Coleção Energia Vol 3
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A evolução da aplicação da energia elétrica e suas consequências para a sociedade
Cole
ção
Ener
gia
- Vo
lum
e 3
Volume 3
ApoioRealização
Promoção
C
M
Y
CM
MY
CY
CMY
K
CAPA FINAL.pdf 1 16/11/09 13:12
2
Caro leitor,
Dando continuidade à nossa Coleção Energia, o terceiro número da série traz um espectro amplo da evolução das
aplicações da eletricidade ao cotidiano social.
Com um foco especial para a trama histórica da sociedade brasileira, temos uma matéria que nos explica como
um esforço de planejamento governamental foi essencial para que o Estado de São Paulo pudesse aproveitar
seu grande potencial hídrico. Os rios paulistas contribuíram decisivamente para a expansão territorial brasileira
verificada na época colonial, servindo de suporte para o avanço dos bandeirantes. Foi a partir da década de 1950
que começou a se tornar realidade a promessa de transformar o potencial das águas (que no começo do século XX
era chamado de “hulha branca”) em efetiva geração de energia. O crescimento industrial e urbano vertiginoso que
se verificava necessitava de uma correspondente grande infraestrutura de produção de eletricidade. Os apagões,
que então eram comuns, apontavam para uma mudança de modelo no setor. Surgiram assim as empresas
que na década de 1960 foram unidas e consolidadas com a criação da Cesp. Nas demais regiões brasileiras,
empreendimentos similares se impuseram, como Furnas, Cemig, Chesf e muitas outras, formando a espinha dorsal
de um sistema que passou a ser interligado e muito mais eficiente.
O empreendimento mais sensacional que essa era nos legou é sem dúvida Itaipu. Seu gigantismo, seu papel
sensível em termos geopolíticos continentais, assim como o atestado de maioridade que representou para a
tecnologia de construção de barragens, com o pioneiro uso do cálculo numérico por elementos finitos são dados
que o leitor poderá conhecer nas próximas páginas. O impacto do apagão na noite de 10 de novembro de 2009,
que deixou boa parte dos estados mais populosos no escuro por várias horas, é um testemunho da importância
da geração de Itaipu e de como a transmissão dessa energia desempenha um papel vital no sistema elétrico
brasileiro.
O uso pacífico da energia nuclear foi o mote para a construção de usinas térmicas, que se tornaram essenciais
dentro do panorama internacional. O avanço das instalações nucleares trouxe requisitos especiais de segurança,
que nem sempre foram obedecidos, deixando um flanco aberto às críticas políticas e técnicas. Felizmente essa
etapa vem sendo vencida e hoje a energia nuclear volta a ser cogitada para um papel relevante na matriz
energética. O Brasil, que se empenhou tanto internacionalmente para garantir o acesso às tecnologias nucleares
a todos os países, e não apenas para uma minoria, logrou um tento notável ao dominar recentemente o ciclo de
enriquecimento do combustível nuclear – e um pouco dessa história é relatada neste volume.
Um efeito espetacular do progresso nas aplicações da eletricidade foi a entrada em campo da eletrônica,
especialmente a partir do início do século XX. Dispositivos como a válvula foram sucedidos pelo transistor e a
eletrônica de semicondutores possibilitou uma incrível e crescente miniaturização dos componentes. Além de usos
industriais, a eletrônica de consumo criou uma verdadeira revolução cultural em todas as camadas populares,
desde o popular radinho de pilha até o cada vez mais presente – e discute-se a sua imprescindibilidade e a
dependência assim criada – computador.
Finalmente, ainda no plano do consumidor, contamos uma história pouco conhecida: o sucesso inicial do carro
elétrico, até este ser vencido pelo motor a combustão interna. A pressão ambientalista ressuscitou o assunto, que
vem merecendo cada vez mais a atenção de governos, fabricantes e usuários.
Desejamos que esses temas ensejem uma leitura proveitosa e sirvam para suscitar novas reflexões sobre o mundo
energético em que vivemos.
Gildo Magalhães
Professor livre-docente em História da Ciência na Universidade de São Paulo
carta ao leitor por Gildo Magalhães
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Desenvolvimento e tecnologiaOs bastidores da construção da gigantesca Itaipu e as implicações sociais e
técnicas para três países. Seu projeto foi a forma encontrada para resistir ao
choque do petróleo e suprir as demandas energéticas da época.
Era da eletricidadeA história da iluminação artificial contada desde a descoberta do fogo e
a sua utilização para iluminar os caminhos do homem, passando pelas
luminárias a gás, a querosene, chegando à luz alimentada pela eletricidade.
Cidade em movimentoEm meados do século XIX, os carros elétricos eram dominantes em
detrimento dos veículos a combustão, empregados em competições e objetos
de pesquisas acadêmicas. O cenário mudou com o tempo, especialmente com
o desenvolvimento da indústria e alguns interesses privados.
EvoluçãoO desenvolvimento da eletrônica teve papel fundamental nas aplicações
da eletricidade. A substituição da válvula pelo transistor e a eletrônica de
semicondutores deram inicio a uma verdadeira revolução tecnológica, cada
vez mais presente no cotidiano das pessoas.
NuclearUm relato sobre a conquista da energia nuclear, os percalços desde sua
descoberta, sua aplicação em alguns lugares do mundo e uma reflexão sobre
como sua utilização é potencialmente mais segura do que outras formas de
geração amplamente empregadas.
Sob um olharA contribuição de uma companhia – formada pela fusão de 11 empresas
– para importantes projetos hidrelétricos, tendo como consequência a
profissionalização dos técnicos e peritos envolvidos nas obras.
DiretoresAdolfo VaiserJosé Guilherme Leibel Aranha Gerência operacionalSimone [email protected] Coordenação de circulaçãoEmerson [email protected]
Assistente de pesquisaMarina [email protected]
Administração Paulo Martins Oliveira [email protected]
Jornalista responsávelFlávia LimaMTB [email protected]
Projeto gráfico e direção de arte Leonardo [email protected]
Conselho editorialCyro Bernardes, Cyro Boccuzzi, Hilton Moreno, Isabel Félix, Gildo Magalhães dos Santos, Márcia Pazin e Sérgio Bogomoltz
ReportagemBruno D’Angelo e Lívia Cunha
RevisãoGisele Folha Mós
PublicidadeDiretor comercialAdolfo [email protected]
Contatos PublicitáriosAna Maria [email protected]ésar [email protected] [email protected]
Capa e ilustrações internasPoeira Estúdios
ImpressãoGráfica Ipsis
DistribuiçãoCorreios
Atitude Editorial Ltda.Rua Piracuama, 280 cj. 72 / PompéiaCEP 05017-040 / São Paulo - SPFone/Fax - (11) 3872-4404 [email protected]
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expediente índice
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ENERGIA BINACIONAL
desenvolvimento e tecnologia Por Lívia Cunha
Com nome de origem tupi, a Usina de Itaipu gerou um acordo binacional que impactou diretamente três países do cone sul latino-americano, diversos Estados brasileiros e deu origem à maior hidrelétrica do mundo em plenas crises mundiais do petróleo
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1974.Anodecopadomundo,quandoa
AlemanhaOcidental–àépoca,divididadesdeo
finaldaSegundaGuerraMundial(1939-1945)em
socialista,noladoorientaldopaís,ecapitalista,no
ocidental–saiuvitoriosa,emcasa,conquistando
seubicampeonato.ParaoBrasil,restoupouco.
Poucoresultadoepoucaslembrançasdaseleçãode
70.Chegouàssemifinais,masperdeu.Disputouo
terceirolugarcomaPolônia;outrapartidaperdida,
oquelherendeuoquartolugarnocampeonato.
Enquantoperdiaemcampo,começavaaganharem
outrosterrenos.Nomesmoano,oterreirodeobrasdo
maiorprojetoenergéticodomundocomeçavaaser
preparado.AparceriabrasileiracomoParaguai–que
nãotinhaseclassificadoparaacopadaqueleano–
começavaaganhararesderealidade.Aobra,claro,era
aUsinaHidroelétricadeItaipuBinacional.
Oiníciodasobras,em1974,colocavafimaum
conflitodiplomáticoquejádurava224anos.Isso
fazcomqueahistóriadeItaipu,porvezes,pareça
maisumadisputapolítico-diplomáticadoqueuma
questãoeconômico-energética.Ahistoriadoraeautora
dolivroItaipu – As faces de um mega projeto de
desenvolvimento,IvoneCarlettoLima,explicaqueessa
impressãoficapelaformacomoahistóriadausinase
desenrolou.“Itaiputemtodaumahistóriaavercom
aquestãodaenergia,dodesenvolvimentoindustrial.
Mas,daformacomoaconteceu,elaacabouse
transformandoemumprojetoessencialmentepolítico
edecarácterinternacional”.Essaimpressãoresultados
diversosdesacordospolíticosentreosdoisprincipais
paísesenvolvidosatéchegaraoplanocomum.
AregiãoescolhidaparaainstalaçãodeItaipu,
chamadadeSaltodasSeteQuedasouSaltodeGuaíra,
eraumaáreadelitígiodisputada,desde1750,por
PortugaleEspanha–asmetrópolesdosfuturospaíses
latino-americanos–,quandofoiassinadooprimeiro
acordoquedescreviaaregião;oTratadodePermuta.
Abrigaeraparasaberquemtinhaosdireitossobre
aregiãodoSalto,noRioParaná–umconjuntode
cachoeirascomposto,naverdade,por21quedas,que
revelaria,anosmaistarde,umdosmaiorespotenciais
energéticosdomundoequedesapareceujustamente
porcontadaconstruçãodausinadeItaipu.Otexto
dotratadodoséculoXVIIInãodeterminavaquem
detinhaodomíniosobreasprópriasquedas.Osdois
paísesconsideravamqueoterritórioseriaseu,enão
dovizinho.Amaioriadosdocumentosseguintes
estabeleciaqueumamargemdoriopertenciaaum
paíseamargemopostaaooutro,masaquestãoera
orioemsi.Seeleeraomarcodivisor,oRioParaná
pertenciaaquem?
Eraapenasoiníciodeumadisputaextensa,
reacesa122anosdepois,em1872,comTratadode
Paz,quepôsfimàGuerradoParaguai(1864-1870).
Comavitóriabrasileira,quetevecomoaliadoso
UruguaieaArgentina,opaísguaranisofreuuma
retaliaçãodeguerra:seuterritóriofoireduzidopara
quase60%nopós-conflito–osaproximadamente
40%foramrepartidosentreoBrasileArgentina.
OdocumentoredefiniaterritórioseutilizavaoRio
Paraná,maisumavez,comopontodedivisão.Mas
nãohaviaprecisãosobrequemteriaopodersobreas
águaseesseimpasseseestendeuaté1966,anoem
quefoiassinadaaAtadeIguaçu,tambémconhecida
comoAtadasCataratas,quedeterminouqueo
aproveitamentodorioeseupotencialenergéticoseria
feitoemcondomíniodosdoispaíses.Esseéoinício
doestabelecimentodaatualregiãodeItaipucomo
binacional,ouseja,nãopertencenemaoBrasil,nem
aoParaguai:pertenceaosdois,juntos.Easemente
doque,nofuturo,viriaaserMercadoComumdoSul,
oMercosul.
Antesdechegaraesseacordo,oBrasilcogitou
elaborarumausinasozinhanaregião,masoParaguai
nãoaceitou,alegandoqueeletambémtinhadireito
sobreaárea.Ogovernoparaguaioameaçou,inclusive,
declararnovaguerraaoBrasilcasoinsistisseem
construirausinasozinha.Então,em1966,conta
Carletto,“emumareuniãoqueteveemFozdeIguaçu,
comosdoisrepresentantesdospaíses–osdois
chanceleres,brasileiroeparaguaio–,oBrasilacabou
cedendonoseguintesentido:dequesehouvesse
umaproveitamentodoRioParanánotrechoFozde
Iguaçu-Guaíra,esteseriaemcondomínio.Issopara
acabarcomesseproblematododequestionamento”.
Comoentendimentopolítico,atécnicacomeçouaser
postaemprática.Estudossobrearegião,opotencial
easformasdeimplantaçãodeumausinaforam
iniciados.
O tempO parecia ter Outra dimensãO àquela épOca. […] até entãO nãO se discutia a quem
pertencia O “saltO de Guairá”. O Brasil
cOnsiderava sua aquela estreita faixa de terra. O paraGuai tamBém.
Em Itaipu: integração em concreto ou
uma pedra no caminho, de Tão Gomes
Pinto. Ed. Amarilys.
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desenvolvimento e tecnologia
“Sete Quedas por nós passaram,
E não soubemos, ah, não
soubemos amá-las...
E todas sete foram mortas,
E todas sete somem no ar...
Sete fantasmas, sete crimes,
Dos vivos golpeando a vida,
Que nunca mais renascerá...”
(Carlos Drummond de Andrade)
Contexto
OBrasilviviaumaditaduramilitardesde1964.O
Paraguai,porsuavez,reviviaumregimeautoritário
comogeneralAlfredoStroessnerdesde1954–opaís
teveaindaoutraditaduracercadedezanosantes,
comotambémgeneralHiginoMorínigo,de1940a
1948.AsditadurasmilitaresnaAméricaLatinaforam
reflexosdiretosdaGuerraFria,instauradadesdeofim
daSegundaGuerraMundial,equedividiuomundo
entrecapitalistasesocialistas.Comoaguerranãotinha
confrontodiretoerachamadadefria,emoposição
àquentecomdisparosàqueima-roupaeataques
diretos.OsEstadosUnidos,quesempretiveramgrande
influênciasobreospaísesaosuldoseucontinente,
paraevitaraexpansãodaesquerdanaregião,
auxiliarameapoiaramasditadurasdegovernos
militares,cerceadorasdasliberdadesindividuais.
Nesseperíodo,apopulaçãodoBrasilaindaera
majoritariamenterural(aurbanasósuperouado
campo,nadécadade1970,deacordocomocenso
daépocadoInstitutoBrasileirodeGeografiae
Estatística,quandoopaíschegouapoucomaisde93
milhões,aotodo)eaindustrializaçãocomeçavaase
afirmar.Oprocesso,iniciadonoprimeirogovernode
GetúlioVargas,logoapósaRevoluçãode1930,foi
intensificadocomapolíticadesenvolvimentistade
JuscelinoKubitschek(1956-1961)eduranteaditadura
militar.Nesseperíodo,comoaumentodapopulação,
amudançaparaascidadeseocrescentenúmerode
equipamentos,aparelhosedispositivosexclusivamente
dependentesdaeletricidade,ademandaporenergia
elétricadopaíscomeçouacrescer.Parasuprir
àpopulaçãoeàsindústrias,eranecessáriotera
possibilidadedegerareoferecermaisenergiaaos
consumidores.Eissoperpassavapornovosprojetos,
principalmentehidrelétricos,aespecialidadedoBrasil.
Aadoçãodeprojetosdefontesenergéticas
renováveisganhouforçaem1973quandoomundo
viveuumadasgrandescrisesmundiaisdopetróleo.
Ospreçosforamelevadosemmaisde300%,como
formadeembargodospaísesárabesdaOrganização
dosPaísesExportadoresdePetróleo(OPEP)aosEstados
UnidoseàEuropaOcidentalporterdadoapoioe
subsídiosparaqueIsraelresistisseàsofensivasegípcia
esírianaGuerradoYomKipur–odiadoperdão,
umadasdatasmaisimportantesdocalendáriojudaico.
Omundosentiurapidamenteaaltadospreçoseos
paísesquetinhammaiordependênciadoóleonatural
sofreramosefeitosemsuaseconomias.OBrasil,que
játinhagrandeconhecimentonageraçãodeenergia
elétricaporfontehidráulica,intensificouaindamaisa
exploraçãodeenergiasrenováveis.
PoucosmesesantesdoconflitodoOrienteMédio,
tinhasidoassinadooTratadodeItaipuentreParaguai
eBrasil,quemarcavaadefiniçãolegaldoinícioda
exploraçãodoRioParanáemcondomíniodosdois
países,ouseja,oiníciodeItaipu.ComooParaguai
nãotinhaconhecimentotécnicoaprofundado–atéa
obradabinacional,opaíssótinhaumapequenausina
hidrelétrica–;tecnologiaprópriaecapitalfinanceiro
parainvestir,diz-sequeovizinhobrasileiroentrou
sócomaágua.Maseranecessárioconhecimentoe
recursosparaqueItaipudeixassedeserumprojeto
epassasseaserefetivamenteumausinageradorade
energia.Dessaforma,oBrasilsecomprometeuem
arcarcomtodososcustos.ParaqueoParaguaifosse
condôminonoempreendimento,ficouestabelecido
queadívidaseriapagaemenergia,nãoemdinheiro,
aolongode50anos.Porisso,ogovernoparaguaioé
obrigadoavendertodaaenergiageradaporItaipue
nãoconsumidaaoBrasilapreçosabaixodomercado.
Oprojetodamaiorhidrelétricadomundo,que
auxiliariaasuprirdemandasenergéticasdosdois
países,foiaformaencontradapararesistiraochoque
dopetróleoenãocortarosinvestimentosenem
congelaroprojeto.“Oobjetivodopresidenteda
República[doBrasil]erareforçaroabastecimentode
energiadetodaaregiãosudeste,vítimadeconstantes
‘apagões’”,contaojornalistaTãoGomesPinto,em
suaobraItaipu: integração em concreto ou uma pedra
no caminho.Porisso,depoisdeassinadooTratado
em1973,aobrasóparounoveanosdepois,em1982,
quandoausinafoifinalizada,resistindoamaisoutro
choquedopetróleo,ode1979.
Masnemtodosospaísesdoconesulestavam
satisfeitoscomoentendimentodoBrasileParaguai.
AArgentina,quetambémébanhadapeloRioParaná,
temiaqueausinaprejudicasseseuterritórioeinteresses
sobreaságuas.“AArgentinaquestionouaconstrução
daItaipujustamenteporcausadaaltitudedabarragem,
doníveldolagoqueseriaconstruído.Eladissequeseo
Brasilfizesseumausinadetalporteiriaimpossibilitar
aconstruçãodeumausinaqueelapretendiafazer
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Trabalhadores constroem uma das turbinas de Itaipu
Do tupi e guarani
Quando o grupo de técnicos paraguaios e brasileiros fizeram as pesquisas e
buscas da região mais apropriada para a instalação da hidrelétrica, eles chegaram
a um trecho do Rio Paraná chamado de Itaipu, que em tupi significa algo como “a
pedra que canta”. No local existia uma ilha, conhecida por esse nome, que quase
sempre ficava submersa devido à forte correnteza, acentuada por uma região de
curva do rio. Naquele local foi registrado um excepcional rendimento energético,
daí, foi definida a instalação da usina no local.
Assim como Itaipu tem influência das tribos indígenas existentes na região
anterior à chegada dos europeus, o Paraguai também tem. Ainda mais pela grande
presença de índios e seus descendentes na composição da população. Mostra disso
é que o país é bilíngue, falando espanhol e guarani. O próprio nome Paraguai,
em Guarani, tem um significado relativo a águas. Paraguay seria originado de
“águas do mar”, em Guarani. Sendo pará, o mesmo que “mar”; guá, que denota
“origem”; e ý, que significa “água”. Assim, seu significando seria algo como “água
que vem do mar”. O Rio Paraguai, um afluente do Rio Paraná, teria sido o primeiro
a receber o termo indígena. Depois, com a formação da nação, o país recebeu o
mesmo nome.
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desenvolvimento e tecnologia
tambémnoRioParaná,masmaisabaixo,em
condomíniocomoParaguai”,explicaahistoriadora
IvoneCarletto.Aquestãochegouaserlevadaparaa
AssembleiaGeraldasNaçõesUnidas,em1972,esó
foiresolvidaem1979,quandoostrêspaíses–Brasil,
ParaguaieArgentina–assinaramoAcordoTripartite.
Esseacordodefiniuasregrasparaoaproveitamento
dosrecursoshidráulicosnoRioParaná,notrechoqueia
desdeasSeteQuedasatéafozdoRiodaPrata.
Somadaàquestãodeaproveitamentohídricodo
rio,haviaumalendadequeseItaipufossemesmo
construídaeoBrasilabrisseascomportas,como
consequênciadeumeventualconflitoentreospaíses
aosuldaAméricaLatina,queeramgovernadospor
ditadurasmilitares,acidadedeBuenosAiresseria
inundadapelaságuas.Mascomotratadoentreos
países,aquestãodiplomáticafoisolucionada.O
acordodeutãocertoqueeleseriaagênesedistantedo
Mercosul,contandoaindacomaDeclaraçãodeFoz
deIguaçu–de1985,assinadapelospresidentesda
ArgentinaeBrasil,queselouasrelaçõesamistosasentre
osdoispaísesefoiabasedaintegraçãoeconômica
doconesul–ecomoTratadodeAssunção,que
oficialmentecriouoMercadoComumdoSul,de1991,
comaArgentina,oBrasil,oParaguaieoUruguai.
