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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu MESTRADO EM DIREITO MARCELLA GOMES DE OLIVEIRA RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA E A MEDIAÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA CURITIBA 2015

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu – MESTRADO EM DIREITO

MARCELLA GOMES DE OLIVEIRA

RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA E A MEDIAÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA

CURITIBA 2015

MARCELLA GOMES DE OLIVEIRA

RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA E A MEDIAÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA

Dissertação a ser apresentada em Banca Pública de Defesa para aprovação no Programa de Mestrado em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba, mediante orientação.

CURITIBA 2015

MARCELLA GOMES DE OLIVEIRA

RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA E A MEDIAÇÃO DO ESTADO NA

ATIVIDADE ECONÔMICA

Dissertação aprovada como requisito final para a obtenção de grau de Mestre em

Direito Empresarial e Cidadania do Programa de Mestrado em Direito Empresarial e

Cidadania do Centro Universitário Curitiba, pela Banca Examinadora formada pelos:

Orientador: Prof. Dr. Fernando Gustavo Knoerr:

______________________________

Membro interno: Prof. Dra. Viviane Coêlho de Sellos-Knoerr:

______________________________

Membro externo: Prof. Dr. Vladimir Oliveira da Silveira:

______________________________

Curitiba, 07 de julho de 2015.

Aos meu pais, pelo suporte, força e incentivo

que me conduziram por esse caminho.

AGRADECIMENTOS

Todo o esforço e dedicação para a realização do mestrado, ao final, traz a

oportunidade para agradecer aos que estiveram envolvidos nos bastidores de

alguma forma.

Agradeço imensamente meu orientador Fernando Gustavo Knoerr e co-

orientadora Viviane Coêlho de Séllos-Knoerr, pela oportunidade e condução

ideológica que compartilhamos durante todo esse período, desde o início até a

finalização deste trabalho. Fico muito feliz por ter tido a convivência em sala de aula

e fora dela, com os quais permanece uma amizade muito querida.

Meu pai Marco Antônio Gomes de Oliveira merece todos os agradecimentos

possíveis, não só pela educação exemplar que tive, mas pelo imenso prazer que é

ser sua filha, todo o amor e gratidão do mundo não seriam capazes de exprimir tudo

o que senti convivendo ao seu lado, desde o primeiro momento, a escolha das

escolas, faculdade e agora mestrado, todas as orientações e revisões dos textos

que escrevia, o apoio para que eu participasse de inúmeros eventos, por fim serão

recompensados com um título dedicado com muito esforço para ele que terá um

lugar permanente no meu coração.

Agradeço à minha mãe Elaine Noeli Destro pelo espelho de força e foco, por

ter permitido com que eu fosse cada vez mais longe aos seus cuidados, é quem me

ensinou que mesmo quando acontecem imprevistos, são nesses momentos em que

temos que levantar cada vez mais fortes. Por toda história que viveu, me mostrou

que o conhecimento é a única coisa que permanece, assim, investiu tremendamente

em minha educação e no meu caráter, palavras de agradecimento são poucas para

expressar a influência de minha mãe em minha vida.

Agradeço muito minha grande amiga e irmã de alma Fernanda Adams, que aos

poucos foi ganhando espaço em minha vida e me ajudando de formas que eu nem

pensava que fossem possíveis. Divido com ela a paixão pelos estudos e pela

afinidade que temos pelos mesmos temas, com o passar do tempo se tornou uma

pessoa essencial em minha vida, tanto na construção ideológica deste trabalho,

como em relação aos planos que temos em comum, a presença se tornou

indispensável para o crescimento de espírito e evolução de caráter recíprocos,

palavras não são suficientes para agradecer o esforço e dedicação que vieram com

nossa amizade, pois os amigos são a família que escolhemos.

Dotado de inteligência, é cada um responsável tanto pelo seu crescimento

como pela sua salvação. Ajudado, por vezes constrangido, por aqueles que o

educam e rodeiam, cada um, sejam quais forem as influências que sobre ele se

exerçam, permanece o artífice principal do seu êxito ou do seu fracasso:

apenas com o esforço da inteligência e da vontade, pode cada homem crescer

em humanidade, valer mais, ser mais.

(PAPA PAULO VI)

RESUMO

O presente trabalho possui como objetivo realizar a ligação entre a intervenção estatal por meio da atividade econômica e responsabilidade social da empresa. Desta forma, mostra-se extremamente necessário que se faça a construção histórica de: sociedade, poder, Estado e Direito, para que depois seja possível mencionar acerca da ordem econômica, bem como das noções de Direito e Economia. Verifica-se a intervenção estatal devido ao extremo poder que o Estado exerce, de forma que deve ser observada justiça social, como finalidade da ordem econômica. Antes de trazer o conceito de responsabilidade social da empresa, deve-se definir a importância da função social, assim, após as construções conceituais do tema analisa-se a responsabilidade social da empresa como dever, ainda que o objetivo final da empresa seja o lucro deve ser observado o princípio da dignidade da pessoa humana, para compreender a justiça social inserida no Estado Moderno. Palavras-chave: ordem econômica, justiça social, intervenção estatal, função social da empresa, responsabilidade social da empresa.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 9 2. SOCIEDADE, DIREITO, ESTADO E TRIBUTOS ............................................ 12 2.1. SOCIEDADE, PODER E DESENVOLVIMENTO .......................................... 12 2.2. DIREITO ........................................................................................................ 20 2.3. ESTADO ........................................................................................................ 28 2.4. TRIBUTO ....................................................................................................... 43 3. ORDEM ECONÔMICA ..................................................................................... 47 3.1. ORDEM ECONÔMICA .................................................................................. 47 3.2. ATUAÇÃO DO ESTADO E O DIREITO ECONÔMICO ................................. 54 3.3. MODELO ECONÔMICO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO ........................ 59 3.4. ORDEM ECONÔMICA CONSTITUCIONAL ................................................. 62 4. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA ....................... 65 4.1. NORMA JURÍDICA – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA REGULAMENTADA À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ........................................................................... 65 4.2. FISCALIDADE E EXTRAFISCALIDADE ....................................................... 70 4.3. INTERDISCIPLINARIEDADE NA RELAÇÃO DIREITO E ATIVIDADE ECONÔMICA – INTERVENÇÃO ESTATAL......................................................... 71 4.4. INTERVENÇÃO DO ESTADO E O BEM-ESTAR ......................................... 76 5. RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA ............................................. 80 5.1. O ESTADO E A ATIVIDADE EMPRESARIAL SOB A ÓTICA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA ......................................................................................... 80 5.2. FUNÇÃO SOCIAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL NO ÂMBITO DO DIREITO EMPRESARIAL .................................................................................................... 84 5.3. RELAÇÃO ENTRE RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA E A INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA ............................. 93 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 101 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 115

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1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa demonstrar a relação entre a responsabilidade social

da empresa e a intervenção estatal (entendida como mediação) na atividade

econômica, assim, trazem-se diversos conceitos que se relacionam entre si para o

entendimento do tema proposto como um todo.

Desta forma, o primeiro capítulo do trabalho reflete a importância histórica

para a concepção das ideias de sociedade, Direito e Estado. Neste sentido, o

surgimento da sociedade ocorreu a fim de suprir uma vontade humana, visando um

relacionamento harmônico e recíproco dentro de um pluralismo social, exprimindo-se

em um poder social.

Já a ordem jurídica de uma sociedade se expressa institucionalmente através

das normas positivas atingidas por uma classe que alcançou o poder político, capaz

de transformar seus próprios sentimentos de desrespeito social anteriormente

vivenciados, aparecendo neste momento as normas jurídicas positivas, ou seja, toda

ordem jurídica pública representa a corporificação dos sentimentos particulares de

injustiça.

Acerca do Direito, traz-se sua concepção desde seu surgimento, uma vez que

ele aparece com o viés de regular as sociedades, já que o Direito é o instrumento

das regras morais, concebido como meio de impor deveres de moralidade, portanto,

não há sociedade sem direito pela função que este exerce sobre aquela.

Ainda abarca-se a figura do Estado, primeiramente com sua função

onipotente, já que regula a liberdade daqueles que estão submetidos a ele, e

também no sentido de que o interesse público deve ser sempre superior ao

interesse privado, pois o Estado é poder, por isso seus atos obrigam, mas é poder

abstrato e por isso não é afetado pelas modificações que atingem seus agentes,

sendo sua imagem de ordem o próprio fundamento do poder, uma vez que o poder é

mais do que essencial para o Estado, ele é o próprio Estado como expressão

ordenada da ideia que prepondera no grupo.

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Importante ainda trazer diante da ideia de direito a ideia de justiça, no sentido

de que esta se apresenta como um setor da realidade atingido pela moral. A palavra

justiça é polissêmica e a virtude de justiça é sempre uma atividade a serviço da

Ordem, desta forma, a justiça deve ser entendida como a soma de todas as virtudes.

Portanto, verifica-se que o Estado deve subordinar-se ao direito, que deve

observar a justiça, de modo que o Estado deve cumprir as normas jurídicas da

mesma forma como devem fazer os particulares, assim, o Estado age e atua por

meio do Direito, significando que o exercício do poder só pode se efetivar por meio

de instrumentos jurídicos institucionalizados pela ordem jurídica.

No segundo capítulo será abordada a ordem econômica, de modo que sua

conceituação é primordial para a compreensão do tema que vamos estudar, pois se

utiliza da premissa dos institutos positivados na Constituição Federal para seu

entendimento, ou seja, ao conjunto normativo positivado na Constituição Federal

que interfere na atividade econômica atribui-se a designação de constituição

econômica, entendida como um conjunto de normas constitucionais que regulam

fatos que repercutem no modo de ser econômico da sociedade, já que é a regulação

jurídica da economia em seu sentido mais amplo.

Observa-se ainda a atuação do Estado e o direito econômico, uma vez que a

busca pelo desenvolvimento impõe a aliança entre os setores público e privado no

escopo de suas funções, estando presente na Constituição Federal o tratamento

peculiar para a atividade econômica e serviço público, especialmente no art. 173 da

CF, que prevê os casos em que o Estado pode explorar a atividade econômica.

Sob a perspectiva do Direito, analisando a interdependência do Estado e

Economia, é que aparece o Direito Econômico, que possui como objeto o tratamento

jurídico da política economia e do agente que dela participe, surgindo a necessidade

de pensar o Direito como um nível do todo social como mediação específica e

necessária das relações econômicas.

A empresa é uma das molas propulsoras do capitalismo e certamente o

objetivo social de cada ente empresarial é o lucro, contudo, não se pode perder de

vista que a obtenção do lucro deve observar a solidariedade mencionada

anteriormente. A atividade empresarial deve ter esse viés do lucro, sendo

devidamente orientada ou direcionada à perspectiva da solidariedade social.

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Quanto à regulação no Direito, esta se refere no sentido de o Direito ser uma

ciência deôntica, voltada ao dever-ser, sendo que o conceito de regulação jurídica

decorre dos textos legais, especialmente o constitucional, assim a intervenção

estatal realizada por meio da regulação faz referência a uma atividade, edição de um

ato normativo e produto dessa atividade para os efeitos do ato administrativo editado

e seu resultado jurídico produzido, sendo que tanto a atividade quando o resultado

são conceitos definidos pela finalidade.

A regulação nos termos do art. 174 ocorre não apenas pela função de

fiscalização, mas também pela função de incentivo (fiscalização refere-se à função

administrativa ordenadora; incentivo refere-se à função administrativa fomentadora).

O reconhecimento da interferência no comportamento dos demais por um agente

econômico é garantido pela CF conforme seu art. 173, §4º, que proíbe o abuso do

poder econômico.

Desta forma, o sistema jurídico brasileiro tem como valor fundamental a

liberdade, de modo que a regulação administrativa refere-se à atividade econômica,

à interferência da Administração Pública sobre a atividade econômica, assim, a

regulação por ordenação consiste na restrição do direito fundamental à livre

iniciativa econômica concretizada pela atuação da Administração Pública.

No terceiro e quarto capítulos será abordada a questão da intervenção do

Estado, necessário mencionar que a intervenção estatal deve ser compreendida na

forma de mediação, assim, uma vez que se analisam os institutos acima

mencionados com a finalidade da verificação da intervenção estatal na atividade

econômica, introduz-se a figura da empresa socialmente responsável capaz de

atender à justiça social. Deve-se observar, ainda, a dignidade da pessoa humana,

que busca atingir o objetivo de fomentar a solidariedade social sustentada pela

Constituição Federal em vigência e pela ideia do Estado social.

Verifica-se, portanto, a importância da figura do Estado como forma de

incentivar a observância das normas e regras conduzidas pelo Direito. Assim, o

presente trabalho é bastante conceitual, na medida em que observa a relação de

cada instituto apresentado para a finalidade de atingir a justiça social, a construção

da importância da sociedade, Estado, Direito e atividade econômica, que servem de

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base para a introdução do conceito de responsabilidade social da empresa,

intrinsecamente ligada à função social da empresa.

2. SOCIEDADE, DIREITO, ESTADO E TRIBUTOS

2.1. SOCIEDADE, PODER E DESENVOLVIMENTO

A sociedade pode ser considerada o fruto de uma necessidade ou da vontade

humana à medida que se desenvolveram os meios de controle e aproveitamento da

natureza. A invenção e aperfeiçoamento de instrumentos de trabalho e de defesa

tornou a sociedade cada vez mais complexa, chegando a um pluralismo social

complexo. Assim, para se obter um relacionamento recíproco e harmônico dentro do

pluralismo social deve ser estabelecida uma caracterização geral das sociedades,

quais sejam: uma finalidade ou valor social; manifestações de conjunto ordenadas; e

o poder social.

A ordem jurídica de uma sociedade é apenas a expressão institucional das

normas positivas, em que uma classe que alcançou o poder político foi capaz de

transformar seus próprios sentimentos de desrespeito social anteriormente

vivenciados e, por esse motivo, inversamente, toda classe oprimida que tenta por

seu turno, lutar contra o sistema jurídico seletivo da ordem social dominante, precisa

ter transformado criativamente as representações morais, de início apenas

negativas, em normas jurídicas positivas, antes de poderem concorrer pelo poder

político, ou seja, toda ordem jurídica pública representa, por conseguinte, somente a

corporificação dos sentimentos particulares de injustiça com que está dotada aquela

classe que dispõe do poder político por razões moralmente contingentes.

(HONNETH, 2003, p. 243-244)

O poder social, mencionado da caracterização geral das sociedades, destaca-

se relevando que o problema do poder é considerado como o mais importante para

qualquer estudo da organização e do funcionamento da sociedade, pois há quem o

considere o núcleo de todos os estudos sociais.

O poder é um fenômeno social e indica duas ou mais vontades, sendo uma

delas predominante, ainda, o poder necessita da existência de vontades submetidas.

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Considera-se o poder sob dois aspectos, como relação quando se procede ao

isolamento artificial de um fenômeno para efeito de análise, verificando qual a

posição dos que nele intervêm, ou como processo, quando se estuda a dinâmica do

poder.

Desta forma, verifica-se que:

A maioria dos autores que têm estudado o poder o reconhece como necessário à vida social, embora variando enormemente as justificativas para sua existência e as considerações sobre aspectos relevantes. Um argumento constante, de ordem histórica, é que o poder sempre existiu, não havendo qualquer documento, mesmo relativo aos períodos pré-históricos, indicando a possibilidade de ter existido, em alguma época a sociedade humana desprovida de poder. As teorias negadoras do poder, quando se referem ao seu aparecimento depois de um certo período de vida social, apoiam-se apenas em suposições e hipóteses, não apontando qualquer dado concreto que sirva de comprovação, ou mesmo de indício, de que tenha existido realmente aquele período anárquico. A observação do comportamento humano, em todas as épocas e lugares, demonstra que mesmo nas sociedades mais prósperas e bem ordenadas ocorrem conflitos entre indivíduos ou grupos sociais, tornando necessária a intervenção de uma vontade preponderante, para preservar a unidade ordenada em função dos fins sociais. Num amplo retrospecto histórico, o que se verifica é que, nas sociedades mais primitivas, a ideia de vontade preponderante, ou de poder, quase se confunde com a ideia de força material (DALLARI, 2007, p. 41-42).

No decorrer dos séculos os homens tornaram-se mais conscientes e a

superioridade baseada na força material tornou-se precária, identifica-se, portanto,

que as configurações atuais do poder e seus métodos de atuação baseiam-se no

sentido de que o poder, reconhecido como necessário, quer o reconhecimento de

sua legitimidade, obtido por meio do consentimento dos que a ele se submetem.

Embora o poder não chegue a ser puramente jurídico ele age

concomitantemente com o direito, buscando uma coincidência entre os objetivos de

ambos.

Ainda há um processo de objetivação que dá precedência à vontade objetiva

dos governados ou da lei, desaparecendo a característica de poder pessoal,

atendendo a uma aspiração à racionalização, desenvolvendo-se uma técnica do

poder que o torna despersonalizado – poder do grupo ou poder do sistema – ao

mesmo tempo em que busca meios sutis de atuação, coloca a coação como uma

forma extrema.

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O processo e racionalização se torna mais intenso na modernidade através

da institucionalização do processo técnico e científico, consolidando o poder político

apoiado na razão técnica, deste modo, o poder se autonomiza e busca sua

legitimidade na técnica e na ciência.

Acerca da sociedade empresarial e judiciária, ambas são as faces da ordem

econômica neoliberal, instrumentalizando o direito por meio da política e economia,

desse modo, na sociedade neoliberal percebe-se que a racionalidade governamental

causa um impacto na vida em sociedade através de uma tecnologia ambiental de

tolerâncias e administração de perdas e ganhos, observa-se que:

O neoliberalismo propõe uma retirada do Estado da economia, pois parte da mesma premissa do liberalismo: a liberdade de mercado. Porém, não adota integralmente o modelo liberal, por isso o prefixo “neo”. Defende um mercado livre e competitivo, mas aceita um controle e regulação do Estado na economia. [...] O modelo reconhece que o mercado não se auto-regula, mas as falhas criadas pelo intervencionismo estatal no Estado Social foram excessivas. Cabe ao Estado regular o mercado e corrigir as suas falhas, as quais causarão a iniquidade na distribuição dos lucros e na incidência de custos maiores sobre os setores mais necessitados. (LOYOLA, 2008, p. 35)

Cabe, ainda, identificar as sociedades políticas, que não se prendem a um

objetivo determinado e não se restringem a setores limitados da atividade humana,

elas buscam integrar todas as atividades sociais que ocorrem no seu âmbito, assim,

o político é influenciado e condicionado pela totalidade do ser humano e influencia e

condiciona essa totalidade, acrescentando que o objeto específico da política

consiste sempre na organização de oposições de vontade sobre a base de uma

comunidade de vontade.

As sociedades políticas são aquelas que, visando a criação de condições

para a consecução dos fins particulares de seus membros, ocupam-se da totalidade

das ações humanas, coordenando-as em função de um fim comum. Forma-se assim

a primeira noção de Estado, que é uma sociedade política.

O Estado é poder, por isso seus atos obrigam, mas é poder abstrato e por

isso não é afetado pelas modificações que atingem seus agentes, se ele dura tanto

apesar das contingências históricas é em razão da encarnação de uma ideia, sendo

sua imagem de ordem o próprio fundamento do poder e, apesar dessa concepção,

no Estado o poder se reveste de características que não são encontradas em outro

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lugar, seu modo de enraizamento no grupo lhe dá uma originalidade que repercute

na situação dos governantes e sua finalidade o liberta da arbitrariedade das

vontades individuais, seu exercício obedece a regras que limitam seu perigo. O

poder é mais do que essencial para o Estado, ele é o próprio Estado como

expressão ordenada da ideia que prepondera no grupo, a convivência. Desta forma:

[...] o verdadeiro sentido de poder ou dominação estatal não é o que uns homens estão submetidos às normas. E quando se fala no poder do Estado como poder coativo isto quer dizer que as normas estatais, determinando certos comportamentos, prescrevem a coação para o caso de desobediência, isto porque são normas jurídicas. Mas essa ordem estatal é objetiva, porque tem validade objetiva, independendo dos homens que constituem o Estado. Por último, rejeitando a ideia de que o poder do Estado seja irresistível porque ninguém se subtrai ao seu império, Kelsen procura demonstrar que há um poder de dominação irresistível, em sentido estritamente jurídico. De acordo com seu ponto de vista há uma distinção, realmente importante, que pode ser feita entre a ordem estatal e as demais: enquanto que estas são ordens cujo âmbito de validade se acha ou pode achar-se limitado no espaço e no tempo por uma ordem superior, porque esta determina as condições e até o conteúdo de sua validade, a ordem estatal é uma ordem suprema, que não sofre aquelas limitações. Neste sentido ela é irresistível e onipotente, porque pode aceitar todos os conteúdos imagináveis, uma vez que são ilimitadas suas possibilidades na determinação de seu próprio conteúdo. (DALLARI, 2007, p. 113)

Não se pode admitir o poder como estritamente político, também não se

sustenta que ele seja exclusivamente um poder jurídico.

A observação de qualquer sociedade humana revela a presença de uma

ordem jurídica e de um poder, assim, organizar-se é constituir-se com um poder,

assinalando que como não há organização sem presença do direito não existe poder

que não seja jurídico, ou seja, não há poder que não seja suscetível de qualificação

jurídica.

O poder é jurídico no sentido de estar relacionado a uma graduação de

juridicidade, representado pela força ordenadamente exercida como meio para

atingir certos fins, mesmo que o poder se apresente com a aparência de mero poder

político ele já participa da natureza jurídica, e quando atinge o grau máximo de

juridicidade continuará sendo político, capaz de agir com plena eficácia e

independência para a consecução de objetivos não-jurídicos.

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Acerca do desenvolvimento traz-se o que consta na encíclica Populorum

Progressio, escrita pelo Papa Paulo VI (1982, p. 11) sobre o desenvolvimento dos

povos:

Ser libertos da miséria, encontrar com mais segurança e subsistência, a saúde, um emprego estável; ter maior participação nas responsabilidades, excluído qualquer opressão e situação que ofendam a sua dignidade de homens; ter maior instrução; numa palavra, realizar, conhecer e possui mais, para se mais: tal é a aspiração dos homens de hoje, quando um grande número dentre eles estão condenados a viver em condições que tornam ilusório este legítimo desejo. Por outro lado, os povos que ainda há pouco tempo conseguiram a independência nacional, sentem a necessidade de acrescentar a esta liberdade política um crescimento autônomo e digno, tanto social como econômico, a fim de garantirem aos cidadãos o seu pleno desenvolvimento humano e de ocuparem o lugar que lhes pertence no concerto das nações.

Porém, percebe-se que existe um choque entre as civilizações, no sentido

que o conflito entre as gerações agrava um dilema que se exprime em ou guardar

instituições e crenças atávicas e renunciar ao progresso, ou então abrir-se às

técnicas e civilizações vindas de fora e rejeitar toda a sua riqueza humana. A visão

cristã de desenvolvimento pelo Papa Paulo VI (1982, p. 16) aparece no seguinte

sentido:

O desenvolvimento não se reduz a um simples crescimento econômico. Para ser autêntico, deve ser integral, quer dizer, promover todos os homens e o homem todo, como justa e vincadamente sublinhou um eminente especialista: “não aceitamos que o econômico se separe do humano; nem o desenvolvimento, das civilizações em que ele se incluiu. O que conta para nós, é o homem, cada homem, cada grupo de homens, até se chegar à humanidade inteira”.

Para se chegar a uma autorrelação bem sucedida o ser humano depende do

reconhecimento intersubjetivo de suas capacidades e de suas realizações; se uma

tal forma de assentimento social não ocorre em alguma etapa de seu

desenvolvimento, abre-se na personalidade como que uma lacuna psíquica, na qual

entram as reações emocionais negativas como a vergonha ou a ira, daí a

experiência de desrespeito estar acompanhada de sentimentos afetivos que, em

princípio, podem revelar ao indivíduo que determinadas formas de reconhecimento

lhe são socialmente denegadas (HONNETH, 2003, p. 220).

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O desenvolvimento deve ser entendido na visão do desenvolvimento do

homem inserido na sociedade e também nas relações entre sociedades diversas,

veja-se:

Mas cada homem é membro da sociedade: pertence à humanidade inteira. Não é apenas tal ou tal homem; são todos os homens, que são chamados a este pleno desenvolvimento. As civilizações nascem, crescem e morrem. Assim como as vagas na enchente da maré avançam sobre a praia, cada uma um pouco mais que a antecedente, assim, a humanidade avança no caminho da história. Herdeiros das gerações passadas e beneficiários do trabalho dos nossos contemporâneos, temos obrigações para com todos, e não podemos desisteressar-nos dos que virão depois de nós aumentar o círculo da família humana. A solidariedade universal é para nós não só um fato e um benefício, mas também um dever (PAPA PAULO VI, 1982, p. 18).

Os sujeitos humanos não podem reagir de modo emocionalmente neutro às

ofensas sociais, representadas pelos maus-tratos físicos, pela privação de direitos e

pela degradação, os padrões normativos do reconhecimento recíproco têm uma

certa possibilidade de realização no interior do mundo da vida social em geral; pois

toda reação emocional negativa que vai de par com a experiência de um desrespeito

de pretensões de reconhecimento contém, novamente em si, a possibilidade de que

a injustiça infligida ao sujeito se lhe revele em termos cognitivos e se torne o motivo

da resistência política (HONNETH, 2003, p. 224).

O desenvolvimento deve ainda observar a dignidade, veja-se:

Desejaríamos ser bem compreendidos: a situação atual deve ser enfrentada corajosamente, assim como devem ser combatidas e vencidas as injustiças que ela comporta. O desenvolvimento exige transformações audaciosas, profundamente inovadoras. Devem empreender-se, sem demora, reformas urgentes. Contribuir para elas com a sua parte, compete a cada pessoa, sobretudo àquelas que, por educação, situação e poder, têm grandes possibilidades de influxo. Dando exemplo, tirem dos seus próprios bens, como disseram alguns dos nossos irmãos no episcopado. Responderão, assim, à expectativa dos homens e serão fiéis ao Espírito de Deus, porque foi “o fermento evangélico que suscitou e suscita no coração do homem uma exigência incoercitível de dignidade”. (PAPA PAULO VI, 1982, p. 28).

A regulação social, no sentido de solucionar os problemas da população

flutuante, que não será integrada ao mercado e ao consumo, aparece através da

preocupação que recai na garantia da possibilidade da existência de um patamar

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que possa permitir o desenvolvimento da sociedade empresarial, sem ignorar os

indivíduos pertencentes à sociedade como um todo.

Conforme Dalmo Dallari:

[...] verifica-se que o Estado, como sociedade política, tem um fim geral, constituindo-se em meio para que os indivíduos e as demais sociedades possam atingir seus respectivos fins particulares. Assim, pois, pode-se concluir que o do Estado é o bem comum, entendido este como o conceituou o Papa João XXIII, ou seja, o conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana. Mas se essa mesma finalidade foi atribuída à sociedade humana no seu todo, não há diferença entre ela e o Estado? Na verdade, existe uma diferença fundamental, que qualifica a finalidade do Estado: este busca o bem comum de um certo povo, situado em determinado território. Assim, pois, o desenvolvimento integral da personalidade dos integrantes desse povo é que deve ser o seu objetivo, o que determina uma concepção particular de bem comum para cada Estado, em função das peculiaridades de cada povo. (DALLARI, 2007, p. 108)

O desenvolvimento humano ocupa um lugar central no debate sobre o

desenvolvimento desde 1990, levando em consideração a importância das

oportunidades que as crianças e jovens têm de acesso à educação, saúde e

moradia digna, ou seja, de desfrutar uma longa vida produtiva que lhes autorize

manter uma família. A maior prova disso é a relevância do Relatório Mundial de

Desenvolvimento Humano publicado pela PNUD (Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento) a partir de 1990. (OLIVEIRA, 2006, p. 27)

Em abordagens mais amplas o desenvolvimento aparece como o crescimento

econômico acompanhado de melhoria na qualidade de vida, de maneira a melhorar

os indicadores de bem-estar econômico e social. (OLIVEIRA, 2006, p. 16). Acerca

do desenvolvimento econômico traz-se a dificuldade pela conceituação econômica

do termo desenvolvimento, assim:

Os economistas vêem surgir a necessidade de elaborar um modelo de desenvolvimento que englobe todas as variáveis econômicas e sociais. Sob o prisma econômico, “desenvolvimento é, basicamente, aumento do fluxo de renda real, isto é, incremento na quantidade de bens e serviços por unidade de tempo à disposição de determinada coletividade”. Sandroni já considera desenvolvimento econômico como crescimento econômico (incrementos positivos no produto) acompanhado por melhorias do nível de vida dos cidadãos e por alterações estruturais na economia. Para ele, o desenvolvimento depende das características de cada país ou região, do seu passado histórico, da posição e extensão geográficas, das condições demográficas, da cultura e dos recursos naturais que possuem.

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Milone afirma que para se caracterizar o desenvolvimento econômico é preciso observar, no transcorrer do tempo, a existência de variação positiva de crescimento econômico, medido pelos indicadores de renda, renda per capita, PIB e PIB per capita, de redução dos níveis de pobreza, desemprego e desigualdade e melhoria dos níveis de saúde, nutrição educação, moradia e transporte. (OLIVEIRA, 2006, p. 18)

Portanto, o desenvolvimento pode ser encarado como sendo um processo

complexo de transformações e mudanças de ordem política, econômica e humana e

social, ou seja, o desenvolvimento é o crescimento transformado para satisfazer as

necessidades do ser humano.

Ele engloba, ainda, a dignidade da pessoa humana no sentido de ter seu

conceito em permanente processo de construção – o conteúdo da noção de

dignidade da pessoa humana, na sua concepção de conceito jurídico-normativo,

reclama uma constante concretização e delimitação pela práxis constitucional, tarefa

cometida a todos os órgãos estatais (SARLET, 2012, p. 52). “A dignidade da pessoa

humana está relacionada com valores humanos, que levam em consideração um

tratamento humanitário, de igualdade, visando a erradicação de desigualdades

sociais” (FRAGA, 2013 p. 85).

Entendendo-se que a dignidade da pessoa humana é aplicável no âmbito das

relações privadas, entre particulares, pode ser fundamentada também na natureza

igualitária e na ideia de solidariedade, veja-se:

[...] fácil notar a relevante função delegada ao princípio da dignidade da pessoa humana, neste sentido propiciando a necessária visão harmônica, unitária e coerente que se há de extrair do conjunto das normas jurídicas, onde coabitam valores e princípios que emergem da realidade social em que este sistema se insere e da qual, portanto, jamais podem ser desvinculadas, pena de se tornarem incompreensíveis. Por isso que nenhum princípio é mais valioso para compendiar a unidade material da Constituição do que o princípio da dignidade da pessoa humana. Não se há, pois, de imaginá-lo como metapositivo, retórico e de conteúdo abstrato. É mesmo uma proposição do mais elevado teor axiológico, umbilicalmente ligado à concretização dos direitos fundamentais e, se um modo especial neste estudo, dos princípios, valores e regras que resultam da normatividade, sobremaneira em ápice constitucional, atinentes à ordem econômica. (PETTER, 2008, p. 191-192)

A dignidade como qualidade intrínseca da pessoa humana, é irrenunciável e

inalienável, constituindo um elemento que qualifica o ser humano como tal e dele

não pode ser destacado, de tal sorte que não se pode cogitar na possibilidade de

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determinada pessoa ser titular de uma pretensão a que não lhe seja concedida a

dignidade. (SARLET, 2012, p. 52).

