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  • PROJETO DE RESTAURAO Caderno de Estudos

    IMVEL SEDE DO IPHAN-ES Diagnstico

    Projeto de Restaurao Imvel Sede do Iphan-ES

    Caderno de Estudos

    Volume II

    Diagnstico

    Vitria Novembro de 2011

  • PROJETO DE RESTAURAO Caderno de Estudos

    IMVEL SEDE DO IPHAN-ES Diagnstico

    SANETEC Saneamentos e Servios Tcnicos de Engenharia Ltda.

    R. Rio de Janeiro, 282/906 . Centro . CEP 30.160-040 . Belo Horizonte/MG . telefax: (31) 3201-4766

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    EDITORIAL INSTITUTO DO PATRIMNIO HISTRICO E ARTSTICO NACIONAL SUPERINTENDNCIA NO ESPRITO SANTO IPHAN-ES

    Diva Maria Freire Figueiredo Superintendente Iphan-ES

    Aline Barroso Miceli Chefe da Diviso Tcnica Caroline Maciel Lauar Tcnica Arquiteta Urbanista SANETEC SANEAMENTO E SERVIOS TCNICOS DE ENGENHARIA LTDA. Honrio Nicholls Pereira Scio Diretor Arquiteto e Urbanista CREA 67.602/D-MG Adriana Paiva de Assis Arquiteta e Urbanista CREA 61.651/D-MG Aline Pinheiro Brettas Historiadora

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    SUMRIO VOLUME II APRESENTAO...................................................................................................................................................4 INTRODUO ........................................................................................................................................................5 FICHA TCNICA.....................................................................................................................................................7 2. DIAGNSTICO ARQUITETNICO ....................................................................................................................8

    2.1 ANLISE FSICO-AMBIENTAL .....................................................................................................................8 2.2 ANLISE HISTRICA .................................................................................................................................10

    2.2.1 Histrico de Vitria ................................................................................................................................10 2.2.2 Histrico do Imvel Sede do Iphan-ES .................................................................................................32

    2.3 PROSPECES .........................................................................................................................................60 2.4 PLANTAS DE MATERIAIS CONSTRUTIVOS ............................................................................................80 2.5 PLANTAS CRONOLGICAS ......................................................................................................................83 2.6 ANLISE CONSTRUTIVA ...........................................................................................................................86 2.7 ANLISE ESTTICO-ESTILSTICA............................................................................................................90 2.8. ANLISE DO ENTORNO ...........................................................................................................................94 2.9 FICHAS DE DIAGNSTICO........................................................................................................................96 2.10 MAPEAMENTO DE DANOS....................................................................................................................136 2.11 RELATRIO FINAL .................................................................................................................................144 2.12 PROGRAMA DE NECESSIDADES.........................................................................................................148

    3. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...............................................................................................................150

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    APRESENTAO Este Caderno de Estudos parte integrante do Projeto de Restaurao e Adaptao do Imvel Sede do Iphan-ES, localizado na cidade de Vitria, Estado do Esprito Santo, e tem por finalidade consolidar a proposta de restaurao e adaptao do imvel para utilizao como sede da Superintendncia no Esprito Santo do Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional - Iphan-ES. Neste Volume apresentada a etapa de Levantamento Cadastral do Projeto de Restaurao e Adaptao. O trabalho foi elaborado pela SANETEC Saneamento e Servios Tcnicos de Engenharia Ltda., sob responsabilidade tcnica do Arquiteto e Urbanista Honrio Nicholls Pereira (CREA 67.602/D-MG) e com a colaborao da Arquiteta e Urbanista Adriana Paiva de Assis (CREA 61.651/D-MG) e da Historiadora Aline Pinheiro Brettas, para a Superintendncia no Esprito Santo do Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional Iphan-ES, entre os meses de setembro e novembro de 2011.

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    INTRODUO A Casa Rua Jos Marcelino, 203/205 localiza-se na Cidade Alta de Vitria, ponto de ocupao mais antiga da cidade. Foi provavelmente edificada no perodo colonial, tendo sofrido diversas intervenes e adaptaes ao longo do tempo. Sua ocupao foi predominantemente residencial, tendo sido usada como casa de moradia e/ou de aluguel. H registros de que tenha sido usada, eventualmente, para fins comerciais ou mistos. A edificao foi tombada pelo Iphan em 13 de novembro de 1967, atravs do Processo 0787-T-67, recebendo a Inscrio n 408 do Livro Histrico. O imvel foi adquirido pelo Iphan em 2006 e vem sendo usado, desde ento, como sede de sua Superintendncia no Esprito Santo, sem, contudo, ter sido adaptado para receber o novo uso institucional. O Projeto de Restaurao e Adaptao do Imvel Sede do Iphan-ES compreende o conjunto de elementos necessrios e suficientes para execuo das aes destinadas a preservar e prolongar o tempo de vida til da edificao, englobando no apenas sua restaurao, mas tambm a adaptao ao novo uso institucional. O Projeto est dividido em trs sees. A primeira seo refere-se etapa de Levantamento Cadastral e tem como objetivo conhecer e analisar o objeto sob os aspectos fsico, histrico, artstico, formal e tcnico. Objetiva tambm compreender o significado do objeto ao longo do tempo, conhecer sua evoluo e, principalmente, os valores pelos quais foi reconhecida como patrimnio cultural. Nessa seo so apresentados os levantamentos histrico, documental, fsico e cadastral, complementados pela anlise e descrio do monumento e de sua insero na rea urbana de Vitria. A segunda seo refere-se ao Diagnstico do edifcio, que consolida as pesquisas e estudos anteriormente realizados, complementando o conhecimento do objeto. So analisados, de forma pormenorizada, os aspectos histricos e artsticos, com a finalidade de compreender seu significado ao longo do tempo, conhecer sua evoluo e, principalmente, os valores pelos quais foi reconhecido como patrimnio cultural. Tambm so analisados os aspectos fsicos e ambientais que influenciam o estado de conservao da edificao, alm dos problemas e questes relativos ao estado atual de conservao do edifcio. So apresentadas, atravs de fichas de anlise e pranchas de mapeamento de danos, as principais alteraes e patologias da edificao, sendo identificados os agentes e as causas que geram as alteraes. De forma complementar, so feitas anlises, prospeces e um histrico das intervenes pelas quais o bem cultural passou atravs dos anos. Tal mapeamento serve de base elaborao de um relatrio tcnico com recomendaes para a conservao preventiva e para a implementao de diretrizes de interveno, que sero retomadas e consideradas na etapa seguinte, o Projeto de Restaurao. A terceira e ltima seo do trabalho consiste no Projeto de Restaurao propriamente dito, que compreende o conjunto de aes necessrias e suficientes para caracterizar a interveno, determinando solues, definindo usos e procedimentos de execuo, abordados tcnica e conceitualmente. O projeto ser composto por justificativa terica e conceitual, programa arquitetnico, memorial descritivo, especificaes tcnicas, desenhos em pranchas e escalas apropriadas e demais informaes necessrias ao perfeito entendimento do projeto em questo. O Projeto Arquitetnico de Restaurao, acima especificado, ser acompanhado pelos seguintes projetos complementares: Estrutural, Hidrosanitrio, Drenagem, Eltrico e Luminotcnico, Lgica e

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    Telefonia, Climatizao, Proteo Contra Incndio e Pnico PCI e Sistema de Proteo Contra Descargas Atmosfricas SPDA. Acredita-se que, a partir da efetiva execuo deste projeto de Restaurao e Adaptao, o Imvel Sede do Iphan-ES ser preservado, receber um novo uso compatvel com suas caractersticas fsicas e construtivas e ter seu tempo de vida til prolongado. A nova destinao institucional contribuir ainda para a revitalizao da regio urbana onde se insere e para o resgate da memria urbana da Cidade Alta e, por que no dizer, da cidade de Vitria e do Estado do Esprito Santo.

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    FICHA TCNICA

    Projeto: Projeto de Restaurao e Adaptao do Imvel Sede do Iphan-ES Imveis: Casa Rua Jos Marcelino, 203/205 Endereo: Rua Jos Marcelino, 203/205 Cidade Alta, Centro Vitria/ES Propriedade: Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional Iphan Finalidade: Restaurao e adaptao para o uso institucional rea edificada: 380,49 m rea do terreno: 215,10 m poca de construo: Anterior a 1875

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    2. DIAGNSTICO ARQUITETNICO 2.1 ANLISE FSICO-AMBIENTAL1 O municpio de Vitria est localizado no extremo Leste do Estado do Esprito Santo. Limita-se a Norte com o municpio de Serra, a Sul com Vila Velha, a Oeste com Cariacica e a Leste com o Oceano Atlntico. Integra, segundo a classificao do IBGE, a mesorregio Central Esprito-santense e a microrregio de Vitria. O municpio integra a Regio Metropolitana da Grande Vitria, rea bastante urbanizada, compreendida pelos municpios de Vitria, Cariacica, Fundo, Guarapari, Serra, Viana e Vila Velha. A sede do municpio est localizada nas coordenadas geogrficas 2019'09" de latitude Sul e 4020'50" de longitude Oeste. Vitria dista 524km de Belo Horizonte (BR-262 e BR-381), 525km do Rio de Janeiro (BR-101) e 1.252km de Braslia (BR-040). Todas as rodovias de acesso so pavimentadas. De acordo com a diviso administrativa de 2005, o municpio constitudo pelos distritos Sede e Goiabeiras. A sede do Municpio conta com 79 bairros, distribudos pelas ilhas e pela regio continental. A populao do municpio de 327.801 habitantes (IBGE 2010), sendo 153.948 homens (46,96%) e 173.853 mulheres (53,04%). A populao est distribuda em uma rea de 98,506km2, o que corresponde a uma densidade populacional de 3.327,72 hab/km2, bastante alta quando comparada mdia do Estado e do Pas. A populao do municpio predominantemente urbana (>95%). A economia de Vitria voltada para as atividades porturias, comrcio, indstria, prestao de servios e turismo de negcios. A capital capixaba conta com dois dos mais importantes portos do pas: Vitria e Tubaro. As indstrias mais importantes da capital so a Arcelor Mittal Tubaro (antiga CST) e Vale (antiga Companhia Vale do Rio Doce). Esses portos, junto com vrios outros do estado, formam o maior complexo porturio do Brasil. O Estado do Esprito Santo recebe royalties por ser produtor de petrleo e gs natural, o que contribui para o aumento dos recursos e da renda do Estado e dos municpios capixabas. O PIB per capita de Vitria chegou a R$ 71.407,32, em 2008, sendo este o maior PIB entre as capitais do pas. O ndice de Desenvolvimento Humano Municipal IDH-M de Vitria de 0,856 (PNUD 2000), integrando a faixa de desenvolvimento alto, correspondendo ao 18 lugar entre todas as cidades brasileiras e 3 lugar entre as capitais do pas. Em relao geografia, Vitria possui localizao privilegiada na plancie litornea, junto Baia de Vitria. A parte mais antiga da cidade est localizada em uma ilha fluviomarinha a Ilha de Vitria , enquanto a parte mais nova localiza-se no continente. A Ilha de Vitria limitada a Oeste e Sul pelo Rio Santa Maria, a Norte pelo Canal do Camburi e a Leste pela Baia de Vitria. 1 Dados retirados das snteses do IBGE, disponveis em www.ibge.gov.br; do IEMA, disponveis em http://www.iema.es.gov.br/; da Prefeitura Municipal de Vitria, disponveis em http://legado.vitoria.es.gov.br/regionais/home.asp; e da Wikipedia, disponveis em http://pt.wikipedia.org/wiki/Vit%C3%B3ria_%28Esp%C3%ADrito_Santo%29 .