Construção
Depoisdosestudosdecampoedadefiniçãodo
localdausina,em1973,oterrenofoipreparado,em
1974,paraqueausinacomeçasseasererguidaem
1975.Aconstruçãoincluíaodesviode2quilômetros
doRioParaná,com150metrosdelargurae90metros
deprofundidadeparaaformaçãodoreservatório
dausina.ArecémcriadaEmpresaBrasileirade
Comunicação,aRadiobrás,em1978,noticiouque
“odesviodorioporumcanalartificialcorrespondeu
àprimeirafasedeconstruçãoparaasecagemde
seuleito.Ocanaldedesvio,escavadoemrocha,na
margemesquerda,temproporçõesincomuns”.Tudo
emItaipueragigantesco,porisso,foichamadopela
revistanorte-americanaPopular Mechanicsdeum
“trabalhodeHércules”–emreferênciaaosdoze
trabalhosqueosemi-deusgregotevequerealizare
quesópodiamserrealizadosporalguémcomforça
sobre-humana.
LocalizadanomunicípiodeFozdoIguaçu,
peloladobrasileiro,enaCiudaddelEste,pelo
paraguaio,ausinadeItaiputevequeconstruiruma
verdadeiracidadeparaalojarostrabalhadoresdo
empreendimento.AcidadedeFoz,antesdoiníciode
Itaipu,tinhacercade20milhabitantes.Nofinalda
obra,apopulaçãojáerademaisde100milpessoas.
Duranteaconstrução,entre1975e1978,foram
erguidasmaisdenovemilmoradiasaolongodasduas
margensdoRioParanáparaabrigarostrabalhadores
queparaaregiãosemudaram.Nopicodaobra,Itaipu
chegouater40miltrabalhadoresdiretos,odobrode
todapopulaçãoinicialdeFozdeIguaçu.Essenúmero
foialcançadoporque,entre1978e1981,foram
contratadasaté5milpessoaspormês.
Asobrasdabarragemforamconcluídasem
1982.Comoreservatórioformado,ospresidentes
doBrasil,JoãoFigueiredo,edoParaguai,Alfredo
Stroessner,inauguraramItaipu,em5denovembrode
1982,comoacionamentodomecanismoquelevanta
automaticamenteas14comportasdodeclive,que
liberaramaáguarepresadadoRioParaná.Depois
demaisde50milhorasdetrabalho,amaiorusina
hidrelétricadomundoestavafinalizada,masogiro
daprimeiraturbinasóacontecerianoanoseguinte,
emdezembrode1983,eageraçãoeatransmissãode
energiacomeçariadoisanosdepois,em1984.
Transmissão
TodaenergiaproduzidapelaUsinaBinacional
deItaipu,comofoidefinidopeloTratadodeItaipu,é
geradaemduastensõesefrequênciasdiferentes.Como
oParaguaiémovidoaumafrequênciade50Hzeo
Brasila60Hz,asoluçãoencontradapelostécnicos
doempreendimentofoiproduzirmetadedaenergia,
referenteàpartebrasileira,emcorrentealternada,
jáa60ciclosporsegundoe750kV,enquantoa
outrametade,doParaguai,seriageradaemcorrente
contínua,em50Hze600kV.
Oengenheiroeletricistaeprofessordoutorda
EscolaPolitécnicadaUniversidadedeSãoPaulo
(Poli/USP)JoséAntônioJardiniexplicaque“Itaipu
eraparasertodaemcorrentealternada,mascomo
oParaguaiempregafrequênciade50Hzeaquié60
Hz,nãodáparaligarumnooutro,então,erapreciso
retificaros50HzdausinadeItaipu:gerarem50Hz,
paraoParaguai,depoisretificareinverterparaoutra
9
A construção da Usina custou US$ 1 mil/MW instalado. O equivalente a cerca de US$ 14 bilhões, à época.
A obra demorou 8 anos para ser concluída. Foi iniciada em 1974 e concluída em 1982. Mas só começou a gerar energia dois anos depois, em 1984.
Entre 1975 e 1978, mais de 9 mil moradias foram construídas às margens do rio para abrigar os homens que atuavam na obra.
A alteração do curso do Rio Paraná removeu 55 milhões de m³ de terra e rocha para escavar um desvio de 2 km de extensão, 150 m de largura e 90 m de profundidade. Para tanto, foram usadas 58 toneladas de dinamite.
Só no dia 14 de novembro de 1978, foram colocados na obra 7.207 m³ de concreto, o equivalente a 1 prédio de 10 andares/hora.
O total de concreto utilizado na barragem, 12,3 milhões de m³, seria suficiente para concretar 4 rodovias como a Transamazônica.
Itaipu alavancou o PIB do Paraguai, que em 1978 cresceu 10,8%.
Entre 1978 e 1981, eram contratadas até 5 mil pessoas/mês. No pico de construção, tinham cerca de 40 mil trabalhadores diretos.
O transporte de materiais para a Itaipu utilizou 20.113 caminhões e 6.648 vagões ferroviários em 1980.
26 dias foi o tempo recorde de transporte de rodas de turbinas entre a fábrica e a usina. Essas peças tinham cerca de 300 toneladas cada e percorriam um caminho de até 1.350 km.
O enchimento do Rio Paraná levou 14 dias. A lâmina de água tem 4 vezes o tamanho da Baía de Guanabara.
170 km foram submersos entre os municípios de Foz do Iguaçu e Guaíra.
8.519 propriedades foram desapropriadas e inundadas na margem brasileira do Rio Paraná.
Recorde de geração
Em 2004, quando a usina completou 20 anos de atividade, Itaipu já havia gerado energia suficiente para abastecer o mundo durante 36 dias.
Recorde de geração foi de 94.684.781 de MWh, em 2008.
Foi necessário mais do que conhecimento técnico, tecnologia e dinheiro para construir Itaipu. A obra foi feita pelas mãos de diversos homens que, durante muitos dias, tinham o trabalho como suas vidas. Devido ao grande porte da usina e à região inicialmente sem estrutura para uma construção dessa magnitude, foi necessário montar uma verdadeira cidade em torno do canteiro de obras. Casas, refeitórios, assistência. Tudo foi oferecido àqueles que lá trabalharam por anos. Mas a vida de uma pessoa não se resume à profissão. É composta pelas relações sociais, como relacionamentos afetivos e fraternos. Com os funcionários de Itaipu, claro, não foi diferente. Engenheiros, encarregados, topógrafos, geólogos, especialistas de cálculos de concreto, peritos em explosivos, ou seja, todo o tipo de “barrageiros” tradicionais, como são chamados os trabalhadores responsáveis pela construção de barragens de usinas hidrelétricas. Todos eles foram mandados para Foz do Iguaçu, pelo lado brasileiro, a fim de preparar o terreno de Itaipu. “No canteiro binacional, os paraguaios chegavam com sede de aprender e prestavam muita atenção no trabalho dos colegas brasileiros. Era uma relação carinhosa. No fim da história, casaram-se muitos brasileiros com paraguaios e vice-versa”, conta o jornalista Tão Gomes Pinto, no seu livro Itaipu:integraçãoemconcretoouapedranocaminho. Mas, durante as obras, o relacionamento entre empregados não era bem visto pela empresa. Era, inclusive, proibido. Tão Gomes relata em seu livro a história do namoro de um engenheiro com uma bibliotecária que foi coibido pela empresa. “A paixão do jovem engenheiro foi correspondida. Foram vistos pelo canteiro, algumas vezes, de mãos dadas. O assunto chegou à diretoria, que decidiu pela demissão do rapaz. Ele conta que chegou a chorar quando o encarregado de pessoal simplesmente pegou a tesoura e cortou a ponta do seu crachá. Era o ritual que o desligava de Itaipu”, conta.
númerOs de itaipu as mãOs de itaipu
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desenvolvimento e tecnologia
Pesquisa:• Itaipu: integração em concreto ou uma pedra no caminho. TãoGomesPinto,Amarilys.• Itaipu: as faces de um mega projeto de desenvolvimento.IvoneTeresinhaCarlettodeLima,EditoraGermânica.• A energia do Brasil. AntonioDiasLeite,NovaFronteira.
frequência,de60Hz,paraentãoligarnosistema
brasileiro.ÉporissoqueItaipugerouumaparteem
correntecontínua,ametadedoParaguai”.
EjáqueItaipu,paraoBrasil,foipensadapara
solucionarproblemasdeabastecimentoedemandade
energiaemgrandescentrosconsumidores,comoSão
PauloeRiodeJaneiro,essaenergiaprecisavachegar
aessasregiões.Dessaforma,foidefinido,desdeantes
daconclusãodaUsina,queaeletricidadegeradaseria
conectadaaoSistemaInterligadoNacional(SIN)e
enviadaparaabastecer,emespecial,SãoPaulo,pela
transmissãodeFurnasCentraisElétricas.Ogerenteda
SubestaçãodeIbiúna,SergioLuizIasbeck,explicaque
“oBrasilcompraaenergianãoutilizadapeloParaguai
eporumprocessodeconversãotransformaacorrente
alternadaemcorrentecontinua,transmiteemcorrente
continuae,naSubestaçãodeIbiúna,nacidadede
Ibiúna(SP),seconverteessaenergiaparaaforma
deenergiautilizadanosistemaelétricobrasileiro”.A
energiaparaguaia,porsuavez,étransmitidaparatodo
paíspelaAdministraciónNacionaldeEletricidad(Ande).
OsistemaemcorrentealternadadeItaipu,em750
KVe60Hz,compreendetrêslinhasdetransmissão
quesaemdaSubestaçãodeFozdeIguaçu,com18
das20unidadesgeradorasdahidrelétrica,echegam
àSubestaçãoTerminaldeTijucoPreto,emSão
Paulo.Essaenergiapassaaindapelassubestaçõesde
Ivaiporã,noParaná–umdosprincipaispontosde
conexãoeintercâmbiodeenergiaelétricadasregiões
SuleSudeste–,edeItabera,emSãoPaulo.Poresse
percurso,aenergiageradaporItaipu,referenteà
partebrasileira,chegaaosdemaisestadosdopaís.
JáaenergiacompradadoParaguaiéconvertida
naSubestaçãodeIbiúna,emSãoPaulo,deondeé
retransmitidaeconectadaaosistemainterligado.
Desde1984,quandoItaipucomeçouagerar
energia,atransmissãobrasileiraérealizadaporFurnas.
ComoéconectadaaoSIN,todososEstadosbrasileiros
interligadosaosistemacomandadopeloOperador
NacionaldoSistemaElétrico(ONS),acabamrecebendo
energiaelétricadeItaipu.Atualmente,trêsdos26
Estadosbrasileiros(maisoDistritoFederal)nãoestão
interligadosaosistema.SãoelesAmapá,Amazonase
Roraima.Masoabastecimentoprioritáriodausinaé
paraosestadosdoSuleSudeste.Abastecimento,este,
queficouprejudicadoemnovembrode2009.Porum
problemanatransmissãodaenergiageradaporItaipu,
18estadosbrasileirosconectadosaosistemasofreram
comafaltadeenergiaelétrica.Quatrodelestiveram
faltatotal,atingindotodososseusmunicípios–Riode
Janeiro,SãoPaulo,MatoGrossodoSuleEspíritoSanto
–,eosdemais14estadosregistraramblecautesparciais.
Impactos
ÉcertoqueItaipualterousignificativamentea
regiãodatríplicefronteira–Paraguai,Argentinae
Brasil.LevounãosóausinaparaomunicípiodeFoz
deIguaçu,levoumilharesdepessoasaseinstalaram
naregiãoepromoveudesenvolvimentoparaacidade
queseresumiaaduasruasasfaltadasnofinalda
décadade1960,iníciode1970.Mas,emcontrapartida,
retirouumaobradebelezanaturaldomundo,oSalto
deSeteQuedas,umaregiãode1,5km²deflorestase
terrasagriculturáveis,quefoiinundada.Maisde36mil
animaisforamdeslocadosdeseuhabitatnaturale8
milfamíliastiveramquesairdesuasterras.
AhistoriadoraIvoneCarletto,estudiosadahistória
deimplantaçãodeItaipuedosimpactossobrea
população,contacomosedeuoprocesso.“Houve
umagrandedesapropriação,forammaisdeoitomil
processossódoladobrasileiro.Emuitagentesesentiu
prejudicadaporqueachavaquenãofoijustoopreço
eelesfizeramummovimento,oMovimentodos
SemTerra(MST),quehojefazpartedahistóriados
movimentossociaisdoBrasil”.Foinesseperíodoqueo
MSTfoiformado,emcidadesnointeriordoParaná.“E
foiummovimento”,relataCarletto,“quefezcomque
Itaipucedessebastante,porqueelesconseguiramquase
tudoquepediramnaépoca”.
Aprincipalreivindicaçãodasfamíliasexpropriadas
eraaquestãoimobiliária.Issoporque,noiníciodos
anos1980,ainflaçãoeramuitoalta(ainflação
acumuladadoanode1979foide77,21%).“Por
exemplo,vocêrecebiadinheirodeItaipuhojee
amanhãjánãoconseguiacomprarquasenadaporque
ascoisasaumentavamdepreço,nãoacadadia,masa
cadahora”,acrescentaahistoriadora.
11
As obras da usina foram iniciadas em 1974 e concluídas em 1982
as hiDrelétricas
Rio Paraná
A Usina Hidrelétrica de Itaipu Binacional foi
o terceiro empreendimento hidrelétrico brasileiro
ao longo do Rio Paraná. A primeira obra foi a
Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira, iniciada em
1965 e concluída em 1978; seguida pela Usina
Hidrelétrica Engenheiro Sousa Dias, conhecida
como Usina de Jupiá, que foi iniciada na primeira
metade da década de 1960 e finalizada em 1974.
Após o início de operação da binacional, ainda
foi construída mais uma geradora no rio do lado
brasileiro: a Usina Hidrelétrica Engenheiro Sérgio
Motta, conhecida como Usina de Porto Primavera,
iniciada em 1980 e concluída no ano 2000. Foi o
primeiro projeto hidráulico em águas paraguaias.
Maiores do mundo
Itaipu foi durante muitos anos a maior usina
geradora de hidreletricidade do mundo. Com potência
instalada de 14 mil MW, proporcionada por 20
unidades geradoras de 700 MW cada, perdeu o
posto para a Usina Hidrelétrica de Três Gargantas,
na China, que, apesar de atualmente gerar menos
energia, tem maior potência instalada com previsão
de chegar a 22,4 mil MW quando estiver completa,
com todas as turbinas em funcionamento, o que deve
acontecer em 2011. A terceira maior usina do mundo
também é latino-americana. A Usina Hidrelétrica de
Guri, na Venezuela, tem potência instalada de 10.300
MW e abastece, além do próprio país, o Estado de
Roraima, no Brasil, que não está ligado ao Sistema
Interligado Nacional (SIN).
Usina
Turbinas
Potência nominal
Potência instalada
Recorde de produção anual
Concreto utilizado
Altura
Comprimento da barragem
Vertedouro (capacidade de vazão)
Escavações
Itaipu
20
700 MW
14 mil MW
94,7 bilhões kWh/ano (2008)
12,57 milhões m³
196 metros
7.744 metros
(concreto, enrocamento e terra)
175 metros (dique de Hernandárias)
62.200 m³/s
63,85 milhões m³
Comparativo entre itaipu e três GarGantas
Três Gargantas
32 (6 subterrâneas)
700 MW
22,4 mil MW (quando estiver completa,
prevista para 2011)
80,8 bilhões kWh/ano (2008)
27,94 milhões m³
181 metros
4.149 metros (concreto 2.309 m e dique
Maoping 1.840 m)
120.600 m³/s
134 milhões m³Fonte: Itaipu Binacional
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12
O ADVENTO DA ILUMINAÇÃO ARTIFICIAL
era da eletricidade Por Bruno D’Angelo
A história da luz através dos tempos, desde a revolucionária descoberta do fogo pelos homens
primitivos até o desenvolvimento da iluminação pública
13
Muitoantesdearchotes,lamparinasagás,
queroseneelâmpadaselétricas,eraaluzdosolque
guiavaoshomenspelomundo.Dediaeànoite
também,jáqueoluarnadamaisédoquealuzdo
solrefletidanalua.
Ocasoéquenemsempreoshomenspodem
contarcomobrilhodaluapararealizaremalguma
atividadenoturna.Muitasvezesocéuficaencoberto
pornuvens,impedindoqueapreciemosoluar,outras
tantas,osraiossolaresrefletememumafacedalua
quenãoseofereceparanós,aquidaTerra,fenômeno
chamadodeLuaNova.Nadamaiscerto,então,
queosprimeiroshomenstenhamconcentradosuas
tarefasnoperíododiurno,deixandoparaanoiteo
descanso.
Durantemuitotempo,pode-sedizer,atéa
invençãodalâmpadaincandescenteporThomas
Edison,asituaçãopermaneceubasicamentea
mesma.Nãoque,nesteínterim,algumasdescobertas
nãotenhampropiciadoaohomemummelhor
aproveitamentodanoite,fazendodelatambémum
palcoparaatividadesprivadas.Essasdescobertas,
porém,devidoàssuaspeculiaridades,nãopermitiram
oflorescimentodeumaculturanoturnanosmoldes
daqueocorreuapósoinventodeEdison.
Atrito, faísca e o homem se ilumina
Aprimeiragrandetransformaçãorealizada
peloengenhohumano,noquetangeàproduçãode
luz,surgiuaindanapré-história,comadescoberta
demeiosparaobterecontrolarofogo.Adatade
quandonossosancestraisrealizaramtalachadonão
podesermuitobemprecisada,porém,evidências
encontradasemcavernasatestamdequecercade
500milanosa.C..,naEradoPaleolíticoPosterior,o
chamadoHomemdePequimjáutilizavaofogonas
suaspráticasdiárias.
Ousodofogoapresentaduasfases:aquelana
qualohomemsomentesebeneficiavadaexistência,
masaindanãosabiacomoproduzi-loeoutra,na
qualohomemfinalmenteseapossavadosmeios
antespertencentessomenteanatureza,parapoder,
assim,provocarofogonahoraquebementendesse.
Naprimeirafase,eranecessárioesperarque
descargaselétricasatmosféricasatingissemárvores,
fagulhasseformassemeofogoiniciadoseespalhasse
pelaflorestacomaaçãodovento.Nessaetapa,o
homemficavatotalmentedependentedoacaso,oque
dificultavabastantequalquertipodeplanejamento.
Afinal,usufruía-seapenasmomentaneamentedoque
anaturezaoferecia.Assimqueachamaseextinguia
eraprecisovoltaràvidaanterior,comaesperançade
quenofuturoaflorestaseiluminassedenovo.
Noqueconcerneaodomíniodaprodução
defogoporpartedohomem,provavelmente,ele
começouassim:aobservaçãodequeofenômeno
sepropagavapeloaquecimentodegalhosoufolhas
secasindicouqueachamapoderiaseriniciadacom
temperaturaselevadas.Daíparaadescobertadeque
oatritoentredoispedaçosdemadeirasecapoderia
causartalefeitofoiumpulo.
Muitotempodepois,foidescobertoquequando
sebatiasílexcomferroouaçoasfagulhaserammais
fortesepersistentes.Esteprocedimento,detãoeficaz,
persistiuatéocomeçodoséculoXXemdiversos
cantosdomundo,inclusivenoBrasil.
Comodomíniodoprocessodecomoproduzir
emanteraschamas,começavaasegundafasedo
fogo.Assim,ohomemconseguiu,pelaprimeira
vez,iluminarsuasnoitescomsuasprópriasforças
semdependerdaboavontadedoSol.Enãosó.
Ofogotrouxeoutrosbenefíciosàraçahumana
quepôdefundirmetaisefabricarferramentas
paraatividadesdelaboredeguerra,aquecer-se
melhordofrioecozinharseusalimentose,dessa
forma,consequentemente,melhorarsuascondições
devida,aumentandosuaexpectativadevida.A
eletricidade,maistarde,trariabenefíciossemelhantes
eaprimorados.
Os primórdios da iluminação artificial
Descobertaamaneiradeseobterfogoefazê-
lodurar,ohomemtinhaagoraumnovodesafio:
fazeressadescobertanãoficarrestritaaespaços
determinados,eraprecisofazerandarachama.No
início,atritandomadeiraoupedraparaproduziro
fogo,ohomemfabricavapequenosarbustospara
queelecontinuassevivo.Empoucotempo,porém,
14
era da eletricidade
oprocessofoisetornandomaisbemelaborado.
Porexemplo,naBabilônia,naFeníciaenoAntigo
Egito,jáeramempregadasmadeirasmaisresinosas
desfiadasemtiras,amarradasemcipósdepichese
resinas.Estasforam,aliás,asprimeirastochas,que
possibilitaramaohomemmover-sejuntamentecom
ofogo,marcandooiníciodeumafasedailuminação
artificialdenominadadehomem-luz.
Provavelmente,oprimeiromaterialcombustível,
alémdamadeira,foiagraxaanimal.Maistarde,
descobriu-sequeoóleoextraídodeprodutosvegetais
comoolinho,amamonaeatéazeitonastambém
eramúteis.Algunsdesseselementos,aliás,seriam,
temposdepois,tambémempregadoscomobiomassa
parageraçãodeenergiaelétrica.Essesóleoseram
coletadosemchifresdeanimais,conchasmarinhasou
pedrascomcavidadesnaturais,que,posteriormente,
passaramdesimplesaparelhosrecolhedoresdeóleo
parareceptáculosondeseeragerado,mantidoe
transportadoofogo;surgiramassimasprimeiras
lucernas.Maistarde,aspesadaserústicaslucernas
depedraforamcedendoespaçosparautensíliosmais
sofisticadosfeitosdebarroedemetal
Nascivilizaçõesantigas,aslucernasoutochas
setornavamcadavezmaisfixas,comointuitode
iluminargrandesáreas,forospúblicoseanfiteatros.
