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HUSSERL, HERDEIRO DE DESCARTES: APROXIMAÇÕES E DISTANCIAMENTOS José Reinaldo Felipe Martins Filho Graduado em Filosofia Faculdade Católica de Anápolis [email protected] Eixo Temático 4 Fenomenologia - Tendências Resumo: A presente comunicação possui a proposta de estabelecer um paralelo entre a fenomenologia husserliana e o cartesianismo como sua fonte de inspiração. Para tal, percorrerá alguns dos principais conceitos elaborados por Edmund Husserl sempre sinalizando, de um ponto de vista metodológico e sistemático, quais foram seus avanços em relação à perspectiva cartesiana. Como fruto da investigação surgirá a condição de bipolaridade da consciência através do postulado cogito-cogitatum, que se contrapõe ao solipisismo do sujeito pensante que, instituído por Descartes, perpassou todo o período moderno até a contemporaneidade. Em suma, Husserl é considerado como autêntico herdeiro de Descartes sem, contudo, por em detrimento o mérito particular atribuído ao método fenomenológico e ao alcance de sua aplicação. A maior ênfase dessa investigação estará debruçada sobre o vasto horizonte de possibilidades abertas a partir da instituição do ego puro como dotado de uma consciência intencional, ou seja, consciência que sempre visa a um objeto. Finda-se, portanto, o primado da subjetividade sobre a objetividade, concedendo a ambas papel ativo na construção do conhecimento. Palavras-chave: Husserl, Descartes, fenomenologia, metafísica. Introdução Oriundos do mundo das ciências, René Descartes e Edmund Husserl apontam a necessidade de algo que fosse capaz de fundamentar também a filosofia, levando-a ao patamar de uma ciência autônoma. Ainda como no tempo de Descartes, a filosofia do século XX permanecia em meio a uma tempestade de correntes e tendências das mais variadas possíveis. O problema consistia no fato de que, “vendo que foi cultivada pelos mais elevados espíritos que viveram desde muitos séculos e que, apesar disso, nela ainda não se encontrava uma única coisa a respeito da qual não houvesse discussão,” (DESCARTES, 2000, p. 40), tornava-se sumamente necessário encontrar o caminho viável para sua consolidação como ciência. Ora, os princípios científicos não eram os mesmos da filosofia. Entretanto, para Husserl, mesmo em meio a esse turbilhão de correntes, cabe à filosofia o papel de ser a mais rigorosa de todas as ciências, por ser a única capaz de alcançar a verdade das coisas. Diante disso, a instituição de um método capaz de fundamentar esse propósito se acenava como mister. O saber calcado sobre sólidos fundamentos não pode ser posto em dúvida, é evidente por si mesmo. Assim, a missão destinada à filosofia se converteria na busca pelas evidências. Nesse itinerário, a fenomenologia surgiria como a proposta de um método capaz de, partindo das evidências, adentrar ao nível das essências, das coisas mesmas. Por essências entendem-se as verdades primeiras, em si e por si, únicas capazes de sustentar o edifício da ciência universal. Por isso, em todos os modos de

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Artigo que trata sobre a fenomenologia husserliana

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  • HUSSERL, HERDEIRO DE DESCARTES: APROXIMAES E

    DISTANCIAMENTOS

    Jos Reinaldo Felipe Martins Filho Graduado em Filosofia

    Faculdade Catlica de Anpolis [email protected]

    Eixo Temtico 4 Fenomenologia - Tendncias

    Resumo:

    A presente comunicao possui a proposta de estabelecer um paralelo entre a fenomenologia husserliana

    e o cartesianismo como sua fonte de inspirao. Para tal, percorrer alguns dos principais conceitos

    elaborados por Edmund Husserl sempre sinalizando, de um ponto de vista metodolgico e sistemtico,

    quais foram seus avanos em relao perspectiva cartesiana. Como fruto da investigao surgir a

    condio de bipolaridade da conscincia atravs do postulado cogito-cogitatum, que se contrape ao

    solipisismo do sujeito pensante que, institudo por Descartes, perpassou todo o perodo moderno at a

    contemporaneidade. Em suma, Husserl considerado como autntico herdeiro de Descartes sem,

    contudo, por em detrimento o mrito particular atribudo ao mtodo fenomenolgico e ao alcance de sua

    aplicao. A maior nfase dessa investigao estar debruada sobre o vasto horizonte de possibilidades

    abertas a partir da instituio do ego puro como dotado de uma conscincia intencional, ou seja,

    conscincia que sempre visa a um objeto. Finda-se, portanto, o primado da subjetividade sobre a

    objetividade, concedendo a ambas papel ativo na construo do conhecimento.

    Palavras-chave: Husserl, Descartes, fenomenologia, metafsica.

    Introduo

    Oriundos do mundo das cincias, Ren Descartes e Edmund Husserl apontam a

    necessidade de algo que fosse capaz de fundamentar tambm a filosofia, levando-a ao

    patamar de uma cincia autnoma. Ainda como no tempo de Descartes, a filosofia do

    sculo XX permanecia em meio a uma tempestade de correntes e tendncias das mais

    variadas possveis. O problema consistia no fato de que, vendo que foi cultivada pelos

    mais elevados espritos que viveram desde muitos sculos e que, apesar disso, nela

    ainda no se encontrava uma nica coisa a respeito da qual no houvesse discusso,

    (DESCARTES, 2000, p. 40), tornava-se sumamente necessrio encontrar o caminho

    vivel para sua consolidao como cincia. Ora, os princpios cientficos no eram os

    mesmos da filosofia. Entretanto, para Husserl, mesmo em meio a esse turbilho de

    correntes, cabe filosofia o papel de ser a mais rigorosa de todas as cincias, por ser a

    nica capaz de alcanar a verdade das coisas. Diante disso, a instituio de um mtodo

    capaz de fundamentar esse propsito se acenava como mister.

    O saber calcado sobre slidos fundamentos no pode ser posto em dvida,

    evidente por si mesmo. Assim, a misso destinada filosofia se converteria na busca

    pelas evidncias. Nesse itinerrio, a fenomenologia surgiria como a proposta de um

    mtodo capaz de, partindo das evidncias, adentrar ao nvel das essncias, das coisas

    mesmas. Por essncias entendem-se as verdades primeiras, em si e por si, nicas

    capazes de sustentar o edifcio da cincia universal. Por isso, em todos os modos de

  • reduo, persistir a busca pelas essncias, pelo fundamento primeiro. Conscientes de

    que o objetivo de tornar a filosofia uma cincia rigorosa pode ser alcanado, torna-se

    preciso o total despojamento de todo o conhecimento cientfico erigido at ento, a fim

    de atingir as evidncias em si mesmas; as evidncias capazes de trazer o sentido

    absoluto do objeto, sem dar margens a questionamentos e desconfianas; a idia de sua

    perfeio absoluta. Da o famoso imperativo da fenomenologia: Zu den sachen selbst.

    vamos s coisas mesmas. Somente partindo das coisas mesmas, clarificadas pela

    evidncia, tornar-se- possvel alcanar a adequao da cincia e da filosofia como

    cincia. Para tal, o mtodo fenomenolgico prope a suspenso, epoch, de todos os

    conhecimentos anteriores evidncia, que, por ventura, poderiam atrapalhar o processo

    de conhecimento do objeto. Suspender significa fazer reduo, deixar de lado a fim de

    alcanar a evidncia mesma, despojada dos preconceitos que a ela imbricamos. Aqui

    percebemos outra vez os resqucios do cartesianismo e de sua proposta de suspenso do

    conhecimento tido como vlido, pois, segundo Descartes, somente pondo-o em xeque se

    alcanaria a verdade nele contida, pois se o sujeito cognoscente, com pleno grau de

    certeza, no pode distinguir o verdadeiro do falso, pelo menos est ao seu alcance

    suspender seu juzo acerca de tudo o que o circunda. (Cf. DESCARTES, 2000b, p. 255).

