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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE JORNALISMO CECILIA LORENA DE OLIVEIRA PINHEIRO A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DA MULHER A PARTIR DA ANÁLISE DAS MÚSICAS DA BANDA GAROTA SAFADA FORTALEZA/CE 2013

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE JORNALISMO

CECILIA LORENA DE OLIVEIRA PINHEIRO

A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DA MULHER

A PARTIR DA ANÁLISE DAS MÚSICAS DA BANDA GAROTA SAFADA

FORTALEZA/CE

2013

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CECILIA LORENA DE OLIVERIA PINHEIRO

A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DA MULHER

A PARTIR DA ANÁLISE DAS MÚSICAS DA BANDA GAROTA SAFADA

Monografia submetida à aprovação da coordenação do curso de Comunicação Social, com Habilitação em Jornalismo, do Centro Superior do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Graduação sob a orientação do Prof. Carlos Alberto Ferreira Junior (Carlos Perdigão).

FORTALEZA/CE

2013

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Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274

P654c Pinheiro, Cecilia Lorena de Oliveira

A construção da imagem da mulher a partir da análise das

músicas da banda garota safada / Cecilia Lorena de Oliveira

Pinheiro. – 2013.

55f. Il. Orientador: Prof°. Carlos Alberto Ferreira Junior.

Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Comunicação Social com Habilitação em

Jornalismo, 2013.

1. Imagem da mulher. 2. Forró eletrônico. 3. Música - letra.

I Freitas, Márcia Maria Machado. II. Título

CDU 396:784.4

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Aos meus pais, que sempre acreditaram em mim. Ao meu avô, que partiu sem me ver graduada, mas que sempre me chamou carinhosamente de “jornalista”.

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AGRADECIMENTOS

A Deus acima de tudo, pois nunca desistiu de mim e nem descuidou das minhas aflições.

A Nossa Senhora de Fátima e Nossa Senhora da Conceição, constantes intercessoras e

compadecidas dos meus pedidos.

Ao Carmelo Sagrado Coração de Jesus e Madre Tereza, em especial à Irmã Maria Tereza

de Santo Agostinho (Dandinha), minha tia, pelas orações e entregas diárias da minha vida a

Deus.

Aos meus pais, Rejane e Francisco, de quem recebi o dom mais precioso do universo: a

vida. Vocês são os protagonistas deste momento inesquecível. Serão eternamente

lembrados como exemplos de sabedoria e esperança de futuro, pelo esforço contínuo para

que tudo fosse possível, pelas dificuldades enfrentadas e pela confiança depositada em

mim.

Ao meu amor e futuro marido Felipe, pela paciência, força, carinho, dedicação e

companheirismo!

À tia Lindete, minha “patroa” de coração enorme e bondade constante, que me dispensou

de um expediente de trabalho para que eu pudesse me dedicar a este estudo.

Ao profº. Dellano, pela compreensão e sinceridade com que me conduziu nesta fase da

minha vida acadêmica.

As minhas amigas, Ivila, Kamila, Camylla e Ruthany, que nunca deixaram de me ouvir, me

acalmar e alegrar nos momentos tensos.

E finalmente, mas não menos importante (pelo contrário), agradeço imensamente ao meu

professor-orientador, Carlinhos Perdigão, por sua extraordinária dedicação, compreensão e

paciência. Sem seu incentivo não conseguiria chegar tão longe. Muito obrigada mesmo, de

coração.

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RESUMO

Presente no cotidiano das sociedades, a música serve como instrumento de entretenimento e também como potente formadora de opinião dos que fazem parte de uma sociedade, contribuindo para identificação e solidificação de conceitos, ideias e crenças, através da memorização de conteúdos das letras nelas presentes (FERREIRA apud RODRIGUES, 2010 p. 7). Nessa perspectiva, esta monografia tem como objeto de estudo o gênero musical conhecido como “forró”, que atualmente é um dos estilos musicais mais tocados nas rádios e televisões do Nordeste. Uma de suas ramificações é o forró eletrônico surgido nos anos 90, que é caracterizado por utilizar instrumentos como guitarra, teclado, baixo, saxofone e bateria. A linguagem deste forró é estilizada, eletrizante e visual, com muito brilho e iluminação. A mulher - atuando como cantora e dançarina - está sempre presente nessa vertente do forró, desde os nomes das bandas às letras das músicas, e também pela composição dos grupos. Assim, este estudo visa analisar a representação feminina presente nas letras da banda Garota Safada, conjunto formado há aproximadamente 12 anos e que apresenta em suas canções constantes menções à figura feminina representada como objeto sexual e submissa aos desejos masculinos. Esta pesquisa espera contribuir para uma melhor análise crítica das músicas que escutamos em nosso cotidiano e para a discussão dos valores femininos expostos nas composições do forró eletrônico. Palavra-chave: Imagem da mulher. Forró Eletrônico. Letras de Música.

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ABSTRACT

Present in everyday societies, music serves as a means of entertainment as well as forming strong opinions from being part of a society, contributing to identification and solidification of concepts, ideas and beliefs through memorizing content of these letters in them (FERREIRA apud RODRIGUES, 2010 p. 7). This monograph has as its subject matter the musical genre known as "forró", which is currently one of the most musical styles played on radio and television stations in the Northeast. One of its branches is the electronic forró emerged in the 90s, which is characterized by using electronic instruments such as guitar, keyboard, bass, saxophone and drums. The language of this forró is stylized, exciting and visual, and lighting too bright. The woman - acting as a singer and dancer - is always present in this part of forró, since the names of the bands lyrics, and also by the composition of the groups. This study aims to analyze the representation of women in this band's lyrics Naughty Girl. This group was formed about 12 years ago and has in his songs contained references to the female figure depicted as sexual objects and submissive to male desires. This research hopes to contribute to a better critical analysis of the music we hear in our day-to-day and to the discussion of feminine values exposed in the compositions of electronic forró. Keyword: Woman picture. Electronic Forró.Music Lyrics.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................... .. 7

CAPÍTULO 1 - RELAÇÕES ENTRE CULTURA E ARTE ........................ . 11

1.1 A função pública da arte e do artista......................................................... 14

1.2 O cenário cultural brasileiro e nordestino no século XX............................ 18

CAPÍTULO 2 - FORRÓ: O RÍTMO DO NORDESTE ............................... 25

2.1 Definição e gênero.................................................................................... 25

2.2 Forró eletrônico......................................................................................... 29

2.3 A música e as relações de gênero: a representação da mulher nas

produções culturais ontem e hoje ......................................................................... 32

CAPÍTULO 3 - A BANDA GAROTA SAFADA ....................................... 34

3.1 História...................................................................................................... 34

3.2 A Garota Safada e o mercado fonográfico atual....................................... 36

3.3 Análise das letras com ênfase na construção da imagem da mulher ............. 40

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................. 45

AXEXOS ............................................................................................... 48

REFERÊNCIAS .................................................................................... 53

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INTRODUÇÃO

O forró é o gênero musical que mais representou e representa o cotidiano

do nordestino. Ele é considerado a “expressão da identidade sociocultural” desse

povo (SILVA, 2003).

Diante disso, e da condição de nordestina que sou, tomei-me a pesquisar

mais profundamente esse ritmo genuinamente nordestino e suas ramificações, mais

especificamente o forró eletrônico, aqui representado pela Banda Garota Safada.

Este estudo tem como objetivo principal analisar a maneira com que a

figura feminina está presente e é construída nas músicas da banda supracitada.

Considero este tema importante, haja vista o impacto que este forró industrializado

causa nas suas relações com o público e com a mídia. Particularmente, optei por

esse tema não só por também ser mulher e gostar desse gênero musical, mas para,

através da análise das letras, instigar reflexões acerca dessa problemática.

Será utilizada a metodologia da Análise do Discurso (AD) da linha

francesa, que surgiu nos anos de 1960 com o intuito de analisar questões

discursivas e suas representações políticas, sociais, ideológicas e culturais no

mundo concreto. Como sustenta Fernandes:

Discurso implica uma exterioridade à língua, encontra-se no social e envolve questões de natureza não estritamente linguística. Referimo-nos a aspectos sociais e ideológicos impregnados nas palavras quando elas são pronunciadas. (FERNANDES, 2007, p. 18)

Esses aspectos são fundamentais para o desenvolvimento das análises

críticas acerca das canções do conjunto em foco, e que estão presentes neste

estudo, que trabalha com o significado social e humano dessas letras.

Ainda sobre a AD, Eni Orlandi, em uma declaração bem pessoal, diz que

a interpretação feita pela Análise do Discurso “é uma questão da língua e do

sentido”. (ORLANDI, 2004, p. 149)

A autora vai além ao declarar sua posição a esse respeito:

(...) análise de discurso teoriza a interpretação no sentido forte, ou seja, ela interroga a interpretação. (...) para a análise do discurso, a língua (...) se inscreve na história para significar. (p. 149)

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Por sua vez, os autores explorados neste estudo remetem a Felipe Trotta,

Expedito Leandro Silva, Teixeira Coelho, Lúcia Santaella, Bárbara Freitag, Nicolau

Sevcenko, Mariza Veloso e Angélica Madeira. Igualmente esta pesquisa destaca os

estudos realizados por Theodor Adorno e Horkeimer, filósofos que instituíram a

teoria da Indústria Cultural. Todos os citados contribuíram com as perspectivas

desta monografia.

Na primeira parte do trabalho, este estudo considera pertinente discutir

as relações entre cultura e arte e suas problemáticas, incluindo a definição e os

parâmetros da indústria cultural, cultura de massa e manifestações culturais. Nesse

contexto, foi analisada também a função pública da arte e do artista. O primeiro

capítulo descreve também o cenário cultural do Brasil e do Nordeste no século XX,

ressaltando a música como um importante instrumento de expressão de opiniões, de

entretenimento e de socialização.

Por sua vez, a segunda parte da pesquisa mostra o forró como principal

manifestação cultural do povo nordestino. Instituído por Luiz Gonzaga na década de

40, o forró era inicialmente chamado de “baião” e sempre tinha no enredo a

descrição da vida simples e sofrida do sertão e do sertanejo. Com o passar dos anos

surgiram várias ramificações do gênero, como o forró tradicional e o forró pé-de-

serra. Mas foi a partir da década de 90 que este estilo ganhou uma roupagem

diferente de todas as outras. Foram associados a ele instrumentos de sopro,

teclado, bateria e guitarra. Assim nasceu o chamado “forró eletrônico”, o qual tem

como uma das principais características canções que exploram assuntos como

festas, bebidas, ostentação, prazer e mulheres, fugindo - ainda que não totalmente -

do enredo inicial valorizado por Luiz Gonzaga. Observe-se o que sustenta Braga:

O forró eletrônico tem como uma das principais características “alusões explícitas ao consumo de bebidas alcoólicas, ao sexo, às relações amorosas (estáveis e instáveis), à beleza física e ao dinheiro” (BRAGA, 2011).

No final deste capítulo, esta pesquisa procura expor parte da trajetória da

figura feminina nas produções culturais até os dias atuais, destacando nomes que

marcaram a história da música brasileira.

A seguir, no terceiro capítulo, será explorada a história da Banda Garota

Safada: como tudo começou, as dificuldades e a ascensão do grupo que já está há

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mais de uma década presente no mercado fonográfico, não só do Nordeste, mas de

todo o Brasil. Ainda sobre esse mercado, nessa etapa do trabalho será possível

observar que a banda encontra-se atualmente em um lugar privilegiado no “ranking”

dos grupos mais bem pagos do país, e que reúnem um público fiel a cada

espetáculo, sempre lotado e repleto de canções com apologia ao sexo, à bebida e à

ostentação.

Outro aspecto existente nas letras de algumas das músicas da banda em

questão, que é o foco principal deste estudo, é a coisificação da mulher. A figura

feminina é tratada com desprezo e seu corpo passa a ser um objeto de desejo e

prazer do homem, exclusivamente. Nessa perspectiva: ela deve ser submissa e

estar sempre à disposição da figura masculina. Em outras palavras, sugere-se -

através de uma leitura interpretativa inclusive histórica - a presença de conceitos

relacionados ao “machismo”.