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    Alm da ilha principal, fazem parte do municpio outras 34 ilhas. Acredita-se que havia originalmente 50 ilhas na Baa, muitas das quais foram agregadas por meio de aterro ilha maior. A Baixada Espiritossantense, onde se localiza o municpio, caracterizada como plancie sedimentar onde ocorrem diversos afloramentos de rochas grantico-baslticas, chegando a altitudes de 300m. Com relao geologia, o relevo das ilhas um prolongamento do continente, de constituio grantica, circundado pelo mar e reas de praia, mangue e restinga. O macio central da ilha de Vitria o Morro da Fonte Grande, com altitude de 308m. Os principais afloramentos granticos so a Pedra dos Dois Olhos, com 296m, e o Morro de So Benedito, com 194m de altitude. O ponto mais alto do municpio o Pico do Desejado, na ilha de Trindade, com 601m de altitude. Em relao vegetao natural, predominam, nas reas baixas, as vegetaes litorneas (restinga e manguezais). Nas reas mais altas predominam a floresta tropical e a Mata Atlntica. A vegetao natural, entretanto, foi bastante modificada ao longo do tempo pela atividade antrpica. O clima, de acordo com a classificao de Kppen, o Tropical, com veres quentes e chuvosos e invernos amenos e secos. A temperatura mdia anual gira em torno de 23C. As mdias mensais variam entre 27C, em fevereiro, e 21C, em julho. As temperaturas mdias mximas mensais so observadas no vero, chegando a 39C (fevereiro); e as mdias mnimas no inverno, baixando a 12C (junho e setembro). As amplitudes trmicas diria, sazonal e anual so baixas em Vitria. O ndice pluviomtrico mais baixo do que no resto do Estado, com mdia anual registrada de 1.153mm de chuva, concentrada nos meses de outubro a fevereiro. A umidade relativa do ar varia pouco durante o ano. As mdias mensais giram em torno dos 80%, variando entre mdias mnimas de 40%, nos meses secos, e 99%, nos meses chuvosos. Os principais sistemas de circulao atmosfrica que atuam na regio so o anticiclone subtropical do Atlntico Sul, responsvel pelos ventos predominantes de Leste (E) e Nordeste (NE); e o anticiclone polar mvel, responsvel pelas frentes frias provenientes do extremo sul do continente, caracterizado pelas baixas temperaturas, nebulosidade e ventos ocasionais de Sul (S). A velocidade mdia anual dos ventos varia de 0,9 a 2,3 m/s. A presso atmosfrica mdia anual varia em torno de 1007 mbar. A maior mdia mensal ocorre em junho, chegando a 1012 mbar; e a menor mdia mensal ocorre em fevereiro, baixando a 1005 mbar. A radiao solar mdia anual alta em Vitria (200 W/m2), variando entre mdias mensais de 290 W/m2, em janeiro, e 110 W/m2, em junho. A radiao solar mxima observada em fevereiro chega a 1086 W/m2. Em relao poluio do ar, dados recentes (2006) mostram que os ndices de qualidade do ar em Vitria encontram-se em nveis aceitveis (predomnio de nveis "bons" durante o ano). Observa-se que os ndices de Partculas Totais em Suspenso (PTS), Partculas Inalveis (PM10) e Dixido de Nitrognio (NO2) chegam a nveis mdios "regulares" nos meses secos.

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    2.2 ANLISE HISTRICA 2.2.1 Histrico de Vitria A histria da colonizao do Esprito Santo pelos portugueses comea com a chegada de Vasco Fernandes Coutinho e da tripulao da nau Glria capitania que lhe fora doada por D. Joo III, como retribuio aos servios prestados nas campanhas portuguesas na frica e na ndia.2 A Carta de Doao de 1534 estabelecia que a Capitania de Vasco Coutinho deveria ter, como as demais, 50 lguas de frente, avanando "pelo serto e terra firme adentro" at a Linha de Tordesilhas. Os limites da capitania foram definidos por negociao com os donatrios vizinhos. Confrontava, a Sul, com a Capitania de Pero Gis (So Tom) no Rio Itapemirim, e a Norte, com a de Pero Campo Tourinho (Porto Seguro) no Rio Mucuri. De acordo com Jos Teixeira de Oliveira, foi em um domingo, 23 de maio de 1535, que a caravela de Vasco Fernandes Coutinho fundeou esquerda da entrada da baa que julgaram ser um rio. Como se tratava do dia dedicado ao Esprito Santo (oitava de Pentecostes), vila fundada foi dado o nome de Vila do Esprito Santo (atual Vila Velha), termo posteriormente estendido a toda a Capitania.3 Alm de fortificaes, paliadas, almoxarifados e outras feitorias, foram edificadas na Vila do Esprito Santo, nos anos iniciais de ocupao, a capela de N. Sra. do Rosrio (1535), um engenho (no Stio Ribeiro) e cerca de 50 casas. Os povos indgenas que habitavam a regio resistiram ocupao portuguesa. Para expuls-los, o donatrio contou com a colaborao de Duarte Lemos e Jorge de Menezes, a quem concedeu sesmarias. Duarte Lemos, que vivia na capitania da Bahia, chegou em 1536 ou 1537 ao Esprito Santo, empregando homens e recursos nas batalhas que se seguiram pela posse da terra.4 Em retribuio aos esforos na peleja contra os indgenas, Vasco Coutinho doou a Ilha de Santo Antnio (atual Ilha de Vitria) a Duarte de Lemos, em 15 de julho de 1537.5 Duarte de Lemos deu logo s pessoas e moradores da terra grandes partes de sesmarias das terras da dita ilha pera aproveitarem e a povoarem6 e, segundo Baslio Daemon, comprometeu-se a fortific-la contra as invases.7 A Igreja de Santa Luzia foi a primeira a ser edificada na parte alta da ilha, sobre rocha grantica, provavelmente em 1537. Teria sido, segundo fontes secundrias, uma capela particular da fazenda de Duarte Lemos.8 Os primeiros ocupantes da Ilha de Santo Antnio ergueram engenhos e fizeram plantaes em suas terras, de modo que, em 1545, j se fazia referncia produo de cana-de-acar, pescados e

    2 OLIVEIRA, Jos Teixeira de. Histria do Estado do Esprito Santo. 3 ed. Vitria: Arquivo Pblico do Estado do Esprito Santo; Secretaria de Estado da Cultura , 2008. 670 p. (Coleo Cana , v. 8). p. 27. 3 Idem, p. 38. 4 Idem, p. 43. 5 Ibidem. 6 Ibidem. 7 Prov. ES, 58. Citado por OLIVEIRA, p. 43. 8 A Igreja de Santa Luzia foi tombada pelo Iphan atravs do Processo 0195-T-39, sendo inscrita no Livro Histrico sob no. 245, em 1 de agosto de 1946. Igreja de Santa Luzia (Vitria, ES). Arquivo Noronha Santos. Livro de Tombo Histrico. Iphan. Rio de Janeiro.

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    mantimentos diversos. Diz-se que as roas plantadas eram denominadas "capixabas" pelos ndios, expresso que acabou servindo para denominar os habitantes da ilha e, posteriormente, todos os esprito-santenses. As tentativas iniciais de escravizar os ndios Tupi, Goitac e Aymor para o trabalho agrcola resultou num grande ataque destes, por volta de 1545, o qual dizimou plantaes e vilas nascentes, resultando na morte ou fuga dos colonos, e na perda das benfeitorias recm-construdas. Vasco Coutinho decide transferir a sede da Capitania para a Ilha de Santo Antnio, onde a defesa era mais fcil, protegida que estava pelos morros e guas circundantes. De acordo com Oliveira, em maro de 1550 a sede da capitania j havia sido transferida,9 recebendo o nome de Villa Nova ou Villa de Nossa Senhora da Victoria. Em contraposio, a Vila do Esprito Santo passou a ser denominada Villa Velha. O ncleo da nova vila foi estabelecido em um plat rochoso, hoje conhecido como Cidade Alta. O plat era delimitado pelo mar, pelo relevo do Macio Central (atual Morro da Fonte Grande) e pelas reas baixas e alagadias. Todos esses elementos facilitaram a defesa da vila nos primeiros tempos mas, recentemente, passaram a ser limitadores do crescimento urbano. A parte alta da cidade oferecia condies naturais de defesa e concentrou as construes administrativas e religiosas. Ao redor do ncleo administrativo e religioso foram construdas as residncias, que, aos poucos, deram origem s ruas quase sempre estreitas e sinuosas, amoldadas topografia do terreno. A parte baixa da cidade era local menos privilegiado, considerado insalubre e sujeito a inundaes e ataques de invasores. Para proteger a cidade do perigo que vinha do mar, foram construdas diversas fortificaes e paliadas a beira-mar, fazendo de Vitria uma praa-forte. As primeiras igrejas construdas foram as de Santa Luzia (1537) e a Matriz de Nossa Senhora da Vitria (provavelmente edificada a partir de 1551), sempre ocupando stios elevados, voltadas para dentro da ilha e formando adros sua frente. Acredita-se que a Santa Casa de Misericrdia tambm j havia se instalado em Vitria no ano de 1545, recebendo em 1605 os mesmos privilgios de sua irm de Lisboa. Nesse ncleo inicial instalou-se a Companhia de Jesus, representada pelo Padre Afonso Brs e pelo irmo Simo Gonalves. Chegando Villa Nova em maro de 1551 e ocupando terras a eles doadas por Duarte Lemos, "livres de todos os encargos fiscais", os jesutas logo iniciam a construo do Colgio dos Meninos de Jesus do Esprito Santo e da Igreja de Santiago (atual Palcio Anchieta). Em 1552, o Colgio j estava em atividade. Os jesutas contriburam no desenvolvimento e organizao da capitania, implantando fazendas e aldeias ao longo do litoral. As fazendas destinavam-se produo do sustento dos jesutas e as aldeias, catequese dos nativos. A expulso dos jesutas do Esprito Santo, em 1760, teve como conseqncia imediata a desorganizao social, poltica e econmica da capitania, posto que suas fazendas, engenhos, aldeias, escolas e bibliotecas foram abandonados ou entregues prpria sorte. Fato que tambm merece meno a chegada do frei Pedro Palcios a Vila Velha (1558), onde construiu uma ermida para abrigar um painel de Nossa Senhora com o Menino Jesus, que trouxera

