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Flávia Marques Rosário COMPORTAMENTO DESVIANTE E PADRÕES ESTÉTICOS: um estudo exploratório com mulheres que não pintam o cabelo Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Administração Orientadora: Letícia Moreira Casotti, D.Sc. Rio de Janeiro Março de 2006 i

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Flávia Marques Rosário

COMPORTAMENTO DESVIANTE E PADRÕES ESTÉTICOS: um estudo exploratório com mulheres que não pintam o cabelo

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Administração Orientadora: Letícia Moreira Casotti, D.Sc.

Rio de Janeiro Março de 2006

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A minha família e grande amigos

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AGRADECIMENTOS

À professora Letícia pela confiança e valiosa orientação.

À ajuda e aos conselhos inestimáveis de Maribel Suarez e Roberta Campos

Aos professores do Coppead, mestres que, para além da competência e

conhecimento, transmitem valores humanos essenciais.

Aos funcionários do Coppead, pela presteza e bom-humor, diários, um

obrigado especial a Cida, Simone, Lucianita, André, Verinha e Sidney.

À toda a Turma 2004, que fez o meu dia-a-dia no COPPEAD ainda melhor. Em

especial, agradeço aos grandes amigos que fiz aqui dentro, pessoas

admiráveis e inesquecíveis: Fernando Saliba, Juliana Yonamine, Luciana

Toldo, Gabriela Goulard, Cláudia Woods, Carolina Nobili, Dinia Monge, Isabella

Amui, Carlos Roberto Reis, Eduardo Rodrigues, Gustavo Klein, Felipe Rizzo,

Jean Caris.

Às amigas de anos, Rachel Ribeiro e Danielle Muniz

À Janete, José, Gabriel, Lady, Lourdes, Américo, Nathália, Lethícia, Nádia,

Fática e Ademário - minha estimada família, sempre me proporcionando os

melhores momentos que alguém pode viver:

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RESUMO

ROSÁRIO, Flávia Marques. Comportamento desviante e padrões estéticos: um estudo exploratório com mulheres que não pintam o cabelo. Orientadora:

Letícia Moreira Casotti. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2004. Dissertação.

(Mestrado em Administração).

Este estudo de natureza exploratória busca entender como pensam mulheres

entre 25 e 55 anos que, na contramão de um padrão estético cada vez mais

freqüente entre as mulheres brasileiras, optam por manterem seus cabelos

brancos. O interesse foi identificar como elas percebem e reagem à pressão

social; que imagens constroem sobre si e sua aparência; qual o impacto de sua

história pessoal e que valores motivam essa escolha. A pesquisa qualitativa

parece mostrar que o senso estético não desaparece quando se adota uma

estética possivelmente desviante. Muito menos a busca por uma aparência

física bela e em equilíbrio. Além disso, a simbologia dos fios brancos para as

mulheres entrevistadas neste estudo está para além da passagem cronológica

do tempo. Valores como “autenticidade”, “reconhecimento social” e “liberdade”

ajudam a explicar a decisão e a colocar essas mulheres e seus cabelos

grisalhos numa esfera mais ampla que a do senso comum.

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ABSTRACT

ROSÁRIO, Flávia Marques. Comportamento desviante e padrões estéticos: um estudo exploratório com mulheres que não pintam o cabelo. Orientadora:

Letícia Moreira Casotti. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2004. Dissertação.

(Mestrado em Administração).

This exploratory study aims to understand how women between 25 and 55

years-old that keep their white hair think. They are in the opposite direction of

an aesthetic standard – tying the white hair – that has become more and more

frequent among Brazilian women. The purpose was to identify how these

women perceive and react against social pressure; which images upon

themselves and their appearance they have developed; what are the impacts of

their personal history and which values motivate that choice. The qualitative

research seems to show that neither the aesthetic sense nor the search for a

beautiful physical appearance disappear. Moreover, the symbology of white hair

for the women in this study is beyond the chronological sense of time. Values

such as "authenticity", "social recognition" and "freedom" help to explain the

decision and to place these women and their hairs in a sphere wider than the

one of the common sense.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Hierarquia de Aprendizagem Padrão................................................09 Figura 2 - Hierarquia Experiencial ou Emocional............................................. 10 Figura 3 - Hierarquia de Baixo Envolvimento................................................... 10 Figura 4 - Hierarquia das Necessidades Humanas de Maslow........................ 12 Figura 5 – Mapa Laddering para a análise da atitude de não pintar o cabelo.. 95

vii

“Entre o que o nosso corpo nos diz e o que

devemos saber a fim de funcionar, há um vácuo que nós mesmos devemos preencher, e nós o preenchemos com a informação (ou

desinformação) fornecida pela nossa cultura” (Clifford Geertz)

viii

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................10 1.1 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO........................................................................................................................ 13

2. REVISÃO DA LITERATURA...........................................................................................................15 2.1 ATITUDES, MOTIVAÇÕES E VALORES NO COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR........................................... 15

2.1.1 Atitudes ............................................................................................................................................. 15 2.1.2 Motivação ......................................................................................................................................... 18 2.1.3 Valores .............................................................................................................................................. 21

2.2 CONCEITO DE BELEZA ............................................................................................................................... 23 2.2.1 A Beleza e o Corpo ........................................................................................................................... 25 2.2.2 A Beleza e as Mulheres ..................................................................................................................... 29 2.3.3 O Mito de Beleza............................................................................................................................... 32 2.3.4 A Beleza e o Cabelo: a etnografia de Bouzón (2004) ....................................................................... 35

2.3 O COMPORTAMENTO DESVIANTE DO CONSUMIDOR.................................................................................... 39 2.4 A BELEZA E O COMPORTAMENTO DESVIANTE DO CONSUMIDOR: O ESTUDO DE HOLBROOK ET AL. (1996)42

3. METODOLOGIA ..............................................................................................................................47 3.1 PARADIGMA E TIPO DE PESQUISA ADOTADOS............................................................................................. 47 3.2 PERGUNTAS DE PESQUISA .......................................................................................................................... 49 3.3 FASES DA PESQUISA................................................................................................................................... 50 3.4 LIMITAÇÕES DO MÉTODO........................................................................................................................... 65

4. DISCUSSÃO DE RESULTADOS ....................................................................................................67 4.1A PERCEPÇÃO DE VAIDADE......................................................................................................................... 67 4.2 CUIDADOS COM OS CABELOS: PRODUTOS E SERVIÇOS................................................................................ 69 4.3 OS CABELOS GRISALHOS: REAÇÕES E QUESTIONAMENTOS......................................................................... 73

4.3.1 Reações aos cabelos grisalhos.......................................................................................................... 74 4.3.2 Questionamentos pessoais ................................................................................................................ 82 4.3.4. A percepção sobre a mulher que pinta ............................................................................................ 84

4.3 O COMPORTAMENTO DESVIANTE NAS ENTREVISTADAS ............................................................................. 87 4.3.1 Práticas desviantes em outras experiências e no cotidiano.............................................................. 87 4.3.2 Consumo desviante em relação aos cabelos ..................................................................................... 89 4.3.3 Percepção sobre si mesma: Será que os cabelos brancos a colocam em desvio com os padrões? .. 91

4.4 CONSEQÜÊNCIAS E VALORES DA DECISÃO DE NÃO PINTAR OS CABELOS (RESULTADOS DA APLICAÇÃO DA METODOLOGIA LADDERING) ........................................................................................................................... 97

4.4.1 Conseqüências .................................................................................................................................. 99 4.4.1.1 Ser natural ..................................................................................................................................... 99 4.4.1.2 Manter a saúde dos fios ............................................................................................................... 103 4.4.1.3 Ser independente.......................................................................................................................... 103 4.4.2 Valores ............................................................................................................................................ 106 4.4.2.1 Autenticidade ............................................................................................................................... 106 4.4.2.2 Busca de Equilíbrio Interior ........................................................................................................ 108 4.4.2.3 Reconhecimento Social ................................................................................................................ 109 4.4.2.4 Liberdade e Aversão ao Risco ..................................................................................................... 111

5. CONCLUSÃO E SUGESTÕES DE ESTUDOS FUTUROS ..........................................................112 BIBLIOGRAFIA..................................................................................................................................117 ANEXO 1 - ROTEIRO DE ENTREVISTA ..........................................................................................123 ANEXO 2............................................................................................................................................125

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1. INTRODUÇÃO

Seria verdade que 40% da beleza de uma mulher está em seus cabelos? Esse é

apenas um dizer popular, mas o consumo de produtos para os cabelos entre as

mulheres brasileiras faz com que esse sub-setor seja o maior no mercado de

cosméticos e higiene pessoal. Depois dos condicionadores, são as tinturas de

cabelo a categoria de produtos que mais cresce em termos de número e valor de

vendas no Brasil (EUROMONITOR, 2005), pois 56% das mulheres brasileiras

pintam os cabelos (CLÉBICAR, 2005).

O crescimento das vendas de tinturas de cabelo parece ocorrer devido à

popularização do produto entre mulheres mais jovens, interessadas menos em

esconder os sinais de idade – os cabelos brancos – e mais em ter um visual

fashion (EUROMONITOR, 2005). Profissionais ligados à indústria de tinturas

afirmam que se a mulher começa a tingir seus cabelos, a chance dela continuar é

muito grande. O consumo, que antes era quase restrito a mulheres de 35 anos ou

mais, já atinge hoje mulheres de 14 a 29 anos (ABIHPEC, 2004).

Desta forma, a popularização do uso de coloração de cabelo faz com que se

encontre cada vez mais mulheres com cabelos pintados. E que se torne mais

“estranho”, por exemplo, a existência de mulheres ainda jovens que não pintem os

cabelos brancos. Esse estudo tem como objetivo entender as motivações e os

valores da decisão de algumas dessas mulheres.

Optou-se por entrevistar apenas mulheres já que parece existir a percepção de

que “Os homens nasceram com o dom de ficarem mais atraentes à medida que os

cabelos vão ficando brancos” (MEDEIROS, 2005).

Se no campo profissional, as mulheres se aproximam cada vez mais dos homens,

na forma de lidar com os sinais do envelhecimento uma diferença permanece:

dentro dos padrões estéticos sociais, existe maior aceitação de homens de

cabelos brancos. O que é ilustrado nos depoimentos abaixo:

10

“Entre tantas fatias do mundo masculino que a mulher passou a

saborear, talvez a mais rejeitada seja justamente esta: a convivência

pacífica com a própria imagem, os cabelos brancos, as rugas de

expressão e de idade” (BIONDO, 1999, p.22).

“Todo mundo comenta que meu marido está ficando lindo com os

cabelos grisalhos. Com as mulheres não é assim. Somos obrigadas a

estar às voltas com reflexos, hennas e tinturas” (depoimento de Vera

Fajardo em LEAL e PROTASIO, 2004).

O cabelo branco nas mulheres, em relatos extraídos da mídia, pode ser associado

como algo indesejado, aquilo que revela o envelhecimento e, por isso, precisa ser

escondido. Não é difícil achar, nas ruas, homens jovens com cabelos brancos. Já

mulheres... Ao se considerar que a quantidade de salões de beleza é maior que a

de barbearias e que a maioria dos cosméticos e produtos para o cabelo são para

as mulheres, pode-se supor que são elas o gênero mais preocupado com os

cabelos, com o rejuvenescimento e a beleza. Será essa uma das razões que

fazem com que o impacto dos cabelos brancos seja tão maior entre as mulheres

que entre os homens?

Essa “obrigação” – que poderia ser classificada quase como uma exigência social

sugere dificuldade na decisão de assumir ou não os cabelos grisalhos. Para se ter

os cabelos brancos, é preciso encarar questionamentos e julgamentos com mais

freqüência que elogios. “Mas quando você vai pintar o seu cabelo?” ou “você não

pensa em pintar os cabelos?” são mais ouvidas do que “seu cabelo está lindo

desse jeito”. (BOUZÓN, 2004)

Assim como o vestuário, o cabelo segue tendências – seja de estilos de corte,

tratamentos ou cores. É possível mostrar muito sobre si mesmo através deles.

Existem formas de se expressar visualmente através das cores e dos penteados.

Pode-se comunicar desleixo, vaidade, beleza, seriedade, rebeldia, etc. Tudo

11

depende de como os cabelos são usados. (THE ECONOMIST, 2003; O GLOBO,

2004; GAZETA MERCANTIL, 2004).

Os cabelos já foram vistos, por exemplo, como características dos representantes

de movimentos de contestação social - os punks são conhecidos pelo penteado no

estilo moicano; os rastafaris pelos dreadlocks e os hippies pelos cabelos

compridos. O que é hoje visto como proibido e desvalorizado pode, inclusive, se

tornar desejado e estimulado no futuro (BOUZÓN, 2004).

Por serem uma das partes do corpo mais expostas, os cabelos possuem

visibilidade privilegiada, o que faz com que se destaquem visualmente no conjunto

do corpo e passem a identificar uma pessoa dentro do meio social do qual ela faz

parte. Para algumas pessoas, o cabelo é a fonte primordial de beleza, o que pode

gerar um comportamento exagerado de cuidados e preocupações (BOUZÓN,

2004).

Cabelos mudam ao longo da vida de uma pessoa e as mudanças podem ser

provocadas de forma voluntária ou não. Ainda que se possa intervir nos cabelos,

mudando suas cores, texturas e jeitos de usar, em alguns momentos as mudanças

vêm do interior do corpo humano – é o caso em que hormônios podem influenciar

no aspecto do cabelo e em que o envelhecimento pode provocar a perda de cor

dos fios.

No entanto, existem mulheres que optam por não pintarem o cabelo, mantendo-os

brancos, num movimento contrário ao da maioria. Fazendo isso, elas manipulam

diferentemente seu corpo e os cosméticos à disposição, gerando mensagens

possivelmente diversas. A escolha deliberada constitui-se, portanto, como atitude

oposta ao que parece ser o padrão de cuidado da brasileira com o envelhecimento

refletido no cabelo. Uma espécie de “grupo de resistência” que, ao subverter

regras e padrões talvez esteja buscando se comunicar diferentemente, recriando

padrões de inserção social. É este comportamento, aparentemente desviante, que

é objeto do presente estudo.

12

Este estudo exploratório busca, portanto, contribuir para o entendimento de um

grupo ou uma cultura minoritária (Beck, 2003). Para Beck (2003), as culturas

minoritárias estão em crescimento constante em oposição à visão globalizante de

que “vamos todos virar Big Macs” devido às rotas em que se oferecem os

produtos homogeneizadores do mundo. Para o autor, ao lado da

homogeneização, tem surgido também a multiplicação da diferença justamente a

partir das culturas minoritárias. Como encontrar essas diferenças? Os cabelos

grisalhos são uma atitude contestatória em relação aos padrões estéticos que

predominam ou mais uma busca por diferenciação?

Como essas mulheres sentem, percebem e reagem à pressão social relativa aos

cuidados padrões para com os cabelos grisalhos no Brasil? Que imagens

constroem sobre si e sua aparência? Que valores motivam essa decisão? Qual o

impacto de sua história pessoal nessa escolha? E, por fim, qual a intenção por trás

dessa atitude em termos de comunicação com o meio em que se encontram?

1.1 Organização do estudo

O estudo traz a revisão bibliográfica de temas que colaboraram na definição do

roteiro da entrevista e na análise dos resultados. A revisão de literatura começa

com a exposição das teorias a respeito de atitudes, motivações e valores dos

consumidores. Em seguida, o termo beleza e sua complexidade são

apresentadas, com ênfase na associação entre ele e a idéia de corpo e entre ele

e a mulher. As colaborações de uma etnografia, feita num salão de cabeleireiro,

são escritas ao final do tópico beleza. No terceiro sub-item do capítulo, explora-se

o comportamento desviante do consumidor. Por fim, relacionam-se os conceitos

de beleza às teorias de comportamento desviante através da tipologia de

Holbrook et al (1996).

O terceiro capítulo apresenta a metodologia da pesquisa de campo, empregada

para descobrir as motivações e os valores envolvidos na decisão de não tingir os

13

cabelos brancos. São apresentadas as técnicas adotadas e é descrito o

procedimento de coleta, aspectos do campo, perfil das entrevistadas e análise de

dados.

O quarto capítulo traz os resultados do trabalho de campo, bem como a análise

do discurso das entrevistas em profundidade, organizados nos seguintes

assuntos: os cuidados com os cabelos, as significações e as reações aos cabelos

grisalhos, o comportamento desviante identificado nas entrevistadas e as

conseqüências e valores da atitude de não pintá-los.

As considerações finais refletem sobre os principais achados deste estudo e

sugerem campos para futuros estudos. Elas se encontram no quinto capítulo.

14

2. REVISÃO DA LITERATURA

Este capítulo apresenta a revisão da literatura relacionada aos temas atitude,

motivação e valores no comportamento do consumidor; o conceito de beleza: as

mulheres e os cabelos; e o comportamento desviante no âmbito do consumo.

Num primeiro momento, para que mais à frente possam ser investigadas e

entendidas as conseqüências e valores da atitude de manter os cabelos grisalhos,

é feita uma apresentação em linhas gerais das teorias de motivação, atitudes e

valores dos consumidores.

Em seguida, já que o estudo se propõe a analisar a contracultura estética, o termo

“beleza” aparece, através de teorizações antigas e modernas. São expostas as

discussões sobre o impacto da “beleza” nas mulheres e as práticas e

representações da etnografia de Bouzón com freqüentadoras de salão de beleza.

Os últimos sub-itens do capítulo apresentam a idéia de comportamento desviante

no consumo e expõe a tipologia de Holbrook et al. que discorre sobre como o

comportamento desviante é manifestado na aparência de grupos sociais.

2.1 Atitudes, motivações e valores no comportamento do consumidor

O estudo das atitudes dos consumidores está diretamente relacionado às suas

motivações e valores. Entender motivações e conhecer valores de um indivíduo é

entender por que ele tem uma dada atitude. Para estudar o comportamento de

mulheres que optam por manterem seus cabelos brancos, não utilizando tintura,

parece necessário conhecer mais sobre as teorias de atitude, motivações e

valores presentes nos estudos de comportamento do consumidor.

2.1.1 Atitudes

Sheth et al.. (2001) apresentam a definição de atitude, que caracterizam como

clássica, do psicólogo Gordon Allport: “Atitudes são predisposições aprendidas a

15

responder a um objeto ou a uma classe de objetos de forma consistentemente

favorável ou desfavorável” (SHETH ET AL.., p.367). Os autores continuam,

dizendo que atitudes são avaliações e opiniões sobre pessoas, lugares, objetos,

instituições, em termos de qualidade e desejabilidade.

Solomon (2002) apresenta a Teoria Funcional das Atitudes, de Daniel Katz,

psicólogo, formulada em 1960 para explicar como as atitudes facilitam o

comportamento social. Segundo essa teoria, as atitudes existem porque

desempenham alguma função para o indivíduo e, por isso, são determinadas por

seus motivos. O autor propõe quatro funções de atitudes: utilitária, expressiva de

valor, defensiva do ego e de conhecimento. Uma atitude pode ser caracterizada

por mais de uma função, mas normalmente uma delas predomina.

De acordo com a função utilitária, uma pessoa desenvolve uma atitude em relação

a um objeto baseada na dor ou no prazer que esse objeto pode lhe proporcionar.

Essa função tem a ver com benefícios objetivos que uma pessoa pode perceber

ou extrair desse objeto. Já a função expressiva de valor diz respeito às atitudes

que exprimem as atividades, interesses e opiniões do indivíduo e não os

benefícios objetivos de um produto. A função defensiva do ego caracteriza

atitudes de auto-proteção das pessoas, enquanto a função do conhecimento está

presente em atitudes de indivíduos que buscam informação e estruturação para

dúvidas e ambigüidades.

Solomon (2002) afirma que grande parte dos pesquisadores concorda que a

atitude tem três dimensões: afeto, comportamento e cognição. O livro de Sheth et

al.. utiliza os termos sentimento, ação e conhecimento, respectivamente. A

primeira dimensão é a forma como a pessoa se sente em relação a um objeto da

atitude; a segunda, são as intenções de ação da pessoa a respeito do objeto e; a

terceira, as crenças de um indivíduo sobre esse objeto. As três formam o Modelo

ABC de Atitudes. Sheth et al.. vão além em relação a Solomon e discorrem sobre

a cognição, mencionando que existem três tipo de crença. As descritivas, que

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caracterizam um objeto pela sua qualidade ou resultado (ex. “Esse creme é muito

perfumado”); as avaliativas, que o caracterizam por apreciações, preferências e

percepções (ex.: “É fácil utilizar essa tintura em casa”) e; as normativas, que

associam o objeto a um juízo de valor ético ou moral (ex.: “As empresas de

cosmético não deveriam fazer testes em animais”).

Tanto Solomon (2002) quanto Sheth et al. (2001) afirmam que as três dimensões

da atitude podem ocorrer em ordens diversas, de acordo com o indivíduo ou o

objeto da atitude.

A figura 1, a seguir, caracteriza a ordem de ocorrência das dimensões na

Hierarquia de Aprendizagem Padrão. Segundo Solomon, o indivíduo que age

seguindo essa ordem está motivado a procurar muita informação, ponderá-las e

tomar uma decisão racionalmente bem acertada. No caso de um consumidor,

primeiro ele busca informações, com esse conhecimento ele forma crenças para

em seguida desenvolver um envolvimento afetivo e, somente depois, comprar. A

atitude é “baseada no processamento de informações cognitivas” (SOLOMON,

2002, p.167).

A figura 2

ilustra a Hierarquia Experimental ou Hierarquia Emocional, segundo a qual

indivíduos agem de acordo com suas emoções, pensando depois. Assim, as

atitudes de um consumidor cujas atitudes seguem a ordem dessa hierarquia

podem ser direcionadas por atributos intangíveis de um produto e pelas imagens e

mensagens da publicidade. A atitude é “baseada no consumo hedônico”

(SOLOMON, 2002, p.167).

Crenças Afeto ComportamentoCrenças Afeto Comportamento

Figura 1 - Hierarquia de Aprendizagem Padrão

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A figura 3,

abaixo, ilustra, finalmente, a Hierarquia de Baixo Envolvimento, na qual o indivíduo

age com base em um conhecimento limitado sobre o objeto e, somente depois de

obter os resultados de sua ação é que ele avalia e desenvolve um sentimento em

relação ao objeto. O termo “baixo envolvimento” é utilizado porque não importa

muito se ao final do processo o indivíduo se dá conta que tomou a atitude errada.

A importância da decisão é relativamente pequena para o indivíduo e, por isso, ele

não pensa muito antes de agir. A atitude é “baseada nos processos de

aprendizagem de comportamento” (SOLOMON, 2002, p.167).

Afeto CrençasComportamentoAfeto CrençasComportamento

Figura 2 - Hierarquia Experiencial ou Emocional

Crenças AfetoComportamentoCrenças AfetoComportamento

Figura 3 - Hierarquia de Baixo Envolvimento

Segundo Solomon, os indivíduos nem sempre mantém o mesmo nível de

comprometimento na atitude em relação a um objeto. O autor cita três níveis. O

nível de menor envolvimento é a condescendência, no qual a pessoa mantém uma

atitude muito superficial. Um nível mais elevado é a identificação – atitudes de

pessoas em conformidade com a postura de outras. O terceiro nível é a

internalização, com atitudes enraizadas que fazem parte dos valores das pessoas

e são as atitudes menos voláteis.

2.1.2 Motivação

Segundo Schiffman e Kanuk (2000), motivação pode ser classificada como uma

força interna ao consumidor que o leva a agir. Ela é um estado de tensão

produzido por uma necessidade não satisfeita. Solomon (2002) caracteriza esse

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estado de tensão como um abismo entre o estado presente do consumidor e o

estado desejado ou ideal, gerador das necessidades.

