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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO UNISAL - CAMPUS MARIA AUXILIADORA Giselle Alessandra Marchi Marcas na Produção das Identidades de Professoras e Professores de Educação Infantil de Campinas-SP, na Contemporaneidade Americana 2017

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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO UNISAL - CAMPUS MARIA AUXILIADORA

Giselle Alessandra Marchi

Marcas na Produção das Identidades de Professoras e

Professores de Educação Infantil de Campinas-SP, na

Contemporaneidade

Americana 2017

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Giselle Alessandra Marchi

Marcas na Produção das Identidades de Professoras e

Professores de Educação Infantil de Campinas-SP, na

Contemporaneidade

Dissertação de Mestrado apresentada como

requisito para obtenção do título de Mestre

em Educação à Comissão Julgadora do

Centro Universitário Salesiano de São Paulo

– UNISAL. Linha de Pesquisa 2 - CAIPE:

Conhecimento e Análise das Intervenções na

Práxis Educativa Sociocomunitária. Sob

orientação da professora Dra. Fabiana

Rodrigues Sousa.

Americana 2017

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M265m

Marchi, Giselle Alessandra Marcas na produção das identidades de professoras e professores de educação infantil de Campinas- SP, na contemporaneidade / Giselle Alessandra Marchi. – Americana: Centro Universitário Salesiano de São Paulo, 2017. 166 f. Dissertação (Mestrado em Educação). UNISAL – Centro Universitário Salesiano de São Paulo. Orientador: Profa. Dra. Fabiana Rodrigues Sousa de Sante. Inclui Bibliografia. 1. Educação infantil. 2. Formação de professores. 3. Identidades. I. Título. II. Autor. CDD – 370.7

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GISELLE ALESSANDRA MARCHI

MARCAS NA PRODUÇÃO DAS IDENTIDADES DE PROFESSORAS E PROFESSORES DE EDUCAÇÃO INFANTIL DE CAMPINAS - SP, NA CONTEMPORANEIDADE.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do Centro Universitário Salesiano de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação – área de concentração: Educação Sociocomunitária.

Linha de pesquisa: A intervenção educativa sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis. Orientadora: Profa. Dra. Fabiana Rodrigues Sousa de Sante

Dissertação defendida e aprovada em 07 de março de 2017, pela comissão julgadora: __________________________________________ Profa. Dra. Gabriela Guarnieri de Campos Tebet – Membro Externo Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP

__________________________________________

Profa. Dra. Renata Sieiro Fernandes – Membro Interno Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL __________________________________________ Profa. Dra. Fabiana Rodrigues Sousa de Sante – Orientadora Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL

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AGRADECIMENTOS

“Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas

que não se veem.” (Bíblia, Hebreus, 11, verso 1)

Agradeço a Deus que pela fé, dá potência ao meu corpo vibrátil e possibilita a

criatividade e criação.

Aos meus filhos, por dividir meu tempo e por vezes reclamarem pela falta dele

porém por sempre me incentivarem a continuar.

À minha família, pelo apoio apesar de acharem loucura estudar tanto!

À professora Norma Lima Trindade por me apresentar algumas conceitos de

teóricos pós estruturalistas que ao mesmo tempo me fascinam, me assustam e me

animam com a coragem de ir além.

À professora Renata Sieiro Fernandes que com sua fala intensa, seu

profissionalismo e suas escolhas de filmes e textos para as disciplinas despertou

algumas marcas adormecidas aguardando um devir.

À professora Gabriela Guarnieri de Campos Tebet por aceitar participar da minha

banca de qualificação e defesa, um acontecimento, e com seu conhecimento, tanto

ter colaborado com a pesquisa.

Em especial a minha orientadora Professora Fabiana Rodrigues de Sousa, por ter

me aceitado após a saída da professora Norma e pelo esforço de não modificar meu

referencial teórico e ter apoiado, conversado e discutido o processo de elaboração

desta dissertação.

Aos colegas de turmas que vinham com experiências diversas e contribuíram para

grandes reflexões.

A todos que direta ou indiretamente, colaboraram para a conclusão deste trabalho.

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RESUMO

Este trabalho teve como objetivo identificar marcas na produção de identidades de professoras e professores da Educação Infantil de Campinas/SP destacando elementos de sua trajetória profissional e da formação continuada, com intenção de refletir sobre como processos de subjetivação têm afetado a construção e a produção das identidades das e dos docentes. Para tanto, analisamos a participação das professoras e de professores desta etapa da educação básica nos processos de construção das diretrizes curriculares da Educação Infantil, em Campinas, e nas atividades de formação continuada, procurando compreender como esses fatores podem colaborar para o enfrentamento dos desafios da construção de uma sociedade inclusiva que seja capaz de respeitar as diferenças e o diferente. O referencial teórico que deu embasamento a essa pesquisa está ancorado na produção bibliográfica de Félix Guattari, Gilles Deleuze, Sueli Rolnik, Tomaz Tadeu da Silva, Jorge Larrosa para discussão dos conceitos de identidade, experiência, marcas e processos de subjetivação. A Educação Infantil é discutida com base na experiência docente da pesquisadora em diálogo com a produção bibliográfica de pesquisadoras e pesquisadores mais experientes desta área de investigação, tais como Anete Abramowicz, Fúlvia Rosemberg, Moysés Kuhlmann Jr, Ana Lúcia Goulart de Faria. O referencial da educação deu suporte à reflexão sobre as práticas educativas e suas relações com os desafios da contemporaneidade, tais como o reconhecimento do discurso pedagógico e das identidades e diferenças, como construções culturais ligadas às relações de poder, em que a postura dos profissionais e a relação com a comunidade faz toda diferença na construção do conhecimento, apreensão e transformação do mundo. As possibilidades metodológicas pensadas e experimentadas para ouvirmos as professoras e os professores acerca das marcas pelas quais vão construindo suas identidades foram orientadas pelo enfoque qualitativo de pesquisa e a técnica de coleta de dados utilizada foi o questionário on-line contendo perguntas abertas e fechadas, o qual foi enviado para todos os e-mails das professoras e de professores de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação da cidade de Campinas. Responderam ao questionário 21 professoras e professores da Educação Infantil. Ao longo de sua formação(inicial e continuada), professoras e professores foram marcados por diversos processos de subjetivação por meio de várias correntes epistemológicas, as tecnologias, as mídias e dos acontecimentos da sua territorialidade. Na trajetória profissional, também na cidade de Campinas, a participação na formulação das diretrizes Curriculares para Educação Infantil trouxe muitas contribuições para construção de identidades específicas para Educação Infantil. Esperamos que os resultados desta pesquisa favoreçam a reconstrução ou desconstrução de algumas marcas de suas identidades como professoras e professores de uma etapa da Educação Básica afetada por inúmeras forças, com identidades específicas, com crianças vivas e sempre com a possibilidade do devir assim como a vida.

Palavras-chaves: Educação infantil; Formação de professores; Identidades; Processos de subjetivação; Educação sociocomunitária

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ABSTRACT This research work aimed to identify marks on the identities’ production of Early Childhood teachers who work in the city of Campinas/SP, pointing out elements of their professional trajectory and their continued education in order to promote a reflection on how the process of subjectivity has affected the construction and production of the teacher’s identities. For this purpose, we analyzed the participation of these teachers, working on this stage of basic education, on the curricular guidelines building process for Early Childhood Education, in the city of Campinas, and on the continued education activities, in order to understand how these factors can contribute to face up to the challenges to construct an inclusive society able to respect the differences and the different. The theoretical framework in which this research was based on includes the literature review of Félix Guatarri, Gilles Deleuze, Sueli Rolnik, Tomaz Tadeu da Silva, Jorge Larrosa to discuss the concepts of identity, experience, marks and processes of subjectivity. The Early Childhood Education is discussed based on the researcher’s teaching experience in dialogue with the literature review produced by more experienced researchers in this research area, such as Anete Abramowicz, Fúlvia Rosemberg, Moysés Kuhlmann Jr, Ana Lúcia Goulart de Faria. The sociocommunitarian education referential has provided support towards the reflection about educational practices and its relations with the challenges of the contemporaneity, such as the recognition of the pedagogical discourse, the identities and the differences as cultural constructions associated to power, in which the professional posture and the relationship with the community make the difference in the knowledge construction, apprehension and transformation of the world. The methodological possibilities thought and experimented to listen to the teachers concerning the marks throughout they are going to construct their identities were oriented by the qualitative research approach and the data collection used was on-line questionnaires with open and closed questions, that were sent to all the e-mail addresses of the Early Childhood teachers who work in the Municipal Secretariat of Education in the city of Campinas. Twenty-one Early Childhood teachers answered the questionnaire. Throughout their continued education (initial or continuous), teachers were marked by a variety of subjective processes by many epistemological orientations, as technologies, media and the events of their territoriality. In their professional trajectory, in the city of Campinas, their participation in the curricular guidelines for Early Childhood Education building process brought many contributions to the construction of specific identities for Early Childhood Education. We expect that the results of this research propitiate the reconstruction or deconstruction of some of their identity marks as teachers of a stage of Education that is affected by a great deal of forces, with specific identities, with lively children and always with the possibility of becoming, as well as life itself. Keywords: Early Childhood Education; Continued Education; Identities; Process of Subjectivity; Sociocommunitarian education

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1- Números de participantes, nomes, data, hora, idade e sexo.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AIP – Avaliação Institucional Participativa

BNCC- Base Nacional Curricular Comum

CEB – Coordenadoria de Educação Básica da Secretaria Municipal de Educação

CEB - Câmara de Educação Básica

CEFORMA- Centro de Formação

CEFORTEPE – Centro de Formação em Tecnologia e Pesquisa Educacional CF –

Constituição Federal

CNE - Conselho Nacional de Educação

CMI – Capital Mundial Integrado

COEDI- Coordenação de Educação Infantil

COHAB - Companhia de Habitação Popular

CONSED - Conselho Nacional de Secretários de Educação

CP – Coordenador pedagógico

CSF – Coordenadoria Setorial de Formação

DCNEI – Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil

DCNEB- Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Básica

DEPE – Departamento Pedagógico da Secretaria Municipal de Campinas

EB – Educação Básica

ECA – Estatuto da Criança e Adolescente

EF – Ensino Fundamental

EI – Educação Infantil

EJA – Educação de Jovens e Adultos

EMEF – Escola Municipal de Ensino Fundamental

FC – Formação Continuada

FUMEC – Fundação Municipal Educação Comunitária

FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de

Valorização do Magistério

FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

Valorização do Magistério

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

MEC – Ministério de Educação

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MIPID- Programa Memória e Identidade Promoção da Igualdade na Diversidade

NAED – Núcleo de Ação Educativa Descentralizada

OP – Orientador pedagógico

PCN- Parâmetros Curriculares Nacionais

PP – Projeto Pedagógico

RCNEI- Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil

RMEC – Rede Municipal de Ensino de Campinas

RPAI - Reunião Pedagógica de Avaliação Institucional

SME – Secretaria Municipal de Educação de Campinas

TDC – Trabalho docente coletivo

UE – Unidade Educacional

UNDIME - União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação

UNISAL – Centro Universitário Salesiano de São Paulo

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SUMÁRIO

MEMORIAL ............................................................................................................... 13

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 21

1 A PRODUÇÃO DAS IDENTIDADES DAS PROFESSORAS E DOS

PROFESSORES DE EDUCAÇÃO INFANTIL .......................................................... 26

1.1- PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO .............................................................. 26

1.2- MARCAS NA PRODUÇÃO DAS IDENTIDADES .......................................... 31

1.2.1-Memórias e história ................................................................................ 34

1.3- AS IDENTIDADES NA CONTEMPORANEIDADE ....................................... 36

2 CRIANÇA, INFÂNCIA E EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA HISTÓRIA RECENTE .. 44

2.1 - BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL E NA CIDADE DE CAMPINAS NOS ÚLTIMOS 30 ANOS ............................................................ 48

3 PROCESSOS DE CONSTRUÇÃO PERMANENTE DAS DIRETRIZES

CURRICULARES PARA EDUCAÇÃO INFANTIL NA CIDADE DE CAMPINAS .... 56

4 REFLEXOS DA FORMAÇÃO CONTINUADA NA PRODUÇÃO DE IDENTIDADES DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO INFANTIL ......... 82

4.1- ANÁLISE E PROPOSTAS FORMATIVAS DESAFIOS E AVANÇOS ........... 85

5 CAMINHOS, POSSIBILIDADES DE ESCUTA DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES ...................................................................................................... 94

5.1 – RE-TERRITORIALIZAÇÕES DA PESQUISA ............................................ 94

5.2 – MARCAS QUE MOTIVARAM O TORNAR-SE PROFESSORA OU PROFESSOR ....................................................................................................... 108

5.3- CONCEPÇÕES DE INFÂNCIA DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES ENTREVISTADOS ...................................................................... 111

5.4 - FORMAÇÃO DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES E TEMPO DE DOCÊNCIA ............................................................................................................. 114

5.4.1 - Formação continuada ....................................................................... 116

5.5 - SER PROFESSORA OU PROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL ........ 119

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 124

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7 REFERÊNCIAS BIBLIOGÁFICAS ...................................................................... 129

APÊNDICES.............................................................................................................136

APÊNDICE I: Marco Legais....................................................................................137

APÊNDICE II: Sumário do primeiro documento de Diretrizes Curriculares de Campinas “Currículo em Construção”................................................................ 139

APÊNDICE III: Sumário do segundo documento de Diretrizes Curriculares de Campinas “Proposta Curricular da Educação Básica- EI”.................................140

APÊNDICE IV: Minha proposta de ação formativa .............................................141

APÊNDICE V: Publicação do Grupo de estudos no Diário Oficial do Município.................................................................................................................145

APÊNDICE VI: Publicação do cancelamento do Grupo de estudos no Diário Oficial do Município...............................................................................................146

APÊNDICE VII: Envio da proposta via e-mail.......................................................147

APÊNDICE VIII: Questionário de pesquisa de campo.........................................148

APÊNDICE IX: Autorização da SME para pesquisa.............................................152

APÊNDICE X: Gráfico – Ordem de relevância e impacto das Leis e Diretrizes na EI........................................................................................................…...................156

APÊNDICE XI: Gráfico - Instituição em que cursou a graduação......................157

APÊNDICE XII: Gráfico - Onde cursou a pós-graduação …..............................158

APÊNDICE XIII: Quadro - fato histórico SOCIAL marcante da época em que fazia curso de formação inicial (magistério/ graduação) ou especialização....159

APÊNDICE XIV: Quadro - fato histórico POLÍTICO marcante da época em que fazia curso de formação inicial (magistério/ graduação) ou especialização........................................................................................................160

APÊNDICE XV: Quadro - fato histórico ECONÔMICO marcante da época em que fazia curso de formação inicial (magistério/ graduação) ou especialização........................................................................................................161

APÊNDICE XVI: Quadro - fato marcante para sua motivação em tornar-se professor (a) de Educação Infantil........................................................................162

APÊNDICE XVII: Gráfico – Agrupamento que trabalha atualmente...................163

APÊNDICE XVIII: Gráfico – Agrupamento que já trabalhou...............................164

APÊNDICE XIX: Quadro – Experiência de formação continuada mais marcante como professor de Educação Infantil..................................................................165

APÊNDICE XX: Quadro – Para que participa de Ações Formativas Continuadas?..........................................................................................................166

APÊNDICE XXI: Gráfico – Compartilha suas vivências nas Ações Formativas Continuadas com seus colegas da escola......................................................................................................................167

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Memorial

Quando se nasce pobre, estudar é o maior ato de rebeldia!

Pensar meu memorial me remete ao meu contexto socioeconômico, quando

criança, éramos pobres e estudar não era prioridade na família nem por parte de pai

e nem por parte de mãe. Entretanto, meu pai dizia que tinha que estudar mesmo

sem saber o porquê fazer isso. Meus pais sempre trabalharam muito e, por poucas

vezes, vi meu pai tentando retomar os estudos através do supletivo. Minha mãe lia

muito e eu pensava: o que será que tem nesses livros que ela não larga? Depois

percebi que ali havia sonhos, fuga e ideais.

Nasci num bairro que fica do lado da cidade de Campinas, considerado de

elite, porém meus pais moravam com meus avôs que haviam chegado lá há muito

tempo e construíram uma casa, éramos muito mais pobres que os vizinhos e sempre

sofri preconceito em conseguir colegas. Neste bairro as pessoas eram, em sua

maioria, brancas. Um fato que me marcou muito foi um dia ter emprestado um

vestido da única colega que eu tinha e quando fui devolver ela disse que podia ficar

com o vestido, pois a sua mãe não queria que ela usasse mais. Eu pensava “Que

gente esquisita!”.

Quando fiz sete anos meus pais conseguiram uma casa do programa de

casas populares da Companhia de Habitação Popular (COHAB), então nos

mudamos para o lado oposto da cidade, para a periferia. Nesse bairro não tínhamos

asfalto, infraestrutura, entretanto tinha vida, tinha gente, as pessoas conversavam,

brigavam, se ajudavam. Estávamos com pessoas que se pareciam mais conosco.

Agora percebia que quando alguma colega parecia mais “riquinha” sofria. No

caminho da escola, um dia, chegaram a chutar uma colega que ia bem arrumada

para escola. De novo pensei “Que gente esquisita!”.

Acredito que foi observando essas atitudes que resolvi estudar e, tenho

certeza que para quem nasce com poucos recursos (econômico, social ou familiar),

ser “alguém” que respeita o outro é a melhor resposta a esse sistema tão

discriminador, racista e preconceituoso.

Muitas vezes, já temos nossos futuros traçados por outros com base em

nossa raça, nossa orientação sexual, nossa família, nossa condição econômica etc.

Porém, nós podemos escolher e a escola tem esse papel fundamental de mostrar

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aos alunos seu potencial, suas possibilidades, suas superações ou reforçar

preconceitos, discriminações e racismos. Somos sujeitos do nosso cotidiano e

nascemos já com muitos rótulos, mas somos capazes de questionar esses rótulos e

mudá-los.

Estudei sempre em escola pública e minha vida acadêmica, na infância, foi de

1976 a 1988, ou seja, ditadura e início das Diretas já.

Quando fui para o Colegial (hoje Ensino Médio), em 1989, já estávamos

voltando para democracia. Não tive orientação na escola de 1º grau (hoje Ensino

Fundamental) para procurar uma escola, fui por minha conta ao Colégio Culto à

Ciência em Campinas. Chegando lá a senhora que me atendeu me deu uma prova e

disse “Faça! É para o magistério”. Eu perguntei “O que é magistério?” Ela me

respondeu: “É para ensinar crianças, vai, faz a prova”. Eu fiquei com a prova na

mão, pensando, uma garota perto de mim disse “Faz! Não tem química, nem física”.

Como nem sabia o que era direito química e física pensei: “Vou fazer”. Estava difícil

o teste, mas passei e fiz minha matrícula.

A partir do ingresso no magistério, comecei a conhecer novas ideias, a história

por outro viés, as injustiças sociais, a discriminação, o racismo etc. Foi aí que eu tive

certeza de que eu queria ser professora!

Fiz metade do curso no período matutino no Colégio Culto à Ciência e metade

do curso no período noturno no Colégio Carlos Gomes. Durante o curso comecei a

trabalhar como babá.

Logo casei. Parei de estudar por um ano. Casei com dezesseis anos com um

japonês, parece uma informação sem importância, mas não é, pois sofri muito com a

família do meu ex-marido, eles não aceitavam que ele se casasse com uma

brasileira e eu pensava “Eles também nasceram aqui, não são brasileiros?” Minha

ex-sogra, quando se referia a mim, falava em japonês e isso me ofendia muito,

mesmo não sabendo o que ela dizia. Mais tarde soube que ela dizia que se meu ex-

marido casasse comigo, ele teria filhos de cabelo crespo, pois minha irmã tem

cabelos encaracolados. Quando minha filha nasceu, a família do meu ex-marido

olhava para ela procurando traços, tentando identificar com quem ela se parecia e

isso me deixava muito brava!

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Me separei aos vinte anos, voltei para casa dos meus pais e pensei que tinha

de tomar uma decisão, terminar os estudos, arrumar emprego e cuidar da minha

vida e da minha filha, ou entregá-la para meus pais e ficar dependente deles

economicamente para sempre. Decidi estudar.

Como sempre estudei em escola pública, nem tentei entrar na Universidade

Pública, pois eu acreditava que lá entravam somente os alunos que tinham estudado

em escola particular e feito cursinho.

Fui para uma Universidade Privada e, logo nos primeiros dias, senti o peso de

morar em um bairro de periferia, pois ninguém quis formar grupo comigo. Não me

preocupei com isso, mas percebi o que havia acontecido, fiz o trabalho sozinha e

tirei nota boa e no próximo trabalho já tive alguns convites! Mais uma vez pensei

“Que gente esquisita!”.

Paguei a faculdade, pois consegui participar do Programa de Crédito

Educativo1 em 1994.

Prestei concurso e entrei na prefeitura (1992), como monitora de educação

infantil: prestei o concurso pelo nome, tão bonito! Nessa época, tive o primeiro

contato com crianças pequenas na creche e para maioria de nós, monitoras, a

criança precisava ser cuidada, assistida, obediente e pronto!

A diretora cuidava do horário e de coisas administrativas. A administradora

(capitão-do-mato, dava medo!) era como um capataz vigiando tudo e todos.

1 O Programa de Crédito Educativo (PCE) foi aprovado pela Presidência da República, em 23 de

agosto de 1975, com base na Exposição de Motivos nº 393, de 18 de agosto de 1975, apresentada pelo Ministério da Educação e Cultura. Foi implantado, no primeiro semestre de 1976, nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No segundo semestre do mesmo ano, foi estendido a todas as Instituições de Ensino Superior do País, reconhecidas ou autorizadas, tendo beneficiado mais de 870.000 estudantes. Na primeira fase, funcionou com recursos da Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil S.A. e bancos comerciais. Em 1983, teve alterada sua forma de custeio, passando os recursos a serem providos pelo orçamento do Ministério da Educação e pelas loterias, previstas para aplicação do Fundo de Assistência Social (FAS), tendo a Caixa Econômica Federal como único Agente Financeiro. A Lei 8.436, de 25 de junho de 1992, institucionalizou o Programa. Suas diretrizes e regulamentação foram fixadas pelas Portarias nº 202, de 17 de fevereiro de 1993, nº 1.641, de 26 de novembro de 1994, do Ministério da Educação e do Desporto, e pela Circular nº 2.282, de 26 de fevereiro de 1993, do Banco Central do Brasil. A Lei nº 9.288, de 01 de julho de 1996, alterou dispositivos da Lei nº 8.436, de 25 de julho de 1992. Os contratos assinados até o primeiro semestre de 1993 (93/1), inclusive, reger-se-ão pelas normas contratuais vigentes até então; os firmados a partir do segundo semestre de 1993 (93/2), pela Circular do Banco Central nº 2.282/93 e diretrizes decorrentes. Os contratos formalizados a partir do segundo semestre de 1996 (96/2) serão regidos pela Lei nº 9.288, de 01 de julho de 1996.

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Fazíamos rodízio para cuidar das crianças, lavar banheiros e cozinhar. Assim íamos

tocando... cuidando...

Após quase um ano de trabalho, fomos convocadas pelas coordenadoras

pedagógicas (CPs), era um cargo novo e elas ficavam na prefeitura, para um

encontro que aconteceu na Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF)

Corrêa de Mello onde discutimos o cuidar e o educar e participamos de dinâmicas.

Descobri naquele encontro que a rotina da creche poderia ser diferente e que havia

pessoas que pensavam sobre a parte pedagógica da escola e se preocupavam com

o bem-estar das crianças e dos funcionários. Aí decidi que iria estudar isso –

Pedagogia. Naquele encontro eu vi pessoas interessadas na educação infantil.

Decidi que seria professora de Educação Infantil e de Educação de Jovens e

Adultos que sempre foram minhas duas paixões profissionais, os extremos

discriminados. Comecei a estudar para prestar concurso e em 1997 passei para os

dois cargos, professora de EI e professora da EJA deixando o cargo de monitora de

educação infantil e levando muitas marcas desse período.

Vou falar primeiramente do meu fazer com as crianças. Com elas fiz muitas

coisas como pensar, pesquisar, brincar, amar, escrever, desenhar, pintar, sentir,

conversar, sofrer, chorar, viver... Eu fazia muitos cursos e aprendi muito sobre as

crianças e como fazer para elas e com elas. Após dez anos como professora, me

inscrevi para ser orientadora pedagógica (OP) substituta e fui fazer com as

professoras tudo aquilo que fazia com as crianças, o que não foi tão fácil: exige-se

muito da orientadora, porém o trabalho deve ser em conjunto, não existe fórmula

mágica. Como OP, eu ia às reuniões de trabalho com as CPs e, com a vivência

nessas reuniões, decidi que CP era o que eu queria ser. Elas pensavam,

organizavam e faziam formação, instigavam as discussões sobre como pensar as

concepções de criança, infância e Educação Infantil. Como OP eu sentia motivação

a cada reunião de trabalho que fazíamos. Eu via nas CPs uma vontade de mudar ou

transformar a Educação Infantil para melhor. Prestei o concurso e, mesmo todos

dizendo que eram poucas vagas, eu queria e passei. Escolhi o Núcleo de Ação

Educacional Descentralizada (NAED) Sudoeste2 porque queria muito: desde que

2 Em 2003 a organização da Secretaria de Educação Municipal (SME) da prefeitura de Campinas

passou a ser com um núcleo central na prefeitura e cinco núcleos descentralizados em regiões da

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estou na prefeitura, nunca saí da região do NAED Sudoeste. Eu imaginava o

trabalho sério e coletivo que os profissionais do NAED faziam e a forma como

pensavam a educação das escolas públicas.

Nessa época o trabalho das CPs não era mais centralizado na prefeitura,

como no início quando o cargo foi criado nos anos 90, e sim nos Núcleos de Ação

Educacional Descentralizados.

O trabalho do NAED era organizado para que supervisor e CP trabalhassem

em duplas, com um bloco de mais ou menos quatro escolas, o que funcionava muito

bem. Comecei a trabalhar como coordenadora em abril de 2009, nesse modelo,

entretanto, fiquei meio sem saber direito o que fazia, tentava não atrapalhar o que

estava sendo feito, tentava entender... Em 2010, resolvi que precisava assumir

algumas coisas e me engajei na formação principalmente dos monitores e agentes

de Educação Infantil. Foi um trabalho muito intenso e que repercutiu muito bem na

Rede.

Em 2013 as CPs foram convidadas a deixar o trabalho de forma

descentralizada e voltar a realizar um trabalho centralizado em duas coordenadorias:

a Coordenadoria de Educação Básica (CEB) e a Coordenadoria Setorial de

Formação (CSF). Obviamente, pela minha experiência com formação, escolhi a

CSF.

cidade denominados Sudoeste, Noroeste, Sul, Norte e Leste. Os Núcleos de Ação Educativa Descentralizada (NAEDs) são estruturas da Secretaria Municipal de Educação de Campinas, criados a partir do Decreto nº 14.460, de 30/09/03 (DOM 01/10//03:8). De acordo com o texto legal, têm como diretrizes políticas e pedagógicas (artigo 15): I - desenvolver ações educativas descentralizadas voltadas à construção de uma política pública municipal de educação; II - implementar procedimentos e normas político pedagógicas da SME, favorecendo a comunicação, articulação e atendimento à comunidade escolar e seu entorno; III - participar regionalmente das ações das diversas Secretarias para o desenvolvimento de políticas públicas intersetoriais, promovendo a participação ativa da população, a sua inclusão radical nas Unidades Educacionais e a expressão da singularidade de cada Comunidade Escolar; IV - realizar ações fomentadoras à valorização dos saberes produzidos na região em busca da qualidade social. Ainda de acordo com a supracitada legislação, competem aos NAEDs as seguintes atribuições (artigo 17):I - coordenar a ação educativa na região de forma coletiva entre os integrantes da equipe; II - prover suporte administrativo e pedagógico para as Unidades Educacionais; III - articular a Comunidade Educacional para as ações intersetoriais; IV - viabilizar e divulgar eventos da SME e do Governo; V - participar ativa e preferencialmente de todo o processo do Orçamento Participativo; VI - desenvolver projetos de formação regionalizados; VII - acompanhar e apoiar o trabalho dos Conselhos de Escola das Unidades Educacionais; VIII - acompanhar e fortalecer o desenvolvimento do Projeto Político Pedagógico de cada uma das Unidades Educacionais Municipais.

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Fui convidada a ser Coordenadora Setorial de Formação na Rede de Ensino

Municipal de Campinas (RMEC). Tenho tentando através da formação dos

profissionais da Rede colocar em discussão alguns paradigmas e metanarrativas.

Também sou professora da Fundação Municipal para Educação Comunitária3

(FUMEC). Com esses dois cargos, me relaciono com pessoas bem diferentes e,

infelizmente, percebo que o preconceito, o sexismo, o racismo, a homofobia, a

discriminação estão bem presentes, porém de forma velada. As pessoas que o

fazem sabem que não devem fazer, então, ele é escondido atrás de discursos que

em nada se parecem com as práticas.

Como professora da FUMEC pude conhecer as pessoas que ficam à margem

da educação formal por várias razões, entre elas, falta de tempo, não conseguir

estudar na infância, trabalho, dificuldades de aprendizagem, necessidades

especiais, casamentos que aprisionam, filhos etc.

Meu interesse pela Educação de Jovens e Adultos (EJA) começou no terceiro

ano do curso de pedagogia, quando tivemos uma única disciplina que falava sobre

EJA. Foi também nessa disciplina que conheci mais profundamente os livros do

educador Paulo Freire, autor que sempre acompanhou com suas ideias e ideais

minha carreira, tanto na Educação Infantil como na Educação de Jovens e Adultos.

Fiquei tão interessada que fui fazer estágio numa escola que tinha EJA no período

noturno, tive a certeza de que queria trabalhar com os adultos e tentar mudar algo

para melhorar suas vidas.

Todos podemos ser o que quisermos, porém precisamos saber que podemos

fazer outras escolhas.

3 A FUMEC – Fundação Municipal para Educação Comunitária foi instituída nos termos da Lei

5830/87. É uma fundação pública, vinculada à Secretaria Municipal de Educação. É mantenedora dos programas de Alfabetização para Jovens e Adultos através da EJA I – Educação de Jovens e Adultos (anos iniciais) equivalente aos cinco primeiros anos da educação básica e Educação Profissional, através do CEPROCAMP – Centro de Educação Profissional de Campinas – Prefeito Antonio da Costa Santos. A Fundação Municipal para Educação Comunitária – FUMEC, tem por objetivo oferecer aos jovens e adultos a partir dos 15 anos a educação básica equivalente aos cinco primeiros anos, considerando a singularidade dos alunos que não puderam frequentar a escola, ou dela foram afastados pelos mais diversos motivos. As ações de alfabetização são desenvolvidas em salas de aulas instaladas nas cinco regiões do município em escolas municipais, estaduais, associações de bairros, empresas, igrejas, enfim, em todos os locais em que houver demanda.

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Sou mulher, mãe de dois filhos, profissional, provedora de tudo na minha

casa, faço minhas escolhas e pago por fazê-las, saio todos os dias da minha casa,

que fica num bairro entre a periferia e o centro da cidade, em que os vizinhos mal se

cumprimentam, onde os portões estão sempre fechados e o medo de tudo e de

todos prevalece. Não desisto fácil de fazer o que acredito e também não aceito fazer

aquilo que não acredito. Se não dá por um caminho, pego outro. Recuo, mas não

desisto!

Chego ao mestrado no Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL)

para adquirir mais conhecimentos, pois como pedagoga e, no cargo de

Coordenadora Setorial de Formação, numa cidade tão grande como Campinas, não

posso ficar alheia às perturbações, às teorias educacionais e à pedagogia. Há

necessidade de escrever e pesquisar sobre vários temas que nos impactam, tais

como o professor, formação, a criança, a infância e a Educação Infantil.

Escrever, descrever e pesquisar sobre nossas práticas pode colaborar para o

enfrentamento dos desafios da contemporaneidade que tanto afetam a educação.

No mestrado, tive uma surpresa que foi conhecer as ideias de teóricos pós-

estruturalistas através das disciplinas oferecidas no curso pela professora Norma

Lima Trindade. Essas ideias vieram ao encontro das discussões que estamos

fazendo na Rede de Campinas em relação à concepção de professor, formação,

criança, infância e Educação Infantil. Para mim está sendo muito prazerosa a experiência com a leitura de livros e

discussões sobre teóricos pós-estruturalistas e, a partir das leituras e discussões a

escrita e análise.

Dentre tantas questões que nos coloca a contemporaneidade, o que mais me

provoca reflexão é como se da a produção e construção da identidade do professor

de educação infantil e quais as marcas que ajudaram nessa produção e construção.

A cada disciplina cursada no mestrado vamos descobrindo caminhos para a

pesquisa científica e a fundamentação para nossa dissertação. Também é

importante salientar a orientação que recebemos da professora orientadora que, no

meu caso, trocou ao longo do curso e foi uma experiência que trouxe mais uma

marca nessa caminhada do mestrado.

Enfim, pretendo continuar construindo e desconstruindo a minha identidade

como pessoa e profissional da educação, onde as coisas estão em constante

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mudança, na contemporaneidade, numa velocidade incrível. Penso como Paulo

Freire quando diz que gosta de ser gente porque, inacabado, sabe que é um ser

condicionado, mas consciente do inacabamento, sabe que pode ir mais além, e

aprende que é impossível assumir a vida sem riscos!

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Introdução

A experiência, e não a verdade, é o que dá sentido à escritura. Digamos, com Foucault, que escrevemos para transformar o que sabemos e não para transmitir o já sabido. Se alguma coisa nos anima a escrever é a possibilidade de que esse ato de escritura, essa experiência em palavras, nos permita liberar-nos de certas verdades, de modo a deixarmos de ser o que somos para ser outra coisa, diferentes do que vimos sendo. (LARROSA, 2015)

Todo trabalho acadêmico suscita um desassossego, mais conhecido como

um problema. Esse desassossego, geralmente, vem das nossas experiências

profissionais, sociais, econômicas e pessoais. No caso deste trabalho, o

desassossego, o problema de pesquisa, veio dos vinte e cinco anos de experiência

de trabalho na Educação Infantil (EI), onde exerci os cargos de monitora de EI,

professora de EI, vice-diretora, orientadora pedagógica e, atualmente, o cargo de

coordenadora pedagógica (CP), na função de coordenadora setorial de formação.

No cargo de CP tive contato com as escolas e, lendo os seus projetos

pedagógicos e os planos de trabalho das professoras e dos professores de EI, o

desassossego foi aumentando. Muitas das marcas dos vinte e cinco anos na EI e de

todos os cargos foram reatualizadas no cargo de coordenadora pedagógica, onde

pude ter maior contato com as professoras e os professores, com um outro olhar.

Não era mais uma relação de colegas de trabalho em que trocávamos atividades e

angústias, agora atuava como aquela que lia seus planos e, a leitura dos mesmos

me fazia lembrar ações que, muitas vezes, superavam a escrita e, outras vezes, não

condiziam com ela. Surgiu daí a necessidade de ouvir as professoras e os

professores para perceber como as marcas trazidas das suas experiências nos

contextos histórico, social, econômico e político, da formação inicial, da formação

continuada, das suas práticas e da sua vida pessoal contribuíram para a produção

da sua identidade como professora e professor da EI, na contemporaneidade.

Uma contemporaneidade que exige de nós, muito mais que antes, o domínio

da tecnologia, lidar com a globalização e com os processos de subjetivação. As

marcas as quais me refiro aqui são as que, segundo Rolnik (1993), estão nas

memórias guardadas em nosso corpo, um corpo que traz encarnada em conceitos

uma série de marcas que, ao nos afetarem podem provocar em nós o aparecimento

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de uma ou várias marcas inusitadas, ou também, reavivar alguma marca que já

estava ali a nos desassossegar, sem que pudéssemos ouvi-la e/ou responder à sua

exigência. A marca é assim criada ou reatualizada.

É necessário destacarmos sobre quais subjetividades estamos escrevendo,

pois não se trata daquilo que pensamos, mas daquilo que pensamos a partir dos

processos de subjetivação, envolvidos nas relações de poder, que nos marcam e

constroem, em nós, a nossa subjetividade, muitas vezes, sem termos consciência

disso. Nos faz pensar que somos centrados, nos marcam com uma identidade fixada

e, por vezes, nos tornam indiferentes aos processos de subjetivação que nos afetam

sempre, desde o nascimento. Em pesquisa no portal Scielo, encontrei vários

trabalhos sobre subjetividade, entretanto, nenhum deles tratava o tema na

perspectiva abordada aqui, como produção externa influenciada pelas experiências

sociais, políticas, econômicas e históricas, dando ainda mais relevância a essa

pesquisa.

A investigação realizada se insere na linha de pesquisa 2: “A intervenção

educativa sóciocomunitária4: linguagem, intersubjetividade e práxis5. Essa escolha

se justifica, pois, as marcas na produção das identidades de professoras e

professores e como esse(a) profissional se envolve na (re)construção de suas

identidades e das práticas educativas diante dos desafios contemporâneos, tais

como o reconhecimento do discurso pedagógico na contemporaneidade e o trabalho

com as identidades e diferenças, não apenas a tolerância delas; faz toda diferença

na construção do conhecimento, apreensão e transformação do mundo. Há que se

4 “A Educação Sociocomunitária é entendida, na qualidade de tema ou “objeto” de pesquisa, como

aquelas intervenções educacionais que têm — aos seus propositores, ao menos — claras intenções de impacto social; estas ações tendem a se dar nos ambientes ditos “não formais” de educação, mas podem acontecer também em ambientes formais, como a escola, quando se trata da mobilização da comunidade do entorno da instituição formal. Em suma, a educação sociocomunitária trata das ações educativas de impacto social, para além da escola, ou que envolvem a relação escola-comunidade. Esta perspectiva tem sido a principal adotada pelo Programa de Mestrado em Educação do Unisal (Centro Universitário Salesiano de São Paulo), cuja área de concentração é justamente a Educação Sociocomunitária” (GROPPO, 2013, p.2)

5 Trata -se de uma das linhas de pesquisa do UNISAL e tem por objetivo a investigação das ações e das formas de intervenção educativa sóciocomunitária a partir das articulações das linguagens como construção do conhecimento, apreensão e transformação do mundo. A construção do discurso pedagógico na contemporaneidade, como crítica à coisificação do educando, como desenvolvimento de alteridade e autonomia. Os instrumentos de elaboração e interpretação das linguagens para compreensão e significação histórica da práxis educativa.

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pensar em reatualizações e ressignificações das ações educativas com as crianças

que apontem e permitam a problematização das transformações que ocorrem no

mundo e da práxis das professoras e professores à luz de reinterpretações e

ressignificações históricas.

Para Groppo (2013, p2) “A lógica ou princípio sociocomunitário caracteriza-se

por relações sociais que, ao menos inicialmente, atendem a necessidades

propriamente humanas: sobrevivência, cuidado e identidade (em seu viés

comunitário) e liberdade, autonomia e criação (em seu viés societário)”.

Na Educação Infantil há necessidade de discutir os desafios contemporâneos

oportunizando a construção de novos discursos pedagógicos e práticas que incluam

e não excluam.

Na primeira parte, escrevo sobre o conceito de identidade em que me apoio

para pesquisa. Também sobre os processos de subjetivação, as marcas na

produção das identidades/diferenças e memória.

Por participar desta história da EI, como profissional da educação na cidade

de Campinas, entendo que neste trabalho de pesquisa acadêmica seria de extrema

importância apresentar, na segunda parte, um breve histórico da Educação Infantil

no Brasil e na cidade de Campinas, a partir dos marcos legais (Consultar Apêndice

I), mostrando que a construção histórica da Educação Infantil e as identidades das

professoras e dos professores desta etapa da educação básica é recente, porém foi

e é marcada pela produção de subjetividades do mundo contemporâneo e pelas

práticas dos(as) professores(as) que impulsionaram mudanças.