2.2. DIREITO

A invenção do direito em Roma surge enquanto o Estado Romano ainda era

uma república, não existindo ainda, nesse período histórico nenhum ensino teórico

acerca do Direito. Os advogados se formavam no Direito por uma espécie de

método clínico.

Cabe mencionar que os princípios e regras que governaram a sociedade

romana e também a sociedade grega tiveram igualmente a mesma base de

instituições comuns, ainda que com diferenças essenciais, que vão distinguir estes

povos antigos da sociedade moderna. Para Fustel de Coulanges:

[...] a Grécia e Roma apresentam-se-nos com caráter absolutamente inimitável. Nada na história dos tempos modernos se parece com a sua história. Nada no futuro poderá assemelhar-se a elas. [..] As grandes transformações, de tempos em tempos surgidas na constituição das sociedades não podem aparecer como efeito nem do acaso, nem só da força. A causa que as produz deve ter algo de poderoso, devendo residir no próprio homem. Se as leis da associação humana já não são mais as mesmas da antiguidade, o motivo está em que algo do próprio homem se transformou. Temos, efetivamente, algo do nosso ser a modificar-se de século em século: a nossa inteligência. A inteligência está sempre em evolução, quase sempre em progresso, e, por esta razão, as nossas instituições e leis estão sujeitas às flutuações da inteligência do homem. O homem não pensa atualmente do mesmo modo como pensou vinte e cinco séculos atrás e, por isso, não se governa hoje pelas mesmas leis que então o regeram. A história da Grécia e a de Roma são testemunho e exemplo da estreita ligação, que sempre existiu, entre as ideias da inteligência humana e o estado social de cada povo. (COULANGES, 1987, p. 12)

Sobre o governo da cidade cabe trazer a autoridade política do rei, pois a

autoridade se acha inerente ao sacerdócio e ao mesmo tempo juiz e senhor, de

forma que o sumo sacerdote é o seu chefe político. A confusão entre sacerdócio e

poder encontra-se no começo de quase todas as sociedades, pois no início dos

povos só a religião poderia obter a obediência dos homens, por causa de nossa

natureza que experimenta a necessidade da não submissão à outra autoridade

senão à ideia moral.

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A religião se confunde com todas as coisas e era o sacerdote que velava pelo

fogo sagrado, era o culto sagrado que salvava a cidade, só ele conhecia as fórmulas

da oração que os deuses não resistiam. Parece natural que o homem investido de

tanto poder estivesse reconhecido como chefe, assim, como a religião se envolvia

no governo, na justiça e na guerra resultou-se ter sido o sacerdote, ao mesmo

tempo, magistrado, juiz e chefe militar.

A hereditariedade encontra-se como regra para a transmissão do culto, ou seja,

o fundador que instituiu o lar sagrado foi seu primeiro sacerdote, a religião

prescrevia que o cuidado da sua conservação sempre passasse de pai para filho, o

sacerdócio foi hereditário como o próprio poder.

Não foi a força que fez chefes e reis nas cidades antigas, a religião fez o rei na

cidade, como havia antes engendrado o chefe de família para a casa. A crença

ditava o sacerdote hereditário do lar, a ele mesmo, como sendo o único depositário

das coisas santas e guarda dos deuses. O questionamento acerca da hesitação de

obediência a tal homem demonstrava o cunho sagrado do rei e no rei-sacerdote se

olhava e via o homem mais poderoso para conjurar a cólera dos deuses, o homem

cuja sem assistência não se tornava eficaz nenhuma oração ou aceitação de

sacrifício.

Os reis não demonstravam a necessidade de força material, não tinham

exército ou finanças, mas sua autoridade era sustentada por fortes crenças, e estas

cultivadas no comando da alma mantinham sua autoridade inviolável. Uma

revolução acabou com a realeza em todas as cidades, mas o respeito e afeto dos

homens permaneceram-se ligados à sua memória.

Os povos implementaram o sistema republicano e o nome do rei continuou

sendo título venerado, pois os romanos empregavam essa palavra aos deuses em

suas orações, neste ponto insere-se a figura de magistrado:

A confusão, no mesmo indivíduo, da autoridade política e do sacerdócio não cessou com a realeza. A revolução, que implantou o regime republicano, não fez a separação das funções, cuja reunião parecia muito natural, sendo então lei fundamental da sociedade humana. O magistrado que substituiu o rei foi, como este, sacerdote, ao mesmo tempo que chefe político. Algumas vezes este magistrado anual usou o título sagrado de rei. Além disso, o nome de prítane, que lhe conservaram, indica sua primeira função. Em outras cidades, prevaleceu o título de arconte. Em Tebas, por exemplo, o primeiro magistrado designava-se por este nome, e tudo quanto Plutarco afirma da magistratura nos mostra que esta um pouco diferente de sacerdócio. Este arconte, durante o exercício do seu cargo, devia sempre

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trazer uma coroa, como convinha ao sacerdote; a religião proibia-lhe deixar crescer os cabelos e usar qualquer objeto de ferro sobre a sua pessoa, preceitos estes que o aproximam um pouco dos flâmides romanos. A urbe de Platéias tinha também um arconte e a religião da cidade ordenava-lhe que durante o tempo da sua magistratura se vestisse de branco, a cor sagrada. Os arcontes atenienses, no dia da sua entrada para o cargo, subiam à Acrópole com a cabeça coroada de mirto e ofereciam um sacrifício à divindade políada. Também usavam, no exercício das suas funções, uma coroa de folhas. Ora é incontestável que a coroa, a qual com o andar dos tempos tornou-se insígnia do poder, não era então mais que símbolo religioso, sinal exterior a acompanhar a oração e o sacrifício. (COULANGES, 1987, p. 188)

As características do magistrado entre os antigos em quase nada se

assemelham às do chefe de Estado das sociedades modernas, pois sacerdócio,

justiça e comando se confundiam na mesma pessoa, de modo que o magistrado

representava a cidade, a associação tanto religiosa quanto política.

A magistratura romana que se preencheu de membros sucessivamente

desligados do consulado tinham atribuições sacerdotais e políticas, de modo que a

figura dos pretores, os edis curuis, presidiam festas religiosas e não havia

magistrado que não tivesse qualquer ato sagrado a cumprir, já que na inteligência

dos antigos toda e qualquer forma de autoridade deveria manter o aspecto religioso.

O caráter sacerdotal que era atribuído ao magistrado aparece principalmente

por meio da forma pela qual eram nomeados, para se estabelecer a escolha do

chefe da cidade não eram necessários apenas o sufrágio dos homens, durante este

período pareceu natural ao homem que o chefe fosse designado pelo nascimento e

pela virtude da lei religiosa, que determinava em todo o sacerdócio a sucessão do

filho ao pai, pois o nascimento já revelava suficientemente a vontade dos deuses.

Já os atenienses e muitos povos gregos não acharam melhor forma que o

sorteio, uma vez que a sorte não estava entregue ao acaso, mas sim aparecia como

uma revelação da vontade divina, para Platão: “O homem que a sorte designou,

dizemos ser o mais querido à divindade, e achamos justo que seja ele a nos

governar. Em todas as magistraturas que respeitem às coisas sagradas, ao

deixarmos à divindade a escolha dos que lhe são agradáveis, entregamo-nos à

sorte” (PLATÃO apud COULANGES, 1987, p. 191). A cidade supunha, assim,

receber dos deuses os seus magistrados.

Embora, sob aspectos diferentes, em Roma as coisas aconteciam praticamente

da mesma maneira:

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A escolha do cônsul não devia caber aos homens. A vontade ou o mero capricho do povo não eram bastantes para nomearem legalmente o magistrado. O cônsul, era escolhido do seguinte modo: um magistrado em exercício, isto é, o homem já investido no caráter sagrado e dos auspícios, indicava entre os dias fastos aquele durante o qual se devia fazer a nomeação do cônsul. Durante a noite precedente velava, ao ar livre, com os olhos fitos no céu, observando os sinais enviados pelos deuses e, ao mesmo tempo, pronunciando mentalmente o nome de alguns dos candidatos à magistratura. Se os presságios se mostrassem favoráveis era porque os candidatos agradavam aos deuses. No dia seguinte o povo reunia-se no campo de Marte; presidia a assembleia o mesmo personagem que consultara os deuses. Ali o magistrado repetia em voz alta os nomes dos candidatos, sobre os quais tomara os auspícios e se, entre quantos pediram o consulado, havia algum para quem os auspícios não tivessem se mostrado favoráveis, omitia-se seu nome. E o povo só votava nos nomes pronunciados pelo presidente. (COULANGES, 1987, p. 194)

Verifica-se que o poder do povo não passava da ratificação da eleição, porém

esse modo de proceder foi muito vantajoso para a aristocracia romana, assim:

O direito não nascera da noção de justiça, mas brotara da ideia de religião, e não era concebido fora desse âmbito. Para haver qualquer vínculo de direito entre dois homens, tornava-se necessário existir já entre eles o vínculo religioso, isto é, terem o culto do mesmo lar e os mesmo sacrifícios. Quando não existisse entre dois homens esta comunidade religiosa, não se facultada qualquer relação de direito. Ora, nem o escravo, nem o estrangeiro, tinham participação na religião da cidade. O estrangeiro e o cidadão podiam viver lado a lado, durante longos anos, sem nunca se entenderem ou admitirem a possibilidade de se estabelecer vínculo de direito entre ambos. O direito não era mais do que um dos aspectos da religião. Onde não havia religião comum não existia portanto lei comum (COULANGES, 1987, p. 203).

Logo, é correto afirmar que a elucidação do conceito geral do Direito vem da

Filosofia. A ideia de direito é solidária à de justiça e para Aristóteles a justiça seria

um setor da realidade atingido pela moral.

Já a Moral para Aristóteles seria uma análise dos costumes (modos de agir,

comportamentos), buscando reconhecer os fins aos quais tenderiam nossos

comportamentos, analisando ainda se eles se aproximam ou não do objetivo (valor)

pretendido. Nesse contexto surge a ideia de virtude, que seria o tipo de atividade

habitual que se inclina para o bem, ao qual é natural que tendam nossas condutas.

Como todos os termos gerais da nossa língua, a palavra “justiça” é

polissêmica.

A virtude da justiça é sempre uma atividade a serviço da Ordem, pois a Ordem

constitui um valor supremo, que coincide com o belo, por sua vez chamado de justo

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– o homem que tendia ficar em concordância com a ordem cósmica universal, mas,

nas palavras de Bobbio (2005, p. 46):

O problema da justiça é o problema da correspondência ou não da norma aos valores últimos ou finais que inspiram um determinado ordenamento jurídico. Não tocamos aqui na questão se existe um ideal de bem comum idêntico para todos os tempos e para todos os lugares. Para nós, basta constatar que todo ordenamento jurídico persegue certos fins, e convir sobre o fato de que estes fins representam os valores a cuja realização o legislador, mais ou menos conscientemente, mais ou menos adequadamente, dirige sua obra. No caso de se considerar que existam valores supremos, objetivamente evidentes, a pergunta se uma norma jurídica é justa ou injusta equivale a perguntar se é apta ou não a realizar esses valores. Mas, também no caso de não se acreditar em valores absolutos, o problema da justiça ou não de uma norma tem um sentido: equivale a perguntar se essa norma é apta ou não a realizar os valores históricos que inspiram certo ordenamento jurídico concreto e historicamente determinado. O problema se uma norma é justa ou não é um aspecto do contraste entre mundo ideal e mundo real, entre o que deve ser e o que é: norma justa é aquela que deve ser; norma injusta é aquela que não deveria ser. Pensar sobre o problema da justiça ou não de uma norma equivale a pensar sobre o problema da correspondência entre o que é real e o que é ideal. Por isso, o problema da justiça se denomina comumente de problema deontológico do direito.

Justiça, assim entendida, seria então a soma de todas as virtudes. Portanto, a

Justiça geral para Aristóteles seria quase um sinônimo da moralidade e justiça

particular se definiria através de uma análise de honestidade. A língua grega diz que

o comerciante é justo quando é honesto. E para Aristóteles o homem justo é aquele

“que não pega mais que a sua parte, nem menos”.

Essa justiça particular é uma parte menor da justiça geral e, por óbvio, a justiça

particular é uma virtude específica, que não se confunde com o conjunto da

moralidade.

Para Aristóteles o direito é objeto da justiça (finalidade perseguida; harmonia) a

qual tende a atividade do homem justo, de forma que o direito só adquire sua forma

no interior da justiça particular (virtude específica).

Acerca da criação das leis é cabível a afirmação de Fustel de Coulanges, no

sentido de que:

Os antigos esclareciam terem vindo dos deuses as suas leis. Os cretenses atribuíam as suas, não a Minos, mas a Júpiter; os lacedemônios acreditavam como seu legislador, não Licurgo, mas Apolo. Os romanos afirmavam ter Numa escrito como lei o que uma das divindades mais

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poderosas da Itália antiga, a deusa Egéria, lhe ditara. Os etruscos receberam as suas leis do deus Tagés. Em todas estas opiniões encontramos algo de verdadeiro. O autêntico legislador, entre os antigos nunca esteve no homem, mas na crença religiosa de que o homem era portador. As leis ficaram sendo, durante muito tempo, coisa sagrada. Mesmo na época sem que se admitiu que a lei pudesse resultar da vontade de um homem, ou dos sufrágios de um povo, ainda então se considerou indispensável a consulta da religião, e que esta, pelo menos, autorizasse. Em Roma não se acreditava na unanimidade de sufrágio como suficiente para promulgar a lei: tornava-se ainda necessário ter sido aprovada a decisão do povo pelos pontífices, e que os áugures atestassem a sanção dos deuses proposta. [...] Concebe-se daí o respeito e o apego guardados pelos antigos, por muito tempo, às suas leis. Não viam nelas obra humana. Tinham origem sagrada. Não é afirmação vã de Platão, de que obedecer às leis é obedecer aos deuses. Platão não faz mais que dar-nos a conhecer o pensamento grego, quando, no Críton, nos mostra Sócrates entregando a sua existência, só porque as leis o exigem. (COULANGES, 1987, p. 199)

Desta forma, verifica-se que a lei divina era imutável e que as leis tinham a

função de preservar a perenidade da Ordem. Reiterando o raciocínio apresentado

cabe invocar que o direito se inclina a coincidir com a observância das leis, sendo,

para Bobbio, seus três elementos constitutivos:

[...] a sociedade, como base de fato sobre a qual o direito ganha existência; a ordem, como fim a que tende o direito; e a organização, como meio para realizar a ordem. Pode-se dizer, em síntese, que para Romano existe direito quando há uma organização de uma sociedade ordenada ou, em outras expressões análogas, uma sociedade ordenada através de uma organização, ou uma ordem social organizada. Esta sociedade ordenada e organizada é aquilo que Romano chama de instituição. Dos três elementos constitutivos, o mais importante, aquele decisivo, é certamente o terceiro, a organização: os dois primeiros são necessários, mas não suficientes. Só o terceiro é a razão suficiente do direito, a razão pela qual o direito é aquilo que é, e sem a qual não seria o que é. Isto significa que o direito nasce no momento em que um grupo social passa de uma fase inorgânica para uma fase orgânica, da fase de grupo inorgânico ou desorganizado para a fase de grupo organizado. (BOBBIO, 2005, p. 29-30)

Nesse contexto, surge a ideia de que o Direito é instrumento das regras morais,

tal como o direito penal, concebido como meio de impor deveres de moralidade.

Muito embora as leis não devessem ser confundidas com o objeto da justiça, que

seria a própria Ordem, esta segunda espécie de justiça analisada por Aristóteles tem

como finalidade que ninguém tome mais ou receba menos que a sua parte nos bens

exteriores, por ser algo finito, cumpre nomear como Direito.

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Desse modo, não há uma sociedade sem direito pela função que este exerce

sobre aquela, que é a função ordenadora, ou seja, coordenação dos interesses que

se manifestam na vida social, de maneira a organizar a cooperação entre as

pessoas, bem como compor os conflitos existentes entre seus membros. Resta

evidenciada a tarefa da ordem jurídica que é a de harmonizar as relações sociais

intersubjetivas, ensejando a máxima realização dos valores humanos, observa-se

neste sentido:

Por isso, pelo aspecto sociológico é geralmente apresentado como uma das formas – sem dúvida a mais importante e eficaz dos tempos modernos – do chamado controle social, entendido como o conjunto de instrumentos de que a sociedade dispõe na sua tendência à imposição dos modelos culturais, dos ideais coletivos e dos valores que persegue, para a superação das antinomias, das tensões e dos conflitos que lhe são próprios. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2001, p. 19)

Já o método utilizado pela ciência do direito seria um método dialético, que

procede pelo confronto de exemplos e de opiniões contraditórias, pois cada opinião

reflete algum aspecto da realidade, logo, cabe ao jurista descobrir esse método

através de uma sequência de tratamentos.

Leva-se em consideração que todo ato humano é conformado por um conjunto

de condições naturais, históricas e culturais, e só pode ser qualificado como

econômico, jurídico, político, e assim por diante, de modo que:

Diversas coisas governam os homens: o clima, a religião, as leis, as máximas do governo, os exemplos dos fatos passados, os costumes, as maneiras; daí se forma um espírito geral, que resulta do conjunto. O espírito geral é, pois, uma resultante na qual, aliás, o tom é dado por um dos elementos mencionados, que se chamaria, em linguagem moderna, “a dominante”. Essa dominante difere segundo as nações e seu estado de civilização. [...] Apresenta-se, então, outro grande debate clássico. São as leis mais fortes que os costumes, ou estes mais do que aquelas? (É o quid legis sine moribus dos antigos.) Não esperemos de Montesquieau uma resposta decisiva, que a observação não viria confirmar. Não nos surpreendamos, porém, se de início aconselha prudência do legislador: “Como se deve estar atento para não transformar o espírito geral de uma nação.” (CHEVALLIER, 2001, p. 154).

O processo histórico traz à tona a problemática entre direito e justiça, de forma

que:

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A esta abordagem do problema da relação entre justiça e direito nós responderíamos: que o direito corresponda à justiça é uma exigência, ou se quisermos, um ideal a alcançar que ninguém pode desconhecer, mas não é uma realidade de fato. Ora, quando nos colocamos o problema do que é o direito em uma dada situação histórica, nos questionamos sobre o que é de fato o direito e não sobre o que queríamos que ele fosse ou o que deveria ser. Mas, se nos perguntarmos o que de fato é o direito, não poderemos deixar de responder, ao menos, que na realidade vale como direito também o direito injusto e que não existe nenhum ordenamento perfeitamente justo (BOBBIO, 2005, p. 55-56).

O direito, portanto, é descoberto mediante a observação da realidade e da

confrontação de pontos de vistas diversos sobre esta realidade, pois o direito

(particular) é precisamente o ponto entre os extremos, este meio, esta proporção

certa das coisas.

Desta forma, verifica-se que o Direito emerge como sistema de regras de

conduta designado a disciplinar o comportamento humano e, como sua derivação,

temos o Direito Positivo que é considerado um sistema formado por enunciados

prescritivos através dos quais se constroem normas jurídicas decorrentes de sua

interpretação.

Neste sentido e, em conformidade com o entendimento de Everton das Neves

Gonçalves:

O Direito aplicado de forma eficiente torna-se moral, reduzindo as externalidades na medida em que custos são internalizados quando da violação dos próprios princípios morais. O altruísmo, por sua vez, também não está descartado da lei quando é raciocinado em termos econômicos na forma de derivação de utilidade, por parte de alguém, em relação à utilidade desejada por outrem; de forma que o desejo ou anseio individual passa a ser correspondido conforme à satisfação do próximo (GONÇALVES, 2013, p. 142).

Outra classificação que se evidencia do Direito é o Direito Material e o

Processual, sendo que o primeiro versa sobre as normas que tratam da própria

distribuição dos bens da vida, enquanto que o segundo regula o processo como uma

série encadeada de atos destinada a dirimir o conflito e as normas que disso

cuidam.

É importante definir o homem como um ser social dotado de livre-arbítrio,

sendo que tal liberdade e sociabilidade demonstram a necessidade de um

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mecanismo regulamentador, ou seja, aparece a figura do Direito como sistema de

regras de conduta visando disciplinar o comportamento humano.

2.3. ESTADO

O Estado é na sua essência todas as sociedades políticas que, com

autoridade superior, fixaram as regras de convivências dos seus membros, desse

modo, a maneira mais definida de se afirmar a criação de um Estado é o

reconhecimento pelos demais Estados, porém esse reconhecimento não é

indispensável, sendo mais importante que o novo Estado tenha viabilidade, agindo

com independência e mantendo uma ordem jurídica eficaz.

Releva-se que a ação estatal de regulação econômica, voltada para o

progresso técnico e científico, acaba por despolitizar as massas, promovendo uma

consciência de controle da opinião pública nociva para que seja construída a

democracia.

Na obra de Norberto Bobbio (1994, p. 90-91) é possível encontrar o

entendimento do Estado segundo a razão, neste sentido observa-se:

O estado ou é potente (e, portanto, autônomo) ou não é nada: mas, para ser potente e autônomo, deve seguir os ditames da razão. O Estado-potência é também, ao mesmo tempo, o Estado-razão. Spinoza aprendeu bem a lição do “agudíssimo”, do “sábio” Maquiavel, de quem é um admirador, e transformou-a num fragmento de uma das mais coerentes (e impiedosas) concepções do homem jamais imaginada. As razões do Estado são, no final das contas, as razões da razão: a racionalização do Estado se converte na estatização da razão, e a teoria da razão de Estado se torna a outra face da teoria do Estado racional. Para Locke, as leis naturais são as próprias leis da razão. Mas, para observar as leis da razão, são necessárias condições tais que permitam a um ser racional viver racionalmente, ou seja, seguir os ditames da razão. Essas condições não existem no estado de natureza: existem somente na sociedade civil, a qual, portanto, configura-se também em Locke como o único local em que os homens podem ter a esperança de viver segundo as leis da razão. As leis civis, com efeito, não são – não deveriam ser – nada mais do que as próprias leis naturais munidas daquele tanto de poder coercitivo capaz de obrigar também os recalcitrantes a respeitá-las. Por conseguinte, se os homens querem viver o mais possível racionalmente, devem ingressar naquela única sociedade onde as leis naturais podem se transformar em verdadeiras leis, ou seja, em normas de conduta que não são apenas formalmente válidas, mas também eficazes de fato, essa sociedade é o Estado.

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Portanto, o Estado possui um valor intrínseco absoluto que decorre do caráter

absoluto do poder soberano e da obediência que lhe é devida, de modo que não é

um expediente, cujo valor dependa do valor da finalidade, mas sim um ente moral. A

instituição do Estado é um momento decisivo, pois parte da constituição de uma

ideia reguladora para o projeto de uma futura sociedade jurídica universal, para a

qual o homem tende sua gradual aproximação a uma forma de existência conforme

a razão e, a sociedade é a única condição em que o direito tem sua realidade.

Quanto ao Estado, antes de trazer a figura do Estado Moderno é possível

ainda, trazer a ideia de onipotência do Estado, da forma como era constituído, de

acordo com Fustel de Coulanges:

Os antigos não conheciam, portanto, nem a liberdade de vida privada, nem a de educação, nem a liberdade religiosa. A pessoa humana tinha muito pouco valor, perante esta autoridade santa e quase divina que se chamava pátria ou Estado. O Estado não tinha somente, como nas sociedades modernas, direito de justiça em relação aos cidadãos. Podia punir sem o homem ser culpado; bastava estar em jogo o interesse do Estado. [...] A funesta máxima de que a salvação do Estado é lei suprema achou-se, assim, formulada na antiguidade. Pensava-se que o direito, a justiça e a moral deviam estar perante o interesse da pátria. É erro singular entre todos os erros humanos, acreditar-se que nas cidades antigas o homem gozava de liberdade. O homem não tinha sequer a mais leve ideia do que esta fosse. Ele não se julgava capaz de direitos, em face da cidade e dos deuses (COULANGES, 1987, p. 239-240).

Verifica-se que o governo muitas vezes mudou de forma, mas a natureza do

Estado permaneceu mais ou menos a mesma, ou seja, sua onipotência não foi em

quase nada diminuída.

Portanto observa-se:

O sistema de governo tomou vários nomes, sendo uma vez monarquia, outra aristocracia, ou ainda democracia, mas com nenhuma destas revoluções o homem ganhou a sua verdadeira liberdade, a liberdade individual. Ter direitos políticos, poder votar e nomear magistrados, ser arconte, a isto se chamou liberdade; mas o homem, no fundo não foi mais que escravo do Estado (COULANGES, 1987, p. 240).

Partindo da premissa de onipotência do Estado e de sua ideia de poder

passamos a analisar acerca do Estado Moderno, que surge quando o poder real,

monopolizadamente consolidado, nele se transforma. A partir disso, a sociedade

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moderna pode ser caracterizada pela divisão do trabalho e pela monopolização da

tributação e da violência física (GRAU, 2012, p. 16).

A Revolução Francesa permitiu que os monopólios da força física e da

tributação fossem transferidos ao controle institucionalmente garantido de ambas as

classes sociais.

Assim, após a revolução francesa, verifica-se o argumento do livre comércio

como forma de ajudar o Estado, nas palavras de Leo Huberman (1986, p. 180-181):

Os homens de negócios estavam atentos às grandes oportunidades. Estavam desejosos de lucros. Vieram então os economistas clássicos, dizendo que era isso exatamente o que devia acontecer. E ainda mais. Havia um conforto maior para o homem de negócios empreendedor. Diziam-lhe que, ao procurar seu lucro, estava ajudando também ao Estado. Adam Smith disse isso. Eis aqui, por exemplo, um remédio perfeito para o ambicioso negociante que pudesse passar as noites em claro, às voltas com sua consciência perturbada: “Toda pessoa está continuamente empenhada em encontrar o emprego mais vantajoso para o capital de que dispõe”. É sua vantagem pessoal, na realidade, e não a da sociedade, o que tem em vista. Mas o estudo de sua vantagem pessoal, naturalmente, ou melhor, necessariamente leva-o a preferir o emprego mais vantajoso para a sociedade Perceberam? O bem-estar da sociedade está ligado ao indivíduo. Dê a todos a maior liberdade, diga-lhes para ganharem o mais que puderem, apele para seu interesse pessoal, e veja, toda a sociedade melhorou! Trabalhe para si mesmo e estará servindo ao bem geral. Que achado para os homens de negócios, ansiosos por se lançarem na corrida dos lucros cada vez maiores! Abra os sinais para o trem especial do laissez-faire!

O monopólio do monarca ou rei pereceu e, com isso, foi transferido o controle

do Estado para a burguesia, de modo que o Direito instituído pelo Estado Moderno

tinha fundamento na violência. Neste sentido observa-se:

A afirmação de que até o momento neoconcorrencial ou “intervencionista” estava atribuída ao Estado a função de produção do Direito e segurança – bem assim a de que o Direito deixa de meramente prestar-se à harmonização de conflitos e à legitimação do poder, passando a funcionar como instrumento de implementação de políticas públicas – não deve ser tomada em termos absolutos. O Estado moderno nasce sob a vocação de atuar no campo econômico. Passa por alterações, no tempo, apenas o seu modo de atuar, inicialmente voltado à constituição e à preservação do modo de produção social capitalista, posteriormente á substituição e compensação do mercado (GRAU, 2012, p. 19).

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O Estado Moderno pode ser entendido, nas palavras de Adeilda Coêlho de

Resende (2013, p. 82-83):

O Estado Moderno adota a tripartição clássica de Montesquieu – Executivo, Legislativo e Judiciário – que se tornou fundamental para a construção da organização política desse Estado. Assim, em um âmbito evolutivo verifica-se que na verdade, as questões do poder vêm se delineando através da evolução do Estado, cujo embrião se revela na queda do Estado absoluto, e na necessidade que emerge de sobrevida do Estado, que encontra o caminho de salvação na burocratização administrativa. Em uma síntese histórica acerca da formação dos poderes constituídos, tem-se em um primeiro momento, o enfoque dessa preocupação no Poder Executivo na medida em que foi necessária a concentração de esforços para reerguer um mundo arrasado por guerras (volta-se a discussão para as questões burocráticas, as elites políticas, e a máquina governamental; assim tem-se a construção do Estado Liberal e sua posterior transformação em Estado Social (welfare state). Nesse momento, voltam-se as atenções para o âmbito Legislativo, de forma que as reivindicações dessa sociedade embalada pela conquista da democracia política pudessem ser veiculadas por uma representatividade legitimada.

A forma de preservar e constituir o modo de produção é garantido pelo

Estado, o sistema de Direito Civil, baseado nas instituições básicas da propriedade e

também da liberdade de contratar, portanto, para complementar o mercado são

adequadas novas formas de organização empresarial (concorrência e

financiamento) no sistema jurídico.

A incapacidade de autorregulação dos mercados e as imperfeições do

liberalismo atribuíram novas funções ao Estado, tais atribuições o impediam de

realizar os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, que se contrapunham à

realidade do poder econômico.

A aliança entre setor privado e público surge pela busca de desenvolvimento,

de modo que o público estava a serviço do privado, assim, neste sentido, o Direito

aparece como defesa da propriedade, ou seja, o espírito das leis é a propriedade.

O mercado deveria ser compreendido como uma instituição social, um

produto da história, uma criação histórica da humanidade que veio servir aos

interesses de uns, uma instituição política destinada a regular e manter

determinadas estruturas de poder que assegurassem a prevalência dos interesses

de certos grupos sobre os interesses de outros grupos sociais. Tanto o Estado

quanto o mercado se mostram como espaços ocupados pelo poder social e pelo

poder político, pois, nas palavras de Eros Roberto Grau:

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[...] a exigência de um sistema de normas jurídicas uniformes e de um sistema de decisões políticas integrado em relação a determinado território é essencial para o funcionamento e o desenvolvimento dos mercados, ou, de modo mais geral, da sociedade civil, isto é, da coletividade que participa da distribuição dos bens e das oportunidades que nascem dos mercados. O fato é que o Terceiro Estado, a burguesia, apropriou-se do Estado e é a seu serviço que este põe o Direito, instrumentando a dominação da sociedade civil pelo mercado. O Estado, que inicialmente regulava a vida econômica da nação para atender a necessidades ditadas pelas suas, desenvolvendo políticas mercantilistas, passou a fazê-lo para assegurar o laissez faire e concomitantemente, prover a proteção social, visando à defesa e preservação do sistema (GRAU, 2012, p. 30-31).

Para a continuação do mercado capitalista foram necessárias a previsibilidade

e calculabilidade do Direito Moderno, para o capitalismo industrial o importante eram

a estabilidade, segurança e objetividade para o funcionamento da ordem jurídica.

