CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA LUCIANO GONÇALVES BITENCOURT CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO: CONCEPÇÕES PARA A RECONFIGURAÇÃO DE SABERES E A REORGANIZAÇÃO ACADÊMICO-ADMINISTRATIVA NA UNIVERSIDADE Tubarão 2008

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Este trabalho, apresentado para obtenção do título de especialista em Gestão Estratégica em IES, tem o objetivo de apresentar concepções sobre as possibilidades de uma outra organização acadêmico-administrativa na instituição universidade, com base na reconfiguração dos saberes inscritos na tradição disciplinar. A partir de um cenário em que a educação superior se põe em crise em função de objetos de análise quantitativos, cuja preocupação é chegar aos padrões de resposta esperados pelas instâncias reguladoras do sistema, propõe-se a reavaliação dos pressupostos que sustentam os processos de gestão acadêmica. Para a reconfiguração de saberes julga-se necessário repensar a formação no ambiente educacional em função das trajetórias acadêmicas, seus campos de saber e áreas de conhecimento, alinhadas com itinerários ocupacionais, seus campos de atuação e áreas de formação.

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

LUCIANO GONÇALVES BITENCOURT

CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO:

CONCEPÇÕES PARA A RECONFIGURAÇÃO DE SABERES E A

REORGANIZAÇÃO ACADÊMICO-ADMINISTRATIVA NA UNIVERSIDADE

Tubarão

2008

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LUCIANO GONÇALVES BITENCOURT

CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO:

CONCEPÇÕES PARA A RECONFIGURAÇÃO DE SABERES E A

REORGANIZAÇÃO ACADÊMICO-ADMINISTRATIVA NA UNIVERSIDADE

Monografia apresentada ao Curso de Especialização em Gestão Estratégica em Instituições de Ensino Superior da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Gestão Estratégica em Instituições de Ensino Superior.

Orientador: Prof. Dr. Fernando Serra.

Tubarão

2008

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LUCIANO GONÇALVES BITENCOURT

CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO:

CONCEPÇÕES PARA A RECONFIGURAÇÃO DE SABERES E A

REORGANIZAÇÃO ACADÊMICO-ADMINISTRATIVA NA UNIVERSIDADE

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Especialista em Gestão Estratégica em Instituições de Ensino Superior e aprovada em sua forma final pelo Curso de Especialização em Gestão Estratégica em Instituições de Ensino Superior da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Tubarão, (dia) de (mês) de (ano da aprovação).

______________________________________________________ Professor e orientador Nome do Professor, Título.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Nome do Professor, Título.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Nome do Professor, Título.

Universidade do Sul de Santa Catarina

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A quem sempre apostou na minha capacidade

de refletir e incentivou proposições inovadoras

de sentido: ao amor, Mona.

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho não seria possível sem a participação sincera e compromissada com

a instituição universidade de professores e alunos com os quais convivi no período de

elaboração da proposta, período este em que ocupo a coordenação do Curso de Comunicação

Social da Unisul, no campus da Grande Florianópolis. À congregação do curso, meu

muitíssimo obrigado.

Mas arrisco-me aqui a nominar algumas pessoas especiais neste processo, mesmo

que, por lapso ou esquecimento, não relacione alguém. Tânia Cruz, Daniela Germann e

Nelson Baibich foram os principais parceiros. Tânia pelos ensinamentos e pela insistência em

abrir espaços no ambiente pedagógico para o debate das questões levantadas neste trabalho.

Daniela e Baibich por estarem sempre dividindo as angústias e as tarefas na condução do

curso. Tarefas que seriam muito mais difíceis de conciliar não fosse a eficiência de Gracieleni

Barros.

Alessandra Brandão, Ramayana Lira, Rosane Porto, Roberto Forlin, Tony Elíbio,

Jaci Rocha, Valmir Passos, Helena Iracy, Karla Grillo e Rogério Pohl, nas rodas formais e

informais, contribuíram com um riquíssimo debate a respeito do cenário e das proposições

aqui defendidas.

Maurício Lima e Mauri Heerdt foram parceiros intelectuais quanto às concepções

acadêmico-administrativas, sobretudo as que dizem respeito à instituição em que estamos.

Solange Gallo e Daniel Izidoro propiciaram, além do debate, a materialização de muitas das

concepções aqui referenciadas.

Por fim, o muito obrigado à alta gestão da universidade, representados aqui pelo

Reitor, Gerson Joner da Silveira, e pelo Diretor do Campus da Grande Florianópolis, Ailton

Nazareno Soares, por investirem na formação de seus gestores e permitirem o espaço de

reflexão que resultou neste trabalho.

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“O verdadeiro mercado para o saber universitário reside sempre no futuro”

(Boaventura de Souza Santos).

“Sempre que estão em crise e bem antes que a natureza da crise seja medida e

compreendida, as instituições tendem a recorrer instintivamente ao seu repertório de respostas

já tentadas e assim costumeiras” (Zygmunt Bauman).

“Na coexistência dos lugares e não lugares, o obstáculo será sempre político”

(Marc Augé).

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RESUMO

Este trabalho tem o objetivo de apresentar concepções sobre as possibilidades de uma outra

organização acadêmico-administrativa na instituição universidade, com base na

reconfiguração dos saberes inscritos na tradição disciplinar. A partir de um cenário em que a

educação superior se põe em crise em função de objetos de análise quantitativos, cuja

preocupação é chegar aos padrões de resposta esperados pelas instâncias reguladoras do

sistema, propõe-se a reavaliação dos pressupostos que sustentam os processos de gestão

acadêmica. Para a reconfiguração de saberes julga-se necessário repensar a formação no

ambiente educacional em função das trajetórias acadêmicas, seus campos de saber e áreas de

conhecimento, alinhadas com itinerários ocupacionais, seus campos de atuação e áreas de

formação. Neste contexto, estrutura-se uma proposta em que os projetos decorrentes levem

em conta a dinâmica das relações inscritas nessas dimensões. Descreve-se, por fim, uma

perspectiva de arquitetura curricular para a Comunicação, enquanto área de conhecimento e

campo de atuação, num contexto em que ensino, pesquisa e extensão sejam entendidas como

atividades características da instituição universidade e não metas ou objetivos a serem

alcançados.

Palavras-chave: Educação Superior. Certificação. Comunicação.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 - Organização Administrativa das Instituições de Ensino Superior no Brasil. ....... 30

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Evolução de matrículas nas IES públicas e privadas no Brasil. ........................... 18

Gráfico 2 - Década de explosão: Ensino Superior e concluintes do Ensino Médio no Brasil. 19

Gráfico 3 - Demanda latente por ensino superior no Brasil. ................................................... 20

Gráfico 4 - Demanda latente por ensino superior em Santa Catarina. .................................... 23

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Percentual de ociosidade no ingresso em IES no Brasil. ....................................... 21

Tabela 2 - Percentual de ociosidade no ingresso em IES em Santa Catarina. ........................ 23

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SUMÁRIO

1   PARA UMA INTRODUÇÃO: QUE LUGAR É ESTE, A UNIVERSIDADE? .......... 11  

2   UMA VISÃO SOBRE A CRISE DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL ................. 16  

2.1   ITINERÁRIOS EM DIAGONAL ................................................................................... 23  

2.2   BEM PÚBLICO COMO NOVA ÁREA DE NEGÓCIOS ............................................. 25  

2.3   SUTIS DIFERENÇAS INSTITUCIONAIS .................................................................... 28  

2.4   CENÁRIO EM BUSCA DE QUALIFICAÇÃO ............................................................. 33  

2.5   HOMOGEINIZAÇÃO DA FLEXIBILIDADE .............................................................. 38  

2.6   ENTRE A PERFORMANCE E O COMPROMISSO .................................................... 41  

3   CERTIFICAÇÕES, FORMAÇÃO E EDUCAÇÃO ..................................................... 44  

3.1   POR ESPAÇOS DE AFETIVIDADE E AUTONOMIA ................................................ 46  

3.2   EDUCAÇÃO PERMANENTE ....................................................................................... 51  

3.3   ÁREAS DE CONHECIMENTO, CAMPOS DE SABER E TRAJETÓRIAS

ACADÊMICAS ........................................................................................................................ 59  

3.4   ÁREAS DE FORMAÇÃO, CAMPOS DE ATUAÇÃO E ITINERÁRIOS

OCUPACIONAIS .................................................................................................................... 63  

4   COMPONENTES CURRICULARES EM COMUNICAÇÃO ................................... 67  

4.1   ESPAÇO SOCIAL DE APRENDIZAGEM .................................................................... 69  

4.2   LUGARES DE OCUPAÇÃO, COMPETÊNCIAS E HABILIDADES ......................... 71  

4.3   ARQUITETURA CURRICULAR .................................................................................. 75  

4.3.1   Comunicação como área de conhecimento e de formação ...................................... 76  

4.3.2   Comunicação como campo de atuação ...................................................................... 77  

4.3.3   Comunicação como campos de saber ........................................................................ 78  

4.4   DIRETRIZES ABERTAS ............................................................................................... 79  

4.5   TIPOLOGIA DE CERTIFICAÇÕES .............................................................................. 82  

5   CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 87  

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 89  

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1 PARA UMA INTRODUÇÃO: QUE LUGAR É ESTE, A UNIVERSIDADE?

Referências conceituais, muitas vezes, são relegadas em detrimento da

objetividade. Não obstante, a própria concepção de objetividade merece releituras sobre as

referências conceituais que a produzem. Nosso cotidiano está preenchido de “objetos”

desconectados, percebidos dentro dos próprios limites, circunstancialmente utilizados e

“descartados” sempre quando sua força instrumental se esvai. Tudo em função do movimento

no rumo de metas antecipadamente traçadas.

O modelo de sociedade em que vivemos cerceia espaço para referências

conceituais que não se proponham obsoletas, não se insiram no ritmo dos deslocamentos

permanentes e individualizados. As interconexões, as interfaces, os entremeios, ou tudo o que

dá sentido aos “objetos” do cotidiano, as intersubjetividades que nos dão um lugar de

ocupação sempre instável nesse processo forçosamente jogam contra a supressão do tempo

vista como necessária para a configuração dos espaços em que transitamos. Esse alerta é

necessário: os conceitos não estão adiante; antecedem o movimento.

Tentaremos, neste preâmbulo, esboçar algumas referências importantes para abrir

o espectro de visão a respeito do campo educacional. O intuito, evidente, é o de evitar

reduções de interpretação quanto ao contexto em que as ações decorrentes da proposta de

Certificação Processual em Comunicação se fundamentam. Sem a ilusão de superar o

necessário debate sobre a proposição, enquanto esboço, o uso das referências conceituais

neste argumento sustenta-se mais pela necessidade de evidenciar a complexidade de uma

proposta que não se configura meramente num projeto. Associar reconfiguração de saberes e

educação permanente, pressupostos deste trabalho, implica novas paisagens, cenários

complexos e dinâmicos cuja cartografia é constituída por dimensões diversas, variáveis

imprevisíveis e personagens múltiplas, todas inscritas no fenômeno chamado educação. Mais

que apostar na diversidade, está na aproximação das diferenças o maior desafio.

Aproximar diferenças exige alteridade. Lévi-Strauss (1981 apud BAUMAN,

2001) sugere como estratégias humanas duas formas de relação quanto ao reconhecimento da

alteridade dos outros. Uma antropoêmica, outra antropofágica. A primeira sustenta a

necessidade de manter afastados os tidos como estranhos, “vomitá-los” dos lugares de

convivência, negligenciá-los de qualquer contato que configure uma interação social. Bauman

(2001, p.118) descreve como “refinamento” dessa estratégia “o acesso seletivo a espaços e o

impedimento seletivo a seu uso”. O conceito se aplica muito bem aos sistemas de acesso ao

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ensino de nível superior sustentados pela lógica tecnocrática de exigência de requisitos

prévios e de certificações desconexas, usadas para delimitar o grau de legitimidade dos níveis

de conhecimento supostamente necessários.

A segunda estratégia sugerida por Lévi-Strauss, a antropofágica, sustenta-se na

ideia de “aniquilação” ou “suspensão” da alteridade dos outros. Consiste em “devorar” os

estranhos no sentido de possibilitar minimamente a convivência com eles. Uma alusão

possível e também refinada dessa estratégia é o espaço da aula. Diante da “sacralização”, da

“canonização” do conhecimento disciplinar, percebe-se uma dose - às vezes menos

embriagante, diga-se de passagem - de antropofagia intelectual, em que os “aprendizes” são

submetidos a uma certa violência simbólica sustentada na autoridade de “quem sabe” e

fundamentada na própria estrutura acadêmica, que teima em “regurgitar” os não adeptos.

Nesse sentido, as estratégias fágica e êmica se complementam e se consolidam no discurso

sobre o rigor tido como necessário para o que academicamente chamamos de construção do

conhecimento. Rigor, via de regra, sustentado pela autoridade docente, não no diálogo com os

saberes.

Seleção antropoêmica e antropofagia intelectual configuram-se em ambientes

desprovidos de integração; no caso do ensino superior, de vida acadêmica. Os nichos e guetos,

característicos das relações êmicas, são perceptíveis nas estruturas cindidas e fragmentadas

das Instituições de Ensino Superior. Por outro lado, como objetos de desejo, os “produtos e

serviços” acadêmicos servem-se de expedientes culturais para engendrar um sentido de

“comunidade”, em que o princípio de unidade se dá “tanto pelos valores que estimam quanto

pela lógica de conduta que seguem” (BAUMAN, 2001, p. 117). Dito de outro modo, primeiro

expurgam-se os desprovidos de condição intelectual ou econômica, incapazes de ocupar o

nobre espaço de construção de conhecimento, reconhecidos como “estranhos”. Depois, o

ambiente ocupa-se de moldar os adeptos à lógica do espaço em questão.

Na concepção de Bauman (2001), espaços assim seriam reconhecidos como

“públicos-mas-não-civis”. Lugares cuja imponência se dá pela imagem de inacessibilidade

para “os de fora” e cujo sentido de unidade conforta os “de dentro”. Augé (1994) acrescenta

um terceiro olhar sobre esses ambientes: os não lugares. Neles não se pode “ler” a identidade

dos que o ocupa, suas relações e a história que compartilham. São lugares que “não integram

nada, só autorizam, no tempo de um percurso, a coexistência de individualidades distintas,

semelhantes e indiferentes umas às outras” (AUGÉ, 1994, p. 101). Mesmo junto com os

outros, mas sempre sós, os “passantes” estabelecem uma relação de unidade sempre

contratual, cujos símbolos identificam e autorizam circunstancialmente os deslocamentos.

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Os símbolos acadêmicos, aqui representados por diplomas e titulações, pode-se

dizer, já não sustentam um ambiente constituído pelos deslocamentos no percurso de uma

construção coletiva, de vínculos afetivos e regras de convivência decorrentes dessa relação.

Diplomas e titulações parecem muito mais simbolizar, para usar uma expressão de Augé

(1994), as “tensões solitárias” dos lugares de ocupação compromissados com a trajetória na

busca por objetos de desejo para consumo próprio; sempre por um momento. Diríamos que é

para os símbolos que o percurso acadêmico está organizado; não para a consolidação do

espaço. Explicitando melhor: o percurso está para diplomas e títulos, não para o processo de

configuração permanente de saberes na construção de conhecimento. O antropólogo francês

ressalta, entretanto, que os não lugares são caracterizados assim por quem os ocupa; eles não

se caracterizam a si mesmos.

Um quarto olhar pode, ainda, ser acrescentado: o dos espaços vazios.

Sucintamente, poderíamos descrevê-los, a partir de Bauman (2001), como alijados de nossos

mapas mentais. Seriam como lugares potencialmente vivos, mas não vistos. Estão fora de

nossas listas de possibilidade justamente porque dependem de outras estruturações

conceptuais para materializarem-se. Estruturações que nos levariam, obrigatoriamente, ao

desconforto de mudar de lugar, deixar os espaços reconhecidamente preenchidos. Ao

remetermos o conceito para o campo da educação, poderíamos fazer alusão às condições de

possibilidade novas, pensadas, eventualmente propostas mas descartadas pela falta de

“consenso” sobre sua “eficácia” ou falta de clareza sobre as bases nas quais se estruturam

enquanto possibilidade.

Num certo sentido, não vemos os espaços vazios pelo próprio lugar de observação

que ocupamos. Quanto mais preocupados com o lugar de ocupação mais distantes dos novos

mapas mentais que nos permitiriam percebê-los. Entre os lugares êmicos, fágicos, os não

lugares e os espaços vazios, há um sentido político que só pode ser engendrado sob novas

concepções de alteridade, novas concepções de valor e novas regras de ocupação, voltadas

para as relações em sociedade e não para o compromisso com metas e objetivos

(institucionais ou individuais).

Em educação, os projetos dependem das respostas aos sistemas de avaliação que

mensuram seu grau de validade. A priori, as propostas acadêmicas precisam prever, com certo

grau de precisão, aonde pretendem chegar. Há uma taxonomia a serviço dessa projeção que

nos ajuda a localizar em que estágio estamos; o que falta e o que sobra em termos de estrutura

para a viabilizar a projeção. Essa taxonomia diz respeito a tudo que já está definido no

contexto educacional e é de extrema importância para a construção de mapas de referência.

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Quando ela está a serviço dos símbolos que legitimam o conhecimento, titulações

e certificações por exemplo, toda e qualquer alteração de rota rumo aos espaços vazios é vista

como decorrente de um corpo estranho que precisa ser “regurgitado” ou “devorado”,

dependendo dos riscos calculados na relação. Se a estranheza for demais, melhor o exílio; se

for passível de cooptação, melhor digerí-la, mesmo que quando “do lado de dentro” ela

provoque pequenas alterações de metabolismo. E assim vão-se instituindo os lugares de

ocupação sempre passageiros, destituídos de pertencimento e compromisso com o ambiente e

suas normas de convivência entre “os de dentro” e “os de fora”.

Vida acadêmica é antes de tudo vida. Se quer dizer com isso que não se pode

propô-la sem que haja um ambiente arejado, sem que seus “lugares epistemológicos”1 se

abram para percepções novas, para formas de expressão diversificadas, para além dos

catálogos, das coleções, dos cânones. No contexto de uma educação que se proponha

permanente, é preciso constituir espaços sociais de aprendizagem capazes de fazer circular

por eles saberes diferentes, intenções diversificadas, interesses distintos, mas comprometidos

com uma construção coletiva de oportunidades, de perspectivas e de conhecimentos.

“Preparar-se para a vida” - aquela tarefa perene e invariável de toda educação - deve significar, primeiro e sobretudo, cultivar a capacidade de conviver em paz com a incerteza e a ambivalência, com a variedade de pontos de vista e com a ausência de autoridades confiáveis e infalíveis; deve significar tolerância em relação à diferença e vontade de respeitar o direito de ser diferente; deve significar fortalecer as faculdades críticas e autocríticas e a coragem necessária para assumir a responsabilidade pelas escolhas de cada um e suas consequências; deve significar treinar a capacidade de “mudar os marcos” e de resistir à tentação de fugir da liberdade, pois com a ansiedade da indecisão ela traz também as alegrias do novo e do inexplorado (BAUMAN, 2008, P. 177).

É nesse contexto que a proposta de Certificação Processual em Comunicação

se apresenta. Ao compreender que a “democratização da universidade mede-se pelo respeito

do princípio da equivalência dos saberes e pelo âmbito das práticas que convoca em

configurações inovadoras de sentido” (SOUZA SANTOS, 2003, p. 228), o espaço social de

aprendizagem decorrente dessa reconfiguração fundamenta-se pela possibilidade de

movimento constante em busca de conhecimento, independente de níveis, graus e requisitos

1 Por lugar epistemológico poderíamos assumir, como propõe Paulo Freire (1986), um ambiente em que as

reflexões acerca de suas trajetórias cognitivas sejam fundamentadas pela curiosidade de saber justamente por se estar neste lugar. As relações com o ambiente e com o "outro", nesse contexto, fazem parte do processo de aprendizagem e de construção do conhecimento não como forma de superá-los pela competitividade, mas de compartilhar os itinerários.

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prévios2, certificações e titulações legitimadas; contudo, a possibilidade de movimento

sustenta-se pela necessidade de se estar permanentemente no espaço em configuração. Para

propor novas paisagens, sugere-se uma revisão do cenário, uma recomposição institucional a

partir do cenário descrito, e a abertura de espaço para interpretações novas sobre as dimensões

que a constituem. Como estratégia argumentativa, abordaremos aqui questões que

fundamentam uma leitura da crise no ensino superior brasileiro para, em seguida, trabalhar os

conceitos de certificação, formação e educação à luz de uma nova proposta. Por fim,

trataremos das especificidades relativas à área de comunicação e suas potencialidades.

2 Essa independência, obviamente, não se contrapõe aos ditames legais vigentes e que fundamentam as diretrizes

para o ensino superior. Mas, evidentemente, posiciona-se entre o que a lei determina e o que as normatizações sugerem como interpretação dada.

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2 UMA VISÃO SOBRE A CRISE DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL

Tem preocupado setores que lidam com estratégias nas Instituições de Ensino

Superior no Brasil a ociosidade de vagas. O caráter excessivamente seletivo do sistema

educacional brasileiro pode ser percebido pelo afunilamento de matrículas à medida que se

avança nos níveis de aprendizagem. O Censo Escolar de 2004, divulgado pelo Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira, o INEP, indicava que o sistema tinha 55

milhões de estudantes matriculados naquele ano. Destes, 34 milhões estavam no ensino

fundamental; 9,2 milhões, no ensino médio regular; e apenas 3,9 milhões, na graduação. As

escolas públicas concentravam 88% dos alunos no ensino fundamental, mas 41% não

terminaram o ciclo e a grande maioria dos que chegaram ao final do processo levaram mais

tempo do que os 8 anos necessários (MORAES, 2006). Com idade superior à adequada para o

nível de aprendizagem no ensino fundamental em 2004 eram 39%. No ensino médio, 53%.

São números expressivos e que ajudam a explicar porque tem sido difícil amenizar a crise por

que passa o ensino superior. De lá para cá não houve mudança na curva de afunilamento e, ao

contrário dos níveis anteriores, cresceram as matrículas no ensino superior privado.

Percebe-se, a partir da análise dos dados do Censo do Ensino Superior3, que a

crise evidenciada no setor deu-se em função da explosão no número de vagas ofertadas ao

longo das duas últimas décadas. A expansão iniciada nos anos 70 do Século XX, ganhou força

a partir de 1995 (Gráfico 1) e chegou a 74,57% dos 4.880.381 matriculados no sistema em

2007; também em 2007, 89,1% das 2.281 IES reconhecidas pelo censo são do setor privado.

Levando-se em consideração que 47,5% das vagas ofertadas para ingresso no sistema naquele

ano (1.341.987) não foram preenchidas, há aspectos relevantes a serem discutidos e que

transcendem a polarização público/privado. Não por acaso, apenas 10% da população

brasileira entre 25 e 34 anos têm curso superior completo, segundo os dados da Organização

3 Os dados estão disponíveis no endereço http://www.inep.gov.br/superior/censosuperior/default.asp. O Censo do

Ensino Superior reúne todas as informações relativas ao acesso, à infra-estrutura e aos índices de desempenho do sistema brasileiro. São dados meramente quantitativos, mas ricos em possibilidades de análise. Contudo, pelas dimensões da coleta e tabulação dos dados, os números oficiais são sempre divulgados com pelo menos um ano de atraso. Para efeito deste trabalho, fazemos a análise das informações oficiais de 2001 para cá. As informações anteriores foram colhidas de outras referências, principalmente de trabalhos de pesquisa sobre o setor da educação. Mas todos os dados podem ser confrontados com tabelas e gráficos disponibilizados no endereço do INEP na internet. Para efeito deste trabalho, utilizamos os dados oficiais até 2007. Vale ressaltar também que a unificação das provas de vestibular e do Enem e as novas regras de acesso às universidades públicas federais em todo o país devem modificar novamente os processos de coleta e divulgação de informações por parte do Ministério da Eduação. Isso porque, a partir do novo processo, será mais fácil identificar o número de candidatos por inscrição e não por instituição de ensino.