Na terceira e quarta parte escrevo sobre dois fatores que, a meu ver,

influenciam na produção da identidade das professoras e dos professores de EI,

quais sejam, a participação na construção das Diretrizes Curriculares para EI e a

Formação Continuada(FC), na cidade de Campinas.

As Diretrizes Curriculares para EI em Campinas estão sempre em movimento,

pois é uma característica desse documento estar em construção, tendo sempre a

participação dos profissionais da EI, o que faz muita diferença no processo. O

movimento curricular da Rede Municipal de Campinas sempre esteve aberto à

construção e à participação dos profissionais da educação, desde o primeiro

documento chamado “Currículo em construção”(1999). Essa característica aparece

sempre nos documentos, abrindo espaço para mudanças ou documentos

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complementares. Essa participação é que pretendo focar neste trabalho. As

diretrizes trazem uma escolha de uma concepção de currículo que, em cada época,

é subjetivado por políticas públicas6, influências teóricas e pelos documentos legais,

em nível federal e estadual para Educação Infantil. Toda essa construção e

movimento influenciam a organização da formação continuada para os profissionais

da educação, por isso, escrevo um pouco sobre a organização das ações formativas

na cidade de Campinas.

Na quinta parte, conto sobre as possibilidades pensadas e experimentadas no

ouvir as professoras e os professores. Fiz diversas tentativas para ouvi-los(as) e os

caminhos e descaminhos desse processo estão descritos nesta parte do trabalho.

Apoio-me, para as provocações e reflexões do trabalho, nas produções de

autores como Felix Guattari, Deleuze e Foucault, com o conceito de processos de

subjetivação, Deleuze, com o conceito de devir, Foucault com conceito de relações

de poder, Sueli Rolnik, com os conceitos de marcas e subjetividades, Stuart Hall,

com conceito de identidade e deslocamento do sujeito moderno, Tomaz Tadeu Silva,

com os conceitos de identidade e diferença, Boaventura de Sousa Santos, com os

conceitos de eurocentrismo, homogeneidade e pensamento abissal, Jorge Larrosa,

com os conceitos de experiência e formação continuada, Veiga Neto, com o conceito

de multiculturalismo, Silvio Gallo, com os conceitos de devir menor e formação

humana, Milton Santos com o conceito de globalização, dentre outros. Por opção em

não romper a narrativa, alguns conceitos serão detalhados em nota de rodapé, como

um texto paralelo, possibilitando ao leitor(a) a escolha de ler junto com o texto

narrativo ou não.

Assim analisei as marcas na produção de identidades de professoras e

professores na Educação Infantil na contemporaneidade destacando sobretudo

elementos da trajetória profissional e da formação continuada. A reflexão teórica me

ajudou na análise das respostas dos/das entrevistados(as) às questões do

6 De acordo com Oszlak e O'Donnel(1976) políticas sociais implementadas por um governo se referem a (...) um conjunto de ações e omissões que manifestem uma determinada modalidade de intervenção do Estado em relação a uma questão que concita a atenção, o interesse, a mobilização de outros atores na sociedade civil. (citados por Rosemberg, 2001, p.21) Gabriela Tebet (2007, p.20) escreve sobre políticas públicas: "[...] pois penso que as políticas públicas se constroem na relação entre esses quatro segmentos: um que reivindica, um que regulamenta, um que implementa e outro que utiliza o serviço."

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questionário que foi enviado para as professoras e professores da EI e sobre como

os processos de subjetivação, as marcas de suas identidades, suas posturas e suas

práticas têm afetado a construção e a produção das identidades das professoras e

dos professores de Educação Infantil na cidade de Campinas e consequentemente

como elas e eles podem colaborar no enfrentamento dos desafios da construção de

uma sociedade inclusiva ou para a reprodução de paradigmas que excluem bebês,

crianças e professores.

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1. A PRODUÇÃO DAS IDENTIDADES DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO INFANTIL

Afirmo aqui qual o conceito de identidade está apoiando esta pesquisa. O

descentramento do sujeito pós-moderno ou da modernidade tardia7 desconstrói a

ideia de uma única identidade, possibilitando ao sujeito assumir ou deixar

identidades. Em relação às professoras e aos professores destacamos alguns dos

fatores que afetam a produção de suas identidades, quais sejam, os processos de

subjetivação8 e suas marcas, a FC, como um meio de processos de subjetivação, e

os processos de construção das Diretrizes Curriculares do município de Campinas

que serão discutidos nas próximas partes do trabalho.

1.1 PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO

Os processos de subjetivação têm início antes mesmo do nascimento da

criança, pois já são projetadas e esperadas muitas coisas para esse bebê, o quarto,

as roupas, seus desejos já estão sendo preparados para atender às expectativas de

adultos e de um mercado que exercem determinados poderes sobre o bebê e a

criança que vem ao mundo. Por isso, talvez seja tão decepcionante receber um

bebê ou uma criança diferente, com deficiência, por exemplo. Para evitar

7 Ernesto Laclau (1990) usa o conceito de “deslocamento” . Uma estrutura deslocada é aquela cujo

centro é deslocado, não sendo substituído por outro, mas por “ uma pluralidade de centros de poder”. As sociedades modernas, argumenta Laclau, não tem nenhum centro, nenhum princípio articulador ou organizador único e não se desenvolvem de acordo com o desdobramento de uma única “causa” ou “lei”. A sociedade não é, como os sociólogos pensaram muitas vezes, um todo unificado e bem delimitado, uma totalidade, produzindo-se através de mudanças evolucionárias a partir de si mesma, como desenvolvimento de uma flor a partir de seu bulbo. Ela esta constantemente sendo “descentrada” por forças fora de si mesma. As sociedades da modernidade tardia, argumenta ele, são caracterizadas pela “diferença”; elas são atravessadas por diferentes divisões e antagonismos sociais que produzem uma variedade de diferentes “posições de sujeito” – isto é , identidades – para os indivíduos. Se tais sociedades não se desintegram totalmente não é porque elas são unificadas, mas porque seus diferentes elementos e identidades podem, sob certas circunstâncias, ser conjuntamente articulados. Mas essa articulação é sempre parcial: a estrutura da identidade permanece aberta. Sem isso, argumenta Laclau, não haveria nenhuma história. (HALL, 2000)

8 Em vez de ideologia, Rolnik (2010) prefere falar sempre em subjetivação, em produção de subjetividade. […] Tais mutações da subjetividade não funcionam apenas no registro das ideologias, mas no próprio coração dos indivíduos, em sua maneira de perceber o mundo, de se articular como tecido urbano, com os processos maquínicos do trabalho, com a ordem social suporte dessas forças produtivas.

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decepções, atualmente, alguns desejosos de ter um(a) filho(a), com dinheiro, podem

escolher o sexo, quantidades de bebês etc.

A maneira como o mundo recebe este bebê dependerá do local que ele

nascerá, local que já tem marcado seu contexto histórico, econômico, social e

político9, portanto já determinará algumas identidades fixas10.

Subjetividade não é sinônimo de sujeito. Não há como falar de subjetividade

em geral e nem em um sujeito universal, pois os sujeitos se constituem em

experiências sociais, políticas, econômicas e históricas, em caminhos singulares nas

instituições de seu lugar escola, família, igreja, etc.

A subjetividade é produzida por agenciamentos de enunciação. Os processos de subjetivação, de semiotização - ou seja, toda a produção de sentido, de eficiência semiótica - não são centrados em agentes individuais (no funcionamento de instâncias intrapsíquicas, egóicas, microssociais),

9 Entendido aqui como territorialidade termo usado por Deleuze e Guattari. Tudo tem sua territorialidade, está em certo território físico, em certa tradição, em certa cultura. É imanente a uma realidade. É uma territorialidade forçada, pois ao nascermos ela já existe. A noção de território aqui é entendida num sentido muito amplo, que ultrapassa o uso que fazem dele a etologia e a etnologia. Os seres existentes se organizam segundo territórios que os delimitam e os articulam aos outros existentes e aos fluxos cósmicos. O território pode ser relativo tanto a um espaço vivido, quanto a um sistema percebido no seio da qual um sujeito se sente “em casa”. O território é sinônimo de apropriação, de subjetivação fechada sobre si mesma. Ele é o conjunto de projetos e representações nos quais vai desembocar, pragmaticamente, toda uma série de comportamentos, de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, estéticos, cognitivos. (GUATTARI e ROLNIK, 2010) 10 Na medida em que não existe nenhuma "comunidade natural" em torno da qual se possam reunir as pessoas que constituem um determinado agrupamento nacional, ela precisa ser inventada, imaginada. É necessário criar laços imaginários que permitam "ligar" pessoas que, sem eles, seriam simplesmente indivíduos isolados, sem nenhum "sentimento" de terem qualquer coisa em comum. A língua tem sido um dos elementos centrais desse processo - a história da imposição das nações modernas coincide, em grande parte, com a história da imposição de uma língua nacional única e comum. Juntamente com a língua, é central a construção de símbolos nacionais: hinos, bandeiras, brasões. Entre esses símbolos, destacam-se os chamados "mitos fundadores". Fundamentalmente, um mito fundador remete a um momento crucial do passado em que algum gesto, algum acontecimento, em geral heróico, épico, monumental, em geral iniciado ou executado por alguma figura "providencial", inaugurou as bases de uma suposta identidade nacional. Pouco importa se os fatos assim narrados são "verdadeiros" ou não; o que importa é que a narrativa fundadora funciona para dar à identidade nacional a liga sentimental e afetiva que lhe garante uma certa estabilidade e fixação, sem as quais ela não teria a mesma e necessária eficácia. Os mitos fundadores que tendem a fixar as identidades nacionais são, assim, um exemplo importante de essencialismo Cultural. Embora aparentemente baseadas em argumentos {biológicos, as tentativas de fixação da identidade que apelam para a natureza não são menos culturais. Basear a inferiorização das mulheres ou de certos grupos "raciais" ou étnicos, alguma suposta característica natural ou biológica não é simplesmente um erro "científico", mas a demonstração da imposição de uma eloqüente grade cultural sobre uma natureza que, em si mesma, é – culturalmente falando - silenciosa. As chamadas interpretações biológicas são, antes de serem biológicas, interpretações, isto é, elas não são mais do que a imposição de uma matriz de significação sobre uma matéria que, sem elas, não tem qualquer significado. Todos os essencialismos são, assim, culturais. Todos os essencialismos nascem do movimento de fixação que caracteriza o processo de produção da identidade e da diferença.(SILVA,2000, p.85-86)

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nem em agentes grupais. Esses processos são duplamente descentrados. Implicam o funcionamento de máquinas de expressão que podem ser tanto de natureza extrapessoal, extra-individual (sistemas maquínicos, econômicos, sociais, tecnológicos, icônicos, ecológicos, etimológicos, de mídia, enfim sistemas que não são mais imediatamente antropológicos), quanto de natureza infra-humana, infrapsíquica, infrapessoal (sistemas de percepção, de sensibilidade, de afeto, de desejo, de representação, de imagens, de valor, modos de memorização e de produção ideica, sistemas de inibição e de automatismos, sistemas corporais, orgânicos, biológicos, fisiológicos, etc.). (GUATTARI; ROLNIK, 2010, p. 31)

Os processos de subjetivação atrofiam a capacidade de percepção em

relação às formas, sinais e signos, pois parece natural. Nosso corpo é afetado pelas

produções de subjetivação, fazemos esforço para parecer ser o que a mídia, o

capitalismo, o consumismo, o colonizador, enfim, os que possuem um determinado

poder de dominação desejam para nossa subjetividade. A maneira de ver, sentir,

desejar e estar no mundo são engendradas de diversas formas (DELEUZE;

GUATTARI, 1995, p32).

O trabalho de quem vende marcas, desejo, é incessante, incansável e se

aproveita desse vácuo da produção de identidades. Enquanto assumimos nossas

identidades fixadas por quem tem um determinado poder, sem questioná-las,

vivemos os efeitos dos processos de subjetivação controlando nossas vidas, nossas

escolhas e nossa existência. Para Guattari e Rolnik:

Sem um trabalho de formação prévia das forças produtivas e das forças de consumo, sem um trabalho de todos os meios de semiotização econômica, comercial, industrial, as realidades sociais locais não poderão ser controladas. (GUATTARI; ROLNIK, 2010, p 28)

Se há esse trabalho para o controle, há também a possibilidade de um

trabalho de combate em relação a esse controle. Essas maneiras de subjetivação

podem ser reforçadas na escola, pois é um local de controle (DELEUZE, 1992), ou

podem-se criar oportunidades para novos devires.

Qualquer lugar é lugar de combate entre forças, mas a escola tem potencial

relevante no sentido de criar, duvidar, questionar, reconhecer e modificar a

normalidade das coisas. A escola, principalmente as públicas, são espaços do

múltiplo, do diferente.

[...] as multiplicidades são a própria realidade, e não supõem nenhuma unidade, não entram em nenhuma totalidade e tampouco remetem a um sujeito. As subjetivações, as totalizações, as unificações são, ao contrário,

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29 processos que se produzem e aparecem nas multiplicidades. Os princípios característicos das multiplicidades concernem a seus elementos, que são singularidades; a suas relações, que são devires; a seus acontecimentos, que são hecceidades (quer dizer, individuações sem sujeito); a seus espaços-tempos, que são espaços e tempos livres; a seu modelo de realização, que é o rizoma (por oposição ao modelo da árvore); a seu plano de composição, que constitui platôs (zonas de intensidade contínua); aos vetores que as atravessam, e que constituem territórios e graus de desterritorialização (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p.8)

Há possibilidade de construir um conhecimento que não tenha um centro,

que se opõe ao modelo onde há conhecimentos que valem mais que outros. Para os

autores, a educação pode ser menor11 e rizomática12. Para Deleuze e Guattari:

Um rizoma não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo. A árvore é filiação, mas o rizoma é aliança, unicamente aliança. A árvore impõe o verbo "ser", mas o rizoma tem como tecido a conjunção "e... e... e...". Entre as coisas não designa uma correlação localizável que vai de uma para outra e reciprocamente, mas uma direção perpendicular, um movimento transversal que as carrega uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio. (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p.37).

É um movimento criador e pode enfrentar o mundo dicotômico e universal. A

educação menor também é um movimento de enfrentamento em relação à

educação maior e a desterritorização, pois sai das tradições e não aceita o controle

de quem detém o poder. Segundo Gallo:

A educação maior é aquela dos planos decenais e das políticas públicas de educação, dos parâmetros e das diretrizes, aquela da constituição e da LDB, pensada e produzida pelas cabeças bem-pensantes a serviço do

11 A educação menor é uma aposta nas multiplicidades, que rizomaticamente se conectam e interconectam, gerando novas multiplicidades. Assim, todo ato singular se coletiviza e todo ato coletivo se singulariza. Num rizoma, as singularidades desenvolvem devires que implicam em hecceidades. Não há sujeitos, não há objetos, não há ações centradas em um ou outro; há projetos, acontecimentos, individuações sem sujeito. Todo projeto é coletivo. Todo valor é coletivo. Todo fracasso também. (GALLO, 2002, p.176)

12 As principais características de um rizoma são [...]. Ele não é feito de unidades, mas de dimensões, ou antes de direções movediças. Ele não tem começo nem fim, mas sempre um meio pelo qual ele cresce e transborda. Ele constitui multiplicidades lineares sem dimensões, sem sujeito nem objeto [...]. Oposto a uma estrutura, [...], o rizoma é feito somente de linhas.[...] O rizoma é uma antigenealogia. É uma memória curta ou uma antimemória. O rizoma procede por variação, expansão, conquista, captura, picada. [...], o rizoma se refere a um mapa que deve ser produzido, construído, sempre desmontável, conectável, reversível, modificável, com múltiplas entradas e saídas, com suas linhas de fuga. [...] unicamente definido por uma circulação de estados [...] todo tipo de "devires". (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p.32).

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poder. A educação maior é aquela instituída e que quer instituir-se, fazer-se presente, fazer-se acontecer. A educação maior é aquela dos grandes mapas e projetos. Uma educação menor é um ato de revolta e de resistência. Revolta contra os fluxos instituídos, resistência às políticas impostas; sala de aula como trincheira, como a toca do rato, o buraco do cão. Sala de aula como espaço a partir do qual traçamos nossas estratégias, estabelecemos nossa militância, produzindo um presente e um futuro aquém ou para além de qualquer política educacional. Uma educação menor é um ato de singularização e de militância. Se a educação maior é produzida na macropolítica, nos gabinetes, expressa nos documentos, a educação menor está no âmbito da micropolítica, na sala de aula, expressa nas ações cotidianas de cada um. (GALLO, 2002, p.173)

Penso que as professoras e os professores podem agir neste espaço micro,

no cotidiano das suas práticas com as crianças, lugar cheio de potencial para

experiências. Para isso as professoras e os professores precisam conhecer sobre os

processos de subjetivação que cerca a todos e todas na construção da nossa

subjetividade.

Por isso este trabalho pretende olhar para a subjetividade evidenciando

aspectos dos processos de subjetivação. Este conceito é proposto por Guattari

(1990,1992, 1993,1995) em várias obras de sua autoria.

Se não se trata mais - como nos períodos anteriores de luta de classe ou de defesa da "pátria do socialismo" - de fazer funcionar uma ideologia de maneira unívoca, é concebível em compensação que a nova referência ecosófica indique linhas de recomposição das práxis humanas nos mais variados domínios. Em todas as escalas individuais e coletivas, naquilo que concerne tanto à vida cotidiana quanto à reinvenção da democracia – no registro do urbanismo, da criação artística, do esporte etc. - trata-se, a cada vez, de se debruçar sobre o que poderiam ser os dispositivos de produção de subjetividade, indo no sentido de uma re-singularização individual e/ou coletiva, ao invés de ir no sentido de uma usinagem pela mídia, sinônimo de desolação e desespero. Perspectiva que não exclui totalmente a definição de objetivos unificadores tais como a luta contra a fome no mundo, o fim do desflorestamento ou da proliferação cega das indústrias nucleares. Só que não mais tratar-se-ia de palavras de ordem estereotipadas, reducionistas, expropriadoras de outras problemáticas mais singulares resultando na promoção de líderes carismáticos. Uma mesma perspectiva ético-política atravessa as questões do racismo, do falocentrismo, dos desastres legados por um urbanismo que se queria moderno, de uma criação artística libertada do sistema de mercado, de uma pedagogia capaz de inventar seus mediadores sociais etc. Tal problemática, no fim das contas, é a da produção de existência humana em novos contextos históricos. A ecosofia social consistirá, portanto, em desenvolver práticas específicas que tendam a modificar e a reinventar maneiras de ser no seio do casal, da família, do contexto urbano, do trabalho. (GUATTARI, 1990, p.15)

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O autor chama a atenção para a desconstrução de certas formas de lutas que

já não fazem mais sentido, pois a sociedade é cheia de micropolíticas, micro e

macro poderes não são suficientes para tirar, por exemplo, um governante do poder,

para construir uma sociedade mais igualitária. Temos que olhar para o ambiente que

vivemos, para o que teremos que fazer a fim de não acabar com ele e, por

consequência, conosco.

Outros conceitos relativos aos processos de subjetivação serão abordados ao

longo das partes do trabalho.

1.2. AS MARCAS NAS PRODUÇÕES DE IDENTIDADES

Mãos

O coração é nosso tempo Aion, 13 ele pulsa

Todas as coisas passam pela mente As guardadas e as esquecidas

Nossos pés nos levam Ora para frente, ora para trás

Nossos cabelos se transformam Ou vão embora

A infância nos atravessa sempre Nossas mãos são reveladoras

De nossa história Abraçam, apertam, apontam Seguram copos e crianças

Se desesperam, cortam bolos Levam comida à boca

Se escondem, se mostram Sentem, brincam, se molham

Afagam, escrevem, trocam canal da TV Digitam, casam, assinam, usam alianças e anéis

Apoiam, recebem, dão, mostram números Brindam, calçam, arrumam

Destroem, seguram e libertam Adornam, são coloridas, são novas e velhas Servem café, limitam, ascendem e apagam

Abrem presentes, fecham e abrem portas e janelas Entregam presentes, plantam, colhem,

Batem palmas, cumprimentam, dizem adeus Pregam, tocam, trabalham, acariciam, questionam…

Giselle Alessandra Marchi

Em nossa existência, entramos no mundo, encontramos uma territorialidade,

uma história e começamos a fazer parte dela. Participando dessa territorialidade e

13 Aión designa, já em seus usos mais antigos, a intensidade do tempo da vida humana, um destino,

uma duração, uma temporalidade não numerável nem sucessiva, intensiva (Liddell; Scott, 1966, p. 45)

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dessa história nos relacionamos com os seres vivos, não somente humanos,

também convivemos em vários ambientes. Para Rolnik (1993) nesses ambientes

não há apenas o plano visível, o mais óbvio, mas também o invisível, igualmente

real, embora menos óbvio. A autora explica:

Pois bem, no visível há uma relação entre um eu e um ou vários outros (como disse, não só humanos), unidades separáveis e independentes; mas no invisível, o que há é uma textura (ontológica) que vai se fazendo dos fluxos que constituem nossa composição atual, conectando-se com outros fluxos, somando-se e esboçando outras composições. Tais composições, a partir de um certo limiar, geram em nós estados inéditos, inteiramente estranhos em relação àquilo de que é feita a consistência subjetiva de nossa atual figura. Rompe-se assim o equilíbrio desta nossa atual figura, tremem seus contornos. Podemos dizer que a cada vez que isto acontece, é uma violência vivida por nosso corpo em sua forma atual, pois nos desestabiliza e nos coloca a exigência de criarmos um novo corpo - em nossa existência, em nosso modo de sentir, de pensar, de agir etc. - que venha encarnar este estado inédito que se fez em nós. E a cada vez que respondemos à exigência imposta por um destes estados, nos tornamos outros. (ROLNIK, 1993 p.1)

As experiências pelas quais passamos, digo passamos, pois também sou

profissional da educação na SME, como pessoas em contato com outras pessoas e

com os ambientes, criam em nós marcas.

É importante saber quais os fatos que afetaram, subjetivaram professoras e

professores em sua vida, sua formação inicial e continuada, quando mergulham na

memória e encontram suas marcas. Pensar sobre a memória nos remete a

emoções:

Toda memória é adquirida num certo estado emocional: os animais inclusive o homem encontra-se sempre num determinado estado emocional ou estado de ânimo, geralmente difícil de avaliar. Se eu ouvir alguém gritar o número 33 enquanto estou caindo num precipício, é bem provável que, caso eu sobreviva lembre por muito tempo esse número. Se ouvir a mesma coisa numa conversa à qual não estou prestando muita atenção a lembrança desse número na boca de outros desaparecerá com rapidez. (IZQUIERDO, 2004, p. 36)

Se um fato ou um acontecimento nos toca, lembramo-nos dele com mais

intensidade. Se ele só acontece, mas não nos acontece ou não nos toca

esquecemos mais rapidamente. Para Larrosa (2015) isso torna a experiência cada

vez mais rara, pois acontecem e passam muitas coisas, mas quase nada nos passa,

nos acontece. A experiência não é o que acontece ou o que se passa, mas o que

nos acontece, o que nos passa e o que nos toca.

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33 A experiência é cada vez mais rara, por falta de tempo. Tudo o que se passa, passa demasiadamente depressa, cada vez mais depressa. E com isso se reduz o estímulo fugaz e instantâneo, imediatamente substituído por outro estímulo ou por outra excitação igualmente fugaz e efêmera. O acontecimento nos é dado na forma de choque, do estímulo, da sensação pura, forma da vivência instantânea, pontual e fragmentada. A velocidade com que são dados os acontecimentos e a obsessão pela novidade, pelo novo, que caracteriza o mundo moderno, impedem a conexão significativa entre os acontecimentos. Impedem também a memória, já que cada acontecimento é imediatamente substituído por outro que igualmente nos excita por um momento, mas sem deixar nenhum vestígio. (LARROSA, 2015, p.22)

A experiência é individual, cada um é tocado de uma forma pelo mesmo

acontecimento ou fato. Muitos fatos foram vividos por várias(os) professoras e

professores, mas como foram vivenciados foi diferente, com maior ou menor

intensidade. A marca também é assim, está no corpo de cada um(a), e cada corpo

reagiu de uma forma a essa marca ou ainda reagirá, pois a marca é um devir que

podemos reatualizar, ou algo que nos acontece pode reatualizá-la. Então ela é

também fruto do encontro com o outro. Para Rolnik a marca é um devir14:

[...] enquanto estamos vivos, continuam se fazendo marcas em nosso corpo. Mas também por uma razão menos óbvia: é que uma vez posta em circuito, uma marca continua viva, quer dizer, ela continua a existir como exigência de criação que pode eventualmente ser reativada a qualquer momento. Como é isso? Cada marca tem a potencialidade de voltar a reverberar quando atrai e é atraída por ambientes onde encontra ressonância (aliás muitas de nossas escolhas são determinadas por esta atração). Quando isto acontece a marca se reatualiza no contexto de uma nova conexão, produzindo-se então uma nova diferença. E mais uma vez somos tomados por uma espécie de "desassossego", como diz muito apropriadamente Fernando Pessoa em seu livro que traz esse nome no título, ao referir-se à sensação que este estado nos produz. E mais uma vez nos vemos convocados a criar um corpo para a existencialização desta diferença. Ou seja, a marca conserva vivo seu potencial de proliferação, como uma espécie de ovo que pode sempre engendrar outros devires: um ovo de linhas de tempo. (ROLNIK, 1993, p.2-3)

Neste trecho a autora nos instiga a ressignificar nossas marcas

potencializando nossa existência como pessoas que convivem com outras pessoas

e outros seres vivos num constante devir. Por isso precisamos pensar sobre o que

14 E assim vamos nos criando, engendrados por pontos de vista que não são nossos enquanto

sujeitos, mas das marcas, daquilo em nós que se produz nas incessantes conexões que vamos fazendo. Em outras palavras, o sujeito engendra-se no devir: não é ele quem conduz, mas sim as marcas. O que o sujeito pode, é deixar-se estranhar pelas marcas que se fazem em seu corpo, é tentar criar sentido que permita sua existencialização - e quanto mais consegue fazê-lo, provavelmente maior é o grau de potência com que a vida se afirma em sua existência. (ROLNIK,1993, p.3)

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nos acontece, escolher, mas pensar, questionar, mudar, revisitar as memórias,

conhecer quem escreveu ou contou a história, inverter a ordem das coisas, controlar

as máquinas e não ser controlado por elas.

1.2.1 Memórias e história

Atualmente não temos muitas preocupações em relação às memórias, por

vezes, até as atrofiamos por falta de evocá-las. A tecnologia e as máquinas são

encarregadas de guardá-las, nós apenas solicitamos que as resgatem quando

necessário. Mas será que não nos esqueceremos de colocá-las dentro das

máquinas? Ou pior: será que estamos deixando que outros coloquem memórias nas

máquinas do jeito que querem que cheguem a nós? Segundo Izquierdo:

Temos no cérebro humano muitos bilhões de neurônios. Destes, os do córtex cerebral recebem entre 1.000 e 10.000 conexões (sinapses) procedentes de outras células nervosas, e emitem prolongamentos que fazem conexão com outros dez a 1.000 neurônios. Como se vê, as possibilidades de intercomunicação entre as células do cérebro são imensas, e de cada uma dessas conexões ou sinapses podem surgir memórias, sem contar o fato de que cada conexão pode participar de muitas memórias diferentes. Acredita-se que as memórias dependem de alterações na conformação das sinapses. É portanto, altamente provável que a capacidade de armazenamento seja gigantesca. (IZQUIERDO, 2004, p. 21)

Com todo esse potencial de memória, poderíamos explorá-las mais

revitalizando-as ou reatualizando-as.

Há na contemporaneidade uma preocupação excessiva de aproveitar tudo, no

aqui e agora, receber muitas informações, esquecê-las ou não saber o que fazer

com elas. Há um exagero de planos e projetos para o futuro que, muitas vezes,

impede experienciar o imprevisto, a própria experiência e o devir. Isso tudo não

permite lembrarmo-nos do passado com as próprias memórias, prejudicando assim

a maneira como é construída a história. A história é diferente da memória, mas

depende dela e não o contrário.

Memória, história longe de serem sinônimos, tomamos consciência que tudo opõe uma à outra. A memória é a vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela está em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipulações, susceptível de

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35 longas latências e de repentinas revitalizações. A história é a reconstrução sempre problemática e incompleta do que não existe mais. A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente; a história uma representação do passado. Porque é afetiva e mágica, a memória não se acomoda a detalhes que a conformam, ela se alimenta de lembranças vagas, telescópicas, globais ou flutuantes, particulares ou simbólicas sensível à todas as transferências, cenas, censuras ou projeções. A história, porque operação intelectual e laicizante, demanda análise e discurso crítico. A memória instala a lembrança no sagrado, a história a liberta e a torna sempre prosaica. A memória emerge de um grupo que ela une, o que quer dizer, como Halbwachs o fez, que há tantas memórias quantos grupos existem; que ela é, por natureza, múltipla e desacelerada, coletiva, plural e individualizada. A história, ao contrário, pertence a todos e a ninguém, o que lhe dá uma vocação para o universal. A memória se enraíza no concreto, no espaço, no gesto, na imagem, no objeto. A história só se liga às continuidades temporais, às evoluções e às relações das coisas. A memória é um absoluto e a história só conhece o relativo. (NORA, 1993, p.9)

É importante dar atenção à memória, pois ela guarda a história vivida ou

conhecida. A história é importante e importante também é conhecê-la, entretanto, é

interessante que se conheça a história por vários vieses, por inúmeras memórias. A

história contada só pelo lado de quem tem o poder é distorcida, pois despreza

grupos, pessoas e diferenças.

Esquecemo-nos de muitas coisas, pois temos um mecanismo fisiológico,

chamado memória de trabalho15, sem o qual não conseguiríamos pensar, ficaríamos

loucos. O problema é o que nos esquecemos de lembrar através do processo de

subjetivação, por meio da história imposta por grupos e pessoas que detêm o poder.

O passado não é algo fixo, seus movimentos influenciam na maneira com que

encaramos as experiências no presente. Kim (2003) afirma que:

Nós nunca deixamos de interpretar e reinterpretar nossa vida. […] isso significa que o bom–senso erra redondamente ao considerar que o passado seja algo fixo, imutável, invariável, oposto ao fluxo contínuo do presente. Pelo contrário, o passado é maleável e flexível, modificando-se constantemente à medida que nossa memória reinterpreta e re-explica o que aconteceu (KIM, 2003, p. 230).

15 Há vários tipos de memórias. Em primeiro lugar existe a memória de trabalho, que usamos para

entender a realidade que nos rodeia e poder efetivamente formar ou evocar outras formas de memória. [...] A memória de trabalho não forma arquivos duradouros, desaparecem segundos ou, no máximo, minutos.(IZQUIERDO, 2004, p. 23-24)

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É muito arriscado não mexer com as memórias, não reinventá-las e

reatualizá-las. Assim corremos o risco de não sermos criativos, não transformarmos,

não questionarmos a história.

1.3. AS IDENTIDADES NA CONTEMPORANEIDADE

As culturas vêm sofrendo influências da globalização16 e o conceito de

identidade sofre influência das culturas. O uso da palavra ‘culturas’, no plural, apoia-

se no texto de Veiga (2003) e nos traz que, durante muito tempo, a referência

cultural foi monoculturalista, pensada como única e universal, em muitos lugares

ainda é, porém há um movimento em reconhecer que temos culturas e não Cultura.

Ao assumir, em geral implicitamente, a possibilidade de uma linguagem auto-suficiente e ideal, a epistemologia monoculturalista assume, inescapavelmente, uma postura intelectual arrogante porque única e, no limite, de conteúdo determinável e, por isso, de cunho determinista. Nesse caso, cabe à educação apenas dizer, àqueles que estão entrando no mundo, o que é mesmo este mundo e como ele funciona. É evidente o tom totalitário de qualquer pedagogia monocultural [...]. Ao contrário, qualquer multiculturalismo já é, pelo menos epistemologicamente, humilde, na medida em que assume que, por mais que se fale, nunca se saberá o que é mesmo este mundo nem como ele funciona. E lembro que essa incompletude do dito não decorre de alguma suposta incompletude do entendimento humano ou do próprio dizer, mas sim da linguagem em que se aloja o dito. (VEIGA 2003, p 13)

No século passado começam a surgir as rachaduras no conceito moderno de

cultura monoculturalista. Os primeiros ataques vieram da antropologia, da linguística

e da filosofia. Depois a sociologia também começou a questionar a epistemologia

monocultural. Apesar do multiculturalismo vir ao encontro das discussões sobre

identidades, que trataremos neste capítulo, precisamos ir além de e falar não só da

diversidade, mas principalmente das diferenças superando o conceito de simples

tolerância à elas.

16 A globalização é, segundo Milton Santos, o apogeu do mundo capitalista de um processo que

conhecemos como internacionalização do mundo globalizado os fatores que levaram a este processo são: a unicidade da técnica, a convergência dos momentos, o conhecimento do planeta e a mais valia globalizada. As técnicas são oferecidas como um sistema, graças ao avanço da ciência fora produzido um sistema de técnicas da informação, que assim possibilitou um novo sistema de presença em todo o planeta. Globalização é o resultado deste sistema que resulta de ações que asseguram a emergência de um mercado global. (SANTOS, 2000).

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Há um conceito de identidade vinda das ideias iluministas de que ela seria

imutável e inata. Há também o conceito da sociologia que considera a identidade

inata, porém considera que sofre influências do meio social. (HALL, 2000)

O conceito de identidade que abordaremos neste trabalho é o da pós-

modernidade ou modernidade tardia que está ligado às condições das sociedades

em que vivemos, condições que criam, a todo momento, novas formas de

representação, novos grupos identitários. Não há espaço nessa contemporaneidade

para um único valor identitário, uma identidade fixada, soberana e verdadeira. Há

identidades contraditórias e transitórias. (SILVA, 2000)

O sujeito é perpassado de várias identidades e essas estão em constantes

mudanças e sofrem influências das culturas em que estamos inseridos. Aparecem

múltiplos grupos com valores que são disputados pelo poder. Toda forma de fixar

uma identidade está ligada à linguagem, a um discurso de normatização de um

modo de ser em detrimento de um outro, o diferente, que é excluído.

Em uma primeira aproximação, parece ser fácil definir "identidade". A identidade é simplesmente aquilo que se é: "sou brasileiro", "sou negro", "sou heterossexual", "sou jovem", "sou homem". A identidade assim concebida parece ser uma positividade ("aquilo que sou"), uma característica independente, um "fato" autônomo. Nessa perspectiva, a identidade só tem como referência a si própria: ela é autocontida e autossuficiente. Na mesma linha de raciocínio, também a diferença é concebida como uma entidade independente. Apenas, neste caso, em oposição à identidade, a diferença é aquilo que o outro é: "ela é italiana", "ela é branca", "ela é homossexual", "ela é velha", "ela é mulher". Da mesma forma que a identidade, a diferença é, nesta perspectiva, concebida como autorreferenciada, como algo que remete a si própria. A diferença, tal como a identidade, simplesmente existe. É fácil compreender, entretanto, que identidade e diferença estão em uma relação de estreita dependência. A forma afirmativa como expressamos a identidade tende a esconder essa relação. Quando digo "sou brasileiro" parece que estou fazendo referência a uma identidade que se esgota em si mesma. "Sou brasileiro" - ponto. Entretanto, eu só preciso fazer essa afirmação porque existem outros seres humanos que não são brasileiros. Em um mundo imaginário totalmente homogêneo, no qual todas as pessoas partilhassem a mesma identidade, as afirmações de identidade não fariam sentido. De certa forma, é exatamente isto que ocorre com nossa identidade de "humanos". É apenas em circunstâncias muito raras e especiais que precisamos afirmar que "somos humanos".(SILVA, 2000, p.74-75)

De acordo com Tomaz Tadeu da Silva (2000), por trás da afirmação do que

somos, há várias afirmações do que não somos. Se precisamos afirmar o que

somos, é porque temos outras referências de ser que negamos que são as

diferenças.

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Além de serem interdependentes, identidade e diferença partilham uma importante característica: elas são o resultado de atos de criação lingüística. Dizer que são o resultado de atos de criação significa dizer que não são "elementos" da natureza, que não são essências, que não são coisas que estejam simplesmente aí, à espera de serem reveladas ou descobertas, respeitadas ou toleradas. A identidade e a diferença têm que ser ativamente produzidas. Elas não são criaturas do mundo natural ou de um mundo transcendental, mas do mundo cultural e social. Somos nós que as fabricamos, no contexto de relações culturais e sociais. A identidade e a diferença são criações sociais e culturais. (SILVA, 2000, p.76)

A identidade e a diferença estão subjetivadas a certas formas de poder quase

sempre dominante. Elas precisam ser marcadas e geralmente quem faz essa

marcação é quem tem o poder de classificar. As classificações são baseadas em

oposições binárias que valorizam um em detrimento do outro. Nega-se o outro, a

diferença, porque a identidade dele é diferente da minha.

A afirmação da identidade e a marcação da diferença implicam, sempre, as operações de incluir e de excluir. Como vimos, dizer "o que somos" significa também dizer "o que não somos". A identidade e a diferença se traduzem, assim, em declarações sobre quem pertence e sobre quem não pertence, sobre quem está incluído e quem está excluído. Afirmar a identidade significa demarcar fronteiras, significa fazer distinções entre o que fica dentro e o que fica fora. A identidade está sempre ligada a uma forte separação entre "nós" e "eles". Essa demarcação de fronteiras, essa separação e distinção, supõem e, ao mesmo tempo, afirmam e reafirmam relações de poder. "Nós" e "eles" não são, neste caso, simples distinções gramaticais. Os pronomes "nós" e "eles" não são, aqui, simples categorias gramaticais, mas evidentes indicadores de posições-de-sujeito fortemente marcadas por relações de poder: Dividir o mundo social entre "nós" e "eles" significa classificar. O processo de classificação é central na vida social. Ele pode ser entendido como um ato de significação pelo qual dividimos e ordenamos o mundo social em grupos, em classes. A identidade e a diferença estão estreitamente relacionadas às formas pelas quais a sociedade produz e utiliza classificações. As classificações são sempre feitas a partir do ponto de vista da identidade. Isto é, as classes nas quais o mundo social é dividido não são simples agrupamentos simétricos. Dividir e classificar significa, neste caso, também hierarquizar. Deter o privilégio de classificar significa também deter o privilégio de atribuir diferentes valores aos grupos assim classificados.(SILVA, 2000,p.82)

A identidade é discursiva, contraditória, produzida e associada às diferenças,

não nos permitindo dizer que o sujeito é isso ou aquilo. As diferenças, pelas suas

características que não se encaixam nas identidades fixadas, tencionam mudanças

na organização da sociedade para inclusão.

O processo de produção da identidade oscila entre dois movimentos: de um lado, estão aqueles processos que tendem a fixar e a estabilizar a identidade; de outro, os processos que tendem a subvertê-Ia e a

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39 desestabilizá-Ia. É um processo semelhante ao que ocorre com os mecanismos discursivos e lingüísticos nos quais se sustenta a produção da identidade. Tal como a linguagem, a tendência da identidade é para a fixação. Entretanto, tal como ocorre com a linguagem, a identidade está sempre escapando. A fixação é uma tendência e, ao mesmo tempo, uma impossibilidade. (SILVA, 2000, p.84)

A identidade e a diferença são interdependentes e não são naturais, pois são

resultados de criações linguísticas e são ativamente produzidas. Não estão prontas

para serem descobertas, reveladas ou toleradas. A identidade e a diferença não são

simplesmente definidas; elas são impostas. Elas não convivem harmoniosamente,

lado a lado, em um campo sem hierarquias; elas são disputadas. São criações

sociais e culturais tal como a linguagem entendida como sistema de significação. De

acordo com Saussure, os elementos - os signos - que constituem uma língua não

têm qualquer valor absoluto, não fazem sentido se considerados isoladamente.