Diante de quadros como esse, é pertinente ressaltar o que Orlandi

assegura:

(...) não há sentido sem interpretação, e a interpretação é um excelente observatório para se trabalhar a relação historicamente determinada do sujeito com os sentidos, em um processo em que intervém o imaginário e que se desenvolve em determinadas situações sociais. (ORLANDI, 2004, p. 147)

Desta maneira, buscou-se analisar o discurso de algumas das letras da

Garota Safada. São elas: Ei Gatinha, Trenzinho da Sacanagem, Vida de PlayBoy,

Eu sou o Rei do Cabaré e Sou Safado. Vale ressaltar que a escolha das músicas foi

feita de acordo com a gravidade das expressões utilizadas nas mesmas. Portanto,

este estudo não seguiu ordens cronológicas de gravação, até porque este não é o

objetivo. As letras completas das músicas, por sua vez, estão presentes na parte de

anexos desta monografia.

As considerações finais deste trabalho monográfico buscam analisar até

que ponto as letras de tais músicas fazem com que violência contra a mulher seja

potencializada, além de enfatizar a ideologia mercadológica presente na produção

discursiva e divulgação de grupos musicais e das canções em foco.

Sobre tal contexto a Análise do Discurso vem dizer que:

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determinados grupos agenciam suas ideias e procuram apreender o mundo tendo como ponto de referência os conceitos centrais que elaboraram. No entanto é necessário perceber que todo discurso se estrutura a partir de uma posição determinada, as pessoas falam sempre de algum lugar. Essas situações concretas que dão base material à linguagem não são exteriores ao discurso, mas se insinuam em seu interior e passam muitas vezes a estruturá-lo e constituí-lo. (ORTIZ, 1994, p. 67)

Também estão presentes na etapa conclusiva deste estudo

considerações sobre a função atual do artista na produção e divulgação do trabalho

das bandas de forró como a Garota Safada. Neste entorno, é possível observar que

o ritmo antes conhecido como uma das formas de identificação do povo nordestino

se transformou em constantes apologias ao sexo e a festas, deixando de lado as

possíveis contribuições culturais que essa manifestação artística poderia passar aos

que a apreciam.

Vale ressaltar que tal assunto não se esgota neste trabalho, e que cabe à

sociedade refletir sobre a maneira pelo qual a mulher é narrada na música

nordestina, mais especificamente. Ainda no tocante à violência verbal sofrida pelo

público feminino, considero fundamental que os meios de comunicação colaborem

com essa reflexão. Tais contribuições podem ser feitas através de pesquisas de

campo e divulgação dos resultados alcançados, assim como neste estudo.

Na conclusão desta introdução, convém destacar que estão expostas nos

anexos desta monografia as capas dos CD‟s oficiais da Banda Garota Safada em

ordem de lançamento.

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Capítulo 1 - As Relações entre Cultura e Arte

É relevante para este estudo monográfico que, em torno do processo de

análise de algumas das músicas da banda Garota Safada e a representatividade da

construção da imagem da mulher nelas presente, seja realizada uma discussão

elucidatória sobre cultura e arte e suas atribuições dentro de uma sociedade

humana.

Neste contexto, torna-se importante perceber a cultura como uma forma

de reconhecimento de um povo, partindo do pressuposto de que ao nascermos ela

nos é apresentada como um modo de vida já pré-determinado por nossos

antepassados. Nessa perspectiva, Edward Tylor (apud Laraia, 2001 p. 28) conceitua

cultura como sendo “todo comportamento aprendido, tudo aquilo que independe de

uma transmissão genética”.

A arte também está inserida neste quadro a partir do momento que

também nos são ensinadas maneiras de expressarmos o que pensamos. Essas

expressões recebem o nome de manifestações artísticas ou manifestações culturais.

Segundo Roger Bastide (apud Caldas, 1979), “cada grupo tende a se separar dos

outros por caracteres que lhes são próprios, costumes, gírias, vestimentas – a arte é

também umas dessas manifestações”.

As manifestações culturais podem ser entendidas como a forma que cada

povo encontra para transmitir a sua cultura (SILVA, 2003, p. 22). Bruno Brito (2004)

confirma, porém é mais detalhista e explica que as manifestações culturais

“identificam e representam” um determinado “povo ou nação, cada um com suas

determinadas particularidades e princípios”.

Essas manifestações - com o passar dos anos - adquiriram valores

estéticos e mercadológicos tendo em vista a lógica capitalista das sociedades

contemporâneas de incentivar o consumo. Assim, a cultura e a arte passaram a ser

consideradas mercadorias e começaram a ser comercializadas de acordo com o seu

valor de troca, e não seu valor cultural. Esse fenômeno foi intitulado por filósofos

frankfurtianos como “indústria cultural”.

Theodor W. Adorno e Max Horkheimer observaram que existia (e ainda

existe) um “monopólio” quando se fala em cultura de massa, sempre idêntica,

segundo observaram. Para eles isso caracteriza a indústria cultural, pois ela causa a

“padronização”, ”produção em série” e transforma a arte em produtos

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mercadologicamente rentáveis e - ao mesmo tempo - isentos de promover o

crescimento cultural, crítico e intelectual do homem.

A indústria cultural é a integração deliberada, a partir do alto, de seus consumidores. Ela força a união dos domínios, separados a milênios, a arte superior e da arte inferior. Com prejuízos de ambos (ADORNO apud OLIVEIRA, 2010, p. 14).

Sobre tal conjuntura, Bárbara Freitag explica que:

a “indústria cultural” é a forma pela qual a produção artística e cultural é organizada no contexto das relações capitalistas de produção, lançada no mercado e por este consumida. (...) Este deixa de ter o caráter único, singular, deixa de ser expressão de genialidade, do sofrimento, da angústia de um produtor (artista, poeta, escritor) para ser um bem de consumo coletivo, destinado desde o início à venda, sendo avaliado segundo a sua lucratividade ou aceitação no mercado (...). (FREITAG, 1994, p.72)

Em tal afirmação, podemos depreender que a aceitação no mercado de

um produto está relacionada com a questão da “ideologia do consumo”, sendo esta

expressão explicada por Sérgio Telles (2008) como a promessa da felicidade que se

encontra “através da aquisição de uma mercadoria”.

Fábio Luiz Tezini Crocco (2011) confirma essa expressão quando diz que

essa ideologia reproduz “um movimento circular de produção e distribuição de

mercadorias”, e que o “trabalho artístico” está sempre voltado para o marketing, para

uma negociação comercial.

Obviamente que esta ideologia utiliza a música, por exemplo, para

“difundir os valores da indústria cultural”, já que ela a potencializa - como já afirmado

- em torno da lógica do mercado capitalista. Assim, o consumidor aparece como “um

ser incapaz de pensar e de agir” (SILVA, 2003, p. 27). Por sua vez, Adorno (apud

Silva, 2003) confirma tal pensamento ao declarar que “o consumidor não é rei, como

a indústria cultural gostaria de fazer crer; ele não é sujeito dessa indústria, mas seu

objeto”.

Podemos sustentar, portanto, que arte e cultura são conceitos

historicamente “cultiváveis”, com possibilidades de terem significados diferentes na

realidade. Ou seja, significados que atendem a diversos interesses humanos, sejam

eles políticos, artísticos, de mero entretenimento e/ou mercadológicos.

Potencializa esta perspectiva de compreensão em torno desses

interesses Fábio Luiz Tezini Crocco (2011) quando cita Adorno e Horkheimer:

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O entretenimento e os elementos da indústria cultural já existiam muito tempo antes dela. Agora, são tirados do alto e nivelados à altura dos tempos atuais. A indústria cultural pode se ufanar de ter levado a cabo com energia e de ter erigido em princípio a transferência muitas vezes desajeitada da arte para a esfera do consumo, de ter despido a diversão de suas ingenuidades inoportunas e de ter aperfeiçoado o feitiço das mercadorias (ADORNO & HORKHEIMER apud CROCCO, 2011, p. 06).

Portanto, a partir de tal retrato situacional, o que vemos hoje são as

produções culturais sendo comercializadas com “a função de ocupar o espaço de

lazer” da classe trabalhadora, considerada como a classe popular. Isso acarreta o

maior consumo dos produtos oferecidos, mesmo sem grande necessidade, e tal

consumo “é apresentado” para essa classe “como o caminho para realização social”

(FREITAG, 1994). Ou seja, segundo esta pesquisadora, a cultura é imposta pelos

meios de comunicação de massa, entram no dia-a-dia das “classes assalariadas” e

não lhes dão chance de formar uma reflexão crítica a respeito disso, o que importa é

somente o consumo dessas produções (1994).

É pertinente ainda afirmarmos que hoje a “indústria cultural”,

anteriormente já definida por Adorno e Horkheimer, exerce um papel forte no que diz

respeito ao consumo das produções culturais. Sendo assim, ainda segundo Bárbara

Freitag (1994), a “indústria cultural” é responsável pela:

dissolução da obra de arte, produção e reprodução de mercadorias ditas “culturais”, por sua vinculação com a moderna técnica (rádio, tevê, cinema, fotografia, imprensa, etc.) e seu consumo de massas e seu caráter de mercadoria (...). (FREITAG, 1994, p. 73)

.

Deduz-se do acima exposto que existe uma apropriação das

manifestações e das produções culturais e artísticas pela “indústria cultural”, “cujo

objetivo principal é obter sucesso e lucro” (SILVA, 2003). E nesse contexto, o artista

exerce uma função importante na comercialização das “obras de arte”: ele define o

significado da obra e o seu processo de recepção/consumo. Em outras palavras,

segundo Puterman (apud Silva, 2003), o artista “funciona como intermediário entre a

indústria e o consumidor, revestindo de sentido o consumo do produto”.

No caso da música, mais especificamente do forró, objeto de estudo

desta monografia, o artista serve como ícone dessa manifestação cultural, que hoje

tem basicamente interesses mercadológicos. No entorno do forró, os grupos

musicais geralmente colocam à frente das bandas cantores carismáticos, dançarinas

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com corpos atrativos e canções com letras que remetem à vida de ostentação

financeira e à redução da figura feminina.

Tal retrato situacional sinaliza possíveis questionamentos e explicações

sobre o papel do artista nas sociedades humanas.

1.1 A função pública da arte e do artista

Quando falamos de arte, pensamos imediatamente em quadros, telas,

esculturas etc. Esquecemos que a palavra “arte” engloba outros horizontes que vão

além de obras grandiosas pintadas ou esculpidas pelo artista.

Por sua vez, no entendimento de Caldas (apud Silva, 2003, p. 30), “a arte

é uma manifestação cultural que, na sociedade capitalista, tem a incômoda função

de diferenciar as classes sociais através do consumo”.

Já para Newton Duarte (2010), a sociedade capitalista é compreendida

como aquela que é “produtora de mercadorias”. O autor vai além ao dizer que “tudo

no capitalismo se transforma em mercadoria, até o trabalho humano” (DUARTE,

2010). Essa mercadoria, na concepção de Karl Marx (apud Duarte, 2010), é tudo

que tem “seu valor de uso e seu valor de troca”, inclusive a “atividade humana”.

Deste modo, Duarte (2010) explica que:

O trabalhador é obrigado, portanto, pela sociedade capitalista, a vender sua própria atividade, a vender a única fonte de humanização, que é a atividade humana, em troca de dinheiro. E o que o trabalhador compra com o dinheiro obtido por essa venda? Os produtos dos quais necessita para sobreviver e os produtos dos quais necessita porque as relações sociais capitalistas nele produziram necessidades que o tornam escravo dos produtos, ao invés de esses produtos serem meios de desenvolvimento e realização da personalidade de cada ser humano. (DUARTE, 2010, p. 79).

Diante disso, podemos refletir sobre qual posição os artistas devem tomar

diante de tal situação. Segundo Silva (2003), o artista deve “estar mais atento ao

papel da arte na sociedade”. Assim como ele [artista] deve “estar mais ciente da sua

posição: sua função lúdica e de entretenimento, mas também de desempenhar o

papel de agente cultural”, e não só em vender o seu produto, a sua arte.

Nesse contexto, filósofos como Karl Marx possuíam uma concepção

socialista sobre a arte e seu papel dentro de uma sociedade. Marx (apud Bay, 2006)

entendia a arte como “um reflexo da realidade social e também como uma forma de

conhecimento capaz de interagir nela, com o poder de modificá-la”. Já Sigmund

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Freud (apud Bay, 2006), afirmava que a arte tem o papel social de intermediar. Para

ele a arte era um fator determinante de adaptação do indivíduo à sociedade.

