Coerência, Texto e Linguística do Texto 02

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COERNCIA, TEXTO E LINGUSTICA DO TEXTO

Coerncia e Texto

Quando relacionamos coerncia e texto alguns pontos se mostram relevantes e quase sempre se tornam objeto de questionamento pelo interessado no fenmeno da coerncia

Tais pontos so:

1) Qual a contribuio da coerncia para a constituio e existncia de um texto? 2) H sequncias lingusticas que no constituem um texto, isto , que so incoerentes? Ou seja, existe o no-texto? 3) A coerncia uma caracterstica do texto? 4) H diferentes tipos de coerncia para diferentes tipos de textos?

Primeira questo: Qual a contribuioda coerncia para a constituio e existncia de um texto?

a coerncia que faz com que uma sequncia lingustica qualquer seja vista como um texto, porque a coerncia, atravs de vrios fatores, que permite estabelecer relaes (sintticogramaticais, semnticas e pragmticas) entre os elementos da sequncia (morfemas, palavras, expresses, frases, pargrafos, captulos, etc.), permitindo constru-la e perceb-la, na recepo, como constituindo uma unidade significativa global. A coerncia d origem textualidade.

Recapitulando COESO

A coeso apenas um dos fatores de coerncia, que contribui para a constituio do texto enquanto tal, representando fatos da face lingustica da coerncia, mas no sendo nem necessria, nem suficiente para converter uma sequncia lingustica em texto. Pode ocorrer seqncias sem coeso, mas com coerncia que lhes d textualidade e sequncias com coeso mas sem coerncia. Coeso no d textualidade, quem o faz a coerncia.

Exemplos de seqncias sem coesomas com coerncia que lhe d textualidade

(4) O Show

O cartaz O desejoO pai O dinheiro O ingresso O dia A preparao A ida

O estdio A multido A expectativa A msica A vibrao A participao O fim A volta O vazio

pg. 10/11

Exemplos de seqncias sem coesomas com coerncia que lhe d textualidade

(7) Corte Maria Amlia Mello O dia segue normal. Arruma-se a casa. Limpa-se em volta. Cumprimenta-se os vizinhos. Almoa-se ao meio dia. Ouve-se rdio tarde. L pelas 5 horas, inicia-se o sempre.(Miniconto publicado no Suplemento Literrio do Minas Gerais n 686, ano XIV, 24/11/79, p. 9).pg.14

Exemplos de seqncias sem coesomas com coerncia que lhe d textualidade

(13) Lista de convidados para festa do meu aniversrio

- Joo da Silva - Jos Gregrio e esposa - Alberto DOnofrio - Tereza Mardin e noivo - Ceclia Machado . . . . - Tios, tias e primos - Meus irmos. pg. 22

Exemplos de seqncias sem coesomas com coerncia que lhe d textualidade

(14) Triste poema para uma mulher criana. Ugo Giorgetti, uma festa de humor bandido. Premiao. Flores, nica unanimidade. O arraso de Magic Slim. Tite de Lemos. Diana Pequeno em nova fase canta autores inditos. Matogrosso, a ecopera de Philip Glass. Duplas feitas e desfeitas. Retratos de Cher quando jovem, Ney Matogrosso, a aguda inteligncia trabalha ao vivo. Quando o bem sempre triunfava sobre o mal. Romances do tempo em que se perdia a cabea. Autor que inspirou Machado. Reflexos de So Paulo em Amsterd. Estas so algumas das matrias do Caderno 2 de O Estado de So Paulo, hoje, 20/06/89.pg. 22/23

Exemplos de seqncias sem coesomas com coerncia que lhe d textualidade

(15) A Eterna Impreciso da Linguagem Carlos Drumond de Andrade

- Que po! Doce? de mel? de acar? de l? de l de mico? de trigo? de milho? de mistura? de rapa? de saruga? de soborralho? do cu? dos anjos? brasileiro? francs? italiano? alemo? do chile? de forma? de bugio? de porco? de galinha? de pssaros? de minuto? zimo? branco? dormido? duro? sabido? saloio? seco? segundo? nosso de dia? ganho com o suor do rosto? que o diabo amassou? - Uma uva ! Branca? preta? tinta? moscatel? isabel? ma? japonesa? ursina? mijona gorda? brava? bastarda? rara? de galo? de co? de co menor? do monte? da serra? do mato? de mato grosso? de facho? de gentio? de joo pais? do nascimento? do inverno? do inferno? de praia? de rei? de ob? da promisso? da promisso roxa? verde da fbula de La Fontaine? espim? do diabo? [...] pg. 23

