Claquete Alternativa 2015

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A história contada pelos filmes Câmera na mão, ideia na cabeça A história do país narrada pelos filmes Os novos métodos que têm mudado o cinema independente. Avanços tecnológicos no jeito de fazer cinema Como os avanços tecnológicos contribuem para se fazer filmes e atraem cineastas consagrados como Godard CLAQUET A L T E R N A T I V A DEZEMBRO 2015

Transcript of Claquete Alternativa 2015

A história contadapelos filmes

Câmera na mão, ideia na cabeça

A história do país narrada pelosfilmes

Os novos métodos que têm mudado o cinema independente.

Avanços tecnológicos no jeito de fazer cinema

Como os avanços tecnológicos contribuem para se fazer filmes e atraem cineastas consagrados como Godard

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Revista produzida por alunos do 6º semestre do curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo da Universidade Anhembi Morumbi

ReitorOscar Hipólito

Diretor da Escola de Comunicação e EducaçãoProf. Dr. Luis Alberto de Faria

Coordenador do curso de JornalismoProf. Ms. Nivaldo Ferraz

Primeiro-ministro do curso de JornalismoProf. Ms. Alexandre Possendoro

Professores orientadoresProf. Ms. Rafael Fonseca Santos

Projeto gráficoProf. Ms. Rafael Fonseca SantosFelipe Henrique Lima

Redação e diagramaçãoBarbara Maria GodoyFelipe Henrique LimaJéssica ParolinRenata Aloise

Data desta ediçãoNovembro de 2015

expediente

Foto: Dayane Zanetil

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A CLAQUETE ALTERNATIVA tem como mis-são difundir o cinema alternativo no Brasil de maneira inovadora, aprofundando os fa-tos, discutindo, interpretando, analisando e formando opinião. É uma revista feita para quem gosta de ler, que quer saber sempre mais sobre pessoas interessantes que fazem coisas que fogem aos padrões que normal-mente vemos na mídia — no caso, filmes.

Queremos que nossas matérias sejam tão inovadoras quanto os filmes que nos ins-piram e fazem parte do nosso dia-a-dia. Porque a CLAQUETE ALTERNATIVA é feita especialmente para aqueles que respiram cinema, que acham que um dia sem filme é um dia menos alegre.

A revista não se prende apenas a fazer uma análise fria das produções alternativas, ela quer entrar no universo, se aproximar da realidade e trazê-la para seus leitores, para que possam não apenas compreender, mas interpretar e interagir com o mundo alter-nativo das produções cinematográficas, au-mentando ainda mais seu prazer e amor por esse gênero.

apresentação

RECORDANDO6. MARCOU VOCÊ

7. ISMOS8. CINE HISTÓRIA

11. MESTRES

CINE MANIA12. CINE GOURMET

13. SONORA14. INDIE

18. VIAJANDO20. CAPA

24. CINE DE RUA

FIQUE POR DENTRO28. ESTREIAS E

ANÁLISES

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ismos

Neorrealismo ItalianoPor Renata Aloise

Também conhecido como a Era de Ouro do Cinema Ita-liano, é um movimento caracterizado por histórias focadas na classe pobre trabalhadora, filmadas fora dos estúdios, frequentemente estreladas por atores não profissionais. Distinguiu-se pelo uso de elementos da realidade numa peça de ficção, aproximando-se até certo ponto, em algu-mas cenas, das características dos documentários. Ao con-trário do cinema tradicional de ficção, buscou representar a realidade social e econômica de uma época.

O termo surgiu quando, em 1943, Umberto Barbaro chamou de “neorrealístico” o filme Obsessão, de Lunchino Visconti, no qual havia trabalhado como montador. Mas foi só dois anos depois que o movimento ganhou notorieda-de mundial, com o lançamento de Roma, cidade aberta, de Roberto Rossellini, que ganhou o Prêmio do Júri, no Festi-val de Cinema de Cannes.

As crianças tem papel fundamental, e sua presença no final do filme de Rossellini é indicativa de seu papel no neorrealismo como um todo: observadores das dificulda-des de hoje, são como uma chave para o futuro. Ladrões de bicicletas, filme de Vittorio De Sica de 1948, também é bastante representativo do gênero, com atores não profis-sionais e uma história que mostra de maneira detalhada as dificuldades da classe operária do pós-guerra.

CLAQUETE INDICA

1 - A terra treme, 1948, Luchino Visconti2 - Alemanha, ano zero, 1948, Roberto Rossellini

3 - Arroz amargo, 1949, Giuseppe De Santis4 - Umberto D., 1952, Vittorio De Sica

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Marcou você...Por Barbara Godoy e Renata Aloise

O Medo Consome a Alma, 1974

“Nesses últimos tempos eu estou muito ligada ao Fassbinder, estou muito envolvida com o cinema dele, com a figura humana que ele era. O filme que tem me estimulado muito é O Medo Consome a Alma. É um filme tão bonito que mostra uma boa parte das relações que a gente tem com o outro, como os outros definem as nossas relações. Quando a personagem vence esse medo do outro, ela começa a impor o outro que tem dentro dela, aquele outro que nos habita. Na juventude ela foi do grupo nazista, então o amante dela é argelino e ela começa a impor a cultura alemã para o argelino, e ele, claro, fica possesso. É muito inte-ressante. O Medo Consome a Alma, até o título é genial.”

Inez Pereira da Luz, professora na Universidade Anhembi Morumbi

Pink Floyd - The Wall, 1982“Assisti mais de sete vezes [The Wall, do Pink Floyd] aos 18 anos e pedi as contas do meu primeiro emprego. Eu achava que não me corres-pondia, eu podia fazer coisa melhor. Todo o filme me inspirou, mas o principal é a cena final que até hoje está na minha cabeça. Apare-ce uma parede e então vem a música que diz para você derrubar as paredes, porque as pessoas que te amam estão atrás delas. O filme todo é uma metáfora, uma crítica à guerra. Há uma cena de linha de produção em que as pessoas vão sendo trituradas, moídas, como car-ne. Assisti num cinema que nem existe mais, mas que tinha uma tela acústica, você entrava no filme. Chamava-se Comodoro, na Avenida São João. A tela acústica, a música do Pink...foi bom.”

Rose Naves, professora na Universidade Anhembi Morumbi

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Ladrões de bicicletas

Alemanha, ano zero

Umberto D.

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cine história

As memórias do BrasilComo os recursos audiovisuais do cinema têm contribuído para a reprodução de experiências e fatos através do tempo

Por Barbara Godoy, Felipe Henrique Lima, Jéssica Parolin e Renata Aloise

Um garoto entra no fusca com os pais, que dizem que vão sair de férias. Mas no dia seguinte ele tem aula, como vão sair de férias? O pai se enerva, isso não é brinca-deira. O menino então, pega seu maior tesouro debaixo da mesa da cozinha. Como vai viajar sem sua bola de futebol? E será que Pelé e Tostão podem jogar jun-tos?

A cena do filme O ano em que meus pais saíram de férias mos-tra bem o drama da ditadura no Brasil. O terror das perseguições e torturas escondido pela euforia da Copa do Mundo de 1970, no México. E assim é contada a his-tória através do cinema.

Desde a época das pinturas ru-pestres na pré-história, os huma-nos registram o que observam, seus dias, suas experiências, suas descobertas, entre outros aspec-tos da vida cotidiana e política.

Os tempos passaram, mas a necessidade de guardar nossas memórias, como herança aos nossos descendentes, não mu-dou. O que mudou foi a maneira de fazer isto. As pinturas moder-nas, os vídeos, o áudio, a fotogra-fia, a internet, o cinema, a televi-são. Tudo a favor das histórias de pessoas, famílias, povos, nações e do mundo. É como pensou o

teórico francês Jacques Bossuet, “a história é o grande espelho da vida; instrui com a experiência e corrige com o exemplo.”