EmRoma,porexemplo,ocircoMáximoeo
Coliseueramiluminadosdessaforma.Chamadasde
“fax”ou“taedas”,elasacompanhavam,também,
excepcionalmente,cerimôniascomobodasou
mesmocortejosfúnebres.NaGrécia,astochaseram
imobilizadastambémparailuminaçãopúblicae,
ocasionalmente,tornavam-seaparelhosmanuais
parailuminaremfestasemcompetiçãoondeeram
disputadascorridasapéouacavalo.
Énecessárionotarqueastécnicasdegeraçãode
luznãosemodificarammuitodesdesuadescoberta
atéaoséculoXIX;oprocessocontinuouasero
mesmo:aqueimadecombustíveislíquidospara
aproduçãodefogo.Aocontrário,osmateriais
empregadosparasuportedofogo,aslucernas,
sofreramtodootipodealteração.Passarama
contar,porexemplo,comumavariadaeartística
ornamentação;sendofabricadascommetaisecom
materiaispreciosos.
Pode-sedestacartambémnessatransformação
porqualpassaramosequipamentosdeiluminação,na
épocadofogo,osurgimentodoscastiçais,cujaideia
erasimples:aumentaraalturadafonteluminosa
paraqueoespaçoiluminadofossemaisamplo.Com
oaparecimentodavela,oscastiçaisetambémos
candelabrostornaram-seaindamaisimportantes.
Ovidrofoioutrarelevantedescobertaque
contribuiuparaamelhoriadailuminaçãoartificial.
Omaterialjáerafabricadopelosegípciosem2mil
a.C,masalcançougrandedifusãonaIdadeMédia.
Utilizadoaindahojenafabricaçãodelâmpadas
elétricas,ovidrosemprefoidegrandeajudaporque
funcionavacomoabrigoparaachama,evitandoque
estaseapagasseoumesmoseespalhassee,aomesmo
tempo,porsuatransparência,favoreciaailuminação
dosambientes.
Ofatoéqueindependentementedosmateriais
empregadosnafabricaçãodeartefatosdeiluminação,
estasinovaçõescontinuaramdurantemuitotempo
sendoaproveitadaspelascamadasmaisricasda
população.DeacordocomlivroA História da
Iluminação Artificial – das origens até o século XX,
deNataleBonali,aplebecontinuouiluminandoas
andançasnoturnas,comaprimitivaluzmanualfeita
derochasarcaicas.Muitasvezes,aoandarnasvielas
escuras,acamadamenosfavorecidaguiava-seapenas
porluzinhasdeminúsculosoratórioslocalizadosem
algumasesquinas.Jáosmaisricosquegostavam
davidanoturna,utilizavamservoslanterneirospara
guiaremocaminho.
Noquetangeàiluminaçãopública,atéoséculo
XV,elaeraconsideradadeverdoscidadãosenãodas
autoridades;provadissoeramasleisquevigoravam
naépoca,estabelecendopenaspecuniáriaspara
aquelesquedesrespeitassemasregras.Oscastelos
dossenhoresfeudaistambémnãoajudavamna
tarefadailuminaçãopública,jáqueeramtodos
muitosombrios,apresentando,geralmente,como
iluminaçãoexterna,umasolitáriatochapostadana
ponteelevadiça.
NoséculoXVI,numerososedifíciospúblicos
epaláciossenhoriaisforamprogressivamente
melhorandoavisibilidadeurbanaaoinstalarem
lanternasdeferroforjadonasesquinasdeonde
15
a luz trêmula e azulada emitida pelO Gás fOrmava em sua vOlta uma atmOsfera de vaGO
lirismO, uma aura rOmântica, que juntO cOm Os ‘Gasistas’, traBalhadOres respOnsáveis
pela OperaçãO dO aparelhO, tOrnOu-se parte dO fOlclOre pOpular da eurOpa e dOs demais
cOntinentes que vieram a utilizá-la
Rio de Janeiro, no final da década de 1920, com a inauguração da iluminação da Avenida Maracanã, na ponte do cruzamento com a rua Uruguai
Gasista acende luminária pública
Aug
usto
Mal
ta
A H
istó
ria d
a Ilu
min
ação
Arti
ficia
l – d
as o
rigen
s até
o sé
culo
XX
16
era da eletricidade
estavamsituados.Mesmoassim,passadoumséculo,
ailuminaçãopúblicaeuropéianãoapresentou
relevantesmodificações.Aspraçaseasruas
continuavamàsescurasealuzaindavinhaquaseem
suatotalidadedebraseirosetochaslocalizadasem
pátioseempassadiçosdegrandesmansões.
Notérminodosanos1600,porém,os
governantespassaramatomarailuminaçãodas
ruascomosuaresponsabilidadeecomeçaram
ainstalarlanternasemalgumasesquinas,nas
principaiscidades.Estesnovosequipamentoseram
abastecidosporequipeschamadasdefaroleirosque
contavamcomroldanasouescadasparasubirem
àslanternaseassimconseguiremrealizarafunção
paraqualforamdestinados.
Estasaçõesforam,certamente,ocomeçode
umanovafase,porquejánoiníciodoséculoXVIII,
umaprogramaçãomaisracionaldeiluminação
públicacomeçouaserefetuadanaEuropa,naqual
asprincipaiscidadesdocontinenteviramlanternas
semultiplicaremporsuasruas.Anovailuminação
funcionavaàbasedeóleosvegetais,cujoconsumo
eramaislento,masaluminosidadedachamaera
maisfraca.ConformeBonali,oprimeiroavanço
técnicoparamelhorarafruiçãodaluz,deu-seem
1760,comaadoçãodeumespelhocôncavode
metalpolidodentrodalanternaquepermitiumelhor
reflexãodachama.
SenaEuropa,ocenáriodailuminaçãoartificial
estavaprogredindo,naAmérica,poroutrolado,
osavançoserampraticamenteimperceptíveis.
Descobertahápouco,serviunoiníciodoseu
processodecolonização,parailuminarasandanças
dosdescobridores,comaparelhosmanuaistrazidos
dosveleiros,fogaréusimprovisadosearchotes
rudimentares.
Posteriormente,gruposreligiososdifundiram
asvelas,empregadasparailuminarasigrejinhas
quecomeçavamatomarcontadanovaterra.
Algumastentativasdedesenvolverequipamentos
deiluminaçãomaissofisticadostambémforam
colocadasemprática,masasoluçãoveioapenasa
partirdoséculoXVII,quandoaimigraçãotornou-se
maisnumerosaeocontatocomovelhomundoe
entreasigrejassetornoumaisfrequente,oquelevou
àsprimeirasimportaçõesdeaparelhosacabados.
Comachegadadenovosmateriais,foipossível
falardeiluminaçãonospaísescolonizados.NoBrasil,
destaqueparaacidadedoRiodeJaneiro,que,em
1763,poriniciativadeseusmoradores,começoua
iluminarseuslogradourospúblicos.Foraminstalados,
naépoca,20lampadáriosdemadeira,envidraçados,
àbasedeazeitedepeixe,esuspensosporvarõesde
ferro.Comoexplicaoengenheiroeletricistaeperito
emluminotécnica,MiltonMartinsFerreira,estes
lampadárioseramacesostodasasnoites,excetona
luacheia,quandoaluzrefletidaerasuficiente.
Novas tecnologias
Comacrescentepreocupaçãodosgovernantes
comailuminaçãopública,começa-seaprestarmais
atençãonodesenvolvimentodenovosmateriais
quepudessemfornecerumailuminaçãomais
eficiente,emtermoseconômicosedeluminosidade.
Obviamente,assoluçõesiniciaispermaneceram
noâmbitodofogo.Nãosepensoudeprontoem
outromeiodeiluminaçãoartificial.Modificou-sea
maneiracomoachamapassouaserproduzida.
Umadasgrandesiniciativaspioneirasfoia
lâmpadaArgand.InventadapelosuíçoPierreArgand,
em1783,oequipamentoerabaseadonofatodeque
oarcanalizadoemumcanudo,aquecidoporuma
chama,subiamaisrapidamenteaorecambiar-se,
nofundodessecanudo,comarfrio.Processoque
recebeuonomededuplacorrentedearequeporisso
conseguiamultiplicarseupoderiodeiluminação.
SegundoBonali,alâmpadaapresentava,contudo,
algunsinconvenientes,comoasombraprojetadapelo
reservatório,quedeviaestarsempreacimadonível
doqueimadoreocustoelevado.Essesproblemas
nãoforamefetivamenteresolvidos,mastambém
nãoimpediramainvençãodeterrelativosucessona
época.Provadissoéquequaseimediatamenteaoseu
surgimento,elafoiconvertidaemlustreseapliques,
ajustando-se,comotempo,aospreceitosestilísticos
vigorantesdoséculoXVIII.
Maserasóoinícioemuitasinvençõese
mudançasaindaestavamporvir.Aindanosanos
1700,maisespecificamente,em1792,oinglês
17
WillianMurdochencontrouumamaneirade
armazenarumprodutoquehaviasidodescoberto
umséculoantesquandosedestilouocarvão
fóssil:eraogásaeriforme,que,defato,tornou-se
aprimeiraalternativarelevantedescobertapela
humanidadeparaconseguirsuperarostradicionais
combustíveisquealimentavamailuminação
artificialgeradapelofogo.
OarmazenamentodogáspossibilitouaMurdoch
iluminarsuacasaesuafábrica.Paratanto,foi
necessáriaacriaçãodeumacomplexacanalização
feitadetubosdecobreouchumboquepossuíam
emcadaextremidade,torneirasreguladoraseuma
sériedepequenosorifíciosparaasaídadaschamas.
Apesardosucessoaparente,onovocombustível
apresentavaumgrandeobstáculorelacionadoà
segurança;elepodiaescaparfacilmente,aumentando
oriscodeexplosões.Alémdisso,aimplantaçãodo
sistemaeracara.
Estaspeculiaridades,segundoBonali,limitaram,
noinício,oaproveitamentodomésticodailuminação
agás,masnãoimpediramquefosseutilizadapara
iluminaçãopúblicaedegrandesestabelecimentos
comoteatros,cafésesalõesdefestas.Aprimeira
instalaçãopúblicapermanentebaseadaemgásquese
tevenotíciaaconteceu,porém,algumtempodepois
daideiadeMurdoch,em1807,naruaPallMall,em
Londres.Todavia,apósoempurrãoinicial,ascoisas
fluírammaisrapidamentee,empoucotempo,as
principaiscidadesdaEuropapassaramacontarcom
sistemasdeiluminaçãoagás.
Ossistemasconsistiamemlampiõescolocados
sobrepilastrassituadasnascalçadasepresospor
longosbraçosinstaladosnasesquinasoususpensosno
meiodarua.DeacordocomNataleBonali,osnovos
equipamentoseramsemmuitoluxo,apresentadosem
discretasformasquadradasoutrapezóides,feitascom
ferro-gusaousimplesmentechapasdeferrosoldadas.
Afinal,aintençãoeraapenasiluminarenãoadornar
acidade.Isso,entretanto,nãoimpediucertasruasda
cidade,habitadasporluxuosasmansões,exibirem
equipamentosdeiluminaçãoquemaispareciamobras
dearte.
NoBrasil,ailuminaçãoagáschegouem1854
porobradoBarãodeMauá,queimportouparaa
cidadedoRiodeJaneiroosistemainventadona
Inglaterra.Cácomolá,achou-seporbemnãousar
talinvençãoemambientesinternos,pelorisco
queofereciaavidadaspessoas,deintoxicaçãoe
incêndio.Outrofatorquefreouadifusãodonovo
sistemafoiocustoelevado.Conformeoengenheiro
eletricistaMiltonFerreira,esseobstáculoencontrou
umasaídacomadescobertadoquerosene.Menos
perigoso,elepodiaserusadoemambientesdoméstico
ànoite,semoperigodeespalhar-secomoogáse
causargrandestranstornos.
Antesdecederespaçoparaoutratecnologia,a
iluminaçãoagáspassouporumaprimoramento,
aumentandosuadifusão.Amelhoriaquelevou
aessecenárioveio,sobretudo,comainvenção
do“bicoAuer”,umretinodealgodãoembebido
deóxidosque,alémdepermitirregularasaída
dogás,tornava-seincandescentesemqueimar,
possibilitandoumgrandeaumentodeluminosidade.
Devidoàssuascaracterísticas,quandoodispositivo
começouaserutilizado,apartirde1886,operigo
deexplosõesdiminuiudrasticamente,alémdomais,
porcausadele,pôde-sevirar,pelaprimeiravez,a
chamailuminanteparabaixo,facilitandooprocesso
demanutenção.Outramodificaçãonoslampiõesa
gásqueotornaramequipamentosaindamelhores
paraépocafoioacoplamentodascamisinhascujo
desenvolvimentodematerialpermitiuquealuz
emitidapeloequipamentoapresentasseumbrilho
maisintenso.
Maisoumenosportentosos,comousem“bico
Auer”,ocertoéqueossistemasdeiluminaçãoagás
mudaramoscenáriosdascidades.Deacordocomo
especialistaemiluminação,MiltonFerreira,antesda
chegadadetalinvento,sobaprecáriailuminação
vindadofogo,asatividadesnoturnasdasociedade
emgeral,tantointernascomoexternas,erambem
limitadas.“Ogásfoiaprimeiramanifestaçãode
melhoramentonailuminaçãopublica,agilizandoas
atividadesnoturnas”,diz.
Depoisdele,avidadaspessoassetransformou
emdiversosaspectosemesmoqueseuusotenhasido
duranteumcurtoperíododetempo,suapassagem
foimarcante.ComoescreveBonali,“aluztrêmulae
azuladaemitidapelogásformavaemsuavoltauma
18
era da eletricidade
atmosferadevagolirismo,umaauraromântica,que
juntocomos‘gasistas’,trabalhadoresresponsáveis
pelaoperaçãodoaparelho,tornou-separtedo
folclorepopulardaEuropaedosdemaiscontinentes
quevieramautilizá-la”.
Concomitantementeaogásaeriforme,outros
combustíveisforamlargamenteutilizadosno
séculoXIXparaaproduçãodeluz.Ocarboneto
decálcio(acetileno),porexemplo,substância
orgânica,gasosa,incolor,foiempregadoem
carroças,bicicletas,vagõesferroviáriose,nofim
dos1800,emveículosmotorizados,parailuminar
oscaminhosdaspessoasqueosguiavam.Ao
recebergotasdeágua,oacetilenodáorigem
avivaschamas,oqueotornouumaopção
eficienteparaosveículosemgeral,apesardesua
instabilidadeedoriscodeexplosão.Segundo
Bonali,em1899,ocarroFiat,porexemplo,
jáexibiadoisgrandesfaróisalimentadospelo
carbonetodecálcio.
Opetróleotambémfoiutilizadoparaproduzir
iluminaçãoapartirdofogo.Aexistênciadomaterial
éconhecidadesdeaAntiguidadeemquetextosjáo
descreviamemformabetuminosaflutuandonaágua
doscharcos.Contudo,suadescobertaoficialédatada
de1859,quandoocoronelnorte-americanoEdwin
LaurentineDrake,aoperfurarosolododesertoda
Pensilvânia,nosEstadosUnidos,fezpelaprimeiravez
jorrardochãooóleonegroviscoso.
Aimagemdopetróleoémaisatreladaà
produçãodederivadosdecombustíveisparafazer
funcionaremveículosmotorizados.Nãosemmotivo,
afinaldecontas,ahistóriaprovouseressaasua
maisimportantefunção.Entretanto,nosprimeiros
anosdesuamaciçaextração,serviutambém
dealimentoparaosarcaicosequipamentosde
iluminação.Istoporque,destilado,eletemumalto
graudeabsorçãocapilar,alémdeserarmazenado
facilmenteede,naépoca,tercustobaixo.
SegundoBonali,naáreadeiluminação,
empregou-semaisopetróleonaslâmpadasdemesa,
jáquehaviadificuldadestécnicasemutilizá-lonos
aparelhospênseisporcausadafaltadereservatórios
paraocombustível.Aslâmpadasdemesa,pelo
contrário,jádispunham,naépoca,deumacervoque
contavacomessedepósitoqueeraanteriormente
ocupadocomóleosviçososecheirosos.
A iluminação elétrica
Experimentoscomproduçãodeluzpormeio
daeletricidadejávinhamsendofeitosdesdeo
séculoXVII.Maisespecificamente,comoinforma
oengenheirodeIluminaçãodaGEConsumer&
Industrial,JoséCervantes,desde1650,quando
ocientistaalemãoOttovonGuerikedescobriu
quealuzpoderiaserproduzidapelaexcitação
elétrica.Delápracá,muitosoutrosachados.No
iníciodadécadade1700,porexemplo,oinglês
FrancisHawskbee,realizouumaexperiênciana
qualcolocavaenxofredentrodeumglobode
vidrovazio;fazendoisso,percebeuaformaçãode
luzeesteexperimentofoiconsideradoaprimeira
lâmpadaelétricadesenvolvidanomundo.
Cercadeumséculoemeiomaistarde,em1840,
outroinglês,WilliamGrove,descobriuquetirasde
platinaeoutrosmetaisdevidamenteaquecidos,até
seincandescerem,produziamluzporumperíodo
detempo.UmanodepoisdaexperiênciadeGrove,
maisumavezumbritânico,FrederickdeMoleyns,
patenteouaprimeiralâmpadaincandescente
quesetemnotícia.Contudo,tantooaparelhode
Moleynsquantoosoutrosinventosdesenvolvidos
atéentãoapresentavamlimitaçõestécnicas,ouseja,
aluzproduzidanãopossuíaintensidadeeduração
suficientesparaseremutilizadosemlargaescala
parasubstituíremosequipamentosdeiluminação
existentesnaqueleperíodo.
Asprimeiraslâmpadaselétricasquetiveram
relativosucessocomercialforamasdearcovoltaico.
Inventadasnoiníciodosanos1800peloquímico
inglêsHumphryDavy,elasforambasicamente
utilizadasnailuminaçãopública.Conformeo
engenheiroeletricistaMiltonFerreira,aslâmpadas
aarcovoltaicooperavamemcircuitos-série,
exigindoparaseucontrole,oempregodevários
equipamentosauxiliares,oqueencareciaoprocesso,
alémdisso,elasapresentavamgrandeintensidade
luminosa,nãoprestandodessaforma,aouso
interno.Umaexperiênciarealizada,em1858,no
A Light and Power Company, assim como outras companhias de eletricidade, divulgava os benefícios da iluminação elétrica por meio de propagandas
19
faroldeSouthForeland,naInglaterra,comprovou
adificuldadeemseutilizaroequipamento;sua
queimaerainconstanteeavidaútilmuitocurta,
exigindoconstantemanutenção.
Asoluçãoveiocomonorte-americanoThomas
AlvaEdison.Aideiadalâmpadaincandescentejá
existia,masfoiEdisonqueencontrouofilamento
adequadoparaquealuzgeradafosseintensae
duradoura.Eletentoumaisdeseismilmateriaisde
filamentosalternativosdurantedoisanos,egastou
40mildólaresdaquelaépoca(cercadeUS$1milhão
dehoje)realizandomaisde1.200experiênciasaté
quedescobrisseofilamentodealgodão.Edison
acendeuseufilamentonodia19deoutubrode1879
edoisdiasdepoiseleaindaestavaincandescente.
Posteriormente,buscandomaiorduraçãodo
tempodeiluminaçãodalâmpada,Edisoneos
demaiscientistasdaépocapartiramatrásdeoutros
materiaisparafilamento.Edisonecnontrou,em
primeirolugar,comoopçãoeficiente,ofilamento
debambucarbonizadoqueapresentoumelhor
rendimentoedurabilidadequeofiodealgodão.
Depois,foiavezdofilamentodecelulosesuplantar
obambu.Masnadaquesecomparasseaometal
tungstênio,materialqueganhouadisputa,sendo
utilizadoaindahoje,por,entreoutrasrazões,
apresentarumpontodefusãomaiselevadodoque
3.000°C,ouseja,terumatemperaturadetrabalho
maisaltadoqueosoutrosmateriais.
Onovoinventomostrou-seeficiente,prático
e,sobretudo,seguroelimpo,secomparadoaos
equipamentosdeiluminaçãoquevinhamsendo
utilizadosatéaquelemomento.Porisso,foram
comercializadasemlargaescala,jáem1880,sendo
oprimeirosistemadeiluminaçãointroduzidoem
1882,noviadutoHolburn,emLondres.Nomesmo
ano,ailuminaçãoelétricachegouaNovaYorkpara
iluminaraPearlStreetStation.
Masadifusãodalâmpadanãosedeu
magicamente,paraqueelativesseapelocomercial,
ThomasEdisontevequetrabalharnoseu
aperfeiçoamento.Aorudimentarbulbocomfilamento
dealgodão,foiacrescentado,porexemplo,umabase
rosqueadaparausoemreceptáculos.Ocertoéque,
comainvençãodeEdison,aspessoasconseguiram
prolongarseudiaatéanoitedemaneirasustentável
eeconômica.“Apartirdestedescobrimento,a
rotinadomundocivilizadoeavidadaspessoas
mudaramradicalmente,nãosópermitindoomaior
desenvolvimentomaterialnomundo,mas,ao
longodotempo,umpadrãodevidamelhorparao
serhumano”,dizFerreira.Defato,ainvençãoda
lâmpadaelétricarevolucionoutodoocomportamento
dasociedade,aumentandoohoráriodasatividades
comerciaisouindustriaisepossibilitandoolazere
atividadesesportivasnoperíodonoturno.