Exemplos de seqncias sem coesomas com coerncia que lhe d textualidade

(16) A: O telefone! B: Estou no banho! A: Certo.pg. 25

Exemplo de seqncia com coeso massem coerncia

(8) Joo vai padaria. A padaria feita de tijolos. Os tijolos so carssimos. Tambm os msseis so carssimos. Os msseis so lanados no espao. Segundo a teoria da Relatividade o espao curvo. A geometria rimaniana d conta desse fenmeno.(Marcuschi, 1983: 31)pg. 15

Exemplo de seqncia com coeso massem coerncia(20) A Vaguido Especfica As mulheres tm uma maneira de falar que eu chamo de vago-especfica. (Richard Gehman) - Maria, ponha isso l fora em qualquer parte. - Junto com as outras? - No ponha junto com as outras, no. Seno pode vir algum e querer fazer qualquer coisa com elas. Ponha no lugar do outro dia. - Sim senhora. Olha, o homem est a. - Aquele de quando choveu? - No, o que a senhora foi l e falou com ele no domingo. - Que que voc disse a ele? - Eu disse para ele continuar. [...]

(Fernandes, Millr. Trinta anos de mim mesmo, Crculo do Livro, p.77)

pg. 36/37

Segunda questo: H seqncias lingsticasque no constituem um texto, isto , que so incoerentes? Ou seja, existe o no-texto?

Beaugrande e Dressler (1981) - H sequncias lingusticas incoerentes, que seriam aquelas em que o receptor no consegue descobrir qualquer continuidade de sentido, seja pela discrepncia entre os conhecimentos ativados, seja pela inadequao entre esses conhecimentos e o seu universo cognitivo. Marcuschi (1983) juntamente com Fvero e Koch (1985) - Falam na mesma existncia de textos incoerentes.

Charolles

Charolles (1987) - Afirma que as seqncias de frases no so coerentes ou incoerentes em si. Pois como no h regras de boa formao de textos (como as h para as frases) que se apliquem a todas as circunstncias e cuja violao, como na sintaxe das frases, fizesse unanimidade, isto , levasse todos ao mesmo veredicto: um texto ou no um texto, tudo vai depender muito dos usurios do texto (o produtor e principalmente o receptor) e da situao. Para Charolles no h o texto incoerente em si, mas admite que pode ocorrer o tipo de incoerncia local e que pode resultar do uso inadequado de elementos lingsticos, violando seu valor e funo.

Exemplos desta violao

(1) Maria tinha lavado a roupa quando chegamos, mas ainda estava lavando a roupa. (2) Joo no foi aula, entretanto estava doente. (3) A galinha estava grvida.pg. 9

Exemplos desta violao

(26) Roberto tem um belo veculo. um cavalo rabe puro sangue. (Cavalo no hipnimo de veculo e a seqncia aparece como incoerente.)pg. 43

(28) b) Joo foi festa, todavia ela no fora

convidada. d) Joo foi festa, todavia porque no fora convidado.pg. 44

Charolles

Charolles comenta o fato de muitas vezes se considerar como incoerentes sequncias nas quais no h nenhuma marca de relao entre os enunciados e nas quais a relao entre os contedos dos enunciados no aparente.

Exemplo: (30) A: Voc me empresta seu livro do Guimares Rosa?B: Hoje eu comi um chocolate que uma delcia!pg. 46

(32) b) Jlia est com dor de dente. / Dois e dois so quatro.pg. 55

Explicao : EXEMPLO 30 A/B

Neste exemplo, a fala de B, sem qualquer relao com a fala de A, pode ser vista pragmaticamente como uma recusa por qualquer razo, excluda naturalmente a hiptese de que B, no tendo ouvido a pergunta, disse algo que deseja contar a A.