Uma das ferramentas que se destacam neste meio e que está ajudando a contar muitas expe-riências, é o cinema. Como um mergulho no tempo, os cineas-tas tentam reproduzir os luga-res, pessoas, vestimentas, falas, feições e cada detalhe, trazendo maior compromisso com a reali-dade. De acordo com o historia-dor francês Marc Ferro, “intriga autêntica ou pura invenção”, filme é história.

Pode ser que você nunca te-nha estudado sobre ou vivido períodos de guerras, ditaduras, revoluções, imperialismo, demo-cracia, fome, doenças, mas os fil-mes conseguem fazer com que

você entre neste universo e se co-loque no lugar de pessoas que já vivenciaram tudo isso.

No Brasil existem alguns filmes que conseguem transparecer tudo o que vivemos no país por ângulos e visões diferentes.

“O Brasil tem seu jeitinho úni-co e genuíno de fazer cinema, pois também a história daqui é única,” comenta Artur Mirov, for-mado em cinema Digital pela La-tin America Film Institute. “Acho que entre muitos erros e acertos, temos de elogiar.”

Contar histórias de fatos histó-ricos ocorridos no país tem dado certo. A trama do sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil em 1969, virou filme nas mãos de Bruno Barreto em 1997, adaptado do livro do jornalista Fernando Gabeira.

O que é isso, companheiro? foi indicado para o Oscar de Me-lhor Filme Estrangeiro no ano seguinte. Outra produção indi-cada ao prêmio da Academia foi O quatrilho, de Fábio Barreto. A película conta a história de uma comunidade rural no estado do Rio Grande do Sul habitada por imigrantes italianos, e mostra as dificuldades encontradas por aqueles que deixaram seu país de origem para viver no Brasil.

“O cinema sempre foi uma arte para a comunicação de mas-sas, um meio em que se podia explorar o simbólico e assim fu-gir da censura, explorar a autoria em prol do total e isso é absolu-tamente necessário,” afirma Luiz Felipe Baute, 22, formado em Co-municação Social e roteirista na

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Coala Filmes.Essa afirmação pode até expli-

car por que o período da ditadu-ra é ainda o tema mais abordado pelas produções cinematográfi-cas. “Foi a época do veto total. O horror, a falta de liberdade. Tudo proibido e o desumano impe-rava no pais,” completa Arthur Mirov. “Também há muito o que desvendar ainda, existem docu-mentos de desaparecidos que ainda não foram lidos e pessoas que desconhecem onde os seus parentes e presos políticos estão enterrados.”

Os filmes, de certa forma, são documentos. Fixam em suas ima-gens partes de nossas memó-rias. Por mais que não tenhamos produzido a película, épocas por qual passamos nos fazem relem-

brar e nos identificarmos. Por te-rem essa função, é importante que os tenhamos em alta conta, apesar da não podermos depen-der exclusivamente deles.

“Mesmo o mais documental dos documentários é sujeito a montagem. O cinema é a arte da construção através da descons-trução,” diz Luiz Felipe Baute. “O filme buscará aproximar o espec-tador pela sua narrativa, seja fic-cional ou não, mas ele não será realidade, a própria linguagem do cinema foi construída a partir dessa percepção e por isso ele pode adquirir dimensões mui-to maiores. O papel do cinema é esse retrato em aproximadamen-te, e comumente, duas horas e o seu assunto, será o assunto do fil-me e não do real.”

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Cena do filme O que é isso companheiro?, 1997, de Bruno Barreto

O ano em que meus pais saíram de férias, 2006, de Cao Hamburguer

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As cinebiografias, como por exemplo o recente Getúlio, de João Jardim, são retratos interes-santes que ajudam a entender fatos passados, uma janela aber-ta sobre um pedaço de vida. Mas uma vida é muito mais que duas horas.

Assim como os filmes podem contar histórias, também a his-tória pode se contar através dos filmes. Muitas produções cine-matográficas representam sua época nas telas, podendo se transformar no futuro em boas ferramentas para se entender ge-rações que já passaram.

A geração do Cinema Novo na década de 60, por exemplo, trans-pôs o contexto de incerteza da época com certa precisão, mes-mo que de forma subjetiva, para suas produções. Filmes como Ter-ra em Transe, de Glauber Rocha e O Bandido da Luz Vermelha, de Rogério Sganzerla, são clássicos estudados até hoje.

Dessa forma, por mais distante que possa parecer, não é comple-tamente absurdo dizer que o ci-neasta, ao fazer um filme de teor histórico, assume a posição de historiador, apesar de não seguir à risca o rigor do trabalho histo-riográfico.

A história do Brasil contada pelos filmes

Fotos: DivulgaçãoArte: Jéssica Parolin

Foto: Divulgação

Michelangelo AntonioniPor Renata Aloise

mestres

A desilusão que traz o futu-ro é traduzida por um simples olhar, que vaga lânguido pelo espaço vazio de um mundo que não parece pertencer a ninguém em particular. O olhar pertence à musa Monica Vitti. A direção per-tence ao grande mestre italiano Michelangelo Antonioni.

Filho de uma rica família de proprietários de terra, nasceu em 1912, em Ferrara, no norte da Itá-lia. Desde pequeno se interessou por desenhos e música, e já aos nove anos deu seu primeiro con-certo de violino.

Logo após se formar em eco-nomia pela Universidade de Bo-logna, começou a trabalhar como jornalista de cinema para o jornal Il Corriere Padano, em 1935.

Em 1940, se mudou para Roma, onde trabalhou na revis-ta oficial fascista Cinema, mas foi despedido alguns meses depois por desavenças polítcas.

Em 1942, foi contratado para co-escrever Un pilota ritorna com Roberto Rossellini, e trabalhou como diretor assistente em Más-cara de sangue, de Enrico Fulchig-noni. No ano seguinte conseguiu financiamento para Gente do Pó, documentário sobre a vida dos pescadores que viviam às mar-gens do Rio Pó.

Mudou os rumos de sua obra com o lançamento de seu primei-ro longa, Crimes da alma, de 1950. O filme trata da classe média ita-liana e de alienação social, assim como seus próximos três filmes.

Em 1960, sua obra-prima es-treou no Festival de Cinema de Cannes. A aventura é um estudo sobre alienação, tédio e isola-mento espiritual que atravessa seus 143 minutos lentamente, sem seguir uma história bem defi-nida através de seus longos e be-los planos. Mesmo sua premissa básica – a busca por uma mulher perdida – é abandonado antes do final do filme, o que causou a fú-ria dos espectadores em Cannes. A produção ganhou o Prêmio do Júri e transformou tanto Antonio-ni, como a estrela da produção, Monica Vitti, em astros.

A noite – o segundo filme da trilogia iniciada por A aventura – estreou em 1969, ainda exploran-do os temas da alienação, não-co-municação e a falta de sentido da vida moderna. O fim da trilogia veio em 1962, com O eclipse, a história de uma jovem que aban-dona o amante e logo se relacio-na com outro homem.

Em 1966, filmou Blow-up na Inglaterra, seu maior sucesso co-mercial. Sua popularidade trouxe

o cineasta italiano aos Estados Unidos, onde produziu Zabriskie Point em 1970, sua única produ-ção americana.

Produziu então Chung Kuo/Cina, um documentário para a TV gravado na China, denunciado pelo governo como “anti-Chinês” e “anti-comunista”.

Em 1985, sofreu um derrame que o deixou parcialmente para-lizado e incapaz de falar. Apenas dez anos depois voltou a dirigir, com Além das nuvens, co-dirigido pelo alemão Wim Wenders.

Nesse mesmo ano, Antonioni ganhou um Oscar honorário, uma reverência à sua brilhante carreira que desafiou a noção básica do que é apresentar uma história em forma cinematográfica. Ele fale-ceu em 2007, aos 94 anos.