(SILVA, 2000, p.77)

Assim as linguagens vacilam, portanto as identidades também. Segundo Silva

(2000), teóricos pós-estruturalistas17 como Jacques Derrida vêm tentando dizer nos

últimos anos. Ou, nas palavras do linguista Edward Sapir (1921), "todas as

gramáticas vazam". Se a identidade e a diferença são produtos da linguagem,

vacilam e vazam também. Neste caso, há possibilidade de questionamento dessas

identidades fixadas, fazendo isso problematizamos os binarismos que se organizam

em torno da identidade e da diferença através do poder. Os movimentos sociais,

como o feminismo, as leis afirmativas como a inclusão dos deficientes, o movimento

negro e a reivindicação do ensino das africanidades, o estatuto do idoso, o

hibridismo, o sincretismo e o travestismo, movimentos migratórios são exemplos de

questionadores e perturbadores das identidades fixadas, pois introduzem a

diferença.

Outra característica da identidade e a diferença é que elas precisam ser

representadas, pois estão intimamente ligadas a um sistema de significação. O

conceito de representação tem uma multiplicidade de significado, sendo o mais

tradicional ligado à ideia de aprender o real por meio de sistemas de significação de

17 Teóricos pós-estruturalistas não rejeitam o estruturalismo, mas o desconstroem na sua

centralidade. Para os autores considerados pós estruturalistas não há centralidades e sim descentralidades. Não há um único valor para os signos, mas seu valor dependerá dos processos de subjetivação e de sua territorialidade. Não concordam com binarismos, ou isto ou aquilo, mas com multíplos isto e aquilo e aquele e e e...

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maneiras externa (através de signos) e interna (através da representação do real na

consciência). Os pós-estruturalistas rejeitam esse conceito de representação, porém

Stuart Hall recupera o conceito de representação conectado com a identidade e

diferença como um sistema de significação sem pressupostos instintivos do real.

Uma concepção pós-estruturalista de representação rejeita conotações mentais e

interioridade psicológica e é concebida unicamente em sua dimensão de significante

sendo sempre uma marca ou traço exterior. A representação é uma atribuição de

sentido como qualquer outro sistema de significação com suas contradições e

ligações estreitas com o poder. Segundo Silva (2000):

É aqui que a representação se liga à identidade e à diferença. A identidade e a diferença são estreitamente dependentes da representação. É por meio da representação, assim compreendida, que a identidade e a diferença adquirem sentido. É por meio da representação que, por assim dizer a identidade e a diferença passam a existir. Representar significa, neste caso, dizer: "essa é a identidade", "a identidade é isso". É também por meio da representação que a identidade e a diferença se ligam a sistemas de poder. Quem tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade. É por isso que a representação ocupa um lugar tão central na teorização contemporânea sobre identidade e nos movimentos sociais ligados à identidade. Questionar a identidade e a diferença significa, nesse contexto, questionar os sistemas de representação que lhe dão suporte e sustentação. No centro da crítica da identidade e da diferença está uma crítica das suas formas de representação. (SILVA, 2000, p. 91)

Diante do exposto percebemos que a pedagogia e o currículo têm estreita

relação com a forma que concebe essa representação da identidade e da diferença

e na maneira como esses temas serão discutidos na escola, já que há possibilidades

de questionamentos.

Outro destaque importante a fazer é que a representação não será entendida

por Silva (2000) somente como algo descritivo, o que levaria à fixação da identidade

e da diferença, mas valendo-se do conceito de performatividade18, desenvolvido

pela autora Judith Butler (1999) citada por Silva(2000), o autor contorna o problema.

As proposições não servem apenas para descrever coisas, algumas delas tornam-se

performativas, pois, de tanto serem repetidas, acabam produzindo um fato do mundo

social e não apenas o descrevem. Um exemplo é dizer frases como “o aluno ou a

18 O conceito de performatividade desloca a ênfase na identidade como descrição, como aquilo que

é - uma ênfase que é, de certa forma, mantida pelo conceito de representação – para ideia de “tornar-se", para uma concepção da identidade como movimento e transformação.

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aluna não aprende” ou “a professora ou o professor da EI não ensina só brinca”,

contribuindo para definir ou reforçar a identidade que, supostamente, apenas

estamos descrevendo e reforçando a negatividade atribuída, muitas vezes, a aluna

ou ao aluno ou a professora ou ao professor, pois aquilo que dizemos faz parte de

uma rede mais ampla de atos linguísticos. Segundo Judith Butler (apud Silva, 2000):

A mesma repetibilidade que garante a eficácia dos atos performativos que reforçam as identidades existentes pode significar também a possibilidade da interrupção das identidades hegemônicas. A repetição pode ser interrompida. A repetição pode ser questionada e contestada. É nessa interrupção que residem as possibilidades de instauração de identidades que não representem simplesmente a reprodução das relações de poder existentes. É essa possibilidade de interromper o processo de "recorte e colagem", de efetuar uma parada no processo de "citacionalidade" que caracteriza os atos performativos que reforçam as diferenças instauradas, que torna possível pensar na produção de novas e renovadas identidades. (SILVA, 2000, p.95)

À escola cabe interromper essas repetições que reforçam, dentre outros

elementos, o racismo, o preconceito e a discriminação.

A questão da identidade, da diferença e do outro é um problema social ao mesmo tempo que é um problema pedagógico e curricular. É um problema social porque, em um mundo heterogêneo, o encontro com o outro, com o estranho, com o diferente, é inevitável. É um problema pedagógico e curricular não apenas porque as crianças e os jovens, em uma sociedade atravessada pela diferença, forçosamente interagem com o outro no próprio espaço da escola, mas também porque a questão do outro e da diferença não pode deixar de ser matéria de preocupação pedagógica e curricular. Mesmo quando explicitamente ignorado e reprimido, a volta do outro, do diferente, é inevitável, explodindo em conflitos, confrontos, hostilidades e até mesmo violência. O reprimido tende a voltar - reforçado e multiplicado. E o problema é que esse "outro", numa sociedade em que a identidade torna-se, cada vez mais, difusa e descentrada, expressa-se por meio de muitas dimensões. O outro é o outro gênero, o outro é a cor diferente, o outro é a outra sexualidade, o outro é a outra raça, o outro é a outra nacionalidade, o outro é o corpo diferente. (SILVA, 2000, p.97)

A escola, a professora, o professor e as crianças, todos são afetados pelas

identidades e pelas diferenças. A escola não é, nunca foi, nem nunca será um

campo neutro, mas sim um campo de disputas pelo poder, pelo domínio, pela

subjetivação dos desejos das crianças e adultos. Apenas tolerar e respeitar a

diversidade não questiona as relações de poder e o processo de diferenciação, ou

seja, a cultura que considero inferior a minha é tolerada, entretanto a cultura superior

continua sendo a hegemônica.

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Em uma pedagogia da diferença as professoras e os professores precisam

reconhecer que as diferenças são produzidas, questionar como são produzidas e

quais são os mecanismos e instituições que estão por trás dessa produção e da

tentativa de fixação da identidade. As práticas pedagógicas nesta pedagogia

precisam aproximar-se da diferença:

Aproximar - aprendendo, aqui, uma lição da chamada "filosofia da diferença" - a diferença do múltiplo e não do diverso. Tal como ocorre na aritmética, o múltiplo é sempre um processo, uma operação, uma ação. A diversidade é estática, é um estado, é estéril. A multiplicidade é ativa, é um fluxo, é produtiva. A multiplicidade é uma máquina de produzir diferenças - diferenças que são irredutíveis à identidade. A diversidade limita-se ao existente. A multiplicidade estende e multiplica, prolifera, dissemina. A diversidade é um dado - da natureza ou da cultura. A multiplicidade é um movimento. A diversidade reafirma o idêntico. A multiplicidade estimula a diferença que se recusa a se fundir com o idêntico. (SILVA, 2000, p. 100)

Precisamos oportunizar às crianças e a nós professoras e professores

experimentações que nos impeçam de voltar ao eu e ao nós idênticos, único e

hegemônico. Experimentar a diferença do múltiplo e não do diverso. Se mudarmos o

que pensamos sobre o conceito tradicional de identidade, entraremos na diferença

que sempre esteve ali. Para Silva(2000) o outro cultural é sempre um problema, pois

coloca permanentemente em xeque nossa própria identidade e isso é saudável.

A pedagogia da diferença precisa superar as estratégias que somente toleram

as diferenças. Para Silva (2000), há três estratégias usadas, uma que estimula o

cultivo de bons sentimentos e boa vontade em relação à diferença, deixando de

questionar as relações de poder e os processos de diferenciação que, antes de tudo,

produzem a identidade e diferença, atitude que resulta em novas dicotomias como

dominante/tolerante e dominado/tolerado. A segunda estratégia seria a terapêutica

que trata a diversidade como algo natural e boa e considera a rejeição das

diferenças como distúrbio psicológico que precisa ser tratado. A terceira estratégia

fica entre as duas primeiras, além de não considerar as relações de poder, ainda

apresentam as diferenças como algo exótico, curioso e distante evitando confrontos.

O que seria então uma estratégia pedagógica e curricular na pedagogia da

diferença?

Para Silva (2000, p.99-100) a estratégia pedagógica e curricular de uma

abordagem da identidade e diferença levaria em conta:

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- as contribuições da teoria cultural recente, sobretudo aquela de inspiração pós-

estruturalista.

- tratar a identidade e a diferença como questões de política.

- discussão da identidade e da diferença como produção.

- como a identidade e a diferença são produzidas.

- quais são os mecanismos e as instituições que estão ativamente envolvidos na

criação da identidade e de sua fixação.

- a adoção de uma teoria que descreva e explique o processo de produção da

identidade e da diferença.

- ir além das benevolentes declarações de boa vontade para com a diferença.

- uma teoria que permita não simplesmente reconhecer e celebrar a diferença e a

identidade, mas questioná-las.

- que os estudantes e as estudantes deveriam ser estimulados, nessa perspectiva, a

explorar as possibilidades de perturbação, transgressão e subversão das

identidades existentes.

- de que modo se pode desestabilizá-Ias, denunciando seu caráter construído e sua

artificialidade.

- a capacidade de abrir o campo da identidade para as estratégias que tendem a

colocar seu congelamento e sua estabilidade em xeque: hibridismo, nomadismo,

travestismo, cruzamento de fronteiras. Estimular, em matéria de identidade, o

impensado e o arriscado, o inexplorado e o ambíguo, em vez do consensual e do

assegurado, do conhecido e do assentado. Favorecer, enfim, toda experimentação

que torne difícil o retorno do eu e do nós ao idêntico.

- a diferença do múltiplo e não do diverso.

Penso que não é fácil, pois isso mexe com crianças e adultos, mas

principalmente com adultos que têm mais marcado em seu corpo outras formas de

vivenciar a diferença, mas não é impossível, pois as marcas podem ser

reatualizadas, ressignificadas e reconstruídas.

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2. CRIANÇA, INFÂNCIA E EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA HISTÓRIA RECENTE

A história das coisas nunca está isolada. Todos os fatos se relacionam,

mesmo que imperceptivelmente, nos aspectos cultural, social, econômico e político.

A criança, a infância e a Educação Infantil (EI) têm suas histórias marcadas por

esses aspectos de maneiras intensas durante o seu percurso.

Na contemporaneidade, temos um olhar sobre a criança, infância e Educação

Infantil bem diferente de outras épocas e é, portanto, esse um dos principais motivos

para escrever uma parte do trabalho com o resumo dessa trajetória.

Primeiramente é preciso lembrar que a história sobre a criança, a infância e a

Educação Infantil é muito recente e destacar que as histórias são geralmente

contadas por adultos. Kuhlmann Junior destaca:

Se a história da criança não é passível de ser narrada na primeira pessoa, se a criança não é nunca biógrafa de si própria, na medida em que não toma posse da sua história e não aparece como sujeito dela, sendo o adulto quem organiza e dimensiona a narrativa, talvez a forma mais direta de percepcionar a criança, individualmente ou em grupo, seja precisamente tentar captá-la com base nas significações atribuídas aos discursos que tentam definir historicamente o que é ser criança. (KUHLMANN JR. e FERNANDES, 2004, p.16)

Também há de se ressaltar, que os escritores que iniciaram a escrita das

histórias das crianças não foram pessoas das classes economicamente

desfavorecidas. Apesar disso, essas histórias nos dão pistas sobre os valores

culturais das sociedades que ajudaram na construção da nossa história na

contemporaneidade. A obra de Ariès (1981) é um exemplo muito evidente disto,

porém é impossível negar sua contribuição para visibilidade da história da infância e

da criança e sua influência nas obras sobre o tema não pode ser ignorada.

As críticas em relação a Ariès (1973) se relacionam à forma como o autor retrata a infância a partir de representação construída pela modernidade, consequentemente, através da perspectiva da aristocracia burguesa. Na história da infância e da família, descrita em sua obra, evidencia-se a negligência com a história das crianças e de suas infâncias em outras esferas sociais e econômicas, como também de outras localidades e culturas. (SEREDIUK, 2015, p.29)

Escrever sobre algo que acontece pressupõe interesse pelo tema e isso faz

vir à tona questões sobre ele. Ariès (1981, p.4) afirmou que, até o século XVII, a

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criança não era vista ou quase não vista, e menos ainda o “jovem”, e que “a duração

da infância era reduzida a seu período mais frágil, enquanto o filhote do homem

ainda não conseguia bastar-se e que a criança, mal adquiria algum desembaraço

físico, era logo misturada aos adultos e partilhava de seus trabalhos e jogos”.

Quando afirma isso, ele nos mostra um tipo de olhar sobre a criança que na época

era utilizado pelas famílias mais abastadas e nos mostra também a invisibilidade em

relação às crianças das camadas menos favorecidas economicamente da

sociedade.

Ainda segundo Ariès (1981) no século XVIII era proporcionado à criança um

período de “paparicação” reservado apenas a crianças bem pequeninas quando

ainda eram consideradas engraçadinhas servindo de diversão aos adultos.

É preciso destacar que os pensamentos e atitudes das crianças em relação a

sua infância são totalmente desprezados e considerados como desinteressantes. As

crianças sempre tiveram potencial de vivências da infância, entretanto sem interação

com adultos e, muitas vezes, destituída do direito a essa vivência deixavam o

período da infância para entrar no mundo adulto.

Enfim a pesquisa de Ariès é relevante, pois aponta para um sentimento em

relação à infância, por meio da arte, que veio surgindo do século XII ao XVIII. Na

arte medieval até o século XII não se detecta nenhuma expressão infantil.

Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la; é difícil acreditar que essa ausência se devesse à falta de habilidade ou de competência. Parece mais provável que a infância não tivesse lugar naquele mundo (ARIÈS, 1981, p. 50).

No final do século XVII, com as ideias iluministas, um novo hábito aparece

trazendo um novo olhar para a infância e a criança. Em nome da proteção e da

formação do homem de bem, as crianças foram para o “enclausuramento”, onde se

iniciaram os castigos e a inocência preservada. Há a preocupação da família em

escolarizar as crianças, o que traz investimentos específicos para a infância, tendo a

educação jesuítica como reveladora de uma forma de conceber criança e infância.

Os estudos de Ariès possibilitaram que outros autores se contrapusessem e

buscassem argumentos e novas pesquisas, o que para a história é muito saudável.

Neste sentido o autor Moisés Kuhlmann JR. (2015) se contrapõe às pesquisas de

Ariès e, com isso, o autor vai além, mostrando um novo olhar e outras possibilidades

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na construção dos conceitos de infância e criança. Ele traz a existência de uma

infância pobre por conta de tratados, documentos oficiais que evidenciam

atendimento às classes operárias ou camponesas.

A obra de Moisés Kuhlmann JR. (2015) nos instiga a pensar na reconstrução

do conceito de infância e mostra que historiadores como Pierre Riché e Daniele

Alexandre-Bidon “arrolaram os mais variados testemunhos da existência de um

sentimento da especificidade da infância da época”, portanto o sentimento de

infância não seria inexistente em tempos antigos ou na Idade Média (KUHLMANN

JR, 2015, p. 22).

Segundo Kuhlmann JR. (2015) a história da assistência ao lado da história da

família e da educação constituem as principais vertentes que têm contribuído com

inúmeros estudos para história da infância, a partir de várias abordagens, enfoques

e métodos.

Conhecer a história das coisas é muito importante para entender os

acontecimentos na contemporaneidade. Principalmente na educação é de extrema

importância conhecer, além da história da família e da assistência, os discursos

pedagógicos de autores que pensaram sobre a infância ou ao menos influenciaram

sua história com suas ideias.

No campo da história da educação, além da história das instituições educacionais, a história do discurso pedagógico, a partir do estudo de autores como Comenius, Rousseau, Pestalozzi, Froebel, entre outros traz uma importante contribuição à história da infância. (KUHLMANN JR, 2015, p. 18).

Pensei ser de extrema importância escrever sobre alguns sujeitos que

influenciaram na construção da pedagogia na EI.

No século XVII Comenius acreditava que o colo da mãe e o lar seriam os

locais ideais para o ensino da criança.

No século XVIII, Rousseau afirmou que a criança é um ser pensante, com

ideias próprias e características próprias da infância. Seu pensamento contrapunha-

se ao conceito que envolvia a sociedade da época de que a criança era uma tabula

rasa, um saco vazio para ser enchido com ensinamentos. Rousseau avançou na

concepção sobre a criança, sendo considerado um marco na pedagogia

contemporânea, entretanto, ainda acreditava na infância como um período de

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aprendizagem que serviria somente para ser usado pela criança no futuro, no que

ela ainda seria, um adulto.

As ideias de Rousseau foram bases para as o método de Pestalozzi (século

XVIII) e o Kindergarten (jardim da infância) de Frobel (século XIX).

Vale lembrar que as instituições criadas por Frobel ofereciam educação às

crianças das classes economicamente favorecidas. Segundo Kuhlmann JR (2015, p.

69) esses jardins da infância eram considerados, por muitos, instituições educativas

por excelência, algo positivo, neutro e emancipador, enquanto as creches e as

escolas maternais seriam assistencialistas e não educariam, entretanto, essas

últimas também educavam, não para emancipação, mas para subordinação.

Santos (2009) afirma que:

Uma diferenciação pertinente que vale ser ressaltada se refere aos termos creche e jardim de infância. A creche visava assistir a criança que ficava privada dos cuidados maternos devido ao trabalho da mãe, tendo como principal objetivo evitar o abandono das mesmas por seus responsáveis. O jardim de infância pretendia exercer o papel de moralizador da cultura, transmitindo as crianças os mesmos padrões adotados na França e na Bélgica. (SANTOS, 2009, p. 537)

Somente no final do século XIX o oferecimento da EI foi ampliado, porém

com a grande demanda pelas vagas, as crianças das classes populares continuaram

a serem atendidas pela assistência.

Em toda história da EI observa-se que a assistência era ofertada, mas em

troca, as pessoas economicamente mais favorecidas queriam o domínio e controle

da família ou dos responsáveis pela criança. Dava-se assistência e, em troca, dizia-

se como deveriam viver, caracterizando assim um assistencialismo.

Por conta da influência médico-higienista que previa o assistencialismo, os

médicos se envolveram na história da infância. Na sistematização das atividades e

materiais para o trabalho com as crianças destacaram–se Decroly e Maria

Montessori. (KUHLMANN JR, 2015)

A psicologia também voltou seu interesse com Piaget que focou as fases do

desenvolvimento infantil através do contato com o mundo que o cercava, Vygotsky

que focou a interação com o mundo por meio da mediação de um adulto ou criança

mais velha e Wallon que focou na afetividade indispensável à aprendizagem. Esses

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três autores influenciaram a pedagogia no século XX. Há no documento “Currículo

em construção de Campinas”19 um capítulo específico dedicado às suas ideias.

Se continuarmos a pesquisar encontraremos outros autores que irão escrever

sobre outros movimentos relativos ao aparecimento da infância e da visibilidade da

criança, por exemplo, a autora Cintia Veiga (2004) que escreve sobre os

movimentos, construções e desconstruções que foram flexionados com as crianças

abandonadas, orfanadas, pobres, infratoras ou marginalizadas, que impactaram a

sociedade humana e colaboraram para que as concepções de criança e infância

aparecessem.

2.1. BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL E NA CIDADE DE

CAMPINAS NOS ÚLTIMOS 30 ANOS

A Educação Infantil surge há pouco mais de oitenta anos no Brasil como uma

necessidade dos adultos em “guardar” suas crianças, portanto com caráter de

assistência, em uma época em que os movimentos sociais, principalmente os das

mulheres, começam a demandar mudanças em relação às crianças. Porém, essas

mudanças de olhares para a criança vinham ao encontro exclusivamente das

necessidades dos adultos, mulheres que trabalhavam fora, viúvas e mães solteiras.

Outro fato muito importante de ser lembrado é que no Brasil temos as crianças

negras ligadas a um histórico de escravidão, num país que foi um dos últimos a

abolir a escravatura. Temos também crianças das classes economicamente

desfavorecidas que nunca haviam sido consideradas pela classe economicamente

favorecida e dominante, num país, onde elas só teriam o destino de serem escravas.

Há uma tendência em alguns grupos sociais que se intitulam “civilizados” de

desconsiderar pessoas e culturas oriundas de grupos populares. Dentre as forças

dominantes eles – os ditos civilizados - escolhem seus aliados e inimigos, entretanto

outras forças são desconsideradas, caracterizando assim o que Boaventura de

Sousa Santos denomina como pensamento abissal:

19 Primeiro documento curricular específico para EI da SME em Campinas. Trataremos do

documento mais a frente.

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49 O pensamento moderno ocidental é um pensamento abissal. Consiste num sistema de distinções visíveis e invisíveis, sendo que estas últimas fundamentam as primeiras. As distinções invisíveis são estabelecidas por meio de linhas radicais que dividem a realidade social em dois universos distintos: o “deste lado da linha” e o “do outro lado da linha”. A divisão é tal que “o outro lado da linha” desaparece como realidade, torna-se inexistente e é mesmo produzido como inexistente. Inexistência significa não existir sob qualquer modo de ser relevante ou compreensível. Tudo aquilo que é produzido como inexistente é excluído de forma radical porque permanece exterior ao universo que a própria concepção de inclusão considera como o “outro”. (SANTOS, 2007, p. 71).

Levando o apresentado em consideração optei por traçar um breve histórico

a partir dos marcos legais que mudaram significativamente os rumos da EI e

começaram a incitar um processo de olhar para todas as crianças como sujeitos de

direito, e a oferta e permanência na escola como um direito da criança.

Começo com a Constituição Federal de 1988, pois a primeira Lei de Diretrizes

e Bases (LDB 4024/61) da Educação Nacional20 dedicava apenas dois artigos à pré-

escola, sem citar esse termo, portanto, não resolve o problema das crianças; a

reforma de ensino Lei 5692/7121 retrocede sobre o papel do Estado no atendimento

à criança, na etapa da educação infantil, pois não cita em nenhum momento a

educação infantil, dando brecha a passar o problema para a iniciativa privada,

estimulando a ampliação das escolas particulares no atendimento à criança de zero

a seis anos de idade, e desconsiderando a EI como responsabilidade das políticas

públicas deixando a EI para a assistência e como preparatória para o Ensino

Fundamental.

Interessante destacar os movimentos anteriores à culminância da

Constituição de 1988. Em 1979, foi criado o movimento de luta pela creche

composto de mulheres feministas e não feministas. A reivindicação pela creche foi

realizada de forma intensa e, apesar do movimento se dissipar por divergências

internas, teve impacto na atmosfera política da Constituinte, ampliando a luta pelas

20 LDB 4024/61 TÍTULO II Do Direito à Educação Art. 2º A educação é direito de todos e será dada

no lar e na escola. Parágrafo único. À família cabe escolher o gênero de educação que deve dar a seus filhos. Art. 3º O direito à educação é assegurado: I - pela obrigação do poder público e pela liberdade de iniciativa particular de ministrarem o ensino em todos os graus, na forma de lei em vigor; II - pela obrigação do Estado de fornecer recursos indispensáveis para que a família e, na falta desta, os demais membros da sociedade se desobriguem dos encargos da educação,

quando provada a insuficiência de meios, de modo que sejam asseguradas iguais oportunidades

a todos.

21 Lei 5692/71 Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências.

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creches e iniciando uma discussão sistematizada sobre educação para crianças

pequenas (MORUZZI, 2015).

A Constituição trouxe, além do direito às crianças, dever do Estado e da

família (Art. 205)22, uma nova identidade para a professora e o professor que vem

para EI e para os profissionais que já estavam na EI. Antes da lei, o que se tinha

eram as creches domiciliares que recebiam apoio do Estado que, com isso,

mostrava à opinião pública que estava fazendo sua parte e pensando no melhor

para a criança por estar em ambiente familiar, negando-se a institucionalização das

creches e da educação das crianças pequenas. Segundo MORUZZI (2015):

No entanto o fato das crianças serem atendidas em casas de família não significa que elas encontram ali um ambiente familiar. Além disso, percebe-se que esse argumento acena a intenção da preservação da família pelo Estado e o retrocesso na busca da identidade do profissional, uma vez que este poderia ser qualquer mulher ou mãe de outra criança com uma casa disponível. Sabemos que a identidade profissional da professora de educação infantil esteve e está na direção contrária à continuidade maternal, nem “tia”, nem “avó”, nem “mãe”, essa foi uma das reivindicações dos movimentos pela educação infantil. (MORUZZI, 2015, p.68)

Até hoje ainda temos profissionais da EI que não se incomodam por serem

chamados de “tia” e isso é muito ruim para a produção das identidades profissionais

das professoras e dos professores da EI. Somos professoras e professores, temos

nomes, somos profissionais e não somos “tias ou tios”. Podemos ter várias

identidades, somos mulher, homem, mãe, pai, tia, tio, professora, professor,

entretanto, precisamos saber em qual contexto cultural e histórico de subjetividades

essas identidades são produzidas. Paulo Freire escreveu um livro sobre isso com o

título Professora sim, tia não, cartas para quem ousa ensinar, ele escreve que essa

dualidade entre o cuidar e o educar se reflete no modo como as professoras e os

professores da EI costumam ser denominadas, isto é, como ‘tias ou tios’. A respeito

dessa denominação Paulo Freire escreve:

Recusar a identificação da figura do professor com a da tia não significa, de modo algum, diminuir ou menosprezar a figura da tia, da mesma forma como aceitar a identificação não traduz nenhuma valoração à lei. Significa,

22 Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e

incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

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51 pelo contrário, retirar algo fundamental à professora: sua responsabilidade profissional de que faz parte a exigência política por sua formação permanente. A recusa, a meu ver, se deve sobretudo a duas razões principais. De um lado, evitar uma compreensão distorcida da tarefa profissional da professora, de outro, desocultar a sombra ideológica repousando manhosamente na intimidade da falsa identificação. Identificar professora com tia, o que foi e vem sendo ainda enfatizado, sobretudo na rede privada em todo o país, é quase como proclamar que professoras, como boas tias, não devem brigar, não devem rebelar-se, não devem fazer greve. Quem já viu dez mil “tias” fazendo greve, sacrificando seus sobrinhos, prejudicando-os no seu aprendizado? E essa ideologia que toma o protesto necessário da professora como manifestação de seu desamor aos alunos, de sua irresponsabilidade de tias, se constitui como ponto central em que se apoia grande parte das famílias com filhos em escolas privadas. Mas também ocorre com famílias de crianças de escolas públicas. (FREIRE, 2008, p.11-12)

Essa produção de subjetividade vem sendo construída, desde muito tempo,

com a ideia de assistência e com os resquícios das creches domiciliares que

tentavam substituir a família. A família tem suas especificidades e a escola também.

Além da profissionalização da professora e do professor de EI, a partir da

Constituição de 1988, outros desafios se colocaram tais como a incorporação da

dimensão educativa na EI e a elaboração do projeto pedagógico (PP) para os bebês

e as crianças pequenas, questões que ainda permanecem em pauta na

contemporaneidade. Por outro lado, a afirmação do direito da criança na constituição

de 1988 impulsionou medidas e reformas na década de 1990, como a Lei de

Diretrizes e Bases.

A partir da Constituição de 1988, a Educação Infantil é reconhecida

legalmente como um direito da criança e dever do Estado no Artigo 208, inciso IV:

“[...] O dever do Estado para com a educação será efetivado mediante a garantia de

oferta de creches e pré-escolas às crianças até cinco23 anos de idade” (BRASIL,

1988, 105). Inicia-se um processo de tirar a EI do campo da assistência e passá-la

para o campo da Educação.

Nunca é demais lembrar que o final da ditadura militar foi seguido de um intenso movimento de mobilização social pela elaboração de uma nova Constituição. Desta mobilização participaram, além dos atores sociais tradicionais, os chamados novos movimentos sociais: movimento de mulheres e movimento “criança pró-Constituinte”. Também não é demais lembrar que esses novos movimentos sociais elaboraram uma proposta para a Constituição, a que foi aprovada em 1988, reconhecendo a EI como

23 Inciso com redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009, originalmente era até seis

anos.

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uma extensão do direito universal à educação para as crianças de 0 a 6 anos e um direito de homens e mulheres trabalhadores a terem seus filhos pequenos cuidados e educados em creches e pré-escolas. Portanto, direitos relativos à EI foram inscritos na Constituição de 1988, tanto no capítulo da educação quanto no dos direitos à assistência (Campos, Rosemberg, Ferreira, 1992). A Constituição de 1988 reconheceu, então, a EI como direito da criança e como instrumento para igualdade de oportunidades de gênero, na medida em que apoia o trabalho materno extradoméstico. (ROSEMBERG, 2002, p.40-41)

Além da Constituição Federal de 1988, destaca-se a lei 8.069, de 13 de junho

de 1990 que cria o Estatuto da Criança e do Adolescente que afirma em seus artigos

1º, 2º, 3º e 4º que:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem.24 Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. a criança e o adolescente têm o direito à educação, saúde, moradia, família, entre outros, visando seu pleno desenvolvimento, preparo para a cidadania e qualificação para o trabalho.(ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1990)

Estas afirmações trazem à tona os direitos da criança como pessoa humana e

que devem ser garantidos pelos adultos, pois será dever da família, comunidade,

sociedade em geral e do poder público. Todos são responsáveis pela criança. O Art.

53. afirma que “A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno

24 Lei 8.069, de 13 de junho de 1990 Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá

outras providências - Parágrafo único do Art. 3º - Inclusão da Lei 13.257, de 2016

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desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e

qualificação para o trabalho.” reforçando o direito à EI.

A partir dessas tão inovadoras conquistas para a criança em 1996, temos a

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 199625 que estabelece nos seus

Artigos 2º e 29:

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 29 A educação infantil, primeira etapa da educação básica tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. (BRASIL, 1996, 1-17)

Essas foram duas grandes mudanças da LDB, o dever passa a ser também

da família e a EI passa a compor a EB como sua primeira etapa.

Esses documentos fizeram e estão fazendo ainda toda a diferença nos rumos

da EI no Brasil e na cidade de Campinas. Nesses últimos trinta anos a EI passou por

grande transformação e as professoras e os professores ainda estão buscando

compreender esse processo de mudança de paradigmas para EI. Destacam-se,

ainda, as mudanças culturais, políticas, econômicas e sociais que foram muito

intensas e velozes nos últimos trinta anos. A produção de subjetividades pelo

Sistema Capitalista, nesta época histórica, de intenso processo tecnológico, tais

como mídia, imprensa e internet e o consumo desenfreado com acumulação

excessiva por uma pequena parte da sociedade que detém o poder e o dinheiro

produzido pelo capitalismo, foi igualmente intensa e veloz. As pessoas são

convencidas que têm necessidades de ter para se inserirem num grupo e para

serem felizes.

Essas intensas produções de subjetividades modificaram e continuam

modificando nossos desejos, nossos corpos, nossas necessidades. É uma máquina

de produzir pessoas com identidades fixas. Por outro lado, acontecem intensos

25 A Lei 9.394, de 20/12/96, contemplou alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº

053/2006, a Educação Infantil passou a atender crianças de zero até cinco anos de idade ampliando o Ensino Fundamental para nove anos e pela Lei no 12.796, de 04/04/13, Art. 4o O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade [...].

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movimentos de resistência em relação à homogeneização de coisas e pessoas. A

contemporaneidade está em constantes transformações como todos os períodos

históricos, porém numa velocidade maior por conta das máquinas tecnológicas tais

como computadores, celulares etc.

Em meio a todas essas transformações, a EI torna-se a primeira etapa da

Educação Básica, uma modalidade de ensino com sua história recente em relação à

história da Educação no mundo.

Na cidade de Campinas, a história da Educação Infantil na Secretaria da

Educação remete à reflexão sobre o período de 1988, quando foi promulgada a

Constituição Federal, pois a partir daí a educação assume a EI que estava sob a

responsabilidade da Secretaria de Promoção Social (Assistência). Em Campinas, em

1989, os Centros Infantis, vinculados à Secretaria de Promoção Social são

incorporados ao sistema educacional. Essa passagem não foi linear, mas

impregnada de caráter político, ideológico, filosófico, sociológico, cultural,

econômico, psicológico. Ainda hoje, se discutem muito os binarismos: o cuidar e o

educar, a assistência e a educação.

Quando a creche estava sob a responsabilidade da Promoção Social, os

profissionais que cuidavam das crianças eram somente as monitoras e os Monitores

de Educação Infantil, admitidos no cargo com formação não específica para o

desenvolvimento do trabalho na EI. Até hoje esses profissionais estão nas creches,

porém apesar da creche estar atualmente sob a responsabilidade da Secretaria

Municipal de Educação (SME), esses profissionais não pertencem ao quadro do

magistério e são contratados, por meio de concurso público, com a denominação do

cargo de agentes de educação infantil. (DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO DE

CAMPINAS, 2007)

As professoras e os professores que chegam à Educação Infantil naquele

momento de transição da Promoção Social para a Secretaria de Educação, ainda

sem experiência docente, se depararam com este profissional e com práticas

apenas de cuidado. As professoras e os professores, na década de noventa, têm na

sua formação acadêmica práticas ligadas ao ensino de primeiro grau da época

(atualmente o Ensino Fundamental) e, de início, é isso que se tenta fazer,

desenvolver com as crianças na Educação Infantil as atividades que se faziam nas

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séries iniciais do primeiro grau. As propostas eram baseadas em etapas e elencadas

por adultos que esperavam manifestações nas crianças em determinada idade ou

em determinado tempo. A preocupação era sempre a produção feita com materiais

escolares: lápis, papel etc. As atividades que desenvolviam com bebês e crianças

pequenas tinham como objetivo determinadas prontidões para que elas pudessem ir

para outro nível de ensino, e eram atreladas às datas comemorativas, desprovidas

de sentidos para as crianças.

Assim, Unidades Educacionais (UEs), que funcionavam com caráter

exclusivamente assistencial, passaram a ter uma estrutura mais complexa, pois

preservaram o caráter de assistência à criança e introduziram a educação, surgindo

então, como desafio, a construção conjunta de diretrizes que atendessem a esta

realidade educacional. A passagem das creches para a SME trouxe, para aquelas,

descontinuidades em suas propostas de educação e embates bem fortes entre os

profissionais da Educação e os da Assistência Social.

Nesses quase trinta anos, buscou-se superar a concepção de EI preparatória

para o Ensino Fundamental, posto que a criança frequenta a creche ou pré-escola

porque a vivência, nesta etapa da Educação Básica, é importante em sua vida e não

porque ali estará adiantando “conhecimentos e habilidades” para seu “desempenho”

no Ensino Fundamental (EF) e a assistência, pois o cuidar está intrínseco no fazer

da E I.

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3. PROCESSOS DE CONSTRUÇÃO PERMANENTE DAS DIRETRIZES CURRICULARES PARA EDUCAÇÃO INFANTIL NA CIDADE DE CAMPINAS

Espaços Tempos

Currículos pulsantes Enredos educacionais no cotidiano

Histórias infinitas Um coração criança-pensante

Inquieta a vida! Educadores-autores

Mapeiam novidades... O mundo se contorce

Em arrepios... Educação Infantil:

Composição artística Desafiando

Realidades e Devires... Ligia Prando (CAMPINAS, 2013, p.7)

Diante de todo os acontecimentos no Brasil e na cidade de Campinas em

relação à EI, a professora e o professor buscaram refletir sobre o seu papel neste

contexto tão intenso e junto com os outros profissionais da SME, desse modo,

participaram da construção dos documentos curriculares para EI em Campinas que

demonstram comprometimento e avanços em relação à concepção de criança,

infância, currículo e Educação Infantil na cidade de Campinas. Há nas diretrizes da

SME de Campinas vontade pedagógica de construir uma EI comprometida com as

crianças.

Não tratarei especificamente, e nem profundamente, das concepções acima,

pois interessa, nesta parte do trabalho, a participação das professoras e dos

professores no processo de construção de tais diretrizes.

O primeiro documento curricular específico para EI da SME em Campinas foi

o “Currículo em construção”, resultado de muitas discussões coletivas entre a equipe

pedagógica da EI da SME e as equipes pedagógicas das escolas de EI. Sua escrita

iniciou-se após 1996 com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) sendo lançado em 1998.

Foi um documento feito a muitas mãos para EI e com ela. Foram utilizados inúmeros

tempos pedagógicos e reuniões para discussão do documento. E, apesar de sua

visão epistemológica se diferenciar totalmente da apresentada nos atuais

documentos, até hoje ouvimos falar dele na Rede Municipal de Campinas (RMEC)

por conta de todo o envolvimento dos profissionais.

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O primeiro documento tinha sua base epistemológica na psicologia e por

conta de tudo que estava sendo discutido sobre EI, no mundo e no Brasil, ele trazia

o brincar como um dos pilares da constituição do currículo da EI. Era composto da

apresentação, introdução e cinco capítulos. (Consultar Apêndice II)

Já na apresentação é explicitado que um dos princípios do documento seria a

participação. Segundo o então secretário da educação Alcides Yukimitsu Mamizuka

(CAMPINAS,1999, p.4) “Assim, ocorre a reconstrução curricular da Educação Infantil

na rede municipal de Campinas. Os esforços foram infinitos. Teóricos foram

visitados, e a prática refletida. E antes da retórica, a participação foi o fundamento

deste processo.”

Ainda na apresentação do documento a Coordenadora da Educação Infantil

Regina Otília Pires Barbosa escreve:

O “Currículo em Construção” significa o esforço da Equipe Organizadora e seu relacionamento com os profissionais da Educação, da leitura e crítica indispensáveis de cada Escola, dos aspectos particulares que cada um assumiu com atitude comprometida, deixando a neutralidade. Todo esse esforço resultou numa “parada de reflexão” em cada Unidade e, após um período de tabulação tivemos, num primeiro momento, o conhecimento do resultado da própria Rede. Assim, ao começarmos entrar na compreensão, tínhamos a necessidade de propor formas de ações e de pensamentos. Surgiram, neste momento, os Encontros Setoriais. Quanto mais íamos caminhando integrados, mais assumíamos atitudes de cumplicidade tanto nas definições de conceitos como no conhecimento da Rede Municipal de Educação Infantil de Campinas. Após esse momento a Equipe Organizadora passou a analisar e estudar criticamente os resultados. E assim, surgiram as formas de expressão e apresentação do texto. (CAMPINAS, 1998, p.6)

Apesar de não estar registrado no documento os cargos dos profissionais da

comissão referida, na citação acima, posso escrever, pois eu fazia parte dela e ela

era composta por todos os segmentos profissionais da Educação Infantil do

município de Campinas, à época da escrita do documento: Supervisor Educacional,

Coordenador Pedagógico, Diretor Educacional, Vice-Diretor, Orientador Pedagógico,

Professor, Monitor Infanto Juvenil I, Administrador de Creche.

Esse trabalho de envolver os profissionais da RMEC vem tornando-se uma

prática na construção dos documentos curriculares, em Campinas, pois se

demonstrou ao longo dos anos que um documento que tem aceitação da Rede tem

muitas chances de ser implementado. Encontramos até hoje, após quase vinte anos,

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citações do documento “Currículo em construção” nos Projetos Pedagógicos (PPs)26

das escolas.