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para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico - OCDE4. Some-se a Taxa de Titulação

Média no Brasil5, de 47,8% segundo o censo em 2006.

Gráfico 1 - Evolução de matrículas nas IES públicas e privadas no Brasil. Fonte: MEC/INEP.

A estagnação do número de concluintes no ensino médio em nível nacional é

entendida como fator preocupante nesse processo. Em 2005 a taxa de crescimento em relação

a 2000 foi de apenas 1,21%, segundo o censo. Analisando os dados oferecidos pelo Ministério

da Educação, pode-se perceber que, no período em que o ensino superior brasileiro cresceu

mais, o número de vagas ofertadas é que teve curva mais acentuada (Gráfico 2). No entanto, a

diferença entre o número de candidatos e o de alunos efetivamente matriculados também

continuou crescendo. Se está no setor privado o grande salto no índice de oferta, não há como

contestar a opção pela massificação do processo expansionista do sistema.

Comparadas proporcionalmente, oferta de vagas e número de ingressantes tiveram

crescimento bem similar. A questão é que, historicamente, sempre houve sobra de vagas no

4 Pesquisa foi divulgada no relatório Education at a Glace 2009, em 8 de setembro. O Brasil é o país com o

menor índice de adultos com diploma universitário. 5 A Taxa de Titulação representa o número de concluintes em relação aos matriculados quatro anos antes, tempo

médio considerado ideal para a conclusão da graduação.

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sistema. Na década de explosão, portanto, as diferenças se acentuaram. Indo mais além: ao

mesmo tempo que não promove a democratização no acesso, o sistema não sustenta boa parte

dos ingressantes que conseguiram superar a seletividade das instituições tanto públicas (por

“capacidade”) quanto privadas (econômica)6. Os interessados em ingressar no sistema de

ensino superior brasileiro ficam expostos na superfície de um problema corriqueiramente

debatido a partir da dicotomia entre o direito à educação e o financiamento do processo

educativo. Público e privado ganham, assim, lugares extremos numa escala de valores que

desconsidera as oportunidades oriundas no próprio sistema.

Gráfico 2 - Década de explosão: Ensino Superior e concluintes do Ensino Médio no Brasil. Fonte: MEC/INEP.

6 O índice de evasão permaneceu na casa dos 20% ao ano, segundo o Censo do Ensino Superior, entre 2001 e

2006.

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Os especialistas já não falam em demanda reprimida, mas em demanda latente. O

índice de candidatos/vaga caiu de 4,3 em 1995 para 2,1 em 2005 no Brasil. Nos mesmos 10

anos, houve crescimento na oferta de vagas e no número de ingressantes. Contudo, as

diferenças se acentuaram na medida em que o índice ingressantes/vaga caiu de 0,76 para 0,69.

A massificação pela expansão do setor privado do ensino superior brasileiro contrasta com o

padrão de vida e os processos de seleção do setor público, com o nível de aprendizagem de

grande parte da população brasileira7. Resultado: entre 2001 e 2007 o número de vagas não

preenchidas cresceu em mais de quatro vezes (Gráfico 3). Os patamares de candidatos a

ingresso no sistema têm se mantido estáveis desde 2002, o que indica uma demanda latente

igualmente estável (Tabela 1). Os índices de significativa mudança estão no interior da

demanda latente, com a diminuição dos não classificados ano a ano e o aumento de não

ingressantes.

Gráfico 3 - Demanda latente por ensino superior no Brasil. Fonte: MEC/INEP.

7 Estudos promovidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)

apontam que apenas 53,8% dos alunos brasileiros conseguiram completar o ensino fundamental em 2005. Os números colocam o Brasil num patamar intermediário em relação às metas estabelecidas pela Unesco para o movimento Educação para Todos. Uma das principais causas apontadas, aliada à baixa qualidade do ensino no país, é o alto índice de repetência nas séries iniciais. Segundo os dados, também em 2005, 27,3% das crianças matriculadas na 1ª série foram reprovadas. Esses índices também influenciam no contexto da educação de nível superior, visto que os percentuais quanto ao acesso vêm caindo. Em 1999, 61,1% dos alunos brasileiros matriculados no ensino fundamental haviam completado o ciclo.

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Tabela 1 - Percentual de ociosidade no ingresso em IES no Brasil.

Fonte: MEC/INEP.

Os dados do Censo do Ensino Superior não levam em consideração quem se

inscreve em mais de um processo seletivo8, em diferentes instituições. Menos ainda o fato de

que mesmo as instituições que não cobram mensalidade têm feito muitas chamadas

posteriores à primeira matrícula para ingresso, numa clara alusão de que há também

dificuldades no processo seletivo. Trazendo a análise para Santa Catarina, 30.780 vagas

(35,5%) não foram preenchidas em 2007. No setor público, 4.278. Essa característica é

importante, na medida em que o Estado concentra boa parte de suas vagas em Instituições de

Ensino Superior classificadas como públicas municipais e que cobram mensalidade. Tais IES

aparecem no Censo do Ensino Superior junto com instituições públicas e “gratuitas”, mas

estão mais próximas do perfil de gestão das comunitárias, consideradas privadas9.

A consolidação da Região Sul enquanto mercado na educação é apontada por

especialistas como sacramentada. É a região com menos perspectiva de crescimento

quantitativo de IES e, por conseguinte, de matrículas. Para se ter uma ideia, entre 1997 e

2006, o número de IES cresceu em 222,5%10 e há uma estabilidade prevista para os próximos

8 As Hopper Educacional, CM Consultoria e Ideal Invest apontam que, no Brasil, cada candidato se inscreve, em

média, em 2,8 instituições diferentes quando enfrenta o processo seletivo para ingresso no ensino superior; o que sustenta a inexistência de uma demanda reprimida, sobretudo no setor privado.

9 Até a divulgação do Censo do Ensino Superior de 2007, a Universidade do Sul de Santa Catarina aparecia como instituição pública municipal no sistema de classificação do Ministério da Educação. Hoje, a UNISUL é classificada como privada. Para efeito de interpretação dos dados aqui analisados, portanto, vale a ressalva de que a UNISUL contribuía para verificação das vagas não preenchidas em instituições municipais. As demais instituições consideradas públicas e classificadas assim para efeito do Censo do Ensino Superior em Santa Catarina são Universidade Regional de Blumenau (FURB) e a Universidade do Extremo Sul de Santa Catarina (UNESC).

10 Revista Ensino Superior, disponível em <http://revistaensinosuperior.uol.com.br/textos.asp?codigo=12126>. Acesso em: 26 jun. 2008.

Page 22: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

21

anos por conta de uma demanda considerada atendida11. Portanto, para os especialistas, a

questão agora é o investimento em padrões de qualidade, que representariam um diferencial

importante entre as instituições existentes. Por isso mesmo as análises do setor devem levar

em consideração as características de cada IES e o contexto catarinense. Os dados do censo

confirmam essa tendência. Ao contrário do que ocorre no Brasil, em Santa Catarina todos os

índices estão em queda: seja o de ingressantes, não ingressantes ou não classificados. A

demanda latente tem reduzido as perspectivas das IES no que diz respeito à ocupação das

salas de aula.

A grande questão, nos parece, é que o nível de competitividade pela demanda

latente no Estado chega a um patamar em que não são mais suficientes os discursos sobre

infra-estrutura, docentes e projetos pedagógicos melhores. Há uma evidente necessidade de as

IES se pautarem por outros referenciais e outras formas de se mostrar à sociedade. Os

investimentos em marketing têm agora, apontam os estudiosos, como principal fator o

relacionamento com as pessoas. Não apenas para captar recursos, no caso das instituições que

dependem de mensalidade, mas principalmente para criar laços duradouros em que as

pessoas, tenham elas o nível de aprendizagem que tiverem, passem a perceber as IES por sua

conduta, não pelo seu discurso.

Um dos caminhos possíveis para essa nova configuração é considerar o processo

de formação como decorrente de um projeto de longo prazo, flexível e compatível com as

diferentes demandas sociais. É significativo considerar que, de 2001 a 2007, a demanda

latente dava sinais de crescimento até 2005; depois disso vem caindo. Os dados do censo

atestam que, entre 2005 e 2007, o número de ingressantes é maior que o número de não

classificados; e que o número de vagas não ocupadas é superior à metade de ingressos

efetivados (Gráfico 4 / Tabela 2).

11 A tendência, de acordo com os especialistas, são as fusões ou a compra de instituições menores por grandes

empreendimentos educacionais. Mas quanto ao número de vagas, o crescimento deve ser muito pequeno nos próximos anos.

Page 23: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

22

Gráfico 4 - Demanda latente por ensino superior em Santa Catarina. Fonte: MEC/INEP.

Tabela 2 - Percentual de ociosidade no ingresso em IES em Santa Catarina.

Fonte: MEC/INEP

Estudo publicado pela Hopper Editora (BRAGA, 2006) atesta que, só em 2004, as

IES privadas investiram 4,2% do faturamento em marketing e comunicação, com diferenças

significativas de montante nas instituições localizadas em capitais. Isso equivale a R$ 596

milhões, uma quantia considerável. A principal questão, segundo o estudo, é que boa parte

Page 24: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

23

dos recursos foi aplicada na captação de novos alunos, sobretudo através de propaganda (75%

do total destinado a marketing e comunicação). O contexto atual deve promover não só uma

redução destes recursos para este fim como uma mudança profunda no foco dos investimentos

ainda necessários no setor.

Reforçar o relacionamento institucional com discentes (os que já estão) e docentes

deve ser o novo foco. Essa mudança está diretamente associada com a qualificação dos

“produtos e serviços” oferecidos, mas deve ir além. A relação mais consistente e duradoura

com os “clientes” (docentes e pessoal administrativo aqui envolvidos) passa também por um

ambiente que estimule circulação e acesso permanentes aos interessados em vivenciá-lo.

Significa dizer que nem sempre o contexto exige a formalização contratual de cunho

comercial, com cobrança de taxas ou mensalidades. Isso exige uma mudança na concepção

dos currículos, mudança que permita a injeção de valores mais atualizados para as gerações

que estão chegando ao ensino superior.

2.1 ITINERÁRIOS EM DIAGONAL

Reconhecidamente, a escolha por uma carreira profissional ganha cada vez mais

complexidade. Seja pela imaturidade dos estudantes recém-saídos do ensino médio, ainda

muito novos e despreparados para fazê-la; pelas características de cada profissão quanto à

empregabilidade e os níveis salariais decorrentes; pela incerteza quanto às competências

exigidas pelo setor produtivo; ou por quaisquer outras razões inerentes à contemporaneidade.

Mais e mais, como argumenta o professor Renato Janine Ribeiro, as carreiras profissionais

fazem uma “trajetória em diagonal”, constroem um sentido que parte de uma atividade

entendida como porto seguro e percorre um “itinerário profissional” afastado do diploma

(RIBEIRO in QUADROS, 2003). Por outro lado, como apontam Carmen Sylvia Vidigal

Moraes & Sebastião Lopes Neto, o “itinerário formativo” no Brasil desvincula as “trajetórias

ocupacionais” de um processo educativo que consolide e qualifique certificações profissionais

a partir de uma política alinhada com as demandas sociais e não apenas com as do setor

Page 25: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

24

produtivo (MORAES e LOPES NETO, 2005). Itinerários formativos e profissionais estão em

diâmetros diferentes, quando não opostos12.

No contexto de carreiras incertas e da ansiedade pela necessidade de escolhas

constantes, é fundamental a compreensão da multiplicidade de funções que o Ensino Superior

assumiu nos últimos anos, ainda que as três finalidades básicas – investigação, ensino e

prestação de serviços – permaneçam desde os anos 60. Segundo Souza Santos (2003, p.189),

em

1987, o relatório da OCDE sobre as universidades atribuía a estas dez funções principais: educação geral pós-secundária; investigação; fornecimento de mão-de-obra qualificada; educação e treinamento altamente especializados; fortalecimento da competitividade da economia; mecanismo de seleção para empregos de alto nível através da credencialização; mobilidade social para os filhos e filhas das famílias operárias; prestação de serviços à região e à comunidade local; paradigmas de aplicação de políticas nacionais (ex. igualdade de oportunidades para mulheres e minorias raciais); preparação para os papéis de liderança social (OCDE, 1987: 16 e ss.).

O artigo 43 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96) , ao

tratar das finalidades da educação superior, fundamenta a amplitude do papel das Instituições

de Ensino Superior no Brasil. Essa amplitude precisa ser percebida como estruturante da

diversidade proposta pelo sistema de ensino. Pela LDB, a Educação Superior tem como

finalidades a) estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do

pensamento reflexivo; b) formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para

a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade

brasileira, e colaborar na sua formação contínua; c) incentivar o trabalho de pesquisa e

investigação científica, visando ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e

difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que

vive; d) promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que

constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações

ou de outras formas de comunicação; e) suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento

12 Em documentos recentes e no Plano de Gestão 2009-2013, elaborado coletivamente para a gestão do Reitor

Ailton Nazareno Soares, a instituição busca construir um processo educacional, com ou sem certificação, que esteja permanentemente ao alcance de quem busque novos conhecimentos. Sustenta-se a necessidade de promover currículos de vida, muito mais do que currículos de curso. A ideia de possibilitar a formação ao longo de toda a vida, como expressa a missão da Unisul, não é nova tampouco exclusiva. Mas passa por uma transformação estrutural profunda, sobretudo nos projetos de curso e nas concepções administrativas sobre a educação que têm levado em consideração, quase que exclusivamente, o corte de despesas. Sustenta-se a necessidade de que o conhecimento se estruture por áreas não mais por cursos.

Page 26: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

25

cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os

conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do

conhecimento de cada geração; f) estimular o conhecimento dos problemas do mundo

presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade

e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; g)promover a extensão, aberta à

participação da população, visando à difusão das conquistas e dos benefícios resultantes da

criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.

Na medida em que a educação passou a ser reconhecida como um direito, o ensino

superior ganhou novos significados e finalidades. Por isso a crise tem implicações mais

profundas, como argumenta Souza Santos (2003). Ao perder a hegemonia como centro de

produção de conhecimento e da alta cultura, a universidade perdeu também a legitimidade

social desse processo e pulverizou-se enquanto instituição para atender às diferentes

demandas do mundo do trabalho. Concomitantemente, as propostas de inovação não têm

conseguido romper com as tensões inerentes a esse processo de mudanças; a opção tem sido

controlar, administrar, fazer a gestão das contradições, justamente num ambiente que propõe

permanente flexibilidade e oferece a promessa de múltiplas possibilidades. Não se pode

perder de vista que a variedade nas combinações de oferta nos processos de ingresso e

motivação para a permanência no sistema educacional atualmente é fruto das demandas

econômicas e das lutas por justiça social.

2.2 BEM PÚBLICO COMO NOVA ÁREA DE NEGÓCIOS

Antes de sintetizar as diferenças entre as IES, importante nesta análise, é necessário

contextualizar, mesmo que sucintamente, em que condições o sistema estrutura sua

organicidade. De acordo com Porto e Réginer (2003), o crescimento do setor privado no

ensino superior não é um fenômeno isolado. Com a perda de capacidade de financiamento e

de atuação direta do estado-providência13, o setor público deixou de ser o principal

responsável por atender à expansão da demanda por educação de nível superior, ainda que a

13 O termo estado-providência é usado pelo pesquisador português Boaventura de Souza Santos para designar um

período em que o Estado era percebido como produtor de bens e serviços na educação. Pensada naquele momento como um bem público, a educação tornou-se bandeira de luta política, sobretudo no que se refere à gratuidade dos serviços e à qualidade do processo.

Page 27: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

26

elevação dos índices de acesso ao sistema esteja vinculado aos princípios de democracia e

justiça social. O paradoxo reside na questão de que tal elevação já não é uma exigência

unicamente econômica e, por isso mesmo, institui-se numa nova “área de negócios”. Por estar

vinculada a critérios de desenvolvimento econômico e aumento de produtividade nacionais

por um lado e a fatores de mobilidade social e perspectivas de melhoria de renda individuais

por outro14, a educação de nível superior passa a ser muito mais que uma necessidade. Como

as instâncias reguladoras do processo permitiram, sobretudo no Brasil, uma expansão

desmedida e desassociada de avaliações mais consistentes quanto às verdadeiras

potencialidades da educação superior no país. Para Porto e Réginer (2003, p. 66),

o sistema se move evidenciando tendências de rompimento com padrões estabelecidos e consagrados, porém não mais eficientes tanto na perspectiva dos sistemas produtivos quanto na perspectiva das aspirações culturais ou geracionais – as duas principais forças propulsoras da expansão do ensino superior. Do lado do mercado de trabalho, há as novas exigências de qualificação profissional (novos conteúdos, novas profissões, etc.), do lado das aspirações culturais há o fator do acesso ao ensino superior como elemento novo na cultura juvenil (primeiro nas classes médias mas que também opera em mimetismo sobre as camadas menos favorecidas) – o ensino superior passa a ser objeto de desejo (grifo dos autores).

Ainda fazem parte das “profundas transformações” no ensino superior brasileiro,

segundo Porto e Réginer (2003), a diversificação ampla dos tipos e modalidades de cursos

oferecidos, com a eliminação da rigidez dos currículos mínimos; a profissionalização da

gestão das instituições de ensino superior, numa alusão de mudança do perfil das lideranças

gerenciais: de educador-administrador para administrador-educador; a difusão da cultura de

avaliação, agora também disseminada na graduação; a atração de novos investimentos para a

educação superior frente às estimativas de expansão do sistema, numa alusão à diversificação

dos “produtos e serviços” a serem ofertados pelas IES; além da interiorização do ensino,

consolidação da pós-graduação, melhoria na qualificação do corpo docente e aumento da

produtividade do sistema. São tendências avaliadas a partir de cenários que colocam o Brasil

num momento-chave.

A última versão do anteprojeto de lei da educação superior15, assinada pelo então

ministro da Educação Tarso Genro, traz na essência da exposição de motivos a intenção de

“democratizar e qualificar suas instituições de ensino em todos os níveis”. O documento

propõe expansão com “qualidade e equidade”. Uma das razões expostas no anteprojeto é a de

14 O relatório Educations at a Glance 2009, da OCDE, divulgado em 8 de setembro, aponta que no Brasil, a renda

dos trabalhadores aumenta em mais de 100% com um diploma de ensino superior. 15 Documento publicado pelo Ministro Tarso Genro em 29 de julho de 2005.

Page 28: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

27

que a Taxa de Escolarização Bruta16 no Brasil chegava a 9%, uma das mais baixas do mundo.

Taxa que, pela proposta do Plano Nacional de Educação, tem de chegar a 30% em 2010

(NEIVA e COLLAÇO, 2005), 40% deste número em matrículas no ensino público. Essa

perspectiva tem sido discutida a partir da expansão de instituições privadas, como aconteceu

durante os anos 1990, e do fortalecimento das instituições públicas federais, como sustenta o

atual governo em seu projeto de reforma.

Pelo Censo do Ensino Superior, em 200617 a Taxa de Escolarização Bruta já havia

alcançado os 20,1%. E mesmo com a diminuição do ritmo da expansão por conta da atual

política educacional do Governo Federal, o setor privado continua crescendo

proporcionalmente em número de matrículas e de instituições. Percebe-se nas estratégias do

Governo a preocupação com os dados quantitativos, cujo enfoque reforça a intenção de

massificar a Educação Superior no Brasil para garantir uma elevação nos índices de

produtividade nacional. Em contraste, os índices de qualidade quanto ao aprendizado ainda

são muito baixos. Às IES que dependem de mensalidade resta criar alternativas para

acompanhar o nível de renda da população sem abandonar a missão de formar seres humanos

capazes de adotar posturas responsáveis nas relações com a sociedade.

Em documento síntese do Seminário Internacional Universidade XXI – Novos

Caminhos para a Educação Superior: o Futuro em Debate18, realizado em Brasília entre 25 e

27 de novembro de 2003 pelo Ministério da Educação, a tensão entre educação pública e

privada foi um dos fatores de preocupação. Mas o então ministro Cristovam Buarque parecia

mais focado na sobrevivência do sistema e na aproximação das diferentes naturezas e

finalidades das IES brasileiras. Ainda que o ensino público e gratuito estivesse em primeiro

plano, os estudos realizados na época, cuja essência não parece ter sido considerada nos

documentos atuais, levavam em consideração a complexidade da estrutura então disponível

aos interessados em ingressar no ensino superior. Note-se que o evento contou com a

participação de 31 países, o que evidencia um problema que não é localizado. Diz o

documento (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, pp. 4 e 5):

16 Índice que leva em consideração a proporção de pessoas entre 18 e 24 anos de idade e o número de

matriculados nas Instituições de Ensino Superior, independente da idade. No caso do Brasil, a taxa pode representar distorções, visto que pode haver um grande número de alunos no sistema que não se enquadram na faixa etária analisada. Em 2006, de acordo com o Ministério da Educação, a Taxa de Educação Líquida, que leva em consideração o número de matriculados dentro da faixa etária, chegava a apenas 12,1%.

17 Disponível no endereço eletrônico http://www1.universia.com.br/CensoEdSup_2006.ppt. Acessado em: 16 fev. 2008.

18 Disponível em http://mecsrv04.mec.gov.br/univxxi/resul_sem.htm. Acessado em: 31 jan. 2008.

Page 29: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

28

A tensão entre a educação pública e privada (...) [e]m geral, (...) assume forma de um debate travado nos termos do financiamento da educação, opondo o público – com financiamento do estado – ao privado, com seus diversos modelos de financiamento. (...) Nos termos dessa oposição, visto do ponto de vista apenas econômico, o financiamento público é definido como aquele que é estatal, e não no sentido republicano daquele que promove o bem público. De um ponto de vista mais amplo, conceituando-se a educação como um bem público, é possível pensar a existência de um sistema plural de instituições públicas e privadas, que adote diferentes modelos de financiamento e atenda diretrizes voltadas para uma clara política de ampliação da oferta e democratização do processo educacional (grifos nossos).

O índice de matrículas atribuídas ao setor privado no Brasil é um dos mais altos

do mundo segundo a UNESCO. Essa tendência está expressa no anteprojeto de lei sobre

organização e funcionamento do ensino superior, que resultou na Lei Universitária 5.540, de

1968. A proposta residia na busca de uma "conciliação difícil" entre o "ensino de massa" e a

"universidade" como centro de ciência e alta cultura, cujo objetivo era dar "soluções realistas"

e criar "medidas operacionais" para "racionalizar a organização" das atividades nas

universidades e obter maior "eficiência e produtividade"19.

Como resultado, a educação enquanto negócio estimulou a concorrência e ganhou

vantagens competitivas a partir da Constituição de 1988, com a autonomia dada às

instituições universitárias. Nessa perspectiva, a descontinuidade nas políticas educacionais

tem contribuído para que o sistema de ensino superior não consolide suas potencialidades.