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O Bandido da Luz Vermelha, 1968, Rogério Sganzerla

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cine gourmet

“...qualquer um pode cozinhar”.Por Jéssica Parolin

A animação Ratatouille, obra do diretor Brad Bird, lançado em 2007 pelos estúdios Pixar, faz su-cesso entre as crianças e adultos. Mergulhamos na história com o ratinho francês Remy que sonha em ser chef de cozinha, porém é apenas um roedor que rouba co-mida dos lixos.

Um acidente faz com que Remy se perca da família e encon-tre um famoso restaurante. Lá ele é guiado pelo espírito do grande chef Gusteau e se une a Linguini, um faxineiro desajeitado que de-seja ser cozinheiro.

Após o filme é quase impos-sível não desejar experimentar o famoso Ratatouille, prato que dá nome a obra. Embarque nessa aventura gastronômica.

Ingredientes- 1 unidade pequena de berinjela- 1 unidade pequena de abo-brinha italiana- 2 unidades grandes de tomate, sem sementes- 1 unidade média de pimentão verde, sem sementes- 1 unidade média de cebola picadinha- 1 dente de alho picado- 3 colheres de sopa de azeite de oliva- Sal a gosto- Pimenta-do-reino a gosto- 1 colher de chá de manjericão picado- 1 colher de chá de orégano picado- 1 colher de chá de salsinha picada

Como fazerFatie a berinjela em rodelas

finas. Depois de cortada, deixe descansar por alguns minutos com sal, sobre um escorredor, para drenar seu líquido e retirar o sabor amargo.

Fatie também a abobrinha ita-liana, o tomate e o pimentão ver-de. Reserve.

Refogue o alho e a cebola no azeite, usando uma frigideira grande. Faça isso até que a cebola fique transparente.

Em um recipiente, alterne as rodelas dos legumes, colocando uma ao lado da outra, de modo que criem um efeito visual colo-rido.

Espalhe a cebola e o alho fri-tos no azeite sobre os legumes, acrescente sal e pimenta-do-rei-no a gosto.

Acrescente as ervas e leve ao forno por cerca de 20 minutos ou até que os legumes estejam cozi-dos e o líquido, evaporado total-mente.

sonora

Olhe para trás, para as recorda-ções que povoam nossa memória, as formaturas, as conversas com os pais, quando nossas amizades pareciam ser eternas ou tudo o que você queria era dirigir sem direção, rumo a um lugar onde seu coração não sentiria a dor de ser partido. Essas situações pro-vavelmente foram embaladas por uma canção.

O compositor francês Michel Chion disse que um dos mais sig-nificativos impactos do uso de som no cinema foi seu efeito no tempo cinematográfico, tornan-do-o uma “arte do tempo”.

O filme Boyhood, de Richard Linklater, é um verdadeiro épico em quase todos os sentidos. Gra-vado durante 12 anos, mostra a trajetória de Mason nesse “tempo real” cinematográfico, envolven-do o espectador no mundo cria-do pelo cineasta americano.

Som e música estruturam o universo do filme, as descober-tas e epifanias dos personagens.Uma menininha canta à plenos pulmões “Oops! ... I Did it Again”, de Britney Spears para irritar seu irmão mais novo, sem entender a letra direito; A excitação infantil dá lugar aos resmungos adoles-centes que quase não entende-mos.

Por trás de tudo isso há músi-ca tocando, constantemente. A trilha sonora de Boyhood foi elo-giada pela especificidade, pelo jeito em que as canções traçam a cronologia da história, desde “Yellow”, de Coldplay, no início do filme, até “Summer Noon”, de Jeff Tweedy, nos créditos finais. E mesmo assim, o mundo sônico de Boyhood é mais que uma mixtape desconexa. Há uma divisão clara entre as músicas do mundo do filme – um personagem ouvindo um CD, ou o rádio – e as músicas que ocorrem além do quadro da câmera.

Boyhood mostra a dualidade da música pop, efêmera e atem-

poral, enquanto oferece um es-tudo de como a música funciona em nosso dia-a-dia. “LoveGame”, de Lady Gaga, “Anthem Part Two”, de Blink-182, “Good Girls Go Bad”, de Cobra Starship, refletem o gosto das pessoas que habitam o mundo do filme, mais do que o gosto daqueles que o produziram (ou daqueles que o assistem).

E é claro, ser jovem é passar muito tempo ouvindo músicas que não necessariamente você irá gostar daqui um, dez ou vin-te anos. A trilha sonora da nossa vida é bonita, irritante, embaraço-sa, necessária. E Boyhood mostra isso de maneira primorosa, coisa que poucos filmes conseguem.

A música da minha vidaPor Renata Aloise

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Cena do Filme Ratatouille, 2007, de Brad Bird e Jan Pinkava

Dica: sirva com baguete ou pão italiano. O prato também pode ser ser-

vido como acompanha-mento de carnes e aves.

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indie

Câmera na mão, ideia na cabeça

Revolução ou ditadura. Eram as alternativas que se coloca-vam à disposição da população brasileira entre os anos 50 e 70, a primeira vista. Era necessário o desenvolvimento do país, seja para acompanhar um mercado internacional ou para remediar as contradições sociais existentes. Mas esse desenvolvimento não poderia ser realizado de forma isolada, num mundo em que o capitalismo se tornava cada vez mais mundial. No entanto, esse desenvolvimento era acompa-nhado de um processo de urbani-zação e industrialização que gera-va uma gradual desintegração da cultura nacional, dos costumes, da tradição, que muitas vezes re-presentavam válvulas de escape para uma situação de miséria e sofrimento, e de transgressão e luta. Era esse o contexto vivido pelo cineasta Glauber Rocha.

Grande representante do Ci-nema Novo brasileiro na década de 60, Rocha já dizia que para se fazer cinema é necessário ape-nas “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”. E até hoje, talvez mais do que nunca, sua frase tem um efeito imenso. Sua filosofia de transformar o país através do cinema não incluía grandes or-çamentos, apenas uma ideia re-

volucionária que abriria os olhos da população para os problemas sociais que o Brasil enfrentava.

O conceito de “cinema inde-pendente”, também chamado de “underground” ou “alternativo” é aplicado a um filme que foi pro-duzido sem a interferência de um grande estúdio cinematográfico e sem a influência de interesses comerciais e mercadológicos.

Mas, o significado de cinema independente não pode ficar restrito apenas a um filme “não-hollywoodiano”. Ele vai muito além disso. Um filme indepen-dente precisa se desgarrar do óbvio, tem que ter a audácia para contar uma história inovadora

com um ponto de vista mais críti-co, mais abrangente, enfim, deve apresentar mais do que o clichê adotado pelo cinema comercial.

O termo “independente” co-meçou a ser usado na década de 50, quando as películas passa-ram a ser produzidas no formato 16mm, ampliando o acesso de mais pessoas no processo de pro-dução da sétima arte.

Portanto, não é de hoje que os avanços tecnológicos contri-buem para o crescimento desse tipo de cinema, conhecido por suas técnicas experimentais tan-to na narração quanto dramatici-dade, e por histórias que buscam maior engajamento político.

A facilidade trazida com os smartphones e suas câmeras de alta resolução, além de avança-dos programas de edição de ví-deo, fazem com que qualquer um possa se aventurar na produ-ção de um filme. Antes um sonho distante para alguns, agora ser notado numa indústria conhe-cidamente fechada pode estar mais fácil.