Explicao : EXEMPLO 32

Neste exemplo podemos estabelecer entre eles uma relao plausvel. Imagine a seguinte situao: o produtor de (32b) dentista e irmo de Jlia, que uma menina. O produtor de (32b) - um dentista conhece bem a situao dos dentes de Jlia (eles esto com vrias cries) num dado momento. Certo domingo, Jlia est chupando muito sorvete e picol. O irmo dentista avisa que ela vai ter dor de dentes, mas ningum se preocupa em fazer a menina parar. tarde, a menina comea a chorar e reclamar que est com dor de dentes, ento o irmo diz (32b), significando que Jlia estar com dor de dentes era algo to certo e esperado quanto dois mais dois ser quatro.

Bernrdez

Bernrdez (1982) - Ao falar do processo de criao de um texto coerente, prope que ele se d em trs fases e que, em cada uma delas, podem ocorrer falas causadoras de incoerncia em determinados casos.

A)

Primeira fase

O produtor do texto tem uma inteno comunicativa. Se ele tiver uma inteno comunicativa impossvel para a situao, o texto ser incoerente; mas esse tipo de incoerncia dificilmente acontecer. Para Bernrdez, quase s pessoas com problemas psquicos ou neurolgicos incorreriam neste tipo de falha;

B)

Segunda fase

O produtor do texto desenvolve um plano global que lhe possibilite conseguir que seu texto cumpra sua inteno comunicativa, ou seja, tenha xito face a todos os fatores envolvidos. Se o produtor projetar mal o seu plano, ocorre falha e incoerncia. Seja o caso em que se pede a algum que compare dois fatos, fenmenos, livros, pessoas, etc. O produtor do texto pode caracterizar s um dos elementos em comparao ou caracterizar ambos, mas no estabelecer o paralelo entre as caractersticas dos dois. Neste caso, o texto pode at estar coeso, compreensvel, mas seria incoerente com a inteno comunicativa que devia realizar;

C)

Terceira fase

O produtor do texto realiza as operaes necessrias para expressar verbalmente o plano global, de maneira que, atravs das estruturas superficiais, o recebedor seja capaz de reconstruir ou identificar a inteno comunicativa. As falhas dessa fase afetam diretamente a formulao lingstica, sendo um texto sem coeso ou com problemas de coeso e/ou gramaticalmente incorreto (aqui no no sentido normativo).

Pontos relevantes para a resoluoda segunda questo

Mesmo os que admitem a existncia de textos incoerentes ou de determinadas incoerncias locais no colocam a incoerncia apenas na sequncia lingustica, mas fazem-na depender dos usurios e da situao (cf. o que Beaugrande e Dressler disseram ser um texto incoerente: aquele em que o receptor no consegue descobrir qualquer continuidade de sentido). Mesmo fatores normalmente definidores da coerncia podem ser violados sem, necessariamente, criar coerncia, dependendo da situao, dos usurios (produtor, receptor) do texto, da inteno comunicativa, de normas sociais, etc.

Pontos relevantes para a resoluoda segunda questo

A descontinuidade at uma condio para a existncia do texto como um texto de humor. Como est explicitado no exemplo (18). Mesmo o texto sendo o mais absurdo, o receptor (interpretador) far todo o possvel para estabelecer um sentido para a seqncia que recebe, por mais incoerente, sem sentido que ela possa parecer: ele ir construir as relaes que no figuram explicitamente no texto, usando para isso todos os recursos sua disposio. Buscar um contexto, uma situao em que a seqncia dada como incoerente faa sentido e se torne coerente, constituindo um texto.

Exemplo 18(18) O aluno se aproxima do professor para lhe pedir alguns esclarecimentos: - Professor, gostaria de lhe fazer algumas perguntas. - Pois no. - Eu queria saber as causas econmicas da Revoluo Francesa / e tambm as causas sociais, polticas, filosficas, psicolgicas, morais e religiosas. (o trecho aps a barra falado de enfiada, quase sem tomar flego). -E s isso que voc quer saber? ( professor coloca nfase em s como a fazer uma leve ironia em relao pergunta do aluno). - Tambm gostaria de saber porque as garotas no me do bola. (Com entonao natural, como se isto no fosse algo totalmente dspar do que perguntara antes). (RISOS) pg. 32/33