A concepção de currículo que permeava o documento tinha como palavras-

chave o respeito à criança, seu conhecimento e o direito à brincadeira, e se

configura como um conjunto de orientações:

Entendemos como Currículo um conjunto de orientações, de posturas educacionais e éticas que contemple valores como o respeito à criança e seu conhecimento, seu direito à brincadeira, sua família e meio sócio-cultural. Concebido como processo, o Currículo é eminentemente interativo, envolvendo criança, educador, família e sociedade. Portanto, construir uma proposta curricular requer uma postura dinâmica, de leitura da realidade, da qual se pode aferir as necessidades e possibilidades em relação as quais é viável que se proponha a organização de novos conhecimentos e vivências. Neste sentido, o papel da Educação Infantil é oferecer instrumentos para que os pequenos possam desenvolver-se e constituir-se enquanto cidadãos autônomos, capazes de responsabilidades e escolhas próprias. É necessário oportunizar espaços de aprendizagem e possibilitar a vivência integral da criança, combinada aos ideais de solidariedade humana. O momento social pelo qual a criança passa hoje define a infância como tempo de direitos: direito à vaga na escola, ao saber elaborado, à saúde, aos cuidados, ao brincar, ao respeito a sua cultura e cidadania. (CAMPINAS, 1998, p.9)

Quando falamos em criança como cidadã, estamos reconhecendo direitos,

porém, também nos remetendo a deveres e escolhas. Infelizmente, nem sempre as

escolhas das crianças são realizadas por elas, mas sim por adultos. Porém, há de

se reconhecer a relevância de trazer ao currículo esses valores em relação às

crianças, reconhecendo a cultura que ela já traz consigo, suas experiências vividas

na família e sociedade.

O documento curricular da cidade de Campinas foi um avanço, por estar

pautado na Constituição de 1988, para a época, anos 90, que iniciou com muitas

ações e propostas27 feitas pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) e a

Coordenação de Educação Infantil- COEDI, órgão criado após a promulgação da

26 Nos dias 12, 13 e 14 de fevereiro de 1990 foi realizado o I Congresso Municipal de Educação,

onde foram aprovadas as Diretrizes do Projeto Pedagógico, o qual posteriormente resultou na Portaria SME nº 1.163/90 que dispõe sobre as Diretrizes do Projeto Pedagógico da Secretaria Municipal de Educação (D.O.M.14/11/90).

27 As diretrizes gerais dessa proposta estão resumidas no documento de Política de Educação Infantil e foram elaboradas com participação de segmentos sociais – universidades, movimentos sociais, partidos políticos, associações profissionais, usuários – que já haviam acumulado um repertório de conhecimentos experiências sobre este setor das políticas sociais e constituído o consenso de expandir a EI com qualidade para todas as crianças cujas famílias por ela optassem.

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Constituição de 1988, mas ainda pairavam sobre a EI muitas políticas de

assistencialismo. As novas propostas, dentre as quais Rosemberg (2002, p. 41)

destaca duas, que mais evidenciam a ruptura com o modelo anterior: equivalência

de creches e pré-escolas, ambas tendo por função de cuidar e educar crianças

pequenas como expressão do direito à educação; formação equivalente para o

profissional de creche e pré-escola em nível secundário e superior”, retrocederam na

metade dos anos 90, após as políticas do governo da época como nos mostra a

autora:

A implantação dessas propostas foi interrompida com a nova administração federal (governo Fernando Henrique Cardoso, 1994), que, como se sabe, incorporou, no plano das políticas econômicas, cânones do FMI e, no plano das políticas educacionais, cânones do BM (De Tommasi, Warde, Andrade, 1996), as influências do BM na EI brasileira a partir da administração FHC se fazem sentir através de dois eixos complementares: o da reforma educacional geral que, entre outras medidas, preconizou, em seu início, a prioridade absoluta de investimentos públicos no ensino fundamental; o da retomada da proposta de programas “não formais”28 a baixo investimento público de EI para crianças pequenas pobres.

28 Sobre o termo "não-formais", sempre escrito entre aspas pela autora, algumas considerações: [...] Neste artigo procurarei desenvolver o argumento de que as políticas de EI contemporâneas nos países subdesenvolvidos têm sido fortemente influenciadas por modelos ditos “não formais” a baixo investimento público, propugnados por organismos multilaterais. No Brasil, essas propostas já foram incorporadas em passado recente e estão ameaçando o presente atual. A partir dos anos de 1970, essa influência proveio, especialmente, da Unesco e do Unicef; a partir dos anos de 1990, a maior influência provém do BM. p.28-29 [...] para reduzir os investimentos públicos, os programas devem se apoiar nos recursos da comunidade, criando programas denominados “não formais”, “alternativos”, “não institucionais”, isto é, espaços, materiais, equipamentos e recursos humanos disponíveis na “comunidade”, mesmo quando não tenham sido concebidos ou preparados para essa faixa etária e para seus objetivos. p.34 [...] Aponto, também, o equívoco quanto ao caráter “não formal” ou não institucionalizado dessas experiências: a formalização e a institucionalização são intensas nos níveis técnico-burocráticos dos que elaboram, financiam, implantam e administram tais projetos; o técnico do BM que trabalha em Washington bem como seu colega brasileiro usam tecnologia dura e cara, são altamente especializados, têm vínculo empregatício, recebem bom salário, usufruirão de benefícios de aposentadoria, viajam em aviões, usam computadores de última geração. Não aceitariam, em seu trabalho, o que propõem para o trabalho da educadora na creche: os restos do consumo, a sucata. p.58 [...]A crítica que interponho aos programas “não-formais” não decorre de sua normalidade”, nem do baixo custo em si, mas do fato de que são programas incompletos, implantados como soluções de emergência, porém extensivas, o que redunda, geralmente, em atendimento de baixa qualidade e de grande instabilidade, sendo destinados, exatamente, a populações pobres que, da ótica de políticas afirmativas, necessitam de e têm direito a programas completos e estáveis como medidas de correção das injustiças que vem sofrendo histórica e sistematicamente. p.57 [...] Atendimento em Unidades de Jornada Integral ou Parcial: essa modalidade era tradicionalmente desenvolvida apenas em creches e pré-escolas. Abre-se a possibilidade de realizar esse atendimento também em outros espaços físicos, utilizando inclusive outras formas de trabalhos com crianças, tais como: brinquedotecas, creches volantes (veículos equipados com jogos, brinquedos, com supervisão de educadoras infantis que se deslocam para diferentes pontos do município com a finalidade de realizar ação socioeducativa para adultos encarregados de trabalhos com as crianças), atendimento domiciliar (crianças atendidas em casas de família com adequada

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A reforma educacional brasileira dos anos 90 apresentou as seguintes características (Haddad, 1998, p. 48-49): • focalização dos gastos sociais no ensino fundamental, em detrimento do ensino médio, da educação de jovens e adultos e da EI; • descentralização, que se traduz em municipalização; • privatização, através da constituição de um mercado de consumo de serviços educacionais; • desregulamentação, no sentido de que o governo federal “abre mão do processo” (financiamento e gestão municipal no caso do ensino fundamental e EI), mas “controla o produto”, por meio dos currículos nacionais e da avaliação de resultados (Haddad, 1998, p. 49).” (ROSEMBERG, 2002, p. 42)

Mesmo neste cenário político de possível retrocesso, Campinas continuou

com vistas aos direitos das crianças com a intenção de oportunizar espaços de

aprendizagem e possibilitar a vivência integral da criança. O primeiro documento

demonstra isto ao longo de seus capítulos.

No primeiro capítulo o documento mostra um breve histórico da educação

considerando a Constituição de 1988, os direitos da criança e a LDB com foco na EI

como primeira etapa da Educação Básica. Aparece já neste documento o conceito

de infâncias, pois não há uma infância única, universal, comum a todas as crianças.

Este conceito foi referendado na tese de doutorado da autora Maria Carmen

Barbosa que afirma que:

Falar de uma infância universal como unidade pode ser um equívoco ou um modo de encobrir uma realidade. Todavia uma certa universalização é necessária para que se possa enfrentar a questão e refletir sobre ela, sendo importante ter sempre presente que a infância não é singular, nem é única.

A infância é plural: infâncias. (BARBOSA, 2000, p. 84)

Concordo com essa ideia de que a infância é plural, principalmente no Brasil

onde temos tantas diferenças culturais, sociais e econômicas.

Também há, neste capítulo, a visão de criança como produtora e consumidora

da cultura, esses termos lembram as ideias capitalistas: produzir e consumir, mas

por outro lado se refere à cultura, algo que não se compra com dinheiro, mas se

apaga com o tempo se não considerada ou se massacrada pelas epistemologias

dominantes. Também se escreve neste capítulo que a relação tempo-espaço do

adulto é diferente da relação tempo-espaço da criança. Parece-me que havia no supervisão técnica) etc. Em todas essas ações devem estar integradas as crianças portadoras de deficiência e as crianças em situação de extremo risco. p.57

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texto uma pergunta a ser estudada e respondida que diz respeito à qual criança

estavam escrevendo e trabalhando. É bom quando surge a dúvida sobre algo que

precisamos fazer, pois instiga a melhorar. Começa a vir à tona a consideração da

criança como alguém que é hoje e não apenas um vir a ser.

O item que trata da educadora e do educador, ao meu ver, é muito superficial,

distante, desconexo e não diz nada sobre o que é ser professora e professor na

RMEC. Há um resgate histórico bem breve e desconexo do quadro atual, da época

em que foi escrito, de profissionais da SME Campinas. Ouso fazer uma crítica

questionando nesse sentido que omitir a nomenclatura da professora e do professor

e da monitora e do monitor de educação infantil teria sido uma saída para diminuir

os confrontos entre cuidar e educar?

Apesar disso, no próximo item podemos observar a grande preocupação da

Rede em promover seminários, estudos, pesquisas, comissões para discussões e

melhoria da qualidade do atendimento e a publicação do Estatuto do magistério.29

Também, nesse item, ficam bem demarcados pontos importantes que foram

consensuados, nessas discussões, para constituir o documento “Currículo em

construção”:

[...] sendo um deles a definição da linha norteadora de atuação pedagógica como a interacionista, que considera a criança construtora de seu conhecimento e o educador mediador de todo processo educacional. Outro ponto relevante foi a definição da Cultura como eixo norteador e desencadeador de todo o trabalho considerando a criança como ser integral, superando a visão de criança dicotomizada em seu desenvolvimento e conhecimento. Destacando o brincar como elemento fundamental para as crianças e os adultos que integram a Educação Infantil na Rede Municipal de Ensino de Campinas. (CAMPINAS,1998, p.24)

O destaque do brincar como elemento fundamental para as crianças e a

consideração da sua cultura foram pontos-chave para mudanças nas práticas, até

então, escolarizantes, que caminhavam no sentido de fazer da EI um “mini

fundamental”.

O capítulo 2 do documento é totalmente dedicado às visões epistemológicas

que foram base teórica para o documento tendo um capítulo específico. A sociologia

aparece, porém de forma bem pontual em alguns trechos do documento. Neste

capítulo são citados rapidamente alguns pontos em itens chamados de

29 Lei nº 6.894 que dispõe sobre o Estatuto do Magistério Público.

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antropológicos e filosóficos que parecem confundir-se com a psicologia que é

exposta bem profundamente no item dedicado aos pontos psicológicos

demonstrando o caminho que o documento seguiria. Parece-me que não há, no

documento, definição clara de teóricos da antropologia e da filosofia, porém estão

bem definidos os autores Piaget, Wallon e Vygotsky para psicologia. Neste item são

descritos os trabalhos dos autores sem a preocupação de que seus trabalhos

possam não ser complementares e, muitas vezes, até divergentes. O fato dos três

autores escreverem sobre estágios, níveis e zona de desenvolvimento não significa

que compartilham das mesmas ideias conforme indica o documento:

Dessa rápida leitura sobre as teorias de Piaget, Vygotsky e Wallon, pode-se ressaltar a importância da criança como construtora de seu conhecimento, de sua interação com o meio e com o outro através dos aspectos cognitivo, afetivo, social e motor. Estas ideias trazem mudanças no cotidiano escolar, levando o educador a repensar sua prática pedagógica, por meio de situações de aprendizagem que atenda às reais necessidades da criança e favoreça o seu desenvolvimento em todos os níveis. (CAMPINAS, 1998, p.35)

Isso pode ter sido um grande equívoco epistemológico do documento. Pode

ser que essa base teórica não tenha conversado com algumas ideias apresentadas

nos outros capítulos subsequentes. Suponho talvez que tenha se pensado na

pluralidade de ideias indicada pela LDB, entretanto o documento deveria organizar

tais ideias.

O capítulo 3 do documento trata da organização do PP pela escola através do

trabalho coletivo.

A base para a discussão e a formulação da proposta educativa de uma instituição de Educação Infantil deve ser a experiência acumulada por seus educadores; a teoria que fundamenta essa prática; a concepção de ser humano, sociedade, infância e mundo que a comunidade escolar possua; os valores individuais e coletivos existentes; o contexto sócio-cultural onde a comunidade se insere; a visão de proposta curricular de que se necessita e que se deseja. Essa elaboração pressupõe o estabelecimento de prioridades, definição de metas e objetivos claros do que se pretende atingir, práticas que evidenciem os atos de cuidar e educar, definição dos recursos didáticos, financeiros e humanos imprescindíveis à realização de suas propostas, definição dos princípios norteadores referentes à estrutura curricular que se deseja implantar, avaliação da proposta e um posicionamento político-pedagógico frente às decisões tomadas no espaço coletivo. (CAMPINAS,1998, p.37)

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Esse trabalho aproximou os profissionais nas discussões para construção do

PP. Havia reuniões periódicas para planejamento e avaliação. Neste capítulo

aparece uma frase sobre a formação continuada do(a) profissional da SME que

denomina essa formação com o termo ‘reciclagem’. Envolve-se nesse processo

também a comunidade escolar, ressaltando a função dos Conselhos de Escola e da

gestão participativa, também indicada na LDB. Ainda neste capítulo, é tratada a

questão do cuidar e educar na perspectiva de que são indissociáveis. Começa a se

falar muito timidamente da inclusão de crianças com deficiência:

É baseado nesses princípios que se quer o trabalho da Rede de Educação Infantil do Município de Campinas, a qual é composta por Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI), Centro Municipal de Educação Infantil (CEMEI), e Centro Integrado de Educação Infantil (CIMEI), formado por um agrupamento de EMEIs e/ou por um CEMEI e uma EMEI que possuem caráter tanto de cuidar como de educar porque atendem às necessidades básicas de formação e desenvolvimento global das crianças, atendendo também crianças portadoras de necessidades especiais com a proposta de incluí-las num ensino normal e regular.”(CAMPINAS, 1998, p.39)

O item 3.3 é dedicado às culturas infantis e tem como base teórica a autora

Ana Lúcia de Goulart Faria, pesquisadora da área da infância que tem se ocupado

em defender uma educação de qualidade para as crianças, reforçando sempre o

direito à infância, às vivências diversas das crianças como o brincar e o respeito à

produção e manifestação cultural infantil.

No capítulo 4 do documento são tratadas as questões relacionadas aos

profissionais da educação, chamados de educadores. Há uma preocupação em unir

o pessoal e o profissional na tentativa de mostrar que os profissionais são inteiros e

que juntos formam um coletivo forte.

Segundo o documento, a formação da professora e do professor inicial não é

suficiente para a qualificação de suas práticas pedagógicas e que, por isso, ela deve

ser permanente.

Assim, segundo o professor Pedro Demo, faz parte do perfil do educador:

" - aprender a pesquisar, porque é a pesquisa que mais lhe define o exercício profissional, esse processo deve revelar o compromisso com o questionamento reconstrutivo". Isto é, deve aprender a pesquisar, estar sempre renovando os conhecimentos culturais e científicos, mantendo-os atualizados, dentro de uma visão crítica, ética, moral, e dessa forma construindo seu próprio caminho de aprendizagem;

" - saber elaborar com mão própria é um dos componentes mais substanciais da aprendizagem", o que significa que cabe ao educador atuar, praticar, construir seu próprio conhecimento, e não reproduzir, ser co-autor

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do projeto coletivo, pois "na verdade só se muda, o que se elabora. Ou só se aprende o que se elabora";

" - saber teorizar sua prática, combinar criativamente teoria e prática, admitindo ambas como razão da pesquisa ou do questionamento reconstrutivo. A reconstrução do conhecimento se inicia pelo questionamento da prática. Ou seja, a prática é conduzida de volta a teoria, com o objetivo de recuperar a necessidade de renovação";

" - atualização permanente, um desafio que é visto como educação permanente (pois) nenhuma profissão envelhece mais rapidamente do que a de professor, precisamente porque lida mais de perto com a lógica do conhecimento”. Sendo assim, é preciso manter-se atualizado, é preciso estudar buscando inovar-se;

" - produzir e usar instrumentação eletrônica, uma questão que passará a ser alvo de interesse cada vez mais intenso, inclusive por razões de motivação das novas gerações”. O professor tem como desafio “usar dos meios disponíveis, para fins de socialização mais acessíveis de conhecimento e informação e produzir materiais didáticos através de meios eletrônicos, passando de mero receptor, para autor de propostas criativas”;

“ - avançar na direção da interdisciplinaridade do conhecimento" como forma de tornar o educador mais polivalente e assim contribuir para uma formação mais abrangente da criança;

" - rever sua teoria e prática da avaliação com objetivo de aprimorar o processo de aprendizagem."” (CAMPINAS, 1998, p.57)

Diante desse perfil de educador(a) espera-se que seja somente ele(a) o(a)

responsável pela sua formação continuada. Não vemos no documento a

responsabilidade do poder público30 com a formação da professora e do professor

pelo menos, não está explícita no documento. Isso é preocupante, pois o problema é

sempre só do(a) profissional. Ainda neste capítulo, é cobrado da educadora e do

educador o planejamento, o registro e avaliação. Claro que isso deve acontecer,

porém não há pistas do que será realizado com a educadora e o educador para

avançar nesses itens. É somente faça, faça e faça...

O documento exige que a educadora e o educador traga para o trabalho com

as crianças as capacidades ou competências de acordo com os Referenciais

Curriculares Nacional de Educação Infantil (1999):

30 Entendido aqui como a Secretaria Municipal de educação da prefeitura de Campinas e os

profissionais, técnicos da SME, que articulam as políticas públicas.

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65 Segundo o Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil, as capacidades são de ordem física, afetiva, cognitiva, ética, estética, de relação interpessoal e inserção social. - capacidades de ordem física: remetem à possibilidade de apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, ao autoconhecimento, ao uso do corpo na expressão das emoções, ao deslocamento com segurança; - capacidades de ordem cognitiva: consistem no uso e apropriação de formas de representação e comunicação e na resolução de problemas; - capacidades de ordem afetiva: se reportam às motivações, à auto-estima, às atitudes no convívio social, à compreensão de si mesmo e dos outros; - capacidades de ordem estética: remetem à possibilidade de produção artística e apreciação da produção artística de diferentes culturas e de diferentes tempos históricos;

- capacidades de ordem ética: referem-se à possibilidade de construção de valores que norteiam ações das crianças;

- capacidades de relação interpessoal: dizem respeito à possibilidade de estabelecer um convívio social que envolva produzir, dividir e aprender a conviver com as diferenças culturais, de temperamentos, de intenções, de hábitos e costumes, dentre outras;

- capacidades de inserção social: referem-se à possibilidade de cada criança perceber-se como membro de um grupo, de uma comunidade, de uma sociedade, com possibilidade de participação e responsabilidade para com a vida coletiva.

Para desenvolver essas capacidades se faz necessário estabelecer vivências que sejam explicitadas no planejamento do educador. (CAMPINAS, 1998, p.60)

Os RCNEI são objeto de estudos e críticas do livro Infâncias e maquinarias de

Bujes (2002). Tomando como seu foco principal o Referencial Curricular Nacional

para a Educação Infantil (RCNEI), a autora aponta para as formas como operam os

dispositivos de governamento da infância, a partir da racionalidade governamental

moderna. A investigação, de inspiração foucaultiana, destaca também como os

aparatos de verdade sobre a infância, com seus sistemas de enunciados

verdadeiros, são produzidos no interior das relações pedagógicas. Para Bujes (2002)

o RCNEI propõe um indivíduo infantil, em que pese esta sua “consciência” dos

vínculos que o ligam ao grupo, que se subjetive para ser o titular da sua própria

história, ocupante de um espaço que não é apenas seu, singularizado pelas suas

marcas particulares, seus signos de identidade. O RCNEI, segundo a referida

autora, atua como um dispositivo de produção da verdade, cuja finalidade é a

organização, a disseminação e o controle do saber que circula nas instituições de

Educação Infantil.

As autoras Palhares; Martinez destacam que o RCNEI foi um desvio de rota

pois:

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O caminho apontado pela equipe técnica responsável pela educação infantil no MEC, em 1994, era o de buscar a superação da dicotomia da educação e assistência incentivando estratégias de articulação de diversos setores e ou instituições comprometidas com a educação infantil. Dando andamento a essas proposições, o MEC promoveu debates, incentivou assessorias e realizou diferentes publicações, cabendo destacar aquele conhecido “Caderno azul” - Critérios para o atendimento em creches e pré-escolas que respeitem os direitos fundamentais da criança (BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, Campos & Rosemberg, 1995) e outros nas cores amarela, vermelha e laranja... que abordavam a política para educação infantil, a bibliografia anotada etc.[...] […] Agora o MEC lança o Referencial curricular Nacional de Educação Infantil- RCNEI (PALHARES; MARTINEZ, 2003, p.6-7)

Parece que houve uma decepção em relação à atitude do MEC, pois ocorreu

descontinuidade num trabalho, o que não agradou. Penso que o que aconteceu foi

um documento vindo do poder público sem participação, o que assusta e, muitas

vezes, não vem ao encontro das discussões.

Entretanto o documento “Currículo em construção”(1999) seguiu o RCNEI e

podemos observar isso em várias partes do documento, principalmente na sua

escolha epistemológica apresentada no capítulo 2. E, segundo Kulmann JR (2003),

o texto do documento RCNEI destaca as influências do mercado educacional no uso

indiscriminado de teorias e métodos, assim como a confusão de perspectivas

evidenciada na justaposição dos enfoques teóricos de Piaget, Wallon e Vygostky,

exatamente como o documento de Campinas destaca no 2º capítulo.

O capítulo 5 do documento “Currículo em construção”, e último, é dedicado

inteiramente ao brincar destacando o jogo, o brinquedo e a brincadeira. Este capítulo

é o que mais demonstra o referencial teórico da psicologia no qual o documento se

apoia. É um capítulo interessante, pois desperta nos profissionais o lúdico na EI e

muitas boas práticas lúdicas passam a integrar a EI.

O principal objetivo do documento “Currículo em construção” era que ele

estivesse sempre em construção e, com base nisso e na velocidade das mudanças

que vinham acontecendo na EI, passados oito anos do documento, a equipe de

coordenadoras pedagógicas (CPs) começa a pensar, em 2007, a partir de um

seminário de educação infantil31, na continuidade da construção de uma Proposta

Curricular da Educação Básica para EI.

31 A Secretaria Municipal de Educação, por iniciativa dos NAEDs, realizou o Seminário de Educação

Infantil/ 2007, que envolveu todos os profissionais da RMEC, os quais realizaram comunicações

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Neste documento intitulado “Proposta Curricular da Educação Básica – Educação Infantil” faz-se constar um acervo de considerações que vimos elaborando na última década a respeito da Educação Infantil, com ênfase em avançar o movimento do “Currículo em Construção” - 1998, as “Diretrizes Curriculares para o trabalho pedagógico com leitura e escrita na Educação Infantil” - 2008, bem como atender às exigências do tempo presente, das determinações legais pós Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN 9394/96, e ainda, explicitar e enfatizar a política educacional da Secretaria Municipal de Educação de Campinas - SME, na confluência do trabalho pedagógico hoje desenvolvido nas Unidades Educacionais de Educação Infantil do Município de Campinas. Assim esta proposta curricular traz em seu bojo um repertório teórico-prático anunciado, estudado, refletido e vivido por muitos educadores da Rede Municipal de Ensino de Campinas - RMEC, que desenvolvem o cotidiano do trabalho. (CAMPINAS, 2009, p.5)

Isso aconteceu por conta das novas práticas dos profissionais da educação

nas escolas, que não mais estavam de acordo com o primeiro documento “Currículo

em construção”.

Entre o documento “Currículo em Construção” e o segundo documento

“Proposta Curricular da Educação Básica – EI”, foi construído, por técnicos da SME,

o documento “Diretrizes Curriculares para o trabalho pedagógico com leitura e

escrita na Educação Infantil” que não foi enviado para Rede para consulta e

conhecimento, mas chegando pronto e, por isso, foi totalmente rejeitado pelos

profissionais. Não se ouve falar desse documento pelos profissionais da educação e

quase não há registro dele nos projetos pedagógicos das escolas. Temos, na rede

municipal de Campinas, profissionais bem críticos e capazes de identificar

documentos que se apresentam de forma autoritária.

O segundo documento “Proposta Curricular da Educação Básica – EI” trouxe

como base da sua construção as práticas da Rede através da visão das CPs que

estavam nos Núcleos de Ação Educativa Descentralizados (NAEDs) e em relação

direta com os PPs e as escolas (Consultar Apêndice III). Porém, esse documento

também não foi para rede para discussão, tampouco saiu do Departamento

Pedagógico (DEPE), órgão para qual o documento foi entregue pelas CPs.

orais sobre a suas práticas pedagógicas. O relato dessas experiências foram sistematizados pelas Equipes dos NAEDs, em 2009, com a intenção em constituir-se em uma proposta pedagógica, com as experiências vividas no cotidiano com bebês e crianças pequenas da Rede Municipal de Ensino de Campinas – RMEC. Disponível em papel pela SME.

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Esse documento que ficou engavetado também deixou aberta a possibilidade

de continuar construindo novos cadernos que complementassem as ideias do

documento e trouxe, além do brincar, as múltiplas linguagens das crianças e já

iniciava uma rejeição a escolha epistemológica da psicologia trazendo a sociologia

das infâncias:

Com essa abordagem pretende-se referendar uma concepção de educação infantil que não seja focada em “brincar por brincar” e nem tampouco em uma “escolarização precoce”. Assim, elabora-se uma proposta educacional para a Educação Infantil que aponta a todos os educadores a oportunidade de se compreenderem em seu desenvolvimento profissional, de atuarem com intencionalidade numa prática pedagógica que favorece e compreende o brincar, da mesma forma que compreende e favorece práticas educativas organizadas com crianças que se constituem nas múltiplas linguagens, no mundo letrado, na cultura humana. (CAMPINAS, 2009, p.6)

Foi bem enfatizado também, em todo o documento, que a EI não tinha espaço

para escolarização precoce, tampouco seria preparatória para o EF.

Em oposição aos Documentos anteriores, o novo documento reconhece que

a EI apoiou-se em referências teóricas diversas, com maior ou menor intensidade,

de acordo com o contexto histórico e com a evolução do pensamento pedagógico,

como já ocorreu com a forte influência da psicologia base do documento “Currículo

em construção” e da psicolinguística base do documento “Diretrizes Curriculares

para o trabalho pedagógico com leitura e escrita na Educação Infantil”, entretanto

atualmente está mais claro que as contribuições teóricas das diversas áreas do

conhecimento são possibilidades de compreender e delinear a Pedagogia da

Infância32 que se organiza sistematicamente ao longo de sua história recente.

Ainda aparece neste documento um movimento enfático de se compreender

coletivamente a relação dialética entre o cuidar e o educar que constituem um único

fazer na Educação Infantil. Traz a relação com a comunidade, o registro, o

planejamento, a avaliação, o brincar com intencionalidade, a importância do PP,

32 Pedagogia das Infâncias refere-se à estudos das práticas educativas voltada para a infâncias, as

quais se constituem em diferentes tempos, lugares diversos, que se configuram e reconfiguram nas múltiplas relações cotidianas. Para compreender essa pluralidade de infâncias e as relações que se estabelecem, faz-se fundamental o apoio da sociologia da infância, que estuda as relações sociais das culturas de pares, das crianças entre elas e delas no mundo, compondo amizades, conflitos, curiosidades, gostos, sentidos, prazeres, brincadeiras, imaginação.(CAMPINAS, 2013, p.16)

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entretanto neste documento não se diz nada sobre a formação continuada do

profissional da EI.

Enfim chegamos ao documento que está em vigor atualmente chamado

“Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil: um processo

contínuo de reflexão e ação”. O documento é composto por:

Prefácio, Apresentação, Introdução, Tópico 1: Das Histórias da Educação Infantil em Campinas, Tópico 2: Criança, Currículo, Infância: Práxis Educacionais Inventivas, sub tópico 1: Manifestações expressivas dos bebês e crianças pequenas, sub tópico 2: Tecer fios... Projetar caminhos..., sub tópico 3: Educação Básica: um movimento contínuo, Tópico 3 (Trans)formação Continuada: reflexão e criação do fazer pedagógico, Considerações e Referências bibliográficas. (CAMPINAS, 2013, sumário)

Logo no prefácio, o documento é apresentado como caderno inicial das

diretrizes do município, dando abertura a novos cadernos que virão. O caderno foi

sistematizado pela Assessoria de Currículo33 do DEPE, CPs e uma Equipe ampliada

formada por CPs, Orientadoras Pedagógicas (OPs), professoras e professores dos

agrupamentos 1, 2 e 3, professoras da educação especial e representante do

Programa Memória e Identidade Promoção da Igualdade na Diversidade (MIPID)34.

Com diferentes níveis de participação, com maior e menor intensidade que ajudaram

a construir o documento.

33 A assessoria foi extinta em abril de 2015. 34 O Programa Memória e Identidade: Promoção da Igualdade na Diversidade na Rede Municipal de Campinas foi revitalização por meio da resolução SME/FUMEC nº 10/2015 em conformidade com as Leis 10.639/03 e 11.645/08, que alteram o art. 26 da Lei 9394/96. Seus objetivos são: “I – planejar e coordenar ações que possibilitem aos profissionais da educação a compreensão das relações étnico-raciais numa perspectiva social, multicultural e pluriétnica; II – incentivar o desenvolvimento, bem como a divulgação, de estratégias pedagógicas que estimulem a formação de atitudes, posturas e valores que contribuam para uma vida em sociedade na qual todos possam se reconhecer na cultura nacional; III – promover e divulgar a produção de conhecimento sobre a educação das relações étnico-raciais; IV – revitalizar o acervo dos registros de memória, relatos de experiência, pesquisa e produção de conhecimento, realizados nos diversos espaços formativos, dentro da temática da educação das relações étnico-raciais; V – revitalizar o acervo de obras literárias que subsidiam a educação das relações étnico-raciais; VI – promover intercâmbios, seminários, encontros, publicações ou outros eventos, que possam oferecer subsídios aos Projetos Pedagógicos das Unidades Educacionais, às propostas e ações dos Núcleos de Ações Educativas Descentralizadas, das Coordenadorias/ Departamento Pedagógico e outras instâncias da SME e da EJA Anos Iniciais/FUMEC, e VII – participar de ações intersetoriais que contribuam para a consolidação de uma cultura identitária miscigenada. Disponível em http://educacaoconectada.campinas.sp.gov.br/objetivo-do-programa-mipid/ acesso em 27/01/2017

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O documento enfatiza o direito à infância, assegurando a brincadeira e

ludicidade, ressalta, não somente, as crianças como produtoras de cultura e

compreendidas como sujeitos históricos atuantes no seu tempo presente, mas

também sua família e a equipe pedagógica. Também se compromete com uma

Pedagogia da infância que tem práticas de letramento e de acesso aos

conhecimentos acumulados pela humanidade.

Traz um planejamento de tempos e espaços de cuidado e educação como

práticas constitutivas do trabalho desenvolvido com as crianças na EI. O tema dos

tempos e espaços será discutido no próximo caderno temático. Apesar de na

introdução já terem sido encaminhadas outras propostas temáticas como metas para

as próximas escritas sendo elas: Documentação e Registro; Arte e ciência;

Letramento; Relações Étnico-Raciais; Educação Especial; Gênero e Sexualidade;

Projetos; Corpo e Movimento. Na apresentação também se destaca a continuidade

do documento:

Não se trata de concluir estas Diretrizes, mas sinalizar o que está por vir: o chão da escola, a voz dos profissionais, os questionamentos das crianças, a busca da qualidade social da educação e a relação com o conhecimento. A elaboração e sistematização das Diretrizes Curriculares é o primeiro passo, o começo de uma nova etapa que traz a sua implementação, num processo contínuo de reflexão e ação que contribua para uma educação de qualidade. Compreendemos que um currículo será efetivamente assumido por toda a rede quando todos e cada um puderem nele reconhecer a sua identidade. Isso só é possível no diálogo em que cada um possa falar e ouvir o outro. (CAMPINAS, 2013, p.3)

Interessante essa abertura a novos documentos que aparece em todos os

documentos curriculares da Rede e que abre espaço para novas formas de

construção e reconstrução do documento.

O processo da escrita teve um texto preliminar que foi enviado a Rede

Municipal de Ensino de Campinas (RMEC) para que, após conhecimento e análise,

os profissionais da educação pudessem dar contribuições coletivas ou individuais.

As contribuições foram de supressão, substituição, acréscimo e reavaliação no final

da escrita do documento.

A versão preliminar do documento acrescido das contribuições foi lida no II

Seminário Curricular- Educação Infantil, em 2012, nesta ocasião os profissionais e

equipes das escolas puderam esclarecer, se assim achassem necessário, suas

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contribuições. As escolas enviaram representantes para falar sobre as contribuições

dadas.

Na introdução, explicita-se que o documento está dividido em tópicos. Por

isso trataremos como tópicos as divisões do documento. O documento traz no

primeiro tópico a história do movimento curricular na RMEC. O texto começa com a

poesia da CP Lígia Prando sobre EI35 dando um toque especial logo de início.

Recuperar a história nos dá elementos para criar uma nova proposta, uma proposta

atual sobre EI.

Novas histórias, novos tempos, outras gerações de profissionais da educação, bebês e crianças pequenas irão viver e contar as histórias possíveis, feitas em momentos de transformações, de coesão de princípios e ideais e nas brechas do possível, no contexto das diversidades a vislumbrar políticas públicas, que possibilitem uma Educação Infantil numa perspectiva de multiplicidade cultural. (PRADO in CAMPINAS, 2013, p.8)

Observamos uma nova concepção de cultura, a multiplicidade cultural. Há

neste tópico também acontecimentos importantes na história da educação que

provocam mudanças. Um acontecimento diz respeito ao financiamento da educação

com a substituição do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF)36 pelo Fundo de

Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização do Magistério

(FUNDEB)37, que incluiu a creche, a pré-escola e as instituições conveniadas no

direito ao financiamento previsto em lei, advindo do governo federal. Outro

acontecimento no município foi a implementação dos Agrupamentos Multietários que

foi formalizada através da resolução da SME nº. 23/2002, publicada em Diário Oficial

do dia 13/11/2002, pela qual as crianças deveriam ser matriculadas e divididas em

turmas por idade aproximada. Como profissionais da educação, recebemos,

percebemos e analisamos essa ação como uma política para aumentar o número de

vagas na EI, entretanto, foi uma medida pedagógica que fez todos os profissionais

da EI repensarem seus fazeres. Repensar os ideais de turmas homogêneas

divididas em faixa etária que dava a sensação de todas as crianças serem iguais.

35 Epígrafe da terceira parte do trabalho. 36 Foi criado pela Emenda Constitucional nº 14/1996 e regulamentado pela Lei nº 9.424/1996 e pelo

Decreto nº 2.264/1997. O FUNDEF foi implantado, nacionalmente, em 1º de janeiro de 1998. 37 Foi criado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494/2007 e

pelo Decreto nº 6.253/2007 em substituição ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de valorização do magistério – FUNDEF que vigorou de 1998 a 2006.

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O segundo tópico Criança, Currículo, Infância: Práxis Educacionais Inventivas

prescreve alguns caminhos para os fazeres cotidianos, mas mesmo assim indica a

liberdade de criar, transgredir e inovar dos profissionais para fazer para e com as

crianças.

Logo de início, já se percebe que as faixas etárias, tão destacadas no

documento do “Currículo em Construção”, são abandonadas deixando emergir o

conceito de bebês e crianças pequenas:

Trata-se neste documento da elaboração das Diretrizes Curriculares para o trabalho com crianças de 0 (zero) a 5 (cinco) anos e 11 (onze) meses, conforme estabelece o Regimento Escolar Comum das Unidades Educacionais da Rede Municipal de Ensino de Campinas, Portaria SME nº 114/2010, com ênfase necessária à educação dos bebês, muitas vezes subsumida dos estudos teóricos e práticas cotidianas. Assim, neste documento, optou-se por referir-se a “bebês e crianças pequenas”, sem mencionar a todo o momento as faixas etárias. (CAMPINAS, 2013, p. 13)

Esta opção já vem carregada de intenção, a meu ver, boa intenção de colocar

as crianças e bebês como sujeito que fazem muitas coisas não por causa de ter

essa ou aquela idade cronológica. Todos são produtores de cultura, os bebês, as

crianças, as famílias e as equipes pedagógicas, sujeitos socioculturais e históricos.

Neste documento a concepção de currículo é “tudo que se dá, se estabelece,

se planeja, se discute, se projeta, se vive, se experiência, constituindo história de

vida. O currículo é vivo, é libertador, é comprometido, é inovador, é transgressor [...]”

(CAMPINAS, 2013, p.13). O currículo é construção e se dá nas relações, nas ações

que se estabelecem no cotidiano das escolas entre seus profissionais, crianças e

famílias. Trata-se de uma concepção de currículo voltada ainda para as relações de

poder porque falta potência, mas avança tendo em vista a ressignificação da cultura

adulta pelas culturas infantis.

Neste documento se diz o que é o currículo na EI e o que não é:

Ressalta-se que Currículo aqui não é tratado como rol de conteúdos a serem trabalhados por todos os profissionais de Educação Infantil e aprendidos por todos os bebês e as crianças pequenas. Claro também fica que não se trata de um conjunto de orientações e propostas etapistas, elencadas por adultos que esperam determinadas manifestações nos bebês e nas crianças pequenas, em uma idade específica ou em tempo definido. Também não se trata de atividades que se pretende desenvolver, tendo em vista determinadas prontidões que esperam que eles possam ter em outro nível de ensino; bem como não se trata também de pautar o trabalho na

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73 sequência de datas comemorativas, sempre desprovidas de sentidos para as crianças. (CAMPINAS, 2013, p. 14)

É muito importante deixar bem marcado o que não se espera de um currículo

na EI, pois a EI é um campo de disputas ideológicas. A diretriz é o movimento

coletivo que sintetiza princípios, concepções de criança, infâncias, EI, profissional da

EI, metodologias e espaço físico que são validados nos PPs das unidades.

Há neste tópico do documento, a afirmação que a construção das diretrizes

está em consonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil

(DCNEIs) aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), em 2009, e com

a resolução CNE/Câmara de Educação Básica (CEB) nº 05/2009 que tem caráter

mandatório.