“A tecnologia tem impacto positivo na produção de filmes autorais e de baixo orçamento, pois promove a democratização do acesso a equipamentos de alta qualidade, mas com custos

Como os cineastas brasileiros driblam a falta de recursos e incentivos para levar seus filmes a um público cada vez mais ansioso por histórias que saem do lugar-comum

menores”, diz Luana Melgaço, 36, produtora. “Mas é preciso ter o cuidado para saber utilizá-la como meio ou veículo a favor da proposta do projeto e não de for-ma ‘aleatória’”.

Luana trabalha no grupo A Teia, que abriga sua produtora de cinema, a Anavilhana. Entre suas produções, estão os premiados Girimunho, de Clarissa Campolina e Helvécio Martins Jr., O céu sobre os ombros, de Sérgio Borges e A falta que me faz, de Marília Rocha.

“Desde que comecei a me de-dicar à produção de filmes, tenho escolhido projetos que têm como objetivo a sua relevância artística

e pesquisa de linguagem e não necessariamente com resposta comercial nas bilheterias”, co-menta Luana.

Intimidade entre a obra e seus autores.

Fazer um filme sem o finan-ciamento dos grandes estúdios traz grande liberdade para os ci-neastas trabalharem suas ideias da maneira que as conceberam originalmente. Sem a necessida-de de agradar patrocinadores, parceiros e sem a pressão de criar uma obra que alcance a massa e

renda grande retorno financeiro, os autores podem ousar mais nos diálogos e no enredo, bem como no enfoque de suas obras.

“Funcionam melhor na relação de cinema de autor”, diz Luiz Feli-pe Baute, 22, formado em Rádio e TV e roteirista na Coala Filmes. “Muitas vezes isso representa um olhar diferenciado e subversivo às montagens e paradigmas clás-sicos ou convencionais nos quais estamos acostumados com os filmes dito hollywoodianos, uma profundidade bem particular, é interessante”.

Por essa maior liberdade, o cinema independente tem se

Por Barbara Godoy, Felipe Henrique Lima, Jéssica Parolin e Renata Aloise

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“A câmera é um olho sobre o mundo, o travelling é um instrumento de conhecimento, a montagem não é demagogia, mas a pontuação do nosso ambicioso discurso sobre a realidade humana e social do Brasil”. Glauber Rocha

Um filme independente precisa se desgarrar do

óbvio, tem que ter a audácia para contar uma história inovadora com um ponto de vista mais

crítico, mais abrangente, enfim, deve apresentar

mais do que o clichê adotado pelo cinema

comercial.

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indie

destacado por histórias que apre-sentam um grande viés social, principalmente no que diz res-peito à política e ao estilo de vida da sociedade atual. É comum ver-mos obras com críticas ao gover-no, à violência, ao capitalismo e à forma superficial como as pes-soas do século XXI enxergam o mundo.

A difícil escolha de voar com as próprias asas

A independência, no entanto, traz algumas dificuldades provo-cadas pelo desprendimento do apoio dos grandes estúdios. O fi-nanciamento e a distribuição são os principais setores que atrasam a chegada da obra ao público.

O cineasta Maurício Eça lan-çou seu primeiro longa-metra-gem Apneia em 2014. Mas entre escrever e lançar o projeto se pas-saram cinco anos. “Por ser um fil-me nada comercial foi mais difícil conseguir apoiadores e patroci-nadores que entendessem a cara que o filme deveria ter”, ele diz. “Mas graças a algumas empresas que entenderam a mensagem do filme e a equipe de atores que vestiram a camisa e se entrega-ram de corpo e alma, pudemos realizá-lo”.

Além do tortuoso caminho percorrido pelos cineastas na produção de seus filmes, há ain-da a difícil chegada às salas de ci-nema. Com o gradativo aumento dos locais de exibição nos sho-ppings, a preferência vai sendo dada para as películas que têm seu sucesso praticamente ga-rantido, geralmente estrelando atores populares que atraem um público imenso.

“O Brasil não possui uma in-dústria cinematográfica, mas sim grandes conglomerados que aca-bam tomando conta da produção

audiovisual que, consequente-mente, tem seu espaço reservado nas grandes salas de exibição do país, como a rede internacional Cinemark”, comenta Alex Bonilha, 22, que trabalha na O2 Filmes e estuda Rádio e TV. “Hoje, filmes independentes acabam possuin-do um pequeno espaço em sa-las de exibição mais alternativas, como o CineSesc. Além, é claro, dos festivais ao redor do mundo. Se não fossem as inscrições, exi-bições e premiações em festivais internacionais, talvez nem no próprio país de origem os títulos tivessem a oportunidade de se-rem exibidos”.

Certamente os festivais de ci-nema regionais e internacionais são os maiores responsáveis pela divulgação dos filmes “under-grounds”. Em número cada vez maior e sendo realizados com mais frequência, esse tipo de evento evidencia a importância desses filmes para o cenário do cinema como um todo. Os filmes independentes são um contra-ponto ao cinema de mercado de massa e sempre questionam seus valores, dando foco a histórias e personagens marginalizados pela sociedade capitalista e revivendo momentos da história que não podem simplesmente ser esque-cidos.

O Brasil no cenário inter-nacional

Apesar das dificuldades, a pro-dução independente brasileira tem recebido certa atenção em festivais internacionais. A produ-ção de 2014, Hoje eu quero voltar sozinho, dirigida por Daniel Ribei-ro, estreou na seção Panorama do Festival Internacional de Berlim, que compreende filmes de no-vos cineastas e lidam com temas considerados mais controversos, não-convencionais. Acabou por levar o prêmio Fipresci, concedi-do pela Federação Internacional de Críticos de Cinema.

Alex Bonilha lembra ainda do filme Beira-mar, de Filipe Mat-zembacher e Marcio Reolon, que também estreou em Berlim, na edição de 2015. “É um filme gaúcho que também aborda a homossexualidade de uma for-ma sutil e nada vulgar. Tem mo-bilizado uma grande quantidade de pessoas nas redes sociais. Ele está no catálogo do Netflix nos Estados Unidos, mas pro Brasil, seu país de origem, só tem sua estreia marcada para o início de novembro.”

Girimunho, produzido por Lua-na Melgaço, estreou em 2011 no Festival de Cinema de Veneza e al-guns meses depois foi exibido no

Festival Internacional de Toron-to. Ganhou o prêmio de melhor estreia no Festival de Havana. “O reconhecimento dos filmes reali-zados também abre portas para que vários profissionais queiram trabalhar conosco e estabelecer trocas artísticas com os nossos projetos,” diz a produtora.

O futuro na sétima arte

É difícil para os produtores independentes competir com o cinema comercial. Cineastas in-dependentes dispõem de menos recursos financeiros e tecnológi-cos que podem gradativamente apagar a chama, diminuir a von-tade de se fazer cinema. Mas isso pode ser visto como um desafio, e não um problema.

“Hoje vivemos um momento de um acesso incrível em que é possível se fazer com câmeras e equipamentos super acessíveis numa qualidade boa. Cada um

vai descobrir a sua forma e o seu jeito de lançar e divulgar o filme, seja online, seja da forma que for,” diz Maurício Eça. “Se fosse dar um conselho, é buscar a ideia mais criativa, trabalhe ela o máximo possível, estude as possibilida-des, os detalhes, ensaie e se pre-pare muito pra quando chegar a hora você poder estar seguro e confiante e a chance de proble-mas minimizar.”

É preciso fisgar as pessoas, por isso a importância de uma histó-ria bem contada. Um enredo for-te, atuações convincentes e um bom poder de criatividade são capazes de driblar todas as difi-culdades causadas por um orça-mento limitado e fazer com que um filme independente alcance o sucesso. Uma câmera na mão pode ser o que falta para trazer várias ideias às cabeças daqueles que não se assustam com os per-calços que se apresentam ao lon-go do caminho.

