Integralidade: O SUS deve oferecer a atenção necessária à saúde da população, promovendo ações contínuas de prevenção e tratamento aos indivíduos e as comunidades, em quaisquer níveis de complexidade; Participação: É um direito e um dever da sociedade participar das gestões públicas em geral e da saúde pública em particular, assegurando a gestão comunitária do SUS. Fonte: O SUS no seu município: Garantindo saúde para todos. Disponível em: <http://www.pmfi.pr.gov.br/ArquivosDB?idMidia=63581>. Acesso em: 05 set. 2014 16 Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências (BRASIL, 1990).

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8.142/1990)17, que contará em cada esfera de governo com a Conferência de Saúde

e o Conselho de Saúde (BRASIL, 1990). Dispõe sobre o papel e a participação da

comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências de recursos financeiros

nas esferas de governo.

Assim, a saúde passou a ser legitimada como direito por meio desses

dispositivos legais que a regulamentam no plano jurídico como política. Todavia,

Bravo (2009) defende que essas medidas pouco impactaram na melhoria das

condições de saúde da população, pois a sua operacionalização não ocorreu.

Apontando para além dos limites estruturais, as forças progressistas comprometidas

com a Reforma Sanitária passaram, a partir de 1988, a perder espaços na aliança

política, bem como no interior dos aparelhos institucionais.

Todo o caminho traçado pela política de saúde no Brasil e todo o arcabouço

jurídico construído para o setor até aqui revelam importantes passos para a sua

consolidação enquanto direito social, mas carregam também grandes limitações e

muitos desafios.

Logo após a Constituição, as políticas sociais enfrentam inúmeros

rebatimentos da política neoliberal, resultando numa série de determinações

políticas, econômicas e sociais. Nas quais, o processo de mudança da RSB, passa a

ser negado na prática pela continuidade de um sistema socialmente injusto (LIMA;

OLIVEIRA, 2012).

Na década de 1990, a afirmação da hegemonia neoliberal influencia no papel

do Estado, que se desvia de suas funções básicas ao ampliar sua presença no setor

produtivo, se tornando promotor e regulador, e transferindo suas atividades para o

setor privado. (BRAVO, 2009, p. 100).

Com a afirmação das contrareformas de cunho neoliberal, o projeto do grande

capital objetiva a defesa do processo de privatização, a mercantilização da saúde, a

ampliação do assistencialismo e a constituição do cidadão consumidor (CFESS,

2010). Este processo é caracterizado por pela privatização do patrimônio público,

barateamento da força de trabalho, precarização das políticas públicas e o corte nos

gastos sociais.

_____________ 17

Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências (BRASIL, 1990).

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Constatamos a partir disso que o neoliberalismo, objetivando ampliar o

mercado e a privatização, reduzindo sua intervenção e flexibilizando as relações de

trabalho tem sido responsável pela redução dos direitos sociais, pelo desemprego

em massa, precarização do trabalho, sucateamento da saúde, entre outras

problemáticas. Isso acarreta, portanto, na desconstrução da proposta de política de

saúde construída nos anos 1980.

Bravo (2009) aponta algumas questões que comprometeram a possibilidade

do avanço do SUS como política social: o desrespeito ao princípio da equidade na

alocação de recursos públicos pela não unificação dos orçamentos federal,

estaduais e municipais; e o afastamento do princípio da integralidade, priorizando a

assistência médico-hospitalar em detrimento das ações de promoção e proteção da

saúde. A proposta de reforma, ou contrarreforma do Estado para o setor de saúde,

era de separar o SUS em dois: o hospitalar e o básico.

Diante do exposto, o Estado só deve intervir com o intuito de garantir um

mínimo para aliviar a pobreza e produzir serviços que os privados não podem ou

não querem produzir [...]. “Portanto, o neoliberalismo opõe-se radicalmente à

universalidade, igualdade e gratuidade dos serviços sociais”. (LAURELL, 1997 apud

LIMA & OLIVEIRA, 2012, p. 93).

Sustenta Sarreta (2011) que a criação do SUS representou importantes

mudanças de caráter institucional, pois a organização da saúde no Brasil, durante a

década de 1990, trouxe grandes inovações decorrentes do processo de

descentralização. Entretanto, o fortalecimento da política econômica neoliberal

manteve a continuidade das desigualdades no acesso aos bens e serviços públicos,

como a saúde. A crise econômica, junto com mudanças políticas e econômicas,

chocou-se com os direitos afirmados na Constituição. Observa-se, assim, que estes

acontecimentos causaram uma filosofia destoante aos direitos sociais e trabalhistas

garantidos legalmente, mas distanciados no plano prático.

O que se observou nesse quadro, apesar das declarações oficiais de adesão

ao SUS, foi o descumprimento dos dispositivos legais e uma omissão do governo na

regulamentação e fiscalização das ações de saúde em geral. Nesse cenário,

presenciamos dois projetos em tensão: o projeto de reforma sanitária, já explicitado

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anteriormente, e o projeto de saúde articulado ao mercado ou privatista18,

caracterizado como:

[...] a reatualização do modelo médico-assistencial privatista, está pautado na política de Ajuste, que tem como principais tendências a contenção dos gastos com racionalização da oferta e a descentralização com isenção de responsabilidade do poder central. A tarefa do Estado, nesse projeto, consiste em garantir um mínimo aos que não podem pagar, ficando para o setor privado o atendimento dos que têm acesso ao mercado (BRAVO, 2009, p. 101).

Percebemos que a universalidade do direito à saúde que fundamenta o SUS

tem gerado conflitos e provocado resistência àqueles que são favoráveis ao projeto

de saúde voltado para o mercado, e que através desse projeto o SUS “universal” só

ocorre no âmbito da realidade daqueles mais pobres.

Bravo (2009) afirma tal colocação quando chama a atenção para o

distanciamento entre a proposta do movimento sanitário e a realidade que

vivenciamos no SUS, que acabou por se consolidar como espaço destinado aos que

não têm acesso aos subsistemas privados, como parte de um sistema segmentado.

Estabelecendo relações desiguais e contraditórias no acesso à saúde. A partir disso,

a autora infere:

O Projeto de Reforma Sanitária está perdendo a disputa para o Projeto voltado para o mercado. Os valores solidários que pautaram as formulações da concepção de Seguridade Social, inscrita na Constituição de 1988, estão sendo substituídos pelos valores individualistas que fortalecem a consolidação do SUS para os pobres e a segmentação do sistema (BRAVO, 2009, p. 107).

Desse modo, os valores são distorcidos, o individualismo e o espírito de

concorrência são cada vez mais evidenciados, apresentando grandes contradições

entre o que está posto legalmente na política de saúde e a realidade frente ao seu

acesso como direito universal.

O SUS é um projeto inovador, a despeito de está sendo gerado dentro de

uma estrutura obsoleta, centralizada e marcada por profundas desigualdades

sociais, econômicas e culturais.

_____________ 18

Suas principais propostas são: caráter focalizado para atender as populações vulneráveis através do pacote básico para a saúde, ampliação da privatização, estímulo ao seguro privado, descentralização dos serviços ao nível local, eliminação da vinculação de fonte com relação ao financiamento (COSTA, 1997 apud BRAVO, 2009).

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Destarte, percebemos que a realidade enfrentada pelo SUS são problemas

que envolvem o acesso e a qualidade do atendimento e comprometem o modelo de

atenção proposto, bem como a sua legitimidade, comprovando que as expressões

da “questão social” na área da saúde revelam-se nestas contradições e nas

desigualdades sociais.

Mesmo assim, os avanços empreendidos com a criação desse sistema são incontestáveis ao se analisar o aparato jurídico-legal que institucionalizou o SUS com seus princípios e diretrizes inovadores, que incentivam a cidadania e a democracia. Além disso, o SUS proporcionou o acesso às camadas da população até então desprovidas de direito. Tal avanço o transformou numa das politicas públicas brasileiras de maior amplitude (OLIVEIRA, 2006 apud LIMA; OLIVEIRA, 2012, p. 94).

Os resultados alcançados pelos SUS são realmente inegáveis; contudo,

persistem os problemas a serem enfrentados para que sua consolidação seja

efetivada, os grandes desafios19 envolvidos são: o desafio da universalidade, o

desafio do financiamento, o desafio do modelo institucional, o desafio da gestão do

trabalho, e o desafio da participação social (CONASS, 2006).

Bravo (2009) assegura que a construção da democracia é o único caminho

para se alcançar a Reforma Sanitária, bem como a mobilização política como

estratégia. Na saúde, a grande bandeira é a luta para o fortalecimento e

consolidação do Projeto de Reforma Sanitária.

As discussões apresentadas acima foram de suma importância para

retomarmos um pouco sobre o processo histórico de constituição da Saúde no

Brasil, política pública vista como um direito social universal, destacando suas

características principais, seus avanços e recuos, pois não podemos deixar de

reconhecer em todo esse movimento as grandes tensões e limitações que se

apresentam e desafiam cotidianamente a sua implementação.

A partir do próximo ponto, iremos desenvolver uma reflexão sobre o Serviço

Social e sua inserção profissional na área da Saúde. Discutiremos a relação entre o

Projeto de Reforma Sanitária e o Projeto Ético-político do Serviço Social.

Abordaremos de forma sucinta a intervenção profissional do assistente social, bem

como, o seu arcabouço jurídico-político nesta esfera. De posse dessa

_____________ 19

Ver detalhes em BRASIL. Conselho Nacional de Secretários da Saúde. SUS: avanços e desafios. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.

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fundamentação, pretendemos refletir sobre os desafios hoje postos à categoria para

efetivação da saúde enquanto direito social.

3.3 Serviço Social e saúde no contexto atual

A partir do cenário exposto anteriormente, podemos perceber que o Serviço

Social brasileiro tem uma participação ativa e efetiva na defesa da saúde enquanto

direito social e do SUS como política pública, universal e integral.

Imprescindível considerarmos que o trabalho do profissional do Serviço Social

será diretamente impactado nessa nova configuração da política de saúde no que

tange às condições de trabalho, à formação profissional e influências teóricas e

ampliação da demanda. Amplia-se o trabalho precarizado e os profissionais são

chamados a amenizar a situação da pobreza [...] (CFESS, 2010, p. 21).

Para uma análise do Serviço Social no âmbito da Saúde no atual contexto é

necessário recuperarmos os avanços e recuos ocorridos na profissão a partir da

década de 1980, período que demarca o início da maturidade da tendência

hegemônica – intenção de ruptura20 – e a real interlocução com a tradição marxista.

Contudo, na saúde:

[...] os avanços conquistados pela profissão no exercício profissional são considerados insuficientes, pois o Serviço Social chega à década de 1990 ainda com uma incipiente alteração do trabalho institucional, continua enquanto categoria desarticulada do Movimento de Reforma Sanitária, e insuficiente produção sobre as demandas postas à prática em saúde. (BRAVO, 1996 apud CFESS, 2010, p. 23).

Nesta década, o Serviço Social parecia ter uma conjuntura favorável para

desenvolver práticas que respondessem a este novo momento da profissão, mas se

deparou com a consolidação e êxito ideológico do projeto neoliberal no Brasil, que

vem de encontro ao projeto profissional hegemônico do Serviço social e com o

projeto da Reforma Sanitária (KRUGER, 2010).

_____________ 20

A perspectiva de “intenção de ruptura” do projeto de formação profissional do Serviço Social pode ser caracterizada como um movimento de ideias que visa à renovação da profissão, objetivando romper substantivamente com o tradicionalismo e suas implicações teórico-metodológicas e prático-profissionais (NETTO, 2001).

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Diante desse contexto, identifica-se que os dois projetos políticos em disputa

na área da saúde passam a apresentar diferentes demandas para a profissão.

Conforme pontua Bravo (1996):

O projeto privatista vem requisitando ao assistente social, entre outras demandas, a seleção socioeconômica dos usuários, atuação psicossocial por meio de aconselhamento, ação fiscalizatória aos usuários dos planos de saúde, assistencialismo por meio da ideologia do favor e predomínio de práticas individuais. Entretanto, o projeto de reforma sanitária, vem apresentando como demandas que o assistente social trabalhe as seguintes questões: democratização do acesso às unidades e aos serviços de saúde; estratégias de aproximação das unidades de saúde com a realidade; trabalho interdisciplinar; ênfase nas abordagens grupais; acesso democrático às informações e estímulo à participação popular. (BRAVO, 1996 apud CFESS, 2010, p. 23).

Diante das requisições apresentadas, fica perceptível a relação existente

entre o projeto ético-político e o projeto de reforma sanitária, sobretudo no tocante

aos seus grandes eixos: principais aportes e referências teóricas, formação

profissional e princípios. Os dois projetos são construídos durante o processo de

redemocratização da sociedade brasileira e ambos se consolidam nos anos de

1980. Não podemos deixar de mencionar a luta em defesa da efetivação dos direitos

sociais e da saúde em específico nos dois projetos.

Sarreta (2008) concorda quando aponta em seus estudos que as proposições

enunciadas no projeto ético-político do Serviço Social, materializadas no Código de

Ética de 1993, convergem e refletem o movimento da Reforma Sanitária brasileira,

visando efetivar a universalidade do acesso à saúde por meio de políticas públicas

efetivas. Sua implementação destina-se a amenizar as diferenças e injustiças

instaladas na sociedade e considerar mecanismos que permitam ampliar as

possibilidades de acesso aos bens e serviços produzidos. São enunciados de

princípios e diretrizes para a construção de relações com base na liberdade, na

supressão da alienação, das formas de exploração, dominação e para a participação

ativa dos sujeitos sociais.

Matos (2013), sob outra ótica, assinala que embora sejam distintos, uma vez

que o Projeto Ético-Político do Serviço Social é de uma corporação profissional e o

da Reforma Sanitária um projeto de política social que se materializa como um

serviço, ambos possuem uma nítida vinculação a um projeto societário não

capitalista, apontando para a superação do sistema vigente.

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Interessa-nos aqui refletir, diante das considerações expostas, acerca da

inserção do profissional de Serviço Social na Saúde, considerando que neste

cenário encontram-se inúmeras razões para que sua ação e intervenção profissional

sejam pautadas de forma a tensionar a política social vigente em direção aos

propósitos da reforma sanitária e do projeto ético-político da profissão.

O Serviço Social se legitima na saúde a partir das contradições da política de

saúde. É nas lacunas ocasionadas pela não efetivação do SUS que o assistente

social vem sendo demandado a intervir, e desta forma, constituindo o elo invisível do

SUS (COSTA, 2000 apud MATOS, 2013).

As premissas para a intervenção profissional em saúde assentam-se em três

pilares21: necessidades sociais em saúde; direito à saúde e produção da saúde

(KRUGER, 2010, p. 223).

A profissão vem produzindo conhecimentos e alternativas para enfrentar as

dificuldades vivenciadas no cotidiano, provocando o alargamento da prática

profissional, que, associada à produção de conhecimentos e à qualificação

profissional, tem ampliado a inserção do profissional na área da saúde e, ao mesmo

tempo, vem legitimando o trabalho e ampliando as possibilidades de acesso e de

inclusão social. Assim, compreende-se que:

[...] cabe ao Serviço Social – numa ação necessariamente articulada com outros segmentos que defendem o aprofundamento do SUS – formular estratégias que busquem reforçar ou criar experiências nos serviços de saúde que efetivem o direito social à saúde, atentando que o trabalho do assistente social que queira ter como norte o projeto ético-político profissional, tem de, necessariamente, estar articulado ao projeto de reforma sanitária (MATOS, 2003; BRAVO; MATOS, 2004 apud CFESS, 2010, p. 28).

Nessa conjuntura, as entidades do Serviço Social têm por desafio articular

com os demais profissionais de saúde e movimentos sociais em defesa do projeto

de Reforma Sanitária. Considerando que as transformações estruturais nas políticas

sociais, e na saúde em particular, só serão efetivadas através de um amplo

movimento de massas que questione a cultura política da crise gestada pelo capital

_____________

21 Ver melhor caracterização dos três pilares em MIOTO, R.C.T; NOGUEIRA, V.M.R. Serviço Social e Saúde – desafios intelectuais e operativos. In: SER Social, Brasília, v. 11, n. 25, p. 221-243, jul./dez.2009.

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e que lute pela ampliação da democracia numa dimensão econômica, política e

cultural (CFESS, 2010).

Para Behring e Boschetti (2006), refletir a dimensão de produção e

reprodução das políticas sociais é também um dos desafios a serem enfrentados,

para que o assistente social atue também como um sujeito articulador do processo

organizativo. Desvendando os mecanismos postos pelo ideário neoliberal, seu

funcionamento, sua complexidade e contradições, o assistente social direciona seu

trabalho na busca de estratégias que fortaleçam a saúde como direito universal.

Considera-se que o Código de Ética do Assistente apresenta ferramentas

essenciais para a atuação profissional na esfera da saúde em todas as suas

dimensões. Pensar e realizar uma prática crítica e competente do Serviço Social na

área da saúde consiste em: estar articulado e sintonizado ao movimento dos

trabalhadores e de usuários que lutam pela real efetivação do SUS; conhecer as

condições de vida e trabalho dos usuários, bem como os determinantes sociais que

interferem no processo saúde-doença; facilitar o acesso de todo e qualquer usuário

aos serviços de saúde da instituição e da rede de serviços e direitos sociais; buscar

a necessária atuação em equipe, tendo em vista a interdisciplinaridade. (CFESS,

2010).

É indispensável salientarmos ainda os dois grandes pilares que

regulamentam e legitimam a profissão, conferem as atribuições e competências dos

profissionais, na saúde ou em outro espaço sócio-ocupacional: a Lei de

Regulamentação da Profissão de Assistente Social (Lei no. 8.662/93) e o Código de

Ética do Assistente Social (Resolução CFESS N. 273/93), que apresentam seus

direitos e deveres, bem como os princípios fundamentais22 e os valores que

orientam e norteiam o exercício profissional, e sua relação com usuários,

_____________

22 Reconhecimento da liberdade como valor ético central; defesa intransigente dos direitos humanos; ampliação e consolidação da cidadania, com vista à garantia de direitos civis, sociais e políticos das classes trabalhadoras; defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização política e da riqueza socialmente produzida; posicionamento em favor da equidade e justiça social, que assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática; empenho na eliminação de todas as formas de preconceito; garantia do pluralismo, por meio do respeito às correntes teóricas, e compromisso com o constante aprimoramento intelectual; opção por um projeto vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação/exploração de classe, etnia e gênero; articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que partilhem dos princípios deste código e com a luta geral dos trabalhadores; compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional e exercício do Serviço Social sem discriminação (CFESS, 2012).

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profissionais, entidades da categoria e instituições empregadoras. Requisitando,

com base na referida Lei, algumas competências gerais, fundamentais à

compreensão do contexto sócio-histórico em que se situa a intervenção profissional:

[...] compreensão do significado social da profissão e de seu desenvolvimento sócio-histórico, nos cenários internacional e nacional, desvelando as possibilidades de ação contidas na realidade; - identificação das demandas presentes na sociedade, visando formular respostas profissionais para o enfrentamento da questão social, considerando as novas articulações entre o público e o privado (ABEPPSS, 1966 apud CFESS, 2010, p. 33).

Junto aos instrumentos legais já citados, que delimitam atribuições e

competências do assistente social, não podemos esquecer-nos de salientar a

publicação de um importante documento específico na área da saúde denominado

Parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde, pelo

Conselho Federal de Serviço Social – CFESS – (2010). O referido documento, como

seu próprio título denuncia, tem por finalidade referenciar a intervenção profissional

do assistente social na saúde, com o objetivo de fortalecer a prática na direção dos

Projetos de Reforma Sanitária e Ético-Político Profissional, imprimindo maior

qualidade ao atendimento prestado à população usuária.