Texto incoerente

(33) Era meia-noite. O sol brilhava. Pssaros cantavam pulando de galho em galho. O homem cedo, sentado mesa de roupo, esperava que lhe servissem o desjejum. Enquanto esperava, passava a mo na faca sobre a mesa como se a acariciasse tendo idias, enquanto olhava fixamente a esposa sentada sua frente. Esta, que lia o jornal, absorta em seus pensamentos, de repente comeou a chorar, pois o telegrama lhe trazia a notcia de que o irmo se enforcara num p de alface. O cego, pelado com a mo no bolso, buscava consol-la e calado dizia: a Terra se queixa de que ele ficou impassvel, porque no o irmo dele que vai receber as honrarias. Ele se agasta, olha-a com desdm, agarra a faca, passa a manteiga na torrada e lhe oferece, num gesto de amor.(Este texto reproduz aproximadamente verso ouvida junto a crianas de Araguari - MG)pg. 59

Anlise: Texto incoerente 33

O texto ratifica a conceituao da coerncia como um princpio de interpretabilidade e nos leva posio de que no existe o texto incoerente em si, mas que o texto pode ser incoerente em/para determinada situao comunicativa. O texto ser incoerente se o seu produtor no souber adequ-lo situao, levando em conta inteno comunicativa, objetivos, destinatrio, regras socioculturais, outros elementos da situao, uso dos recursos lingusticos, etc. Caso contrrio, ser coerente. O papel do receptor fundamental, ele deve estar bem estruturado para poder entender e/ou compreender o texto que est lendo. Nada adianta o texto ser bem elaborado se o receptor desconhece o assunto, no tem domnio do lxico e/ou estruturas. Sendo assim ele far o comentrio: No consegui entender este texto.

Possibilidade terica

O mau uso de elementos lingusticos e estruturais cria incoerncias no nvel local. Se o produtor de um texto violar em alto grau o uso desses elementos, o receptor no conseguir estabelecer o seu sentido e teramos um texto incoerente em si, por termos um mau uso extremo do cdigo lingustico. Excetuando casos patolgicos em que no teramos um situao normal, colocamos esta possibilidade como apenas terica por duas razes: a) como produtor e recebedor so cooperativos, um produtor s faria um texto assim com um propsito, o que suficiente para torn-lo coerente; b) devido competncia lingstica dos usurios da lngua improvvel o aparecimento real de um texto com tal nvel de violao no uso de elementos lingsticos.

Terceira questo: A coerncia uma caracterstica do texto?

O produtor do texto, em funo de sua inteno comunicativa, levando em conta todos os fatores da situao e usando seu conhecimento lingstico, de mundo, etc., constri o texto, cuja superfcie lingustica constituda de pistas que permitem ao receptor calcular o (um) sentido do texto, estabelecendo sua coerncia, atravs da considerao dos mesmos fatores que o produtor e usando os mesmos recursos. Nesta atividade (cf. Garrafa, 1987) est envolvida a manipulao de elementos lingusticos por operaes argumentativas (ligadas intencionalidade) e processos cognitivos realizados entre os usurios do texto, de modo que podemos afirmar que a coerncia no nem caracterstica do texto, nem dos usurios do mesmo, mas est no processo que coloca texto e usurios em relao numa situao comunicativa.

Quarta questo: H diferentes tipos decoerncia para diferentes tipos de textos?

Coerncia: um princpio de interpretabilidade, como a possibilidade de estabelecer um sentido para uma seqncia lingstica. Diferentes tipos de texto podem diferir quanto ao nmero e/ou quanto ao tipo de pistas da superfcie lingstica que apresentam ao receptor do texto para que ele possa estabelecer o sentido desse texto.

Quarta questo: H diferentes tipos decoerncia para diferentes tipos de textos?

Na Lingustica Textual, diferentes tipos de texto tm diferentes esquemas estruturais, que recebem o nome de superestruturas. As superestruturas ou esquemas textuais conjunto de conhecimentos sobre os diversos tipos de textos, que vo sendo adquiridos proporo que temos contato com esses tipos e fazemos comparaes entre eles.

Quarta questo: H diferentes tipos decoerncia para diferentes tipos de textos?

Textos: narrativos, descritivos e dissertativos. Subtipos: entre os narrativos, romances, contos, crnicas, fbulas, epopias. Textos poticos so diferentes dos textos em prosa.

Quarta questo: H diferentes tipos decoerncia para diferentes tipos de textos?