Essas necessidades, por sua vez, podem ser inatas ou adquiridas. As

necessidades inatas são aquelas que precisam ser atendidas para que um

indivíduo sobreviva. Já as adquiridas são produzidas pela cultura ou pelo meio

ambiente do qual faz parte o indivíduo (SCHIFFMAN, KANUK, 2000). Solomon

(2002), por outro lado, caracteriza as necessidades como utilitárias – relacionadas

a um desejo por um benefício funcional ou prático – e hedônicas – necessidade

por uma experiência, com vistas a satisfazer uma fantasia emocional.

Schiffman e Kanuk (2000) ressaltam que a motivação pode ter dois

direcionamentos: positivo ou negativo. Quando a força motriz leva o indivíduo na

direção de um objeto ou condição, a motivação é positiva. Quando a força afasta

do indivíduo do objeto ou condição, ela é negativa.

Os mesmos autores destacam que alguns estudiosos diferenciam a motivação

como racional e emocional. Os motivos dos consumidores são racionais quando

eles consideram todas as alternativas e escolhem a de máxima utilidade. Em

marketing, a racionalidade implica, segundo os autores, considerações sobre o

preço, o peso, o tamanho, ou seja, critérios objetivos. Os motivos emocionais, por

outro lado, envolvem a escolha por critérios subjetivos e envolvem emoções como

o medo, o orgulho, a raiva. Os autores destacam que a distinção não é a mesma

para todas as pessoas, visto que os motivos racionais são definidos por cada

pessoa. Assim, a decisão racional de um indivíduo pode ser considerada irracional

por outro que não compartilhe os mesmos valores.

Já que a motivação é um estado de tensão produzido por uma necessidade não

satisfeita, cabe aqui mencionar os estudos sobre necessidades. Segundo

Schiffman e Kanuk (2000), em 1938, Henry Murray, psicólogo, desenvolveu uma

listagem de 28 necessidades psicogênicas, que mais tarde foram utilizadas em

testes de personalidade. Murray acreditava que as necessidades eram comuns a

19

todos os indivíduos, mas que cada um definia de forma própria sua ordem de

prioridade das necessidades.

Já a Hierarquia Universal das Necessidades Humanas, criada pelo psicólogo

Abraham Maslow (MASLOW, 1970). A teoria postula que existem cinco níveis de

necessidades humanas. Para que um indivíduo seja motivado por uma

necessidade, é preciso que seja satisfeita a necessidade do nível anterior. É o

nível mais baixo da necessidade insatisfeita que motiva o comportamento dele.

Maslow propõe que existe uma superposição entre os níveis de necessidades,

dado que nenhuma necessidade é totalmente satisfeita. Mesmo que as

necessidades de nível inferiores continuem a motivar o indivíduo, existirá uma

necessidade, no nível mais elevado que as anteriores, que o motivará mais

fortemente.

Mesmo sendo uma teoria criticada, Schiffman e Kanuk (2000) afirmam que os

profissionais de marketing recorrem bastante a ela, que é utilizada como base

para a segmentação de mercado. Os autores classificam alguns bens de consumo

de acordo com algumas necessidades propostas por Maslow. Para eles, “quase

todos os produtos de higiene e limpeza (cosméticos, anti-séptico bucal, creme de

barbear) são comprados para satisfazer necessidades sociais”, por exemplo.

Necessidades Fisiológicas(alimento, água, ar, abrigo, sexo)

Necessidades de Segurança e Proteção(proteção, ordem, estabilidade)

Necessidades Sociais(afeição, amizade, afiliação)

Necessidades do Ego(prestígio, status, auto-respeito)

Auto-realização

Necessidades Fisiológicas(alimento, água, ar, abrigo, sexo)

Necessidades de Segurança e Proteção(proteção, ordem, estabilidade)

Necessidades Sociais(afeição, amizade, afiliação)

Necessidades do Ego(prestígio, status, auto-respeito)

Auto-realização

Figura 4 - Hierarquia das Necessidades Humanas de Maslow

20

Segundo Schiffman e Kanuk (2000), alguns psicólogos defendem a existência de

três necessidades básicas, que apesar de estarem inseridas na Hierarquia de

Maslow, têm uma relevância própria para a motivação dos consumidores: são as

necessidades de poder, de afiliação e de realização. É a chamada Teoria das

Necessidades de McClelland (MCCLELLAND, 1975). Entendê-la permite que as

empresas desenvolvam propagandas direcionadas e que possam conhecer o

perfil de consumo dos indivíduos.

A necessidade de poder tem a ver com o desejo de um indivíduo de controlar

outras pessoas, objetos e o ambiente. O indivíduo, motivado por essa

necessidade, aumenta sua auto-estima quando exerce poder sobre objetos e

pessoas. A de afiliação sugere que alguns consumidores são motivados pelo

desejo de relacionamento, amizade e aceitação do outro – pessoas muito

motivadas por essa necessidade têm forte dependência social dos outros. Já a

necessidade de realização influencia pessoas que precisam da realização para se

sentirem mais confiantes. Segundo Schiffman e Kanuk, essas pessoas não

gostam de correr riscos, pesquisam bastante o ambiente, buscam feedback e

atividades em que possam se auto-avaliar.

2.1.3 Valores

Hoyer e McInnis (2000) definem valores como crenças duradouras de que um

comportamento ou uma reação é desejável ou boa. Os valores servem como

padrões que guiam o comportamento das pessoas durante situações e diferentes

momentos de vida. O sistema de valores de cada pessoa é constituído dos seus

valores e da importância relativa de cada um deles. A forma como as pessoas se

comportam, em dada situação, é frequentemente influenciada por essa

importância relativa. Os valores impulsionam, portanto, grande pare do

comportamento do consumidor.

21

Os valores são aprendidos através do processo de socialização. A socialização,

por sua vez, resulta da exposição das pessoas aos grupos de referência, como

família, amigos, colegas de trabalho, artistas (HOYER; McINNIS, 2000).

Assim, os valores são expressões da cultura de dada população. E, toda cultura

possui um conjunto de valores compartilhados por seus membros de forma que a

importância relativa dos valores caracteriza e diferencia uma cultura da outra. É o

que se chama de endosso de um sistema de valores (SOLOMON, 2002).

Existem metodologias distintas para medir os valores de dada cultura. As mais

utilizadas em pesquisas sobre o comportamento do consumidor são a “Escala de

Valores de Rokeach”, que é aplicada, pedindo-se ao entrevistado a avaliação de

18 valores terminais e 18, instrumentais (HOYER; McINNIS, 2000); a “Lista de

Valores (LOV)”, instrumento que “identifica nove segmentos de consumidores com

base em valores que eles endossam e que relaciona cada valor a diferenças no

comportamento de consumo” (SOLOMON, 2002, p.107); e a Cadeia Meios-fins

(Means-end chain), abordagem que considera que os atributos dos produtos estão

ligados aos valores terminais – para acessá-los, o pesquisador deve construir

junto ao entrevistado a “escada” de ligações entre essas duas partes (SOLOMON,

2002).

Com o objetivo de resumir as inter-relações existentes entre os conceitos

apresentados neste capítulo de necessidade, motivação e atitude, contruiu-se um

modelo conceitual dos termos aqui explicados:

NECESSIDADE NÃO ATENDIDA

MOTIVAÇÃOgera provoca ATITUDES

CULTURA VALORES

= CRENÇAS

gera guiam ATITUDES

22

2.2 Conceito de Beleza

O termo “beleza” está relacionado a padrões estéticos, sejam eles em relação à

arte ou a aparência humana. Diversos autores (ECO, 2004; QUEIROZ e OTTA,

2000; BAUDRILLARD, 1995; NOVAES E VILHENA, 2003; WOLF, 1992;

HARGREAVES e KURY, 2000; BOUZÓN, 2004) chamam atenção para o fato de

que a concepção de beleza em uma sociedade está ligada a sua cultura.

Com relação à arte, a beleza pode ser expressa através de pinturas, esculturas,

fotografias, instalações, filmes e obras literárias. A beleza física, por sua vez, é

representada pelo corpo humano, suas partes e o que ele apresenta à sociedade

(ECO, 2004).

Parece ser unânime nas leituras que o conceito de belo é, em princípio, oriundo de

padrões estéticos e construído de forma arquetípica, segundo a conjugação tanto

de avaliações universais quanto de diferenças culturalmente construídas.

Queiroz e Otta (2000) defendem que, apesar de existirem diferenças no conceito

de beleza física entre as várias culturas, alguns padrões são universais. Os

autores citam estudos que comprovam, por exemplo, que quanto mais simétrico

um rosto feminino, mais atraente ele é considerado; traços típicos de bebê (como

bochechas arredondadas e rosadas) quando se manifestam nos adultos denotam

espontaneidade e inocência; homens barbados são mais masculinos aos olhos

das mulheres.

Baudrillard (1995) complementa mencionando um dos padrões de beleza atual:

“corpo belo é corpo magro”. Nunca a magreza e a beleza estiveram tão

diretamente associadas como na atualidade. Aboliu-se, no mundo moderno, a

noção grega de harmonia das formas, para se evidenciar o corpo belo como

magro e se exigir que as pessoas sejam esbeltas. Novaes e Vilhena (2003)

acrescentam que pessoas fora desses padrões estéticos atuais – ou seja, gordos

23

e feios – correm o risco de serem excluídos socialmente e percebidos como

negligentes, preguiçosos e descuidados.

O fato de hoje existirem formas de mudança na aparência justificaria esse

julgamento. A beleza não é mais o simples resultado da genética e da Natureza.

Num corpo humano, em princípio considerado esteticamente feio, podem ser

feitas intervenções e “melhorias”. Aqueles que não as fazem, assim, podem ser

percebidos como desleixados (QUEIROZ E OTTA, 2000). A avaliação sobre a

beleza física evoca não somente adjetivos como belo e feio, mas também outras

formas de caracterização. As sociedades ocidentais modernas associam os

conceitos de beleza corporal à inteligência e ao poder aquisitivo. Espera-se que

uma pessoa mais bonita seja mais inteligente e bem-sucedida. Associações

opostas acontecem para uma pessoa feia (QUEIROZ E OTTA, 2000).

Para Baudrillard (1995), a explicação para o julgamento é de ordem econômica. O

capitalismo leva as pessoas a perceberem seus corpos de maneira dicotômica:

tanto como um “bem de produção”, de onde provém o sustento do indivíduo,

quanto como feitiço, ou objeto de consumo. O corpo não deve ser negado ou

omitido; pelo contrário, as pessoas precisam ser convencidas a nele investir –

econômica e psicologicamente.

Para o autor, a “redescoberta”, no mundo atual – isto é, a queda de tabus e a

decorrente valorização do corpo – atribui-lhe funções morais e ideológicas. A

libertação física e sexual, a onipresença do corpo na publicidade, na moda e na

cultura de massa – no culto pela juventude, nos regimes, cuidados, sacrifícios que

ele conecta indicam que hoje o corpo adquire, sobretudo, um poder de salvação

do indivíduo.

A valorização da beleza física mobiliza, então, mulheres a cuidarem de seus

corpos buscando mantê-los jovens e magros. As mulheres teriam se emancipado

de antigas dominações, como as sexuais e as da procriação, para ingressarem na

servidão da estética (LIPOVESTKY, 2000).

24

Nesta nova concepção de corpo, beleza e erotismo ganharam destaque, cita

Baudrillard (1995), ao serem juntos a nova ética da relação com o corpo. Apesar

de atingirem homens e mulheres, as conotações são distintas: o modelo feminino

prevalece sobre o masculino, sendo um imperativo. O autor observa que, nas

mulheres, ser bela deixou de ser um atributo natural ou que advém das qualidades

morais. Ser bela é fruto de cuidados com o corpo. Seria esse o corpo bem

cuidado, uma recompensa, como as de conotação religiosas?

2.2.1 A Beleza e o Corpo

Baudrillard (1995) lembra que durante séculos se faziam esforços no

convencimento das pessoas de que elas não possuíam seus corpos. Na era

capitalista, o que a propaganda faz é justamente o contrário, tenta convencer as

pessoas dos seus próprios corpos. Mas, a evidência de que se possui o corpo não

seria o corpo em si, que é visto e sentido? Baudrillard diz que não. O corpo é “um

fato de cultura”, isto é, a relação com o corpo é um reflexo do modo como as

pessoas se relacionam socialmente e com as coisas que as rodeiam.

Hargreaves e Kury (2000) também descrevem o corpo humano como sendo

depositário de sua cultura. Cada traço de maquiagem, corte de cabelo, jóias,

arrumações estéticas em geral ou atitudes com cuidados pessoais e com a beleza

refletem um pouco o que as pessoas são e o que querem ser. O corpo é como um

prolongamento do que são. Seriam os ideais de beleza adequados à cultura de

cada país? Geralmente esses ideais valorizam o que é raro, exclusivo, único,

como uma loura de olhos azuis no Brasil ou uma mulher de cabelos cacheados no

Japão.

Para destacar características culturais associadas ao corpo, Novaes e Vilhena

citam Le Breton (1990). Para ele, desde a modernidade, o corpo humano é uma

representação da individualidade, é o que marca a diferença entre um homem e

outro, “fruto do individualismo e do descolamento do indivíduo do todo

comunitário” (NOVAES e VILHENA, 2003, p.12). Por conta disso, ao ator social, é

25

permitido conceber o seu corpo como sua propriedade. É essa idéia de possessão

do corpo, na qual o indivíduo se torna responsável pelo seu corpo, que justificaria

a obrigação de ser belo e legitimaria o julgamento de gordos e feios.

Os resultados do estudo de Askergaard (2002) reforçam a ligação do corpo com a

cultura. O estudo foca na perfeição do corpo, procurando analisar mudanças no

comportamento de consumo associado à estética, através de entrevistas com

mulheres que se submeteram a cirurgias estéticas como lipoaspiração, prótese

mamária e outras.

A grande maioria das entrevistadas apresentou o que a autora chama de discurso

retórico, cujas falas estavam na linha do “a beleza vem de dentro”. Antes de fazer

a cirurgia, no entanto, muitas se questionavam "Por que vou ser eu a única a

aparentar a minha própria idade?", como que justificando sua decisão. Isso

demonstra que apesar de possuírem o discurso retórico, elas associam o conceito

de beleza a atributos físicos, como a idade, por exemplo. Além dessa descoberta,

a autora constatou que a participação do contexto social é tão forte que envolve

até mesmo a necessidade de se possuir um corpo adequado a um padrão de

tamanhos e formas de vestuário (ASKEGAARD, 2002).

Queiroz e Otta (2000) lembram que, como o ideal de beleza é relacionado à

integridade física do corpo, deformidades evidentes contrariam o ideal estético e

podem chegar, até mesmo, a causar a marginalização de seus portadores,

estigmatizando-os.

Askergaard (2002) utiliza o modelo de Guiddens (1991) para mostrar como o

relacionamento entre as pessoas e a formação da individualidade mudou no fim

da era moderna. A opção de escolha, que é a chave do mundo pós-moderno,

permite que as pessoas passem a ter mais controle sobre a sua vida. As relações

passaram a seguir o conceito de "relacionamento puro", que é mantido apenas por

laços entre as pessoas e por nenhum outro motivo econômico, político ou moral. É

26

um conceito individualista, que diz que pessoas se relacionam com um objetivo de

buscar algum benefício pessoal nas pessoas que as cercam.

Em 1987, Nahoum identificou dois fatores históricos fundamentais para a

mudança da imagem cultural do corpo na Era Moderna: o uso maciço de espelhos

nas classes populares e a educação dos nossos sentidos, a partir do qual a visão

assumiu um papel preponderante. Também na modernidade, frisam Novaes e

Vilhena (2003), a apreciação da beleza se dá de forma fragmentada, com a

valorização dos detalhes, dos recortes. E o controle exercido “por meio de um

olhar minucioso sobre a aparência, e com o aval da ciência, contribui para

regulamentar diferenças e determinar padrões estéticos em termos daquilo que é

próprio ou impróprio, adequado ou inadequado, normal ou anormal” (NOVAES e

VILHENA, 2003, p.16).

O corpo pode ser gerenciado como se fosse uma unidade processável e

customizável? Quanto o “eu” deve ser alterado até que ele seja considerado

diferente? O estudo de Askergaard (2002) sugere que esse processo de mudança

do corpo não é inteiramente positivo, mas pode estimular auto-estima e bem-estar.

É o ponto onde se observa o fim da tirania do destino, onde o corpo era visto

como um atributo dado, para a tirania da escolha, onde o indivíduo se vê quase

que obrigado a tomar certas atitudes de acordo com padrões estéticos definidos

socialmente e culturalmente.

Lipovetsky (2000) defende que a busca pela juventude está ligada às mudanças

culturais que ocorreram a partir de 1960. Nessa década, a mídia começou a exibir

modelos adolescentes; os esportes se desenvolveram; as atividades de praia

ganharam muitos adeptos e; a moda seguiu esse movimento – surgiu o short e o

biquíni, as saias ficaram mais curtas e as roupas mais justas; o design

funcionalista, que elimina os exageros da forma. Todas essas mudanças

contribuíram para a valorização do corpo magro, móvel e jovem em detrimento do

sedentarismo feminino observado no período do Renascimento. Essas mudanças,

27

no entanto, não tiveram tanta força quanto a mudança social pela qual passaram

as mulheres. O reconhecimento do trabalho feminino, os métodos de controle

contraceptivo e a valorização de ideais individualistas foram essenciais para que o

papel da mulher deixasse de ser o de reprodutora. A criação dos filhos deixou de

ser a função da existência das mulheres.

De forma que, segundo Askergaard (2002), as relações se tornam mais livres,

mas também mais vulneráveis e mais temporárias. Por isso, as pessoas passaram

a ter uma necessidade de se “fazerem interessantes” o tempo todo, para poderem

estabelecer relacionamentos benéficos para si. Comparando com o início da

modernidade, onde a repressão havia gerado um sentimento de culpa que se

incorporava no comportamento dos indivíduos, hoje um pensamento narcisista

está gerando um sentimento muito mais ligado à identidade própria, capaz de

gerar vergonha nas pessoas que não seguem os padrões estéticos definidos. A

vergonha aumenta conforme aumenta a distância entre a percepção de si e as

aspirações, ou seja, aquilo que se pode vir a ser. Essas sensações, que se

positivas podem gerar orgulho e se negativas podem gerar vergonha, são

provocadas pelas interações sociais.

Segundo Baudrillard (1995) o corpo, a beleza e o erotismo aumentam as vendas e

desenvolvem os mercados na medida em que o corpo das pessoas é emancipado.

Ao redescobrir o próprio corpo, o indivíduo nele reinveste de forma narcisista – o

desejo pela mudança é transformado em procura por objetos e signos

manipuláveis racionalmente pelos consumidores, o que move um processo

rentável para o mercado (NOVAES e VILHENA, 2003, p.18). Dentro da lógica,

denotada também por Barthes (1982) de que embora “tratada como banal, a

modelagem da boa aparência na verdade é investida de grande carga ideológica,

fazendo com que a lógica do consumo permeie todos os investimentos estéticos”.

Nas palavras de Roland Barthes (1982, p. 645): “Meu corpo é para mim mesmo a

imagem que eu creio que o outro tem deste corpo”. Novaes e Vilhena (2003)

28

lembram que os cuidados físicos são uma forma de preparo para o enfrentamento

do julgamento e das expectativas da sociedade – isto é, o investimento em

estética é vinculado à visibilidade social que um indivíduo deseja ter. E a mídia

como um todo opera neste jogo de espelhos entre o modelo ideal (as lindas

modelos nas revistas), o modelo percebido (auto-imagem e auto-estima dos

leitores) e como as pessoas gostariam de ser percebidos pelo outro (na lacuna

entre o que são e o que almejam ser). Mas, como se comportam as mulheres

diante dessas possibilidades de modelos de beleza?

2.2.2 A Beleza e as Mulheres

Lipovetsky (2000) explica que nem sempre, na história da humanidade, as

mulheres foram as representantes da beleza. Há indicativos de que, nas

sociedades pré-históricas e selvagens, a fecundidade feminina era o atributo mais

valorizado. Nestas sociedades, o poder e o prestígio social estavam reservados

apenas aos homens – a idolatria das mulheres, que poderia advir da valorização

da beleza, era incompatível com a organização social existente.

Segundo Lipovetsky (2000), para que a beleza das mulheres passasse a ser

valorizada foi preciso que se criasse a divisão do trabalho e da sociedade em

classes, formando-se uma camada social privilegiada de mulheres que não

trabalhavam. Foram elas que inauguraram a associação entre a mulher e a

beleza. Essas mulheres aristocráticas possuíam tempo e recursos para se

tornarem mais bonitas. A beleza passava também a se associar a virtudes

aristocráticas.

Ao remontar à cultura grega, Lipovetsky (2000) afirma que já na antiguidade

clássica mulheres de dedicavam ao ato de se embelezar e escritores e autores

prestavam homenagem à beleza feminina. Naquele momento, no entanto, ainda

que louvada, a beleza feminina era ofuscada pelas formas perfeitas das

representações artísticas dos jovens gregos. Entre os gregos – como em outras

civilizações – a beleza feminina parecia ocultar a dita astúcia e mentira das

29

mulheres. Considerava-se que as mulheres enganavam, utilizando sua beleza e

sedução. Esse pensamento que associa a beleza a aspectos negativos persistiria,

segundo Lipovetsky (2000), na cultura judaico-cristã e na Idade Média.

A idolatria do sexo feminino se inicia na Renascença nos séculos XV e XVI

conjugando as duas lógicas do arcabouço cultural do culto à beleza feminina: o

reconhecimento da superioridade estética da mulher e a “glorificação hiperbólica

de seus atributos físicos e espirituais” (LIPOVETSKY, 2000, p.113). Neste

momento, as mulheres começam a ser associadas a “anjos superiores”,

representantes da beleza divina, graças a uma reinterpretação religiosa que nega

a distinção entre sagrado e profano no que diz respeito à beleza das mulheres.

Antes, apenas a beleza feminina, sagrada e pura da Virgem era retratada. As

Vênus de Botticelli e de Ticiano permitem observar como se dá a dissociação da

beleza feminina com o pecado, fazendo-a se aproximar da beleza divina da

Virgem Maria. Sobre o Nascimento de Vênus, de Botticelli, vale reproduzir

Lipovetsky: “Francastel observa que esse quadro nos faz assistir ao nascimento

de uma nova divindade, ao triunfo da Beleza, à apoteose da mulher que, nua,

ocupa agora, sozinha, a imagem: ‘Vênus substitui a Virgem’” (FRANCASTEL apud

LIPOVESTSKY, 2000, p.116).

A partir daí, a mulher é elevada à função de representar a beleza e as obras de

arte passam a mostrá-la como algo a ser visto e admirado “narcisicamente” tanto

por outras mulheres como por homens.

Na obra de Baudelaire (2004) há indicações da mudança de perspectiva sobre a

beleza feminina. No século XIX, o autor defende a posição da mulher como fonte

de inspiração para artistas e escritores, destacando e legitimando o uso de

artifícios para ser bela. O autor extrapola a idéia de musa, ao dizer que a mulher

teria como dever proporcionar ao homem imagens belas e artificiais, imagens que

o afastem do desagradável que advém da natureza.

30

A mulher está perfeitamente nos seus direitos e cumpre até uma

espécie de dever esforçando-se em parecer mágica e sobrenatural; é

preciso que desperte admiração e que fascine; ídolo, deve dourar-se

para ser dourada. Deve, pois, colher em todas as artes os meios para

elevar-se acima da natureza para melhor subjugar corações e

surpreender os espíritos. Pouco importa que a astúcia e o artifício sejam

conhecidos de todos, se o sucesso está assegurado e o efeito é sempre

irresistível (p.64)

Lipovetsky (2000) sublinha como pinturas renascentistas de mulheres deitadas

conferiram mais significado ao belo sexo. As pinturas, de mulheres passivas,

lânguidas, ociosas, denotam o aspecto da beleza a ser contemplada e totalmente

descaracterizada de qualquer esforço ou trabalho. Neste momento, a beleza

feminina ganhava significações de três tipos: era decorativa; não advinha de

esforço, era natural; era inatingível.