Cena do filme “Girimunho”, 2011

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“A tecnologia tem impacto positivo na produção de

filmes autorais e de baixo orçamento, pois promove a

democratização do acesso a equipamentos de alta qualidade, mas com custos menores”

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Filme Apneia, 2014, de Maurício Eça Foto: Divulgação Foto: DivulgaçãoFilme Hoje eu quero voltar sozinho, 2014, de Daniel Ribeiro

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viajando

Conhecendo Paris com Celine e JesseO poder do diálogo associado ao encanto do cenário parisiense

Por Barbara Godoy

O filme Antes do Pôr do Sol, dirigido pelo diretor Richard Linklater, foi lançado em 2004 e é uma conti-nuação de Antes do Amanhecer, obra inaugural da trilogia que retrata a relação entre Celine e Jesse, per-sonagens que se conhecem em um trem e passam a se relacionar através de diálogos arrebatadores que perduram durante todo o roteiro, envolvendo a complexidade e fragilidade das questões existenciais. É respeitando esse ritmo que Linklater origina um conjunto de obras coerentes a um cinema que tem muito a acrescentar.

1 - Livraria Shakespeare and CompanyO início desse reencontro, 9 anos depois, acon-tece na livraria parisiense Shakespeare and Company, conhecida como a mais charmosa do mundo. Ela se mantém na região da Rive Gua-che desde 1951, às margens do Rio Sena e com vista para a catedral de Notre Dame. É lá que Jesse, após se tornar um famoso escritor, está em turnê do lançamento de seu livro, This Time, e reencontra Celine, que vai até o local ao saber do evento.

2 - Le Pure CaféÉ nesse atraente café que os dois resolvem pa-rar após alguns minutos de caminhada, nele o casal comenta sobre as mudanças físicas e psicológicas acarretadas pelo tempo, e desco-brem, também, que durante os anos perdidos estiveram ao mesmo tempo em Nova Iorque.

3 - Coulée Verte René Dumont (antigo Pro-menade Plantée)Voltando a caminhada, os dois se dirigem ao jardim suspenso Promenade Plantée, feito em cima de um viaduto no bairro de Bastille. Ao tra-tarem de assuntos como infância e morte, Celi-ne alega: “A memória é uma coisa maravilhosa se você não tiver de lidar com o passado”.

4 - Quai de La Tournelle (Pont Sully)Após o passeio no atraente jardim parisiense, os dois se dirigem até às margens do Rio Sena e embarcam no bateau mouche, embarcação própria de passeios tu-rísticos que possui o convés superior aberto para que as regiões possam ser apreciadas. Mas aqui, o cenário se torna apenas um plano de fundo em meio a conver-sa dos dois. “... Não se pode substituir ninguém, porque todo mundo é uma soma de pequenos e belos deta-lhes.” Essa cena dá origem à imagem de capa do filme.

5 - Quais Henri IV É aqui que os dois desembarcam e onde o motorista de Jesse o aguarda para levá-lo até o aeroporto. Ele, então, oferece uma carona até o pequeno apartamen-to de Celine. A sequência de cenas dentro do carro evi-denciam ainda mais a delicadeza de Linklater, encon-trada nos diálogos e nas minúcias, como no momento em que Jesse olha para a janela e Celine tenta, disfar-çadamente, tocar seu rosto. Instante que também está presente no primeiro filme, quando os dois acabam de se conhecer e Jesse tenta tocar, delicadamente, o ca-belo de Celine.

6 - Court de I’Étoile d’OrA última parada acontece na Court de l’Étoile d’Or, pe-quena vila com casinhas localizada na Rue du Fauburg Saint-Antoine, onde Celine mora. Jesse resolve conhe-cer seu lar e promete não demorar, porém, no meio desse desfecho, enquanto Celine resolve finalmente tocar algo para ele ouvir, a atração entre os dois se evidencia nos versos musicais “...Uma única noite com você, pequeno Jesse, vale por milhares com qualquer outro.” É assim, no meio de uma valsa e de Celine imi-tando a presença de palco de Nina Simone, que Jesse se vê encurralado entre a realidade e o caso de amor que não terminou naquela noite de 95. Aqui, Linklater nos presenteia com o final mais tentador da história do cinema.

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A arte do futuroO jeito de fazer cinema se modificou profundamente com a inclusão das novas tecnologias que vão surgindo a cada dia. Mas todo esse avanço contribui ou prejudica a arte de contar histórias?

Por Barbara Godoy, Felipe Henrique Lima, Jéssica Parolin e Renata Aloise

Explosões, fogo, prédios que desabam, o fim do mundo. Ima-gens que transmitem as emoções necessárias para se contar um de-terminado tipo de história. Coisa que o cinema consegue tão bem, e não é de hoje. Desde o começo, a tecnologia anda junto com os cineastas para que grandes acon-tecimentos como os relatados possam ser integrados ao roteiro dos filmes e, assim, colocados nas telas.

O avanço tecnológico, porém, não se limita aos efeitos espe-ciais — grandes responsáveis por levar os espectadores às salas — mas também ajuda a aproximar os responsáveis pelas produções ao seu público-alvo, já que as no-vas tecnologias proporcionam imensas possibilidades de inte-ratividade. E é dessa forma que a tecnologia está assumindo o controle e mudando o rumo da indústria cinematográfica.

Diante de tantas artimanhas para prender a atenção do espec-tador, como no caso dos estúdios que ajudam a bancar produções gigantescas e sua distribuição, há ainda aquele público mais crítico, que não se deixa convencer ape-nas por imagens e efeitos de pon-

ta ou por uma mixagem e efeitos sonoros de arrepiar, mas que bus-ca no cinema uma magia que vai além da era tecnológica que esta-mos vivendo.

“O que me chama atenção em um filme é, justamente, a história e o desenvolvimento da narrati-va”, é o caso do estudante de Rá-dio e TV, Victor Hugo de Moura, 22. “Um filme começa por algo a ser contado e, se bem trabalha-do, não importam as restrições e dificuldades técnicas, pois só se torna um clássico quando seu público mantém a história viva.”

E manter essa história viva está cada vez mais fácil, já que a maneira de se assistir filmes tam-bém foi modificada com a tecno-logia. O crescimento da Internet proporcionou a criação de tec-nologias de streaming de vídeo e, consequentemente, o avanço dos serviços de vídeo sob de-manda, como o Netflix.

Ter um grande público nas sa-las de cinema não é mais impres-cindível como antes. O poder da Netflix hoje em dia é tão grande, que além do serviço de vídeo sob demanda, a empresa também iniciou o processo de distribuição de filmes, o primeiro deles sendo

Beasts Of No Nation, do cineasta Cary Fukunaga. O longa irá estre-ar simultaneamente nos cinemas norte-americanos e no Netflix em âmbito mundial.

O marco do início do cinema se deu com o filme A chegada do trem à estação de Ciotat, dos ir-mãos Lumiere em 1895. Foi uma novidade tão grande que muitos telespectadores saíram correndo das salas por acreditar que o va-gão entraria naquele local. Desde então os filmes vêm passado por inúmeras inovações em suas pro-duções.

Filmes como The Jazz singer, de 1927, primeiro filme falado, causaram revolução assim como Cidadão Kane, de 1941, dirigido por Orson Welles, que inovou não só nos enquadramentos ci-nematográficos, mas também na narrativa usada de maneira não cronológica.

Branca de Neve e os sete anões, de 1937, é sem dúvida nenhuma um grande marco para o cinema, suas técnicas de animação desen-volvidas para o filme influenciam até hoje,” afirma Victor Hugo.

As animações talvez sejam o gênero cinematográfico que mais ganhou com o crescimento sem limites das novas tecnolo-gias. Antigamente, não passavam de desenhos unidimensionais, com a limitação de cenários, – como não se lembrar dos dese-nhos clássicos em que se repetia

o mesmo cenário como fundo para uma cena de perseguição ou na qual um personagem está correndo, por exemplo – e com poucas possibilidades visuais a oferecer ao público. Atualmen-te, os animadores e estúdios de animação gastam milhões de dó-lares em softwares que possibili-tam criar detalhes antes inimagi-náveis para o gênero.