Ainda segundo Freud (apud Bay 2006), a arte:

(...) teria o poder de liberar o artista de suas fantasias, permitindo-lhe exorcizar os fantasmas interiores, canalizando-os para a obra, num processo catártico e terapêutico. Desta maneira entendeu que o ponto inicial de criação era a própria vida do artista, a qual determinaria a temática, o estilo e toda forma plástica, de tal maneira que a obra poderia ser vista como um substituto das fantasias geradas pelo seu inconsciente. (FREUD apud Bay, 2006 p. 07).

Por sua vez, para os autores contemporâneos, a arte também ocupa

papéis importantes na vida do ser humano e nas relações em sociedade. Em torno

desse aspecto, a blogueira Elma Carneiro (2009) postou em sua página eletrônica

trechos do escritor Armindo Trevisan em que ele descreve a função social da arte:

A função social da arte é a busca solitária (até certo ponto) do artista que declara lealdade a si mesmo, e a tudo o que é humano. (...) É não arredar pé do humano, não abrir mão dos direitos mínimos do cidadão

1.

Em contrapartida, Carneiro (2009) cita também Fernando Pessoa, em sua

declaração de que:

O artista não tem que se importar com o fim social da arte, ou, antes, com o papel da arte dentro da vida social. Preocupação é essa que compete ao sociólogo e não ao artista. O artista tem só que fazer arte. Pode, é certo, especular sobre o fim da arte na vida das sociedades, mas ao fazê-lo, não está sendo artista, mas sim sociólogo; não é um artista quem faz essa especulação, é um sociólogo simplesmente

2.

Tal conjuntura sobre o aspecto social da arte mostra que estamos em um

terreno complexo de opiniões divergentes, ao mesmo tempo em que podemos

perceber a importância que tal assunto em foco permite. De qualquer forma, esta

monografia sustenta que mesmo com a ideia de que o artista produz em favor do

bem social e público, “o sistema capitalista, a produção em grande escala” e a

“mercantilização da cultura”, já tematizados anteriormente, afetam a relação entre

ele e as pessoas interessadas, causando um afastamento, como cita Silva (2003, p.

1Disponível em: http://modernidadeartes.blogspot.com.br Acesso em: 20 abr. 2012 2Disponível em: http://modernidadeartes.blogspot.com.br Acesso em 20 abr. 2012

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32) entre “a arte (e seus fatores criativos) e o povo, ao direcionar toda a produção

para a obtenção de lucro”. Ou seja, é deixado de lado o crescimento cultural,

intelectual e o “prazer da criação artística, em atenção à necessidade de ter um

público que os prestigie e compre seus produtos” (SILVA, 2003).

Silva (2003) ressalta ainda que “a obra de arte tem o poder de envolver a

sociedade”. Este autor também faz alusão à maneira de como a arte era negociada

entre os que obtinham um poder aquisitivo bem confortável no Brasil da década de

60: “as obras de arte sempre estiveram ligadas a quem detinha o poder e os artistas

raramente possuíam autonomia” (SILVA, 2003, p. 34).

Lúcia Santaella (1995, p. 17) confirma essa perspectiva ao ressaltar que

“os produtos artísticos sempre estiveram e continuam estando sob o poder e para o

usufruto das classes privilegiadas e opressoras”. Porém, a autora destaca um trecho

do pensamento de Augusto Boal (1979) em que ele observa:

A cultura é produzida pela sociedade e, portanto, uma sociedade dividida em classes produzirá uma cultura dividida. (...) As classes dominantes tentam instituir como cultura a „sua‟ cultura e como incultura a cultura das classes dominadas (apud, p. 85).

Tal afirmação de Boal sinaliza divisões sociais, as quais podem ser

compreendidas em torno de lógicas de consumo. Assim, esta monografia sustenta

que as pessoas, para terem acesso a algum produto cultural, precisam pagar de

alguma maneira pelo que estão adquirindo, seja de que forma for, “basta estar ligado

a um equipamento eletrônico (tevê, aparelho de som, etc) ou assistir a um

espetáculo gratuito, (...) somos todos consumidores em potencial” da arte, seja de

qual for o seguimento (SILVA, 2003).

Em confirmação a essa afirmativa, Adorno (apud Silva, 2003) explica que:

(...) no universo da indústria cultural o valor de troca assume ilusoriamente funções de valor de uso. Neste sentido, a flutuação de juízos de valor está em sintonia com a demanda da produção artística: quanto mais pasteurizados os valores estéticos, menos a possibilidade de julgamento, e a obra de arte acaba por perder a sua própria razão de ser como resultado do ato de criar. (p, 35)

Assim, em concordância com Adorno, a obra de arte se afasta de sua

concepção crítica, e passa a ser algo produzido em torno de meros escapismos,

potencializados pelo consumo capitalista. Dentro dessa lógica, começa a acontecer

uma “produção acelerada para atender o mercado” (SILVA, 2003). Diante disso, a

cultura “feita em série industrialmente” passa a ser observada apenas como um

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“produto trocável por dinheiro”, e não como “instrumento de crítica e conhecimento”

(COELHO, 1986 p. 11).

Todo esse retrato situacional provoca um fenômeno que Silva (2003)

chama de “mesmice artística”, em que ocorre uma espécie de “padronização” das

criações. Assim, o que há é um:

produto padronizado, como uma espécie de kit para montar, um tipo de pré-confecção feito para atender necessidades e gostos médios de um público que não tem tempo de questionar o que consome (COELHO, 1986 p. 11).

E é dessa maneira que a indústria cultural “se apropria” das

manifestações culturais e artísticas, moldando-as, cada uma ao seu estilo, com

formas próprias e consideradas adequadas, objetivando somente “sucesso e lucro”

(SILVA, 2003), exatamente como acontece no meio musical, mais especificamente

no forró, centro da discussão desta monografia.

Diante disso, e de acordo com essa perspectiva, podemos depreender

que a real função de parte da arte ocidental - na qual o forró midiático da banda

Garota Safada está entronizado - é entreter para lucrar, e do artista é produzir para

também lucrar. Como admiradores da arte, e dos que a produzem, boa parte dos

que a consomem (no sentido lato do termo!) não sentem tão explicitamente que

estão na verdade sendo possivelmente ludibriados pela indústria cultural e seus

artifícios envolventes em torno de uma mesmice artística, voltada praticamente à

estética do consumo dos produtos por ela oferecidos às pessoas.

Nesse sentido, torna-se lógico comentar o papel de sustentáculo

ideológico que a mídia tem em todo este processo. Obviamente que ela realiza

ações diversas no entorno desse quadro, atuando como um espaço de propagação

do mercado consumista entranhado no mundo do forró industrializado. Nesse

contexto, a mídia segue um rumo ideológico de acordo com os valores postos na

lógica de consumo deste mercado, valores relacionados com aqueles que detêm os

meios de produção. Ou seja: valores dominantes.

Conforme García Canclini (apud Dias & Rosini, 2008, p. 3):

o consumo cultural se caracteriza pela preponderância do valor simbólico de um bem ofertado pela indústria cultural sobre os seus valores de uso ou troca, ou onde pelo menos estes últimos estão subordinados à dimensão simbólica. García Canclini (apud Dias & Rosini, 2008, p. 3).

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Aprofundando tal temática, esta monografia sustenta que os valores

estéticos que as classes dominantes defendem como eternos/imutáveis e que

relacionam a arte e a cultura funcionam como uma imposição ideológica - dentro de

seu conjunto de valores - de sua suposta superioridade.

E trazendo para o forró da Banda Garota Safada: esses valores

“maquiados” são apresentados para o público como uma forma de manter viva a

cultura nordestina de fazer e dançar forró. Porém, o que vemos desde os anos 90

até hoje nos palcos são espetáculos grandiosos, nos quais a exposição de corpos e

a apelação à sexualidade feminina são os principais atrativos.

Sobre tal quadro, o jornalista Anselmo Alves (apud Trotta, 2008) publicou

no Jornal do Commercio de Recife que o forró atual vem sendo alvo de várias

críticas por conta da “explícita tematização erótica e sensual”. Felipe Trotta confirma

essa perspectiva destacando que as bandas passaram a adotar “elementos

performáticos profundamente eróticos” (TROTTA, 2009, p. 140). Segundo ele, isso

promoveu uma reviravolta no cenário do forró da região Nordeste. Essa discussão

será desenvolvida nos próximos capítulos desse estudo monográfico.

1.2 O cenário cultural brasileiro e nordestino no século XX

Quando iniciou o século XX, o Sudeste brasileiro, em especial o Rio de

Janeiro, foi considerado “centro de migrações”. Eram trabalhadores rurais que

chegavam à então capital do Brasil em busca de novas oportunidades de emprego e

de uma vida melhor.

É pertinente observar também que o número de imigrantes vindos

principalmente da Alemanha, Itália e Japão aumentou consideravelmente nas

décadas de 20, 30 e 40 devido ao “crescimento da industrialização” no Brasil. Esse

misto de povos de vários lugares do mundo tornou parte do Sudeste brasileiro -

segundo Veloso e Madeira (1999, p. 95) - no “mais complexo e fecundo caldo

formador da nossa cultura”. Ou seja, o Brasil passou a abrigar um número

expressivo de culturas diferentes, tanto nacionais quanto internacionais.

Por sua vez, Nicolau Sevcenko (2003) explica em seu livro Literatura

como Missão que o Rio de Janeiro no início do século XX atraía as atenções para si

devido aos grandes privilégios que tinha como capital da República. O autor cita que

a cidade possuía uma “economia cafeeira” aquecida, assim como o comércio. O Rio

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era feliz nas “aplicações industriais”, dona da “maior rede ferroviária” do país, da

“maior bolsa de valores”, abrigava também a “sede do Banco do Brasil”, as “grandes

casas bancárias nacionais e estrangeiras”, tinha o “15º porto do mundo em volume

de comércio”, e o maior “mercado nacional de consumo e de mão-de-obra”. Diante

disso e de vários outros atrativos, o Rio se tornou o “maior centro populacional” do

Brasil na época.

Esse aglomerado de pessoas na mesma cidade vindo de várias regiões

do país culminou em problemas típicos dos centros urbanos que crescem sem

estrutura prévia. Surgiram as epidemias de febre tifóide, amarela, varíola e várias

outras (SEVCENKO, 2003, p.41).

Mesmo assim, os migrantes não paravam de chegar. Eles se instalavam

nos imensos casarões coloniais e imperiais do centro da cidade. Esse fato não

agradou às classes dominantes e os detentores de poder, até que em meados de

1904 iniciou-se a “regeneração” do Rio de Janeiro, quando a população que vivia

nesses casarões foi obrigada a desocupar os imóveis, para que no lugar onde

moravam fossem abertas “amplas avenidas, praças e jardins, decorados com

palácios de mármore de cristal”, sempre seguindo o estilo e os costumes da Europa

(SEVCENKO, 2003, p. 43).

O modo de vida europeu tomou conta do Brasil, tanto estrutural como

culturalmente. Teixeira Coelho (2008) ressalta em seu livro A cultura e seu contrário

que a “cultura francesa surgiu como um modo civilizacional indiscutível”. Sevcenko

(2003) confirma mostrando que os “hábitos e costumes” considerados pela

“sociedade dominante” como parte de uma “sociedade tradicional” e com indícios de

cultura popular era rejeitados, pois poderiam denegrir a “imagem civilizada” de “vida

parisiense” que a burguesia impunha.

Os migrantes passaram, então, a serem vistos somente no período do

carnaval e nas festas natalinas, quando “a cultura afro-nordestina se mesclava com

as manifestações locais”. Ainda assim, havia por parte da sociedade dominante um

desagrado sob a maneira com que as classes desfavorecidas brincavam o carnaval

(SILVA, 2003).

A “versão europeia com arlequins, pierrôs e colombinas” contrastavam

com “os cordões, os batuques, as pastorinhas e as fantasias populares”. A fantasia

de índio sofreu “severas restrições”, assim como o “comportamento dos foliões” nos

cordões (SEVCENKO, 2003, p. 47).

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Entretanto, os brincantes não desistiram de celebrar o carnaval no Rio de

Janeiro. Segundo Tinhorão (apud Silva, 2003), cada grupo de migrantes tinha sua

“música própria, tradicional”, e assim conquistaram a “simpatia das classes mais

privilegiadas”, numa tentativa de “aproximar as manifestações da cultura popular às

da cultura erudita” (SILVA, 2003, p. 41).

Torna-se importante destacar que se entende como cultura popular

“qualquer manifestação cultural (dança, música, festas, literatura, folclore, arte, etc.)

em que o povo produz e participa de forma ativa” 3.