Entretanto, pelas suas características jurídico-administrativas e acadêmicas consolidadas na

Constituição de 1988, a universidade é a única entre as Instituições de Ensino Superior capaz

de reunir todas as possibilidades de oferta previstas pelo sistema e combiná-las com o rigor do

conhecimento científico, sejam quais forem as fontes de financiamento.

2.3 SUTIS DIFERENÇAS INSTITUCIONAIS

É necessário um recorte para evidenciar as principais características do sistema de

ensino superior brasileiro e igualmente importante que se retome a análise a partir das

categorias administrativas reconhecidas no país para as IES. A organização administrativa

(Quadro 1) decorre da natureza jurídica de suas mantenedoras. São, portanto, instituições

19 Idem.

Page 30: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

29

públicas as mantidas, mesmo que parcialmente, pelo Poder Público federal, estadual ou

municipal; e privadas as mantidas por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. As

instituições privadas são reconhecidas como com fins lucrativos ou particulares em sentido

estrito, de vocação exclusivamente empresarial; e sem fins lucrativos, classificadas quanto à

vocação social: são comunitárias as mantidas por pessoas físicas ou jurídicas compostas por

representantes da comunidade em que está inserida; confessionais as mantidas por pessoas

físicas ou jurídicas de orientação confessional e ideológica específicas; e filantrópicas as

mantidas por instituições de educação ou assistência social que oferecem serviços

complementares ao Estado, sem remuneração20.

Quadro 1 - Organização Administrativa das Instituições de Ensino Superior no Brasil. Fonte: MEC.

Uma outra forma de compreender a estrutura da educação superior no Brasil é

pela organização acadêmica das IES. Esta classificação especifica prerrogativas

20 Informações disponíveis em

http://portal.mec.gov.br/sesu/index.php?option=content&task=category&sectionid=1&id=88&Itemid=517.

Acesso em: 29 jan. 2008.

Page 31: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

30

constitucionais e legais, dependendo de sua especificidade, que garantem autonomia didático-

científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, como preconiza a Constituição

de 1988, no seu artigo 207. As Instituições de Ensino Superior são hoje classificadas em

universitárias e não-universitárias. Cada instância tem subdivisões com características que se

diferenciam muito sutilmente. As instituições universitárias são classificadas em21

• Universidades: São instituições pluridisciplinares, públicas ou privadas, de formação

de quadros profissionais de nível superior, que desenvolvem atividades regulares de

ensino, pesquisa e extensão;

• Universidades Especializadas: São instituições de educação superior, públicas ou

privadas, que atuam numa área de conhecimento específica ou de formação

profissional, devendo oferecer ensino de excelência e oportunidades de qualificação ao

corpo docente e condições de trabalho à comunidade escolar;

• Centros Universitários: São instituições de educação superior, públicas ou privadas,

pluricurriculares, que devem oferecer ensino de excelência e oportunidades de

qualificação ao corpo docente e condições de trabalho à comunidade escolar (grifos

nossos).

A exigência de desenvolver “atividades regulares de ensino, pesquisa e extensão”

é que institui a principal diferença entre as universidades e as demais IES com o status de

universitárias. A composição do corpo docente pela proporcionalidade de titulação e a

implantação de um número mínimo de cursos de pós-graduação stricto sensu são aspectos

discutidos em várias instâncias da educação no Brasil, mas que hoje caracterizam as

instituições universitárias como de pesquisa por um lado (universidades) e de ensino por outro

(centros universitários). Quanto às IES não universitárias, as fronteiras são bem menos

visíveis. Elas são subdivididas em22

• CEFETs e CETs: Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets) e os Centros de

Educação Tecnológica (CETs). Representam instituições de ensino superior, públicas

ou privadas, pluricurriculares, especializados na oferta de educação tecnológica nos

diferentes níveis e modalidades de ensino, caracterizando-se pela atuação prioritária na

área tecnológica. Eles podem ministrar o ensino técnico em nível médio. O centro de

Educação Tecnológica possui a finalidade de qualificar profissionais em cursos

21 IES – Organização Acadêmica: textos retirados na íntegra do endereço eletrônico

http://portal.mec.gov.br/sesu/index.php?option=content&task=view&id=651&Itemid=292. Acessado em 29 jan. 2008.

22 Idem.

Page 32: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

31

superiores de educação tecnológica para os diversos setores da economia e realizar

pesquisa e desenvolvimento tecnológico de novos processos, produtos e serviços, em

estreita articulação com os setores produtivos e a sociedade, oferecendo, inclusive,

mecanismos para a educação continuada;

• Faculdades Integradas: São instituições de educação superior públicas ou privadas,

com propostas curriculares em mais de uma área do conhecimento. Tem o regimento

unificado e é dirigida por um diretor geral. Pode oferecer cursos em vários níveis

sendo eles de graduação, cursos sequenciais e de especialização e programas de pós-

graduação (mestrado e doutorado);

• Faculdades Isoladas: São instituições de educação superior públicas ou privadas.

Com propostas curriculares em mais de uma área do conhecimento são vinculadas a

um único mantenedor e com administração e direção isoladas. Podem oferecer cursos

em vários níveis sendo eles de graduação, cursos sequenciais e de especialização e

programas de pós-graduação (mestrado e doutorado);

• Institutos Superiores de Educação: São instituição publicas ou privadas que

ministram cursos em vários níveis sendo eles de graduação, cursos sequenciais e de

especialização, extensão e programas de pós-graduação (mestrado e doutorado) -

grifos nossos. Academicamente, portanto, a universidade deve se organizar de modo a responder

minimamente por ensino, pesquisa e extensão indissociados. Um dilema, na medida em que

as interpretações quanto a esta condição são tão variadas que a concepção mesma de

universidade se esvai. Defende-se aqui que sem desenvolver uma perspectiva de iniciação

científica e de comunicação23 com a sociedade, os financiamentos para as atividades que

transcendem o ensino em instituições universitárias, sobretudo de gestão privada, não são

alcançados com a estrutura necessária para promover a vida acadêmica e a “qualidade”

almejadas.

A instituição universidade deve integrar múltiplos conhecimentos existentes e

transformá-los em patrimônio coletivo (BOTOMÉ, 1996). Esses compromissos sociais

diferenciam a universidade das demais instituições. Gerar e socializar conhecimentos depende

de um fazer humano cujo significado está nas suas relações. Nesse contexto, ensino, pesquisa

23 Comunicação aqui entendida como um lugar em que os processos culturais se desenvolvem; não como um

lugar de mediação nem de transmissão de informações.

Page 33: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

32

e extensão são atividades desse fazer humano; resultam de um sistema de relações que

constituem a própria universidade. Não são, portanto, metas ou objetivos.

Para chegar aos financiamentos externos, a pesquisa precisa estar comprometida

com o ensino e com o desenvolvimento dos critérios de construção do conhecimento dela

advindos conjuntamente com a sociedade. Aqui, portanto, não se está falando de divulgação

de ciência, tampouco da difusão dos resultados de pesquisa; mas de um processo de

comunicação pautado por uma relação social que leve em consideração os múltiplos saberes

envolvidos. Nesse sentido, é possível pensar projetos pedagógicos que estruturem programas

de aprendizagem mais flexíveis, abertos à curiosidade epistemológica (FREIRE, 1996),

terreno fértil para abarcar a investigação científica nos processos de aprendizagem. Para as

instituições que cobram mensalidade, uma práxis que permite o financiamento de atividades

de pesquisa vinculadas ao ensino.

É sobre a lógica que pressupõe pesquisa e extensão, e igualmente o ensino, como

meta que se constroem indicadores de produtividade. Contudo, o foco institucional da

universidade está no processo, ou seja, nas relações que propiciam a geração e a socialização

do conhecimento. As avaliações quantitativas têm instigado uma interpretação desse enfoque

baseada num portfólio a partir de demandas específicas, com o objetivo de manter a

sustentabilidade econômico-financeira. As análises de mercado alicerçadas exclusivamente

em produtos e serviços desconsideram uma das funções primárias da universidade enquanto

instituição: gerar condições de possibilidade para o desenvolvimento socioeconômico do

lugar em que está inserida. E isso não se refere apenas à preparação de mão-de-obra

qualificada para setores produtivos que as demandam. É para a sociedade que estas

instituições existem.

O equívoco talvez resida na negação dos valores que diferenciam uma

universidade das demais IES em detrimento da tentativa desesperada de garantir a ocupação

das salas de aula com estratégias que enfatizam unicamente as supostas vantagens entre os

custos e os benefícios para os interessados. E o problema está no fato de que não basta

adequar-se ao contexto a partir, unicamente, da sustentabilidade financeira. Porque não é um

curso enquanto produto que sustenta a universidade. É a condição de universidade que

fundamenta as escolhas de sua própria constituição, para além de uma carteira de produtos e

serviços. Significa dizer que a sustentabilidade não é exclusivamente ponto de partida

tampouco decorrência de ações bem planejadas. Ela é concomitante a um processo que se

configura na relação com a sociedade; não só com o setor produtivo.

Page 34: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

33

Sob esse aspecto, há uma interpretação simplista dentro e fora das IES. Via de

regra, do lado de fora desenvolve-se uma estreita visão de que quanto mais competitivo é o

processo seletivo, mais qualificada parece ser a instituição quanto aos produtos e serviços em

oferta (as IES que não cobram mensalidade sempre levarão vantagem nesse quesito). De outro

lado, as estratégias de marketing nas IES que cobram mensalidade têm, também via de regra,

desvalorizado os princípios acadêmicos como fator de sustentabilidade, sobretudo no que

tange a qualidade das atividades educacionais. Entramos no Século XXI e os princípios de

exclusão permanecem delineando as escolhas quanto aos pressupostos de qualidade. E essa

visão é sustentada pelo próprio meio acadêmico.

O fundamento elitista de que o conhecimento não é para todos justifica os

pressupostos de uma docência focada nos alunos mais qualificados para o aprendizado. Uma

distorção, na medida em que o rigor científico na construção do aprendizado deve ser um

critério de comportamento, mensurável por uma trajetória em processo; não um critério de

seleção nem meta a ser alcançada por um programa de aprendizagem. Qualificar o processo,

portanto, passa também pelo fortalecimento dos compromissos de gerar e socializar

conhecimento. Docentes valorizados, constantemente atualizados, tornam-se fundamentais;

não menos que o compromisso de canalizar as energias dos estudantes para um processo de

formação mais cooperativa24 e menos instrumental.

2.4 CENÁRIO EM BUSCA DE QUALIFICAÇÃO

As propostas do Governo Federal para a educação superior, baseadas num

processo expansionista do sistema público e gratuito de ensino, corroboradas por

investimentos em novas universidades e outras Instituições Federais de Ensino Superior; os

investimentos dos municípios em ensino superior, com instalação de novas unidades e novos

cursos gratuitos; a movimentação do setor produtivo no sentido de garantir qualificação para a

grande quantidade de postos de trabalho ociosos em algumas áreas; a expansão do Ensino a

24 O termo cooperativo aqui assume um sentido muito mais amplo do que a configuração de um modelo de

negócios de relações descentralizadas e de baixa hierarquia. O sentido de cooperação assumido aqui é o de um ambiente em que as ações são pensadas e desenvolvidas para a construção de um espaço social comprometido com todos os que por ele circulam.

Page 35: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

34

Distância25, também gratuito, como proposta de “democratização” do acesso ao ensino

superior no país; todos são estruturantes na configuração do cenário para os próximos anos.

Esse cenário apresenta invariantes macro-estruturais com os quais se precisa

contar, como apontam Porto e Réginer (2003, pp. 91 a 93): com a abertura externa da

economia e a modernização tecnológica, a base produtiva do país tende a promover um

aumento de competitividade; em decorrência, há uma tendência de mudança nas relações de

trabalho, caracterizadas pela diminuição do emprego formal e o aumento do trabalho

informal, mesmo com a tentativa governamental de buscar, na flexibilização das relações

trabalhistas, o aumento nos níveis de emprego; o país entra no mapa dos investimentos

internacionais sustentado pela modernização dos sistemas de telecomunicações e tecnologias

da informação, apesar das deficiências ainda crônicas dos setores de energia elétrica e

transportes; e há também uma tendência de o Estado brasileiro fortalecer a retomada do papel

de “regulador e promotor do desenvolvimento”.

Também importante é a mudança no perfil demográfico brasileiro. Estudos

publicados pela Fundação Joaquim Nabuco com base nos dados do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística - IBGE, apontam em longo prazo uma mudança significativa na taxa

de crescimento da população jovem, com uma “continuada redução do tamanho absoluto da

população menor de 15 anos”. As estimativas são de que até 2050, a população jovem fique

na casa dos 17% (contra os cerca de 35% atuais) em relação ao contingente populacional. São

mudanças significativas e que impactam nas políticas sociais, sobretudo no que diz respeito

aos investimentos na educação.

A taxa de crescimento populacional, que caiu de 3,4% para 1,9% entre os anos 60

e 70 do século passado, deve se estabilizar em 0,74% ao ano entre 2010 e 2020. Esses fatores

indicam que, para a população jovem, o mais significativo seja deslocar os investimentos em

educação, hoje aplicados na ampliação do número de salas de aula e de docentes, para a

qualidade no ensino (MOREIRA, 2002). Além disso, há fortes indícios de que outros

processos seletivos e outras modalidades de oferta sejam necessárias, em função dessa

mudança de perfil.

Se considerarmos os pressupostos de que educação e trabalho estão hoje

concomitantemente para o processo produtivo; de que trabalho e emprego já não têm uma

relação explícita; e que há a promessa de diminuição da centralidade do trabalho produtivo na

25 Os dados do censo são relevantes quanto ao Ensino a Distância. De 1.682 matriculados em 10 cursos, em

2000, o EaD saltou para 207.206 matriculados em 349, em 2006. Esse índice chega a 4,4% do número de matrícula nos cursos presenciais naquele ano.

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35

vida das pessoas (SOUZA SANTOS, 2003), teremos uma ideia das mudanças de paradigma

por que passa o setor da educação no mundo inteiro. Há dois níveis, segundo Souza Santos

(2003), de questionamento quanto à relação educação-trabalho nos modelos atuais. O

primeiro diz respeito aos ciclos característicos a cada um dos fatores que estruturam a relação.

Entre a titulação e a ocupação há uma correspondência instável.

Por um lado, a estrutura rígida da universidade não consegue acompanhar os

movimentos rápidos do mercado; por outro, o sentido de eficácia do setor produtivo não

contempla uma sólida formação humana. O segundo nível, mais profundo, consiste em dois

aspectos básicos e importantes: na atualidade, educação e trabalho são entendidos como

concomitantes diante das profundas transformações nos processos produtivos e por isso se

fala em educação permanente. Além disso, trabalho e emprego não se relacionam mais

diretamente, dissociando a ideia de investimento na formação como investimento direto num

emprego específico.

Diante das novas tecnologias de armazenamento e cruzamento de dados, de busca veloz da informação, resta ao ensino, à universidade, mais do que nunca, assumir sua função de (...) formar analistas simbólicos, pessoas, cidadãos capazes de interagir, de se movimentar, de decodificar essas informações, de extrair desse excesso de informações um pensamento ou uma ação. Não se trata mais de ensinar uma profissão, porque ela pode deixar de existir em três anos, mas formar sujeitos capazes de se reciclar e mudar de profissão duas, três, quatro vezes ao longo de sua vida profissional e de sua existência (BENTES, 2002, p. 4).

No âmbito das ocupações, sejam elas formais ou informais, no chamado mercado

de trabalho, constata-se o desequilíbrio entre as “qualificações adquiridas” por meio educativo

e as “qualificações requisitadas” pelo setor produtivo. Moraes e Lopes Neto (2005), contudo,

alertam para o fato de que os processos de formação e educação não geram emprego. A

constituição das políticas trabalhistas e a instituição das condições de possibilidade de

distribuição de renda decorrem da relação entre capital e trabalho. Portanto, a desarticulação

entre a empregabilidade e “os processos sociais subjacentes às mudanças em curso” é fruto de

uma visão distorcida quanto à necessidade de as “capacidades formadas” terem de atender

exclusivamente a competências consideradas necessárias pelo setor produtivo.

Reconhecidamente, o conhecimento ganha obsolescência quando reduzido ao mercado de

trabalho. Nesse sentido, também os cursos quando pensados como unidades de negócio com

ciclos de vida pré-estabelecidos.

Como flexibilizar tem sido o argumento para suprimir o tempo gasto na produção

e acelerar o tempo de giro do capital, a qualificação do capital humano e a qualidade dos

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36

conhecimentos produzidos têm se tornado tão essenciais na atualidade. Competitividade e

produtividade, hoje também exigidas no âmbito da educação, tornaram-se dogmas de luta pela

sobrevivência no mundo dos negócios26. Todos esses valores são transferidos para as

composições curriculares no ensino superior por conta de uma visão de mundo que não

alcança outras perspectivas e se padroniza para atender a demandas de mercado.

Uma série de fatores está associada às demandas para reformarmos as universidades a fim de fazê-las mais “eficientes”: (...) currículos (...) mais relevantes para os negócios e a indústria; (...) contratação do corpo docente em regimes de trabalho de curto período e uma geral tendência à temporalidade da força de trabalho; (...) avaliação de desempenho (...), que força o corpo docente a ensinar dentro das modalidades aprovadas e a publicar mais; (...) padronização dos certificados, diplomas e diplomas superiores; (...) o crescente gerenciamento (...) para fiscalizar e controlar os acadêmicos e efetuar o corte e o marketing da universidade (FEATHERSTONE in SANTOS FILHO e MORAES, 2000, pp. 80 e 81) - grifo do autor.

Quase que com unanimidade, percebe-se a necessidade de garantir nas

composições curriculares valores entendidos como essenciais para uma formação atualizada

de profissionais, cidadãos, conscientes de seus compromissos sociais e com a sustentabilidade

do planeta. Mas há uma reflexão importante a ser feita: as políticas de elaboração e

implantação desses currículos, no mais das vezes, ainda refletem a sociedade industrial, e

estão preocupadas em preencher os postos de trabalho até como condição de autopromoção

(os cursos que mais empregam são os mais valorizados). Hoje, entretanto, os postos de

trabalho não são mais fixos e a formação está mais voltada para consumidores, centrada em

conteúdos generalizantes. Tais conteúdos talvez não estejam associados à necessidade de

visão global dos processos; talvez sejam reflexo da descontextualização dessa visão. Os

projetos pedagógicos, em seus princípios, podem apresentar diferentes modos de expressar

tais valores, mas eles estão lá:

1. Formação cultural sólida e ampla;

2. Uso de quadros teóricos analíticos mais gerais;

3. Visão global do mundo e suas transformações;

4. Desenvolvimento de espírito crítico;

5. A inserção da criatividade como elemento importante;

6. Disponibilidade para a inovação;

26 A reflexão pode ser melhor apreciada na revista Educação & Sociedade de número 75 (Agosto/2001), no

artigo Política Educacional, Mudanças no Mundo do Trabalho e Reforma Curricular dos Cursos de Graduação no Brasil, de Afrânio Mendes Catani, João Ferreira de Oliveira e Luiz Fernando Dourado. Acessado em 24 de outubro de 2006 no endereço eletrônico www.scielo.br/pdf/es/v22n75/22n75a06.pdf.

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37

7. Ambição pessoal;

8. Atitude positiva diante do trabalho, individual ou coletivamente;

9. Capacidade de negociação. Tais valores são válidos, indubitavelmente. Contudo, não se deve listá-los apenas

como um leque de opções para a composição de currículos “inovadores”. Segundo Callon (in

PARENTE, 2004) são dois grandes processos de modernização que alicerçam o conceito de

inovação: a competição econômica do mercado mundial e a ciência como fonte de progresso e

eficácia. E essa ideia de inovação paralisa porque se impõe e se naturaliza por não permitir a

todos os atores envolvidos a percepção de margens de manobra estratégica. Nessa concepção,

“a ciência é exterior ao mundo social e econômico” e seus laboratórios, suas redes logísticas

não são reconhecidos como o que dá sentido aos textos científicos; a ciência, portanto, não

circula nem se inscreve como representação do vivido. Concomitantemente, a inovação é

entendida apenas como potencialidade de uma ideia.

Dos primeiros esboços aos protótipos, do desenvolvimento à circulação de bens

materiais ou simbólicos, a inovação se efetiva ao ser aceita pelo consumidor, como último

estágio. As ideias são, portanto, associadas à produção como origem e ao consumo como

resultado; uma lógica que estabelece a priori os papéis de cada um no processo. Contudo, sem

a ação política, que retoma permanentemente o controle, para evitar, por exemplo, que se leve os mais desprovidos ao desespero e à exclusão total, o mercado auto-regulador acabaria desabando sobre si mesmo, levando em sua queda a sociedade inteira, reduzindo a farrapos o tecido social, destruindo a solidariedade entre os seres. (...) A única comunicação entre a oferta e a demanda é feita através do preço e da troca de dinheiro. Reduzir as relações sociais à troca silenciosa garante, aliás, a paz social. Nada de tagarelices inúteis, nada de debates metafísicos, nada de discursos incoerentes (CALLON in PARENTE, 2004, p. 72).

Ciência e inovação, vistas de modo linear, estão para um mercado regulado pela

competitividade e pela eficiência. Mas, construída socialmente, a concepção de mercado não

tem nada de natural. A construção social do mercado começa no processo de aprendizagem e

de formação; portanto é necessário inseri-lo no âmbito da própria construção. Em outras

palavras, está nas relações sociais e econômicas a sua estruturação e, por isso, sem a definição

compartilhada dos papéis que desempenharão os atores desse processo como “recursos

estratégicos chave”, a concepção de mercado se resume a uma competição que “recai sobre a

satisfação de demandas que arbitram entre diferentes ofertas”.

A instituição universidade pode ser a articuladora entre ciência, inovação e

mercado, como que atando um nó em uma rede de relações sociais e econômicas capazes de

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38

perceber novas condições de possibilidade. Nesse sentido, as relações para além do projeto

pedagógico e da composição curricular também devem estar pautadas por essa premissa. O

ambiente universitário, em todas as suas dimensões, inclusive as que envolvem contrato

comercial, devem se constituir num ambiente de relacionamento aberto, de negociações

constantes, orientadas pelas necessidades sociais para gerar condições de acesso ao

conhecimento em constante geração seja por quem projeta um “itinerário profissional” ou

almeja um “itinerário formativo”.

2.5 HOMOGEINIZAÇÃO DA FLEXIBILIDADE

Na perspectiva de uma visão tecnocrática, os processos de inovação no ensino, em

quaisquer dos níveis que o componham, construíram suas referências a partir do controle de

variáveis para uniformizar, homogeneizar os resultados. Em especial no ensino superior, as

reformas orientam-se para “formas e estruturas organizativas” com o fim de atingir

eficazmente objetivos específicos (RASCO in CASTANHO e CASTANHO, 2000). Em

outras palavras, as "novas formas" de utilização de indicadores, avaliações e inspeções

sustentam condições de competitividade que, via de regra, obrigam a tomada de decisões

conforme o esperado. A partir do trabalho de E. R. House (1981), Rasco adverte sobre três

mitos calcados nos interesses das sociedades industriais, que buscam “altos benefícios com

baixos custos”. Os mitos da transferibilidade, do especialista e do consenso social originam-se

de um ambiente hierarquizado, em que as decisões partem de cima para baixo e do centro para

as periferias.