Necessário mencionar acera do Estado liberal, neste sentido:

No ideário liberal, o papel do governo parece reduzir-se a algumas poucas funções básicas: 1) proteger cidadãos contra inimigos externos, reais ou potenciais; 2) garantir a liberdade e a possibilidade de auto-determinação dos indivíduos; 3) manter uma estrutura institucional que permita aos indivíduos cooperar eficientemente. Alguns liberais (não todos) admitem uma quarta função: garantir a segurança material das pessoas – para que o padrão de vida dos cidadãos não caia abaixo de certo mínimo de decência, intervenção à qual geralmente se adiciona o limite estampado no lema: “material security, not material equality”. Mas, além disso, caberia ao Estado papel mais ativo, empreendedor? Poderia o Estado recriar, emular, simular as condições da ordem competitiva? Hayek chega a admitir que certas condições para uma ordem espontânea podem ser realmente projetadas. Só assim aliás teria sentido a sua pretensão de constituir uma teoria da lei e uma teoria política, uma doutrina da organização dos poderes (MORAES, 1999, p. 37).

A ordem pública é constituída pelas normas jurídicas que caracterizam o

núcleo mais expressivo, o que significa que, os agentes econômicos necessitam de

uma justiça e administração com funcionamento calculado racionalmente, desse

modo, a ordem pública garante a execução dos contratos, do qual o sucesso

empresarial depende. O resultado final do processo de racionalização social é o

moderno Estado de Direito com a consequente consciente imposição de regras de

comportamento social, que excluem a autotutela em opção por uma normatividade e

execução centralizadas. Neste sentido:

33

Objetivamente: liberalismo político e liberalismo econômico se entrelaçam de modo tal que, sob pena de comprometimento da essência de um e outro, não se os pode cindir. E que fique bem nítido que os adeptos do primeiro estão, ingenuamente ou não, a serviço do segundo. Daí ser necessário desnudarmos o comprometimento dos “direitos fundamentais” e dos “direitos do homem” com a afirmação da primazia das autonomia individuais, quer dizer, autonomias individuais dos que podem tê-las, ou seja, dos proprietários burgueses. O fato é que as teorizações do Estado de Direito nascem da luta da burguesia contra o poder absoluto do monarca, isto é, da luta pelo Estado juridicamente controlado/limitado, cuja legitimidade não carece mais de fundamento teológico, transcendente, metafísico (GRAU, 2012, p. 38).

Ao desempenho da função de integração e modernização capitalista,

paralelamente, o Estado implementa duas outras, a de legitimação e a de repressão.

No exercício da legitimação, o Estado pretende atribuir ao sistema capitalista e à

ordem política o reconhecimento de que sejam justos e corretos, já a repressão se

manifesta primeiramente como autorrepressão, para colocar a situação de lealdade

e adesão ao capitalismo à massa da sociedade civil.

Assim, ligado ao liberalismo aparece o laissez-faire, nas palavras de Leo

Huberman (1986, p.126-127):

Laissez-faire tornou-se o lema dos fisiocratas franceses que viveram na época de Gounay. Eles são importantes porque constituem a primeira ‘escola’ de economistas. Formavam um grupo que, a partir de 1757, se reunia regularmente sob a presidência de François Quesnay para examinar problemas econômicos. Os membros da escola escreveram livros e artigos pedindo a eliminação das restrições, defendendo o comércio livre, o laissez-faire. Quando Mirabeau, fisiocrata famoso, recebeu de Carlos Frederico, governador de Baden em 1770, pedido de conselho sobre como administrar o reino, escreveu: “Ah, Monseigneur, sede o primeiro a dar a vossos Estados a vantagem de um porto livre e um comércio justo, e que as primeiras palavras ouvidas em vosso território, depois de vosso amado e respeitado nome, sejam as três palavras nobres: Independência, Imunidade, Liberdade! Vossos Estados se tornarão rapidamente a habitação privilegiada do homem, a rota nacional do comércio, o ponto de encontro do universo.” Os fisiocratas chegaram à sua fé no comércio livre por um caminho indireto. Acreditavam, acima de tudo, na inviolabilidade da propriedade privada, partircularmente na propriedade privada da terra. Por isso, acreditavam na liberdade – o direito do indivíduo fazer de sua propriedade o que melhor lhe agradasse, desde que não prejudicasse a outros. Atrás de sua argumentação a favor do comércio livre está a convicção de que o agricultor devia ter permissão para produzir o que quisesse, para vender onde desejasse. Naquela época, não só era proibido mandar cereais para fora da França sem pagar impostos, como o próprio trânsito do produto de uma parte do país para outra era taxado. A isso se opunham os fisiocratas.

34

A globalização decorre da terceira Revolução Industrial (informática,

microeletrônica e telecomunicações) e se realiza como a globalização financeira. A

globalização financeira permitiu que o dinheiro deixasse de ser um intermediário na

troca entre valores de uso, exercendo uma função própria. Neste sentido, observa-

se que:

Globalização significa, entre outras coisas, a progressiva separação entre poder e política. Como assinalou Manuel Castells no seu recente e monumental estudo em três volumes sobre a “sociedade da informação”, o capital, e especialmente o capital financeiro, “flui”, não mais limitado pelo espaço e a distância, enquanto a política continua como sempre localizada, presa ao território. O fluxo escapa cada vez mais ao alcance das instituições políticas. Podemos dizer que o poder e a política ocupam espaços diferentes. O espaço físico, geográfico continua sendo a casa da política, enquanto capital e a informação habitam o ciberespaço, no qual o espaço físico é abolido ou neutralizado (BAUMAN, 2000, p. 124-125).

A tendência geral do desenvolvimento social era libertar o indivíduo das

restrições que o mantinham sujeito a padrões determinados pelo costume ou pela

autoridade no que dizia respeito a suas atividades ordinárias, de modo que a

constatação de que os esforços empreendidos pelos indivíduos espontaneamente e

não dirigido pela autoridade eram capazes de produzir uma complexa ordem de

atividades econômicas só poderia ocorrer após um processo de desenvolvimento, já

que a elaboração de uma tese coerente de defesa da liberdade econômica gerou-se

do livre desenvolvimento das atividades econômicas que tinham sido um subproduto

imprevisto e não planejado da liberdade econômica, nas palavras de F. A. Hayek

(1987, p. 43):

Os princípios básicos do liberalismo não contêm nenhum elemento que o faça um credo estacionário, nenhuma regra fixa e imutável. O princípio fundamental segundo o qual devemos utilizar ao máximo as forças espontâneas da sociedade e recorrer o menos possível à coerção pode ter uma infinita variedade de aplicações. Há, em particular, enorme diferença entre criar deliberadamente um sistema no qual a concorrência produza os maiores benefícios possíveis, e aceitar passivamente as instituições tais como elas são. Talvez nada tenha sido mais prejudicial à causa liberal do que a abstinada insistência de alguns liberais em certas regras gerais primitivas, sobretudo o princípio laissez-faire. Contudo, de certa maneira, essa insistência era necessária e inevitável. Diante dos inumeráveis interesses a demonstrar que certas medidas trariam benefícios óbvios e imediatos a alguns, ao passo que o mal por elas causado era muito mais indireto e difícil de perceber, apenas regras fixas e imutáveis teriam sido eficazes. E como se formara uma forte convicção de que era imprescindível

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haver liberdade na área industrial, a tentação de apresentá-la como uma regra sem exceções foi grande demais para ser evitada.

O liberalismo foi reconhecido como uma filosofia de certa forma negativa, pois

não poderia oferecer a cada indivíduo mais do que uma participação no progresso

comum, um progresso cada vez mais considerado natural e inevitável e não mais

como decorrente da política de liberdade, o próprio sucesso do liberalismo foi sua

causa de declínio, devido ao êxito alcançado, o homem mostrou-se cada vez menos

disposta a tolerar os males ainda existentes, que lhe pareciam insuportáveis e

desnecessários. Para Hayek (1987, p. 58):

É importante não confundir a oposição a essa espécie de planejamento com uma dogmática atitude de laissez-faire. A doutrina liberal é a favor do emprego mais efetivo das forças da concorrência como um meio de coordenar os esforços humanos, e não de deixar as coisas como estão. Baseia-se na convicção de que, onde exista a concorrência efetiva, ela sempre se revelará a melhor maneira de orientar os esforços individuais. Essa doutrina não nega, mas até enfatiza que, para a concorrência funcionar de forma benéfica, será necessária a criação de uma estrutura legal cuidadosamente elaborada, e que nem as normas legais existentes, nem as do passado, estão isentas de graves falhas. Tampouco deixa de reconhecer que, sendo impossível criar as condições necessárias para tornar efetiva a concorrência, seja preciso recorrer a outros métodos capazes de orientar a atividade econômica. Todavia, o liberalismo econômico é contrário à substituição da concorrência por métodos menos eficazes de coordenação dos esforços individuais. E considera a concorrência um método superior, não somente por constituir, na maioria das circunstâncias, o melhor método que se conhece, mas sobretudo por ser o único método pelo qual nossas atividades podem ajustar-se umas às outras sem a intervenção coercitiva ou arbitrária da autoridade. Com efeito, uma das principais justificativas da concorrência é que ela dispensa a necessidade de um “controle social consciente” e oferece aos indivíduos a oportunidade de decidir se as perspectivas de determinada ocupação são deficientes para compensar as desvantagens e riscos que a acompanham.

Assim, o bom uso da concorrência como princípio de organização social

exclui certos tipos de intervenção coercitiva na vida econômica, e admite outros que

podem auxiliar seu funcionamento, mesmo exigindo determinadas formas de ação

governamental. Desta forma, o funcionamento da concorrência não apenas requer a

organização adequada de certas instituições como a moeda, os mercados e os

canais de informação, mas depende da existência de um sistema legal apropriado e

estruturado a fim de manter a concorrência e permitir que ela produza os resultados

mais benéficos possíveis, neste sentido, para Hayek (1987, p. 68):

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Longe de se adequar apenas a condições mais ou menos simples, é a própria complexidade da divisão do trabalho no mundo moderno que faz da concorrência o único método pelo qual essa coordenação pode se produzir de modo eficaz. Um planejamento ou um controle eficiente não apresentariam dificuldades se as condições fossem tão simples, é a própria complexidade da divisão do trabalho no mundo moderno que faz da concorrência o único método pelo qual essa coordenação pode se produzir de modo eficaz. Um planejamento ou um controle eficiente não apresentaria dificuldades se as condições fossem tão simples que uma única pessoa pudesse fiscalizar todos os fatos importantes. A descentralização só se torna imperiosa quando os fatores a serem considerados são tão numerosos que é impossível obter uma visão de conjunto. Uma vez estabelecida a necessidade da descentralização, surge o problema da coordenação – um tipo de coordenação que dê aos órgãos particulares a autonomia de ajustar suas atividades a fatos que só eles podem conhecer, e que, no entanto promova ao mesmo tempo um ajustamento mútuo dos seus respectivos planos. Como a descentralização tornou-se necessária porque ninguém pode equilibrar de maneira intencional todos os elementos que influenciam as decisões de tantos indivíduos, a coordenação não pode, é claro, ser efetuada por “controle consciente”, mas apenas por meio de uma estrutura que proporcione a cada agente as informações de que precisa para um ajuste efetivo de suas decisões às dos demais. E, como nunca se podem conhecer todos os pormenores das modificações que influem constantemente nas condições da oferta e da procura das diferentes mercadorias, e nenhum órgão tem a possibilidade de reuni-los e divulgá-los com suficiente rapidez, torna-se necessário algum sistema de registro que assinale de forma automática todos os efeitos relevantes das ações individuais – sistema cujas indicações serão ao mesmo tempo o resultado das decisões individuais e a orientação para estas.

De modo que, é essa a função que o sistema de preços desempenha no

regime de concorrência, e que nenhum outro sistema promete realizar, pois permite

aos empresários ajustar sua atividade à de seus concidadãos pela observação das

oscilações de um certo número de preços.

Acerca do objetivo social, afirma Hayek (1987, p. 74-75):

O “objetivo social” ou o “propósito comum” para o qual se pretende organizar a sociedade costuma der vagamente definido como o “bem comum”, o “bem-estar geral” ou o “interesse comum”. Não é necessário muito esforço para se perceber que esses termos nãos estão suficientemente definidos para determinar uma linha específica de ação. O bem-estar e a felicidade de milhões não podem ser aferidos numa escala única de valores. O bem-estar de um povo, assim como a felicidade de um homem, dependem de inúmeras coisas que lhe podem ser proporcionadas numa infinita variedade de combinações. Não é possível exprimi-las de modo adequado como um objetivo único, mas apenas como uma hierarquia de objetivos, uma ampla escala em que cada necessidade de cada pessoa tem o seu lugar. A direção de todas as nossas atividades de acordo com um plano único pressupõe que para cada uma de nossas necessidades de atribua uma posição numa ordem de valores que deve ser bastante completa pra tornar possível a escolha entre as diferentes alternativas que o planejador tem diante de si, pressupõe, em suma, a existência de um

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código ético completo, em que todos os diferentes valores humanos estejam colocados em seu devido lugar.

O neoliberalismo é uma ideologia e não há necessariamente uma relação

entre globalização e neoliberalismo. Neste sentido:

Há marcante contradição entre o neoliberalismo – que exclui, marginaliza – e a democracia, que supõe o acesso de um número cada vez maior de cidadãos aos bens sociais. Por isso dizemos que a racionalidade econômica do neoliberalismo já elegeu seu principal inimigo: o Estado Democrático de Direito. O discurso neoliberal confronta o discurso liberal, que viabilizou o acesso da generalidade dos homens não apenas a direitos e garantias sociais, mas também aos direitos e garantias individuais. Pois é contra as liberdades formais, no extremo, que o discurso neoliberal investe (GRAU, 2012, p. 55).

O neoliberalismo é autofágico, pois ao investir contra esses direitos, fere o

próprio sistema, dessa forma, os movimentos, as ondas de juridificação, constituem

um processo de transformação e também de ampliação de direitos sociais e

econômicos titulados pelos indivíduos.

Acerca do papel do governo, para Milton Friedman (1980, p. 46):

O governo desempenha um papel importante, mas limitado principalmente aos nossos quatro deveres, interpretados de forma bem rigorosa. Faz cumprir a lei e a ordem, proporciona meios de formulação de regras de conduta, resolve litígios, facilita os transportes e as comunicações e supervisiona a emissão de moeda. Providencia habitações públicas para os refugiados. Embora seus gastos tenham crescido em compasso com a expansão da economia, continuam a ser dos mais baixos do mundo como proporção da renda nacional. Como resultado, baixos impostos preservam os incentivos. Homens de negócios podem colher os benefícios de seus sucessos, mas também têm de arcar com os custos dos erros que porventura cometam.

Verifica-se a partir da citação acima, a perspectiva atual de nossa economia

mundial, advinda do Estado liberal e abrindo margem para o neoliberalismo, no

sentido de inserir os direitos sociais defendidos pelo Estado. Obviamente o papel do

governo desde 1980 possui uma maior abrangência até o momento atual, mas o que

importa neste ponto é a parte de que os baixos impostos preservam os incentivos,

de modo a ser fator determinante para a ambientação de uma nova empresa, seja

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ela em âmbito interno ou internacional, neste sentido Milton Friedman (1980, p. 51)

afirma:

Temos o exemplo mais claro disso no comércio internacional. Os ganhos de alguns produtores com tarifas aduaneiras e outras restrições são mais do que superados pelas perdas de outros produtores e, em especial, dos consumidores em geral. O livre comércio não só promoveria nosso bem-estar material, mas também a paz e a harmonia entre as nações e estimularia a concorrência interna. Os controles sobre o comércio externo, porém, desbordam também para o comércio interno. Entrelaçam-se com todos os aspectos da atividade econômica. Esses controles têm sido amiúde defendidos sobretudo no que interessa aos países subdesenvolvidos, como essenciais para gerar desenvolvimento e progresso.

Acerca do Estado, cabe ainda mencionar que ele foi criado para buscar

imprimir uma maior eficácia às regras de conduta criadas pelo Direito e, de forma a

se manter exige em troca o pagamento de tributos aos que estão submetidos ao seu

poder. Na opinião de Hugo de Brito Machado Segundo:

Com o advento dos modernos Estados de Direito, Democráticos, limitados pelo Direito, as pessoas que integram ou corporificam o Estado também passaram a se submeter, no exercício de suas funções, a regras de conduta previamente estabelecidas. O ramo do Direito que cuida disso chama-se Direito Público, e, mais especificamente, no que toca à subdivisão ocupada de disciplinar a cobrança de tributos, Direito Tributário (MACHADO SEGUNDO, 2010, p. 02).

Assim, após mencionar acerca de liberalismo e neoliberalismo, cabe trazer

agora o Estado social. O Estado social não possui origem apenas nas concepções

ideológicas, mas também, e em maior grau de contingências econômicas, devido à

revolução que ocorreu nos meios de produção (primeira Revolução Industrial –

emprego da máquina a vapor – e segunda Revolução Industrial no século XIX –

emprego de energia elétrica). Em razão do quadro crítico originado pela Revolução

Industrial (primeira e segunda), o capitalismo requereu a ajuda do Estado, com o

argumento de que um não existe sem o outro, pois não há Estado sem capitalismo e

não há capitalismo sem Estado, neste sentido:

O Estado passa a auxiliar o capitalista. Para sustentar e incrementar a força de trabalho, o Estado começou a prestar serviços de base à classe

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proletária, chamados serviços públicos, tais como saúde (no padrão mínimo suficiente para que ele continue trabalhando), educação (para aprender o indispensável no operar das máquinas), habitação (de preferência próxima ao local de trabalho) e previdência (lastreando a esperança de que o trabalhador possa algum dia viver sem trabalhar). Surge o Estado Social como um prestador de serviços que foi-se agigantando ao longo do tempo, fazendo a dignidade humana depender da prestação e ao acesso aos serviços públicos. No Estado liberal o poder público esta fortemente limitado pela lei. Vigia a concepção de que o Estado somente pode fazer o que a lei expressamente prevê e, de outro lado, o indivíduo tem a liberdade de fazer tudo que a lei não proíbe. A liberdade individual conceitua-se de forma negativa (liberdade negativa), pois decorre da falta de vedação legal e se destina a tutelar os direitos individuais contra possíveis abusos por parte do poder público. No modelo de estado social o indivíduo passa a titularizar direitos (à saúde, educação, etc.) cuja satisfação depende da movimentação da estrutura do Estado. Nesse contexto, admite-se até mesmo que o Estado sem expressa autorização legal. Está habilitado a atuar no vazio, na lacuna da lei, desde que não prejudique o particular (SÉLLOS-KNOERR; KNOERR, 2014, p. 190-191).

Existe ainda a figura da democracia liberal, que configura uma das mais

poderosas utopias modernas que desenharam o modelo pelo qual se deveria

estruturar e governar uma boa sociedade ou pelo menos uma sociedade garantida

contra algumas das suas mais óbvias deficiências de opção pode-se mencionar a

democracia liberal que existe e estará aquém do ideal utópico e exibe características

que são difíceis de ser assimiladas na noção de uma boa sociedade. A democracia

liberal é uma tentativa de realizar um equilíbrio excessivamente difícil, assim, nas

palavras de Zygmunt Bauman (2000, p.157-158):

A democracia liberal, tanto na sua versão visionária quanto na sua versão prática, é uma tentativa de manter a eficiência política do Estado no seu papel de guardião da paz e de mediador entre os interesses do grupo e dos indivíduos, permitindo a livre formação dos grupos e a livre auto-afirmação dos indivíduos e sua livre escolha do estilo de vida que quiserem seguir. Na maior parte da história e na maioria das regiões do planeta, sabe-se que esses dois objetivos estiveram em geral em total oposição. Reconciliá-los não é façanha menor, mesmo nas melhores condições. Mas quanto às condições que a democracia liberal tenta dar ao Estado, aos indivíduos e às tribos que os formam, não se contentaria com nada menos que as melhores que se possam conceber. O objetivo da democracia liberal não é apenas um tipo de sociedade que permita ao Estado dirigir os seus assuntos e um tipo de Estado que também permita à sociedade dirigir os negócios dela, mas também um tipo de sociedade capaz de cuidar para que os assuntos do Estado sejam dirigidos corretamente e um tipo de Estado capaz de defender a sociedade contra os excessos que o governo dos interesses dela pode acarretar. A democracia liberal, em outras palavras, aspira à quadratura de um dos mais notórios círculos dentre os menos enquadráveis – para preservar simultaneamente a liberdade de agir do Estado, dos indivíduos e de suas associações, ao

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mesmo tempo que faz da liberdade de cada um condição para uma liberdade dos outros. Sobre a “sociedade civil” – para muitos pensadores políticos atuais, nome de código do “grande compromisso” entre o Estado e a sociedade que é o eixo do projeto e da prática liberal-democráticos [...]. Em outras palavras, a sociedade civil torna segura a liberdade individual – na verdade, segura ao ponto de na vida cotidiana achar-se que está garantida e não ser mais notada, quanto mais colocada com uma questão.

Sobre o Estado brasileiro é importante frisar que este é a entidade jurídica

que regula as relações econômicas e sociais daqueles que integram uma

determinada população em certo território, sendo que a figura da relação jurídica:

Esta é definida como relação entre sujeitos jurídicos, quer dizer, entre o sujeito de um dever jurídico e o sujeito do correspondente direito (Berechtigung) ou – o que não é o mesmo – como relação entre um dever jurídico e o correspondente direito (Berechtigung) [...] Dizer que dever e direito se correspondem significa que o direito é um reflexo do dever, que existe uma relação entre dois indivíduos dos quais um é obrigado a uma determinada conduta em faze do outro. Em ambos os casos é uma relação constituída pela ordem jurídica (KELSEN,1998, p. 182-183).

Conforme já mencionado o Estado Democrático de Direito tem sua atividade e

sua forma de organização política determinadas e limitadas pelo direito, sendo que o

Estado é estruturado na juridicidade estatal que tem como suas dimensões

fundamentais o governo de leis, o reconhecimento de direitos, a garantia de tribunais

independentes, o pluralismo, o funcionamento do sistema de organização estatal, as

liberdades e garantias, a organização do poder (segundo o princípio da divisão de

poderes), o primado do legislador, que estão subordinadas ao exercício do poder do

Estado, ou seja, aos princípios da responsabilidade e controle feito por meio de

instrumentos jurídicos determinados constitucionalmente.

O Estado deve subordinar-se ao direito de forma que ele, os poderes locais e

regionais, os órgãos, funcionários ou agentes dos poderes devam respeitar,

observar e cumprir as normas jurídicas da mesma forma como devem fazer os

particulares, portanto o Estado age e atua por meio do Direito, significando que o

exercício do poder só pode se efetivar por meio de instrumentos jurídicos

institucionalizados pela ordem jurídica, de forma a garantir o princípio geral da

segurança jurídica, que protege os cidadãos contra incertezas provocadas pelo

Poder Público. Como afirma Marilene Rodrigues:

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Assim, a segurança jurídica em suas dimensões e em sentido geral abrange todas as relações entre cidadãos e Poder Público, sejam decorrentes de funções administrativas ou judicial e principalmente em relação a proteção e tutela constitucional de respeito ao direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. O desafio está sempre em encontrar o justo equilíbrio entre direitos dos contribuintes, de um lado, e os poderes da administração de outro lado, para que não sejam exercidos de forma arbitrária, retirando direitos do contribuinte, que são constitucionalmente assegurados, para fins de arrecadação dos tributos e aplicação em gastos públicos (RODRIGUES, 2007, p. 193).

A ideia de intervenção do Estado, através da mediação, baseia-se como a

forma de que o Estado não se encontra em oposição ao desenvolvimento da

sociedade, mas como incentivador das relações que ocorrem na sociedade jurídica

através da liberdade de seus indivíduos. Desta forma, esclarece Michelangelo

Bovero (1994, p. 158-159):

[...] o Estado como forma superior da coletividade e como momento propriamente político, capaz de produzir normas gerais universalmente vinculantes e de obter pela coação o respeito às mesmas. Desse modo, o Estado: a) mantém e organiza, fixando e garantindo as “regras do jogo”, a ordem social dada, ou melhor, produzida pelo desenvolvimento histórico, tal como se manifesta no nível da sociedade civil: mas, precisamente por isso, não o “forma” ou produz; b) configura-se como esfera superior da sociedade, em cujo interior os sujeitos singulares, enquanto cidadãos, recebem uma determinação diversa e oposta àquela que têm como pessoas privadas dentro da esfera inferior da sociabilidade: e, portanto, como Estado político, contrapõe-se à sociedade civil tanto quanto a unidade orgânica se contrapõe à conexão mecânica, a finalidade coletiva ao interesse individual, o bem público ao bem-estar particular ou privado. Essas duas faces ou aspectos essenciais do Estado são apreendidos do modo mais claro possível por Hegel: contra o sistema da vida privada e seus componentes, por um lado o Estado “é uma necessidade externa” – enquanto é nas chamadas leis materiais da economia que a bürgerliche Gesellshaft encontra a sua necessidade interna – e “é para eles o poder (Macht) mais alto”, o que fixa e impões coativamente as condições jurídicas nas quais o processo social pode explicitar-se na esfera civil; por outro lado, o Estado “é a finalidade imanente deles [do sistema da vida privada e de seus componentes]”, na medida em que se põe como integração dos interesses e das realidades particulares na realidade universal da coletividade. Do mesmo modo – embora aqui o problema seja mais complexo e muito mais difícil de ser claramente definido –, Marx encara o Estado ora segundo o aspecto do domínio, da “violência concentrada e organizada”, ora segundo o aspecto da comunidade, ainda que ilusória. Por um lado, o Estado mostra a face do aparelho burocrático, de uma máquina que se superpõe à sociedade, de modo que o poder aparece como algo que desce do vértice para a base – onde os sujeitos resistem a ele opondo-lhe os próprios direitos civis; por outro lado, o Estado mostra a face de um organismo no qual a pluralidade dos sujeitos privados se agrupa em unidade superior, de modo que o poder aparece como algo que ascende da base para o vértice – em virtude do exercício dos direitos políticos.

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Portanto, para que ocorra a intervenção do Estado por meio da mediação são

necessárias determinadas iniciativas, uma vez que o Estado precisa do

desenvolvimento de seu povo para que obtenha seu próprio desenvolvimento.

Podem-se desenvolver os tópicos já mencionados inclusive no âmbito da empresa,

que verificando a função social e a responsabilidade social esteja de acordo com os

ditames do ordenamento jurídico e do Estado, como uma relação de comensalismo,

nas palavras do Papa Paulo VI (1982, 28-30):

Só a iniciativa individual e o simples jogo da concorrência não bastam para assegurar o êxito do desenvolvimento. Não é lícito aumentar a riqueza dos ricos e o poder dos fortes, confirmando a miséria dos pobres e tornando maior a escravidão dos oprimidos. São necessários programas para “encorajar, estimular, coordenar, suprir e integrar” a ação dos indivíduos e dos organismos intermediários. Pretende aos poderes públicos escolher e, mesmo impor, os objetivos a atingir, os fins a alcançar e os meios para os conseguir e é a eles que compete estimular todas as forças conjugadas nesta ação comum. Tenham porém cuidado de associar a esta obra as iniciativas privadas e os organismos intermediários. Assim, evitarão o perigo de uma coletivização integral ou se uma plantificação arbitrária que, privando os homens da liberdade, poriam de parte o exercício dos direitos fundamentais da pessoa humana. Ao serviço do homem Porque, em qualquer programa feito para aumentar a produção não tem, afinal, razão de ser senão colocado ao serviço da pessoa. Deve reduzir desigualdades, combater discriminações, libertar o homem da servidão, torná-lo capaz de, por si próprio, ser o agente responsável do seu bem-estar material, progresso moral e desenvolvimento espiritual. Dizer desenvolvimento, é com efeito preocupar-se tanto com o progresso social como com o crescimento econômico. Não basta aumentar a riqueza comum, para que ela seja repartida eqüitativamente. Não basta promover a técnica, para que a terra possa ser habitada de maneira mais humana. Nos erros dos predecessores reconheçam, os povos que se encontram em fase de desenvolvimento, um aviso dos perigos que hão de evitar neste domínio. A tecnocracia de amanhã pode gerar ainda piores males que o liberalismo de ontem. Economia e técnica não têm sentido, senão em função do homem, ao qual devem servir. E o homem só é verdadeiramente homem, na medida em que, senhor das suas ações e juiz do valor destas, é autor do seu progresso, em conformidade com a natureza que lhe deu o Criador, cujas possibilidades e exigências ele aceita livremente.

Ainda, acerca da influência do Estado como mediador, verifica-se o seguinte

entendimento do Papa Paulo VI (1982, 44):

Para atingirem a sua plena eficácia, estes esforços não podem ficar dispersos e isolados e, menos ainda, opostos por razões de prestígio ou de poder: a situação atual exige programas bem organizados. Um programa é, efetivamente, mais e melhor que um auxílio ocasional, deixado à benevolência de cada um. Supõe, como acima dissemos, estudos

43

aprofundados, fixação de objetivos, determinação de meios e conjugação de esforços, para que possa responder às necessidades presentes e às exigências previsíveis. Mais ainda, ultrapassa as perspectivas do crescimento econômico e do progresso social: dá sentido e valor à obra que se pretende realizar. Ordenando o mundo, valoriza o homem.

Desta forma, eleva-se a figura do homem – como já explicitado através da

Luta por Reconhecimento de Axel Honneth – visando o desenvolvimento do homem

através da dignidade. Conforme mencionado pelo Papa Paulo VI, ao ordenar o

mundo, valoriza-se o homem, ainda, se verifica a utilização de programas bem

organizados perante a interpretação e verificação do Estado como mediador, de

maneira que é possível compreender a aplicação de tais programas em uma visão

interna e não apenas pela perspectiva mundial.

Assim, existem os programas de ações afirmativas, inclusão social, menor

aprendiz, todos para a dignificação do homem e desenvolvimento da sociedade,

porém ainda é necessário mencionar acerca dos tributos e de como são feitos os

incentivos, como exemplo, temos as empresas que se deslocam da área central de

Curitiba para fixarem-se na região metropolitana, pois é mais vantajoso para

algumas indústrias e fábricas pelo viés econômico tributário.

Inserindo as empresas na região metropolitana o impacto que se tem é uma

empresa geradora de empregos para as pessoas que vivem naquelas regiões e

também no comércio, pois se altera o polo econômico de modo a impactar

diretamente no comércio e através disso, mais empresas surgem ao entorno, pelo

viés econômico, com um impacto social e desenvolvimento da cidade cada vez

maior, desse modo o Estado atua em benefício ao direito à empresa, fomentando o

desenvolvimento de diferentes locais, como a região metropolitana, os determinados

Estados brasileiros e a inserção de empresas de outros países para que se tenha

um melhora na economia nacional.

2.4. TRIBUTO

A ciência do Direito Tributário – construída através da necessidade de o

Estado regulamentar suas relações – estuda o Direito Positivo, no qual a linguagem

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prescritiva é utilizada pelo legislador de uma forma técnica e livre com aplicação no

direito dependente da norma tributária constituída através do intérprete.

No que se refere a tributo, este tem como sua noção empírica a de que o

particular deve entregar uma quantia em dinheiro ao Estado, limitada através do

direito. Em sua perspectiva ideológica, o tributo ocorre por meio da fixação de

critérios legais, solidariedade social, capitalismo, conflitos imanentes entre

particulares e Estado ou então entre os próprios entes competentes para tributar, ou

ainda entre os próprios particulares.