Por sua vez, em contrapartida, a cultura erudita é “aquela para pessoas

com alto nível de instrução, que possuem muito estudo, uma formação específica

sobre um determinado assunto, em especial sobre história da arte” 4.

No entorno de toda essa perspectiva, Silva considera o casamento entre

a cultura popular e a erudita uma forma de enriquecer ainda mais o carnaval carioca:

A junção do popular com o erudito proporcionou aos organizadores uma nova tarefa, que foi aprimorar os desfiles dos ranchos aos valores e conceitos modernos vigentes. Para isso contaram com a colaboração e o apoio técnico de especialistas, tais como cenógrafos, escultores e pintores. A partir da intervenção desses profissionais os carros alegóricos e o enredo musical tornaram-se mais atraentes, e uma nova estética foi proposta para satisfazer o gosto de diversas classes sociais (SILVA, 2003, p. 41).

Na música, as classes sociais menos favorecidas encontravam espaço e

tinham a oportunidade de se expressar através das canções transmitidas pelas

ondas do rádio por todo o país. Por exemplo, na época, a contribuição da cantora e

compositora Chiquinha Gonzaga foi muito importante. É o que Marcos Napolitano

explica no livro História e Música. Segundo ele, Chiquinha:

compôs polcas, tangos, peças musicais, modinhas, marcha (aliás, ela teria sido a inventora do gênero). Temperada pelo ambiente musical dos “chorões”, entre os quais era uma presença assídua, sua trajetória atravessou o século e marcou o cenário musical brasileiro até o início do século XX (NAPOLITANO, 2002, p. 31).

Ao mesmo tempo, ainda na primeira década do século XX, surgiram os

“salões, livrarias e confeitarias” que serviam de abrigo para as últimas tendências da

moda, “livros, jornais e revistas”, instigando assim estudos culturais e debate de

3Disponível em http://www.suapesquisa.com/o_que_e/cultura_popular.htmAcesso em: 16 abr. 2012 4Disponível em http://www.significados.com.br/erudito/Acesso em: 16 abr. 2012

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ideias, porém a essência desses lugares tinha sempre traços da cultura europeia

intelectual (VELOSO & MADEIRA, 1999, p. 80).

Mas a tendência europeia não perpetuou por muito tempo: na década de

20 o início da Primeira Guerra Mundial abalou a “crença da superioridade dos

padrões de conduta e dos valores europeus”. Isso fez ascender nos brasileiros a

sede de redescobrir o Brasil. A partir daí surgiram “novas instituições culturais e

outras formas de reconhecimento da cultura brasileira” (VELOSO & MADEIRA, 1999,

p.88).

Nesse sentido, foram iniciadas “convergências” políticas, culturais e

econômicas (RIDENTI, 2003, p. 135). A cultura popular era extraída do passado a

fim de “construir uma nova nação” que fosse, segundo Ridenti (2003), “moderna e

desalienada, no limite, socialista”.

Para Veloso & Madeira (2007, p. 93), os chamados “intelectuais

modernistas” foram os principais responsáveis por revolucionar “os padrões

estáticos vigentes e os cânones de interpretações de nossa cultura”.

Ampliando a análise, para alguns críticos contemporâneos o século XX foi

caracterizado pela “revolução cultural”, quando os conceitos e tendências culturais

passaram a ter uma nova roupagem, causando estranhamento em algumas pessoas

e êxtase em outras. (COSTA, 2003)

Sobre tal contexto, pensadores como Stuart Hall, Fredric Jameson, Nestor

Canclini, Beatriz Sarlo, David Harvey observaram que:

A cultura precisa ser estudada e compreendida tendo-se em conta a enorme expansão de tudo que está associado a ela, e o papel constitutivo que assumiu em todos os aspectos da vida social. (COSTA, 2003, p. 38)

Eles acreditavam que a centralização da cultura devesse acabar, pois

esta tem o poder de instituir ideias e atitudes dentro de uma sociedade; assim,

quanto mais diversificada, maior seria o seu poder de gerar opiniões. Tomaram

como exemplo a música, foco desse estudo monográfico, e explicaram que ela não

é apenas uma manifestação cultural, mas artifícios representativos, os quais

“inventam sentidos que circulam e operam nas arenas culturais”, onde cada

“significado é negociado e as hierarquias são estabelecidas” (COSTA, 2003, p. 38).

Esta monografia destaca ainda que a revolução cultural da época foi

potencializada pelo Modernismo. Assim, a Semana de Arte Moderna de 1922

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aconteceu em São Paulo, foi idealizada pelo pintor Di Cavalcanti e tinha por objetivo

divulgar as “tendências artísticas de vanguarda” que circulavam pela Europa. Porém

a elite paulista não compreendeu essa nova “forma de expressão”, pois ainda seguia

“formas estéticas europeias mais conservadoras” (GOMES, 2011, p. 01).

Mariza Veloso e Angélica Madeira (1999) consideram que esse

acontecimento “foi o resultado de um desejo coletivo de tornar visíveis as novas

ideias que inquietavam a intelligentsia brasileira”. Além disso, os criadores do evento

queriam promover e “organizar instituições artísticas, científicas e pedagógicas” com

o intuito de “divulgar todas as manifestações da cultura brasileira” (VELOSO &

MADEIRA, 1999 p. 89-90).

Por sua vez, nos anos 30, os intelectuais ligados ao movimento

modernista sentiram a necessidade de produzir o que Veloso e Madeira (1999)

chamam de “retratos do Brasil”: imagens que tinham o intuito de descobrir e divulgar

a cultura do nosso país.

Assim, os chamados “criadores culturais” passaram a viajar pelo interior

do país a fim de conhecer “manifestações artísticas”, “suas etnografias, histórias, os

ritos, os contos e as danças” espalhadas pelo território nacional (VELOSO &

MADEIRA, 1999, p.91).

Ainda segundo as autoras, essas pesquisas proporcionaram

uma releitura crítica de nossas tradições, identificando traços recorrentes, alguns que deveriam ser afirmados - como o nosso patrimônio lúdico e estético - e outros a serem superados, como os arcaísmos remanescentes da tradição patriarcal. (VELOSO & MADEIRA, 1999, p.91)

Portanto, marcado o século XX pelas novas ideias do Modernismo e a

mistura de linguagens que ele preconizava, já no início dos anos de 1960 um grupo

de artistas do Teatro Arena de São Paulo procurou a União Nacional dos Estudantes

(UNE) para produzirem juntos. Segundo Ridenti, eles começaram a trabalhar em um

projeto que recebeu o apelido de CPC (Centro Popular de Cultura), cujo objetivo era

“fazer arte popular em diversas áreas, teatro, cinema, literatura, música e artes

plásticas”. O movimento deu certo e eles “percorreram os principais centros

universitários do país” expondo suas ideias e fazendo arte por onde passavam.

(RIDENTI, 2003).

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No campo musical, nessa época começou “o período da música de

protesto”, os estudantes que lideraram esses movimentos perceberam que a música

como cultura popular podia servir de “instrumento de conscientização e

transformação sociopolítica do país”, e não só como entretenimento (SILVA, 2003 p.

47).

Em torno desse conjunto de ideias e valores - mesmo que de uma forma

incipiente e intuitiva - nasceu na segunda metade dos anos 60 o movimento cultural

batizado de Tropicalismo, liderado por Gilberto Gil, Caetano Veloso, Torquato Neto,

Rogério Duprat, Tom Zé e Os Mutantes, artistas herdeiros da Bossa Nova e

vivenciadores de um mundo que estava em franca (r)evolução.

Sobre tal movimento, Carlos Basualdo (2007) afirma que:

O tropicalismo pretendera constituir-se em um mecanismo capaz de incorporar - de assimilar antropofágica e, portanto, seletivamente - a complexa totalidade da realidade cultural brasileira com o fim de desencadear um processo de transformação radical. (BASUALDO, 2007 p. 15)

O Tropicalismo foi um agente revolucionário na música popular brasileira,

entretanto o movimento atingiu outras esferas culturais como as artes plásticas,

cinema e poesia. Segundo Veloso e Madeira (1999), esse importante acontecimento

da cultura em nosso país serviu para “a valorização de nossas riquezas rítmicas,

linguísticas e visuais”. As autoras ressaltam também que o Tropicalismo instigou nos

brasileiros, principalmente nos artistas, o “desejo de assumir a cafonice nacional”

(VELOSO & MADEIRA, 1999 p. 109). Ainda na mesma perspectiva, Roberto Murcia

Moura e Affonso Romano de Sant'Anna (1998) afirmam que o movimento tropicalista

tinha como principal característica a irreverência e o “resgate do mau-gosto”.

Tal retrato situacional sugere a fundação de um campo cultural. Que, com

a chegada dos anos 70, potencializou-se e fez com que a “expansão da cultura de

massa e a ampliação dos espaços das mídias e do mercado de bens simbólicos”

ganhassem mais força no Brasil por meio da modernização das indústrias culturais e

das telecomunicações. (BORELLI, 2006, com adaptações).

E tudo isso terminou por capilarizar o mercado da música, haja vista que

nas décadas de 60 e 70 diversos festivais musicais foram efetivamente realizados

por grandes cadeias nacionais de televisão, como é o caso das Redes Record e

Globo, que transmitiam e patrocinavam tais eventos - inclusive - em horário nobre.

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Tal contexto igualmente potencializou o mercado musical, fazendo dos artistas,

cantores e bandas verdadeiros fenômenos de mídia, com altos índices de aprovação

popular.

Obviamente e como já afirmado, a entrada (e o sucesso) da televisão no

esquema aumentou a presença da música nos lares brasileiros e aqueceu bastante

o mercado publicitário e também o mundo artístico musical. Este trabalho sustenta,

na conclusão desta etapa monográfica, que tal conjuntura chega até os tempos

atuais com as produções deste forró midiático, no qual a banda Garota Safada é um

dos principais nomes.

O próximo capítulo, por sua vez, versa sobre a presença histórica do forró

no Nordeste brasileiro.

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Capítulo 2 - Forró: o ritmo do Nordeste

O forró é, sem dúvida, a manifestação cultural que mais representa a

região Nordeste. O gênero, antes conhecido como “baião” - como sustenta Felipe

Trotta, no texto Música popular, valor e identidade no forró eletrônico do Nordeste do

Brasil-, foi instituído no mercado musical nas décadas de 40 e 50 com as canções

de Luiz Gonzaga, que sempre traziam narrativas do Nordeste “baseadas na

construção simbólica do sertão e do sertanejo”, conhecidas popularmente como

“eixos de autenticidade do povo nordestino” (TROTTA, 2011, p. 01).

É possível afirmar que a temática constante nas músicas de Luiz

Gonzaga - sempre falando da vida no sertão - tinha como finalidade, além de

sucesso e prestígio, amenizar a saudade que os nordestinos tinham de sua terra

natal. O rádio desempenhou um papel determinante na divulgação dessas músicas

na “colônia nordestina” espalhada pelo o Brasil, e fez com que o forró fosse

conhecido por “outros públicos com pequeno ou nenhum contato com a cultura

popular” do Nordeste (FERRETI apud COSTA FILHO, 2010, p. 03).

Silva (2003, p. 15) confirma explicando que o forró “é uma expressão da

identidade sociocultural” dos migrantes nordestinos que escolheram –

principalmente - o Sudeste pra viver, funcionando com um “elo” de ligação com sua

terra de origem. E foi esta corrente migratória que também contribuiu para uma

“maior difusão e comercialização do forró”.

2.1 Forró: definição e gênero

O termo que dá nome a este gênero musical ainda é motivo de

controvérsias, quando se fala em sua origem, entre alguns autores. Cascudo (1988)

afirma que “forró vem da palavra forrobodó,” que tem dois significados: bagunça,

confusão e festa popular, arrasta-pé (ALFONSI, 2007, p.29).

Em contrapartida, Silva (2003), declarou em seu livro “Forró no Asfalto”,

que a palavra surgiu da expressão for all, que quer dizer “para todos”, pois no início

do século XX os trabalhadores ingleses que viviam no Nordeste realizavam bailes

dançantes abertos ao público, daí o surgimento do termo forró”. Silva (2010, p.02)

explica ainda que o forró nasceu de “influências europeias e africanas”, e que se

tornou um estilo musical com o “baião como dança e canto típico do Nordeste”.

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Também há registros que a palavra “forró” apareceu pela primeira vez em

uma música em 1949:

(...) em Forró do Mané Vito, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Surgiria então o gênero musical Forró – segundo José Calixto da Silva, há o gênero musical forró, oriundo do côco, do xaxado e do baião. (TRINDADE apud QUADROS JUNIOR, 2005, p.118).