Sealâmpadaincandescentelevoualuz
elétricaaosquatrocantosdomundo,alâmpada
fluorescente,quefuncionaàbasedevaporde
fósforo,difundiuaquestãodeeconomianoque
tangeàiluminaçãoviaeletricidade.Istoporque,
tendo,basicamente,amesmaqualidadedeluzquea
lâmpadaincandescente,utilizacercade70%menos
eletricidadequeelaecontacomumavidaútilaté20
vezesmaior.Porisso,setornoutãopopularquanto
alâmpadaincandescentenomundo,utilizadaem
residências,indústriaseestabelecimentoscomerciais.
No Brasil
Aprimeiracidadedopaísacontarcomum
sistemadeiluminaçãopúblicaaeletricidade,ainda
queembrionárioedemodestasproporções,foi
PortoAlegre,istoporque,acapitaldoRioGrande
doSul,jáservia-se,desde1887,daenergiagerada
pelaVelhaUsinaTérmicadaCompanhiaFiatLux.
Paraseterumaideiadecomoomunicípioestava
avançado,deacordocomolivroVidacotidiana
noBrasilModerno,aenergiaelétricaeasociedade
brasileira(1880-1930),asduasprincipaisregiões
doPaís,naépoca,SãoPauloeRiodeJaneiro,
sóforamcontarcomumsistemadeiluminação
elétricanoiníciodadécadade1900.
SãoPaulo,porexemplo,haviainaugurado
seusistemadeiluminaçãoagásem1872ejáse
interessavapelanovatécnicaquesurgia.Demorou,
então,algunsanosatéqueaportasseemterras
paulistanasoinventodeThomasEdison.Nãoque
duranteessaesperanadarelacionadoàeletricidade
tivessedadoascarasemsolopaulista.Pelocontrário,
20
era da eletricidade
diversosprojetosnaáreaforamrealizados,entre
eles,ainstalaçãodelâmpadasdearcovoltaicopela
EmpresaPaulistadeEletricidade,posteriormente
encampadapelaCompanhiaÁguaeLuzde
SãoPaulo,maistardeincorporadapelaLight;a
inauguraçãodosserviçosdaCompanhiaPaulista
deEletricidade,em1888;eailuminaçãodaRua
BarãodeItapetininga,em1905,pelaTheSãoPaulo
Tramway,LightandPowerCompanyLtd.
Noentanto,foisomenteem1911,queaLight,
responsávelpeladistribuiçãodeenergiaelétrica
paraSãoPaulo,fechouseuprimeirocontratocom
ogovernoestadualparailuminaçãopúblicaa
eletricidade.Nesteacordo,curiosamente,estava
incluídaadistribuiçãodeluzparaasavenidas
BrigadeiroLuísAntônioeHigienópolis,duasdas
atuaisprincipaisavenidasdacidade.
Nessesentido,sehouvecertademoraparaa
lâmpadaelétricachegaremSãoPaulo,empouco
tempo,porém,elaseespalhou.Em1914,omunicípio
jápossuía1637pontosdeiluminação,dosquais818
eramdelâmpadasincandescentese819delâmpadas
aarco.Mesmoassim,em1916,oslampiõesagás,
emnúmerode8.605,superavamainda,emmuito,a
iluminaçãoelétrica.
NoRiodeJaneiro,aintroduçãosistemática
daenergiaelétricacomeçouumpoucomaiscedo,
em1904,comasobrasdeconstruçãodaAvenida
Geral,cujofornecimentodeenergiaficouacargoda
empresaBranconnoteIrmãos,queforacontratada
pelacompanhiafrancesaSocietéAnonumeduGaz,
responsávelpeladistribuiçãodogásnacidade,
naépoca.Namesmaregião,fixouresidênciaa
companhiaTheRiodeJaneiroTramway,Light
naPowerCompanyLtd.,empresaquesetornaria
responsávelpelailuminaçãopúblicadacidade.
Independentementedaregiãodopaís,
asituaçãoaindaeraincipiente,mascom
investimentossólidosemunidadesprodutorase
distribuidorasdeenergialocalizadaspróximasàs
áreasaseremiluminadas,ascidadesbrasileiras
foramgradativamentedeixandodeladoos
lampiõesagáseinstaurandoaslâmpadaselétricas.
Sóparaseterumaideia,em1920,segundoo
Censo,umterçodasvilasemunicípiosdopaís
jápossuíailuminaçãoelétrica:noestadodeSão
Paulo,137dos158municípioscontavamcom
iluminaçãoexclusivamenteelétrica;emMinas
Gerais,98dos112;noParaná,26dos29;enoRio
GrandedoSul,39das60cidades.
AcidadedoRiodeJaneiro,porexemplo,entre
1910e1926,viuseunúmerogeraldepontosde
eletricidadequintuplicarnoslogradourospúblicosda
região,passandode3,5milparamaisde16mil,isso
tudopuxadoporumconsumoqueaumentaraoito
vezesnestemesmoperíodo.Aprogressãoacelerada
possibilitou,jáem1920,asubstituiçãototaldogás
pelaeletricidadenailuminaçãopúblicadomunicípio.
Comadesãosistemáticadailuminação
elétricaincandescentenoBrasil,nadamaiscerto
queocotidianodeseushabitantesmudasse
vertiginosamente.Asruasdasgrandescidades,por
exemplo,deixaramparatrás,pelomenosnaquele
momento,aimagemquemédicos,policiaise
autoridadespúblicas,constantemente,lheimpunham,
deumlugarinsalubre,violentoeinseguro.Coma
chegadadaluzelétrica,aruapassoudemeiopara
fim,delugardepassagemrápidaparapontode
encontro,reuniõesefestividades.Podia-se,agora,em
umacidadeemqueosíndicesdecriminalidadeainda
nãoeramelevados,desfrutardepasseiosnoturnosnas
novasgrandesavenidasemarcarencontroseeventos
naspraçasenosparquesurbanos.
Osteatrostambémsebeneficiarambastanteda
iluminaçãoelétrica.Tornaram-semaisclaros,mais
agradáveisemaissegurostambémporquediminuíram
oriscodeincêndiosqueexistiaquandoeram
iluminadosportochasouporlampiõesalimentadosa
gás.Nestecontexto,acidadedoRiodeJaneiroassistiu,
em1909,àinauguraçãodoTeatroMunicipal,em
umestadodegrandedesenvolvimentodolazereda
cultura.Jáem1911foiavezdeSãoPauloinauguraro
seuTeatroMunicipal.Aluzelétricatambémfezsurgir
umasériedenovasdiversõespúblicas,comoossalões,
clubesebilhares.Elescomeçaramaproliferargraças
aonovoinvento,oferecendoàpopulaçãovariadas
opçõesdelazeredivertimento.
Seasopçõesdelazeraumentavamdevidoao
21
Pesquisa• Vida cotidiana no Brasil Moderno, a energia elétrica e a sociedade brasileira (1880-1930), MemóriadaEletricidade• A História da Iluminação Artificial – das origens até o século XX, NataleBonali
adventodaluzelétrica,osproblemasrelacionados
aoprogressoeconômicotambém.Aoladodetodo
avançotecnológicopodia-severamisériageradana
esteiradeste.Aruaestavacadavezmaispovoada
pelasmultidõesqueproliferavamnoscortiçosecasas
decômodos.Cenárioque,deacordocomolivro
aVidacotidiananoBrasilModerno,eravisto,por
muitos,comoumaameaçaàordem,umretratoda
barbáriesedoatraso,resistênciaàcivilização.
Eraprecisotomarumaatitudeparaquea
situaçãonãosetornassemaiscalamitosaparaaqueles
quepodiamdesfrutardosnovosprogressos.Neste
momento,começaaseconsolidararelação,quase
automáticaquesefazhojeemdia,entresegurança
eruasiluminadasànoite.Diantedisso,asociedade,
preocupadacomseuprópriobem-estar,aumentoua
cobrançasobreoEstado,buscandoacontinuidadee
aexpansãodosbenefíciosdailuminaçãoelétricadas
viaspúblicas.
Umadasformasdeseminimizarasmazelassociais
éimpedirqueseusefeitossejamsentidosporqualquer
pontodacadeiasocial,iluminando-seoslogradouros
públicos,torcendoparaqueaviolênciatenhaosolhos
feridoscomaclaridadedaslâmpadaseseafaste.
Éprecisolembrarqueaeletricidadenãogera
apenasluz,elatambémproduzmovimentopara
asmáquinas,quetrazaumentodeprodução.O
empregadorvendemaismercadoriaetemmais
lucrodiantedeummercadoconsumidorcadavez
maior;oempregado,queétambémoconsumidor,
temmaishorasdetrabalhoe,consequentemente,
maisdinheiroparaconsumir.Dessaforma,para
aumentaraprodução,eraprecisotrabalharmais
tempo,eraprecisotrabalhartambémànoitee,
paraisso,aluzelétricasetornouimprescindível.
Semaistrabalhotrazmaisdinheiro,ailuminação
elétricanãodeixoudecontribuir,dessaforma,para
amelhoriadascondiçõeseconômicasdooperariado.
Foto de 1930 que mostra a iluminação pública da Rua Viana Drummond, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro
a iluminaçãO dOméstica fOi Beneficiada cOm a
descOBerta dO querOsene. menOs periGOsO, ele pOdia ser usadO em
amBientes dOmésticO à nOite, sem O periGO de espalhar-se cOmO O Gás e
causar Grandes transtOrnOs.
Luminária residencial para uso de gás, na parte superior, e eletricidade, na parte inferior.
22
cidade em movimento Por Flávia Lima
Entraves como carência de pesquisas e interesses políticos impediram o desenvolvimento dos veículos elétricos, nascidos em meados do século XIX, antes mesmo dos carros a combustão interna. Preocupação ambiental e crises da indústria do petróleo abriram caminho para um novo recomeço.
ELETRICIDADE SOBRE RODAS
Senador George P. Wetmore, em um veículo elétrico chamado “Krieger Electric Landaulet”, em Washington, nos Estados Unidos, no ano de 1906.
23
Emboraoscarrosdepropulsãoagasolina
tenhamdominadoasruasdetodoomundo,
elesnãoforampioneirosemsuaessência.Os
veículoselétricos–quevoltamagoraàcena
comoumasoluçãoecologicamenteviável–
passamlongedeserumanovidade.Háregistros
dequeoprimeiroindíciodeveículoelétricoseja
de1827naHungria,tendoganhadomercadoa
partirdofinaldoséculoXIXcomfabricação,
temporariamente,próspera.
Efetivamente,apartirdasegundametadedo
séculoXIX,deu-seinícioàeradaeletricidade
quesetornariapermanente.Orecurso
energéticoaplicado,especialmente,coma
invençãodomotorelétricoesuadifusãocom
aprimoramentos,revolucionoutodasasáreas
dasociedade.Tendoomotorelétricocomo
mecanismofundamentalaodesenvolvimento
daenergiaelétricaaplicada,aintrodução
dessaeletricidadenosprocessosprodutivos
enotransportedeu-sequasequeaomesmo
tempo.Nasmáquinasquecomeçamasurgir
nasdécadasfinaisdoséculoXIX,motores
maismodernoscolocavamempráticaos
conhecimentosdoeletromagnetismo.Omesmo
ocorreunotransportequandoaeletricidade
começaatracionarasprimeiraslocomotivas,
especialmenteasdecarga,sendotambém
aplicadasaoscarrosdepasseio.
Aeletricidadeéomaisantigométodode
propulsãodeautomóveisqueseconhece.A
tecnologiapodeseratribuídaaalgunscélebres
cientistas,acomeçarpelohúngaroinventor
domotorelétrico,ÁnyosJedlik,quemteria
primeirocriadooprincípiododínamoelétricode
autoexcitação,em1827.Comosuacriaçãonãofoi
noticiadaantesdonomedeSiemens,esteficou
comafamadoinventomaistarde,em1861.
Umpassomaisconsistentefoidado,porém,
pelofísicofrancêsGastónPlanté,aocriar,em
1859,abateriarecarregáveldechumbo-ácido,
amesma–comaprimoramentos–utilizadaaté
hojeemautomóveisconvencionais.Adescoberta
abriucaminhoparaoscarroselétricos,que
ganharamaEuropaeosEstadosUnidospor
trêsdécadas,tendosidoaFrançaeaInglaterra
osprimeirospaísesaapoiarodesenvolvimento
dessaindústria.
Osamericanos,naverdade,sóderamatenção
aoveículoelétricoapósA.L.Rykerintroduziro
primeirocarroaeletricidadenopaís,em1895.A
partirdeentão,ointeressecresceuedecidiu-se
investirfortementenanovidadeentreosanos
1890easduasprimeirasdécadasdoséculoXX.
Paraseterideia,em1897,osveículoselétricos
ganharamsuaprimeiraaplicaçãocomercialnos
EstadosUnidoscomumafrotadetáxisdeNova
York,constituídapelaElectricCarriageand
WagonCompanyofPhiladelphia.
Ofatoéque,antesdodesenvolvimentodos
automóveismovidosacombustíveis,oselétricos
foramumasoluçãobastanteaplicada.Odiretor
doInstitutoNacionaldeEficiênciaEnergética
(Inee),JaymeBuarquedeHollanda,conta
que,atéaviradadaqueleséculo,haviamuitos
veículoselétricosemcirculação.Estima-seque
40%doscarrosvendidosnesseperíodoeram
elétricos,sendoorestanterepartidoempartes
praticamenteiguaisentreveículosavaporede
combustãointerna.
Carros elétricos versus carros a combustão interna
OfimdoséculoXVIII,marcadopela
RevoluçãoIndustrial,tambémdeixouseu
Carro a vapor Bordino, de 1854
24
cidade em movimento
legadonotransporte.Símbolodestarevolução,
amáquinaavaporexerceugrandeinfluência
sobreosmeiosdetransporte.Em1769,ofrancês
Nicolas-JosephCugnotteriausadoummotora
vaporparamovimentarumveículopequeno,de
trêsrodas,mecanismoqueganhoumaisênfase
naslocomotivasdoiníciodoséculoXIX.Eassim
comoaslocomotivasconquistaramterritório,
osveículosavapor,tambémofizeramantes,
penetrandoomercadodeautomóveisdepasseio
edeserviço.Estesveículosmovidosavapor
concorreriammaistardecomoselétricosecom
osdecombustãointerna,tendoesteúltimosido
concebidonaAlemanha,porvoltade1885,
eobtidosucessodevido,principalmente,a
HenryFord,quepassouafabricá-losemsérie,
vendendocercade15milhõesdeunidadesde
umúnicomodelo,oconhecidoT,entre1908e
1927.
Desenvolvidosquasequesimultaneamente
emumperíodopropícioàmaterializaçãodas
pesquisascientíficasquebrotavamdasmentes
iluminadas,oscarroselétricoseàcombustão
internaandaramjuntosporalgumasdécadas
apartirdosanos1890,tendooprimeiro
sustentadoaposiçãodefavoritoporanos.Isso
porqueoselétricoschegaramaalcançaraltas
velocidadeseavencergrandesdistâncias.Um
dosmaisnotáveisrecordesfoiatingidopelo
conhecido“JamaisContente”,criadopelofrancês
CamilleJenatzy,que,em29deabrilde1899,
alcançouavelocidadede105,88km/h,sendo
oúnicoveículoaultrapassaramarcados100
km/hnaépoca.
Apesardofeito,demodogeral,osveículos
nãoapresentavamgrandepotencialde
velocidade–oquenãoeraumadesvantagem
propriamentedita,jáqueosautomóveisda
épocaeramempregadosemzonasurbanas,
relativamentepequenas.Elesapresentavamainda
algumasvantagensemrelaçãoaosconcorrentes:
nãoproduziamvibrações,cheirooubarulho.
Alémdisso,trocaraembreagememcarros
movidosagasolinaeraapartemaisdifícildesua
dirigibilidade,açãonãoexigidapeloselétricos.
Naviradadoséculo,eramoscarroselétricos
quepossuíammotorcommaiordesempenho.
Hollandacontaqueoveículoacombustãoainda
erapoucodesenvolvido,apresentavaalguns
problemas,alémdenãocontarcomcombustíveis
padronizados–atéoamadurecimento
daindústriadopetróleo,empregavam-se
principalmenteoqueroseneeoetanol,este,por
sermaishomogêneo.
Oscarroselétricostornaram-sepopulares
entreaspessoasmaisbem-sucedidasdaépoca,
queosempregavamnascidadespornãoexigir
grandesvelocidades.Eleseramospreferidos
tambémporquenãoseexigiaesforçomanual
paradarpartida,aocontráriodosveículos
agasolinaquedispunhamdeumamanivela
quedemandavagrandeesforçofísicoparaser
acionada,comointuitodedarpartidanocarro.
Oproblemaéqueessaalavancaexigiamuita
forçafísicadoscondutores,chegando,inclusive,
aprovocaracidentesnosusuários,comofraturas
nasmãosenosbraços.Porestemotivo,os
elétricoseramosfavoritosdasmulheres,que
tambémeramseduzidaspelaspropagandas,
asquais,frequentemente,exploravamessa
característicaaseufavor.Hollandacontaqueo
próprioHenryFordnãoadmitiaquesuaesposa
dirigisseumcarrocommotordecombustão
interna,apenasoelétrico,receosodequeelase
machucasseaomanejaramanivela.
Porsermaisconfortávelefácildemanusear,
Thomas Edison e um carro elétrico em 1913.
25
comparadoaosoutrosmeiosdetransporteda
época–avaporeacombustão–,oveículo
elétricotornou-seasoluçãofavoritado
transporteurbano,principalmenteporsua
simplicidade.“Suaconstruçãoeoperaçãoeram
maissimplesdoqueasdeveículosavaporou
acionadospormotoresdeexplosão.Entretanto,
suagrandelimitaçãoeraaautonomiade
percurso,devidaàpequenacapacidadedas
bateriasemrelaçãoaseupesoetamanho”,
explicaopresidentedaAssociaçãoBrasileirado
VeículoElétrico(ABVE),PietroErber.
FoinosEstadosUnidosqueoveículoelétrico
ganhoumaisaceitação,chegandoaregistrar,no
iníciodadécadade1900,33.842carroselétricos.
Paraseterideia,oconceitofoialémdoscarros
depasseio.Emmeadosde1920,haviamaisde
quatromilcaminhõesdeentregamovidosà
eletricidadeemNovaYork.AFrançatambém
investiunatecnologia,chegandoainstalar
cercade700pontosderecarga,noanode1901.
NoBrasiltambémtemosregistrosdeveículos
elétricos,porexemplo,oscaminhõeselétricos,
pesandoquatrotoneladas,querealizavam
amanutençãodaredeaérea,em1906,pela
TheRiodeJaneiroTramway,lightandPower
CompanyLimited.
Ocarroelétricoperdedefinitivamentea
corridacomocarroacombustãointernaa
partirde1912,quandoasvendascomeçarama
definhar.Umadasjustificativasquesedãoao
declíniodocarroelétricoéaescassezdeenergia
elétrica,porvoltade1912,quandoasresidências
foraminvadidasporequipamentoselétricos,
prejudicandoapopularidadedosautomóveis.
Erberacrescentaqueamelhoriadodesempenho,
areduçãodocustodosmotoresdecombustão
interna,amaiorautonomiaeainvençãoda
partidaelétricaparaessesmotoresdeterminaram
oabandonodatraçãoelétricaemautomóveis.
Soma-seaissoofatodeque,emcomparação
comumFordT,porexemplo,umcarroelétrico
chegavaacustaratétrêsvezesmais.Outros
fatosisoladostambémcontribuíram.Nadécada
de1920,aGeneralMotorsadquiriuosistema
debondeselétricosdaCalifórniaapenaspara
desativá-loeintroduzirousodeveículos
movidosacombustíveisfósseis.
Idas e vindas
Nadécadade1910,AlfredP.Sloan,o
maisduradouropresidentedaGeneralMotors,
inseriuummotorelétriconapartidadoveículo
acombustãointerna,desenvolvendoassimo
motordearranque.Anovatecnologiafacilitou
avidadoscondutoresemarcouoiníciodo
sucessodessemodelo.Adescoberta,associada
aofortalecimentodaindústriadepetróleofez
oscarrosacombustãodeslancharem,ganhando
mercado,emdetrimentodosveículoselétricos,
cujaprincipaldeficiência–abateria–não
haviasofridoaprimoramentossignificativos.
Númerosdaindústriadepetróleodadécada
de1920mostramqueaquedademercadodos
veículoselétricosestádiretamenterelacionadaà
estabilidadeeaoaumentodaproduçãomundial
depetróleo.
Éimportantelembrarque,mesmocoma
decadênciadoscarroselétricos,nuncasedeixou
defabricá-los,masparaaplicaçõesespecíficas.
PietroErberafirmaqueelespassaramaser
empregadosemcarrospequenosdeserviço,
principalmentenaEuropa,comocarrosde
carteirosedeleiteiros.“Oscarroselétricossão
ideaisparasetrabalharnoregimedoandae
Apreciador das novas tecnologias, Santos Dumont trouxe o primeiro carro elétrico para o Brasil, em 1891.