Textos lricos so diferentes de textos de fico e dramticos. Nos textos poticos do gnero lrico, os mecanismos que fazem a coeso sequencial por progresso atravs de encadeamentos (sobretudo por conexo), so bem menos usados que os mecanismos por progresso atravs de manuteno temtica e os de sequenciaro por recorrncia de termos, estruturas e recursos fonolgicos (rima, ritmo, aliterao, eco, etc.). Ainda no mesmo tipo de texto parece que, entre os mecanismos de coeso referencial, os por reiterao so mais freqentes que os de

substituio.

Exemplo 4

O Show O estdio A multido A expectativa A msica A vibrao A participao O fim A volta O vaziopg. 10/11

O cartaz O desejo O pai O dinheiro O ingresso O dia A preparao A ida

Exemplo 5

O Show Sexta-feira Raul viu um cartaz anunciando um show de Milton Nascimento para a prxima tera-feira, dia 04/04/89, s 21h, no ginsio do Uberlndia Tnis Clube na Getlio Vargas. Por ser f do cantor, ficou com muita vontade de assistir apresentao. Chegando em casa, falou com o pai que lhe deu dinheiro para comprar o ingresso. Na tera-feira, dia do show, Raul preparou-se, escolhendo uma roupa com que ficasse mais vontade durante o evento. Foi para o UTC com um grupo de amigos. L havia uma multido em grande expectativa aguardando o incio do espetculo, que comeou com meia hora de atraso. Mas valeu a pena: a msica era da melhor qualidade, fazendo todos vibrarem e participarem do show. Aps o final, Raul voltou para casa com um vazio no peito pela ausncia de todo aquele som, de toda aquela alegria contagiante.pg. 12

Exemplo 7

Corte Maria Amlia Mello O dia segue normal. Arruma-se a casa. Limpa-se em volta. Cumprimenta-se os vizinhos. Almoa-se ao meio dia. Ouve-se rdio tarde. L pelas 5 horas, inicia-se o sempre.(Miniconto publicado no Suplemento Literrio do Minas Gerais n 686, ano XIV, 24/11/79, p. 9).pg.14

Exemplo 34Infncia Carlos Drummond de Andrade Meu pai montava a cavalo, ia para o campo. Minha me ficava sentada cosendo. Meu irmo pequeno dormia. Eu sozinho menino entre mangueiras lia a histria de Robinson Cruso, Comprida histria que no acaba mais.

Minha me ficava sentada cosendo, olhando para mim? - Psiu... no acorde o menino, pra o bero onde pousou um mosquito. E dava um suspiro... que fundo!L longe meu pai campeava no mato sem fim da fazenda. E eu no sabia que minha histria era mais bonita que a de Robinson Cruso.(Do livro Alguma Poesia) pg. 63

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu a ninar nos longes da senzala e nunca se esqueceu chama para o caf. Caf preto que nem a preta velha caf gostoso, caf bom.

Exemplo 35

Trem de FerroManuel Bandeira O... Foge, bicho Foge, povo Passa ponte Passa poste Passa pasto Passa boi Passa boiada Passa galho De ingazeira Debruada No riacho Que vontade De cantar! [...]pg. 64/65

Caf com po Caf com po Caf com po

Virge Maria qie foi isso maquinista?Agora sim Caf com po Agora sim Voa, fumaa Corre, cerca Ai seu foguista Bota fogo Na fornalha Que eu preciso Muita fora Muita fora

Exemplo 36

Pssaro em Vertical penas fofas leves plumas mole espuma e um risco surdo n o r t e s u l

Librio Neves Cantava o pssaro e voava cantava para l voava para c voava o pssaro e cantava de repente um tiro seco

(Do livro Pedra Solido)

pg. 66

Exemplo 37

Circuito Fechado

Ricardo Ramos1 Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. gua. Escova, creme dental, gua, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, gua, cortina, sabonete, gua fria, gua quente, toalha. Creme para cabelo, pente. Cueca, camisa, abotoaduras, cala, meias, sapatos, gravata, palet. Carteira, nqueis, documentos, caneta, chaves, leno, relgio, mao de cigarros, caixa de fsforo. Jornal. Mesa, cadeiras, xcara e pires, prato, bule, talheres, guardanapo. Quadros. Pasta, carro. Cigarro, fsforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papis, telefone, agenda, copo com lpis, canetas, bloco de notas, esptula, pastas, caixas de entrada, de sada, vaso com plantas, quadros, papis, cigarro, fsforo. Bandeja, xcara pequena. Cigarro e fsforo. Papis, telefone, relatrios, cartas, notas, vales, cheques. (...)