Segundo o primeiro [mito], toda inovação terá uma ampla aceitação e oferecerá uma solução com alta capacidade de generalização, que poderá ser “transferida de um lugar para outro”. (...) Como se pode facilmente estimar, esse é um mito derivado diretamente da epistemologia positivista. Um produto tecnológico goza da capacidade da generalização – e da transferibilidade – próprias das proposições causais verdadeiras em que se fundamenta, porque tal produto é o resultado pragmático da manipulação de certas causas para obter efeitos desejados. (...) O segundo mito é o dos especialistas. (...) Qualquer iniciativa ou proposta tecnológica exige a presença de investigadores especializados. Como tais, eles controlam os arcanos do saber e são, por isso, os mais qualificados para orientar as decisões sobre os cursos de ação possíveis. (...) [O] mito do consenso baseia-se na ideia de que os interesses particulares, pessoais ou coletivos, dos receptores das inovações, coincidem com os interesses gerais dos grupos da decisão e dos grupos da criação do

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conhecimento (RASCO in CASTANHO e CASTANHO, 2000, pp. 19 e 20) - grifos do autor.

Já Cortella (2004) aponta duas necessidades contemporâneas no que diz respeito à

educação: a educação formal, que alicerça os conhecimentos básicos para o ingresso das

pessoas ao mundo do trabalho; e a educação continuada, que garante a possibilidade de

atualização desse conhecimento por toda a vida. Mas as respostas do campo educacional às

novas demandas têm sido dadas no âmbito da estrutura legitimada pelos ideários de carreira

acadêmica e das decisões conforme o esperado.

De acordo com o grau de formação, há níveis diferenciados de valorização salarial

no sistema de ensino ao qual o adjetivo “superior” confirma o sentido ainda elitista das IES.

Tal característica tem origem no mundo do trabalho, cujo processo de formação profissional

desconsidera os fundamentos socioculturais, e mesmo os científico-tecnológicos, como

essenciais aos novos perfis exigidos pelo mercado e é avaliado pelos critérios de polivalência

e flexibilidade.

Não se pode desconsiderar as potencialidades do sistema de ensino superior a

partir de critérios de revitalização do conhecimento (não confinado apenas à racionalidade

científica) em qualquer nível de aprendizagem. Assim, a ideia de aprendizado permanente

talvez possa se desvincular da necessidade de titulações baseadas em “nichos” de saberes.

Não no sentido de superá-las definitivamente, mas no de valorizar outros quesitos igualmente

importantes para o processo de formação em quaisquer áreas do conhecimento humano e de

formação profissional.

É preciso ir para além das identidades profissionais fixas, o que inclui o próprio

ideário de carreira acadêmica (RIBEIRO in QUADROS, 2003). Aliás, esse é outro (senão o

mesmo) ponto paradoxal: a flexibilidade27 exigida serve para manter fixas algumas

concepções estruturantes do que se quer flexível. Dizendo de outro modo, a concepção de

flexibilidade tem sido usada para justificar uma nova dinâmica de projeção de itinerários,

sejam formativos ou ocupacionais, mas não sustenta, por si mesma, a efetivação das

trajetórias dela decorrentes. Estruturas flexíveis não têm forma; portanto, não estão dadas,

precisam ser “construídas” no percurso, em permanente processo.

27 Bauman (2007, p.10) refere-se à flexibilidade como a “prontidão [do indivíduo] em mudar repentinamente de

táticas e de estilo, abandonar compromissos e lealdades sem arrependimento – e buscar oportunidades mais de acordo com sua disponibilidade atual do que com as próprias preferências”. Em outras palavras, essa ideia de flexibilidade serve para que os projetos organizacionais – esses fixados em metas a serem atingidas – mantenham o “controle” das variáveis não previstas. Com o destino pré-traçado, os indivíduos podem sair do “lugar alocado”, se deslocar e realocar de acordo com as oportunidades postas à escolha; mesmo que não considerem os destinos traçados como ideais.

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40

Nesse contexto, a complexidade do sistema de ensino superior brasileiro reserva

um terceiro nível de classificação que diversifica os processos de formação. Culturalmente,

um curso de nível superior circunscreve-se à graduação (bacharelado, licenciatura e

tecnologia). Contudo, tem aparecido no Brasil – muito timidamente, é verdade – a opção por

cursos superiores cuja proposta é explorar campos de saberes de "formação específica", com

direito a diploma e possibilidade de ingresso em pós-graduação lato sensu, ou de

complementação de estudos com direito a certificado. A base da educação superior ainda

oferece a possibilidade de oferta de cursos de extensão, com certificado de caráter meramente

social, mas de igual importância na formação.

Quanto à pós-graduação, há duas classificações:

1. Lato Sensu: Os cursos têm duração mínima de 360 horas, não computando o

tempo de estudo individual ou em grupo e sem assistência docente. É aquele

destinado à elaboração de monografia ou trabalho de conclusão de curso.

Direcionado ao treinamento nas partes de que se compõe um ramo profissional ou

científico, o curso confere certificado a seus concluintes. Os cursos de pós-

graduação lato sensu geralmente têm um formato semelhante ao dos cursos

tradicionais, com aulas, seminários e conferências, ao lado de trabalhos de

pesquisa sobre os temas concernentes ao curso. O critério de seleção para o

ingresso no curso de pós- graduação lato sensu é definido de forma independente

em cada instituição, sendo geralmente composta de uma avaliação e de uma

entrevista, no qual a única exigência formal a ser cumprida pelo interessado se

refere à posse de um diploma de nível superior. Cabe a SESU regulamentar estes

cursos conhecidos como Especialização e Residência Médica.

2. Stricto Sensu: Os cursos de Stricto Sensu são direcionados para a continuidade da

formação científica e acadêmica, como mestrado e doutorado, de alunos com nível

superior. Cabe a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

(CAPES). A avaliação é realizada a cada três anos, e as médias variam de 1 a 7.

Para ser reconhecido, o curso deverá apresentar média maior que 3. O curso de

mestrado tem a duração de dois anos, no qual o aluno desenvolve a dissertação e

cursa as disciplinas coerentes a sua pesquisa. Os quatro anos de doutorado são

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41

referentes ao cumprimento das disciplinas e a elaboração da tese junto à

orientação.28

Aqui a polarização do sistema se singulariza. Tecnicismo e humanidades,

autonomia e clientelismo, academia e mercado, seriedade e leviandade, bem público e

mercantilização do serviço, os termos são amplos e variados, mas todos postos em

antagonismo. Os “produtos e serviços” educacionais são estigmatizados por essas referências

a priori. Cursos sequenciais em oposição aos de graduação; de técnólogo, aos de formação

humanística e por aí seguem as diferenciações que resultam numa excessiva competitividade

(das instituições aos indivíduos) e que transformam um bem público numa relíquia a ser

conquistada através de processos seletivos meramente instrumentais ou consumida como

simples objeto de satisfação individual. Se há uma singularidade a ser sustentada, ela está na

percepção de que vários processos fazem parte de um espaço social diferenciado; reconhecer

suas relações e criar condições de possibilidade para que delas surjam novos ambientes é o

desafio que nos persegue.

2.6 ENTRE A PERFORMANCE E O COMPROMISSO

O sistema de classificação29 do Ministério da Educação é consubstanciado por

uma deferência da Constituição da República Federativa do Brasil de 1998 e que garante

autonomia didático-científica às Instituições de Ensino Superior. Mas, segundo Neiva e

Collaço (2006), há um hiato entre as perspectivas legais, que evidenciam uma abertura na

composição do sistema, e as diretrizes curriculares nacionais. Resultado de um excesso de

imposições normativas que inibem a inovação, as IES mergulham na falta de percepção das

“imensas oportunidades que esse posicionamento abre para que possam se adaptar a uma nova

realidade”. Neiva e Collaço apontam uma “cultura do medo” sintetizada pela “irresistível

tendência de [as IES] se manterem submissas às exigências despropositadas da burocracia

atrasada” das instâncias regulamentadoras.

28 IES – Quanto à Formação:

http://portal.mec.gov.br/sesu/index.php?option=content&task=view&id=598&Itemid=292., Acessado em: 29 jan. 2008.

29 Aqui expusemos as organizações administrativa, acadêmica e quanto à formação.

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42

Tal submissão tem um viés extremamente danoso para os processos de inovação

ainda a serem propostos. Sem romper as “amarras”, que como apontam Neiva e Collaço

(2006) estão mais no campo das normatizações do que das leis, não será possível pensar em

novas condições de possibilidade, justamente porque o campo de visão normativo não as

alcança. Em outras palavras, há a necessidade de uma percepção mais ampla das condições de

possibilidade; uma visão que alcance um espectro maior de alternativas, para além de focos

em produtos e serviços. Esse, aliás, é o grande desafio: romper com a fragmentação do

conhecimento científico, expresso na própria estrutura que consolida os processos de

formação e o contexto educacional.

Enquanto os níveis de aprendizagem e seus aspectos estruturais não compuserem

um único processo de formação, entendido como contínuo e permanente, não há como

estabelecer mudanças significativas. Em outras palavras, a preocupação maior das IES no

contexto atual é com a performance, ou com a obediência às normatizações para responder

aos padrões de eficiência e eficácia propostos pelos órgãos reguladores; seja quanto às

avaliações ou processos de reconhecimento e recredenciamento. O compromisso com a

performance, muitas vezes sustentado por avaliações tecnocráticas e que respondem a

processos de controle, não deve sobrepor-se ao dinâmico espaço social tecido

institucionalmente.

O sistema de classificações que caracteriza a estrutura da educação superior no

Brasil não inibe as instituições não-universitárias, mesmo com foco exclusivo no ensino, de

ofertarem cursos de pós-graduação; assim como não proíbe as universidades, com o

compromisso de desenvolver “atividades regulares de ensino, pesquisa e extensão”, de

potencializarem suas condições de oferta, sejam elas gratuitas ou pagas, e tornarem-se abertas

quanto ao sentido de formação. Dependendo do espectro de visão e seu alcance é possível

pensar e propor novas escalas de valores para a aprendizagem, cujo fundamento é a

atualização constante do conhecimento, não a construção regular de conteúdos numa tabela de

fluxos.

Nessa perspectiva, também as propostas de pós-graduação, com raras exceções, estão

desvinculadas da graduação tanto em conteúdos quanto em estrutura. Essa cesura está

caracterizada sobretudo pela ideia de que as teorias estão relacionadas aos modos de

conhecimento e as práticas aos modos de saber fazer. Relacionada às trajetórias ocupacionais,

a graduação permanece vinculada quase que exclusivamente ao ensino (BRAGA, 2006). A

pesquisa pertence aos níveis de aprendizagem para além da graduação e a extensão aos

setores que respondem pelo conceito de responsabilidade social nas universidades. E essa

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43

cesura também se reflete na composição dos projetos pedagógicos dos cursos na graduação:

pesquisa e extensão são pensadas como interface a partir do ensino; não são parte integrante

do processo de aprendizagem e, portanto, justificam estruturas independentes.

As ações resultantes de análises que não levem em consideração a natureza de suas

premissas tendem a sustentar um processo de gestão centralizado em generalizações que

sufocam a diversidade de pensamentos característica de uma universidade. Potencializar o

ambiente acadêmico, torná-lo mais aberto e suscetível à diversificação de perfis de

ingressante, reconfigurar saberes e promover a desfragmentação do conhecimento científico

são desafios contemporâneos das Instituições de Ensino Superior. Não há outro caminho às

IES senão o de tornarem-se protagonistas no contexto educacional, seja quanto às condições

de oferta ou de formação.

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44

3 CERTIFICAÇÕES, FORMAÇÃO E EDUCAÇÃO

Na primeira parte do trabalho propôs-se a exposição de uma visão do complexo

dilema pelo qual passam as IES brasileiras. A leitura até aqui nos remete a um contexto de

saturação mercadológica, de pré-conceitos estruturais que inibem uma ação mais radical30

quanto aos movimentos de mudança, de dúvidas e incertezas quanto ao futuro, de crise

profunda. Mas é importante também que se enfatize de onde se faz a leitura: é de dentro do

ambiente desgastado que se analisa o contexto. As ações decorrentes dessa análise sempre

levam em consideração como ser melhor que os concorrentes, como desenvolver “vantagens

competitivas” para consolidar uma singularidade institucional capaz de ser reconhecida diante

das diversas opções oferecidas no “mercado” da educação.

Em quase todos os aspectos, ao menos nos mais significativos, as leis e as

possibilidades de estruturação conferem às Instituições de Ensino Superior perspectivas de

transformação interessantes. Vantagem maior é das universidades pela garantia de processos

acadêmicos e de gestão autônomos. Some-se a abertura com relação às várias modalidades de

aprendizagem hoje admitidas, às possibilidades de certificação e às diretrizes nacionais para a

composição de produtos acadêmicos. Se é para as necessidades sociais que as IES,

principalmente as universidades, precisam se voltar, parece evidente a percepção de que o

modelo hoje em oferta não atende a todas as expectativas por educação superior. É nesse

contexto que surge a proposta de Certificação Processual em Comunicação. Passemos,

então, a partir de agora, a especificar as concepções que norteiam a proposta em sua

organicidade.

É preciso, antes de qualquer argumentação, estabelecer algumas reflexões acerca

do propósito da certificação como sanção de um percurso escolar ou de reconhecimento de

saberes específicos ainda que externos ao ambiente educacional. No Brasil especialmente, as

certificações de estímulo à qualificação ocupacional no setor produtivo concorrem com as

obtidas por meios educativos. Em última análise, certificações escolares sancionam um

percurso cumulativo em termos de conhecimento, certificações de pessoas explicitam graus

de desempenho em situações passíveis de verificação, e certificações de conhecimento

30 O termo radical aqui adotado está no sentido de ir à raiz do problema para interpretá-lo em um contexto novo.

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atestam as possibilidades de continuidade de estudos, todas sem uma política que as conduza

e oriente quanto aos itinerários possíveis.

Diante desse quadro, tanto os processos de formação quanto suas certificações

permanecem distantes pelo grau de seletividade no acesso ao sistema escolarizado e pela

ausência de critérios que fundamentem a continuidade de estudos para quem adquiriu saberes

ao longo da vida por outras vias que não a escolar. Moraes e Lopes Neto (2005) aferem que

85% da população trabalhadora entra antes dos 17 anos na vida ativa, o que as impede de

continuar os estudos. Alia-se a esse fator condicionante, o grande número de pessoas com

idade superior a 15 anos, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios -

PNAD - feita em 2001, que não possuem nível fundamental completo. De outro lado, como já exposto neste trabalho, os altos índices de evasão escolar,

sobretudo no ensino superior, evidenciam a desarticulação entre formação geral e formação

profissional no Brasil. Não há um sistema de certificações compatíveis com a Classificação

Brasileira de Ocupações31 e os processos formativos, via de regra, estão focados no

desenvolvimento de competências que atendem a demandas muito específicas, em resposta

aos interesses do sistema de produção.

Há controvérsias quanto aos ideários de formação por competências que recaem sobre

essa falta de articulação entre as formações geral e profissional. No conjunto de leis e decretos

hoje em vigor no país, tanto no campo educacional quanto no de ocupações, o conceito de

competência está ligado à verificação de desempenho em situações de trabalho, para além dos

conhecimentos formais adquiridos. E, por não abarcar “dimensões culturais e cognitivas

fundamentais à avaliação das potencialidades dos sujeitos”, o próprio Ministério da Educação

(Moraes e Lopes Neto, 2005, p. 1449) adverte quanto ao uso indiscriminado dessa concepção,

mesmo em se tratando de educação profissional e tecnológica, visto que os fundamentos

científico-tecnológicos e socioculturais não podem e não devem ser desconsiderados em

quaisquer dimensões de formação. Isso implica uma revisão das diretrizes tanto do ensino de

nível médio (técnico-profissionalizante) quanto superior (tecnólogo).

No âmbito da educação, há um hiato entre a organização de cursos, a recuperação

de escolaridade e a classificação de ocupações. Uma Instituição de Ensino Superior não tem

como dar conta sozinha de preencher esse vazio. Mas, estruturada a partir de uma proposta de

educação permanente, deve pensar em formas de inserção nesse contexto e de contribuir não

só com o debate, mas com ações que encaminhem novas oportunidades e perspectivas,

31 Disponível em http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorTitulo.jsf.

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46

principalmente quando as referências apontam para um processo educativo mais aberto e

preocupado com a formação integral, não apenas com a força de trabalho.

Por esta razão, uma revisão quanto às tipologias de certificação no ensino superior

torna-se fundamental. Primeiro porque reorganiza os vínculos de transição entre diferentes

etapas e depois porque propõe um olhar mais amplo sobre as dimensões que fundamentam

essa reorganização. Entretanto, é preciso que se reforce o vínculo, antes de tudo, com as

pessoas que farão parte desse processo. A transição de etapas e o olhar sobre suas dimensões

estruturantes orientam-se pelas e com as pessoas que compõem o movimento de

reorganização.

3.1 POR ESPAÇOS DE AFETIVIDADE E AUTONOMIA

O mundo contemporâneo e suas relações tecno-humanas têm fomentado um rico

debate a respeito das condições de possibilidade na construção de um espaço social de

aprendizagem mais afetivo. Diante da premissa de que, como modernos, somos incapazes de

romper com o constante movimento necessário pela busca da satisfação, sempre a ser

alcançada, cresce a crença de que não há um fim para nossa jornada, um telos alcançável de

mudança histórica (BAUMAN, 2001). Como essa busca já não é mais coletiva, o direito à

diferença é levado a um nível de individualidade que desregulamenta e privatiza as tarefas e

os deveres que estruturam a modernização em constante processo, a ponto de transformar a

esfera pública em palco de dramas particulares.

Não por acaso, as atuais relações entre docentes e discentes estão cada vez mais

sustentadas por uma ansiedade permanente em que o inacabado não tem um oposto factível;

também pela necessidade de a “autoridade” docente depender do poder de sedução que

implique maior número de seguidores possíveis, num processo de legitimação em que, via de

regra, o foco da aprendizagem se desloca da negociação sobre o que fazer para a esfera do

exemplo, o como fazer. Diante de tantos meios e tantos fins hoje vistos como “disponíveis”, o

melhor para conter a ansiedade parece ser o aprendizado de meios específicos para fins que

estão na esfera experimencial da “autoridade” docente. Nesse sentido, as energias são

canalizadas para certas finalidades, projetadas com antecedência para garantir parâmetros

mensuráveis de avaliações de desempenho. Como resultado, a ansiedade permanente é

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47

reforçada num contexto em que “tudo fica como está”, numa sucessão de encontros

episódicos sem afetividade nem autonomia.

O Século XX trouxe o contexto empresarial, dos fins planejados e projetados

como “local epistemológico de construção” do mundo. Segundo Bauman (2001), esse

“sentido praxeomórfico32”, em que o know-how do dia voltado para a eficácia e a eficiência

tornou-se estruturante, teve sua expressão maior na lógica de funcionamento da Ford

enquanto instituição. E foi adotado, inclusive, pela academia. Sucintamente, a cesura entre

projeto e execução, iniciativa e atendimento a comandos, liberdade e obediência, invenção e

determinação, em que “o entrelaçamento dos opostos se dá pelo comando do primeiro ao

segundo”, engendrou um modo de ser em que a criação se estabelecia pelo cálculo dos meios

para se chegar a determinados fins.

No Século XXI os fins não são mais reconhecidos como determináveis; já

“existem” em “abundância”. E é aos meios que se precisa “chegar”. Se, como afirma Bauman

(2001), são os indivíduos que definem e enfrentam em nossos dias seus problemas individuais

com as habilidades e os recursos de que dispõem ou “desenvolvem”, é nesse contexto que o

volume e a eficácia dos meios os conduzem ao lugar de “autoridade” e os legitimam enquanto

exemplo a ser seguido.

A Comunicação, no sentido estrito, é fator estruturante no processo de construção

de um espaço social que se constitua numa “esfera pública”; um lugar de negociação

constante dos meios e avaliação dos fins, atualmente confinados ao nível dos indivíduos. Mas

ainda hoje há dois extremos que “normatizam” o espaço social e têm nos ideários de

flexibilidade os pressupostos de legitimação: o mercado, cujo processo econômico-

administrativo se dá pela promoção da liberdade de escolha via consumo; e o estado, cujo

processo político-administrativo se constitui na promoção da liberdade de escolha pela

segurança. Pode-se, nessa interpretação proposta por Bauman (2001), considerar que as

instituições vivem o antagonismo de prometer aos indivíduos a liberdade econômico-

administrativa por um lado e a segurança político-administrativa por outro. Portanto, apesar

das mudanças contextuais, o mapa que caracteriza a vida social ainda é orientado pela gestão

das tensões. E a Comunicação fornece esses meios em grande escala.

Para romper com esses dogmas, o compromisso com a aprendizagem hoje

significa, continuada e permanentemente, oferecer condições de possibilidade para pensar o

32 Como os seres humanos tendem a conceber o mundo a partir do que podem fazer e de como o fazem

usualmente.

Page 49: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

48

espaço social, mesmo que pelo viés produtivo, cognitiva e esteticamente preocupado com as

responsabilidades individuais e coletivas decorrentes. Fortalecer esse espaço pressupõe uma

proximidade que reconfigure a vida em sociedade. Significa criar um ambiente em que a

afetividade não se limite em favorecer uma vida social episódica, na qual os outros, sempre

estranhos, estão próximos apenas nos momentos de busca por volume e eficácia dos meios

para os fins em pauta. Parte-se, nesta proposição, de uma mudança concreta quanto à ideia de

que o espaço social, portanto público, não é um lugar de passagem para o movimento

constante rumo aos fins sempre individuais; o espaço social deve se constituir num lugar para

se estar nele, negociando constantemente a direção e os resultados do processo de formação.

Em fóruns mais politizados e preocupados com a questão da sustentabilidade, o

conceito de “economia criativa” (REIS, 2007) tem sido debatido amplamente. Essa ideia é

fundamental no contexto aqui desenhado porque toda a estrutura basilar do sistema

educacional ainda é conservadora quanto a seus lugares de ocupação. Sendo assim, a

sustentabilidade dos postos de trabalho no campo da educação quase nunca leva em

consideração seu sentido pleno, que está na viabilização do espaço social e não nas garantias

econômicas de financiamento. Para a “economia criativa” os aspectos econômicos devem ser

pensados a partir de objetivos sociais e de uma política de desenvolvimento.

É, portanto, um espaço de negociações permanentes que reconhece os capitais

intelectual e criativo33 como valores estratégicos. O potencial criativo desse processo está no

“livre fluxo de ideias”, cujo valor social depende da capacidade de diálogo entre as mais

diferentes fontes de articulação e o valor econômico depende de diferentes modelos de

negócio e canais de mercado. Em outras palavras, esse novo contexto pede um fluxo

econômico preocupado com produção, distribuição e demanda aliadas a formação,

democracia de acesso e liberdade de escolhas. Aspectos tangíveis e intangíveis estruturam

uma “espiral criativa” (REIS, 2007) cujo ciclo constrói valores para além dos preços

decorrentes da simples relação entre demanda e oferta.

Qualquer instituição de ensino tem no seu corpo docente o capital intelectual e

criativo e, enquanto “organização do conhecimento”, nela o verdadeiro valor do negócio não

está relacionado, necessariamente, a assuntos de ordem financeira. Mas o modelo de negócios

atualmente adotado pelas IES ainda sustenta uma tensão entre demanda e oferta quanto aos

33 Usamos aqui o conceito adotado por Ana Carla Fonseca Reis no trabalho Economia da cultura e

desenvolvimento sustentável: o caleidoscópio da cultura. Citando Tom Bentley e Kimberly Seltzer, a autora sustenta que o processo de criação depende fundamentalmente de desatarmos “amarras mentais”. Como principais habilidades desse processo destacamos: a)formular novos problemas e solucioná-los; b) reconhecer o aprendizado contínuo e os erros inerentes; e c) intercambiar conhecimentos de uma área para outra.