Existe um conceito unitário de tributo que é utilizado pela Constituição Federal

permitindo ao jurista identificar as principais características comuns das taxas,

empréstimos compulsórios, contribuições especiais e impostos para lhes dar

operacionalidade jurídica. Desta forma, para Ricardo Lobo Torres (2007. p. 35):

O tributo, noção nuclear do Direito Constitucional Tributário, é a categoria básica sobre a qual se edificam os sistemas constitucionais tributários (do nacional ao federado e ao internacional) e a partir da qual se formam as diferenças para com as figuras próximas do preço público e da multa, integrantes do fenômeno da quase-fiscalidade, e das contribuições econômicas e sociais, nos ordenamentos que cuidam da extrafiscalidade e da parafiscalidade. O termo tributo aparece inúmeras vezes na Constituição Tributária, sem qualquer definição: o art. 150, I, veda a exigência ou o aumento do tributo sem lei que o estabeleça; o art. 151, I, proíbe a instituição de tributo que não seja uniforme em todo o território nacional; o art. 150, III, dispões sobre a irretroatividade e a anualidade dos tributos; o art. 150, IV, veda a utilização do tributo com efeito de confisco. De rara complexidade pelas inúmeras funções que exerce no seio da Constituição Tributária, o conceito de tributo há que ser entendido de modo unitário, através da definição que lhe abarque todas as características. Mas a unidade, que lhe dá sentido, é ao mesmo tempo a sua perdição, por não se adequar à complexidade fiscal do Estado de Direito dos nossos dias.

Observa-se que o conceito de tributo não deve ser buscado apenas no

discurso da Constituição, da doutrina e do Código Tributário Nacional, mas também

na jurisprudência que fez o balizamento para a compreensão de suas diversas

espécies.

A edificação do conceito de tributo se deve à contribuição do trabalho do

Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Constitucionais em países como Áustria,

Alemanha, Itália e Espanha de forma antecipada às definições legais de modo a

interpretá-las ou oferecer pauta para sua normatividade em ordenamentos em que

são omissas.

45

É necessário visualizar o tributo e sua relação entre Estado e história para

que se possa estabelecer uma relação jurídica-tributária, nas palavras de Rogério

Martins:

Pelo que vê, “História”, “Tributo” e “Estado” sempre caminham juntos e a relação jurídica-tributária foi sempre uma relação advinda do poder do Estado e nunca uma relação voluntária por parte do indivíduo. Outrossim, a coerção sempre foi o elemento que dá a eficácia à relação jurídico-tributária, uma vez que é a imposição fiscal clássica norma de rejeição social. Por se tratar de uma relação jurídica de poder e com eficácia conferida por coerção é que o indivíduo procura, no ordenamento jurídico, normas que o resguardem a fim de se evitarem abusos por parte do Poder Tributante. Nesta esteira de raciocínio é que a nossa Constituição Federal contempla todo um capítulo às “Limitações ao Poder de Tributar”, assim como cada vez mais cresce na sociedade o conceito de “direito do contribuinte”, existindo já projeto de “Código de Defesa do Contribuinte” em curso perante o Congresso Nacional, assim como a edição da Lei Complementar nº 101/2000, denominada “Lei de Responsabilidade Fiscal”, visando a conter e gerenciar os gastos do Poder Público. Os direitos do contribuinte e mecanismos para sua defesa são necessários, uma vez que o Estado possui uma gama de atividades e funções a ele conferida pela Constituição Federal e demais normas jurídicas (MARTINS, 2007, p. 133).

O tributo é criado no Estado de Direito cobrado e pago conforme as normas

jurídicas estabelecidas.

De acordo com Gustavo Miguez de Mello (2007, p. 423) os tributos são

cobrados para:

[...] restringir a demanda doméstica contrapondo-se à expansão dela decorrente de gastos governamentais, evitando a inflação e, principalmente para realizar a equidade ou justiça fiscal, impedindo que contribuintes de renda mais baixa suportem encargos tributários relativamente mais elevados do que os de renda mais alta.

Cabe destacar que a tributação tem como finalidades: os objetivos

econômicos de desenvolvimento, de estabilização interna da economia (de forma a

combater o desemprego e a inflação); a estabilização externa da economia

(buscando o equilíbrio do balanço de pagamentos internacionais e formação de

reservas monetárias conversíveis); a realização da equidade ou justiça fiscal; a

finalidade política no sentido de distribuição do poder através do fortalecimento da

46

federação; a finalidade jurídica para a proteção dos direitos do contribuinte e a

finalidade administrativa referente à realização na prática das demais.

Para que possa realizar suas finalidades o Estado necessita da contribuição

de todos os integrantes da sociedade, para que assim atenda as despesas públicas

na medida da capacidade contributiva dos mesmos, porém a sociedade também

possui interesse no funcionamento e existência do Estado, e assim, deve

proporcionar a ele os meios adequados para o atendimento das necessidades

públicas por meio de pagamento de tributos.

Neste sentido Marilene Rodrigues afirma que:

A tributação é por excelência instrumento de geração de recursos para o Estado. Mas é preciso que haja lei que autorize a exigência de tributo e que esta lei esteja em harmonia com a Constituição e com os princípios e garantias dos contribuintes, para que possa ser exigido. A não-observância dos preceitos constitucionais pela lei que institui o tributo torna inconstitucional a exigência tributária. A capacidade que o cidadão possui para contribuir com os gastos públicos deve ser respeitada. O ponto de equilíbrio da tributação deve ser traduzido por aquilo que possa ser razoável e coerente com o objeto econômico do tributo, de forma a dimensionar a racionalidade do seu pagamento (RODRIGUES, 2007, p. 191).

Assim a concepção harmônica das normas tributárias e a relevância da

matéria a ser examinada envolvem a liberdade individual e a defesa do interesse

público para o desenvolvimento das atividades pelo Estado. Portanto, no Estado

Democrático de Direito a transferência de riquezas do particular para o Estado

configura a finalidade essencial da imposição tributária, para que assim seja possível

o exercício de suas principais atividades políticas, econômicas e sociais em

benefício da sociedade sem violar os direitos e garantias do contribuinte.

Ainda, para Marilene Talarico Martins Rodrigues (2007, p. 191):

O conceito jurídico de tributo é construído à luz dos princípios e normas constitucionais, devendo ser interpretado de forma sistemática. O Código Tributário Nacional conceitua tributo em seu art. 3º, em que se lê: “Tributo é toda prestação em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.

O principal fundamento do tributo é o meio de suprir recursos para que o

Estado promova a justiça social, cabe salientar que o tributo tem ligação com a

47

capacidade contributiva, pois o ônus do tributo que o contribuinte deve suportar não

deve sacrificar o mínimo existencial ou o necessário físico.

Em princípio a tributação tem seu limite estabelecido no nível de produção de

bens, coisas e serviços e de tal limite deduz-se o indispensável para que seja feita a

manutenção dos habitantes do país no padrão médio de vida.

Assim sendo, o planejamento da economia tem seu reflexo no Direito

Tributário ou por meio de leis ou através de atos administrativos submetidos

diretamente à Constituição.

Tal filosofia deve ser estabelecida em relação à integração da Ciência das

Finanças e do Direito Financeiro devendo ser consideradas as relações econômicas

entre Poder Público e particulares. As finalidades e o estudo do tributo devem levar

em conta toda a atividade estatal na realização de uma receita ou através de uma

administração do produto arrecadado ou então por meio de realização de

investimentos.

A se falar de uma autêntica política tributária, esta deve ter como objetivo o

Estado submetido ao princípio da legalidade em submissão da Administração às

Leis, devendo cumpri-las e praticá-las, de modo que toda atividade de todos os seus

agentes obedeça às disposições legais fixadas pelo Poder Legislativo para que seja

eficaz.

Desta forma devem ser aplicados os recursos arrecadados nas necessidades

básicas da população e quando os tributos forem vinculados, os recursos devem ter

sua aplicabilidade efetivada para as finalidades às quais foram instituídos, conforme

ações coordenadas, possibilitando maiores resultados com diminuição dos gastos

públicos sem desperdícios e com retorno compatível em serviços públicos.

3. ORDEM ECONÔMICA

3.1. ORDEM ECONÔMICA

Ao conjunto normativo positivado na Constituição Federal que interfere na

atividade econômica atribui-se a designação de constituição econômica, que deve

ser entendida como o conjunto de normas constitucionais que regulam fatos que

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repercutem no modo de ser econômico da sociedade, ou seja, é a regulação jurídica

da economia em seu sentido mais amplo (AMARO, 2011, p. 49).

Para a elaboração deste capítulo utilizamos como referência a obra de Eros

Roberto Grau: A ordem econômica na constituição de 1988: interpretação e crítica,

pois em conformidade com o autor mencionado, a ordem econômica pode ser

referida como uma parcela da ordem jurídica, esta última tomada como sistema de

princípios e regras jurídicas compreendendo uma ordem pública, privada, econômica

e social. Veja-se:

[...] o vocábulo ordem porta em si, na sua rica ambiguidade, uma nota de desprezo em relação à desordem, embora esta, em verdade, não existe: a desordem é apenas, como observa Gofredo da Silva Telles Júnior, uma ordem com a qual não estamos de acordo. A defesa da ordem, desta sorte, sobretudo no campo das relações sociais e de sua regulação, envolve uma preferência pela manutenção de situações já instaladas, pela preservação de suas estruturas (GRAU, 2012, p. 63).

A referência de uma “ordem econômica e social” nas Constituições de 1934 a

1967 reflete a afetação ideológica da expressão, extraindo da leitura despida de

senso crítico, a indicação de que o capitalismo se transforma na medida em que

assume um novo caráter social.

A expressão “ordem econômica” (como termo de conceito de fato) para

conotar o modo de ser empírico de determinada economia concreta, apresenta essa

mesma economia (realidade do mundo do ser) como normatizada. Suficientemente,

o vocábulo “ordem” significa um conjunto ou sistema de normas (realidade do

mundo do ser) sendo referida pela expressão antecipadamente descrita como

adequadamente “ordenada”, normatizada e, assim, regulada.

Daí por que essa realidade, por já se manifestar no mundo dos fatos de modo ordenado (auto-ordenado), regulada (autorregulada), prescindiria de qualquer outra ordenação ou regulação. Além disso, o significado de harmonia que a expressão também veiculada induz, na sugestão de que as partes do todo que é essa ordem caminham harmonicamente, a suposição de que nela se realiza harmonia plena entre capital e trabalho. É discernível, destarte, no mero uso da expressão “ordem econômica” para conotar uma determinada economia, nítida feição ideológica. A ambiguidade que a polissemia da expressão instala conduz não apenas o leitor da Constituição, mas em especial os que dela tem distantes notícias, a nutrirem, em relação à ordem econômica – e aqui o mistério da expressão é

49

reassumido em sua plenitude – simpatia ou antipatia, sobretudo antipatia (GRAU, 2012, p. 68).

Desta forma, a ordem econômica é uma parcela da ordem jurídica – mundo

do dever-ser – e também um conjunto de normas que institucionaliza uma

determinada ordem econômica – mundo do ser.

Quanto às ordens econômicas precedentes (mundo do dever ser) vê-se uma

transformação, pois passam a instrumentar políticas públicas, como por exemplo, o

art. 170 da CF que prevê a ordem econômica (mundo do ser) findada na valorização

do trabalho e livre iniciativa, substituindo a ordem econômica liberal por uma ordem

econômica intervencionista, ainda que preservando o capitalismo.

Dentre as diversas classificações das constituições anteriores a que mais se

destaca é a que diferencia uma constituição estatutária de uma constituição

orgânica, bem como uma diretiva de outra programática, sendo que as constituições

estatutária e orgânica são meros instrumentos de governo, já a programática

também enuncia as finalidades a serem alcançadas tanto pela sociedade como pelo

Estado.

As constituições diretivas ou programáticas relacionam-se diretamente com

as constituições econômicas, de modo que a Constituição Econômica aparece

sempre como uma Constituição Econômica diretiva, desta forma:

Compreendendo, a Constituição Econômica, conjunto de preceitos que institui determinada ordem econômica (mundo do ser) ou conjunto de princípios e regras essenciais ordenadoras da economia, é de se esperar que, como tal, opera a consagração de um determinado sistema econômico. E isso mesmo em uma situação limite, quando – et pour cause – expressamente não defina esses preceitos ou tais princípios e regras. Dir-se-á mesmo, radicalizando, que uma Constituição Econômica que não opere essa consagração não é uma Constituição Econômica (GRAU, 2012, p. 79).

A expressão ordem econômica no contexto do §5º do art. 173 conota o

mundo do dever-ser e não o mundo do ser, diferentemente do art. 170, caput,

portanto, a expressão ordem econômica deve ser interpretada como síntese de

ordem econômica constitucional material, observa-se:

50

Assim, a Constituição brasileira prevê e, seu artigo 170 as formas de intervenção na ordem econômica e elege os valores e direitos difusos, coletivos e metaindividuais de grupos ou organizações no sentido de proteger a propriedade privada e sua função social, como elementos fundamentais das políticas públicas de desenvolvimento. (KOLADICZ, 2009, p. 83)

A ordem econômica tem como fim a justiça social, pois sem justiça o homem

vive sempre mal, ainda que tenha liberdade, desenvolvimento, ordem e caridade em

torno de si, desta forma, a liberdade sem justiça fomenta o privilégio, o

desenvolvimento que não tem justiça aumenta a exploração, a ordem desprovida de

justiça cria a imposição e a caridade sem justiça desenvolve o paternalismo

(PETTER, 2008, p. 197).

A busca incessante pela justiça mostra-se como dever supremo do jurista,

superando a estreiteza empirista daqueles que renunciam à tarefa axiológica, sem

perceberem que nesta atitude acabam renunciando a ideia de racionalidade e

necessária legitimidade que acompanha a compreensão e justificativa do fenômeno

jurídico.

Assim, a inserção da justiça social como fim da ordem econômica deve ser

tida como reconhecimento de que todos se encontram em face de um destino

comum, em uma inescapável empresa comunitária, na qual a coexistência deve ser

vista de frente. A perspectiva metaindividual, coletiva, que supera individualismos

exacerbados inspira a compreensão normativa da justiça social.

Neste sentido:

O fim da ordem econômica é possibilitar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social. Se a expressão de existência digna nos remete ao princípio da dignidade da pessoa humana, considerada, preponderantemente, na sua individualidade, a justiça social, diz respeito a uma espécie de dignidade coletiva. Não basta alguém possuir digna existência se aquele que está ao lado não possui dignidade alguma. Por isso que a justiça social está relacionada com a correção das grandes distorções que ocorrem numa sociedade, diminuindo distâncias e diferenças entre as diversas classes que a constituem, favorecendo os mais humildes. Evitar que os ricos se tornem cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres e oferecer idênticas oportunidades a todos constituem variações semânticas do termo sob comento (PETTER, 2008, p. 201).

A ideia de justiça social está ligada à ideia de um discurso ético do Direito e

do Estado, de modo que a ideia de justiça é irrenunciável, pois em sua perspectiva

51

histórica universal, já em Atenas, assume que as leis e formas de Estado são

recusadas e até passíveis de não serem aceitas em caso de excessiva dureza e

injustiça.

Desta forma, a justiça social é uma primordial vocação da ordem

constitucional econômica e sua finalidade é destino obrigatório de toda tarefa

exegética.

Cada uma das constituições federais instaurou uma nova ordem no Estado brasileiro, sofreu influências internacionais e correspondeu aos anseios dos detentores do poder econômico de plantão. Construir uma identidade nacional, formar e incluir a sua população não tem sido meta prioritária. A Constituição Federal de 1988, que introduziu a ordem econômica com o fito de concretizar a ordem social, sucumbe a cada dia diante da ordem financeira (POMPEU, 2012, p. 125).

A publicação da encíclica Rerum Novarum, em 15 de maio de 1891, reforçou

a importância da intervenção do Estado, ensejando o incremento na publicação de

leis protetivas, neste sentido:

O que objetivava esta carta aberta escrita pelo Papa Leão XIII era debater não somente entre os clérigos, mas também junto a Sociedade a condição da classe trabalhadora, questionar e orientar as relações entre o governo, os negócios, o trabalho e a Igreja. Relações estas se encontravam bastante mitigadas pela laicização do Estado liberal. Apresentou-se nova diretriz nas questões relativas ao trabalho, buscando dignidade humana neste e a nova doutrina social da Igreja, visando a justiça social. Criticava tanto o liberalismo, o individualismo, como o socialismo. Pela autoridade de quem a redigiu, influenciou governantes e parlamentares, ou, no mínimo, ratificou os caminhos protetivos que se iniciavam, estimulando o Estado na sua nova postura. A este incumbia a edição das leis cerceadoras da ilimitada liberdade contratual (AZEVEDO, 2011, p. 16).

Portanto, a Rerum Novarum proclamou a justiça social, sustentando como

necessário a implantação de novas bases nas relações de trabalho para a

preservação da dignidade da pessoa humana, de modo a estabelecer o fundamento

moral na necessária intervenção do Estado para a solução das questões sociais.

Neste ponto é importante destacar a figura do Estado do bem-estar social:

Em nome da solidariedade, fruto do Estado do bem-estar social, substitui-se a igualdade pura pela igualdade jurídica, como regra de direito que impõe o

52

interesse geral sobre o particular sem que, no entanto, se anule a pessoa do indivíduo. E, para que esta igualdade pudesse ser alcançada o Estado começa a ser obrigado a atuar de forma positiva, concedendo aos indivíduos determinadas prestações (TREVISO, 2011, p. 104).

Portanto, quando se fala em justiça social deve ser abordada a questão da

solidariedade, em conformidade com o entendimento do Papa Paulo VI (1982, 42-

43):

O dever de solidariedade é o mesmo, tanto para as pessoas como para os povos: “é dever muito grave dos povos desenvolvidos ajudar os que estão em via de desenvolvimento”. É necessário pôr em prática este ensinamento do Concílio. Se é normal que uma população seja a primeira a beneficiar os dons que a providência lhe concedeu como fruto do seu trabalho, é também certo que nenhum povo tem o direito de reservar as suas riquezas para seu uso exclusivo. Cada povo deve produzir mais e melhor, para dar aos seus um nível de vida verdadeiramente humano e, ao mesmo tempo, contribuir para o desenvolvimento solidário da humanidade. Perante a indigência crescente dos países subdesenvolvidos, deve considerar-se normalmente que um país evoluído dedique uma parte da sua produção a socorrer as suas necessidades; é também normal que forme educadores, engenheiros, técnicos e sábios, que punham a ciência e a competência ao seu serviço.

Vê-se, portanto, a importância da soberania dos Estados enquanto existe a

preocupação com a solidariedade e desenvolvimento, de modo que ainda que a

citação acima seja referência ao dever de solidariedade dos Estados, tal aplicação, a

título exemplificativo, pode ser verificada através da deslocalização das empresas,

no sentido de que ainda que exista uma matriz, responsável pela realização da parte

que envolve pesquisa e desenvolvimento, existe a preocupação do local em que

seja possivelmente viável a realização da produção.

Assim, existe a pesquisa inserida no mercado a fim de verificar os

custos de mão de obra, impostos, matéria prima, ou seja, a deslocalização das

empresas, ainda que objetivem o lucro, visam também a parte social, pois a partir do

momento que elas se inserem em outro país a economia daquele local é afetada,

aumentando a mão de obra e o desenvolvimento dos indivíduos daquele país, de

modo que a função do Estado neste momento é a de estabelecer os incentivos

possíveis para a melhor adaptação da empresa que deverá respeitar o ordenamento

jurídico de cada local, no Brasil, por exemplo, podemos verificar as fábricas

montadoras de veículos, que foram incentivadas a realizar a fabricação dos carros

53

no país, uma vez que era mais viável economicamente manter uma fábrica no Brasil,

do que realizar a exportação.

Traz-se novamente a menção da encíclica Populorum Progressio acerca da

encíclica Rerum Novarum e a justiça social, neste sentido:

Continua a valer o ensinamento de Leão XIII, na encíclica Rerum Novarum: em condições demasiado diferentes, o consentimento das partes não basta para garantir a justiça do contrato, e permanece subordinada às exigências do direito natural a regra do livre consentimento. O que era verdade do justo salário individual, também o é dos contratos internacionais: uma economia de intercâmbio já não pode apoiar-se sobre a lei única da livre concorrência, que freqüentes vezes leva à ditadura econômica. A liberdade das transações só é eqüitativa quando sujeita às exigências da justiça social. [...] Mas não se podem usar nisto dois pesos e duas medidas. O que vale para a economia nacional, o que se admite entre países desenvolvidos, vale também para as relações comerciais entre países ricos e países pobres, sem o abolir, é preciso ao contrário manter o mercado de concorrência dentro dos limites que o tornam justo e moral e, portanto, humano. No comércio entre economias desenvolvidas e subdesenvolvidas, as situações são demasiado discordantes e as liberdades reais demasiado desproporcionadas. A justiça social exige do comércio internacional, para ser humano e moral, que restabeleça, entre as duas partes, pelo menos certa igualdade de possibilidades. É um objetivo a atingir a longo prazo. Mas, para o alcançar, é preciso, desde já, criar uma igualdade real nas discussões e negociações. Também neste campo se sente a utilidade de convenções internacionais num âmbito suficiente vasto: estabeleceriam normas gerais, capazes de regular certos preços, garantir certas produções e sustentar certas indústrias nascentes. Que duvida de que tal esforço comum, no sentido de maior justiça nas relações comerciais entre os povos, traria aos países em via de desenvolvimento um auxílio positivo, cujos efeito seriam não só imediatos, mas também duradouros? (PAPA PAULO VI, 1982, 49-51).

Desta forma, verifica-se a necessidade de utilizar esforços, conhecimentos e

meios financeiros para que possam ser realizados programas de desenvolvimento a

fim de aumentar os intercâmbios comerciais e culturais, pois todos os homens e

todos os povos devem assumir suas responsabilidades. Nas palavras do Papa Paulo

VI (1982, 65):

Homens de Estado, incumbe-vos mobilizar as vossas comunidades para uma solidariedade mundial mais eficaz e, sobretudo, levá-las a aceitar os impostos necessários sobre o luxo e o supérfluo, a fim de promoverem o desenvolvimento e salvarem a paz. Delegados às organizações internacionais, de vós depende que perigosas e estéreis oposições de forças dêem lugar à colaboração amiga, pacífica e desinteressada, a favor de um desenvolvimento solidário da humanidade, onde todos os homens possam realizar-se.

54

A liberdade para cada um e para todos é um motor do desenvolvimento, que

só se estabelecerá onde a justiça social se torne mais presente no convívio da

sociedade, pois a justiça social refere-se ao que toca a cada um como membro da

sociedade, como semelhante.

Não bastam somente as leis, pois elas devem corresponder às necessidades

dos fatos, assim estão vinculadas aos desejos e vertentes econômicas, devendo

permitir e incentivar em certas instâncias o crescimento econômico, e em outras

situações sua função é inibir ou proibir a atuação de determinadas atividades

econômicas.

3.2. ATUAÇÃO DO ESTADO E O DIREITO ECONÔMICO

A busca pelo desenvolvimento impõe a aliança entre os setores público e

privado no tocante ao escopo de suas funções.

O constitucionalismo ao longo do processo de consolidação do

capitalismo contemplou gradativamente normas capazes de disciplinar as relações

entre Estado e demais agentes econômicos através da ordem constitucional

econômica. Desta forma, a CF de 1988 resultou de um processo de

redemocratização político e social do país, conduzindo a um novo patamar de

democracia e desenvolvimento do Estado, refletindo na formulação da ordem

econômica e social vigente, assim:

Em função da ingerência reclamada do Estado, o qual deve atuar para atender aos fins individuais, coletivos, e sociais, em função dos quais está inserido no sistema econômico, outorga-lhe a prática legiferativa para regular o processo de produção e circulação de bens. (TONO, 2011, p. 16)

O processo de gestão da Constituição econômica de 1988 buscou

atender todas as necessidades do corpo social sem se dar conta que o papel a tudo

aceita, porém os fatores reais de poder nem sempre estão de acordo com o que

nele se escreve (SCAFF, 2003, p. 78).

As formas de atuação do Estado podem ser diferenciadas especialmente

no que diz respeito ao campo de atuação dos serviços públicos (área estatal) e o de

atuação da atividade econômica (setor privado).

55

A atuação do Estado na economia foi estabelecida em várias normas, tendo-se distinguido entre os campos de atuação do Estado na atividade econômica, de forma supletiva, e aqueles em que o Estado deveria atuar prioritariamente enquanto executor de serviços públicos. Em cada caso a intenção era delimitar onde era o campo de atuação prioritário do Estado (prestação de serviços públicos) no qual a iniciativa privada poderia atuar de forma supletiva, e aquele em que a atuação dos agentes privados seria prioritária, cabendo ao Estado um papel supletivo (SCAFF, 2003, p. 85).

A Constituição de 1988 confere tratamento peculiar para a atividade

econômica e serviço público. O art. 173 prevê expressamente os casos em que o

Estado pode explorar atividade econômica, ressalvado que deve seguir o regime

jurídico das empresas privadas.

O serviço público é uma espécie do gênero atividade econômica, pois

envolve a utilização de bens e serviços.

Assim, serviço público pode ser considerado o tipo de atividade

econômica que tem seu desenvolvimento atribuído ao setor público, de modo que

deve ser salientado que o setor privado presta serviço público sob regime de

permissão ou concessão.

A prestação de serviço público está voltada à satisfação de necessidades, o que envolve a utilização de bens e serviços, recursos escassos. Daí podermos afirmar que o serviço público é um tipo de atividade econômica. Serviço público – dir-se-á mais – é o tipo de atividade econômica cujo desenvolvimento compete preferencialmente ao setor público. Não exclusivamente, note-se, visto que o setor privado presta serviço público em regime de concessão ou permissão. Desde aí poderemos também afirmar que o serviço público está para o setor público assim como a atividade econômica está para o setor privado (GRAU, 2007, p. 103).

Frente a isso, a classificação do gênero atividade econômica (sentido

amplo), divide-se entre atividade econômica em sentido estrito e serviço público,

cada um com um regime jurídico específico (art. 173 e 175 da Constituição,

respectivamente).

O art. 174 da CF confirma este conceito de atividade econômica em

sentido amplo, pelo qual o Estado deve regular o setor público e o privado. Assim

como art. 170 da CF define que tanto setor público como privado devem pautar sua

atuação na valorização do trabalho humano.

56

Para exemplificar a atividade econômica em sentido estrito utiliza-se a

previsão contida no art. 173, pelo qual o Estado pode desempenhar atividade

econômica sob o regime jurídico das empresas privadas.

Portanto entende-se que:

Na prestação de serviços públicos foi estabelecido ser incumbência do poder público a prestação de serviços públicos, podendo serem estes outorgados, através de concessão ou de permissão, sempre através de licitação (art. 175). À União competia uma enorme lista de atividades (art. 21), dentre elas as de: (inciso XI) explorar, diretamente ou mediante concessão a empresas sob controlo acionário estatal, os serviços telefônicos, telegráficos, de transmissão de dados e demais serviços públicos de telecomunicações, assegurada a prestação de serviços de informações por entidades de direito privado através da rede pública de telecomunicações explorada pela União; (inciso XII, a) radiodifusão sonora e de sons e imagens e demais serviços de telecomunicações26; (inciso XII, b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos; (inciso XII, c) a navegação aérea, aeroespacial e a infra- -estrutura aeroportuária; (inciso XII, d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território; (inciso XII, e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros; e (inciso XII, f) os portos marítimos, fluviais e lacustres. Duas destas atribuições foram alteradas através de Emendas Constitucionais, a do inciso XI e do inciso XII, a. O regime de mercado foi assegurado, sendo cabível a exploração direta da atividade econômica pelo Estado apenas em caráter supletivo, em duas hipóteses: quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme fosse estabelecido em lei (art. 173). De toda forma, quando isso ocorresse, o Estado deveria submeter-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, sendo incabível a concessão de privilégios ao Estado que não fossem estendidos ao setor privado. Além disso, asseverava ao Estado o papel de agente normativo e regulador da atividade econômica, devendo exercer o papel de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este apenas indicativo para o setor privado e vinculante para o público (art. 174) (SCAFF, 2003, p. 85-86).

Os serviços públicos podem ser divididos em privativos e não privativos,

sendo os privativos aqueles que o Estado detém a titularidade, podendo prestá-los

diretamente ou mediante concessão ou permissão (art. 175), já os não privativos são

aqueles que, embora a prestação seja um dever do Estado (saúde, educação e

previdência), também podem ser prestados pela livre iniciativa (art. 209 e 199).

É passível de menção ainda outra forma de atuação do Estado no campo

da atividade econômica em sentido estrito como agente econômico, que pode ser

verificada no art. 177 (monopólio). Nestes casos, apesar da atuação estatal, não se

verifica a prestação de um serviço público.

57

Em tal distinção é importante analisar a diferença entre o interesse social

que afeta os serviços públicos e o interesse coletivo que atinge estes tipos de

atividade econômica em sentido estrito.

A atividade econômica, ao ser exercida em seu sentido amplo em função

de imperativo da segurança nacional ou ainda de forma a atender um importante

interesse coletivo em sentido estrito, para prestar acatamento ao interesse social se

percebe o desenvolvimento por parte do Estado. Para Hayek:

A autoridade que dirigisse toda a atividade econômica controlaria não só o aspecto da nossa existência que envolve as questões inferiores; controlaria também a alocação dos meios escassos e os fins a que seriam destinados. Quem controla toda a atividade econômica também controla os meios que deverão servir a todos os nossos fins; decide, assim, quais deles serão satisfeitos e quais não o serão. É esse ponto crucial da questão. O controle econômico não é apenas o controle de um setor da vida humana, distinto dos demais. É o controle dos meios que contribuirão para a realização de todos os nossos fins. Pois quem detém o controle exclusivo dos meios também determinaria a que fins nos deixaremos, a que valores atribuiremos maior ou menor importância – em suma, determinará aquilo em que os homens deverão crer e por cuja obtenção deverão esforçar-se. Planejamento central significa que o problema econômica será resolvido pela comunidade e não pelo indivíduo; isso, porém, implica que caberá à comunidade, ou melhor, aos seus representantes, decidir sobre a importância relativa das diferentes necessidades. A chamada liberdade econômica prometida pelos adeptos da planificação quer dizer precisamente que seremos libertados na necessidade de resolver nossos próprios problemas econômicos, e que as duras decisões que isso muitas envolve serão tomadas por outrem. Como, hoje em dia, dependemos em quase tudo dos meios proporcionados pelos nossos semelhantes, o planejamento econômico importaria o controle da quase totalidade da nossa vida. Não existiria praticamente nenhum aspecto desta – desde as necessidades primárias até as relações de família e de amizade, da natureza do nosso trabalho até o uso que fazemos de lazer – sobre o qual o planejador não exercesse seu “controle consciente” (HAYEK, 1987, p. 101)

A Constituição programática atualmente vigente prevê a promoção da

coesão social. Para tanto o Estado deve atuar na prestação das atividades

econômicas em sentido amplo que sejam indispensáveis ao desenvolvimento social,

as quais passam a ser conceituadas com os serviços públicos.