Em relação ao profissional da EI o documento afirma que há o que fazer:

O fazer mencionado refere-se a contar muitas histórias, oportunizar muitas formas de expressão artística e sensorial, o cuidar, o alimentar, proporcionar jogos dramáticos, danças, músicas, organizar ambientes desafiadores, disponibilizar variados materiais, brinquedos, objetos, livros, construir projetos coletivamente. Enfim, assumir o papel de pesquisador, mediador, estudioso que escuta atentamente e considera as crianças nas suas múltiplas manifestações, que busca a ampliação do repertório cultural e que oferece às crianças possibilidades de sair do comum e entrar no surpreendente, no maravilhamento das diversas formas de expressão e sentimento. (CAMPINAS, 2013, p. 15)

As(os) profissionais da educação, ainda chamados de educadoras e

educadores, não são vistos como meros executores(as), mas convidados a criar

formas e jeitos de respeitar as infâncias e os direitos das crianças. Cada experiência

cotidiana faz parte do currículo. O único método de trabalho proposto pelas diretrizes

são os projetos:

O trabalho com projetos é uma das possibilidades da efetivação destas Diretrizes Curriculares nas Unidades Educacionais municipais de Educação Infantil. Entende-se como projeto aquele trabalho em que a escolha do objeto de estudo irá partir da realidade em que o grupo de bebês e crianças pequenas está inserido, aquilo que irá despertar a curiosidade, a vontade de investigar, de conhecer mais profundamente, de olhar, de sentir, de experimentar o entorno. Implica também, na flexibilidade dos profissionais que estão à frente de cada turma, pois não será possível mais pautar-se nos modelos de planejamentos prescritivos, mas sim, em adotar práticas narrativas de situações coletivas do cotidiano nas quais sente-se, pressente-se, lê-se, intuí-se, constata-se que há um interesse cognoscente, fios e pistas são levantados como horizontes de possibilidades das tessituras do cotidiano. (CAMPINAS,2013, p.19)

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Entretanto numa diretriz que logo no início já indica que não se considera

prescritiva, parece meio contraditório indicar um método, seja ele qual for, nesse

caso, são com os projetos. Porém essa prática com projetos acontece muito e

aparece em quase todos os PPs das escolas, portanto, merece destaque nas

diretrizes.

Aparece neste documento, e não nos outros, o conceito de qualidade

negociada. Penso que uma ação que influenciou muito a aparição deste conceito, no

documento, foi a implementação da Avaliação Institucional Participativa (AIP) na EI

que teve início de formas pontuais em alguns NAEDs, em 2009, e de forma geral em

2010. O conceito de qualidade negociada segundo Bondioli (2004) pode ser assim

apresentado:

[..] qualidade não é um valor absoluto, não é adequação a um padrão ou a normas estabelecidas a priori e do alto. Qualidade é transação, isto é, debate entre indivíduos e grupos que têm um interesse em relação à rede educativa, que têm responsabilidade para com ela, com a qual estão envolvidos de algum modo e que trabalham para explicitar e definir, de modo consensual, valores, objetivos, prioridades, e ideias sobre como é a rede para a infância e sobre como deveria ou poderia ser. (BONDIOLI, 2004, p. 14)

O documento considera a avaliação intrínseca ao processo educativo

destacando-se os seguintes pontos: protagonismo dos bebês e crianças,

documentação pedagógica38 e ações compartilhadas com as famílias. Destaco, aqui,

o aparecimento do protagonismo da criança e do bebê, pois o bebê, muitas vezes,

não é considerado como protagonista por se expressar de formas diferentes das

costumeiras nas práticas escolares. A participação da família, ao meu ver, e pelas

experiências que vejo no cotidiano das escolas, ainda precisa avançar para além de

reuniões esporádicas para um café na escola. É necessário envolver as famílias nas

práticas cotidianas da escola fazendo aflorar o sentimento de pertencimento e

participação nas decisões e discussões. Sobre a documentação pedagógica,

saliento que essa prática é pautada e está forte nas discussões da Base Nacional

38 Nestas Diretrizes Curriculares considera- -se que a documentação pedagógica constitui-se em

ferramenta de escuta e olhar atento através de diversos meios: relatórios, planejamentos, entrevistas com as famílias, diário de campo e de classe, ficha de avaliação descritiva das crianças, registros de tempos pedagógicos, vídeos, gravações, fotografias, painéis, portfólios, livros da vida, entre outros.

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Comum Curricular39. Essas discussões vêm trazendo demandas para EI como, por

exemplo, sobre como serão feitos os documentos de transferências, já que a partir

da obrigatoriedade de 4 anos, as escolas terão que expedir histórico escolar também

para as crianças da EI.

O terceiro e último tópico trata da formação continuada chamada no título

deste tópico de (Trans) Formação Continuada: Reflexão e criação do fazer

pedagógico. Esta diretriz, diferente das anteriores, admitindo e enfatizando que, para

implementação das diretrizes curriculares, é preciso envolver os profissionais e que

a formação continuada é um dos caminhos para isso. Chama-se a atenção para

políticas de formação continuada dos especialistas da educação, professoras e

professores, monitoras e monitores, agentes de EI e demais funcionários e

funcionárias da escola.

A diretriz propõe experiências formativas a partir do diálogo entre as diretrizes

curriculares e os PPs das escolas por meio da Coordenadoria Setorial de Formação

(CSF), NAEDs e escolas, proporcionando a formação em rede. Também afirma que

o processo de Formação Continuada (FC) tem como princípio a articulação entre

teoria e prática buscando a qualidade da EI. Segundo o documento as FC são

organizadas para proporcionar aos profissionais espaço e tempo para estudo,

39 A elaboração de uma base comum para os currículos nacionais, na perspectiva de um pacto

interfederativo, teve início com a constituição de um Comitê de Assessores e Especialistas, com ampla representatividade, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Compuseram esse Comitê professores universitários, atuantes na pesquisa e no ensino das diferentes áreas de conhecimento da Educação Básica, docentes da Educação Básica e técnicos das secretarias de educação, esses dois últimos indicados pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e pela União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME). Coube ao Comitê a redação dos documentos preliminares da BNCC, disponibilizados à consulta pública pela Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC) entre setembro de 2015 e março de 2016. [...] Com o intuito de mobilizar os estados, o Distrito Federal e os municípios para a discussão dos documentos preliminares da BNCC, a Diretoria de Currículos e Educação Integral da Secretaria de Educação Básica (DICEI-SEB) promoveu e participou de reuniões, seminários e fóruns realizados em escolas, universidades, sindicatos, dentre outros espaços. Entre julho de 2015 e março de 2016, para apresentar a Base, mobilizar as redes, promover debates, responder a questionamentos e buscar elementos para aprimorar o processo de consulta pública, técnicos do MEC e membros do Comitê de Assessores e Especialistas estiveram em, aproximadamente, 700 reuniões, seminários, debates, fóruns e outros eventos promovidos, nas cinco regiões do país, por Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, Universidades Públicas e Privadas, representações de fóruns de educação, organizações científicas e acadêmicas, sindicatos e diferentes atores envolvidos com a Educação Básica.Ministério da Educação. (BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR PROPOSTA PRELIMINAR SEGUNDA VERSÃO REVISTA, abril/2016, p. 28 e 29)

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escrita, reflexão, discussão dos conhecimentos produzidos por eles ou pelo seu

coletivo no cotidiano pedagógico.

Importante destacar as temáticas para FC elencadas na diretriz:

• O trabalho educativo com bebês de 0 a 3 anos • O trabalho educativo com crianças pequenas • Sociologia da Infância • Filosofia da Infância • Antropologia da criança • Diretrizes Curriculares da Educação Infantil • Letramento • Educação Inclusiva • Pedagogia de Projetos • Artes/linguagens expressivas – dança teatro, música, artes plásticas e visuais, expressões pictóricas, literatura • Estudo do poético • Corporeidade • Estudos Étnico-raciais • Tempos e espaços • Relações interpessoais • Culturas das Infâncias • Gênero • Sexualidade • Tecnologias • Brincadeiras • Registro e Documentação Pedagógica • Múltiplas Culturas • Processos Avaliativos (CAMPINAS, 2013, p.28-29).

Observamos que as temáticas elencadas são de extrema relevância e vêm ao

encontro das especificidades da EI. Além das temáticas a diretriz também sugere

parcerias com as universidades para cursos de especialização, mestrado e

doutorado e programação de palestras, encontros, mostras, seminários, fóruns,

congressos, entre outros.

O documento chega a suas considerações finais com as mesmas palavras do

início e reafirma estar em permanente construção. Traz o compromisso de escrever

cadernos temáticos semestrais que ainda não foram realizados. Somente o caderno

curricular temático Educação básica: ações educacionais em movimento, Espaços e

tempos na educação das crianças, volume I,40 foi construído, mas não impresso

ainda.

Destaca-se que a RMEC tem concretamente dois grupos de profissionais

trabalhando com bebês e crianças: professoras e professores e monitoras e

monitores e agentes de EI41 que tem condições de trabalho bem diferenciadas.

As diferenças se iniciam pela forma de ingresso no cargo, jornada, atribuições

e também porque os agentes e monitoras e monitores não fazem parte do quadro do

magistério.

A Lei nº 12.985 de 28/06/07, que dispõe sobre o plano de cargos, carreiras e

vencimentos dos servidores do Município de Campinas, apresenta no art. 4º II e no

40 Participei da elaboração e fiz a leitura como coordenadora da CSF para enviar para publicação. 41 Monitor e agentes de educação infantil refere-se ao mesmo profissional a nomenclatura do cargo

foi modificada pela Lei Municipal nº 12.987, de 28 de junho de 2007, que dispõe sobre o Plano de Cargos e Carreiras do Magistério Público Municipal de Campinas e dá outras providências, alterada pela Lei Complementar Nº 57, de 09 de janeiro de 2014.

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art.9º paragrafo 4º sobre a jornada das monitoras e monitores e agentes de

educação infantil:

Art. 4º. Os quadros de cargos de que trata esta Lei são integrados por cargos de provimento efetivo subdivididos nos seguintes Grupos, conforme anexos I- A e I- B: II- Cargos de Nível Médio: Grupos D e E; Art. 9º. A jornada de trabalho dos servidores poderá ser definida, a critério da administração, em: § 4ºOs titulares de cargo de Agente de Educação infantil têm jornada de 32 (trinta e duas) horas semanais, devendo cumprir 30 (trinta) horas em serviço e 2 (duas) horas de formação, conforme regulamento.(CAMPINAS, 2007)

Já com relação à jornada das professoras e professores, está na Lei nº

12.985 de 28/06/07 que dispõe sobre o plano de cargos, carreiras e vencimentos

dos servidores do Município de Campinas, consta no seu art. 2º I e II, art. 5º I, II e III,

art. 6 I art. 12, art. 45, I, II e III:

Art.2º. Para os fins desta Lei considera-se: I - Servidor do Magistério: o servidor legalmente investido em cargo público de provimento efetivo, função pública e função atividade do Quadro do Magistério Público Municipal; II - Docentes: titulares de cargo que compõem um Grupo de Servidores do Magistério com atribuições de docência nas unidades escolares; Art. 3º. O Quadro de Cargos do Magistério compreende: I-Grupo de Docentes, constituído de cargos efetivos de: a) Professor de Educação Básica I (PEB-I) ; Art. 5º. O ingresso no Quadro do Magistério dar-se-á da seguinte forma: I - Nível I, Grau A, para os docentes do subgrupo D-A, conforme anexo I, com nível médio, na modalidade normal; II - Nível III, Grau A, para os docentes do subgrupo D-A, conforme anexo I, com licenciatura plena; III - Nível I, Grau A, para os docentes do subgrupo D-B e para os especialistas dos subgrupos E-C, E-D, E-E. Art. 6º. Aos ocupantes de cargos do Grupo de Docentes compete a organização e realização do processo pedagógico na aula, a participação na gestão da Unidade Educacional, bem como a coordenação em pesquisa, em projeto e em trabalho com a comunidade, nos seguintes campos de atuação: I - Educação Infantil; Art. 12 - A jornada de trabalho do Grupo de Docentes é composta por: I - Trabalho Docente com Aluno (TDA): compreende o exercício da docência em cumprimento ao currículo, em atividade direta com a coletividade de crianças, adolescentes, jovens e adultos; II - Horas-atividade: de cumprimento obrigatório para todos os docentes, inclusive aos que se encontrem em regime de acumulação de cargos, formada por: a) Trabalho Docente Coletivo (TDC): espaço formativo que compreende reuniões pedagógicas da equipe escolar para a construção, o acompanhamento e a avaliação do projeto político-pedagógico da Unidade Educacional e para as atividades de interesse da Secretaria Municipal de Educação; b) Trabalho Docente Individual (TDI): compreende o atendimento e a

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recuperação dos alunos, reuniões com pais, atividades educacionais e culturais com alunos; c) Trabalho Docente de Preparação de Aulas (TDPA): compreende o trabalho desempenhado em hora e local de livre escolha do docente, destinado à preparação das atividades pedagógicas. § 1º O descumprimento das horas-atividade destinadas ao Trabalho Docente Coletivo e Individual prejudica a caracterização do efetivo exercício para fins de pagamento e de contagem de tempo de serviço público municipal, nos termos da legislação municipal vigente. § 2º Caberá à Secretaria Municipal de Educação disciplinar a estratégia, procedimentos e fluxos de cumprimento das horas de Trabalho Docente Coletivo - TDC e Trabalho Docente Individual - TDI, a fim de garantir a efetividade da sua execução. Art. 45 - As parcelas a seguir discriminadas serão pagas integralmente em rubricas separadas: I- Carga Suplementar; II- Hora-aula Excepcional; III – Hora-projeto;

Já se observa grandes diferenças nas suas jornadas. Sobre as atribuições

dos dois profissionais, o Edital do concurso nº 6/2014 de 17/10/2014, no seu anexo II

1.5 e 1.6, fala sobre as atribuições dos monitores e agentes:

II - DAS CARACTERÍSTICAS DO CARGO 1.5. Pré-requisito/ Escolaridade: Ensino Médio completo 1.6. Atribuições do cargo: Atuar nas Unidades de Educação Infantil, acolhendo, cuidando e auxiliando na educação de crianças, em conformidade com a proposta educacional; promover o contato afetivo e harmonioso entre adulto e a criança; conhecer e acompanhar o desenvolvimento das crianças, a forma como vivem, seus progressos e dificuldades; subsidiar e orientar as crianças em suas atividades recreativas, de cuidados com o corpo e de repouso; zelar pela guarda e conservação do material de consumo da Unidade Educacional; acompanhar e orientar as crianças durante as refeições, estimulando-as e auxiliando-as no desenvolvimento de bons hábitos alimentares, tomando os devidos cuidados, de acordo com a faixa etária; corresponsabilizar-se pelo cuidado, observação e orientação às crianças na aquisição e desenvolvimento de hábitos de higiene; realizar as trocas de fraldas, sempre que necessário; auxiliar as crianças nos momentos de banho, escovação de dentes e demais procedimentos de higiene; acompanhar as atividades recreativas e o momento de repouso/sono das crianças; colaborar na organização da entrada e saída das crianças, do espaço das atividades, do material didático e dos eventos em geral; auxiliar no desenvolvimento das atividades que favoreçam a aprendizagem e a interação entre as crianças e os adultos; mediar e auxiliar na prevenção das situações de conflitos no grupo, visando à integridade física e emocional da criança; comunicar a equipe gestora ocorrências envolvendo a integridade da criança; responsabilizar-se, em seu horário de trabalho, pelo registro de todas as ocorrências e atividades da Unidade Educacional; participar da avaliação e planejamento da Unidade Educacional; participar de atividades que visem integrar a escola com as famílias e comunidade; executar atividades correlatas e outras tarefas de mesma natureza ou nível de complexidade.(CAMPINAS, 2014)

O Edital do concurso nº 5/2014 de 04/08/2014, no seu anexo I, fala sobre as

atribuições dos professores de EI:

ANEXO I - ATRIBUIÇÕES DO CARGO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO

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79 BÁSICA I - EDUCAÇÃO INFANTIL: Atuar como docente na Educação Infantil, atendendo às atribuições previstas na legislação educacional vigente. Participar, elaborar, sistematizar, implementar, executar e avaliar os conteúdos registrados no Projeto Pedagógico, com base nas Diretrizes Educacionais da Secretaria Municipal de Educação; avaliar e reorganizar periodicamente o trabalho pedagógico, para o cumprimento dos objetivos documentados; planejar e avaliar as atividades pedagógicas, em consonância com os cuidados devidos ao educando, tendo em vista a autonomia e a formação integral discente; utilizar metodologias que garantam resultados eficazes de ensino e de aprendizagem aos alunos, estabelecendo estratégias de atendimento diferenciado, quando necessário; elaborar, utilizar e adaptar recursos pedagógicos e materiais específicos para todos os educandos de sua área de atuação, socializando estes instrumentos para uso dos demais profissionais da unidade educacional; participar dos programas de formação continuada, propostos pela Secretaria Municipal de Educação; planejar, implementar e participar das atividades de articulação da escola com as famílias e comunidade; participar efetivamente da avaliação institucional proposta no Projeto Pedagógico da unidade educacional, com o objetivo de reavaliar e replanejar o seu trabalho a partir dos resultados obtidos. Executar atividades correlatas e outras tarefas de mesma natureza ou nível de complexidade, associadas à sua área de atuação, obedecendo à regulamentação da LDB, bem como normas e resoluções vigentes na Secretaria Municipal da Educação.

Pensei ser importante destacar também o conteúdo programático dos dois

cargos exigido no edital dos concursos. No edital do concurso nº 6/2014 o conteúdo

programático para agentes de educação infantil:

ANEXO IV - CONTEÚDO PROGRAMÁTICO LÍNGUA PORTUGUESA Interpretação e produção de texto. Ortografia Oficial. Pontuação e acentuação gráfica Concordância verbal e nominal. Intertextualidade. MATEMÁTICA/RACIOCÍNIO LÓGICO Sistema de numeração decimal; adição, subtração, multiplicação e divisão de números inteiros. Razões e proporções; porcentagem. Regras de três simples e compostas Grandezas e medidas. Gráficos, tabelas, raciocínio lógico e resolução de situações problema. CONHECIMENTOS GERAIS - Matérias relacionadas à educação e cultura geral: fatos políticos, econômicos e sociais ocorridos nos últimos 12 (doze) meses e divulgados na imprensa local e nacional, contados até a data de publicação do edital de abertura deste concurso público. - Estatuto do Servidor Público De Campinas - Lei Municipal Nº 1.399/55 (Artigo 15 e Artigos 182 a 204). - Manual De Ética Da Prefeitura Municipal De Campinas (Páginas 4 a 27) - Lei Orgânica do Município de Campinas (Artigos 222 a 238) CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS A Prova Objetiva, no que se refere aos conhecimentos específicos, será elaborada com base nas atribuições do cargo e da profissão previstas na legislação vigente, e, inclusive, nos seguintes conteúdos programáticos: - Organização do trabalho na unidade de educação infantil. Organização dos espaços, do tempo e seleção de atividades de rotina e atividades para recreação. Diversificação de atividades para as crianças. Brinquedos e materiais ao alcance das crianças. Integração escola X família e comunidade. Cuidados com a criança: alimentação, higiene (trocar fraldas, banhar, escovar dentes, desfraldar), descansar/dormir, saúde, segurança. Noções de deficiências e como atuar com a criança deficiente. Combate à discriminação: de gênero, étnica, econômica, de credo. Postura como educador: brincar junto com a criança, escutar a criança, dialogar com a criança, tom de voz, modos de

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falar com a criança. Trabalho em equipe. Atividades lúdicas. Noções de nutrição. Noções de ética e cidadania. Noções básicas de relações humanas. - LEGISLAÇÃO FEDERAL: Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil - Constante no Documento Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica de 2013 – páginas 80 a 100. Caderno MEC - Brinquedos e Brincadeiras de Creches. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana - LEGISLAÇÃO MUNICIPAL: Lei Municipal nº 6662/91 - Conselho de Escola Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil: um processo contínuo de reflexão e ação – Município de Campinas. (CAMPINAS,2014)

No edital do concurso nº 5/2014, o conteúdo programático para agentes de

educação infantil:

ANEXO V - CONTEÚDO PROGRAMÁTICO Comum a todos os cargos de Professores LÍNGUA PORTUGUESA Interpretação e produção de texto. Intertextualidade. Ortografia oficial. Pontuação e acentuação gráfica. Classes de palavras: substantivo, adjetivo, numeral, pronome, verbo, advérbio, preposição e conjunção: emprego e sentido que imprimem às relações que estabelecem. Vozes verbais: ativa e passiva. Colocação pronominal. Concordância verbal e nominal. Regência verbal e nominal. Crase. Sinônimos, antônimos e parônimos. Sentido próprio e figurado das palavras. CONHECIMENTOS GERAIS ÁREA PEDAGÓGICA GERAL: - Princípios da prática docente e discente: sociológicos, filosóficos, antropológicos, éticos e estéticos. - História da Educação Brasileira: Escola, Estado e Sociedade: política educacional; estrutura e organização da educação. - Currículo: Ciclos de aprendizagem; Currículo e os direitos dos educandos e dos educadores; conhecimento e cultura; currículo e avaliação; currículo e projeto pedagógico; currículo e práticas pedagógicas. - Gestão Escolar Democrática. Projeto Político Pedagógico. - Avaliação Institucional. - Avaliação do Processo de Ensino e Aprendizagem. - Educação e Cidadania. - Educação Ambiental. - Princípios e Fundamentos da Educação Inclusiva. - Diversidade e relações étnico-raciais. - Escola para a educação integral. - As dimensões da Tecnologia da Informação e Comunicação na educação. Legislação Educacional Federal: - Constituição Federal e emendas. - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e suas alterações (LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996). - Estatuto da Criança e do Adolescente (LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990). - Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. - Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva (http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politica.pdf) - Revista da Educação Especial, v. 4, n. 1, jan./jun. 2007a (disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/rev4web.pdf). Legislação Educacional Municipal: - Lei Municipal nº 6.662/91 de 10/10/1991, que dispõe sobre a criação do Conselho de Escola nas unidades educacionais. - Lei Municipal nº 8.869 de 24/06/1996, que dispõe sobre a criação, a composição, as atribuições e o funcionamento do Conselho Municipal de Educação. - Resolução SME nº 05/2008 – Estabelece as Diretrizes para a implementação do processo de Avaliação Interna das Unidades Municipais

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81 de Ensino Fundamental e para a Constituição da Comissão Própria de Avaliação (disponível no Diário Oficial do Município de 07/05/2008). Demais conhecimentos - Matérias relacionadas à educação e cultura geral: fatos políticos, econômicos e sociais ocorridos nos últimos 12 (doze) meses e divulgados na imprensa local e nacional, contados até a data de publicação do Edital de Abertura deste Concurso Público. Estatuto do Servidor Público de Campinas - Lei Municipal nº 1.399/55 (Artigo 15 e Artigos 182 a 204). Decreto Municipal nº 15.514/06, que dispõe sobre o Programa de Avaliação Probatória do Servidor. Manual de Ética da Prefeitura Municipal de Campinas - páginas 4 a 27. CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS PROFESSOR DE EDUCAÇÃO BÁSICA I - EDUCAÇÃO INFANTIL Concepções: de educação, de Educação Infantil, de infância e de criança.Leitura e escrita na Educação Infantil. Plano de Ação Pedagógica Docente para a Educação Infantil. Corporeidade: o corpo criança criador de culturas e conhecimentos. Os processos de criação no brincar - a constituição do brinquedo. A exploração e a construção estética das crianças. Os processos de relação com obras de arte e das criações e autoria das crianças, junto às várias formas de expressão artística existentes: artes visuais, plásticas, literatura, música, dança, teatro, cinema. A prática docente: profissional, estética, ética, social, humana e dialógica com o outro. História da Educação Infantil no Brasil Educar-cuidar os corpos infantis. Composição de tempos e espaços na Educação Infantil. O conhecimento matemático na educação de crianças e suas relações junto às experiências cotidianas. Ciências naturais e suas relações com o ambiente, o corpo e o desenvolvimento humano na Educação Infantil. A Pesquisa e a exploração de novas descobertas na Ed. Infantil. Filosofia 23 na educação de crianças. Avaliação e registro do processo educacional na Educação Infantil. Formação continuada de professores e suas relações com o professor pesquisador. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil – Município de Campinas. (CAMPINAS,2014)

Podemos perceber que as exigências de conhecimento e de fazer do

cotidiano são bem parecidas, mas quando se trata de jornada e salário a realidade é

bem diferente. Portanto é necessário provocar e aflorar a diferença quando a

igualdade é prejudicial.

Espero que as diretrizes possam continuar nesta constante construção,

análise de novos documentos como a Base Nacional Curricular Comum, orientando

a EI e seus profissionais para resistir aos processos homogeneizantes das

avaliações sistêmicas e das identidades fixas para preservar os movimentos

coletivos a fim de que outras histórias curriculares possam ser vividas e contadas.

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4. REFLEXOS DA FORMAÇÃO CONTINUADA NA PRODUÇÃO DE

IDENTIDADES DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO

INFANTIL.

Destaco aqui um dos fatores que, ao meu ver, mais impacta na produção das

identidades do professor na Educação Infantil que é a Formação Continuada (FC), a

maneira como as políticas públicas conduzem as formações42, bem como os autores

e ideias escolhidas para embasar tais ações formativas poderão produzir ao longo

do tempo nas professoras e nos professores uma identidade fixa que é muito ruim

para a inclusão das diferenças ou para as identidades que possibilitam mudanças

assumindo ou deixando identidades. Daí a importância de escrever sobre a FC na

Rede de Campinas.

Nos documentos de diretrizes curriculares para EI em Campinas, que foram

apresentados na terceira parte deste trabalho, a FC aparece com diferentes focos no

primeiro documento, só responsabilidade da professora e do professor e,

atualmente, responsabilidade das políticas públicas e da professora e do professor.

As primeiras FCs para os profissionais da educação, oferecidas pela

Secretaria Municipal de Educação (SME), tiveram início após a promulgação da

Constituição Federal (1988) e se intensificaram após a LDB (1996). Não há registros

formais sobre a trajetória da Formação Continuada dos profissionais da Educação

da SME. Fui procurar registros na Coordenadoria Setorial de Formação e não há no

Núcleo de memória registros formais. Há um documento que foi iniciado em 2010 e

retomado em 2013 com o título “Fundamentos e Diretrizes para a Política de

Formação Continuada dos profissionais da Educação da Rede Municipal de

Educação de Campinas” que não foi finalizado pela SME. Questionei, via telefone, o

diretor do Departamento Pedagógico da SME sobre o encaminhamento do

documento e a resposta foi que estava em análise. Lá constam alguns fundamentos

42 O processo de definição de políticas públicas para uma sociedade reflete os conflitos de interesse, os arranjos feitos na esfera de poder que perpassam as instituições do Estado e da sociedade como um todo (HÓFLING, 2001 apud TEBET, 2006, p.16). Rosemberg (2001 apud TEBET, 2006, p.19) afirma que: Neste entrejogo de conflitos, tensões, coalizões e negociações, participam também cientistas, suas corporações e o conhecimento produzido por cientistas. (...) Não é o conhecimento quem deva determinar, diretamente as prioridades em políticas públicas. Nesta determinação, o conhecimento deve instrumentalizar os atores, pois essas opções são políticas, resultante do jogo de interesses e pressões.

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e diretrizes que precisam ser revisitadas para atender a Educação Básica43. Não

usarei o conteúdo do documento no texto atualizado, pois ele não foi publicado, tive

acesso ao documento de 2013, como Coordenadora Pedagógica(CP), pois o

documento foi enviado aos profissionais para contribuições.

Após a criação do cargo de CP em 199144, nos próximos anos 1992 e 1993,

as FCs começaram a ganhar formato. No início eram Encontros e Grupos de

Estudos que aconteciam nas escolas, onde eram realizadas dinâmicas de

acolhimento, discussões sobre educação e sensibilização para o trabalho com as

alunas e os alunos e profissionais. A psicologia estava com forte influência na

educação e isso se demonstrava nas formações também. Sei disso, pois participei

desses processos como profissional da educação.

Em 2003 foi criada a Coordenadoria Setorial de Formação (CSF) e o espaço

físico do Centro de Formação (CEFORMA)45, que em 2008 passou a se chamar

Centro de Formação em Tecnologia e Pesquisa Educacional (CEFORTEPE), foi

transferido para um espaço físico mais amplo. A CSF foi criada para coordenar e

investir na formação dos profissionais da educação, proporcionando cursos e

espaços de reflexão sobre a própria prática, nas escolas e para além delas,

oferecendo subsídios e orientações aos profissionais, contribuindo para o

aprimoramento das práticas pedagógicas, a fim de possibilitar avanços na melhoria

da qualidade de ensino dos alunos da Rede Pública de Campinas.

Segundo o Decreto 14460/2003, artigo 20:

A Coordenadoria Setorial de Formação do Departamento Pedagógico da SME tem por atribuições e objetivos: I – realizar as ações de formação em serviço de todos os profissionais da SME, no que se refere às atividades específicas de sua função e àquelas que os constituem como educadores; II – organizar as ações para suprir as necessidades básicas de formação dos profissionais, exigidas para o exercício da função;

43 LDB 9493/96 Art. 21. A educação escolar compõe-se de: I - educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. O município não atende ensino médio.

44 Lei Nº 6894 de 24 de dezembro de 1991, que dispõe Sobre o Estatuto do Magistério Público e dá providências correlatas no seu Art. 6º inciso IV.

45 Lei Nº 14.460 de 30 de setembro de 2003, que Reorganiza a Estrutura Administrativa, as

atribuições dos departamentos, coordenadorias e setores da Secretaria Municipal de Educação e dá outras providências, no seu Art.5º incisos II e VI parágrafos 2º e 3º.

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III – viabilizar as diversas possibilidades formativas, tais como grupos de estudos/pesquisa, palestras, oficinas, dentre outros; IV – viabilizar e organizar o material que subsidie a reflexão curricular de modo mais amplo que as especificidades das áreas de conhecimento; V – articular a integração da formação entre a SME e a FUMEC; VI – sistematizar o processo de vivência curricular, de forma a construir o currículo em movimento constante de pesquisa-ação, fundado na promoção constante da investigação e da produção acerca do trabalho pedagógico desenvolvido com a Rede e pela Rede. (DIÁRIO OFICIAL MUNICÍPIO DE CAMPINAS, 30/09/2003)

Parte-se do entendimento que a Formação Continuada dos profissionais da

educação46 é direito e dever de todos os profissionais da educação, direito de tê-la

oferecida pelas políticas públicas e dever de realizá-la, assim cabe à Secretaria

Municipal de Educação (SME) oferecer as necessárias condições para sua

realização e, ao profissional, o dever de participar tendo em vista a consecução do

Projeto Pedagógico (PP), as Diretrizes Curriculares Municipais e o aprimoramento

constante da qualidade do seu trabalho e da educação pública. Entende-se por

profissionais da Educação: Professor, Monitor e Agente de Educação Infantil, Vice-

Diretor Educacional, Diretor Educacional, Orientador Pedagógico, Coordenador

Pedagógico e Supervisor Educacional.

Segundo o COMUNICADO SME/DEPE Nº 01/2015 de 16 de dezembro de

2015, as ações formativas são propostas ou analisados pela CSF e as equipes

gestoras47 e demais educadores podem organizar propostas e enviar para análise e

parecer das CPs da CSF. A CSF oferece Formação Continuada em serviço nas

seguintes categorias: Cursos, Grupos de Estudo, Grupos de Trabalho, Palestras,

Seminários, Encontros, Fóruns, Oficinas e outras modalidades que atendam aos

objetivos da SME (RESOLUÇÃO SME Nº 05/2016).

Há na organização das ações formativas a intenção de articulação das

formações oferecidas com as Diretrizes Curriculares de Campinas, os projetos

pedagógicos e as necessidades dos profissionais, da UE e da SME. O item 1.1. do

Comunicado deixa isso explícito:

46 Resolução SME Nº 05/2016 que dispõe sobre as normas de formação continuada em serviço

oferecida pela SME de Campinas. 47 As equipes gestoras são compostas pelo diretor educacional, vice-diretor educacional e

orientador pedagógico que atuam na escola.

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85 “1.1. as Equipes Gestoras e demais educadores poderão organizar propostas que atendam às necessidades e interesses diretamente relacionados aos desafios apontados em seus Projetos Pedagógicos, em consonância com as Diretrizes Curriculares da Rede Municipal de Ensino atendendo aos ANEXOS I, II e III” (DIARIO OFICIAL MUNICIPIO DE CAMPINAS,16/12/2015)

O anexo I do Comunicado refere-se às categorias de ações formativas

explicando as características de cada uma. O anexo II do Comunicado refere-se aos

objetivos da FC e às temáticas para apresentação de propostas. O anexo III do

Comunicado refere-se à estrutura para elaboração de proposta para ação formativa

continuada.

4.1. ANÁLISE E PROPOSTAS FORMATIVAS: DESAFIOS E AVANÇOS

Como pedagoga e ocupando o cargo de coordenadora setorial de formação

na SME de Campinas, percebo que a velocidade das mudanças e os processos

pedagógicos exigem mais de todos os profissionais envolvidos com a educação.

Entendendo a formação como um processo contínuo de reflexão da/na ação

pedagógica e a construção de conhecimentos como troca de ideias e reflexões

contínuas que poderão determinar as futuras ações do sujeito, é necessário estar

atento às produções de subjetividades que nos afetam, pois a Formação poderá

reforçar ou minimizar práticas de preconceito, discriminação e manutenção do

pensamento hegemônico.

Tudo o que é produzido pela subjetivação capitalística - tudo o que nos chega pela linguagem, pela família e pelos equipamentos que nos rodeiam - não é apenas uma questão de ideia, não é apenas uma transmissão de significações por meio de enunciados significantes. Tampouco se reduz a modelos de identidade, ou a identificações com polos maternos, paternos, etc. Trata-se de sistemas de conexão direta entre as grandes máquinas produtivas, as grandes máquinas de controle social e as instâncias psíquicas que definem a maneira de perceber o mundo. (GUATTARI e ROLNIK, 2010, p. 27)

Vivemos num período de intensas produções de subjetividades, mais que em

outros períodos, por causa das máquinas tecnológicas que modificaram e continuam

modificando pessoas. Por outro lado, vivemos também intensos movimentos de

resistência em relação à homogeneização de coisas e pessoas. Desta forma, somos

afetados e afetamos a história.

Em meio a tantas influências que perpassam e perpassaram essa construção

e constituição de Formação Continuada têm nos chegado boas propostas de

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formação vindas das unidades educacionais (UEs) e Núcleos de ação educativa

descentralizados (NAEDs). A Equipe de CPs analisa as propostas tendo como

referencial as Diretrizes Curriculares Municipais para Educação Infantil, Ensino

Fundamental e EJA de Campinas que também dialogam com os documentos

Nacionais.

As propostas de Formação feitas pela CSF têm avançado e acolhido novos

autores como exemplo Jorge Larrosa, Walter Kohan, Charles Feitosa, Sílvio Gallo e

as Leis Afirmativas do nosso país. Apesar dos esforços é sempre bom estar atento

às armadilhas do Capitalismo Mundial Integrado (CMI)48 e a imposição de

conhecimentos considerados verdadeiros e inquestionáveis. Boaventura de Sousa

Santos nos alerta para a armadilha do pensamento homogêneo e eurocentrado49

onde:

48 .O CMI – são pessoas, os americanos, os russos, os petroleiros, dominadores do capital etc, que

controlam a realidade do mundo e a realidade psíquica. Essas realidades incidem nos esquemas de conduta, de ação, de gestos, de pensamento, de sentido, de sentimento, de afeto, etc. Ela incide nas montagens da percepção, da memorização, ela incide na modelização das instâncias intra-subjetivas - instâncias que a psicanálise reifica nas categorias de Ego, Superego, Ideal do Ego, enfim, naquela parafernália toda. A força da subjetividade capitalística se distingue dos sistemas de classes sociais ou das antigas castas senhoriais e religiosas, pois ela se produz tanto ao nível dos opressores, quanta dos oprimidos. Trata-se de certos processos da constituição da subjetividade coletiva, que não são resultado da somatória de subjetividades individuais, mas sim do confronto com as maneiras com que, hoje, se fabrica a subjetividade em escala planetária. O CMI afirma-se, em modalidades que variam de acordo com o país ou com a camada social, através de uma dupla opressão. Primeiro, pela repressão direta no plano econômico e social - o controle da produção de bens e das relações sociais através de meios de coerção material externa e sugestão de conteúdos de significação. A segunda opressão, de igual ou maior intensidade que a primeira, consiste em o CMI instalar-se na própria produção de subjetividade: uma imensa máquina produtiva de uma subjetividade industrializada e nivelada em escala mundial tornou-se dado de base na formação da força coletiva de trabalho e da força de controle social coletivo. (GUATTARI e ROLNIK, 2010)

49 Na América, a ideia de raça foi uma maneira de outorgar legitimidade às relações de dominação impostas pela conquista. A posterior constituição da Europa como nova identidade depois da América e a expansão do colonialismo europeu ao resto do mundo conduziram à elaboração da perspectiva eurocêntrica do conhecimento e com ela à elaboração teórica da ideia de raça como naturalização dessas relações coloniais de dominação entre europeus e não-europeus. Historicamente, isso significou uma nova maneira de legitimar as já antigas ideias e práticas de relações de superioridade/inferioridade entre dominantes e dominados. Desde então demonstrou ser o mais eficaz e durável instrumento de dominação social universal, pois dele passou a depender outro igualmente universal, no entanto mais antigo, o intersexual ou de gênero: os povos conquistados e dominados foram postos numa situação natural de inferioridade, e consequentemente também seus traços fenotípicos, bem como suas descobertas mentais e culturais. Desse modo, raça converteu-se no primeiro critério fundamental para a distribuição da população mundial nos níveis, lugares e papéis na estrutura de poder da nova sociedade. Em

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87 A linha invisível que separa a ciência de seus “outros” modernos está assente na linha abissal invisível que separa, de um lado, a ciência, filosofia e a teologia e, de outro, conhecimentos tornados incomensuráveis e incompreensíveis por não obedecerem nem aos critérios científicos de verdade nem aos critérios dos conhecimentos reconhecidos como alternativos, da filosofia e da teologia. No campo do direito moderno, este lado da linha é determinado por aquilo que se reputa como legal ou ilegal de acordo com o direito oficial do Estado ou do direito internacional (SANTOS, 2010, p 73).

A política de formação tem potenciais diversos, porém muitas vezes, se

prende ao pensamento que segundo Santos (2010) é homogêneo e eurocentrado,

ficando assim do lado da linha, mais regulatória, onde está a ciência, filosofia,

teologia e o direito, e se deixa de oferecer formações importantes como, por

exemplo, diálogo com integrantes de tribos indígenas e ou quilombolas, pois se

pensa que indígenas e negros não têm muito a nos ensinar. O eurocentrismo que

justificou o colonialismo e ignorou as culturas colonizadas quase que acabou com

essas culturas. Tudo que não era europeu foi considerado não civilizado para o

eurocentrismo trazer a cultura europeia e acabar com a cultura do outro trazendo-lhe

civilidade seria um favor. O discurso eurocêntrico se fundamenta em acreditar que

um ser/um grupo cultural é melhor do que o outro e por isso deverá fazer o outro

mudar (deixando de ser o que é) para que seja tido como civilizado. Esse discurso

outras palavras, no modo básico de classificação social universal da população mundial. De acordo com essa perspectiva, a modernidade e a racionalidade foram imaginadas como experiências e produtos exclusivamente europeus. Desse ponto de vista, as relações intersubjetivas e culturais entre a Europa, ou, melhor dizendo, a Europa Ocidental, e o restante do mundo, foram codificadas num jogo inteiro de novas categorias: Oriente-Ocidente, primitivo-civilizado, mágico/míticocientífico, irracional-racional, tradicional-moderno. Em suma, Europa e não-Europa. Mesmo assim, a única categoria com a devida honra de ser reconhecida como o Outro da Europa ou “Ocidente”, foi “Oriente”. Não os “índios” da América, tampouco os “negros” da África. Estes eram simplesmente “primitivos”. Sob essa codificação das relações entre europeu/não-europeu, raça é, sem dúvida, a categoria básica. Essa perspectiva binária, dualista, de conhecimento, peculiar ao eurocentrismo, impôs-se como mundialmente hegemônica no mesmo fluxo da expansão do domínio colonial da Europa sobre o mundo. Não seria possível explicar de outro modo, satisfatoriamente em todo caso, a elaboração do eurocentrismo como perspectiva hegemônica de conhecimento, da versão eurocêntrica da modernidade e seus dois principais mitos fundacionais: um, a ideia-imagem da história da civilização humana como uma trajetória que parte de um estado de natureza e culmina na Europa. E dois, outorgar sentido às diferenças entre Europa e não-Europa como diferenças de natureza (racial) e não de história do poder. Ambos os mitos podem ser reconhecidos, inequivocamente, no fundamento do evolucionismo e do dualismo, dois dos elementos nucleares do eurocentrismo.(QUIJANO, 1999)

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deve ficar bem longe da escola, pois estimula a exclusão, discriminação, racismo e

preconceitos.