    9 Oliveira, p. 66.

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    da Europa (provavelmente de origem espanhola). Mais tarde ampliada, a ermida de frei Pedro originou o atual Santurio de Nossa Senhora da Penha. Em meados do sc. XVI, a capitania do Esprito Santo era considerada uma das mais prsperas da colnia, tendo em seu territrio seis engenhos de acar,10 nmero maior do que o total existente nas capitanias de Porto Seguro, So Vicente e So Tom (Rio de Janeiro).11 Como afirmava Tom de Souza em uma carta a D. Joo III: O Esprito Santo a melhor e a mais rica capitania que h na costa do Brasil.12 Pouco se sabe sobre as primeiras edificaes residenciais de Vitria. Eram provavelmente edificaes feitas com materiais pouco durveis. Por ocasio de uma tentativa de invaso de corsrios franceses, em 1561, relatava-se que a populao da vila ficara aterrorizada "por serem os moradores poucos, as casas cobertas de palha e sem fortaleza".13 A administrao do segundo donatrio, Vasco Coutinho (filho) (1564-1589) foi marcada por um perodo de paz e prosperidade, resultando na construo de mais engenhos e na implementao do comercio direto com Portugal. Naquele momento, a capitania era rica em "gado e algodes, alm de seis engenhos de acar", e que os portugueses tinham "muita escravaria dos ndios cristos. A Vila de Vitria, entretanto, no parecia refletir a prosperidade da capitania. Visitada por Cardim e habitada por Jos de Anchieta no quartel final do sc. XVI, Vitria seria descrita como uma vila "mal situada", localizada "em lugar baixo e pouco aprazvel". Cardim informa que a vila "contava com mais de cento e cinqenta vizinhos, com seu vigrio" e que os jesutas tinham "uma casa bem acomodada com sete cubculos e uma igreja nova e capaz".14 Jos de Anchieta afirmava que a gente da terra era "rica e honrada" e que a terra era visitada anualmente por trs ou quatro navios que iam a Portugal. Em 1559 um incndio teria destrudo a primitiva Igreja de So Tiago. Em 1573, os jesutas iniciam a construo de uma nova igreja em seu Colgio, com "mais de cem palmos de comprido, fora a capela, e quarenta e cinco de largo". As paredes foram feitas de taipa sob fundaes de pedra e cal. Os prprios padres da Companhia dirigiram a obra, auxiliados por Belchior de Azeredo e os principais moradores, que com suas prprias mos [ajudaram] a trazer pedras grandes para os alicerces.15 Foi assim, com o "adjutrio de grandes e humildes, de senhores e escravos, e graas ao naufrgio que obrigou o padre Lus da Gr e seus companheiros a uma longa demora na Vila da Vitria", que se levantaram as primeiras paredes do templo que, em 1595, acolheria os restos mortais de Jos de Anchieta. Em 1589, poucos meses aps a morte de Vasco Coutinho (filho), aportam em Vitria os frades franciscanos Antnio dos Mrtires e Antnio das Chagas, que iniciaram a construo do Convento de So Francisco, em terras doadas pelo falecido donatrio. No mesmo ano, os padres beneditinos frei Damio da Fonseca e irmo Baslio chegaram da Bahia com o intuito de fundar, na Vila Velha, um mosteiro da sua ordem. Dois anos mais tarde, obtinham 10 CARDIM, Pe. Ferno Apud LIMA JNIOR, Carlos Benevides. Baia de Vitria: aspectos histricos e culturais. Vitria: Editora Fundao Ceciliano Abel de Almeida/UFES, 1995, p. 30. Ver tambm SCHAYDER, Jos Pontes. Histria do Esprito Santo: uma abordagem didtica e atualizada 1535-2002. Campinas, SP: Companhia da Escola, 2002, p. 26. 11 SCHAYDER, Op. Cit. p. 26. 12 Carta de Tom de Souza Apud SCHAYDER, p. 24. 13 Carta do Esprito Santo, de 1562, in Cartas, III, 465. Citado por OLIVEIRA, Op. Cit., p. 106. 14 OLIVEIRA, Op. Cit. p. 113. 15 Carta de INCIO TOLOSA, apud SERAFIM LEITE, HCJB, I, 222). Citado por OLIVEIRA, Op. Cit., p. 116.

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    huma sorte de terras em Vitria, onde pretendiam fundar outro Mosteiro. Os beneditinos iniciaram a construo de seu mosteiro em uma ilha que passaria a ser conhecida como Ilha do Frade. A construo no foi terminada e encontra-se hoje em runas. Por ocasio da passagem do lendrio corsrio ingls Thomas Cavendish por Vitria, em 1592, foram construdos dois fortins na entrada da baa, um deles no local em que, anos mais tarde, seria definitivamente construdo o Forte So Joo. Em 1605, Vitria chegava a 700 habitantes e relatava-se possuir boas casas de negcio, alm de colgios e conventos.16 As ilustraes do Reys-boeck van het rijcke Brasilien () ou "Livro de viagem ao reino Brasileiro (...)" publicado na Holanda por volta de 1624, incluem uma estampa do Espiritu Santo (Figura 1). Trata-se de importante documento iconogrfico, embora com alguns erros geogrficos, justificveis por se tratar de um levantamento feito por holandeses que no tinham acesso ao territrio brasileiro.

    Figura 1: Estampa "Espiritu Santo". Ilustrao de autor no-identificado, inclusa no Reys-boeck van het rijcke Brasilien () ou "Livro de viagem ao reino Brasileiro (...)" publicado na Holanda ca. 1624 (FONTE: REIS, s/d).

    O canal representado como Rio de Espiritu Santo e a vila de Vitria (no alto) no representada como parte de uma ilha. O Po de Acar (atual Penedo) aparece invertido, direita do canal. Vila Velha ( grafada como Vilha velha) guarda a entrada do canal, representada com uma torre que talvez seja da Igreja do Rosrio. Uma Fortaleza aparece direita do canal, talvez fosse a antiga fortificao reedificada, anos mais tarde, com o nome de Forte de So Joo. Nestor Goulart Reis faz algumas observaes sobre essa estampa:

    16 ROCHA POMBO, HB, V, 133-4. Citado por OLIVEIRA, Op. Cit. p. 126.

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    No desenho aparecem duas torres de igrejas. A mais afastada poderia ser a do Colgio dos jesutas e a mais prxima a da Matriz. Ao fundo, sobre uma colina, o que seria a ento pequena igreja dos frades franciscanos. As casas so apresentadas como se fizessem frente para a praia, margem do canal. De fato, situavam-se ento na borda da Cidade Alta, no mesmo nvel das demais. Nesse caso, o que parece ser a frente das casas, voltadas para o canal, seria de fato seu fundo, na parte alta.

    Os belssimos mapas do Esprito Santo e Vitria feitos por Joo Teixeira de Albernaz, em 1631, mostram uma pequena vila na costa Sul da ilha, sendo pouco detalhados em relao ocupao urbana. Nesses mapas, alguns acidentes geogrficos so identificados: Ponta da Barra ou Morro de Joo Moreno, Abrolho, Rio Moreype e Ponta do Tubaro. Em relao ocupao humana, ganham destaque os fortins de So Miguel e So Marcos, guarnecendo a entrada da Baa; a Vila Velha com destaque para a Igreja de N. S. da Pea; e a Villa da Vitoria, representada como um povoado de 15 casas em frente a um porto.

    Figura 2: Detalhe do mapa da Capitania do Esprito Santo do Cabo de So Tom Ponta da Fruta. Reproduo fotogrfica do livro "Estado do Brasil, coligido das mais certas noticias que pode ajuntar D. Jernimo de Atade. por Joo Teixeira Albernaz I, Cosmgrafo de Sua Majestade, 1631". (FONTE: Biblioteca Itamaraty, 1631).

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    Figura 3: Mapa da Barra e Baa do Esprito Santo, com a Ilha de Vitria. Reproduo fotogrfica do livro Estado do Brasil, coligido das mais certas noticias que pode ajuntar D. Jernimo de Atade. por Joo Teixeira Albernaz I, Cosmgrafo de Sua Majestade, 1631. Em destaque, a Ilha de Vitria (FONTE: Biblioteca Itamaraty, 1631).

    Outro mapa de Albernaz, datado de 1666 e mais detalhado, identifica, alm dos acidentes j mencionados, o Po de Acar (atual Penedo), a Ilha de D. Jorge, a Enseada de Areia (atual Camburi) e as "Serras", a Leste. Em Vila Velha, so identificadas as igrejas da Penha e do Rosrio. Em Vitria, alm do povoado, merecem destaque o "Forte" e uma Vigia (Farol), esta situada no alto do morro que receberia o nome de Morro da Vigia.

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    Figura 4: Detalhe da Demonstrao do Sprito Santo. Reproduo fotogrfica do "Livro de toda a Costa da provincia Santa Cruz feito por Joo Teixeira Albernas anno d. 1666 (FONTE: Ministrio das Relaes Exteriores, 1666).