    De modo sistemtico, como primeira reduo est a proposta de eliminar todos os

    pressupostos da cincia e da filosofia, ao que se denomina por reduo filosfica ou

    gnosiolgica e isso j significa o confronto entre o conhecimento vigente, exposto ao

    crivo do mtodo.

    Segundo Husserl, em um segundo momento torna-se necessria a suspenso da

    atitude natural, segundo a qual j trazemos nossa percepo do mundo. Ora, nada

    evidente seno o objeto enquanto pensado e, por isso, nenhuma concepo de mundo

    pode ser assumida de modo ingnuo. Trata-se, pois, da reduo fenomenolgica, que em

    Descartes equivaleria suspenso da idia de Deus e a instituio da imagem do Gnio

    Maligno como fonte de dvida e enganao acerca de todo o conhecimento do mundo

    objetivo. Todo o real torna-se suspenso, ao que resta-nos somente a conscincia. Talvez

    seja esse o ltimo grau de elaborao realizado por Descartes em sua reflexo. No

    percurso cartesiano o prximo passo seria a descoberta do cogito como patente

    indubitvel do conhecimento, diante do que Husserl no se dar por satisfeito. Aps a

    suspenso do mundo e do conjunto se suas significaes, resta-nos ainda a prpria

    conscincia enquanto patente do pensamento. Da mesma forma como necessria a

    suspenso das idias e concepes para se chegar s essncias, tambm torna-se preciso

    suspender o prprio eu pensante, o ego puro e suas cogitationes, levando a conscincia

    ao patamar do eu transcendental. Esse o passo que, segundo Husserl, Descartes no

    percorreu. Chegou porta, abriu-a, mas no adentrou o universo novo que se impunha.

  • Trata-se do percurso novo, no qual o herdeiro dever caminhar com seus prprios

    passos.

    Por conseqncia da reduo fenomenolgica, chega-se ao encontro do ego puro

    e suas cogitationes. Como afirma Husserl, se queremos fundamentar as cincias de

    maneira radical, a evidncia do mundo que a experincia nos fornece necessita de

    qualquer forma de uma crtica prvia de sua autoridade e de seu alcance. (1 Med. 7)

    Uma vez que tal processo seja instaurado, encontra-se o ego transcendental, o eu que

    pensa as coisas do mundo. O ego puro aquele que pensa o mundo; nele o prprio

    mundo se encontra. O que mais poderia ser o mundo seno o conjunto dos sentidos?

    Ora, o mundo o horizonte mximo de nossas snteses. Pensar um sentido pressupe

    pensar a conscincia, o sujeito transcendental, o pensamento. Nisso, o empirismo nunca

    alcanou a totalidade, pois sempre permaneceu esquivo realidade da conscincia como

    fundamento para pensar o mundo. Minhas impresses do mundo sempre trazem consigo

    sentidos que esto em mim, em minha conscincia. Ora, o objeto percebido est sempre

    em relao com a conscincia que o visa. Desse modo, o mundo no para mim outra

    coisa seno o que existe, e vale para minha conscincia num cogito semelhante.

    (Ibidem.) Todo o sentido universal ou particular, toda a validade da existncia , por sua

    vez, retirada dessas cogitationes. Nas cogitationes do ego puro transcorre toda e

    qualquer vida intramundana. Sem elas o eu no poderia viver, experimentar a realidade,

    julg-la, pens-la, pois todas essas atitudes so atos da conscincia. Voltar-se para essa

    vida, colocando o mundo como existente de modo exclusivo para essa vida em si,

    segundo Husserl, o mesmo que encontrar-se com o ego puro e suas cogitationes.