Em Campinas, recentemente, no cargo de coordenadora setorial de formação,

tive muita dificuldades em contratar um indígena para apresentar sua cultura, a partir

do indígena, por não estar dentro dos “padrões” da sociedade capitalista, regulatória,

onde o sujeito tem que ter documentos e, principalmente, uma conta bancária para

negociar com os órgãos estatais. Conseguimos iniciar o processo por conta da Lei

11.645 de 10 de março de 2008 que estabelece, no seu artigo 26, que nos

estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados,

torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. Daí

pode-se perceber a importância das Leis afirmativas como a Lei 10639 que

estabelece o ensino da História da África e da Cultura Afro-brasileira nos sistemas

de ensino, que foi uma das primeiras leis assinadas no país e que significa o

reconhecimento da importância da questão do combate ao preconceito, ao racismo

e à discriminação na escola. Essa Lei e depois a Lei 11645, que dá a mesma

orientação quanto à temática indígena, reconhecem a escola como lugar da

formação de cidadãos e afirma a relevância de a escola promover a necessária

valorização das matrizes culturais que fizeram do Brasil o país rico, múltiplo e plural

que somos. (BRASIL, 2003)

Penso que as leis afirmativas são aceitas pelo capitalismo, pois a adequação

da sociedade para atender as exigências dessas leis gera consumo. Por exemplo,

para incluir deficientes é preciso mexer nas estruturas de ruas e construções

colocando rampas, elevadores, banheiros adaptados etc.

O capitalismo nos tem como instrumento, porém se identificamos isso

podemos fazer a revolução molecular50. Esse nome para revolução é dado pelo

autor Felix Guattari (2010), por se tratar de uma revolução feita no ser humano pelo

retorno de sua singularidade51 e para a harmonia com a natureza e uma sociedade

50 A ideia de revolução molecular diz respeito sincronicamente a todos os níveis: infrapessoais (o

que esta em jogo no sonho, na criação, etc.); pessoais (por exemplo, as relações de autodominação, aquilo que os psicanalistas chamam de Superego); e interpessoais (a invenção de novas formas de sociabilidade na vida doméstica, amorosa, profissional, na relação com a vizinhança, com a escola, etc.). (GUATTARI; ROLNIK, 2010, p.46).

51 O termo "singularização" é usado para designar os processos disruptores no campo da produção do desejo: trata-se dos movimentos de protesto do inconsciente contra a subjetividade

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inclusiva. É uma revolução sem guerra e que não visa a troca do poder para

continuar com a repressão, mas visa a mudança da sociedade frente aos diferentes.

Paulo Freire (1987) escreve que quando a educação não é libertadora, o

oprimido introjeta a sombra do opressor. Isso é exatamente o que não precisamos,

só trocar o opressor.

A educação serve a um desejo e necessidade da sociedade que precisa

transformar-se para incluir seus diferentes. Quem precisa mudar também é a

sociedade e não somente as pessoas. A mudança da sociedade deve estar atrelada

a mudança da escola que, necessariamente, se atrela a mudança de postura da

professora e do professor e dos demais profissionais da educação.

Hall (2000) afirma que o "sujeito humano", que tem certas capacidades

humanas fixas e um sentimento estável de sua própria identidade e lugar na ordem

das coisas, emergiu como produção discursiva pela primeira vez na idade moderna

e ele se tornou "centrado" nos discursos e práticas que moldaram as sociedades

modernas. Ele adquiriu uma definição mais sociológica ou interativa; só que ele está

sendo "descentrado" na modernidade tardia. Apesar das concepções mutantes do

sujeito humano, visto como uma figura discursiva, cuja forma unificada e identidade

racional eram pressupostas tanto pelos discursos do pensamento moderno quanto

pelos processos que moldaram a modernidade, sendo-lhes essenciais, o sujeito

humano, a meu ver, atualmente, conseguiria perceber, principalmente nos coletivos,

que essa postura centrada sem relação com o ambiente e os discursos postos

precisa ser transformada. Faz-nos refletir, então, sobre o conceito da diferença e

que o que nos faz diferente do outro é construído, e se é construído pode ser

desconstruído e construído novamente.

As professoras e os professores da EI planejam, refletem, organizam e

estruturam, intencionalmente, espaços e tempos que possibilitam aos bebês e às

crianças pequenas o direito ao brincar. E ainda participam ativamente dos

momentos lúdicos, brincando junto com os bebês e as crianças pequenas, propondo

brincadeiras e inserindo elementos junto com os bebês e as crianças pequenas, de

modo a ampliar e enriquecer as atividades com meninas e meninos. Elas e eles

capitalística, através da afirmação de outras maneiras de ser (GUATTARI; ROLNIK, 2010, p.45).

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cuidam e educam os bebês e as crianças pequenas, pois isso faz parte da vivência

de seu crescimento, de seu bem-estar e da sua saúde. Segundo Kulmann Junior:

A caracterização da instituição de educação infantil como lugar de cuidado e educação, adquire sentido quando segue a perspectiva de tomar a criança como ponto de partida para as formulações das propostas pedagógicas. Adotar essa caracterização como se fosse um dos jargões do modismo pedagógico, esvazia seu sentido e repõe justamente o oposto do que se pretende. A expressão tem o objetivo de trazer à tona o núcleo do trabalho pedagógico consequente com a criança pequena. Educá-la é algo integrado ao cuidá-la. A polarização entre assistencial e educacional opõe a função de guarda e proteção à função educativa, como se ambas fossem incompatíveis, uma excluindo a outra. Entretanto a observação das instituições escolares evidencia que elas têm como elemento intrínseco ao seu funcionamento o desempenho da função de guardar as crianças que a frequentam (Kulman Jr, 2003, p. 60)

Não podemos nos envergonhar das especificidades da Educação Infantil e

das nossas funções como professoras e professores da EI.

Ao longo do último século, no Brasil, as professora e os professores vêm

sendo bombardeados com infinitas cobranças e com subjetividades que

desmoralizam e desvalorizam seu trabalho e suas práticas. Entretanto, não será

atuando como professoras e professores com corpo vibrátil em coma52 e

52 As forças de criação e de resistência mobilizam-se na subjetividade em decorrência de um

paradoxo irresolúvel entre dois modos de apreensão do mundo enquanto matéria – como desenho de uma forma ou como campo de forças –, os quais por sua vez dependem da ativação de diferentes potências da subjetividade em sua dimensão sensível. Conhecer o mundo como forma convoca a percepção, operada pela sensibilidade em seu exercício empírico; já conhecer o mundo como força convoca a sensação, operada pela sensibilidade em seu exercício intensivo e engendrada no encontro entre o corpo, como campo de forças, decorrentes das ondas nervosas que o percorrem, e as forças do mundo que o afetam. Vou designar este exercício intensivo do sensível por “corpo vibrátil”, para distingui-lo do exercício empírico do sensível, pois é com ele que corremos mais facilmente o risco de confundi-lo. [...] [...] Ora, uma subjetividade cujo corpo vibrátil está em coma, não tem como reconhecer a crueldade da vida como causa de seu assombro: estando restrita ao conhecimento do mundo como forma e, portanto, ao mapa da forma vigente com suas figuras e seus conflitos de interesse, para encontrar uma explicação e aliviar-se, a subjetividade projeta no outro a causa de seu assombro, atribuindo-lhe a autoria da crueldade. O assombro se transforma em medo e desamparo. Mobilizada pela experiência da crueldade, mas passada pelo crivo desta interpretação, a força de resistência ao invés se dirigir-se à afirmação e defesa das novas formas de vida que se fazem necessárias, será dirigida “contra” o outro. Tal força é então capturada pela matriz dialética, como luta entre opostos, subjetividades reificadas em figuras identitárias, cuja luta gira exclusivamente em torno do poder, cada um reivindicando para si o lugar do bem e fixando o outro no lugar do mal, contra o qual deverá ser investida a força de resistência. Neste tipo de exercício da política, que se transforma em luta entre o bem e o mal, seja qual for o lado vencedor, em termos de política de desejo, o resultado é um só. Quem vence é a força do conservadorismo, fruto do temor à crueldade: resistência negativa que denega o germe de diferença que pede passagem e breca a criação de uma forma de vida na qual o germe ganhe corpo e se atualize. Portanto, quem perde é a vida cujo

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desconectados com as realidades que serão valorizados. Muitas vezes, pela falta de

uma identidade de grupo, que não deveria ser de atitudes de disputas, mas em

muitos casos é. As professoras e os professores muitas vezes, não apresentam

perigo a continuidade dos paradigmas, pois não causam medo nenhum no sentido

de abalar/questionar o sistema vigente; transformando–se em meros reprodutores

dos pensamentos homogêneos e hegemônicos e de conteúdos sem vida. Ou ainda,

disputando entre si que modalidade de ensino é mais importante, culpabilizando a

modalidade anterior pelo insucesso escolar das crianças. São produções de

identidades fixas que confundem as professoras e os professores que apesar de

terem mais em comum, serem professoras e professores, acabam por valorizar as

diferenças excludentes. Esses comportamentos, segundo Rolnik (2010), vão além

da noção de ideologia que não nos permite compreender essa função literalmente

produtiva da subjetividade. A ideologia permanece na esfera da representação,

quando a produção essencial do CMI não é apenas a da representação, mas a de

uma modelização que diz respeito aos comportamentos, à sensibilidade, à

percepção, à memória, às relações sociais, às relações sexuais, aos fantasmas

imaginários etc.

Para desunir um grupo é preciso humilhar, desqualificar o trabalho, suas

identidades impondo subjetividades que orientam seus comportamentos.

Embarcamos nesse processo de divisão social geral da produção de subjetividade e não há mais volta. Mas, por isso mesmo, devemos interpelar todos aqueles que ocupam uma posição de ensino nas ciências sociais e psicológicas, ou no campo de trabalho social - todos aqueles, enfim, cuja profissão consiste em se interessar pelo discurso do outro. Eles se encontram numa encruzilhada política e micropolítica fundamental. Ou vão fazer o jogo dessa reprodução de modelos que não nos permitem criar

fluxo fica travado, quando ela não é concreta e irreversivelmente interrompida pelo extermínio, em nome de uma configuração de mundo tomada como a verdade, configuração que, por supô-la absoluta, se quer conservar. É o mundo do consenso: mundo fusional sem alteridade, sem resistência, sem criação – em suma, sem vida. Assim completa-se a estratégia de denegação da crueldade: a produção imaginária de um mundo idealizado, sem paradoxo – e, portanto, sem turbulência, sem sofrimento e sem o esforço conjugado de criação e de resistência –, alucinação que se projeta no futuro. É esta a política de desejo que está na base dos fundamentalismos de toda espécie, sejam eles de direita, de esquerda ou de centro. (ROLNIK, 2003)

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saídas para os processos de singularização, ou, ao contrário, vão estar trabalhando para o funcionamento desses processos na medida de suas possibilidades e dos agenciamentos que consigam por para funcionar. Isso quer dizer que não ha objetividade científica alguma nesse campo, nem uma suposta neutralidade na relação (por exemplo, analítica). (GUATTARI; ROLNIK, 2010, p.29)

A organização de uma política de formação continuada voltada para

autorreflexão das professoras e dos professores poderá permitir a tomada de

consciência e a transformação das práticas das professoras e dos professores,

enquanto sujeito que afeta e é afetado pelas subjetividades, mas que também é

capaz de mudar isso.

Se precisamos de uma sociedade inclusiva de que nos serviria uma escola

excludente?

Segundo Larrosa, a FC dos professores se produz em práticas:

Nas quais o que se pretende é que os participantes problematizem, explicitem e, eventualmente, modifiquem a forma pela qual construíram sua identidade pessoal em relação a seu trabalho profissional. Do que se trata aí é de definir, formar e transformar um professor reflexivo, capaz de examinar e reexaminar, regular e modificar constantemente tanto sua própria atividade prática quanto, sobretudo, a si mesmo, no contexto desta prática profissional. As palavras-chaves desses enfoques sobre a formação do professorado são reflexão, autorregulação, autoanálise, autocrítica, tomada de consciência, autoformação, autonomia etc. Por outro lado é importante advertir que os motivos da autorreflexão não incluem apenas aspectos “exteriores” e “impessoais”, tais como as decisões práticas que se tomam, os comportamentos explícitos na sala de aula, ou os conhecimentos pedagógicos que se têm, mas, sobretudo, aspectos mais “interiores” e “pessoais”, como atitudes, valores, disposições, componentes afetivos e emotivos etc. Dito de outro modo, o que se pretende formar e transformar não é apenas o que o professor faz ou o que sabe, mas, fundamentalmente, sua própria maneira de ser em relação ao seu trabalho. (LARROSA, 1999, p 49)

Ora veja, estou sugerindo, aqui, uma formação continuada que vai além

daquela superficial que discute somente as práticas ou somente uma teoria

desconectada da realidade e do sujeito. Proponho uma formação continuada que

possibilite o (re)conhecimento do que é ser professora e professor, sujeito de um

tempo, com valores, subjetividades e com tudo que nos cerca na

contemporaneidade.

A falta da autorreflexão da professora e do professor e as subjetividades que

lhe impõem a sociedade dificultam as transformações tão necessárias no campo

educacional e as mudanças de paradigmas necessárias para melhoria da qualidade

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da educação e da escola. As mudanças advindas de reflexões e conscientização da

realidade podem intervir nas subjetividades impostas.

A sociedade, estando em crise, exige da escola e da educação mudanças

para resolver os seus problemas. Na contemporaneidade, a escola, muito mais que

antes, não tem conseguido acompanhar a velocidade das mudanças da sociedade.

As políticas afirmativas implementadas nos últimos dez anos têm afetado a escola e

as professoras e os professores que não têm mais conseguido olhar suas turmas de

forma homogeneizante. O CMI chega num ponto em que as políticas sociais

inclusivas, são imprescindíveis para mantê-lo vivo, pois se os excluídos não

consomem, não tem dinheiro, não gira a roda do capitalismo. A escola ainda não

conseguiu sair do modelo individualista e excludente que, outrora, serviu ao sistema.

A EI é um campo de disputa pelos que detém o poder, através dos processos

de subjetivação, pois desperta interesses políticos, econômicos e acadêmicos. Isso

suscita da professora e do professor atenção, discussão e problematização, saber

do que se trata e a quem atende suas práticas pedagógicas, assumindo seu papel

de especialista desta área de conhecimento e em seu fazer que é ser professora e

professor. Todos os outros especialistas de outras áreas querem, e o fazem, opinar

sobre as práticas pedagógicas e educação, sem que nós, professoras e professores

falemos nada; naturalizamos essas práticas invasivas em nosso fazer por, talvez,

nos faltar convicção e argumentos. Se precisamos de um advogado ou engenheiro,

procuramos um. Não podemos chegar ao juiz e palpitar sobre o trabalho que é do

advogado, não fazemos a planta de nossas casas, pois esse trabalho é do

engenheiro ou do arquiteto. Se eles precisam de uma professora ou um professor,

eles têm que sê-lo(a) para que os procurem e encontrem. Não se pode admitir que

outros profissionais, sem formação em educação, tomem um lugar que é da

professora e do professor. Se querem ser professoras ou professores que estudem

para isso.

Uma política de FC voltada para autorreflexão das professoras e dos

professores torna-se importante para analisar e qualificar as suas práticas na escola

e fora dela, e estas devem ser demonstradas nas práticas cotidianas e nos discursos

e escritas das professoras e dos professores. Tornando assim uma prática reflexiva

e em constante transformação, assim como a vida.

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5. CAMINHOS, POSSIBILIDADES DE ESCUTA DAS PROFESSORAS E DOS

PROFESSORES

As lagartas não podem acreditar na lenda das borboletas

tão antiga entre o seu rastejante e esforçado povo...

mas sua felicidade consiste em relembrar, às vezes,

o absurdo e maravilha desse velho sonho:

o de se transformarem, um dia, em borboletas.

Mario Quintana

Nesta parte do trabalho falo das possibilidades pensadas e experimentadas

para ouvir as professoras e os professores. Chamarei de professoras e professores

e não educadoras e educadores, pois educadoras e educadores todos na escola

podem e devem ser, mas temos funções diferenciadas com cargos distintos. Na

RMEC há um movimento que pode ser interpretado como uma fuga de enfrentar o

embate entre as funções de professoras e professores e monitoras e

monitores/agentes de educação infantil, de chamar todos(as) os(as) profissionais da

educação de educadoras e educadores para abranger tanto professoras e

professores como monitoras e monitores/agentes de educação infantil, porém ao

meu ver, isso descaracteriza tanto um quanto o outro na tentativa de lhes impor uma

identidade fixa homogênea que, nas práticas no cotidiano da escola, não existe. Isso

pode, neste caso, impedir que o grupo de monitoras e monitores e agentes lute por

condições melhores de trabalho, por exemplo.

5.1.RE-TERRITORIALIZAÇÕES DA PESQUISA

Realizei uma pesquisa pautada na abordagem qualitativa através das

narrativas das professoras e dos professores acerca de sua formação e prática

docente na EI.

Para Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Aplicada inicialmente em estudos de Antropologia e Sociologia, como contraponto à pesquisa quantitativa dominante, tem alargado seu campo de atuação a áreas como a Psicologia e a Educação. A pesquisa qualitativa é criticada por seu empirismo, pela subjetividade e pelo envolvimento emocional do pesquisador. (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p.32)

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Trabalhar com a significação dos dados vem ao encontro das pesquisas com

narrativas. Toda narrativa vem carregada de histórias e as histórias carregam muitas

marcas. A partir do momento que a professora e o professor se arriscam a narrar

suas práticas e suas experiências, ela e ele entram num território das memórias.

Essa imersão exige do corpo um trabalho que poderá levar a muitas mudanças, a

partir das reflexões que esse exercício da narrativa exige. Na atualidade quase não

há tempo para pensar nas ações que se foram, as que estão sendo. Muitos(as) se

ocupam de pensar no futuro e a ansiedade toma conta de todos(as). O exercício da

narrativa é reflexivo e, muitas vezes, nos permite lembrar por que fazemos as coisas

de certo modo, se precisamos mudar ou melhorar.

Para tanto, inicialmente, propus um grupo de estudos (Consultar apêndice IV)

que é uma das categorias de ação formativa da Coordenadoria Setorial de

Formação (CSF) da Secretaria Municipal de Educação (SME) que, segundo o

Comunicado da SME /Departamento Pedagógico (DEPE) 01/2015, o grupo de

estudo tem como característica o aprofundamento da reflexão teórico prática,

subsidiado por pesquisas, leituras e partilhas de experiências/ vivências e suas

relações com a realidade pedagógica da Unidade Escolar (UE); a coordenação pode

ser individual ou compartilhada entre os integrantes do grupo. Um dos objetivos,

quando propus o grupo, era que ele se iniciasse com a minha coordenação e que

depois essa coordenação fosse assumida pelas professoras ou pelos professores do

grupo. Os demais objetivos desse grupo de estudos foram:

✓ Questionar, diante do contexto contemporâneo, como se deu a produção de

subjetividades na identidade das professoras e dos professores na Rede Pública e

quais são suas marcas;

✓ Perceber como as subjetividades têm impactado na construção da identidade e nas

Formações Continuadas da professora e do professor de educação infantil e em

suas práticas diante dos desafios contemporâneos, podendo produzir no(a)

professor(a) atitudes reprodutoras do pensamento homogêneo;

✓ Refletir sobre como a formação tem se revelado nos processos pedagógicos ao

longo da história da educação infantil, na postura da professora e do professor em

relação ao que significa ser professora e professor na contemporaneidade e a que

suas práticas têm servido;

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✓ Provocar o olhar sobre como a Formação Continuada tem oportunizado a reflexão, e

as consequentes mudanças das práticas ou tem servido para reforçar paradigmas

que já poderiam ter sido superados;

✓ Identificar como a produção de subjetividades tem afetado a construção da

identidade da professora e do professor de Educação Infantil na

contemporaneidade;

A proposta intitulada “Professores(as) e suas narrativas de formação, marcas

das subjetividades na sua identidade”, publicada em Diário Oficial do Município em

29/02/2016 (Consultar apêndice V), tinha como propósito refletir, utilizando textos de

alguns teóricos considerados pós-estruturalistas e as narrativas das professoras e

dos professores, sobre como a Formação Continuada e as marcas das

subjetividades têm contribuído para a construção das identidades dos(as)

professores(as) de Educação Infantil.

O público alvo seria composto por professoras e professores da Educação

Infantil que atuam ou já atuaram nesta modalidade. A carga horária total seria de 80

horas, 20 encontros, com vagas para vinte e cinco professoras e professores. O

grupo teve quatro inscritos, fato que inviabilizou a execução da proposta, pois a ação

formativa com menos de 25% de inscritos em relação ao número de vagas

oferecidas não forma turma (Consultar apêndice VI). Muitas possibilidades podem

estar associadas a esse baixo número de inscrições, dentre elas o fato de a

proponente ser a coordenadora setorial de formação da CSF e como falar de suas

marcas, memórias, seus desafios e angústias para uma representante do poder

público?

A proposta foi encaminhada seguindo os trâmites exigidos pela CSF, via e-

mail, e analisada pelas coordenadoras pedagógicas (CPs).(Consultar apêndice VII)

Passei por uma entrevista com três CPs. As perguntas feitas para os proponentes

são muito interessantes e desafiadoras. Acabei por aproveitar a entrevista e solicitei

que me deixassem gravá-la para talvez utilizar na dissertação e elas aceitaram.

Elas recebem os proponentes e pedem para que estes falem de sua proposta,

pois a leitura traz várias interpretações e ideias, porém quando os proponentes

falam sobre o que foi proposto eles trazem mais elementos e é mais fácil fazer

recortes, aproximar a proposta das diretrizes, capturar alguns elementos da fala para

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ajudá-lo a organizar ou qualificar a ação formativa. Então a entrevista tem o objetivo

maior de ouvir os formadores proponentes.

Falei então da proposta apresentada e da minha história de vinte e cinco anos

de trabalho na Educação Infantil (EI) que tem marcas fortíssimas de formações

realizadas, pois sempre participei das ações formativas oportunizadas pela

prefeitura. Falei sobre concepção de infância, criança e EI. Contei também um fato

que marcou muito minha vida profissional que foi uma visita em uma escola para

fazermos uma devolutiva da leitura do Projeto Pedagógico (PP)53 e uma professora

fez um desabafo, dizendo que não era professora, pois não dava aula, não tinha giz,

não tinha lousa e não tinha alunos e alunas. Falei que a Educação Infantil não tem

essa especificidade, mas tem muitas outras. Porém essa fala foi muito marcante e

pensei sobre quantas e quantos professoras e professores de Educação Infantil

poderiam sentir isso e não expressar. Por que uma professora ou um professor de

EI não se sente professora ou professor?

A autora Rita de Cássia Marchi traz, em seu artigo intitulado O “ofício de

aluno” e o “ofício de criança”: articulações entre a sociologia da educação e a

sociologia da infância algumas, reflexões sobre essa discussão:

O princípio da infância como construção social questiona a ideia desta como categoria definida simplesmente pela biologia e passa a entender seu significado como variável do ponto de vista histórico, cultural e social e sempre sujeito a um processo de negociação tanto na esfera pública quanto na privada. Desta negociação, participam tanto os adultos (e as diversas estruturas e instituições sociais) quanto, em condições desiguais de ação e poder, as próprias crianças. (MARCHI, 2010, p. 184-185.) A gênese e constituição da Sociologia da Infância diferem de país para país, mas algumas preocupações e questões centrais são comuns à disciplina: 1) a necessidade de "desescolarizar" a abordagem da criança, pois esta não se resume às questões colocadas pela existência da criança somente enquanto "aluno"; 2) a necessidade de opor ao modelo teórico clássico da socialização o modelo da infância como grupo de idade que tem cultura própria; 3) opor ao modelo determinista da infância o da criança como produto e produtora de cultura, 4) opor ao modelo da vulnerabilidade natural da criança a visão da infância como um grupo de idade que apresenta uma vulnerabilidade estrutural, socialmente construída. (MARCHI, 2010, p 185.)

53 No Núcleo de ação educativa descentralizada havia a prática de, após as leituras do projeto

pedagógico (PP), irmos até a escola para fazer uma devolutiva da leitura e apontamentos e ouvir a equipe sobre o PP. A visita era realizada pela CP e o supervisor educacional responsáveis pela leitura do documento.

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A desescolarização da criança e de professoras e professores não é tarefa

fácil e a Sociologia da Infância tem tentado demonstrar o novo espaço para bebês e

crianças.

Além das questões de metodologia e interpretação propriamente voltadas ao mundo das crianças, estudar a infância por "mérito próprio" significa resgatá-la de sua invisibilidade, isto é, não deduzi-la simplesmente de instituições como a escola e a família ou de seus agentes, pais e professores, que têm sido os únicos socialmente habilitados – ao lado dos próprios analistas – para falar sobre e em nome das crianças e da infância.

(MARCHI, 2010, p. 188)

Marchi faz a reflexão sobre como o afastamento inicial que ocorreu entre

disciplinas afins como são, particularmente, a Sociologia da Educação e a Sociologia

da Infância pode ser (re)convertido em contribuição recíproca:

Neste sentido, o momento durante o qual foi necessário realçar as ‘diferenças‘ entre estas disciplinas parece ter chegado ao fim e, doravante, para o progresso de ambas, faz-se necessário trabalhar em conjunto com o objetivo de aproveitar o quê de valioso cada disciplina tem a oferecer. Se os estudos sociais contemporâneos sobre a infância e a criança não podem mais permanecer restritos aos espaços e problemas relacionados somente à sua educação (tanto na escola quanto na família), também é verdade que a infância contemporânea permanece em grande parte determinada por este recorte institucional. E é isto, sabemos, o que também a constitui enquanto uma estrutura social. Consoante, a intensificação da interdisciplinaridade dos estudos sobre a infância (um campo que é, por sua natureza, necessariamente multidisciplinar) é parte imprescindível de uma proposta que vise fazer progredir estes estudos de forma particular em cada campo e de uma forma geral e integrada a todos eles. (MARCHI, 2010, p. 196)

É um trabalho árduo para professoras e professores a construção de

identidades específicas na EI, pois sua formação inicial traz uma identidade fixa de

professora e professor com concepções de Ensino Fundamental, aluno, disciplina,

habilidades, competências, componentes curriculares, sala de aula etc. Por isso na

EI foi importante até mesmo a mudanças de termos como de aluno para criança,

classe por turma, de sala de aula para sala de referência. Todo espaço da EI é

considerado local de aprendizagem e todo trabalho da professora e do professor é

especificidade de ser professor na EI. Danilo Russo em seu texto que é também seu

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plano de ensino para uma turma de EI fala sobre tudo que acontece no trabalho

docente como professor de EI como o exemplo abaixo:

No trabalho com as palavras, faço, em geral, vários tipos de operações. A operação de nomeação, de enriquecimento lexical com base nas coisas e nas ações que por acaso ocorram na turma, é a mais comum, e obrigatória no meu papel. O resultado dessa operação - quando funciona - é um vocabulário de palavras concretas (digamos: substantivos, verbos, adjetivos), que se consolidam e se tomam hábitos lingüísticos à medida que objetos e ações se tomam hábitos práticos. Depois, começo a nomear coisas fora da sala, ou abstratas, e isso introduz a questão do significado, a exigência de explicar uma palavra, sem a possibilidade de indicar com o dedo o objeto correspondente. Faço isso quando é possível e não me interessa se tem só um me escutando ou 20. Preocupo-me, porém, em colocar na ordem do dia para esta própria turma a pergunta "o que significa". Nem sempre me interessa o rigor da resposta, nem sempre dou a minha, freqüentemente bastam as respostas que vêm de uma das crianças. Acho que é em torno disso que deveriam girar as perguntas que fundamentam o trabalho docente, inclusive na universidade. Quanto vale a voz que ensina? Ela merece sempre e em qualquer circunstância o máximo de audiência? Tem sempre o direito de se impor a todos e todas, tanto ao explicar as integrais, como ao dar instruções para colar a velinha para a festa do dia dos pais? Em que condições tem esse direito? E se não fosse assim, de que outra maneira poderia falar a minha voz para o grupo de pessoas que ensino? Perdendo o quê? Ganhando o quê? (RUSSO, 2007, p. 73 - 74)

O autor também fala da autoridade da professora e do professor da EI que

não combina com autoritarismo e pode ser uma construção coletiva para e com as

crianças:

Eles já me vêem muito como quem manda, e isso reflete o excesso de diretividade que, evidentemente, emano; e já surgiu a discussão sobre se tenho ou não tenho sempre razão (eu apoiava a segunda posição, com exemplos e tudo...). E, mais ainda, fazer disto uma conversa interessante, não tendo em vista uma conclusão, mas a construção de um espaço de pesquisa e de reflexão infantil, parece-me, apenas, a seqüência natural. Como adoro dizer, vou tentar torná-lo provável. Já estou sempre prestando a atenção para que o que meninos e meninas me vêem fazer seja sempre questionável, não apenas por parte de curiosidades adultas, mas também, por parte dos próprios meninos e meninas. Quando isso acontece, e percebo que por quase um ano vou poder contar com o fato de que meninos e meninas, para me imitar, para me substituir, para debochar de mim, para me criticar ou para me elogiar, já se questionaram sobre como eu funciono, não preciso mais me dar esta tarefa, ou seja, de fazer um lembrete das minhas incumbências "didático-educativas", de tão convencido estou de que aí esteja a melhor abertura para o relacionamento entre adultos e meninos e meninas. (RUSSO, 2007, p. 71 )

Escrever sobre o fazer com e para as crianças é um dos recursos

metodológicos da professora e do professor de EI, pois enquanto escreve sobre o

fazer vai criando novos fazeres e as identidades específicas da professora e do

professor de EI.

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Na época das devolutivas de PP (2009 a 2012), quando aconteceu o fato que

narrei acima, nós, as CPs do Núcleo de ação educativa descentralizado (NAED),

fizemos um trabalho muito intenso com as professoras e professores e seus planos

de trabalho, com objetivo de que aparecessem as concepções de infância, de

criança, de EI, do brincar e de todas as especificidades que a EI tem. Esse trabalho

trouxe à tona muitas discussões e depoimentos como o relatado acima gerando em

mim desassossegos em relação à produção das identidades da professora e do

professor de EI.

Expliquei para as CPs que eu queria, com o grupo de estudo, refletir sobre as

marcas que as professoras e os professores trazem através de suas narrativas

sobre sua trajetória profissional e de formação continuada.

As CPs também me questionaram sobre o porquê usar ideias de autores pós-

estruturalistas e, então, refleti que sempre estive a procura de ideias que fossem

inclusivas e essas ideias só vieram ao encontro desse desejo. Conheci esses

autores ao ingressar no mestrado e isso me fez refletir sobre como podemos

avançar e sermos inclusivos e não apenas tolerantes.

Outras sugestões das CPs foram: como eu faria o trabalho com as narrativas

e me sugeriram cartas, porém preferi encontrar com as professoras e os professores

o jeito de narrar suas memórias e que eu deveria escolher um dos objetivos, pois

havia muitos itens de pesquisa e que seriam necessários alguns recortes, o que me

fez perceber que realmente estava muito amplo. Apesar de muito ter contribuído

para minha dissertação não foi possível realizar o grupo e, então, decidi utilizar outro

procedimento metodológico, o questionário.

Segundo Gerhardt e Silveira (2009) o:

Processo de elaboração do questionário requer a observância de normas precisas, a fim de aumentar sua eficácia e validade. Em sua organização, devem-se levar em conta os tipos, a ordem, os grupos de perguntas, sua formulação, além de tudo aquilo que se sabe sobre percepção, estereótipos, mecanismos de defesa, liderança etc. Existem três tipos de questões: fechadas, abertas e mistas. Nas questões abertas, o informante responde livremente, da forma que desejar, e o entrevistador anota tudo o que for declarado. Nas questões fechadas, o informante deve escolher uma resposta entre as constantes de uma lista predeterminada, indicando aquela que melhor corresponda à que deseja fornecer. Este último caso favorece uma padronização e uniformização dos dados coletados pelo questionário maior do que no caso das perguntas abertas. Contudo, a maior parte dos questionários apresenta uma proporção variável entre os dois tipos de questões. As questões mistas (fechadas e abertas) são aquelas em que,

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101 dentro de uma lista predeterminada, há um item aberto, por exemplo, “outros”. Pré-teste do questionário Depois de redigido, o questionário precisa ser testado antes de sua utilização definitiva, por meio da aplicação de alguns exemplares em uma pequena população escolhida. (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p.70)

Foi aplicado um questionário (Consultar apêndice VIII) com perguntas mistas

contendo 15 perguntas abertas e 26 fechadas que foi enviado para todos os e-mails

das professoras e dos professores da EI, os quais me foram fornecidos pela

Secretaria Municipal de Educação de Campinas, que autorizou a minha pesquisa.

(Consultar apêndice IX). No e-mail, as professoras e os professores eram

convidados a participar da pesquisa, além disso, havia uma breve apresentação da

pesquisa e seus objetivos, bem como da pesquisadora.

Apenas vinte e um professoras e professores responderam de um universo

de mais ou menos mil e duzentos profissionais. Apesar de ser um número pequeno

em relação ao todo, percebi que o questionário ficou longo, fiz testes antes, mas na

prática, as perguntas abertas exigiram tempo e disponibilidade dos(as) participantes,

mais do que pensei. Essa foi uma limitação com que me deparei, ao optar pelo uso

de questionário on-line utilizando o Google Docs54, pois após iniciar as respostas

não é permitido parar e voltar da questão onde parou.

Duas reações de professoras e professores me surpreenderam, pois ao

receber o e-mail da pesquisa ficaram muito bravas e retornaram:

“Boa tarde. Gostaria de saber onde conseguiu meu e-mail e informações sobre minha profissão. No aguardo.” “Por gentileza retirar meu e mail dos seus contatos, não me recordo de tal permissão. Sem mais”

Respondi os e-mails explicando que se tratava de uma pesquisa conforme

apresentação no corpo do e-mail e ficou tudo bem. Entretanto fiquei pensando como

professoras e professores que deveriam, pela própria essência do cargo, serem

pesquisadores(as) recebem uma pesquisa desta forma? Possivelmente, não

compreenderam que se tratava de um convite a participar da pesquisa, tendo

54 Google Docs é um conjunto de programas para criação, edição e compartilhamento de textos,

planilhas, gráficos, desenhos, banco de dados e formulários de pesquisa. Tais programas rodam em sistema web, ou seja, dependem de um navegador de internet para funcionar. Especificamente no caso dos formulários, a edição posterior das respostas pode ser habilitada ou não pelo autor da pesquisa.

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compreendido como uma imposição já que o convite partia de uma CP ou se

assustaram com o controle que a internet pode ter sobre sua vida pessoal. Outras e

outros professoras e professores justificaram que não estavam mais trabalhando.

Optei por nomear os(as) participantes do questionário com cores de

borboletas para manter o anonimato garantido aos participantes, quando do convite

a sua participação na pesquisa.

Tabela 1- números de participantes, nomes, data, hora, idade e sexo.

PARTICIPANTES DATA HORA IDADE SEXO

1 Borboleta Rosa 27/04/2016 22h52min 42 Feminino

2 Borboleta Amarela 28/04/2016 14h52min 42 Feminino

3 Borboleta Verde 28/04/2016 19h18min 39 Feminino

4 Borboleta Roxa 29/04/2016 10h25min 34 Feminino

5 Borboleta Preta 29/04/2016 16h22min 43 Feminino

6 Borboleta Branca 29/04/2016 17h23min 47 Feminino

7 Borboleta Vermelha 29/04/2016 17h32min 30 Feminino

8 Borboleta Marrom 29/04/2016 22h52min 43 Feminino

9 Borboleta Caqui 01/05/2016 18h43min 38 Feminino

10 Borboleta Laranja 02/05/2016 16h26min 39 Feminino

11 Borboleta Lilás 02/05/2016 19h43min 28 Feminino

12 Borboleta Cinza 02/05/2016 19h53min 34 Feminino

13 Borboleta Dourada 02/05/2016 23h05min 25 Feminino

14 Borboleta Salmão 03/05/2016 20h17min 27 Feminino

15 Borboleta Bege 07/05/2016 08h59min 37 Feminino

16 Borboleta Azul Céu 04/06/2016 09h28min 46 Feminino

17 Borboleta Prateada 07/06/2016 07h09min 37 Feminino

18 Borboleta Verde Escuro 07/06/2016 12h14min 38 Masculino

19 Borboleta Colorida 07/06/2016 14h17min 44 Feminino

20 Borboleta Azul 13/06/2016 01h26min 46 Feminino

21 Borboleta Azul Turquesa 20/06/2016 02h57min 32 Masculino

A escolha da borboleta não foi aleatória, mas sim por ser considerada

um símbolo da transformação. Suas transformações são muito significativas e são

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marcadas por períodos e fases bem diferenciadas. Partindo da leitura das respostas

apresentadas pelas professoras e pelos professores participantes da pesquisa e

apoiando-me no referencial teórico apresentado no trabalho farei análise dessas

transformações e dos significados atribuídos pelas professoras e pelos professores

à sua prática docente na EI e suas marcas.

A professora e o professor também são transformados pelas suas marcas e

transforma suas práticas a partir delas, segundo a frase de Freire (1995) ninguém

começa a ser professora ou professor numa certa terça-feira às quatro horas da

tarde... Ninguém nasce professora ou professor ou marcado para ser professora ou

professor. A gente se forma como educadora e educador permanentemente na

prática e na reflexão sobre a prática. Assim gostaria de ouvir as professoras e os

professores e saber sobre essas transformações.

A faixa etária dos(as) participantes é bem variada, o que possibilita apreender

maior diversidade nas marcas e experiências das professoras e dos professores.

Três professoras e professores têm entre 25 e 29 anos, quatro têm entre 30 e 34

anos, seis têm entre 35 e 39 anos, cinco têm entre 40 e 44 anos e três professoras e

professores têm entre 45 e 49 anos.

O quadro acima apresenta o horário que o questionário foi respondido, pois

isso pode dizer um pouco sobre em quais horários as professoras e os professores

podem fazer essas reflexões. Observei que a maioria das professoras e dos

professores respondeu nos períodos vespertino e noturno. Em Campinas as turmas

de Educação Infantil são, em sua maioria, no período matutino. Percebi que elas e

eles realmente dedicaram um tempo ao questionário.

O sexo dos(as) participantes, 19 do sexo feminino e 2 do sexo masculino,

demonstra uma realidade na EI: que há um número muito maior de mulheres nesta

modalidade da Educação Básica (EB). “O fato do trabalho docente na Educação

Infantil se constituir, em sua maioria, por mulheres o torna uma profissão feminina?

Quais as fronteiras entre o trabalho masculino e o feminino nestes espaços?”

(VENTURINI; THOMASI, 2013, p. 2)

Esses questionamentos estão presentes na EI onde a figura masculina ainda

é muito discriminada e alvo de preconceitos e estereótipos da vocação e missão

feminina. Entretanto somos profissionais da educação, estudamos para isso. Não

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deveriam existir fronteiras entre o trabalho masculino e feminino no espaço

educativo.

De acordo com autores como Kramer (1994) e Codo (1998), a identidade docente na educação infantil se justifica por uma relação entre o cuidar e o educar existente nas salas da educação infantil. Estes aspectos são expressos nos vínculos da identidade da professora com parentes (tia, mãe) e no próprio atendimento às necessidades básicas da criança. Em pleno século XXI, pode-se constatar que essa ainda é uma concepção vigente nas escolas que oferecem a educação infantil. Mas, de todo modo torna-se importante destacar que, embora de maneira tímida, o percentual de professores do sexo masculino seja mínimo, ele é existente e tais perspectivas apontam para um cenário de mudanças que se estende à busca de uma identidade para o profissional desta modalidade de ensino (VENTURINI; THOMASI, 2013, p.8).