A grandiosidade da tecnolo-gia, aliada à criatividade humana é tão grande, que os desenhos impressionam pela proximidade com a nossa realidade. O nariz que transformou Nicole Kidman em Virginia Woolf no filme As Ho-ras, a agonia de Marion Cotillard em Ferrugem e Osso ao perder as pernas, os ângulos das câmeras que contam com uma maquete para originar o grandioso Hotel Budapeste, o cenário futurístico que compõe a trama de Ela, a notoriedade dos sons usuais nas obras de Tarantino, enfim, todo esse conjunto nunca esteve tão próximo do real. Chegamos ao ponto em que, sem o uso des-ses recursos gráficos de última geração, muitos filmes como Toy Story, Wall-E, Avatar, entre outros, não produziriam o mesmo im-

pacto no grande público.Vale ressaltar que a simulação

em computador não está presen-te apenas nas animações. Cená-rios e até mesmo uma sequência de ações podem ser produzidas inteiramente com o uso de pro-gramas especializados.

Essa alternativa tem sido cada vez mais utilizada pelos produto-res, já que reduz os custos de pro-dução, pois não é preciso deslocar uma grande equipe para gravar a ação no local, e também preser-va a integridade de atores e du-blês em sequências que possam representar algum risco. Além, é claro, de sempre ter a possibilida-de de acrescentar um elemento extra de criatividade na cena em questão, já que o cinema, não é apenas a representação da rea-lidade tal como ela é, mas busca sempre algo extra, para deleitar o público e aguçar a capacidade imaginativa dele.

Outro recurso bastante utili-zado atualmente, o 3D não é no-vidade das produções do século 21. Já nos anos 50 os americanos testaram essa técnica. Em 1952 estreou o primeiro filme 3D em cores Bwana Devil. O resultado abismou o público que nunca

Cena da animação Branca de Neve, 1937

Arte: Felipe Henrique Lima

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vira nada parecido. As imagens pareciam emergir da tela e isso impressionou até mesmo os crí-ticos de cinema. Adeus à Lingua-gem, 2014, de Jean-Luc Godard, abusa do recurso em 3D ao so-brepor imagens em níveis de pro-fundidade diferentes.

Para Luiz Felipe, 22, formado em Comunicação Social e rotei-rista na Coala Filmes, esse recurso veio para suprir as necessidades financeiras de grandes estúdios e obter mais lucro sobre a bi-lheteria dos filmes em cartaz. “O ingresso para um filme em 3D é mais caro. As salas de cinema de blockbusters e filmes com maior destaque tiveram que se adaptar rapidamente, mais e mais filmes começaram a ser produzidos com essa esquemática. A indústria se transformou e parece querer tri-lhar esse caminho de inovações.”

Futuras inovações cinema-tográficas

A evolução da sétima arte não está envolvida apenas na tecno-logia técnica que acrescenta qua-

lidade às películas, o modo de exibição vem se reinventando a cada ano.

As salas de cinema, inicialmen-te construídas em cinemas de rua ou salas de teatro, passaram a to-mar conta dos shoppings centers, locais associados à globalização que se apropriaram dos filmes e os tornaram mercadorias. Essa apropriação transformou o ato de ir ao cinema em puro entrete-nimento midiático.

“O cinema incorporará diver-sas novas linguagens por meio de influências midiáticas, cultu-

rais, sociológicas e mercadológi-cas,” comenta Luiz Felipe sobre essa percepção futura. “O estudo de novas mídias e abertura de pesquisas e experimentações em mídia comparada de gran-des centros possibilitou observar com maior clareza o impacto das mídias entre si – em sentido estri-to ou competitivo.”

As redes distribuidoras usu-fruem de recursos tecnológicos sempre buscando o crescimen-to monetário da instituição. É o exemplo da nova proposta ex-posta em Miami durante a feira ShowEast 2014, que apresentou um novo conceito de projeção cinematográfica. O projeto con-ta com três telas exibidoras, o que, segundo eles, proporcionará maior imersão ao espectador e aumento do número de bilhete-ria.

“O cinema, assim como qual-quer outro produto de massa, irá servir seu propósito mercadoló-gico e para tal necessita de tais avanços, porém eu acredito que a essência de se contar histórias lhes dá uma outra dimensão, mais transcendental e o progres-

so tecnológico conecta o cinema para quem se faz cinema.”, afirma Luiz.

Assim como os primeiros teles-pectadores não poderiam imagi-nar que um dia, frente a uma tela de cinema, seria possível assistir uma obra colorida, não podemos prever quais serão os futuros mé-todos de exibição.

A arte cinematográfica nasceu com o simples intuito de incitar emoções, mas o desempenho das mudanças técnicas e mercadoló-gicas que usaram a tecnologia

como alicerce possuem critérios benéficos e maléficos para a his-tória. Esse critério básico acres-cido de intenções humanas e confrontadoras que levam o es-pectador a real reflexão encon-tra-se quase obsoleto perante as tramas massificadas do cinema estritamente lucrativo, exercen-do influência direta no especta-dor submisso ao sistema.

A tecnologia modificou o modo de interagir em nossa so-ciedade, e o cinema, como re-sultado da produção e esforços

humanos de retratar a realida-de de outra forma, teve de se adaptar e modificar seu modo de ser feito, para atender às ne-cessidades desse público acos-tumado com a era digital.

“Eu quero que o filme co-mece quando você sair da sala”, disse certa vez Jacques Tati, grande cineasta francês. As explosões que vêm da tela de nada servem se não trans-passarem o coração do espec-tador, e assim viverem para sempre.

“As salas de

cinema de blockbusters e

filmes com maior destaque tiveram que se adaptar rapidamente - à

tecnologia 3D- [...] mais filmes começaram a ser produzidos

com essa esquemática. A indústria se transformou e parece querer trilhar esse

caminho de inovações.”

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Wall-E, 2008, de Andrew Stanton Foto: Tate-Vader © Ferrugem e Osso, 2012, de Jacques Audiard Foto: Divulgação

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Os Contadores de Histórias

No Belas Artes é assim: entra-se pela metade do preço para sair com a cabeça farta. O públi-co que paga inteira, ali, é mino-ria. Não é preciso nem entrar no saguão para notar que os jovens estudantes fazem daquele lugar o “point” dos encontros paulista-nos, como as catracas de metrô.

Logo no único degrau do hall de entrada, onde antes os ho-mens de topetes engomados e jaquetas de couro esperavam por suas donzelas vestidas com blu-sas que acentuavam os sutiãs de bojo e saias longas, encontram-se os cinéfilos do século XXI, com suas barbas compridas e camisas sociais estampadas esperando por suas donzelas de vestidinhos curtos.

No saguão espelhado que agrega a bilheteria e a rampa de acesso ao café já é possível notar a grandeza e o ar nostálgico do local. Sua decoração é toda mo-derna, mas é um lugar dedicado ao passado. A maioria das pare-des carregam pôsters vintages de Meliès a Hitchcock, e a cafete-ria (que também ocupa o andar de cima) é dedicada ao mestre do cinema italiano, Fellini. Nele, descobrimos que o público de idosos também marca presença. Eles usufruem da meia entrada

e do café, mas o que prevalece é a sensação insubstituível de ir ao cinema à moda antiga.

No meio dessa mistura de gos-tos e idades é perceptível a mu-dança que o tempo deixou, mas o cinema ainda continua o mesmo. Amante das paixões, consolador dos sofredores, e sempre, conta-dor de histórias.

