Como Ser Um Conservador

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Sobre os erros do conservadorismo

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  • Como Ser um Conservador No-Liberal e Anti-Socialista (Por Roger Scruton)

    Intelectuais do ps-guerra herdaram dois grandes sistemas de pensamento poltico para satisfazer sua sede de doutrina: o liberalismo e o socialismo. Este um testemunho da persistncia do quadro dicotomitizao da mente que, mesmo na Europa Oriental, o "conflito mundial", que perdurou por 70 anos era freqentemente visto em termos da oposio entre esses sistemas. E por serem sistemas, muitas vezes suposto que eles so organicamente unificados, que voc no pode abraar qualquer parte de um deles, sem abraar a totalidade do mesmo. Mas diga-se desde o incio, que, do ponto de vista de nossa situao atual, nada mais bvio sobre estes sistemas so de fato, em seus pressupostos, essencialmente os mesmos. Cada um deles prope uma descrio de nossa condio, e uma soluo ideal para ela, em termos so seculares, abstratos, universais e igualitrios. Cada um v o mundo em termos "dessacralizados", em termos que, na verdade, correspondem a nenhuma experincia humana comum duradoura, mas apenas para os paradigmas frios esquelticos que assombram os crebros dos intelectuais. Cada um abstrato, mesmo quando ele pretende uma viso da histria humana. Sua histria, como sua filosofia, separado da circunstncia concreta da atividade humana, e, de fato, no caso do marxismo, vai to longe a ponto de negar a eficcia da atividade humana, preferindo ver o mundo como uma confluncia de foras impessoais . As idias pelas quais os homens vivem e encontram suas identidades locais - idias de fidelidade, de pas ou nao, da religio e da obrigao, todos estes so, para o socialista, mera ideologia, e para o liberal, questes de escolha "privada", a ser respeitado pelo estado pois eles no podem ser um problema verdadeiro para o estado. Apenas em alguns lugares da Europa e da Amrica uma pessoa pode chamar-se um conservador e esperar ser levado a srio. A primeira tarefa do conservadorismo, portanto, criar uma linguagem em que "conservador" no mais um termo de abuso. Esta tarefa faz parte de outro, e maior, empreendimento: o da purificao da linguagem do slogan-zamento insidioso que se apoderou dele. Esta no uma tarefa simples. Na verdade, , em certo sentido, toda a poltica. Como os comunistas perceberam desde o incio, controlar a linguagem controlar o pensamento - no o pensamento real, mas as possibilidades de pensamento. E em parte graas aos esforos bem sucedidos dos

  • comunistas - auxiliado, claro, por uma guerra mundial, a qual eles precipitaram - que nossos pais pensaram em termos de dicotomias elementares. Esquerda-direita, fascista-comunista, socialista-capitalista, e assim por diante. Tais eram os "termos de debate" que herdamos. Na medida em que voc no "de esquerda", eles diziam, ento, nessa medida, voc "direita", se no comunista, ento muito mais prximo do fascismo, se no um socialista, ento um defensor do "capitalismo , "como um sistema econmico e poltico. Se h uma dicotomia bsica que hoje nos confronta, s entre ns - os herdeiros do que resta da civilizao ocidental e do pensamento poltico ocidental - e os fornecedores de dicotomias. No existe essa oposio entre Esquerda e Direita, ou entre o comunismo e o fascismo. H simplesmente uma aliana eterna - apesar de uma "aliana dos injustos", que esto sempre prontos para violar os termos que os prendem - entre aqueles que pensam em termos de dicotomias e etiquetas. deles o novo estilo de poltica, a cincia em que a verdade tomou o lugar da poltica como sempre foi conhecida. deles um mundo de "foras" e "movimentos", o mundo percebido por essas mentes infantis que est em um constante estado de agitao e conflito, avanando agora para a esquerda, ora direita, de acordo com as previses mal feitas deste ou aquele terico do destino