Ao avançar na idéia de sentido social atribuído ao culto da beleza feminina,

Lipovetsky (2000) expõe as diferenças entre a visão tradicional e a moderna. A

tradicional, que dominou até o século XVIII, associa a beleza a virtudes morais; os

feios são pessoas com vícios internos. Socialmente, ela tem pouco valor: por

exemplo, nos matrimônios da época, o que contava era apenas a condição

financeira da mulher. A visão moderna, que se seguiu e prevalece até hoje,

desvincula a beleza da moral, ela é puramente física.

Sob a ótica de Baudelaire (2004), em Sobre a Modernidade, de 1859, pode-se

entender como a imagem da bela burguesa estava ligada aos recursos. O autor

defende que os artifícios usados pelas mulheres para se tornarem mais belas –

roupas, maquiagem – compunham uma imagem, na mente do homem fascinado,

da beleza da “mulher vestida e maquiada”, “ser” formado pela combinação corpo-

artifício. A beleza era do conjunto e não da suas partes. “Tudo que adorna a

mulher, tudo que serve para realçar sua beleza, faz parte dela própria” (p.58).

31

Hoje a beleza também tem dupla concepção social quanto ao gênero. As autoras

Novaes e Vilhena (2003) chamam atenção para o fato de que enquanto a imagem

de “mulher pública” está ligada à “aparência, apresentação e atração”, o “homem

público” é aquele que desempenha seu dever social. “A sociedade mostra-se mais

condescendente e tolerante com a feiúra masculina” (p.27). Enquanto o desvio do

padrão de beleza aceitável está vinculado a falta de tempo do homem, dada a sua

rotina atribulada; entre as mulheres, está vinculado à falta de vaidade, de esforço

e de cuidado pessoal. Além disso, o efeito do cuidado em excesso é avaliado de

forma diametralmente oposta. Homens que têm muito cuidado com a beleza, são

vistos como gays. Entre as mulheres, o excesso reafirma suas identidades sociais,

sua feminilidade. Lipovetsky (2000) também acredita que “a beleza não tem o

mesmo peso para homens e mulheres”. O autor utiliza, inclusive, o termo o “belo

sexo” para identificar o sexo feminino, justamente, graças ao peso que a mídia e a

cultura ocidentais atuais atribuem às mulheres.

Assim, a pressão ou a exigência moral parece recair muito mais sobre as

mulheres, que “se quiserem, podem ser belas” – o que na opinião de Novas e

Vilhena (2003) se apresenta como um terrorismo contemporâneo em relação à

beleza. A obrigação e a facilidade em se tornar bela reforçam uma a outra e as

mulheres se tornam responsáveis por sua beleza. Retomam-se as idéias de

Baudrillard (1995), que indicam a passagem da estética para a ética do corpo da

mulher. Ética ou mito da beleza?

2.3.3 O Mito de Beleza

Para Wolf (1992), o mito da beleza é um tipo de coerção social pós-feminismo –

uma ideologia criada para controlar e limitar as mulheres, eliminado a herança

deixada pelo feminismo na vida das mulheres ocidentais. O mito é uma ideologia

capaz de diminuir a sensação de valorização que o feminismo trouxe à vida das

mulheres.

32

“A beleza não é ideal, nem imutável” (WOLF, 1992, p.15). Para Wolf, o mito da

beleza não deve ser visto como natural ou histórico, pois é cultural, derivado de

um sistema econômico e da estrutura de poder atual, que busca uma contra-

ofensiva contra as mulheres. Segundo a autora, a maioria das hipóteses aponta

que o mito, como o é hoje, ganha espaço desde 1830. No momento em que a

classe média começa a surgir, as mulheres dessa classe começam a ser

alfabetizadas e a sociedade, então, precisa domesticá-las.

Wolf (1992) argumenta que a ocupação com a beleza assumiu o lugar das tarefas

domésticas, no momento em que a dona-de-casa, “entediada, inquieta e isolada”

abandona seu lugar no lar para ocupar posições no mercado de trabalho. Em face

da perda do seu principal consumidor, os anunciantes precisaram arrumar formas

de fazer com que essa nova mulher, agora ocupada e estimulada, continuasse a

consumir nos mesmos níveis de outrora. “Era preciso uma nova ideologia que as

levasse ao mesmo consumismo inseguro de antes”. Essa mudança é

caracterizada pela autora como a passagem da Mística Feminina1 para o Mito de

Beleza (p.20 e 86).

O mito da beleza, como coloca Wolf tem, pelo menos, duas justificativas

econômicas. A primeira, é que como o mito baixa a auto-estima das mulheres, de

forma que elas não reclamem por receber menores salários. A segunda é “um

novo imperativo de consumo” que transforma em virtude social a obrigação das

mulheres em serem belas. (p.22 e 23)

Wolf (1992, p77-78) observa que mulheres idolatram e se espelham em o que ela

classifica como “realmente nada – imagens, recortes de papel”. A resposta está no

fato de as mulheres sempre estiveram obcecadas pela imagem “ideal”, justamente

porque os homens sempre as levaram a pensar assim, dado que elas não passam

1 Termo de Betty Friedman, retirado do livro A mística feminina, que caracteriza o momento (no pós-guerra) em que revistas femininas estimulavam o consumo de produtos domésticos, retratando’ as mulheres como donas-de-casa inseguras e sem identidade definida.

33

de “beldades” na cultura masculina, como, inclusive, descrevem Lipovetsky (2000)

e Baudelaire (2004).

Wolf (1992, p. 91-2) também aponta a grande importância que as revistas

femininas tiveram na construção e no fortalecimento do mito. Não só refletiram

mudanças no papel social das mulheres, como também as provocaram. Para a

autora, a mudança do mito da “dona-de-casa” para o de “beleza” começou nas

revistas femininas, através de anunciantes. O anúncio que atribui aos produtos

valores psicológicos inatingíveis promove o descontentamento nas mulheres e a

sensação de insegurança, que as leva ao consumo.

Wolf (1992) defende que o mito de beleza pode, ao mesmo tempo, unir e separar

as mulheres. Quando estão em grupo, ajudam umas às outras a lidar com a

beleza, dando dicas, emprestando produtos, ou reclamando sobre algum padrão

ou exigência estética. Esses laços, no entanto, não existem quando a beleza é

ameaçadora, quando isola as mulheres umas das outras e as fazem se vigiarem

possessivamente e de forma invejosa.

Apesar de um tanto radical, a visão de Wolf (1992) parece se articular com a de

Baudrillard (1995) que menciona que o mito estético-erótico afeta mais a mulher

pelo fato de, graças ao recalcamento do corpo, ter havido uma repressão à

mulher, cuja sexualidade foi historicamente reprimida e associada ao mal. Não só

no recalcamento, mas na libertação o corpo e as mulheres se ligam.

Para Baudrillard (1995), o corpo da modelo, belo e erótico, não é uma

representação do que aquela mulher é – de sua interioridade e sexualidade; mas

um conjunto de signos publicitários, simulação produzida pela fotografia. Não é um

corpo, mas uma forma, que nada tem de erótico. É um objeto assexuado como os

outros objetos retratados na publicidade. No entanto, qualquer objeto retratado

junto ao corpo dessa modelo, na troca de significações conseguem induzir

pessoas a os consumirem.

34

Lipovetsky (2000) parece não concordar com Wolf (1992), sobre a afirmativa de

que “ditadura da magreza” é uma opressão dos valores feministas. Para o autor, o

corpo magro representa a independência financeira e o cotidiano agitado. Esse

corpo firme e esbelto representa o sucesso, o autodomínio, a capacidade de se

autogerenciar dessa nova mulher. O autor acredita que a busca por um corpo

magro, entre as mulheres, manifesta a vontade de se igualarem aos homens, de

serem senhoras de suas próprias vidas.

Ainda criticando as colocações de Naomi Wolf, Lipovetsky (2000) discorda do fato

de que exista uma “mística de produtos de beleza” (LIPOVETSKY, 2000, p.141).

Ele defende que o consumo é voluntário e que há espaço para a “interrogação

crítica, o debate coletivo” no mercado de cosméticos – existe o espaço para o

consumidor comparar produtos e fazer escolhas voluntárias. A avidez por novos

produtos entre as mulheres não caracteriza um hipnotismo das massas; mas,

contrariamente ao que prega Wolf, é para Lipovetsky, uma vontade das mulheres

de serem protagonistas.

Neste sentido, expõe Lipovetsky (2000), o cuidado com o corpo se aproxima dos

valores da modernidade: de dominação da natureza, de enaltecimento da razão

(no caso, estética), de utilização de tecnologia e da não-aceitação da fatalidade.

Enquanto Wolf (1992) critica o “mito da beleza”, Lipovetsky (2000) defende que o

“culto à beleza”, já que esse confere motivação para as mulheres conquistarem

cada vez mais seus espaços, igualando-se aos homens. No entanto, ele admite

que hoje persista a diferença na forma como a sociedade avalia homens e

mulheres. A beleza é o elemento de manipulação e conquista de reconhecimento

social para as mulheres como a profissão o é para os homens.

2.3.4 A Beleza e o Cabelo: a etnografia de Bouzón (2004)

“Os cabelos também refletem valores, significados e comportamentos reveladores

de importantes dimensões da vida social” (BOUZÓN, 2004, p.12).

35

Se a cultura ocidental associa feminilidade à beleza, é o cabelo o elemento quase

indispensável na construção do feminino. É interessante entender, como nesse

cenário teórico, as mulheres lidam com ele. A seguir, são apresentados os

principais achados do estudo de Bouzón a cerca de representações e práticas

femininas relativas aos cabelos.

A etnografia realizada por Bouzón (2004) é uma contribuição no sentido de

entender significações sociais por trás dos cabelos. Ela foi feita no ano de 2003

em um salão de beleza da zona sul do Rio de Janeiro, onde foram entrevistados

freqüentadores – mulheres brancas de 20 a 60 anos – e profissionais que

trabalham no salão.

Bouzón (2004) traz uma discussão em torno dos significados associados aos

cabelos. Por exemplo, o cabelo arrumado, garante segurança emocional,

protegendo a pessoa do julgamento e da exclusão pela aparência; os cabelos

compõem uma fachada pessoal e podem até servir para afastar um indivíduo do

convívio com outras pessoas. Esse é o caso quando a pessoa tem um corte

“cafona”, a cor do cabelo “escandalosa” ou um cabelo “sujo”, “desgrenhado”. Um

outro exemplo da avaliação pelas características do cabelo no Brasil, encontrado

em Queiroz e Otta (2000), é a desqualificação social dos traços físicos dos negros,

através de termos populares, como “cabelo ruim” para caracterizar o cabelo

crespo.

Os achados da etnografia apontam aspectos com respeito ao hábito de pintar os

cabelos e sobre os fios brancos. No salão pesquisado, a presença na sala de

coloração era principalmente de mulheres entre 35 e 55 anos – idade, na visão da

antropóloga, em que começa a acontecer o branqueamento dos fios. A associação

mais forte do cabelo branco é com a velhice. existe uma relação dicotômica entre

fios brancos e envelhecimento. Se, por um lado, esconder fios brancos é uma

forma de se manter afastada da lembrança do envelhecimento, da finitude da vida;

num contexto em que se busca parecer jovem, os fios brancos denunciariam

36

“perdas físicas e simbólicas”. Por outro lado, não pintar os cabelos é visto como

uma prova de que a mulher soube encarar o envelhecimento. Essa é uma

condição colocada, principalmente, quando as mulheres são mais velhas. Junto às

mais novas, no entanto, existe a idéia de que manter os cabelos brancos em uma

conotação de “desleixo”. A cor branca, que na esfera da saúde e da medicina, é

um símbolo da pureza, acaba por ganhar uma conotação de “sujeira”.

Embora a noção de velhice receba diferentes associações positivas como

“experiência” e “sabedoria” pois em referências ocidentais, deuses, sacerdotes,

cientistas, gênios e magos costumam ter cabelos brancos. O cabelo branco em

outras associações se associa à “ansiedade”, “hereditariedade”, pode simbolizar

também pessoas estressadas, workaholics.

Mulheres reclamam do fato de serem “reféns” da coloração, não conseguindo

abandonar o hábito de pintar os cabelos brancos. Para elas, essa atitude é uma

“necessidade, uma obrigação moral e não uma opção” (p.86) Por isso, muitas

entrevistadas consideram a atitude das mulheres mais jovens, que pintam

somente para mudar o visual, quase um pecado. Existe também a percepção de

que assumir cabelos brancos é algo muito difícil. A coerção de amigos pode fazer

com que uma mulher pinte seus cabelos, mesmo não se incomodando em mantê-

los brancos. Assumir os fios brancos, indo contra fortes exigências sociais, é uma

atitude considerada corajosa. Mas assumir cabelos brancos poderia ser

considerado um comportamento desviante das consumidoras entrevistadas?

O momento de retocar os fios brancos é medido pelo tamanho da raiz. À medida

que o cabelo cresce, a raiz do fio branco começa a aparecer. Quanto antes for

feito o retoque, mais escondida a raiz. Não é bom ter uma raiz branca aparente,

muito menos um cabelo cuja raiz é de uma cor e o reto do fio de outra. Quem tem

um cabelo assim é considerada descuidada com os cabelos e com a aparência.

Essa atitude permite, aos outros, reconhecer que o cabelo é pintado, e não

natural. Na etnografia, foi possível perceber uma busca pela “naturalidade” na

37

aparência dos cabelos. O “natural” denotaria a falta de intervenções culturais, a

originalidade, aquilo que combina com nós mesmos, com o que somos.

É interessante a forma como algumas mulheres associam as cores das tinturas e,

assim, dos cabelos a características pessoais da portadora. Os tons loiros estão

associados a mulheres ou ricas ou “peruas” ou “vulgares”, que buscam ser

atraentes e sexies. Já as mulheres morenas são vistas como clássicas, que não

se arriscam; mas que, por outro lado, são muito inteligentes. Como a loira, a

mulher ruiva é aquela que quer se destacar, despertando atração sexual nos

homens. Independente da cor escolhida para os cabelos, os achados sugerem

que é preciso que o cabelo combine com o rosto e o corpo.

Também o comprimento dos cabelos traz simbolismos a respeito da aparência de

uma mulher: o comprimento do cabelo deve “combinar” com a idade e às

mulheres de mais de 50 anos não é recomendado usar cabelos compridos e

franjas.

“Situações sociais podem pedir tipos de cabelo” (p. 125). Com relação ao

ambiente de trabalho, por exemplo, parece existir um código de uso dos cabelos

bem definido, ou seja, quanto mais formal a ocupação, mais bem cuidado deve ser

o cabelo. Por cuidado, entende-se: cortes e tinturas sóbrias; penteados

arrumados. No contexto profissional, aparece também o medo de envelhecer e de

perder o emprego que faz com que se disfarcem sinais da idade, como os cabelos

brancos.

Apesar do “cabelo bem tratado” ser associado às camadas sociais mais ricas, a

etnografia identificou muitas pessoas que, mesmo estando em um salão de

cabeleireiro de uma área geograficamente mais valorizada, relatavam ter poucos

cuidados com os cabelos. Para Bouzón (2004) isso sugere a existência de uma

grande “auto-exigência estético-moral” que pode levar à percepção de que os

cuidados empregados com os cabelos nunca são suficientes.

38

2.3 O comportamento desviante do consumidor

O que significa comportamento desviante do consumidor? O conceito de desviante

parece estar associado ao que se costuma denominar de ‘contracultura”. Segundo

Pereira (1992), contracultura foi um termo dado pelos jornalistas americanos aos

movimentos jovens da década de 60 que criticavam o militarismo americano e os

valores da sociedade de então. Esses movimentos de rebelião podem ser

exemplificados pelas comunidades hippies, pela produção literária (beat

generation) e musical (rock n’roll), pelos protestos nas universidades americanas,

pela valorização do Oriente, pelo uso de drogas como o LSD, por atitudes como

viajar pelo mundo levando apenas uma mochila.

Pereira (1992) descreve a sociedade americana das décadas de 60/70 para

explicar quais seriam os valores contra os quais os jovens lutavam: indústria

avançada, possibilitando o constante lançamento de novos produtos, renovando o

“massificante sistema do consumismo”, “sociedade tecnocrática voltada para a

busca de um máximo de modernização, racionalização e planejamento”, “privilégio

dos aspectos técnico-racionais sobre os sociais e humanos” (PEREIRA, 1992,

p.28).

O outro sentido do termo denota uma postura crítica e radical contra uma cultura

convencional. A contracultura, nesse caso, seria uma cultura minoritária

caracterizada por valores, normas e padrões de comportamento que contrariam

aqueles da sociedade dominante (BATZELL apud DESMOND ET AL.., 2001). E

não somente contrariam: o termo pode se referir a um sistema coerente que

compreende pelo menos uma norma ou valor comprometido com uma mudança

cultural da ordem dominante (DESSAUR ET AL. apud DESMOND ET AL., 2001).

Desmond et al. (2001) fazem uma análise da evolução dos movimentos de

contracultura. Segundo os autores, os primeiros movimentos eram formados por

sujeitos cuja resistência se ligava à tomada de consciência. A partir do

conhecimento, os indivíduos se davam conta da condição em que viviam e, assim,

39

inauguravam os questionamentos. Eram cidadãos auto-críticos e autênticos, que

viviam a resistência em todos os momentos da vida. Hoje nas sociedades ditas

pós-modernas, diferentemente, o que Desmond et al. (2001) deslumbram são

indivíduos que podem viver uma parte do tempo na contracultura e, outra, na

ordem vigente, através da incorporação dos valores pós-modernos aos

movimentos de contracultura. Os autores citam como exemplos a

descentralização, a espontaneidade, a fluidez, a diversidade e a fragmentação. A

separação entre comportamento desviante e padrão parece ter ficado mais tênue.

Esse movimento abre espaço para a existência de diferentes vozes e tribos na

contracultura, que ganham destaque por meio da Internet e o conseqüente

aumento da possibilidade de comunicação e mobilização. Essa mudança parece

ser coerente com um momento social em que a vida não é mais vivida como um

projeto único; pelo contrário, as pessoas experimentam diferentes sensações,

assumem diversas facetas e identidades no mundo de hoje. Um mundo que aceita

que um indivíduo seja hoje de uma tribo e amanhã de outra, onde a postura

desviante encontra pouca surpresa e o indivíduo parece alternar posturas

desviantes e de concordância sem suscitar reações sociais de rejeição. Um

mundo que, assim, não se surpreende se hoje você tem uma postura desviante,

mas amanhã não (DESMOND ET AL., 2001).

Embora a juventude não esteja mais tão mobilizada, como no cenário descrito por

Pereira (1992), e o movimento de contracultura seja promovido por pessoas que

transitam entre o questionamento e a prática comum, é ainda possível observar

movimentos sociais contrários à ordem estabelecida. Foram esses movimentos,

por exemplo, os focos do estudo de Kozinets e Handelman (2004). Os autores

ouviram ativistas contrários a elementos da sociedade de consumo, como a

propaganda e a marca Nike, e aos alimentos geneticamente modificados. Os

estudiosos dos movimentos de consumidores assumem que o objetivo por trás

dessas iniciativas é promover mudanças nos princípios, práticas e políticas das

organizações, negócios, indústrias e governo.

40

Segundo Kozinets e Handelman (2004), os ativistas conhecem as mudanças que

buscam na ideologia do consumidor. Eles querem que os consumidores

questionem as morais e as éticas da origem de um produto ou serviço e as

implicações sociais e ambientais dele. Eles mencionam a autodisciplina e o

comedimento na compra e no uso (Kozinets e Handelman, 2004).

Kozinets e Handelman (2004) observam que a organização dos movimentos de

consumidor se dá contra práticas industriais e de marketing, tais como a venda de

produtos que podem prejudicar o consumidor e a publicação de propagandas

enganosas.

Para os autores, os elementos da contracultura foram e são regularmente

incorporados à cultura do consumo e que, por isso, a ameaça dela é bem

pequena, o que torna difícil mobilizar as pessoas contra o capitalismo global

(Kozinets e Handelman, 2004).

Como associar comportamentos desviantes às pressões sociais existentes em

relação aos padrões estéticos que predominam?

41

2.4 A Beleza e O Comportamento Desviante do Consumidor: o estudo de Holbrook et al. (1996)

A interseção entre o comportamento desviante dos consumidores e a questão da

beleza é muito bem representada no estudo de Holbrook et al. (1996). Os autores

conseguem identificar comportamentos desviantes com relação a beleza e

aparência física das pessoas, ajudando a categorizar tipos diferentes de

comportamento social desviantes.

Dada a complexidade da relação entre o consumo e a aparência física, foi

desenvolvida uma tipologia, obtida através de uma metodologia de análise de

filmes, que ajuda a simplificar e analisar grupos de pessoas que seguem os

mesmos padrões ao lidar com sua aparência. Apesar de, no final, os autores

deixarem claro que as formas de classificação são limitantes, a tipologia proposta

ajuda a dar uma idéia mais precisa do panorama que eles se propõem a exibir.

Essa tipologia está baseada em duas dimensões chaves: (1) a posição social

almejada e (2) posição social atual. Na análise, essas dimensões variam entre a

normalidade e o desvio. Os pares posição social almejada versus posição social

atual e normal versus desviante caracterizam os quatro principais eixos que foram

analisados no estudo. São elas: configuração, transfiguração, refiguração e

desfiguração. Para cada um desses tipos, foi apresentada uma análise descritiva,

as motivações, atitudes, exemplos e analogias que permitem ao leitor entender

cada postura a fundo. O primeiro perfil não se demonstra desviante, mas foi

incluído nesta descrição para que o leitor possa ter a visão completa do estudo.

(1) Perfil Configuração

Consumidores dentro do perfil da configuração têm comportamento que não

variam dentro do padrão da normalidade. São indivíduos normais que desejam

manter a adequação às normas e convenções da sociedade e têm sucesso nisso.

42

O padrão de consumo desse perfil se baseia na busca por se manter belo e

atraente dentro do padrão de estética convencional. Isso implica em sempre

buscar vestir as tendências da moda, ter os cabelos cortados de acordo com a sua

idade (quanto mais idade, mais curto o cabelo), ter uma alimentação correta

(mantendo-se magro), freqüentando lugares onde também estão pessoas bonitas.

Apesar da aprovação social que esses consumidores recebem em troca por serem

os representantes e mantenedores das convenções sociais, a busca pela beleza

física faz deles alvos de críticas, sátiras e rejeição por parte da sociedade. Alguns

dos críticos consideram que a postura de configuração aliena a pessoa de sua real

identidade. Ela age de acordo com os valores do sistema, negando seus desejos e

sua individualidade.

(2) Perfil Transfiguração

São consumidores desviantes, mas que buscam a normalidade, pela adequação

aos cânones sociais tradicionais. Muitas vezes, o consumo dessas pessoas passa

pelo embelezamento físico. Esse consumidor é motivado pelo desejo de ser

aceito. Ele, que é uma pessoa fora dos padrões estabelecidos, busca se passar

por normal; o movimento é da diferenciação para a similaridade, tendo o consumo

de produtos e serviços relacionados à beleza como guia.

E essa motivação faz com que as significações sociais dêem lugar aos produtos,

na lógica do “você é o que você consome”. Nesse ponto se pode observar a força

do marketing integrando corpo a consumo. Beleza e atração podem ser

encontradas nas prateleiras ou nos salões e clínicas. Quanto mais xampus,

condicionadores, maquiagem você consumir, maiores as suas chances de passar

da condição de feio (desviante) para a de belo (normalidade). O estudo cita que

também as pessoas que se submetem a cirurgias plásticas, e de mudança de

sexo, como os hermafroditas, são exemplos desses consumidores na sociedade.