Os assistentes sociais na saúde atuam em quatro grandes eixos23 que devem

ser compreendidos de forma articulada, numa concepção de totalidade: atendimento

direto aos usuários; mobilização, participação e controle social; investigação,

planejamento e gestão; assessoria, qualificação e formação profissional (CFESS,

2010).

No que tange à intervenção profissional do assistente social na saúde,

Vasconcelos (2009) nos faz importantes considerações. No interior dos espaços

sócio-ocupacionais neste âmbito, os assistentes sociais seguem uma lógica de

organização de seu trabalho a partir de plantão ou plantão e programas.

Esta autora critica essa maneira de organização do Serviço Social na saúde e

a postura dos profissionais de se colocarem passivos, submissos, dependentes e

subalternos às rotinas institucionais e as solicitações da direção, dos demais

profissionais e dos serviços de saúde, aceitando como únicas as demandas dos

_____________ 23

O Documento Parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde (CFESS, 2010) explicita as principais ações desenvolvidas pelo assistente social nesses quatro eixos.

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usuários, o que acabam por resultar numa concepção passiva das demandas

direcionadas ao Serviço Social, o que determinará a qualidade de seu trabalho. Essa

organização através de plantão é caracterizada por Vasconcelos (2009, p. 246) da

seguinte maneira:

O plantão se caracteriza por ser uma atividade de qualquer demanda da unidade/usuários; funciona na maioria das vezes em locais precários quanto ao tamanho, localização e instalação. Assim, um ou mais assistentes sociais, num mesmo espaço físico, aguardam serem procurados – de forma passiva – por usuários que buscam espontaneamente ou são encaminhados ao plantão do Serviço Social (VASCONCELOS 2009, p. 246, grifos da autora).

O plantão faz parte de qualquer unidade de saúde e constitui-se como ponto

de referência para a realização de trabalho com os internados e seus familiares.

Neste plantão, o usuário é recebido, ouvido e encaminhado para recursos internos

ou externos. Assim, o plantão não se constitui, num serviço ou uma atividade

pensada, planejada, organizada, reduzindo-se as ações isoladas para resolver os

problemas dos usuários (VASCONCELOS, 2009).

Destarte, a autora defende que a prática do assistente social reduz-se a uma

prática burocrática, não assistencial, que objetiva dificultar e inviabilizar o acesso

dos usuários aos serviços e recursos enquanto direito social. Vasconcelos nos

coloca ainda, que as demandas manifestadas são consideradas individuais, ou seja,

não são consideradas coletivas por que são apresentadas individualmente.

Sustentando ainda que os assistentes sociais negam o caráter coletivo dessas

demandas, que são coletivas, sobretudo, por que só coletivamente poderão ser

enfrentadas.

O grande desafio colocado por Vasconcelos (2009) está na apropriação de

uma perspectiva teórico-metodológica, capaz de gerar condições para um exercício

profissional crítico, criativo e politizante, de acordo com os valores preconizados no

Código de Ética Profissional de 1993.

Ao analisar criticamente o enfrentamento das desigualdades sociais e o

direcionamento das políticas públicas para a construção da saúde como direito, o

assistente social pode contribuir efetivamente na criação e implementação de

políticas e programas que apresentem mecanismos, procedimentos e ações para o

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acesso à saúde e às instituições, e assim, aos bens e serviços produzidos pela

sociedade. (IAMAMOTO, 2012; BRAVO, 2006).

A partir dessa abordagem teórica, principalmente a defendida por Bravo

(2009), podemos observar que o assistente social dispõe de atribuições específicas

na área da saúde, o que constitui um instrumento importante na construção de

estratégias para o exercício profissional e na busca de alternativas visando ao

atendimento das necessidades sociais apresentadas pelos usuários nos serviços de

saúde.

Assim, a realidade enfrentada na saúde, a partir da desconstrução dos

direitos assegurados na legislação, deve levar o assistente social a refletir e buscar

novos caminhos para a conquista do direito universal à saúde. Para que em suas

intervenções profissionais, possa alcançar os recursos e as soluções necessárias

para garantia da saúde enquanto direito social. Trabalhando com essas questões,

estará contribuindo para a construção da integralidade da saúde do usuário, que

consiste em atendê-lo na sua totalidade, pois este faz parte de um contexto

histórico, social, econômico e político.

3.4 O conceito ampliado de Saúde e o Serviço Social

Para uma melhor compreensão da saúde, faz-se necessário conhecermos o

seu amplo significado, construído historicamente de acordo com cada conjuntura

social, cultural, econômica e política.

Paim (2009) nos apresenta três dimensões da saúde: Estado vital, que

corresponde ao modo de levar a vida; um setor produtivo da economia onde se

produzem ações de saúde, bens e serviços; e uma área do saber, a partir da

produção de conhecimento. Entretanto, a saúde tem sido reconhecida como o

completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença.

Conforme se referem Falleiros e Lima (2010, P. 242):

[...] depois inscrita na Constituição Federal de 1988; resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra, e acesso aos serviços de saúde (FALLEIROS; LIMA, 2010, P. 242).

Esse conceito de saúde na Constituição de 1988 e na Lei nº 8.080/1990,

ressalta as expressões da “questão social”, ao apontar que “[...] a saúde é um direito

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de todos e dever do Estado, garantido mediantes políticas sociais e econômicas que

visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e

igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”

(BRASIL, 1988) e indicar como fatores determinantes e condicionantes de saúde,

entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio-ambiente, o

trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços

essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e

econômica do país. (Lei nº 80.080/1990, artigo 3º).

Arouca (1987 apud KRUGER, 2010) abarca essa dimensão social quando

confere um significado abrangente afirmando que a saúde:

[...] não é simplesmente não estar doente, é mais: é um bem estar social, é o direito ao trabalho, a um salário condigno, é o direito a ter água, à vestimenta, à educação, e até, a informação sobre como se pode dominar o mundo e transformá-lo. É ter direito a um meio ambiente que não seja agressivo, mas que, pelo contrário, permita a existência de uma vida digna e decente; a um sistema, político que respeite a livre opinião, a livre possibilidade de organização e de autodeterminação de um povo. É não estar todo tempo submetido ao medo da violência, tanto daquela violência resultante da miséria, que é o roubo, o ataque, como a violência de um governo contra seu próprio povo, para que sejam mantidos os interesses que não sejam os do povo (AROUCA, 1987, p. 36 apud KRUGER, 2010).

Percebemos, assim, a saúde compreendida como um conjunto de fatores

sociais, com sua compreensão mais ampla, expressando seus determinantes

sociais, tendo em vista que está diretamente relacionada com as condições de vida

e trabalho da sociedade, articulando e sofrendo as determinações de sua lógica e

estrutura.

O conceito da saúde é mencionado por Carvalho e Buss (2013) como uma

complexa produção social, em que os resultados para o bem-estar da humanidade

são cada vez mais o fruto de decisões políticas incidentes sobre os seus

determinantes sociais.

Navarro (1983 apud BRAVO, 2013, p.20) considera que a medicina reproduz

a ideologia do sistema capitalista, pautada no individualismo, quando os

profissionais reduzem os determinantes das enfermidades (que são, na sua origem,

sociais) a uma categoria individual e o tipo de intervenção é orientado basicamente

para o “doente”.

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Diante desse reconhecimento, percebemos que na contemporaneidade a

profissão do assistente social, assim como a saúde, vêm avançando

significativamente. O Conselho Nacional de Saúde (CNS), através da Resolução nº

218/1997, reconheceu o assistente social como um dos treze profissionais da saúde

de nível superior. O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), através da

Resolução 383/1999, reafirma o assistente social como profissional de saúde,

considerando seu conceito que amplia a compreensão da relação saúde-doença

como decorrência das condições de vida e de trabalho na própria formação do

assistente social e no seu compromisso ético-político expresso no Código de Ética

da profissão.

Ao defender essa concepção de saúde, o movimento de reforma sanitária

salientou a importância da determinação social sustentada nas categorias de

trabalho e reprodução social da vida. Nessa concepção são fundamentais o contexto

e as condições sociais que impactam o processo saúde-doença (CFESS, 2010, p.

38).

Dessa forma, é por meio do reconhecimento das determinações sociais que

impactam a saúde que a política de saúde brasileira em muito alargou o espaço de

atuação de vários profissionais da saúde, entre eles, o do assistente social.

O modelo de atenção à saúde, construído pelo movimento sanitário, pautado

nesta concepção ampliada de saúde e postulando o paradigma da determinação

social como estruturantes do processo saúde-doença, constituem-se num terreno

extremamente fértil para o Serviço Social (MIOTO; NOGUEIRA, 2009).

Ao reconhecer a saúde como resultado das condições econômicas, políticas,

sociais, culturais, o Serviço Social passa a fazer parte do conjunto de profissões

necessárias à identificação e análise dos fatores que intervém no processo

saúde/doença.

Cumpre observar que hoje, no Brasil, o Serviço Social integra o rol das

profissões de saúde, sendo reconhecido tanto no plano legal como através da

legitimação social das suas ações profissionais. Isso decorre da ampliação do

conceito de saúde, incorporando sua dimensão social e, consequentemente, a

exigência da proteção social em saúde (MIOTO; NOGUEIRA, 2009, p. 223).

Assim, devemos considerar a totalidade na qual o indivíduo está inserido

socialmente, constituída em seus aspectos culturais, econômicos e políticos. É

também extremamente relevante considerarmos a perspectiva da saúde como

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produção social, conforme nos esclarece Paim (2009), ao afirmar que a saúde tem

fatores determinantes e condicionantes, expressos na organização social e

econômica do país, indicando uma concepção que ultrapassa as dimensões

biológicas da saúde dos indivíduos e da coletividade, alcançando uma dimensão

social que adota seu conceito de modo ampliado. Conforme especificado no artigo

3º da LOS.

Daí o reconhecimento do Assistente social enquanto profissional necessário

para atuar na área da saúde para poder compreender esta outra dimensão que

determina a saúde ou a falta desta, numa dimensão de totalidade, que vai muito

além da dimensão biológica.

As condições de vida da população usuária, como a pauperização, a velhice,

a ausência de vínculos familiares têm sido “problemas” para os serviços de saúde.

Neles, a “resposta” a esses “problemas” tem sido encarada como responsabilidade

exclusiva do Serviço Social (MATOS, 2013, p. 65).

Portanto, o objetivo da profissão na área da saúde passa por essa

compreensão dos determinantes sociais, econômicos e culturais que interferem no

processo saúde-doença, na busca de estratégias político-institucionais para o

enfrentamento da “questão social”.

O reconhecimento da questão social como objeto de intervenção profissional

(conforme estabelecido nas Diretrizes Curriculares da ABEPSS, 1996) demanda

uma atuação profissional em uma perspectiva totalizante, baseada na identificação

das determinações sociais, econômicas e culturais das desigualdades sociais. A

intervenção orientada por esta perspectiva teórico-política pressupõe: leitura crítica

da realidade e capacidade de identificação das condições materiais de vida,

identificação das respostas existentes no âmbito do Estado e da sociedade civil,

reconhecimento e fortalecimento dos espaços e formas de luta e organização dos

trabalhadores em defesa dos seus direitos; formulação e construção coletiva, em

conjunto com os trabalhadores, de estratégias políticas e técnicas para modificação

da realidade e formulação de formas sobre o Estado, com vistas a garantir os

recursos financeiros, materiais, técnicos, e humanos necessários à garantia de

direitos (CFESS, 2010, p. 33).

O debate sobre o trabalho do assistente social na saúde deve ser

aprofundado com outros sujeitos profissionais, a partir do que caracteriza a

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intervenção, mas também resgatando essa dimensão do conceito ampliado de

saúde, que deve ser considerado em sua totalidade.

4 QUESTÃO SOCIAL E SERVIÇO SOCIAL

4.1 A “questão social” e suas concepções: um debate necessário

Visamos neste capítulo problematizar diferentes concepções da “questão

social”, apresentando um breve resgate acerca de seu entendimento e enfretamento

no contexto do liberalismo clássico ao neoliberalismo, bem como o conceito adotado

pelo Serviço Social, tendo esta enquanto objeto da intervenção profissional. Ainda

neste capítulo final apresentamos os resultados dos dados obtidos por meio das

entrevistas realizadas com seis das assistentes sociais que atuam no HIAS/CPC,

com o objetivo de condensar uma análise dos principais aspectos percebidos nas

falas das profissionais, com ênfase naqueles que mais se aproximam do objeto de

nossa pesquisa.

A “questão social” é considerada numa perspectiva de reunir os problemas

que atingem a sociedade num determinado contexto histórico. Indissociável a

intervenção profissional do assistente social, por constituir-se como objeto da

profissão. Isto posto, consideramos de extrema relevância buscarmos compreender

a sua concepção em diferentes contextos até os dias de hoje.

Durante muito tempo a “questão social” esteve relacionada à “disfunção” ou

ameaça de alguns indivíduos a ordem social. Seu reconhecimento se deu na

segunda metade do século XIX, com a emergência da classe operária e seu

ingresso no cenário politico, na luta por direitos sociais (IAMAMOTO, 2012).

A expressão foi cunhada em meados 1930, vista como ameaça a luta de

classes no âmbito do poder. Os argumentos construídos por Iamamoto centralizam-

se nas análises de Marx sobre o processo de acumulação capitalista e das

consequências deste em relação à classe trabalhadora, ou seja, se expressa nas

contradições entre capital e trabalho. Logo, a “questão social” é apreendida por

Iamamoto (2012, p. 27) como sendo:

O conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que têm uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a

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apropriação dos seus frutos se mantém privada, monopolizada por uma parte da sociedade (IAMAMOTO, 2012, p. 27).

Portanto, a “questão social” expressa as contradições do Modo de Produção

Capitalista (MCP). Contradições estas fundadas na produção (pelos trabalhadores) e

apropriação (pelos capitalistas) da riqueza produzida socialmente e na exploração

de uma classe sobre a outra.

A fim de melhor condensarmos a nossa discussão, julgamos interessante

traçar, à luz de Montaño (2012), um breve resgate da concepção e enfrentamento da

“questão social” do liberalismo clássico ao neoliberalismo.

No contexto do capitalismo concorrencial do século XIX, a expressão

"questão social" começa a ser empregada maciçamente a partir da separação

positivista, no pensamento conservador, entre o econômico e o social, dissociando

as questões tipicamente econômicas das "questões sociais" (NETTO, 2001, p. 42

apud MONTAÑO, 2012).

Dessa forma, o social era visto de forma naturalizada e a-histórico,

desarticulado dos fenômenos econômicos e políticos da sociedade. Logo, se a

problemática social não tinha seus fundamentos na estrutura socioeconômica, seu

enfrentamento também não passaria pela lógica de transformação do sistema.

Começa-se a se pensar então a "questão social", a miséria, a pobreza, e todas as manifestações delas, não como resultado da exploração econômica, mas como fenômenos autônomos e de responsabilidade individual ou coletiva dos setores por elas atingidos. A "questão social", portanto, passa a ser concebida como "questões" isoladas, e ainda como fenômenos naturais ou produzidos pelo comportamento dos sujeitos que os padecem (MONTAÑO, 2012, p. 272).

Refletindo sobre esse cenário, o autor nos assinala que a “questão social” e

suas causas estariam vinculadas a pelo menos três elementos, numa perspectiva

individual, sendo eles: déficit educativo; problema de planejamento e problema de

ordem moral-comportamental.

Acrescenta-se a essa “cultura da pobreza”, o fato de o indivíduo ser sempre

culpabilizado pelas suas condições de vida e pobreza, e o seu enfrentamento é

desenvolvido por meio de ações filantrópicas.

Assim, o tratamento das chamadas ‘questões sociais’ passa a ser segmentado (separado por tipo de problemas, por grupo populacional, por território), filantrópico (orientado segundo os valores da filantropia burguesa), moralizador (procurando alterar os aspectos morais do indivíduo)

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e comportamental (considerando a pobreza e as manifestações da “questão social” como um problema que se expressa em comportamentos, a solução passa por alterar tais comportamentos) (NETTO, 2001, p. 47 apud MONTAÑO, 2012).

A partir de então, a saída para a resolução das chamadas “questões sociais”,

estaria na filantropia e na educação dos indivíduos.

Em meados 1834, no contexto de lutas de classes trabalhistas, começa-se a

entender a lei dos pobres24 como a fonte da situação do pauperismo inglês, que

estaria estimulando a miséria e suas causas. Assim, ao invés de ser tratada como

ações filantrópicas e assistenciais, a pobreza passa a ser reprimida e castigada. A

beneficência e os abrigos passam a ser substituídos pela repressão. A ideológica

expressão de “marginal” começa a adquirir uma conotação de “criminalidade”. O

pobre, aqui identificado como marginal, passa a ser visto como ameaça à ordem

(MONTAÑO, 2012, p. 273).

Diante do exposto, a “questão social” passa a ser entendida de modo

separado dos fundamentos econômicos, a pobreza é atribuída a causas individuais

e psicológicas e o seu enfrentamento se dá através da repressão e reclusão dos

pobres.

No contexto do capitalismo monopolista (final do século XIX até o final da

década de 30 do século XX), o Estado assume tarefas e funções essenciais para

nova fase de acumulação e inibição-institucionalização dos conflitos sociais da

classe trabalhadora.

Aqui a “questão social” passa a ser como que internalizada na ordem social. Não mais como um problema meramente oriundo do indivíduo, mas como consequência do ainda insuficiente desenvolvimento social e econômico (ou do subdesenvolvimento). Assim, a “questão social” passa de ser um “caso de polícia” para a esfera da política (de uma “política” reduzida à gestão administrativa dos “problemas sociais” e seu enfrentamento institucional), passa a ser tratada de forma segmentada, mas sistemática, mediante as políticas sociais estatais (NETTO, 1992 apud MONTAÑO, 2012, p. 275).

A partir dessa perspectiva, a pobreza e a miséria, expressões da “questão

social” passam a ser entendidas como um problema de distribuição do mercado,

_____________ 24

Na Inglaterra, promulgase a Lei dos Pobres (Poor Law), em 1601, que “[...] instituía um aparato oficial, centrado nas paróquias, destinado a amparar trabalhadores pobres, sob o auspício da taxa dos pobres” (cf. DUAYER; MEDEIROS, 2003, p. 241; MARTINELLI, 1991, p. 33 e 55 apud MONTAÑO, 2012).

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como um descompasso na relação oferta/demanda de bens e serviços25. Com isso,

o Estado passa a absorver parte do excedente e redistribuí-lo mediante políticas

sociais.

Na conjuntura aqui expressa, cabe salientarmos, mediante as reflexões de

Montaño (2012), as características adquiridas da “questão social” e seu

enfrentamento: passa a ser considerada como um produto do sistema capitalista,

concepção que ainda conserva seu tratamento segmentado. A pobreza passa a ser

considerada como um problema de distribuição; assim, o seu tratamento passa a ser

um processo de redistribuição, mediante políticas e serviços sociais.

No atual contexto neoliberal, supõe a manutenção de uma ação mínima do

Estado na área social, focalizada e precária, com programas de combate a fome e a

miséria, financiados, inclusive, por impostos e por ações filantrópicas do terceiro

setor26.

Assim, a atual estratégia neoliberal de “enfrentamento” da pobreza orienta-

se, segundo Montaño (2002),

[...] numa tripla ação. Por um lado, a ação estatal, as políticas sociais do Estado, orientadas para a população mais pobre (cidadão usuário); ações focalizadas, precarizadas, regionalizadas e passíveis de clientelismo. Por outro lado, a ação mercantil, desenvolvida pela empresa capitalista, dirigida à população consumidora, com capacidade de compra (cidadão cliente), tornando os serviços sociais mercadorias lucrativas. Finalmente, a ação do chamado “terceiro setor”, ou da chamada sociedade civil (organizada ou não), orientada para a população não atendida nos casos anteriores, desenvolvendo uma intervenção filantrópica (MONTAÑO (2002 apud MONTAÑO, 2012, p. 277).