social do homem. Acima de tudo, a mente dicotomizada tem necessidade de um sistema. Ela procura a afirmao terica da condio social e poltica do homem, da qual pretende derivar uma doutrina que vai responder a todas as circunstncias material. Cada sistema tambm universal. Um socialismo internacional o ideal declarado da maioria dos socialistas, um liberalismo internacional a tendncia no declarada do liberal. Para nenhum dos dois sistemas concebvel que o homem vive, no por aspiraes universais, mas por ligaes locais, no por uma "solidariedade" que se estende por todo o mundo de ponta a ponta, mas por obrigaes que so entendidas em termos que separam o homem da maioria dos seus companheiros, em termos tais como a histria nacional, religio, idioma e os costumes que fornecem a base de legitimidade. Finalmente - e a importncia deste nunca deve ser subestimada - tanto o socialismo e o liberalismo so, em ltima anlise, igualitrios. Ambos supem que todos os homens sejam iguais em todos os aspectos relevantes para a sua vantagem poltica. Para o socialista, os homens so iguais nas suas necessidades e, portanto, deve ser igual em tudo o que concedido a eles, para a satisfao de suas necessidades. Para o liberal, eles so iguais em seus direitos, e, portanto, deve ser igual em tudo o que afeta a sua posio social e poltica. Devo dizer que eu tenho mais simpatia pelo liberal do que para a posio socialista. Para ele baseado em uma filosofia que no s respeita a realidade da ao humana, mas tambm tenta conciliar a nossa existncia poltica com as liberdades elementares que so constantemente ameaadas. Mas - qualquer que seja o seu valor como um sistema filosfico, o liberalismo continua sendo, para mim, no mais do que isso - um corretivo constante para uma dada realidade, mas no a realidade em si. uma sombra, lanado pela luz da razo, cuja existncia depende do corpo macio que impede que a luz, o corpo do homem dado existncia poltica. A existncia poltica do homem desafia os quatro axiomas do liberalismo e do socialismo. No secular, mas espiritual, no abstrato, mas concreto, no universal, mas particular, e no igualitria, mas repleta de diversidade, desigualdade, privilgio e poder. E assim deve ser. Eu digo que espiritual, pois

  • acredito que o mundo como o homem entende - o Lebenswelt - lhe dado em termos que levam a marca permanente de obrigaes que ultrapassam o seu entendimento. Ele nasce em um mundo que exige dele para o sacrifcio, e que lhe promete recompensas obscuros. Este mundo concreto, no pode ser descrito numa lngua abstrata do terico socialista ou liberal sem remover a pele do significado que o torna perceptvel. O mundo do socialista e do mundo do liberal so como esqueletos mortos, dos quais a pele viva foi removida. Mas este mundo real, o viver, o mundo social, uma particularidade, uma coisa vital, e deve, se for para florescer, distribuir diferentemente e desigualmente sua vida sobre as suas partes. A igualdade abstrata do socialista e do liberal no tem lugar neste mundo, e pode ser realizado apenas pela afirmao de controles to grande a ponto de destruir a si mesmos. A fim de justificar, e de fato a ganhar, a sua guerra com a realidade, a mente intelectual desenvolveu uma linguagem aniquiladora que usa para descrever. Todas as realidades polticas so descritas fora da histria, como se fosse possvel ser estabelecida em qualquer lugar, a qualquer momento. Assim, o fenmeno particular polons da "Solidariedade" empurrado para as formas abstratas ditadas pela teoria da "democracia liberal". Ele visto at mesmo como uma espcie de socialismo, especialmente por intelectuais franceses para os quais nada bom se no tiver um nome socialista. O exemplo ameaador. Se quisermos voltar realidade, devemos procurar uma linguagem que escrupulosa em relao ao mundo humano. Uma generalidade, no entanto, til para ns, justamente porque, por trs disso, milhares de particularidades se encontram