26
cidade em movimento
para,pois,parada,abaterianãodescarrega,
enquantoocarroacombustívelnãoéindicado
paraatuarnesseritmo”,compara.Emseguida,
foramtambémempregadoscomoempilhadeiras
ecomomeiodelocomoçãoemcamposdegolfe,
defuteboleemalgumasgrandescompanhias.
Dequalquermaneira,ointeressepor
pesquisassobrebateriastambémsedeixou
abaterenãoobtevegrandesevoluções.
Diferentementedabateriautilizadanos
automóveiscomoapoioaomotordearranque,
abateriadoveículoelétricodemanda
característicasespeciais,entreelas,devetera
propriedadedecargaededescargacontínua,
entretanto,comaspesquisasabandonadas,o
veículoelétricocontinuavaaapresentarpouca
autonomia,principalentraveaoseusucesso.
Orenascimentodosveículoselétricosse
dariaapartirdadécadade1970,comacrise
dopetróleo.DeacordocomoengenheiroElifas
GurgeldoAmaral,osproblemasambientais,
especialmenteoaquecimentoglobal,reforçaram
osinvestimentosempesquisas.Ainda,a
instabilidadedofornecimentodepetróleoe
aaltaoscilaçãodopreçocausadopelacrise
financeiramundialintensificaramanecessidade
denovosmeiosdetransporteefontesdeenergia
diferenciadas.Segundoele,todosessesfatores
favoreceramabuscadenovastecnologias,
fontesalternativasdeenergia,comoosveículos
flex,motoresmaiseficientes,veículoselétricose
híbrido,entreoutras.
Outropontoafavoréosurgimentodos
celularesedosnotebooks,nofinaldosanos
1980,queacabaporreacenderaspesquisas
sobrebaterias.“Osprimeiroscelulareseram
verdadeirostijoloseeracomumteruma
bateriareservanabolsaporcontadasuapouca
autonomia”,lembra.Nesseperíodo,aindústria
começaaapresentardemandaporbateriasmais
leveseentãoosestudosrecomeçam.Asbaterias
modernizaram-seeissoreavivouaspesquisas
tambémsobreasbateriasparaveículos(elétricos
ounão).
Éimportante,entretanto,relatardoisgrandes
saltoscomrelaçãoaorecomeçodocarroelétrico:
umestímulonorte-americanoeoutrofrancês.No
iníciodadécadade1990,foipromulgadauma
leinoEstadodaCalifórnia,nosEstadosUnidos,
quedeterminavaquecertopercentualdoscarros
nasruasdeveriateremissãozerodepoluição.
Alegislaçãonãofalavaemcarroelétrico,
masemboratenhahavidoalgumassoluções
propostas,naprática,foiadocarroelétricoque
maisseadequou.Ainiciativa,entretanto,nãofoi
muitobemrecebidaegeroupolêmica,indoparar
noSupremoTribunaldosEstadosUnidos.Aação
serviuparaqueosfabricantesseentusiasmassem
eprocurassemsaídasparaseobteratalemissão
zero.
AmaisfamosadelasfoiocarroEV1
(originalmente,electricvehiclenumber1,ou
veículoelétriconúmero1),produzidopela
GeneralMotors,masagora,diferentemente,
dosprimeirosmodelosdoiníciodoséculo,
esteprotótipopossuíaumasériedeelementos
modernosos.Ocarrofoilançado,masnão
obtevesucessonasvendas,poisopacotede
bateriasaindaeramuitocaro.Asoluçãoentão
encontradapelafabricantefoialugaroveículo,
istoé,nolugardevendê-lo,ocarroseria
emprestadoaoconsumidoremtrocadeumataxa
mensal.Aalegaçãoeradequeoaluguelseria
compensadopelaeconomiacomcombustível.
Oveículopossuíaautonomiademaisde
100quilômetroseotempoderecargaerade
aproximadamenteoitohoras.
Diversasempresastambémseenveredaram
Pela simplicidade de manuseio, propagandas incentivavam as mulheres a consumir carros elétricos. Este é um anúncio da Detroit Electric, em 1912.
27
Veículo elétrico puroSão aqueles que usam apenas a energia elétrica como
fonte de tração:
• Podem usar bateria ou células fotovoltaicas
• São recarregáveis
• Baixa autonomia
• Alto custo e baixo desempenho
• Não emitem nenhum tipo de poluente
híbriDoUtilizam a fonte elétrica e o combustível convencional.
• Principal solução em curto prazo em veículos elétricos
• Bom desempenho
• Boa autonomia
• É poluente
híbriDo plug-inUtilizam a fonte elétrica e o combustível convencional.
• Bateria pode ser alimentada por fonte externa (na
própria rede elétrica convencional)
• Atenua as limitações das baterias
um carrO elétricO que circule aprOximadamente 15 mil km pOr anO cOnsOme cerca de 300 kWh pOr mês, O que equivale aO cOnsumO de um aparelhO de ar-cOndiciOnadO. ele deverá ir aO encOntrO dO cOnceitO de smartGrid (redes inteliGentes), pOis pOderãO ter um efeitO de estaBilizadOr na rele elétrica distriBuída, incOrpOrandO funções, em uma residência, cOmO as de um nOBreak, pOr exemplO.
eficiência e emissões De Veículos elétricos
Veículo elétrico a bateria
• Eficiência: ~50% a 70%
• Não emite no local em que circula
Veículo elétrico híbrido
• Eficiência: pelo menos 30% a 50% mais km/l que o
convencional
• Emissões: menos 40% a 90% que o convencional, dependendo
do poluente
Henney Kilowatt, o primeiro carro elétrico regulado por transistores. Foi comercializado entre 1959 e 1962.
Prius: carro híbrido lançado pela Toyota em 1997. Conforme a fabricante, o próprio veículo recarrega a sua bateria, reunindo energia do calor dos gases de escape e energia cinética durante a travagem.
28
cidade em movimento
pelomesmocaminho,criandocarroscomesse
conceito.Apesardisso,em2003,aGeneral
Motorsdecidiuquenãovaliamaisapena
continuarcomessesistemaeresolveuretirar
osveículosdomercado.“AGMhaviadado
saltosespetaculares,comváriaspatentes,mas
resolveramjogartudofora,comummovimento
quefoilamentado,jáqueelespoderiamestar
hojemuitomaisàfrentedeondeestão;oVolt
éonovomodelocriadopelamontadora,mas
elestiveramquecomeçartudodenovo”,avalia
JaymeBuarquedeHollanda,doInee.
Osegundopontoimportantenahistória
doscarroselétricosveiodosfrancesesque,
preocupadoscomaquestãodapoluição
ambiental,lançaramumprogramaque
incentivavaalgumasempresas,comooserviço
decorreios,porexemplo,autilizarcarros
elétricosemsuasfrotasegrandesmontadoras,
comoRenaultePeugeot,sentiram-seencorajadas
eaderiramaocarroelétrico.Aquitambéma
ideianãovingoue,mesmotendoproduzido
cercadeseismilcarroseerguidoseletropostes
pelopaís,aexperiêncianãofoibemconduzidae
ficounamemória.
Maisumfatoisoladoequefuncionoucomo
umsolavancoparaatecnologiadaeletricidade
aplicadaaosveículoselétricosfoiincentivado
pelaatmosferadepreocupaçãocomoplaneta
transmitidapelaEco92,ocorridanoRiode
Janeiro.Poucotempodepois,oentãopresidente
dosEstadosUnidos,BillClinton,criouum
programaquedefiniaoseguinte:paracadadólar
investidoempesquisaedesenvolvimentodecarros
elétricos,ogovernoinvestiriamaisumdólar.
Aúnicacondição,estabelecidapelopróprio
governo,eradequeessecarrodofuturo
alcançasseamarcade80milhasporgalãode
gasolina–amédiadeconsumonaquelaépoca
erade23milhasporgalão.Praticamentetodos
osfabricantesentraramnojogoelevaram
variadosconceitosdeautomóveis,garantindo
que,emumfuturopróximo,trabalhariamcom
orendimentoproposto.Ocuriosoéquetodosos
modelosapresentadoseramdafamíliahíbrida,
istoé,incorporaosdoisconceitos:combustão
eeletricidade.Atecnologia,aliás,nãoeratão
original,jáque,em1917,oprimeiroveículo
híbrido(gasolina–eletricidade)foilançadopela
WoodsMotorVehicleCompany,emChicago.
Oshíbridosnãoderamcertocomercialmente,
poisofereciammuitopoucopeloseupreço:não
atingiamgrandesvelocidadeseapresentavam
dificuldadesdeuso.
Um novo conceito
Emboraaindústrianorte-americananão
tenhaprosseguidocomafabricaçãodosmodelos
desenvolvidos,oeventodesencadeoureações
dooutroladodomundo.NoJapão,aHonda
eaToyota,receosasdeficaremaquémdos
acontecimentosglobais,trataramdeselecionaros
melhoresengenheirosafimdeestudarosveículos
elétricos.Nasceu,então,nofinalde1997,oPrius,
oprimeirocarrohíbrido(movidoacombustão
eaeletricidade)produzidopelaToyota,tendoa
Hondanoseuencalço,comacriaçãodoInsight,
ummodelohíbridomaisesportivoecomsoluções
técnicasdiferenciadas.Começaentãoumanova
geraçãodecarros,oschamadosveículoshíbridos.
JaymeBuarquedeHollandalembraqueo
movimentoiniciadonaCalifórniateriasidoo
principalestímuloaosveículoselétricos,somado
àvoltadaspesquisassobrebaterias,reanimada
comoadventodoscelularesecomputadores
portáteis.“Atualmente,há2,5milhõesdePrius
[daToyota]emtodoomundo,alémdeoutros
Princípio de veículo elétrico idealizado por Ányos Jedlik em 1827.
29
Pesquisa•DocumentárioQuem matou o carro elétrico?DireçãodeChrisPaine.Produtora:ElectricEntertainment•Artigo“Umavisãogeraldosveículoselétricos,híbridosecélulaacombustívelnoBrasil”,deMaxMauroDiasSantoseGabrielGilvanderTomazGonçalvez(Disponívelemwww.simea.org.br)AssociaçãoBrasileiradeVeículosElétricos–www.abve.org.brInstitutoNacionaldeEficiênciaEnergética–www.inee.org.br
modelosdediversosfabricantes”,comemora.
Percebendoatendênciadepreocupaçãocom
omeioambiente,notandoatecnologiaque,
emboratenhanascidohámaisdeumséculo,
continuadevanguardaeacompanhandoas
recentespesquisas,osfabricantesdeautomóveis
passaramaseassociaraosprodutoresde
baterias,dandoinícioaumaverdadeiracorrida
nosentidodeaperfeiçoá-las–inserindomais
cargaereduzindoseupesoetamanho–eformar
osmelhoresconjuntosautomotivospossíveis.
Emtodoomundo,montadorasestão
desenvolvendoefabricandoseusveículos
elétricos;concessionáriasdeenergia,emparceria
comfabricantes,tambémestãocriandosuas
tecnologias.NocasodoBrasil,entretanto,
alémdaquestãodabateria–que,notocanteà
autonomia,aindaprecisaseraperfeiçoadapara
concorrercomosautosdecombustãointerna
–háoutroentravesignificativo:oImposto
sobreProdutoIndustrializado(IPI)paraesses
veículoséde25%,aopassoqueodeumcarro
convencionalédeaproximadamente7%.
ComoescreveramMaxMauroDiasSantose
GabrielGonçalves,emumartigosobreotema,
“noiníciodahistóriadoautomóvel,osveículos
elétricosocupavamlugardedestaque,enquanto
omotoracombustãointernaerausadoem
competiçõeseemtrabalhosacadêmicos”.Os
papéisforaminvertidos,entretanto,apesardas
barreiras,especialistasapostamnatecnologia
comoumfuturocerto.
Comparativo: automóveis a bateria e a Gasolina
Faixa de consumoConsumo médio
Consumo mensal (20 mil km/ano)Custo mensal de combustível
Gasolina
7 a 10 km/l8 km/l208 l
R$ 458
Elétrico
3 a 10 km/kWh5 km/kWh333 kWhR$ 153
Fonte: ABVE
motor elétrico
motor elétrico
bateria recarregável
gerador
FunCionamento de um veíCulo elétriCo
30
VIDA ELETRÔNICA
evolução Por Lívia Cunha
A eletrônica começou a ser aplicada em equipamentos elétricos
com maior intensidade depois da década de 1950, quando um
dos principais componentes eletrônicos foi desenvolvido: o
transistor. Graças a ele, os aparelhos eletroeletrônicos entraram
tão fortemente na vida cotidiana que hoje é difícil imaginar o dia
a dia sem eles.
31
Oscomputadoressempreinspirarammuitoa
criatividadehumana,sejanaáreatécnicaquantona
cultural.Duranteoperíodoáureodedesenvolvimento
dessasmáquinas,emmeadosdoséculoXX,quando
ocineastaStanleyKubricklançou2001: uma
odisseia no espaço,em1968,umdosfilmesmais
marcantesdahistóriadocinema–consideradosua
obraprima–,vislumbrava-sequalseriaoimpacto
dessescomputadoresnavidadaspessoas.Apesarde
Kubrickterapresentadoemsuaobraatemáticado
medodequeatécnicaganhassevidaprópria,que
acriaturadominasseocriador,oquereabriuuma
sériedequestionamentossobreéticaelimitesde
desenvolvimentodaciência,esteéumreceioantigo
nahistóriadahumanidade.
Fazendoumparalelocomocientificismo,que
ganhouforçanosséculosXVIIIeXIX,acreditava-
sequeaciênciapoderiacurartodososmales
domundo.Omesmosentimentoenvolveua
computação,entreasdécadasde1950e1970,ea
genéticaeaclonagem,nofinaldoséculoXX,temas
quetambémforamabordadosemdiversasobrasde
ficçãocientífica.
Odesenvolvimentotecnológicodainformáticaea
corridaespacialprovocadapelaGuerraFria(1945-
1991),emqueamericanosesoviéticostentavam
provaroseupoderesupremaciapelaconquistado
espaço,serviudepanodefundoparaqueKubrick
elaborasseseufilme,noqualcomputadorestomam
vidaedominamhumanos.Noperíodo,devidoao
desenvolvimentodenovoscomponenteseletrônicos,
oscomputadorescomeçavamareduzirdetamanho,
arealizarmaisoperaçõeserondavamoimaginário
popular.Estavamprestesasetornarelementos
pessoaisindispensáveisparaavidacontemporânea.
Masnãosóeleschegavamàscasaseàsvidas
modernas.Eletrodomésticoseeletroeletrônicosse
afirmavamcomopeças-chavenaformaçãodosbens
deconsumodasfamíliasdametadedoséculopassado.
Masparaqueeleschegassemaesseestágio,
deindispensabilidadenavidamoderna,inúmeros
pesquisadorescontribuíramcomprojetos.O
computador,noentanto,éconsideradoumainvenção
seminventor,tamanhaaquantidadedepessoasque
contribuíramaolongodeanos.
Mulheres operam um dos grandes computadores do meio do século XX, o Eniac
32
evolução
Origens
Oconceitodocomputadormoderno,paraseter
umaideia,nasceumuitosanosantesdeKubrick,mais
precisamenteem1822,quandoCharlesBabbage,
matemáticoeprofessordaUniversidadedeCambridge,
idealizouaMáquinadasDiferenças.Oprotótipo
imaginadoseriaumdispositivomecânicobaseado
emrodasdentadasquepoderiacomputareimprimir
extensastabelascientíficas.
AtéBabbage,osdispositivoscriadospara
computarecalculareramequipamentossimples.
Seuprojeto,de1822,queriamais.Maisdoqueser
umamáquinadecálculoequeresolvesseproblemas
matemáticos,aMáquinadasDiferençasseriacapaz
deexecutarumaamplagamadetarefas.Usandoum
sistemanuméricodecimal,funcionariapelogirode
umamanivela.Comoprotótipo,eledesejavalevara
comunidadecientíficaaumnívelmaisavançadode
desenvolvimentotécnico.
Oprojetodoequipamentoéconsideradoo
primeirocomputadormoderno,quecontariacom
memória,programas,unidadedecontroleeperiféricos
desaída.Masamodernidadefoiexatamenteoque
inviabilizouoaparelho.Comoamáquinaeraavançada
demaisparaosrecursosdaépoca,elacomeçouaser
construída,masnãofoiconcluídaporBabbage,devido
àslimitaçõestécnicasdoperíodo.
Odesenvolvimentodainformática–daqual
Babbageéconsideradoo“pai”pelaMáquinadas
Diferenças–edoscomputadoresmodernosestá
diretamenterelacionadoaosurgimentodaeletrônicaeà
aplicaçãodelatantoemequipamentosdonossodia-a-
dia,taiscomotelevisoreseaparelhosdesom,quantono
setorelétricodepotência,comaparelhosmaiscomplexos,
responsáveispelasupervisãoecontroledeindústriasdas
áreasdegeração,transmissãoedistribuição(GTD).
TalvezosinventoresdoséculoXIXnãoimaginassem
queemumfuturonãotãodistantetodosutilizariam
equipamentosrecheadosdecomponenteseletrônicosno
seudiaadia.Paralongedasprevisõesfuturistasdecarros
voadoresedefamíliasquepassariamfériasemoutros
planetas,oestágioalcançadonesseiníciodoséculoXXI
mostraumatecnologiainclusivaqueaparececadavez
maisparafacilitaravidahumana:computadorespessoais
eportáteis;telefonescelulares,que,entreasdiversas
funções,decâmera,gravadoreportaarquivos,também
servemparaconversar;aparelhoseletrodomésticos,que
vieramfacilitaretornaravidahumanamaispráticae
rápida;entretantasoutrascriações.
Masparachegarmosàsatuaismáquinas,dos
componentesedossistemasinteligentes,milhares
deanosdedesenvolvimentoforamtranscorridos.
Dosdispositivoscompletamenterudimentares,
passandopelosmanuais,eletromecânicos,eletrônicos
aosmicroprocessados,queincluemverdadeiros
microcomputadoresnosaparelhos,cadavezmais
compactos,passaram-semilênios,comintensificação
dodesenvolvimentonosúltimosséculos.Os
computadores,porexemplo,umdosprincipais
símbolosdamodernidadeeletrônicaatual,nadamais
sãodoqueaevoluçãodemáquinasdecalcular,que
remontamaosprimeirosdispositivosdecálculo.
Desdeaauroradohomem,comoapré-história
(próximoa4.000a.C.)échamadanaobradeKubrick,
oserhumanosentiunecessidadedeefetuarcálculos.
Inicialmente,eramutilizadaspequenaspedrase
gravetos,agrupadoseseparados,parafazercontas
comosomaesubtração.Osdedostambémeram
utilizadosnessatarefa.Masosprimeirosregistros
doquefuturamenteculminariamnainvençãodo
computadormodernosãodoorienteantigo.Nessa
épocaapareceuoprimeirodispositivomanualde
cálculo:oábaco.Nãoháprecisãoquantoàdata,mas
háregistrosqueeleteriasurgidonaMesopotâmia
(atualIraque),em5.000a.C.,noEgito,próximoa3.500
a.C.,ouaindanaChina,pertode2.600a.C.
Compostoporumamolduracombastões
ouaramesparalelos,dispostosnavertical–que
correspondiamàsunidades,dezenas,etc.,nosquais
eramcolocadoselementosmóveispararealizara
contagem,podendoserfichas,bolas,contaseassim
pordiante–,aequaçãoerafeitapelacombinação
doselementos.Oábacofoiométododecálculomais
rápidoatéoséculoXVII,quandosurgiuaRéguade
Cálculo,umdispositivomanualparacontasrápidas.
CriadapeloinglêsWilliamOughtred,entreas
décadasde1620e1630,elapermitiaqueassoluções
dosproblemasnuméricosfossemdadaspormeiode
duasguiasgraduadasdeslizantes.AcriaçãodaRégua
deOughtredfoipermitidagraçasàdescobertados
logaritmospelomatemáticoescocêsJohnNapier,na
décadade1610.Atabeladelogaritmos,elaboradapor
Napier,foicombinadacomodispositivodeWilliam,
dandoorigemàRéguadeCálculo.
Emseguida,surgiramascalculadorasautomáticas,
Os aparelhos eletroeletrônicos
criaram uma nova forma
de consumo e alteraram
significativamente a vida e
as relações de trabalho das
sociedades seguintes. A revolução
tecnológica é um dos fatores
que tende a alterar padrões
de consumo e hábitos de vida,
ajudando a explicar as alterações
que a sociedade sofreu
33
comoaPascalina,aprimeiramáquinaautomática
decálculo.Eraumequipamentocomrodasdentadas
quesimulavamofuncionamentodoábacoerealizava
contasdesomaesubtração.Anosmaistarde,na
décadade1670,comoevoluçãodaPascalina,surgiu
achamadaCalculadoraUniversal,capazderealizar,
alémdasfunçõesbásicas,amultiplicação,adivisãoea
raizquadradadasequações.
Essesequipamentoseosoutrossubsequentes
fizeramtécnicaseconhecimentosseremaprimorados
edifundidos.Essacadeia,formadaporfísicos,
matemáticoseoutroscuriososeinteressadospelo
mundotécnico,permitiuqueCharlesBabbage
projetasseoprimeirocomputadormoderno.Isso
porquenenhuminventoratuousozinho.Todosderam
continuidadeatrabalhosanterioresedeixaramabertos
oscamposparapesquisasedesenvolvimentosfuturos.