Independente disso, Chianca (2006) considera importante enfatizar que

esse termo torna o forró “tanto o gênero musical quando a dança que o acompanha,

assim o baile onde ele será tocado/dançado: dança-se forró num forró, enquanto se

escuta um forró”. O autor destaca também que o ritmo não é mais uma

“dança/música exclusiva do São João”, pelo contrário, os eventos denominados de

forró acontecem o ano todo, arrastando muitos seguidores e sendo reconhecido

como “cultura nordestina” (CHIANCA, 2006).

Por sua vez, Trotta (2010) esclarece que o forró consolidou-se:

(...) não mais somente como uma festa, mas como um gênero da indústria cultural, tendo espaço próprio para a gravação, distribuição e vendagem de álbuns de novos cantores, instrumentalistas, compositores e conquistando assim uma expectativa de consumo.

O forró tradicional (título que conhecemos hoje), inicialmente foi chamado

de “baião”, e era um ritmo que só se ouvia nos festejos juninos. A dança era

conhecida também como arrasta-pé, bate-chinela e fodó. Também possuía

semelhanças com o toré, uma dança típica dos índios cujo passo principal era o

arrastar dos pés no chão (TROTTA, 2011). Acusticamente, o forró era acompanhado

somente pela sanfona, a zabumba e o triângulo e suas letras descreviam o “jeito de

ser do nordestino sertanejo” (TROTTA, 2011).

Não se pode falar de forró sem ressaltar o principal ícone desse gênero

tipicamente nordestino, Luiz Gonzaga. Na década de 40, o forró ficou conhecido em

todo o Brasil através dos versos dançantes do “Rei do baião”, como era

carinhosamente chamado Velho Lua (LOPES, 2007, p. 24).

Gonzaga teve o primeiro contato com a música através do “pai Januário

que tocava sanfona e consertava foles” e com sua mãe que gostava de cantar,

principalmente nas novenas no “mês de Maria” (RAMALHO apud LOPES, 2007, p.

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25). Profissionalmente, ele iniciou sua carreira artística no Rio de Janeiro, “tocando

em portas de bares e de gafieiras” em troca de dinheiro (LOPES, 2007, p. 26).

E foi durante uma dessas apresentações tímidas que um grupo de

universitários cearenses “desafiaram Luiz Gonzaga a tocar canções do seu pé-de-

serra”, de sua terra natal (LOPES, 2007, p. 26). A partir daí, com a ajuda do rádio, o

sanfoneiro conseguiu entrar no mercado musical e “demonstrar a existência de um

público consumidor” formado principalmente por “migrantes nordestinos no

Sudeste”. (FERRETI apud COSTA FILHO, 2010).

Ainda na década de 40, o forró na voz de Luiz Gonzaga “tornou-se um

sucesso musical nacional, conseguindo a simpatia e adesão de vários compositores,

intérpretes” e ouvintes de várias regiões do país. Porém, houve “resistência por

parte da classe média”, com críticas ao “sanfoneiro nordestino pelo forte sotaque

regional” (COSTA FILHO, 2010, p. 04).

E foi justamente a valorização do sertão que fez com que esse estilo

musical adentrasse no mercado. O conjunto de “sonoridade” (com ênfase para a

sanfona), o “vocabulário (jargões da linguagem regional) e imagens (chapéu de

couro, cenário do agreste, casas de barro)” passaram a servir como um “indicador

de qualidade da produção forrozeira” naquela época (TROTTA, 2011, p.07).

Já nos anos 60, este estilo musical nordestino entrou em declínio

provocado por um “boicote” das emissoras de rádio. O forró não era mais

considerado novidade, e por isso perdeu o seu lugar na programação radiofônica

para outros gêneros musicais como a Jovem Guarda (COSTA FILHO, 2010, p. 05).

Apesar das dificuldades, Leandro Expedito Silva (2003) afirma que em 1975 “a

música nordestina se consolidou no mercado brasileiro apresentado Luiz Gonzaga

como interlocutor dessa nova fase do forró”.

Historicamente, a partir dos anos 90 o forró tradicional ganhou uma nova

ramificação: forró universitário. “Fruto da junção do forró tradicional com a

musicalidade do pop e do rock”, conquistou adeptos não só no Nordeste, mas no Sul

e Sudeste do país e colocou para dançar pessoas de várias classes sociais. A partir

dessa categoria foram sendo introduzidos, timidamente, os instrumentos eletrônicos

(SILVA, 2003).

O forró universitário também é conhecido popularmente como forró pé-de-

serra, porém, segundo Antônio Carlos de Quadros Júnior (2005), o “FPS” teve

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origem na década de 40, sendo apresentado também por Luiz Gonzaga e Jackson

do Pandeiro.

Também a partir da década de 90 o forró inaugurou uma roupagem mais

“estilizada”. Assim, passaram a ser associados a ele com mais ênfase instrumentos

como teclado, bateria, metais (instrumentos de sopro) e guitarra.

Costa Filho (2010) explica que:

Até então, os instrumentos mais utilizados na execução do forró tradicional eram: sanfona, zabumba e triângulo. As letras eram, geralmente, inspiradas na vida do homem do campo e seus problemas. A dança era feita por casais sempre agarradinhos (COSTA FILHO, 2010 p. 06).

Foi a partir daí que o cearense Emanuel Gurgel teve a ideia de agregar

outros instrumentos nas bandas de forró. Sua intenção era de transformar as

músicas, fazê-las mais dançantes, modernas e que atingissem principalmente o

público jovem (COSTA FILHO, 2010, p.06).

Porém, estudiosos do assunto criticam até hoje essa transformação do

forró tradicional para o eletrônico. Silva (2010) acredita que o forró estilizado

“descaracteriza” o forró tradicional e oferece ao público que escuta “um produto sem

referência cultural e que promove a deturpação e degradação do gosto popular”. Já

para Trotta (2011), essa modernização do forró foi uma tentativa de aproximação

com o “estilo da música pop internacional”.

Por sua vez, o jornalista José Telles é categórico e firme em sua opinião

ao afirmar que:

O forró dito eletrônico (...) não é forró. Pelo contrário, prejudica o forró, porque tem público. E tem o mesmo público que teve o gosto musical embotado pelo axé music. Para este o que vale é a multidão, a turba. Podem botar um poste em cima de um caminhão em silêncio que eles vão atrás (JOSÉ TELLES, JC, 13/06/2007 apud TROTTA, 2011).

Mesmo assim, com uma estratégia de mercado inovadora, o chamado

forró eletrônico surgiu repleto de signos destinados a seduzir os ouvintes e

expectadores mais exigentes (SILVA, 2003).

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2.2 Forró eletrônico

O forró eletrônico tem como uma das principais características “alusões

explícitas ao consumo de bebidas alcoólicas, ao sexo, às relações amorosas

(estáveis e instáveis), à beleza física e ao dinheiro” (BRAGA, 2011, p. 04).

Segundo Robson Silva Braga (2011), esse estilo de forró conta com

batidas mais eletrizantes da bateria, diferenciando-se do xote, do baião, do xaxado e

do forró tradicional enraizado por Luiz Gonzaga, que tem o ritmo mais lento.

Tais novidades sinalizam mudanças: “a sonoridade da sanfona com

baixo, guitarra, teclado e bateria” começa a passar por cima da marcação da

zabumba e do triângulo (TROTTA, 2011). E com o passar do tempo - em torno

dessa nova perspectiva na composição de gênero - as referências ao “jeito matuto

do povo sertanejo e ao amor sublime” foram substituídas por letras de cunho

humorístico, amoroso e sensual (BRAGA, 2011, p. 04).

Como já citado, a ideia partiu do empresário Emanuel Gurgel, “que

pretendia revolucionar os padrões do gênero, tornando-o mais estilizado e

progressista” (TROTTA, 2011). Gurgel percebeu que os salões dos clubes ficavam

lotados quando as bandas começavam a tocar forró e decidiu investir no gênero,

“mas só que de forma renovada”. Ele queria criar “um novo jeito de produzir forró”,

com novos arranjos musicais, músicas irreverentes e batidas dançantes (COSTA

FILHO, 2010).

Essa categoria de forró foi consolidada pela Banda Mastruz com Leite,

criada pelo empresário nos anos 90. O conjunto surgiu com elementos nunca vistos

e nem escutados pelos apreciadores do forró. Além do ritmo mais eletrizante, de

cenários mais chamativos e de composições que falavam de amor e de

sensualidade, “pela primeira vez no Brasil um conjunto musical citava seu próprio

nome no decorrer de cada canção”. Era uma estratégia de identificação e de venda

do nome da banda (COSTA FILHO, 2010, p. 6-7).

A primeira música a fazer sucesso do Mastruz com Leite foi “Meu

vaqueiro meu peão” (CD Vol. 02 – Só pra chamegar) que ainda trazia em suas

estrofes referências ao homem valente e batalhador do sertão nordestino:

Já vem montado em seu alazão, chapéu de couro, laço na mão, seu belo charme me faz cantar. No seu rosto um grande lutador, que trabalha com

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calor, com toda a dedicação. Ó meu vaqueiro, meu peão, conquistou meu coração, na pista da paixão e valeu o boi...

5.

Porém os shows não faziam tanto sucesso. O fato das bandas só serem

contratadas na época das festas juninas engendrava com que as apresentações no

decorrer do ano fossem fracassadas. A solução encontrada por Gurgel foi propor à

rádio FM 93 que fossem feitas transmissões ao vivo direto das casas de forró. Foi

um sucesso (COSTA FILHO, 2010).

Para o consumidor, a entrada, no princípio, era apresentar na portaria

uma embalagem de Café Santa Clara, que estava chagando no mercado. Não

demorou e a agenda da banda Mastruz com Leite estava lotada (COSTA FILHO,

2010). As apresentações passaram a ser cada vez mais grandiosas e bem

estruturadas. Tudo passou a ser muito bem ensaiado e sincronizado (TROTTA,

2011).

A demanda começou a crescer e Emanuel Gurgel teve mais uma ideia

exitosa. Ismar Capistrano Costa Filho (2010) descreve a decisão tomada pelo

empresário:

As apresentações duravam cerca de cinco horas cada. Para suportar o desgaste dos músicos, eram escalados dois bateristas e dois sanfoneiros. Mesmo assim, estava evidente que um grupo sozinho não seria suficiente para atender as solicitações de apresentação. A solução encontrada para o problema foi criar novas bandas como Cavalo de Pau, Rabo de Saia e Balaio de Gato (COSTA FILHO, 2010, p. 07).

E assim, começaram a surgir vários conjuntos com as mesmas

características fonográficas: Limão com Mel, Brucelose, Caviar com Rapadura,

Calcinha Preta e as mais atuais Aviões do Forró e Garota Safada, entre outras,

“ocupando o topo das listas das mais tocadas nas principais rádios” do Nordeste

(TROTTA, 2011, p. 08).

Em uma matéria encomendada pela Revista Isto É em 1998, a repórter

Apoenan Rodrigues refere-se ao forró eletrônico no título da reportagem como

“Ritmo Safado”. Apoenan observou que os shows se desenvolviam em meio a muita

fumaça e gelo seco, os vocalistas se multiplicam em três “para não personalizar os

grupos”, com os nomes dos conjuntos sendo repetidos exaustivamente no meio das

canções. Afirmou ainda que “o ritmo emergente carrega nos seus versos muita

5Disponível em http://www.vagalume.com.br Acesso em: 27 fev. 2012

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safadeza e coloca à frente das suas bandas um exército de loiras tingidas, quase

todas fartas nas suas proporções” (RODRIGUES apud COSTA FILHO, 2010, p. 09).

Tal retrato situacional sugere reflexões no entorno da música e as suas

relações com o gênero feminino. Assim, esta monografia destaca a representação

da mulher nas produções culturais relacionadas ao forró, haja vista sua forte

presença nos espetáculos de tal gênero.

Sobre tal perspectiva, Silva (2003) mostra que já na década de 40

existiam mulheres que representavam o forró tradicional enraizado por Luiz

Gonzaga. Nomes como Carmélia Alves, Anastácia, Clemilda e Marinês fizeram parte

da gama de artistas que ajudaram a propagar o forró como exímio gênero musical

do Nordeste, em assunto que será desenvolvido na próxima etapa.