    No quartel final do sc. XVII, toma impulso em Vitria a arquitetura militar, seja com a construo de novas fortificaes ou reforma e ampliao das existentes. A administrao Francisco Gil de Arajo (1678-1682) foi particularmente ambiciosa em relao s fortificaes e edificaes oficiais. Francisco Gil teria edificado ou refeito os fortes de N. S. do Monte do Carmo e de So Joo, este encontrado em runas. De sua iniciativa, conta-se a construo do forte de S. Francisco Xavier, estrategicamente situado para proteger a entrada da barra de Vitria. s quatro companhias de armas existentes na capitania, Francisco Gil adicionou mais cinco, inclusive uma de homens pardos. Tambm as edificaes oficiais foram cuidadas pelo donatrio: a casa de cmara e o Pelourinho, que ainda no existiam, foram construdos de pedra e cal, "to perfeito que se no a acha villa que a tenha como ella". Os templos foram asseados; e a Santa Casa da Misericrdia, de que no se viam mais que os vestgios, foi reedificada, ficando perfeitssima.17 Outra importante referncia urbana a surgir na vila o Convento de Nossa Senhora do Monte do Carmo, fundado em 1682 por padres carmelitas. Totalmente edificado, o conjunto era composto pelo convento propriamente dito, pela Igreja de Nossa Senhora do Monte do Carmo e pela Capela da Ordem Terceira. A descoberta do ouro nas Minas Geraes, em 1693, traria grandes mudanas para a Capitania do Esprito Santo, pois foi proibido o comrcio e a abertura de estradas em direo s minas, como forma de evitar o contrabando. Todo o escoamento do ouro e das pedras preciosas o que gerava grande fluxo de pessoas, maior movimentao da economia e disseminao de conhecimento era 17 FREIRE, Capitania, 80. Citado por Oliveira, p. 172.

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    feito pela capitania de So Tom (atual Estado do Rio de Janeiro). Esses fatos, somados incompetncia das administraes subseqentes de Francisco Gil, levaram a um longo perodo de estagnao econmica da Capitania do Esprito Santo. Durante o sc. XVIII, encontraremos a economia do Esprito Santo ainda canalizada pelas funes administrativas e militares, temerosos estavam os governantes de que estrangeiros tomassem a capitania e dali passassem s Minas. A compra da capitania pela coroa portuguesa por 40 mil ducados, em 1710, pode ser entendida nesse contexto de controle e proteo do territrio contra invasores estrangeiros. Nesse contexto, a Vila de Vitria passou a depender economicamente do aprimoramento de suas funes administrativa e militar, que resultaram em maior diviso social do trabalho, especializao da mo-de-obra e certo refinamento cultural.18 A construo da Capela da Irmandade de Nossa Senhora do Amparo e da Boa Morte, em 1707, claro reflexo da diversidade social da vila, posto que a irmandade era formada por homens pardos, isto , trabalhadores livres e urbanos. Passados oito anos, as irmandades solicitaram permisso para construir, no local da capela, uma igreja dedicada a So Gonalo Garcia. Em 2 de novembro 1766, com a presena do visitador diocesano, padre Antnio Pereira Carneiro, e do vigrio da vila de Vitria, Antnio Xavier, a igreja foi consagrada.19 Em relao questo militar, observa-se ao longo do sc. XVIII a recorrente preocupao dos administradores com a construo, reforma e manuteno de fortificaes militares na Baa e na Vila de Vitria, reflexo da preocupao da Coroa Portuguesa com possveis invases estrangeiras. Em 1726, o vice-rei conde de Sabugosa comissionou o engenheiro Nicolau de Abreu Carvalho para reconstruir ou "aperfeioar" as fortificaes, julgadas necessrias, na baa do Esprito Santo. Asseveram os cronistas que Nicolau de Abreu refez a fortaleza de So Joo na garganta que faz a baa acima da Vila do Esprito Santo; os fortes de Nossa Senhora do Monte do Carmo entre o cais grande e a praia do peixe na marinha da cidade [de Vitria] e de S. Tiago, dentro da vila de Vitria; alm de S. Incio, ou S. Maurcio, na marinha da cidade; dentro da cerca que foi dos regulares jesutas (Figuras 5 a 8).

    18 Em 1700, o bacharel formado pela Universidade de Coimbra, Joo Trancoso de Lira, fora nomeado ouvidor da capitania. De 1703 a proviso concedendo licena a D. Joo de Noronha para advogar em todos os juzos da vila de Vitria. O primeiro alcaide-mor da vila, Antnio Pacheco de Almeida, foi nomeado em 1709. 19 A Igreja de So Gonalo foi tombada pelo Iphan atravs do Processo 0381-T-48, sendo inscrita no Livro de Belas Artes, sob no. 317, em 6 de novembro de 1948, e no Livro Histrico sob no. 251, em 8 de novembro de 1948. Igreja de So Gonalo (Vitria, ES). Arquivo Noronha Santos. Livro de Tombo Histrico. Iphan. Rio de Janeiro.

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    Figura 5: Planta da Fortaleza de So Joo, cpia do original de Joo Antnio Caldas de 1764, por Luis dos Santos Vilhena, 1801 (FONTE: Biblioteca Nacional, 1801).

    Figura 6: Planta e Prospecto do Fortinho de S. Thiago, cpia do original de Joo Antnio Caldas de 1764, por Luis dos Santos Vilhena, 1801 (FONTE: Biblioteca Nacional, 1801).

    Figura 7: Planta e Prospecto do Forte de N. S. do Monte do Carmo, cpia do original de Joo Antnio Caldas de 1764, por Luis dos Santos Vilhena, 1801 (FONTE: Biblioteca Nacional, 1801).

    Figura 8: Planta e Prospecto do Fortinho de Santo Igncio, cpia do original de Joo Antnio Caldas de 1764, por Luis dos Santos Vilhena, 1801 (FONTE: Biblioteca Nacional, 1801).

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    Aproveitando sua presena na terra e atendendo aos pedidos do povo e s prprias necessidades do culto, o capito-mor Dionsio Carvalho de Abreu mandou orar as obras de reedificao da igreja-matriz de Nossa Senhora da Vitria que, aos olhos de seus contemporneos, parecia-se mais com uma caza de armazem, que lugar dedicado para a celebrao dos officios divinos.20 Em 1731 foi baixada uma ordem rgia determinando a execuo das obras,21 s iniciadas em 1749.22 Graas documentao que instruiu o processo relativo s obras da Igreja Matriz, sabe-se que, entre 1728 e 1730, a vila da Vitria se achava mui destituida de cabedaes e atenuada por falta de negocio, sendo por esta cauza muy pobres os seus moradores; que os vizinhos de que se compunha passavo de 5.000 entre brancos, pardos, pretos forros e captivos, que os fogos que nella havio passavo de 700, que os dizimos no chegavo em muitas occasies a cobrir os filhos da folha, no passando o seu rendimento de 2:500$000.23 A ocupao do Morro do Pernambuco ocorreu na segunda metade do sc. XVIII, a partir da construo da Igreja de Nossa Senhora do Rosrio dos Pretos, em 1765. A estrutura principal foi concluda em dois anos, com mo-de-obra negra. O terreno foi doado Irmandade de Nossa Senhora do Rosrio dos Pretos pelo capito Felipe Gonalves dos Santos e, a partir da, os arredores do Morro do Pernambuco comearam a ser ocupados, mormente por membros da irmandade do Rosrio dos Pretos. A estadia do engenheiro militar Jos Antonio Caldas na vila de Vitria, em meados da dcada de 1760, foi extremamente profcua, legando posteridade um excelente acervo de mapas, plantas, prospectos e frontispcios da cidade. Caldas realizou o levantamento da rea do canal, produzindo tambm a carta geogrfica denominada "Topogrfica da Barra, de Rio do Esprito Santo" e o "Prospeto da Vila da Vitoria". A planta e o prospecto da cidade, feitos por Caldas em 1767 (Figura 9), mostram uma cidade j estabelecida, com ruas longas e sinuosas, amoldadas s curvas de nvel do terreno. A cidade se organizava em torno de um eixo central (Sudoeste-Nordeste) na parte alta, indo da Igreja de So Tiago, no Colgio dos Jesutas ( esquerda, no mapa), at a Igreja Matriz ( direita), passando pela Igreja da Misericrdia e pela Cadeia (Pelourinho). Esse eixo central era denominado Rua da Matriz e corresponde atual Rua Pedro Palcios.

    20 Da Informao do provedor da Fazenda do Rio de Janeiro (ALMEIDA, Inventrio, VII, 133-4). So da Informao retro mais as seguintes valiosas achegas: Tem o corpo desta Igreja cento e vinte palmos de comprimento, e achando os ditos engenheiros ter de largura somente cincoenta e trs lhe deram mais sete, que fazem sessenta, para ter a proporo dupla ao comprimento ... As paredes que so feitas de pedra e barro e muito arruinadas, escassamente chego a ter vinte palmos de altura. Tambem lhe dero pouco mais fundo e largura na capella mr, por ser mui pequena. 21 Sou servido por resoluo de vinte e dois do prezente mez e anno, em consulta do meu Conselho Ultramarino, que do rendimento dos mesmos dizimos se tirem todos os annos 400$000 rs. para a factura da Egreja e que os Freguezes concorro igualmente com outros 400$000 rs. todos os annos para o corpo della, cujas contribuies duraro ath se prefazerem os ditos 10:000 cruzados, em que foi orada a dita egreja, que hade ser feita na forma da dita planta (ALMEIDA, Inventrio, VIII, 103). 22 72 - Certido em que o Escrivo da Fazenda Carlos Jos Ferreira declara ter ficado deserta a arrematao das obras da reedificao da referida egreja e terem principiado as mesmas obras sob a direco do Provedor da Fazenda e da Camara. Vila de N. Sa. da Victoria, cinco de fevereiro de 1749 (ALMEIDA, Inventrio, VIII, 103). 23 Informao do provedor da Fazenda do Rio de Janeiro, baseada em elementos do seu colega do Esprito Santo. No mesmo documento, se l mais o seguinte: no sabia que houvesse naquella Capitania [Esprito Santo] effeitos alguns donde sahisse a despeza que se havia de fazer com a reedificao da dita Igreja. (ALMEIDA, Inventrio, VII, 133-4). Citado por OLIVEIRA, Op. Cit.

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    Outra via de destaque era a Rua Santa Luzia ou Grande (atual Jos Marcelino), que partia do Colgio dos Jesutas, passava pela Igreja de So Gonalo, Capela de Santa Luzia e fundos da Matriz, terminando na Ladeira da Pedra, descida ngreme que levava Prainha, onde fora construdo o Forte So Thiago e a Capela de N. Sra. da Conceio. Na periferia da cidade, a Nordeste, a cidade chegava at o Morro do Pernambuco, onde em 1765 comeou a ser edificada a Igreja do Rosrio.

    Figura 9: Planta da Villa da Victoria, Capital da Capitania do Espirito Santo, de Jos Antonio Caldas (FONTE: Arquivo Histrico do Exrcito, 1767).