Como retrata o autor, no MPC, a pobreza é resultado da acumulação privada

de capital, mediante a exploração da força de trabalho, que gera as desigualdades

_____________ 25

O problema de distribuição estaria vinculado a um déficit de demanda efetiva (por bens e serviços) no mercado, criado pela sobreoferta de força de trabalho não absorvida pela esfera produtiva. Isto é, com o desenvolvimento das forças produtivas (ou, na interpretação keynesiana, em função do ainda insuficiente desenvolvimento), um contingente da população fica excluído do mercado de trabalho, e ao não poder vender sua força de trabalho, não tem fonte de renda que lhe permita adquirir no mercado bens e serviços. Para enfrentar esse hiato, segundo Keynes, o Estado deve passar a intervir em dois sentidos: (a) responder a algumas necessidades (carências) demandas dessa população carente; (b) criar as condições para a produção e o consumo, incentivando a uma contenção do desemprego ou uma transferência de renda (seguridade social e políticas sociais). Promove-se o chamado “círculo virtuoso” fordista-keynesiano. (MONTAÑO, 2012, p. 275). 26 Montaño (2010, p. 186) define o chamado “terceiro setor” numa perspectiva crítica e de totalidade, refere-se a um fenômeno real, ao mesmo tempo inserido e produto da reestruturação do capital, pautado nos (ou funcional aos) princípios neoliberais: um novo padrão (nova modalidade, fundamento e responsabilidades) para a função social de resposta à “questão social”, seguindo os valores da solidariedade local, da autoajuda e da ajuda mútua.

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sociais. A partir dessas concepções, uma caracterização histórico-crítica da “questão

social”, deve considera-la, como:

[...] fenômeno próprio do MPC, constitui‑se da relação capital‑trabalho a

partir do processo produtivo, suas contradições de interesses e suas formas de enfrentamento e lutas de classes. Expressa a relação entre as classes (e seu antagonismo de interesses) conformadas a partir do lugar que ocupam e o papel que desempenham os sujeitos no processo produtivo

(MONTAÑO; DURIGUETTO, 2010, p. 82‑98 apud MONTAÑO, 2012).

Não contraditória a esta concepção, temos a afirmação de Iamamoto e

Carvalho (2012):

A questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção, mais além da caridade e da repressão (IAMAMOTO; CARVALHO, 2012, p. 84).

Com base nestas concepções, percebemos que a “questão social” traz à tona

as necessidades do Estado intervir nas relações entre o empresariado e a classe

trabalhadora, gerindo a organização e prestação dos serviços sociais, como um

novo tipo de enfrentamento à “questão social”. Dessa forma, as condições de vida e

trabalho já não podem ser desconsideradas no processo de formulação das políticas

sociais.

Contudo, no cenário neoliberal a lógica que passa a presidir a política social é

a da privatização seletiva dos serviços sociais. Presenciamos o desmonte das

politicas sociais públicas. O projeto neoliberal subordina os direitos sociais à lógica

orçamentária, à política social e à política econômica (IAMAMOTO, 2012, p. 149).

Para a autora, as transformações societárias têm repercutido diretamente nas

políticas públicas de proteção social e no surgimento de novas configurações da

“questão social” no cenário brasileiro, a partir da década de 1970. Diante desse

quadro, a “questão social” sofre alterações e apresenta particularidades e

especificidades para a sociedade brasileira no quadro contemporâneo.

As novas condições históricas metamorfoseiam a “questão social” inerente ao

processo de acumulação capitalista, adensando-a de novas determinações e

relações sociais. Neste sentido, a “questão social” é mais do que as expressões de

pobreza, miséria e “exclusão”. Condensa a banalização do humano, a subordinação

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da sociabilidade humana às coisas. Retrata um desenvolvimento econômico que se

traduz como barbárie social (IAMAMOTO, 2012).

Ao considerar a “questão social” como sendo inerente as desigualdades

sociais, econômicas, políticas e culturais oriundas do sistema capitalista e ao

embate político a favor dos direitos sociais, tensionados numa arena de disputas, a

autora defende que a “questão social” não se trata de um fenômeno recente, típico

do esgotamento dos chamados trinta anos gloriosos da expansão do capital,

defendendo, pois, que na contemporaneidade há uma “velha questão social”, inscrita

na própria natureza das relações capitalistas, mas que assume inéditas expressões.

Para Netto (2001), também inexiste qualquer “nova questão social”, e sim:

A emergência de novas expressões da ‘questão social’ que é insuprimível sem a supressão da ordem do capital. A dinâmica societária específica dessa ordem não só põe e repõe os corolários da exploração que a constitui medularmente: a cada novo estágio de seu desenvolvimento, ela instaura expressões sócio-humanas diferenciadas e mais complexas, correspondentes à intensificação da exploração que é a sua razão de ser (NETTO, 2001, p.48).

Concordando com os autores ora referenciados, temos a concepção de Montaño (2012, p. 281):

[...] não há novidade (a não ser nas formas e dimensões que assume) na ‘questão social’ na atualidade. As análises que tratam de uma suposta ‘nova questão social’, de uma ‘nova pobreza’, dos ‘novos excluídos sociais’, constituem abordagens que se sustentam na desvinculação da ‘questão social’ e de suas manifestações (pobreza, carências, subalternidade cultural etc.) dos seus verdadeiros fundamentos: a exploração do trabalho pelo capital. E estes fundamentos permanecem (e permanecerão enquanto a ordem capitalista estiver de pé) inalterados (MONTAÑO, 2012, p. 281).

Dessa forma, é que o crescimento da força de trabalho é estimulado pelas

mesmas razões que a força expansiva do capital, expressando a lei da acumulação

capitalista, resultante do aperfeiçoamento dos meios de produção e do

desenvolvimento da produtividade mais rápido do que a população trabalhadora

produtiva, que cresce mais rapidamente do que a necessidade de seu emprego.

Gerando uma superpopulação, que segundo Iamamoto (2012), não são os “inúteis

para o mundo” referidos por Castel, e sim os supérfluos para o capital, que no

período da Revolução Industrial foram atribuídos como exército industrial de reserva.

Há autores que defendem a existência da “nova questão social”, como Robert

Castel e Pierre Rosanvallon, partindo da premissa de que as transformações

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ocorridas no sistema capitalista contemporâneo rompem com o período capitalista

industrial e com a “questão social” emergida no século XIX, na Europa Ocidental,

com o surgimento do pauperismo. A partir disso, entram em cena “novos sujeitos”,

“novos usuários” e consequentemente, “novas necessidades”, ou seja, o Estado

deve responder de forma inovadora.

O crescimento do desemprego e o aparecimento de novas formas de pobreza

estariam indicando o surgimento da “nova questão social” e o esgotamento do modo

de proteção baseado no risco coletivo devido a não adaptação dos velhos métodos

de gestão social à nova realidade. (ROSANVALLON, 1995 apud PASTORINI, 2007).

Robert Castel (2000) compreende que a “questão social” dizia respeito ao

pauperismo da classe trabalhadora no início do século XIX, e o trabalho assalariado

visto como algo ameaçador a ordem societária. Apesar disso, afirma que a “questão

social” vem se metamorfoseando com o decorrer da história, e a necessidade de

compreendê-la a partir de outro paradigma está na configuração da sociedade

salarial27, que tem sofrido muitas transformações. A sociedade salarial passou a

manter a vida do trabalhador através de um sistema de proteção, de garantias e de

direitos, mas não foi suficiente para acabar com a desigualdade social.

A partir das inúmeras mudanças sociais, econômicas e políticas na sociedade

contemporânea Castel (2000) também vem referir-se a uma “nova questão social”,

onde a dicotomia entre capital e trabalho defendida por Iamamoto, não serviria mais

como parâmetro central na análise da “questão social”, isto é, a perspectiva

sociológica apresenta como ameaça a ordem e a coesão social; provém de uma

gestão inadequada, sendo consequência da crise do Estado Social.

O autor também questiona se as relações salariais ainda podem estar no

centro da análise da “questão social”, afirmando que o trabalho perde espaço no

tocante a essa dimensão de centralidade. Todos os benefícios vinculados ao

trabalho perdem sua legitimidade: uma desmontagem do sistema de proteção,

desestabilização da ordem do trabalho. Enfim, situações que repercutem na vida

social, para além do trabalho. Afirmações evidenciadas na sua fala:

A nova social, hoje, parece ser o questionamento dessa função integradora do trabalho na sociedade. Uma desmontagem desse sistema de proteções

_____________ 27

Robert Castel (1996, p. 235) denomina a sociedade salarial como uma sociedade na qual a maioria dos sujeitos sociais têm sua inserção social relacionada ao lugar que ocupam no salariado, ou seja, não somente sua renda, mas também seu status, sua proteção, sua identidade.

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e garantias que foram vinculadas ao emprego e uma desestabilização, primeiramente da ordem do trabalho, que repercute como uma espécie de choque em diferentes setores da vida social, para além do mundo do trabalho propriamente dito (CASTEL, 1996, p. 232).

Afirmando em suas análises que o mundo do trabalho se transformou e a

“questão social” também, não podendo ser mais explicada pelos mesmos

paradigmas clássicos. Para enfrentar a “questão social” são necessários novos

métodos, percebendo que o Estado não poderá dar mais conta desta.

Não obstante, embasamos os nossos estudos nas análises de Antunes

(2006) sobre as metamorfoses e centralidade do trabalho ao afirmar que, enquanto

perdurar o modo de produção capitalista, não se pode concretizar a eliminação do

trabalho como fonte criadora de valor. Ou seja, não é possível pensarmos uma

sociedade produtora de mercadorias sem as relações de trabalho, o que ocorre é

que estas sofreram diversas transformações com a dinamicidade social na

contemporaneidade. Nas palavras do autor “[...] nem o operariado desaparecerá tão

rapidamente, e o que é fundamental, não é possível perspectivar, nem mesmo num

universo distante, nenhuma possibilidade de eliminação da classe-que-vive-do-

trabalho”. (ANTUNES, 2006, p. 62). Assim, sustentamos que o trabalho permanece

no centro de análise da “questão social”.

Embora estejamos diante de um grande debate travado atualmente sobre a

“questão social”, a partir das transformações ocorridas no interior da sociedade

capitalista, sustentamos que a gênese da “questão social” permanece a mesma: a

contradição inerente ao sistema capitalista e a exploração de uma classe social

sobre a outra, concordando com as análises de Iamamoto (2012), Netto (2001) e

Montaño (2012) de que hoje se presencia uma renovação da “velha questão social”

sob outras roupagens e novas condições na sociedade contemporânea, que

aprofunda as suas contradições, isto é, aquela que se expressa nas desigualdades

sociais geradas pelo sistema capitalista, nascida no caráter coletivo de produção,

nas relações e nas condições de trabalho e para compreendê-la é necessário

entender as relações de trabalho alienado.

Em seu enfretamento, a “questão social” deve ser amenizada pela defesa das

necessidades dos trabalhadores, onde o Estado deve implantar políticas sociais

universais voltadas aos interesses daqueles, na busca por uma democratização

econômica, política e cultural, tendo em vista que a “questão social” expressa essas

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dessemelhanças nas classes sociais por meio das relações de gênero, etnia e

formações regionais, pautando as relações entre os vastos segmentos sociais.

Discorrer sobre as diferentes posições acerca da “questão social” é de suma

importância para o melhor entendimento desse processo sócio histórico em nossa

sociedade. Cabe enfatizar que os problemas sociais são um contínuo, e antecedem

o capitalismo, mas existe nesse contexto, uma relação de interdependência entre

ambos, ao mesmo tempo em que a “questão social” contribui para as

transformações do capitalismo, este influencia nas formas através das quais a

“questão social” se configura em nossa sociedade.

De posse da concepção de “questão social”, aqui debatida minimamente,

buscaremos no próximo item, fomentar uma reflexão acerca da “questão social”, e

sua relação com o Serviço Social, tendo aquela enquanto objeto de intervenção

profissional do assistente social.

4.2 “Questão social” e sua relação com o Serviço Social

Em meados dos anos 1980 do século XX, observa-se a emergência de

discussões que abordam a relação entre o Serviço Social e a “questão social”, tendo

como marco a publicação da obra Relações Sociais e Serviço Social no Brasil, em

1982, cuja autoria é composta por Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho (MOTA,

2008). A obra concretiza a primeira aproximação rigorosa da profissão ao legado

marxiano.

A maturidade teórico-metodológica e ético-política apropriada pela categoria

por meio da obra marxiana e aprimorada com as produções teóricas do Serviço

Social Brasil, forneceu elementos e fundamentos para a construção do projeto

profissional na década de 1990, que introduziu um processo de discussões acerca

da temática “questão social”, sobretudo, pela nova lógica curricular aprovada pela

Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social (ABESS), que se tornou

posteriormente na Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social

(ABEPSS).

Nesse contexto, foram estruturadas as Diretrizes Curriculares para o Curso de

Serviço Social (ABESS/CEDEPSS, 1996), nas quais a “questão social” é posta como

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eixo fundante da profissão e articulador dos conteúdos da formação profissional que

deve ter em vista a formulação de respostas profissionais para o seu enfrentamento.

Para Machado (1999), o Serviço Social é uma profissão legitimada

socialmente, que possui uma função social, e ainda assim, mantém historicamente,

o dilema da especificidade profissional. Tal especificidade é dada pelo objeto

profissional.

No Brasil, o objeto do Serviço Social tem sido historicamente circunscrito -

considerando-se as conjunturas sociais, políticas, econômicas e culturais - de

acordo com as perspectivas teórico-ideológicas que norteiam a intervenção

profissional do assistente social. O objeto do Serviço Social pode ser definido como

“questão social”, e/ou as suas expressões. Ainda segundo a ABESS (1996),

O assistente social convive diariamente com as mais amplas expressões da ‘questão social’, matéria-prima de seu trabalho. Confronta-se com as manifestações mais dramáticas dos processos sociais ao nível dos indivíduos sociais, seja em sua vida individual, seja em sua vida coletiva (ABESS, 1996, p.154-155).

Percebemos que a intervenção profissional do assistente social frente às

refrações da “questão social”, enquanto seu objeto de trabalho perpassa o cotidiano

social dos indivíduos, contemplando todas as esferas da sua vida, sejam elas

individuais ou coletivas, dadas as desigualdades e contradições sociais.

E como toda categoria arrancada do real, nós não vemos a “questão social”,

vemos suas expressões: o desemprego, o analfabetismo, a fome, a falta de leitos

em hospitais, a violência etc. (MACHADO, 1999, p. 43).

Destarte, torna-se substancial a inserção da intervenção do Serviço Social no

âmbito das desigualdades sociais, ou, mais precisamente, nas expressões da

“questão social”, esta sendo considerada também como sinônimo de rebeldia:

Os assistentes sociais trabalham com a questão social nas suas mais variadas expressões quotidianas, tais como os indivíduos a experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde, na assistência social etc. Questão social que, sendo desigualdade é também rebeldia, por envolver sujeitos que vivenciam as desigualdades e a elas se resistem e se opõem. É nesta tensão entre produção da desigualdade e produção da rebeldia e da resistência, que trabalham os assistentes sociais, situados nesse terreno movidos por interesses sociais distintos, aos quais não é possível abstrair ou deles fugir por que tecem a vida em sociedade (IAMAMOTO, 2012, p. 28).

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Desvelou-se o caráter social da intervenção profissional e o aspecto da luta

de classe nos processos em que se inseriam os assistentes sociais. Portanto,

compreendemos que a saúde, em sua concepção ampliada, é uma das refrações da

“questão social”.

A questão social se manifesta de diferentes formas. Por isso é importante o

estudo de situações concretas. Assim, pode-se dizer que a saúde apresenta

particularidades que necessitam ser desveladas. Desta forma, compreender os

determinantes sociais na saúde e seus rebatimentos torna-se fundamental no

exercício profissional (MATOS, 2013).

Portanto, a intervenção profissional do assistente social na saúde deve ser

pautada num conjunto de ações que possibilite o atendimento efetivo das refrações

da “questão social” que refletem na saúde. Contudo, a efetivação dos direitos sociais

dependerá essencialmente das condições estruturais das políticas públicas

implementadas na realidade do sistema vigente.

Assim, esta intervenção profissional seria realizada por meio de ações

complementares e indissociáveis, que apresentem a dimensão de totalidade na

análise dos determinantes sociais da saúde dos usuários. Ou seja, é necessário

entendermos que a necessidade da saúde vai além do tratamento médico, é preciso

analisar o indivíduo em suas necessidades humanas, em sua totalidade:

alimentação, habitação, trabalho, saúde, segurança, e educação.

E a saída para a real consolidação dos direitos e uma possível transformação

social está nas lutas de classes e na superação do sistema vigente, conforme

assinala Montaño (2012, p. 281):

Só as lutas de classes, e a mudança na correlação de forças sociais, poderão reverter esse processo histórico, confirmando e ampliando conquistas e direitos trabalhistas, políticos e sociais, e superando a ordem do capital. As políticas sociais e direitos sociais representam também conquistas dos trabalhadores, que podem diminuir, mas jamais eliminar as desigualdades sociais (MONTAÑO, 2012, p. 281).

Partindo dessas afirmações, entendemos que a “questão social” deve ser

situada como uma “problemática” que, no universo do Serviço Social, designa um

conjunto de questões reveladoras das condições sociais, culturais e econômicas em

que vivem as classes trabalhadoras na sociedade capitalista.

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Não se trata mais de procurar identidades, especificidades ou métodos

próprios, mas de adensar a discussão em torno de questões que possibilitem

particularizar a profissão no conjunto das práticas sociais, refinando a sua

capacidade de conhecer, analisar e transformar o real – e, neste adensamento, o

trato forte da questão social é um objeto inarredável (MOTA, 2008, p. 37).

A mesma autora ressalva que a formação profissional deve se voltar para

uma rigorosa qualificação no que tange ao tratamento da “questão social”

considerando que esta dá concretude ao Serviço Social.

[...] é precisamente aqui que ganham relevo as dificuldades e tensões que perpassam a intervenção sociopolítica através da atividade profissional, posto que a divisão social do trabalho medeia a relação do Serviço Social com os instrumentos e formas institucionais de enfrentamento da questão social. A tensão entre intervenções políticas mediatas e horizonte ético-político se reflete na cultura profissional e aponta para a necessidade de fortalecermos o núcleo teórico, estratégico e político da nossa profissão. (MOTA, 2008, p. 51).

A profissão de Serviço Social não se explica por si mesma senão a partir de

sua inserção na sociedade. Sendo assim, no que tange ao enfrentamento da

“questão social” que condensa a intervenção profissional, como já discutido

anteriormente, o desafio posto está no conhecimento adquirido por meio do

aperfeiçoamento teórico-metodológico contínuo, bem como, na postura ético-política

em consonância com o Código de ética da profissão, tendo em vista seu

fortalecimento e materialização.

O profissional do Serviço Social defronta-se no âmbito da saúde com as

múltiplas expressões da “questão social”, como a violência, a pobreza, o

desemprego, a falta de acesso à educação, à saúde, à habitação e muitas outras.

Faremos uma análise das expressões da “questão social” mais frequentes, e suas

formas de enfrentamento materializadas na realidade de nosso campo de pesquisa

no tópico a seguir.

4.3 Saúde e “questão social”: a intervenção profissional do assistente social

no Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS)

O reconhecimento da “questão social” como objeto da intervenção profissional

do assistente social, demanda uma atuação numa perspectiva totalizante, baseada

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na identificação dos determinantes sociais, culturais e econômicos das

desigualdades sociais.

Um dos grandes conflitos enfrentados pelos assistentes sociais é trabalhar

demandas, exigências imediatas – a dor, o sofrimento, a falta de tudo, a iminência

da morte, as faltas de condições de trabalho, as condições de vida

(VASCONCELOS, 2012, p. 23).