Serviço público, diremos, é atividade indispensável à consecução da coesão social. Mais: o que determina a caracterização de determinada parcela da atividade econômica em sentido amplo como serviço público é a sua vinculação ao interesse social. Daí por que diremos que, ao exercer atividade econômica em sentido amplo em função de imperativo da segurança nacional ou para atender relevante interesse coletivo, o Estado desenvolve atividade econômica em sentido

58

estrito; de outra banda, ao exercê-la para prestar acatamento ao interesse social, ainda que ambos se componham na categoria interesse público. Uma das características da Constituição de 1988 está em que ela é marcantemente principiológica – e, por consequência, programática –, no sentido de que dispõe não apenas regras, mas também princípios (GRAU, 2007, p. 130).

O serviço público se exprime como uma atividade explícita ou definida

supostamente pela Constituição, como sendo indispensável para a realização do

desenvolvimento, coesão e interdependência social, mas isso em determinado

momento histórico.

Ainda, a Constituição delimita a atuação do legislador infraconstitucional

quando prevê que as atividades econômicas em sentido estrito não podem ser

tratadas como serviço público.

Serviço público, assim, na noção que dele podemos enunciar, é a atividade explícita ou supostamente definida pela Constituição como indispensável, em determinado momento histórico, à realização do desenvolvimento, da coesão e da interdependência social (Duguit) – ou, em outros termos, atividade explícita ou supostamente definida pela Constituição como serviço existente relativamente à sociedade em um determinado momento histórico (Cirne Lima). Não há qualquer demasia em relembrarmos, aqui, que a interpretação da Constituição, indispensável ao desvendamento do quanto por ela definido a esse respeito, explícita ou supostamente, envolve também a interpretação dos fatos, tal como se manifestam em um determinado momento (GRAU, 2007, p. 136).

Em razão da sua indispensabilidade, vinculado ao serviço público, está o

princípio da continuidade. O art. 175 da Constituição ainda garante o equilíbrio

econômico-financeiro dos contratos mediante uma estrutura tarifária específica para

os serviços prestados.

Para realizar a adequação do uso do vocábulo intervenção entende-se

que ele serve para referir a atuação estatal no campo da atividade econômica em

sentido estrito (domínio econômico).

Deve-se fazer a distinção de três modalidades de intervenção:

intervenção por absorção, pela qual o Estado assume integralmente o controle dos

meios de produção; intervenção por participação, pela qual o Estado assume o

controle de parcela dos meios de produção; e intervenção por direção, pela qual o

Estado exerce pressão sobre a economia ou por indução, quando o Estado

59

manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das

leis que regem o funcionamento dos mercados.

Ao Direito cabe dirigir o sentido de suas apreciações em olvidar que os

mesmo fatos encontrem-se submetidos à influência das leis econômicas, de modo

que se encontrará mais apto para cumprir o desiderato de justiça para o qual se

propõe e que é causa de sua própria legitimidade.

Como salienta a doutrina, mesmo admitido um caráter instrumental no Direito Econômico em relação aos processos econômicos, tal não o reduz à mera condição de servidor da Economia. Pois o Direito Econômico não pode renunciar à realização da ideia de justiça e, consequentemente a influir na conformação das relações sociais, ordenando a própria Economia. De modo que, mesmo observado sob o ângulo da instrumentalidade da Economia, não lhe escapa também um sentido de direcionamento desta mesma Economia. Como elemento tipicamente regulador, o Direito não pode desconhecer o dado econômico, porém deve captar e delinear o seu conteúdo, para disciplinar-lhe a finalidade. Nele não se asila ou resume. De fato, norteia-lhe o destino (PETTER, 2008, p. 74-75).

O decisivo desafio para o Direito está na interdependência do Estado e da

Economia e no fortalecimento da atuação política por meio do Direito.

Neste sentido, é possível ainda, trazer a conceituação de Direito

Econômico:

Direito Econômico é o ramo do Direito que tem por objeto a “juridicização”, ou seja, o tratamento jurídico da política econômica e, por sujeito, o agente que dela participe. Como tal, é o conjunto de normas de conteúdo econômico que assegura a defesa e harmonia dos interesses individuais e coletivos, de acordo com a ideologia adotada na ordem jurídica. Para tanto, utiliza-se do “princípio da economicidade” (DANTAS, 2002, p. 19).

Portanto, sobre o Direito Econômico, é necessário pensar o Direito como

um nível do todo social - nível da realidade - como mediação específica e necessária

das relações econômicas.

3.3. MODELO ECONÔMICO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO

60

Muito tem se debatido qual foi o modelo encartado pela Constituição da

República Federativa do Brasil em 1988. Alguns entendem que o modelo seria do

Estado Social enquanto outros, especialmente a partir das reformas da década de

90, entendem que seria o Estado neoliberal.

Os dois modelos, sendo que o modelo neoliberal é uma atualização do

modelo liberal do século XVIII / XIX, disputam a melhor interpretação do sistema

capitalista, ainda que ambos, ao que parece não tenham tido um bom desempenho.

Se o modelo liberal clássico se mostrou incapaz de atender a grande massa

operária eis que estava a serviço da burguesia industrial; o modelo do Estado social,

por vezes, restou à serviço de regimes totalitários em razão do esmagamento das

classes operárias que viam nesse regime a sua salvação messiânica.

Seja como for, esse embate oxigenou os dois modelos, os quais agregaram a

democracia como fundamento primeiro para a sua própria sobrevivência. Paulo

Bonavides (2011, p. 189) na sua obra esclarece:

Naturalmente, não se contentou a massa proletária apenas com o direito formal do voto, senão que fez dele o uso que seria lícito esperar e que mais lhe convinha: empregou-o, sem hesitação, em benefício dela mesma, ou seja, dos trabalhadores, mediante legislação de compromisso que veio amortecer o ímpeto da questão social. Com a reconciliação entre o capital e o trabalho, por via democrática, todos lucram. Lucra o trabalhador, que se vê suas reivindicações mais imediatas e prementes atendidas satisfatoriamente, numa fórmula de contenção de egoísmo e de avanço para formas moderadas do socialismo fundado sobre o consentimento. E lucram também os capitalistas, cuja sobrevivência fica afiançada no ato de sua humanização, embora despojados daqueles privilégios de exploração impune, que constituíam a índole sombria do capitalismo, nos primeiros tempos em que se implantou.

Ocorre que a democracia não pode ser considerada um fundamento de um ou

outro modelo de forma exclusiva, a presença da democracia é viável e necessária

seja no modelo neoliberal, seja no modelo social.

O princípio da livre iniciativa contemplado no artigo 170 da Constituição

Federal de 1988, bem como a emenda constitucional nº 5/1996, a qual abre o

mercado para o capital estrangeiro, analisadas singularmente certamente indicariam

para um modelo neoliberal. De outro lado, analisando o artigo 3º o qual reconhece

como fundamento uma sociedade justa, livre e solidária e ainda o próprio artigo 170

61

que reconhece à propriedade a sua função social certamente indicaria para um

modelo social. O que parece mais prudente é não analisar a Constituição Federal

em tiras (na lição de Eros Grau), mas sim analisar o seu contexto.

Aqui devo salientar, contudo, inicialmente, que, assim como jamais se interpreta um texto normativo, mas sim o Direito, não interpretam textos normativos constitucionais, isoladamente, mas sim a Constituição, no seu todo. Não se interpreta a Constituição em tiras, aos pedaços. A interpretação de qualquer texto normativo da Constituição impõe ao intérprete, sempre, em qualquer circunstância, o caminhar pelo percurso que se projeta a partir desse texto até a Constituição (GRAU, 2007, p. 161).

Nesse sentido, analisando a Constituição Federal na sua completude e não

aos pedaços, impõe-se reconhecer que a mesma inclina-se para adotar o modelo

que privilegia a promoção de uma sociedade solidária. Contudo, estão presentes os

elementos que poderiam ser reconhecidos na Constituição, numa leitura mais

açodada, como estritamente neoliberais (conforme mencionado acima). No mundo

do dever-ser, certamente a presença dos artigos 1º, 3º e 170 na Constituição

Federal, na leitura do todo, inviabilizam o reconhecimento do modelo neoliberal:

[...] A política neoliberal também nessa matéria implementada é incompatível com os fundamentos do Brasil, afirmados no art. 3º da Constituição de 1988, e com a norma veiculada pelo seu art. 170. A Constituição do Brasil, de 1988, define, como resultará demonstrado ao final desta minha exposição, um modelo econômico de bem-estar. Esse modelo, desenhado desde o disposto nos seus arts. 1º e 3º, até o quanto enunciado no seu art. 170, não pode ser ignorado pelo Poder Executivo, cuja vinculação pelas definições constitucionais de caráter conformador e impositivo é óbvia (GRAU, 2007, p. 46).

O que se pode concluir é que o modelo constitucional é um modelo aberto, ou

seja, fica a cargo do intérprete justamente qual o caminho que conforme a realidade

social será trilhado. Contudo, não se pode perder de vista e deve estar alinhado à

sua característica primeira o modelo do bem estar social, fundamentado

especialmente numa sociedade livre, justa e solidária. Arremata Eros Grau:

Concluindo – e até porque aquelas conclusões se integram nas afirmações que seguem, destas sendo pressupostos – temos que: - A Ordem Econômica na Constituição de 1988 define opção por um sistema, o sistema capitalista. – Há um modelo econômico definido na Ordem Econômica na

62

Constituição de 1988, modelo aberto, porém, desenhado na afirmação como modelo bem-estar. – A Ordem Econômica na Constituição de 1988, sendo objeto de interpretação dinâmica, poderá ser adequada às mudanças da realidade social, prestando-se, ademais, a instrumentá-las (GRAU, 2007, p. 345).

Assim, o que se tem é a prerrogativa de que a Constituição Federal de 1988

privilegiará o bem-estar, sendo que qualquer atividade, especialmente a econômica,

deve ter um primeiro olhar para esse fundamento. É com esse olhar que serão

abordados os tópicos seguintes.

3.4. ORDEM ECONÔMICA CONSTITUCIONAL

Sem prejuízo de outros dispositivos constitucionais, a ordem econômica

constitucional pode ser determinada pela leitura dos artigos abaixo transcritos da

Carta de 1988, quais sejam:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos estados e municípios e do distrito federal, constitui-se em estado democrático de direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. parágrafo único. todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta constituição. Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da república federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte. X - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país §único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

63

Fato é que no Título VII denominado “Da Ordem Econômica e Financeira”

verificam-se outros dispositivos. Contudo os artigos 1º e 3º, combinados ao artigo

170 da Carta Constitucional determinam a alma da ordem econômica constitucional.

Eduardo Teixeira Farah bem esclarece o tema:

Observa-se que o legislador, ao enumerar estes princípios de forma aleatória, estabeleceu a necessária complementariedade entre eles, uma vez que nenhuma “ordem” pode ser considerada como um fato, mas apenas como uma construção normativa. Ademais, estes princípios políticos constitucionais conformadores do referido art. 170 devem assegurar a efetividade das normas reitoras estabelecidas no art. 1º, da mesma Carta Política. Estes princípios que regulam a ordem econômica devem estar em harmonia com as diretrizes estabelecidas nos artigos 1º e 3º da própria Constituição Federal brasileira, principalmente em face da dignidade da pessoa humana e da solidariedade social (FARAH, 2002, p. 675).

Logo, os princípios elencados no artigo 170 da CF de 1988 devem sempre

atentar-se e coadunar-se com o princípio da dignidade da pessoa humana e da

solidariedade social, essa é, aparentemente, a contradição da ordem econômica

constitucional na medida em que é determinado como fundamento da ordem

econômica constitucional a livre iniciativa no caput do artigo 170 da CF de 1988 e

posteriormente nos incisos II e IV; sobre a propriedade privada e a livre

concorrência, poder-se-ia estabelecer um confronto direto com os princípios

estabelecidos nos artigos 1º e 3º, bem como nos demais incisos do artigo 170, por

exemplo, determina a redução das desigualdades regionais e sociais – inciso VII.

Contudo, não é essa a mais adequada interpretação da ordem econômica

constitucional. A Constituição não pode ser interpretada em tiras, sendo que todo o

seu conteúdo deve ser analisado a fim de que se possa promover a interpretação

mais adequada.

Ao verificar tão somente cada um dos princípios em separado, certamente o

operador do direito, em rápida análise, determinará uma interpretação totalmente

equivocada. O contraponto da propriedade privada, certamente o maior fundamento

da ordem econômica capitalista, encontra-se no inciso subsequente do artigo 170

que estabelece para a mesma propriedade a sua função social. Na mesma esteira, a

livre iniciativa encontra o seu freio ético justamente no fundamento constitucional

mencionado no artigo 3º que preconiza a construção de uma sociedade justa, livre e

solidária.

64

Uma das faces da livre iniciativa é a liberdade econômica, ou liberdade de iniciativa econômica, assim entendido como liberdades da empresa. Isso garante aos agentes econômicos tanto o ingresso ao mercado, quanto a atuação e permanência no mercado. (LANNES, 2014, p. 187)

Não se está aqui a determinar que não deve ser levado em conta os

princípios que privilegiam a função puramente econômica das empresas, cumpre

sempre salientar que o objetivo das empresas é o lucro e o seu aumento. Contudo,

repito expressão acima, os freios éticos são justamente aqueles, dentre outros,

determinados pelos próprios fundamentos constitucionais.

Valendo-se novamente da lição de Eduardo Teixeira Farah (2002, p.677)

quanto à completude de cada um dos princípios estabelecidos na ordem econômica

constitucional:

Desta plêiade de princípios e regras infere-se que a disciplina da empresa deve estar pautada pela valorização do trabalho humano no desenvolvimento da livre iniciativa, todavia a diretriz da solidariedade social obriga, ainda, a subordinar o ambiente econômico à ordem constitucional. Outrossim, toda e qualquer interpretação da ordem econômica constitucional em relação à disciplina da empresa implica reconhecer a prevalência dos valores assegurados na própria Constituição, entre os quais o da solidariedade social. Eis por que a empresa deve observar a diretriz da solidariedade social não apenas em relação às normas conexas às suas atividades, mas pautar suas ações num contexto maior em coordenação com todos os valores insculpidos na Constituição.

Assim, evidente que a empresa é uma das molas propulsoras do capitalismo

e certamente o objetivo social de cada ente empresarial é o lucro, contudo, não se

pode perder de vista que a obtenção do lucro não deva observar a solidariedade

mencionada anteriormente. A atividade empresarial deve ter esse viés do lucro,

sendo devidamente orientada ou direcionada à perspectiva da solidariedade social.

Nesse sentido a excelente Judith Martins Costa esclarece com maior propriedade:

A expressão “sociedade solidária” tem, no entanto, amplíssima vagueza semântica e precisa ser, nos mais variados campos da vida social, devidamente densificada. Antes de mais, a palavra “solidariedade” traduz categoria social que exprime uma forma de conduta correspondente às exigências de convivência de toda e qualquer comunidade que se queira como tal, implicando a superação de uma visão meramente individualista do papel de cada um dos seus singulares membros e assim configurando elemento de coesão da estrutura social. Essa categoria social (e igualmente ética e política) é apreendida pelo Direito na Constituição, indicando, em

65

linhas gerais, a exigência de evitar, ou ao menos reduzir, a conflitualidade social mediante a superação de uma visão estreitamente egoística do Direito. Torna-se, pois, exigência ético-jurídica de tipo político, cujo o papel é o desenvolver “uma função de endereço político acerca do funcionamento do próprio ordenamento jurídico” (MARTINS-COSTA, 2002, p. 620).

A Constituição Federal, é bom que se diga, consagrou a economia de

mercado, não é a toa que estabeleceu, por exemplo, a livre concorrência. Esse fato

é inescapável e deve ser sempre lembrado, contudo não quer dizer que a chamada

economia de mercado não possa voltar-se ao fim comum de estabelecer uma

sociedade solidária. Mais uma vez a doutrina de Judith Martins Costa (2002, p. 620):

Há, portanto, uma relação íntima entre o mercado e solidariedade social. Esta é norma conformadora daquele, tanto quanto a valorização da iniciativa privada e do trabalho, dissolvendo-se, nesta perspectiva, a antinomia entre a valorização do trabalho e a livre iniciativa, pois ambas se devem conjugar em atenção ao fim comum que as polariza, qual seja a construção de uma sociedade solidária.

O texto, com bastante propriedade, aponta a solidariedade social como norma

conformadora e é justamente nesse sentido que todas as demais devem ser

interpretadas.

4. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA

4.1. NORMA JURÍDICA – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA REGULAMENTADA À LUZ

DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

O ordenamento jurídico é formado por um conjunto de normas dispostas

hierarquicamente desde as inferiores até as constitucionais, formando a “pirâmide

jurídica”, na qual tais normas ordenam-se por meio de uma relação sintática no

sentido de que as normas inferiores adquirem respaldo de validade a partir das que

se encontram acima delas até o máximo patamar que é o da Constituição Federal

(CARRAZZA, 2010, p. 35).

Assim sendo, as normas subordinadas devem estar em harmonia com as

normas superiores, pois caso isto não ocorra podem deixar de ter validade no

66

ordenamento jurídico, sendo que a lei máxima, o critério último de validade e

existência das demais normas dispostas no sistema do Direito é a Constituição

Federal.

Sobre isso afirma Roque Antonio Carrazza (2010, p. 37) que “em suma, a

Constituição é o limite do Poder Público e o fundamento de todo o sistema jurídico.”

Cabe ressaltar que as normas jurídicas mais importantes mostram-se

dispostas na Constituição Federal, pois ela indica os detentores dos poderes

estatais e quais são tais poderes e como devem ser exercidos, bem como, os

direitos e garantias dispostos pelas pessoas em relação a eles.

Portanto, a aplicação do direito positivo depende da construção da norma

jurídica, da interpretação dada pela doutrina ao texto criado pelo legislador.

Acerca da Administração Pública quando examinada pela ótica objetiva ou

material faz com que ela seja entendida como o exercício da função essencial da

Administração, ou seja, a função administrativa em si, ou o encargo que compete

com predominância ao Poder Executivo. Quando examinada de forma subjetiva ou

formal entende-se a Administração Pública como conjunto de pessoas jurídicas,

agentes públicos e órgãos que exercem a função administrativa como objetivo.

Desta forma a Administração Pública em seu sentido formal é o conjunto de

órgãos instituídos para a realização dos objetivos do Governo e em sentido material

mostra-se como conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral.

Ela pode ainda ser analisada em acepção operacional como desempenho perene e

sistemático, legal e técnico dos serviços próprios realizados pelo Estado ou que por

ele são assumidos para o benefício da coletividade.

Existe ainda a subdivisão direta e indireta da Administração Pública, que nas

palavras de Marcio Pestana:

A expressão administração direta e indireta, prestigiada pela atual Constituição Federal, provém do Decreto-Lei nº 200/67, que promoveu no Brasil uma reforma administrativa no plano federal, irradiando, a partir deste diploma e do Ato Institucional 8/69, tal concepção administrativa aos Estados e Municípios (estes com mais de 20 mil habitantes). A distinção básica de ambas as espécies de administração é a de que a Administração Pública direta encontra-se concentrada no núcleo do respectivo Poder, tal qual tracejado pelo próprio Texto Constitucional; já a designada Administração Pública indireta encontra-se na periferia deste núcleo, sob os auspícios da descentralização administrativa (PESTANA, 2007, p. 09).

67

Pode-se ainda analisar a Administração Pública em relação ao processo

administrativo-tributário, pois tal processo mostra-se presente tanto na

Administração Pública direta quanto na indireta. Essa análise deve ser tomada no

campo federal, dado que envolve discussões entre o administrado e a Administração

Pública sobre tributos e obrigações travados diretamente no Ministério da Fazenda

de forma específica na Secretaria da Receita Federal, ou seja, na seara da

Administração Pública federal direta.

No âmbito da Administração Pública federal indireta inserem-se as figuras das

Autarquias, por exemplo, o caso do Banco Central do Brasil ou o que ocorre no

Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.

Sobre a Administração Pública Marilene Rodrigues (2007, p. 206) afirma que:

A constitucionalização dos princípios da Administração Pública, na forma estabelecida pelo art. 37 da Constituição Federal – que em sua atuação deve obediência aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência – procurou reestruturá-la para atender aos elementos democráticos que caracterizam a República Federativa do Brasil nos contornos expressos no art. 1º da CF. A estrutura da Administração Pública, assim colocada, que em relação ao seu próprio agente, que em relação ao administrado, na prática, não se mostra eficiente, razão pela qual é oportuna a discussão em torno de um conceito mais amplo de tributo.

Assim, cabe mencionar que:

1) O poder não pode ser exercido como um fim em si mesmo, mas como serviços à sociedade para não ser desviada sua finalidade. 2) No Estado contemporâneo, há necessidade de uma intensa participação na coisa pública. Os contribuintes devem deixar de ser súditos de um Estado-tutor para se transformar em cidadãos de um Estado-instrumento. 3) O Direito Administrativo não pode mais apenas se preocupar em estabelecer limites ao poder, ou em garantir os direitos individuais diante do poder, sua preocupação deve voltar-se para a elaboração de fórmulas que possibilitem a efetivação dos direitos sociais, econômicos, coletivos e difusos, os quais exigem prestações positivas por parte do Estado. 4) Para uma avaliação global das deficiências do sistema tributário torna-se necessário o exame amplo de questões a partir de parâmetros de integração da Ciência das Finanças, do Direito Financeiro, considerando-se as relações econômicas entre particulares e Poder Público, o nível de carga tributária em confronto com os serviços públicos prestados, os gastos da administração e a real necessidade de recursos públicos que são arrecadados. Além dessa avaliação global é preciso que sejam elaboradas leis em harmonia com a Constituição, com respeito aos direitos e garantias do contribuinte, em consonância com todo ordenamento jurídico, para que

68

possam ser cumpridas com a necessária segurança jurídica e com o dever público do cidadão de pagar tributos (RODRIGUES, 2007, p. 207).

A Administração, em um sentido mais amplo, aparece como todo

aparelhamento do Estado preordenado à realização dos seus serviços, e visa à

satisfação das necessidades da coletividade, desta forma ela não pratica atos de

governo, mas sim atos de execução com maior ou menor autonomia funcional

definida pela competência do órgão ou de seus agentes, sendo tais atos

denominados atos administrativos.

Por ser uma atividade neutra normalmente vinculada à lei ou à norma técnica,

a Administração mostra-se como uma conduta hierarquizada, ela executa sem

responsabilidade constitucional ou política, mas com responsabilidade técnica e

legal. Desta forma ela é o instrumento disposto pelo Estado para colocar em prática

as opções políticas do Governo que age como uma conduta independente, política e

discricionária com responsabilidade constitucional e política.

Deste modo a Administração detém o poder de decisão somente no âmbito

de suas atribuições e nos limites legais de sua competência executiva, podendo

somente opinar e decidir sobre assuntos técnicos, financeiros, jurídicos ou de

conveniência e oportunidade administrativas sem ser facultado a ela a opção política

da matéria.

Quanto à regulação no Direito, esta se refere no sentido de o Direito ser

uma ciência deôntica, voltada ao dever-ser, sendo que o conceito de regulação

jurídica decorre dos textos legais, especialmente o constitucional.

A regulação administrativa reporta-se ao caput do art. 174 da CF, de

modo a estabelecer que toda função estatal é normativa e que administrar é, em

regra, realizar a edição de normas concretas, pois o próprio texto constitucional (art.

49, inciso V e art. 169 da CF) indica possibilidade de função administrativa

normativa.

A palavra regulação é constitucionalmente ambígua, sendo que a

regulação administrativa em sentido estrito não consiste em atividade no sentido

constitucional, quando da edição de normas abstratas. Regular é efetuar

ponderações no plano concreto.

69

No Direito Brasileiro regulamentação significa a edição de normas

abstratas através do chefe do Executivo para que se torne possível a fiel execução

das ponderações legislativas. Todo regulamento é executivo no Direito Brasileiro.

Desta forma a finalidade da regulação possui referência a uma atividade,

edição de um ato normativo e produto dessa atividade, para os efeitos do ato

administrativo editado e seu resultado jurídico produzido, sendo que tanto a

atividade quando o resultado são conceitos definidos pela finalidade.

A regulação nos termos do art. 174 ocorre não apenas pela função de

fiscalização mas também pela função de incentivo (fiscalização refere-se à função

administrativa ordenadora; incentivo refere-se à função administrativa fomentadora).

O fomento pode ser caracterizado pela voluntariedade e pelo objetivo de satisfação

indireta das necessidades públicas (MARTINS, 2011, p. 128-129).

Existe um terceiro meio de regulação que é a exploração direta da

atividade econômica, conforme o art. 173 da CF, essa regulação ocorre por três

formas: por direção; por indução; e por participação. Tal classificação aplica-se

também à intervenção do Estado na ordem econômica, sendo que toda regulação é

uma intervenção na ordem econômica mas a recíproca não é verdadeira.

O reconhecimento da interferência no comportamento dos demais por um

agente econômico é garantido pela CF conforme seu art. 173, §4º, que proíbe o

abuso do poder econômico, e como definição toma-se o poder econômico no

seguinte sentido:

Poder econômico quer dizer poder de controlar os preços. Na concorrência perfeita ninguém o detém: os agentes econômicos são suficientemente numerosos, de modo a assegurar que nenhum deles afete o preço de mercado. Há dois tipos de poder econômico: o monopólio é a capacidade do vendedor e o monopsônio é a capacidade do comprador de influenciar no preço. Vale dizer: monopólio é um mercado em que existe apenas um vendedor e muitos compradores; monopsônio é um mercado em que existe apenas um comprador e muitos vendedores. Em ambos os casos o preço não é ditado pelo mercado, mas pelos agentes econômicos. Os economistas propõem a intervenção estatal como meio de enfrentamento dessa falha de mercado, indicando três alternativas básicas: (a) lei antitruste, pelas quais o governo pode impedir a fusão de empresas e, pois, a formação de monopólios; (b) fixação de preços; (c) apropriação pública do monopólio ou estatização do monopolista (MARTINS, 2011, p. 90).

O sistema jurídico brasileiro aparece assentado no valor fundamental da

liberdade. Acerca da regulação administrativa, esta refere-se à atividade econômica,

70

ou seja, à interferência da Administração Pública sobre a atividade econômica, a

regulação por ordenação consiste na restrição do direito fundamental à livre

iniciativa econômica concretizada pela atuação da Administração Pública.

4.2. FISCALIDADE E EXTRAFISCALIDADE

A supremacia do interesse público sobre o do privado é um princípio relevante

do Direito Tributário, no sentido de que:

[...] pela supremacia do interesse público sobre o do particular, o Estado, na busca da realização das metas constitucionais, pode exigir o sacrifício de recursos dos indivíduos. Em termos positivos, o princípio encontra guarida no objetivo fundamental da República Federativa do Brasil em construir uma sociedade solidária (art. 3º, I) em que, é razoável considerar, todos devem contribuir para que o Estado alcance seus objetivos, representados genericamente pelo bem comum (GOUVÊA, 2006, p. 36).

Inserido nesse aspecto traz-se a figura da fiscalidade que possui como

finalidade a de arrecadar recursos, de forma a suprir as necessidades dos cofres

públicos, sendo que esta atividade decorre da supremacia do interesse público

sobre o interesse do particular.

Ainda que no Estado Democrático de Direito seja obedecido o regime

constitucional, que valoriza a livre iniciativa e o direito da propriedade, que tenha

como capitalismo seu sistema econômico, cujas regras impedem ou limitam a

atividade econômica estatal, é axiomático adotar-se a tributação como forma de

obtenção de recursos para financiar a concretização dos fins estatais. Desta forma,

havendo fundamentos econômicos, históricos, políticos e sociais para a tributação,

com vistas ao provimento de recursos para o Estado pode-se traduzi-los no

fundamento jurídico-principiológico que denomina-se fiscalidade.

A extrafiscalidade pode ser considerada igualmente como princípio de

legitimação da incidência tributária, sendo necessário sustentar um fundamento

jurídico que permita ao Estado tributar, com vistas a objetivos diversos, distintos da

arrecadação, afastando os interesses individuais contrários à incidência tributária.

71

Revela-se, assim, outra faceta do corolário da supremacia do interesse público sobre o interesse do particular, no Direito Tributário. O Estado tributa com vistas a auferir receitas, e assim a supremacia do interesse público consubstancia o princípio da fiscalidade. Quando se apreciam objetivos outros, que se afastam da pura arrecadação, apresenta-se a extrafiscalidade. Eis a extrafiscalidade como princípio, decorrente da supremacia do interesse público, que fundamenta, juridicamente, a tributação com fins diversos do puramente arrecadatório (GOUVÊA, 2006, p. 43).

Portanto, a figura da extrafiscalidade é a que impõe a tributação de maneira

que o Estado possa obter efeitos não arrecadatórios, mas sim econômicos, políticos

e sociais, buscando os fins que lhe são impostos pela CF.

O desenvolvimento econômico e a tributação aparecem no sentido de que as

preocupações com o desenvolvimento ultrapassem às voltadas para o crescimento

quantitativamente considerado e também para as correções do mercado, de forma

que o desenvolvimento busca minimizar ou anular as baixas dos ciclos econômicos.

4.3. INTERDISCIPLINARIEDADE NA RELAÇÃO DIREITO E ATIVIDADE

ECONÔMICA – INTERVENÇÃO ESTATAL

A intervenção do Estado na sociedade, que em decorrência de um intenso

esforço competitivo entre os grandes Estados, desencadeou um novo processo

intervencionista (DALLARI, 2007, p. 283).

Desta forma, o Estado passou a ser um grande financiador e um dos

principais consumidores, associando-se com muita frequência aos maiores e mais

custosos empreendimentos.

O Estado exerce a função de agente negociador e poderoso apoiador dos

grupos econômicos e financeiros privados, abrindo mercados para exportação,

patrocinando acordos econômicos, instituindo barreiras protecionistas para

favorecimento dos interesses econômicos de grupos que se encontram sediados em

seu território.

Neste sentido:

Constatando as influências do planejamento e do desenvolvimento tecnológico no mundo atual, observa GALBRAITH que o planejamento bem

72

sucedido nas áreas de tecnologia cara e sofisticada exige que o Estado subscreva os custos de pesquisa e aperfeiçoamento, e que garanta um mercado para os produtos resultantes. O atrativo exercido pela tecnologia refinada, mesmo sobre as pessoas de menor nível cultural, fez com que seu financiamento se tornasse uma função social aprovada, não se indagando dos reais benefícios que o empreendimento trará à sociedade. Além disso tudo, observa-se que os modernos processos de organização, produção, divulgação, venda e distribuição não ficam mais na dependência de mecanismos espontâneos de oferta e procura, nem decorrem de iniciativas idealistas que assumem todos os riscos. Em algum lugar disso, apoiam-se em pessoal técnico altamente especializado, que, na sua quase-totalidade, têm a sua formação financiada ou mesmo custeada pelo Estado. A consequência disso tudo é que já se pode considerar definido um novo intervencionismo do Estado na vida social. Desapareceram os limites entre o público e o privado, e o Estado, antigo mal necessário, passou à condição de financiador, sócio e consumidor altamente apreciado, tendo cada vez mais estimulada sua atitude intervencionista, justamente pelos grupos que mais se opunham a ela (DALLARI, 2007, p. 283-284).

Ao final do século XX começou a integrar o vocabulário corrente: a

globalização, ressalta-se que a ideia da globalização pretende fundamentar-se

originariamente nas relações econômicas e nas atividades financeiras.