Continuao EXEMPLO 372 Dentes, cabelos, um pouco do ouvido esquerdo e da viso. A memria intermediria, no a de muito longe nem a de ontem. Parentes, amigos, por morte, distncia, desvio. Livros, de emprstimo, esquecimento e mudana. Mulheres tambm, como os seus temas. Mveis, imveis, roupas, terrenos, relgios, paisagens, os bens da infncia, do caminho, do entendimento. Flores e frutos, a cada ano, chegando e se despedindo, quem sabe no viro mais, como o jasmim no muro, as roms encarnadas, os ps de pau. Luzes, do candeeiro ao vaga-lume. Vrias vezes, conversando, contando, chamando e seus ecos, sua msica, seu registro. (...)

Continuao EXEMPLO 373Muito prazer. Por favor, quer ver o meu saldo? Acho que sim. Que bom telefonar, foi timo, agora mesmo estava pensando em voc. Puro, com gelo. Passe mais tarde, ainda no fiz, no est pronto. Amanh eu ligo, e digo alguma coisa. Guarde o troco. Penso que sim. Este ms, no, fica para o outro. Desculpe, no me lembrei. Veja logo a conta, sim? pena mas hoje no posso, tenho um jantar. Vinte litros, da comum. Acho que no. Nas prximas frias, vou at l, de carro. Gosto mais assim, com azul. Bem, obrigado, e voc? Feitas as contas, estava errado. Creio que no. J, pode levar. Ontem, aquele calor, hoje chovendo. (...)

Continuao EXEMPLO 374

Ter, haver. Uma sombra no cho, um seguro que se desvalorizou, uma gaiola de passarinhos. Uma cicatriz de operao na barriga e mais cinco invisveis, que doem quando chove. Uma lmpada de cabeceira, um cachorro vermelho, uma colcha e os seus retalhos. Um envelope com fotografias, no aquele lbum. Um canto de sala e o livro marcado. Um talento para as coisas avulsas, que no duram nem rendem. Uma janela sobre o quintal, depois a rua e os telhados, tudo sem horizonte. Um silncio por dentro, que olha e lembra, quando se engarrafam o trnsito, os dias, as pessoas. Uma curva de estrada e uma rvore, um filho, uma filha, um choro no ouvido, um recorte que permanece, e todavia muda. Um armrio com roupa e sapatos, que somente vestem e calam, e nada mais. Uma dor de dente, uma gargalhada, felizmente breves. (...) pgs. 73/74/75Fonte: Os Melhores Contos Brasileiros de 1973. Porto Alegre: Editora Globo, 1974, p. 169 - 175

Pesquisa emprica

Necessidade de pesquisa emprica que permita estabelecer as regularidades bsicas da relao entre gneros e tipos de pistas da superfcie lingustica e sua frequncia em cada um deles.

Coerncia e Lingstica do Texto

O texto como unidade de estudo: Gramtica do texto (semelhante gramtica de frases proposta por Chomsky). Teoria do Texto ou Lingustica do Texto princpios e/ou modelos cujo objetivo no predizer a boa ou m formao dos textos, mas permitir representar os processos e mecanismos de tratamento dos dados textuais que os usurios pem em ao quando buscam interpretar uma sequncia lingustica, estabelecendo o seu sentido e, portanto, calculando sua coerncia.

Coerncia e Lingstica do TextoO estudo da produo, compreenso e coerncia textuais tornou-se um campo inter e pluridisciplinar, recebendo contribuies da: Psicologia, Sociologia, Filosofia, Teoria da Computao e Informtica, Lingustica em geral e de alguns ramos em particular Socio-lingustica, Psicolingustica.

Coerncia e Lingstica do Texto

O que cabe Lingustica fazer no estudo da produo, compreenso e coerncia textuais? Segundo Charolles (1987), cabe aos linguistas delimitar, na constituio e composio textuais, qual a parte e a natureza das determinaes que resultam dos diferentes meios que existem nas diferentes lnguas, para exprimir a continuidade ou a sequncia do discurso. O linguista deve fazer a anlise das marcas de relao entre as unidades de composio textual que a lngua usa para resolver, o melhor possvel, os problemas de interpretao que seu uso possa gerar. Isto para alm da generalidade dos processos psico e sociocognitivos que intervm na interpretao (da coerncia) do discurso.