    Assim, afirma Husserl categoricamente que o domnio de existncia natural, portanto,

    s tem uma autoridade de segunda categoria e pressupe sempre o domnio

    transcendental. (Ibidem.) Portanto, se a epoch que pe em suspenso a existncia do

    mundo como tal, descobrindo o eu que pensa como primordial, denomina-se reduo

    fenomenolgica, constatao da existncia de um ego puro, transcendental, e suas

    cogitationes como pressuposto para a prpria existncia do mundo natural, Husserl

    evoca pelo ttulo de reduo fenomenolgica transcendental.

    De modo especial no 14 de suas meditaes, Husserl apresenta a corrente das

    cogitationes e sua importncia diante da compreenso da estrutura da conscincia.

    Tendo por base a estrutura da conscincia, ego-cogito-cogitatum, podemos concluir que

    a conscincia sempre conscincia de algo. Diante desse carter bipolar, a saber, o fato

    de a conscincia ser sempre conscincia de um objeto, o processo de intencionalidade

    torna-se o condutor fundamental para todos os atos da conscincia em sua atitude de

    visar. No se trata, portanto, de um eu que reflete de modo isolado dos objetos do

    mundo e nem mesmo de que os objetos simplesmente se encontrem como produtos

    duma conscincia unilateral. Aqui encontramos outro desdobramento da problemtica

  • cartesiana, para a qual a unilateralidade do sujeito pensante reduzia a realidade objetiva

    a representao de sua conscincia. Ora, a conscincia sempre conscincia de algo e o

    exerccio do pensamento somente se institui quando possui um objeto de

    intencionalidade. No h um pensamento desprovido de alguma relao com o objeto.

    Na verdade, o prprio eu que pensa se constitui a partir da relao com os objetos.

    Desse modo, como nos mostra Dartigues, o resultado da epoch fenomenolgica no

    somente o eu penso, mas tambm o seu objeto de pensamento, ou seja, no se trata

    somente de um ego cogito, mas, de outro modo, de um ego-cogito-cogitatum. Disso se

    constitui a estrutura da conscincia, ego-cogito-cogitatum, que antes de indicar para um

    solipsismo do cogito, como no modo cartesiano, aponta para uma correlao entre

    cogito e cogitatum, pensamento/subjetividade e objeto/realidade.

    Tudo o que existe est na relao entre os objetos e minha conscincia. Diante

    disso, segundo Stegmller, a conscincia em Husserl pode ser definida pelos seguintes

    aspectos: a conscincia como o entrelaamento das vivncias psquicas empiricamente

    verificveis numa unidade de fluxo de vivencia; como percepo interna dessas prprias

    vivncias e como designao que resume todas as vivncias intencionais. Mais uma vez,

    vale dizer que a conscincia sempre conscincia de algum objeto, o que lhe confere

    sentido. Na atitude de doadora de sentido, o objeto de seu vislumbre torna-se objeto de

    intencionalidade, ou seja, sempre, segundo Dartigues, um objeto para um sujeito o

    que, longe de expressar a estrita dependncia do objeto em relao ao sujeito, demonstra

    o elo que os compromete mutuamente. Portanto, a intencionalidade, entendida como a

    particularidade intrnseca e geral que a conscincia tem de ser conscincia de qualquer

    coisa, de trazer, na sua qualidade de cogito, o seu cogitatum em si prprio, o que

    define o fundamento de toda a corrente da conscincia. Tal intencionalidade no visa

    somente idia de objeto contida na conscincia, nem mesmo existncia do objeto em

    si mesmo, mas, de outro modo intenso, a essncia de tal objeto, que corresponde

    representao transcendental do mesmo na conscincia, gerada pelo cogito e doada pelo

    cogitatum.