43

A geração de inúmeras propagandas que estimulam as pessoas a modificar sua

auto-imagem, através do uso do produto anunciado, tem conseqüências sociais.

As pessoas com esse perfil tendem a ser menos felizes, com baixa auto-estima e

aprovação pessoal, principalmente porque se comparam com as imagens

mostradas nas propagandas, que na verdade não são reais, mas, sim, retocadas

para dar a impressão de uma realidade melhorada. Bordo (1993, apud

HOLBROOK ET AL., 1996, p.40) sugere que os anúncios e a mídia causam

desordens alimentares, produzindo uma cultura doente – opressiva, vazia de amor

e de moralidade, ou seja, conseqüências sociais ainda maiores.

(3) Perfil Refiguração

Aqui, são os consumidores que buscam sair do padrão normal para o desviante,

como uma forma de crítica aos padrões estabelecidos. A motivação desses

consumidores envolve a rebelião, que advém da não-conformidade com o mito de

Beleza Ideal. Por não serem representantes do belo, eles são vistos como desvios

sociais. Os integrantes preferem se fazer de “feios” (pela concepção

convencional), distinguindo-se assim do grupo dos “belos” cujas idéias eles

menosprezam.

Nos movimentos populares, punks, hippies e skinheads são representantes desse

grupo, que se veste e se comporta de forma pouco convencional na tentativa de

criar uma forma de expressão alienante e contrária aos valores do status quo.

Famosos roqueiros e artistas como Alice Cooper, Mick Jagger e Madonna se

transformaram de pessoas relativamente normais em pessoas “estranhas”,

engajadas em alguma oposição social ou buscando uma identidade alternativa na

subcultura dos desviantes.

Pode-se citar como outros exemplos de consumidores com perfil de refiguração

pessoas que importam a automutilação das culturas indígenas ou africanas,

pessoas que utilizam objetos fetichistas como coletes, botas, chicotes, etc.,

pessoas tatuadas e usuários de piercings.

44

Os efeitos sociais desse tipo de comportamento são obtidos na medida em que a

rebeldia é incorporada à sociedade. O autor menciona a moda como principal

meio por onde a rebeldia se estabelece, citando como exemplos o espaço que a

tatuagem e o piercing ganham nos ensaios de moda e desfiles; o estilo “grunge”,

criado por roqueiros americanos, que estava em alta na época em que o texto foi

escrito; e a incorporação recente do jeans, antes uma peça de roupa utilizada pela

juventude transviada, nos guarda-roupas de todas as camadas sociais. Quando a

rebeldia é incorporada aos padrões convencionais, o grupo busca uma nova

maneira de chocar até que esse novo choque seja incorporado pela sociedade.

(4) Perfil Desfiguração

São consumidores que possuem alguma característica física ou psicológica que

os faz serem desviantes e que elegem ou são obrigados a se manterem no padrão

contrário ao normal. Muitas vezes, permanecem assim porque não desejam ou

não estão aptos a mudar. Essas pessoas podem permanecer com aparência e

consumo que os faz serem considerados estranhezas, aberrações, monstros ou

bizarrices.

A motivação desses consumidores é o desejo por atingir, manter ou aceitar uma

condição de unicidade frente aos outros membros da sociedade. Ao invés da

conformação, esses indivíduos prezam a ostentação. Eles valorizam suas

qualidades desviantes, mostrando aos outros uma aparência chocante, da qual

muitas vezes eles tiram os seus sustentos. Seu consumo é marcado por exageros.

E a postura deles frente a suas aparência envolve imitação e ilusão – as pessoas

são vistas como caricaturas grotescas.

Na sociedade, são exemplos desse tipo de consumidor as “aberrações”2 que vão

a público explorar suas diferenças – podem ser artistas circenses, para-normais,

2 Do inglês, freak.

45

pessoas com anomalias físicas. Também citados como exemplos são os artistas

travestis e as drag queens.

Apesar de parecerem para o resto da sociedade como desvios, a condição de

anormalidade traz a essas pessoas benefícios psicológicos e econômicos.

Holbrook et al. (1996) sugerem que eles têm orgulho da condição de seres únicos

o que os permite a exibição pública e os seus salários.

Os efeitos sociais dessa postura não ultrapassam o grupo. A sociedade continua

vendo-os como aberrações grotescas. Enquanto isso, eles se resignam em ser o

que são, seja porque podem ser “lucrativos” em benefício próprio, seja por não

terem opção e, com isso, se tornarem traumatizados.

Para explicar o significado que as pessoas atribuem aos perfis Refiguração e

Desfiguração, os autores mencionam a existência de uma tendência cultural entre

as pessoas em classificarem os outros dicotomicamente: velho/novo, bonito/feio,

pobre/rico, preto/branco, homem/mulher, macho/fêmea, correto/deformado. Essa

forma de ver os outros pode ser considerada como uma conseqüência do

pensamento moderno – racional, objetivo, categórico e capaz de explicar tudo.

Sob esse aspecto, quando o outro cruza de uma classificação para a outra, se dá

estranhamento por não se poder classificá-lo numa dessas categorias binárias.

Essa tendência humana de classificação foi questionada pelo pós-modernismo e

pelo feminismo. Ambos compartilham da mesma postura de questionamento. Para

esses movimentos, a sociedade deve parar de questionar o porquê de uma

pessoa não poder ser classificada categoricamente com um desses rótulos e

começar a tolerar as diferenças, aceitar os desvios.

46

3. METODOLOGIA

Este capítulo tem por objetivo descrever a metodologia empregada neste estudo.

Nos tópicos a seguir, justifica-se a escolha da metodologia qualitativa empregada

neste trabalho, através de uma caracterização geral; e retoma-se a delimitacão

dos objetivos de pesquisa. Em seguida, são detalhadas as diferentes fases dessa

pesquisa: contato com o fenômeno, formação do corpus, coleta de dados e

tratamento das entrevistas.

3.1 Paradigma e tipo de pesquisa adotados

Nas ciências sociais, em geral, existem dois paradigmas de pesquisa: o positivista

e o interpretativista. O primeiro parte do pressuposto de que existe uma visão

única e objetiva da realidade. Nos fenômenos sociais, sob esse paradigma, são

observadas tendências racionais e regulares de manifestações e fatores que

agregam previsibilidade e causalidade. As eventuais visões conflitantes e as

ambigüidades são eliminadas na medida em que se repetem relatos conclusivos

acerca de um fenômeno (D’ANGELO, 2004; LINCOLN, GUBA, 1985).

Já o interpretativismo, pelo contrário, acredita que os fenômenos culturais sejam

oriundos de construções múltiplas e complexas, derivadas da interação social.

Constrói-se o conhecimento, sob esse paradigma, através da combinação de

diferentes visões sobre um tema, ainda que não haja, entre elas, concordância.

Não se busca alcançar, pelas pesquisas, previsibilidade ou leis gerais que

expliquem um fenômeno – o objetivo é, apenas, descrevê-lo e interpretá-lo

(D’ANGELO, 2004; LINCOLN, GUBA, 1985).

Bauer et al. (2002) reforçam o ponto de vista interpretativista ao afirmarem que, na

pesquisa social, as descobertas dizem respeito ao mundo que se conhece e se

experimenta. Por isso, os dados são levantados através de processos de

comunicação e podem ser de dois tipos: formais ou informais. Na pesquisa social,

o interesse do pesquisador é em como as “pessoas se expressam e falam sobre o

47

que é importante para elas e como elas pensam sobre suas ações e as dos

outros”.

Busca-se neste trabalho, que tem um fim exploratório, a diversidade de discursos

e opiniões acerca do tema pesquisado. Não se trata aqui de indicar causas e

explicações para o fenômeno social pesquisado, nem de se estabelecer regras

gerais, mas sim buscar a multiplicidade de pontos de vista sobre um tema e, mais

especificamente, os fundamentos desses pontos de vista. Alinhando-se os

pressupostos da pesquisadora e os desafios inerentes à pergunta de pesquisa,

entende-se que uma metodologia de pesquisa qualitativa forneceria um conjunto

de recursos adequado para se buscar os objetivos deste trabalho.

Segundo Flick (2002), as rápidas mudanças sociais que vêm ocorrendo na

atualidade e a resultante diversificação de estilos de vida fazem com que o

pesquisador se confronte com novos contextos e perspectivas sociais. Sob esse

aspecto, as metodologias tradicionais – que buscam testar hipóteses e teorias –

se mostram pouco eficazes. A pesquisa qualitativa, nesse contexto, ganha

espaço.

Através da pesquisa qualitativa, estudam-se os fenômenos em seus contextos

naturais, buscando construir um sentido ou interpretá-los segundo a perspectiva

daqueles que falam sobre ele, os pesquisados. Neste processo de pesquisa,

enfatiza-se também a relação entre o pesquisador e o objeto do estudo e as

peculiaridades e q características que moldam o ambiente de pesquisa (DENZIN E

LINCOLN, 2000).

Para isso, a pesquisa qualitativa deve envolver o estudo de uma grande variedade

de materiais empíricos – estudos de caso, experiências pessoais, introspecção,

história de vida, entrevistas, artefatos, textos e produções culturais, textos

históricos – capazes de traduzir a rotina, a problematização e a significação da

vida de determinado indivíduo (DENZIN e LINCOLN, 2000).

48

Esse tipo de pesquisa possui aspectos essenciais, como a escolha correta dos

métodos e teorias oportunas, o reconhecimento e análise de diferentes pontos de

vista, a reflexão dos pesquisadores acerca da pesquisa como parte do processo

de produção do conhecimento e a variedade de abordagens e métodos (FLICK,

2002).

3.2 Perguntas de pesquisa

A pergunta a que se visa responder nesta pesquisa é: “Quais são as principais

motivações, atitudes e valores em torno da decisão de mulheres em não tingirem

seus cabelos, mantendo-os brancos?”.

Para alcançar esse propósito, torna-se fundamental entender essas mulheres num

quadro mais amplo, que inclui não apenas seus pontos de vista no momento atual,

mas também a relação com seu passado e com o grupo social que está a sua

volta. Assim, para se responder à pergunta principal desta pesquisa, foram

elaboradas questões secundárias:

(a) Quais são os cuidados cotidianos dessas mulheres com relação aos cabelos?

(b) Como são suas histórias em relação aos cuidados com o cabelo?

(c) Quais são os valores por trás da atitude de manter os cabelos brancos? E

como se dá o encadeamento entre essa atitude e esses valores?

(d) De que forma as mulheres entrevistadas percebem as mulheres que não

pintam o cabelo? Como elas enxergam a reação dos outros a sua atitude?

(e) O comportamento dessas mulheres que optam por manterem seus cabelos

grisalhos tem características de um comportamento desviante, frente aos

padrões estéticos e os hábitos de cuidado pessoal predominantes?

49

3.3 Fases da pesquisa

FASE 1 – Contato com o fenômeno social

A primeira fase da pesquisa, “de orientação e visão geral” (LINCOLN, GUBA,

1985), abrange a introdução ao tema. Pode-se dizer que isso se deu a partir da

participação da autora em uma pesquisa sobre hábitos de consumo de produtos

de beleza.

Realizada pela Cátedra L’Oréal de Comportamento do Consumidor, um núcleo de

pesquisa do Instituto Coppead de Administração, a pesquisa consistiu em

entrevistas em profundidade com mulheres entre 17 e 55 anos, moradoras da

zona sul do Rio de Janeiro. Para a formação do objeto de pesquisa e

desenvolvimento do questionário, o núcleo analisou o conteúdo da Revista Veja

sobre o tema, entrevistou estrangeiros, especialistas da área e consumidores, foi a

campo observar e coletar informações.

A integração da autora na fase de coleta de dados desse estudo, permitiu levantar

conhecimentos acerca do tema beleza. Cabe mencionar que outros

comportamentos desviantes – como o uso de piercings, de tatuagens e formas de

se vestir – foram inicialmente considerados. Optou-se, ao final, pelo estudo de

mulheres que não tingem seus cabelos, mantendo-os grisalhos, por vontade

própria. Exclui-se desta pesquisa mulheres que não utilizam a tintura por serem

alérgicas ao produto e que, ao serem perguntadas, não consideravam que tinham

cabelos brancos, ainda que os cabelos brancos fossem visíveis.

Além do contato com essa pesquisa qualitativa sobre a Beleza, que serviu

inclusive como base na produção do roteiro de entrevistas deste estudo (anexo 1),

a pesquisadora buscou levantar informações sobre o tema do estudo através de

levantamento bibliográfico e material secundário, como matérias de jornais e

revistas.

50

Essa fase de busca por material literário de referência aconteceu entre janeiro e

julho de 2005. Foram consultadas as bases de dados internacionais para busca de

artigos que, após a seleção, eram lidos e resenhados. Foram estudados livros a

respeito de beleza e hábitos de cuidado pessoal. A freqüente leitura de periódicos,

como jornais e revistas, permitiu o contato com textos sobre costumes atuais em

relação aos cabelos.

FASE 2 – Construção do corpus de pesquisa

A noção de corpus, presente em Bauer e Aarts, guiou a seleção de entrevistadas

desta pesquisa. Barthes (1967: 96) define corpus como “uma coleção finita de

materiais, determinada pelo analista, com (inevitável) arbitrariedade, e com a qual

ele irá trabalhar”. Ainda na concepção de Barthes, os materiais do corpus devem

ser teoricamente relevantes para a pesquisa, isto é, devem ter um foco temático;

devem ser tão homogêneos quanto possível, e devem ser de um mesmo momento

histórico (apud BAUER, AARTS, 2002).

O corpus desta pesquisa qualitativa se constitui pelas informações verbais

coletadas a partir de um mesmo foco temático – o entendimento das motivações e

valores da atitude de não pintar os cabelos – entre mulheres de mesma classe

econômica e área geográfica; e com uma mesma característica – manterem os

cabelos brancos sem utilização de tinturas. Além disso, as entrevistas foram

realizadas num mesmo período: junho de 2005.

Segundo Gaskell (2002), como o objetivo da seleção dos entrevistados deve ser o

de descobrir a variedade de pontos de vista, o entrevistador deve buscar a

segurança de ter ouvido todos os pontos de vista e, para isso, é preciso entender

como o meio social que se deseja pesquisar se segmenta. Com o objetivo de

definir qual grupo de mulheres entrevistar, buscou-se observar mulheres antes do

início da seleção.

51

A seleção das entrevistadas teve, então, como parâmetros: o sexo (feminino), a

classe econômica (classe A), a área geográfica de moradia (zona Sul do Rio de

Janeiro) e a idade (25 aos 55 anos).

Duas razões explicam a opção por mulheres nesta faixa etária. Primeiro, a

dificuldade em se encontrar mulheres mais novas que já tenham cabelos brancos

suficientes para adotarem a cor de cabelo “grisalha”. Sabe-se que o aparecimento

dos cabelos brancos está ligada, entre outros fatores, ao envelhecimento. Dessa

forma, é pouco comum encontrar mulheres muito jovens com muitos cabelos

brancos.

O segundo motivo é o fato de que, entre mulheres mais velhas, parece ser mais

comum a não utilização de tintura. Através da observação de grupos de mulheres

na terceira idade, foi possível identificar que, entre as senhoras com mais 60 anos,

seria mais freqüente encontrar mulheres que não pintem os cabelos. Pode-se

dizer, portanto, que a atitude de manter os cabelos na cor original seria mais

incorporada aos padrões sociais nesta faixa etária, o que exclui essas mulheres

do corpus desta pesquisa.

A opção por moradoras do Rio de Janeiro da classe A e moradoras da Zona Sul

se explica pela conveniência em se achar as entrevistadas. Existe a percepção,

advinda do senso comum e portanto não cientificamente comprovada, de que

esse perfil de mulheres é o perfil de formadoras de opinião, de mulheres que

lançam tendência por terem alto nível de formação intelectual, pertencerem a um

extrato elevado na classificação econômica e serem moradoras de áreas nobres

da cidade.

FASE 3 – Coleta de dados

O método de coleta de informação escolhido para esse estudo foi a entrevista em

profundidade semi-estruturada.

52

A entrevista qualitativa em profundidade é uma técnica de entrevista direta,

pessoal e aberta que visa revelar motivações, crenças, atitudes e sentimentos a

respeito de uma dada atitude. A utilidade mais característica desse tipo de

entrevista é justamente em estudos exploratórios, em pesquisas através das quais

se busquem entendimento e insights a cerca de um tema pouco explorado ou

desconhecido (MALHOTRA, 1993).

Na pesquisa social, a entrevista qualitativa é a forma que o pesquisador possui de

obter informações sobre a interação social e, assim, formar uma compreensão

mais detalhada das crenças, atitudes, valores e motivações relacionados ao

comportamento das pessoas (GASKELL, 2002).

Desenvolvimento do roteiro de entrevista

Com base nos objetivos definidos para a pesquisa, na literatura pesquisada e na

pesquisa sobre hábitos de beleza da Cátedra L’Oréal de Comportamento do

Consumidor, foi elaborado um roteiro semi-estruturado para as entrevistas (anexo

1). Antes de ser aplicado, o roteiro foi pré-testado em uma entrevista. O pré-teste

serviu para que se pudesse avaliar se havia dificuldade de compreensão das

perguntas por parte da entrevistada e se os temas e objetivos estabelecidos para

a pesquisa estavam sendo cobertos.

O roteiro de perguntas serviu apenas de guia para as entrevistas: a forma como as

questões foram colocadas e a ordem na qual elas apareceram dependia mais do

discurso do entrevistado do que do roteiro. Segundo Gaskell (2002), o

entrevistador deve incorporar no roteiro questões relevantes que surjam no

decorrer das entrevistas e que não estejam no roteiro originalmente definido. No

caso desta pesquisa, novos tópicos foram sendo incorporados ao roteiro na

medida em que eles surgiam e se mostravam relevantes para os objetivos

pretendidos.

53

Uma parte do roteiro incluiu uma adaptação da utilização da técnica laddering

(REYNOLD, THOMAS, 1988; OLSON, REYNOLD, 2001), que se mostra como

uma ferramenta adequada na busca pelo entendimento das conseqüências e dos

valores pessoais envolvidos na decisão de não pintar o cabelo. Desenvolvido a

partir da teoria Means-end (meios-fins), o laddering é utilizado apenas como um

referencial na descoberta das relações entre a ação de não pintar o cabelo, as

conseqüências disso na vida das entrevistadas e os valores pessoais por trás

dessa escolha. Neste momento, cabe explica-la de forma mais detalhada,

destacando sua relevância e utilização na pesquisa em comportamento do

consumidor.

A teoria Means-end (Meios-fins) e a técnica do laddering

A Teoria do Means-End foca, especificamente, nas relações entre os atributos dos

produtos (os “means”), a conseqüência deles do produto para o consumidor, e os

seus valores pessoais (os “ends”) (REYNOLD, THOMAS, 1988). A abordagem

Means-End considera que os atributos de um produto não são considerados pelo

consumidor de forma isolada no momento da tomada de decisão. Os

consumidores pensam também na solução de seus problemas ao fazerem suas

escolhas, é por isso que as conseqüências das atitudes de consumo são

relevantes para eles (OLSON, REYNOLD, 2001).

A principal idéia por trás da abordagem Means-End é o fato de que o tomador de

decisão escolhe a forma de agir que lhe parece trazer melhores conseqüências. A

abordagem permite não somente identificar quais opções de ação o consumidor

possui como também entender o porquê da importância de cada uma delas

(OLSON, REYNOLD, 2001).

Dessa forma, o entendimento do critério de decisão – isto é, das possibilidades de

ações do consumidor – e a relevância de cada critério ajudam a entender mais a

fundo o processo decisão. Os pesquisadores podem utilizar a abordagem para

cinco objetivos diferentes (OLSON, REYNOLD, 2001): (1) entender qual o critério

54

de escolha do consumidor; (2) identificar os aspectos positivos (equities, quando

associados por um grande número de consumidores) de um produto, serviço ou

marca em comparação a outros; (3) questionar o consumidor sobre os fatores

adversos que o afastem do consumo de uma marca ou produto; (4) entender o

contexto na qual a decisão é tomada; e (5) entender as relevâncias pessoais

atribuídas a cada escolha. Para alcançar esse último objetivo, o pesquisador

utiliza a técnica do laddering, que será descrita a seguir.

A técnica do laddering, utilizada de forma adaptada, numa parte do roteiro desta

pesquisa, consiste numa técnica de entrevista em profundidade cujas perguntas

têm o objetivo de fazer com que o respondente crie associações entre os atributos

do produto e as características próprias do seu “eu”, neste caso, suas motivações

mais pessoais. As perguntas diretas, que são formuladas de forma específica para

cada entrevistado, seguem um modelo: “Por que isso é importante para você?” O

“isso” são as distinções previamente mencionadas entre as específicas marcas de

produtos e serviços (REYNOLD, THOMAS, 1988).

Os três diferentes níveis de abstração das respostas são os atributos do produto

(A), as conseqüências na vida do consumidor (C) e os valores pessoais que estão

por trás da escolha (V). A cadeia A-C-V permite entender como as informações do

produto são processadas pelo consumidor no que pode ser chamado de

perspectiva motivacional, que revela o que está por trás da escolha de um atributo

ou uma conseqüência (REYNOLD, THOMAS, 1988).

A técnica foi desenvolvida para aplicação em pesquisas de comportamento do

consumidor relacionado à escolha por um produto e, normalmente, a entrevista

emprega somente esta técnica. No caso desta pesquisa, precisou-se adaptar a

técnica, já que se busca não só a pluralidade de opiniões da atitude em relação a

um produto, a tintura de cabelo, mas também a obtenção de outras informações

que auxiliassem a compreensão do comportamento das entrevistadas. Dessa

forma, não somente o método de aplicação – que se aliou à outros

55

questionamentos – mas também o número de entrevistadas foi uma adaptação

para que se aproveitasse da melhor forma essa técnica.

Após a aplicação do laddering, o pesquisador está apto a traçar mapas de

quantificação e análise dos encadeamentos entre os níveis de abstração. O

objetivo, aqui, não foi o de mapear os atributos, conseqüências e valores de forma

quantitativa. Pelo contrário, empregaram-se as formas de abordagem do laddering

para aprofundar o discurso do consumidor e ampliar o entendimento acerca do

fenômeno. Novamente, menciona-se a necessidade de adaptação da técnica para

dela extrair o que de mais útil ela teria por oferecer a essa pesquisa. A adaptação

segue a metodologia empregada por Zaltman (2003) na pesquisa com latino-

americanos nos EUA.

Realização das entrevistas

Segundo Gaskell (2002), deve existir um limite máximo para o número de

entrevistas, que não deve ultrapassar 25 entrevistas individuais. Para Bauer e

Aarts (2002) a limitação do total se baseia tanto na saturação do tema quanto ao

tempo hábil para a pesquisa. O tempo disponível para se fazer e analisar as

entrevistas é a primeira restrição sobre o tamanho de uma pesquisa. O

pesquisador precisa de tempo para fazer uma boa análise, diminuindo o risco de

coletar tanto material a ponto de não conseguir aprofundar suas análises. A

segunda limitação, a saturação, refere-se ao momento em que uma nova

entrevista acrescenta pouco às descobertas já feitas no estrato pesquisado.

No total foram realizadas 12 entrevistas que duraram, em média, noventa minutos,

totalizando 554 minutos de gravação. Anotações foram feitas ao final de algumas

entrevistas, quando as entrevistadas davam depoimentos relevantes ao tema,

após o gravador estar desligado. Essas anotações foram incorporadas às

transcrições no momento da análise.