escondidas. Refiro-me ideia de legitimidade. Para seu imenso crdito, os liberais tentaram dar uma ideia alternativa de legitimidade - com a qual desafiam os direitos histricos que deveriam ser extintos pelo triunfo de seu sistema. A primeira, e ltima, a condenao do comunismo desmentiu a ideia de legitimidade com uma gargalhada cavernosa. No a minha preocupao argumentar com o liberal, alguns que as idias devem, eventualmente, ser incorporados em qualquer teoria filosfica de governo legtimo. Eu gostaria apenas de sugerir uma alternativa no-liberal, que ser estar livre do contgio da teoria. Entre as vrias dicotomias que tm pulverizado a inteligncia moderna que suponho que devido a Weber entre a legitimidade e a legalidade, entre os modos de autoridades tradicional e racional-legal, tem sido a dicotomia mais prejudicial. Somente se a lei mal-interpretada, como um sistema de abstraes, a legalidade pode ser considerada uma alternativa para ao invs de uma realizao particular legitimidade. Mas a lei abstrata , por esse motivo, no possui uma fora duradoura. Legitimidade , simplesmente, o direito do comando poltico. E este direito inclui o exerccio da lei. O que confere este direito sobre um povo? Alguns diriam que a sua "escolha". Mas essa ideia ignora o fato de que temos apenas os instrumentos mais rudimentares pela qual as escolhas so medidas, e essas escolhas dizem respeito apenas a mais fortuita das coisas. Alm disso, o que leva as pessoas a aceitarem a "escolha" que imposta a eles por seus companheiros, se no um sentimento prvio que eles esto unidos em uma ordem legtima?

  • A tarefa para o conservador encontrar as fundamentos da existncia poltica concreta, e trabalhar para o re-estabelecimento de um governo legtimo em um mundo que foi varrido e desprotegido por abstraes intelectuais. Nosso modelo final para um fim legtimo aquele que dado historicamente, para as pessoas unidas por seu senso de um destino comum, uma cultura comum e uma fonte comum dos valores que regem suas vidas. A intelligentsia liberal no Ocidente, como da intelligentsia comunista antigo no Oriente, persistentemente se recusou a aceitar a naturalidade da existncia humana. Ele tornou a vida, e em particular da vida poltica, em uma espcie de experincia intelectual. Vendo a infelicidade do homem, eles se perguntam - o que deu errado? Sonham com um mundo em que um ideal abstrato de justia ser feita realidade. Parece que, para todos lugares, uma nica soluo, ir resolver os conflitos e restaurar a harmonia em todos os lugares, seja no Plo Norte ou no Equador. Por isso, a total incapacidade do liberalismo para fornecer uma soluo para aqueles que esto aflitos por uma ilegitimidade totalitria. O liberal comea a partir do mesmo pressuposto do totalitrio, ou seja, que a poltica um meio para um fim, e o fim a igualdade no uma igualdade material, mas a igualdade moral, uma igualdade de "direitos". A democracia o resultado necessrio deste ideal liberal, uma vez que a democracia a realizao final da igualdade poltica. Para o liberal, a nica forma de se opor ao totalitarismo atravs da lenta e constante democratizao da ordem social. Quem pode duvidar do apelo dessa ideia? Mas esta negligencia um fato inescapvel. Eu no consigo ver a minha vida como os liberais desejam ver a vida poltica. Eu no consigo ver a minha vida como um experimento. Nem posso considerar minhas obrigaes como sendo inteiramente criaes da minha liberdade, de aes responsveis. Eu nasci em uma situao que eu no criei, e estou sobrecarregado desde o nascimento com as obrigaes que no so da minha prpria concepo. Minha dvida bsica para o mundo no de justia, mas de piedade, e s quando eu reconhecer esse fato que eu posso ser verdadeiramente eu. Apenas em relao a minha dada situao que posso formar esses valores e pretenses sociais que me do foras, e assim, por fim, experimentar a liberdade. Qualquer ttulo verdadeiro de nosso sentimento de