O mundo todo aparece unificado com padrões do capitalismo e pela falta de

conflitos o Estado substitui-se pela iniciativa privada, mostrando assim, a

globalização sob a égide do mercado. Ainda que quase não subsistam barreiras

nacionais para movimentação financeira, existem graves divergências quanto à

circulação de mercadorias e serviços, face ao protecionismo que muitos Estados

praticam e que é uma maneira de intervenção do Estado nas relações econômicas.

A globalização se apresenta como expressão das forças de mercado, e

também pode ser a expressão do reconhecimento da existência de importantes

inovações entre os Estados e as instituições econômicas e financeiras, porém está

longe de significar a integração mundial das sociedades humanas e também dos

grupos nacionais.

Ainda, é possível estabelecer o desenvolvimento como fundamento

interventivo e não como subsidiariedade, exposto da seguinte forma: primeiramente

tomamos o desenvolvimento inserido na economia (análise de organizações

políticas – estudo macroeconômico), e a partir desse tipo de verificação traz-se dois

conceitos: o da eficiência estática e o da eficiência dinâmica, visto que em uma

organização político-econômica há consideração estaticamente eficiente no caso de

ocupação da capacidade produtiva do sistema econômico e de seus recursos

73

humanos de maneira plena, desta forma preconiza-se o pensamento de eficiência

dinâmica.

Neste sentido:

O desenvolvimento, em geral, é definido pelos autores como um processo autossustentado. Um processo que faz, portanto, as condições de vida se elevarem continuamente ao longo de um dado período. Por consequência, a expressão “desenvolvimento autossustentado”, é apenas crescimento, ainda que venha acompanhado de melhorias no tocante ao bem-estar social. Portanto, “para que ocorra realmente um processo de desenvolvimento a melhoria do padrão de vida da população deverá tender a ser automática, autônoma e necessária”. Em regra, o crescimento pode ser chamado de exógeno, pois implica aumento de Produto Interno Bruto ou renda per capita sem mudança na estrutura social e por um tempo determinado. Neste caso, o crescimento é em regra decorrente de fontes externas, como, por exemplo, operações internacionais de crédito. Nesse sentido, é apenas um “surto” (cessada a causa, retorna-se rapidamente ao estado anterior); não é processo. O desenvolvimento é sempre um processo. Quando há alteração estrutural, com desenvolvimento, o processo culmina em uma situação estável, a partir da qual não se fala mais em desenvolvimento, mas em mero crescimento (crescimento dentro do desenvolvimento). Os Estados considerados desenvolvidos (como Alemanha e Japão, por exemplo) apenas crescem, dentro de uma situação estável. Nesta situação o desenvolvimento não é mais um processo, e o crescimento não é considerado apenas um surto (GABARDO, 2009, p. 244).

A Constituição Federal de 1988 apresenta a recorrente utilização do

desenvolvimento, referindo-se sempre ao “desenvolvimento nacional ou regional”,

como por exemplo, nos artigos 3º, II e 174, parágrafo 1º. O desenvolvimento deve

ser entendido mais como um direito fundamental, tanto no plano interno quanto

internacional.

Ainda que a ligação entre subsidiariedade e desenvolvimento seja comum,

no Brasil não é possível fazer tal relação, pois a ordem econômica presente da

Constituição Federal de 1988 não elenca a subsidiariedade como um princípio,

ainda que alguns autores identifiquem sua previsão legal, assim o processo de

desenvolvimento previsto se caracteriza de forma centralizada e estabelece

competências tanto para o Estado como para os entes e também regulamenta

especificamente o que é direcionado à iniciativa privada.

Desse modo o crescimento econômico deve ocorrer de forma a atender as

solicitações das diferentes classes sociais, regiões e países, de modo que o

desenvolvimento passa a ser compreendido como resultante do processo de

74

crescimento autossustentado, e na procura pelo crescimento encontra-se presente o

sentimento de que o bom ocorre quando se tem mais, sem ter importância a

qualidade desse acréscimo, de maneira que as sociedades consideradas

desenvolvidas são as capazes de produzir continuamente.

Por isso as nações perseguem o desenvolvimento, visando angariar mais

bens sem se preocupar com os efeitos dessa acumulação.

O crescimento econômico, ainda que não seja condição suficiente para o

desenvolvimento é um requisito para que seja superada a pobreza e também para a

construção de um padrão digno de vida (OLIVEIRA, 2006, p. 21).

Veja-se que a distribuição dos frutos do crescimento econômico precisa ser

regida através dos princípios da necessidade e da justiça social e não só pelos

desígnios das forças econômicas dominantes e relações de poder político e dos

processos de decisão que, usualmente, fazem o favorecimento de algumas regiões

e grupos em detrimento das regiões mais carentes e também das camadas

marginalizadas da população.

A sociedade pode se organizar no sentido de transformar os impulsos de

crescimento econômico em melhores níveis de qualidade de vida para todos, sendo

assim, resta pensar em um novo cenário que favoreça o conjunto da população e

não somente pequenos grupos sociais. Deve-se pensar em uma economia social, a

serviço de todos, favorecendo a melhoria dos indicadores de qualidade de vida.

O Estado de Direito só está autorizado a intervir na ordem econômica por

meio de princípios formais, porém, ao passo que a regulação econômica ocorre

através de regras formais, a regulação social vem exigir a intervenção judiciária para

que seja feito o arbitramento das regras. Portanto, quanto mais formal a intervenção

estatal maior é a necessidade de que o serviço judiciário seja onipresente,

evidenciando a instrumentalização do direito pela economia e pela política.

As normas econômicas de intervenção do Estado na economia sempre

existiram, onde houve concentração econômica acabou havendo intervenção do

Estado na economia, ambas são tão antigas quanto a própria economia de câmbio.

Verifica-se que o Direito Econômico surgiu para dar base a uma concepção

“neomercantilista”, oposicionista às doutrinas socialistas, favorecendo a formação

dos grandes conglomerados industriais, comerciais e financeiros (SILVA, 2002, p.

65).

75

A perspectiva do Direito Econômico apenas como intervenção do Estado na

vida econômica ocorre no sentido de que a:

[...] economia é toda a atividade dirigida à produção, distribuição e consumo de bens. Assim, Direito da Economia identifica-se com todo o direito relativo à economia, de maneira extensa sem exprimir especificidade. Por outro lado, Direito Econômico, abrangendo apenas alguns aspectos específicos do Direito da Economia, restringe-se ao ponto de encontro de todas as regras de Direito Privado e de Direito Público atinentes à atividade econômica. Portanto, se quisermos abordar a definição de Direito Econômico temos que nos ater a sua concepção restrita, ou seja, se quisermos dar solidez e unidade ao Direito Econômico temos que tomar como ideia fundamental justamente a intervenção do Estado na vida econômica, porque a redução do Direito Econômico exclusivamente ao direito da intervenção do Estado na economia obtemos automaticamente do Direito Econômico uma concepção restrita. [...] é evidente que a delimitação e a caracterização do Direito Econômico comporta sempre algo de convencional e de pragmático, de molde a fornecer um conceito operacional. Assim, do seu conteúdo pode, de certo modo, dizer-se que “Direito Econômico é o que a doutrina jurídico-econômica convencionou ser” (SILVA, 2002, p. 71).

Desse modo, a concentração econômica e a intervenção do Estado ocorrem

nestes tempos de grandes empreendimentos industriais, sendo evidente que as

grandes concentrações de capital são exigidas para realizar a tarefa de hoje, e que

este capital só pode ser fornecido por meio de grandes combinações de interesses

privados ou pelo governo.

O surgimento do Estado social teve como pano de fundo guerras sem

precedentes e uma forte concorrência ideológica entre o socialismo e o capitalismo e

também pelo fracasso do liberalismo clássico.

Através do excesso do mercantilismo e também a mudança que surgiu por

meio do renascimento e desenvolvimento do capitalismo, decorreram ideias que

acabaram por modificar a própria estrutura do mercado, que conviveram então com

a dicotomia marcada pela intervenção e liberdade, neste momento as doutrinas mais

relevantes da história da economia podem ser mencionadas, tais como a Escola

Fisiocrática e a Escola Clássica.

Ressalta-se que a reserva constitucional não se mostra incompatível com o

desenvolvimento constitucional, de modo que a Constituição não pode ser imutável,

necessita de uma capacidade de evolução histórica, mas sem ser volúvel. Existe

uma interligação necessária entre o espírito do Estado com a essência da

Constituição, ambos envolvidos pelo “sentimento jurídico”, que fornece a ligação

76

mental para a configuração público-institucional, pois o sentimento constitucional

firma inter-relações de forma permanente entre Estado, sociedade civil e natureza.

Por meio da relação indissociável do Estado e Constituição ressaltam-se três

princípios de ordenação das instituições políticas presentes no regime democrático:

reconhecimento dos direitos fundamentais; representatividade social da política e

seus dirigentes; consciência acerca de cidadania. O direito não pode ser apenas um

componente formal da Constituição, deve ser reconhecido pelo sentimento coletivo

proveniente da sociedade civil. Assim o Estado social parte da premissa de um

modelo que tenha como pressuposto a positividade, passando a ser o modelo típico

de uma sociedade que faz a máxima exigência.

É possível verificar também que a solidariedade é um atributo típico do

Estado social e também característica da intervenção pública automática e que

também a solidariedade social não possui restringência a questões econômicas,

mas se refere igualmente a questões de caráter moral. (GABARDO, 2009, p. 168).

4.4. INTERVENÇÃO DO ESTADO E O BEM-ESTAR

O art. 174 da CF confirma o conceito de atividade econômica em sentido

amplo, pelo qual o Estado deve regular o setor público e o privado. Assim como art.

170 da CF define que tanto setor público como privado devem pautar sua atuação

na valorização do trabalho humano.

Para realizar a adequação do uso do vocábulo intervenção entende-se

que ele serve para referir a atuação estatal no campo da atividade econômica em

sentido estrito (domínio econômico), nas palavras de Ricardo Marcondes Martins

(2011, p. 280-281):

O sistema econômico sem a intervenção do Estado não funciona adequadamente. Negar isso é atentar contra uma obviedade. Contudo o controle do Estado não é absoluto, não é total: os agentes econômicos têm liberdade. Trata-se de um regime capitalista. Daí ser tecnicamente correto falar em intervenção, ingerência do Estado no campo de outrem a regulação é uma espécie de intervenção (supra, II/6.4.4). Onde não há liberdade, não há, do ponto de vista jurídico, regulação em sentido estrito. O texto constitucional de 1988 é, nesse ponto, de técnica invulgar: regulação diz respeito à atividade econômica, campo dos particulares sujeito à intervenção do Estado.

77

No XII Simpósio do IET Luís Eduardo Schoueri afirmou o seguinte ponto

acerca da intervenção sobre o domínio econômico:

O que é intervir sobre o domínio econômico? Intervir sobre o domínio econômico significa, num sentido negativo, corrigir distorções do mercado. Por exemplo, quando há empresas formando um monopólio, pode-se fazer uma intervenção para criar concorrência, para gerar novos agentes no mercado. É uma intervenção do Estado que almeja corrigir falhas do mercado. Por outro lado, muitas vezes a intervenção sobre o domínio econômico também ocorrerá positivamente, para concretizar objetivos da própria Constituição. No art. 170 deste diploma, nós encontramos objetivos de atuação positiva do Estado, como, por exemplo, erradicar desigualdades regionais, diminuir as desigualdades sociais, promover a microempresa, garantir a soberania nacional, assegurar o exercício da função social da propriedade. A intervenção do Estado é que pode, então, ser motivada: no sentido negativo para correções de distorções no mercado e no sentido positivo, para concretizar os princípios da ordem econômica (SHOUERI, 2004, p. 147-148).

Já Eros Roberto Grau (2007. p, 148-149) faz a distinção de três

modalidades de intervenção: intervenção por absorção, pela qual o Estado assume

integralmente o controle dos meios de produção; intervenção por participação, pela

qual o Estado assume o controle de parcela dos meios de produção; e intervenção

por direção, pela qual o Estado exerce pressão sobre a economia ou por indução,

quando o Estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na

conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados.

A intervenção por indução ocorre em dois pontos, a saber: o primeiro

quando o Estado onera por imposto elevado o exercício de determinado

comportamento; e o segundo decorrente da execução, por ele, de obras e serviços

públicos de infraestrutura, que tendem a otimizar o exercício da atividade econômica

em sentido estrito em certas regiões.

Traz-se ainda a intervenção no comércio por tabelamento de preços que é

uma das matérias em que mais tem se exercido o poder de intervenção, sendo que,

de acordo com Alberto Venâncio Filho:

O fundamento da intervenção do estado no setor do comércio encontra sua razão na doutrina do poder de polícia, definido por FREUND sucintamente como o poder de promover o bem-estar público, restringindo e regulando o uso da liberdade e da propriedade. Na doutrina e na jurisprudência norte-americana, o exercício das faculdades intervencionistas foi feito, utilizando

78

as atribuições contidas na famosa cláusula do comércio (art. 1º, seção 8ª da Constituição), que atribuía ao Congresso o poder de regular o comércio entre as nações estrangeiras e entre os vários Estados e entre as tribos indígenas. A conceituação do poder de polícia em nossa doutrina jurídica provoca, a nosso ver, a discussão sobre a intervenção do Estado no domínio econômico, facultada não só à União, como também aos Estados Federados e aos Municípios (VENÂNCIO FILHO, 1998, p. 255).

Deve-se ainda mencionar a justificativa do livre comércio, ligada à intervenção

do Estado como mediador, Friedman (1980, p. 62-63) se posiciona no seguinte

sentido:

A interdependência é uma característica geral do mundo moderno: na esfera econômica propriamente dita, entre um e outro conjunto de preços, entre uma e outra indústria, entre um e outro país; na sociedade mais ampla, entre a atividade econômica e as culturais, sociais e caritativas; na organização da sociedade, entre acordos econômicos e acordos políticos, entre liberdade econômica e liberdade política. Na esfera internacional, igualmente, os arranjos econômicos entrelaçam-se com os acordos políticos. O livre comércio internacional promove relações harmoniosas entre nações que diferem em cultura e instituições, da mesma forma que dentro do país fomenta relações cordiais entre indivíduos que diferem em crenças, atitudes e interesses. Num mundo de livre comércio, como numa economia livre em um país qualquer, transações ocorrem entre entidades privadas – indivíduos, empresas, organizações de caridade. Os termos nos quais as transações se concretizam são objeto de acordo entre as partes que delas participam. A transação não ocorre a menos que todas as partes acreditem que delas vão tirar um benefício. Como resultado são harmonizados os interesses das várias partes. A cooperação e não o conflito, é a regra. Quando o governo intervém, muda inteiramente a situação. Dentro do país, empresas reivindicam subsídios, seja de forma direta seja em forma de tarifas ou outras restrições ao comércio. Procuram evitar as pressões econômicas concorrentes que lhes ameaçam a rentabilidade, ou a própria existência, recorrendo à pressão política e, assim, impondo-lhes custos. A intervenção do governo em favor de empresas locais leva empresas de outros países a pedirem ajuda a seus próprios governos, a fim de contrabalançar as medidas tomadas pelo governo estrangeiro. Desacordos privados transformam-se em motivos de disputas entre governos. As negociações comerciais adquirem, todas elas, conotações políticas.

Desta forma, a existência de um poder ordenador acompanha a história da

sociedade, não sendo característica do momento moderno, ou seja, eram várias as

formas de intervenção pública, determinadas a evitar abusos nas satisfações

individuais demonstradas pelos interesses ou exercício de direitos e liberdades

atribuídos aos particulares. Verifica-se o afastamento da autotutela como uma

exigência sociocultural, entendendo o Estado nacional e suas formas de intervenção

79

conduzindo ao reconhecimento de diversos sistemas econômicos e correntes de

pensamento.

A partir de tal visão, para Emerson Gabardo (2009, p. 155), releva-se que:

Toda economia é um sistema ou um tipo, “no sentido de um conjunto de elementos ordenados unitariamente e dotados de certa estabilidade”. Por conseguinte, possui elementos pessoais (produtores, consumidores), materiais (meio de produção, matéria prima) e processos (produção, distribuição), podendo ser caracterizado segundo dois critérios fundamentais: o modo-de-produção (foco de Karl Marx) e o tipo-de-coordenação (foco de Max Weber). O primeiro trata das relações entre produtores, meios ou instrumentos de produção e os próprios produtos (por exemplo, o capitalismo defende a apropriação privada dos meios; o socialismo, a sua expropriação). O segundo critério indica a pré-ordenação da ação econômica, por exemplo, sugerindo a economia de mercado (autonomia dos indivíduos típica do capitalismo) ou a economia dirigida (interferência de uma entidade central e superior típica do socialismo). Há várias possibilidades entre estes modelos estruturantes e, ademais, em uma economia concreta nunca há um único sistema econômico puro (embora sempre haja um dominante). O Estado social, desse modo, caracteriza-se por introduzir por meio da ordem constitucional um específico modelo de forte intervenção cujo modo-de-produção é pautado pela apropriação mista dos meios de produção e por um esquema de planejamento parcial em um sistema econômico predominantemente capitalista. Estruturação esta que, a partir das mudanças institucionais ocorridas na última década do século XX, passou a ser determinada fortemente pelo equilíbrio fiscal e pela preferência pelas parcerias privadas, em oposição ao momento antecedente, cuja característica era justamente contrária, ou seja, de imposição do déficit e da intervenção direta como meios de fomento econômico.

Conforme o pensamento de Amartya Sen percebe-se que:

Na lógica intervencionista de Smith, o argumento básico é que os sinais de mercado podem ser enganos, e as consequências do livre mercado podem ser um grande desperdício de capital, efeito do empenho privado em empreendimentos mal orientados ou míopes, ou do desperdício privado de recursos sociais. Jeremy Bentham criticou Smith em uma longa carta que lhe escreveu em março de 1787, defendendo a não-intervenção no mercado. Esse é um episódio notável na história do pensamento econômico, com o principal intervencionista utilitarista fazendo preleção para o guru pioneiro da economia de mercado sobre as virtudes da alocação de mercado (SEN, 2000, p. 149-150).

É perceptível o posicionamento de Amartya Sen no sentido de um

desenvolvimento social que se envolve em diversos âmbitos, especialmente

econômico e político, verificando um certo intervencionismo com reservas, inclusive

em formas de incentivo para a regulação do mercado.

80

O Estado deve se responsabilizar pelo incremento civilizatório da sociedade,

de maneira a proteger os indivíduos no caso de possível retrocesso nas esferas

socioeconômica, sociocultural e socioambiental (GABARDO, 2009, p. 178). Pode-se

mencionar que uma concepção constitucional da democracia torna-se necessária no

sentido de que as decisões coletivas devem ser tomadas pelas instituições políticas

cuja estrutura, composição e práticas tratem a todos os membros da sociedade

como indivíduos com consideração e respeito de forma igualitária.

É necessária a neutralidade institucional do Estado frente às concepções

que são rivais de bem e, a partir dessa premissa, é preciso de uma neutralidade

ética, concluindo que tanto a tolerância não limitada quanto a tolerância ilimitada

seriam da mesma forma tão destrutivas ao tecido social como uma unificação ética

totalitária, ou seja, ser intolerante a respeito de algumas coisas é a mesma condição

para ser tolerante a respeito de outras, firmando uma dualidade entre tolerância e

intolerância de forma que essa dualidade se mostra incrivelmente mais importante

que os polos isolados de cada um dos lados, relacionando-se intrinsecamente com a

solidariedade.

5. RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA

5.1. O ESTADO E A ATIVIDADE EMPRESARIAL SOB A ÓTICA DO PRINCÍPIO DA

DIGNIDADE HUMANA

A figura do Estado Democrático de Direito tem sua atividade e sua

forma de organização política determinadas e limitadas pelo direito, sendo que o

Estado é estruturado na juridicidade estatal que tem como suas dimensões

fundamentais o governo de leis, o reconhecimento de direitos, a garantia de tribunais

independentes, o pluralismo, o funcionamento do sistema de organização estatal, as

liberdades e garantias, a organização do poder e o primado do legislador, que estão

subordinadas ao exercício do poder do Estado, ou seja, aos princípios da

responsabilidade e controle feito por meio de instrumentos jurídicos determinados

constitucionalmente (MARTINS, 2007, p. 191-207).

81

Já a atividade empresária privada exige responsabilidade através de uma

atuação ética, ou seja, a busca do lucro é dever da empresa. Importante esclarecer

que o bom funcionamento de uma empresa (o que é oxigenada pela obtenção dos

lucros produzidos pela mesma) também é um ente de relevância social para uma

determinada comunidade na medida em que gera empregos, recolhe tributos, etc.

Contudo, essa atuação não é suficiente. O desenvolvimento da atividade

empresária privada requer mais na ótica constitucional. Exercer a função social

estabelece o respeito no desenvolvimento da sua atividade ao meio ambiente local.

Não se pode pretender que uma empresa que utiliza recursos naturais, seja em

qualquer escala, promova o desrespeito ao meio ambiente em que está inserida.

A atividade empresária deve encontrar na sua função social a sua importância

enquanto ente gerador de riquezas junto à sociedade. Diante da sua importância

social, deve-se reconhecer a necessidade de geração de lucros, mas exercendo a

sua atividade de maneira responsável, ética e solidária.

O Direito positivo cumpre funções de legitimação, não como indutor de certos

efeitos éticos – característica que o postulado da pureza descarta –, mas através de

sua sistemática racional, que serve para organizar o consenso em torno do

monopólio da força, emprestando-lhe um caráter racional.

O Direito positivo cumpre, então, uma função mítica em relação ao exercício

da coação por parte dos órgãos do Estado, pois apresentando-a como resposta

ética frente à comportamentos indesejáveis dos indivíduos, nega aquela coação

como componente da organização da sociedade. Essa função mítica sustenta-se, de

outra parte, na suposta vinculação da política com a justiça. (WARAT, 2002, p. 170-

171).

A partir de tal realidade, François Chesnais afirma que a sociedade deve se

adaptar às novas exigências e obrigações, descartando a ideia de se orientar,

dominar, controlar ou canalizar esse novo processo, portanto, a globalização

apresenta-se como expressão das “forças de mercado” (CHESNAIS, 1996, p. 25).

Cabe precisar que os traços da mundialização encontram-se no capital

quanto ao nível das empresas e não quanto ao nível do comércio internacional,

sendo que a internacionalização se mostra dominada mais através do investimento

internacional do que pelo comércio exterior, moldando assim as estruturas

predominantes da produção e intercâmbio de bens e serviços.

82

A mundialização não se refere somente às atividades de grupos empresariais

e fluxos comerciais que elas provocam, mas também à globalização financeira.

A forma de oferta mais presente no mundo é o oligopólio, sendo que a

existência de situações com essa característica não se reduzem mecanicamente ao

grau de concentração, portanto, as companhias não reagem mais a forças

impessoais provenientes do mercado mas pessoal e diretamente a suas rivais. O

oligopólio é um espaço de rivalidade delimitado pelas relações de dependência

mutua de mercado.

O uso do termo externalização remete a dois processos distintos, ainda que

concomitantes: primeiro indicando a extensão ou aprofundamento da divisão

industrial do trabalho; o segundo aparece por oposição à internalização frente a

teoria dos custos de transação, esse sentido é o que deve ser utilizado.

A empresa-rede apresenta-se como uma nova forma de organizar e gerenciar

hierarquias e não como uma ruptura com as hierarquias e a internalização, bem

como maximizar as possibilidades de “internalizar” as “externalidades”

proporcionadas pelo funcionamento em rede.

O caráter mundializado da concorrência aparece de maneira a afetar todas as

empresas, desde as puramente nacionais e pequenas e médias empresas, como

consequência direta da liberalização do intercâmbio.

A atividade empresária exige responsabilidade por meio de uma atuação

ética, de modo que a busca do lucro é dever da empresa, ou seja, o bom

funcionamento de uma empresa também é um ente de relevância social. A atividade

empresária também deve encontrar na sua função social a sua importância

enquanto ente gerador de riquezas junto à sociedade e diante da sua importância

social deve-se reconhecer a necessidade de geração de lucros exercendo a sua

atividade de maneira responsável, ética e solidária.

O Estado tem impacto direto neste sentido, devendo observar o Direito como

regulamentador e incentivador do cumprimento da responsabilidade social e também

da função social das empresas.

Neste contexto, verifica-se que o princípio da dignidade da pessoa humana é

um limitador do poder excessivo do Estado, de forma a impedir que o poder público

viole a dignidade da pessoa, o qual implica também na atuação do Estado, que

deverá ter como meta permanente a promoção, a proteção e a realização concreta

83

de dignidade para todos, assim, a figura da dignidade da pessoa humana e o

respeito e a proteção da dignidade da pessoa constituem-se em meta permanente

da humanidade, do Estado e do Direito.

A responsabilidade do estadista com o futuro diz respeito à sabedoria e

moderação que ele devota ao presente, ou seja, esse presente não está aí com vista

a um futuro de outra espécie, mas uma hipótese mais favorável, um futuro que é

igual e precisa justificar-se a si mesmo tanto hoje quanto naquele futuro. Assim

sendo, pode-se dizer que: "a ação política possui um intervalo de tempo de ação e

de responsabilidade maior do que aquele da ação privada, mas, [...] sua ética nada

mais é do que uma ética do presente [...]." (HANS, 2006, p. 54).

A teoria da responsabilidade aparece no sentido de apontar as diferença entre

responsabilidade legal e moral, refletindo na diferença entre o direito civil e penal,

com evoluções diferentes que dissociaram os conceitos de compensação e pena

que antes eram mesclados (responsabilidade legal e culpa) (HANS, 2006, p. 166).

A figura da teoria da responsabilidade que se refere aos pais e homem de

estado como paradigmas eminentes tem em comum entre ambas responsabilidades

três conceitos (totalidade; continuidade; futuro) referidos à existência e sorte dos

seres humanos.

A positivação do princípio da dignidade da pessoa humana é relativamente

recente, ao longo do séc. XX, a partir da Segunda Guerra Mundial, a dignidade da

pessoa humana passou a ser reconhecida expressamente nas Constituições, após a

consagração pela Declaração Universal da ONU de 1948 (SARLET, 2012, p. 80).

Desta forma, pode-se dizer que o Estado existe em função da pessoa

humana, e não o contrário, já que o ser humano constitui finalidade precípua, e não

meio da atividade estatal.

Assim, o princípio da dignidade da pessoa humana impõe limites à atuação

estatal, o qual visa impedir que o poder público viole a dignidade da pessoa, o qual

implica também na atuação do Estado, que deverá ter como meta permanente

promoção, proteção e realização concreta de dignidade para todos.

Todos os órgãos, funções e atividades estatais estão vinculados ao princípio

da dignidade da pessoa humana, o qual impõe um dever de proteção e respeito e,

em razão disso, o Estado deve abster-se de ingerência na esfera individual que

sejam contrarias a dignidade pessoal. O princípio da dignidade da pessoa humana

84

além de impor dever de respeito deve ter conduta positiva para proteger, justamente

a dignidade.

A dignidade da pessoa humana impõe ainda ao Estado a obrigação de

promover as condições que viabilizem e removam obstáculos que impeçam as

pessoas de viverem com dignidade.

A própria eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares

encontram fundamento no princípio da dignidade, já que os direitos fundamentais

vinculam diretamente os particulares nas relações entre si.

O Estado é autorizado e obrigado a intervir em face de atos de pessoas que

atentem contra sua própria dignidade.

No princípio da dignidade e no princípio fundamental, decorrem direitos

subjetivos a proteção, respeito e promoção em razão do reconhecimento de direitos

fundamentais de modo autônomo, o qual implica ainda na ultima ratio por força de

dimensão intersubjetiva.

Deve haver ainda uma ponderação, de bens em causa com vistas à proteção

da dignidade da pessoa humana, aplicando-se o princípio da proporcionalidade que

já está conectado ao princípio da dignidade.

O princípio da dignidade da pessoa humana possui dupla função e serve

como um importante elemento de direitos contra medidas restritivas contra abusos

de direito e ainda serve como uma justificativa de restrições à direitos fundamentais,

atuando como elemento limitador. Tal princípio atua ainda de maneira simultânea

como limites dos direitos e limites dos limites, sendo uma barreira contra a atividade

restritiva dos direitos fundamentais, o que não afasta a controvérsia sobre o próprio

conteúdo da dignidade e a existência, ou não, de uma violação do seu âmbito de

proteção (SARLET, 2012, p. 148-149).

5.2. FUNÇÃO SOCIAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL NO ÂMBITO DO DIREITO

EMPRESARIAL

A concepção de atividade empresarial se desenvolveu com base no

pensamento liberalista da sociedade pós Revolução Industrial, assim, a empresa

surgiu a partir dos contornos econômicos, políticos e jurídicos predominantes no

mundo ocidental (pensamentos filosófico, individualista e liberalista).

85

Com o advento do século XX, em decorrência das inúmeras transformações

sociais vivenciadas pós Guerra e da necessidade de uma mudança de perspectiva,

ocorreu uma atuação mais efetiva do Estado. Isto porque, houve uma perda na

confiança do individualismo liberal e a autonomia privada, tão enaltecida pelo

liberalismo, se tornou um flagelo as massas, impondo uma reavaliação de valores do

Estado Liberal.

Assim, neste contexto, surge uma nova ordem constitucional e um novo

contorno político: o Estado Social.

Com o Estado Social, a empresa passou a ser vista, não só a partir do

prisma econômico, mas também, como um elemento essencial para promoção dos

interesses sociais.

De acordo com Gisele Ferreira de Araújo:

O papel da empresa assume maior relevância na atuação em face da sociedade ampliando-se a discussão e promoção de função social e, consequentemente, de responsabilidade social da empresa, que apesar do caráter equívoco da conceituação exprime a noção básica de compromisso do empresário em adotar um padrão ético de comportamento, contribuindo para o desenvolvimento econômico, como estratégia de negócio que não só melhora a qualidade de vida de seus funcionários, mas da comunidade e da sociedade como um todo (ARAÚJO, 2007, p. 113).

Portanto, a empresa passa a ser um agente de transformação social que

atua diretamente no processo de desenvolvimento econômico, razão pela qual,

ampliou-se a necessidade de efetivar a promoção da noção de função social e

consequentemente de responsabilidade social da empresa.

Porém, não se pode tratar de responsabilidade social na empresa sem antes

definir as Sociedades Empresárias que, de acordo com o art. 1.150 do Código Civil

de 2002, englobam o gênero de sociedades que se vinculam ao Registro Público de

Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais. (SOUZA, 2007, p. 18).