56

A seguir é feita uma breve descrição do perfil das entrevistadas, traços marcantes

e a descrição dos cabelos. Como cada entrevistada possuía diferentes

quantidades de fios brancos, foi feita uma escala (ANEXO 1), a partir da

percepção da entrevistadora, a fim de que orientar o leitor em termos dessa

diferença entre os tipos de cabelos.

Descrição das entrevistadas

Alice, 37 anos, casada

o glês

o te

de

elos

Aline, 47 anos, casada, 3 filhos

Formação Técnica em produções cinematográficas

Ocupação Produtora cultural e produtora executiva de um projeto de difusão do Áudio Visual Brasileiro

Traços Marcantes Tem dupla nacionalidade (brasileira e americana), gosta de sair com os amigos em dias menos movimentados, freqüenta muitas festas e tem visual moderno

Descrição dos Cabelos Cabelo com grandes mechas brancas Predominância dos fios brancos.

Formaçã Letras Português/In

Ocupaçã Comercian

Traços Marcantes Mulher simples, em termos de visual e atividadeslazer

Descrição dos Cab Cabelo longo, escuro com mechas brancas em quantidade média. Tom cinza acobreado.

57

Amanda, 36 anos, desqu

o

Ocupação Advogada de uma consultoria de gestão

Traços Marcantes

elos se imperceptíveis.

Ana Maria, 53 anos, 3 filhos

Formação incompleta em Arquitetura e Psicologia. Completa em Pedagogia

Ocupação Empresária. Trabalha com o marido e os filhos numa

Traços Marcantes É vegetariana, vai para o trabalho de bicicleta, recebe os xima

com os cabelos – conhece bastante e já foi cabeleireira de amigos.

Descrição dos Cabelos Cabelo longo. Mechas acinzentadas, distribuidas de forma homogênea. Tom cinza.

Bruna, 38 anos, solteira

Formação Jornalismo

itada

Formaçã Direito

Pratica esportes radicais ao ar livre como “catarse” do cotidiano, já foi professora de etiqueta

Descrição dos Cab Cabelos longos e muito escuros, fios brancos qua

produtora pedagógico-editorial.

amigos todos os domingos, tem relação muito pró

58

Ocupação Editora

arcantes s ao ar livre, lê os rótulos dos produtos para o cabelo antes de

Cabelos

Cristiana, 49 anos, casada, 2 filhos

Formação Arquitetura

Administra a produtora de vídeo da família

arcantes das as manhãs na rotina de caminhar até a praia e resolver problemas de casa, a tarde também

Descrição dos Cabelos Cabelos curtos e mesclados de forma homogênea.

Lúcia, 31 anos, solteira, s pais

ormação Comunicação, pós incompleta em tradução

Ocupação Editora

Traços Marcantes Gosta de se divertir sozinha, se arruma como se fosse um “projeto gráfico”, por duas vezes quase pintou o cabelo.

Descrição dos Cabelos Cabelo de comprimento médio, escuro, fios brancos

Traços M Mora sozinha, é vegetariana, valoriza as atividade

comprá-los (preocupada em adquirir produtos sem química).

Descrição dos Cabelo curto e mesclado de forma homogênea. Tom cinza – predominância dos fios pretos.

Ocupação

Traços M Passa to

fica em casa, onde funciona a produtora.

Predominância dos fios brancos. Tom cinza

mora com o

F

59

perceptíveis, em grande quantidade

istina, 33 anos,

Ocupação ável pela Comunicação de um Instituto

da família. Seu lazer se resume a programas com o filho

Descrição dos Cabelos Cabelos longos e muito escuros, fios brancos perceptíveis, mas em pouca quantidade.

Regina, 31 anos, casada

Formação Comunicação, com mestrados em Administração e

Ocupação Professora de Marketing e pesquisadora free lancer

Traços Marcantes Vestia roupas com toque de modernidade, de “tendência” de moda, usa maquiagem (rímel e batom) todos os dias.

Descrição dos Cabelos Cabelo médio, mesclado de forma homogênea, fios brancos e negros. Tom cinza escuro.

Rogéria, 28 anos, solteira, mora com os pais

Formação Letras e Tradução

Maria Cr casada, 1 filho

Formação Psicologia

Respons

Traços Marcantes Está em ascensão no trabalho, faz um curso de pós-graduação e cuida

Sociologia (na França)

60

Ocupação Tradutora free-lancer e Assistente Editorial

arcantes unhas pintadas de preto “há anos”, vestia roupas bem simples, tem duas rotinas de trabalho – passa os fins-de-semana trabalhando.

Descrição dos Cabelos Cabelo médio e mesclado de forma homogênea.

Sandra, 54 anos, casada, 1 filha

Formação Informática

Administra cooperativa de Informática

arcantes ar a cabeça raspada, dirigir sem

habilitação, dirigir um trator.

Descrição dos Cabelos Cabelo muito comprido, com mechas acinzentadas,

Telma, 51, casada, 3 filhos

ormação Biologia

Ocupação Professora de biologia e Coordenadora de Psicopedagogia de uma escola tradicional

Traços Marcantes Lazer é em casa ou com a família. Viaja anualmente ou para Santa Catarina, onde tem família, ou para a Europa, quando tem dinheiro

Descrição dos Cabelos Cabelos curtos e mesclados de forma homogênea.

Traços M Usa as

Predominância de cabelos brancos. Tom cinza claro

Ocupação

Traços M Quando jovem, morava em uma cidade do interior e fazia coisas como us

distribuídas de forma heterogênea. Tom cinza.

F

61

Predominância dos fios brancos. Tom cinza.

Dificuldades e peculiaridades no campo

udo,

peculiaridades na realização das entrevistas. Como auxílio para futuros estudos,

z-se aqui uma descrição desses percalços.

m realizadas no local e horário mais conveniente às

entrevistadas e por serem elas, em sua maioria, profissionais com a rotina

ocupada por co os, a pesquisadora precisou estar disponível

para ir a diversos bairros como Leblon, Cosme Velho, Centro, Botafogo e em

qualquer horários do dia – pela manhã, na hora do almoço ou de noite. Para que a

istas não d

qualquer momento. Teve-se o cuidado de li

istas, q

As entrevistas foram feitas em diversos locais e cômodos – salas de reunião,

staurantes, salas de jantar, quartos, salas de trabalho. Era preciso ter atenção

para que a gravação não ficasse com muitos ruídos quando a entrevista precisava

ser feita em lugares públicos abertos, como restaurantes.

Quando realizada no ambiente de trabalho, era comum ocorrerem interrupções,

como as do toque do telefone, da entrada de outros funcionários na sala ou pela

necessidade de solução de algum problema urgente. Neste momento, a

pesquisadora precisava parar a gravação e ter em mente a última frase da

entrevistada, para saber de onde retomar a entrevista.

Como em todo est a pesquisadora também encontrou dificuldades e

fa

Como as entrevistas fora

bastante mpromiss

fase de entrev emorasse muito tempo, era preciso estar disponível a

gar no dia anterior ou horas antes para

confirmar as entrev uando elas eram agendadas com antecedência.

re

62

Ocorreu, também, a intervenção de um marido quando a entrevista se realizava na

mesma sala onde ele estava. A entrevistada e a pesquisadora estavam sentadas

mas o marido ava na sala de jantar próxima. Ao ouvir um

depoimento, o homem se manifestou. Mais tarde, muitos telefones começaram a

sala da casa era

perguntou se não haveria outro cômodo onde a entrevista pudesse continuar, sem

tina da “ca

marido e dos telefonemas.

no sofá, trabalh

tocar (a o escritório da empresa do casal), e a pesquisadora

perturbar a ro sa-empresa”. O estudo continuou no quarto, longe do

63

FASE 4 – Tratamento de dados

Neste trabalho, a análise dos dados foi feita por meio de duas técnicas: a análise

de discurso e a análise dos dados obtidos na aplicação adaptada do laddering.

vida social (GILL, 2002).

entrevista antes de serem identificados os padrões e

as discrepâncias nas narrações. A análise foi baseada tanto na identificação

desses dois pontos, quanto na tentativa de aliar o que se encontrou na revisão da

literatura com o que foi dito pelas entrevistadas.

A análise do discurso foi feita após ter sido completada a analise dos dados

obtidos com o laddering.

Na metodologia laddering, a formação da cadeia de três níveis de abstração

(atitude, conseqüência e valores), pode ser desdobrada em uma de seis níveis e

de quatro, sendo a de quatro a mais comum. A cadeia de seis elos foi escrita por

Olson e Reynold em 1983 e é demonstrada a seguir (OLSON, REYNOLD, 2001):

“Análise de discurso é o nome dado a uma variedade de diferentes enfoques no

estudo de textos” (GILL, 2002, p.244). Existem diversos estilos de análise de

discurso, variando de acordo com tradições teóricas. Todas essas formas rejeitam

a noção realista de que a linguagem é uma forma de refletir sobre o mundo. Todas

compartilham da idéia de que o discurso tem importância central na construção da

O método de trabalho consiste em, primeiramente, procurar por padrões no

discurso, o que denota a variabilidade e a consistência entre as narrações. Em

seguida, pode-se criar hipóteses sobre as características específicas do discurso,

testando-as frente aos dados. A atenção dos analistas de discurso deve ser

empregada tanto no exame da linguagem quanto nos silêncios, naquilo que não é

dito (GILL, 2002).

Foram feitas duas leituras da

64

Atributos Concretos – Atributos Abstratos – Conseqüências Funcionais –

Conseqüências Psicosociais – Valores Instrumentais – Valores Terminais.

e

não aplicável em vários negócios, adota-se hoje como o padrão a cadeia de

primeiramente, uma análise de conteúdo para identificar os elementos-chaves, isto

3.4 Limitações do método

sta pesquisa não devem ser

et al., 2004).

serem ditas em palavras, constrangedoras ou “descortesias”; o entrevistado pode

ter um discurso tendencioso – discurso pronto, que não é o seu, mas o do status

Por vários estudiosos entenderem que a cadeia de seis elos é muito complexa

quatro elos, descrita abaixo (OLSON, REYNOLD, 2001):

Atitudes – Conseqüências Funcionais – Conseqüências Psicosociais – Valores ou

Objetivos

A análise da informação coletada através da técnica de laddering envolveu,

é, as respostas mais citadas para cada um dos elos. Depois, o pesquisador

elaborou uma tabela para representar o número de associações feitas entre cada

um dos elementos (REYNOLD, THOMAS, 1988). Essa tabela serviu de base para

a formação de um diagrama, onde se pode visualizar melhor as cadeias, cuja

análise foi feita em seguida.

Antes de se apresentar os resultados e as conclusões desta pesquisa, é preciso

alertar o leitor para as limitações do tipo de estudo aqui proposto.

Deve-se ter em mente que os resultados de

projetados para outras amostras ou populações, visto que as informações obtidas

não se propõem a serem representativas (Aaker

Por se basear nas informações concedidas, isto é, pelo discurso do entrevistado, a

pesquisa qualitativa apresenta limitações da seguinte ordem: o entrevistador pode

não ser capaz de entender a linguagem do entrevistado; o entrevistado pode não

mencionar todos os detalhes importantes; algumas coisas podem ser difíceis de

65

quo. Tudo isso pode fazer com que o entrevistador tenha falsas inferências a partir

da análise dos dados (GASKELL, 2002).

Outra limitação é o fato da pouca estruturação do roteiro permitir grande

flexibilidade aos resultados (Aaker et al., 2004). Dessa forma, a pesquisa

qualitativa está muito suscetível à influência do entrevistador e à lógica do

entrevistado. A obtenção de pontos de vista diferentemente abrangentes e a

A, 1993). Pelo lado do entrevistado, ele, ainda que guiado, cobre de

interpretação dos dados dependem fortemente das capacitações do entrevistador

(MALHOTR

forma mais profunda os assuntos que mais lhe interessem e vice-versa; além

disso, é sua lógica e perspectiva interna que conduz a entrevista (CAMPOS,

2000).

66

4. DISCUSSÃO DE RESULTADOS

Neste tópico é feita a discussão do que foi levantado nas entrevistas qualitativas.

amentos – formas de usar e comparação com aquelas que não os tingem.

O terceiro item desta análise apresenta e analisa os resultados da aplicação da

metodologia laddering, ou seja, que conseqüências e valores foram identificados

na atitude de não pintar os cabelos. No último tópico, é analisado o

comportamento desviante das entrevistadas em termos de estilo de vida, consumo

e relação com o cabelo bem como o levantamento de como elas se vêem frente

aos padrões de beleza estabelecidos.

4.1A percepção de vaidade

De forma freqüente, as perguntas em relação aos hábitos e cuidados em relação

aos cabelos desencadeavam a avaliação de muitas entrevistadas a respeito da

sua vaidade, um discurso que contrapõe a descrição de seus hábitos de beleza:

“Eu não sou uma pessoa muito vaidosa” (Telma, 51)

“É, vamos dizer assim, eu não sou uma pessoa assim muito

preocupada”. (Sandra, 54)

A discussão é conduzida, principalmente, pelas perguntas que o estudo pretendeu

responder. Em meio à apresentação dos resultados, é feita a associação deles

com as teorias apresentadas na Revisão da Literatura. Este capítulo se inicia com

a apresentação dos tipos de cuidados que as entrevistadas têm com seus

cabelos, isto é, que tipo de rituais existem por trás da relação com eles e que

produtos são consumidos. No segundo tópico, discute-se os fios brancos em

termos das reações que eles despertam no meio social do qual pertencem as

entrevistadas, e do que eles representam para as mulheres com base em seus

question

67

“Eu sou uma mulher muito, muito pouco vaidosa. É assim, higiene

básica mesmo (...) O meu cabelo é uma coisa assim que eu curto muito,

ade relacionada ao tempo gasto para satisfazê-la

o

sempre sob uma forma de jogo, de desnecessário, de luxo (MARCEL MAUSS,

1972). É de com algo fútil,

desnecessário, quando se existe algo de mais “útil” no qual empregar o tempo.

Neste sentido, a explicação

fútil porqu entro do campo da vaidade, da beleza, do

corpo físico, do que é externo, superficial e profano” (BOUZÓN, p. 39).

agora é um cabelo que não me dá trabalho” (Alice, 37)

Na declaração de Alice, a percepção de vaidade parece relacionada com o tempo

disponível da mulher, “não me dá trabalho” pode ser lido como “não preciso gastar

muito tempo cuidando dele”. Outras entrevistadas também associam a vaidade a

sua disponibilidade:

“O meu limite de vaidade é até onde ela me dá trabalho. Eu sou uma

pessoa vaidosa, mas eu não sou capaz de sacrificar o meu tempo de

lazer em benefício da vaidade” (Cristiana, 49)

“Eu não sou muito vaidosa. Então eu não gosto de dedicar tempo à

essas coisas. E se ele fosse complicado eu ia ter que dedicar. Porque

assim, que por menos vaidosa que você seja, você simplesmente não

pode sair com o cabelo sujo. Não pode sair com o cabelo parecendo um

ninho de pombo. Enfim, então...Tem um mínimo que você tem que

fazer”. (Rogéria, 28)

Talvez a percepção de vaid

possa ser explicada pelo que afirmam Mauss (1972) e Bouzón (2004). A noção de

estética é caracterizada pela ausência de utilidade, diferente da técnica, que se

relaciona diretamente com a idéia de utilidade. O fato estético é representad

como se Cristiana e Rogéria relacionassem a vaida

de Bouzón (2004) é de que “O cabelo é considerado

e é socialmente localizado d

68

Ainda que

Rogéria, e

imagem q seja vaidosa, e

tenha essa noção de utilitarismo dentro de você.

erente às mulheres.

her” (Ana Maria, 53)

De tal form

pode ser

suas prát

parece po

começa a

4.2 Cuidados com os cabelos: produtos e serviços

vo ele pra

o tempo pareça ser mais importante do que a vaidade, no discurso de

xiste “um mínimo” a fazer. Esse mínimo sugere que é preciso cuidar da

ue você tem frente aos outros, mesmo que você não

Além dessa possível percepção de pouca utilidade na vaidade com os cabelos,

Ana Maria chama a atenção para uma outra maneira de encarar a vaidade. Para

ela, parece ser algo in

“Apesar de ser assim uma pessoa sem hábitos de vaidade muito forte,

eu sou uma pessoa muito vaidosa. Eu acho que estou sempre ligada,

sabe, em nunca esquecer que eu sou uma mul

a que ela, cujos hábitos de vaidade são poucos, sugere que a vaidade

algo interno, algo que está na mente dos vaidosos e não somente em

icas. Porém, ao mesmo tempo em que esse grupo de entrevistadas

ssuir alguma dificuldade para assumir que são vaidosas, a vaidade

se revelar quando falam dos cuidados com os cabelos.

Através do relato dos hábitos de beleza em relação aos cabelos é possível

identificar a conexão das entrevistadas com suas madeixas. Percebe-se que os

cuidados podem até se constituir em rituais. O caso de Aline, 47 anos, é um

exemplo.

“...eu massageio bem o couro, puxo ele pra lá e pra cá, e também puxo

o cabelo, viro a cabeça pra baixo e puxo e esfrego bem as pontas. Aí,

seco com a toalha, uso o condicionador e a cera. Depois, eu escovo

com uma escova (...). Eu tenho muito cabelo. Então é uma escova meio

pente. E aí eu jogo o meu cabelo pra todos os lados. Esco

69

frente, pra trás, pro lado. Depois que eu escovo, acerto com a mão e

passo o tal creme de pentear” (Aline, 47).

Para muitas, os hábitos relacionados aos cabelos parecem se resumir a lavar com

xampu e condicionador. A freqüência de lavagens na semana varia, mas muitas

Como é a relação dessas entrevistadas com seus cabeleireiros? Alguns discursos

como os d

a impaciê

ambiente que

deixou de continuar um tratamento de hidratação e largou o hábito de pintar

s meses para manter o corte. Os relatos sugerem que cabelos curtos

combinam com os fios gisalhos:

começou a ficar mais grisalho, eu fiz essa opção (Telma, 51)”

relatam que lavam todos os dias. Aquelas que consideram seus cabelos mais

secos optam por lavar menos.

e Aline (47) e Regina (31), mostram um certo desconforto. Elas relatam

ncia com o Salão de Cabeleireiro – mencionam que não gostam do

e que rapidamente sentem vontade de ir embora. Aline menciona

graças ao “desgosto em freqüentar esse ambiente”. Hoje, ela corta os cabelos em

um lugar que chama de “atelier”. Regina relata que já ganhou hidratações ou

escovas, em promoções por cortar o cabelo e, mesmo assim, não quis

permanecer no salão para realizar esses serviços “brindes”. No entanto, as

entrevistadas foram revelando a importância atribuída aos serviços de

cabeleireiro.

Aparecem, por exemplo, diferentes freqüências do corte de cabelo. Os relatos

daquelas cujos cabelos são curtos – isto é, cabelos na altura ou acima do pescoço

– indicam que elas vão ao cabeleireiro mais vezes ao ano. Normalmente, a cada

dois ou trê

“Porque o cabelo grisalho eu acho legal ele mais repicado, acho que

aparece mais o grisalho, ele fica mais bonito, e aí eu fui gostando dele”

(Cristiana, 49).

“Porque eu acho que o cabelo branco grande envelhece. Quando ele

70

Nesses re

uma unida o tornar os cabelos brancos

interessantes? O relato de Regina (31), também sobre cortes, aponta para

que cabelos brancos combinam com

o do padrão ao não pintar os cabelos, Regina demonstra qye está

buscando a “harmonia”, o “belo”, o “resultado”, ou seja, a beleza é algo que pode

nografia de Bouzón (2004), que aponta que é

preciso que o cabelo combine com o rosto e o corpo. Um novo corte pode

influenciar a vida de uma mulher, por c

expressão

moderno, em que uma mesma pessoa pode possuir vários estilos? (Cova, 2002)

ortamento

latos aparecem opções de escolha e os cabelos são gerenciados como

de customizável (Askergaard, 2002). Com

significados interessantes. Ela sugere que cabelos brancos não seriam modernos,

o que motivaria a vontade pelo contraponto, pelo corte moderno, mais

interessante, mais diferente, com intuito declarado de chamar mais atenção. O

que não acontecera com ela, talvez por

cabelos curtos:

“Quando eu voltei da França, eu pensei assim: ’vou fazer um corte de

cabelo muito diferente. Muito moderno; que dê um contraponto pro

cabelo branco’. Então ao invés de eu ter o cabelo liso comprido, igual a

todo mundo, eu vou fazer um corte que seja diferente também. E

engraçado, porque parece que o meu cabelo ficou menos branco com o

corte. Assim, ele chama menos atenção” (Regina, 31).

O que aconteceu? Será que o corte tornou mais discreto os cabelos grisalhos,

porque os recolocou em equilíbrio com alguma lógica ou com algum padrão?

Mesmo fugind

ser melhorada (Queiroz e Otta, 2000).

O depoimento de Ana Maria (53) reforça a idéia, presente na declaração de

Regina, de que o corte dos cabelos está além da relação tesoura-fio-corte – numa

visão similar ao resultado da et

onstituir tanto sua aparência quanto sua

visual no mundo. E, como lidar com o cabelo, num mundo pós-

“E o corte eu acho que tem que ser além do estilo. É lógico que você

tem muitos estilos, mas você tem o rosto da pessoa. O comp

71

que fica. Qual é a relação do peso de seu cabelo na parte de cima do

cabelo com a parte debaixo do cabelo? Como é que é a relação desse

corte com o seu pescoço? Com o resto do seu corpo?” (Ana Maria, 53).

Os testemunhos coletados em relação aos cuidados com os cabelos mostram

também preocupação com a escolha dos produtos e marcas? O que, inicialmente,

parecia estar associado a algo muito básico: um xampu e um condicionador passa

a revelar outras preocupações e cuidados, fato exemplificado pelo relato de

Rogéria (28):

s

“Então assim: desde que eu me entendi com o cabelo, eu evito mexer

muito com ele. (...) Eu normalmente uso xampu e creme rinse e só;

tomo muito cuidado. Eu me acertei com um xampu, que pra mim é muito

caro, mas é bom. Eu evito botar qualquer coisa no meu cabelo. É um

trauma mesmo de adolescência” (Rogéria, 28).

As entrevistadas mostraram diversidade em suas escolhas de produtos e marcas

para os cabelos. Algumas pagam mais caro (“de 15 a 20 reais”) por xampus de

marcas mais sofisticadas (“Boticário, Payot, Klorane”), enquanto outras compram

xampus mais baratos (“de 5 a 10 reais”), de marcas mais populares (“Seda,

Aquamarine, Colorama”).

Bruna (38) relata que, por ser “natureba de carteirinha”, investe em produtos

naturais, com cheiro menos forte. E, não basta que o produto seja vendido como

natural:

“Eu sou aquela pessoa que lê os rótulos dos produtos pra ver o que tem

(...) Então eu gosto de comprar sempre os produtos mais naturais

possíveis (...) Têm muitas substâncias que às vezes você não nota. Por

exemplo, uma vez eu comprei um xampu numa loja de produto

naturais. (...) Naquele tipo de xampu natural eu tinha quatro tipos de

corantes diferentes. E várias substâncias conservantes. (...)Tem alguns

72

tipos de corantes que são absolutamente prejudiciais à saúde. Então eu

fui na loja e troquei aquele xampu. Não quis usar aquilo.” (Bruna, 38)

A atitude de Bruna remonta ao que Lipovetsky (2000) defende: a idéia de que

Aline (48) e Regina (31) relatam especificamente o uso de xampus

para cabelos grisalhos. Cristiana (49), por exemplo, faz testes antes de suas

escolhas

cabelos o

mês (...) Esse do Boticário eu senti realmente que fez uma diferença no

chama de necessidade social, em sua Hierarquia das

Necessidades Humanas. O depoimento de Cristiana sugere que um dos motivos

des.