legitimidade deve comear a partir do reconhecimento de que a piedade precede a justia, tanto em nossas vidas, quanto em nosso pensamento, e que, at que tenhamos associado ns mesmos a um lugar e as pessoas, e comear a pensar nos outros como "dos nossos", as exigncia da justia, a superstio de igualdade, so inteiramente sem sentido para ns. Mas esse apego ao lugar e as pessoas no escolhido: no o resultado de uma reflexo liberal sobre os direitos do homem, nem concebido no esprito experimental que to importante para o programa socialista. Nascemos para as obrigaes da famlia, e na experincia de ns mesmos como partes de um todo maior. No reconhecer a prioridade desta experincia de admitir a premissa maior do pensamento totalitrio, que afirma que a existncia poltica nada mais que um experimento de longo prazo. H uma viso particular, ainda popular entre os intelectuais de esquerda no Ocidente, que o sistema sovitico era um "socialismo errado." Esse pensamento expressa precisamente o grande perigo poltico de nosso tempo, que a crena de que a poltica envolve uma escolha de sistemas, como um meio para um fim, de modo que um sistema pode "dar errado", enquanto outro "dar certo." A verdade que o socialismo errado, justamente porque acredita que ele pode dar certo - justamente porque ele v a poltica como um meio para um fim. A poltica uma forma de existncia social, cujo fundamento as obrigaes dadas a partir do qual nossas identidades sociais so formadas. A poltica uma forma de associao

  • que no um meio para um fim, mas um fim em si mesmo. fundada na legitimidade, e legitimidade reside em nosso senso de que somos feitos por nossa herana. Assim, se quisermos redescobrir as razes de ordem poltica, devemos tentar endossar as obrigaes no escolhidas e que conferem a nossa identidade poltica, e se contentar com um plo, e este, no pode ser governado de Moscou, ou para um habitante das Ilhas Malvinas que ele no pode ser legitimamente governado a partir de Buenos Aires. +++ Vale a pena fazer uma pausa para mencionar outra, e rival, generalidade, que tem sido de algum servio para o intelectual de esquerda ou liberal no nosso tempo. Em seu esforo para acabar com o passado, e encontrar uma base poltica obrigatria que olha apenas para o presente e pro futuro. a ideia do "povo" como uma fonte de ordem legtima. A ideia normalmente combinada com a fantasia de que o intelectual tem alguma faculdade peculiar de ouvir, e tambm articular, a "voz do povo." Esta auto-iluso, que persistiu inalterada desde os tempos da Revoluo Francesa, expressa a preocupao do intelectual para se reunir com a ordem social de que seu prprio pensamento foi to tragicamente separado. Ele deseja se redimir de sua "externalidade". Infelizmente, entretanto, ele consegue unir-se no com a sociedade, mas s com outras abstraes intelectuais - "o povo" - projetada de acordo com exigncias tericas impecveis, precisamente para ocultar a intolerabilidade da realidade da vida cotidiana. "O povo" no existe. Mesmo se existisse, seria autoridade para nada, uma vez que no teria nenhuma base concreta sobre a qual construir a sua legitimidade. Ningum pode falar para o povo. A verdade, no entanto, se esfora para ser dita, e pode encontrar expresso, agora nesses lbios, agora sobre aqueles. Ao contrrio de "o povo", a nao no uma abstrao. um dado da realidade histrica. construdo em particular e imediato numa linguagem, costume, religio e cultura. Ele contm em si a sugesto de uma ordem legtima. Isto, creio eu, deve ser sempre lembrado, mesmo por aqueles - e isso inclui a maioria de ns agora - que hesitam em adotar o nacionalismo objetivo que surgiu a partir do Congresso de Viena e que a princpio pacificou, mas, posteriormente, destruiu, o nosso continente. +++ Mas, certamente, voc vai dizer, no h outra fonte de legitimidade, que no requeira o apoio dessas obrigaes piedosas que parecem nos comprometer com tanto na base de to pouco? No h uma legitimidade a ser encontrado na democracia, que um dia substituir o apelo piedade? Essa uma grande questo. Mas duas coisas precisam ser ditas em resposta. Em primeiro lugar, a "democracia" um termo disputado, e ningum sabe bem o que isso significa ou como garantir a estabilidade. Devemos esperar at que todos os paradoxos da escolha social tenham sido resolvidos antes de formular nossos compromissos polticos? Em segundo lugar, o que as pessoas tm apreciado na democracia no uma escolha coletiva peridica. O que h de to estimvel no fato de que uma maioria