Há o preconceito de que homens não sabem cuidar e a mulher já é criada

para isso. Essa é uma subjetivação antiga que, infelizmente, na contemporaneidade

ainda gera muitas discussões. Homens e mulheres educam e cuidam, pois isso é

inerente à profissão na EI. Segundo Souza e Tebet (2015) que escreveram sobre os

estudos de Ana Lúcia de Goulart de Faria:

Faria aponta para as instituições de educação infantil como o espaço da sociedade onde se vivenciam as mais distintas relações de poder: gênero, classe social, idade e etnia. A autora afirma que há uma trajetória promissora na pesquisa sobre a pequena infância e a relação de gênero na educação infantil, tanto em creches quanto em pré-escolas, e destaca que pesquisas sobre brincadeiras e jogos entre meninos e meninas, ou sobre desenhos como documentos de meninos e meninas, por exemplo, tem mostrado outras formas de construção cultural do feminino e do masculino. De acordo com a pesquisadora, a presença masculina nas creches tem questionado o “cuidado” como manifestação exclusivamente feminina, exemplo que aponta para uma sociedade mais justa e menos sexista. Para Ana Lúcia, a superação da desigualdade social com certeza passa pela educação e convivência com diferenças nos espaços coletivos na esfera pública desde a primeira infância. (SOUZA; TEBET, 2015, p.118)

Apesar de tímidas, o aparecimento da figura masculina na EI poderá ajudar

nas descontinuidades de paradigmas em relação às mulheres.

Como escolhi, na segunda parte do trabalho, contar uma breve história da EI

com as diretrizes e leis, pensei ser importante saber em que ordem as professoras e

os professores acreditam que esses documentos afetam a EI. A participante

Borboleta preta incluiu a Lei 12.796/2013 que tornou obrigatório a matrícula da

criança de quatro anos até o adolescente de dezessete anos, bem como solicitou

novamente, como condição mínima para o exercício da docência na educação

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infantil e nos cinco primeiros anos da educação fundamental, o ensino normal

superior.

A grande maioria dos(as) participantes escolheu a Lei de Diretrizes e Bases

para Educação (LDB), a Constituição de 1988, as Diretrizes Municipais e o Estatuto

da Criança e do Adolescente (ECA) como as mais relevantes e que mais

impactaram na EI (Consultar apêndice X). Esses também foram os documentos que

escolhi na segunda parte do trabalho para contar um breve histórico da EI. Isso pode

demonstrar que essas leis fizeram a diferença na EI em Campinas, pois foi a partir

desses documentos que a EI começa a deixar de ser somente assistencialista e

passa a ser percebida por seu cunho educativo.

Todos os marcos legais produziram muitas inquietações nos pesquisadores e

na esfera pública e suas políticas. Essas leis também motivaram a construção das

diretrizes municipais que sempre estiveram abertas a novas construções.

Interessante destacar que o que mais influenciou a escrita do documento atual

‘Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil: um processo

contínuo de reflexão e ação’ de Campinas, foram as práticas das professoras e dos

professores que, em suas formações, já estavam discutindo novas práticas, novos

conceitos, lendo outros autores e mudando o olhar em relação à criança, infância e

EI. As CPs através das visitas nas escolas, leitura dos PPs e ações formativas

percebiam a necessidade de reconstruir o primeiro documento, Currículo em

construção, pois ele não atendia mais as práticas nas escolas.

Pensando que tudo que acontece nas esferas políticas, sociais e econômicas

nos afeta e, muitas vezes, nos subjetiva, solicitei que abordassem no questionário

quais foram as formações inicial ou continuada (magistério55, graduação e pós-

graduação) dos(as) participantes, ano de conclusão e se foram realizadas em

escolas ou universidades públicas ou privadas. E, logo após essa pergunta, pedi que

citassem um fato social, um político e um econômico da época de suas formações.

O objetivo era que buscassem em suas memórias as marcas nos períodos de suas

formações.

55 Extinto em função dos art. 62 e 63 da LDB 9394/96. Em Campinas a exigência mínima para

ingresso no cargo de professor e professora de EI é o curso de pedagogia.

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Das entrevistadas e entrevistados, 29% cursaram magistério, 13% em

escolas particulares e 87% em escolas públicas. Sobre o ano de conclusão 33%

concluíram entre1985 e1989, 2% entre 1990 e 1994 e 47% entre 1995 e 1999.

Em relação à graduação, 100% das professoras e dos professores cursaram

Pedagogia. Duas participantes cursaram primeiro outro curso, a Borboleta Colorida

cursou Educação Física e a Borboleta Azul Céu cursou Publicidade. Metade dos

entrevistados cursou graduação em universidades públicas e a outra metade em

universidades particulares (Consultar apêndice XI).

Sobre o ano de conclusão 1% concluíram entre 1991 e 1995, 24% entre 1996

e 2000 29% entre 2001 e 2005, 19% concluíram entre 2006 e 2010 e 19% entre

2011 e 2015.

Em relação à pós-graduação 81% cursam sendo 35% stricto senso e 65%

lato senso. Em relação ao tipo de instituição 35% cursaram em universidades

públicas e 65% universidades particulares (Consultar apêndice XII).

Sobre o ano de conclusão 11% estão cursando, 63% concluíram entre 2011 e

2015, 16% entre 2006 e 2010 e 11% antes de 2005.

Diante dos dados, pude observar que no curso do magistério, a maioria das

entrevistadas e dos entrevistado estudou em instituições públicas; na graduação, as

instituições públicas e privadas estão bem equilibradas, porém na pós-graduação já

vemos que a instituição privada ocupa 65%. Isso provavelmente se dá pelo fato de

as instituições de ensino superior públicas não dão conta de atender a demanda.

Observei também que a conclusão do curso de magistério aconteceu antes de 2000,

a graduação entre 1991 e 2015 e a pós-graduação 2000 até 2016. Dos temas mais

cursados na pós-graduação, o curso de psicopedagogia tem destaque, acredito que

ainda por influência da psicologia tão forte na EI, principalmente, no período entre os

anos de 1990 a 2000.

Pode-se concluir que essas professoras e esses professores passaram por

várias fases dos processos históricos sociais, políticos e econômicos do nosso país,

portanto, têm muitas marcas. Pedi-lhes que citassem fatos sociais, econômicos e

políticos que lembrassem da época de suas trajetórias de formação inicial e

continuada. Segundo Rolnik (1993) à medida que vamos mergulhando na memória

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para buscar os fatos e reconstituir sua cronologia, adentramos numa outra espécie

de memória, uma memória do invisível feita não de fatos, mas de marcas.

Para análise dos fatos sociais, políticos e econômicos citados pelos(as)

participantes, escolhi trechos de suas respostas e as palavras que mais e maiores

apareceram e as que menores apareceram nos quadros que foram feitos no Google

drive a partir das respostas das entrevistadas e dos entrevistados (consultar

apêndice XIII, XIV e XV). Nesses quadros as palavras têm tamanhos maiores por

ordem de citação nas respostas. Quando mais citado, maior aparece.

Primeiramente gostaria de ressaltar que separar fatos políticos, econômicos e

sociais é muito difícil, mas as questões separadas foram propositais. Apenas o

participante Borboleta Azul Turquesa fez essa consideração sobre a dificuldade e

até mesmo a impossibilidade de separar esses fatos, porém ele fez a tentativa.

Talvez por isso 7 entrevistadas e entrevistados não responderam a essas três

questões deixando-as em branco. Desses 7, um respondeu apenas ao fato político

colocando sobre impeachment do presidente Collor, aliás um dos fatos mais citados

pelas entrevistadas e pelos entrevistados. Penso que é muito impactante e marcante

pensar que o “povo” consegue tirar um político que faz algo de errado. Infelizmente

atualmente temos vivido experiências que nos mostram que não é bem o “povo” que

decide isso. Trata-se de um processo de subjetivação que ficou desvelado? Ou

agora podemos perceber melhor essas tramas do CMI? E o que fazer? Não dá para

enfrentar com guerra, então, penso que a revolução deve ser molecular como a

proposta de Guattari.

O participante Borboleta Azul Turquesa respondeu “não lembro” para as três

questões. Isso realmente me instiga como não lembrar nenhum dos tantos fatos que

acontecem diariamente em nossas vidas?

Alguns(as) participantes descreveram que foram marcados por fatos que

causam muita tristeza e prejuízos aos seres vivos e ao meio ambiente, tais como:

acidente radioativo em Chernobil, vírus da AIDS, aumento da fome e pobreza no

país, tragédia na cidade de Mariana-MG, conflito Oriente Médio e guerras.

Outros(as) participantes descreveram fatos que são lutas por direitos, tais

como: LDB 9394/96, início da extinção do curso de magistério, Programas Bolsa

Família, FIES e PROUNI, queda do muro de Berlim, ENEM, discussões sobre

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discriminação e valorização das diferenças, discussão sobre meio ambiente entre

países.

Outros(as) participantes descreveram fatos culturais Rock brasileiro,

programas que passam na televisão, redes sociais, visita do papa João Paulo ao

Brasil, produção cultural intensa, bares na cidade de Campinas.

Veja que somente 14 participantes puderam elencar todas essas marcas,

imagine quantas delas nos afetam diariamente, acontecem e nos acontecem.

Precisamos transformá-las, revitalizá-las ou reatualizá-las. Ou seria mais fácil não

lembrar? Penso que não lembrar é um ato de covardia conosco e com nossas

crianças. Afinal somos professoras e professores e não podemos nos dar ao luxo de

esquecer o que acontece nos contextos históricos.

5.2. MARCAS QUE MOTIVARAM O TORNAR-SE PROFESSORA OU

PROFESSOR

Tantos fatos expostos acima e nos quadros (consultar apêndice XIII, XIV e

XV) e tantas marcas que podem se transformar em potência de vida pelas

professoras e pelos professores. E o mais importante, que poderão vivenciar

experiências com as crianças e, não somente, experimentos o que é muito diferente

de experiência.

Sobre os fatos marcantes que motivaram as(os) participantes da pesquisa a

se tornarem professoras e professores da EI, as palavras que mais se destacam nas

respostas foram: professora, educação, infantil, fazer, trabalho, ser e criança

(Consultar apêndice XVI). As respostas foram diversificadas e provocadoras de

reflexões

Destaco algumas respostas para discussão. O primeiro destaque é sobre

quatro professoras e professores que não responderam à questão. Fico pensando:

será que não tiveram nenhum fato marcante que os motivaram a se tornar

professoras e professores de EI?

A Borboleta Prateada respondeu que sua motivação foi o fato de sua mãe ser

professora. As borboletas Rosa, Colorida e Caqui também tiveram como motivação

pessoas como mãe, tia que eram professoras:

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Muitos fatos me motivaram a tornar-me professora de Educação Infantil, mas o que me levou a escolha de fato foi que quando criança, às vezes, eu acompanhava minha mãe ao trabalho (ela também era professora), e eu amava brincar de professora nas salas vazias... Essa brincadeira foi se tornando um prazer cada vez maior...Borboleta Rosa Tive influência de minha tia. Eu achava importante a possibilidade de contribuir na formação de outras pessoas. Borboleta Caqui Acompanhar a vivência de minha mãe enquanto professora de educação infantil, a importância do desenvolvimento infantil e as vivências na graduação e no magistério. Borboleta Colorida

Isso pode demonstrar que não nascemos professoras e professores, mas

vários acontecimentos vão nos passando, nos tocando e nos formando ou

transformando.

Dir-se-ia que Kertérsz nomeia aqui a relação clássica entre experiência e formação: a experiência é o que me acontece e o que ao me acontecer, me forma ou me transforma, me constitui, me faz como sou, marca minha maneira de ser, configura minha pessoa e minha personalidade. Por isso o sujeito da formação não é o sujeito da educação ou da aprendizagem e sim o sujeito da experiência: a experiência é a que forma, a que nos faz como somos, a que transforma o que somos e o que converte em outra coisa. (LARROSA, 2015, p. 48)

Todas as respostas parecem estar ligadas a experiências, pois são

marcantes. Nelas observamos os fatores sociais, econômicos e políticos que muito

afetam todos os sujeitos, principalmente na contemporaneidade, onde se confunde

informação com conhecimento, experimento com experiência, ter com ser,

perpetuando binarismos que tentam fixar a identidade.

Algumas respostas já vislumbram mudanças na maneira de tratar o

conhecimento na EI como a da participante Borboleta Azul Turquesa que tem olhar

para um trabalho na EI além dos conteúdos e áreas do conhecimento, para um

trabalho de autoria e produção de cultura das e pelas crianças, numa gama de

experiências cotidianas.

Durante o estágio curricular da educação infantil vi as possibilidades para um trabalho docente além dos conteúdos e áreas do conhecimento, para um trabalho de autoria e produção de cultura das e pelas crianças, numa gama de experiências cotidianas. Borboleta Azul Turquesa

Também sobre experiências profissionais as Borboletas Azul, Roxa, Preta e

Laranja escrevem:

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O fato marcante relaciona-se a "escolha". A opção por uma profissão era tomada ainda muito cedo. Aos 14 anos isso era decidido e ninguém queria errar. O erro custaria anos de estudo. Por isso, teste de vocação profissional era muito utilizado na época. Mas fui influenciada a fazer o magistério, já que no teste vocacional surgiram profissões que não gostava tanto assim. E foi no magistério, durante os estágios, que gostei muito da educação infantil. Comecei a lecionar numa escola pequena, no bairro onde morava. E na década e 1990 prestei concurso público e insisti em permanecer na educação infantil. Acredito que fui escolhida pela educação infantil também: pelo desafio, pela motivação em querer fazer diferente, pelo respeito às crianças, pelas mudanças que ela me proporcionou. (Borboleta Azul) Foi na época do estágio do Magistério. Eu fazia estágio numa escola pública municipal de Campinas e a professora da turma de Educação Infantil ensinava a cobrir o pontilhado do número 1. Se as crianças não seguissem a flecha indicativa do traço, ela apagava e a criança deveria refazer... Sempre pensei que aquilo poderia ser ensinado de outra maneira!!! (Borboleta Roxa) A significativa experiência profissional vivenciada na implementação de uma política pública de educação básica no município de Guarulhos/SP. (Borboleta Preta) Os estágios na graduação foram desencadeadores do desejo de trabalhar com essa etapa da educação básica. (Borboleta Laranja)

Há inúmeras formas de ensinar os números, por exemplo, a Borboleta Roxa

percebeu isso na observação da prática da professora ou do professor e, hoje,

temos outras formas de ensinar, a criança precisa aprender o uso social do número,

na sua data de aniversário, no número da sua casa, do seu telefone, sua idade etc.

Para Borboleta Cinza a aprovação num Concurso foi seu motivador e para

Borboleta Azul Céu foi a remuneração salarial. Mais duas professoras tiveram esses

motivadores:

Na verdade eu não tinha outras possibilidades financeiras para fazer outro curso a não ser o normal, então queria fazer um que me desse uma oportunidade de ter uma profissão logo para me sustentar. (Borboleta Amarela) Passei no concurso, no começo preferia o fundamental, mas depois o trabalho com a fantasia, histórias e imaginação ampliaram o horizonte da função de professora, acabei apaixonada pela magnitude dos fazeres pertencentes ao território da Infância. (Borboleta Verde)

Para 62% das(os) participantes a escolha de se tornar professora e professor

sempre foi uma opção, porém a porcentagem 38 % de professoras e professores

que não escolheram se tornar professor de EI também é significativa. Acredito que

isso se deu, pois a história da EI como modalidade da EB é recente e a formação

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para EI também iniciou nos anos noventa. A resposta da Borboleta Lilás demostra

isso:

Na verdade nunca tinha pensado em ser professora de Educação Infantil. Desde muito cedo, me encantava pela alfabetização, pela descoberta das letras, o mundo todo que se abria aos olhos da criança. Ser professora de Educação Infantil simplesmente aconteceu, e foi uma grande descoberta. (Borboleta Lilás)

À medida que as ações educativas foram se agregando às ações de cuidado,

nós, as(os) profissionais da educação, fomos destacando as especificidades da EI,

criando novas formas de vivenciar o conhecimento, o saber para e com as crianças.

Questões como gênero, sexualidade, etnia, raça, classe social, brincar, inclusão,

laicidade, entre outros, estavam em pauta, à tona. Para tanto foi de extrema

necessidade definirmos quem são as(os) profissionais da EI, a criança e a

concepção de infância.

5.3. CONCEPÇÕES DE INFÂNCIA DAS PROFESSORAS E DOS

PROFESSORES ENTREVISTADOS

A criança sempre existiu, porém a infância é uma construção social.

As crianças sempre existiram desde o primeiro ser humano, e a infância como construção social […] desde os séculos XVII e XVIII. Nada poderia, por consequência, explicar esta atenção recente em todo o mundo não fora o facto dos tempos actuais introduzirem novas circunstâncias e condições à vida das crianças e à inserção social da infância. (SARMENTO; PINTO, 1997, p. 11 – grifo dos autores)

Pela relevância do tema infância e por ser uma construção social perguntei

aos(as) participantes o que era infância para elas e para eles. A Borboleta Laranja

ressaltou na resposta que a infância é uma construção social que indica um tempo

da vida, o direito de ser criança reforçando a ideia destacada acima.

Há nas respostas 15 citações sobre infância como etapa, fase, momento,

período, tempo56. Entretanto a Borboleta Salmão considera a infância

56 “A infância é muito mais que uma fase da vida; é a melhor fase da vida. É a fase das descobertas, dos aprendizados, do início do convívio social e de demonstração sincera de sentimentos.” Borboleta Rosa “Tempo de vivência.' Borboleta Amarela “Uma fase importante da vida, do desenvolvimento humano, com características próprias, cheia de segredos que nós adultos já esquecemos.” Borboleta Verde “Infância é uma fase humana em que podemos desenvolver muitas capacidades. A criança tem direitos e é capaz de se expressar, de aprender de contribuir com os colegas.” Borboleta Roxa

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“Encantamento do mundo” e as Borboletas Bege e Azul indicaram que a infância é

muito além de um espaço de tempo pré-determinado:

A Infância é um processo de produção da modernidade, pois houve a necessidade num dado momento histórico de diferenciá-la do adulto, ou de uma outra fase da vida. E, a partir desta visão, cria-se instituições, objetos, roupas, etc, como meios reguladores de infância que foram diferenciados dos de adultos. Atualmente, outras ciências têm contribuído para ampliar as concepções sobre a infância tratando-a, inclusive, no plural por entenderem que deve ser compreendida como uma construção social marcada por uma época, uma localidade, pelo gênero, pela condição social. Borboleta Azul Infância é comumente considerada a etapa de vida da criança; esse é o entendimento socialmente aceito, o que tem grande importância, visto que é uma escolha 'cultural', de um grupo. Porém, pra mim, infância é algo mais profundo, carregado de significados... É um estado de brincar, de verdade, de bem viver, de bem escolher, um estado de prazer e de busca incessante da felicidade e realização do ser... sonho, criação, ação, tudo autêntico, intencional. É encantamento, sensibilidade, poesia...Borboleta Bege

“Infância compreendo como a fase do nascimento da criança até a puberdade e uma fase importante da vida, devido as estruturas psíquicas que se estabelecem e que definem o indivíduo para toda sua vida.” Borboleta Preta “Tempos de descobertas e de brincar.” Borboleta Vermelha “É aproveitar a melhor fase da vida, brincar, conhecer o mundo, surpreender-se com coisas simples da vida.” Borboleta Marrom “Descoberta, criação, invenção, ludicidade, brincar, explorar, vivenciar, sentir com o corpo todo. Infância é momento de encantamento com coisas mais simples, acompanhar o caminho das formigas, descobrir o exoesqueleto da cigarra e querer fazer uma coleção... é disputar território, brinquedo, afeto, chorar porque "ele não quer ser meu amigo" e fazer as pazes no mesmo segundo. Infelizmente, há também outras infâncias, as que têm que trabalhar, cuidar dos irmãos mais novos, que convivem com drogas, prostituição, são tantas as infâncias, múltiplas e únicas.” Borboleta Lilás “Depende de cada cultura, cada criança pode ter uma infância diferente, deveria ser um período em que as crianças deveriam brincar, estudar e receber cuidados.” Borboleta Cinza “Infância é a etapa da vida na qual iniciamos nossas experiências com o outro e com o mundo que nos cerca, período no qual começamos a construção de nossa identidade e consolidamos valores importantes para toda a vida. Aprendemos as primeiras palavras, as primeiras regras de convivência, estabelecemos os primeiros vínculos e é uma fase, na qual estamos dispostos a qualquer desafio, conhecemos pouco sobre o que é ter medo. Nos lançamos às descobertas.' Borboleta Dourada “Período mais importante do desenvolvimento humano.” Borboleta Azul Céu “Momento fundamental de desenvolvimento de emoções.” Borboleta Prateada “Infância é o momento de descoberta, do aprendizado lúdico.” Borboleta Verde Escuro “A concepção de infância está associada ao contexto histórico e os estudos nos mostram as diferentes formas de encarar a infância ao longo dos anos e como essas formas interferiram na educação das crianças e na organização da sociedade. Considero a infância um momento de descoberta de si próprio e do mundo, de conhecimento e crescimento, de aconchego, do lúdico, da linguagem, de identidade e de construção. Uma etapa rica pra ser vivida e explorada em todas as possibilidades!!” Borboleta Colorida “Para infância existem várias definições, entendo a infância para além do período que antecede a adolescência e vida adulta, sendo um período que estruturas de pensamento são construídas e uma fase repletas de capacidades, onde se constroem culturas, realizam-se experiências significativas, ressignificam-se conhecimentos e se apropriam e constroem sua identidade, autonomia, cooperação e interações com pessoas, meio e objetos do conhecimento e de aprendizagem.” Borboleta Azul Turquesa

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Essas discussões sobre infância também podem ser encontradas no atual

documento das Diretrizes curriculares para EI de Campinas, as quais apontam para

superação da ideia de infância como etapa, período e fase bastante valorizadas pela

área da psicologia.

Muito me surpreendeu a resposta da participante Borboleta Branca “Período

em que se forma a personalidade, e onde é necessário que existam bons exemplos

e orientação adequada, principalmente em casa. Afinal a educação vem de casa.”

Mas a educação vem mesmo somente de casa? A escola não é lugar de educação?

A escola é um lugar de educação, de cuidado e muitas outras experiências. É

muito instigante e preocupante ouvir isso de uma professora ou um professor

envolvido com a educação de bebês e crianças.

Nos anos 2000, as produções teóricas apontavam para um novo olhar para a

criança e para os conceitos de infância. A criança, já considerada sujeito de direitos,

agora também é produtora de culturas, criadora. Segundo Abramowicz (2015), a

tendência em discutir concepções de infância e experiências práticas ganhou fôlego

a partir das contribuições dos ideais e práticas italianas, sobretudo aquelas

abordadas nas pesquisas e produções de Ana Lúcia Goulart de Faria.

A autora Ana Lúcia Goulart de Faria foi professora da UNICAMP até sua

aposentadoria, recentemente. Sempre fez parcerias com a prefeitura e recebeu

profissionais da educação da SME Campinas para cursos, seminários, palestras,

congressos, curso pós-graduação, portanto, influenciou muito, como já citei neste

trabalho, nos referenciais teóricos das(os) profissionais da educação da Rede

Municipal de Ensino de Campinas com conceitos como linguagens infantis,

pedagogia da infância, culturas infantis e culturas da infância, formação docente e

gênero.

Seus estudos trouxeram para infância a construção de uma pedagogia não

escolarizante para a primeira etapa da EB e que também supera o assistencialismo

integrando educação e cuidado, organizando o espaço e envolvendo crianças,

famílias e profissionais da educação. Na perspectiva dessa autora:

Se as crianças são inventivas, também se faz necessária uma formação profissional sofisticada, inventiva, de outro tipo que permitirá que as professoras, com a filosofia, a história e as ciências (psicologia, sociologia, antropologia, demografia, etc.) e a ARTE como fundamentos desta

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formação, “soltem sua dimensão brincalhona” e construam esta nova profissão: a professora de crianças de 0 a 6 anos em creches e pré-escolas, isto é, da educação infantil, primeira etapa da educação básica. Uma formação densa teórica, mas não apenas com as ciências que buscam/ram a regularidade. Para o estudo das diferenças impõem-se campos teóricos que se pautam também nas singularidades. Somos e não somos diferentes. Mergulhar num mundo pós-colonialista, ver o mundo na ótica do mapa de Peters com a África no centro e a Europa no sul com certeza trará repertório inovador para uma pedagogia do processo (e não de resultado), como se espera de uma pedagogia da infância de 0-10 anos. (SOUZA;TEBET, 2015, p.132-133)

Esse trecho é aglutinador de várias ideias da autora sobre infâncias, currículo

e especificidades da EI e nos chama a atenção para a importância da qualidade da

formação da professora e do professor da EI. Tema que passaremos a tratar agora a

partir das questões que falavam sobre formação continuada.

5.4. FORMAÇÃO DAS PROFESSORAS E DOS PROFESSORES E TEMPO

DE DOCÊNCIA

Antes de olharmos para formação continuada, precisamos olhar para o perfil

profissional da professora e do professor em relação às situações funcional, tempo

de serviço, tempo de serviço na escola atual, quantas escolas já trabalhou, em quais

turmas já trabalhou, qual turma trabalha atualmente. A seguir descrevo sobre o perfil

profissional das(os) participantes da pesquisa.

Em relação à situação funcional temos três situações: o professor efetivo57, o

professor adjunto I58 e o professor TJE59. Em relação à composição desses

57 Professor de Educação Básica I - educação infantil: Atuar como docente na Educação Infantil,

atendendo às atribuições previstas na legislação educacional vigente. Participar, elaborar, sistematizar, implementar, executar e avaliar os conteúdos registrados no Projeto Pedagógico, com base nas Diretrizes Educacionais da Secretaria Municipal de Educação; avaliar e reorganizar periodicamente o trabalho pedagógico, para o cumprimento dos objetivos documentados; planejar e avaliar as atividades pedagógicas, em consonância com os cuidados devidos ao educando, tendo em vista a autonomia e a formação integral discente; utilizar metodologias que garantam resultados eficazes de ensino e de aprendizagem aos alunos, estabelecendo estratégias de atendimento diferenciado, quando necessário; elaborar, utilizar e adaptar recursos pedagógicos e materiais específicos para todos os educandos de sua área de atuação, socializando estes instrumentos para uso dos demais profissionais da unidade educacional; participar dos programas de formação continuada, propostos pela Secretaria Municipal de Educação; planejar, implementar e participar das atividades de articulação da escola com as famílias e comunidade; participar efetivamente da avaliação institucional proposta no Projeto Pedagógico da unidade educacional, com o objetivo de reavaliar e replanejar o seu trabalho a partir dos resultados obtidos. Executar atividades correlatas e outras tarefas de mesma natureza ou nível de complexidade, associadas à sua área de atuação, obedecendo à regulamentação da LDB, bem como normas e resoluções

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profissionais na pesquisa 1 TJE, 1 Adjunto e 19 efetivos. Todos têm as mesmas

atribuições, porém a atribuição de aulas e de escolas é diferente. Isso faz com que

as professoras e os professores adjuntos e TJEs tenham mais rotatividades nas

escolas de EI. Sobre o tempo de serviço, temos 1 com menos de um ano de

serviço, 8 entre 1 e 10 anos de serviço, 8 entre 11 e 20 anos de serviço e 4 com

mais de 20 anos de serviço. Na UE atual das(os) entrevistados, 4 estão há menos

de 1 ano, 14 entre 1 e 10 anos, 1 entre 11 e 20 anos e 2 estão há mais de 20 anos.

Em relação à quantidade de UE que já trabalharam, 5 trabalharam em 1 UE, 9 entre

2 e 5 UEs, 5 entre 6 e 10 UEs e 2 em mais de 10 UEs.

É surpreendente a quantidade de participantes que respondeu ao

questionário que têm entre 10 e mais de 20 anos de tempo de serviço (76%),

quebrando um paradigma da RMEC de que professoras e professores com mais

tempo de serviço não participam de pesquisas. A pesquisa ficou bem diversificada

em relação a tempo de serviço, pois os mais novos também participaram.

As turmas são denominadas, aqui em Campinas, de agrupamentos60.

Perguntei no questionário em quais agrupamentos as(os) participantes trabalham

atualmente ou trabalharam (Consultar apêndice XVII e XVIII).

Os agrupamentos são multietários e essa forma de organização trouxe um

acréscimo na oferta de vagas e trouxe também a necessidade das(os) profissionais

da educação repensarem suas práticas. Não havia mais como imaginar uma turma

homogênea que na realidade nunca existiu, entretanto a proposta exige um número

menor de crianças por turma. Apesar dos agrupamentos multietários estarem

vigentes na Secretaria Municipal da Educação. (DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO DE

CAMPINAS, 2014)

58 Atuar em substituição do docente titular, na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, assumindo toda carga horária que lhe for atribuída, nos termos da lei, e em qualquer escola para a qual for designado, atendendo às atribuições previstas na legislação educacional vigente. Atuar nas atividades pedagógicas na escola ou no NAED, conforme orientação da SME, caso não haja necessidade de substituição. (DIÁRIO OFICIAL DO

MUNICÍPIO DE CAMPINAS, 2014)

59 Professores substitutos ao titular em situação de processos Transitados em Julgado Estáveis (TJEs) atuando em substituição do docente titular, na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, assumindo toda carga horária que lhe for atribuída, nos termos da lei, e em qualquer escola para a qual for designado, atendendo às atribuições previstas na legislação

educacional vigente.(DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO DE CAMPINAS, 2014)

60 A implementação dos Agrupamentos Multietários foi formalizada através da resolução SME nº. 23/2002, publicada em Diário Oficial do dia 13/11/2002. Agrupamento I – crianças de 03 meses a 01 ano e 11 meses; Agrupamento II – crianças de 2 a 3 anos e 11 meses; Agrupamento III – crianças de 4 a 5 anos e 11 meses.

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implementados, desde 2003, ainda provocam vários debates e são motivos de

reivindicações constantes para condições de trabalho melhores. Sobre esse assunto

Prado (2006) considera:

As professoras não negavam as possibilidades de construção de um espaço educativo multietário, uma vez que evidenciavam a multiplicidade de formas de relações entre as crianças e seus saberes entre idades diversas. Entretanto, elas revelavam desconhecer estudos mais específicos sobre o tema, apontando para suas necessidades de aprofundamentos e estudos teóricos, denunciando a ausência de planejamento coletivo e formativo para implantação de tal proposta, por parte da Secretaria de Educação do município e suas possíveis consequências e resistências. [...] O que poderia ser uma proposta avançada e inovadora apresenta-se como mais um impasse ao campo educativo, ainda por se discutir, se refletir, se construir. Não tenho como objetivo desconsiderar propostas avançadas como esta, mas revelar que, se a cultura possui lugares próprios, dinâmicos, ela é autônoma até certo ponto, pois se inscreve numa determinada sociedade que, por sua vez, também afeta as instituições, suas propostas e suas práticas. (PRADO, 2006, p.109-110)

Os agrupamentos multietários continuam sendo tema de debates e de ações

formativas. São ao mesmo tempo possibilidade e desafio. Outra observação

importante é que as professoras e os professores, no início da carreira, passam

pelos agrupamentos I e II e depois vão para o III e lá ficam com as crianças maiores.

Que há com as crianças mais novas e bebês? Será que a relação com monitoras e

monitores e agentes influenciam nesta escolha, já que no agrupamento III não tem

esses profissionais? Essas questões serão retomadas, posteriormente, na

devolutiva da pesquisa que será realizada por meio de uma roda de conversa com

as e os participantes da pesquisa.

5.4.1. Formação Continuada

Para iniciar a análise da formação continuada escolhi a questão que

fomentava as(os) participantes a buscar na memória uma experiência de formação

continuada que mais havia marcado sua trajetória formativa e a questão que falava

sobre para que participavam das ações formativas.

Pude perceber pelos quadros resultantes dessas questões (Consultar

apêndice XIX e XX) que essas marcas e motivos para participar de ações formativas

incluem autores, universidades, cursos, experiências, grupos, estudos, participação,

reflexão, discussão, práticas, relações, encontro, conceitos, busca, redescobertas,

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troca, relato, produção, aprender, conhecer, profissional, crescer, pensar,

enriquecimento, aprimoramento, saber, motivação entre outras. Gostaria de destacar

o verbo aprender na linha de pensamento destacada por Sílvio Gallo:

Na esteira da linha de pensamento inaugurada por Nietzsche, Deleuze afirma que o aprender é mais importante do que saber, que é estático, na medida em que é dinâmico, processo, experiência, passagem, travessia. Quando alguém sabe, isso significa a tranquilidade de uma posse; mas, quando alguém aprende, temos o turbilhão do acontecimento, em que tudo é possível. Aí, nessa abertura, é que a criação pode acontecer. E, por ser abertura, passagem, acontecimento, o aprender não pode ser compreendido de antemão, não se pode ser metrificado, não pode ser metodologizado. Retomando a ideia de Proust e os Signos de que não se pode saber de antemão como alguém aprende, Deleuze (2006, p. 237) afirma que “não há método para encontrar tesouros nem para aprender”. O aprender é, pois, sempre singular, experiência da diferença, não reprodução do mesmo. (GALLO, 2011, p 18)

Essas experiências são singulares porque dependeram de como foram

recebidas ou vividas pela professora e pelo professor. Entretanto as experiências

formativas educativas sempre desestabilizam e isso é bom. O que se aprende

encontra-se com as marcas que estão guardadas, produzindo novas marcas.

Podemos pensar, pois, que o processo educativo dá-se nesse entre-lugares, entre a história e o atual, agindo de modo a produzir devires-outros em cada um. Educar-se é sair de si mesmo, abandonar aquilo que já se é, na direção deste outro que se está para ser, sem, no entanto, chegar a sê-lo plenamente. Educar-se é abandonar identidades fixas, mas não para assumir novas identidades, e sim para deixar-se ficar em fluxo, em movimento, em devir.61 (GALLO, 2011, p 24)

Aprender nos impede de assumir identidades fixas, mas nos permite mudar

de lugar, olhar o outro, olhar para si mesmo, perceber as subjetividades que nos

afetam, olhar nossas práticas e criar. Apesar de ser uma experiência singular

aprender é sempre uma atividade coletiva.

61 O devir nunca se faz na direção do instituído. Por exemplo, em uma sociedade machista e

falocêntrica, não faz qualquer sentido afirmar um devir-homem; mas, faz todo o sentido afirmar um devir-mulher, um devir-animal, um devir-homossexual, um devir-criança... A direção do devir é sempre a da minoria, não em sentido numérico, mas em sentido do não instituído, daquilo que escapa, que foge ao cânone. Daí que se fala em um devir-menor, mas não em um devir-maior (GALLO, 2011, p.23).

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[...] pode-se dizer que o aprender deleuziano está próximo da “imitação criadora” nietzschiana, na medida em que Deleuze (2003b, p. 21) afirma que “nunca se aprende fazendo como alguém, mas fazendo com alguém, que não tem relação de semelhança com o que se aprende”. Ou seja, não é pela simples imitação, pela simples repetição dos atos de um outro que se aprende; mas tampouco se aprende sozinho: aprendemos quando nos encontramos com signos, portanto precisamos de alguém que emita signos. Pode-se dizer, assim, que ensinar é emitir signos, é convidar a esse tipo de encontro. Ensinar é convidar para fazer algo junto e aprender é fazer junto com alguém, entrando nessa vibração com os signos. (GALLO, 2011, p 17)

Aprendemos fazendo com o outro. A formação continuada não pode ter a

pretensão de ensinar fórmulas ou livros de receitas. Ela precisa fomentar nas

professoras e nos professores a autorreflexão e deixar marcas que poderão ser

resgatadas num momento oportuno e provocar ações criadoras.

Perguntei as(aos) participantes o que era levado em conta na escolha da

formação e, dentre as quatro opções, a maioria mencionou que escolhe pelo

conteúdo e pelo formador ou formadora, ou seja não serve aprender qualquer coisa

com qualquer pessoa. Nesta questão havia possibilidade de fazer considerações e

uma participante considerou que:

“Procuro escolher entre temáticas que estejam relacionadas a desafios (conflitos) urgentes em minha sala de aula, em que eu necessite de orientação ou esteja me sentido desafiada.”

É grande a falta de cobrança pela instituição em relação à participação dos

profissionais nas ações formativas, pois 95% das instituições não cobram. A equipe

gestora da escola deveria ser a maior interessada na formação de seus

profissionais. Nessa questão havia espaço para consideração e uma ou um

participante considerou:

“Não há uma cobrança por parte da instituição para participar da formação, mas sim o apoio da equipe gestora para que tenhamos as informações necessárias.”

Espero que nas demais instituições também haja esse apoio.

Também achei importante saber se as(os) participantes das ações formativas

compartilham suas vivências com suas e seus colegas de trabalho. E para quem

não compartilha poderia escrever o porquê. Duas das(os) participantes escreveram

sobre o não compartilhamento:

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119 “Diretamente não há como compartilhar, visto o pouco tempo em comum, a imensa demanda burocrática que temos a cumprir... muitas vezes até falta de interesse da própria gestão em abrir espaço para socialização (muitas vezes briguei sozinha por esse espaço...)” “Não há espaço de compartilhamento das FC's62, visto o pouco tempo e a demanda burocrática”

É expressiva a porcentagem (95%) de profissionais que compartilham suas

vivências com seus colegas. As vivências são compartilhadas com os colegas, em

sua maioria, em conversas e não nos tempos pedagógicos como RPAI63 e TDC64

que são para avaliação e planejamento, mas também seria um momento muito

propício para compartilhar as aprendizagens consolidadas nas ações formativas

(consultar apêndice XXI)

5.5. SER PROFESSORA OU PROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL

Enfim, finalizo a apresentação dos dados coletados por meio do questionário

com a questão sobre o que é ser professora e professor de EI.

Acredito ser importante para análise dos dados saber o que pensam as(os)

entrevistados sobre o que é ser professora e professor da EI e deixei para o final

pela relevância da questão.

Algumas palavras aparecem em várias respostas tais como: criança, infantil,

ser, educação, professora, desafio, falta, estar, momento, formação e mediar.

Entretanto palavras, a meu ver, importantes, aparecem poucas vezes são elas:

pequenos, interação, humanidade, aprendizagem, profissão, diferença, turma,

autoria, saberes, contexto, protagonista, único, reflexivo, ações, compartilhar,

trabalhar, conhecer, participar, respeito e planejamento.

Todas as respostas falavam das funções da professora e do professor e sua

importância para as crianças, entretanto, para Borboleta Prateada ser professora e

professor significa ser uma peça fundamental para moldar o ser que está em

construção. Essa afirmação, depois de tudo que já foi discutido sobre infância e

62 Formação Continuada é uma ação de formação continuada que acontece na escola prevista em

calendário escolar e não é dia letivo. 63 Reunião Pedagógica de Avaliação Institucional (RPAI), prevista em calendário escolar, sem

atividade letiva. 64 TDC - Trabalho docente coletivo extra classe de 2 horas/aula sequenciais semanais. (Resolução

22/2010 de 20 de novembro de 2010).

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criança na RMEC, é um tanto assustadora. Parece que a criança é uma coisa sem

movimentos próprios e a professora e o professor vão deixá-la como ela(e) quer. A

criança é um ser humano que tem suas vontades, suas potencialidades, seus

limites. Esse ato de moldar e se achar peça fundamental é uma tentativa explícita de

subjetivação, pois geralmente o molde que se tem é o molde dos que têm o poder

de classificar e mandar.