4.3 Os ca

Por que m

mulheres

poucas mulheres na mesma situação -

de duas ou três; as mulheres grisalhas

existe espaço, no mercado de cosméticos, para a escolha crítica, para o

consumidor comparar produtos e fazer escolhas voluntárias. Como é o caso

também da escolha do xampu mais adequado.

Cristiana (49),

de produto e marcas à procura do tom mais bonito do branco dos

u de um melhor custo/benefício:

“Acho que dá uma tonalidade ao branco, mais brilhante, não fica

amarelado. Mantém o branco bonito e um vidro dura mais ou menos um

branco, inclusive das pessoas comentarem que o cabelo estava

diferente“. (Cristiana, 49)

A compra de produtos de higiene e limpeza, na maioria dos casos, acontece para

satisfazer ao que Maslow

diretos para a escolha do Boticário tenha sido o reconhecimento das pessoas, um

exemplo claro, dentre outros reconhecidos nos depoimentos acima, da teoria das

necessida

belos grisalhos: reações e questionamentos

anter os cabelos grisalhos não parece ser uma decisão comum? As

que tomaram essa decisão sugerem possíveis motivos: elas conhecem

as que dizem conhecer, lembram apenas

não são assunto de revistas e jornais

73

voltados p

representa

belo grisalho. Eu já

olhei várias revistas de moda. Na Elle, na Cláudia, na Estilo, na Nova,

Outro mo

manterem

de indaga

familiares

teoria de s, vai contra fortes exigências sociais, sendo

uma atitude muito corajosa.

a (2003) lembram que o indivíduo é responsável por seu corpo e

ma representação da

individualidade. A concepção sobre si mesma pode ser diferente dos padrões

ara o público feminino – as mulheres de cabelos brancos não se sentem

das pelos meios de comunicação:

“lembro de uma matéria que saiu no Caderno Ela [do Jornal O Globo]

sobre isso. Nunca mais li nada sobre o cabelo grisalho” (Aline, 47).

“Você não vê uma reportagem de tratamento pra ca

nenhuma dessas revistas nunca trouxe uma reportagem pra cabelo

grisalho. Eu até já pensei em escrever, dizendo: ‘puxa, vocês não

pensam nessas mulheres moças com cabelo grisalho, por quê?’”

(Cristiana, 49)

tivo se relaciona com reações que as pessoas têm ao fato delas

seus fios brancos. Algumas entrevistadas relatam reações de surpresa,

ção e até mesmo de tentativas de coerção por parte de amigos e

, o que parece estar de acordo com a etnografia de Bouzón (2004) e a

que manter os fios branco

Algumas entrevistadas, entretanto, relatam observações positivas, de aprovação –

principalmente, por parte dos homens – à opção por não colorirem os cabelos.

4.3.1 Reações aos cabelos grisalhos

Novaes e Vilhen

que desde a modernidade o corpo humano é u

existentes, que guiam a busca coletiva. No entanto, conceber-se diferente tem

conseqüências, como reações e julgamentos.

74

Os depoimentos das entrevistadas sobre reações d grupo social em relação à

opção pelos cabelos grisalhos sugerem algumas dificuldades. Elas encaram “por

quês”, estranhamentos, indagações – os questionamentos negativos:

de

não criticar, mas fala assim: ‘Nossa!’” (Maria Cristina, 33)

As pessoa

tempo ou

velha!, É falta de tempo?’ (...)

Mas reação positiva eu não vejo ninguém. Muito difícil.” (Alice, 37)

nunca esse cabelo?’ (...) a minha

mãe, por exemplo, ficava ‘incomodadíssima’ com o meu cabelo. Quando

diferenças nas reações das pessoas

o estão “na berlinda” como ela por

causa de seus cabelos ou de outras características físicas?

“Olha, acho que não tem reação boa. Ninguém elogia. A pessoa po

s costumam associar os fios brancos até mesmo à falta de dinheiro, de

de cuidado.

“O que eu escuto: ‘o que está faltando? Dinheiro? Perdeu a vaidade?

Nossa! Você está parecendo bem mais

“Pra mim, a pior coisa do cabelo branco é agüentar a pressão das

outras mulheres. Elas ficam muito incomodadas. Às vezes, cruzo com

gente andando na praia: ‘Cristiana, quando é que você vai pintar esse

cabelo?” Passa por mim, mal cumprimenta. Mas que já não me vê há

muito tempo. “Você não vai pintar

o meu cabelo ficou branco ela falava o tempo todo” (Cristiana, 49).

Os depoimentos abaixo ajudam a entender

com muita ou pouca intimidade. Na percepção de Regina (31), quando não se é

íntimo, há certo constrangimento na reação. Por outro lado, quando se é muito

amigo ou da família, as reações são diferentes. A entrevistada parece não

entender o porquê de apenas seus cabelos serem assunto de conversas em

jantares de família. Por que outras pessoas nã

75

: “Engraçado que eu acho que as pessoas ficam meio sem graça. Eu

acho que não é todo mundo que tem a coragem de vir pra mim e dizer:

‘Por que você não pinta?’ Não é todo mundo que tem essa coragem.”

(Regina, 31)

olóquio se eu

deveria pintar o cabelo ou não. E as pessoas discutindo. ‘ah, ela é muito

e é meu primo, eu acho ele gordo. E ninguém discute se

Existe “felicidade” com os cabelos br o de

Roberta d

cabelos g

A falta da teria

o mesmo princípio da tintura? Não seria também, sob um ponto de vista, uma

forma de esconder as marcas de envelhecimento? Por que, na comparação, a

atro e tava esperando

começar a peça e aí eu escutei assim as mulheres detrás comentando:

“Eu lembro que rolou esse jantar e se instaurou um c

nova pra ter cabelo branco’, ‘ela poderia fazer isso...’ Engraçado porque

um deles, qu

ele tem que fazer dieta. O outro, sei lá, tem um cabelo que eu acho

esquisito. Ninguém discute o corte dele, entendeu? (Regina, 31)

ancos? Alice (37) reforça a posiçã

e que outras características não são tão criticadas ou realçadas como os

risalhos:

“Vou a tudo quanto é festa sem maquiagem, nunca ouvi ninguém falar:

‘Pô, está de cara limpa’. Agora quando você está com o cabelo sem

pintar, fatalmente vão falar”. (Alice, 37)

maquiagem, então, seria permitida? Mas a maquiagem, no fim, não

cobrança é maior com a tintura?

Bruna (38) lembra que as reações são contraditórias. Apesar de ouvir

frequentemente reações de indagações dos outros, ela se surpreendeu quando

ouviu, sem querer, uma reação de admiração:

“A reação mais comum é perguntar o por quê. Por que você não pinta o

cabelo? Em contrapartida, eu tava uma vez no te

76

‘olha só o cabelo dessa mulher aí da frente. Eu me arrependo tanto de

ter começado a pintar o meu cabelo... ‘ “. (Bruna, 38)

o, Bruna parece ter sido uma Nesse cas prova, para essa mulher, de que era

possível viver com os cabelos brancos. Isso está de acordo com o que percebe

Aline (47)

É como se forma

rcebi que agrada aos homens. Eu encontro com amigos meus

Vale, nest s e Vilhena (2003), segundo as

es, elas se sintam mais incomodadas

com as desviantes, com aquelas que não seguem os mesmos padrões que lhes

marido, por exemplo, meus filhos, são francamente favoráveis. Dão maior apoio

que não p

Identifica-se, no discurso de algumas entre

um local propício para as avaliações e sugestões de mudança:

:

“As mulheres olham. As mulheres ficam assim... Têm um olhar de

estranhamento, mas não é um estranhamento negativo. É um

estranhamento de curiosidade. De possibilidades” (Aline, 47)

as mulheres vislumbrassem a possibilidade de agirem da mesma

e de serem capazes de, assim, freqüentar lugares públicos, como teatros e festas.

E os homens? Como reagem aos cabelos grisalhos dessas mulheres?

“Eu já pe

que não vejo há muito tempo: ‘Nossa! Até que enfim uma pessoa

autêntica! ’ ‘Que legal! ’ ‘Você está bárbara!’ “ (Cristiana, 49)

e momento, retomar as idéias de Novae

quais o desvio do padrão de beleza aceitável, para o homem, está vinculado à

falta de tempo, dada a sua rotina atribulada. Já entre as mulheres, o desvio está

vinculado à falta de vaidade, de esforço e de cuidado pessoal. Talvez pelo fato do

peso do padrão ser maior entre as mulher

são estabelecidos.

Telma também percebe o apoio masculino. “Os homens em geral apóiam (...) Meu

inte” (Telma, 51)

vistadas, que o salão de cabeleireiro é

77

“Quando você vai cortar o cabelo no Salão de Cabeleireiro, tem muita

gente que fica olhando” (Bruna, 38).

“Qualquer salão novo que eu vou eu tenho realmente que convencer

que eu não quero pintar o cabelo. Senão fica uma catequese querendo

me mostrar todos os produtos. Os últimos lançamentos. A melhor

novidade do mundo pra me convencer a pintar” (Cristiana, 49).

Aline che

discurso, rofissional

mais “antenado”, que não critica seus cabelos e, em contrapartida, a profissionais

ios brancos

sem dúvidas, Aline (47) precisa de um cabelereiro moderno que respeite sua

atitude.

alha, mais

especificamente, com produções de moda] nunca falou pra eu pintar.

desejos e entender suas atitudes. Ela destaca dois universos

de beleza com valores completamente diferentes e se coloca na posição de

ualquer tipo de reprovação por parte de qualquer

pessoa, a não ser alguns cabeleireiros que sugeriram de eu pintar o

ga a comparar as diferentes reações de cabeleireiros. A partir de seu

pode-se perceber a formação de um juízo em relação a um p

mais tradicionais que viviam sugerindo a continuidade do hábito de pintar.

Enquanto Regina (31) precisou de um corte moderno para assumir os f

“Por exemplo, o Vini [cabeleireiro que atende em ateliê e trab

Sempre brincou e transou e trabalhou com o meu cabelo com a questão

dele ser grisalho. É claro que as cabeleireiras lá do ‘salãozinho

mequetrefe’ queriam que eu continuasse a pintar” (Aline, 47).

Talvez o que Aline queira dizer é que não é qualquer pessoa ou profissional que

entende a atitude de manter os fios brancos – é preciso estar além do ‘mequetrefe’

para respeitar seus

mulher moderna, à frente do seu tempo.

“Nunca recebi q

cabelo”. (Lucia, 31)

78

Lucia não

“Eu tenho sido muito elogiada (...) Todo mundo fala: ‘Poxa é a primeira

achando que o cabelo é diferente e que é legal eu assumir o cabelo

comentários a cerca dos cabelos brancos. O fato dos cabelos de Rogéria sempre

Segundo Aline (47), a adoção dos cabelos brancos parece ser mais comum hoje

em dia qu

mas quan

explicação

críticas er

“Minha mãe tem 52 anos. Vai fazer 53 e ela tem o cabelo grisalho, e ela

Se o uso de tintura para cabelos cresce, porque se aceita cada vez mais as

mulheres

mulheres?

com o dife

é a única que só recebe comentários positivos.

vez que eu estou vendo um cabelo ficar grisalho de uma forma bonita”.

(Ana Maria, 53)

“Eu acho que a maioria gosta. Pelo menos a maioria se manifesta

assim; dificilmente alguém não tem uma opinião sobre o meu cabelo”

(Rogéria, 28)

Além do elogio, o depoimento acima aponta para o porquê dos constantes

despertarem opiniões não é indicativo de que eles são diferentes? Ainda mais ao

se considerar a idade da entrevistada...

e há cinco anos. ”Porque agora eu vejo mais gente com cabelo grisalho,

do eu comecei a usar, não tinha ninguém”. Será que isso pode ser

para o que aponta Rogéria? Em relação a sua mãe, ela acredita que as

am muito maiores:

passou a vida inteira ouvindo as pessoas pedindo pra ela pintar o

cabelo, até muito mais do que eu. Não sei se houve alguma mudança.

Ela sempre teve mais reações negativas do que positivas, em relação

ao cabelo dela” (Rogéria, 28).

que não a utilizam e, ainda, porque é mais comum encontrar essas

Será essa uma constatação de que a sociedade está mais acostumada

rente?

79

Interessante perceber como algumas entrevistadas percebem a indagação das

pessoas quanto a naturalidade de seus cabelos. Parecem existir dúvidas que um

cabelo branco bonito seja natural.

oas costumar ser apresentadas pra mim, muitas delas

me perguntam se é natural, se não é” (Rogéria, 28)

o. Outro dia, a gente entrou na loja da Zoomp, na Oscar

Freire, que é a epítome do fashion do Brasil. Do fashion legal. E veio o

car com o cabelo grisalho”. (Aline,

que você fez’. Quer dizer, porque cabelo branco

normalmente quando ele chega, ele é uma praga entendeu? Ele é ruim.

A percepç

estranhem o fato de uma pessoa de fios brancos ser bonita. Isso merece,

inclusive, questionamentos em situações como dentro de lojas, em caixas de

“Quando as pess

“Recebo muito retorno externo natural das pessoas assim, de eu entrar

em loja e vendedor fashion vir me perguntar se o meu cabelo é natural

ou se é pintad

cara imediatamente falar comigo. Claro que ele podia estar tentando

persuadir pra vender, mas eu acho que não foi isso não porque ele foi

super-espontâneo, querendo saber se eu pintava, se meu cabelo era

natural, porque ele tava louco pra fi

47)

Regina parece ter uma explicação para o que está por trás desse questionamento.

“Elas falam: ‘É natural?’ Eu falo: ‘É, por quê?’ ‘Não, porque ficou tão

bem que parece

Ele é feio de qualquer jeito. Então o cabelo branco ficou bonito, as

pessoas perguntam: ‘É natural?’ “(Regina, 31)

ão de que os cabelos brancos são algo ruim faz com que as pessoas

supermercado, no escritório de trabalho. Talvez a impressão das pessoas seja

tamanha que elas não escondem sua curiosidade.

80

Na opinião de Ana Maria (53), os cabelos mais curtos possivelmente a fazem

receber mais elogios hoje.

“Agora com ele curto, menos pessoas falam pra eu pintar. As pessoas

A mãe de

cabelo de

isso. “’Cab

cortei o ca

Assim que os fios

cortou o c

aparece mais o grisalho, fica mais bonito”.

De onde virá essa percepção de que cabelos brancos ficam melhor quando

brancos representam o desleixo de quem os têm. Ele pode demonstrar que, pelo

contrário,

que mesm

na busca

Talvez out

Telma (51) justifica, da seguinte maneira, a opção de algumas amigas por terem

belo de Telma ter se tornado

grisalho de forma homogênea, sem mechas na frente, tenha colaborado na

estão elogiando. ‘Você está bacana, seu cabelo está ficando branco,

mas está bonito’. ‘Poxa, está lindo o seu cabelo!’”

Regina (31), que pinta os cabelos, parece ser uma que elogiaria o

Ana Maria. Sua reação quando Roberta cortou os cabelos demonstra

elo comprido, branco. Pelo amor de Deus, né!’ Ela me falou quando eu

belo: ‘Até que enfim você cortou esse cabelo!’”

brancos foram ficando mais presentes, Cristiana (49) também

abelo curto. “O cabelo grisalho eu acho legal mais repicado, acho que

cortados? O corte parece ser um contraponto à percepção de que os cabelos

a mulher se cuida – reforçando a idéia mencionada no item anterior de

o o cabelo grisalho pode (e deve, pela reação dos outros) ser alterado

pela “harmonia” e pela “beleza”.

ra justificativa para os elogios seja a distribuição dos fios brancos.

pintado: “Muitas dizem que começaram a pintar porque o grisalho era um grisalho

muito feio, localizado aqui na frente. Realmente, se meu cabelo tivesse ficado

grisalho assim eu acho que eu ia pintar”.

Sua fala nos permite inferir que talvez o fato do ca

81

decisão de manter os fios brancos, justamente por eles serem harmoniosos e

bonitos.

A mulher,

acontece

aquelas q a, ela acredita que os

cabelos brancos combinam melhor com mulheres de olhos claros. Ela acha que

Tanto pessoas negras

quanto pessoas de olho azul, tendem a ficar bem de cabelo branco sem

a, cujos olhos azuis lhe protegem do

envelhecimento dos cabelos brancos e, consequentemente, podem amenizar

uê?

mostra como pode ser difícil tomar essa

Desmarquei na véspera, porque a minha chefe falou que tinha que

entretanto, não pode interferir no processo de clareamento dos fios, que

de forma natural. Aline destaca outro fator “natural” que favorece

ue possuem cabelos brancos. Em sua perspectiv

fica mais bonito. Dentre as entrevistadas, apenas três possuem olhos claros. Ela é

uma delas.

“uma das coisas que faz ficar bem é o olho claro.

ter um aspecto envelhecido”. (Aline, 47)

Aline seria, assim, uma mulher privilegiad

algumas reações.

4.3.2 Questionamentos pessoais

Nem todos os depoimentos demonstraram convicção em relação à opção de

manter os cabelos brancos. Dúvidas? Por q

Maria Cristina, de 33 anos, lembra que, há oito meses, comprou um xampu

colorante para passar nos cabelos. Não usou, porém, não jogou fora nem deu

para uma amiga – o que costuma fazer quando compra um produto e não o usa –

sugerindo uma intenção de pintar o cabelo no futuro.

Outro relato, agora de Lucia (31) também

decisão.

“Há um mês, eu marquei o cabeleireiro pra passar tonalizante. Não fui.

82

tomar muito cuidado porque às vezes eles não colocam tonalizante.

Colocam tintura. Então você é que tem que levar o seu tonalizante. Eu

não tinha a menor idéia. Eu não conheço esse produto. Ela me deu uma

ua sem pintar os cabelos. Não confiou no profissional, nem comprou

um outro tonalizante, que “combinasse com seus cabelos brancos”. Ainda assim,

afirma que pode ser que venha a pintar.

por enquanto ainda t

31).

“Hoje, eu não tenho mais dúvida, mas se chegar um momento em que

ais bom’, ‘não está mais bonito’, eu vou

s brancos é apenas sua vontade.

car parecendo uma mosca

Vou ter que pintar de abóbora, cortar pequeno”.

Ainda que

pressões

caixinha, que era um tonalizante e a cor era camurça. Só que eu pensei

assim: ‘camurça? Não vai cair bem nos meus cabelos brancos’.

Também não vai combinar com os meus cabelos pretos. Ah deixa como

tá que é melhor” (Lucia, 31)

Lucia contin

“Quando ficar muito branco, talvez, mas

á no ‘oitenta vinte’. Eu nunca fecho possibilidades” (Lucia,

“Não fechar possibilidades” parece ser a atitude de outras entrevistadas como

Regina (31) e Ana Marina (53):

eu olhar e falar ‘não tá m

pintar” (Regina, 31).

Ela sugere que o limite entre pintar ou não os fio

A fala de Ana Maria (53) sugere alinhamento com a opinião de Roberta:

“De repente eu fico com mais cabelo branco, e parecendo que estou

morta, porque eu sou super-clara. Não tenho quase cor nos lábios.

Sou uma pessoa super-devagar. Vou fi

morta. Pode ser, entendeu? Então eu vou ter que usar um artifício.

reajam aos padrões de beleza, as mulheres parecem conviver com

estéticas. Ao não se colocarem numa “bolha”, elas admitem que podem

83

vir a sucu

os fios bra

Atitude dif

4.3.4. A p

Em seus

atitude de como essas mulheres – às vezes decididas,

sas”; porém “inseguras” e “imaturas” na comparação com as que não pintam:

ssas que não têm essa preocupação tão grande,

até mais maduras”.

se sentir

Na contram

acreditar q as e o que vê são

mbir às pressões. Quando não se sentirem mais bonitas, elas pintarão

ncos. Onde estão as motivações para continuar sem pintar os cabelos?

erenciada? Comportamento desviante? Senso estético?

ercepção sobre a mulher que pinta

relatos, as entrevistadas falam das diferentes reações de “outros” à

não pintar os cabelos. Mas,

às vezes inseguras – percebem ou julgam as que pintam? É interessante explorar

esse caminho inverso; na busca por mais explicações que ajudem na

compreensão da ausência do hábito de usar a tintura.

Alice (37), por exemplo, caracteriza as mulheres que pintam o cabelo de “mais

vaido

“Eu acho que as pessoas que pintam têm uma preocupação maior

com a vaidade. E já e

são pessoas mais seguras, estão mais felizes com o que são. Não

estão se importando tanto com o que as pessoas vão falar dela. Eu

acho que são pessoas

Sandra (54) tem uma percepção bastante peculiar sobre as usuárias de tintura:

“Como eu me sinto bem com a minha cabeça branca. Ele vai

bem com o cabelo dela pintado. Porque ela acha que está

rejuvenescendo. Eu acho que não. (risos) Acho que está

envelhecendo".

ão do senso comum de que tintura rejuvenesce, Sandra parece

ue tintura envelhece. Ela olha para suas amig

mulheres com rostos menos jovens do que teriam se optassem, como ela, por não

utilizar a tinta de cabelo.

84

Cristiana (49) também concorda que essas mulheres têm uma aparência pior por

causa da pintura. Ela não menciona o envelhecimento, mas a dificuldade em obter

uma cor adequada (sem ser “demais”):

“Eu vejo muita porcaria aí. Muita gente com cabelo pintado muito feio.

Ou fica escuro demais, ou fica claro demais. Vermelho demais”.

simples, onde o simples parece ser uma característica que ganhe cada vez mais

importância

sofisticação

espírito”, “d

“Tem uma diferença muito grande de es

questão de toda hora pint sariamente uma

o

pinta o cabelo e que seria mais intelectualizada, que não estaria nessa

s

e

Será que cabelos brancos ajudam a pensar (numa referência à mulher “mais

(47) e Ana Maria (53) parecem, no entanto, abrir uma

exceção para a justificativa do cabelo pintado. A intenção da mulher no uso da

(Cristiana, 49)

Para Maria Cristina (33), o motivo passa pela vaidade e pela forma de ser:

“uma imagem da mulher que pinta é mais... sofisticada, usaria essa

palavra. E a que não pinta, geralmente é uma mulher mais simples”.

Mas as comparações de Lucia (31) não se resumem à dicotomia sofisticado-

na atualidade. Chegam a dizer que “simplicidade é a máxima

”. Lúcia sugere diferenças mais acentuadas entre os dois grupos; “de

e poder”, “intelectual”, “profissional”:

pírito entre a mulher que faz

ar o cabelo, que não é neces

executiva, mas que seria o ícone desse tipo de mulher, e a que nã

gica do poder, de competitividade, de estar se apresentando, estar

empre bacana (...) Eu acho que 0,00001% das mulheres com o estilo

xecutivo assumiriam os cabelos brancos”. (Lucia, 31)

intelectualizada”) e os cabelos pintados ajudam a gerenciar (mulheres

“executivas”).

Os depoimentos de Aline

85

tinta pode influenciar a sua avaliação. Quando a intenção é brincar com o visual, a

opção pela tintura é respeitada:

“Tem o lúdico que eu acho legal. Porque aí é... aí é uma brincadeira

acho bacana. Quando não tem lúdico, só tá

querendo forçar uma barra...“ (Ana Maria, 53)

Então, o objetivo de esconder os fios brancos não seria visto da mesma forma que

o de muda

uma “brin a

“trapaça”, é a “negação do envelhecimento” e, por isso, uma “forçação de barra” –

mo fora da realidade. Afinal, de

qual grupo seria o comportamento desviante? Dos que não pintam? Das que

pintam? De ambos ou de nenhum

com a beleza. Não é querer negar uma realidade”. (Aline, 47)

“Quando a coisa é lúdica eu

r o visual. Na verdade, enquanto esse último é aceito, esperado, por ser

cadeira” e estar no campo do “lúdico”, o primeiro é associado a um

um artifício para querer ser aquilo que não se é.