Esses conflitos se materializam nas demandas dirigidas ao Serviço Social

apresentadas pelos usuários e profissionais no cotidiano do HIAS. Demandas que,

em sua maioria, consistem numa dimensão assistencial/emergencial, geralmente

estão relacionadas ao funcionamento dos serviços prestados pela unidade de saúde

e/ou a doença em si, problemas associados à rotina hospitalar, numa intervenção

socioassistencial, no sentido de viabilizar o acesso aos direitos, e dessa forma,

minimizar as expressões da “questão social” intrínsecas ao fazer profissional.

Das atividades desempenhadas elencadas pelas profissionais entrevistadas,

podemos destacar: acolhimento e acompanhamento da admissão até a alta;

entrevista social, na admissão, pós-admissão, readmissão e alta, visando traçar

perfil socioeconômico da família e possíveis riscos sociais; orientação quanto aos

deveres do acompanhante e dos pais, quanto aos direitos sociais da criança e da

família e quanto às normas do hospital; anamnese social; encaminhamento à rede

socioassistencial (PSF, CRAS, CAPS, BPC, Casas de Apoio); acompanhamento e

monitoramento da freqüência do paciente ao tratamento; reunião com usuários;

demandas espontâneas; registro nos prontuários; visitas aos leitos; disponibilização

de vales transportes e refeições; orientações para lidar com doenças; orientação

sobre tratamento; visita domiciliar; mediação de conflitos; participação na

comunicação do óbito; declaração de atendimento realizado/comparecimento na

unidade; agilização de atendimento na emergência; reclamações diversas;

orientação previdenciária; documentação; localização das famílias de pacientes

internados; providências quanto à violência contra criança; cadastramento;

coordenação do Serviço Social; estatísticas; supervisão de alunos, entre outras.

Das demandas acima remetidas ao profissional do Serviço Social, merece

relevo a participação na comunicação ou comunicação de óbito. Uma das demandas

dirigidas historicamente ao Serviço Social, que causa controvérsia no interior da

categoria devido ao seu componente burocrático, mas nem sempre os assistentes

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sociais conseguem se desvencilhar e/ou lidar com essas demandas na direção dos

interesses do usuário (VASCONCELOS, 2012, p. 176).

Na realidade do HIAS, por vezes ocorre, mesmo que indiretamente, de a

assistente social participar da comunicação do óbito, e até chegar a conduzir a

comunicação aos familiares, ainda que, excepcionalmente, como menciona Dália:

Nós fazemos a primeira abordagem com a família, quem deve comunicar é o médico, mas às vezes ele não comunica, é papel médico, por que a família tem o direito de saber a causa, o porquê. Quando é que a gente comunica? O paciente é do interior, a mãe tá lá e a criança tá aqui, aí não tem como a gente aguardar ela chegar, por que os trâmites ela tem que resolver do interior, a questão do caixão, a questão do translado, ela tem que providenciar, como se não bastasse toda a questão do sofrimento, então isso aí a gente não tem como, tem que realmente informar, apesar de que a gente pede até para algum familiar, pra dar a noticia. A gente tenta ver realmente essa questão da orientação, do que fazer, do como fazer, viabilizar o acesso, em relação ao óbito (DÁLIA).

Para orientação aos profissionais, o Conselho Regional de Assistentes

Sociais da 7ª região/RJ promulgou a resolução 49/96, que versa sobre a

participação dos assistentes sociais na comunicação de óbito28. Nela consta em seu

Artigo I que não é competência do assistente social comunicar óbito

(VASCONCELOS, 2012, p. 176). No depoimento acima, Dália manifesta o seu

conhecimento quando afirma que a comunicação do óbito não é papel do assistente

social, e sim do médico, pelo direito a informação que tem o usuário, contudo, em

determinadas situações faz-se necessária à sua intervenção.

Segundo o CRESS, em situações de óbito cabe ao assistente social, de

acordo com o seu conhecimento e sua autonomia técnica, identificar os casos em

que deve prestar aos familiares, amigos e responsáveis o apoio necessário para o

enfrentamento da situação, e, fundamentalmente, esclarecer a respeito dos

benefícios e direitos referentes à situação de óbito e previstos no aparato normativo

e legal vigente, tais como relacionados à previdência social, ao trabalho (licenças) e

a seguros sociais (DPVAT), entre outras garantias de direitos. O apoio à família, bem

como os trâmites burocráticos necessários após a comunicação do óbito, fica

perceptível na análise de Girassol:

_____________ 28

De acordo com o documento Parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde, umas das ações de articulação com a equipe de saúde, é a convocação do responsável para informar sobre óbito e a comunicação do óbito, ou seja, essa ação deve ser realizada em conjunto com a equipe de saúde (médico, psicólogo e outros). (CFESS, 2010).

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Também tem a questão do óbito, que a gente chega muito presente, ao lado

das mães, elas procuram o apoio do Serviço Social. Quando o paciente vai

a óbito, a gente toma conhecimento, eles procuram logo o Serviço Social, o

médico, normalmente é na UTI, a gente vai, e fica lá com a família, dando

aquele apoio, fica só ao lado delas! Eu pelo menos não digo nada! Eu deixo

ela e a dor dela, respeito o momento dela, deixo sentir, e trago pra sala.

Quando eles melhoram mais, e tem condições de falar, aí a gente toma as

providências [...] (GIRASSOL).

Dos quatro eixos de atuação do assistente social apresentados no documento

Parâmetros Para Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde, sendo eles:

atendimento direto aos usuários; mobilização, participação e controle social;

investigação, planejamento e gestão; assessoria, qualificação e formação

profissional (CFESS, 2010). Destacam-se, nas ações desenvolvidas pelo Serviço

Social no HIAS, o atendimento aos usuários por meio de ações socioassistenciais,

ações de articulação interdisciplinar e as ações socioeducativas.

Das ações de articulação com a equipe de saúde, frente às condições de

trabalho e/ou a falta de conhecimento das competências dos assistentes sociais,

têm historicamente requisitado a eles várias demandas que não os competem, tais

como comunicação de óbito, já explicitado mais acima, como também marcação de

consultas. Esta última ação pode ser identificada palavras de Tulipa:

Dia de quinta-feira eu fico sozinha na minha sala, por que a minha atendente vai dar assistência à equipe médica que está atendendo ao fissurado, então chega um paciente novo, um recém-nascido, a mãe com a criança que a acabou de nascer fissurada, e ela chega pra eu, fazer cadastro, fazer toda a explicação do atendimento. Então, se eu for me fixar, pura e simplesmente, na minha função de assistente social, esse paciente vai sair daqui sem uma consulta agendada. Por que eu como assistente social não posso marcar consulta. Entendeu? Então assim, como a minha atendente não ta, eu faço! Eu tenho minha agenda, eu pego as vagas, que é disponível naquele momento, e eu anoto o nome dele, e ela depois transcreve para o livro de consultas. Então, é isso que eu to dizendo, eu não gosto desse estreitamento, aí eu vou fazer só a minha função de assistente social, eu vou cadastrar, vou orientar essa mãe, explicá-la como é o fluxo de atendimento, falar um pouco sobre a questão da fissura [...] vou encaminhar pra fono, vou fazer tudo! Mas, eu não vou marcar consulta, por que não é minha função? Então ela vai embora, sem uma consulta agendada, então, eu não trabalho dessa forma! Agora o que é que eu acho importante, é você ter consciência de que você precisa fazer algumas mudanças, e eu acho que é possível [...] (TULIPA).

Tulipa nos declarou conhecer e reconhecer a importância do documento que

parametriza a atuação profissional na saúde, afirmando que ele possibilitou o

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conhecimento e a identificação de inúmeras atividades realizadas pelo Serviço

Social que não faz parte de sua função, como por exemplo, marcação de consulta,

ilustrado por ela anteriormente. A profissional sustenta que não se opõe à realização

da ação eventualmente, para não violar o direito do usuário ao acesso à saúde por

meio do atendimento agendado.

Das ações socioassistenciais expostas no referido documento, foi possível

visualizarmos no cotidiano profissional das assistentes sociais do HIAS as seguintes

demandas: solução quanto ao atendimento; reclamação com relação à qualidade do

atendimento e/ou não atendimento; não entendimento do tratamento indicado e falta

de condições para realização do tratamento, devido aos medicamentos de alto

custo, do transporte para acesso ao hospital; demandas referentes às condições

reais de vida dos usuários (desemprego, violência, ausência de moradia etc.); visitas

domiciliares; democratização das informações; entrevistas sociais, dentre outras

demandas já apontadas.

É fundamental que as ações profissionais frente às demandas apresentadas

transponham o caráter emergencial e burocrático, o profissional precisa ter clareza

de suas atribuições e competências, para estabelecer prioridades e estratégias,

buscando conhecer e aplicar as ações que os competem em suas intervenções

profissionais, de acordo com os Parâmetros de Atuação para assim garantir o direito

dos usuários ao acesso aos serviços.

Conforme caracterizamos no capítulo anterior, o conceito de saúde no texto

constitucional:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988, p. 94).

O grande mérito desta concepção está na explicitação dos determinantes

sociais que envolvem o processo saúde/ doença, muitas vezes desconsiderados nas

concepções que privilegiam abordagens individuais.

Há certa unanimidade nas opiniões das entrevistadas, ao expressarem sua

concepção de saúde, sendo compreendida em seu conceito adotado pela

Organização Mundial de Saúde (OMS), ou seja, a saúde definida como um estado

de completo bem-estar, e para além da ausência de doença. Como se preconiza na

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Lei Orgânica da Saúde (LOS), artigo 3º, enfatizando a totalidade, as expressões da

“questão social”, e os determinantes sociais presentes no processo saúde/doença.

As assistentes sociais apontaram ainda em suas falas a importância do

processo educativo, como menciona Íris ao afirmar que a saúde é “um processo

constante que vem desde a educação da criança, passando pela educação das

mães, que é o principal membro da família que cuida da educação e saúde da

criança”. O aspecto espiritual é apontado na definição de Tulipa:

O conceito de saúde é muito amplo, envolve todos os aspectos da vida de

uma pessoa, não só o aspecto orgânico, psíquico, mas também, o lazer, o

trabalho, a parte espiritual, que hoje em dia já se olha muito pra essa

questão (TULIPA).

Entretanto, o conceito de saúde de acordo com o que é preconizado na

Constituição Federal de 1988, ou seja, a concepção de saúde como direito do

cidadão e dever do Estado, não foi mencionado nos relatos de nenhuma

profissional. A saúde não foi definida na perspectiva do direito, ou seja, enquanto

direito fundamental, conforme o texto constitucional, bem como definição legitimada

na Lei Orgânica da Saúde (LOS)29

Assim, a perspectiva da saúde como um direito social que transcende a

democratização do consumo da assistência médica, ainda que presente na norma

legal, não foi acompanhada historicamente pelos profissionais de saúde, inclusive os

assistentes sociais. (VASCONCELOS, 2012, p. 89)

Ao enunciarem suas definições de “questão social”, as assistentes sociais

assumem concepções distintas, sendo percebida desde algo natural, como

mecanismos de dominação do homem, não estando relacionada somente à questão

da pobreza, mas também à solução de problemas, apoio social, perpassando até as

relações sociais associadas aos problemas que chegam ao Serviço Social,

decorrentes da vulnerabilidade social, requisitando a atuação do assistente social.

É óbvio que há uma “questão social”, eu acho que ela é muito profunda,

vem dos conceitos da sociedade desde os primórdios [...] advém desse

instinto natural, que fez com que o homem gerasse vários mecanismos de

dominação e com isso, gerou a diferença social, e a “questão social” como

um todo (ÍRIS).

_____________ 29

A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício (BRASIL, 1990, p. 306).

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‘Questão Social’ pra mim é quando a solução está um pouco difícil de

conseguir aparecer, e aí, onde há uma imposição de fatores que não faz o

cidadão ter a solução, e aí eu acho que cabe, a participação do assistente

social, intermediar estas questões, os problemas que surgem e conseguir

uma solução (TULIPA).

A ‘questão social’ é tudo que está externo a nós, externo ao ser humano, a

sua pessoa, compreende tudo. Então vai a família, a comunidade, o seu

local de trabalho, a escola, os seus relacionamentos... Tudo que gera apoio

social ao ser humano (AMARÍLIS).

[...] a gente pode encarar como os problemas sociais na maneira como eles

se apresentam na sociedade atual, da maneira como eles chegam ao

Serviço Social [...] são demandas sociais decorrentes de questões de

vulnerabilidade, e que chegam, requerendo a atuação do profissional da

área social (DÁLIA).

Percebemos nos discursos acima que a apropriação do conceito de “questão

social” pelas assistentes sociais, se apresenta de forma diferenciada, não sendo a

“questão social” referida diretamente nas discussões como objeto de trabalho do

assistente social, conforme já explicitado neste estudo, análise hegemônica hoje na

categoria.

É importante frisarmos, que a literatura do Serviço Social não contempla hoje

uma definição única sobre o conceito da “questão social”, embora haja um consenso

de que esta é inerente ao sistema capitalista e as desigualdades sociais oriundas

deste.

Destarte, ao se referirem as manifestações da “questão social”, e sua

materialização no HIAS, as formas de enfrentamento e a intervenção profissional,

expressaram situações inerentes ao Modo de Produção Capitalista (MPC), ou seja,

as desigualdades, a violação dos direitos e as contradições sociais, fazendo jus à

conceituação de “questão social” adotada pelo Serviço Social, como por exemplo, a

dificuldade no acesso à saúde:

Aqui a ‘Questão Social’, ela se mostra de diversas formas, por que a gente

cuida do adoecimento das pessoas, as pessoas que nos procuram elas

estão adoecidas, não só seus filhos, seus parentes, mas a família como um

todo também adoece com o sofrimento. [...] porque o paciente ele passa às

vezes três anos na fila de espera pra poder ter acesso à primeira consulta

ambulatorial, pra poder iniciar um tratamento. A gente não tem profissional

suficiente, pra está atendendo esses pacientes de uma forma regular. Tem

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paciente que passa uma vez por ano pelo atendimento, enquanto ele tem

extrema necessidade e deveria ter uma periodicidade muito maior (ÍRIS).

O Serviço Social é uma profissão que, como já mencionado, atua sobre as

diferentes expressões da “questão social”, que se apresentam metamorfoseadas em

falsos problemas que ora são identificados como de responsabilidade dos

indivíduos, ora da sociedade, ou seja, tais problemas raramente são identificados

como consequências da desigualdade inerente ao MPC (MATOS, 2013).

Assim, podemos perceber que expressões da “questão social” se

materializam das mais diversas maneiras no HIAS, não só no adoecimento do

paciente, mas também, no adoecimento da família, questão mencionada por metade

das entrevistadas, tanto pelas dificuldades e sofrimento no tratamento complexo,

como pelas barreiras de acesso ao sistema, e demora no atendimento.

Outro aspecto bastante pontuado trata-se da burocratização e lentidão para

acesso aos benefícios da Assistência Social, sobretudo o Benefício de Prestação

Continuada (BPC)30, no qual os usuários de doenças complexas, sindrômicas, e

crônicas degenerativas, que embora tenham o direito ao benefício e se enquadrem

no perfil exigido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), muitas vezes têm o

acesso negado e o direito violado. Situação confirmada na fala de Íris:

A gente tem a questão da dificuldade do acesso aos benefícios que esses

pacientes necessitam [...] há uma dificuldade muito grande no acesso ao

BPC, por conta da vagareza do INSS mesmo, é muito devagar o processo,

o processo é altamente burocrático, eles negam o processo mais de uma

vez, a situação que a gente tem é essa, os pacientes têm o direito, vão com

exames, com laudos, tudo ok, a família se enquadra na questão da renda

familiar, a renda per-capita, por que ainda tem isso, tanto a previdência

social quanto a assistência social ela não é universal como a saúde, pelo

contrário, ela é seletiva, ela seleciona o público dela, de acordo com a

questão da renda, então, é muito complicado, por que eles negam muitos

benefícios (ÍRIS).

Vale reforçarmos que, no tocante à legislação, a Constituição Federal de

1988, bem como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)31 trouxeram a questão

da assistência para o campo da seguridade e da proteção social pública, dos

_____________ 30

O Benefício de Prestação Continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família (BRASIL, 1993, p. 257). 31

A Lei Orgânica da Assistência Social foi sancionada em 7 de dezembro de 1993, regulamentando os artigos 203 e 204 da Constituição Federal, dispondo sobre a organização da Assistência Social e dando outras providências (BRASIL, 1993).

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direitos, da universalização como política pública, afirmando seu caráter de direito

não contributivo ao apontar a necessária integração entre econômico e social; a

centralidade do Estado na garantia de direitos sociais; a participação popular e ainda

o controle social. Isso instituiu o debate ampliado por meio da cidadania e

democracia (COUTO et al, 2012).

Apesar disso, a realidade retratada no depoimento acima demonstra a

distância existente entre a lei e a sua efetivação, seja na esfera da assistência social

ou na saúde. Considerando que, de acordo com as reflexões de Couto (et al, 2012),

seu processo de implantação vai ocorrer numa conjuntura adversa, numa dinâmica

contraditória ao sofrer os impactos das políticas econômicas neoliberais, que

caminham numa direção oposta a garantia dos direitos sociais e investimentos na

política social, o que amplia a pobreza, as desigualdades e o desemprego.

As mesmas autoras explicam que as razões para essa dificuldade e lentidão

no acesso ao BPC se dão exatamente a este fato de que seu processo de

implantação vai ocorrer em uma conjuntura onde se evidencia extrema

incompatibilidade entre econômico e social, no que tange aos investimentos por

parte do Estado, que no contexto neoliberal reconhecendo o dever moral do socorro

aos pobres, não reconhece seus direitos.

As dificuldades apresentadas acabam por refletir na realidade de inúmeras

famílias que são atendidas no HIAS que recebem as orientações por meio do

Serviço Social, executam os procedimentos exigidos e muitas vezes são barradas

pela burocracia institucional da Previdência Social e deixam de ser beneficiadas, o

que se torna um grande problema, tendo em vista que o cuidado com a criança com

necessidades especiais passa a ser integral levando quase sempre ao familiar ter

que deixar o seu emprego. Conforme percebemos no discurso abaixo:

[...] nós orientamos pra que eles busquem o mais rápido possível, a questão do benefício, que é um direito da criança com problemas oncológicos, vem também ajudar muito, por que essas mães têm que deixar de trabalhar, então esse dinheiro vem ajudar muito (AMARÍLIS).

Vale salientarmos que quando o benefício é concedido às crianças, estas já

estão num estágio mais avançado da doença, logo, o acesso ao benefício de certa

forma melhoraria a vida da família e minimizaria o sofrimento, visto que poderiam

suprir suas necessidades imediatas.

Contudo, é também de extrema relevância destacarmos que o BPC é direito

conquistado com muita luta, não se tratando de favor ou de benemerência, é direito

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resguardado na LOAS, e seria extremamente importante e necessário, se acessado

por todos aqueles que possuem o direito conforme o estabelecido legalmente.

Dentre as demandas postas ao assistente social citadas no início deste

capítulo, é comum também aparecer para a equipe de saúde demandas referentes à

violência contra crianças, adolescentes, mulheres etc. Nessas situações, o CFESS

(2010) aponta que a responsabilidade pela notificação é função de toda a equipe, o

assistente social deve colaborar nessa ação conjunta, contudo, essa não é uma

atribuição privativa do mesmo. Cabendo a este, realizar abordagens socioeducativas

com os familiares, bem como viabilizar os devidos encaminhamentos. As ações

presentes no exercício profissional do assistente social no HIAS, são impressas

nessa dimensão, como detalharemos mais à frente.