Oprimeirocomputadortotalmenteautomático
apareceusomentecemanosdepoisdoprojetoda
MáquinadasDiferenças.OAutomaticSequence
ControlledCalculator,conhecidocomoMarkI,foi
iniciadoem1939naUniversidadedeHarvard,por
HowardAiken,econstruídoemparceriacoma
Marinhaamericana.Com17metrosdecomprimento
por2,5metrosdealturaeumpesodecincotoneladas,
ocomputadorlevavadetrêsacincominutospara
fazerumacontademultiplicação.Maseratotalmente
automáticoenãonecessitavadaintervençãohumana
pararealizaçãodeseuscálculos.
Essesavançosrepresentamaeconomiadehoras
detrabalhoparaostrabalhadores.Issoporqueaté
quemáquinaseequipamentoscomoestesfossem
desenvolvidos,asatividadesqueenvolviamnúmeros
levavamhoras,àsvezes,diasparaseremrealizados.
Masnesseperíodo,entreosanos1930e1940,toda
afuncionalidadequeoscomponenteseletrônicos
poderiamagregaràvidahumanaeraaindapotencial.
Essesavançosedescobertasestavamconcentrados
nasmãosdepoucosenãohavia,ainda,ointeresse
depopularizar.Oconhecimento,porinfluênciadas
guerrasmundiais,estavarestritoanúcleosmilitarese
universidadesdeponta.
Provadissoéqueoprimeirocomputadordigital
eletrônicosurgiuseteanosdepoisdoprotótipode
Harvard,em1946,comodesenvolvimentodas
válvulaseletrônicas.EssamáquinaeraoEniac(do
inglêsElectronicNumeralIntegratorandCalculator),
criadopelaUniversidadedaPensilvâniaemparceria
O sistema naciOnal interliGadO (sin), que cOnectOu a rede elétrica Brasileira
a partir da década de 1970, fOi pOssível surGir cOm O desenvOlvimentO dOs
cOmpOnentes eletrônicOs
34
evolução
comogovernoamericano.Oprojetofoiiniciadoem
1943,duranteaSegundaGuerraMundial(1939-1945)
etinhacomoobjetivocomputaraçõestáticasde
guerra.Mascomosófoiconcluídodepoisdotérmino
doconflito,elepassouarealizaroperaçõespacíficas.
OfísicoCarlosBertulanirelataque,quandofoi
finalizadoecomeçouaoperar,oEniacocupavauma
salade140m².Logoapós,“noperíodode1945a
1951,irãosurgirosprimeiroscomputadores,nas
diferentesuniversidadesinglesaseamericanas,ao
mesmotempoemqueserãoconstruídasasúltimas
grandescalculadoras”,contaoengenheiroPhilippe
BretonnoseulivroHistória da informática.
Apartirde1951,essasmáquinascomeçaramaser
comercializadasedeixaramdeserexclusividadedas
universidadespesquisadoraseprogramasmilitares.
Inicialmenteutilizadoemgrandesempresas,foram
necessáriasalgumasdécadasatéqueocomputadorse
tornasseumprodutodeconsumodemassa,quetivesse
otamanhoeopreçoreduzidoseacapacidadeea
velocidadedeprocessamentoaumentada.
Oengenheiroeletricistaeprofessordoutorda
EscolaPolitécnicadaUniversidadedeSãoPaulo(Poli/
USP),JoséAntônioJardini,relataque,noBrasil,“para
usarumcomputadornadécadade1960,vocêtinha
quefazerumcontratocomaempresa,levarumasérie
decartõescomosdadosdoseucomputadoredeixar
láparaocomputadorlereprocessar;vocêlevavapara
acasaeolhavaosresultados,seerrasseumdado,
vocêperdiaoserviçoesósaberianodiaseguinte,pois
demoravahorasparaprocessarosdados”.
Diversosfatorescontribuíramparaqueaparelhos
eletrônicospassassemaintegrarnossasvidas
rotineiramente.Muitosdelesvãoalémdaquestãodo
desenvolvimentotecnológico.Sóatécnica,talvez,não
fossecapazsozinhadeprovocaraquiloquealguns,
inclusive,chamamderevoluçãotecnológicaouda
informação.ComoenfraquecimentodaGuerraFria
eosurgimentodadoutrinaeconômicaneoliberalista,
adotada,principalmente,pelosEstadosUnidosepela
Inglaterra,ospaísesestavamprontosparaexplorarem
odesenvolvimentodasindústriasdebensdeconsumo
edecapital,utilizandocomponentesdeeletrônica.Isso
alterou,significativamente,aformacomoaspessoas
serelacionavamcomosprodutosconsumidos.
Consumo
Oscomponenteseletrônicosforamresponsáveis
portornarequipamentoseaparelhosmenores,mais
baratosecommaiorprecisão.Dessaforma,acada
atualização,eramagregadasdiferentesfuncionalidades.
Comopassardosanosecomoaprimoramentoda
técnica,novastecnologiasforamsurgindo.AGuerra
Friacontribuiuparaodesenvolvimentotecnológico
dessasmáquinas,quandopaísesdoblococapitalistae
doblocosocialistainvestiamempesquisasmilitares.
Comaprimoramentodatecnologiadoscomponentes
eletrônicos,areduçãodocustodosprocessose
ogradualtérminodoconflitopermitiramquea
comercializaçãodoscomputadoresedeaparelhos
eletrônicoscomeçasse,especialmente,nosentão
chamadospaísesdeprimeiromundo.
Essesaparelhoseletroeletrônicoscriaramuma
novaformadeconsumoealteraramsignificativamente
avidaeasrelaçõesdetrabalhodassociedades
seguintes.Aantropólogadeconsumoeprofessorada
UniversidadeFederaldoEspíritoSanto(Ufes),Patrícia
Pavesi,explicaquearevoluçãotecnológicaéum
dosfatoresquetendeaalterarpadrõesdeconsumoe
hábitosdevida,ajudandoaexplicarasalteraçõesque
asociedadesofreu.
Provadissoforamosfenômenosprovocadosna
sociedadeocidentalpelorádioepelatelevisão,sua
sucessoracomoprincipalmeiodecomunicaçãode
massa.Orádio,criadonofinaldoséculodoséculo
XIX,eatelevisão,nadécadade1920,ganharam
grandepopularidadeapósasgrandesguerrase
alteraramaformacomoasfamíliasserelacionavam
comolar.Noperíodopós-guerras,possuirum
dessesdoisaparelhospassouarepresentarstatus
socialeelespassaramaserobjetosdacasaaserem
exibidosaosamigos,comosímbolosdemodernidade
esucessoprofissional.
AolongodasegundametadedoséculoXX,o
modelocapitalistaimperousobreosocialista,que
acentuouessasmudançasdehábitossociais.“Nosúltimos
anos,oconsumoaparececomoumsinalizadorsocial
dessasmudanças,inclusiveemseusexcessos.Dessa
forma,mudançasnospadrõesdeconsumoimplicam
mudançasnoestilodevida”,acrescentaPavesi.Foi
quandoosequipamentoseletroeletrônicossofreramum
substancialavançoemodernoscomponentespassarama
serconstruídoscomosaparelhos.
Assim,diversosfatorescontribuíramparao
sucessodaeletrônicanasociedadecontemporânea:
odesenvolvimentotecnológico,queculminouno
barateamentodosaparelhos,quefortaleceuoestímulo
aoconsumismoparagarantirstatussociale,assimpor
diante,todoselesalavancaramaprodução,oconsumo
O ábaco foi o primeiro equipamento manual de cálculo. Surgido na antiguidade, foi utilizado até o século XVII
35
esealimentavamciclicamente.
Quandoaeletricidadecomeçouaserinserida
nascidades,noBrasilentre1890e1920,ela
erarecorrentementeassociadaaoprogressoeà
modernidade.Quando,nasegundametadedoséculo
XX,aeletrônicacomeçouasefirmarcomotecnologia
dominante,pelamaioreficiênciaecontroledos
processos,possuirdispositivoseletroeletrônicosdeste
tipotambémpassouaserassociadoàatualidadeeà
modernização.
Componentes eletrônicos
Aeletrônicasempreestevepróximada
áreaelétrica,atépelosistemadealimentaçãoe
funcionamento.Massuaaplicaçãofoigradativa,a
partirdodesenvolvimentodatecnologia,utilizada
inclusiveemoutrasáreas.Antesdechegaresse
período,nofinaldoséculoXIXeiníciodoséculo
XX,quandoasusinasgeradorasdeenergiaelétrica
começavamaseinstalarnoBrasilparaabastecer
pequenasindústriasenúcleoshabitacionais,a
eletricidadeeraumprivilégiodepoucos.
Nessaépoca,asinstalaçõeserampontuais,as
usinasnãoseconectavamumasàsoutraseaenergia
produzidanãoerasuficienteparaabasteceratoda
população.Entretanto,maisdoqueumapolítica
excludente,onúmerorestritodebeneficiadosera
umalimitaçãotécnicaederecursosqueosprimeiros
empreendimentoselétricosbrasileirostinham.Eranesse
período,ainda,queaeletromecânicadominavaosetor.
Sóumpoucomaistardeéque“aeletrônica
começouaentrarnossistemaselétricos,antesda
eradaválvula,comoschamadosretificadores,
inicialmentedeselênioedepoisdegermânio”,conta
oescritortécnico,autordemaisde100livrosde
eletrônica,NewtonC.Braga.Aválvulafoiaprimeira
tecnologiaeletrônicautilizadaemlargaescala,
especialmentenaradiocomunicação,televisão,
computadoreseoutrosequipamentosdaprimeira
metadedoséculopassado.
Desenvolvidanadécadade1900peloamericano
LeedeForest,aválvulaeletrônicafoiutilizadacom
forçaatéadécadade1950,momentoemqueos
transistoresforamdesenvolvidos.Tambémconhecida
comoválvulatermiônicaouavácuo,elaéformada
poruminvólucrodevidrocomcomponentesmetálicos
noseuinterior,funcionandopeloaquecimentodeum
filamentometálico.Umadasprincipaisaplicações
daválvulaeletrônicafoinaradiocomunicação.
Comoelasfuncionavamapartirdoaquecimentode
seuscomponentes,eracomum,nesseperíodo,que,
paraseutilizarrádios,eraprecisoesperarqueestes
“esquentassem”atéestaremprontosparaseremusados.
DuranteaPrimeiraGuerraMundial(1914-1918),
acomunicaçãoviarádiofoiamplamenteempregada,
aproveitandoqueoconhecimentotécnicodos
aparelhoseletrônicosestavaconcentradonoscentros
depesquisasmilitares.Sóapósaguerraaindústria
eletrônicaefetivamentesurgiu,comoadventodas
emissõesradiofônicas,crescendorapidamente.“Entre
1922e1960,ototalanualdevendasdeequipamentos
eletrônicossubiudeUS$60milhõesparaUS$10,2
bilhões”,contaBertulani.
Masatécnicacomeçouamudartambém.
Nadécadade1950,asválvulascomeçaramaser
substituídaspelostransistores.Desenvolvidoem
1948pelosfísicosWalterBrattain,JohnBardeene
WilliamShockleynoslaboratóriosdaBellTelephone,
conhecidacomoBellLabs,nosEstadosUnidos,o
transistorrendeuumPrêmioNobeldaFísica,em
1956,aosinventores.Compostoporumpequenogrão
dematerialsemicondutor,noinício,erautilizadoo
germâniomas,posteriormente,foisubstituídopelo
silício,noqualeramligadostrêsoumaisterminais,em
geral,filamentosdeouro.
“Quandoostransistoressurgiramnaforma
comercialnadécadade1950,controlavamcorrentes
muitofracas.Dessaforma,aintroduçãodaeletrônica
nossistemaselétricosficoulimitadaatéqueos
semicondutoresevoluíramapontodepodercontrolar
O Eniac, primeiro computador digital eletrônico, surgiu em 1946 com o desenvolvimento das válvulas eletrônicas e ocupava um espaço de 140 m²
36
evolução
correntesintensas.Foiaépocaemqueaeletrônica
convencionalseseparoudaeletrônicadepotênciae
maiseletrônicapassouaserencontradanossistemas
elétricos”,esclareceNewton.
Masaimplantaçãodessasnovastecnologias
nãoerauniforme.OBrasil,porexemplo,estava
muitoatrasadoemtermosdeaplicaçãocomercial
dessesnovosdispositivos.Paraseterumaideia,
enquantoostransistoreseramcriadosecomeçavam
arevolucionaraeletrônicamundial,oBrasilainda
estavasedimentadonaeletrônicaanalógica,como
contaoengenheiroeletricistaeprofessordoutorda
EscolaPolitécnicadaUniversidadedeSãoPaulo(Poli/
USP)JoséAntônioJardini:“eramuitotrabalhoso
operarumausina,comsistemaelétricoantigamente,
porque,nadécadade1950e1960,vocêusavatelefone
erádioparaoperarosistema.Telefonavaparaausina
edizia‘desligaalinha’.Eraousodeeletrônica,de
comunicação,paraapoiarosetorelétrico”.
Essaatividadedecontrolemanualpormeiode
sistemasdecomunicaçãocomcomponenteseletrônicos
descritaporJardinierachamadadedespachodecarga.
MuitocomumemmeadosdoséculoXXnoBrasil,
começouasersubstituídoquandoasusinasforam
integradasaoSistemaNacionalInterligado(SIN),a
partirdadécadade1970,integrandoasusinasdo
setorelétricobrasileiro.Apesardenemtodaamalha
elétricadopaísestarinterligadaatualmente,autilização
deequipamentoselétricoseeletrônicosmelhorou
consideravelmenteocontroledeoperaçãoeos
processos,deixando-osmaisprecisos,seguroserápidos.
Apesardeteremdemoradoumtempomaior
paraseremintroduzidosnossistemaselétricos
depotência,ostransistoresforamrapidamente
incorporadosemequipamentoselétricosque
nãoexigiamgrandepotência,comonanascente
eletrônicadelazer,especialmentenospaísesmais
desenvolvidosdohemisférionorte.Comisso,
aválvulafoisubstituídaporessecomponente
eletrônicomaismoderno,rápido,baratoeeficiente.
Assim,osnovoscomputadoresconseguiramter
seustamanhosreduzidos,alémdocusto,que
foibarateado,edamelhoriadavelocidadedas
operações.Aindústriaeletrônicasepreparava
entãoparacresceremproduçãoelucratividadenos
anosseguintes.
Em1958,aGeneralElectriclançouumnovo
dispositivosemicondutormulticamadaschamado
tiristor.Comoadventodossemicondutores,asválvulas
foramsubstituídaspelostransistores,portiristores,
taiscomoosDiodosControladosdeSilício(SCRs),e
diversosoutrossemicondutoresdepotência,como
osTriacs,IGBTseMOSFETsdepotência.Odomínio
sobreaaplicaçãodosilício,utilizadonotransistor,foi
fundamentalparaosucessodaindústriaeletrônica,
paraaplicaçãonosistemaelétricodepotênciaepara
incorporaçãodessesaparelhoscomessescomponentes
navidacotidiana.
Odesenvolvimentodecomputadoresseaproveitou
tãofortementedessatécnicaque,emumaregiãoda
Califórnia,nasceuumconjuntodeempresasdosramos
deeletrônicaeinformática,apartirdadécadade1950,
queficouconhecidocomoValedoSilício,considerado
comoumaregiãodedesenvolvimento,devanguarda
edeinovaçãotecnológicanesseramo.ParaNewton
Braga,odesenvolvimentodatecnologiadosilício
foimuitoimportante,poispossibilitoujustamenteo
aparecimentodenovosdispositivossemicondutoresde
potênciae,aomesmotempo,microcontroladorescada
vezmenores,maisbaratosemaissofisticadosaponto
depossibilitaraimplantaçãodecontrolesdepotência,
comandos,inversoresemuitosoutrosdispositivosde
formasimpleseeficiente.
Odomíniodautilizaçãodesemicondutores
permitiuaindaacriaçãodoscircuitosintegrados,
entreofinaldadécadade1950einíciode1960.
Elessurgiramdanecessidadecadavezmaiorda
miniaturizaçãoedaeconomiadecustosdoscircuitos
eletrônicos.Admitiram,paraoscomputadores,
amultiprogramaçãoeaevoluçãodossistemas
operacionais.Tambémconhecidocomochip,um
circuitointegradoéumdispositivomicroeletrônico
quecontacommuitostransistores.Comdimensões
extremamentereduzidas,oscomponentessão
formadosempastilhasdematerialsemicondutor.
Jánadécadaseguinte,em1970,surgiramos
microprocessadores.TambémconhecidoscomoCPUs
ouunidadescentraisdeprocessamento,sãocircuitos
integradosquerealizamfunçõesdecomputaçãoem
umamáquina.AprimeiraCPUlançadafoioIntel
4004,em1971.Elamarcouépocaporque,atéentão,
diversostransistoresemchipstinhamqueserligados
umaumparafazerfuncionarocomputador.Com
omicroprocessador,todasasfunçõesecomandos
eramrealizadosapartirdeumúnicochip.Essas
novastecnologiaspermitiamavançosnãosónaárea
Quando os transistores surgiram
na forma comercial na década
de 1950, controlavam correntes
muito fracas. Dessa forma, a
introdução da eletrônica nos
sistemas elétricos ficou limitada
até que os semicondutores
evoluíram a ponto de poder
controlar correntes intensas
37
decomputação,mastambémnasindústriasquese
modernizavam,especialmentepelaautomaçãodeseus
processos;nostransportesurbanos;entreoutros.
Foinessadécadatambémqueaeletrônicade
potênciacomeçouaseraplicadaemmaiorescalaem
diversasaplicaçõesdosistemaelétricobrasileiro.A
eletrônicadepotênciapermitiuummelhorcontrole
demotoresparatraçãoelétrica,utilizadosemmetrôs
etrens;odesenvolvimentodedisjuntoresdeestado
sólido;assimcomoaaplicaçãodecomponentes
eletrônicosemdiversasoutrasaplicaçõesindustriais.
Foiem1974,porexemplo,queaprimeiralinhade
metrôdoBrasilfoiinaugurada,em14desetembro,na
capitalpaulista,ligandoJabaquaraàVilaMariana.
OdiretordeoperaçãodoMetrôdeSãoPaulo,
ConradoGravadeSouza,eoengenheiroeletricista
econsultormetroviário,PeterAlouche,relatamno
artigo“EvoluçãodatecnologianoMetrôdeSão
Paulo”algumasdasalteraçõesdoperíodo:“Erauma
épocadeimportantesinovaçõestecnológicasem
todosossetores–elétrico,eletrônicoemecânico,
comatelecomunicaçãoeainformáticasofrendo
umaverdadeirarevolução,emgrandeparte,fruto
daconquistaespacial.Ostécnicos,entãosouberam
aproveitaradequadamenteessesavanços,na
especificaçãodossistemasdesinalização,com
aadoçãopioneiraemlinhasnovasdemetrôda
conduçãoautomáticaedasupervisãoautomáticada
operaçãocomumacentralizaçãooperacionalpara
asupervisãoecontroleglobaldetodosossub-
sistemasapartirdeumcentrodecontroletotalmente
informatizado,inéditoparaosanos1970”.
Oaprimoramentodatécnicaeobarateamento
dosequipamentos,aliadosaodesenvolvimentoda
internet,permitiramqueumnúmeromuitomaior
depessoastivesseacessoaoconhecimentoeà
informação,oqueimplicaumapluralidadecadavez
maiordetecnologiaseferramentas.
Pesquisa: • Livro “História da Informática”, dePhilippeBreton.Unesp.• Livro “Memórias do computador: 25 anos de informática no Brasil”, deVeraDantaseSoniaAguiar.IDGComputerworlddoBrasil.• Artigo “Introdução à Informática – História da Informática – Um olhar pelo sistema”, deRaulSilvérioCoutinho.• Artigo “Do transistor ao microprocessador”, deEwaldoL.M.Mehl.• Artigo “História da Eletrônica”, deCarlosA.Bertulani.• www.newtoncbraga.com.br
Geração
1ª
2ª
3ª
4ª
5ª
Período
1940 – 1952
1952 – 1964
1964 – 1971
1971 – 1981
1981 – Hoje
Tecnologia eletrônica
Válvulas a vácuo
Transistores
Circuitos integrados
Microprocessadores
Circuitos com alta integração, VLSI (Very Large Scale Integration)
e ULSI (Utra Large Scale Integration)
Principais características
• Armazenamento de dados em cartões perfurados
• Surgem os primeiros tambores magnéticos
• Grandes computadores• Poucas horas de funcionamento
• Aplicação científica e militar• Tempo de operação:
milissegundos• Núcleos de ferrite, fitas e
tambores magnéticos são usados como memória
• Diminuição de tamanho• Mais rápidos
• Menor consumo de energia• Aplicação gerencial e
administrativa• Tempo de operação:
microssegundos• Evolução dos sistemas
operacionais• Miniaturização dos componentes
• Redução do tamanho• Menor custo
• Surgimento da multiprogramação
• Memória feita com semicondutores e discos
magnéticos• Surgimento do microprocessador
permitiu grande redução no tamanho
• Surgem muitas linguagens de programação
• Tempo de operação: nanossegundos
• Popularização do uso• Discos magnéticos de capacidade
muito grande• Inteligência artificial• Alta velocidade de
processamento• Alto grau de conectividade
• Tempo de operação: picossegundos
Gerações dos computadores
Fonte: Artigo Introdução à informática – História da informática – Um olhar pelo sistema, de Raul Silvério Coutinho e apresentação “Evolução dos Computadores”, de Alexandre Vitoreti de Oliveira, professor de Tecnologias para Sistemas de Informação da Unisul
38
nuclear Por Gildo Magalhães
ENERGIA ATÔMICAUma fonte para a “segunda onda” de eletrificação
39
Aampliaçãoexponencialdoconsumoenergético
aolongodostemposdeve-se,historicamente,a
avançostecnológicoscomoosquelevaramao
desenvolvimentodamáquinaavapor,domotor
elétrico,domotoraexplosão,daeletrônicaeda
micro-eletrônica,etc.Seéverdadequeahistória
dahumanidadepodesercontadacomoadascrises
energéticassucessivas,comoodesflorestamentoda
EuropanaIdadeMédiae,maiscontemporaneamente,
aescassezrelativadocarvão,dopetróleo,etc.,nãoé
menosverdadequeestaétambémahistóriadecomo
taiscrisesforamsuperadaspeloengenhocriativo
doserhumano.Abuscaporfontesenergéticas
abundantes,maiseficientesebaratasfazpartedo
padrãoculturalhumanodetodasasépocaselugares.