Page 50: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

49

lugares de ocupação dos docentes na estrutura institucional, pensados pela via econômico-

financeira. As horas de trabalho são compostas por diferentes atividades, fragmentadas; os

planos de carreira valorizam cargos e posições nas esferas acadêmico-administrativas.

A oportunidade de potencializar a inserção docente num ambiente muito mais

amplo e arejado não deve desconsiderar os processos administrativos até aqui desenvolvidos,

mas reorientá-los numa política que viabilize o espaço social a ser oferecido como ambiente

acadêmico economicamente sustentável. Nesse sentido, o corpo docente deve ser parte

integrante das esferas de decisão acadêmico-administrativas que orientam os “produtos e

serviços” educacionais. O “livre fluxo de ideias” para diferentes modelos de negócio e canais

de mercado só é possível com a efetiva valorização dos capitais intelectual e criativo

(discentes e corpo técnico-administrativo aqui também incluídos) nessa outra concepção de

economia.

No âmbito educacional, pelo viés administrativo dos cortes, diminuir a duração

dos cursos surge como alternativa para preencher as vagas ociosas no sistema de ensino. Essa

estratégia, contudo, transforma a IES num lugar de passagem. A saída proposta pelo que

chamamos de Certificação Processual é, ao contrário, transformá-la num lugar para se estar

nele, permanentemente. Processualmente, os interessados em adquirir conhecimento podem

se mover de acordo com os meios e os fins de que dispõem. A chave está na concepção de

que não é mais um diploma, como entendido tradicionalmente, que finda o processo (e alguns

dos motivos já foram evidenciados neste trabalho); nem há um sentido cumulativo obrigatório

para evidenciar que o conhecimento foi “adquirido” (ou poderíamos sugerir consumido?).

O processo, de fato, se constitui num ambiente de relações que se propõem

duradouras, em que o espaço acadêmico é aberto para que se potencialize os fins não só a

partir do que está previamente planejado (individual e institucionalmente); mas que seja

também construído na própria relação34, cujos esforços (docente e discente) devem ser

política e economicamente responsáveis e criativos.

É interessante pensar na universidade como um “ponto privilegiado de encontro

de saberes” (SOUZA SANTOS, 2003, p. 224). Significa dizer que, na atualidade, está na

“configuração que proporciona” e não mais no centro de produção e transmissão de saberes

34 Algumas instituições de ensino estão transformando projetos de pesquisa em jogos eletrônicos via rede para

obter “ajuda” em análises e procedimentos. Isso, de fato, não cria ainda um espaço social considerado acadêmico; mas evidencia, indubitavelmente, que os níveis de aprendizagem e os nichos de conhecimento são muito mais intercambiáveis e contíguos do que se supõe. Um espaço social aberto a essas novas formas de relacionamento parece ser ideal para romper com alguns dogmas vigentes no sistema educacional. E é fundamental, para isso, que a figura do cânone, singelamente representada pelo docente, reconheça outros saberes necessários para a construção do que se designa conhecimento.

Page 51: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

50

sua principal característica. Assim, a ambiência universitária constitui-se da

“multivocalidade” que singulariza essa configuração para além de comparações “mensuráveis

pela mesma unidade de medida”. Nesse lugar de encontro multivocal, a docência deve

representar “um processo que pode, na melhor das hipóteses, sugerir, nunca impor, seus

resultados” (BAUMAN, 2008, p. 177). Isso porque já não é mais possível, ainda que se insista

nessa tarefa, guiar a formação para se chegar num alvo projetado por princípio. A vida e os

compromissos decorrentes não podem mais ficar descolados dos processos educacionais, ou o

preço de ninguém se sentir encarregado por eles ficará cada vez mais caro.

Se é de um novo “sentido praxeomórfico”, um outro “lugar epistemológico” de

construção que falamos, está na docência os primeiros passos para essa transformação. É a

partir dela que os saberes têm oportunidade de reconfiguração; que os conhecimentos

“monodisciplinares”, fragmentados e especializados devem ser substituídos por uma nova

práxis, capaz de romper com o “modelo aplicacionista”, como argumenta Tardiff (2000), em

que a vida, seja ela profissional ou não, só é vivida depois que os fundamentos para a ação são

ensinados em seus conceitos.

Reconfigurar saberes não é o mesmo que reconfigurar suas certificações. Por isso

mesmo, áreas de conhecimento e campos de saber como espaços para a docência em educação

permanente são o alicerce do processo. Busca-se privilegiar a multivocalidade, a interseção

entre conhecimentos e saberes instituídos, com o firme propósito de ambientar a vida

acadêmica, não de apenas projetar novos espaços padronizados em busca de reconhecimento

por critérios de mensuração com tendência a homogeneizarem-se. O reconhecimento é

decorrência do ambiente e de como ele se articula.

Como sugere Tardiff (2000), os saberes da docência não se restringem aos

conteúdos programáticos, aos conhecimentos universitários. Os saberes docentes estão

também muito relacionados às suas histórias de vida e experiências exploratórias no campo da

educação; partem de diferentes fontes e se propõem a atingir diferentes objetivos

simultaneamente; e dificilmente se consegue dissociá-los dos traços de personalidade e das

características do ambiente de trabalho. Falar de afeto e de generosidade, por exemplo,

depende de ações que sustentem o discurso sobre a docência; experiências a serem

compartilhadas no ambiente da vida acadêmica também como conhecimento em processo de

construção.

O compromisso de educar ao longo de toda a vida depende fortemente dos laços

consolidados no ambiente acadêmico. Medina (2006) identifica “as pegadas de uma

continuidade que não se desmancha no ar” na “diáspora dos ex-alunos” que por ela passaram,

Page 52: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

51

resultado de uma experiência pedagógica afetiva e voltada ao outro. Considerando que

“diáspora” e “ex-alunos” são termos que não combinam com as concepções de uma educação

permanente, os argumentos de Medina se atualizam pelo comportamento que inspiram; pela

noção de docência preocupada com a reconfiguração dos saberes para além dos muros

universitários. Os laços permanecem quando o processo é regido sob “o signo da relação”.

Nossas salas de aula, atualmente, respiram homogeneidades; de sonhos, de

perspectivas, de resultados. No momento em que esse espaço valorizar a alteridade e a

construção coletiva de diferentes trajetórias, os responsáveis por ele precisam estar preparados

para lidar com a mesma multivocalidade que o ambiente propõe organizar. Nesse ambiente,

diplomas e titulações estão para o conhecimento, para a aprendizagem, para a valorização dos

saberes; não o contrário. É preciso pensar, administrativamente falando, em novas formas de

valorização que permitam a potencialização desse ambiente acadêmico reconfigurado. Lidar

com estruturas flexíveis, produtos resultantes de processos dinâmicos, em que o conhecimento

esteja em primeiro plano e as relações sociais (dentro e fora da instituição) sejam estruturantes

nesse outro ambiente, pede também uma outra postura administrativa.

A docência, como função, conseguirá dar passos na reconfiguração de saberes

quando o próprio ambiente acadêmico estiver estruturado para permitir os avanços

necessários. Nesse sentido, os passos dependem de processos administrativos que sirvam de

suporte para as ações propostas e não como modelo de configuração do ambiente. Contudo,

sem novas proposições que desafiem o sentido de organização tradicionalmente estruturado

ficaremos confinados ao mesmo espaço, composto por lugares de passagem, lugares de

constante deslocamento em busca de objetos de desejo que nos autorizam o movimento no

tempo de um percurso. O espaço social de aprendizagem compromissado com a educação ao

longo de toda a vida precisa ser vivido em processo; não apenas estruturado como modelo.

3.2 EDUCAÇÃO PERMANENTE

A ideia de educação permanente não é nova. A discussão em torno do tema

ganhou maior importância a partir do Século XX, quando a finalidade do ensino,

principalmente o chamado “superior”, parece vincular-se exclusivamente aos fundamentos

que consolidaram a ciência como fonte de progresso e de exclusão. O termo “permanente”

Page 53: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

52

aparece, em muitos aparece, em muitos aspectos, como redentor de um processo de

aprendizagem fragmentado e focado no conhecimento tecnológico. Enquanto conceito, o

termo sugere uma complexidade de interpretações cujo valor está justamente na abertura de

múltiplas escolhas; seja quanto ao tempo de formação, quanto ao espectro de conhecimentos

abarcáveis nesse tempo e aos métodos de aprendizagem possíveis.

No anteprojeto “Modelo de Negócio para a Educação Continuada”35, da

Universidade do Sul de Santa Catarina - Unisul, o professor Osvaldo Della Giustina propõe

uma diferença para os termos que qualificam o sentido da educação. Diz ele que permanente

refere-se à “duração em si”; a educação permanente pode ser interrompida e retomada

“sucessivamente através da vida”. Já o termo “continuada” expressa como deve se dar esse

processo, em “curso contínuo, sem interrupção enquanto dure”. Na oportunidade, contudo, a

ideia central tinha em seu entorno os processos de virtualização36 do conhecimento pela

tecnologia; não estava vinculada a um lugar de relações, ainda que pensada como espaço

(virtual) no qual os conhecimentos produzidos pela Unisul seriam disponibilizados para o

mundo. Estava dirigida muito mais a novas modalidades de acesso ao conhecimento gerado

pela universidade do que propriamente ao conceito aplicado à ela.

Da concepção de modelo de negócios, o projeto evoluiu para um documento com

a preocupação de expandir o debate em torno dessa tendência. Coordenado e escrito pelo

professor Mauri Heerdt, então gerente de ensino, pesquisa e extensão da Unisul no Campus da

Grande Florianópolis, o documento intitulado Educar ao longo da vida: a missão e a

contribuição da Unisul para o desenvolvimento de pessoas, de organizações e da sociedade

propõe levar a discussão à comunidade acadêmica. Em síntese, põe em pauta a ideia de que a

educação, como preconiza a missão institucional, deve seguir ao longo de toda a vida humana,

independente de tempo e lugar para isso. E deve integrar o quanto possível todos os níveis de

aprendizagem, processos de formação e métodos de ensino, além de permitir a criação de

novas condições de possibilidade quanto ao acesso e à frequência.

A Educação Permanente é, primeiramente, um discurso relativo à educação em geral, cuja importância na sociedade não é questionada; muito pelo contrário, atribui-lhe um papel primordial e decisivo, seja para adaptar os indivíduos à essa sociedade, seja para transformá-la. Os autores estudados estão de acordo quanto à necessidade, ao papel, à possibilidade de uma educação cuja característica mais eminente é que ela prossegue durante toda vida. Ao consenso relativo sobre

35 O documento foi apresentado aos participantes do Projeto Estratégico com o mesmo nome para fundamentar

as primeiras discussões em 2007. 36 O conceito de virtualização aqui empregado estava muito mais voltado para as alternativas tecnológicas de

ruptura com o espaço físico e o tempo a ele circunscrito.

Page 54: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

53

importância da educação, acrescente-se o consenso relativo concernente à sua extensão (GADOTTI, 1991, p.66).

O principal desafio é elevar a proposta a um nível de interpretação que supere a

ideia de projeto. A educação permanente precisa ser entendida como um novo “sentido

praxeomórfico” de universidade. É como “lugar epistemológico de construção” que a

proposta deve chegar. Enquanto projeto, fica confinada ao contexto administrativo de

construção dos meios para se chegar a este fim. E o ambiente gerencial das organizações

contemporâneas perpetuam as concepções de eficácia pela “ordem” do “planejamento criativo

e inovador”; criativo pela projeção e controle das variáveis, inovador pelo volume e eficácia

dos meios, sem mudanças estruturais no processo.

São os rumos pré-traçados por estratégias baseadas na monotonia, na

regularidade, na repetição e na previsibilidade que ainda sustentam as ações ditas criativas e

inovadoras; ironicamente, aspectos incompatíveis com o próprio princípio formativo sugerido

pelas instituições de ensino. No atual modelo, as relações exclusivamente comerciais,

características da sociedade industrial e tecnológica, requerem uma “neutralidade emocional”

típica da convivência com estranhos; indivíduos desvinculados do espaço social

potencialmente aberto mas ainda vazio; espaço rico mas ainda desprovido de conteúdos

relacionados a tempo e circunstância (BAUMAN, 1997).

Nessa perspectiva, as dificuldades traduzem-se também e principalmente nos

modelos disponíveis para oferta de “produtos e serviços” educacionais decorrentes. O

entendimento de currículo ainda está estruturado sobre a ideia de projeto, pressupõe a

intervenção constante no “real” para controle das variáveis previstas, de modo ainda pensado

como no modelo fordista (mesmo que com diferenças evidentes): o entrelaçamento dos

opostos37 ensino e aprendizagem se dá pela intervenção do primeiro sobre o segundo, pela

projeção do primeiro sobre o segundo, pela sobreposição do primeiro em relação ao segundo.

O fato é que ainda há uma cesura que hierarquiza o espaço social acadêmico, no

qual a ideia de aquisição e distribuição de conhecimentos não oferece contiguidade nem

intercâmbio. As críticas ao modelo focam-se na fragmentação do conhecimento; mas é a

37 O entendimento de que ensino e aprendizagem estão em “oposição” um ao outro diz mais respeito à

hierarquização característica da relação de quem ensina e quem aprende. O pressuposto básico dessa “oposição”, entendida como lugares distintos de ocupação no processo de diálogo com o saber, é a própria ordem estabelecida no espaço circunscrito à sala de aula e o tempo planejado pela rotina de ocupação desse espaço. Grosseiramente, a disciplina deve chegar a um determinado lugar na escala de saberes propostos pelo docente; aos discentes resta fazer o esforço de chegar lá e provar que o conseguiram. Há experiências menos ortodoxas em andamento, mas as próprias diretrizes educacionais não são percebidas como possibilidade de transformação desse processo.

Page 55: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

54

própria hierarquia estabelecida na aquisição e na distribuição do conhecimento que fragmenta

o espaço de aprendizagem, numa relação entre estranhos em que o conhecimento adquire

valor de troca.

Ainda fruto do modelo fordista, um “lugar epistemológico” específico de

construção de mundo, todos os “produtos e serviços” educacionais que se propõem a um tipo

específico de formação o fazem mais ou menos do mesmo jeito. Os sistemas de controle e

mensuração de desempenho são replicados de tal modo que a qualificação desses “produtos e

serviços” atende aos padrões ditados por “especialistas” em todas as instâncias do sistema

educacional; as respostas a esses padrões ficam enclausuradas nas variáveis passíveis de

controle. A profanação desse ambiente sacralizado por rituais tecnocráticos é um risco que

pode custar o não-reconhecimento ou o descredenciamento de qualquer instituição do sistema.

Contudo, como já vimos, esse tipo de comportamento está muito mais relacionado ao medo

de agir do que propriamente à censura externa.

Desnecessário dizer que do “lugar epistemológico” tradicionalmente ocupado não

há como pensar novas composições curriculares. Os cursos ainda são estruturados pelo viés

do lugar de ocupação do egresso no “mercado”, seus projetos se constituem de espaços

disciplinares delimitados pelo lugar de ocupação dos docentes numa grade de conteúdos

distribuídos por nichos de conhecimento específicos. O projeto de implantação do curso

consiste em, pedagogicamente, unir esses conhecimentos específicos num fluxo de

informações capaz de garantir o “aprimoramento” de “habilidades e competências exigidas”

pelo “mercado” e pela sociedade38. É interessante perceber que, via de regra, pouquíssimos

docentes têm o domínio pleno do currículo em implantação, o que é exigido do egresso

através de estratégias de controle e mensuração de desempenho, intra e extra-institucionais.

Em outras palavras, como preconiza Silva (1999, pp. 148 e 150),

[é] apenas uma contingência social e histórica que faz com que o currículo seja dividido em matérias ou disciplinas, que o currículo se distribua sequencialmente em intervalos de tempo determinados, que o currículo esteja organizado hierarquicamente... É também através de um processo de invenção social que certos conhecimentos acabam fazendo parte do currículo e outros não. (...) Com a noção de que o currículo é uma construção social aprendemos que a pergunta importante não é “quais conhecimentos são válidos?”, mas sim, “quais conhecimentos são considerados válidos (grifo do autor).

38 Ainda que haja uma generalização aqui evidenciada, não há como negar que as discussões sobre projeto

pedagógico, culturalmente, levam em consideração com maior ou menor peso, disciplinas contempladas a partir do campo de domínio do corpo docente. Pode-se discutir a medida, mas não a intenção de garantir o lugar de ocupação docente via projeto pedagógico.

Page 56: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

55

A contingência social e histórica, o “lugar epistemológico” de construção desses

processos, também fragmenta as atividades docentes para atender e legitimar lugares de

ocupação no contexto das Instituições de Ensino Superior, especialmente as que dependem de

financiamento privado. A docência fica refém da abertura ou não de cursos, do fechamento ou

não de turmas para a composição de carga horária. E para complementar essa carga horária, as

aulas devem, de preferência em primeiro plano, constituir um rol de atividades que envolve

também a pesquisa e a extensão. Indo um pouco mais adiante, Botomé (1996) traça o que,

tradicionalmente, configura o perfil de docente nas IES:

1. Técnico e especialista em um campo de trabalho;

2. Pesquisador ou cientista em uma área do conhecimento;

3. De nível superior, capaz de ensinar e preparar para tarefas complexas da

sociedade;

4. Administrador de funções as mais diversas no meio acadêmico;

5. Escritor que atende a uma demanda de publicações para manter seu status.

Quanto maior o domínio sobre o volume e a eficácia dos meios que constituem

esse perfil, maior o “capital político” (BOTOMÉ, 1996) que garante o docente no lugar de

ocupação institucional. A distribuição de carga horária se dá em função desse “capital

político”, que depende do reconhecimento nas mais variadas instâncias de poder que

constituem o corpus universitário. Do ensino à pesquisa, há uma escala de valores que

configura o espaço acadêmico; do mesmo modo que um rol de funções operacionais, táticas e

estratégicas identificam o grau de importância do lugar de ocupação no sistema

administrativo.

Em outras palavras, há circunstâncias em que o distanciamento das atividades de

ensino, especialmente o de graduação, em detrimento do tempo para a pesquisa (seja ela qual

for) é sinal de maior status docente no lugar de ocupação do sistema acadêmico. Melhor

dizendo, não basta ao docente demonstrar competência nas tarefas para as quais está

designado; tal competência deve estar legitimada pelo próprio sistema, de acordo com as

normas e preceitos determinados pelas instâncias de poder que o compõem. Assim, o volume

e a eficácia dos meios que o docente precisa dominar dependem de sua participação como

“usuário” do sistema, não como protagonista. Obediência às normas e aos critérios de

avaliação dela advindos faz da docência também um trabalho tecnocrático, mensurável pela

quantidade de ações decorrentes.

Page 57: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

56

Os fios que tramam e tecem a docência vão produzindo efeitos, talvez até monumentos que indicam crenças, convicções e valores. Disso parece que não é possível escapar. O que, contudo, deve ser enfrentado é uma lógica que se produz a partir dessas teias, qual seja uma lógica do déficit. No debate mais amplo sobre formação do(a ) professor(a), parece sempre estar presente essa ideia de que ele(a) deve à instituição alguma coisa. Pode ser tempo, dedicação, esforço, títulos, planejamentos, ementas, obediência. Penso que dessa lógica é preciso se libertar, para poder pensar de uma forma nova as políticas de formação, certamente mais abertas e arejadas, para poder considerar os diferentes tipos e estilos de docentes sem aprisioná-los em um formato único definido como “docente institucional”. Olhar para essa paisagem maior implica estar disposto a dar um outro lugar para o(a) docente, construir uma dimensão estética que consiga reencantar os sujeitos implicados pelo ambiente acadêmico e pelo processo de aprendizagem, para que possam, coletivamente, mobilizar-se para a busca de um compromisso novo com a sociedade no que diz respeito à educação (HARDT, 2004, p.10) - grifos da autora.

Hardt (2004) chega a essa conclusão depois de analisar o espaço da sala de aula

em suas relações. Como espaço social, esse ambiente ainda é carregado de ordem e

solenidade, com “sistemas normativos, regulamentos, diplomas, portarias e pareceres”. Nesse

ambiente o docente não reconhece outros modos de administrar o espaço que não o de

obediência aos ditames. Para a pesquisadora, em função dos protocolos aos quais os docentes

tendem a seguir não há, muitas vezes, lugar privilegiado para o aprofundamento dos

conteúdos; e a docência, segundo ela, não dá conta dos discentes “interessados, cheios de

curiosidade e com desejo de aprender”. Mas o que caracteriza o espaço social na sala de aula?

Com o reconhecimento de algumas transgressões pontuais diante da “política de verdades”

institucional, a pesquisadora enumera algumas tendências básicas quanto aos “fios que tecem

a docência”:

1. Esquemas lineares e geométricos de distribuição de saberes;

2. Negação da ambivalência em detrimento do desejo da ordem;

3. Discurso oriundo da ordem institucional;

4. Defesa dos saberes legitimados pela lógica do currículo e pela própria

competência.

Featherstone (2000) nos fala de um desafio ainda mais difícil de superar por conta

de “convenções e pressupostos tácitos que aprendemos a usar sem questionar”. Segundo ele,

“a potencial democratização dos meios de produção e consumo intelectuais” e a

“dessacralização do conhecimento intelectual e acadêmico”, hoje vistos como uma ameaça,

pode ser a oportunidade de quebrar “o ciclo da aprendizagem e da pesquisa” fragmentadas.

Sugere, então, que outras formas de expressão do conhecimento científico podem amenizar o

processo de exclusão decorrente dos ideais elitistas do ensino superior. Para ele, o grande

Page 58: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

57

dilema é criar abertura para formas “pós-escritas” e “pós-simbólicas” de expressão no

contexto da docência.

De fato, o sistema ainda resiste em aceitar trabalhos acadêmicos de iniciação

científica expressos em textos com material sonoro e visual incorporados, por exemplo. Na

concepção de Featherstone (2000) “desenvolver habilidades de editar, de desenhar, de

manusear imagens, filmes e música assim como textos” será condição primordial no processo

de aprendizagem, desde que haja o cuidado para que seus resultados não fiquem circunscritos

a um “trivial edutenimento39”. Desnecessário dizer que outras formas de expressividade

podem permitir a fruição a um espaço estético diferente do que fundou a racionalidade técno-

científica.

Pode ser que alunos elaborando uma tese de doutorado não escrevam 80 mil palavras e não entreguem um grosso volume encadernado, mas entreguem, sim, um disquete ou CD ROM que contenha material multimídia. Parte da habilidade que eles terão de demonstrar será de modelar, fazer modelos multimídia que iluminem a matéria escolhida a partir de uma série de direções e apresentem uma “resposta” multidimensional à pergunta que eles fizeram a si mesmos, tanto num modelo feito de texto como de imagens. A tese torna-se algo no qual podemos literalmente, ou devemos dizer simultaneamente, entrar. Ela é construída num espaço visual, num ambiente ou mundo virtual, no qual dados textuais, imagísticos, orais e musicais são incorporados (FEATHERSTONE in SANTOS FILHO, 2000, pp. 92 e 93).