Outra resposta que me causou espanto foi a da Borboleta Roxa:

O Professor de Educação Infantil deve ser um estudioso do desenvolvimento cognitivo, das práticas pedagógicas, deve ser reflexivo e se empenhar em conhecer as diferentes áreas do conhecimento. (Borboleta Roxa)

Por que destacar apenas o desenvolvimento cognitivo? A professora e o

professor precisam estudar sobre a criança como um ser completo, parece que

algumas professoras e alguns professores da EI de Campinas ainda não superam a

visão epistemológica do documento Currículo em construção de 1999 baseado nas

teorias desenvolvimentistas de Piaget, Wallon e Vygotsky. Depois disso, muitas já

foram as discussões, ações formativas e práticas que poderiam ter favorecido a

superação desse paradigma. Esse paradigma precisa ser superado, pois por meio

de outros estudos teóricos como por exemplo a sociologia da infância, a filosofia

podemos perceber que crianças tem experiências diferentes e momentos de

aprendizagens diferentes não podendo ser encaixadas em etapas cognitivas que

acabam excluindo e não incluindo.

Na resposta da Borboleta Verde Escuro, ser professora e professor:

Significa estar próximo e participando deste momento único dos nossos "filhos". Também significa que temos que ofertá-los contextos para que elas, as crianças, possam se constituir na nossa sociedade.

Parece que houve uma confusão que, para a ação do profissional professora

e professor pode ser mal interpretada, pois não estamos falando de “nossos filhos”.

Claro que a profissional pode ser mãe, porém na pesquisa falo de bebês, crianças,

alunas e alunos que fazem parte do cotidiano do trabalho.

Para Borboleta Caqui, ser professora e professor significa fazer parte do

momento mais importante do ser humano: ser criança, porém, eu questiono será

mesmo a fase mais importante do ser humano? Não acredito que o ser humano

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tenha fases mais importantes que outras, mas que tem experiências diferentes ao

longo da vida que são sempre importantes.

A resposta da Borboleta Branca fala da dificuldade de ser professor:

Uma tarefa nobre, porém muito difícil. Devido à falta de reconhecimento dos outros profissionais frente aos da educação infantil, que são tratados de maneira inferior. Também devido às condições oferecidas que são difíceis, complicadas, falta apoio dos gestores que muitas vezes dificultam o trabalho do professor.

Essa resposta me chamou muito a atenção, pois ela só coloca dificuldades e

uma delas é sobre “outros profissionais” que são tratados de maneira inferior. Eu

penso que esses são os agentes e monitoras e monitores da EI, questão já

abordada neste trabalho, o tabu sobre a relação professora e professor e agentes e

monitoras e monitores é tão grande que nem se menciona o nome deles. Mas como

todos nós profissionais da RMEC sabemos, eles(as) são tratados de maneira

desigual. Outra dificuldade que a resposta traz é a relação com a equipe gestora,

que na análise do questionário, eu percebi que precisava tocar mais nesse assunto,

o que também será retomado na devolutiva na roda de conversa que farei para e

com as(os) entrevistadas(os). Também pode estar se referindo a outras professoras

e professores de outras modalidades de ensino que tratam a professora e o

professor de Educação Infantil de forma inferior.

As respostas abaixo vieram ao encontro do que venho falando ao longo do

trabalho:

Vejo o professor de educação infantil como um elemento sensível entre o querer, o poder e o ser; ou seja, um elemento que observa, compartilha, propõe e concretiza junto à criança, as mais diversas situações e experiências, construindo e transformando saberes. Além de possibilitar que as crianças se sintam e se identifiquem como seres capazes em seu próprio processo de aprendizagem, propondo e planejando esses momentos e ações. Com muito estudo e reflexão sobre suas ações. (Borboleta Colorida) Professor que planeja, que promove atividades, pensando o ensino, aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Professor que precisa de formação. (Borboleta Cinza) Uma profissão de grande responsabilidade devido a enorme potência de aprendizado que as crianças pequenas têm em plena formação das bases para o desenvolvimento da sua personalidade. (Borboleta Preta) Ser professor de Educação Infantil é estar disposto a ser mediador no desenvolvimento de todas as potencialidades da criança. Ajudá-la a estabelecer pontes com os cuidados consigo mesma e com o outro e também com as aprendizagens. É socorrer quando preciso for e soltar a mão no momento certo. (Borboleta Dourada)

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Estar dentro deste território é extremamente desafiador, em que cada criança, cada turma, cada momento histórico apresenta tesouros valiosos que me impulsiona a buscar novos conhecimentos para que minha presença e interação com as crianças ocorra de forma mais rica e prazerosa. Ser professora de Educação Infantil é encontrar prazer e desafio a cada interação com as crianças. (Borboleta Verde) Ser professora de Educação infantil, para mim, é entrar nesse mundo e se deixar encantar e recriar, se redescobrir e revisitar sua própria infância. É lidar com o inesperado o tempo todo e mesmo com toda a rotina que muitas vezes nos engole, é sempre surpresa. Tem também suas dificuldades, como o número de crianças por turma, o desgaste físico e emocional disso decorrente.(Borboleta Lilás) Incorporar de maneira integrada as funções de educar e cuidar, mediar o aprendizado das crianças, participar e vibrar a cada descoberta e dar muito carinho!!! (Borboleta Rosa) Gosto de pensar que "estar sendo" professora de educação infantil há tanto tempo, é a intersecção do que poderia ter sido e o que foi (como me ensinou Marcos Vilella Pereira). Isso perpassa por minhas experiências, pelo abandono de certezas, pelos descaminhos...Acredito que a educação infantil permite que isso aconteça, justamente pelos desafios diários que enfrento no encontro com os pequenos. Por isso, "ser" professora de ed infantil é marcada pela diferença que a profissão produz em mim!!! (Borboleta Azul)

Me agrada muito a séria brincadeira da Borboleta Bege que escreveu que ser

professora e professor é “Ser feliz, e poder 'bagunçar' à vontade...rsrssrsr”. Para

mim, ser professora e professor de EI é ser professora e professor!

É aprender as especificidades desta tão importante quanto às outras

modalidades de ensino.

É cuidar e educar ao mesmo tempo e no mesmo espaço.

É fazer para e com as crianças.

É vibrar com cada descoberta de si e do outro.

É abrir-se ao devir-criança.

É desafiador, é prazeroso.

É autorreflexão e reflexão.

É responsabilidade e profissionalismo.

É lidar com problemas como falta de apoio, discriminação e um número

grande de crianças por turma.

É fazer a diferença.

É não aceitar a exclusão e não apenas tolerar a inclusão.

É lidar com o inesperado, o improviso, mas não a improvisação.

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É ser formador de outros professores (as).

É segurar e deixar ir...

É ser feliz e “bagunçar”.

É elemento sensível entre o querer, poder e o ser.

É planejar, replanejar, oportunizar e criar.

É o abandono de certezas, são descaminhos...

Gallo ressalta:

Para se tornar o que se é, é necessário ser criador. Já não se trata de realizar, pela formação, algo que está em si mesmo, mas de criar este si mesmo, de criar-se a si mesmo. Nessa criação de si mesmo – que seria retomada por Foucault – reside a afirmação da singularidade. Ressalta Larrosa que isso que se é já não se trata de um objeto, de uma realidade (seja subjetiva ou objetiva); não diz respeito a um autodescobrimento, a um conhecer-se a si mesmo, como no dito socrático da antiguidade clássica, e assim não está relacionado à lógica da identidade. Está mais para o lado de uma lógica da diferença, uma vez que se trata de uma invenção de si mesmo. O sujeito não é um dado, mas uma construção, uma invenção que se faz no processo, daí Larrosa afirmar que o signo, aqui, é o da experiência como travessia. O tornar-se o que se é como vir-a-ser, mas um vir-a-ser como devir. (GALLO, 2011, p 11)

Tornar-se professora e professor exige ser criador, exige identidades que são

contraditórias no sentido de estarem abertas a mudanças que favoreçam a inclusão

e que não apenas tolerem as diferenças. É construir no processo, no devir.

E ainda o autor nos convida a refletir:

Cada um possui seu caminho, não como um percurso traçado de antemão, mas como um trajeto a ser construído, a ser inventado em sua singularidade. Um devir que é superação do ponto de partida, um devir que é processo, experiência, sem ponto de chegada. (GALLO, 2011, p 12)

Não há como fixar a identidade na contemporaneidade, pois ser ou estar

depende de vários fatores sociais, políticos, econômicos e culturais. Tem a ver com

tudo que acontece e nos acontece, nos toca, nos passa, nos afeta.

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6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A maior riqueza do homem é a sua incompletude.

Nesse ponto sou abastado. Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.

Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 horas da tarde,

que vai lá fora, que aponta lápis, que vê a uva etc. etc.

Perdoai Mas eu preciso ser Outros.

Eu penso renovar o homem usando borboletas. (Manoel de Barros)

Antes de chegar nesta parte do trabalho eu havia pensado que aqui seria o

final. Entretanto, ao iniciar a escrita das considerações, percebi que elas são, na

verdade, potenciais de novos devires.

O trabalho que surgiu do desassossego que as leituras dos planos de

trabalho das professoras e dos professores nos PPs me causaram e dos vinte e

cinco anos de experiência na EI, suscitou várias leituras e experiências. Essas

experiências aconteceram desde que entrei no mestrado do UNISAL e começaram

as leituras, as discussões, os encontros com outros profissionais e alunos e alunas

como eu e as professoras e os professores da UNISAL. Meu memorial surgiu dessas

experiências que fui reativando, reatualizando e incorporando marcas.

Da ideia inicial para a pesquisa até aqui, foram muitos devires e muito

aprendizado. Quando decidi falar em marcas da produção de identidade, precisei

demonstrar o conceito de identidade que subsidiaria o trabalho e, ai, iniciaram-se as

desconstruções das estruturas e centralismos que nos são oferecidos sobre tudo.

Falei então sobre identidades, pois não há uma identidade fixa, mas ao longo

dos acontecimentos, dos processos de subjetivação e da globalização vamos

deixando e construindo novas identidades. Os conceitos de processos de

subjetivação vão aparecendo ao longo de todo o trabalho.

Onde há identidade, há a diferença, então falei das diferenças também que,

tanto quanto as identidades, estão subjetivadas a certas formas de poder, por

exemplo o poder da classificação em oposições binárias, ou isto ou aquilo. A

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descoberta boa é que as diferenças tensionam mudanças e as identidades podem

ser isto e aquilo e outra coisa e e e...

Após o conceito de identidade e diferença, percebi que precisava falar sobre a

história dessa modalidade da educação básica que é a Educação Infantil no Brasil e

na cidade de Campinas. Penso que a história das coisas é de extrema importância,

pois nos faz entender um pouco do momento atual da história que não para. A EI

tem uma história muito recente, entretanto, marcada por processos de subjetivação

e narradores adultos. A escolha de usar os marcos legais foi muito interessante, pois

sabemos que por trás de Constituições, Leis, decretos, diretrizes, etc há muitas

lutas, mulheres, crianças, intelectuais envolvidos, há uma trajetória nem sempre

traçada em linha reta.

Destaco no trabalho, dois fatores que, após rever a história da EI, aparecem

como meios de processos de subjetivação e muito influentes na produção de

identidades da professora e do professor de EI.

O primeiro fator é o processo de participação na construção das Diretrizes

Curriculares para EI na cidade de Campinas. Essa construção sempre esteve em

movimento, oportunizando sempre a participação dos profissionais da EI. Foi esse o

objetivo da escrita sobre esses processos, pois ele traz uma escolha de uma

concepção de currículo que, em cada época, é subjetivado por influências teóricas,

pelos documentos legais e pelas escolhas do poder público e também pela forma

como cada sujeito incorpora e vivifica os processos de subjetivação. Na história das

diretrizes apareceu uma discussão sobre os dois profissionais que trabalham na EI,

agentes/monitoras e monitores e professoras e professores, com condições bem

diferenciadas de trabalho que são chamados de educadoras e educadores, ao meu

ver, na tentativa de evitar ou abafar possíveis conflitos.

O segundo fator é a Formação Continuada (FC), sua organização, seus

princípios, suas prioridades etc. A maneira como as ações formativas acolhem os

profissionais tem potencialidade para mudanças de paradigmas ou a conservação

dos mesmos.

Percebi por meio da análise das respostas das professores e professores

entrevistadas(os) ao questionário que os professores com mais tempo de trabalho,

portanto mais participação na construção das diretrizes e nas formações

continuadas são os que têm boas ideias inclusivas e interessantes sobre bebês,

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crianças, infância e Educação Infantil. Isso reforça que temos que continuar com as

professoras e professores que tem menos tempo de serviço e as(os) ingressantes o

trabalho de discussão, implementação, (re)construção das diretrizes e as ações

formativas.

As ações formativas em Campinas têm vários diferenciais tais como a equipe

da escola poder escolher a formadora ou formador que fará a ação formativa, há

remuneração para realizar as ações formativas, há um local específico para

formação, há uma Coordenadoria de formação com coordenadoras pedagógicas

que estão trabalhando para melhorar a qualidade das ações formativas. A escolha

de participar das ações formativas é por adesão da equipe ou do profissional.

Diante das possibilidades de ouvir as professoras e os professores, pensei

que um grupo de estudos seria a forma ideal para que eu pudesse fomentar as

narrativas de marcas da experiências sociais, políticas e econômicas de

territorialidade dessas professoras e desses professores. Entretanto, a proposta não

deu certo, pois não houve inscritos suficientes para o grupo. Isso teria sido muito

pior para minhas expectativas se eu não tivesse experienciado na disciplina de

metodologia de pesquisa que esse acontecimento é um dado de análise. Esse devir

me possibilitou a análise na quinta parte do trabalho das hipóteses sobre o que teria

acontecido.

Após esse fato resolvi enviar para as professoras e professores de EI da

RMEC um questionário com perguntas abertas e fechadas que, inicialmente, pensei

que também não daria certo, pois dos 1200 professores(as) de EI, apenas 21

responderam. Pensei, então, em entrevistas e minha orientadora me indicou rodas

de conversas. Contudo, considerei pertinente analisar os dados do

questionário, pois 21 professoras e professores se dispuseram a responder e

mereciam uma devolutiva. Iniciando a análise percebi que havia muitos dados nas

respostas para subsidiar a pesquisa. Foi ai que optei por realizar a roda de

conversa, posteriormente, como meio para devolutiva da análise dos dados as(aos)

participantes e também para chamar as quatro professoras que se inscreveram para

o grupo de trabalho proposto no início da pesquisa.

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Também após análise dos dados percebi que três temas apareceram e

precisam ser retomados, quais sejam os bebês, a relação com a equipe gestora e o

compartilhamento das formações nos tempos pedagógicos.

Os bebês ficam nos agrupamentos I e II, local de trabalho das monitores e

monitores e agentes de educação infantil. Esses agrupamentos na pesquisa

aparecem como agrupamentos pelos quais os professores começam sua trajetória e

depois mudam para o agrupamento III onde ficam as crianças a partir de 4 anos e

não tem outras(os) profissionais que ficam junto com as professoras e professores.

A equipe gestora é um outro fator que colabora para a construção da

identidade da professora e do professor, pois a maneira com que ela exerce a

gestão, que por lei deveria ser democrática, fará toda diferença na postura das(os)

profissionais da escola. Uma equipe gestora que não apoia e incentiva suas(seus)

profissionais a participação ou a formação continuada terá uma equipe bem limitada

em relação a melhoria da EI com maior possibilidade de ter suas(seus) profissionais

se removendo para outras escolas já uma equipe que tem incentivado e apoiado

suas(seus) profissionais tem destaque nas práticas, tem uma equipe mais constante.

As professoras e professores de Campinas têm em sua jornada tempos

pedagógicos destinados a encontros entre as professoras e professores entretanto o

compartilhamento das formações que fazem não acontecem nesses tempos e sim

informalmente segundo os dados das respostas do questionário. Há necessidade de

ocupar esse tempos remunerados com as discussões sobre as ações formativas

que as(os) profissionais da escola participam.

Eu acredito que esses fatos deveriam ser desassossegos para novas

pesquisas acadêmicas. Em relação aos bebês seria interessante explorar o que os

profissionais que trabalham com bebês conhecem sobre eles e porquê alguns têm

medo desse trabalho. Sobre o tema que envolve as equipes gestoras é importante

pesquisar sobre como a gestão democrática tem acontecido na prática, pois a

maneira como a equipe gestora faz a gestão fará todo diferença nas práticas das

professoras e dos professores com os bebês e crianças. Sobre o compartilhamento

das experiências e aprendizagens que professoras e professores vivenciam nas

ações formativas seria necessária uma pesquisa sobre como são aproveitados os

tempos pedagógicos remunerados para esse fim.

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O trabalho atendeu ao propósito de analisar as marcas na produção de

identidades de professoras e professores na Educação Infantil na

contemporaneidade destacado, sobretudo, elementos da trajetória profissional e da

formação continuada. Pude observar por meio das respostas que as professoras e

professores trazem marcas da sua vida pessoal tais como mudanças de governo e

na economia, guerras, acidentes, vitórias pessoais ou coletivas na conquista de

diretos; de suas formações inicial e continuada onde estudaram em escolas públicas

e particulares, passaram por vários momentos epistemológicos; da sua trajetória

profissional trabalhando em várias escolas e diferentes agrupamentos, participando

da construção das diretrizes, trabalhando com outras(outros) profissionais,

enfrentando equipes gestoras autoritárias.

Os processos de subjetivação que afetam a todas, a todos e ao meio

ambiente, através da mídia, das tecnologias, da exploração das forças de trabalho,

da fixação de identidades, do controle do desejo, da classificação, dos usos dos

poderes etc também afeta a professora e o professor, entretanto as professoras e os

professores precisam perceber e questionar esses processos junto com seus

alunos. Deste modo, teremos muito mais pessoas que poderiam usar o micro poder

para uma sociedade realmente inclusiva e não somente tolerante em relação as

diferenças e ao diferente.

As posturas e práticas das professoras e de professores têm potencial de

colaborar para o enfrentamento dos desafios da construção de uma sociedade

inclusiva, que tratam a diferenças e identidades como produzidas e não naturais e,

portanto, passíveis de transformações, perturbação, transgressão e subversão.

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136

APÊNDICES

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137

APÊNDICE I

Tabela marcos legais

LDB 4024/61 1961

Lei 5692/71 1971

Constituição da República Federativa do Brasil 1988

Lei 8.069/90 Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências

1990

Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à Educação

1993

Política Nacional de Educação Especial. Secretaria de Educação

especial.

1994

Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças

1995

LDB 9394/96 1996

Plano Nacional de Educação (PNE)

Referencial curricular nacional para a educação infantil / Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. — Brasília: MEC/SEF, Volume 1, 2 e 3

1998

Currículo em construção- Campinas 1999

Lei 10639/2003 Diretrizes curriculares nacionais para a educação das relações Etnicorraciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana

2003

Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil - Volume 1 e 2.

2006

Lei 11645/2008 Diretrizes curriculares nacionais para a educação das relações Etnicorraciais e para o ensino de história e cultura indígena

2008

Política Nacional de Educação Especial. Secretaria de Educação

especial.

2008

Diretrizes Curriculares Nacionais Para a Educação Infantil instituída

pela resolução CNE/CEB nº 05/2009

2009

Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos

fundamentais das crianças –MEC

2010

Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil: um processo contínuo de reflexão e ação. Campinas

2013

Plano Nacional de Educação (PNE) 2014

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138

Base Nacional Comum Curricular Proposta Preliminar Segunda

Versão Revista

2016

.

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139

APÊNDICE II Sumário do primeiro documento de Diretrizes Curriculares de Campinas “ Currículo em Construção” Capitulo 1 nome: Contando A História e 4 itens 1.1. A Educação; 1.2. A Educação

Infantil ; 1.3. O Educador e 1.4. A Rede Municipal de Educação Infantil de

Campinas;

Capítulo 2 nome: Diferentes Pontos de Vista e 3 itens 2.1. Ponto de vista

Antropológico; 2.2. Ponto de vista Filosófico e 2.3. Ponto de vista Psicológico

CAPÍTULO 3 nome: Organizando e Estruturando a Escola de Educação Infantil e 5

itens 3.1. O pensar e o fazer juntos: construindo as relações coletivas, 3.2.

Priorizando a Infância: construindo a Pedagogia da Educação Infantil , 3.3. A

dimensão cultural no contexto educativo e o contexto educativo na dimensão

cultural, 3.4. A relação Escola/Comunidade em uma gestão participativa, 3.5.

Vivendo um dia de cada vez e 4 sub itens no item 3.5.: 3.5.1. Como a escola acolhe

a criança, 3.5.2. Construindo hábitos de higiene, alimentação e cuidados com a

saúde, 3.5.3. Espaço de ensinar e de aprender e 3.5.4. Pesquisando e

aproveitando a diversidade de recursos

CAPÍTULO 4 nome: Adulto-Educador – Aquele Que Ensina, Aprende, Brinca,

Sonha e 4 itens 4.1. Estabelecendo vínculos entre o Eu pessoal e o Eu profissional,

4.2. Teoria e prática se entrecruzam na formação do educador, 4.3. O saber

pensar, o saber fazer, 3 sub itens no item 4.3.: 4.3.1. Planejamento, 4.3.2. Registro

da prática pedagógica e 4.3.3. Avaliação , 4.4. Algo mais a acrescentar ao fazer

educacional , 4 sub itens no item 4.4.:4.4.1. Convivendo com a diversidade

inclusiva, 4.4.2. Convivendo com o meio ambiente e construindo a consciência

ecológica, 4.4.3. Convivendo com a sexualidade infantil e 4.4.4. Cidadania na

palma das mãos

CAPÍTULO 5 nome: Nossas Crianças têm Direito à Brincadeira 5.1. Brincar:

transformar o real e inventar o novo, 5.2. O jogo, o brinquedo e a brincadeira 3 sub

itens no item 5.2.: 5.2.1. O jogo, 5.2.2. O brinquedo e 5.2.3. A brincadeira, 5.3. O

significado do jogo na Educação 4 sub itens no item 5.3.: 5.3.1. Jogos tradicionais ,

5.3.2. Jogos de construção, 5.3.3. Jogos simbólicos , 5.3.4. Jogos com regras ,

5.4. Principais idéias a respeito do brincar nas teorias de Piaget, Vygotsky e Wallon

e 5.5. Brincar.

Anexo I - Data de fundação das Unidades Educacionais pertencentes à

Prefeitura Municipal de Campinas e Anexo II - Depoimentos

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140

APÊNDICE III Sumário do segundo documento de Diretrizes Curriculares de Campinas “Proposta

Curricular da Educação Básica – EI”

O documento foi composto por:

Introdução,

Parte I – Quanto à Educação Infantil,

Parte II – Quanto às linguagens, 5 itens sobre as linguagens:

2.1. Linguagem Artística,

2.2. Linguagem oral, leitura e escrita,

2.3. Linguagem corporal e as questões de gênero,

2.4. Linguagem matemática,

2.5. Língua estrangeira,

Parte III - Quanto ao brincar na intencionalidade dos profissionais: a ênfase no

lúdico,

Parte IV – Quanto à diversidade Étnico-racial,

Parte V – Quanto à Educação Ambiental,

Parte VI – Quanto à Educação Alimentar,

Parte VII – Quanto à Educação Especial,

Conclusão e

Bibliografia.

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141

APÊNDICE IV

PROPOSTA DE AÇÃO FORMATIVA PARA 2016

Categoria (ANEXO I): Grupo de Estudo

Título da Ação Formativa: Professores e suas narrativas de formação, marcas

das subjetividades na sua identidade.

- Nome: Giselle Alessandra Marchi

- Cargo: Coordenadora Pedagógica

- Matrícula: 119658-8

- Telefone para contato: (19) 32671198 /988330950/ 991255774

- Endereço eletrônico: [email protected]

Ementa com breve síntese que aponte o essencial da ação formativa: Refletir,

utilizando textos de alguns teóricos pós-estruturalistas e as narrativas dos

professores, sobre como a Formação Continuada e as marcas das subjetividades

têm contribuído para a construção da identidade dos professores da Educação

Infantil. Fomentar a autorreflexão dos professores para analisar e qualificar as

suas práticas na escola, e fora dela, demonstrado-as no cotidiano, nos seus

discursos e suas escritas, podendo assim transformá-la em uma prática reflexiva

e em constante transformação, assim como a vida.

Objetivos:

- Questionar, diante do contexto contemporâneo, como se deu a produção de

subjetividades na identidade do professor na Rede Pública e quais são suas

marcas;

- Perceber Como as subjetividades têm impactado na construção da identidade e

nas Formações Continuadas do professor de educação infantil e em suas práticas

diante dos desafios contemporâneos, podendo produzir no professor atitudes

reprodutoras do pensamento homogêneo;

- Refletir sobre como a formação tem se revelado nos processos pedagógicos ao

longo da história da educação infantil, na postura do professor em relação ao que

significa ser professor na contemporaneidade e a que suas práticas têm servido;

- Provocar o olhar sobre como Formação Continuada tem oportunizado a

reflexão, e as consequentes mudanças das práticas ou tem servido para reforçar

paradigmas que já poderiam ter sido superados;

- Identificar como a produção de subjetividades tem afetado a construção da

identidade do professor de Educação Infantil na contemporaneidade;

- Utilizar as Narrativas do professor na minha dissertação de Mestrado mediante

sua autorização e autorização da SME.

Justificativa com indicação da(s) temática(s) à qual a proposta está relacionada

(ver ANEXO II) e as contribuições que a ação formativa poderá trazer para as

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142

práticas pedagógicas na perspectiva da implementação das Diretrizes

Curriculares:

Como pedagoga e no cargo de Coordenadora Setorial de Formação, numa

cidade tão grande como Campinas, não posso ficar alheia às perturbações nas

teorias educacionais e na pedagogia. A velocidade das mudanças, as leis

afirmativas, os processos pedagógicos e as práticas do professor exigem mais de

todos os profissionais envolvidos com a educação. Isso tem sido ótimo para

reflexão dos professores sobre suas práticas, entretanto é necessário articular a

política de Formação Continuada para impactar na reflexão do professor sobre

todas as exigências da educação na contemporaneidade.

As leituras dos planos de ensino dos professores, que encontram-se nos Projetos

Pedagógicos das unidades educacionais, provocaram em mim reflexões sobre o

papel do professor nesta etapa da Educação Básica e como suas posturas e suas

práticas podem colaborar para enfrentamento aos desafios da

contemporaneidade em uma sociedade inclusiva, ou perpetuar paradigmas que

excluem crianças e professores. Há um conjunto de fatores que favoreceu o

surgimento de uma identidade especifica do professor da Educação Infantil que

os professores podem ressignificar.

Ao longo do último século, no Brasil, os professores vêm sendo bombardeados

com infinitas cobranças e com subjetividades que desmoralizam e desvalorizam

seu trabalho e suas práticas. Entretanto não será atuando como professores em

coma e desconectados com as realidades que serão valorizados. Na

contemporaneidade, os professores não representam nenhuma ameaça ao poder

hegemônico, pois muitas vezes transformam–se em meros reprodutores dos

pensamentos hegemônico e conteúdos sem vida.

Há paradigmas na Educação Pública, fundamentados em teorias binárias, que

não dão conta mais dos desafios da contemporaneidade. Esses paradigmas

continuam firmes e só reforçam a produção de ideias de melhores ou piores,

bons ou maus, competente ou incompetente, vencedores ou perdedores e

colocam sobre o sujeito a culpa das limitações.

Metodologia a ser adotada deve ser detalhada, tais como: estudos bibliográficos,

estudos do meio, visitas monitoradas, oficinas, seminários, convite a

palestrantes, produção de escritas, audiovisuais, portfólios, software e outros:

A metodologia utilizada será a utilização de textos de teóricos pós-estruturalistas

para estudos bibliográficos, vídeos, escritas dos professores, dinâmicas e roda de

conversa.

Pretendo coordenar um grupo de trabalho com 25 professores de educação

infantil apoiando-me nas produções de Felix Guatarri (2010) e Sueli Rolnik

(1993, 2003 e 2010) sobre o tema das subjetividades e diante do contexto

contemporâneo, suscitando uma reflexão sobre a produção de subjetividades que

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143

tem, de muitas formas, influenciado na construção da identidade e da Formação

Continuada dos professores de educação infantil na cidade de Campinas.

Utilizarei também alguns conceitos dos autores Tomaz Tadeu Silva, como o

conceito das metanarrativas (1999), Boaventura de Souza Santos com o conceito

do pensamento hegemônico e eurocentrado (2010), Jorge Larrosa com o

conceito da autorreflexão dos professores (1999), as leis afirmativas do Brasil

(1988, 1996, 2003 e 2008) busca-se compreender como a produção das

subjetividades acabam por influenciar as escolhas de Formações e a construção

da identidade dos professores que em alguns momentos mantêm o discurso

hegemônico e outras vezes avançam nas questões da sociedade inclusiva que a

contemporaneidade tem demandado.

Público-Alvo:

Professores da educação infantil que atuam ou já atuaram nesta modalidade.

Nº de Turmas e Nº de vagas, considerando a adequação à proposta e ao espaço

físico que o grupo ocupará:

Será uma turma com 25 professores

Carga horária total e nº de encontros:

80 horas 20 encontros

Carga horária semanal:

3 h/a presenciais e 1 não presencial

Dia da semana e horário, e, havendo mais de uma turma, também especificar.

Para os Cursos, Grupos de trabalho e Grupos de Estudo centralizados, indicar

mais de uma opção de disponibilidade (dia/horário) do formador:

Quartas-feiras das 18h10 às 21h30

Nome e Endereço do local indicado para realização e, quando for na U.E ou

outro espaço a adequação do mesmo deve ser verificada e autorizada com

antecedência pelos gestores ou responsáveis:

Centro de Formação Tecnologia e Pesquisa em Educação “Prof. Milton de

Almeida Santos” - CEFORTEPE

Endereço: Rua: Dr. João Alves dos Santos, 860 – Jd das Paineiras

Procedimento de Avaliação da Atividade Formativa e da produção do grupo:

A avaliação se dará através dos registros das atividades que ficará a cargo de

todos os professores envolvidos em forma de revezamento e através das analises

das escritas dos professores.

Referências Bibliográficas:

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do

Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.

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144

educação nacional. Brasília, DF: Imprensa Oficial, 1996.

_____. Ministério da Educação. Diretrizes curriculares nacionais para a

educação das relações Etnicorraciais e para o ensino de história e cultura

afro-brasileira e africana. Brasília: MEC, [s.d.]. Disponível em:

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CAMPINAS. Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal.

Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil: um

processo contínuo de reflexão e ação. Departamento Pedagógico– Campinas,

SP, 2013 Disponível em

http://campinas.sp.gov.br/arquivos/educacao/04_diretrizes_infantil.pdf.

GUATTARI, F.; ROLNIK, S. Micropolítica: Cartografias do desejo.

Petrópolis: RJ: Vozes, 2010

HALL, S. Nascimento e morte do sujeito moderno. In _____A identidade

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sujeito da educação: estudos foucaltianos. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

ROLNIK, S. 'Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma

Conferência proferida nos simpósios: Corpo, Arte e Clínica (UFRGS, Instituto

de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e

Institucional – Mestrado. Porto Alegre, 11/04/03); A vida nos tempos de cólera

(ONG Atua, Rede de Acompanhamento Terapêutico. Itaú Cultural, São Paulo,

17/05/03) e A clínica em questão: conversações sobre clínica, política e criação

(DA de Psicologia UFF e Universidade Nômade, Niterói, 05/12/03).

--------. Pensamento, corpo e devir Uma perspectiva ético/estético/política no

trabalho acadêmico Palestra proferida no concurso para o cargo de Professor

Titular da PUC/SP, realizado em 23/06/93, publicada no Cadernos de

Subjetividade, v.1 n.2: 241-251. Núcleo de Estudos e Pesquisas da

Subjetividade, Programa de Estudos Pós Graduados de Psicologia Clínica,

PUC/SP. São Paulo, set./fev. 1993.

SANTOS, B. de S. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma

ecologia de saberes. In SANTOS, B.S.; MENESES, M. P.(orgs).

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SILVA, Tomaz Tadeu. “A produção social da identidade e da diferença”. In:

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APÊNDICE V

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APÊNDICE VI

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APÊNDICE VII

Page 149: CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO …§ão_Giselle... · como Anete Abramowicz, Fúlvia Rosemberg, Moysés Kuhlmann Jr, Ana Lúcia Goulart de Faria. O referencial da educação

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APÊNDICE VIII

QUESTIONÁRIO DE PESQUISA DE CAMPO

Prezado (a) Professor (a) de Educação Infantil,

Gostaria de contar com a sua colaboração para o desenvolvimento da pesquisa de Mestrado acerca dos impactos das marcas na produção da identidade do professor de educação infantil das escolas públicas de campinas, na contemporaneidade. A sua participação não é obrigatória. Saliento que a participação neste questionário poderá ser anônima, sem identificação do colaborador. A pesquisa não trará nenhum custo ou implicação pessoal ao professor (a). Apenas os dados recolhidos serão objeto de análise na pesquisa do mestrado, garantindo a isenção e impessoalidade. O questionário é parte integrante da pesquisa de mestrado, realizado no

Programa de Pós Graduação em Educação, do UNISAL de Americana. O

objetivo da pesquisa é investigar como se dá a produção da identidade do

professor da Educação Infantil na Rede Pública de Campinas, diante do

contexto contemporâneo, e quais são suas marcas.

Caso consinta em participar, é importante que saiba que sua colaboração é essencial para que possamos discutir e elencar alguns pontos referentes. Reitero que o link de acesso ao questionário é http://goo.gl/forms/qrBDwddNhx. É

rápido!!! Conto com a ajuda/colaboração de vocês. Atenciosamente. Giselle Alessandra Marchi Mestranda em Educação Programa de Pós Graduação em Educação UNISAL de Americana

Data do preenchimento do questionário: _____/_____/2016 Caso o espaço das linhas reservadas às respostas não seja suficiente, poderá continuar no final do questionário, tendo o cuidado de identificar o número da questão. DADOS PESSOAIS: 1-NOME (optativo): _______________ 2- Idade: _____ anos. 3- Sexo: ( ) Fem. ( )Masc

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FORMAÇÃO:

4- Cursou Magistério? ( ) SIM ( ) NÃO 5- Qual o tipo de instituição? ( ) Público ( ) Particular 6- Qual data da conclusão? ________ 7- Cursou Graduação? ( ) SIM ( ) NÃO 8- Qual foi o curso na graduação? __________________________ 9- Qual o tipo de instituição? ( ) Pública ( ) Particular 10- Qual instituição?_________________ 11- Qual data da conclusão? ________ 12- Cursou pós-graduação? ( ) SIM ( ) NÃO 13- Qual o curso? 14- Qual o tipo de instituição? ( ) Pública ( ) Particular 15- Qual instituição?_________________ 16- Qual data da conclusão? ________ 17- Cite um fato histórico político marcante para você dessa época em que fazia

curso de formação inicial (magistério/ graduação) ou especialização ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

18- Cite um fato histórico social marcante para você dessa época em que fazia curso de formação inicial (magistério/graduação) ou especialização ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

19- Cite um fato histórico econômico marcante para você dessa época em que fazia curso de formação inicial (magistério/ graduação) ou especialização ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

20- Cite um fato marcante para sua motivação em tornar-se professor (a) da Educação Infantil

__________________________________________________________________________________________________________________________________

TEMPO E LOCAL DE TRABALHO:

21- Você trabalha na Educação Infantil da RMEC como: efetivo ( ) TJE ( ) adjunto ( )

22- Há quanto tempo trabalha na RMEC 23- Ser professor na Educação Infantil foi uma escolha sua: ( ) sempre ( ) a partir

de _________ ( ) nunca 24- Qual a sua Unidade de Trabalho atual?__________ 25- Há quanto tempo está nesta Unidade? ______ 26- Em quantas unidades já trabalhou?

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27- Em qual agrupamento trabalha atualmente? AG 1 ( ) AG 2 ( ) AG3 ( ) 28- Em quais agrupamentos já trabalhou? AG 1 ( ) AG 2 ( ) AG3 ( ) 29- Para você o que é infância? 30- Para você, o que significa ser professor (a) na Educação Infantil?

31- Enumere por ordem de sua preferência quais leis e diretrizes abaixo

relacionadas tiveram mais importância e impacto para a Educação infantil: ( ) Constituição (1988). Constituição da Rep ública Federativa do Brasil ( ) Lei n. 9394/96 – 20 dz. 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. ( ) Lei 10639/2003 Diretrizes curriculares nacionais para a educação das relações Etnicorraciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana. ( )Lei 11645/2008 Diretrizes curriculares nacionais para a educação das relações Etnicorraciais e para o ensino de história e cultura indígena

( ) Diretrizes Curriculares da Educação Básica para a Educação Infantil: um processo contínuo de reflexão e ação. ( ) Currículo em construção ( ) BRASIL, Ministério da Educação.Secretaria de Educação especial. Política

Nacional de Educação Especial. Brasília: MEC/SEESP, 1994.

( ) BRASIL, Ministério da Educação.Secretaria de Educação especial. Política

Nacional de Educação Especial. Brasília: MEC/SEESP, 2008.

( ) Referencial curricular nacional

32- Caso tenha outra Lei ou Diretriz, especifique. FORMAÇÃO CONTINUADA:

33- Qual experiência de formação continuada mais marcante como professora de educação Infantil?

__________________________________________________________________ 34- Há cobrança institucional para que você participe de Ações Formativas? 35- O que você leva em conta quando escolhe a ação formativa que participa?

Enumere por ordem de prioridade. ( ) conteúdo

( ) formador ( ) local ( ) horário

36- Caso tenha outras considerações, especifique: ________________________________

37- Para que você participa de ações formativas continuadas? ______________________________________________________________

38- Compartilha suas vivências nas Ações Formativas Continuadas com seus colegas de Unidade Escolar? ( )sim ( ) não

39- Em quais momentos compartilha? ( ) TDC ( ) conversas informais ( ) RPAI ( ) FC ( )Blog ( ) Redes sociais

40- Por que não compartilha?

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41- Espaço para comentários sobre as perguntas elaboradas e sugestões para o que não foi contemplado: _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

42- Se você tem interesse de participar de uma roda de conversa deixe seu e-mail aqui:___________________________

Agradeço sua participação! Giselle Alessandra Marchi

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APÊNDICE IX

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APÊNDICE X

Gráfico – Ordem de relevância e impacto das Leis e Diretrizes na EI

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APÊNDICE XI

Gráfico - Instituição em que cursou a graduação

24%

38%

4%

5%

5%

5%

5%

5%

9%

Puccamp

Unicamp

USP

UFPelotas

Ouro Fino

Unisal

Metrocamp

São Marcos

Unip

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APÊNDICE XII

Gráfico - Onde cursou a pós-graduação

35%

12%12%

41%

Unicamp

Puccamp

Unisal

Outras

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APÊNDICE XIII

Quadro - fato histórico SOCIAL marcante da época em que fazia curso de formação

inicial (magistério/ graduação) ou especialização

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APÊNDICE XIV

Quadro - fato histórico POLÍTICO marcante da época em que fazia curso de formação

inicial (magistério/ graduação) ou especialização

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APÊNDICE XV

Quadro - fato histórico ECONÔMICO marcante da época em que fazia curso de formação inicial

(magistério/ graduação) ou especialização

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APÊNDICE XVI

Quadro - fato marcante para sua motivação em tornar-se professor (a) de Educação Infantil

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APÊNDICE XVII

Gráfico – Agrupamento que trabalha atualmente

17%

25%58%

Chart Title

AG1

AG2

AG3

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APÊNDICE XVIII

Gráfico – Agrupamento que já trabalhou

19%

32%

49%

Chart Title

AG1

AG2

AG3

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APÊNDICE XIX

Quadro – Experiência de formação continuada mais marcante como professor de Educação Infantil

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APÊNDICE XX

Quadro – Para que participa de Ações Formativas Continuadas?

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APÊNDICE XXI

Gráfico – Compartilha suas vivências nas Ações Formativas Continuadas com seus colegas da

escola

0

5

10

15

20

25

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