Atualmente, na capital pau-lista encontram-se em funciona-mento 10 cinemas de rua, entre eles está o mais conhecido, o Cine Caixa Belas Artes, localizado na Consolação, reaberto em 2014. A programação do local é exclusiva para filmes clássicos e indepen-dentes, além dos eventos extras, como o Noitão, exibição de filmes

ocorrida nas madrugadas de sex-ta com direito a café da manhã. Mas esses locais não são os úni-cos a promoverem a exibição de clássicos, os Centros Culturais e Bibliotecas são responsáveis pela organização de eventos como as Mostras, período em que são exibidos filmes derivados de um tema previamente definido, os Ci-neclubes, encontros combinados virtualmente que contam com o apoio desses lugares físicos para o “cultuamento” das obras a par-tir de projeções e debates, e, por fim, a possibilidade de locação encontrada em algumas bibliote-cas, atividade extinta pelas novas tecnologias que tornaram as lo-cadoras obsoletas.

Como os cinemas de rua moldam a cultura de um local e transformam a vida das pessoas que se deixam levar por suas fábulas

Por se tratar muitas vezes de uma realidade paralela, o cine-ma tem a capacidade de aflorar nossa imaginação e despertar um grande interesse nas pesso-as, que acabam vendo nas obras uma maneira para escapar do mundo físico e entrar em um uni-verso aberto a diferentes inter-pretações. Sabendo desse poder, alguns diretores, principalmente aqueles do chamado “cinema in-dependente”, utilizam a sétima arte para introduzir pensamen-tos, reflexões, críticas e referên-cias à cultura de nossa sociedade. Desse modo, os cinemas de rua podem ser considerados espaços de influência direta no modo de agir de seus frequentadores.

O cinema, definindo como sétima arte, se tornou um dos principais mediadores culturais permanentes do século. Os fil-mes pioneiros, criados a partir de 1895, foram resultados de técni-cas recém-descobertas na época, apoiadas pela arte fotográfica. Apesar da massiva substituição cronológica dos filmes contem-porâneos pelos clássicos, esses filmes ainda permanecem pre-sentes na vida de muito cinéfilos e admiradores que defendem a relevância dessas películas na atualidade.

A história cinematográfica não pode ser contada sem menção aos cinemas de rua, grandes res-ponsáveis pela exibição de filmes no surgimento da sétima arte e lo-cais que preservam a tradição das obras mais antigas, os chamados “medalhões” do cinema. Em São

Por Barbara Godoy, Felipe Lima, Jéssica Parolin e Renata Aloise

Inauguração do Belas Artes reacende a procura pelos cinemas de rua

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RESERVA CULTURALAvenida Paulista, 900

CINE SALARua Fradique Coutinho, 361

Outros cinemas de rua que atraem os amantes da sétima arte em São Paulo

CINE MARABÁAvenida Ipiranga, 757

ESPAÇO ITAÚRua Augusta, 1475

Paulo, o primeiro cinema de rua foi inaugurado em 1907, com o nome Bijou-Palace. O crescimen-to desses estabelecimentos foi contínuo até o ano de 1960, onde o número de espectadores dimi-nuiu de 58 mil para 36 mil, queda atribuída ao avanço da televisão.

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cine de rua

O cinema de rua, nos seus pri-mórdios, teve impacto direto na formação de um público mais crí-tico e exigente que acabou pas-sando seu conhecimento para gerações futuras. Mesmo em nú-mero relativamente menor, esses locais ainda concentram o que há de melhor em termos de pro-duções cinematográficas e seu impacto sociocultural pode ser traduzido pela quantidade e di-versidade de temas que são abor-dados de maneira profunda pelas películas independentes.

São Paulo, desde o início, aco-lheu muito bem o cinema. O cres-cimento desses estabelecimen-tos foi notável nas décadas de 50 e 60, onde as pessoas incorpora-

prédio aconteceu com a ajuda de seu irmão Iwao, que era dono de uma serraria em Uraí, no Paraná, e o capital veio do comércio de fei-jão da família Tanaka, que ia tão bem na época que Yoshikazu era conhecido como o “Rei do Feijão”.

O investimento foi tão grande, que o resultado surpreendeu a todo e orgulhou a grande comu-nidade japonesa, que necessita-va de um incentivo para sair da melancolia advinda da derrota e destruição de seu país pós-Se-gunda Guerra. Além da grande sala de cinema de dois andares, com 1500 poltronas estofadas, no térreo, o prédio contava com um restaurante no primeiro andar; um hotel nos dois andares se-guintes, e um salão de festas no último pavimento.

O primeiro filme exibido foi Os Amores De Genji, em 1953. Todos os filmes eram legendados e toda segunda-feira entrava um novo filme no projetor. 20 mil pessoas passavam pelas salas todas as se-manas.

Algumas sessões tinham fi-las que dobravam a esquina, e grandes estrelas vieram ao bairro para promover seus filmes. Isso aconteceu várias vezes, e um dos convidados foi Koji Tsuruta, um galã na época. Nessas ocasiões, o

convidado se hospedava no hotel da família Tanaka, e as recepções aconteciam na ampla sala da casa de Susumu, irmão de Yoshikazu.

Outros cinemas abriram, an-siosos para repetir o sucesso do “Herói do Japão” (o nome vem junção de Nitto [Japão] e herói), mas nenhum conseguiu se tornar o ícone que é o Niterói, o último cinema japonês da Liberdade.

Seu grande sucesso também trouxe prosperidade para o bair-ro, já que muitos comerciantes se instalaram no bairro graças ao grande número de pessoas que circulavam por lá graças ao cine-ma.

O encerramento das ativida-des deu-se em 1968, quando o ci-nema foi desapropriado para dar origem a ponte Osaka. A unidade mudou de endereço, passando a residir na Avenida Liberdade, mas

não resistiu às mudanças do mer-cado e fechou no ano de 1988.

Os interesses do setor imobili-ário, que tende a fechar os espa-ços culturais para faturar em cima dos imóveis, foram os maiores responsáveis pela extinção dos cinemas de rua. Atualmente es-ses cinemas viraram raridades na cidade, os poucos sobreviventes nos envolvem em uma clima nos-tálgico com a estrutura cheia de influências da época, programa-ção voltada a filmes clássicos e cults, e o famoso pipoqueiro com seu carrinho, substituinte das pi-pocas amanteigadas e industria-lizadas. Os escombros de outras unidades extintas que ainda não foram transformadas em pontes, shoppings, casas, edifícios, carre-gam o histórico cultural que afe-tou a vida de cada espectador da época.

ram a ida ao cinema em sua ro-tina. Essa expansão da indústria cinematográfica e o surgimento de novos empreendimentos mo-dificou não apenas a forma como as pessoas obtinham cultura, mas também foi responsável por mu-danças importantes no espaço social da cidade.

Cine Niterói: Exemplo de como o cinema pode incorporar a cul-tura de um povo

A importância do cinema na vida das pessoas pode ser exem-plificada, no bairro da Liberdade, por uma construção que existiu até 1968, o Cine Niterói. Um mar-co na história da comunidade

japonesa em São Paulo, o cine-ma tinha sua programação intei-ramente voltada ao cinema do Japão, o que contribuiu não só para uma melhor adaptação dos imigrantes como também para difundir essa arte entre os oci-dentais.