Aconquistadaenergianuclearé,nessesentido,
umdosrelatosmaisfascinantesdahistóriadaciência.
Seuusocontroladofoiconsideradopelocientista
LinusPauling(PrêmioNobeldequímicaem1954
eNobeldapazem1962)comoamaisimportante
contribuiçãocientíficadesdeaconquistadofogo
pelohomemprimitivo.Aradioatividadenaturalde
certassubstânciasdespertouaatençãodoscientistas
principalmentenasúltimasdécadasdoséculoXIX,
quandosesucederaminúmerasinvestigaçõese
descobertas:osraioscatódicosealuzfluorescente,os
raiosXevidenciadosporRöntgenem1895(equelogo
setransformaramemumusopioneiroepacíficoda
energianuclearnamedicina)earadiaçãodourânio.
Essesfenômenosapontavamparaaexistência
deumaestruturainternadoátomoeváriosmodelos
hipotéticosforamsucessivamentepropostose
debatidos,emespecialosdeThomson,Rutherforde
Bohr.NoiníciodoséculoXX,chegou-seaospoucos
aumconsenso,dequehaveriaumnúcleodecarga
elétricapositivaondeseconcentravaamassadecada
átomoeemvoltaelétrons,decarganegativa.
Emseguida,discutiu-seintensamenteporque
algunsnúcleoseramestáveis,aopassoqueoutros
sedesintegravamnaturalmente,emitindoradiação,
fenômenoespecialmenteestudadonaFrança
pelocasalCurie,MarieePierre,equeoslevouà
descobertadenovoselementosquímicos,comoo
rádio.Em1932,novasexperiênciasamadureceram
aideiadequeointeriordonúcleoatômicocontinha
doistiposdeconstituinte:opróton,comsuacarga
elétricapositiva,eonêutron,semcarga,mascom
propriedadesespeciais,poisalgunsconseguiam
atravessarparedesespessas.Começou-seausaros
recém-descobertosnêutronsparabombardearátomos
pesadoscomoourânio,atéqueumapesquisadora
alemã,LiseMeitner,dolaboratóriodeOttoHahn,
percebeuquenesseprocessoaconteciaaquebrado
núcleoatômico,oufissãonuclear,dandoorigema
átomosmaisleveseliberandoumaenergiaenorme,
quesepodiacalcularusandoafórmuladeEinsteinde
conversãodamatériaemenergia.
Seriapossívelmanterumareaçãoquímica
defissãoduranteumtempoemqueessaenergia
liberadapudesseseraproveitada?Comostrabalhos
deEnricoFermirealizadosjánosEstadosUnidos
duranteaSegundaGuerraMundial,estabeleceram-
seascondiçõesteóricasepráticaspararesponder
afirmativamente,pormeiodachamadareação
emcadeia,queaproveitavaoprodutodeuma
fissãoemitindonovosnêutronsque,porsuavez,
bombardeavamoutrosnúcleospesados,criandoum
efeitomultiplicadoremcascata.Estavaassimrealizado,
decertaforma,ovelhosonhodosalquimistasde
transmutaçãodamatéria.
NosecretoProjetoManhattan,osamericanos
coordenaramentãoummaciçoesforçodeequipes
40
nuclear
científicas,lideradasporRobertOppenheimerpara
produzirumformidávelartefatobélico,cujoprotótipo
foitestadocomêxitoemLosAlamosem1945.A
seguirprepararam-seasbombasatômicasqueseriam
desnecessáriasecruelmentelançadascontraoJapão
emHiroshimaeNagasaki,pondofimàSegunda
GuerraMundial.
Oqueémenosconhecidodessahistórianuclearé
quejáhátempostinha-sepensadoemusaragrande
liberaçãodecalorpromovidapelareaçãonuclearpara
esquentaráguaeassimpromoverageraçãotérmica
deeletricidade.Aampliaçãoemgrandeescalados
primeirosreatoresnuclearescomessafinalidadese
darianoiníciodadécadade1950,graçasaesforçosde
cientistas,comoocasalfrancêsFrédéricJolioteIrène
Curie,que,apartirde1948estabeleceramumplano
demetasdoEstadoparaimpulsionaraeconomia
debilitadapelaguerra,usandocomomolapropulsora
oconsumodeeletricidadegeradanuclearmente.A
comunidadeinternacionalpercebeuqueaenergia
nuclearpermitiriaumaindependênciadaimportação
dopetróleoárabe,como,aliás,evidenciou-secoma
criseegípcia-israelensedoCanaldeSuez,deflagrada
em1956.
OprogramaÁtomosparaaPazfoilançado
em1953pelopresidenteEisenhower,destinadoa
incentivarousopacíficoeapesquisadaenergia
nuclear,tornando-seumgrandeincentivopara
desenvolveracorrespondenteindústriaamericana.As
décadasde1960e1970viramumaexpansãonotável
daproduçãonucleardeeletricidade,atéqueaopinião
públicafoimobilizadacontra,emvirtudedosacidentes
dosreatoresdeThreeMileIsland(1979)nosEstados
UnidosedeTchernobyl(1986),naUcrânia.
Nesseentremeio,ousonuclearpacíficose
expandiu.Alémdageraçãoelétricaparausopúblico,
amarinhadosEUA,tendooalmiranteRickoverà
frente,equipousubmarinoscompropulsãonuclear–o
primeirosubmarinoNautilusfoiassimdenominado
emhomenagemaJúlioVerne,queemVinte Mil
Léguas Submarinashaviadescritoumaembarcação
dessetipo.Logo,aAlemanhaconstruiuoprimeiro
cargueironuclear,oOttoHahn.Conhecimentosnaárea
energéticaacabaramrevertendoparaoutrasaplicações
nucleares,comonamedicina(rádio-isótoposeoutros
elementosradioativosparatratamentoecurado
câncer)enaagricultura,parairradiaçãodealimentos
–ummétodoeconômicodeconservaçãosemalterar
suaaparênciaougosto,aplicávelamuitomaisclasses
dealimentosdoqueatradicionalpasteurização.Cabe
citaraquioavançobrasileironessasáreas,verificado
pelotrabalhodeinstituiçõescomo,respectivamente,
oInstitutodePesquisasdeEnergiaNuclear(Ipen)na
CidadeUniversitária,emSãoPaulo,eoCentrode
EnergiaNuclearnaAgricultura(Cena)daUniversidade
deSãoPauloemseucampusdePiracicaba.
Afissãonuclearnãoéaúnicaformadeproduzir
energiaapartirdonúcleoatômico.Existetambém
apossibilidadedesejuntarnúcleosdeátomosleves,
formandoumelementomaispesado–éafusão
nuclear.Oprocessoédetalmaneiramaiseficiente
quetodasasoutrasformasdeproduçãoenergética,
queelepôdefinalmenteexplicaralgoqueintrigava
oscientistashámuitotempo:deondeasestrelas
tiramocombustívelparamantersuastemperaturas
extraordinariamentealtas?Arespostaéqueelas
realizamreaçõesdefusãonuclearcomofonte
energética,comoonossoSol,quefundeátomos
dehidrogênio(trata-sedeisótoposdehidrogênio,
deutérioetrítio;isótopossãovariantesdeumátomo,
cujosnúcleostêmomesmonúmerodeprótons,mas
quantidadesdiferentesdenêutrons),transformando-os
emhélio.
Infelizmente,talcapacidadetambémfoiutilizada
paracriararmaseabombadefusãodohidrogênio
foiexperimentadapelosEstadosUnidosem1952,
41
a cOnquista da enerGia nuclear é um dOs relatOs mais fascinantes da história da ciência. seu usO cOntrOladO
fOi cOnsideradO pelO cientista linus paulinG cOmO a mais impOrtante cOntriBuiçãO científica desde a cOnquista dO
fOGO pelO hOmem primitivO.
42
nuclear
em tOdas as aplicações Bélicas, a enerGia nuclear
é liBerada de fOrma descOntrOlada, aO passO que nO usO
pacíficO se delimita e se cOnseGue desacelerar de fOrma cOntrOlada
a prOduçãO de nêutrOns na reaçãO em cadeia. as usinas nucleares mOdernas sãO pOtencialmente
mais seGuras dO que Outras fOrmas de
GeraçãO, inclusive a hidrOeletricidade.
intensificandoacorridaarmamentista,transformada
emguerra“fria”nasdécadassubsequentes.Apesar
disso,aenergiadefusãotambémseprestadeforma
notávelparaaproduçãodeusinaselétricastérmicas.
Oproblematemsidomanterareaçãodefusãoa
temperaturasaltasporumtemposuficienteparaque
oprocessosejaeconômico,ehouvegrandesavanços
napesquisatecnológicademateriaiseprocessosnesse
sentido,comonaimplosãoalaserenosgeradores
toroidais(“tokamak”).
Nãohádúvidadequeaenergianuclear
possibilitadapelafusãoseapresentanomomento
comoamaisinteressante,poisamatéria-primapara
afusãoéabundante,servindo,porexemplo,aágua
pesada(comosisótoposdehidrogênioeexistente
nosmares)eolítio(queseencontraportodapartena
crostaterrestre).Assim,virtualmente,qualquernação
teriaemprincípioacessoàmatéria-primaenergética,
ficandolivredecartéisdefornecedores.Enquanto
afusãopuranãosetornacomercial,umasolução
alternativaéoreatorhíbridodefissão-fusão,emquea
energianucleardafissãopodeservirparaaigniçãoda
reaçãodefusão.
Anecessidadedegerareletricidadecontinua
sendoumdosmaisfortesimpulsionadoresparao
usopacíficodaenergianucleare,comoreferido,a
Françafoipioneiranesseesforço.Issosedeveua
diversosfatores,entreelesarelativadificuldadede
aproveitarageraçãohídricanosriosfranceseseo
altonívelcientíficoetecnológicodopaís,quepôde
seraplicadoàindústrianuclearelevouaumcustodo
quilowatt-horamaisbaixodoquenasusinastérmicas
queusamcombustívelfóssil,bemcomomaisbaixo
doqueaenergianuclearemoutrospaíseseuropeus.
Oresultadoéque80%daeletricidadefrancesaé
deorigemnuclear.Há,porém,outrosmotivos,que
levaramàexpansãodaeletricidadedeorigemnuclear
poroutrospaísesdomundo,como:Bélgica(60%da
matrizelétrica),Hungria,SuéciaeCoreiadoSul(todos
acimade40%),Suíça,Espanha,Alemanha,Japão
(30%),EstadosUnidoseGrã-Bretanha(20%),Canadá
eArgentina(15%).Sãoaotodo44paísesemquea
energianucleardesempenhaalgumpapelrelevantena
matrizenergéticanacional.
Paraentenderoporquêdessaopção,énecessário
atentarparaváriosfatores,começandocoma
concentraçãodeenergiaimplícitanaeletricidade
deorigemnuclear.Umausinacompotênciade1
Gigawattnecessitade35toneladasdeurâniopara
suprirduranteumanoumacidadecomummilhão
dehabitantes;sefosseumatérmicaacarvãoseriam
necessárias2milhõesdetoneladasdehulha.
Outracomparação:onaviomercanteOttoHahn
operoudurantenoveanosconsumindoapenas55
quilosdecombustívelnuclear.Adensidadeenergética
(quantidadedeenergiageradaporunidadedemassa
docombustível)dourânionaturalemumgeradorde
últimageração(comregeneraçãodecombustívela
partirdochamado“lixo”atômico)émaisde500mil
vezesmaiordoqueadagasolina–permitindoque
ocustodaeletricidadegeradasejacompetitivocom
odaprópriahidroeletricidade.Casoseviabilizeo
reatordefusão,adensidadeenergéticaseriaaindano
mínimo14vezesmaiordoquenomelhorreatorde
fissãodeurânio.
Emtodasasaplicaçõesbélicas,aenergianuclear
éliberadadeformadescontrolada,aopassoqueno
usopacíficosedelimitaeseconseguedesacelerar
deformacontroladaaproduçãodenêutronsna
reaçãoemcadeia.Asusinasnuclearesmodernassão
potencialmentemaissegurasdoqueoutrasformas
degeração,inclusiveahidroeletricidade.Paraisso
contribuiuodesenvolvimentodoconceitodefailsafe,
oufalhasegura,istoé,emcasodequalquerfalhaque
possacomprometerasegurançadosistema,oprocesso
élevadoàinterrupção.
43
Esseprincípiojátinhasidointroduzidodesde
meadosdoséculoXIXnatecnologiaferroviária
paracontroledotráfego(achamadaengenhariade
“sinalizaçãoferroviária”),comousodecomponentes
ditos“vitais”–emcasodesituaçãodeinsegurança
oudefalhadoprópriodispositivodesegurança,o
sistemadecontroleinterrompiaacirculaçãodetrens,
gerandoumsinalvermelho–maismodernamente
essesistemaatuanosprópriostrenseleva-osà
paradaautomática.Essasnoçõesdesegurançaforam
generalizadaseestendidasàsregrasoperacionais,aos
programasdecomputadoreoutrositensdascentrais
nucleares–oquepodeseratestadocomparando-seo
projetoconceitualdeusinasmodernascomumaantiga
comoadeTchernobyl,concebidadentrodepremissas
maisadequadasaousomilitardoquecivildaenergia
nuclear.
Comessasmedidas,aenergianucleardefissão
efusãotorna-semaisseguradoqueviajardeavião
oudemetrô.Asegurançadecorredosaltosíndices
deconfiabilidadedasusinasnucleares,deseus
componenteseprocessos,quesãoresultadodo
investimentointensivoemtecnologia.Aprópriacarga
radioativaaquetodapessoaestáconstantementesujeita
noplaneta(devidoàradiaçãoterrestrenatural,aosraios
cósmicos,etc.)écercadedezvezesmaiordoqueaquela
recebidapelotrabalhadornasusinasnucleares.
Outrofatordeatratividadeparaaenergianuclear
temsidoaprogressivareciclagemdosresíduos
radioativos.Aexpressão“lixoatômico”é,aliás,
inteiramenteinadequada,poisosprodutosdafissão
nuclearsãoricosemprodutoscujaaplicaçãotem
despertadocadavezmaisaatençãodoscientistas.Os
produtosdasreaçõesnuclearescontêmumagrande
variedadedeisótoposúteisparaumasériedeprocessos
naturais,algunscompropriedadesinovadoras,que
sóagoracomeçamaserestudadas.Adotando-se
esseenfoquetecnológico,aenergianuclearpodeser
consideradaaomesmotempoumadasmaislimpas
queháeumaverdadeirafábricadenovosmateriais.
Finalmente,paraentenderaadoçãodaenergia
nuclearfeitaporváriospaísesdeve-selembrarque
nãoédesprezívelocustodetransmissãodaenergia
elétrica.Nocasodasbarragenshidrelétricas,seu
localédefinidoporcritériosdedesnível,vazão,área
dealagamento,etc.enormalmenteageraçãofica
acentenasoumilharesdequilômetrosdoscentros
consumidores,necessitando-sedeextensaslinhas
detransmissãodealtatensão,oquetemencarecido
consideravelmenteaeletricidade.
Comoocombustívelnuclearpodeserdeslocado
aumcustorelativamentebaixoatéausina,pois
graçasàjácitadaaltadensidadeenergéticasetrata
dequantidadescomparativamentepequenasde
combustível,ascentraispodemserlocalizadaspróximas
aosconsumidoreseatéseremlevadasparalocais
aindapoucopovoados,comoumvetorparainduzir
odesenvolvimentoeconômico(conceitodecidades
“nuplex”).Istopermiteplanejarcomplexosagro-
industriaisoudeextraçãoebeneficiamentodeminérios,
esuarespectivainfraestrutura,comumaflexibilidade
maiordoquecomoutrasfontesdeenergia.
NoBrasil,coubeaumcientistaemilitaraofinal
daSegundaGuerraMundialchamaraatençãoda
necessidadedesepesquisareproduziraenergia
nuclear.OalmiranteÁlvaroAlberto(1889–1976),que
eratambémquímicoeempresário,foieleitopresidente
daComissãodeEnergiaAtômicadarecém-criada
OrganizaçãodasNaçõesUnidas(ONU),cargoem
queseempenhouparagarantiroacessoàenergia
nuclearaospaísesemgeral,enãosomenteparaas
superpotências.Estasuaposiçãocausou-lhemuitos
problemaspolíticos,principalmente,porpartedos
EstadosUnidos.NoBrasil,ÁlvaroAlbertoconseguiu
criaroConselhoNacionaldePesquisas(CNPq)em
1951,importantesuporteparaodesenvolvimento
nãO há dúvida de que a enerGia nuclear pela fusãO se apresenta cOmO a mais interessante,
pOis a matéria-prima para a fusãO é aBundante, servindO, pOr exemplO, a áGua
pesada e O lítiO - recursOs aBundantes.
44
nuclear
científicoemgeral.
Apósumperíododeinstalaçõesexperimentais
depequenoporteeoestabelecimentodegrupos
depesquisa(emSãoPaulo,RiodeJaneiroeMinas
Gerais),jáduranteoperíododegovernomilitarpós-
1964,foicompradaausinanucleardeAngra1(depois
batizadacomonomedeÁlvaroAlberto),quecomeçou
aserconstruídaem1972massóentrouemoperação
comercialapartirde1985.Estausinasofreuatrasos
diversos,masaacusaçãomaiorquesepodefazeré
tersidocompradadosEstadosUnidosnaformade
“caixapreta”,sempermitiroacessopelosbrasileirosà
suatecnologia.Mesmocomtantosproblemas,deve-se
ressaltarqueAngra1éresponsávelporsupriruma
importantezonaindustrializadanosudestebrasileiro
eumsinaldesuaimportânciafoique,duranteo
dramáticoapagãoregistradoem2001,elacontribuiu
paraqueasituaçãonoEstadodoRiodeJaneironãose
tornasseaindapior.
DepoisdeAngra1foiassinado,aindaduranteo
períodomilitar,umacordodecooperaçãonuclearentre
oBrasileaAlemanhaOcidental,quetrouxealguns
novosesériosproblemas–sobrelevandoqueparte
datecnologiavendidapelosalemãesaindanãoera
testada.DesseacordoresultaramasusinasdeAngra
2e3(aindanãoterminada).HojeAngra1eAngra2
abastecemquasemetadedademandaenergéticado
EstadodoRiodeJaneiroerepresentamcercade2%
damatrizdegeraçãobrasileira.Umprogramamilitar
secretoenvolvendoaenergianuclearfoidenunciado
nogovernoCollor,tendosidodescontinuadoem
1991.Mesmoassim,permaneceuemvigênciaum
acordodepesquisanuclearenvolvendoaMarinha,a
UniversidadedeSãoPauloeoInstitutodePesquisas
EnergéticaseNucleares(IPEN)paradesenvolverum
protótipodegeradorelétricoparasubmarino.
Apesardoscortesdrásticosdeverbaseda
faltadeapoiooficial,aMarinhacontinuousuas
pesquisasemIperó,próximoaSorocaba,nointerior
deSãoPaulo.Ofrutodessapersistentebatalhafoi
alcançarem2006ocompletodomíniodociclode
enriquecimentodourânio,aonívelnecessárioparaa
produçãodeeletricidade–ourânionaturalprecisaser
“enriquecido”porisótoposquepossibilitemmantera
reaçãoemcadeia.TalfaçanhapermitiuaoBrasilentrar
noseletoclubedosquedominamessatecnologia,
podendo-seimaginarumfuturodeindependência
econômicacomrelaçãoaocarteleuropeude
enriquecimentodourânio–oquecausouverdadeira
celeumainternacional,tendoinclusivesidomotivo
paraaAgênciaInternacionaldeEnergiaAtômicafazer
vistoriaemIperócomopretextodecomprovarse
haviaintençãodefabricararmasnucleares.
SeoBrasilatualmentedominatodoociclodas
diversasetapasdefabricaçãodoelementocombustível,
poroutrolado,pode-seconsiderarumanação
favorecidaporpossuirenormesjazidasdeminério
(umadasmaioresreservasmundiais,naformade
uraninita),principalmenteasdeLagoaReal(Bahia)
eItatiaia(Ceará).Apenasumquartodoterritório
nacionaljáfoidevidamentemapeadoquantoaisso,
masnessaregiãojáseconstatouqueháimensas
reservasdeminério(300.000toneladas).