Esse desafio não diz respeito apenas à sala de aula e suas relações de

aprendizagem. Partindo do princípio de que a instituição universidade se diferencia das

demais instituições sociais pela capacidade de transformar em patrimônio coletivo os

múltiplos conhecimentos existentes, Botomé (1996) entende que ensino, pesquisa e extensão

são atividades de um fazer humano que dá sentido e significado a esta instituição específica.

Estrutura-se numa práxis que reconhece os múltiplos fazeres, não apenas o lugar de ocupação

dos espaços estruturados para esse fim.

Em suma, a socialização do conhecimento científico é pensada, tradicionalmente,

pela divulgação de projetos inovadores, recém-descobertos. E a divulgação de ciência vibra

na mesma frequência da hierarquização do espaço de aprendizagem; ambas estão para um

lugar de ocupação antecipadamente destacado em relação aos demais. As premissas expostas

por Botomé (1996) abrem uma outra perspectiva para a docência que insere no fazer humano

e nas relações do espaço social de aprendizagem as condições de possibilidade. A extensão

universitária é resultado de ensino e pesquisa comprometidos com o espaço social e a exigida

indissociabilidade é inerente a esse compromisso.

Page 59: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

58

Fica evidente que as concepções de Certificação Processual e de educação

permanente não se pautam por lugares de ocupação pré-estabelecidos. Talvez a mudança mais

paradigmática esteja na dinâmica dos fluxos pelos quais fluem os processos que constituem a

identidade das Instituições de Ensino Superior. O espaço social hierarquizado pelos níveis de

conhecimento e de resposta aos problemas que nos afetam deve ser substituído. Musso (in

PARENTE, 2004) alerta, entretanto, para a existência de um espaço social constituído de

conexões permanentes em que os “passantes” estão sempre mergulhados em fluxos. Nele

também não há afetividade, ainda que as possibilidades de relação estejam sempre ali,

disponíveis.

É necessário que se configure o espaço; que suas dimensões, mesmo que tênues,

expressem uma área quantificável, possível de perceber. Um espaço social hierarquizado tem

um mapa pronto, projetado por especialistas; um espaço social aberto precisa ser cartografado

e suas fronteiras negociadas, sobrepondo-se os vários “níveis de terreno” numa só

configuração. O primeiro é dado, o segundo é vivido.

Se, como diz Latour (in PARENTE, 2004), o “domínio erudito” não é exercido

diretamente sobre os fenômenos, mas “sobre inscrições que lhe servem de veículo”, a

educação permanente ainda depende de estruturas factíveis que lhe sirvam de parâmetro. E

esse é o objetivo da Certificação Processual: ser uma das possibilidades decorrentes desse

outro conceito de educação. As justificativas para esta pretensão já foram descritas em

cenários que podem ser discutidos quanto à dimensão; negados, jamais.

Portanto, as leis, os aspectos políticos e econômicos e, sobretudo, as demandas

sociais identificadas são contemporâneas desses ideais transformadores no campo da

educação. A Certificação Processual depende, então, de recursos que mapeiem

constantemente o espaço social em suas relações. Academicamente, a fruição para essa nova

dimensão passa pelo entendimento de conceitos que já sustentam o atual modelo mas que

podem ser reinterpretados sem ferir as leis que lhes dão legitimidade. E tais conceitos devem

nortear ações que promovam o equilíbrio entre o “capital intelectual” que compõe o espaço

social acadêmico e o “capital político” dos lugares de ocupação numa nova escala de valores.

39 Palavra cunhada para designar a junção de educação com entretenimento.

Page 60: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

59

3.3 ÁREAS DE CONHECIMENTO, CAMPOS DE SABER E TRAJETÓRIAS40

ACADÊMICAS

Pautada pelos ideários de flexibilidade, interdisciplinaridade e pela

democratização do acesso ao ensino de nível superior, a Lei 9.394 (Lei de Diretrizes e Bases)

instituiu em 1996 o termo campo de saber como pressuposto para a criação de cursos de

complementação de estudos e de formação específica, entendidos como não acadêmicos. Um

dos objetivos mais evidentes era a promoção de acesso ao sistema para pessoas com outros

interesses, que não os de formação acadêmica tradicional (seja por opção ou por falta de

recursos). A ideia de campo de saber foi claramente usada para estabelecer uma diferença em

relação às áreas do conhecimento humano, consolidadas como base para as diretrizes dos

cursos de graduação e stricto sensu, e de forte valor acadêmico.

A diferença conceitual entre áreas de conhecimento e campos de saber está

evidenciada no parecer da Câmara de Educação Superior 968/98. O termo área do

conhecimento “é nomenclatura abreviada” de um conceito já presente na Lei Universitária

5.540, de 1968, ainda em vigor. O artigo 11 da Lei Universitária estabelece os critérios de

organização da universidade; a alínea “e” do artigo citado aponta como critério “a

universalidade de campo, pelo cultivo das áreas fundamentais do conhecimento humano,

estudados em si mesmos ou em razão de ulteriores aplicações e de uma ou mais áreas técnico-

profissionais” (grifos nossos). Foram sucessivas as regulamentações que, gradualmente,

deram sentidos novos ao termo. A mais recente está expressa na Resolução 2/94, do já extinto

Conselho Federal de Educação (CFE).

No artigo 7, parágrafo 3, inciso 4, o documento fundamenta que as “áreas

fundamentais do conhecimento humano compreendem as ciências matemáticas, físicas,

químicas e biológicas, as geociências e as ciências humanas, bem como a filosofia, as letras e

as artes”. Note-se que os termos filosofia, letras e artes estão destacados, como forma de

evidenciá-los num contexto em que as ciências consolidam a base da classificação. As áreas

de conhecimento, portanto, fundamentam-se pelo viés epistemológico, de cunho científico, e

que foram tomando forma ao longo da implantação do sistema de ensino superior no Brasil.

40 O termo trajetórias ganha sentido neste trabalho quando associado à ideia de movimento resultante das

escolhas individuais em relação aos diferentes itinerários disponíveis no momento da decisão. As trajetórias são, portanto, os lugares percorridos nos espaços propostos pelos itinerários.

Page 61: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

60

Interessa compreender, contudo, que o conhecimento humano também é composto pelo

conhecimento científico; não só por ele.

Atualmente, os sistemas de classificação são utilizados para fins e com

metodologias diferentes. O instituído pelos Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq), Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior (CAPES) e Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) reconhece, a partir do

cenário proposto pelos projetos de pesquisa que engendraram os atuais “produtos e serviços”

acadêmicos, oito grandes áreas, divididas em áreas e subáreas. Uma nova tabela foi divulgada

em 2005 e atualmente é entendida como “versão preliminar”41. A comunidade científica

permanece no debate quanto aos parâmetros que levaram à comissão de especialistas

composta pelas três agências de fomento a fazer a proposição.

Para efeito de estudo da nova tabela, área é a unidade básica de classificação. É

pelo “conjunto de conhecimentos inter-relacionados, coletivamente construídos, reunido

segundo a natureza do objeto de investigação com finalidades de ensino, pesquisa e

aplicações práticas” que o sistema se configura por áreas de conhecimento. A “aglomeração

de diversas áreas de conhecimento, em virtude da afinidade de seus objetos, métodos

cognitivos e recursos instrumentais refletindo contextos sociopolíticos específicos” configura

as grandes áreas, cuja finalidade é facilitar a visualização das 84 unidades hoje identificadas,

somadas as tabelas da CAPES e do CNPq.

Por sub-área entende-se a “segmentação da área do conhecimento, estabelecida

em função do objeto de estudo e de procedimentos metodológicos reconhecidos e amplamente

utilizados”; enquanto especialidade é a “caracterização temática da atividade de pesquisa e

ensino. Uma mesma especialidade pode ser enquadrada em diferentes grandes áreas, áreas e

sub-áreas”42. Pelas definições, pode-se apreender que o sistema leva em consideração

singularidades acadêmicas pautadas pela organização do conhecimento científico.

Já a definição de campo de saber aparece na página 8 do parecer CES 968/98:

“um recorte específico de uma área do conhecimento, ou de suas aplicações, ou de uma área

técnico-profissional ou, ainda, uma articulação de uma ou mais destas”. Os documentos que o

adotam estão relacionados à proposição de cursos sequenciais ou de lato sensu, sobretudo

especialização. Tratados como complementares, de menor duração e em regime especial de

oferta, eles têm por base campos de saber justamente para que não se permita a criação de

41 Disponível em http://www.memoria.cnpq.br/areas/cee/proposta.htm#doc. Acessado em: 30 jan. 2008. 42 Disponível em http://www.capes.gov.br/avaliacao/tabela-de-areas-de-conhecimento. Acessado em 23 fev.

2009.

Page 62: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

61

cursos com esta característica em substituição aos de graduação. Suas certificações e

diplomas, portanto, têm menor “valor” acadêmico, ainda que reconhecidos como de nível

superior. Não há sistema de classificação previsto para os campos de saber, justamente pela

sua dinâmica de articulação.

Um “campo de saber” pode ser entendido como uma proposta curricular que esteja inserida no corpo de saberes de uma determinada área do conhecimento, ou como uma proposta interdisciplinar que utilize conhecimentos buscados em diferentes áreas mas que podem compor um conjunto articulado e sistemático para a formação acadêmica e profissional. Se pudéssemos fazer uma analogia simplificadora, poderíamos afirmar que um “campo de saber” é um subconjunto de saberes advindos de uma ou mais áreas do conhecimento, que são reconhecidas tradicionalmente nos cursos de graduação (MARTINS, 2004, p. 54).

Relacionar áreas de conhecimento e campos de saber depende das possibilidades

de configuração ao alcance. Genericamente, esses conceitos estão à margem das discussões

sobre a elaboração de “produtos e serviços” acadêmicos. Quando muito, são utilizados para

definir um lugar de ocupação para as proposições educacionais. Essa vertente taxológica,

posteriormente, consolida os processos de avaliação quanto às proposições em andamento.

Por princípio, um curso de Comunicação já tem seu lugar definido no sistema de

classificação. E é a partir dele que os “produtos e serviços” a serem propostos devem iniciar

suas discussões.

Essa lógica cristaliza as proposições sempre num mesmo padrão quantificável que

facilita posteriores avaliações de reconhecimento e recredenciamento. Além disso, estabiliza

os critérios e métodos de ensino e pesquisa numa economia de valores cuja moeda de troca é

o “uso” do sistema. Ressalte-se, no entanto, que as próprias normatizações vinculam a oferta

de cursos superiores obrigatoriamente aos de graduação. Sem cursos de graduação

reconhecidos, as IES não são autorizadas a ofertar cursos superiores. O que parece ser um

cerceamento representa, analisado sob outra perspectiva, a necessidade de integração entre

certificações, mesmo quando a serviço do controle e das normatizações dogmáticas. A ironia

do sistema reside na sua relação de forças e nas interpretações tecnocráticas dos debates e das

leis em educação.

Por isso mesmo, no âmbito desta análise se quer desviar o olhar para outros

horizontes disponíveis no mesmo ponto de observação, mas que exigem esforços de

movimento. Áreas de conhecimento e campos de saber são contíguos e intercambiáveis. As

definições consolidadas pelas instâncias de regulação educacional não deixam quaisquer

dúvidas quanto a isso. Conhecimento científico, não somente a racionalidade subjacente, e

Page 63: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

62

múltiplos saberes estão um para o outro; não são esquemas paralelos de formação.

Conhecimento é um termo fortemente vinculado à ciência e seus recursos de inscrição na vida

contemporânea. Suas áreas delimitam uma certa medida, um certo espaço de atuação.

Pensada assim, uma área de conhecimento se desenvolve pelo aprofundamento e

não pela abertura de campo que proporcionaria uma amplitude de espaço a percorrer. Já o

termo saber é mais abrangente; conhecimentos, competências, habilidades e atitudes (para

ficarmos em concepções reconhecidas academicamente) são abarcáveis por ele. Vinculado à

ideia de campo como terreno a percorrer, nele se pressupõe o ato de escolha pela delimitação

do espaço. Os campos de saber seriam, então, campos abertos e ainda não profundamente

delimitados nem reconhecidos pelas epistemologias tradicionais que fundam o conhecimento

científico.

A configuração de um espaço social de aprendizagem passa pelo reconhecimento

das delimitações já aferidas, mas não deve deixar de lado os campos ainda não percorridos;

campos que não devem servir apenas como lugar de passagem. Essa mudança de concepção é

importante porque diversifica o ambiente sobre o qual os “produtos e serviços” educacionais

se originam. Na estrutura atual, áreas de conhecimento têm um valor acadêmico infinitamente

superior aos campos de saber. Pela própria lógica de enquadramento dos cursos oriundos

nesse contexto é possível perceber que não há vínculo entre os níveis de formação propostos.

O sistema ainda se reconhece cumulativo, linear, em que o aprendizado se dá pela

exigência de requisitos em sequência e com espaços próprios e regulados para cada um dos

níveis de aprendizagem. A Certificação Processual propõe um outro ethos acadêmico, em

que múltiplos saberes estejam disponíveis em campos nos quais as áreas de conhecimento

sejam delimitadas pelo movimento de percorrê-los. Esse movimento, inscrito nas vontades de

presença e de construção desse espaço social, pressupõe a percepção de outras dimensões cujo

percurso se insere em novas paisagens, seja na visão dos possíveis “itinerários” ou no sentido

mesmo das “trajetórias” decorrentes.

Page 64: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

63

3.4 ÁREAS DE FORMAÇÃO, CAMPOS DE ATUAÇÃO E ITINERÁRIOS43

OCUPACIONAIS

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP

- usa um catálogo internacional44 para classificar as áreas de formação e treinamento

reconhecidas pelo Ministério da Educação. A lógica de composição deste outro sistema tem a

ver com as disponibilidades de oferta nos níveis de graduação e lato sensu. O INEP tem como

base o modelo de negócios estruturado pelos lugares de ocupação na esfera do trabalho,

organizado por áreas gerais, áreas detalhadas, programas e/ou cursos. Ainda que haja uma

tentativa de aproximação com a tradição epistemológica de organização científica, a tabela de

áreas de formação e treinamento evidencia a complexidade do sistema educacional brasileiro,

em que é a graduação que habilita para atividades profissionais específicas. No contexto da

Certificação Processual, os lugares de ocupação caracterizadas por atividades profissionais

específicas são demarcações dentro de um determinado campo de atuação, cujas dimensões

são muito mais amplas.

Um ethos mercantil ainda esboça as concepções do chamado mundo do trabalho

na atualidade e é legitimado pelo sistema educacional nas propostas de formação, mesmo a

acadêmica em grande parte. De acordo com Moraes (2006), os ideários desse ambiente estão

voltados para a resolução de problemas econômicos com base na competitividade, cujo

nascedouro está numa concepção de educação entendida como permanente em que o

processo de aprendizagem “instrumentaliza a vida” pela ênfase na mera “adaptação funcional

à economia e ao mercado”. O atual mundo do trabalho imputa ao indivíduo a responsabilidade

de ingressar e manter-se no sistema produtivo e na vida econômica ativa.

Essa característica reforça-se no sistema de ensino superior quando pautado na

racionalidade econômica da empregabilidade e na competitividade por lugares de ocupação

43 Por itinerários compreende-se a indicação dos caminhos possíveis numa dada circunstância. São as

perspectivas de movimento em busca de lugares a percorrer. 44 A Classificação Internacional Padronizada da Educação (ISCED - International Standard Classification of

Education) é um sistema organizado pelo Gabinete de Estatísticas da União Europeia - EUROSTAT, em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO, e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE. No Brasil, as 24 áreas de formação estão estruturadas em consonância com a classificação das áreas de conhecimento usadas para fomento em pesquisa e produção científica. Contudo, o catálogo, usado pelo Ministério da Educação para fins de Censo da Educação Superior e para o reconhecimento dos cursos de graduação é também uma referência para cursos de capacitação e treinamento em diversas áreas. Para cursos superiores, contudo, são usadas apenas as áreas de formação como referência.

Page 65: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

64

tanto no processo de formação quanto no campo de atuação. As “trajetórias” decorrentes

desse ambiente não levam em consideração itinerários mais cooperativos, consolidados por

interesses sociais de desenvolvimento e por relações preocupadas com direitos coletivos para

além das garantias genéricas que condicionam os direitos individuais. A busca por ensino de

qualidade nessas condições resume-se à manutenção dos investimentos em lugares de

ocupação já consolidados.

Complexo, o mundo do trabalho dá pistas interessantes. Por um lado, evoca as

dificuldades de adaptação dos jovens de hoje ao ambiente fortemente hierarquizado de grande

parte das organizações; dificuldade apressadamente entendida como tendência à

indisciplina45. De outro, aponta o forte vínculo da formação de nível superior com garantias

de empregabilidade e melhores condições de vida46. Tais aspectos da cultura contemporânea

reforçam a concepção simplista de que grande parte da população não está preparada para

enfrentar os desafios da “sociedade do conhecimento” e para isso precisa ser

instrumentalizada. Mas os próprios critérios de mensuração e avaliação desse processo são

discriminatórios: a empregabilidade consolida-se na constatação de quem tem ou não

instrumentos para “competir no mercado” e, portanto, a falta de trabalho recai sobre a

incompetência, um conjunto de atributos individuais necessários apenas para cumprimento de

tarefas específicas.

Tratar o mercado como um espaço a ser preenchido, somente, sugere

deslocamentos individuais em busca de lugares de ocupação. Mas, como afirma Callon

(2004), “não se entra em um universo estruturado, que se impõe a todos” quando se busca

ocupações no mercado. Essa visão linear de causa e efeito é o corolário de uma cisão

historicamente engendrada, fruto de um processo econômico cumulativo no qual formação

45 No artigo O futuro do emprego, publicado no jornal A Folha de São Paulo em 27 de setembro de 2009, o

colunista Gilberto Dimenstein analisa pesquisa feita pela psicóloga Sofia Esteves, presidente da Cia. de Talentos, responsável pela entrevista de pretendentes a postos de alta qualificação em grandes empresas. Preocupada com o alto índice de vagas não preenchidas e de desistência do emprego num curto espaço de tempo, a psicóloga se propôs a ouvir 31 mil universitários. Como resultado, o estudo revela que os jovens “não entendem o que as empresas pedem” e não se sentem satisfeitos com o ambiente que não proporciona qualidade de vida. Em suma, quem procura um ambiente mais propenso à criatividade é visto como alguém que tem dificuldades de reconhecer a hierarquia. Prazer e incapacidade de lidar com a disciplina estão no centro do antagonismo. Como conclusão, a psicóloga salienta que deve haver mudança de postura em ambos os lados; os jovens devem mudar de atitude em relação ao trabalho e as empresas terão de mudar o ambiente.

46 Pesquisa apresentada no 11° Fórum do Ensino Superior Particular Brasileiro (FNESP) em 24 e 25 de setembro de 2009 aponta que 12% dos alunos entrevistados esperam acesso ao mercado de trabalho quando escolhem a instituição em que estudam. Com 9% vem a busca por formação profissional e por um futuro melhor, com igual percentual. Foram ouvidas 1.682 pessoas, entre alunos, ex-alunos, professores, pais de alunos e ex-alunos, gestores, funcionarios, população do entorno, autoridades municipais e a mídia no estado de São Paulo. Significativa é a associação expontânea que 15% desse universo faz entre ensino superior privado e emprego e profissão.

Page 66: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

65

geral e formação profissional não se conjugam. Compreender que o “mercado é apenas o

resultado desse processo de aprendizagem e de formatação” passa por dimensões desprezadas

no âmbito educativo, voltado exclusivamente para o mercado ou exclusivamente para as

concepções acadêmicas.

Se é mesmo factível a constatação de que educação e trabalho são processos

concomitantes e que trabalho e emprego já não oferecem garantias de contiguidade, não se

pode continuar estruturando espaços de aprendizagem que não discutam e elaborem novas

formatações, novos “modelos de negócio” que permitam um outro tipo de ocupação. Portanto,

quaisquer circunstâncias relacionadas ao mercado de trabalho devem fazer parte do processo

formativo; não como espaços a serem percebidos e preenchidos, mas como itinerários a serem

construídos.

Campos de atuação compõem-se de atividades específicas reconhecidas pelas

áreas “profissionais” como habilidades a serem construídas para gerar competências capazes

de ocupar os espaços entendidos como dados. Mas as trajetórias ocupacionais mostram

itinerários distintos daqueles planejados e projetados na origem. Há uma mobilidade quanto

às ocupações que caracterizam esses campos e que, portanto, não pode ser desconsiderada; ao

contrário, são os critérios que permitem essa mobilidade, instigando mudanças de itinerário,

que contam mais no processo aqui descrito.

Os fundamentos técnicos necessários para o preenchimento dos lugares de

ocupação específicos num campo de atuação só ganham sentido quando percebidos na

dinâmica social das relações que fundam esses espaços. Tais singularidades sociotécnicas são

fundamentais para uma composição de certificações em processo porque consolidam o

movimento de ocupação e valorizam saberes que transcendem aspectos meramente

disciplinares.

Um “lugar epistemológico” que se proponha como ambiente aberto a constantes

negociações, capaz de aproximar itinerários diferentes quanto a perspectivas de ocupação e de

propor trajetórias ocupacionais que se orientem e sejam orientadas por essas singularidades

sociotécnicas, esse lugar se consolida nas atividades específicas que constituem o chamado

mercado de trabalho, mas também, e sobretudo, no sentido de inserção política quanto às

dinâmicas de relação que definem os chamados modelos de negócio dessa economia de

mercado.

No âmbito da formação, é importante propor reflexões sobre o que se pode fazer

diante das necessidades de mudança e o que habitualmente se faz. Esses saberes

“praxeomórficos” são geradores de fronteiras tênues entre os campos de atuação diversos, não

Page 67: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

66

estão classificados em taxonomias acadêmicas ou currículos profissionais e, por isso mesmo,

emergem como necessários para compor os critérios de formação, visto que instigam, por

princípio, uma ruptura em relação às instâncias já consolidadas do conhecimento científico e

às trajetórias ocupacionais já legitimadas pela tradição. É de uma “epistemologia da prática”

(TARDIFF, 2000), que os itinerários ocupacionais em Comunicação, nosso objeto de análise,

se ressentem, justamente porque seus processos formativos são praticamente estáticos se

comparados à mobilidade ocupacional em seus campos de atuação.

Page 68: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

67

4 COMPONENTES CURRICULARES EM COMUNICAÇÃO

A área de Comunicação é concebida no ensino técnico de nível médio para

ocupar-se “da produção, da armazenagem e da difusão ou da distribuição, em multimeios ou

multimídia, de informações, ideias e de entretenimento” 47. Para tanto, organiza-se em termos

curriculares a partir de três pilares: as Ciências Humanas fundamentam o “nível de qualidade

e o crivo ético” da atividade; as Linguagens e Códigos, de onde a comunicação é considerada

herdeira direta, dão os alicerces instrumentais; e as Ciências da Natureza, os “aparatos

tecnológicos disponíveis”. Há uma gama bastante ampla de conteúdos a contemplar em cada

um dos pilares: dos estudos de língua e literatura, passando pelas artes, às disciplinas clássicas

de formação geral, com destaque para sociologia e filosofia, até os estudos de física,

considerados de fundamental importância para o entendimento dos recursos tecnológicos.

As diretrizes determinam que a educação profissional na área “deve,

preferencialmente, centralizar seus desenhos curriculares no desenvolvimento pleno de

competências significativas para o processo produtivo, independente da forma como a

organização do trabalho as reúna em títulos ocupacionais” (grifos nossos). Inovações

tecnológicas, incertezas quanto ao futuro, mudanças culturais no mundo do trabalho,

formação integral, “convergência profissional”, profissionais “multitarefas” ou “polivalentes”,

os conceitos estão todos explicitados no documento usado como referência para a elaboração

de cursos e constituem os argumentos quanto ao que se espera das instituições que os

elaborem.