Sendo que:

O grande desafio posto, presentemente, é fazer com que a atividade empresarial, em si mesma, seja compreendida e realizada como função social e, consequentemente, como responsabilidade social. A empresa, no sistema constitucional brasileiro, não se justifica em si mesma e no interesse dos integrantes do quadro societário ou de seus acionistas. A empresa somente merece tutela à medida que cumpre sua função social. A

86

função social não lhe é externa, como um limitador da autonomia privada. A responsabilidade social da empresa decorre do fato de que a função social lhe é intrínseca no ordenamento jurídico brasileiro. Desta forma, é precipuamente na realização de sua atividade fim que a empresa deve manifestar sua função social10 e, em decorrência, sua responsabilidade. Isto é, no exercício de seu direito e de sua autonomia estão implícitos deveres que lhe são inerentes. A responsabilidade social não diz respeito, primeiramente, a uma atividade paralela, a ser exercitada por um departamento de relacionamento com instituições culturais, científicas, filantrópicas, ou até mesmo esportivas. Este departamento ou até mesmo uma fundação pode existir, mas, a função social da empresa deve ser realizada e percebida no desenvolvimento de sua atividade essencial. (SILVA; SÉLLOS-KNOERR, 2013, p. 446)

A responsabilidade econômico-social das empresas engloba o sentido de que

a entidade empresarial pode ser visualizada sob três aspectos: como sociedade civil,

como empreendimento econômico e também como destinação social ou função

social, de modo que “a responsabilidade social empresarial (RSE) é a ferramenta de

gestão da empresa sustentável, ou seja, aquela empresa que estende as suas

atividades produtivas num longo prazo e dentro dos pilares da sustentabilidade:

econômico, social e ambiental”. (SILVA, 2011, p. 12)

As empresas de qualquer porte estão ordenadas por normas administrativas,

trabalhistas, tributárias, ambientais, sanitárias, orientadas para constituírem uma

organização que se volta para a sociedade visando o bem comum. Em relação ao

campo econômico, as entidades empresariais tem suas atividades organizadas por

meio de diretrizes capitalistas que buscam produzir lucro ou gerar renda, deste

modo, é inerente à atividade empresarial a geração de ganhos suficientes para

manutenção da empresa, aperfeiçoamento dos funcionários e também de

apropriação do lucro.

Acerca da função social como responsabilidade empresarial cabe mencionar

que várias entidades não governamentais buscam efetivar a ponte entre os

socialmente incluídos e os socialmente excluídos, por meio de atividades não

apenas assistenciais, mas promocionais das pessoas, respeitando sua dignidade,

dessa forma, a dignidade humana não aparece somente como um direito

fundamental, mas também por ser intrínseca a todos os homens sua distinção pela

racionalidade.

As empresas estão, modernamente, se organizando em função de uma

inserção social eficiente, seja internamente pela agregação de benefícios aos

87

trabalhadores ou externamente, por atividades de promoção junto aos excluídos,

estejam eles nas áreas de seu entorno geográfico ou em espaços e atividades

distantes.

Desde quando a legislação brasileira, constitucional e civil, reafirmou a

primazia da função social da propriedade, dos contratos e das empresas, surgiu um

novo paradigma empresarial nas discussões econômicas e jurídicas, assim:

Analisam, aquelas pesquisas, os conceitos de responsabilidade empresarial e sua função social, correntes na doutrina e na legislação, sob os enfoques dos Direitos constitucional, administrativo, civil, ambiental, tributário e penal, seguindo uma perspectiva dialética do particular frente ao coletivo. Por estes estudos sobre empreendedorismo, pode-se evidenciar que os direitos fundamentais, reconhecidos pela Constituição e assegurados a todos os cidadãos, embora particulares (subjetivos), não podem ser exercidos de forma absoluta e exclusiva, pois estão afetados pelas exigências coletivas de justiça social. Nesta linha de ideias, entendemos que o tema da responsabilidade das empresas, sob três visões apontadas, deva ser estudado segundo uma hermenêutica humanista do Direito, expressa pelos princípios fundamentais do respeito à dignidade da pessoa e prevalência dos direitos humanos. O tema se enquadra na linha das relações empresariais e inclusão social, que, por ser aberta, permite discurso eclético e multidisciplinar, nisto consistindo também sua relevância (SOUZA, 2007, p. 47-48).

Com efeito, estabelecer a função social da empresa é reconhecer na

solidariedade e na dignidade da pessoa humana, princípios norteadores e primeiros

da atividade empresária.

A função social da empresa diz respeito ao desempenho correto da atividade

empresária e, também diz respeito ao desempenho da sua atividade olhando para

tudo o mais onde está inserida essa empresa. Logo, não se pode estabelecer uma

atividade lucrativa havendo o recolhimento de todos os tributos e gerando empregos

com salários dignos, se ao mesmo tempo e de outro lado é verificado um claro

prejuízo ao meio ambiente, ao ambiente de trabalho e aos consumidores com

implementação de cláusulas e práticas abusivas.

Na doutrina de Pietro Perlingeri (2008, p. 510-511):

[...] de outro lado, que a praxe constitucional esgote a sua função no alargamento das fronteiras da vida do mercado, com uma mudança decisiva em direção às instâncias do `constitucionalismo econômico` e de um pragmatismo distante dos princípios e dos valores centrais do ordenamento

88

vigente, fazendo assim coincidir as razões de mercado com as razões do interesse público, a eficiência com a justiça.

Ainda, é possível afirmar que o princípio da função social da empresa é um

importante corolário lógico do princípio da função social da propriedade privada, que

era compreendido como direito absoluto, de modo que a CF apresentou limitadores

que possuem um viés social, impondo restrições à livre disposição da propriedade

(CLARO, 2009, p. 190)

Neste sentido:

Em um sistema inspirado na solidariedade política, econômica e social e no pleno desenvolvimento da pessoa (art. 2 Const.), o conteúdo da função social assume um papel do tipo promocional, no sentido de que a disciplina das formas de propriedade e as suas interpretações deveriam ser atuadas para garantir e para promover os valores sobre os quais se funda o ordenamento (PERLINGIERI, 1999, p. 226).

O objetivo da função social é o de mostrar compromisso e também as

responsabilidades sociais da empresa, de modo a reinserir a solidariedade social na

atividade econômica por meio de condicionamentos à própria atividade empresarial.

Ainda que a função social da empresa seja o corolário de uma ordem econômica,

cuja finalidade é a de assegurar a todos uma existência digna em conformidade com

a justiça social, a responsabilidade da empresa se faz em face da sociedade como

um todo e não somente perante seus concorrentes e consumidores (HUSNI, 2007,

p. 82).

Desta forma, a partir da função social podemos notar que, não obstante a

atividade empresarial visar o lucro, ela reflete diretamente no contexto social, seja a

partir do aumento na arrecadação de impostos, na geração de empregos, ou ainda,

possibilitando a circulação de riquezas.

De modo que uma empresa socialmente responsável é aquela que

efetivamente contribui para a disseminação dos valores sociais do contexto em que

está inserida, promovendo uma busca pela equidade e justiça social de modo a

equilibrar os conflitos sociais existentes, típicos de uma sociedade capitalista pós

revolução industrial.

89

O tema da responsabilidade social mostra-se obrigatório entre empresários,

gestores dos meios de produção e do comércio em uma economia capitalista, a

responsabilidade é entendida como obrigações constitucional, decorrente dos

princípios sobre a ordem econômica, presentes no art. 170 da Constituição Federal

(SOUZA, 2007, p. 49).

Tal artigo vincula a ordem econômica a um fim social, desse modo, a

liberdade de iniciativa empresarial dirige-se a uma finalidade humana, visando

garantir a existência digna das pessoas, conforme os ditames da justiça social, que

é fundada sobre os princípios: da soberania nacional – inciso I; da propriedade

privada – inciso II; da função social da propriedade privada – inciso III; da livre

concorrência – inciso IV; da defesa do consumidor – inciso V; da defesa do meio

ambiente – inciso VI; da redução das desigualdades regionais e sociais – inciso VII;

da busca do pleno emprego – inciso VIII; do favorecimento às empresas de pequeno

porte – inciso IX.

Dessa forma, conclui Carlos Aurélio Mota de Souza:

É, portanto, dever constitucional do empresariado privilegiar esta justiça social, a fim de garantir a todos cidadãos condições mínimas para satisfazer suas necessidades fundamentais, tanto físicas como espirituais, morais e artísticas. É princípio de justiça social, em uma ponta, pagar aos empregados remuneração justa, garantindo condições de sobrevivência digna; na outra, limitar o lucro arbitrário, ou os preços abusivos, como infrações à ordem econômica. A questão ganha relevância ao se tratar da função social da propriedade. Os empreendedores, possuindo os meios de produção, têm assegurada a reserva de seus bens e a possibilidade de lucro mediante sua utilização. No entanto, o conceito de que tais meios devem se destinar tão-somente à satisfação dos proprietários-empresários, foi afastado de nosso ordenamento jurídico, tanto pela Constituição Federal de 1988, como pelo novo Código Civil de 2002m quando limita a liberdade de contratar à função social do contrato. O uso do direito de propriedade e dos meios produtivos, é, portanto exercido com limitações. Além de proporcionar ganhos ao seu detentor, deve atender à sua função social, ou seja, destinar-se a fins sociais muito mais amplos, que a simples atenção ao mercado de consumo. O uso responsável da propriedade deverá visar, além da produção de bens e dos lucros, à melhoria da sociedade como um todo, na qual a empresa se insere. Trata-se de um investimento social, não assistencialista, que se torna garantia futura da própria subsistência do empreendimento. São, portanto, diretrizes precisas, de responsabilidade social, promover o bem-estar dos funcionários, proporcionando seu aperfeiçoamento profissional e pessoal; proteger os recursos naturais locais; respeitar o direito dos consumidores e os direitos humanos em geral; enfim, a satisfação de necessidades fundamentais da coletividade (SOUZA, 2007, p. 50).

90

Portanto, as empresas estão adstritas à observância dos princípios contidos

no art. 170 da CF, dentre eles, o da função social da propriedade, assim também

prevê o art. 1.228, §1º do Código Civil de 2002 que dispõe: “O direito de propriedade

deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e

de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecimento em lei

especial, a flora, a fauna e as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio

histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” (SOUZA, 2007,

p. 52-53).

A função social da propriedade é correlata à função social do contrato e da

empresa. No Código Civil não há explicitamente a função social da empresa, de

modo que aplica-se a ela o art. 421 da mesma legislação: sua sociedade significa a

democratização e moralização do governo da empresa, e a concretização de uma

conduta que atende aos superiores interesses do país e da sociedade.

Destaca-se, também, acerca da livre concorrência:

A livre concorrência foi traço marcante no período posterior do direito comercial, tido como a quarta fase e conhecida como a teoria subjetiva moderna, ou ainda, a teoria da empresa. Na Itália depois de editado o Código Civil de 1942 com forte influência fascista, houve a unificação das atividades mercantis e civis no entendimento de que não deveria se dividir atos em civis e mercantis. O Código Civil brasileiro de 2002 adotou a teoria da empresa, influenciada pelo Direito Civil italiano, passando a configurar o empresário e a sociedade empresária em substituição ao antigo conceito de comerciante. Essa teoria adotou como forma de regulamentação da relação jurídica não somente os atos relativos ao direito do comerciante (subjetivo) ou dos atos do comércio (objetivo), mas regulamente a forma e a atividade empresarial (subjetiva moderna). Dessa forma, a teoria adotada contempla o antropocentrismo, pois a pessoa humana do empresário é a responsável pela atividade da empresa, respondendo por ela e pelos seus atos perante os seus sócios e a sociedade (LORGA, 2013, p. 248-249).

Desta forma, a responsabilidade social está explícita na categoria das

empresas de economia privada, que se inserem no mercado, porém conscientes de

uma hipoteca social que as orienta para uma justa e eficiente aplicação do lucro

através das várias modalidades conhecidas e praticadas, de modo que a concepção

mais ampla da responsabilidade social funda-se na crítica ao objetivo exclusivo da

empresa de obter lucro em curto prazo, não ponderando fatores sociais, éticos e

econômicos, e forma a aceitar uma proposta alternativa de um modelo que também

considere as exigências externas à sociedade empresarial.

91

Mas o que é uma empresa socialmente responsável? Para Gisele Ferreira de

Araújo:

Evocando-se a definição contida no Livro Verde da Comissão da União Europeia, diz-se que a RSE é a integração voluntária de preocupações sociais e ambientais por parte das empresas nas suas operações e na sua interação com outras partes interessadas. Reconduz-se ao cumprimento dos deveres e ao respeito pelos direitos consagrados na lei fundamental e na legislação comum, em outros termos, esgota-se na obediência às normas em vigor. Envolve, ao nosso ver, a adoção de comportamentos com conteúdos mais atuantes e inovadores. Como decorre do Livro Verde da Comissão, através da RSE, as empresas vão para além dos requisitos reguladores convencionais e procuram elevar o grau de exigência de Direito construído. O voluntarismo é necessariamente uma característica de referência obrigatória em qualquer definição da RSE. Outro elemento fundamentalmente marcante indispensável, mencionado no Livro Verde de Comissão, é a noção de “partes interessadas” (“stakeholders”). Nele se incluem, por um lado, além dos investidores, os trabalhadores, os parceiros comerciais, os fornecedores, os clientes e os credores (grupos dos chamados “stakeholders coletivos”). [...] a RSE é o produto espontâneo da capacidade das empresas para promover soluções para os novos problemas da comunidade em que estão inseridas e que empresa socialmente responsável é aquela que, não apenas, satisfaz plenamente as exigências jurídicas e convencionais aplicáveis, mas que integra também, voluntariamente, enquanto investimento estratégico, as dimensões sociais, ambientais e econômicas nas suas políticas globais (ARAÚJO, 2007, p. 122-123).

Uma empresa socialmente responsável poderia ser considerada como

aquela capaz de contribuir para que os valores da comunidade onde se insere em

nível local, nacional e internacional em todos os domínios da vida humana a saber:

trabalho, ambiente, relações humanas, aproximação das sociedades e das pessoas

num sentido e caminho comuns, pautados por mais justiça e equidade social, de

modo a promover o equilíbrio necessário para a elaboração e assegurar uma

legitimação social, possibilitando ultrapassar a relação de conflito da típica

sociedade industrial.

Com base em tais fatos, se constrói a noção de responsabilidade social da

empresa.

De acordo com Gisele Ferreira de Araújo:

O conceito de responsabilidade social é essencialmente baseado na iniciativa das empresas em contribuir com o desenvolvimento da sociedade em termos sócio-ambientais, inspiradas por uma tradição de auto-

92

regulação, que tende a ser mais voluntária do que coercitiva numa tendência de “soft-law” verificada nas mais modernas sociedade democráticas (ARAÚJO, 2007, p. 120).

Desta forma é possível mencionar que o conceito de responsabilidade social

é elástico, mas se pode mencionar que os fundamentos da responsabilidade social

são o motor propulsor da história da humanidade, pois persegue a inclusão social,

igualdade e garantias de direitos civis e também a ética e transparência nas

relações, acrescentando a esta lista preocupações pós-modernas temos o

desenvolvimento sustentável e qualidade de vida.

Neste sentido:

Responsabilidade social é um ideal de conduta a ser perseguido não só pela empresa, mas pelo Estado e pelo conjunto de cidadãos na busca de uma melhor qualidade de vida e do desenvolvimento sustentável. [...] A empresa, em seu perfil multifacetado, demonstra ter estruturação propícia e de gestão para o exercício de atividades distintas de sue objeto social, na busca do preenchimento da função social, nos exatos preceitos estabelecidos no art. 170 para disciplinar a ordem econômica e social. Aliás, fica melhor aclarada esta função social quando se vislumbra o texto legal protetivo da empresa, contido na lei de recuperação e de falências, e as possibilidade recuperatórias, em que nos permitimos apresentar sugestões que em última análise se referem também à forma como o Poder Judiciário perceberá, através do conteúdo de suas decisões, uma empresa socialmente responsável que tenha sido abrangida por uma crise econômico-financeira (HUSNI, 2007, p. 175).

Por fim, correlacionando os conceitos acima explicitados, unindo função

social à responsabilidade social da empresa é possível, ainda, entender que no

gênero função social existem espécies, ou seja, a empresa societariamente

responsável é a que cumpre estritamente com todas suas obrigações impostas pelo

exercício da atividade empresarial e para com as leis e regulamentos concernentes,

de modo a atender as reivindicações dos poderes públicos, mantendo em

determinados casos sistemas de governança corporativa, pagando seus tributos,

atendendo bem consumidores e fornecedores e mantendo suas obrigações sociais

de âmbito trabalhista sempre em dia. Assim, a empresa estará cumprindo a sua

função social.

Há também no gênero função social a espécie de empresa socialmente

responsável que ultrapassa os ditames legais e contratuais em busca de ideais

93

comunitários e sociais, de forma a implementar programas mais sofisticados de

governança corporativa, preocupando-se com o meio ambiente, inclusive o de

trabalho, participando de atividades relacionadas ao social, desenvolvendo políticas

de relacionamentos por meio de códigos de melhores praticas e também

colaborando no que lhe concerne para um desenvolvimento sustentável, seja para a

inclusão social, digital ou de qualquer outra natureza.

5.3. RELAÇÃO ENTRE RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA E A

INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA

Em busca de desenvolvimento o Estado efetiva uma aliança entre o setor

privado e o setor público, estando este a serviço daquele. Neste contexto o Direito

se firma como defesa da propriedade.

O mercado deve ser visto como uma instituição social que serve aos

interesses de uns e não de todos e como instituição política destinada a manter

determinadas estruturas de poder. Desta maneira o poder que comanda é o poder

social.

“O fato é que o Terceiro Estado, a burguesia, apropriou-se do Estado e é a

seu serviço que este põe o Direito, instrumentando a dominação da sociedade civil

pelo mercado” (GRAU, 2012, p. 31).

O mercado capitalista precisou da previsibilidade e da calculabilidade do

Direito Moderno para continuar existindo, pois para o capitalismo industrial é

fundamental contar com estabilidade, segurança e objetividade no funcionamento da

ordem jurídica, assim como no caráter racional das leis e da administração.

Para atender a demanda do mercado de que fosse assegurada a

calculabilidade exigida pelas transações econômicas, foi necessário interferir na

equidade e transformá-la em um sistema rígido de normas. Tal necessidade

justificou também a limitação do poder da monarquia patrimonial e do feudalismo, o

que culminou na instituição do poder legislativo dos parlamentos, pois o Estado tinha

como tarefa ser um redutor de riscos e criar uma ordem jurídica que tornasse

possível o cumprimento das obrigações contratuais. Neste contexto, o modo de

produção social capitalista coloca o Direito Positivo a seu serviço para permitir a

fluência da circulação mercantil.

94

A garantia de fluência nestas relações é uma dupla garantia, contra o Estado

(liberalismo político) e em favor do mercado (liberalismo econômico). A lei assegura

a primeira garantia e concomitantemente é posta a serviço da prestação de

mercado.

Paralelamente ao desempenho da função de integração e modernização

capitalista, o Estado implementa duas outras: a de legitimação e a de repressão. No

exercício da primeira, o Estado, promovendo a mediação de conflitos de classe,

sustenta a hegemonia do capital e conta com a ajuda da Constituição formal para

isso, pois esta além de proporcionar a manutenção da ordem capitalista, confere

operacionalidade plena ao poder detido pelas classes dominantes. Já a repressão

não é exposta, palpável, ela está misturada na concepção de hegemonia.

No desempenho do seu novo papel, o Estado, atuando como agente de

implementação de políticas públicas, enriquece suas funções de integração,

modernização e legitimação capitalista.

A globalização é decorrente da terceira Revolução Industrial e traz consigo

uma revolução na informática, microeletrônica e telecomunicações. Em paralelo a

esta globalização tecnológica surge também a globalização financeira. Esta

globalização neoliberalista ameaça a sociedade civil, pois está associada a novos

tipos de exclusão social, gerando um subproletariado, sendo responsável também

pela instalação contínua e crescente competição global.

Neste contexto global percebe-se nos últimos anos a presença de uma crise

econômica que assinala o declínio do neoliberalismo. Esta crise trouxe uma

crescente insegurança para o mercado, exclusão social e altas taxas de

desemprego.

Faz-se necessário agir contra este sistema excludente, individualista e

competitivo, lutando para alcançar o Estado Social, de maneira que se deve

defender o capitalismo contra os capitalistas, o que não excluirá o sistema

capitalista, já que este apresenta como grande virtude a sua capacidade de

transformação.

Cabe mencionar acerca da ligação entre a responsabilidade social e a

encíclica Rerum Novarum no contexto do Estado social:

O Estado social contemporâneo, ao criar garantias para os setores menos afortunados da população, não teria transcendido uma ética puramente

95

individualista, fundada na ideia de seguro. Deste modo, o Estado social legitimou-se não como instância distributiva, mas como agência seguradora. A tributação imposta pelo Estado para assegurar benefícios como auxílio-saúde ou auxílio-desemprego foi apresentada como contribuição a um fundo comum que previne contra um risco comum. Como qualquer pessoa pode necessitar de auxílio graças a uma doença ou perda de emprego futuro, é racional, de um ponto de vista estritamente autointeressado, pagar as contribuições necessárias para obter uma “cobertura” em caso de “sinistro”. No modelo do seguro, contribui-se para um fundo comum, na medida em que o risco é comum. Do ponto de vista do indivíduo autointeressado, a contribuição ao fundo comum o seguro é racional na medida em que preserva a própria condição em uma situação de risco. Aceita-se contribuir mesmo que não se usufrua de um benefício. De um ponto de vista estatístico, aquele que contribui poderia eventualmente se beneficiar. A responsabilidade por outrem, ou responsabilidade social funda-se aqui em uma ética individualista (BARZOTTO, 2011, p. 200)

Assim, o modelo referido acima requer de seus concidadãos não o altruísmo,

mas sim um egoísmo racional, de modo que o apoio das políticas compensatórias

ocorre baseada no autointeresse, sendo que a condição básica dessa ideia de

seguro é um risco comum.

O Estado social se desenvolveu também com a ideia de crescimento

econômico nacional com a respectiva distribuição de riqueza no âmbito interno, pois

o que fundamenta a responsabilidade social no âmbito do Estado-nação é a ideia de

comunidade nacional, uma vez que a comunidade desenvolve-se a partir da ideia de

associação de pessoas que partilham de um mesmo bem, um bem comum a elas, já

que o bem comum é o bem de todos, pelo qual todos são responsáveis.

Nas palavras de Luciane Cardoso Barzotto (2011, p. 202):

A recusa da responsabilidade social por parte da elite fica nítida na sua postura contra qualquer tributação com fins redistributivos. Por não se identificarem com seus concidadãos, são indiferentes com relação a seu destino, e não aceitam partilhar seus ganhos com os necessitados da comunidade. O argumento desse setor social vem formulado nos seguintes termos: somos indivíduos que interagem de modo competitivo no mercado, onde cada um busca o seu interesse. Ora, se a segurança, educação e saúde são bens que um indivíduo adquire no mercado, por que ele deve ser tributado para pagar a saúde, a educação, a segurança dos outros? Ele já está pagando por si; por que deve pagar pelos outros? O que há em comum entre ele e os demais membros da sociedade? Não há uma comunidade no interior da qual poderia haver transferências de renda dos setores mais afluentes para os menos afortunados. Na terminologia clássica, para as elites descritas por Lasch não pode haver justiça distributiva, mas somente justiça comutativa, a justiça das trocas operadas no mercado. Na nossa terminologia, não há responsabilidade social, pois com o colapso da ideia de comunidade, cada um responde apenas por si.

96

A figura da responsabilidade social da empresa baseia-se como o

compromisso das empresas em adorar um comportamento responsável em todas as

suas atividades e em criar vínculos estreitos com todos os interessados no processo

produtivo, portanto, é um comprometimento permanente dos empresários em adotar

uma postura ética e contribuir para o desenvolvimento econômico e também para

melhorar a qualidade de vida de seus empregados e de seus familiares, da

comunidade local e da sociedade como um todo. Observa-se:

A responsabilidade social caminha ao lado do conceito de desenvolvimento sustentável e de democracia industrial. Uma atitude responsável em relação ao ambiente e à sociedade, garante a não escassez de recursos, e a promoção humana de todos os envolvidos na cadeia produtiva. Pelo movimento da responsabilidade social, sublinha-se que as empresas não devem satisfação apenas aos seus acionistas, mas também, aos stakeholders, seus funcionários, à mídia, fornecedores, consumidores, ao setor não governamental e ambiental. Em síntese, a empresa se legitima socialmente pela qualidade de sua participação comunitária, que nada mais é do que seu contributo efetivo para o bem comum. Sementes desta ideia, ainda que com outra roupagem e terminologia já estavam contempladas em 1891, na encíclica Rerum Novarum. Num ideário de justiça social, empregados e empregadores trabalham para o bem comum. Na contribuição para o bem comum é que se realiza a justiça social. Na busca do bem comum e da justiça social é que pode ser resumida a ideia de responsabilidade social tanto do empregado como do empregador, da empresa (BARZOTTO, 2011, p. 204-205).

Verifica-se, então, que o movimento da responsabilidade social empresarial

resgata a noção de que o mercado pode gerar justiça, na medida em que opera na

lógica da reciprocidade, mas pode superar está lógica com a noção de gratuidade e

autotranscendência, portanto a responsabilidade social das empresas será mais um

fator de humanização do mercado.

O posicionamento do Estado tem forte influência, bem como o Direito na

atividade empresarial, de modo que esta deve observar as normas impostas de

maneira a respeitar a responsabilidade social, bem como a função social.

Sob a perspectiva intervencionista releva-se a figura do desenvolvimento, que

em abordagens mais amplas aparece como o crescimento econômico acompanhado

de melhoria na qualidade de vida, de maneira a melhorar os indicadores de bem-

estar econômico e social, pode ser encarado também como sendo um processo

complexo de transformações e mudanças de ordem política, econômica e humana e

97

social, ou seja, desenvolvimento é o crescimento transformado para satisfazer as

necessidades do ser humano.

A intervenção estatal no domínio econômico tornou viável a relação direta

entre relações de produção e direito privado, de modo a assegurar as trocas do

mercado, assim, o papel da atividade estatal aparece no sentido de assegurar a

estabilidade e também o crescimento econômico, dando conta das necessidades de

legitimidade do poder e também de solucionar os problemas advindos das

consequências sociais do funcionamento dos mercados.

Neste contexto, a responsabilidade social da empresa mostra-se como o

produto espontâneo da capacidade das empresas para que se promova soluções

para os novos problemas da sociedade em que estão inseridas. A empresa

socialmente responsável é a que além de satisfazer as exigências jurídicas e

convencionais aplicáveis, também integra as dimensões sociais, ambientais e

econômicas nas suas políticas globais.

Portanto, uma empresa que é socialmente responsável poder ser considerada

como empresa capaz de contribuir promovendo os valores da comunidade onde se

está inserida em nível local, nacional e internacional e em todos os domínios da vida

humana, de modo a se obter justiça e equidade social, promovendo o equilíbrio

necessário assegurar uma legitimação social, possivelmente ultrapassando a

relação de conflito da típica sociedade industrial.

Na sua função social a empresa deve encontrar sua importância enquanto

ente gerador de riquezas junto à sociedade, por meio da sua importância social,

reconhecendo a necessidade de geração de lucros e exercendo a sua atividade de

maneira responsável, ética e solidária.

Com a função social se busca coibir as deformidades da ordem jurídica, de

forma a evitar que as destinações da propriedade privada possam levar ao seu uso

degenerado. O princípio da função social da empresa, desta forma, impõe ao

proprietário ou a pessoa que controla a empresa, o dever de exercer esse poder em

benefício de outrem e não apenas em prejuízo desses, portanto, a função social da

propriedade é correlata à função social do contrato e da empresa.

Dessa forma, a responsabilidade social da empresa aparece promovendo

soluções para os problemas que estão inseridos na sociedade, visando satisfazer o

que estabelece o Direito, integrando as diversas dimensões (sociais, ambientais e

econômicas).

98

A empresa capaz de gerar contribuições de forma a promover os valores de

onde está inserida é uma empresa socialmente responsável, obtendo assim justiça e

equidade social e o equilíbrio assegurador de uma legitimação social.

Já a função social da empresa, ainda que não tenha fundamento jurídico

próprio está correlacionada à função social do contrato e da empresa, assim, exerce

a função social e estabelece o respeito no desenvolvimento da sua atividade ao

meio ambiente local.

Ressalta-se a relação intrínseca entre a atividade econômica e o Direito,

caracterizadas pela intervenção estatal, evidentes o caráter jurídico e político das

normas que são aplicadas através do poder no sentido de favorecimento do

desenvolvimento, que pode ser encarado como fundamento interventivo, segundo os

autores analisados. Destaca-se a utilização do poder e a intervenção estatal como

grande favorecedora de grupos econômicos privados, pois o Estado funciona tanto

como negociador quanto como consumidor desses grupos, fato este que pode

acarretar favorecimento ou desfavorecimento em relação a determinadas regiões,

estimulando o desenvolvimento quantitativo e não qualitativo, quando não observado

o desenvolvimento em sentido amplo.

Assim, verifica-se a atuação do Estado como interventor no sentido de

fomentar a aplicação de regras estabelecidas no Direito a fim de que sejam

respeitadas as normas jurídicas que promovem a justiça social, observando a função

social da empresa e consequentemente a sua responsabilidade social, que deve se

preocupar tanto com o âmbito em que se encontra inserida, bem como com os

princípios norteadores do Direito, como por exemplo a dignidade da pessoa humana.

Neste sentido, o presente trabalho abarca diversos conceitos para realizar a

construção histórica e conceitual de pontos importantes na sociedade atual,

verificando através do Estado social e da CF de 1988 os dispositivos legais que

trazem a ordem econômica como ponto primordial para o entendimento de todo o

trabalho, de forma que quando surge a figura interventiva do Estado, esta aparece

em decorrência do explicitado na CF, principalmente nos arts. 170 e seguintes.

Preserva-se, portanto a figura da justiça social, função social e

responsabilidade social analisadas de acordo com o princípio da dignidade da

pessoa humana, pois quando aplicadas na contextualização da empresa, que ainda

que tenha como objetivo a obtenção de lucro deve atender ao ordenamento jurídico

na qual encontra-se inserida, de modo que: “O conceito de função social não implica

99

em assistencialismo, filantropia ou atividade subsidiária das empresas.

Objetivamente, é uma obrigação legal, decorrente da Constituição Federal,

sobretudo dos princípios contidos no capítulo da ordem econômica e financeira.”

(SOUZA, 2013, p. 71)

Cabe destacar acerca do lucro da empresa, que este não é sua função social, mas

sim um direito econômico da empresa, garantida pela economia de mercado

ambientada em uma sociedade capitalista, como é o caso do Brasil, assim, a função

social da empresa encontra-se relacionada a um dever supremo, moral e jurídico, ou

seja, atuar no mercado com ética empresarial, promovendo a dignidade humana.

A promoção da dignidade da pessoa humana ganha efetividade e concretiza-

se quando o gestor pratica o trabalho decente e o comércio justo quando se

preocupa com o crescimento da empresa, estabelecendo metas que respeitem e

preservem os recursos ambientais, humanos e culturais para as gerações futuras.

Desta forma, a responsabilidade social aparece como sendo um dever de

todos, pois está além de um mero paradigma desejável, é uma obrigação jurídica,

neste sentido, nas palavras de Carlyle Popp (2010, p. 9-10):

É certo que a Responsabilidade Social não se confunde com a caridade e nem se esgota na filantropia, contudo, como ensina a lição natalina, a Nação conta com seus cidadãos, que a cada momento desempenham um papel – magnatas ou pequenos empresários, banqueiros ou bancários, patrões ou empregados, filantropos ou beneficiários, familiares ou solitários, livre pensadores ou aprisionados amantes – todos, sem exceção, estão compelidos ao direito-dever de transformar a realidade, em nome da construção, plenamente factível, de uma sociedade livre, justa e solidária, visando a efetivação dos Direitos de todas as Eras, na insuperável doutrina de Norberto Bobbio. Afinal, que empresa – assim considerada como um contrato social que é – pode ser considerada socialmente responsável? Ou como se responsabilizar a um governo, ente abstrato, derivado do ideal republicano? Ora, é certo que os cidadãos, pessoas humanas e singulares, são responsáveis, quer seja atuando na unidade de seu individualismo, quer seja atuando no limiar ou no auge de suas prerrogativas coletivas. Para mudar o mundo precisamos acreditar em coisas melhores. Que somos delas merecedores. E uma vez crentes, lutar, com todas as forças, por sua concretização. Dignidade da pessoa humana não é só um princípio constitucional. É um começo, um caminho, um comando de um mundo melhor.