No que concerne às manifestações acerca da materialização da “questão

social” no cenário do HIAS, percebemos muitas semelhanças nas descrições das

entrevistadas em seu cotidiano de trabalho. Merece relevo, a questão da negligência

e os mais diversos tipos de violência, muitas vezes evidenciados na realidade social

das crianças atendidas, o que pode contribuir consideravelmente para o surgimento

e/ou agravamento da enfermidade que as levaram à Instituição.

A violência doméstica contra crianças e adolescentes pode ser definida como

sendo:

[...] ato ou omissão, praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e/ou adolescentes que, sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima, implica numa transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, por outro lado, numa coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento. (AZEVEDO; GUERRA, 2001, apud ROSAS; CIONEK, 2006, p. 11)

Durante as discussões nos foram citados alguns casos de violência física

contras à criança, que, embora tenham sido tomadas as providências, e realizado os

procedimentos necessários, tais como: recebimento e encaminhamento da

notificação médica aos órgãos competentes, abordagem com os familiares,

relatórios, e registro de denúncia ao Conselho Tutelar32, conforme estabelecido no

_____________

32 O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei (BRASIL, 1990, p. 440).

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Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)33. Foi alegado que o principal órgão de

defesa dos direitos da criança possui um atendimento precário, inviável, e que

muitas vezes não consegue responder em tempo hábil as questões complexas de

violação dos direitos da criança levando ao agravo da situação.

[...] a gente recebe aqui na emergência, pacientes vítimas de negligência, de violência física. Até recebi um caso, complicadíssimo, que a criança ainda está interna aqui, que a criança chegou tão espancada, tão espancada, que ela foi direto pra reanimação. [...] e ainda você esbarra na incompetência de vários órgãos, por exemplo, no dia que essa criança deu entrada aqui, eu estava no plantão noturno da emergência, ela entrou no diurno, mas as meninas passaram pra mim por que não conseguiram entrar em contato diretamente com o Conselho Tutelar, pra poder ser feita a visita aqui, por que a mãe ainda estava no hospital. Eu entrei em contato várias vezes com o plantão do Conselho Tutelar, falei com uma educadora social várias vezes, e até meia-noite, eu ainda fiz ligação pra lá e ela me disse: “olha, até o momento, nenhum dos conselheiros tutelares de plantão apareceram no plantão”. Aí o que aconteceu, a mãe se evadiu do hospital, a mãe tá foragida, e a criança tá interna sem acompanhante. [...] a única coisa que está assegurada para a criança até o momento é a assistência medica, que até ontem ainda estava na UTI (ÍRIS).

O mesmo caso foi exposto por Dália, confirmando que um grande problema

para o enfretamento às expressões da “questão social” encontra-se na ineficiência

de alguns órgãos públicos, bem como na falta de efetividade das políticas sociais. A

fala da profissional revela e denuncia este fato:

Nós estamos atualmente com uma situação, foi notificada uma violência

doméstica de uma criança que chegou aqui e foi direto pra reanimação, e

da reanimação para a UTI. E você ao olhar pra criança, você já ver,

fisicamente você percebe os sinais de tortura pelas quais a criança passou.

Pela notificação que foi feita pelo médico no primeiro atendimento, estavam

suspeitas todos os tipos de violência que ela poderia ter sofrido, e ela está

realmente, bastante adoecida. A mãe foi usuária de drogas, nós não temos

a certeza se ela deixou de ser, violenta, já é acompanhada pelo Conselho

Tutelar desde 2009, a criança tem sete anos. [...] aí você ver a ineficiência

das políticas públicas, fizeram com que essa criança chegasse a uma

situação de quase morte. Por quê? Por que o caso já foi denunciado desde

2009, o Conselho Tutelar tinha conhecimento do caso desde 2009 (DÁLIA).

A indignação percebida nos depoimentos de Íris e Dália revela o impacto

sofrido na vida da criança, e demonstra que o tratamento às expressões da “questão

social” na saúde, em toda e qualquer problemática, sobretudo, nos complexos casos

_____________

33 Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. (BRASIL, 1990, p. 419).

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de violência doméstica infantil, deve envolver um conjunto de atores e segmentos

que atuam na defesa dos direitos da criança e do adolescente, tendo em vista que a

efetivação desses direitos (referentes à vida, à saúde, à dignidade, ao respeito, à

cultura, à liberdade etc.) é um dever da família, da comunidade, da sociedade e do

poder público, conforme instituído no artigo 4° do ECA.

Nesta complexa intervenção, foi feita abordagem com todos os envolvidos,

relatórios, órgãos competentes (CREAS e Conselho Tutelar). Um trabalho

multiprofissional que teve êxito graças ao envolvimento da atuação de médicos,

enfermeiras e assistentes sociais, que foi concluído mediante intervenção judicial,

decidindo pela condenação da mãe e pela destituição de poder familiar. O caso

permanece em acompanhamento, tendo em vista que entendeu-se que a criança

não teria mais condições de voltar à sua família, precisando de uma nova que venha

a acolhê-la legalmente.

Sabemos que o fator preponderante que leva a família a buscar o

atendimento médico no HIAS está na saúde da criança, contudo, relatou-se a

importância de serem observados todos os outros fatores sociais inseridos na

problemática da doença, tais como, a questão do trabalho, da pobreza, da educação

e da família. Em se tratando dos pacientes que sofrem com a fissura do lábio

palatino34, considerou-se o fenômeno do bullying35, que possivelmente pode

enfrentar no contexto de suas relações escolares.

O nosso trabalho, ele é muito amplo. Em termos de, quando chega uma

pessoa com problemas “x”, de saúde, especificamente, dentro desse

problema da saúde dele, ou de doença, que assim melhor a gente pode

chamar, nós temos que olhar para outros fatores, que é a questão trabalho,

o sustento dessa família, a questão da educação, que esses pacientes são

pacientes já adolescentes, uma criança maior adolescente, a gente tem que

ver a questão da escola, por exemplo, um paciente com fissura de lábio

palatino, muitas vezes, ele traz a fissura, como fator preponderante do seu

problema, por que ele quer a operação. Mas dentro desse contexto, existe

_____________ 34

O lábio fissurado e/ou a fenda palatina são aberturas no lábio, palato ou tecido mole da parte posterior da boca. Entre as principais causas da má formação estão o uso de álcool, cigarros, realização de raios X na região abdominal, deficiência nutricional, estresse emocional, hereditariedade, dentre outras. As consequências da fissura na vida de uma criança vão além da estética, podem causar problemas auditivos, infecções crônicas, má nutrição, má formação da dentição e dificuldades no desenvolvimento da fala. Frequentemente, observa-se o abandono escolar e a baixa da autoestima, ocasionando também problemas psicológicos. Disponível em: <http://www.saude.ce.gov.br/index.php/noticias/45847-albert-sabin-faz-nesta-quinta-25-avaliacao-de-cirurgias-de-labio-leporino>. 35

Conjunto de atitudes agressivas, intencionais e repetidas que ocorrem sem motivação evidente [...] causando dor, angústia e sofrimento. Insultos, intimidações, apelidos cruéis, gozações que magoam profundamente [...] (FANTE, 2005, p. 29).

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um problema na escola, por que ele está sofrendo bullying, essa mãe que

não tem dinheiro pra vir pro tratamento, pra comprar o medicamento, aí é

que nós entramos, nesse trabalho (TULIPA).

Assim, percebemos que a atuação da assistente social traz a preocupação

central de enfatizar os determinantes sociais na saúde do usuário, ou seja, está para

além da cura da doença, e do atendimento técnico-institucional, pois se considera

que o adolescente pode ser atingido em vários aspectos que possam comprometer

suas condições mentais e sociais. Assim, durante as abordagens realizadas na

intervenção profissional, atua-se na busca de proporcionar não somente o acesso à

saúde, mas, aos direitos sociais de forma mais ampla.

São avaliadas as condições socioeconômicas da família, por meio de

entrevistas, visando dar o maior suporte possível, tanto na garantia do acesso à

cirurgia de lábio palatino, quanto na disponibilização dos recursos para viabilizar o

tratamento, como transporte e medicação, visando amenizar o sofrimento com a

doença e proporcionar uma maior qualidade de vida ao usuário.

[...] nós temos que dar suporte social a essa família de tentar conseguir a cirurgia dele, de ter o dinheiro para o transporte, de ter o medicamento, viabilizar essa questão, e acima de tudo, muitas vezes, o suporte emocional, é muito importante. Nós, assistentes sociais, a gente que trabalha nessa área, a gente tem que ter um olhar mais profundo pra entender que esse paciente ele pode morar numa área de risco, ter uma vulnerabilidade social imensa, mas muitas vezes, o suporte que o hospital dar, faz melhorar a qualidade de vida dele, por que ele aprende a lidar com isso, não só ele, mas como a família (TULIPA).

Percebemos ainda nos depoimentos de Tulipa que durante o atendimento

identificam-se pais, que possivelmente fazem uso nocivo de álcool e/ou outras

drogas, e até mesmo crianças com transtornos psicológicos e depressivos. Nesses

casos, são realizados os devidos encaminhamentos para tratamentos, e estes

podem acontecer no próprio hospital com a equipe de psicólogos e psiquiatras.

No atendimento geral, a gente identifica muitas vezes, pais que são alcoolistas, pais usuários de drogas, crianças com alguns tipos de transtorno, e aí, o que é que a gente faz? Quando é crianças e adolescentes que tem uma depressão, que tem uma dificuldade por conta da fissura, então a gente faz os encaminhamentos, quando eu posso fazer aqui dentro mesmo, eu conto com a equipe, nós temos a psiquiatra aqui, nós temos neurologistas, e a gente vai tentando conseguir através da agenda restrita do SUS, mas muitas vezes, é difícil a gente conseguir, colocar em prática, algumas necessidades, porque? Por que tem toda uma regulação, e aí, por exemplo, uma consulta de primeira vez, a mãe tem que ir no posto ou no município dela pra conseguir, muitas vezes não consegue,

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a neurologia é uma área super difícil, mas agora, a gente batalhou e conseguimos que uma médica, atenda quatro por mês, quatro pacientes, e isso foi uma vitória, entendeu? Então assim, eu acho que o Serviço Social, ele não pode trabalhar sem um dinamismo, ele tem que ser dinâmico, e tem que buscar sabe? tem que ir atrás, vamos dizer assim, de resolver determinadas situações que é possível, dentro da própria unidade de saúde (TULIPA).

Embora o problema seja estrutural, fazendo com que a profissional se depare

com muitos limites institucionais, sua atuação dinâmica e propositiva, possibilita a

viabilização à saúde.

Dentre as situações presenciadas durante a observação participante, um caso

que nos despertou atenção, ocorreu no dia 22 de setembro de 2014, tratando-se do

complexo fenômeno da depressão pós-parto, acompanhado de uma situação de

possível assédio sexual, que levou à usuária a solicitar alta a pedido, envolvendo

outros atores sociais, como o filho recém-nascido, o marido e uma tia da usuária -

mãe adolescente, de apenas 16 anos.

O nascimento de um bebê, principalmente se tratando do primeiro filho, tem

sido considerado como um momento favorável ao surgimento de problemas

emocionais, tais como a depressão pós-parto, que se refere:

[...] a um conjunto de sintomas que iniciam geralmente entre a quarta e a oitava semana após o parto, atingindo de 10 a 15% das mulheres. Esses sintomas incluem irritabilidade, choro frequente, sentimentos de desamparo e desesperança, falta de energia e motivação, desinteresse sexual, transtornos alimentares e do sono e a sensação de ser incapaz de lidar com novas situações. (KLAUS et al, 2000 apud SCHWENGBER; PICCININI, 2003)

Podemos perceber que são diversos os fatores que contribuem para o

desencadeamento da problemática da depressão pós-parto, tais como fatores

biológicos, obstétricos, psicológicos e, sobretudo, sociais.

A situação observada já vinha sendo acompanhada pelo Serviço Social há

cerca de três meses, não sendo, no entanto, solucionada. Assim, a Coordenação do

setor, que já tinha conhecimento do caso desde o início, precisou intervir, ao ser

procurada pela usuária, acompanhada do marido e da tia, a fim de relatar suas

queixas e ter o seu problema resolvido. Trata-se de uma mãe adolescente de 16

anos cujo primeiro filho nasceu com os rins comprometidos; a criança foi transferida

direto da maternidade ao HIAS e está internado na Unidade há três meses.

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De acordo com os relatos do marido, a adolescente veio com ele de Natal/RN

para Fortaleza à procura de emprego. Não conseguindo, ficaram na cidade e hoje o

genitor trabalha de forma autônoma, o que, segundo ele, o impossibilita de

acompanhar o filho no tratamento, por necessitar prover o sustento da família.

A adolescente chorava incontrolavelmente, apresentava-se abatida e

melancólica. Logo foi possível associar sua expressão com os sintomas da

depressão pós-parto. Imediatamente a assistente social iniciou uma abordagem de

caráter investigativo, na busca de identificar as possíveis razões que a levaram a

chegar naquela situação de transtorno.

A princípio, percebemos o grau de dificuldade que a mãe apresentava ao

conversar, pois não conseguia parar de chorar, tampouco, estabelecer algum

diálogo compreensível. Ficou perceptível que ela sentia-se insegura para conversar

a respeito do assunto, mas a assistente social a deixou bem à vontade e foi

insistindo aos poucos, assegurando que ela estaria resguardada.

Contudo, os argumentos apresentados e a solicitação de alta a pedido vieram

por meio do marido, que demonstrava está bastante ansioso. O mesmo admitiu ter

problemas de ansiedade, sequelas de acidente com queimaduras de alto grau no

passado. Declarou que as crises de choro e o sofrimento constante da esposa

desencadearam-se logo após o nascimento da criança, seu primeiro filho,

atualmente com três meses, internado na unidade hospitalar desde o seu

nascimento.

São diversos os fatores que podem contribuir para a solicitação de alta por

parte dos usuários/responsáveis, tais como: falta de informação sobre o tratamento;

aspectos culturais e/ou religiosos; necessidade de sobrevivência/manutenção

familiar; não poder faltar ao trabalho etc. (CFESS, 2010). A justificativa dada pelo

genitor foi de que a esposa estaria bastante fragilizada devido à depressão que a

acometera após o parto. O pai relatou ainda que o estado de abalo psicológico da

esposa estaria relacionado a episódicas situações de assédio sexual, por parte de

um funcionário dos Serviços Gerais do hospital. Dessa forma, o Serviço Social se

empenhou em dar uma resposta, uma decisão à solicitação da família, atuando

como um profissional que se utiliza da mediação como instrumentalidade.

Durante a intervenção, embora estivesse mais tranquila, a genitora

demonstrava desânimo e tristeza. E o marido insistia que precisava retirá-la junto ao

seu filho, embora com uma doença crônica, relutava que não poderia mais permitir

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aquela situação. Solicitou ainda uma visita domiciliar por parte do Serviço Social, a

fim de comprovar que teria condições de realizar o tratamento da criança em sua

residência.

Considerando que uma das atribuições do profissional de Serviço Social no

HIAS é de orientar, esclarecer e refletir com o usuário e familiares às condições e

consequências que os levaram a solicitar a alta a pedido, e lembrando sempre que o

assistente social atua coletivamente em uma equipe multiprofissional, a Assistente

Social levou o caso à Direção médica, tendo em vista que a alta hospitalar é

concedida pelo médico. Verificou a possibilidade de o pai da criança e/ou de alguém

da família que possivelmente poderia substituí-la no acompanhamento, para que a

mãe descansasse e pudesse buscar tratamento psicológico. Contudo, durante toda

a abordagem, foi possível perceber certo clima desfavorável para o casal, como se

houvesse algum problema de família, além do que estava sendo declarado. O

marido afirmava veementemente que a mãe não tinha ninguém, nenhum outro

familiar, somente a ele e a tia presente, que era de outro Estado, e pouco

argumentava.

Conforme afirmado no documento Parâmetros para Atuação de Assistentes

Sociais na Saúde (CFESS, 2010), a alta a pedido é uma situação que muitas vezes

recai sobre o profissional de Serviço Social. E é importante que sejam feitas

algumas reflexões sobre o significado da alta e da autonomia do usuário no serviço

de saúde, levando em conta que e os procedimentos devem ser adotados de forma

coletiva.

Segundo o artigo 46, do Código de Ética Médica, os médicos só podem se

recusar a dar a alta a pedido ao usuário no caso de iminente risco de vida, em caso

contrário, deve ser respeitada a decisão do usuário (CFESS, 2010).

Devemos levar em consideração os princípios e as diretrizes do SUS,

presentes no artigo 7° da LOS, que ressalta a preservação da autonomia dos

usuários na defesa de sua integridade física e moral, e o direito à informação dos

usuários assistidos, sobre sua saúde. Dessa forma, após reunião da família com o

Serviço Social e Direção Clínica, ficou decidido que até o final da semana, período

no qual sairão os resultados dos últimos exames realizados na criança, a depender

destes, a alta será concedida mediante parecer médico. Posteriormente, será

realizado encaminhamento da criança para atendimento no Programa de Assistência

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Domiciliar (PAD)36, para viabilizar realização do tratamento da criança em casa,

acompanhado por uma equipe multiprofissional, constituída pelo médico, enfermeira,

assistente social, psicólogo e fisioterapeuta.

Em relação à queixa do possível assédio sexual, detalhado de forma mínima,

na qual, o funcionário ao passar, bate no vidro da enfermaria e solta beijo, se

insinuando para a mãe adolescente, de forma insistente. A assistente social

registrou as características, e horários informados, e se reunirá com a Chefia do

Setor de Serviços Gerais, visando identificar o funcionário, para realização de

audiência e, se houver confirmação do fato denunciado, realizar a devida

advertência e/ou punição.

A profissional do Serviço Social orientou ao genitor acerca dos tratamentos

oferecidos no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), não só para a mãe, como

também para ele próprio, explicando a importância do tratamento para ambos. A

partir dos relatos obtidos e do descontrole emocional a cada abordagem realizada,

compreendemos a urgência daquela mãe adolescente em receber um apoio

especializado, e tentamos sensibilizá-la da importância de um tratamento com o

psicólogo.

Logo, a atuação da assistente social frente a esta problemática foi realizada

de acordo com o proposto no documento Parâmetros para Atuação de Assistentes

Sociais na Saúde, que norteia as ações profissionais neste âmbito. No que tange à

evasão hospitalar e alta a pedido a postura profissional deve ser de orientação,

esclarecimento, e reflexão junto ao usuário e à equipe de saúde com relação às

condições objetivas que estão impulsionando os usuários a tomarem esta decisão,

deixando sempre claro que:

O profissional responsável pela alta e pelos seus procedimentos deve ser o médico e não o assistente social. O profissional de Serviço Social pode ser um interlocutor entre os usuários e a equipe de saúde com relação aos determinantes sociais, visto que o respeito pela diversidade é um princípio

_____________ 36

O Programa de Assistência Domiciliar (PAD) foi implantado no HIAS em julho de 2000. A partir daí, após a estabilidade do quadro clínico, crianças com problemas crônicos puderam dar continuidade ao processo de recuperação em suas residências, recebendo todo suporte médico-hospitalar necessário, desde que elas estivessem dentro dos critérios de inclusão do programa. Entre os requisitos estabelecidos estão: residir em Fortaleza, ter registro de nascimento, possuir baixa renda familiar, ter aceitação do Programa da Família e necessitar de, no mínimo, dois dias de visitas semanais. Disponível em: <http://www.hias.ce.gov.br/index.php/pad--pavd>.

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que deve fundamentar tanto a sua formação como o seu trabalho profissional (CFESS, 2010, p.49).