O cenário desenhado pelo documento sugere conteúdos que sustentem visão

intersemiótica e multimidiática; práticas pedagógicas compatíveis com as tecnologias de

produção; debates sobre o impacto das tecnologias na era da informação; espaços de

discussão, ensaio e vivências laboratoriais para inovação e redefinição de processos; fluência

no uso de softwares avançados; leitura e interpretação, comunicação oral e inglês.

Seis grandes funções estruturam o processo de formação profissional no ensino

técnico de nível médio: criação, planejamento, produção, pós-produção, distribuição e

exibição/veiculação, e , por último, direção e gestão. Outras subfunções estão relacionadas e

47 As concepções estão expressas nos Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de Nível

Técnico para a área de Comunicação, publicado pelo Ministério da Educação em 2000. Disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=16463. Acessado em: 13 fev. 2008.

Page 69: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

68

distribuídas de acordo com suas características e habilidades necessárias. Essa divisão

funcional propõe-se a representar os campos de atuação com indicações para itinerários

formativos que são igualmente percebidos no ensino de nível superior.

O Ministério da Educação estuda proposição de alinhamento dos cursos de nível

médio com os de graduação tecnológica a partir de um cadastro nacional único para cursos de

educação profissional no sentido de aproximar os níveis de formação - nível médio e

graduação tecnológica - por eixos estruturantes. Nos catálogos de graduação tecnológica

organizados pelo MEC atualmente dois eixos estão diretamente relacionados com a área de

Comunicação: o de informação e comunicação e o de produções culturais e design.

Paradoxalmente, os dois eixos tratam de itinerários específicos, ainda que

complementares, e ilustram bem a divisão oriunda do caráter funcional de formação para o

mercado. O eixo de informação e comunicação reúne cursos com objetivo de desenvolver

competências para a geração de bases tecnológicas, de suportes técnicos para a comunicação,

as chamadas Tecnologias de Informação e Comunicação; já o de produções culturais e design

objetiva desenvolver competências técnicas para a geração de conteúdos comunicacionais

com base nos suportes já desenvolvidos. Antes da vertente tecnológica, o ensino de

graduação, tradicionalmente em bacharelados, na área primava pelo humanístico social da

comunicação, pelos usos sociais dos elementos que a constituem e pelas influências culturais

provocadas pelas transformações nos processos comunicacionais de grande escala. Os

avanços da Ciência e da Tecnologia, contudo, têm fomentado um amplo debate quanto às suas

premissas socioculturais.

É nesse contexto que os estudos em comunicação ganham importância. Os

itinerários formativos inerentes a esta área construíram uma trajetória acadêmica rica em

diversidade quanto aos fundamentos científico-tecnológicos; e os itinerários profissionais,

igualmente, a consolidam como um vasto campo de atuação, ainda mais abrangente em

função do acesso cada vez maior aos meios de produção e distribuição/veiculação. A

graduação na área precisa acompanhar a dinamicidade de seus campos de atuação sem perder

a profundidade no processo de geração e socialização de conhecimentos. O dilema é antigo,

mas as perspectivas decorrentes são ricas em oportunidade por todos os aspectos já

relacionados neste trabalho. Uma outra arquitetura curricular, combinando múltiplas

certificações e aproximando diferentes itinerários torna-se não só possível como necessária.

Page 70: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

69

4.1 ESPAÇO SOCIAL DE APRENDIZAGEM

Enquanto arquitetura curricular, a Certificação Processual em Comunicação

configura-se num espaço social de aprendizagem que reconhece na educação permanente as

possibilidades de aliar fundamentos científico-tecnológicos e socioculturais, subjacentes às

trajetórias acadêmicas e seus itinerários formativos, com fundamentos sociotécnicos

provenientes dos campos de atuação, característicos das trajetórias ocupacionais e seus

itinerários sociais e técnico-profissionais. Por espaço social entendemos os âmbitos intra e

extra-institucionais. Na medida em que a universidade põe-se a mediar signos, sujeitos e

objetos histórico-culturais com o intuito de transformar conhecimento em condutas

significativas, de mobilizar seus recursos e valores em prol de respostas às necessidades da

sociedade, tais ações já estão na esfera social.

Esse compromisso, quando efetivado na relação do ensino com a aprendizagem,

tende a diminuir os espaçamentos cognitivos, estéticos e ético-morais entre universidade e

sociedade. Esse espaço social tende a ser mais afetivo quando os objetivos de aprendizagem

inerentes a ele são coletivamente construídos, valorizam o movimento na troca de

experiências e aproximam itinerários formativos e técnico-profissionais, para além do

treinamento e da capacitação como exigências funcionais dos lugares de ocupação no mundo

do trabalho.

Não se quer, com isso, desvalorizar a formação técnico-profissional. Pelo

contrário. O espaço social de aprendizagem preocupa-se, justamente, com a valorização dessa

formação a ponto de discutir tendências, buscar alternativas e avaliar o modelo econômico

que sustenta os lugares de ocupação e suas exigências. Trazer à tona as tramas que tecem as

relações socioculturais e sociotécnicas, estruturantes do espaço social em que vivemos, é de

suma importância não só para desestabilizar os mitos que a própria Ciência e suas verdades

constroem, mas para estabelecer um outro patamar de escolhas quanto às trajetórias

acadêmicas e ocupacionais em debate. Ciência e tecnologia são instrumentos nesse espaço

social em que a mediação de signos, sujeitos e objetos histórico-culturais sugere relações mais

afetivas, consubstanciadas na autonomia e na força de uma burocracia a serviço da criação, de

uma organização reflexiva. Tanto quanto as técnicas e os saberes que as orientam.

Entende-se que o currículo corporifica as relações sociais (SILVA, 1996) e, por

isso mesmo, precisa estar aberto a novos mapas culturais, cartografias em processo. Entre a

Page 71: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

70

cultura engendrada a partir dos meios impressos e a que responde aos meios audiovisuais e

aos computadores há um sujeito diferente, menos fixado em rígidos padrões morais, mais

horizontalizado em suas relações e aberto a múltiplos estímulos e experiências. Esse “eu”

característico da subjetividade humana assume imagens “multiformes, heteróclitas,

descentradas, instáveis, subversivas” (SANTAELLA in LEÃO, 2004) diante do cenário de

incertezas e do mal-estar em relação às crenças e às perspectivas. Diferentes capacidades e

habilidades são oriundas desse novo contexto, que pede vontade de articulação, mais que

transmissão de conteúdos.

Ensinar nesse espaço é, sobretudo, aprender a lidar com a multiplicidade e com o

movimento constante na construção e na socialização do conhecimento. São as capacidades,

as habilidades para lidar com a vida e o mundo do trabalho em diferentes contextos que

importam. Sendo assim, é preciso respeitar também as trajetórias individuais, singulares. Os

subprodutos acadêmicos específicos, traduzidos em cursos e programas, não têm relação

biunívoca com as atividades específicas características dos campos de atuação em seus

diferentes ramos técnico-profissionais. As singularidades científico-tecnológicas e

socioculturais que delimitam as áreas de conhecimento não se relacionam diretamente com as

singularidades sociotécnicas das áreas profissionais. Portanto, é preciso assumir no espaço

social de aprendizagem que aproximar essas diferenças constitui-se numa das forças

geradoras dos itinerários em projeto e das trajetórias efetivamente realizadas. Dizendo de

outro modo, há a necessidade de se educar para a mudança e a incerteza (BERHEIM e

CHAUÍ, 2008). É para as possibilidades que a educação contemporânea existe.

Diante desse quadro, a avaliação ganha em importância conceitual. Não estamos

falando de aferições conteudistas, definidas por uma escala de valores nem sempre claras nos

objetivos disciplinares e disciplinadores. “A avaliação autêntica é uma utopia e ela tem essa

existência paradoxal: é inatingível, mas não podemos parar de buscá-la” (BLIKSTEIN, 2006,

p. 19). Capacidades e hablidades, quando postas à prova, impõem uma complexa rede de

interpretações sobre os resultados obtidos em associação com a compreensão do processo de

mobilização dos recursos necessários. Fazer e compreender estão em escalas de valores

diferentes. Nesse sentido, a avaliação no espaço social de aprendizagem não pode ser

concebida sem a avaliação do próprio espaço.

A autonomia na mobilização dos recursos e de valores para alcançar determinados

horizontes propostos em trajetórias específicas está diretamente relacionado com a

organização do espaço em que o processo se desenvolve. A avaliação está em reconhecer as

fronteiras entre o proposto e o realizado. E fronteiras não são mais limites entre espaços

Page 72: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

71

distintos; são, antes de tudo, espaços de movimento entre lugares significativos para a

aprendizagem.

A consolidação do espaço social de aprendizagem tem, então, duas concepções

elementares e ilustrativas. Por um lado, pressupõe uma estrutura de sinapses, conexões de

saberes que se articulam para configurar itinerários formativos e técnico-profissionais e

efetivar trajetórias acadêmicas e ocupacionais. Tais conexões dependem, por outro lado, de

relações sinestésicas em que múltiplas experiências e percepções componham o sentido dos

itinerários e das trajetórias em percurso.

Sinapses e sinestesias são figuras de linguagem de um processo educativo focado

na autonomia, na organização reflexiva dos processos e resultados e na permanente circulação

por entre as áreas de referência acadêmica, as áreas profissionais, seus campos de saber e de

atuação. Mas representam bem o movimento de circulação no espaço social de aprendizagem,

visto que não admitem isolamento; dependem de um "outro" para efetivarem-se. Está na

alteridade, está no reconhecimento desse "outro" como integrante do espaço em questão o

sentido para as conexões de saberes e as trocas de experiências e percepções não ficarem

reduzidos a fluxos.

4.2 LUGARES DE OCUPAÇÃO, COMPETÊNCIAS E HABILIDADES

Valorizar experiências cognitivas e afetivas num mesmo espaço social tem sido o

desafio contemporâneo das instituições de ensino em todas as instâncias de formação.

Contudo, a tradição disciplinar orientada para a aplicação de fórmulas prontas, explicação de

conceitos dados e de forte vertente conteudista, no sentido do aprendizado pela reiteração e

pela memorização, reduz a aprendizagem à lógica da simples capacidade de expressar os

conhecimentos apreendidos, sem novas contextualizações e significações a partir dos desejos

de quem quer aprender. E, de fato, hoje quem tem a responsabilidade de ensinar, pouco ou

quase nada sabe sobre como se constitui o ato de aprender, mesmo que tacitamente aja como

aprendiz quando, por exemplo, precisa refazer suas estratégias e planos de ensino. O ato de

aprender é, por si só, uma capacidade ou competência a ser desenvolvida no ambiente

acadêmico; ato que pressupõe movimento, desejo, interesse.

Page 73: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

72

O ensino por competência tem merecido um amplo debate e é tema controverso

quanto às concepções que o envolvem. O uso semântico do termo varia de acordo com o

campo para o qual oferece designações e, contemporaneamente, tem fortes ligações com as

necessidades eminentemente técnicas dos postos de trabalho característicos de um modelo

econômico de sociedade. Neste sentido, os lugares de ocupação pré-determinados pelo mundo

do trabalho exigem competências funcionais específicas cujo domínio alguém precisa para

responder por ações inerentes a este lugar de ocupação. Na educação, entretanto, é sobre os

lugares de ocupação que se deve pensar; sobre os itinerários de vida, o que inclui a esfera do

trabalho, que se deve desenvolver potencialidades. Ocupar-se de desenvolver o treinamento

para performances específicas é um dos objetos da educação. Isso não significa, porém, que o

ensino por competência seja instrumentalizador e tecnicista.

Etimologicamente, em latim, competere significa pedir junto com, buscar junto

com (MACHADO in PERRENOUD, 2002). De origem comum, competência e

competitividade ganharam sentidos similares pelo uso social dos termos em deferência aos

ditames de uma nova ordem econômica. Sendo assim, no latim tardio prevaleceu o significado

de disputar junto com. Como princípio em educação é ideal que se busque o sentido original

da palavra. Seja como for, o sentido de competência está diretamente associado a um verbo,

designa ação; ações em potencial (MACHADO in PERRENOUD, 2002), se o vínculo aqui

expresso for com itinerários formativos.

A mobilização de saberes para articular os itinerários pessoais com os construídos

coletivamente constitui-se no fundamento para quaisquer trajetórias demarcadas por

certificações que lhes dêem legitimidade. Essas ações em potencial, que dependem de um

conjunto de habilidades em determinados âmbitos, sejam de referência cientifico-tecnológica,

sociocultural ou sociotécnica, podem ser esquematizadas como interfaces elementares para o

processo formativo.

Importa para a concepção de arquitetura curricular a ser proposta indagar

permanentemente, nunca definir, quais ações potenciais interessam à Comunicação, como

área de conhecimento e como campo de atuação, de acordo com as trajetórias, sejam

acadêmicas ou ocupacionais, marcadas pela singularidade dos itinerários que formos capazes

de articular. Os conteúdos são decorrência desse processo. Na medida em que obedeçam aos

critérios estabelecidos em diretrizes estruturantes do sistema educacional e de procedência

institucional, podem ser reconfigurados para dar conta de novos saberes, mais amplos, mais

abertos e encadeados pela busca, sempre coletiva, de respostas aos problemas que nos afetam.

Page 74: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

73

Os itinerários personificados dizem respeito aos tipos de recurso e aos valores construídos

nessa trajetória, não ao ato mesmo de mobilizá-los.

A proposta de Certificação Processual tem por base os cursos de graduação.

Toda a estruturação feita aqui parte da consolidação do ensino de Jornalismo e de Publicidade

e Propaganda, habilitações de Comunicação Social, na Universidade do Sul de Santa Catarina.

Mas este é um projeto para a área de Comunicação. Jornalismo e Publicidade e Propaganda,

portanto, compõem uma paisagem e suas diversas trajetórias possíveis. Neste contexto,

propõe-se relacionar competências e habilidades a serem desenvolvidas nas trajetórias

acadêmicas postas como possibilidade. Cada certificação tem seu próprio elenco de

habilidades e competências a trabalhar e a complementar em relação às demais. O espaço

social de aprendizagem em Comunicação propõe desenvolver em todas as suas certificações

as capacidades de48

• Articular teoria, pesquisa e prática social a partir da integração entre a produção

científica e artística com o agir pessoal e político;

• Exercitar a criatividade e a improvisação;

• Utilizar adequadamente os recursos tecnológicos disponíveis;

• Cultivar a curiosidade, a iniciativa e a autonomia intelectual;

• Administrar o tempo e cumprir prazos.

De acordo com as especificidades a certificar, quer-se desenvolver capacidades

para

• Assimilar criticamente conceitos que permitam a apreensão de teorias e usar tais

conceitos e teorias em análises críticas da realidade;

• Conhecer e utilizar a língua portuguesa nas suas manifestações oral e escrita em

termos de recepção e produção de textos;

• Refletir analítica e criticamente sobre a linguagem como fenômeno psicológico,

educacional, social, histórico, cultural, político e ideológico;

• Expressar visão histórica e prospectiva, centrada nos aspectos sócio-econômicos

e culturais, revelando consciência das implicações econômicas, sociais,

antropológicas, ambientais, estéticas e éticas de sua atividade;

48 As competências e habilidades aqui listadas foram estudadas a partir das diretrizes curriculares de todas as

áreas que, de algum modo, têm interface com a Comunicação enquanto itinerário formativo. Como componentes complementares foram avaliadas as referências da Classificação Brasileira de Ocupações e as portarias publicadas pelo Ministério da Educação por conta do Exame Nacional do Desempenho de Estudantes - ENADE, no qual a Comunicação enquanto área foi avaliada pela primeira vez em 2006.

Page 75: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

74

• Compreender criticamente processos envolvidos na recepção de informações e

seus impactos sobre os diversos setores da sociedade;

• Refletir criticamente sobre as práticas profissionais no campo da Comunicação;

• Interpretar, classificar, explicar, criticar e contextualizar informações;

• Expressar em linguagem própria conceitos e soluções de acordo com as diversas

técnicas de expressão e reprodução visual;

• Aplicar as linguagens habitualmente usadas nos processos de comunicação, nas

dimensões de criação, de produção, de interpretação e da técnica;

• Experimentar e inovar no uso destas linguagens;

• Avaliar, compreender, sistematizar e criticar processos de produção e

empreendimentos;

• Aplicar as linguagens e gêneros relacionados às criações audiovisuais e gráficas;

• Argumentar e estabelecer relações entre texto verbal e não verbal;

• Coordenar o desenvolvimento de materiais de comunicação, em diferentes

meios e suportes, voltados para a realização dos objetivos estratégicos das

empresas;

• Gerar produtos em suas especialidades criativas, como escrever originais ou

roteiros para realização de projetos em comunicação;

• Elaborar, desenvolver e avaliar planejamentos estratégicos de comunicação;

• Desenvolver, planejar, propor, executar e avaliar projetos na área de

comunicação;

• Responder pela realização de produções em comunicação;

• Posicionar-se em defesa de valores ético-políticos, reconhecendo a diversidade e

a alteridade nos processos de comunicação e no âmbito cultural;

• Compreender a importância de problematizar o sentido e a significação da

própria existência e das produções culturais;

• Analisar contextos, interpretar dados e sintetizar ideias como forma de se

posicionar criticamente em todos os espaços sociais;

Na habilitação de Jornalismo somam-se capacidades específicas, características do

campo de atuação:

• Registrar fatos, apurando, classificando, questionando, interpretando, editando e

transformando-os em notícias e reportagens;

• Investigar e questionar informações, produzir textos e mensagens jornalísticas

com clareza e correção e editá-los em espaço e período de tempo limitados;

Page 76: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

75

• Apresentar domínio oral e escrito da língua nacional e as estruturas narrativas e

expositivas aplicáveis às mensagens jornalísticas, abrangendo-se leitura,

compreensão, interpretação e redação;

Em Publicidade e Propaganda, somam-se as capacidades de

• Aplicar linguagens e competências estéticas e técnicas para criar, orientar e

julgar campanhas de comunicação e/ou publicidade

• Planejar, executar e administrar campanhas de comunicação com o mercado,

envolvendo o uso de ferramentas de comunicação, como a promoção de vendas,

o merchandising, o marketing direto, a publicidade e propaganda e o patrocínio.

É importante evidenciar que esse conjunto de habilidades e competências se

repete ao longo das trajetórias em percurso, dependendo das escolhas quanto aos itinerários

possíveis em termos de certificação. Não há, portanto, perfis específicos a priori. A

articulação dessas ações em potencial, a partir de recursos e valores a serem mobilizados, é

que vão traçar, esboçar o perfil a ser alcançado.

4.3 ARQUITETURA CURRICULAR

Na arquitetura há sempre uma boa dose de cálculo e outra de imaginação. Para

efeito de organização do processo, suas metas e propósitos, suas respostas quanto aos critérios

de avaliação e outros aspectos mais tangíveis, o cálculo quanto às projeções é imprescindível.

Mas sem uma dose, por mínima que seja, de imaginação, as ações em potencial correm o risco

de perder a saudável proporção de intangibilidade, de imprevisibilidade. Um espaço social de

aprendizagem reconhece as tensões entre o cálculo e a imaginação como aspectos

constitutivos das relações a serem consolidadas. Novas paisagens culturais, “lugares

epistemológicos”, ambientes de circulação e convivência permanente, funcionalidade

estrutural, todas estas concepções não têm como estar entregues apenas ao cálculo das

projeções. O espaço social de aprendizagem também pressupõe sensibilidade quanto às

percepções dele advindas, pede o bem-estar coletivo e a construção de novas perspectivas.

Uma arquitetura curricular pode combinar tantos elementos e proporcionar a criação desse

espaço.

Page 77: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

76

O desenho pede a análise de seis dimensões sobre as quais se pode cartografar

possibilidades. As projeções, portanto, não definem os lugares de circulação e ocupação para

todos; apenas propõem itinerários que fornecem pontos de conexão e cuja forma tem, no

máximo, esboços. A primeira das dimensões a ser considerada reúne as áreas de

conhecimento e de formação cujos lugares estão determinados num sistema de classificações,

mas levam em conta relações e construções técnico-profissionais e epistemológicas coletivas.

Numa segunda dimensão são associados os campos de saber e de atuação, na perspectiva de

identificar o que escapa à tradição e à taxonomia. Por fim, os níveis e modalidades de ensino e

aprendizagem aliam-se às certificações reconhecidas tanto no ambiente acadêmico quanto nos

campos de atuação.

4.3.1 Comunicação como área de conhecimento e de formação

Para dar conta de mobilizar saberes em razão de ações em potencial que sustentem

trajetórias acadêmicas e ocupacionais sólidas, a arquitetura curricular em Comunicação deve

reconhecer no centro de todo o processo a área de conhecimento, homônima ao campo de

atuação. Enquanto área de conhecimento, a Comunicação caracteriza-se como ciência social

aplicada. De acordo com a classificação ora adotada pelas agências de fomento à pesquisa,

mais vinculadas a programas de pós-graduação, inserem-se no contexto epistemológico como

sub-áreas teoria da comunicação, jornalismo e editoração (esta subdividida em teoria e ética

do jornalismo, organização editorial de jornais, organização comercial de jornais e

jornalismo especializado), rádio e televisão (subdividida em radiodifusão e videodifusão),

relações públicas e propaganda, comunicação visual.

Esta classificação foi revista em 2005, quando uma comissão montada por

representantes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq,

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e da Financiadora

de Estudos e Projetos - FINEP apresentou uma proposta de alteração. Nessa nova concepção,

a Comunicação passa a ser uma área das Ciências Socialmente Aplicáveis e suas sub-áreas,

teorias da comunicação, processos sociais, mídias, relações públicas e propaganda e ética e

linguagens. Além disso, acompanha a tabela de classificação uma lista de especialidades com

as quais a área tem interfaces.

Page 78: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

77

Controvérsias à parte, julga-se importante recuperar o conceito de área de

conhecimento como referência. Se é “pela natureza do objeto de investigação” que a área

organiza os “conhecimentos inter-relacionados e coletivamente construídos” para fins de

“ensino, pesquisa e aplicações práticas”, sua referência deve gerar movimento, numa espiral

criativa que resulte em múltiplas possibilidades de percurso e certificação.

Já para o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

- INEP, jornalismo e informação compõem uma área específica de ciências sociais, negócios

e direito, considerada área geral. Como subdivisão, jornalismo e reportagem denominam uma

área detalhada em que cinema e vídeo, comunicação social (redação e conteúdo), informação

(redação e conteúdo), jornalismo, noticiário e reportagem, produção editorial, publicação

(disseminação de mensagens), rádio e telejornalismo, e radialismo são os programas e/ou

cursos nela inscritos.

Publicidade e propaganda aparece nesta classificação como programa e/ou curso

da área detalhada marketing e publicidade. Isso porque a formação é entendida como

pertencente a comércio e administração, área igualmente incluída em ciências sociais,

negócios e direito. Junto de publicidade e propaganda estão marketing e propaganda,

mercadologia (marketing), pesquisa de mercado e relações públicas.

Tal caracterização evidencia a cesura já explicitada neste trabalho. Pensada pelo

viés da tradição epistemológica a Comunicação abarca conhecimentos diversificados em que

as atividades técnico-profissionais são objeto de reflexão e análise. Mas pensada pelo viés da

formação, a área se dilui, ganha o adjetivo "social" e é associada a técnicas de produção

textual e geração de conteúdos por um lado, e técnicas de persuasão e perspectivas de negócio

por outro.