    Como vimos, a evidncia se d quando o objeto se torna ele mesmo presente na

    conscincia, que em seu vislumbre sempre apropria-se de algum objeto de

    intencionalidade. Desse modo, todo o processo de busca pela evidncia dos objetos

    toma como base a intencionalidade da conscincia. A inteno, por sua vez, se preenche

    pela intuio do objeto e por intuio ou induo entende-se o conhecimento imediato a

    partir do contato com o objeto. o objeto que se oferece por si mesmo. Segundo

    Husserl, na percepo, como um dos atos da conscincia, o objeto se d em carne e

    osso. A intencionalidade, portanto, apresenta-se como a principal caracterstica da

    conscincia, que possibilita aos objetos aparecerem e se manifestarem a ela. Quando

    percebo, imagino, penso ou recordo, eu percebo, imagino, penso ou recordo alguma

  • coisa, e da, segundo Husserl, ao contrrio de um nivelamento ou reduo esfera do

    mesmo, pode-se perceber a diferenciao estabelecida entre sujeito e objeto. Nesse

    sistema o sujeito surge como um eu capaz de atos da conscincia, como julgar,

    perceber, recordar; enquanto ao objeto restringe-se a possibilidade de manifestao

    desses mesmos atos.

    Ao propor a novidade de sua anlise intencional, Husserl pretende distingui-la

    de toda anlise no sentido natural do termo, o que significa um avano extremamente

    considervel. Para Husserl, o papel da anlise intencional o de revelar as

    potencialidades implicadas nas atualidades da conscincia. Enquanto significao da

    coisa que visa, o prprio cogito se afirma em seu carter intencional e o cogitatum

    assume seu papel ativo. Ao contrrio de uma atuao unilateral, na qual prevalece a

    ao do pensamento sobre o objeto, resignando-lhe condio de passividade, na ao

    intencional, tambm o objeto causa influncia sobre o ato do pensamento. Trata-se de

    uma atividade bipolarizada, na qual todo cogito a significao da coisa que visa, a

    absoro de seu sentido. Compreendendo a significao do objeto que visa, o cogito

    atua de modo sinttico sobre ele, retirando-lhe o sentido. Ao mesmo tempo, no se

    limita, o objeto, posio esttica de um sentido. Por seu horizonte de possibilidades,

    influi no prprio cogito inmeras possibilidades de significao, que se concretizam e se

    distanciam de acordo com a particularidade de cada ato de visar. Para Husserl, essa

    superao da inteno na prpria inteno deve ser considerada como essencial

    conscincia e a novidade instaurada pela anlise intencional consiste no fato de que,

    como intencional, tal anlise ultrapassa os estados singulares que so objetos de anlise.

    Explicando seus horizontes correlatos, a anlise intencional coloca os estados annimos

    extremamente variados no campo daqueles que desempenham papel fundamental na

    constituio do sentido objetivo do cogitatum. Em ltima instncia, a anlise intencional

    da conscincia definir a relao entre os atos mentais da prpria conscincia e o mundo

    exterior a ela e tal anlise se denomina intencional por necessitar de um objeto sobre o

    qual se intencione. Atravs do fluxo de sua sntese intencional, a conscincia poder

    constituir a unidade noemtico-notica do sentido objetivo das coisas do mundo. Trata-

    se, segundo Husserl, do reino das estruturas tpicas, de natureza essencial, suscetveis de

    serem encerradas em conceitos rigorosos.

    Para concluir

    Um dos mais conceituados filsofos do sculo XX, Edmund Husserl marca a

    histria da humanidade com a introduo de seu pensamento e, de modo particular, com

    a construo e desenvolvimento do mtodo fenomenolgico, sem, contudo, apontar a

    causa de sua inspirao na filosofia cartesiana. Na introduo de suas meditaes, o

    prprio Husserl quem afirma que em nossos dias, a nostalgia de uma filosofia viva

  • conduziu a muitos renascimentos. Prova disso, sua prpria filosofia. Resgatar o

    pensamento cartesiano, no significa adot-lo em sua totalidade. Antes disso, deve ser

    tomado o que de magnfico Descartes construiu, a saber, o retorno radical ao ego cogito

    puro, mas apropriar-se da maturidade necessria para, considerando a histria do

    pensamento posterior a Descartes, dar a ele pleno desdobramento. Trata-se do caminho

    pelo qual percorreu a fenomenologia transcendental ao que, segundo o filsofo, somos

    convidados a percorrer juntos. A partir do mtodo fenomenolgico, torna-se possvel

    garantir, tambm filosofia, maior proximidade do que significa um carter preciso de

    cincia, ou mesmo, longe do rano que tal afirmao pode denotar, a unidade necessria

    busca pela verdade das coisas.