O que foi percebido e materializado na referida intervenção, na qual a

profissional do Serviço Social, percebendo a complexidade social envolvida,

intermediou junto à família e à coordenação médica, priorizando sempre a saúde e o

tratamento da criança, sem, contudo, deixar de buscar responder da melhor maneira

possível, as demais expressões da “questão social” imbuídas na realidade social

daquela família. Destarte, as ações realizadas pela Assistente Social foram de suma

importância, pela detecção dos problemas, pois a identificação de mulheres em

situação de depressão pós-parto é de extrema relevância, bem como na denúncia

do possível assédio sexual sofrido pela mãe para que sejam tomadas as medidas

protetivas.

Diante dos atendimentos expostos, podemos perceber que, a “questão social”

e suas múltiplas expressões são cotidianas no âmbito do HIAS, e tem maior

evidência na violação dos direitos da criança, sobretudo, por meio da violência

doméstica.

A “questão social” também é bastante associada às desigualdades, e a falta

de recursos das famílias dos usuários, tanto no aspecto financeiro, como questões

de moradia, transporte, educação, dentre outros aspectos. Conforme destacamos no

depoimento a seguir:

A “questão social” que chega aqui no hospital pode chegar de várias maneiras. Podem chegar nos problemas da emergência para os tipos de adoecimento da criança relacionado não com a questão física, mas pela questão realmente da pobreza, a questão da falta de conhecimento, decorrente da falta de estudo, da falta de oportunidade de educação; problemas do entorno do hospital, por que estamos numa área, que é próxima a área de risco (DÁLIA).

No caso de pacientes oncológicos, sustenta-se que este vem ao hospital

trazendo consigo uma “bagagem de problemas” relacionados principalmente ao fato

de a doença ter um tratamento de longo prazo, o que ficou perceptível na análise de

Amarílis:

Acho que as expressões da ‘questão social’, elas acontecem realmente por conta das desigualdades, mas seria por conta da falta de recursos, das pessoas, né? Então, essa ausência de recursos ela vai desde o financeiro, dos recursos de sobrevivência, do básico, até a questão de transporte, a questão de moradia, então tudo isso, traz pras eles não só um problema, quando eles chegam aqui com um problema de saúde, principalmente um problema de saúde grave, como oncológico ou hematológico, que é de uma

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doença que vai levar muito tempo pra ser curada, ou um tratamento, eles trazem uma bagagem de problemas (AMARÍLIS).

É importante salientarmos que, no âmbito do CPC, a viabilidade para

transplantes ocorre com a intervenção direta do Serviço Social, que realiza todos os

trâmites necessários, dando o suporte nas questões de transporte, passagem aérea,

viabilizando a realização de exames de compatibilidade, prestando ainda apoio

emocional às famílias das crianças com câncer.

Segundo Nogueira e Mioto (2009, p. 229), não é possível compreender ou

definir as necessidades de saúde sem levar em conta que elas são produtos das

relações sociais e destas com o meio físico, social e cultural.

Ao serem indagadas acerca dos aspectos sociais que mais contribuem para o

aparecimento de doenças, as profissionais apontaram diversos fatores, a saber: falta

de informação em saúde; falta de educação, bem como o desconhecimento e

despreparo da família, a pobreza, a violência, a questão socioeconômica, dentre

outros fatores.

[...] vão contribuir com certeza a falta de educação, a gente acompanha muitos pais que não tiveram educação primária, ou que não tiveram nenhum tipo de educação, que é o principal; a falta de poder aquisitivo, o paciente às vezes está “enfiado” numa área rural, no interior, ele tem uma dificuldade imensa pra chegar até Fortaleza, pra poder ter o atendimento necessário para o caso dele, então principalmente, a educação primeiro de tudo. Primeiro lugar é a educação, e segundo lugar a questão da dificuldade do poder aquisitivo mesmo (ÍRIS).

[...] aí nós entramos na questão socioeconômica, que é a questão da falta de emprego, da falta de sustento dessa família pra ter uma boa alimentação, e aí entra a questão do trabalho também, vai envolver muito essa questão socioeconômica (TULIPA).

Embora possamos perceber certa culpabilização ao indivíduo, é importante

frisarmos que por trás de uma família negligente há um Estado também negligente,

que descumpre o seu dever no que tange à garantia dos direitos sociais legitimados

constitucionalmente. A análise desses aspectos sociais está para muito além da

singularidade do indivíduo, devendo-se levar em consideração a totalidade da

complexa realidade social na qual se inserem os usuários do sistema de saúde.

Assim, podemos perceber que dentre os diversos fatores determinantes das

condições de saúde, além dos condicionantes biológicos, há os meios físico, cultural

e socioeconômico. Mais do que isso, envolve aspectos éticos relacionados ao direito

à vida e à saúde, direitos e deveres (NOGUEIRA; MIOTO, 2009, p. 229).

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No âmbito do CPC nos foi relatado que embora não existam dados científicos

que comprovem a interferência do social na questão do câncer, ou seja, que não

haja uma relação direta dos riscos sociais com os aspectos oncológicos, a relação

torna-se direta após o diagnóstico, bem como durante todo o processo do

tratamento. Conforme percebemos nos discursos de Amarílis

[...] não tem assim, uma relação direta dos riscos sociais, com relação ao câncer. Agora a gente sabe né, só complementando, que o posterior tem! Quer dizer, a qualidade de vida, dessa criança com câncer, vai depender muito da “questão social”, o depois acontece! Essa relação aí é direta. Por que ele precisa está numa casa forrada, ele precisa de bem estar, não pode está num solo muito quente, por conta das defesas que são muito baixas, ele pode pegar uma pneumonia, uma virose, uma coisa que pode levar a óbito, sem ser exatamente por conta do câncer. Os riscos sociais no câncer a gente não pode saber, por si, se provocam ou não, mas se é um agravante no tratamento, ele é um agravante! Então por isso, que a gente tenta minimizar o que pode para o alcance da cura, é fundamental (AMARÍLIS).

Verificamos a partir do exposto, que o atendimento às necessidades de saúde

remete ao atendimento das necessidades humanas elementares, tais como

habitação, alimentação, transporte, educação, em suma, qualidade de vid, serviços

sociais que no CPC são garantidos por meio da APP, ONG parceira do HIAS.

Nesse momento, é fundamentalmente relevante situarmos o papel do Estado

na provisão dos direitos sociais via políticas públicas, devendo garantir um mínimo

social aos seus cidadãos. Entretanto, o terceiro setor, materializado nesse sentido,

na organização sem fins lucrativos, atua na prestação dos serviços sociais no âmbito

do HIAS/CPC/APP, porque o Estado não ocupa devidamente o seu espaço ao

desresponsabilizar-se de suas funções básicas inerentes, participando como uma

espécie de parceiro.

Daí nos questionarmos, por que o Estado não pode contemplar e priorizar o

social de forma mais ampla implementando e efetivando políticas sociais,

desempenhando assim o seu papel como protagonista, e o seu dever ser? É

importante também buscarmos desmistificar a questão de que uma ONG atua de

forma somente solidária e gratuita, lembrando que a organização enquanto

instituição precisa manter-se, pois para o seu funcionamento é necessário dispor de

recursos técnicos, financeiros e operacionais para sua manutenção, bem como sua

gestão demonstrar resultados por meio de relatórios, e efetuar prestação de contas

com Estado e sociedade civil.

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Obviamente, não podemos de forma alguma desmerecer o importante papel

do terceiro setor na provisão dos serviços sociais, que faz toda a diferença no

tratamento das crianças no CPC, possibilitando que o assistente social, em suas

intervenções, obtenha mais respostas profissionais. Só não podemos é deixar de

questionar a crescente redução do papel do Estado e consequentemente a

ampliação do terceiro setor, que deve funcionar como um complemento às políticas

sociais.

A partir dos relatos sublinhados, percebemos a materialização diversificada

das refrações da “questão social” com suas consequências alarmantes nos mais

variados aspectos da realidade social das crianças e adolescentes atendidas no

HIAS. Percepções decorrentes da ampliação do conceito de saúde, já debatidas

neste trabalho monográfico, que reforça a necessidade de atuação profissional

multidisciplinar numa perspectiva de totalidade que concorram para a efetivação da

saúde enquanto direito social, consolidação que exige que o profissional tenha

capacidade de enfrentar cotidianamente muitos desafios, mediante algumas

limitações nas quais se depara. Faremos um recorte acerca disso no próximo tópico.

4.4 O serviço social e a prática profissional na saúde: limites, possibilidades e

desafios.

Como já nos referimos ao longo deste trabalho, o SUS está consolidado na

Constituição Federal e regulamentado na Lei Orgânica da Saúde (Lei n° 8.080/90).

Universalizou-se o direito à saúde, apontando para a garantia do pleno acesso aos

serviços sem quaisquer critérios de exclusão ou discriminação. (Nogueira & Mioto,

2009, p. 221, grifo nosso). Vale ressaltarmos que a consolidação do SUS via

legislação constitui-se como um objeto de luta do movimento de reforma sanitária e

da sociedade, destacamos dessa forma, que é essencial a participação da

sociedade por meio da continuidade dessa luta para que o sistema se concretize

plenamente.

As novas contradições criadas com a contrarreforma na saúde tentam não

viabilizar o SUS constitucional, ocasionando diversas questões operativas nos

serviços prestados: demora no atendimento, dificuldade no acesso, burocratização e

precariedade dos recursos (CFESS, 2010).

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Numa análise mais ampla da realidade, percebemos que o grande problema

não está no sistema implementado, mas na discrepância entre a sua legislação e a

real efetivação.

Por outro lado, as dificuldades enfrentadas na concretização do SUS não

podem ser generalizadas, tendo em vista que alguns Municípios assumiram a saúde

de seus cidadãos, conseguindo conciliar minimamente o que prega a lei, prestando

atendimento com qualidade e dignidade aos usuários atendidos.

Nesse sentido, direcionamos a nossa análise tendo como base as falas de

nossas entrevistadas durante indagação quanto à viabilidade do SUS, considerando

que há um verdadeiro consenso de defesa do sistema, e de que este é viável no

contexto do HIAS, a maioria das entrevistadas foram concordes ao apontarem

justificativas favoráveis à materialização do sistema de saúde na prática profissional,

sobretudo, após o acesso a unidade, visto que a dificuldade do sistema está no

acesso, conforme nos retrata Íris:

Eu acho que o SUS é altamente viável, e eu defendo o SUS até o fim! Primeiro, por que o SUS pressupõe o atendimento integral as pessoas, e ele vêm desenvolvendo mecanismo para poder está ofertando esse atendimento integral, aí você fala assim: ah, mas há um grande estrangulamento, uma grande dificuldade desse acesso. Há! Há uma dificuldade muito grande no acesso, especialmente na atenção terciária com as especialidades, mas a gente tem que ver que há uma série de problemas a serem superados. [...] O SUS dentro do hospital é viável, principalmente quando se consegue ter o acesso, depois que você tem o acesso, dificilmente há uma quebra! Aqui no hospital eu vejo que dificilmente há uma quebra no tratamento após o acesso (ÍRIS).

Apesar de o HIAS ser um hospital de referência, ainda podemos perceber

certa instabilidade no atendimento dos serviços no que concerne ao acesso à saúde.

As maiores queixas são pela demora no atendimento, outro problema é que muitas

vezes, embora os casos dos usuários possam ser sanados no atendimento primário,

eles procuram o HIAS, aumentando ainda mais a demanda e fragilizando o

atendimento, o que acaba por fortalecer o modelo de saúde privatista que propõe o

Estado mínimo para o social.

A dificuldade está no acesso. É a fila de espera grande, para o atendimento ambulatorial, é a dificuldade do acesso na emergência, a gente ver que é um hospital de grande porte, de especialidades, e a gente ver crianças que chegam aqui com resfriado (ÍRIS).

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Diante da fala de Íris, podemos perceber que o impacto desse atendimento

deficiente nas redes terciárias é devido ao não funcionamento do atendimento da

atenção básica, que implica na atenção média e alta, resultado de um sistema que

não funciona conforme a proposta baseada nos princípios e diretrizes do SUS,

presente na LOS. A maioria da demanda não procura as unidades básicas para o

atendimento mais simples, mas os Hospitais que já estão com lotação em seu

atendimento, que o caso do HIAS. Logo, na melhora no atendimento dos serviços de

saúde é uma questão bem mais ampla, o cenário aponta para a necessidade de

mudanças no Sistema de Saúde, para que o SUS constitucional seja efetivado.

Os problemas a que Íris se refere, vão desde a expansão da saúde privada,

com os planos de saúde, que são contra a efetivação do Sistema Único, tendo em

vista que a partir do momento que o SUS estiver funcionando de forma regular e

satisfatória, eles deixarão de ter os lucros exorbitantes que tem hoje, indo até o

problema do corporativismo de algumas profissões, que muitas vezes atravancam a

concretização do serviço público de Saúde.

Com todas as dificuldades inerentes ao sistema vigente, que refletem

diretamente na realidade de nosso sistema de saúde, o assistente social que atua

no HIAS consegue realizar o seu trabalho “com todas as precariedades que existe

hoje, a necessidade do SUS ter um reestudo, uma renovação e uma ampliação,

apesar das dificuldades a gente consegue fazer muita coisa! Sabe, assim, é muita

luta!” (TULIPA).

Dessa forma, as profissionais conseguem alcançar resultados na defesa dos

direitos sociais, de forma a minimizar as desigualdades e amenizar as explosivas

expressões da “questão social” em seu cotidiano, por meio das mediações e

estratégias impressas em suas ações:

O SUS é um plano de saúde, né? Ele tem muitas facetas que a gente trabalha e tem resultados, agora, é muito trabalho! A gente rompe muita barreira. Tem mediações, têm negociações, intervenção nossa é bem complexa! Precisa mesmo que o assistente social se envolva, pra coisa acontecer! (VIOLETA).

No CPC, afirma-se que a viabilidade do sistema que garante uma efetividade

e qualidade no tratamento tem feito com que muitos pacientes da rede privada

busquem o atendimento que se tornou referência no Estado.

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Dentro do contexto da prática profissional do assistente social o SUS está sendo viável, eu acredito que sim! Eu vejo de uma forma muito positiva, essa cena é tão positiva, que nós estamos com muitos pacientes de convênios vindo pra cá! Pela qualidade do serviço, pelo reconhecimento (AMARÍLIS).

Sob outra ótica, um dos depoimentos destaca-se por questionar essa

viabilidade do SUS. Uma das entrevistadas fez uma avaliação negativa do sistema,

discordando das demais análises, ao afirmar que o problema do SUS é um problema

de gestão que reflete na realidade de seu trabalho enquanto assistente social.

Reforçando que o problema maior está no acesso ao sistema, que é um direito

garantido constitucionalmente, e muitas vezes negado, mediante as grandes filas de

espera no atendimento, apontando ainda lacunas no tocante a estrutura física da

Instituição.

No contexto de trabalho, essa inviabilidade é percebida. Por exemplo, o hospital, ele é referência terciária, e referência também em especialidades. Era pra ser garantido pelo governo do Estado que todas as crianças do interior do Estado pudessem ter um acesso rápido aqueles especialistas que tem aqui, e quando a gente ver, muitas vêm à procura direta, achando que aqui no Serviço Social teria como interferir nessa fila de regulação, por que no Município está a mais de seis meses, as vezes até mais de um ano, aguardando a consulta, e não consegue! [...] O problema está no acesso, é um direito que ela tem, a gente sabe que é um direito, a gente sabe que é para o Estado garantir esse direito, mas muitas vezes, muitas fazem é desistir, por que não conseguem acessar o Sistema Único. E tem a própria estrutura do hospital, que talvez nem desse conta de todos esses pacientes que necessitam dos serviços (DÁLIA).

Percebemos a ênfase de Dália no que diz respeito ao direito à saúde, e

consequentemente, muitas vezes, a sua violação. Considerando que a consolidação

plena do SUS esbarra tanto na ausência de vontade política de alguns governantes,

como na ausência de organização da sociedade civil, especialmente a população

mais pobre que têm dificuldades de mobilização para pressionar o poder público,

posto que muitas vezes desconhece os seus próprios direitos.

Portanto, o assistente social, numa ação conjunta com os demais

profissionais da saúde, deve buscar possibilidades de empreender estratégias de

ações que favoreçam os interesses e necessidades dos usuários, o que por sua vez,

depende da capacidade do desvendamento e apreensão da realidade social e suas

contradições (VASCONCELOS, 2012), visando à viabilização do SUS e a efetivação

do direito à saúde.

Diante da realidade exposta, o desafio posto ao profissional do Serviço Social

está em caminhar na direção ao Projeto Ético-Político da profissão, oposto ao

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projeto capitalista neoliberal, numa perspectiva não somente de possibilitar que os

usuários conheçam os seus direitos, mas que busquem de forma crítico-consciente

as melhorias no acesso e qualidade dos serviços de saúde.

Vasconcelos (2012) aponta que, embora com restrições, o assistente social é

o profissional que tem como possibilidade uma inserção e atuação não programada

nas instituições, diferente dos demais profissionais, e que por esta razão é levado a

conquistar o seu espaço profissional no interior das unidades de saúde, buscando

desenvolver parcerias para realizar suas ações e, assim, oferta e incentiva ações

que transcendem o consultório e a cura, estimulando o trabalho em equipe. “Aqui no

hospital [...] o Serviço Social, ele foi ponte, ele foi um elo entre todas as áreas”

(TULIPA).

A mesma autora salienta que pensar, propor estratégias e viabilizar ações

com vistas à construção de uma consciência sanitária demanda uma ação

interdisciplinar no campo da saúde que extrapole as ações na prevenção e combate

a doenças.

O profissional do Serviço Social no trabalho em equipe na saúde dispõe de

ângulos particulares de observação na interpretação das condições do usuário e

uma competência distinta para o encaminhamento das ações, que o diferencia dos

demais profissionais da saúde (CFESS, 2010).

A relação do Serviço Social entre si, enquanto equipe, no HIAS, varia de

profissional para profissional. O importante é saber lidar e priorizar a saúde e os

direitos da criança. Contudo, há a necessidade de se melhorar o trabalho

interdisciplinar37 no âmbito do próprio Serviço Social. Foi dada como sugestão a

realização de reuniões mais frequentes envolvendo temáticas de interesse da

categoria, havendo também o reconhecimento da necessidade do aperfeiçoamento

profissional.

A equipe de Serviço Social, ela tem uma interação, que eu considero assim, boa, mas com a necessidade de melhorar! Eu acho que nós temos um foco muito bom no trabalho, cada um sabe o que tem que fazer e faz! Eu acho que nós temos uma equipe muito dedicada, aguerrida mesmo no trabalho diário, mas eu acredito que a gente tenha a necessidade de ter uma

_____________ 37

A interdisciplinaridade pode ser definida como uma relação de reciprocidade, de mutualidade, que possa pressupor uma atitude diferente de ser assumida; seria substituir a concepção fragmentária pela concepção unitária [...] o saber universal sobrepõe-se ao conhecimento individual (CARRIJO et al, 2003, p. 44).

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interdisciplinaridade mais trabalhada, eu acho que tá precisando aumentar um pouco, a multidisciplinaridade dentro do próprio Serviço Social [...] Eu acho que tá faltando um pouco essa coisa do aperfeiçoamento profissional. (TULIPA).

É importante salientarmos que o princípio “X” do Código de Ética do

assistente social versa sobre a importância e compromisso que o profissional deve

ter com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento

intelectual, na perspectiva da competência profissional (CFESS, 1993), ou seja, o

desenvolvimento teórico-metodológico é crucial para o sucesso da intervenção

profissional.

Sobre essa questão, Vasconcelos (2012), ressalta que na direção do acesso

a saúde como um direito social, é essencial não só o investimento na capacitação

dos profissionais, mas também o resgate da reconstrução da relação entre o poder

público e a sociedade civil.

No que tange aos usuários, há uma preocupação e interesse por parte das

profissionais pelas suas condições sociais de vida, sendo estabelecida uma relação

de confiança, sem, contudo, deixar de estabelecer limites, quando necessário. É

preciso buscar entendê-lo de acordo com a sua realidade, e, sobretudo, escutá-lo,

respeitando a diversidade cultural.