4.3.2 Comunicação como campo de atuação

Numa sociedade midiatizada, fortemente caracterizada pela supressão do tempo e

o alargamento do espaço, os lugares de ocupação para quem conhece minimamente os

processos que envolvem este fenômeno contemporâneo são muitos. Contudo, os avanços da

tecnologia, fundamentados ou não pela Ciência, têm reduzido as perspectivas de

interpretação, avaliação e socialização dos resultados quanto aos aspectos centrais do

Page 79: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

78

processo comunicacional. Mesmo o ambiente acadêmico tem dado mais ênfase à velocidade

das mudanças do que propriamente aos impactos desse modelo de construção da realidade no

nosso cotidiano. Sendo assim, o campo de atuação pede, antes de tudo, um olhar mais

profundo sobre os critérios que sustentam o modelo e sobre as alternativas a ele. Isso não quer

dizer negar o campo; quer dizer potencializá-lo.

Nas diretrizes curriculares reguladas pelo Ministério da Educação, apenas o curso

cinema e vídeo teve sua autonomia reconhecida49. Jornalismo, publicidade e propaganda,

editoração, relações públicas e radialismo continuam como habilitações do curso de

Comunicação Social. Esta vinculação engessa as áreas de conhecimento e de formação na

medida em que impõem, numa composição curricular isolada, compatibilizações de recursos

cognitivos, estéticos, procedimentais e estruturais nem sempre passíveis de articulação. É

pensando a Comunicação como campo de atuação, e não uma área técnico-profissional

específica, que se pode potencializar os itinerários formativos com flexibilidade e mobilidade

suficientes para atender às diretrizes e valorizar trajetórias singulares.

4.3.3 Comunicação como campos de saber

Na medida em que diferentes saberes se aproximam, tanto a área de conhecimento

quanto o campo de atuação se diversificam. Estamos falando dos saberes reconhecidos pela

Ciência e dos tacitamente presentes na paisagem cultural na qual os meios e os processos

comunicacionais existem. Os saberes “epistemológicos” em Comunicação abarcam uma

ampla gama de conteúdos hoje estruturados em disciplinas que não cabem nas 2.700 horas

mínimas previstas para a graduação na área, como rezam as diretrizes. Isso porque tais

conteúdos estão confinados na própria estrutura disciplinar cujo recorte não se dá pelo viés da

ciência sobre seus efeitos na formação, mas pela fragmentação de uma grade em que o

currículo homogeiniza o que deve ser aprendido.

De outro lado, os saberes “praxeomórficos” isolam-se no interior do campo de

atuação e não se reconhecem enquanto conteúdo significativo para os itinerários formativos. É

como se a construção do conhecimento sobre Comunicação não precisasse entender o que

tendemos a fazer em certas circunstâncias aplicadas à atuação no campo e porque o fazemos

Page 80: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

79

habitualmente do mesmo jeito. Os campos de saber são a perspectiva de articulação entre as

áreas de conhecimento e os campos de atuação na medida em que não só aproximam

conteúdos, competências e habilidades em suas dimensões socioculturais, científico-

tecnológicas e sociotécnicas, como permitem conceber produção e análise, reflexão e técnica

no âmbito da formação, não só do conhecimento acadêmico necessário para habilitar uma

área técnico-profissional.

4.4 DIRETRIZES ABERTAS

Outras três dimensões a serem consideradas - níveis e modalidades de ensino e

aprendizagem, e tipos de certificação - orientam as perspectivas de estruturação dos

componentes curriculares em função dos objetivos propostos e das competências e

habilidades a serem trabalhadas. A organização dos conteúdos surge numa espiral cujo

movimento aproxima as diretrizes curriculares e as de avaliação do ensino superior, além das

trajetórias acadêmicas e ocupacionais. Portanto, os conteúdos estão para os itinerários

formativos, sociais e técnico-profissionais, ainda que sua origem esteja nas disciplinas

tradicionais.

A questão é que, em termos de composição, tais conteúdos já são pensados fora de

suas amarras e do isolamento disciplinar os quais se busca romper depois, quando se intervém

no percurso para que a projeção, pensada separadamente, se efetive no conjunto. É nesse

contexto que a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão é pedida; é também aí que

projetos integradores tornam-se uma saída. Ora, por princípio, a Certificação Processual se

pensa em processo e, portanto, sem delimitações disciplinares. Os conteúdos são tomados por

seu valor para o itinerário proposto e o ensino, a pesquisa e a extensão já são o contexto.

À espiral que aproxima os elementos acrescenta-se o qualitativo “criativa” por

duas razões básicas: a primeira, mais elementar, é que a área está sempre em movimento. As

mudanças de itinerário podem ser feitas a qualquer tempo, visto que todo o processo é

certificado e tende a compor as trajetórias possíveis no espaço social de aprendizagem.

Significa dizer que as reformulações pedagógicas não estão mais no interior de cursos; estão,

sim, na viabilização de trajetórias entendidas como importantes para a área.

49 Ver Resolução n. 10, de 27 de junho de 2006.

Page 81: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

80

Como decorrência dessa primeira razão elementar, as reformulações na

Comunicação dependem da paisagem cultural ao alcance das percepções. Toda e qualquer

planificação inerente ao cálculo arquitetônico do projeto deve, por isso, estar associado,

obrigatoriamente, às trajetórias pessoais cuja articulação só é possível com imaginação. Como

um espaço social de aprendizagem, um lugar para se estar nele, a Certificação Processual

depende do desejo para movimentar a espiral e da aproximação das diferenças para torná-lo

factível.

Para iniciar o movimento e traçar os primeiros itinerários, façamos a análise das

diretrizes curriculares em Comunicação. Primeiramente é preciso destacar o uso do termo

“Social” junto à Comunicação não como elemento revelador, mas para evidenciar as formas

de diferenciar o sentido da formação. Como já vimos, os cursos técnicos em Comunicação

têm duas vertentes básicas: a elaboração de bases tecnológicas e a de recursos técnicos para o

uso dessa base. Os cursos de bacharelado, contudo, para evitar comparativos, ganham um

adjetivo, uma característica. Significa dizer que, por princípio, nem toda a comunicação é

Social. O termo, então, está a serviço de uma formação mais humanística, focada em valores

coletivos para a construção de cidadania etc.. Contudo, a formação de competências e

habilidades para desenvolver as bases tecnológicas por onde circulam as produções estão fora

dos itinerários na área. Mesmo nos cursos de tecnólogo, que compõem a graduação. Produção

de base tecnológica é com as engenharias.

As diretrizes curriculares em comunicação sugerem que cada curso estabeleça e

organize seus conteúdos. Mas especificam a necessidade de dois conjuntos: os

“caracterizadores da formação geral da área”, chamados de básicos, e os que organizam o

“currículo pleno”. Tradicionalmente, essa organização é pensada sob o ponto de vista de uma

base comum em Comunicação e os complementos específicos por habilitação. Propostas nas

diretrizes, há seis habilitações já legitimadas: Jornalismo, Relações Públicas, Radialismo,

Publicidade e Propaganda, Editoração e Cinema. Diz o documento que podem ser criadas

“ênfases específicas em cada uma destas habilitações, que serão então referidas pela

denominação básica, acrescida de denominação complementar que caracterize a ênfase

adotada” e “novas habilitações pertinentes ao campo da Comunicação”50. Aqui importa

evidenciar o grau de abertura proporcionado pelo documento.

Quatro eixos orientam a organização de conteúdos, em relação à formação geral

da área: a) os teórico-conceituais; b) os analíticos e informativos sobre atualidade; c) os de

50 Parecer CES/CNE 492/2001, p. 17.

Page 82: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

81

linguagens, técnicas e tecnologias midiáticas e d) os ético-políticos. A arquitetura curricular

proposta aqui para a Comunicação fundamenta neles os saberes necessários para a

constituição de uma certificação. Não há diferença entre conteúdos gerais e específicos,

porque não há disciplinas estruturadas com este tipo de classificação. Os eixos orientam os

conteúdos no sentido de mobilizar recursos e valores para promover ações em potencial

legitimadas nas certificações a serem propostas. As especificidades, em termos de conteúdo,

como propõem as diretrizes, são as próprias certificações, organizadas de modo singular, por

complementaridade. Neste sentido, não há disciplinas a compartilhar, visto que os conteúdos

são exclusivos de uma certificação e complementam-se a partir dos eixos descritos pelas

diretrizes.

Isso implica mudanças estruturais no modelo mental de organização curricular. O

propósito de trabalhar certificações em processo é, justamente, o de usar toda a abertura legal

no campo da educação para promover ações inclusivas, promover o trânsito pelo espaço

social de aprendizagem pela construção e socialização do conhecimento e não pela

certificação em si. A Comunicação, enquanto área de conhecimento e campo de atuação, tem

a perspectiva de abrir múltiplas possibilidades de acesso ao ambiente universitário ao não se

impor por fases disciplinares, cumulativas e cindidas em termos de teoria e prática.

Composições curriculares em que os conteúdos impliquem ações em potencial,

aliás, parecem mais integradas aos sistemas de avaliação ora implementados pelo Ministério

da Educação e que se caracterizam como tendência no mundo inteiro. Não é mais a

quantidade de informações, de insumos educacionais que um estudante conseguiu acumular

ao longo de sua formação o objeto de aferição. Mas a capacidade de articular os saberes e

demonstrar condições de pensar soluções para os problemas que nos afetam.

Em Comunicação, os debates quanto às divisões do conhecimento por área estão

sempre latentes. É que a trajetória acadêmica percorrida ao longo da história inclui uma

autorreflexão profunda, a ponto de transformar também os itinerários técnico-profissionais. O

debate envolve inclusive outras áreas, pois não há setores que não sejam afetados pelas

transformações inerentes à Comunicação.

O campo de atuação está em constante transformação, é instável e suscetível aos

movimentos políticos de época. A área de conhecimento, igualmente, admite vertentes

múltiplas quanto aos “lugares epistemológicos” nela reconhecidos. Pô-las no movimento em

espiral significa inserir essa instabilidade e suas condições de possibilidade no próprio

processo de formação, condição que não só amplia os horizontes à vista como reconhece

Page 83: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

82

politicamente o embate de forças quanto à legitimidade dos saberes e dos lugares de ocupação

contemporâneos.

4.5 TIPOLOGIA DE CERTIFICAÇÕES

O termo certificação tem, em síntese, dois aspectos relevantes a serem

considerados. Em primeira instância, os itinerários propostos para a Comunicação devem ter

caráter de terminalidade, certificável num determinado contexto. Esse caráter de

terminalidade está associado às competências a serem desenvolvidas e aferidas numa dada

circunstância. Neste caso, estão associados aos níveis de aprendizagem e suas referências

normativas definidas pelo Ministério da Educação. Numa segunda instância, o termo está

associado aos produtos em oferta, cursos cuja característica interessam a demandas

específicas ou a investimentos de longo prazo, estratégicos para a instituição de ensino.

A tipologias gerada nesse processo e relacionada neste trabalho é uma referência

ainda tímida das potencialidades subjacentes, mas já estabelece um amplo espaço social de

aprendizagem e oferece múltiplas possibilidades de acesso e trânsito ao ambiente

universitário. Como argumento principal, a proposta de Certificação Processual rompe com

a visão unilateral de que há saberes inferiores, estes sim, disponíveis a todos os que não

tiveram capacidade/competência para ocupar um lugar no sistema de ensino superior como

estudante regular. Os requisitos para se chegar à uma graduação estão em

capacidades/competências adquiridas em processo. Os pré-requisitos são os estabelecidos pela

lei. Um espaço social de aprendizagem coerente com o compromisso de formar para a

cidadania tem, de início e necessariamente, que romper com os dogmas que sustentam a

exclusão e a hierarquia de saberes.

Neste sentido, a articulação dos saberes na Comunicação pode ser feita nas

seguintes estruturas certificáveis, intercambiáveis e contíguas nas suas áreas e campos,

legitimadas pelas instâncias reguladoras do sistema educacional brasileiro de nível superior:

a. Cursos livres e de promoção social - em caráter de extensão, têm a finalidade

de promover atividades complementares de formação técnica e de iniciação

científica. Propõem heterogeneidade de perfis de ingressante e conteúdos

associados a uma série de recursos que auxiliem na efetivação das ações em

Page 84: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

83

potencial propostas em itinerários formativos. Além disso, podem ser

estruturados para a formação de parcerias, sejam duradouras ou temporárias,

que viabilizem o uso de novas tecnologias e estruturas laboratoriais. São

também um excelente espaço para a contratação de palestrantes e docentes

temporários cujo conteúdo a ministrar representa alguma inovação ou objeto

de pesquisa significativa para a área. Na arquitetura curricular subdividem-se

em

i. Cursos de Iniciação, introdutórios quanto à formação técnica ou

acadêmica, ou relacionados a novos processos, métodos e concepções

sejam socioculturais, sociotécnicos ou científico-tecnológicos;

ii. Cursos de Atualização, focados em conhecimentos e procedimentos

técnicos ou acadêmicos cuja estruturação tenha por objetivo "renovar"

ações potenciais já desenvolvidas;

iii. Cursos de Qualificação, voltados para o aprimoramento de

competências desenvolvidas academicamente ou requisitadas. no

contexto técnico-profissional;

b. Cursos superiores de complementação de estudos - de destinação coletiva,

compõem o processo de formação em nível de graduação para todas as

certificações decorrentes. Envolvem campos de saber e de atuação a partir de

conteúdos mobilizados para competências e habilidades específicas. São

complementares em relação às trajetórias na área e complementares também

entre si. Subdividem-se em

i. Cursos de degustação de saberes, orientados para a área de artes e

focados no uso de elementos comunicacionais para estruturar formas de

expressão mais livres. Oferecem certificação de nível superior a partir

de pré-requisitos pensados em função de seus objetivos. São de

degustação justamente por proporcionarem itinerários introdutórios ao

ambiente universitário.

ii. Cursos de fundamentação de campo, que constituem essencialmente o

processo de formação na graduação. Neles estão as dimensões

científico-tecnológicas, socioculturais e sociotécnicas necessárias ao

espaço social de aprendizagem, cuja orientação depende das ações em

potencial a serem desenvolvidas.

Page 85: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

84

c. Cursos superiores de formação específica - mais vocacionados para formação

sociocultural, refletem campos de saber e suas articulações com a área de

conhecimento e o campo de atuação (mínimo de 1.600 horas). Seus diplomas

não são de graduação, mas chancelam uma trajetória que responde por lugares

de ocupação na sociedade e permitem a inserção em cursos lato sensu.

d. Cursos de graduação em tecnologia - mais vocacionados para formação

sociotécnica, refletem campos de atuação profissional, reconhecidos pelo

mundo do trabalho e por itinerários técnico-profissionais legitimados pela

sociedade (mínimo de 1.600 horas). Seus diplomas garantem acesso a

quaisquer cursos de pós-graduação.

e. Cursos de bacharelado - compõem as habilitações da Comunicação Social,

tradicionalmente descritos nas diretrizes (mínimo de 2.700 horas). Atualmente

na arquitetura curricular estão Jornalismo e Publicidade e Propaganda.

f. Cursos de pós-graduação - atualmente, as possibilidades de cursos nesta área

são amplas e conjugam as necessidades de formação técnica com a acadêmica,

dependendo da característica e da modalidade em oferta.

i. Em lato sensu:

1. Cursos de Aperfeiçoamento: com carga horária mínima de 180

(cento e oitenta) horas, visam ao aprofundamento de

conhecimentos e habilidades técnicas em domínios específicos

do saber e da prática profissional.

2. Cursos de Especialização: com carga horária mínima de 360

(trezentas e sessenta) horas, visam à complementação,

ampliação e desenvolvimento do nível de conhecimento

teórico-prático em determinado domínio do saber.

3. Cursos de MBC (Master in Business Communication), com

carga horária mínima de 360 (trezentas e sessenta) horas,

enquadram-se nos cursos lato sensu em nível de especialização,

destinando-se a segmentos de gestão e negócios na área.

4. Programas de Residência, classificados na pós-graduação lato

sensu, em nível de especialização, são desenvolvidos como

treinamento em serviço, em tempo integral, sob supervisão de

docente ou profissional de elevada qualificação ética e

profissional, em ambiente de ensino e pesquisa.

Page 86: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

85

ii. Em stricto sensu:

1. Cursos de Mestrado objetivam aprofundar o conhecimento

profissional e acadêmico, bem como possibilitar o

desenvolvimento da habilidade para executar pesquisa em área

específica. Hoje são reconhecidos os mestrados acadêmicos,

para a formação de pesquisadores e docentes, e os mestrados

profissionais, para a formação de técnicos de alto nível.

2. Cursos de Doutorado objetivam o desenvolvimento da

habilidade para conduzir pesquisa original e independente, em

área específica.

Pela tipologia apresentada, a arquitetura curricular em Comunicação ganha um

sentido mais amplo em relação às tradicionais propostas pedagógicas. As interfaces e os

recortes inerentes aos campos de saber e de atuação diante da tradição epistemológica e

mercadológica ganham sentido num mapa de certificações que não está confinado à ideia de

portfólio de produtos e serviços educacionais. O movimento por entre as certificações aqui

propostas não é somente linear, valorizada pela sobreposição de títulos. Há uma circulação

possível em relação aos ambientes de aprendizagem decorrentes dos projetos arquitetônicos

em seus diversos graus de complexidade.

É necessário combinar as esferas do saber, do saber fazer e do ser em conteúdos

conceituais, procedimentais e atitudinais (ZABALA, 1998) cujas barreiras estruturais

disciplinares sejam vencidas em programas de aprendizagem em código aberto. A ideia de

código aberto não significa uma proposição caótica em que as trajetórias se reconheçam por

quaisquer possibilidades. Antes, colabora com o movimento em espiral proposto na

composição das certificações; os contratos de aprendizagem, como são muitas vezes

considerados esses programas, devem ser consolidados pelas ações em potencial. Portanto,

deve ficar suficientemente claro na “assinatura” desse contrato o compromisso de todos os

envolvidos no desenvolvimento dessas ações. No espaço social de aprendizagem, seus

programas propõem as ações em potencial e negociam em processo as relações necessárias

para se implementar tais ações. Há uma certa dose de previsibilidade e de intervenção

possível; mas educar para as incertezas pressupõe um processo de negociações constantes em

que se pode apenas sugerir as possibilidades, não mais que isso.

Nesse sentido, os processos de avaliação também propõem-se mais abertos.

Significa dizer que não há como estabelecer critérios de avaliação sem se estar envolvido

diretamente no processo de realização das ações em potencial. O sentido de avaliar em

Page 87: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

86

processo não permite que primeiro se chegue a um resultado e a partir dele se faça as relações

com a aprendizagem possível. Estar em processo significa poder intervir nos rumos apenas

pontualmente. As correções de rota em momentos chave dependem de avaliações sempre

coletivas que discutam e proponham quais soluções são factíveis para se alcançar os

horizontes propostos. Para que uma burocracia, necessária, consiga se pôr a serviço da

criação, surja do vivido, é necessário promover no espaço social de aprendizagem um

ambiente específico para o processo de avaliação; considerá-lo também como conteúdo e,

portanto, socializar o debate sobre as proposições decorrentes do processo; não apenas seus

resultados.

Page 88: CERTIFICAÇÃO PROCESSUAL EM COMUNICAÇÃO

87

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Resultado de pelo menos dois anos de reflexão em grupos estratégicos e em

reuniões de planejamento no Curso de Comunicação Social da Universidade do Sul de Santa

Catarina, campus da Grande Florianópolis, a Certificação Processual em Comunicação traz

uma proposta de reconfiguração dos processos acadêmicos para reorientar processos

administrativos. Sem mudanças na estrutura, da curricular à de gestão financeira, não nos

parece possível pensar em uma outra universidade.

Autônoma em suas atividades, prerrogativa constitucional, a instituição

universidade no Brasil permanece atrelada às excessivas normatizações e aos modelos de

organização tecnocráticos nas respostas aos processos avaliativos. Propor diferentes

concepções de estrutura acadêmico-administrativas é também propor alternativas aos padrões

de resposta esperados pelas instâncias de regulação do sistema educacional. E não há porque

ter receio quanto a isso. As medidas reguladoras não tendem a oferecer resistência quando as

alternativas de proposição sustentam-se em argumentos que reforçam a própria educação

enquanto concepção.

Como propósito, este trabalho buscou entender o cenário da educação superior no

Brasil e argumentar sobre as aberturas possíveis no contexto da crise por que passa o setor.

Uma crise, aliás, sustentada pelo próprio sistema, na medida em que reforça os padrões de

seletividade e distancia os níveis "inferiores" - para usarmos um termo de similar significância

quanto ao nível aqui analisado - no processo de aprendizagem. Instituições públicas e

provadas enfrentam a mesma situação, ainda que por circunstâncias diferentes. Mas as que

dependem de mensalidade, em particular, organizam-se como empresas em busca de

sustentabilidade estigmatizadas pela ideia de que estão "negociando" um bem público.

Diante do cenário analisado, há formas de organização que possibilitam à

instituição universidade de direito privado valorizar o conhecimento como patrimônio

coletivo e a educação como bem público, em concomitância aos ideários de sustentabilidade

econômica. Isso pede um espaço permanentemente aberto à circulação dos interessados em

conhecimento, não só em títulos; pede a criação de propostas que reconheçam diferentes

saberes e valorizem o capital intelectual não só como capital político, mas e sobretudo como

identidade institucional; pede o reconhecimento de uma diversidade inerente à própria

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instituição, além de outros modelos mentais e esforços de solução em patamares nos quais os

problemas que enfrentamos sejam deslocados a outro nível de compreensão.

No âmbito administrativo, e por consequência econômico-financeiro, essa outra

organização pede formas diferentes na relação com os interessados no conhecimento

estruturado em produtos acadêmicos. Formas que valorizem o interesse na aprendizagem a ser

financiada pelas mensalidades, que procurem respeitar o tempo disponível para a efetivação

de uma trajetória acadêmica e diversifiquem as perspectivas de ingresso no sistema

educacional de nível superior. Sem uma discussão profunda quanto aos aspectos

administrativos que estejam a serviço da gestão desses novos processos, não há como

implementar mudanças profundas.

Pensar na instituição universidade como "lugar epistemológico" capaz de educar

ao longo de toda a vida e, por consequência, construir outros "sentidos praxeomórficos" para

a percepção do mundo em que vivemos não é possível num ambiente dogmatizado por

preceitos inscritos na mesma tradição que gerou a crise. Para a gestão numa "organização de

conhecimento", como se costuma denominar as instituições de ensino, é fundamental que

justamente o conhecimento fomente concepções em resposta aos problemas por ela

enfrentados. E, para isso, entender os conceitos que alicerçam o movimento de reconfiguração

de saberes e reorganização da estrutura torna-se fundamental.

Como desafio, a Certificação Processual precisa, enquanto projeto, de um

mergulho nas concepções operacionais, relativas não apenas à gestão mas aos processos

acadêmicos mesmo. Ainda que longa e abrangente em conceitos e perspectivas, a proposta

que ora fecha seu primeiro ciclo terá de caminhar agora para uma constituição mais

pragmática, funcional. E para isso terá de se deparar com os itinerários projetados pelos

setores estratégicos, a alta gestão da universidade. Espera-se sensibilizar para um outro

movimento, fora do contexto reconhecido nos processos de gestão formal de instituições de

ensino superior.

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