Em observância dos dispositivos constitucionais referentes à ordem

econômica, em especial o art. 170 da CF, direcionam para a integração dos

interesses particulares, representados pela livre iniciativa, e interesses sociais,

100

representados pelas ideias de dignidade humana, valorização do trabalho humano,

desenvolvimento nacional, entre outros. Veja-se:

Ora, da conjugação de tais ideias o que se pode extrair é que toda atividade oriunda da liberdade da iniciativa, ainda que tenha por finalidade a obtenção de lucro e sujeição ao mercado globalizado, portanto sujeito a efeitos e regras mundializados, deverá levar em conta interesses supra individuais. No caso analisado tais interesses estão representados pelo incentivo, através da instituição de meia entrada em estabelecimentos de cultura, esporte e lazer, à doação de sangue, ato individual capaz de salvar diversas vidas. A conjugação de esforços, tanto públicos como privados, é essencial para a realização do projeto constitucional de construção de uma sociedade livre, justa e solidária (SETTI, 2010, p. 66-67).

A ideia de liberdade como atomização do indivíduo na sociedade, inclusive a

liberdade de iniciativa como poder de aferir lucro sem resposta à sociedade, aparece

em decorrência do Estado liberal, advindo a partir da Revolução Francesa e, em

decorrência da Revolução Industrial começou a apresentar um lado obscuro, pois o

agravamento das diferenças sociais, a exclusão social, são problemas verificados na

ideologia do laissez-faire. Assim, ocorre a evolução do Estado para o modelo social,

observando a finalidade de atender a necessária composição de interesses

particulares e sociais.

Desta forma, a empresa deve preocupar-se em praticar as funções que lhe

são atribuídas, como pagamento de tributos, o respeito com seus funcionários e

consumidores, com o meio ambiente e, também com o desenvolvimento social que

acontece ao seu entorno, caracterizando-se como socialmente responsável ao

atender estas particularidades sem deixar de lado a manutenção de sua atividade

econômica, buscando além do lucro a solidariedade social.

101

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se o presente trabalho trazendo algumas noções do que foi abordado

nos primeiros capítulos a fim de que ao chegar ao tema proposto haja coerência,

bem como seja possível compreender a ligação da responsabilidade social da

empresa juntamente com a intervenção estatal realizada através de tributos,

portanto, parte-se da construção de sociedade relacionada ao poder e

desenvolvimento no sentido de que a sociedade é o fruto de uma necessidade ou da

vontade humana.

O aperfeiçoamento de instrumentos de trabalho e de defesa torna a

sociedade cada vez mais complexa, devendo neste momento ser identificada sua

finalidade ou valor social, exprimida no poder social.

Desta forma, a ordem jurídica de uma sociedade é a expressão institucional

das normas positivas, sendo o poder social o instituto que indica duas ou mais

vontades, ainda que uma delas seja predominante. Aborda-se o poder sob dois

aspectos: como relação quando se procede ao isolamento artificial de um fenômeno

para efeito de análise, ou como processo, quando se estuda a dinâmica do poder.

Ainda que o poder não seja puramente jurídico ele age concomitantemente

com o direito, buscando uma coincidência entre os objetivos de ambos. Existe

também um processo de objetificação que dá precedência à vontade objetiva dos

governados ou da lei, desaparecendo a característica de poder pessoal, atendendo

a uma aspiração à racionalização, que o torna despersonalizado, ou seja, poder do

grupo ou poder do sistema.

A ação estatal de regulação econômica voltada para o progresso técnico e

científico acaba por despolitizar as massas, promovendo uma consciência de

controle da opinião pública nociva para que seja construída a democracia. Quanto à

sociedade empresarial e judiciária, ambas são faces da ordem econômica neoliberal,

instrumentalizando o direito por meio da política e economia, assim, na sociedade

neoliberal percebe-se que a racionalidade governamental causa um impacto na vida

em sociedade através de uma tecnologia ambiental de tolerâncias e administração

de perdas e ganhos.

102

O desenvolvimento em abordagens mais amplas aparece como crescimento

econômico acompanhado de melhoria na qualidade de vida, de maneira a melhorar

indicadores de bem-estar econômico e social, portanto, o desenvolvimento pode ser

encarado como sendo um processo complexo de transformações e mudanças de

ordem política, econômica e humana e social, ou seja, o desenvolvimento é o

crescimento transformado para satisfazer as necessidades do ser humano,

englobando a dignidade da pessoa humana no sentido de ter seu conceito em

permanente processo de construção.

Após a conceituação acerca de sociedade, poder e desenvolvimento, cabe

agora trazer as figuras do Direito, Estado e dos tributos. Assim, o surgimento do

Direito veio para regulamentar a vida em sociedade, ultrapassando sua construção e

sua aplicação em sentido histórico, traz-se a elucidação do conceito geral do Direito,

que vem da Filosofia, de modo que a ideia de direito é solidária à de justiça, sendo

justiça, na visão de Aristóteles, um setor da realidade atingido pela moral e, moral

como análise dos costumes, buscando reconhecer os fins aos quais tenderiam os

comportamentos humanos, analisando se eles se aproximam ou não do valor

pretendido. Traz-se, ainda, a ideia de virtude como um tipo de atividade habitual que

se inclina para o bem, ao qual é natural que tendam nossas condutas.

A virtude de justiça é uma atividade a serviço da ordem, pois a ordem

constitui um valor supremo que coincide com o belo, ou seja, o homem tendia ficar

em concordância com a ordem cósmica universal. Porém o problema da justiça é o

da correspondência ou não da norma aos valores últimos ou finais que inspiram um

determinado ordenamento jurídico, pois todo ordenamento jurídico persegue certos

fins, e convir sobre o fato de que estes fins representam os valores a cuja realização

o legislador, mais ou menos conscientemente, mais ou menos adequadamente,

dirige sua obra.

Assim, considerar que existam valores supremos, objetivamente evidentes, a

pergunta se uma norma jurídica é justa ou injusta é o mesmo que perguntar se é

apta ou não a realizar esses valores, mas também no caso de não se acreditar em

valores absolutos, o problema da justiça ou de uma norma tem um sentido, qual seja

o de perguntar se essa norma é apta ou não a realizar os valores históricos que

103

inspiram certo ordenamento jurídico concreto e historicamente determinado. Justiça

seria, portanto, a soma de todas as virtudes.

Importante salientar que o direito é instrumento das regras morais. Muito

embora as leis não devessem ser confundidas com o objeto da justiça, que seria a

própria ordem, entende-se que a finalidade é que ninguém tome mais ou receba

menos que a sua parte nos bens exteriores, por ser algo finito, cumpre nomear como

direito. Portanto, não existe uma sociedade sem direito pela função que este exerce

sobre aquela, que é a função ordenadora, de coordenação dos interesses que se

manifestam na vida social, de maneira a organizar a cooperação entre pessoas, bem

como compor os conflitos existentes entre seus membros.

Acerca da figura do Estado, traz-se a ideia de sua onipotência, de modo que,

ainda que o governo muitas vezes mude de forma, a sua natureza permanece mais

ou menos a mesma, ou seja, sua onipotência não foi em quase nada diminuída, já

sobre o Estado Moderno, este surge quando o poder real nele se transforma, de

modo que a sociedade moderna pode ser caracteriza pela divisão do trabalho e pela

monopolização da tributação de da violência física. O resultado final do processo de

racionalização social é o moderno Estado de Direito com a consequente consciente

imposição de regras de comportamento social que excluem a autotutela em opção

por uma normatividade e execução centralizadas.

Ainda sobre o Estado, cabe ainda mencionar que ele foi criado para buscar

imprimir uma maior eficácia às regras de conduta criadas pelo direito, e de forma a

se manter exige em troca o pagamento de tributos aos que estão submetidos ao seu

poder, assim, com o advento dos modernos Estados de Direito, Democráticos,

limitados pelo direito, as pessoas que integram ou corporificam o Estado também

passaram a se submeter, no exercício de suas funções, a regras de conduta

previamente estabelecidas, de tal forma que o ramo do direito que cuida disso

chama-se Direito Público, e, mais especificamente, no que toca à subdivisão

ocupada de disciplinar a cobrança de tributos, Direito Tributário.

O Estado deve subordinar-se ao direito de forma que ele, os poderes locais e

regionais, os órgãos, funcionários ou agentes dos poderes devam respeitar,

observar e cumprir as normas jurídicas da mesma forma como devem fazer os

particulares, portanto o Estado age e atua por meio do direito, significando que o

104

exercício do poder só pode se efetivar por meio de instrumentos jurídicos

institucionalizados pela ordem jurídica, de forma a garantir o princípio geral da

segurança jurídica, que protege os cidadãos contra incertezas provocadas pelo

Poder Público.

Acerca do tributo, este tem como sua noção empírica a de que o particular

deve entregar uma quantia em dinheiro ao Estado, limitada através do direito. Em

sua perspectiva ideológica, o tributo ocorre por meio da fixação de critérios legais,

solidariedade social, capitalismo, conflitos imanentes entre particulares e Estado ou

então entre os próprios entes competentes para tributar, ou ainda entre os próprios

particulares. História, tributo e Estado sempre caminham juntos e a relação jurídico-

tributária foi sempre uma relação advinda do poder do Estado e nunca uma relação

voluntária por parte do indivíduo.

Destaca-se que a tributação tem como finalidades: os objetivos econômicos

de desenvolvimento, de estabilização interna da economia (de forma a combater o

desemprego e a inflação); a estabilização externa da economia (buscando o

equilíbrio do balanço de pagamentos internacionais e formação de reservas

monetárias conversíveis); a realização da equidade ou justiça fiscal; a finalidade

política no sentido de distribuição do poder através do fortalecimento da federação; a

finalidade jurídica para a proteção dos direitos do contribuinte e a finalidade

administrativa referente à realização na prática das demais. Desta forma, o principal

fundamento do tributo é o meio de suprir recursos para que o Estado promova a

justiça social.

Agora mencionaremos sobre ordem econômica, de modo que ao conjunto

normativo positivado na Constituição Federal que interfere na atividade econômica

atribui-se a designação de constituição econômica, que deve ser entendida como o

conjunto de normas constitucionais que regulam fatos que repercutem no modo de

ser econômico da sociedade, ou seja, é a regulação jurídica da economia em seu

sentido mais amplo. Assim, a ordem econômica pode ser referida como uma parcela

da ordem jurídica, esta última tomada como sistema de princípios e regras jurídicas

compreendendo uma ordem pública, privada, econômica e social.

Quanto às ordens econômicas precedentes (mundo do dever ser) vê-se uma

transformação, pois passam a instrumentar políticas públicas, como por exemplo, o

105

art. 170 da CF que prevê a ordem econômica (mundo do ser) findada na valorização

do trabalho e livre iniciativa, substituindo a ordem econômica liberal por uma ordem

econômica intervencionista, ainda que preservando o capitalismo.

Desta forma, a ordem econômica brasileira vem regulada no art. 170 e

seguintes da CF de 1988, sendo reentendida como o conjunto de normas de

intervenção protetora ou restritiva às atividades econômicas, em consequência de

certas finalidades e através de certos meios, num contexto em que os fins buscados

se vinculam à garantia de uma existência digna para todas as pessoas, de acordo

com o que se denomina de justiça social.

Fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, a ordem

econômica estabelecida no texto constitucional, em vigor, determina a observância

de princípios como: a propriedade privada, a função social da propriedade, a livre

concorrência, a defesa do consumidor e do meio ambiente, nos termos dos incisos

do art. 170. De inspiração nitidamente capitalista, mas com temperamentos de

natureza social, a CF de 1988 procura limitar a intervenção do Estado no domínio

econômico, restringindo-lhe a exploração de atividade econômica unicamente

quando necessário aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse

coletivo.

A ordem econômica tem como fim a justiça social, pois sem justiça o homem

vive sempre mal, ainda que tenha liberdade, desenvolvimento, ordem e caridade em

torno de si, desta forma, a liberdade sem justiça fomenta o privilégio, ou seja, o

desenvolvimento que não tem justiça aumenta a exploração, a ordem desprovida de

justiça cria a imposição e a caridade sem justiça desenvolve o paternalismo. Assim,

a inserção da justiça social como fim da ordem econômica deve ser tida como

reconhecimento de que todos se encontram em face de um destino comum, em uma

inescapável empresa comunitária, na qual a coexistência deve ser vista de frente. A

perspectiva metaindividual, coletiva, que supera individualismos exacerbados inspira

a compreensão normativa da justiça social.

Assim, a ideia de justiça social está ligada à ideia de um discurso ético do

Direito e do Estado, de modo que a ideia de justiça é irrenunciável, pois em sua

perspectiva histórica universal, já em Atenas, assume que as leis e formas de

Estado são recusadas e até passíveis de não serem aceitas em caso de excessiva

106

dureza e injustiça, a justiça social é uma primordial vocação da ordem constitucional

econômica e sua finalidade é destino obrigatório de toda tarefa exegética.

O constitucionalismo ao longo do processo de consolidação do capitalismo

contemplou gradativamente normas capazes de disciplinar as relações entre Estado

e demais agentes econômicos através da ordem constitucional econômica, desta

forma, a CF de 1988 resultou de um processo de redemocratização político e social

do país, conduzindo a um novo patamar de democracia e desenvolvimento do

Estado, refletindo na formulação da ordem econômica e social vigente.

As formas de atuação do Estado podem ser diferenciadas especialmente no

que diz respeito ao campo de atuação dos serviços públicos – área estatal – e o de

atuação da atividade econômica – setor privado – de modo que a classificação do

gênero atividade econômica (sentido amplo), divide-se entre atividade econômica

em sentido estrito e serviço público, cada um com um regime jurídico específico (art.

173 e 175 da Constituição, respectivamente). O art. 174 da CF confirma este

conceito de atividade econômica em sentido amplo, pelo qual o Estado deve regular

o setor público e o privado. Assim como art. 170 da CF define que tanto setor

público como privado devem pautar sua atuação na valorização do trabalho humano.

Sendo que o decisivo desafio para o Direito está na interdependência do

Estado e da Economia e no fortalecimento da atuação política por meio do Direito,

assim, aparece a figura do Direito Econômico, que é o ramo do Direito que tem por

objeto a juridicização, ou seja, o tratamento jurídico da política econômica e, por

sujeito, o agente que dela participe. Como tal, é o conjunto de normas de conteúdo

econômico que assegura a defesa e harmonia dos interesses individuais e coletivos,

de acordo com a ideologia adotada na ordem jurídica. Portanto, sobre o Direito

Econômico, é necessário pensar o Direito como um nível do todo social, como

mediação específica e necessária das relações econômicas.

Ao ser analisada a Constituição Federal na sua completude e não aos

pedaços, impõe-se reconhecer que a mesma inclina-se para adotar o modelo que

privilegia a promoção de uma sociedade solidária, de modo que o que se pode

concluir é que o modelo constitucional é um modelo aberto, ou seja, fica a cargo do

intérprete justamente qual o caminho que conforme a realidade social será trilhado,

contudo, não se pode perder de vista e deve estar alinhado à sua característica

107

primeira o modelo do bem estar social, fundamentado especialmente numa

sociedade livre, justa e solidária. Assim, o que se tem é a prerrogativa de que a

Constituição Federal de 1988 privilegiará o bem-estar, sendo que qualquer atividade,

especialmente a econômica, deve ter um primeiro olhar para esse fundamento.

A empresa é uma das molas propulsoras do capitalismo e certamente o

objetivo social de cada ente empresarial é o lucro, contudo, não se pode perder de

vista que a obtenção do lucro não deva observar a solidariedade mencionada

anteriormente. A atividade empresarial deve ter esse viés do lucro, sendo

devidamente orientada ou direcionada à perspectiva da solidariedade social. A

Constituição Federal consagrou a economia de mercado, não é a toa que

estabeleceu, por exemplo, a livre concorrência, esse fato é inescapável e deve ser

sempre lembrado, contudo não quer dizer que a chamada economia de mercado

não possa voltar-se ao fim comum de estabelecer uma sociedade solidária.

Acerca da intervenção do Estado na atividade econômica traz-se a figura

das normas jurídicas, pois o ordenamento jurídico é formado por um conjunto de

normas dispostas hierarquicamente desde as inferiores até as constitucionais,

formando a “pirâmide jurídica”, na qual tais normas ordenam-se por meio de uma

relação sintática no sentido de que as normas inferiores adquirem respaldo de

validade a partir das que se encontram acima delas até o máximo patamar que é o

da Constituição Federal.

Ressalta-se que as normas jurídicas mais importantes mostram-se dispostas

na Constituição Federal, pois ela indica os detentores dos poderes estatais e quais

são tais poderes e como devem ser exercidos, bem como, os direitos e garantias

dispostos pelas pessoas em relação a eles, portanto, a aplicação do direito positivo

depende da construção da norma jurídica, da interpretação dada pela doutrina ao

texto criado pelo legislador.

Já a figura da Administração Pública surge ao que se refere ao exercício da

função essencial da Administração, ao encargo que compete ao Poder Executivo ou

ao conjunto de pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos que realizam como

objetivo a função administrativa.

Cabe mencionar ainda que a Administração Pública deve ter sua regulação à

luz da CF, reportando-se ao art. 174 da CF trazendo a função administrativa

normativa.

108

Portanto, o sistema de regras de conduta que disciplina o comportamento

humano decorre do Direito Positivo que constrói normas jurídicas provenientes de

sua interpretação. O Estado, criado para efetivar as regras de conduta dispostas

pelo Direito, se mantém em troca de pagamento de tributos aos que se encontram

submetidos ao seu poder.

O tributo ocorre a partir da fixação de critérios legais, capitalismo,

solidariedade social e conflitos imanentes entre o Estado e particulares ou entre os

próprios entes que detêm competência para tributar ou então pelos próprios

particulares. O conceito unitário do tributo encontra subsídio legal na Constituição

Federal, de modo a identificar as características comuns dos tributos a fim de lhes

dar operacionalidade jurídica.

No que diz respeito à fiscalidade e extrafiscalidade, entende-se a supremacia

do interesse público sobre o do privado como um princípio relevante do Direito

Tributário. Portanto, a figura da fiscalidade possui como finalidade a arrecadação de

recursos, a fim de suprir as necessidades do erário e, ainda que no Estado

Democrático de Direito seja obedecido o regime constitucional, que valoriza a livre

iniciativa e o direito da propriedade, que tenha como capitalismo seu sistema

econômico, cujas regras impedem ou limitam a atividade econômica estatal, é

axiomático adotar-se a tributação como forma de obtenção de recursos para

financiar a concretização dos fins estatais.

Verifica-se que a função da extrafiscalidade no Direito Tributário aparece no

sentido de regular condutas, visando um fim econômico, político ou social, em

conformidade com a CF. Nesse sentido é possível trazer a função de intervenção do

Estado e o bem-estar social com essência constitucional, falando-se em intervenção

como ingerência do Estado no campo de outrem. Desta forma, o desenvolvimento

econômico e a tributação aparecem no sentido de que as preocupações com o

desenvolvimento ultrapassem às voltadas para o crescimento quantitativamente

considerado e também para as correções do mercado, de forma que o

desenvolvimento busca minimizar ou anular as baixas dos ciclos econômicos.

Primeiramente, devemos identificar a forma de atuação do Estado, no

presente trabalho a intervenção do Estado é utilizada como mediação, de modo a

fomentar vo direito à empresa, e assim, obter seu próprio desenvolvimento

econômico, como já mencionado, tal relação assemelhasse ao comensalismo, ou

seja, uma relação produtiva que beneficia ambas as partes.

109

É necessário ambientar acerca da atuação do Estado quanto a

interdisciplinariedade na relação Direito e atividade econômica, pois o Estado de

Direito só está autorizado a intervir na ordem econômica por meio de princípios

formais, porém, ao passo que a regulação econômica ocorre através de regras

formais, a regulação social vem exigir a intervenção judiciária para que seja feito o

arbitramento das regras.

Portanto, quanto mais formal a intervenção estatal maior é a necessidade de

que o serviço judiciário seja onipresente, evidenciando a instrumentalização do

direito pela economia e pela política. Portanto, as normas econômicas de

intervenção do Estado na economia sempre existiram, onde houve concentração

econômica acabou havendo intervenção do Estado na economia, ambas são tão

antigas quanto a própria economia de câmbio.

A intervenção do Estado e o bem-estar social como espírito do Estado e

essência constitucional percebe-se no sentido de que o sistema econômico sem a

intervenção do Estado não funciona adequadamente, pois trata-se de um regime

capitalista, de modo a ser tecnicamente correto falar em intervenção, ou seja, a

ingerência do Estado no campo de outrem pois a regulação é uma espécie de

intervenção, onde não há liberdade, não há, do ponto de vista jurídico, regulação em

sentido estrito, uma vez que o texto constitucional estabelece que regulação diz

respeito à atividade econômica, campo dos particulares sujeito à intervenção do

Estado.

Portanto, intervir sobre o domínio econômico significa, num sentido negativo,

corrigir distorções do mercado, por outro lado, muitas vezes a intervenção sobre o

domínio econômico também ocorrerá positivamente, para concretizar objetivos da

própria Constituição, assim, a intervenção do pode ser motivada no sentido negativo

para correções de distorções no mercado ou no sentido positivo, para concretizar os

princípios da ordem econômica.

Para realizar a adequação do uso do vocábulo intervenção entende-se que

ele serve para referir a atuação estatal no campo da atividade econômica em sentido

estrito (domínio econômico). Deve-se fazer a distinção de três modalidades de

intervenção: intervenção por absorção, pela qual o Estado assume integralmente o

controle dos meios de produção; intervenção por participação, pela qual o Estado

assume o controle de parcela dos meios de produção; e intervenção por direção,

pela qual o Estado exerce pressão sobre a economia ou por indução, quando o

110

Estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade

das leis que regem o funcionamento dos mercados.

A intervenção por indução ocorre em dois pontos, a saber: o primeiro quando

o Estado onera por imposto elevado o exercício de determinado comportamento; e o

segundo decorrente da execução, por ele, de obras e serviços públicos de

infraestrutura, que tendem a otimizar o exercício da atividade econômica em sentido

estrito em certas regiões.

A essência constitucional pode ser referida pela forte ligação com a

experiência constitucional, ensejando uma práxis em concordância com a

consciência política geral de uma determinada comunidade, pois Constituição,

Estado e política não podem ser compreendidos de maneira dispersa, devendo ser

buscado um equilíbrio.

O desenvolvimento social que se envolve em diversos âmbitos,

especialmente econômico e político, verifica um certo intervencionismo com

reservas, inclusive em formas de incentivo para a regulação do mercado, de modo

que o Estado deve se responsabilizar pelo incremento civilizatório da sociedade, de

maneira a proteger os indivíduos no caso de possível retrocesso nas esferas

socioeconômica, sociocultural e socioambiental, mencionando ainda, que uma

concepção constitucional da democracia torna-se necessária no sentido de que as

decisões coletivas devem ser tomadas pelas instituições políticas cuja estrutura,

composição e práticas tratem a todos os membros da sociedade como indivíduos

com consideração e respeito de forma igualitária

Desta forma, mostra-se necessária a neutralidade institucional do Estado

frente às concepções que são rivais de bem e, a partir dessa premissa, é preciso de

uma neutralidade ética, concluindo que tanto a tolerância não limitada quanto a

tolerância ilimitada seriam da mesma forma tão destrutivas ao tecido social como

uma unificação ética totalitária.

Adentrando ao tema da responsabilidade social da empresa deve-se

mencionar acerca do Estado frente a atividade econômica através da ótica do

princípio da dignidade humana, pois a atividade empresária privada exige

responsabilidade através de uma atuação ética, ou seja, a busca do lucro é dever da

empresa, assim, o bom funcionamento de uma empresa (o que é oxigenada pela

111

obtenção dos lucros produzidos pela mesma) também é um ente de relevância

social para uma determinada comunidade na medida em que gera empregos,

recolhe tributos, etc. Contudo, essa atuação não é suficiente. O desenvolvimento da

atividade empresária privada requer mais na ótica constitucional, de forma a exercer

a função social que estabelece o respeito no desenvolvimento da sua atividade ao

meio ambiente local, não se podendo pretender que uma empresa que utiliza

recursos naturais, seja em qualquer escala, promova o desrespeito ao meio

ambiente em que está inserida.

Desta forma, a atividade empresária deve encontrar na sua função social a

sua importância enquanto ente gerador de riquezas junto à sociedade, diante da sua

importância social, deve-se reconhecer a necessidade de geração de lucros, mas

exercendo a sua atividade de maneira responsável, ética e solidária. O Direito

positivo cumpre, então, uma função mítica em relação ao exercício da coação por

parte dos órgãos do Estado, pois apresentando-a como resposta ética frente à

comportamentos indesejáveis dos indivíduos, nega aquela coação como

componente da organização da sociedade, essa função mítica sustenta-se, de outra

parte, na suposta vinculação da política com a justiça.

O Estado tem impacto direto neste sentido, devendo observar o Direito como

regulamentador e incentivador do cumprimento da responsabilidade social e também

da função social das empresas. O princípio da dignidade da pessoa humana é um

limitador do poder excessivo do Estado, de forma a impedir que o poder público viole

a dignidade da pessoa, o qual implica também na atuação do Estado, que deverá ter

como meta permanente a promoção, a proteção e a realização concreta de

dignidade para todos, assim, a figura da dignidade da pessoa humana e o respeito e

a proteção da dignidade da pessoa constituem-se em meta permanente da

humanidade, do Estado e do Direito.

O princípio da dignidade da pessoa humana possui dupla função e serve

como um importante elemento de direitos contra medidas restritivas contra abusos

de direito e ainda serve como uma justificativa de restrições à direitos fundamentais,

atuando como elemento limitador. Tal princípio atua ainda de maneira simultânea

como limites dos direitos e limites dos limites, sendo uma barreira contra a atividade

restritiva dos direitos fundamentais, o que não afasta a controvérsia sobre o próprio

112

conteúdo da dignidade e a existência, ou não, de uma violação do seu âmbito de

proteção.

A responsabilidade econômico-social das empresas engloba o sentido de que

a entidade empresarial pode ser visualizada sob três aspectos: como sociedade civil,

como empreendimento econômico e também como destinação social ou função

social.

Acerca da função social como responsabilidade empresarial cabe mencionar

que várias entidades não governamentais buscam efetivar a ponte entre os

socialmente incluídos e os socialmente excluídos, por meio de atividades não

apenas assistenciais, mas promocionais das pessoas, respeitando sua dignidade,

dessa forma, a dignidade humana não aparece somente como um direito

fundamental, mas também por ser intrínseca a todos os homens sua distinção pela

racionalidade.

As empresas estão, modernamente, se organizando em função de uma

inserção social eficiente, seja internamente pela agregação de benefícios aos

trabalhadores ou externamente, por atividades de promoção junto aos excluídos,

estejam eles nas áreas de seu entorno geográfico ou em espaços e atividades

distantes, desta forma, a função social da empresa diz respeito ao desempenho

correto da atividade empresária e, também diz respeito ao desempenho da sua

atividade olhando para tudo o mais onde está inserida essa empresa, assim, não se

pode estabelecer uma atividade lucrativa havendo o recolhimento de todos os

tributos e gerando empregos com salários dignos, se ao mesmo tempo e de outro

lado é verificado um claro prejuízo ao meio ambiente, ao ambiente de trabalho e aos

consumidores com implementação de cláusulas e práticas abusivas.

Portanto, o objetivo da função social é o de mostrar compromisso e também

as responsabilidades sociais da empresa. Ainda que a função social da empresa

seja o corolário de uma ordem econômica, cuja finalidade é a de assegurar a todos

uma existência digna em conformidade com a justiça social, a responsabilidade da

empresa se faz em face da sociedade como um todo e não somente perante seus

concorrentes e consumidores. Não obstante a atividade empresarial visar o lucro,

ela reflete diretamente no contexto social, seja a partir do aumento na arrecadação

113

de impostos, na geração de empregos, ou ainda, possibilitando a circulação de

riquezas.

Assim, uma empresa socialmente responsável é aquela que efetivamente

contribui para a disseminação dos valores sociais do contexto em que está inserida,

promovendo uma busca pela equidade e justiça social de modo a equilibrar os

conflitos sociais existentes, típicos de uma sociedade capitalista pós revolução

industrial.

Desta forma, a responsabilidade social está explícita na categoria das

empresas de economia privada, que se inserem no mercado, porém conscientes de

uma hipoteca social que as orienta para uma justa e eficiente aplicação do lucro

através das várias modalidades conhecidas e praticadas, de modo que a concepção

mais ampla da responsabilidade social funda-se na crítica ao objetivo exclusivo da

empresa de obter lucro em curto prazo, não ponderando fatores sociais, éticos e

econômicos, e forma a aceitar uma proposta alternativa de um modelo que também

considere as exigências externas à sociedade empresarial.

Caracteriza-se como uma empresa socialmente responsável aquela capaz de

contribuir para que os valores da comunidade onde se insere em nível local,

nacional e internacional em todos os domínios da vida humana a saber: trabalho,

ambiente, relações humanas, de modo a aproximar as sociedades e as pessoas

num sentido e caminho comuns, pautados por mais justiça e equidade social,

promovendo o equilíbrio necessário para a elaboração e assegurar uma legitimação

social e possibilitando ultrapassar a relação de conflito da típica sociedade industrial.

Portanto, o conceito de responsabilidade social é elástico, porém pode-se mencionar

que os fundamentos da responsabilidade social são o motor propulsor da história da

humanidade, uma vez que persegue a inclusão social, a igualdade, as garantias de

direitos civis e também a ética e transparência nas relações, preocupando-se ainda

com o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida das pessoas.

Conclui-se que o presente trabalho abarca diversos conceitos para realizar a

construção histórica e conceitual de pontos importantes na sociedade atual,

verificando através do Estado social e da CF de 1988 os dispositivos legais que

trazem a ordem econômica como ponto primordial para o entendimento de todo o

114

trabalho, de forma que quando surge a figura interventiva do Estado, esta ocorre em

decorrência do explicitado na CF, principalmente nos arts. 170 e seguintes.

Por fim, a relação entre responsabilidade social da empresa e a intervenção

estatal na atividade econômica se exprime no sentido de que a empresa deve

preocupar-se em praticar as funções que lhe são atribuídas, como pagamento de

tributos, o respeito com seus funcionários e consumidores, com o meio ambiente e,

também com o desenvolvimento social que acontece em seu entorno,

caracterizando-se como socialmente responsável ao atender estas particularidades

sem deixar de lado a manutenção de sua atividade econômica, buscando além do

lucro a solidariedade social.

115

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