O cinema foi fundado na Rua Galvão Bueno, localizada na Li-berdade, bairro de tradição japo-nesa em São Paulo, por Yoshikazu Tanaka, um repórter sem experi-ência alguma em administração. Ele viajou ao Japão e fez acordo com a distribuidora Toei para exi-bir as películas dessa grande em-presa, no momento em que o Ja-pão vivia o “boom” de produção cinematográfica. A construção do

Fachada do Cine Niterói

Filmes japoneses eram a principal atração do Cine Niterói

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Pu-San, 1953, de Kon Ichikawa, filme japonês exibido durante o período áureo do Cine Niterói Cine Joia, um dos cinemas orientais que abriram após o grande sucesso do Cine Niterói Foto: DivulgaçãoFoto: Divulgação

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estreias e análises

Sem “Harry Potter”, A Mulher de Preto retorna amparada em uma boa história e com ambientação impecável da Segunda GuerraPor Felipe Henrique Lima

Por Barbara Godoy

A Mulher de Preto 2 – Anjo da Morte (2014)Nota: 3/5 Título Original: The Woman in Black 2 – Angel of DeathDiretor: Tom HarperProduzido nos Estados Unidos

A sequência de A Mulher de Preto provocou algumas dúvidas e gerou certa expectativa antes mesmo de seu lançamento. O novo filme, dessa vez sob direção de Tom Harper (o primeiro havia sido dirigido pelo britânico James Watkins), teve de superar a saída de Daniel Radcliffe do elenco, protagonista da primeira película e mundialmente conhecido por interpretar Harry Potter.

Assim como seu anterior, A Mulher de Preto 2, apresenta o fan-tasma de uma mulher rancorosa que atrai crianças indefesas para uma casa assombrada no meio de um pântano para lhes dar um trágico fim.

A história se passa no meio da Segunda Guerra. A professo-ra Eve (Phoebe Fox) é convocada pela diretora de uma escola, Jean Hogg (Helen McCrory) a se retirar de Londres que constantemente era alvo de bombardeios, para se refugiar em outra cidade no inte-rior da Inglaterra com um grupo de crianças, entre eles o pequeno

Edward (Oaklee Pendergast), que recentemente perdeu os pais e, por causa do trauma, não conse-gue pronunciar uma palavra se-quer.

Eve cria um laço emocional com Edward em meio a seus pró-prios traumas pessoais. A moça também conhece Harry Burns-tow (Jeremy Irvine), um oficial da aeronáutica que irá ajudá-la a re-solver o mistério que ronda a casa no pântano.

O filme peca justamente pela semelhança com seu predeces-sor, sendo considerado uma re-criação da obra anterior. O diretor utiliza os típicos clichês do gênero como a casa abandonada, o chão que range, a cadeira de balanço que se move sozinha, um quarto cheio de brinquedos assustado-res, e a neblina horripilante.

O lado positivo fica com o foco que é dado ao terror psicológi-co, que consegue superar todos

os elementos rotineiros das pe-lículas de terror e faz com que A Mulher de Preto 2 se diferencie de outras obras atuais do gênero. A história, apesar de previsível, é muito bem contada e não cria nenhum nó na cabeça dos espec-tadores.

Há de se elogiar a preocupa-ção com a ambientação de épo-ca. As cenas de Londres devas-tada pela guerra são dignas de tal elogio, com atenção especial para a tomada aérea da capital inglesa. O ambiente do pântano também foi pensado cuidadosa-mente para acrescentar suspense à história.e o que vemos no longa é mais do mesmo, por sua vez, o mesmo vale a pena ser visto para se ter uma ideia melhor a respei-to de seu antecessor e é um bom divertimento para quem curte o gênero e quer fugir do típico terror enlatado e ensanguentado das produções atuais.

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Frances Ha, a musa de uma geração inquieta

Frances Ha (2012)Nota: 4/5

Título Original: Frances HaDiretor: Noah BaumbachProduzido no Estados Unidos e Brasil

A vida deveria vir com um ma-nual que pudesse auxiliar no des-conforto das mudanças acarreta-das pelo crescimento. Mas, como essa ideia é utópica, está entre as missões do ser humano aprender a lidar com as imposições e fases que vêm junto com a idade, o que não é nada fácil.

Frances Handley (Greta Ge-rwig), a personagem principal dessa história, divide o aparta-mento com sua amiga Sophie (Mickey Sumner), até que a mes-ma resolve ir morar em um lugar melhor localizado e deixa a ami-ga para trás. Assim tem início a odisseia de Frances em relação ao aceitamento da fase adulta. Com problemas financeiros, crises exis-tenciais e à espera de uma chance de integrar o grupo de bailarinos que encenará o espetáculo de na-tal da companhia que faz parte, nossa protagonista não perde o bom humor em relação à vida, e carrega essas situações factuais e cotidianas em cenas que se apro-ximam do espectador, através de questões e diálogos conflituosos,

ou nas entrelinhas da leveza de uma dança espontânea no meio da rua, ao som de Modern Love (referência notória ao filme fran-cês Mavauis Sang). Além de Greta e Mickey Symmer, o elenco fica por conta de Adam Driver, Micha-el Zegen, Charlotte d’Amboise, entre outros.

Em determinada parte do fil-me, um amigo de Frances a defi-ne como “undateable”, uma pes-soa que apresenta dificuldades em relacionamentos amorosos, mas as adversidades enfrentadas por ela vão além do amor. É em qualquer tipo de relacionamento que Frances encontra dificuldade, talvez por isso essa obra seja tão indefinível e adorável. É prazero-so o caráter de identificação que o filme traz ao espectador que se vê, ou já se viu, em situações pa-recidas durante a juventude.

A atmosfera em preto e bran-co que Noah Baumbach opta em usar concilia com o jeito em que Frances olha para o mundo. O recurso de cores clássicas nos remete a simplicidade dos fil-mes antigos que não precisavam de enfeites para se tornar boas obras. As referências também estão presentes na trilha sonora, composta por Bach, Mozart, e Ge-orges Delerue.

Greta Gerwig incorpora nessa obra uma personagem carismáti-ca e representativa de toda uma geração que está em busca de ra-zões definidoras de personalida-de e de significados sobre as rela-ções com o outro, nos mostrando que, assim como ela, ainda não somos pessoas de verdade, mas podemos obter êxito em achar a felicidade nas brechas efêmeras da existência.

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estreias e análises

Confira as últimas estreias

Por Renata Aloise

Quatro padres vivem numa casa isolada à beira-mar. Cada um tem um pecado a ser expiado, e eles estão sob a direção de um guardião. Quan-do um quinto padre chega, ele desperta os pecados enterrados pelos quatro anteriores. Quinto filme do chileno Pablo Larraín, mesmo diretor de No, ganhou o Prêmio do Júri no Festival Internacional de Cinema de Berlim e foi escolhido para representar o Chile no Oscar.

O Clube

Kate Mercer está planejando a festa de comemoração dos 45 anos de casa-da. Porém, cinco dias antes do evento, o marido recebe uma carta: o corpo de seu primeiro amor foi encontrado congelado no meio dos Alpes Suíços. A estrutura emocional dele é seriamente abalada e Kate já não sabe se vai ter o que comemorar durante a festa. Charlotte Rampling e Tom Courte-nay ganharam os prêmios de Melhor Atriz e Melhor Ator no Festival de Berlim por esse delicado drama inglês do diretor Andrew Haigh.

45 anos

Tracy é uma caloura de faculdade que leva uma vida solitária em Nova York. Após muita insistência da mãe, ela resolve ligar para Brooke, filha de seu futuro padrasto, que também mora em Nova York. Tracy fica fasci-nada com a energia de Brooke e resolve usá-la como inspiração em um novo conto. Dirigido por Noah Baumbach, que co-escreveu o roteiro com a atriz Greta Gerwig e produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira.

Mistress America

Coisas estranhas acontecem em Bad City. Uma cidade iraniana fantasma, lar de prostitutas, viciados, cafetões e outras almas sórdidas. Um reduto de de-pravação e falta de esperança, onde uma vampira solitária persegue os habi-tantes mais repugnantes. Mas quando um garoto conhece uma garota, uma história de amor incomum começa a florescer… vermelha como o sangue. Filme de estreia da inglesa de descendência iraniana Ana Lily Amirpour.

Garota sombria caminha pela noite

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