Eu procuro atender o usuário da forma mais natural possível, usando um pouco esse linguajar dele, tendo cuidado, por exemplo, a questão de determinadas expressões que a gente usa que pra nós é muito tranquilo, mas às vezes quando você fala para o usuário, ele fica meio que estranho e também temos que aprender a lidar com a linguagem dele. Também, a gente tem que ver que tem dar um certo limite ao usuário, por que as vezes ele chega com uma queixa que não tem fundamento, aí você tem que sentar com ele, escutar aquela queixa e, mostrar pra ele que aquilo ali não procede (TULIPA).

Tanto com o usuário, que eu escuto, eu gosto de escutar, eu gosto muito de está presente, eu trabalho diariamente, quase de sete as sete, então eu faço parte, muito, da vida deles! Sou muito presente, no dia-a-dia! Elas têm em mim, muita confiança, estou falando por mim, né? (GIRASSOL).

Em relação ao exercício da escuta ao usuário, é importante acentuarmos, que

não basta somente que o profissional escute o que lhe é trazido, tendo em vista que,

se permanecer calado, o profissional acabará por contribuir para a reprodução das

relações sociais já instituídas. Destarte, cabe ao profissional desenvolver habilidades

de escuta e observação do que é dito e do que não é dito verbalmente, visando

possibilitar por meio de seu conhecimento e sua postura ético-política, que esse

usuário se volte ao seu cotidiano numa atitude crítico-analítica, criando assim

condições para o exercício de sua autonomia enquanto sujeito de direitos.

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Na relação multiprofissional há algumas divergências e conflitos de ideias,

mas nada que interfira numa relação harmoniosa e profissional, visando sempre o

melhor para o usuário e, podendo o assistente social, inclusive, encontrar nos

demais profissionais de saúde grandes aliados.

A nossa prática, ele é muito dialética e dialógica. A minha experiência profissional é sempre trabalhando em equipe multiprofissional [...] Enquanto assistente social destes dois núcleos, eu acho que o Serviço Social é muito respeitado, ele é muito bem recebido, eu não tenho dificuldade de diálogo. [...] A gente não trabalha sozinha, não tem condições, de trabalhar só! A equipe, ela consulta muito o Serviço Social, acredita muito! (TULIPA).

Para Dália, o problema está na hierarquia profissional, na correlação de

forças e na dificuldade de exercer a interdisciplinaridade:

Têm profissionais, que conseguem perceber a importância do Serviço Social, como tem profissionais que colocam o assistente social como uma categoria inferior na qual eles estariam um pouco acima. [...] a eterna briga de poder dos profissionais de saúde, hierárquica, a questão da interdisciplinaridade é muito difícil, existe no papel, mas na prática ela é muito difícil! Existe a multiprofissionalidade, vários profissionais atuando com um mesmo objetivo, mas da interação entre profissionais de diferentes categorias, de estarem estudando entre si qual é o melhor plano de atuação para aquela criança, ainda é muito de difícil de ocorrer (DÁLIA).

A inserção dos assistentes sociais nas politicas setoriais, e também na saúde,

vem demonstrando dificuldades na definição de seu papel nas equipes

multiprofissionais (NOGUEIRA; MIOTO, 2013). Haja vista o assistente social,

embora dividindo o trabalho com outros profissionais na saúde, dispor de ângulos

particulares na interpretação dos processos sociais e de uma competência peculiar

para a realização de suas intervenções profissionais.

Em relação às condições de instalação das salas nas quais o Serviço Social

ocupa para realização dos atendimentos, as opiniões das entrevistadas se dividiram:

as profissionais que atendem nas salas do HIAS consideram as instalações e

condições físicas e de infraestrutura bastante precárias, com espaço reduzido, mal

organizado e mal distribuído, o que as faz realizar parte dos atendimentos na sala da

coordenação do setor, comprometendo o sigilo profissional, o que fica bastante claro

no depoimento de Tulipa:

Olha, eu posso dizer assim sem nenhum medo de ser feliz, eu acho extremamente precária! A nossa condição de trabalho é muito precária! Estive pensando, outro dia, que nós temos uma condição muito precária de estrutura física de trabalho, mas é interessante, que o resultado do nosso trabalho é muito maior que isso, apesar da gente ter uma condição muito

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ruim, mas o nosso trabalho ele é imenso em relação a isso, graças a Deus! O que eu quero te dizer é assim, o fato de eu trabalhar num ambiente extremamente precário, não me impede de fazer o meu trabalho, não me impede de forma nenhuma, agora eu também sou da luta! Sabe, eu vou atrás (TULIPA).

Podemos perceber, diante do exposto, as lacunas no que concerne à

estrutura física das instalações ocupadas para realização do trabalho do assistente

social no HIAS. Contudo, a profissional precisa se utilizar de alguns mecanismos

que venham a possibilitar a sua prática, mediante as barreiras estruturais.

Não podemos deixar de mencionar, nesse sentido, a Resolução CFESS n°

493/2006, a qual dispõe sobre as condições éticas e técnicas do exercício

profissional do assistente social, estabelecendo como condição essencial e

obrigatória para a realização dos atendimentos aos usuários espaço físico

adequado, suficiente para abordagens individuais ou grupais, com recursos que

garantam a privacidade do atendimento, e de portas fechadas, de modo a garantir o

sigilo profissional.

Outra questão merecedora de destaque, é que, detectamos no Ambulatório

que o atendimento de enfermeiras dá-se na sala do Serviço Social, ou seja, são dois

atendimentos no mesmo espaço físico ocorrendo de forma simultânea, o que

também compromete um atendimento sigiloso.

Em meio às entrevistas, identificamos algumas outras situações que podem

prejudicar o sigilo profissional, como dão a entender os depoimentos que seguem:

Na hora que o usuário entra, a mãe entra se esgueirando pra não bater na mesa, na cadeira. Tem armário com chave, tem o computador, tem minha mesa, tem cadeira, tem uma estantezinha onde tem telefone, eu tenho fax, ótimo! As condições de trabalho, os recursos eu tenho! Agora o recebimento dessa pessoa, é que eu acho muito triste! Muito restrito! A minha porta, ela abre muito, e muitas vezes o sigilo profissional é prejudicado (TULIPA).

O nosso espaço aqui é muito precário. Nós conquistamos há pouco tempo, um espaço para as plantonistas poderem fazer um lanche! O espaço é reduzido, e muito mal distribuído. Esse balcão, a gente até brinca, diz que é o balcão do crediário! Você vê que ali é impossível fazer um atendimento com sigilo, a pessoa entra, você está atendendo, tem uma pessoa na porta, você pede pra esperar, a pessoa fica chateada (DÁLIA).

No que se refere ao sigilo, o Código de Ética do assistente social versa que

constitui um direito do profissional – inviolabilidade do local de trabalho e respectivos

arquivos, garantindo o sigilo profissional (CFESS, 1993, p. 26). No artigo 17 consta

que é vedado ao assistente social revelar sigilo profissional.

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A quebra do sigilo, de acordo com o Código de Ética, só é admissível quando

se tratar de situações cuja gravidade possa, envolvendo ou não fato delituoso, trazer

prejuízo aos interesses do/a usuário/a, de terceiros e da coletividade.

O sigilo não envolve somente ao que é confiado ao profissional pelo usuário;

é parte ética profissional a preservação do usuário de todas as informações que lhe

digam respeito, mesmo que elas não lhes tenham sido reveladas diretamente.

(BARROCO; TERRA, 2012, p. 91).

Vale ressaltarmos que o HIAS passa atualmente por um processo de reforma

que abrange os espaços físicos de atendimento do assistente social, inclusive a sala

da coordenação. As salas serão ampliadas e reorganizadas, possibilitando melhores

condições de trabalho às profissionais que atuam no setor, assim como aos usuários

atendidos na instituição, fato que gera expectativas ao Serviço Social.

Percebemos que as condições físicas ideais à prática profissional ocorrem na

realidade pesquisada de maneira contraditória, considerando que os espaços de

trabalho no HIAS ainda não proporcionam a privacidade e o conforto necessários ao

profissional e ao usuário, conforme demonstram os relatos citados, ao passo que os

espaços de atendimentos realizados nas salas do CPC/APP possuem uma estrutura

impecável, com salas bonitas, espaçosas e com todos os recursos disponíveis,

contraditoriamente as posições anteriormente expostas, as assistentes sociais que

atendem no CPC, consideram muito boas as condições e instalações do espaço

físico ocupado para desempenho de suas atividades diárias:

Acho ótimas! Nós temos duas salas do Serviço Social, a gente tem condição de atender individualmente uma mãe, por que tem “n” situações, se nós não pudemos fazer uma entrevista com a mãe, ou mesmo ter uma conversa sobre as situações delicadas da família dela. Nós temos boas condições, nós temos um bom auditório para fazer as reuniões semanais com os acompanhantes (AMARÍLIS).

É importante salientarmos, conforme já citado, que o CPC/HIAS possui uma

parceria com a Associação Peter Pan (APP), organização sem fins lucrativos. Ou

seja, no CPC há uma ação conjunta do Estado e do terceiro setor, por meio da ONG

APP, que busca a garantia do direito à saúde de crianças e adolescentes portadoras

de câncer. Demonstrando a retração e desresponsabilização do Estado e em

contrapartida sua participação junto a entidades da sociedade civil na provisão de

políticas sociais.

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A parceria com a Associação Peter Pan – APP é mais a questão social, de assistência social, todos os projetos da APP são voltados pra essa parte do social, pra minimizar os problemas sociais do paciente e da família, eles tem diversas coisas, transporte, vale transporte, cesta básica, acompanhamento, visita domiciliar, reforma de casas, tudo isso, eles realmente tentam chegar junto, né? Doação de eletrodomésticos, colchão, cama, ventilador, geladeira, então eles tentam realmente tentam minimizar exatamente esses problemas sociais, causados pela ausência dos materiais. Eles tentam suprir coisas que possam dar ao paciente uma condição melhor (AMARÍLIS).

Nós temos uma parceria muito grande com a Associação Peter Pan, temos as visitas domiciliares, o Serviço Social, onde a gente detecta essa realidade, teve um paciente nosso de leucemia, junto com a Associação, a gente fez um quarto, um banheiro. Tem mães que desejam mudar o piso, tem outra que é a cobertura da casa, um banheiro, essas coisas que é necessidade delas, é doado! Como também colchão, cama, a gente consegue fogão, uma série de coisas, para aquela casa ficar estruturada (GIRASSOL).

É fundamental inicialmente observar que as ONGs no campo da saúde

expressam uma nova construção social, que tem implicações nas políticas sociais e

no fazer profissional. (MACHADO, 2010, p. 276).

Embora o Serviço Social atuante no CPC/APP possua vínculo empregatício

com a Secretaria de Saúde/HIAS, sua relação com os usuários e equipe

multiprofissional se diferencia, ou seja, sua intervenção profissional acaba tecendo

para a lógica da ONG.

Houve considerável aumento da participação das entidades de cunho privado

e filantrópico na prestação de serviços sociais financiados pelo Estado, expondo os

profissionais a operarem em lógicas contraditórias (NOGUEIRA; MIOTO, 2013).

Dessa forma, o Serviço Social deve pautar suas ações numa perspectiva

contrária à lógica do favor; o seu trabalho junto ao usuário e sua família deve seguir

na órbita do direito social.

Então, o desafio posto está em descobrimos mecanismos e estratégias de

assegurar os direitos sociais e de (re)politizar a “questão social” nestes espaços

sócio-ocupacionais. É preciso que o profissional de Serviço Social consiga fazer a

leitura dos projetos societários em confronto, e assim, construir mecanismos, que

viabilize a organização da população usuária na garantia dos direitos (MACHADO,

2010, p. 281).

Em relação aos limites principais para a atuação profissional, foram

apontados limites estruturais da política de saúde e de assistência, bem como da

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infraestrutura física da instituição, e também a burocratização do acesso ao sistema

de saúde e assistência social, que encontram limites na sua efetivação.

Eu diria que o limite é a própria rede de saúde, e a rede de assistência social, por que a rede de saúde muitas vezes, o que acontece, chega uma mãe aqui fragilizada com a criança já em situações que já não tem muito mais o que os médicos fazerem, por quê? Por que passaram por várias situações de saúde, várias unidades que não detectaram, por dificuldade do acesso e da qualidade dos serviços. Não aqui, antes de chegar aqui. Agora aqui, eu diria a questão das redes sociais, com o SUAS, foi muito ampliada a assistência social, mas ainda não é muito efetivo isso, certo? Então, a falta de efetivação da rede do SUAS, ainda causa alguns entraves, para alguns encaminhamentos que nós precisamos fazer (AMARÍLIS).

A gente ainda tem algumas limitações, a UTI, por exemplo, os nossos acompanhantes, eles estão dormindo no colchão no chão, na varanda da UTI. Em termos de serviços mesmo, nós poderíamos ter um assistente social a mais, pra acompanhar, que tivesse mais tempo pras visitas domiciliares (AMARÍLIS).

Um aspecto mencionado que nos chamou atenção refere-se à visão errônea

por parte de outras categorias profissionais de que o assistente social é responsável

por resolver brigas e conflitos, ou seja, o profissional designado para “apagar o

fogo”, o que demonstra o desconhecimento por parte dos demais profissionais da

saúde acerca da atuação do Serviço Social na saúde.

Onde houver uma questão que outros profissionais da saúde não consigam

resolver, independente de qual seja o problema, a assistente social é chamada a

intermediar o conflito e acalmar os ânimos, apagar o incêndio daquele momento,

conforme nos expressa Dália:

O espaço físico do Serviço Social é bem complicado, e também a questão de que muitas vezes, as equipes dos blocos não chamam a assistente social para fazer parte, tipo, só ver o assistente social quando tem um problema a ser resolvido pelo assistente social, como se fosse alheio, tipo assim, é só pra apagar o fogo! E tem uma questão pior, se tem uma visão aqui no hospital de que assistente social é guarda de briga, tem uma mãe matando outra e não chamam segurança, chamam a assistente social, quando se deve chamar o segurança para resguardar essa mãe. Eu não tenho como apartar uma briga! Teve uma mãe que bateu num guarda, então, chamam a assistente social. Poxa vida, nem o guarda conseguiu resolver? (DÁLIA).

O trabalho em equipe merece ser refletido e as atribuições do assistente

social precisar ser explicitadas e divulgadas para os outros profissionais da saúde,

esta é uma das principais ações de articulação dos assistentes sociais com a equipe

de saúde: esclarecer suas atribuições e competências (CFESS, 2010).

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Dentre os principais fatores que possibilitam a prática profissional, foram

apontadas a receptividade e integração entre a equipe do Serviço Social; a

colaboração dos gestores; o conhecimento teórico que possibilita um melhor diálogo

com o usuário e os devidos encaminhamentos, a parceria com a ONG, e a estrutura

física. Estes dois últimos aspectos facilitadores tratam-se da fala de uma profissional

que atua no CPC.

A integração entre a equipe, tanto a equipe do Serviço Social, como a interdisciplinar, a parceria com a associação, por que se a gente não tivesse pra onde encaminhar diante de tantos riscos sociais, ficaria muito difícil de você solucionar os problemas, então a parceria com a associação eu acho de uma importância muito grande! A estrutura física é muito boa, todas as condições de trabalho aqui são boas, muito boas! (AMARÍLIS).

A despeito das dificuldades e limitações já elencadas, podemos dizer que a

atuação do assistente social tem se configurado como uma experiência exitosa no

contexto do HIAS.

Das possibilidades citadas, cabe evidenciarmos a autonomia relativa exercida

pelas profissionais, haja vista, que para conquistar seus espaços, “é pelo conjunto

do trabalho realizado pelos assistentes sociais que o Serviço Social, como categoria

profissional, poderá ou não ser reconhecido, valorizado, respeitado, com vistas a

alcançar autonomia, ainda que relativa” (IAMAMOTO, 1998 apud VASCONCELOS,

2012, p. 27).

Há a autonomia profissional, não existe um autoritarismo, a nossa burocracia é mínima. O Serviço Social do Albert Sabin, ele tecnicamente é muito independente, nós temos uma independência técnica! A autonomia relativa é exercida aqui! (VIOLETA).

A velha história do poder, da autonomia, que tanto pode ser algo ruim, mas pode ser algo realmente, que ajude a abrir algumas portas, por que queiramos ou não nós temos funcionários que são muito... A questão da humanização, aqui ainda é muito complicada. Então muitas vezes quando você chega, enquanto assistente social aquela pessoa te respeita em relação a isso! (TULIPA).

Desta forma, para dar respostas satisfatórias em suas intervenções, o

trabalho da assistente social soma-se à sua relativa autonomia, que depende dos

recursos materiais, humanos, financeiros e técnicos disponibilizados pela instituição,

e da correlação de forças existente para a realização de suas ações e intervenções

profissionais.

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No contexto do HIAS, como declarado anteriormente, o Serviço Social, no

interior da unidade de saúde, mesmo sob determinadas condições objetivas,

exercita sua relativa autonomia na direção dada às suas ações, fator preponderante

para realização de seu trabalho. Estes processos que buscam romper com a

tendência da relação camuflada entre serviço social e politica social, traduzida em

ações rotineiras e burocratizadas (NOGUEIRA; MIOTO, 2013).

A maior contribuição do Serviço Social para efetivação da saúde enquanto

direito social no âmbito do HIAS está na informação e esclarecimento ao usuário, na

orientação sobre os seus direitos e deveres; no conhecimento, aprimoramento

intelectual, e no compromisso ético-político de cada profissional. Mas, sobretudo, na

busca da viabilização e concretude dos direitos, via políticas públicas, nos

encaminhamentos para rede socioassistencial.

O Serviço Social ele é primordialmente a garantia de direitos, então assim, muitas vezes, não só o usuário, mas também os outros profissionais, desconhecem os direitos do usuário, então, o Serviço Social está aqui pra lembrar e pra garantir esses direitos (ÍRIS).

Isso aí entra na particularidade do atendimento de cada uma, no compromisso individual do profissional, que deve buscar, deve firmar a questão ética, para o desempenho enquanto profissional e o perfil do profissional que deve ser seguido. As condições aparecem quando você provoca, né? Quando você persegue! Nada é de graça (VIOLETA).

Os profissionais de saúde, dentre eles, o assistente social, têm o dever de

conhecer a legislação, visto que colocam como um de seus objetivos à

democratização das informações (VASCONCELOS, 2012). Desta forma, criam-se

possibilidades de o usuário não somente conhecer os seus direitos, mas também de

não se conformar e questionar o que está posto na busca pela sua efetivação.

Informando ao usuário que ele tem direitos! Que ele tem direito a aquele serviço, que ele tem direito a perguntar ao médico qual é o problema de saúde da criança, que ele tem direito a procurar uma Secretaria de Saúde, pra ter acesso a um transporte, pra ter acesso a um encaminhamento, é orientando quanto ao direito que ele tem! Que aquela lei existe, e que ele pode cobrar! (DÁLIA).

Eu acho que ele contribui no próprio momento que a gente passa a orientar essas mães, a esclarecer, ficar mais consciente do seu papel, como mãe, como cuidadora, ela conhecer os direitos dela, isso é uma grande contribuição nossa! (GIRASSOL).

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É importante frisarmos que a democratização das informações devem

potencializar as escolhas e autonomia dos usuários; para tal, não se faz necessário

somente que o profissional tenha conhecimento das leis que asseguram os direitos,

mas que cotidianamente esses direitos sejam detalhados aos usuários nos serviços

de saúde. Assim, uma atuação que se destina a garantir a saúde como direito não

se efetiva somente na democratização das informações, mas criando possibilidades

para que os direitos sejam concretizados.