2.3. A música e as relações de gênero: a representação da mulher nas

produções culturais ontem e hoje

No Brasil, de maneira geral, as mulheres destacaram-se na música a

partir do século XIX com Chiquinha Gonzaga. Em palestra sobre a atuação das

mulheres na música brasileira, a professora de música Márcia Kuri6 afirmou que

Chiquinha “abriu portas para que muitas mulheres assumissem seus papéis no

cenário musical brasileiro”.

Depois desse pontapé inicial, várias mulheres surgiram no mundo da

música em diversos seguimentos, contrariando pensamentos machistas e

preconceituosos que rondavam o universo feminino.

“Elas se destacaram como cantoras, interpretes, instrumentistas, influências (no modo de vestir, comportamento, a ousadia), mas acima de tudo, se destacaram por serem mulheres e por terem a capacidade e vontade de derrubar um dilema criado pelo mundo machista, a de que „mulher é um sexo frágil‟”

7.

Mas foi cantando que as mulheres mais brilharam, e algumas mantêm o

estrelato até hoje. Além de Chiquinha Gonzaga, nomes como Ademilde Fonseca,

Maysa, Nara Leão, Emilinha Borba, Araci de Almeida, Dalva de Oliveira, Dória

6Disponível em: http://www.gcn.net.br/jornal/index.php?codigo=144138&codigo_categoria=166 Acesso em 12 jul. 2012 7Disponível em: http://wagnerlayb.blogspot.com.br/2011/02/importancia-da-mulher-para-musica.html

Acesso em: 15 jul. 2012

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Monteiro, Maria Bethânia, Gal Costa, Clara Nunes, Ana Carolina, Marisa Monte,

Cássia Eller, entre outras, sempre serão lembradas como vozes importantes e

inesquecíveis da música brasileira.

Mas não foi sempre assim. Márcio Ferreira de Souza (2006) lembra que

quando o mercado fonográfico consolidou-se no Brasil não existiam mulheres no

meio. Segundo o autor, vários fatores desencadearam numa ausência de cantoras.

Para ele

A cultura prevalecente de exclusão das mulheres do espaço público em uma época onde estas estavam associadas ao espaço privado, ao âmbito familiar e à própria música popular estava relacionada à marginalidade, considerada como atividade de malandros, boêmios, vagabundos etc. No caso específico das mulheres havia uma forte associação com a prostituição, afinal a música popular estava relacionada com a noite. Atividade que se fazia presente nos saraus, nos bailes e nos clubes noturnos. Hora de “mulher direita” estar dormindo. (SOUZA, 2006, p. 02).

Apesar disso, as mulheres não desistiram de expressar seus talentos.

Além da música, objeto deste estudo, este trabalho considera pertinente citar - como

ilustração - outros grandes nomes femininos que contribuíram para o crescimento do

cenário cultural/artístico brasileiro.

Pessoas como Ruth de Souza que, segundo o site Brasil Cultura, foi a

primeira atriz negra do cinema nacional8. Cecília Meireles, poetisa desde os nove

anos e conhecida por seus versos doces, puros e, segundo o crítico Paulo Rónai,

com “poder transfigurador”9. Tarsila do Amaral, pintora modernista e reconhecida por

utilizar em suas obras “cores vivas”, “temas sociais, cotidianos e paisagens do

Brasil”10. Raquel de Queiroz, escritora de romances, literatura infanto-juvenil, teatro e

crônicas, tornou-se a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de

Letras11. E Ana Botafogo, dançarina especializada em balé clássico, considerada há

vários anos a “primeira-dançarina do Teatro Municipal do Rio de Janeiro”. Além

disso, Botafogo foi premiada em vários países por sua leveza e desenvoltura perfeita

nos palcos12.

Assim, torna-se claro observar que a representação da mulher nas

produções culturais ontem e hoje - apesar das dificuldades nos percursos - teve um

8Disponível em http://www.brasilcultura.com.br/ Acesso em 19 jul. 2012 9Disponível em http://www.releituras.com/cmeireles_bio.asp Acesso em 19 jul. 2012 10Disponível em http://www.suapesquisa.com/biografias/tarsila_amaral.htm Acesso em 19 jul. 2012 11Disponível em http://www.releituras.com/racheldequeiroz_bio.asp Acesso em 19 jul. 2012 12Disponível em http://www.anabotafogo.com.br/quem.php Acesso em 19 jul. 2012

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embasamento - sobretudo - talentoso e relacionado a várias manifestações

artísticas. Sendo estas consideradas exitosas em diversos momentos da vida

sociocultural deste país.

É no entorno de todo este quadro ao mesmo tempo artístico e multimidiático

que a banda Garota Safada aparece, já destacando o gênero feminino em seu título,

e apondo-lhe uma expressão adjetiva relacionada à temática vulgarmente erótica.

Assim, esta monografia julga importante destacar a história deste grupo - presente

na próxima etapa deste estudo - relacionando sua atuação ao marketing e ao

mercado fonográfico.

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Capítulo 3 – A Banda Garota Safada

3.1 História

No ano de 2000, um grupo de amigos da periferia de Fortaleza - mais

precisamente no bairro da Itaoca - começou a se reunir por diversão para tocar

musicas de forró que faziam sucesso na época.

E foi em uma dessas tardes que as brincadeiras tomaram um rumo

diferente: eles passaram a pensar na formação de uma banda de forró para tocar

profissionalmente. Renato Oliveira Cordeiro, integrante da família e da banda Garota

Safada, em entrevista concedida à autora deste trabalho, relatou que os primeiros

instrumentos foram um teclado, um microfone e uma caixa de som. Afirma ainda que

com essa aparelhagem só conseguiam cantar em serestas por barzinhos do bairro.

Ainda segundo Renato, inicialmente a banda chamava-se “Tabaco

Suado”. Depois de algum tempo passou a ser Garota Safada, nome que foi

registrada e com o qual conheceram o sucesso.

Renato explicou ainda que o primeiro cantor da banda foi “Tiaguinho”, que

logo abandonou o grupo. “Ficamos sem cantor de repente e tínhamos uma agenda

pra cumprir, foi aí que o Wesley Oliveira, na época com 13 anos e dançarino da

banda, aceitou fazer um teste e deu certo”, descreveu. Wesley precisou frequentar

aulas de canto e sessões de fonoaudiologia para aprimorar a voz e permanecer

como cantor do grupo.

A banda que em principio reunia-se nas casas da família hoje tem duas

sedes em Fortaleza, ainda no bairro Itaoca, e dois escritórios, um na Aldeota, onde

está localizada a F5 Promoções, e outro em Recife, onde está situada a Luan

Promoções. Ambas as empresas prestam assessoria à Garota Safada e outras

bandas de grande porte do país.

O número de pessoas trabalhando com o conjunto rompeu os limites da

família e hoje chega a mais de 40 integrantes, entre músicos, bailarinos, produtores,

divulgadores, motoristas e assessores.

O primeiro sucesso do grupo, ainda na voz de Tiaguinho, foi a música “Eu

dei bobeira”, de autoria desconhecida.

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“Eu dei bobeira, por não ter de comido logo Por não ter te comido logo, por não ter te comido logo Eu dei bobeira, por não ter de comido logo Por não ter te comido logo, por não ter te comido logo” (CD Garota Safada – Volume 1, faixa 2)

Já o primeiro sucesso na voz de “Wesley Safadão”, como passou a ser

chamado pelas fãs, foi “Bebo porque gosto de beber”, também de autoria

desconhecida.

Daí em diante a banda lançou seis discos e dois DVD‟s oficiais. Seus

shows ganharam muita tecnologia e apresentações ousadas por parte das

dançarinas que acompanham as letras com muita sensualidade.

Sobre a média de shows, Renato Oliveira explica que varia entre 35 a 40

por mês, sendo que no mês de junho, que corresponde às festas juninas, a banda

chega a se apresentar 46 vezes. Wesley Oliveira, atual cantor da banda, em

entrevista ao Programa A Liga, da Rede Bandeirantes, contabilizou que ela faz em

média 780 shows por ano13.

Renato também enfatizou a média de público: “Em festas fechadas,

dependendo do lugar, o público chega até 18 mil pessoas, mas nosso maior público

foi em Recife, nas festas juninas: 90 mil!”.

No que diz respeito à divulgação dos shows, Renato explicou que a

banda investe em divulgação nas rádios e distribuição de CD´s que contêm dia e

local do show na capa, mas não possuem músicas oficiais para não atrapalhar na

venda dos discos. Segundo Renato, essas estratégias servem para aumentar a

“popularidade da banda” e manter o sucesso já conquistado.

De acordo com o sítio oficial da Fm 9314, uma das rádios mais populares

de Fortaleza, a banda aparece hoje em quarto lugar na lista das “mais pedidas”,

atrás apenas de dois conjuntos do gênero gospel e do grupo Aviões do Forró,

também muito conhecido pelas músicas apelativas e pelos shows que reúnem muita

gente. Já segundo a rádio Jangadeiro FM15, também uma das líderes de audiência,

a Garota Safada encontra-se em sétimo lugar.

Potencializa este quadro de sucesso sobre esta banda informações

presentes em outras páginas e sítios localizados na Internet. Por exemplo,

13Programa exibido em 21 out. 2010 14Disponível em http://www.fm93.com.br/ Acesso em 24 jul. 2012 15Disponível em http://www.jangadeiroonline.com.br/fm/ Acesso em 24 jul. 2012

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recentemente o site Palco Mp316 - que apresenta uma página de downloads de

músicas e acesso a letras e cifras - informou que a Garota Safada está em primeiro

lugar nas “mais acessadas” e nas “músicas mais baixadas”. Em torno desta

afirmação, destaca-se também que este sítio faz um levantamento nacional e não

regional. Assim, torna-se importante e lógico destacar que - para este site - dentre

todas as bandas do país, a Garota Safada está à frente em acessos e em

downloads de suas músicas.

Ultimamente o grupo vem aparecendo em alguns programas de auditório

da Rede Globo, como Domingão do Faustão, Esquenta, Caldeirão do Huck e Tevê

Xuxa. A banda também participou do programa jornalístico Profissão Repórter. O

episódio em questão mostrou os ritmos dos artistas que caíram no gosto popular17.

Ela também fez o Programa A Liga, da Rede Bandeirantes, que tratou de

nordestinos que migraram para o Sul e Sudeste do país em busca de uma vida

melhor. Neste contexto, A Liga quis mostrar o sucesso que a Garota Safada faz

nessas regiões e, sobretudo, mostrar que o público que vai aos shows é formado em

sua maioria por nordestinos que sentem saudade da sua terra natal18.

Ao ser questionado sobre o posicionamento da banda em relação à

imagem da mulher nas letras das músicas, objeto deste estudo, Renato esclareceu

que as músicas que trazem a mulher coisificada “entram no repertório, mas não são

incluídas no CD original, porque as produtoras não aceitam”. Ele considera que - nos

tempos atuais - o repertório da Garota Safada é “bem mais romântico do que

quando a banda começou”, mas enfatizou que o grupo só toca esse tipo de música

nos shows porque o público pede.

3.2 A Garota Safada e o mercado fonográfico atual

É possível observar que atualmente, não só a Garota Safada, mas

também outras bandas desse gênero musical fogem da vertente tradicional do forró.

Ao agirem nessa perspectiva, terminam por visar o sucesso e principalmente o lucro,

potencializando assim conexões com a chamada “indústria cultural”, intrinsecamente

16Disponível em http://palcomp3.com/mp3/brasil/ Acesso em 24 jul. 2012 17Episódio exibido em 10 mai. 2011. 18

Episódio exibido em 21 out. 2010.

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relacionada ao mercado - fonográfico, no caso deste trabalho - e às suas diretrizes

em torno do lucro e do escapismo.

Segundo Teixeira Coelho (1986), a indústria cultural - já destacada nesta

monografia, mas que fornece novas bases teóricas para este estudo - em seus

múltiplos eixos veicula a “realidade cultural do país”, e para isso usa elementos que

estão bem próximos das pessoas como a televisão, o rádio e a música. O autor

ressalta ainda que a indústria cultural “precisa vender seus produtos” a todo custo

(1986, p. 97).

Partindo desse pressuposto, é possível observar que as bandas de forró

eletrônico definem, através de seus empresários, “estratégias de marketing” com o

objetivo único e exclusivo de vender a marca da banda e consequentemente obter o

lucro (LIMA & SILVA, 2008).