    O casario civil acompanhava a sinuosidade das ruas na cidade alta, dando as costas baa. No alto da planta (a Noroeste), so vistos os conventos franciscano e carmelita, situados nos arrabaldes da cidade. Ruas transversais, de grande declividade, cortavam a cidade, ligando os cais aos principais prdios pblicos e religiosos.

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    Na parte baixa e alagadia da cidade predominavam os trapiches e fortes, notadamente o de Santo Igncio, na extremidade esquerda do mapa; a Fortaleza de Nossa Senhora do Monte do Carmo (atual Praa Oito), ao centro; e o de So Tiago, direita (atual Praa Costa Pereira). Um pequeno canal com ponte separava o Forte de So Tiago da Igreja da Conceio. Na extremidade direita do mapa, v-se uma rea verde que corresponderia s reas de plantao e engenho dos jesutas, enquanto as linhas marrons seriam canais de irrigao por eles abertos. Em uma variao dessa planta, recolhida ao Arquivo Histrico do Exrcito, nota-se a duplicidade de indicaes relativas Igreja Matriz, indcio de que a nova Matriz (1749) foi edificada em lugar diferente da antiga Matriz (1551).

    Figura 10: Detalhe de uma variao da Planta da Villa da Victoria, Capital da Capitania do Espirito Santo, de Jos Antonio Caldas. Ao centro, v-se duas indicaes de "Matriz". A igreja indicada ao alto era provavelmente a primeva matriz, edificada em 1551; e a de baixo corresponderia segunda matriz, edificada em 1749 e demolida em 1918 (FONTE: Arquivo Histrico do Exrcito, s/d).

    Caldas deixou interessante depoimento sobre a capitania do Esprito Santo, tal como a viu em 1767:

    Aqui me ocorre por na prezena de V. Exa. que esta Villa [da Vitria] frtil de todos os fructos e legumes, que produzem neste Brazil, e com tanta abundancia, que no s a gente da terra (que excede o nmero de oito mil almas, sem a rezenha dos meninos e pagos), mas ainda carregam de mantimentos muitas embarcaes, com que enchem, fornecem e satisfazem em parte esta cidade [do Salvador] e a do Rio de Janeiro, sendo uma das Villas que tem grande commercio no Brazil, porque saiem pela sua barra todos os annos para cima de 300:000 cruzados, no s dos effeitos de mantimentos, se no tambm em assucares, madeiras e pannos de algodo (que este genero o principal daquelle commercio), os quaes transportam em vinte sumacas (cujos senhorios so moradores nella), no s para esta Bahia e Rio de Janeiro, se no para todos os portos do sul como Santos, Paranagu, Iguape,

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    Canania, Itanhaem, Ilha Grande e outros, sendo os commerciantes desta Villa os que neste continente disfructam o commercio mais regular della.24

    De acordo com Caldas, a capitania tinha pelo menos oito mil habitantes, exportava mantimentos, madeiras, panos de algodo e acar para a Bahia, Rio de Janeiro e portos do sul, em valor superior a trezentos mil cruzados por ano. O transporte se fazia em embarcaes pertencentes aos prprios comerciantes de Vitria, que neste continente disfrutam o commercio mais regular. Releva notar que os panos de algodo tinham predominncia nas pautas da exportao, sinal evidente de que a indstria de tecelagem ocupava lugar de destaque nas atividades dos capixabas. Os anos finais do sc. XVIII no traro grandes mudanas organizao urbana representada e descrita por Caldas. H que se notar, apenas, o crescimento da populao que, a dar f aos registros de ento, praticamente dobrou entre 1774 e 1780, passando de 7.773 hab para 15.600 hab. Boa parte dessa populao continuava, de alguma forma, vinculada a atividades administrativas, comerciais, porturias ou militares. Mais da metade da populao era escrava ou forra. Vitria chega ao fim do sc. XVIII com uma configurao urbana bem definida (ver Figura 11), ocupando o plat e as reas alagadias contguas. Eixos de expanso urbana eram ensaiados pela costa, indo do Morro de Pernambuco, Leste, ao Morro da Santa Casa, a Oeste. A Perspectiva da Villa de Victoria, feita por Joaquim Pantaleo Pereira da Silva em 1805, descreve perfeitamente a situao de ocupao da cidade naquele momento. Trata-se, nas palavras de Nestor Goulart Reis, de

    uma vista em perspectiva da Vila de Vitria, tomada a partir do canal. O maior destaque aparece no antigo Colgio dos jesutas, com sua igreja (A) e, na extremidade direita da colina, a Matriz, j com sua nova fachada com fronto trabalhado (B). Bem mais acima, vemos a igreja do Rosrio (D); entre a Matriz e o Colgio dos jesutas, a igreja da Misericrdia (C) e a Casa de Cmara e Cadeia (E), com dois corpos de telhado destacados. Ao centro, um grande cais avana em direo ao canal.25

    Alm das edificaes mencionadas por Reis, so destacados na Perspectiva: Forte do Carmo (F), Forte de So Mauricio (G), Praa nova de SThiago (H), Cais e rua do Porto dos Padres [Jesutas] (I), Cais Novo (J), Cais do Azambuja (M), Cais Grande (N), Cais do Santissimo (O), Porto da Lanxa (P), Ladeira do Pernambuco (Q), Pedra redonda (R), "Capichaba" (S) e Campinho (T).

    24 Ofcio do Engenheiro Jos Antonio Caldas para o Conde Governador, no qual lhe d explicaes sobre as nove plantas que lhe remete, relativas Capitania do Esprito Santo e diversas informaes sobre a mesma Capitania e a construo da Fortaleza da Ilha do Boi. Bahia, treze de outubro de 1767 (apud ALMEIDA, Inventrio, II, 183). 25 REIS FILHO, Nestor Goulart. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: Edusp, 2000.

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    Figura 11: Perspectiva da Villa de Victoria / Capitania do Espirito Santo por Joaquim Napoleo Per. da S./ Anno de 1805 (FONTE: Arquivo Histrico do Exrcito, 1805).

    A visita de August de Saint-HIlaire a Vitria, em 1818, rendeu-nos um excelente relato da situao da cidade naquele momento, merecendo por isso longa transcrio:

    As ruas de Vitria so caladas, porm mal; tm pouca largura, no apresentando qualquer regularidade.

    Aqui, entretanto, no se vem casas abandonadas, como na maioria das cidades de Minas Gerais. Dedicados agricultura, ou a um comrcio regularmente estabelecido, os habitantes da Vila da Vitria no esto sujeitos aos mesmos reveses dos cavadores de ouro e no tm motivo para abandonar sua terra natal. Cuidam bem de preparar e embelezar suas casas. Considervel nmero delas tem um ou dois andares. Algumas tm janelas com vidraas e lindas varandas trabalhadas na Europa. A vila da Vitria no tem cais; ora as casas se estendem at a baa, ora se v, na praia, terreno sem construo, que tem sido reservado para embarque de mercadorias. A cidade tambm privada de outro tipo de ornato: no possui, por assim dizer, qualquer praa pblica, pois a existente diante do palcio muito pequena, e com muita condescendncia que se chama de praa a encruzilhada enlameada que se prolonga da Igreja de Nossa Senhora da Conceio da Praia at a praia. H, na vila da Vitria, algumas fontes pblicas, que tambm no concorrem para embelezar a cidade, mas, pelo menos, fornecem aos habitantes gua de excelente qualidade.

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    Contam-se, na Capital do Esprito Santo, nove igrejas, incluindo-se a dos mosteiros. A igreja paroquial muito grande, muito limpa e no apresenta nada que provoque a curiosidade. Desde a expulso dos jesutas, os conventos no so seno em nmero de dois, o das Carmelitas e o de So Francisco, construdos fora ou quase fora da cidade. O convento de So Francisco, que abrange o panorama de uma parte da baa e as campinas vizinhas, nada tem de notvel a no ser sua posio. Quando de minha viagem, contavam-se nele dois religiosos; entretanto, embora pequeno, o edifcio poderia receb-los em nmero maior; de resto, as receitas dessa casa so pouco considerveis.

    Quanto ao convento do Carmo, pareceu-me qual o dos franciscanos; mas, a administrao tomou o pavimento trreo para fazer a caserna dos soldados pedestres. A igreja desse convento muito limpa e bem clara, a exemplo de todas do Brasil; contristante que se a tenha enfeiado, colocando, em cima dos altares, as mais feias figuras que eu jamais vi. Da comunidade do Carmo depende uma belssima fazenda; mas, essa propriedade, disseram-me, , desde muito tempo, muito mal administrada; os monges, animados do mesmo esprito da maioria dos brasileiros, apenas pensam em fazer dinheiro de tudo, destroem as matas e no deixaro aos seus sucessores seno terras inteis.

    Existem, na Vila da Vitria, um hospital militar e um pequeno hospital civil. Na ocasio de minha viagem, haviam projetado reuni-los e tinham vontade de estabelec-los em cima do morro que se eleva a uma pequena distncia da cidade, bem no extremo ocidental da ilha. Teria sido impossvel escolher-se uma posio mais favorvel, pois so os ventos de nordeste desta regio que afastaro, precisamente, da cidade, as emanaes perigosas.

    Em 1818, os edifcios do hospital projetado se erguiam j a alguns ps do cho, parecendo que seriam notveis.

    O mais belo ornato da capital do Esprito Santo , sem contradio, o antigo convento dos jesutas, hoje palcio do Governador, situado na extremidade da cidade. um edifcio de um andar e quase quadrado, tendo num dos seus lados vista para o mar, e a fachada voltada para a cidade, dando sobre uma pequena praa, fronteira a uma igreja, a da Misericrdia; essa fachada tem cerca de cincoenta ps de comprimento, e cada um dos dois lados quase 60. Diante da parte que d para o mar, h uma espcie de terrao coberto de grama ao qual se chegava, vindo da baa, por uma escadaria ladeada por duas filas de palmeiras.