Nesse sentido, as ações socioeducativas em saúde devem ter como

intencionalidade a construção de uma nova cultura e enfatizar a participação dos

usuários no conhecimento crítico de sua realidade, objetivando a consciência

sanitária38 (CFESS, 2010).

As pesquisas sobre a prática profissional indicam a necessidade de

aprofundar o conhecimento acerca da intervenção profissional no campo da política

social, pois os inúmeros espaços sócio-ocupacionais exigem dos assistentes sociais

a apropriação do debate sobre a intervenção profissional na sua área de

conhecimento, e a necessidade de colocá-la em movimento num campo que

expressa as contradições e os interesses sociais públicos e privados (NOGUEIRA;

MIOTO, 2013).

Entre os principais desafios lançados ao assistente social frentes as refrações

da “questão social”, segundo as percepções das profissionais entrevistadas, estão a

receptividade e, principalmente, o conhecimento; outro fator considerado relevante é

a escuta qualificada ao usuário, o que torna a intervenção profissional um

diferencial. Há ainda, a preocupação com a prática, a necessidade de atualização,

do aperfeiçoamento intelectual.

[...] você ser receptiva, e conhecer! Ter conhecimento dos trâmites, dos encaminhamentos que podem ser feitos, por que você tá aqui e não conhecer os trâmites necessários, como é que você vai tá orientando esse paciente? Como é que você vai orientar os usuários, né? Aí precisa conhecer. E precisa ter calma, ter paciência, saber lidar com esse paciente, fazer uma acolhida melhor, escutar o paciente, principalmente. Por que às vezes a gente faz o diferencial por que a gente acaba escutando o paciente mais do que os outros profissionais. Os profissionais eles reclamam muito da desvalorização do Serviço Social dentro da saúde, como o assistente social é visto como um profissional que é sem cargo, que qualquer um pode fazer o serviço dele, e eu acho que cabe a nós profissionais, buscarmos as formas de fazer do Serviço Social o diferencial, pra aí sim, mostrar as todas

_____________ 38

A consciência sanitária é concebida como a tomada de consciência de que a saúde é um direito da pessoa e um direito da comunidade (CFESS, 2010, p. 53).

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as profissões o quanto nós somos necessários e essenciais. Por que quando você consegue fazer um trabalho diferenciado, você consegue dá resultado no seu trabalho, com certeza você vai ser mais bem visto, mais valorizado (ÍRIS).

Quando se refere ao Serviço Social como essencial, Íris nos fez retomar as

análises de Vasconcelos (2012). Sobre esse aspecto, a autora nos faz importantes

alertas, revelando em seus estudos que o Serviço Social é indispensável para as

unidades de saúde, que necessita de tranquilidade e normalidade em seu cotidiano,

é indispensável para os profissionais da medicina, tendo em vista que estes embora

diagnostiquem e receitem, é junto ao profissional do Serviço Social que o usuário

depara-se com a falta de recursos, de medicações, de leitos, de informações,

alimentação especial etc.

Eu acho que precisa mais assim, é, um pouco mais de envolvimento dos outros profissionais, pra gente fazer um trabalho amplo, campanhas, juntar o HEMOCE para doações de sangue, medula, um envolvimento maior! De todo mundo, sabe? (GIRASSOL).

Tem que ser um profissional criativo e propositivo. A escuta é importantíssima! A gente pode até bloquear uma pessoa, se não souber escutar, o pré-julgamento, por que se julga a pessoa antes de ouvir a história, às vezes dá até a solução para o caso, mas não era aquilo! A gente cansa de escutar, o pré-julgamento acontecer, e ele não conseguir verbalizar o seu pensamento por que faltou a técnica da escuta, que é importantíssima! (VIOLETA).

Portanto, a atuação do assistente social na saúde deve ser pautada num

conjunto de ações que possibilite o atendimento efetivo das refrações da “questão

social” que refletem na saúde.

Acredito que passa pela minha atualização, na questão das leis, da minha capacidade de estudar sempre, de tá atenta, tanto as demandas, e aquilo que eu não conheço, eu ir em busca do conhecimento! E também, interagindo com os diversos saberes, por que se eu não souber o que é determinado serviço, como é que eu vou fazer meu trabalho? Eu tenho que está conhecendo sempre o meu cenário de prática! (TULIPA).

A gente estar mais a par do câncer e das inovações, eu acho que a gente precisaria muito disso, a gente participa de congressos, mas acho que ainda há a necessidade de nós no apropriarmos ainda mais de algumas coisas, das inovações (AMARÍLIS).

Esta intervenção profissional seria realizada por meio de ações

complementares e indissociáveis, que apresentem a dimensão de totalidade e

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suspensão do imediaticidade na análise dos determinantes sociais da saúde dos

usuários.

No que tange ao Projeto Ético-político do Serviço Social, sabemos que este

contempla a indissociabilidade das dimensões teórico-metodológica, ético-política e

técnico-operativa, e que uma especificidade dada pelo seu objeto de intervenção

profissional são as expressões da “questão social” já debatidas nesse estudo. O

trabalho do assistente social no campo da saúde requer a explicitação das

mediações necessárias para que o profissional possa decidir sobre sua prática.

(NOGUEIRA; MIOTO, 2013).

Matos (2013) acredita que o Serviço Social é uma profissão especial, uma vez

que trabalha com inúmeras problemáticas trazidas pelos usuários, expressões vivas

de que a “questão social” existe e permanece inalterada, sendo cada vez mais

agudizadas no âmbito da saúde.

Por conseguinte, coloca-se ao assistente social o desafio de explicitar as

particularidades de seu exercício profissional, sem com isso dissociar que a razão

de ser da profissão são as múltiplas expressões da “questão social”.

Em linhas gerais, a apreensão da função social da profissão na divisão social

e técnica do trabalho, que na saúde passa pela compreensão dos determinantes

sociais, econômicos e culturais que interferem no processo saúde-doença, é

imprescindível ao enfrentamento destas questões.

Compreendemos que é esta a especificidade profissional, o que possibilita ao

assistente Social em suas intervenções no campo da saúde ter, mediante sua

formação, uma leitura abrangente da realidade social e da instituição na qual está

inserido, competências que o diferencia dos demais profissionais.

É imprescindível destacarmos a relevância do compromisso das profissionais

do Serviço Social com a viabilização e efetivação dos direitos dos usuários, e da

busca constante pelo conhecimento e aperfeiçoamento teórico-metodológico,

técnico-operativo e ético-político, que constituem as dimensões da profissão do

assistente social, e que possibilitam a realização dos devidos encaminhamentos à

rede sócio assistencial para consolidação dos direitos sociais.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os avanços na Constituição Federal de 1988 e a promulgação da LOS se

configuram como um marco na política de saúde brasileira, instituindo

transformações significativas, trazendo um novo conceito de saúde ao inscrevê-la

como direito de todos e dever do Estado, mediante a implementação do SUS,

conquista política de cidadania na história da sociedade brasileira através das lutas

do Movimento de Reforma Sanitária e da sociedade civil.

Sabemos que o cenário atual é bastante adverso para a concretização do

SUS, considerando que o projeto neoliberal tem priorizado a mercantilização da

saúde, gerando uma desmontagem dos direitos constitucionais, e o enfrentamento à

“questão social” tem se dado por meio de políticas fragmentadas e ações

refilantropizadoras.

Ao capital interessa uma prática profissional dos assistentes sociais e dos

demais trabalhadores sociais que controle e minimize os efeitos e disfarce as

conseqüências geradas por sua forma de exploração dos homens – a “questão

social” (VASCONCELOS, 2012, p. 448). Em outras palavras, a prática profissional

deverá se voltar aos interesses do sistema, sem, contudo, deixar de alimentar o

processo de alienação dos trabalhadores.

Entretanto, faz-se indispensável reafirmarmos que a garantia dos direitos

sociais e a efetivação da política de saúde passam também pela mobilização dos

cidadãos, usuários dos serviços, tanto na manutenção e consolidação quanto na

ampliação de seus direitos.

Conforme já debatido no decorrer deste estudo, a saúde reflete diferentes

expressões da “questão social”, para parcela significativa da população, pois na

maioria das vezes, o processo de adoecimento é manifestado pelas precárias

condições de vida da população, com ênfase nos determinantes sociais, há ainda as

dificuldades no acesso aos serviços de saúde e falta de efetividade das políticas

públicas.

Para avançar na delimitação das atribuições e competências dos assistentes

sociais, torna-se necessário considerar as expressões específicas da “questão

social” que desafiam a pesquisa concreta de situações concretas (CFESS, 2010, p.

66).

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Entendemos que o Serviço Social é uma profissão construída a partir das

condições objetivas de trabalho, e pela capacidade de desvelar criticamente a

realidade dos usuários, assim, tais problemáticas exigem diretamente a atuação do

assistente social, como profissão de caráter eminentemente interventivo, tendo em

vista que a atual conjuntura reconfiguram e agudizam as expressões da “questão

social” através de novas demandas, exigindo uma postura político-profissional

comprometida com o acesso à saúde pública de qualidade e a garantia dos direitos

sociais que a permeiam.

Não há como ter como objeto a “questão social” sem considerar a questão

saúde, que traz presente, de maneira cabal, os fatores econômicos, políticos,

ideológicos e culturais nas suas interrelações (VASCONCELOS, 2012, p. 92).

O presente trabalho teve como objetivo compreender a atuação do assistente

social frente às múltiplas expressões da “questão social” no âmbito da saúde, tendo

como resultado a evidenciação das mais variadas formas nas quais se materializa a

“questão social” no cenário estudado, resultantes das desigualdades sociais

imanentes ao sistema vigente, que resultam na ampliação da pobreza, no

desemprego, nas dificuldades de acesso à saúde; à educação; à habitação; à

assistência social, rebatendo nas questões de violência e drogadição na vida dos

usuários, demonstrando a fragilidade e a pouca efetividade das políticas públicas.

As percepções dos sujeitos sobre o enfrentamento às expressões da “questão

social” e as suas intervenções profissionais apresentaram nesse cenário algumas

limitações estruturais da política de saúde e de assistência, e aquelas institucionais,

voltadas, sobretudo, para falhas no que tange a estrutura física das instalações

ocupadas para realização do trabalho, no tocante ao comprometimento do sigilo

profissional. Todavia, as profissionais precisam se utilizar de alguns mecanismos

que venham a possibilitar a sua prática mediante as barreiras estruturais.

Mesmo com todos os entraves para a efetivação dos direitos sociais,

mediante as dificuldades apresentadas, inerentes ao sistema capitalista, que

refletem diretamente na realidade de nosso Sistema de Saúde, o assistente social

consegue realizar o seu trabalho, e alcançar resultados, na defesa dos direitos

sociais, de forma a minimizar as desigualdades e amenizar as explosivas

expressões da “questão social” em seu cotidiano, por meio das mediações e

estratégias impressas em suas ações. Destarte, inferimos que a atuação do

assistente social tem sido exitosa no contexto do HIAS, considerando a autonomia

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relativa exercida na instituição, e ao fato de pautarem suas intervenções numa visão

de totalidade, que abrange todas as esferas da vida social, econômica e cultural dos

usuários e os seus rebatimentos na saúde, entendendo que o processo saúde-

doença é resultante de variáveis políticas, econômicas, culturais e sociais das

determinações históricas.

A contribuição maior dada pelo Serviço Social para efetivação da saúde

enquanto direito social está na democratização das informações sobre os direitos

aos usuários, na busca constante da efetivação dos direitos, em uma compreensão

de que o trabalho do assistente social não deve ficar somente no caráter

emergencial e burocrático, e sim direcionar-se para uma ação socioeducativa, com

orientações que levem à reflexão e à socialização de informações, de forma a

mobilizar os usuários a lutar por seus direitos autonomamente.

Os resultados alcançados por meio das entrevistas mostraram que o

assistente social vem desenvolvendo suas práticas com os usuários, na orientação

aos direitos e encaminhamentos e viabilização do acesso aos benefícios, programas

e projetos. Numa direção voltada as necessidades sociais imediatas, as

intervenções estão focadas nas ações sócio assistenciais e socioeducativas. Assim,

há uma predominância do trabalho assistencial.

Neste trabalho, buscamos dialogar com os autores na tentativa de apresentar

os conceitos por eles estabelecidos e confrontá-los com dados reais obtidos através

de entrevistas com as assistentes sociais. Considerando a proposta inicial da

pesquisa acreditamos ter alcançado os principais objetivos: analisar a atuação do

assistente social frente às expressões da “questão social” na saúde; evidenciar

como se expressam as suas refrações e como se dá o seu enfrentamento.

Diante das considerações expostas, podemos afirmar que as nossas

indagações foram alcançadas de acordo com a pesquisa dos referenciais teóricos e

a realidade das profissionais entrevistadas, além dos procedimentos metodológicos

adotados terem sido suficientes, abrangendo toda a nossa pesquisa.

Os resultados evidenciaram que todas as assistentes sociais inseridas no

contexto de nossa pesquisa possuem uma postura política favorável ao usuário dos

serviços, e suas contribuições são demonstradas através da competência em

realizar análises abrangentes da realidade, além de possuírem o devido

conhecimento referente à rede de atendimento.

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É por isso que o assistente social é considerado um profissional capaz de

criar estratégias para o enfrentamento das desigualdades sociais, por conhecer a

realidade de maneira ampla, compreendendo a “questão social” como uma

manifestação da desigualdade capitalista, buscando desvelar a realidade numa

perspectiva teórico-crítica no seu cotidiano de trabalho.

Para tanto, retoma-se, portanto, a relevância de uma educação permanente

em saúde, pois é a capacitação possibilita ao profissional romper com a prática

rotineira, acrítica e burocrática, a qual permita aos profissionais da área que tenham

seus conhecimentos constantemente reciclados, visando ofertar à população um

serviço em saúde que seja capaz de atender às demandas sociais.

O grande desafio posto ao assistente social na saúde está na luta pela

promoção do acesso à saúde integral e de qualidade, numa intervenção profissional

realizada por meio de ações complementares e indissociáveis, que apresentem a

dimensão de totalidade e suspensão da imediaticidade na análise dos determinantes

sociais da saúde dos usuários, tendo como base o documento Parâmetros Para

Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde, bem como o Projeto de

Reforma Sanitária articulado ao Projeto Ético-Político, os profissionais do Serviço

Social podem contribuir para a defesa da saúde como um direito, para efetivação

das políticas públicas de saúde, e para a viabilização do SUS.

Para tanto, é fundamental também que haja o compromisso permanente do

Estado, da sociedade, do conjunto dos trabalhadores e de todos aqueles que

participam, trabalham e gerem o SUS, sobretudo, os seus usuários. Isto significa

compromisso com o bem comum, visando à construção de uma sociedade melhor,

mais justa e humana, proporcionando mais qualidade de vida à totalidade da

população.

A pesquisa ora apresentada representou um vasto campo de estudo, com

importantes significados políticos para a profissão, instigando-nos a dar continuidade

às investigações, na busca de cada vez mais aprofundar a temática da intervenção

profissional do assistente social frente às expressões da “questão social” na saúde.

Assim, não pretendemos esgotar o aprofundamento por esta temática, mas dar

continuidade e nossa contribuição ao tema. Com este estudo, acreditamos ter

contribuído, mesmo que minimamente, para o desenvolvimento da intervenção

profissional do assistente social na saúde.

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REFERÊNCIAS

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APÊNDICE

APÊNDICE A – ROTEIRO PARA ENTREVISTA

Dados: Nome, idade, sexo, formação/ano, tempo de instituição, setor atuante;

vínculo empregatício.

1. Qual o conceito de saúde para você?

2. Qual o conceito de questão social para você?

3. Como se expressam as refrações da questão social no espaço sócio ocupacional do HIAS e como se dá a intervenção profissional em suas formas de enfrentamento?

4. Conforme a Lei 8080/1990 (Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde), qual a viabilidade do SUS dentro do seu contexto de trabalho?

5. Como são tecidas as relações entre o Serviço Social, usuários e equipe multidisciplinar?

6. Quais os aspectos sociais que mais contribuem para o aparecimento das doenças?

7. Quais as principais atividades desenvolvidas pelo Serviço Social na unidade?

8. Como você avalia as condições das instalações que você ocupa na unidade?

9. Quais os principais limites para a realização de sua prática?

10. O que mais contribui para facilitar o cotidiano de sua prática?

11. De que maneira o Serviço Social do HIAS contribui para a efetivação da

saúde, enquanto direito social?

12. Quais os principais desafios a serem enfrentados pelo assistente social frente

às demandas materializadas nas refrações da “questão social”?

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ANEXOS

ANEXO A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Convidamos o(a) Sr(a) para participar da Pesquisa Serviço Social e Saúde:

Uma análise da intervenção profissional do assistente social frente às expressões da

questão social evidenciadas na realidade do Hospital Infantil Albert Sabin, sob a

execução dos(as) pesquisador(as) Verbena Paula Sandy (responsável) e Darlene

Serra Gomes (participante) , a qual pretende Analisar a atuação do assistente social

frente às expressões da questão social evidenciadas na realidade do Hospital Infantil

Albert Sabin – HIAS.

Sua participação é voluntária e se dará por meio de entrevista pré-elaborada,

que consiste em respostas a perguntas apresentadas ao Sr.(a) pelo pesquisador. A

entrevista será realizada no Hospital Infantil Albert Sabin – HIAS, com duração

aproximada de 30 minutos, em dia previamente marcado, de acordo com a sua

disponibilidade. Os depoimentos desta entrevista serão gravados em áudio com seu

consentimento para transcrição, posteriormente o material armazenado em

dispositivo digital será deletado em sua presença e/ou da Coordenação do Serviço

Social. Ainda com o seu consentimento, o material transcrito poderá ser utilizado

para contribuição em estudos futuros, considerando que a pesquisa constitui o

exercício profissional do assistente social.

Comprometo-me em buscar o máximo de benefícios e o mínimo de riscos,

garanto que os riscos previsíveis serão evitados, como por exemplo,

constrangimento no momento da entrevista; haverá prestação de assistência a

qualquer dano que possa resultar da participação da pessoa no estudo; tudo de

acordo com os fundamentos éticos e científicos exigidos na resolução nº 466/2012

da CNS. E o(a) Sr(a). Possui a liberdade de retirar sua permissão a qualquer

momento, seja antes ou depois da coleta de dados, independente do motivo e sem

nenhum prejuízo a sua pessoa e nem ao seu exercício na Instituição.

Se você aceitar participar, estará contribuindo para a construção do saber

como parte constituinte da profissão do assistente social, bem como para

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demonstrar a relevância da atuação do profissional de Serviço Social na esfera da

saúde no âmbito do HIAS.

Ressaltamos que tem o direito de ser mantido(a) atualizado(a) sobre os

resultados parciais da pesquisa. Esclarecemos que, ao concluir a pesquisa, será

comunicado dos resultados finais. Não há despesas pessoais para o(a) participante

em qualquer fase do estudo. Também não há compensação financeira relacionada à

sua participação.

Os pesquisadores assumem o compromisso de utilizar os dados somente

para esta pesquisa. Os resultados da pesquisa serão analisados e publicados, mas

sua identidade não será divulgada, sendo guardada em sigilo. Em qualquer etapa do

estudo, poderá contatar os pesquisadores para esclarecimento de dúvidas ou para

retirar o consentimento de utilização dos dados coletados com a entrevista: Verbena

Paula Sandy, fone: (85) 8970-6736 e Darlene Serra Gomes, pelo fone: (85) 8803-

7910.

Caso tenha alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa

também pode entrar em contato com o Centro de Estudos do Hospital Infantil Albert

Sabin – HIAS, localizado na Rua Tertuliano Sales, 544 – Vila União Fortaleza/CE.

Fone: (85) 3101-4212. E-mail: [email protected]

Data: ___/ ____/ _____

________________________________

Assinatura do participante

________________________________

Assinatura do Pesquisador Responsável