André Luiz da Silva (2010) é bem enfático ao asseverar - em seu texto A

descaracterização do forró influenciada pela indústria cultural através das bandas de

forró - que:

Esse “sucesso” fabricado [das bandas] tem suporte através da força da mídia, através do rádio, com todos os traços do capitalismo, onde o forró, antes de uma representação da cultura nordestina, é degradado para tornar-se uma cultura mais simplificada e perecível, transformando-se num produto da indústria de diversão (SILVA, 2010, p. 7).

Teixeira Coelho (1986) confirma quando destaca que uma das funções da

indústria cultural é dar ênfase ao “divertimento em seus produtos”. Deste modo,

além de adquirir adeptos, esse fenômeno acaba por mascarar a realidade e

proporcionar a fuga dela com atrativos aparentemente inofensivos, mas que,

segundo Coelho (1986), são inimigos mortais do pensamento crítico de um

indivíduo.

Diante desta situação, o consumidor perde a autonomia e

espontaneidade, assim, é induzido a “adaptar-se ao que lhe é oferecido”. A indústria

cultural é quem “indica o que será melhor para o público”, e este acaba ludibriado a

aceitar o que lhes apresentado como o melhor (SILVA, 2003, p. 33).

Isso acontece com mais frequência na publicidade: os “consumidores de

massa”, como intitula Oliveira (2002) são “bombardeados” pelo sistema capitalista

que visa somente o “lucro monetário”, e seus idealizadores não se preocupam em

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maquiar o que querem: vender é o objetivo, e para isso é preciso inovar e chamar a

atenção do consumidor.

E foi exatamente isso que aconteceu com o forró, objeto desta pesquisa.

É pertinente observar que com sua modernização na década de 1990, as bandas

passaram a abordar em suas músicas temas como bebida, festas, mulheres e sexo,

o que atraiu as atenções principalmente do público jovem, o maior consumidor

desse gênero.

Porém, esses “estímulos eróticos” não aparecem somente nas letras das

canções, mas igualmente nas dançarinas que exibem nos palcos seus corpos

esculturais com roupas justas, curtas e coreografias que remetem a “poses

sensuais” (TROTTA, 2011, p.13). Foi uma tentativa apelativa de atrair novos

adeptos, e também de manter os que já tinham. E de acordo com os padrões destas

bandas, deu certo.

Atualmente, em consonância com os números do mercado fonográfico,

este forró midiático está em plena ascensão; e a Garota Safada contribui para essa

realidade. Além da venda de CD´s e DVDs, a banda aparece em segundo lugar no

ranking de cachês mais altos do forró da atualidade. É o que diz notícia publicada no

site Forró Dicunforça.com19.

O sítio afirma que a Garota Safada cobra cerca de 80 mil por

apresentação. E segundo ainda ele: esse valor pode aumentar, dependendo do

evento.

Este estudo entende que todo esse percurso ligado ao êxito se deve às

batidas eletrizantes do forró atual e às letras das composições, que estão sempre

abordando temas juvenis ao fazerem “apologia da festa como lugar de realização

social”, discussões amorosas e relações sexuais (TROTTA & MONTEIRO, 2008, p.

09).

A próxima etapa, portanto, pretende destacar a concretização do discurso

presente nas letras desta banda, relacionando-o à construção da imagem da mulher

por ele sugerido intencional e mercadologicamente.

19Disponível em http://www.forrodicumforca.com/noticia,avioes-tem-o-show-mais-caro-do-forro-6151

Acesso em 30 jul. 2012

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3.3 Análise das letras com ênfase na construção da imagem da mulher

É pertinente iniciar este tópico esclarecendo que as músicas de forró,

objeto deste estudo, são em sua maioria dotadas de estrofes que se repetem

exaustivamente ao longo das canções.

Destaque-se ainda que, na apreciação das letras em foco, este trabalho

utiliza como ferramenta de busca o site Vagalume, endereço eletrônico largamente

utilizado no Brasil que não apresenta em seu material presente preocupações com

pontuação ortográfica ou com um tratamento gramaticalmente eficiente da língua

portuguesa. Nesta perspectiva, este sítio possui muitas palavras fora da norma

padrão, com significados pejorativos. Além disso, há gírias típicas da região

Nordeste.

Vale ressaltar também que a AD da linha francesa será utilizada na

análise das letras das músicas partindo do pressuposto de que procura

“compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do

trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua história”. (ORLANDI, 2000,

p.15)

É pertinente destacar também que a AD tem consequências como:

considerar a não literalidade das palavras, o sentido se forma levando em conta os contextos, um sujeito histórico produz a linguagem interagindo com outro sujeito, a linguagem é constitutivamente heterogênea. (BRANDÃO, 2012, p. 21)

Por sua vez, sobre o mercado “forrozeiro”, torna-se importante destacar

que hoje o seu público principal são jovens (TROTTA, 2008, p. 19). Segundo o

autor, para atrair a atenção desse público, o forró eletrônico se fundamenta em três

conceitos: “festa, amor e sexo” (TROTTA, 2008, p. 19).

Robson da Silva Braga (2011) vai mais longe ao observar que, além dos

temas citados por Trotta, é muito comum encontrar nas músicas “alusões explícitas

ao consumo de bebidas alcoólicas”, à ostentação financeira e “à beleza física de

homens”, mas principalmente de mulheres (BRAGA, 2011, p. 04).

Se antes o forró fazia alusões ao sertão, ao „jeito matuto‟ do povo sertanejo e ao „amor sublime‟, entre outros temas menos recorrentes, hoje o forró eletrônico enaltece tipos urbanos que buscam relações amorosas ou apenas sexuais, que consomem bebidas alcoólicas e se orgulham disso,

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que se exibem com carros importados e equipamentos ou por serem „raparigueiros‟

20 e „pegar mulher‟ (BRAGA, 2011).

Importa igualmente afirmar que as músicas e suas letras complementam

o que está sendo apresentado nos palcos. Portanto, a entoação das canções, e

também bailarinas com corpos malhados e coreografias sensuais dividem as

atenções do público nos espetáculos, tornando o forró “irresistível”, principalmente

aos olhos masculinos.

Diante disso, a figura masculina aparece nas composições como um ser

superior à mulher, detentor de força e poder sobre a figura feminina. Tal perspectiva

pode ser facilmente observada no trecho da música Ei Gatinha, que não foi gravada

oficialmente, mas que participa dos shows e das gravações para a Internet21.

Ei gatinha amor vamos sair, Eu quero me divertir Tá negando, é? Te quero agora Deixe de tanta demora Sou bonito, endinheirado Ando de carro e sou casado Se você não me quiser Vou procurar outra mulher...

Esse trecho descreve um homem exigindo que a mulher em questão não

demore em atender os seus desejos carnais, pois ele tem dinheiro e automóvel,

aspectos importantes para o narrador (cantor), além de se dizer bonito e casado. E

ainda ameaça dizendo que caso ela não queira ceder, vai em busca de outra, que

aceite suas condições. Ou seja: a mulher está sujeita aos desejos do homem, na

visão da letra.

Em consonância, Cleide Nogueira de Faria (2002) observa que “o desejo

feminino parece estar sempre negado, silenciado”, mas o masculino está sempre em

evidência, como se só os desejos dele importassem (2002, p. 20).

A autora lembra também que essas músicas são ouvidas e muitas vezes

cantadas por adultos e por crianças. Tornam-se, portanto, partícipes de uma vida

social em comum e elemento de um conjunto de produções culturais. Nessa

20A expressão faz alusão aos homens que “saem” com várias mulheres, sem compromisso com nenhuma. No Nordeste a palavra “rapariga” é usada para denominar prostituta, mulher que se relaciona sexualmente em troca de dinheiro. 21Disponível em http://www.vagalume.com.br/garota-safada/ Acesso em 10 fev. 2012.

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perspectiva, essas canções - naturalizadas e incorporadas no cotidiano vivenciado

pelas pessoas - são formadoras “da própria subjetividade dos indivíduos, num

processo de internalização de signos, códigos de valores que constituem, constroem

as imagens, as falas e comportamentos das pessoas”. (FARIA, 2002, p. 20)

Segundo os aspectos da AD, Cleudemar Alves Fernandes (2007) afirma

que “analisar o discurso implica interpretar os sujeitos falando, tendo a produção de

sentidos como parte integrante de suas atividades sociais” (p. 21).

Diante do acima exposto, não é difícil discernir que as composições de

forró eletrônico não servem como agente construtor de valores e atitudes cidadãs e

minimamente equilibradas em torno do bom senso.

Seguindo a mesma lógica de (des)construção da imagem da mulher e da

dominação masculina, é comum encontrar músicas em que a mulher é intitulada

como “rapariga”, que no Nordeste significa prostituta.

Sobre essa denominação dada ao público feminino, a Análise do

Discurso, a partir das afirmações de um de seus mentores intelectuais, Bakhtin,

considera que

(...) Toda palavra usada na fala real possui (...) acento de valor ou acento apreciativo (...). Sem acento apreciativo não há palavra. (...) Não se pode construir uma enunciação sem modalidade apreciativa. Toda enunciação compreende antes de mais nada uma orientação apreciativa. É por isso que na enunciação viva, cada elemento contém ao mesmo tempo um sentido e uma apreciação (BAKHTIN & VALOSHINOV, 1979, p. 118).

Isso pode ser observado - atentando-se para a gíria presente no título da

canção, de temática erótica - na música Trenzinho da Sacanagem (CD Garota

Safada – Volume 3).

Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora E no trenzinho da sacanagem que eu já vou Eu sou cabra raparigueiro, nasci pra raparigar Raparigar é minha vida eu nasci pra raparigar A cachaça fica boa quando chega a rapariga e no forró da rapariga todo mundo vai dançar...

O trecho extraído é repetido exaustivamente durante os três minutos de

música. O personagem principal da canção é sempre o homem, e aqui

especificamente, ele instiga outras pessoas (talvez outros homens!) a participarem

do evento intitulado Trenzinho da Sacanagem.

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Em torno de letras como as destacadas nesta monografia, pode-se

compreender como a imagem da mulher está sendo transmitida por este estilo

musical. Segundo Faria, existe no repertório forrozeiro um “empobrecimento da

essência” feminina. A autora explica que o discurso do forró eletrônico “produz uma

imagem da mulher muito mais a partir do seu corpo” e “da beleza estética”,

suscitando a ideia de que ela é um ser vazio, “sem conteúdo” e “descartável”

(FARIA, 2002, p. 30).

Esse descarte geralmente se refere ao ato sexual entre um homem e uma

mulher, ou entre um homem e várias mulheres, elucidando a imagem masculina

como um ser viril e possuidor de “direito certo” sobre as mulheres. Observe-se esta

afirmativa no trecho da música Vida de Playboy (CD Garota Safada – Volume 4).

Forró e vaquejada procuro mulher safada que na hora da trepada me chame de gostosão Mulher raparigueira que na hora da zoeira a gente passa a noite inteira pra matar meu tesão...

A letra da música tem como foco a mulher somente como fonte de prazer

do homem. Elas precisam ser “safadas” para merecer estar com esse homem, e na

hora da relação sexual precisam elogiar o desempenho masculino, exaltando a sua

virilidade e superioridade. A mulher é coisificada, tratada como um ser descartável.

E ele é o dominador, o mais importante e o único que tem direito a ter prazer.

Sobre tal aspecto, Manoel Ribeiro (2009) destaca em seu artigo

Feminismo, machismo e música popular brasileira, que o machismo se dá porque “o

homem é considerado possuidor de qualidades como coragem, audácia e retidão

(...).” Ele deve “ser viril, ser macho, ser forte, vigoroso, não hesitante”. Ribeiro afirma

também que a mulher deve ser “afetiva, carinhosa, ingênua, passiva e sensível”.

Tais atribuições podem ser observadas no trecho da música Eu sou o rei

do cabaré.

Eu sou da bagaceira Gosto da putaria não posso ver mulher que fico Doido Me tremendo Me babando Enloqueço de tesão pra fazer amor Eu sou dermantelado

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Cachorro Descarado Comigo é vucu-vucu na bichinha Tome tome safadinha Tome tapa na bundinha Eu mando pressão!!

Essa música apresenta um homem com desejos exacerbados de obter

prazer sexual com mulheres que estejam dispostas a serem agredidas entre quatro

paredes e serem chamadas de “safadas”. A mulher mais uma vez é vista somente

como objeto de prazer masculino.