    (...) A populao de Vitria elevava-se, em 1818, a 4.245 habitantes, entre os quais cerca de 1/3 de escravos e um pouco mais de 1/4 de brancos. 26

    Com o declnio da minerao, a partir de meados do sc. XVIII, diminuram os riscos de ataque costa brasileira. A proibio de comrcio e transporte entre Esprito Santo e Minas Gerais foi ento abolida e o Esprito Santo ganhou um novo impulso comercial e econmico, incrementado depois pelo ciclo do caf e pela imigrao europia. A populao de Vitria comeou a crescer em ritmo mais rpido, criando um movimento de expanso da cidade. Como soluo para esse problema, foram realizados, ao longo do sc. XIX, pequenos aterros, principalmente nas regies alagadias e nos baixios que existiam na vila. Dois importantes aterros dessa poca foram o da Prainha ou Largo da Conceio (atual Praa Costa Pereira) e da Lapa do Mangal (depois conhecida como Campinho e atualmente Parque Moscoso). Esses aterros permitiram a expanso da vila para alm de seus limites coloniais. O Morro da Santa Casa tambm foi ocupado a partir de 1813, no governo de Francisco Alberto Rubim (1812-1819), reboque da construo da Santa Casa da Misericrdia. A configurao da parte baixa da cidade sofreu, assim, uma primeira onda de modificaes. 26 SAINT-HILAIRE, Auguste. Viagem ao Esprito Santo e Rio Doce. So Paulo: Itatiaia, 1974. pp. 95-99.

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    Figura 12: Mapa de Vitria em 1895. A cidade pouco crescera no sc. XIX, estendendo-se da Santa Casa, a Oeste (esquerda, no mapa), ao Forte de So Joo, a Leste. As principais reas de expanso foram ganhas em aterros da Baa e desmontes de morros (FONTE: Projeto Visitar; PMV, 2008). Terminado o perodo imperial, os primeiros governantes republicanos inspirados pelos ideais positivistas de progresso, harmonia, sade e beleza; e auxiliados por jovens engenheiros e arquitetos doutrinados pelo higienismo voltam-se contra os espaos pblicos da cidade antiga, vista como suja, feia, desorganizada e insalubre. Opera-se, ento, uma srie de modificaes que vo remodelar a cidade antiga e criar novas reas de expanso urbana. Tudo tem incio no primeiro governo Muniz Freire (1892-1896). Seu programa visava centralizar as atividades econmicas em Vitria, reestruturando a rede ferroviria, direcionando-a ao porto da capital e reaparelhando o porto para atendimento nova demanda. Em carter complementar e inserido no mesmo programa encontrava-se o projeto de expanso da cidade de Vitria com o intuito de desfazer sua estrutura urbana colonial e apresent-la como uma cidade moderna. Para modernizar a cidade, Muniz Freire cria, em 1895, a Comisso de Melhoramentos da Capital, liderada pelo engenheiro sanitarista Francisco Saturnino de Brito, que em 1896 projetou um "novo arrabalde" com rea cinco vezes maior que a cidade existente (Figura 13). O projeto idealizado por Saturnino de Brito previa a criao de vias largas e construes bem iluminadas e ventiladas, implantadas com afastamentos nas divisas, algo que se contrapunha lgica histrica da constituio da cidade. Ainda que no executado por Muniz Freire, o ambicioso projeto de Saturnino de Brito serviu de guia para seus sucessores, sendo usado para planejar o crescimento da cidade nos 50 anos seguintes.

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    Figura 13: Planta da Ilha de Victoria 1896. Nela se v o projeto de Saturnino de Brito para o Novo Arrabalde (em rosa), a Leste; e o plano de ocupao do Campinho (em vermelho), a Oeste, que o transformaria no Parque Moscoso (FONTE: PMV; Arquivo UFES, Memria Visual da Baa de Vitria, 1896).

    Jernimo Monteiro (1908-1912) desenvolveu o Plano de Melhoramento de Vitria, aterrando o antigo Campinho, ali criando a Vila e o Parque Moscoso, e realizando algumas melhorias urbanas: implementao dos servios de gua e esgoto; instalao da rede de iluminao pblica e privada de Vitria; abertura de vias largas e retas; e alargamentos e aterramentos das vias que ficavam margem da baa; implementao do servio de bondes eltricos; adoo do estilo ecltico para os prdios pblicos; e reforma do Palcio Anchieta, cujo estilo colonial foi modificado pelo engenheiro francs Justin Norbert. No mandato do governador Bernardino Monteiro (1913-1917) e do prefeito Henrique de Novaes (1917-1920) foi concebido e implementado o Plano Geral da Cidade (1917), um esforo continuado para reformar o centro da cidade, retificando e alargando as ruas, demolindo os "antigos pardieiros" e abrindo novas ruas e avenidas. Especial ateno foi dada por Henrique Novaes ao Porto de Vitria, cujo aterro feito com terras do desmonte do morro da Santa Casa. O Porto foi criado na dcada de 1880 para dar suporte exportao de caf, substituindo os cais e trapiches que at ento caracterizavam a cidade baixa de Vitria. Foi ampliado em 1911, com a construo de um dique de meia mar em aterro ganho Baa. Em 1925, o Servio de Melhoramento de Vitria comeou a construo de uma muralha de 130 metros de extenso e trs armazns, depois ampliados para quatro. A sucessiva ampliao dos armazns bloqueou a vista e o

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    acesso Baa, de modo que o centro da cidade perdeu paulatinamente sua relao histrica com o brao de mar. Poucas brechas restaram, como em frente escadaria do Palcio Anchieta, onde antes havia o cais Grande. No governo Florentino Avidos (1924-1928) foi feito o aterro prximo ao Forte So Joo, melhorando o acesso a essa regio. Tambm comeou a ser implementado o projeto do "Novo Arrabalde" de Muniz Freire. Avidos tambm realizou obras no Porto; a construo dos trs primeiros galpes na regio do Parque Moscoso; a construo da Ponte que liga a ilha de Vitria ao continente pela cidade de Vila Velha (atual Ponte Florentino vidos ou Cinco Pontes); e a abertura da avenida Capixaba (atual Av. Jernimo Monteiro). Induzida pela abertura de avenidas, na dcada de 1920 j comeava a ocupao em Jucutuquara, Marupe e Praia Comprida, a Leste.

    Figura 14: A Avenida Capixaba, atual Jernimo Monteiro, ligou a cidade antiga ao Novo Arrabalde, ampliando as reas de ocupao beira da Baa de Vitria (FONTE: Acervo Photo Paes; Memria Visual da Baa de Vitria; UFES; 1936).

    A dcada de 1920 marca o incio da verticalizao e do adensamento do centro histrico, registrando-se ento a construo dos primeiros edifcios, como o Teatro Glria, na atual Praa Costa Pereira. A verticalizao do centro intensificar-se-ia nas dcadas de 1940 e 1950, quando surgem os primeiros arranha-cus.

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    Figura 15: Panormica de Vitria (1930). A Cidade-Prespio acompanha as curvas da Baa e se encaixa entre os morros, preservando as fontes dgua e os espaos verdes (FONTE: Memria Visual da Baa de Vitria; UFES; 1930). Voltando Prefeitura na dcada de 1930, Henrique Novaes retoma e amplia seu Plano Geral da Cidade de 1917, elaborando e implementando o Plano de Urbanisao de Vitria (1931). Tratava-se, uma vez mais, da urbanizao atravs da execuo de grandes aterros beira da Baa, tanto no "Novo Arrabalde" como no Porto e na Ilha do Prncipe (que foi anexada Ilha de Vitria). Em relao ao centro da cidade, Henrique Novaes passa a se preocupar com as ligaes entre cidade alta e baixa, que so remodeladas na dcada de 1940; a retificao de antigas ladeiras, como a da Pedra; e a execuo de diversas escadarias em estilo ecltico, como a So Diogo. Novaes chega a sugerir alteraes arquitetnicas e paisagsticas, interferindo na construo da Catedral e seu adro.

    Figura 16: Planta Geral da Cidade e Porto de Victria (1936). V-se a a expanso da cidade para alm da Ilha do Prncipe e Vila Rubim, a Oeste; e a construo do "Novo Arrabalde", a Leste (FONTE: Memria Visual da Baa de Vitria; Arquivo Geral de Vitria; 1936).

    Novaes ainda faria um terceiro Plano de Urbanizao em 1945, tendo como consultor Alfred Agache. Nesse ltimo plano Novaes se dedica aos problemas de infra-estrutura viria e de localizao de equipamentos como estaes ferrovirias, rodovirias, hidroporto, aeroporto, estdio municipal e centro administrativo. A implantao do bairro Saldanha da Gama (atual Bento Ferreira) prevista no

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    plano, bem como a criao de avenidas marginais para ligao Leste-Oeste, que continuava sendo o principal problema virio da cidade. Os Planos de 1931 e 1945 previam o zoneamento urbano e propunham diretrizes para o uso e ocupao do solo, que s seriam oficializadas no Cdigo Municipal de 1954 (Lei 351/1954). O Cdigo limitou o nmero de pavimentos de novos prdios, medida necessria mas que chegava tarde ao centro, j crivado de arranha-cus construdos sem respeito ao tecido histrico. A dcada de 1960 marcada pela inaugurao do Porto de Tubaro (1966), cujas atividades criam um novo eixo de crescimento e desenvolvimento urbanos na direo Norte. Como conseqncia, toda a praia de Camburi urbanizada e so criados, entre outros, os bairros Jardim da Penha e Goiabeiras.

    Figura 17: Praia de Camburi provavelmente no incio da dcada de 1960, ainda inabitada (FONTE: Fotos Antigas de Vitria, 1969).

    Tambm a instalao do Campus da UFES em Goiabeiras, a partir de 1962, e o aumento paulatino do trfego no Aeroporto Eurico de Aguiar Salles contribuem para a consolidao da ocupao urbana a Norte, para alm do "arrabalde" de Muniz Freire. Como conseqncia do surgimento de novos eixos de ocupao, o Centro de Vitria comea a sofrer um esvaziamento na dcada de 1970, resultando na ociosidade, degradao e conseqente desvalorizao de seus edifcios histricos. A descoberta de reservas de petrleo no Esprito Santo, em 1969, e o incio de sua explorao comercial, na dcada de 1970, abrem um novo captulo na histria do Estado e de sua capital. O Esprito Santo finalmente atinge sua independncia financeira e passa a crescer acima da mdia nacional, atingindo, na dcada de 2000, marcas invejveis em relao renda e qualidade de vida.

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    Vitria torna-se uma metrpole moderna na dcada de 1990, completando sua integrao fsica aos municpios vizinhos de Vitria, Cariacica, Fundo, Guarapari, Serra, Viana e Vila Velha, que hoje compem a Regio Metropolitana de Vitria. Como outras metrpoles brasileiras, Vitria apresenta srios problemas estruturais: insuficincide moradia, periferizao da populao, transporte pblico insuficiente, ocupao irregular de morros e encostas, violncia, falta de saneamento bsico, falta de recursos para sade e educao, entre outros os mais notveis. Particularmente em relao aos morros e encostas, nota-se que vem se acelerando a ocupao das reas elevadas na rea central da cidade, o que traz problemas complementares para a preservao dos macios que hoje so considerados um patrimnio natural do municpio.