Namatrizenergéticaésaudávelhaverdiversidade
e,dependendodediversoscondicionantessócio-
econômicosegeo-climáticos,asdiversasfontes
energéticasserãorecomendáveis,tantoastradicionais
quantoasconsideradasalternativas,semexclusão.
Observa-se,noentanto,queainsistêncianasenergias
alternativasemdetrimentodasenergiastradicionais
representamuitasvezesumdesdobramentodo
pensamentomalthusiano,derivadodavisãodepolítica
econômicadoinglêsMalthusaofinaldoséculo
XVIII,segundoaqualosrecursossãofinitoseseu
esgotamentocomprometeopadrãodevidadosmais
desenvolvidos.
Essaideiatemsetraduzidonosúltimostempos
empalavrascujaboaintençãoénotável,masque
frequentementeaparecemenvoltasemummantode
obscuridade,taiscomo“crescimentosustentável”.É
precisoevitarquesobumaideiaútiledeapelopopular
seescondaumaintençãodediminuiropotencial
quenecessitaserliberadopelaindustrializaçãoe
plenoempregodaeconomia.Énestascondições
queotermo“sustentável”nemsempreébem
entendido,podendosetransformarapenasemuma
justificativadeadotarumcrescimentopaliativo,
abaixodonecessárioparaoplenoempregoprodutivo
45
a enerGia nuclear de fissãO e fusãO tOrna-se mais seGura dO que viajar de aviãO Ou de
metrô. issO pOrque Os altOs índices de cOnfiaBilidade das
usinas nucleares, de seus cOmpOnentes e prOcessOs, sãO
resultadO de investimentO intensivO
em tecnOlOGia.
queviriacomodesenvolvimentoeconômico
acelerado.Oconservacionismoquandoaliadoao
anti-industrialismodeixadeladoapotencialidade
pararealizarumcrescimentovirtualmenteilimitado,
principalmenteseforlevadoemcontaopotencialde
seresolverascrisespelousodacapacidadecriadorada
mentehumana.
Apolíticaenergéticafazpartedoplanejamento
estratégicodasnaçõesindependentesparacriar
eampliarsuainfraestrutura.Semenergiadealta
densidade,nãohámeioparaseatingirobem-estar
socialcomumaboaqualidadedevida,oqueestá
intimamenteligadoaosobjetivossociaismaisamplos
easeremdistribuídosdeformamaisjustaeequitativa,
comohabitação,saúde,educaçãoecultura.
Nestesentido,adistribuiçãodoconsumo
energéticoéaltamenteconcentradanomundoeno
Brasil,emparticular.Cercadeumterçodapopulação
mundialnãotemacessoàeletricidadeeoBrasil
consomeemmédiatrêsvezesmenoseletricidadedo
queaEspanhaouPortugaleseisvezesmenosdoque
osEUA.Háumademandareprimidadeeletricidade,
queseevidenciarácadavezmaisclaramenteàmedida
quehouverasubstituiçãodoscombustíveisfósseis,
comoporexemplo,nostransportes,semfalarnorisco
desériosecontinuadosapagões.Nãopareceremoto
falarnanecessidadedeumasegundaondamundialde
eletrificação,aexemplodaquelaqueocorreunoinício
doséculoXX.Aquestãonucleartemsidopalcode
grandescontrovérsias.
Paraestanovafasedeeletrificação,énecessário
saberalgodessahistóriadaenergianuclearpara
entendercomoasuacontribuiçãotenderáacrescer
comoesgotamentodasfontesconvencionaisepela
impossibilidadedasfontesalternativassupriremessa
demandareprimidadeformasignificativaeeconômica.
Algumas curiosidades envolvendo a energia nuclear
1) Hápoucosdomínioscientíficosetecnológicos
emqueapresençadasmulherestenhasidotão
significativaquantonapesquisanuclear.Elas
desempenharamnestesetorumpapelprotagonistade
primeironível,emumaproporçãomuitomaiordoque
aquecorrespondeàsuapresençanasprofissõesde
física,químicaouengenharia.Pode-sedizerquesem
aparticipaçãofeminina,desenvolvimentoscruciaisda
energianuclearnãoteriamsidopossíveisnaépocae
nascircunstânciasemqueocorreram.Umalistamais
completaserialonga,masapenasparacitaralgumas
dessasmulheres,lembramososnomesdeMarieCurie,
IrèneCurie,LiseMeitner,IdaNoddack,Marguerite
Perey,MariaGoeppert-Meyer,ElisabethRona,Mareitta
Blau,EllenGleditscheLeonaWood.
2) OalmiranteÁlvaroAlbertotentou,semconseguir,
umalicençadosamericanosparaimportarumacentral
nucleardosEUAem1953.Aalternativaentãopor
eleimaginadafoicomprarnaAlemanha,em1954,as
partescomponentesdeultracentrífugaspararealizar
umdosprocessosparaenriquecimentodeurânio.Com
esseestratagema,asautoridadesnorte-americanasnão
perceberamoqueseescondianocarregamentoque
partiriaemnaviodoportodeHamburgo.Noentanto,
partiudopróprioItamaratiumadenúnciadofatoàs
autoridadesnorte-americanas,queembargaramo
despacho,poisaAlemanhaeraentãoumpaísainda
militarmenteocupadopelosAliados.
3)Houvemuitofolcloreemtornodanecessidadede
aprofundarasescavaçõesparaosalicercesdeAngra
1.Dizia-sequeausinaestavasendoconstruídaem
terrenoinapropriado,algoqueseriasabidoatépelos
indígenas,quechamavamaquelelocaldeItaorna,ou
pedrapodre.OcorrequeapraiadeItaornaderivaseu
nomedeumpicodefrontenaSerradoMar,estesim
possivelmentechamadodeItaornaporalgummotivo
legítimo...Pesquisa: Guilherme Camargo. O fogo dos deuses. Rio de Janeiro: Contraponto.D. Hémery, J.-C. Debier, J.-P. Deléage. Uma história da energia. Brasília: Edunb.Bruno Latour. “Joliot: a história e a física misturadas”. Michel Serres (Ed.), Elementos para uma história das ciências, vol. 3. Lisboa: Terramar. Paulo Marques. Sofismas Nucleares. São Paulo: Hucitec.S. Motoyama, J.C.V. Garcia (Org.). O almirante e o novo Prometeu. São Paulo: Edunesp. Jonathan Tennenbaum. Energia nuclear. Rio de Janeiro: MSIa.Jonathan Tennenbaum. A economia dos isótopos. Rio de Janeiro: Capax Dei.
Gildo Magalhães dos Santos é professor livre-docente em História da Ciência na
Universidade de São Paulo (USP).
46
sob um olhar Por Renato de Oliveira Diniz
A CONSTITUIÇÃO DA CESP COMO FATOR DE DESENVOLVIMENTO DA ENGENHARIA
HIDRELÉTRICA BRASILEIRA
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Usina Euclides da Cunha em obras (rio Pardo, SP, 1956), uma das primeiras hidrelétricas construídas com investimentos do tesouro paulista. Sua construção foi iniciada em 1954 pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) e inaugurada em 1960 pela Companhia Hidrelétrica do Rio Pardo (Cherp), uma das estatais antecessoras da Cesp.
47
Nocomeçodemarçode1980,aEletronorte
construíaamaiorusinahidrelétricainteiramente
brasileira–Tucuruí,8.360MW–norio
Tocantins,noestadodoPará,quandoasobras
foramatingidaspelamaiorcheiaobservada,no
séculoXX,nesserio.Acheia,entreascidades
deMarabáeTucuruí,nãofoiprovocadapela
construçãodausina,poisocorreuforadaárea
dealagamentodoreservatórioeorioaindanão
estavarepresado;mastornou-sesériaameaçaà
continuidadedaconstruçãodausinaserápidas
eeficientesmedidasnãofossemtomadaspela
Eletronorteepelaempresaresponsávelpelas
obrascivis(CamargoCorrêa).Paraaltearem
poucosdiasaensecadeira(barragemprovisória
que‘seca’partedoleitodorioparaaconstrução
dasestruturasdefinitivasdeconcreto),a
Eletronortecontoucomacooperaçãoda
CompanhiaEnergéticadeSãoPaulo(Cesp),no
fornecimentodeinformaçõesarespeitodas
vazõesedaschuvas.Acontribuiçãofornecida
pelacompanhiapaulistafoiimportante,pois
forneceusubsídiosparaaequipeque,pordiase
noitesseguidos,transformouoquepoderiaserum
dosmaioresdesastresdaconstruçãohidrelétrica
noBrasil,emumaprovadacapacitaçãoda
engenhariabrasileiranessaárea.Aexperiência
desenvolvidanoestudo,noprojeto,naconstrução
enaoperaçãodeusinasgeradorasdemédioe
degrandeportepossibilitou,apartirdosanos
1950,principalmentenosestadosdeSãoPaulo,
MinasGeraiseRioGrandedoSul,acriaçãode
conhecimentotécnicoedetecnologianecessários
paraaexpansãodessesetornoBrasil.
Aassistênciatécnicafornecidapela
companhiapaulistafoiimportanteparanortearo
trabalhodaequipeque,pordiasenoitesseguidos,
heroicamentetransformouoquepoderiaserum
dosmaioresdesastresdaconstruçãohidrelétrica
noBrasil,emumaprovadacapacitaçãoda
engenhariabrasileiranessaárea;cujaexperiência
desenvolvidanoestudo,noprojeto,naconstrução
enaoperaçãodeusinasgeradorasdemédioe
degrandeportepossibilitou,apartirdosanos
1950,principalmentenosEstadosdeSãoPaulo,
MinasGeraiseRioGrandedoSul,acriaçãode
conhecimentotécnicoedetecnologianecessários
paraaexpansãodessesetornoBrasil.
ACesp,resultadodafusãodeonzeempresas,
foicriadaemdezembrode1966,tendocomo
principalacionistaotesourodoEstadode
SãoPauloesecaracterizava,jánoiníciodos
anos1980,comoempresaportadoradeparte
significativadoconhecimentoacumuladonopaís
datecnologiadeconstruçãodegrandesusinas
hidrelétricas.Acooperaçãotécnicafornecidaà
EletronortenaconstruçãodeTucuruídemonstraa
‘expertise’daempresageradorapaulista,quenão
setraduziaapenasnosconhecimentostécnicos
deprojeto,construçãoeoperaçãotécnicadessas
centraishidrelétricas.
Desdesuaconstituição,ao‘herdar’asobrase
projetosemexecuçãoporsuasantecessoras,seu
corpotécnicoprecisoudesenvolverapercepção
dequeconstruirumausinaqueaproveitaaforça
daságuasdeumrioparagerarenergiaelétrica
pressupõeumasériedenecessidadesque,em
umprimeiromomento,podeparecerapenaso
conhecimentosobrecomodesenvolveramaior
capacidadepossíveldeseproduzirquilowatts/
horaapartirdaconstruçãodeumabarragemede
umacasademáquinas.Foiprecisodesenvolver
métodosdetrabalhoquetambémdessemconta
dasdimensõessociais,culturais,econômicase
ambientaisdemodoabrangenteecomplexo.
Apesardeacontecercomdezanosdeatraso,
acriaçãodaCespfoiopassoinstitucionalque
marcouedefiniuaimplantaçãodegrande
partedasdiretrizesestabelecidasnoPlanode
EletrificaçãodoEstadodeSãoPaulo,estudo
encomendadopeloDepartamentodeÁguase
EnergiaElétricadaSecretariadeViaçãoeObras
Públicasdogovernopaulistaeapresentado,em
1956,pelaCompanhiaBrasileiradeEngenharia
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Durante a construção da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira (rio Paraná, SP/MS, anos 1960) foi necessário o desenvolvimento de vários estudos, muitos deles pioneiros no país, resultado da cooperação da Celusa/Cesp, do Instituto de Pesquisas Técnológicas (IPT) e das empresas envolvidas com sua construção.
48
sob um olhar
(CBE)que,em1950,entregaraplanosemelhante
aogovernodeMinasGerais.
OPlanodeEletrificação,apósumestudodas
perspectivasdedesenvolvimentodaeconomia
paulistaedeumaanálisehistóricoinstitucional
deseusetorelétrico,defineaformacomo
deveriasedaraintervençãoestatalnaprodução,
transmissãoedistribuiçãodaenergiaelétrica
emSãoPaulo.Alinhadiretrizeraacriação
imediatadeumaholdingcontroladapelo
tesouroestadual(CentraisElétricasPaulistas–
CELP)queseriaresponsávelpelaimplantaçãoe
operaçãodeumsistemadeusinasgeradorasde
potênciasuficienteparadarbaseeincentivar
ocrescimentoeconômicodoEstado;deum
sistemadetransmissão,interligadoecoordenado
pelaempresa;edaincorporaçãodosnegócios
dedistribuiçãoondenãohaviainteresseou
disponibilidadedeinvestimentosporparteda
iniciativaprivada.Ograndepodereconômico
eaforteinfluêncianavidapolíticanacionale
paulistadogrupoLightquedominavaomaior
mercadobrasileirodedistribuiçãodeenergia
elétrica(eixoSãoPaulo-Rio)dificultoua
constituiçãodaCelp,depoisCesp,imediatamente
apósaapresentaçãodoPlanopaulista.
Noentanto,aatuaçãodaCespedetrês
desuasantecessorasestatais(Uselpa,Cherp,e
Celusa),comoconsequênciadiretadaaplicação
deseusobjetivosinstitucionais,provocou
odesenvolvimentodoramodaconstrução
hidrelétricadaengenhariabrasileira:o
planejamentoeimplantaçãodasusinas,sistemas
detransmissãoeredesdedistribuiçãodemandou
umintensoesforçodasdiretoriasdeengenharia
eplanejamentodaempresa,dasempresas
projetistascontratadasedasconstrutoras
encarregadasdaexecuçãodosprojetos.Esse
esforçotraduziu-se,alémdaimplantaçãofísicado
parquegerador,constituídoporgrandescentrais
hidrelétricas,integradoentresieomercado
consumidor,porumconjuntodeextensaslinhas
detransmissão;produziutambémexperiências
econhecimentosqueaindahojedestacama
engenhariahidrelétricabrasileiranocenário
internacional.Possibilitouaimplantaçãoda
indústriadeequipamentoelétricopesado,ainda
quesobdomínioquasetotaldeempresasde
capitalinternacional;eofortecrescimento
daindústriadematerialelétricoleve,ao
mesmotempoemquecapitalizouecapacitou
tecnicamenteempresasprivadasdeconstrução
civilpesada,muitasdelasatualmenteconstituídas
comofortesgruposempresariasnacionaisem
processodeinternacionalização.
Paracitarmosumexemplodenatureza
técnicapodemosfazerreferênciaadepoimentos
querecolhemosrecentementedeengenheiros
envolvidoscomaconstruçãodasusinasdo
complexodeUrubupungá(JupiáeIlhaSolteira),
querelatamadificuldadeinicialmenteencontrada
paraaadoçãodedimensõesmaioresparaas
camadasdeconcretagemdosgrandesblocosde
concretoarmadodabarragem,dedimensões
inusitadasparaaépoca,afimdequesepudesse
aumentaraprodutividadeediminuirotempo
totaldeexecuçãodoempreendimento.Ointenso
calorproduzidopelareaçãoquímicaentreo
cimentoeaágua(“endurecimentodoconcreto”)
provocavarachaduras,inviabilizandoaexecução
deblocosmuitograndes,exigindoreparos
demoradosecaros,alémdecausardúvidasquanto
àsegurançaeàrealeficiênciadasestruturas.
Aconstruçãodasusinasdeconcretoaoladode
grandesinstalaçõesindustriaisprodutorasdegelo
resolveuumproblemacríticodaconstruçãode
grandesbarragens,pormeiodaadiçãodegelona
composiçãodoconcreto,aoinvésdeágua.Foi
aprimeiravezqueseadotounopaís,emlarga
escala,essasoluçãotecnológicajádesenvolvida
noexteriorequeéhojelargamenteutilizada.
Noentanto,oconhecimentoproduzidonão
seresumiuapenasàsquestõesdeengenharia
econstrução.SegundooadvogadoRubens
Naves,diretoradministrativodaCespem1986,a
empresadesenvolveu,emvinteanosdeexistência,
“umametodologiacadavezmaisabrangente
einterdisciplinar”noprocessodeimplantação
deumprojetohidrelétricodegrandeporte.A
partirdosestudosdeimpactosocioambiental
desenvolvidosparaoComplexodeUrubupungá,a
estatalsistematizou,em1978,no“ModeloPiloto
deProjetoIntegral”oknow-hownaconstrução
degrandesbarragens.Nosanos1980,esse
modeloserviudebaseparaaregulamentaçãoda
legislaçãoparalicenciamentodeaproveitamentos
hidrelétricosemtodoopaís,emumprocesso
natural,emqueasnovasquestõeslegais
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Usina de Ilha Solteira: grandes estruturas de concreto demandaram um amplo esforço de capacitação da engenharia nacional.
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Pesquisa• Águas de Março (filme, 16 min.). JeanRomainLésage,CicloFilmes,1980.• CESP: Pioneirismo e Excelência Técnica. JúlioCésarAssisKühleRenatodeOliveiraDiniz, FPHESP, 2002.• Panorama do Setor de Energia Elétrica no Brasil. RenatoFelicianoDias(coord.),CentrodaMemóriadaEletricidadenoBrasil,1988.• Plano de Eletrificação do Estado de São Paulo. DepartamentodeÁguaseEnergiaElétrica–DAEE;CompanhiaBrasileiradeEngenharia–CBE,1956.• Urubupungá – Jupiá – Ilha Solteira. EnzoSilveira,EdiçõesEnsil,1970.• Depoimento do eng. Raphael Antonio Nogueira de Freitas ao Centro de Documentação e Memória Camargo Corrêa – CDMCC, em 4 e 13/02/2004.
Renato de Oliveira Diniz é coordenador do Centro de Documentação e Memória
Camargo Corrêa (CDMCC), é doutorando em História das Ciências pela USP/ Projeto
Eletromemória e foi um dos fundadores e diretor técnico da Fundação Energia e
Saneamento entre 1998 e 2003.
demandadaspelosprojetosemexecuçãocriaram
anecessidadederenovaçãodalegislaçãoeda
consequenteregulamentação.
Avisãoabrangentedasrepercussõesda
construçãodeumahidrelétricadoportedeIlha
Solteirajáestavapresente,em1952,nosestudos
paraoaproveitamentohídricodoOestePaulista
desenvolvidospelaComissãoInterestadualda
BaciaParaná(SP,GO,MG,PR,SC,RS)enacriação
daCelusa,em1961.Construídodistantedos
centrosdeconsumo,ocomplexodeUrubupungá,
alémdefornecerenergiaparaocentroindustrial
paulistapróximoàcapital,deveriacriarumpolo
dedesenvolvimentonaregiãoemqueseinstalava,
possibilitaroestabelecimentodenovasviasde
comunicaçãoentreosuldoentãoestadodeMato
Grossoeooestepaulista,epreocupar-secomos
impactossobreanaturezadasáreasalagadase
navidadaspopulaçõesribeirinhasafetadas.Nos
anos1980,aCespjáhaviadesenvolvidouma
metodologiaqueconsideravaanecessidadede
levaremcontaosimpactossocioambientaisesuas
repercussõescomodeterminantesdoscaminhos
quesepoderiamadotaremdeterminadoprojeto;
anecessidadedeusomúltiplodasrepresascomo
abastecimentodeágua,turismoerecreação;e
atençãoaopatrimônioarqueológico,histórico,
religiosoouculturalsimplesmenteafetadoou
cobertopelaságuasdoreservatório.Issonos
permiteconcluirqueaimplantaçãodoatual
parqueenergéticopaulistafoieéumfatorde
desenvolvimentosocialemseumaisamplosentido.
AconstruçãodaUsinadoJirau,em
Rondônia,obrasímbolodoProgramade
AceleraçãodoCrescimento(PAC)éumexemplo
paradigmáticodacomplexidadedasações
queosempreendedores,hojeprivados,devem
desenvolvermesmoantesdoiníciodostrabalhos
deintervençãonoleitodorio.Osestudos
préviosdosimpactosdasobrasedaoperaçãoda
usinadevemprever,porexemplo,aformação
demão-de-obralocalparaaconstruçãoda
hidrelétrica;programasdeproteçãoàinfância
eàadolescência;deestudoedesenvolvimento
deprocedimentosrelativosàfaunadabacia
hidrográficadoMadeira;eregistroesalvamento
dopatrimônioarqueológicodaferroviaMadeira-
Mamoré.
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Usina Hidrelétrica de Jupiá ou Eng. Souza Dias (rio Paraná, SP/MS, anos 1980) é considerada ainda hoje uma hidrelétrica de grande porte e formou com a Usina de Ilha Solteira o Complexo Hidrelétrico de Urubupungá, marco de escala e de qualidade da tecnologia de construção hidrelétrica no país.
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A evolução da aplicação da energia elétrica e suas consequências para a sociedade
Cole
ção
Ener
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lum
e 3
Volume 3
ApoioRealização
Promoção
C
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CAPA FINAL.pdf 1 16/11/09 13:12