    De modo particular, chama-me ateno a profundidade do alcance do mtodo

    fenomenolgico diante da estrutura do pensamento humano. Profundidade tal que o

    crescimento de seu emprego em outras reas do saber, como a educao, a psicologia,

    dentre outras, sempre mais notrio. Ora, o nome de Husserl ficar guardado na

    histria da humanidade como sendo o iniciador de tal modo de investigao modo

    esse que talvez possamos nos considerar continuadores. A riqueza de suas anlises da

    conscincia serviram para iluminar o caminho de outras vertentes que dela nasceram.

    Aprendemos com Husserl que a conscincia o que de primordial existe no sujeito,

    sendo ela, por sua vez, estruturada pelo binmio cogito-cogitatum. Mesmo que a

    intuio ou pr-disposio para o conhecimento do objeto sempre parta do cogito, ao

    contrrio da concepo vigente na modernidade, da qual Descartes o patrono por

    excelncia, em que o objeto se apresentava inclume diante do sujeito, nica patente

    ativa capaz de interpel-lo, Husserl admite a existncia do que podemos denominar por

    uma inter-relao entre sujeito e objeto, ao definir a conscincia como sendo sempre

    conscincia de algo. Para mim, trata-se de um enorme avano. Como o prprio Husserl

    apresenta, a eleio de um sujeito isolado refere-se apenas questo metodolgica e,

    assim, a conscincia do cogito, j descoberta por Descartes, apenas o ponto de partida

    para tantas outras questes, tais como, por exemplo, a intersubjetividade abordada por

    Husserl na quinta medio de Meditaes Cartesianas e em outras obras que integram a

    Husserliana. No permanece o cogito fechado em si mesmo, mas aberto s

    interferncias exteriores do mundo e dos outros sujeitos. Diante disso, no se pode

    deixar de notar o esforo da anlise fenomenolgica em sua tentativa de descrever como

    se estrutura a conscincia, bem como o modo pelo qual ela se orienta em direo ao

    objeto e, basicamente, so esses os motivos pelos quais Husserl aclamado como

    portador de to profundos mritos, afinal, tornou-se a fenomenologia um dos grandes

    marcas do pensamento contemporneo.

    Referncias Bibliogrficas:

  • DESCARTES, Ren. Meditaes Metafsicas. Traduo de Enrico Corvisieri. So Paulo: Editora Nova

    Cultural Ltda, 2000. (Coleo Os Pensadores)

    DARTIGUES, Andr. O que a fenomenologia? 7. ed. Traduo de Maria Jos J. G. Almeida. So

    Paulo: Centauro, 1973.

    FRAGATA, Julio. A filosofia de Edmund Husserl. In.: http://www.filoinfo.bemvindo.net/

    filosofia/modules/articles/article.php?id=42 Acessado em 19 de outubro de 2009, s 11:30 hs.

    HUSSERL, Edmund. Meditaes Cartesianas: introduo fenomenologia. Traduo de Frank de

    Oliveira. So Paulo: Mandras Editora ltda, 2001.

    REALE, Giovanni/ANTISSERI, Dario. Histria da Filosofia: do romantismo at nossos dias. So Paulo:

    Paulus, 1991. pp. 557-567.

    SILVA, Maria de Lourdes. A intencionalidade da conscincia em Husserl. In: Revista Argumentos, ano 1,

    n 1, UFC 2009. pp. 45-53. STEGMLLER, Wolfgang. A filosofia contempornea: introduo crtica. So Paulo: EPU, 1997.