    Figura 18: Panormica de Vila Velha (em primeiro plano) e Vitria, evidenciando a consolidao da Regio Metropolitana de Vitria (FONTE: Flvio Lobos Martins; Memria Visual da Baa de Vitria, 1999).

    Iniciou-se, na dcada de 1990, uma mobilizao por parte dos rgos governamentais em prol da revitalizao do centro de Vitria, resultando em diversas aes para reformar ruas e praas, melhorar a acessibilidade e mobilidade urbanas e sinalizar o centro histrico com vistas ao turismo. As dcadas de 2000 e 2010, enfim, assistiram revalorizao e revitalizao de importantes espaos centrais como a Praa Costa Pereira e a Rua Baro de Itapemirim. Assistiu tambm restaurao e adaptao de importantes edifcios histricos caso do Palcio Anchieta e dos teatros Glria e Carlos Gomes. O Palcio Domingos Martins tambm objeto de projeto de restauro que em breve se concretizar. O Projeto de Restaurao e Adaptao do Imvel Sede do Iphan-ES pode, portanto, ser entendido como mais uma ao nesse processo recente de revalorizao e requalificao do centro histrico de Vitria para usos culturais e artsticos.

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    Figura 19: Mapa de Ocupao Urbana de Vitria, com manchas de ocupao em 1800, 1900, 1950, 1975 e 2000. Em cinco sculos de ocupao, a pequena vila colonial se expandiu para Norte, aumentando em mais de 40 vezes sua rea de ocupao. O mesmo ocorreu com sua populao. Se, em 1800, ela era estimada em 8.000 hab., em 1900 passara a cerca de 15.000 hab., atingindo 50.922 hab. em 1950, 133.019 hab. em 1970 e 292.304 no ano 2000. Atualmente a populao de Vitria de 325.453 hab. (IBGE 2010) (FONTE: Memria Visual da Baa de Vitria; PMV; UFES; Google Earth; Sanetec, 2011).

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    2.2.2 Histrico do Imvel Sede do Iphan-ES A Casa Rua Jos Marcelino, 203/205 localiza-se na Cidade Alta de Vitria, ponto de ocupao mais antiga da cidade. Foi provavelmente edificada no perodo colonial,27 tendo sofrido diversas intervenes e adaptaes ao longo do tempo. Sua ocupao foi predominantemente residencial, tendo sido usada como casa de moradia e/ou de aluguel. H registros de que tenha sido usada, eventualmente, para fins comerciais ou mistos. A edificao foi tombada pelo Iphan em 13 de novembro de 1967, atravs do Processo 0787-T-67, recebendo a Inscrio n 408 do Livro Histrico. O imvel foi adquirido pelo Iphan em 2006 e vem sendo usado, desde ento, como sede de sua Superintendncia no Esprito Santo, sem, contudo, ter sido adaptado para receber o novo uso institucional. Embora no tenham sido encontrados, at o momento, documentos que atestem a data de construo do Imvel Sede do Iphan-ES, algumas constataes podem ser feitas a partir da anlise da iconografia e da documentao histrica de Vitria. O terreno em questo est localizado na parte alta da cidade e junto ao adro da Catedral Metropolitana, antiga Igreja Matriz de Nossa Senhora da Vitria, rea ocupada desde meados do sc. XVI. O mapa mais antigo da cidade ao qual tivemos acesso o de Jos Antonio Caldas, de 1767. Nele, percebe-se que, naquela poca, a Rua Grande (antiga Rua Santa Luzia, atual Rua Jos Marcelino) j tinha seu traado bem definido (tracejado azul). Uma rea extensa e desocupada configurava um dos acessos entre as cidades alta e baixa, denominada Ladeira da Pedra (depois Ladeira So Diogo, atual Rua Erothildes Rosendo). De acordo com esse mapa, o terreno do Imvel Sede do Iphan-ES j estaria ocupado e edificado em 1767 (Figura 20).

    27 No Guia dos Bens Tombados do Brasil e no Catlogo de bens culturais tombados no Esprito Santo afirma-se que as casas de nmero 197 e 203/205 foram edificadas no sc. XVIII, sendo estes "os nicos exemplares de como eram as construes (residenciais) coloniais de Vitria". Guia dos bens tombados Brasil. CARRAZZONI, Maria Elisa (Coord.). 2 ed. Rio de Janeiro: Expresso e Cultura, 1987. Catlogo de bens culturais tombados no Esprito Santo. ACHIAM, Fernando Antnio de Moraes; BETTA-BELLO, Fernando Augusto de Barros. SANCHOTENE, Fernando Lima (Org.). Esprito Santo: Massao Ohno Editor, 1991.

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    Figura 20: Detalhe de uma variao da Planta da Villa da Victoria, Capital da Capitania do Espirito Santo, de Jos Antonio Caldas (1767). Em tracejado azul, a atual Rua Jos Marcelino. No quadrado vermelho, a localizao aproximada do Imvel Sede do Iphan-ES (FONTE: Arquivo Histrico do Exrcito, s/d).

    Antigos desenhos, gravuras e fotografias, dos scs. XVIII e XIX, confirmam que o entorno da Igreja Matriz era densamente ocupado, possibilitando-nos afirmar que o atual terreno do imvel sede do Iphan-ES estava edificado desde, pelo menos, meados do sc. XVIII (Figuras 21 a 23). Nessa poca, a numerao da Rua Grande era invertida, isto , iniciava-se na Ladeira da Pedra e terminava prximo ao Colgio dos Jesutas. Elmo lton afirma que o sobrado de nmero 1 da Rua Grande foi utilizado como residncia de Dom Jos Justiniano Mascarenhas Castelo Branco, Bispo do Rio de Janeiro, no ano em que este residiu em Vitria (1799), fazendo visitas pastorais pela Arquidiocese. De acordo com lton, o sobrado foi demolido no governo de Aristeu Borges de Aguiar (1928-1930).28

    28 LTON, Elmo. Logradouros Antigos de Vitria. Vitria: EDUFES, 1986. pp. 84-85.

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    Figura 21: Detalhe do Prospecto da Villa da Victoria, Capital da Capitania do Espirito Santo, de Jos Antonio Caldas (1767). Em destaque, os fundos da Igreja Matriz, que ainda no tinha torre sineira, e seu entorno densamente ocupado (FONTE: Nestor Goulart Reis, s/d).

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    Figura 22: Vista geral de Vitria, foto de Victor Frond (1860). No detalhe, o entorno densamente ocupado da Igreja Matriz, com sua torre lateral em construo. Em destaque (seta vermelha), a localizao aproximada do imvel sede do Iphan-ES (FONTE: Biblioteca Nacional, 1860).

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    Figura 23: Vila de Vitria em 1884, fotografada por Marc Ferrez. Em destaque, a ocupao no entorno da Matriz e a localizao aproximada do Imvel-sede do Iphan-ES (FONTE: Arquivo UFES, 1884).

    A Planta da Cidade de Vitria em 1895 mostra uma alterao significativa na ocupao da rea prxima ao atual Imvel Sede do Iphan-ES. Por esse mapa, v-se que a antiga rea livre em frente edificao havia sido ocupada por um quarteiro triangular, de modo que a Ladeira da Pedra (depois Ladeira So Diogo, atual Rua Erothildes Rosendo) j estava fisicamente definida. Percebe-se, pela Planta de 1895, a localizao privilegiada do atual Imvel Sede do Iphan-ES: prximo Matriz, no encontro entre as ruas mais importantes da cidade Jos Marcelino e Pedro Palcios , e em uma das principais articulaes entre Cidade Alta e a parte baixa.

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    Figura 24: Detalhe da Planta Geral da Cidade de Vitria em 1895. desenho de Andr Carloni. Em destaque (elipse laranja), a confluncia entre as ruas Jos Marcelino, Pedro Palcios e a Ladeira da Pedra. O quarteiro triangular, na rea em destaque, foi ocupado aps 1767. A seta vermelha localiza o Imvel Sede do Iphan-ES (FONTE: Arquivo Iphan; UFES, 1895).

    Sendo a numerao da Rua Jos Marcelino invertida, o atual Imvel Sede do Iphan-ES recebeu o nmero 4 e depois 8. De acordo com o livro A Casa Paterna, de Lea Carvalho Ferreira, em 1875 o imvel pertencia a herdeiros de Alexandrina Maria do Couto Rebellos que, em inventrio, deixou " para sua filha, esposa de Dr. Jos Horcio Costa. parte para D. Olindina do Couto Rodrigues, esposa de Jos Rodrigues de Souza, tendo sido as restantes 2/4 partes, vendidas ao Dr. Jos Horcio Costa".29 Os relatrios de contribuintes do imposto predial municipal de 1893 a 1896 apontam que o contribuinte do imvel Rua Jos Marcelino, nmero 8, era Jos de Mello Carvalho Muniz Freire.30 Entre 1902 e 1904, o nome do contribuinte citado nos relatrios do imposto predial municipal Jos Horcio Costa.31 Trata-se de um fato curioso e notvel. Jos Horcio Costa foi advogado e poltico, sendo o primeiro vice-presidente do Estado do Esprito Santo, nomeado por Deodoro da Fonseca em 1889. Em 1890, assumiu o posto de Presidente do Estado interinamente, no lugar de Afonso Cludio de Freitas Rosa, passando o posto a Constante Gomes Sodr em setembro do mesmo ano. Como se sabe, Jos de Mello Carvalho Muniz Freire foi o primeiro Presidente eleito do Esprito Santo, tendo presidido o Estado em dois mandatos, entre 1892 a 1896 e 1900 a 1904.32

    29 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Vitria: s/e, 1979. pp. 69-70. 30 GOVERNO MUNICIPAL DA CIDADE DE VICTORIA. Imposto Predial 1893. Cdigo 634; Imposto Predial 1894. Cdigo 635; Imposto Predial 1895. Cdigo 639; e Imposto Predial 1896. Cdigo 640. Arquivo Pblico Municipal de Vitria. Vitria/ES. 31 GOVERNO MUNICIPAL DA CIDADE DE VICTORIA. Imposto Predial 1902. Cdigo 646; Imposto Predial 1903. Cdigo 647; Imposto Predial 1904. Cdigo 648. Arquivo Pblico Municipal de Vitria. Vitria/ES. 32 Nascido em Vitria em 13 de julho de 1861, Muniz Freire estudou no Atheneu Provincial de Vitria, como era comum aos filhos da elite capixaba, indo para Recife em 1877 para estudar Direito. Retornando a Vitria em 1882, Muniz Freire passa a trabalhar como jornalista, fundando o jornal Provncia do Esprito Santo, ligado ao Partido Liberal, do qual seu pai, Manoel Feliciano Muniz Freire, foi fundador. Muniz Freire teve destacada participao como homem pblico, elegendo-se Deputado Provincial (1882-1883 e 1888-1889), Vereador (1883-1889), Governador (1892-1896 e 1900-1904) e Senador (1904-1905 e 1906-1914). Faleceu a 3 de abril de 1918.