  • ignorante de vez em quando escolhe ser orientada por um novo partido, em direo a objetivos que entendem no melhor do que era entendido os objetivos do partido anterior? O que apreciado so certas virtudes polticas que associamos justamente com a democracia britnica e americana, mas que j existia antes da democracia, e poderia ser estabelecida em outro lugar sem a sua ajuda. Estas virtudes so as seguintes: (i) O poder limitado: ningum pode exercer o poder ilimitado quando seus projetos esto para ser extintos por uma eleio. (ii) O governo constitucional: mas o que defende a Constituio? (iv) A existncia de instituies autnomas, e as associaes livres que as fazem possveis. (v) Estado de Direito: em outras palavras, a possibilidade de adjudicar cada ato, mesmo quando um ato de um oficial - mesmo quando um ato em nome do poder soberano. (vi) A oposio legtima: em outras palavras, o direito de formar partidos e publicar opinies que se opem ao governo, e o direito de lutar abertamente pelo poder. Tericos polticos esto familiarizados, claro, com esses assuntos, e este no o lugar para discuti-los em detalhes. Mas vale a pena resumir sua importncia. Tomadas em conjunto, essas seis caractersticas do governo, dizem, no a democracia, mas sim a limitao constitucional. Para coloc-lo mais diretamente, eles denotam a separao do Estado (que o lugar de autoridade legtima) daqueles que detm o poder em virtude do estado. Aqueles que exercem o poder podem ser julgados em termos das prprias funes de que sejam titulares. Esta certamente parte essencial da verdadeira ordem poltica. tambm uma parte indispensvel de qualquer legitimidade totalmente elaborado. De fato, podemos ver legitimidade do Estado Moderno como composto de duas partes: uma raiz, que o apego devoto que atrai as pessoas em uma nica entidade poltica, e uma rvore que cresce a partir dessa raiz, que o estado soberano, ordenados pelos princpios que eu tenho recomendado. Neste estado, o poder submetido a condies limitantes, e de uma maneira que o faz ser responsvel daqueles que podem sofrer de seu exerccio. Este estado mostra o verdadeiro florescimento de uma "sociedade civil" - uma vida pblica que seja aberta, digna, e imbuda com uma legitimidade instintiva. Tal legalidade cresce e exprime a legitimidade que armazenada em sua raiz. Esta a parte superior, a parte visvel da legitima polis que to evidentemente destruda pelas doutrinas polticas de nossos tempos. Mas a sua destruio se torna possvel, no tanto pela eliminao da democracia, mas pela sufocante alimentao do sentimento legtimo. A democracia pode, claro, sustentar as seis virtudes polticas que eu listei. Mas tambm pode destru-los. Todas dependem de uma coisa que a democracia no pode fornecer, e que insinuada na pergunta que eu adicionei para o nmero (ii): autoridade. O que leva as pessoas a aceitar e se comprometer com os resultados de uma eleio democrtica, ou pela lei existente, ou pelas limitaes incorporadas em um escritrio? O que, em suma, d origem ao "esprito pblico" que notavelmente desapareceu das instituies do governo em grande parte da Europa moderna? Certamente o respeito - para instituies, para os procedimentos, para os poderes e privilgios que so efetivamente apreciados . Esse respeito derivado do sentido que estes poderes, privilgios e procedimentos refletem algo que verdadeiramente "nosso", algo que cresce a partir do vnculo social que define a nossa condio. Aqui