Interessante como, em princípio, qualquer mulher que pinta o cabelo nega a cor

natural do seu cabelo, aquilo que é por natureza. No entanto, aqui, apenas as que

pintam os fios brancos estão sendo avaliadas co

grupo?

86

4.3 O comportamento desviante nas entrevistadas

O conceito utilizado neste estudo para comportamento desviante está relacionado

ao de co

normas e padrões de comportamento que contrariam aqueles da sociedade

dominante (BATZELL apud DESMOND ET AL., 2001)

As entrev elos estariam indo contra

o “padrão de comportamento” de esconder os fios brancos (BOUZÓN, 2004).

as e no cotidiano

reocupa-se com o que consome, ainda

que declare não propagar sua preocupação entre amigos e familiares.

Ela parece ter um comportamento de consumo peculiar, quando se auto-define

como “natureba de carteirinha”. É vegetariana, adepta de produtos naturais, se

exercita ao ar livre, tem a preocupação de não comprar produtos que contenham

substâncias químicas e sempre lê os rótulos de produtos antes de comprá-los,

inclusive os de beleza, como xampus.

O que isso nos mostra é que, provavelmente, a atitude com relação aos cabelos

não esteja isolada, que sua motivação esteja ligada à forma “natural” como a

mulher é ou foi no mundo. Como Bruna, com essas crenças, desconfianças e

atitudes poderia usar tintura?

ntracultura, isto é, uma cultura minoritária caracterizada por valores,

istadas ao optarem por não pintarem seus cab

Como elas se vêem com relação a isso? O estilo de vida delas ou suas

experiências passadas envolvem situações de questionamento de normas?

Existiriam outras manifestações desviantes em relação aos seus cabelos?

4.3.1 Práticas desviantes em outras experiênci

Bruna (38), por exemplo, não é do tipo ativista, mas incorpora no seu dia-a-dia

algumas práticas dos movimentos pesquisados por Kozinets e Handelman (2004).

A organização dos movimentos de consumidores se dá contra a venda de

produtos que podem prejudicar o consumidor e a publicação de propagandas

enganosas. Bruna, no âmbito individual, p

87

“Eu sempre desconfio daquela coisa da tinta (...) Não é só pela comida,

que você se contamina. Têm os produtos pra pele. Têm muitas

eu tempo”, descrevendo o

comportamento que tinha quando era jovem:

rem de

manhã. Comigo, por exemplo, quando era nova, 17 ou 18 anos, essa foi

hã em casa.

anos. Na

minha época as mulheres se casavam muito mais novas”. (Sandra, 54)

ê, por exemplo, se ficar no meu pé,

substâncias que às vezes você não está notando” (Bruna, 38).

Sandra (54) também não se expressa somente nas atitudes e cuidados com o

cabelo. Ela declara ser uma pessoa “a frente de s

“eu sou uma pessoa pra frente, eu acho que sou. Por exemplo, nasci

numa cidade do interior; com treze anos eu dirigia carro, dirigia trator,

Jipe. Sempre fiz coisas que, na época, na minha idade não se fazia.

Hoje em dia é uma coisa natural as pessoas saírem e chega

a coisa que mais gostei, sempre gostei de chegar de man

Eu acho que o amanhecer é a coisa mais linda que tem. Meu pai, a

minha mãe eles falavam que não ficava bem, porque os vizinhos... Tem

sempre os vizinhos. E eu sempre dizia: ninguém paga as minhas

contas. Ninguém pergunta se eu comi. Então eu não tenho que dar

satisfação da minha vida. Só que isso, vamos dizer, há 25, 30 anos

atrás, não era normal. Eu, por exemplo, eu me casei com 29

Mas, como é Sandra aos 54 anos? Ela continua com comportamentos que

contrariam os padrões sociais dominantes? Se a maioria das mulheres pinta os

cabelos brancos, Sandra parece escolher a outra opção:

“eu sou do contra. (rindo) Voc

dizendo que eu tenho que fazer um negócio, vou fazer ao contrário. Eu

faço ao contrário. Não adianta. Isso é meu, mesmo”. (Sandra, 54)

88

4.3.2 Con

Da mesma forma que os depoimentos

possível padrão desviante dessas mulheres, muitas lembranças também podem

des desviantes com relação a eles.

Buscou-se

seria a p

sugerem

corte bem

contexto

perceber

volta, mu

maneira c

Ana Maria (53), por exempl

acessórios

como pen

s meus dezessete anos.

Eu usava uns panos na cabeça também. Umas faixas. Prendia contas.

Sandra (54), ao contrário de Ana Maria, não era adepta dos acessórios, mas de

um cabelo muito simples, um cabelo quase raspado, que ela só conseguia cortar

na barbearia:

sumo desviante em relação aos cabelos

de vida podem ajudar a compreender o

ajudar a conhecê-las melhor. Quando perguntadas sobre “recordações” que

tinham a respeito especificamente de seus cabelos, algumas entrevistadas

lembraram de momentos interessantes e atitu

compreender se a possível atitude desviante de não pintar o cabelo

rimeira postura de contestação aos padrões. Alguns testemunhos

que não. É possível identificar comportamentos pouco usuais, como o

curto do cabelo, a adoção do estilo punk, o cabelo indomado num

de pessoas arrumadas. Em todos os depoimentos abaixo, pode-se

que independente do contexto em que estavam e das pessoas a sua

itas entrevistadas pareciam agir da forma que mais lhe agradava, de

onsiderada autêntica.

o, descreve que quando adolescente utilizava muitos

diferentes no cabelo. Acessórios que ninguém utilizava ou conhecia,

as, sementes, panos diferentes.

“Eu sempre fiz penteados diferentes. Isso eu sempre curti muito. Eu

criava muita coisa no cabelo. Eu tinha maneiras de prender, tinha

maneiras de emendar tranças, eu fazia muitas coisas que hoje já são

normais e naquela época ninguém fazia. Foi no

Eu fazia muitas coisas que eu não tinha visto em nenhum lugar” (Ana

Maria, 53)

89

“Na adolescência eu sempre usei o meu cabelo muito curto. Sempre

muito, muito, até a minha irmã mexia comigo, dizia que eu era “Martim

ça, muito penteado, mas era sempre contra

corrente. Não era nem uma coisa...consciente minha. Eu outro dia, há

Lucia (31) conta que a única atit

cortá-los num estilo

precisou ir a um lugar

s militares e vou fazer um corte punk. Vou mandar cortar.

Passar a máquina no meu cabelo’. Ela tinha o cabelo super-cacheado, e

Bate Lata” porque era assim maluca, que só eu cortava o meu cabelo

assim na navalha. Ficava assim bem baixinho mesmo. E antigamente

isso não era uma coisa comum pra mulher usar. Hoje em dia é moda.

Isso era uma coisa que chamava a atenção porque eu ficava com o

cabelo que só parecia o coquinho da cabeça. Eu cortava no barbeiro de

homem”. (Sandra, 54)

Outro depoimento interessante é o de Aline (47). Ela remete a uma época da vida

em que morava nos Estados Unidos:

“Lá, todo mundo é ‘super-comportadinho’, de cabelinhos curtos, as

mulheres usam o cabelo curto lá, é raro você ver uma mulher de cabelo

comprido, eu tinha um cabelo no meio das costas. Farto. Eu usava rabo

de cavalo. Muita tran

pouco tempo, vendo foto, falei: ‘caramba, vou pra um país onde todo

mundo usa cabelo curto... Fui com o cabelo mais comprido que eu tive.’”

(Aline, 47)

ude mais radical que teve com os cabelos foi a de

punk, por influência de uma amiga. Como Sandra, ela também

alternativo para conseguir o novo penteado:

“Um belo dia, com vinte e um anos, quando entrei pra faculdade, uma

amiga chegou, disse: ‘ah, vou ao barbeiro da Praia Vermelha, que é o

barbeiro do

ele estava grande. Aí ela tirou tudo e só deixou umas mechas assim

localizadas. E eu achei o máximo e também pedi pro barbeiro, pra

90

passar a máquina dois no meu cabelo e deixar só uma mecha aqui na

frente. Uma coisa super-alternativa”. (Lúcia, 31)

et al. (1996), Lúcia e Aline, naquele momento de vida,

ser a caracterizadas dentro do Perfil Refiguração, do qual fazem parte

ir do padrão normal para o desviante, como uma

abelecidos de uma “Beleza Ideal”, física e que se

artifícios (BAUDELAIR

Pela tipologia de Holbrook

poderiam

consumidores que buscam sa

forma de crítica aos padrões est

utiliza da E, 2004; LIPOVETSKY, 2000; BAUDRILLARD,

1995).

mportamento desviante de outra maneira:

relata que tentou mudar a aparência, pintando os cabelos de vermelho. Gostou do

resultado,

4.3.3 Percepção sobre si mesma: Será que os cabelos brancos a colocam em

a, elas foram

questiona

comparação provocada, elas ext

reconhecimento que estão fora do padrão (Bouzón, 2004) ou que querem se

diferencia

Rogéria (28) expressa seu possível co

mas decidiu aguardar até o cabelo voltar a sua cor natural, o “branco“:

“Aí deixei ele crescer normal, ignorando que eu estava com dedos e

dedos de cabelo branco e deixei crescer por um tempão, meu cabelo

ficando com duas cores. Meu cabelo foi crescendo e foi ficando: branco

até a orelha, da orelha pra baixo escuro. Não liguei. Eu sabia que ia

demorar, mas queria assumir mesmo” (Lucia, 28).

desvio com os padrões?

Como as entrevistadas reconhecem seu lugar, ou seus cabelos brancos, em meio

ao padrão estético estabelecido? Antes de se fazer essa pergunt

das sobre qual seria o padrão de beleza da atualidade. Com base, nessa

ernalizaram suas opiniões e parecem ter em auto-

r dele:

91

“O padrão não me incomoda porque ainda sou jovem ou pareço jovem.

Mas eu acho que a exigência de envelhecimento é grande ainda”. (Ana

Claúdia, 33)

“O padrão é a mulher loura, magra, mas gostosa, jovem. Eu querer

fundamentalismo esse da moda. Quando mais a gente puder mostrar

Por mais

no início d , que se contrapõem

ao “fundamentalismo” do padrão, “da moda” (BAUDRILLARD, 1995). Ana Maria

nde a diferença (BAUMAN, 2003), mas acredita que o

o Paulo, isso não existe. Se a pessoa é baixa, alta, vesga. Não

existe. Interessa é o conjunto. É o conjunto da pessoa. Como ela é

fisicamente junto com que ela é pessoalmente. E de cabeça. Então eu

“Hoje as pessoas não podem ter a aparência mais velha, só é bonito

quando é jovem. Eu discordo. Acho que tem muita mulher aí mais

madura que dá show. O que eu acho que você pode estar uma mulher

madura, não tão jovem e ser bonita”. (Telma, 51)

contrapor esse padrão? Não. Não me passa nem pela cabeça. O que eu

acho preocupante é quando você tem um modelo só. Você ter só um

tipo de pessoa? Às vezes têm tantas. Aí é que começa quase como um

que a diferença é legal, mais a gente está contribuindo pra um mundo

menos tacanho. Menos polícia”. (Bruna, 38)

que Bruna não pareça disposta a ir contra a ordem vigente, como ela diz

e seu depoimento, ela é defensora das diferenças

parece compartilhar da mesma insatisfação quanto à padronização ao mesmo

tempo em que também defe

problema é mais acentuado localmente:

“Eu acho que no Rio de Janeiro está acontecendo uma coisa até de

raça pura. Uma coisa... Não é bem raça pura. Estou exagerando, mas

tem assim um padrão muito... Padrão de saúde. Padrão músculo.

Padrão isso, padrão aquilo. E são umas coisas muito fechadas. Você vai

pra Sã

92

acho uma loucura, porque nós não somos todos iguais e ao mesmo

tempo vivam as diferenças”. (Ana Maria, 53)

Lembranças passadas ajudam a compreender a contestação de Ana Maria aos

padrões e

ersavam

comigo. Era tudo em cima da minha aparência física. Então aquilo era

O depoimento de Ana Maria

fosse real

escondida dos outros sobre

não enfrentar julgamentos sociais c

NOVAS E VILHENA, 2003), Ana Maria decidiu abrir mão do convívio social, da

cê... Tem alguma outra coisa que explica

que isso me destaca de uma certa forma, de um contexto vigente de

stéticos.

“Todo Sábado tinha uma festa. E todos os meninos só queriam dançar

comigo. Sabe, era fila pra dançar comigo. E eles não conv

modelo. E aí o que aconteceu? Eu fiquei um ano sem falar com ninguém

nas festas. Não importa quem eu sou?” (Ana Maria, 53)

sugere que “ser” o padrão de beleza impedia que

çado o que de fato deveria importar. Sua invidividualidade parecia estar

o véu do belo. Apesar da pessoa dentro dos padrões

om relação a sua beleza (WOLF, 1992;

valorização da sua beleza.

Sandra (54), Aline (47) e Regina (31) observam que, em geral, as pessoas que

têm o cabelo branco são vistas como desviantes.

“No Brasil, você é estranha por não pintar o cabelo. Você é de

esquerda, você é natureba. Vo

aquela ‘porralouquice’ lá. Você é maluca de alguma forma” (Regina, 31).

“O normal pra mim seria se eu tivesse pintado o meu cabelo. Porque é

uma coisa que todo mundo faz. Então eu sou do contra porque todo

mundo acha que todo mundo tem que pintar e eu não fiz isso” (Sandra,

54).

“Não é uma bandeira. Foi uma coisa que surgiu naturalmente. É óbvio

93

massa. Não é a corrente atual. Agora isso, na verdade, não me

incomoda nem me desloca, porque isso faz um pouco parte da minha

natureza de estar sempre meio fora de sink. Uma coisa que chama a

natural da minha pessoa que combina com o resto de mim”.

Porém “desviante” não está associado ape

uma busc

continuação de seus depoiment

“É óbvio que eu adoro no meio de uma festa vir alguém falar comigo por

convívio e da aceitação dos outros, pois a diferencia

das pessoas, do padrão vigente de cabelos pintados. A partir dele ela conhece

Ao se discutir a diferença padrão normal versus desviante no que tange a beleza,

pode-se tentar utilizar a tipologia

mulheres. Percebe-se, com a análise dos

enquadrá-las inteirament

Primeiro,

cabelo. A tipologia, como Holbr

conjunto de medidas e interferências em

possibilita a passagem das categorias normal/desviantes/momento

atual/aspir

atenção de uma forma diferenciada, agora não é uma coisa proposital. É

uma coisa

(Aline, 47)

nas à “maluco” (Regina, 31) e sim a

a por “destaque” ou “diferenciação da massa” (Aline, 47) como sugere a

os:

causa disso [o cabelo branco]. Então isso nunca me fez sentir uma

outsider, uma inadequada. O cabelo nunca me fez sentir uma

inadequada. Mesmo no meio de jovens. De garotão, de garotona”.

(Aline, 47)

Seu cabelo não a exclui do

pessoas, socializa, interage com o mundo a sua volta.

de Holbrook et al. (1996) para caracterizar essas

depoimentos, que talvez não se consiga

e em nenhum tipo.

porque aqui se está analisando apenas um elemento da aparência, o

ook et al. (1996) explicam, diz respeito a um

diversas partes do corpo, que

m

ação. Ao se analisar as intervenções feitas apenas nos cabelos, esta-se

94

limitando

intervençõ

Segundo, porque par

e, assim,

seria o Perfil Refiguração (de situação normal para a desviante), que acontece à

medida que a mulher vai perdendo a coloração natural de seus cabelos. Mas o

A não-intervenção, por sua vez, poderia paradoxalmente ser considerada um tipo

de movim

padrão de

estado. O

faria mais

“Eu não faço a menor questão de ser igual. Na verdade o meu cabelo é

upas também. Eu tenho o

meu estilo próprio. Eu não sigo moda. Não tenho essa preocupação”.

er o cabelo que gosta de ter, usar as

roupas que aprecia. Ela não quer ser igual a outras pessoas. Ela admite que

o entendimento da tipologia e definir um perfil, com base apenas nas

es feitas em uma parte do corpo, pode ser precipitado.

ece ser possível dividir a análise em dois momentos distintos

dois perfis – na evolução dos fios brancos – apareceriam. O primeiro

processo de transição é um processo natural, sobre cuja evolução as

entrevistadas não têm controle.

ento a favor do desviante. No momento, então, no qual elas já estão no

sviante, a manutenção dos fios brancos indica a permanência nesse

Perfil Desfiguração (do estado de desviante para desviante), assim,

sentido para a caracterização neste momento.

uma coisa natural. Não fui eu que fiz ele diferente. Eu só mantenho ele

diferente. Eu poderia pintar e me tornar igual. Não, mantenho ele do

jeito que eu quero. Isso serve pras minhas ro

(Rogéria, 28)

Rogéria sugere que o “desviante”, na verdade, é o natural e que abre mão do que

poderia ser chamado de “normalidade” para t

busca a diferença nos cabelos, mas essa diferença nada tem de anormal; pelo

contrário, é 100% natural.

“Eu não me sinto obrigada a agradar as pessoas visualmente. Eu sou

muito, muito do meu jeito e se as pessoas entendem, entendem. Se não

95

entendem, paciência. Em geral dá certo. Muitas pessoas me entendem”

(Rogéria, 28)

A postura de Rogéria parece ir contra as formulações de Askergaard (2002),

segundo as quais, o pensamento narcisista está gerando um sentimento muito

mais ligado à identidade própria, capaz de gerar vergonha nas pessoas que não

seguem os padrões estéticos definidos.

Na verdade, Rogéria não segue padrão e não tem vergonha do seu estilo. Talvez

por ela não ter aspirações, ou seja, não olhar uma revista e desejar o cabelo e o

e

viviam a resistência em todos os momentos da vida. Os tempos mudaram e o

moviment

questiona

tempo na

mais esse

tam. Por exemplo, gosto de uma

boa roupa, entendeu? De uma boa água de colônia. Todo mundo gosta

corpo da modelo, não sinta esse constrangimento.

Desmond et al. (2001) afirmam que, ao adquirir conhecimento, os indivíduos se

davam conta da condição em que viviam e, assim, inauguravam seus

questionamentos rumo ao desviante. Eram cidadãos autocríticos e autênticos, qu

o de contracultura é hoje promovido por pessoas que transitam entre o

mento e a prática comum. São indivíduos que podem viver uma parte do

contracultura e, outra, na ordem vigente. As entrevistadas parecem ter

perfil.

“Gosto de tudo o que as pessoas gos

disso. A única coisa diferente é só o cabelo branco” (Sandra, 54)

Não é porque Sandra não pinta os cabelos que ela é diferente da maioria das

pessoas. Esse hábito não deve ser tomado de forma isolada, afinal, ela gosta de

vestir boas roupas, usar perfume, como “todo mundo”.

96

4.4 Cons(Resultados da aplicação da metodologia Laddering)

onseqüências na vida de quem age e

valores pessoais por conta da escolha.

produtos e, por isso, o termo

atributo. No entanto, é possível utilizar a técnica para avaliar atitudes dos

a do mapa da seguinte forma:

- À esqu

atributos,

- As linhas da horizontal conectam os diferentes níveis. Os números entre

- Para cada item foi definido um número, que está a esquerda do nome, para

facilitar a leitura das cadeias.

eqüências e valores da decisão de não pintar os cabelos

Para responder ao terceiro objetivo deste estudo que buscou compreender os

valores terminais por trás da atitude de manter os cabelos brancos optou-se por

recorrer a uma adaptação da metodologia de entrevista chamada de laddering,

que encadeia atributos de uma ação, c

Considera-se como atributo do laddering, na verdade, a atitude de não pintar o

cabelo. A metodologia foi criada para pesquisas com

consumidores (ZALTMAN, 2003). Neste caso, atitudes dos entrevistados podem

substituir os atributos de um produto. A figura 4 a seguir traz um mapa de ligações

entre a atitude de não pintar o cabelos, conseqüências e valores por trás dessa

decisão. Esse mapa serve de guia para a análise – que se inicia pelas

conseqüências e prossegue com os valores – das cadeias formadas a partir do

atributo “Não pintar o cabelo”.

Sugere-se a leitur

erda, na vertical, está a denominação dos seis níveis das cadeias:

conseqüências funcionais, conseqüências psicossociais, e valores;

parênteses próximos às linhas indicam quantas conexões existem entre os dois

níveis;

97

VALO

RES

O AO

ATR

IBUT

OC

onse

qüên

cia

Func

iona

l (2)

Con

seqü

ênci

a Ps

icos

soci

alC

onse

qüên

cia

Func

iona

lC

onse

qüên

cia

Psic

osso

cial

(2)

1.

belo natursatisfeita

corre risc

8. Ass crenças, valore feitos –Ser o cê é

16. AVERSÃRISCO

2. Ca• Está• Não

umir s e deque vo

Não usar tintura

al hojeos

18. AUTENTICIDADE

ecer e

ento

19. RECONHECIMENTOSOCIAL

10. durassen im

6. Coerrosto e cabelo

US LÍRI

Amaumir

velhec

BRIO

ência

17. BINTE

CA DE EQUOR

3. estraga Cabelo não

15. Não ser considerado cafona

7 aúde. Ter boa s

4. Raiz mal pintada não fica aparente

11. Não ser caracterizada como descuidada

12. Ser considerada confiável

13. Manter a beleza

5. Não gcom o q

astar tempo ue não gosta

14. Independência

9. Bem-estar

20. LIBERDADE

(3)

)

2)

(2)

(8)

(9

(3 ((

(2)

(12)

)

(3)

(2)(2)

(3)

5)

(2)(2)

(2)

(8)

(3)(2)

(2)(2)

Figura 5 – Mapa Laddering para a análise da atitude de não pintar o cabelo

VALO

RES

O AO

ATR

IBUT

OC

onse

qüên

cia

Func

iona

l (2)

Con

seqü

ênci

a Ps

icos

soci

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qüên

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Func

iona

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qüên

cia

Psic

osso

cial

(2)

1.

belo natursatisfeita

corre risc

8. Ass crenças, valore feitos –Ser o cê é

16. AVERSÃRISCO

2. Ca• Está• Não

umir s e deque vo

Não usar tintura

al hojeos

18. AUTENTICIDADE

ecer e

ento

19. RECONHECIMENTOSOCIAL

10. durassen im

6. Coerrosto e cabelo

US LÍRI

ência

17. BINTE

CA DE EQUOR

Amaumir

velhec

BRIO

3. estraga Cabelo não

15. Não ser considerado cafona

7 aúde. Ter boa s

4. Raiz mal pintada não fica aparente

11. Não ser caracterizada como descuidada

12. Ser considerada confiável

13. Manter a beleza

5. Não gcom o q

astar tempo ue não gosta

14. Independência

9. Bem-estar

20. LIBERDADE

(3)

)

2)

(2)

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(2)

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(2)

(3)

(2)(2)

(3)

5)

(2)(2)

(2)

(8)

(2)

(3)(2)

)

98

99

vém da atitude de não pintar o cabelo

os naturais, manter a saúde dos fios, não ter a raiz

2), citado pelas doze entrevistadas, assumiu

ões: na primeira, “natural” está associado à preservação da saúde, à

ão ele remete à essência da mulher,

a” e que se desenvolve até que se chegue na idéia do

ento assumido.

a 4, cadeias 1-2-8-17 e 1-2-7-17) pode ser melhor

o de duas entrevistadas naturalistas, que optaram, há muitos

arnes vermelhas. Essa opção não é tomada sozinha, como

e reflete em outros momentos da vida, como na hora dos cuidados com

rmelha, podem ser prejudiciais.