Partido do pressuposto de que a mulher é um ser social, os discursos

veiculados por estas letras, em que a figura feminina aparece de maneira

questionável, representam relações sociais humanas e que têm efeitos sobre as

pessoas. Afinal, os discursos ajudam e contribuem para a construção de relações

sociais e que são construídas no e pelo discurso.

Manoel P. Ribeiro (2009) esclarece que

Não há como traçar os processos de identificação da mulher sem mencionar o homem e a inscrição de sua identidade, muitas vezes, sobre a mulher. É a partir do reconhecimento do que é um homem que a imagem da mulher é construída no seu social (p.74).

Deste modo, o autor reforça o que se vê nas músicas repetidas

freneticamente pela Garota Safada, em que “a mulher, seu corpo (...) se tornam

propriedade do homem” (RIBEIRO, 2009, p. 75).

Ainda sobre o acima exposto, a música Sou Safado (CD Garota Safada –

Volume 5) relata situações ainda mais explícitas no que diz respeito à

desvalorização da mulher.

Eu pego todas sou tarado E a mulherada gosta Eu topo tudo sou safado E a mulherada gosta (...) Recebo uma mensagem da Claudinha Querendo uma tarde de prazer Mas eu já tô marcado com as minas Dou uma rapidinha e mando ver Camila, Suely, Valéria, Carla e Tayná Estão nuas no apartamento me esperando Pra zuar (...) Com Márcia e Tereza já ficou tudo beleza Vou passar lá na casa da Carine e da Raquel Daqui a meia hora elas me ligam com certeza

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Porque marquei com as quatro uma suruba no motel.

A letra em sua totalidade descreve um homem completamente ciente de

sua virilidade e com autossuficiência diante de várias mulheres que o procuram para

obter prazer. As colocações das palavras, o uso de gírias e do termo de baixo calão

“suruba” ajudam a coisificar a mulher e tornam a relação sexual algo identificado

com o descartável22.

Em consonância, Maingueneau, um dos principais pesquisadores da atual

Análise do Discurso, afirma que “o discurso é uma forma de ação” e que “falar é uma

forma de ação sobre o outro e não apenas uma representação do mundo”. Portanto,

tais expressões assentadas nas canções em foco reforçam que “o discurso é (...) um

lugar de investimentos sociais, (...) ideológicos (...), por meios de sujeitos interagindo

em situações concretas”. (CARDOSO, 1999, p. 21)

Em todo o percurso desta monografia, valem reflexões acerca da maneira

com que o público feminino é narrado em tais composições, na perspectiva de se

observar também se essas músicas podem instigar direta ou indiretamente

pensamentos e atitudes machistas e até violentas adotadas por alguns homens

apreciadores do forró eletrônico.

22Segundo o Dicionário Aurélio Online, significa “atividade sexual de que participam três ou mais pessoas”. Disponível em http://www.dicionariodoaurelio.com/Suruba.html. Acesso em 17 mar. 2013.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo monográfico objetivou analisar a construção da imagem da

mulher dentro de algumas das músicas da Banda Garota Safada. Assim, cinco letras

de canções deste grupo foram focadas em torno do universo metodológico da AD

francesa.

Sobre a AD, Eni P. Orlandi (2004) ressalta que “é pelo discurso que

melhor se compreende a relação entre linguagem/pensamento/mundo, porque o

discurso é uma das instâncias materiais (concretas) dessa relação (p. 12).

Diante do acima exposto, no intuito de construir uma análise crítica sobre

tal recorte, foram consideradas as músicas em que a mulher aparece de maneira

mais evidente sendo intitulada de adjetivos que denigrem e ofendem o gênero

feminino. Esse contexto retrata - assim - a difícil realidade da mulher

nordestina/brasileira, vista como - a partir das letras da banda - mero objeto sexual.

Foi possível observar que nos momentos em que a mulher é mencionada

sempre há aspectos como: interesse financeiro por parte dela (sendo considerada:

“interesseira”), bebida em excesso e relações sexuais somente com foco no prazer

masculino. Pode-se dizer que são costumes machistas potencializados por uma arte

baseada no trinômio "festa-mulher-sexo".

É pertinente lembrar que este trabalho trouxe à tona a ideologia

mercadológica que existe em torno destes grupos musicais de forró eletrônico, os

quais, através de canções depreciativas alcançam status e sucesso diante das

grandes massas. Essas, por sua vez, aplaudem e repetem as letras que coisificam a

mulher a todo instante.

Este fenômeno remete historicamente à Indústria Cultural. E torna-se

óbvio afirmar ainda que tal acontecimento está cada vez mais presente no cotidiano

da população jovem e apreciadora destas manifestações artísticas, principalmente

no Nordeste. Tal público não questiona o que é produzido e ainda compactua com a

proliferação de produtos deste calibre.

Teixeira Coelho (1986) corrobora com Adorno e Horkeimer ao explicar

que a Indústria Cultural existe no intuito de

promover a alienação do homem, entendida como processo no qual indivíduo é levado a não meditar sobre si mesmo e sobre a totalidade do

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meio social circundante, transformando-se com isso em mero joguete e, afinal, em simples produto alimentador do sistema que o envolve. (p. 33)

Deste modo é válido ressaltar a responsabilidade da sociedade, assim

como dos profissionais de comunicação social, em abordar com mais frequência e

profundidade tal assunto, e esclarecer que a música tem poder para interferir direta

ou indiretamente nas relações sociais.

Ou seja: em todo o recorte, as pesquisas realizadas mostram a

necessidade de um aprofundamento jornalístico no contexto citado. O intuito é

possibilitar novas visões sobre a imagem da mulher veiculada neste meio musical.

Considero que esta sugestão é uma das principais contribuições

acadêmicas deste estudo monográfico, entretanto faz-se necessário entender que a

arte, num contexto geral e específico, tem valor humanamente enriquecedor,

independente da região ou da classe social. Porém, ocorre que a arte de fazer forró

nos dias de hoje infelizmente está muitas vezes relacionada com o chamariz de sexo

ou de festas.

É preciso considerar também que nas representações citadas neste

estudo o artista é o elemento fundamental para a criação e divulgação do produto

final. Assim, ele tornou-se um mero “entertainer23”, cuja função se

resume em passar o que é produzido sem preocupação com qualquer bagagem

cultural e construtiva para o receptor e com outras conexões sociais pertinentes à

arte.

De qualquer forma, e sobre tais afirmações, é pertinente também citar o

pesquisador Robson Braga24, que foi bastante objetivo em suas declarações em um

artigo de opinião ao sustentar que:

Queiramos ou não, o forró eletrônico é uma das “nossas artes”: ele fala da nossa cultura nordestina contemporânea, concordemos com ela ou não. Isso não significa, contudo, que precisamos enaltecer essa cultura. Cultura não está aí para ser enaltecida, como fazem os movimentos tradicionalistas. Ela está aí para ser compreendida e, se for o caso, repensada

25.

Por sua vez, retomando de certa forma algumas considerações já

presentes nesta etapa final, reafirmo que as pesquisas realizadas durante a

23

Pessoa que faz apresentações, profissionalmente, para a diversão de outros. Disponível em http://www.dicio.com.br Acesso em 17 abr. 2013. 24

Jornalista e doutorando em Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) 25

Trecho extraído da coluna de opinião do Jornal O Povo em 07 mai. 2013

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produção desta monografia apontam para a necessidade de novos e interferentes

estudos em torno do assunto focado. Afirma-se isto em virtude da força

mercadológica que possui este forró midiático. Portanto, este estudo não apresenta

soluções definitivas, haja vista que a construção politicamente correta da imagem da

mulher passa por diversos aspectos do meio social, e aqui não nos cabe

desenvolvê-los.

O que estas considerações finais anunciam é a possibilidade de diálogo

com outros trabalhos monográficos atinentes ao tema. Isto é ciência, é comunicação

e é jornalismo.

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ANEXOS

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ANEXO A - Discografia da Banda Garota Safada

Volume 1 Volume 2 Volume 3

Volume 4 Volume 5 Volume 6

Volume 7 e 1º DVD

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ANEXO B - Letras analisadas Ei Gatinha Ei gatinha amor vamos sair, Eu quero me divertir Tá negando,é? Te quero agora Deixe de tanta demora Sou bonito, endinheirado Ando de carro e sou casado Se você não me quiser Vou procurar outra mulher.(2x) Não, não quero sair com você Tá pensando que é o quê? Não admito Pare com isso Saia fora, eu quero compromisso Não tô afim do seu dinheiro Nem adianta insistir Saia logo Eu não te quero Ficar no falada no mundo inteiro.(2x) Trenzinho da Sacanagem (Volume 3) Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes) Eu sou cabra raparigueiro, nasci pra raparigar Raparigar é minha vida eu nasci pra raparigar A cachaça fica boa quando chega a rapariga e no forró da rapariga todo mundo vai dançar Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (2 vezes) E quando a festa fica boa os homens vivem bebendo Tem rapariga doidona, tem rapariga bebendo Tem rapariga doidona, tem rapariga querendo Tem rapariga doidinha pra se agarrar Tem rapariga chorando, tem rapariga assanhada E no forró da rapariga todo mundo vai dançar Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes) Eu sou cabra raparigueiro, nasci pra raparigar Raparigar é minha vida eu nasci pra raparigar

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A cachaça fica boa quando chega a rapariga e no forró da rapariga todo mundo vai dançar Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes) E quando a festa fica boa os homens vivem bebendo Tem rapariga doidona, tem rapariga bebendo Tem rapariga doidona, tem rapariga querendo Tem rapariga doidinha pra se agarrar Tem rapariga chorando, tem rapariga assanhada E no forró da rapariga todo mundo vai dançar Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes)

Vida de Playboy (Volume 4) Sou forrozeiro 100% biriteiro Mas só gasto meu dinheiro se a mulher for avião Vida de playboy é uma coisa maravilhosa Não falta mulher gostosa no meu carro turbinado E o som arregaçado só querendo curtição Estar na minha casa é somente alegria Mulherada e cachaçada, uma grande putaria Sacanagem de montão, querendo curtição Forró e vaquejada procuro mulher safada que na hora da trepada me chame de gostosão Mulher raparigueira que na hora da zoeira agente passa a noite inteira pra matar meu tesão Sou forrozeiro 100% biriteiro Mas só gasto meu dinheiro se a mulher for avião Sou playboyzinho 100% mauricinho Só pego pitelzinho Sou tremendo garanhão Eu sou o rei do cabaré Eu sou o rei do cabaré

Não posso ver mulher Fico doido pra ... !!!!!!! Eu sou o rei do cabaré Não posso ver mulher Fico doido ... !!!!!!! Eu sou da bagaceira Gosto da putaria não posso ver mulher que fico

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Doido Me tremendo Me babando Enloqueço de tesão pra fazer amor Eu sou dermantelado Cachorro Descarado Comigo é vucu-vucu na bichinha Tome tome safadinha Tome tapa na bundinha Eu mando pressão !!! Fortaleza eu vou na Sandra vou na beti Recife é bom de mais na Odeti Em Teresina quem me espera são as meninas da Beth Cuscuz !! Em São Luís vou na casa da Rosana Aracaju é bom de mais tia Havana Natal é la no Sinal Cartão Vip eu entro é sem pagar !!! Sou Safado (Volume 5) Eu pego todas sou tarado E a mulherada gosta Eu topo tudo sou safado E a mulherada gosta (...) Recebo uma mensagem da Claudinha Querendo uma tarde de prazer Mas eu já tô marcado com as minas Dou uma rapidinha e mando ver Camila, Suely, Valéria, Carla e Tayná Estão nuas no apartamento me esperando Pra zuar (...) Com Márcia e Tereza já ficou tudo beleza Vou passar lá na casa da Carine e da Raquel Daqui a meia hora elas me ligam com certeza Porque marquei com as quatro uma suruba no motel.

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Entrevista Daniel Oliveira Cordeiro, coreógrafo e figurinista das bailarinas da Banda Garota

Safada. Fortaleza – Ce, 18 set 2012. Entrevista concedida à autora. Programas televisivos analisados Profissão Repórter Rede Globo Exibido em 10 mai 2011 A Liga Rede Bandeirantes Exibido em 21 out 2010 Mais Você Rede Globo Exibido em 24 jun 2011 Encanta Ceará – Especial Garota Safada Verdes Mares afiliada Rede Globo – Ceará Exibido em 04 nov 2012 Site da Banda Garota Safada http://bandagarotasafada.com/

Páginas nas redes sociais https://www.facebook.com/WSeGarotaSafada https://twitter.com/GarotaSafada