  • reside a autoridade real: a de que ela vista para conter em si o resduo da fidelidade que define o meu lugar. +++ Agora, o que a verdadeira legalidade? Eu j sugeri a distino entre a lei abstrata e a lei concreta, e eu impliquei que s a lei concreta pode realmente preencher o vcuo de legitimidade que atualmente encontra-se diante de ns. A lei concreta exemplificada no seu melhor na tradio inglesa da lei comum lei criadas por juzes em resposta aos problemas concretos que surgem diante deles, e em que os princpios emergem lentamente, e j se tornam sujeitos a severa disciplina do real. Qualquer lei que o resultado do raciocnio judicial srio, fundada em precedentes e autoridades, tem a marca de uma ordem histrica; tambm continua a responder realidade dos conflitos humanos e constitui uma tentativa genuna para resolv-los, ao invs de ditar uma soluo intelectualmente satisfatria o que pode ser inaceitvel para as partes. Esse tipo de lei incorpora a verdadeira fonte de autoridade legal, que convico da autor de que a justia ser feita, no abstratamente, mas de acordo com seu caso particular, tendo em conta as circunstncias especficas que so dele, e que so, talvez, at mesmo exclusivas dele. Para a lei concreta existir, de qualquer forma, deve haver uma independncia judicial. E uma vez que existe a independncia judicial haver o que todos razoavelmente aspiravam sob a bandeira dos "direitos do homem". Pois existir a garantia de que a justia possa ser feita, seja qual for o poder que pretende extingui-la. Existem duas grandes ameaas lei concreta. Uma delas a abolio da independncia judicial. Isto foi conseguido pelo Partido Comunista, em prol de uma justia "abstrata" - uma "igualdade" de recompensa - que inevitavelmente entra em conflito com as circunstncias concretas da existncia humana. A segunda ameaa a proliferao da lei de estatuto - de lei por decreto, a lei repetidamente feita e re-feita em resposta s idias mal feitas dos polticos e seus assessores. Toda essa lei fatalmente defeituosa: o Partido Comunista repousava toda a sua pretenso de legalidade na gerao de tais leis, ao remover o nico instrumento - a independncia judicial - que poderia transform-las em verdadeiras leis, ao invs de liminares militares. O liberalismo sempre valorizou a importncia da legalidade. Mas legalidade liberal uma legalidade abstrata, preocupada com a promoo de uma ideia puramente filosfica de "direitos humanos". Quais valores so direitos humanos, sem o processo judicial que ir defend-los? E alm disso, ao deixar na mo de algum esta f abstrata e sedutora, no estamos dando a um inimigo o bastio contra o reconhecimento de sua ilegitimidade? No existe a possibilidade de ele dizer que respeita os direitos humanos - mas direitos diferentes? (O direito de trabalhar, por exemplo, ou o direito de uma participao nos meios de produo.) Se olharmos de volta para a Revoluo Francesa, v-se o quo fcil para a doutrina dos "direitos humanos" se tornar um instrumento da tirania mais terrvel. Basta fazer como os jacobinos fizeram a abolir o sistema judicial e substitu-lo por "tribunais populares". Ento qualquer coisa pode ser feita para qualquer um, em nome dos Direitos do Homem. Em resposta ao liberalismo, portanto, necessrio trabalhar para a restaurao das circunstncias concretas da justia. Mas a lei concreta que eu tenho defendido

  • muito diferente de qualquer coisa que tanto um socialista ou um liberal aprovaria. Ela preserva as desigualdades, confere privilgios, justifica o poder. E, no entanto, isso a sua fora. Para sempre haver desigualdades: haver sempre o privilgio e o poder. Esses no so nada, mas sim os traos de uma ordem poltica real. Desde que as igualdades, privilgios e poderem exista, certo que elas devam coexistir com uma lei que possa justific-las. Caso contrrio, elas sero injustas e tambm descontroladas.