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    Costa e Muniz Freire eram correligionrios de Afonso Cludio e membros do Partido Liberal, depois fundaram o Partido Republicano Construtor. Como visto, Jos Horcio Costa apontado como marido de uma das filhas de Alexandrina Maria do Couto Rebellos, tendo comprado metade da casa em 1875. Parece vivel supor, portanto, que Jos Horcio Costa tenha oferecido o sobrado da Rua Jos Marcelino para que Muniz Freire ali residisse ou trabalhasse durante seu primeiro mandato presidencial. O fato do nome de Muniz Freire surgir como "contribuinte" do sobrado da rua Jos Marcelino pode indicar que ele de fato ali residiu ou que tenha alugado o sobrado para algum partidrio de seu governo ou para alguma atividade de seu partido. Dados os limites desta pesquisa, no foram encontrados documentos de poca que registrassem o local de residncia dos governantes capixabas no incio do perodo republicano, embora se imagine que tenham fixado residncia na sede do Governo (atual Palcio Anchieta). Lea Carvalho Ferreira afirma que, em 26 de novembro de 1902, o prdio foi hipotecado por 12 contos de ris para garantia em conta-corrente ao Sr. Oliveira Santos e, em 20 de agosto de 1904, vendido por 6 contos de ris pelos herdeiros de Alexandrina Rebello a Jos Ribeiro Fernandes Coelho.33 Os relatrios de contribuintes do imposto predial municipal de 1911 a 1914 confirmam que o contribuinte do imvel, naquele momento, era Jos Ribeiro Fernandes Coelho.34 Foram encontrados outros registros de imveis situados no centro de Vitria pertencentes a Jos Ribeiro Fernandes Coelho e sua esposa, Maria Pinto de Oliveira Coelho. Alguns desses imveis, incluindo o sobrado, eram imveis de renda, alugados pelos proprietrios a terceiros. O relatrio de contribuintes municipais de 1914 confirma essa hiptese, apontando a existncia de um inquilino, de nome Claro Pitanga, na casa de nmero 8 da Rua Jos Marcelino.35 Teria sido nessa poca (quartel inicial do sc. XX) que o Professor Amancio Pinto Pereira36 veio a morar, como inquilino, no sobrado da Rua Jos Marcelino. Lea Carvalho Ferreira afirma que Amancio Pereira "lecionou em sua residncia, que era o ponto de convergncia da poca, no primeiro andar do Prdio sito rua Jos Marcelino n 8, anteriormente n 4, onde nasceu sua filha Maria Leonidia Pereira dos Santos [filha do segundo casamento, com Joana do Nascimento Pereira]".37 Datam do incio do sc. XX as fotos mais antigas em que se pode reconhecer nitidamente o sobrado da Rua Jos Marcelino. So fotos panormicas, tomadas dos morros do entorno, que enquadram a "Cidade-Prespio". Nessas fotos, possvel reconhecer principalmente o quintal da casa, o fundo do sobrado e suas alteraes ao longo do tempo (Figuras 25 a 27).

    33 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit.. pp. 69-70. 34 GOVERNO MUNICIPAL DA CIDADE DE VICTORIA. Imposto Predial: 1914. Cdigo 650. Arquivo Pblico Municipal de Vitria. Vitria/ES. 35 Idem. 36 Amancio Pinto Pereira nasceu em Vitria/ES em 8 de abril de 1862 e a faleceu a 13 de agosto de 1918. Foi aluno do Professor Aristides Barcelos Freire no Externato do mesmo nome. Fez o Curso Preparatrio no Atheneu Provincial, formando-se em Mestre-Escola no Colgio Normal. Descrito por Afonso Cludio como homem de origem humilde, se alou a redator e fundador de dois jornais e colaborador de muitos outros (ELTON, 1987, p. 33); at, finalmente, tornar-se provavelmente o primeiro dramaturgo brasileiro a escrever peas destinadas especificamente ao pblico infantil (GAMA FILHO apud NEVES, 2000, p. 5). Cf.: CLAUDIO, A. Histria da literatura esprito-santense. Porto: [s. n.], 1912. 37 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit.. p. 59.

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    Figura 25: Foto Vista geral da cidade de Vitria, onde se observa a antiga Igreja Matriz (A) e a Capela de N. Sra. da Conceio (B). Trata-se, portanto, de foto anterior a 1896, ano em que a pequena capela de Conceio foi demolida para construo do Teatro Melpmene. Em destaque (seta vermelha), os fundos (Nordeste) do sobrado do Iphan-ES. As pilastras do poro so altas e feitas de pedra. No h janelas no pavimento Trreo. No pavimento Superior, parece haver um quarto com janela na extremidade esquerda (atual cmodo 24). O telhado apresenta duas guas contnuas. Notar ainda, direita, o sobrado com camarinha, atual nmero 197 (FONTE: Arquivo UFES; Memria Visual da Baa de Vitria, ca. 1904).

    A

    B

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    Figura 26: Foto da Cidade Alta (1905), onde se observa a antiga Igreja Matriz (A) e o Teatro Melpmene (B). Em destaque (seta vermelha), os fundos do sobrado do Iphan-ES. Em relao foto anterior, nota-se o surgimento de pequenas janelas no pavimento Trreo. Observa-se, no pavimento Superior, cinco janelas, a da esquerda solitria e dois pares casados direita. Observa-se tambm o desgaste do reboco e da pintura no centro da parede e sob as janelas (FONTE: Arquivo UFES; Memria Visual da Baa de Vitria, 1905).

    Em 1911, Jos Maria de Carvalho e sua esposa, Anna Pereira de Carvalho, teriam se mudado para o sobrado de nmero 8 com sua famlia,38 naquele momento constituda pelos filhos Urbano, Euthlia,

    38 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit. p. 69.

    AB

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    Nilo e Jos. Lea Carvalho Ferreira afirma que Jos Ribeiro Fernandes Coelho e sua esposa os proprietrios do imvel foram padrinhos do filho caula de Jos Maria de Carvalho, de nome Jos (dos Passos Carvalho), que nascera em 1903.39 Por essa informao percebe-se que o vnculo afetivo entre as famlias Coelho e Carvalho era antigo, tendo existido desde que os Carvalho se mudaram de Cariacica para Vitria, em 1903. Em 30 de maro de 1922, Jos Ribeiro Fernandes Coelho vendeu o imvel para Jos Maria de Carvalho.40 Com o falecimento de Jos Maria de Carvalho, em 1931, a propriedade do imvel passa viva, Anna Pereira de Carvalho, e seus herdeiros, os filhos do casal: Herminia Carvalho, Urbano Carvalho, Euthalia Carvalho Martins da Cunha e Jos dos Passos Carvalho. Euthalia cedeu sua parte do imvel em benefcio de sua me, conforme Termo de Desistncia registrado no Cartrio do Segundo Ofcio da capital.41 Lea Carvalho Ferreira afirma que, em 1931, foi feita a primeira reforma da famlia Carvalho no sobrado, na qual "esfarelou-se parte do miolo, ficando quase intocvel uma das partes que a distingue: trs sacadas de madeira formando balces, o rebordo do telhado que puxa para a fachada as telhas coloniais e a curvatura dos portais (...).42 Consta nos arquivos da Prefeitura, entretanto, apenas um registro de licena para obras no sobrado de nmero 8 da Rua Jos Marcelino, datado de 30 de maro de 1937, com a finalidade de "armao", expedida em nome de Jos dos Passos Carvalho, que assinara como proprietrio do imvel. Por essa licena, a Prefeitura recolheu a importncia de dezoito mil e setecentos ris.43 Trata-se provavelmente da obra feita na fachada dos fundos do sobrado, na qual foram substitudos antigos elementos construtivos em pedra e madeira pela estrutura (armao) em concreto armado ainda hoje existente.

    39 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit., p. 68. 40 Livro de Registro Geral 20AH. Matrcula 10368. Transcrita no Livro 3-A sob nmero 3207 de ordem, em 31 de maro de 1922. Cartrio do 1 Ofcio da Comarca de Vitria. De acordo com Lea Ferreira, a compra foi registrada no "livro 3 pag. 450 sob nmero de ordem 3.207 no Cartrio do Registro Geral desta Comarca". Cf. FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit., pp. 69-70. 41 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit., pp. 70-71. 42 FERREIRA, Lea Carvalho. A Casa Paterna. Op. Cit., p. 14. 43 REGISTRO DE LICENA PARA OBRAS. Vitria, mar. 1937. Cdigo 552. Arquivo Pblico Municipal de Vitria. Vitria/ES.

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    Figura 27: Vista da Catedral em construo. Em destaque, o sobrado na poca das reformas empreendidas pela famlia Carvalho. O esquema de aberturas similar ao atual, exceo feita porta e escada externa que hoje do acesso ao Poro. O telhado apresenta uma espcie de camarinha central e, esquerda, pode-se notar uma clarabia sobre o "quarto da av" de Lea Carvalho Ferrreira. Notar o quintal em desnvel, com o abacateiro relatado por Lea, e as vigas de madeira que sustentavam a parede dos fundos da edificao (FONTE: Arquivo Geral de Vitria, s/d).

    Outras fotos revelam como eram as laterais e a frente da edificao nos anos iniciais do sc. XX. Uma diferena significativa notada nas fotos antigas a presena de um corpo lateral, que em determinado momento teve dois pavimentos, e fazia parte do mesmo imvel (Figuras 28 a 31). Lea Carvalho Ferreira afirma que nessa casa residiam seus parentes maternos. Isso talvez explique porque, nos registros de impostos prediais da Prefeitura, continua constando, no ano de 1929, o nome de Jos Horcio Costa como "contribuinte" de metade do imvel. A outra metade seria da "herdeira" Manoela Rebello. Parte do imvel estaria alugada, naquele momento, ao inquilino Cyrillo Gomes.44

    44 GOVERNO MUNICIPAL DA CIDADE DE VICTORIA. Imposto Predial: 1929. Cdigo 656. Arquivo Pblico Municipal de Vitria. Vitria/ES.

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