“Desde muito jovem eu comecei a prestar atenção na minha

alimentação e ver o que eu estava consumindo. Hoje a gente sabe que

não tem contaminação só pela comida. Tem a coisa dos produtos pra

pele. Têm muitas substâncias que às vezes você não está notando. (...)

As perguntas que desencadearam o uso adaptado do laddering pediam às

entrevistadas a razão para o não-uso de tinturas (Anexo 1). Com base nas

respostas, outras perguntas eram formuladas, até que se conseguisse acessar

conseqüências e valores relacionados ao atributo. Nas páginas a seguir, é feita a

descrição e a análise das cadeias formadas com os resultados da aplicação da

metodologia.

4.4.1 Conseqüências

Reunidas, as conseqüências físicas que ad

são quatro: manter os cabel

branca aparecendo e não perder tempo.

4.4.1.1 Ser natural

O termo “natural” (figura 4, cadeia 1-

duas direç

não-contaminação. Já na segunda direç

aquilo que ela é “por naturez

envelhecim

O termo “ser o que você é” (figur

compreendido no cas

anos, por não comer c

se vê ela s

os cabelos. Elas não querem colocar seus organismos em contato com

substâncias que, como a carne ve

Se eu puder preservar de alguma forma a saúde. Esse cuidado pra mim

é mais importante do que o creme. O cuidado com o que você está

ingerindo. Se você não está se intoxicando”. (Bruna, 38)

“Toda minha opção de vida foi natural. Comida natural, de eu ser

exatamente o que eu sou, não do jeito que está pré-estabelecido em

nenhum ambiente”. (Ana Maria, 53)

Em alguns discursos os cabelos “naturais” aparecem ligados ao que as mulheres

r às pessoas a serem originais. As

entrevistadas contrapõem, assim, dois tipos de beleza: a “natural” (original e

divíduo) e a “construída” (das pessoas que seguem padrões

iginalidade. Ser você. De assumir seus valores.

(Rogéria, 28)

são “de verdade” e “gostam de ser”. Sugerem reafirmações de crenças, valores e

defeitos pessoais; reafirmações legítimas, num momento em que a beleza

mostrada pela mídia não parece leva

autêntica de cada in

midiáticos, virando “personagens”, “modelos”).

“Pra mim, tudo natural é mais interessante. Tudo. Eu me sinto assim

esquisita quando eu boto uma maquiagem, é como se não fosse eu.

Parece que é um personagem. (...) Eu acho que a gente está

precisando é disso, da or

Assumir suas crenças, assumir seus defeitos. No fundo você tem seus

defeitos, mas tem alguma coisa de bonita também. E tem que olhar não

só para a aparência, a estética, o físico. A gente é muito mais do que

isso. Então as pessoas feias não são valorizadas?” (Alice, 37)

“Acho que as pessoas tentam se igualar tanto a parâmetros de beleza.

Querem se igualar tanto às modelos, às pessoas na televisão. Copiar os

cabelos, as roupas, as modas. E eu não tenho essa preocupação. Eu

acho que é importante ser original e acho realmente, meu cabelo ele é

diferente. Porque ele é diferente, a cor e tal. Eu assumo. Ele é branco. E

eu acho legal. Não teria vontade de imitar o cabelo de alguém.”

100

“Eu acho assim, que eu não estaria sendo honesta comigo. (...) Você

não gosta de um negócio, você não tem que fazer porque as pessoas

acham que é bom. Certo? Que é bonito (…) todo mundo diz que o

cabelo branco envelhece a pessoa. É uma questão de opinião. Eu acho

A percepção sobre o “natural”, encontrada nos trechos testemunhados acima

“natural”.

.” (Telma,

o cabelo

conquista

pode sign

anos e lid

que não. Não é. Então eu acho que tem que ter a opinião de dizer não.

Eu não vou fazer porque os outros querem que eu faça.” (Sandra, 54)

destacados, está de acordo com descobertas da etnografia de Bouzón (2004).

Nela, o “natural” também denota a falta de intervenções culturais e sinaliza a

“originalidade”, “aquilo que combina com nós mesmos, com o que somos”.

É possível ser natural, pintando o cabelo? A pintura é indicada como artificial no

sentido de que não permite às mulheres serem exatamente o que são, não

permite a “coerência”, a “verdade”, a beleza do

“Mas eu, por exemplo, pintar agora o meu cabelo de castanho. Vai ficar

o cabelo e a cara da pessoa; duas coisas distintas”. (Ana Maria, 53)

“Você olha um cabelo pintado, e não tem a mesma cor de um cabelo.

Você vê. A pessoa pinta um cabelo de preto, é preto realmente. Quem

tem um cabelo assim? Preto como tintura, certo?” (Sandra, 54)

“Raras vezes eu vejo alguém com cabelo pintado, que você não vê que

é pintado, que eu ache mais bonito do que um cabelo natural

51)

“natural”, “original”, “verdadeiro” vai associar-se a um equilíbrio

do com relação ao envelhecimento (figura 4, cadeia 1-2-6-10). O que

ificar a representação de que algumas mulheres aceitam o passar dos

am bem com isso, sem muitos traumas mais com algum sofrimento.

101

“Eu procurei trabalhar muito a minha cabeça no sentido de que a melhor

forma de eu enfrentar a velhice é enfrentar a velhice do jeito que ela

venha. Quer dizer, se eu brigar, negar, as mudanças que a velhice vai

trazendo na vida, muito mais difícil vai ser eu lidar com ela. Então eu

acho que a coisa do não pintar o cabelo passa um pouco por aí. Eu

acho que o meu cabelo, o grisalho dele, é compatível com a minha

idade.” (Telma, 51)

rda da

elasticidade da pele, vem isso aqui, começa a cair, tudo começa a cair.

ssoa descobrir quem ela

é e como ela quer estar no mundo, independente de como o mundo

Se por um lado, os fios brancos parecem permitir às mulheres se reconhecerem

no real momento da linha de

avançar n

experiência.

ela tem cara de ‘pirralha’, mas o cabelo é branco, ela não deve ser

“Eu também percebi que se eu fosse começar a lutar muito contra o

meu envelhecimento, eu ia entrar em sofrimento e ia envelhecer mais

rápido. Que depois do cabelo vêm as rugas, vem a pe

A lei da gravidade é inexorável” (Aline, 47)

“Acho que faz parte do amadurecimento da pe

esteja.” (Bruna, 38)

suas vidas; por outro, pode permitir às mais novas,

um tempo virtual e ser percebida até como uma pessoa de mais

“É o benefício da dúvida. Normalmente quando a pessoa te olha, e vê

que você é ‘pirralha’ a pessoa já nem te ouve. Mas como ela olha e fala:

“bom

tão ‘pirralha’ assim”. É uma coisa de deslocar de mim fisicamente o

julgamento, pro julgamento do de dentro.” (Regina, 31)

102

4.4.1.2 Ma

Outra conseqüênc

Parece existir a idéia de que

por culpa

continuado de tinturas, pode ger

1-3-7). Além disso, mulheres que hoje consideram seus cabelos sedosos e

brilhantes não gostariam de pôr em risco sua auto-estima e sua aparência caso

algo dess

ior. A gente nunca sabe. Na

dúvida eu fico como estou.” (Rogéria, 28)

A noção de risco associa-se à percepção de que a tintura é algo definitivo (“uma

vez que se pinta, vai se continuar pintando”), cujo efeito no longo prazo é

desconhecido. Essas percepções se ligam à questão do natural, não-químico.

ter a raiz do fio branco aparente. Passados alguns dias da aplicação

de uma tintura, com o próprio

começa a aparecer. Essa raiz aparent

mulheres,

A valoriza

a cuidarem . As mulheres se

emanciparam de antigas dominações, como as sexuais e as da procriação, para

ingressarem no compromisso estético, tal como o retoque dos fios brancos, uma

quase servidão.

nter a saúde dos fios

ia citada foi o não-prejuízo aos cabelos (figura 4, cadeia 1-3).

os cabelos perdem o brilho natural, o viço e a beleza

da tintura. Uma queda freqüente de cabelo, possível resultado do uso

ar desconfiança quanto a saúde (figura 4, cadeia

e errado (figura 4, cadeia 1-3-9-17).

“Eu evito fazer porque estou satisfeita com ele como ele tá. Então eu

não tenho vontade de mudar e aí às vezes fazer alguma coisa pode

causar uma mudança. Pra melhor ou pra p

4.4.1.3 Ser independente

Os testemunhos mostraram uma terceira conseqüência funcional de não pintar o

cabelo é não

crescimento natural do fio, a raiz do cabelo pintado

e, que compromete a aparência das

leva-as aos salões de cabeleireiro de tempos em tempos.

ção da beleza, para Lipovetsky (2000) e Wolf (1996), mobiliza, mulheres

de seus corpos buscando mantê-los jovens e magros

103

“A mulher paga caro pra ela aparecer bonita, você segue um montão de

exigências. E pra mim o cabelo branco é a pior delas. Uma vez que

ma possível insatisfação com a

dependência do retoque que pode aparecer quando uma mulher decide tingir seus

cabelos. Bouzón (2004) também identif

fato de elas serem, como caracteriza

atitude de

uma “necessidade, uma obrigação moral

fazem o retoque estão mostrando aos outros, através

da raiz aparente, uma outra mulher. O desleixo não é ter fios brancos, mas pintá-

todo mundo

vendo que você não é loura, com uma baita raiz preta, eu acho feio,

, uma coisa assim de desleixo” (Telma, 51)

você entra, você não tem como sair mais. Uma vez que você começa a

pintar... Não é feito a unha, que eu vou passo, não passo, tudo bem.

Não vai ser uma coisa grave. Mas meu cabelo, uma vez que eu pintar,

vai começar a aparecer aquela raiz branca crescendo. Então eu vou me

comprometer.” (Roberta, 31)

A declaração de Roberta aponta para u

icou reclamações de mulheres quanto ao

a antropóloga, “reféns” da coloração. A

pintar os fios brancos, a qual não se consegue abandonar, é vista como

e não uma opção” (BOUZON, 2004).

As entrevistas realizadas sugerem que a conseqüência funcional origina as

conseqüências psicossociais de “não ter a imagem de descuidada” (figura 4,

cadeia 1-4-11) e “a independência da tintura” (figura 4, cadeia 1-4-14). Na primeira

delas, as mulheres que não

los e não retocar no tempo adequado.

“Se você pinta o cabelo de louro é porque você quer parecer loura,

então eu fico com ele louro ou quando você quiser deixar de ser loura,

você pinta de morena. Agora você é uma loura que está

incoerente” (Maria Cristina, 33)

“Eu tenho verdadeiro horror de pessoas que pintam o cabelo, eu acho

muito feio quando começa nascer a raiz de outra cor. Pra mim, dá um

aspecto

104

“Parece desleixo, um pouco. Acho que passa realmente essa idéia de

desleixo. Não é estilo. É desleixo” (Lucia, 31)

ia psicossocial que aparece entre as entrevistadas é a

o em ter que retocar a raiz de tempos em tempos. As mulheres já

e são introduzidos em suas vidas bem

ento dos fios bran

Outra conseqüênc

insatisfaçã

possuem hábitos de beleza que normalment

antes do aparecim cos, como o corte dos cabelos

periodicamente, a depilação ou o cuidado com as unhas. Ao serem independentes

do à visibilidade social que um indivíduo

deseja ter (NOVAES e VILHENA,

em estética, num caminho cont

isto é, nã

tratados e cortados. Será que es

a sua boa imagem do que

Essa preo

normas de beleza, se cuida. Mas

pode ser v

adquirem uma percepção de que se cuidam. A desviante refaz as regras.

do retoque, a mulher não sacrifica ainda mais seu tempo livre.

“Eu sou uma pessoa vaidosa, mas eu não sou capaz de sacrificar o

meu tempo de lazer em benefício da vaidade. Não gosto dessa coisa de

ficar escrava de uma tintura e ter que ir ao Salão de quinze em quinze

dias pra retocar” (Cristiana, 49)

“Essa dependência por conta do cabelo branco, por conta da tintura eu

não quero ter, porque não me interessa. Não faz sentido pra mim perder

tempo pintando o cabelo (...) Se eu gostasse muito, se fosse uma coisa

muito importante estaria na minha agenda, mas como não é eu não

quero colocar” (Bruna, 38)

O investimento em estética é vincula

2003). À medida que as entrevistadas investem

rário, dado que elas querem ter uma boa imagem,

o parecerem desleixadas, com as raízes aparecendo; têm cabelos bem

sas mulheres são, então, mais preocupadas com

aquelas que pintam?

cupação revela uma inversão da norma – quem pinta segue aalgumas

, aquele que segue determinadas regras também

isto como desleixado? Elas subvertem algumas regras e, ainda assim,

105

4.4.2 Valo

A cadeia do laddering pode ser lida de cima para baixo ou de baixo para cima. No

Os valores que apareceram referentes ao atributo analisado, “Não pintar o

cabelo”, f

Reconhec

4.4.2.1 Au

O valor aparece ligado ao “ser o que vo

envelhecim

cadeia 1-

necessidade de retocar os cabelos.

adolescente, eu era muito reativa a essas

belo poderia ser outro “algoz” da

res

item anterior, a leitura foi feita de forma ascendente, partindo-se do atributo para

as conseqüências. Aqui, para se entender o significado dos valores, parte-se deles

em direção às conseqüências. Inicialmente, a identificação dos valores seguiu a

lista de Rokeach (HOYER; McINNIS, 2000). Com o desenvolvimento da análise

foram sendo percebidas outras definições que se mostraram mais apropriadas.

oram: Aversão ao Risco, Busca por Equilíbrio Interior, Autenticidade,

imento Social e Liberdade.

tenticidade

cê é”, ao “amadurecer e assumir

ento” e à “independência”. O depoimento da Roberta (31) ilustra bem a

4-14-19, que relaciona a Autenticidade à Independência pela não

“E eu lembro assim que eu

coisas que eu tinha que fazer pra ser mulher: ‘por que eu tenho que

fazer unha toda semana? Por que eu tenho que fazer depilação?’ (...)

Pra mim, pintar o cabelo é uma dessas pequenas prisões, que a mulher

vai se submetendo”

Da mesma forma que os cuidados com as unhas e a depilação foram percebidos

como prisões na adolescência, a tintura de ca

entrevistada, agora na vida adulta. No entanto, com a maturidade, parece ter vindo

a opção de escolha ou de negação. Ao respeitar a si mesma, ela hoje não se

submete a mais uma “escravidão”. A percepção de gestos de beleza como

106

imposições sociais ou obrigações (ASKERGAARD, 2002) pode fazer do não-pintar

um gesto de liberação individual

“O cabelo ele tem um componente forte na composição de uma pessoa

propostas, eu posso estar usando o cabelo

de uma forma errada, que não me valorize, eu fico aberta pra propostas,

ser propostas com a qual eu me sinta confortável (...)

eu. É o

reconheci

é um pro

equilíbrio.

não seria

valorizada, que faz parte da originalidade de algumas mulheres.

pessoa que se trabalha e que se aceita, e aí essa questão de cabelo

grisalho tem a ver com isso também” (Aline, 47).

O depoimento de Aline (47) caracteriza a cadeia 1-5-14-18 (figura 4) que associa a

autenticidade a outra forma de independência, aqui, não mais do ato do retoque,

mas da ida ao cabeleireiro e de ter que lidar com profissionais que, muitas vezes,

não “olham”, não respeitam as percepções estéticas.

não só física, estética, como da personalidade. Então tem que refletir

quem eu sou. O que eu gosto, o que me faz ser confortável. Então é

óbvio que eu fico aberta pra

mas tem que

Cabeleireiro me incomoda porque ele quer o que ele acha que fica bom

pra você. E te respeita muito pouco” (Aline, 47).

É ainda Aline (47) que ilustra a cadeia 1-2-6-10-18 (figura 4), em que a

autenticidade pode se ligar ao entendimento de que você envelhec

mento de que a vivência pode trazer sabedoria. Ter cabelos brancos não

blema e, sim, o reconhecimento de que se está envelhecendo com

Constitui-se uma nova relação com o conceito de envelhecimento. Este

mais uma força inexorável a ser combatida, mas uma trajetória a ser

“Envelhecer vem com o amadurecer. Você acumula uma série de

emoções, vivências e experiências; é inevitável que você fique mais

confortável com quem você é, com as coisas que você sabe, com as

memórias que você tem (...) O envelhecer te traz a sabedoria e o

equilíbrio pra lidar com certas coisas, na medida em que você é uma

107

Quando olhados sob esse ponto de vista, os fios brancos podem ganhar status.

Eles representam toda a vivência daquela mulher. São marcas de experiências.

A cadeia

conservaç

que são e

suas iden

se orgulha

mas eu acho que

eu estou satisfeita com a minha, e então não pretendo fazer isso por

Existe, entretanto, diferenças entre as concepção de ambos os valores. Na cadeia

1-2-8-17

cabeleireir

5-14-18) –

energias p

o espaço pra você se

“Eu não procuro usar o cabelo branco como uma coisa negativa. Eu

procuro olhar pra eles como são as coisas que eu passei na minha vida,

boas, ruins, muito difíceis, experiência. Estão aqui marcadas. As marcas

que a vida deixa na gente” (Telma, 51)

1-2-8-18 associa a autenticidade àquilo que você é de fato, por meio da

ão do cabelo natural. Algumas entrevistadas parecem respeitar aquilo

, principalmente, aquilo que gostam de ser. Elas não colocam em risco

tidades, caracterizadas pelos cabelos que possuem hoje e de que tanto

m.

“Pintar o cabelo causa uma mudança de personalidade muito grande.

Pra quem quer mudar muito a personalidade é ótimo,

esse motivo” (Lucia, 31).

4.4.2.2 Busca de Equilíbrio Interior

O valor Busca de Equilíbrio Interior se aproxima do valor Autenticidade quando

aparece por meio de duas conseqüências psicossociais: “ser o que você é” e

“amadurecer e assumir envelhecimento”.

– diferente do exemplo em que Aline mencionava que muitos

os não respeitavam as suas características estéticas (figura 4, cadeia 1-

o que parece evidenciado é o cuidado pessoal, que traz equilíbrio e

ara enfrentar novos problemas.

“A rotina é pesada e você já faz muitas coisas por obrigação,

porque é compromisso profissional, então

108

cuidar é importante e se cuidar é nesse sentido mesmo. Não é só

passar o creme, mas fazer aquela coisa que te dá o prazer, o

máximo prazer pra você ter aquela reserva pra enfrentar coisas

A cadeia

estar e, problemas como a queda de

cabelos, a fragilidade, a falta de brilho e viço dos fios, a mulher parece gostar de

ecimento Social

Segundo

“fazerem

benéficos

Social”, qu nseqüências psicossociais: “manter a beleza”,

“independência”, “ser o que você é”, não ser considerada “cafona”, “descuidada” e

m que se constrói uma boa

er chamada a atenção”. (Alice, 37)

que são naturais do dia-a-dia” (Bruna, 38)

1-3-9-17 sugere ser possível relacionar o cabelo sem estragos ao bem-

assim, ao equilíbrio interior. Ao evitar

se olhar no espelho e ver refletida a imagem de uma mulher “saudável”. Isso lhe

traz harmonia interior. Ao invés de brigar com sua imagem, os testemunhos

mostram que algumas mulheres grisalhas se fortalecem através dela.

4.4.2.3 Reconh

Askergaard (2002), as pessoas passaram a ter uma necessidade de se

interessantes” o tempo todo, para poderem estabelecer relacionamentos

para si. Essa constatação parece reforçar o valor “Reconhecimento

e se liga a outras seis co

“não-confiável”.

A ligação desse valor a essas três últimas conseqüências remonta a necessidade

das pessoas de passarem uma boa imagem aos outros, principalmente no

trabalho. Entre outras coisas, é através da boa image

reputação. As declarações a seguir ilustram a cadeia 1-4-11-19 e 1-4-12-19,

respectivamente:

“Na sua aparência, você tem que corresponder àquilo que foi te

cobrado, vamos dizer assim. Se você aparece no trabalho muito

desleixada, você fatalmente vai s

109

“Des

pess

Agor

nem a ela?” (Maria Cristina,

33)

os clientes.

Para Askergaard (2002), a vergonha aumenta conforme aumenta a distância entre

, ou seja, aquilo que se pode vir a ser. Se, em

ecificamente, ao ambiente de trabalho, Bouzón (2004) diz existir

nsabilidade.

A declara

pessoa jo

no sub-ite m o

Reconhecimento Social. Nesse caso, a cadeia construída pelo discurso da

entrevistada seria a 1-2-8-19. Quando se é jovem, os fios brancos podem não

cuido tem a ver com confiança. Uma pessoa que se cuida é uma

oa que parece uma pessoa responsável, uma pessoa antenada.

a uma pessoa que está desleixada, você pensa: se ela não cuida

dela como você vai confiar alguma coisa

O que Alice (37) diz parece estar de acordo com Askergaard (2002) sobre as

conseqüências do reconhecimento social através da interação a cerca da

aparência. “Ser chamada atenção” pode provocar vergonha em Alice, por ela não

estar atendendo às expectativas nela depositadas. Em seu trabalho, que envolve

atendimento ao público, ela precisaria ter uma boa imagem frente a

a percepção de si e as aspirações

sua visão, os clientes acreditam que ela pode ter uma imagem melhor com os

cabelos pintados, por que não tê-la? E assim, ao invés de vergonha, seu

sentimento passa a ser o de orgulho, pela boa reputação. A outra entrevistada

Maria Cristina parece compartilhar da noção de que beleza reflete aspectos

comportamentais do indivíduo.

Com relação, esp

um código de uso dos cabelos bem definido. Quanto mais formal a ocupação,

mais bem cuidado deve ser o cabelo. Por cuidado, entende-se: cortes e tinturas

sóbrias; penteados arrumados. Parece ser isso, também, que garante na

percepção de Maria Cristina a boa imagem de uma pessoa a quem se pode

confiar uma respo

ção da Regina (31) sobre “não ser considerada uma pirralha”, uma

vem demais para desempenhar bem uma função profissional, exposta

m que trata das conseqüências, também denota a preocupação co

110

denotar e

(2004) en

emprego,

para Regi

4.4.2.4 Liberdade e Aversão ao Risco

estar bonita. Dá um bem estar a gente estar bem.

. Para Cristiana, com relação aos cabelos, eles

nvelhecimento, mas sabedoria. Assim, a preocupação que Bouzón

controu, nas mulheres de seu estudo, em envelhecer e perder o

o que motivaria o disfarce dos cabelos brancos, parece ainda não existir

na.

Por trás da conseqüência psicossocial da “independência”, estão o valor

“Liberdade”. A cadeia que leva a Liberdade é a 1-4-14-20, é a liberdade que se

tem pelo fato de não ter que ir ao salão de tempos em tempos para fazer o

retoque das raízes. Cristiana (49) relata que não gostaria de ficar a “mercê” do

cabeleireiro em relação a essa obrigação. Existe a percepção de que o

cabeleireiro sempre atrasa. Segundo ela, depender dos outros sem saber quando

tempo você gastará do seu dia é muito ruim.

A aversão ao risco, na cadeia 1-3-9-16 está relacionada ao Bem-estar de se olhar

no espelho e se achar bonita, como relata Cristiana (49). A segurança, que advém

desse bem-estar, gera satisfação, felicidade em olhar para o espelho e se sentir

bonita: “porque é bom a gente

Eu gosto do resultado que eu vejo, eu fico feliz. Por que é bom ficar feliz? Porque

dá uma segurança”.

Neste sentido, a declaração parece estar de acordo com o que destaca Bouzón

(2004): o cabelo, quando arrumado, garante segurança emocional, protegendo a

pessoa do julgamento e da exclusão pela aparência. O conceito de arrumação, no

entanto, varia de caso a caso

precisam ser cortados de três em três semanas. O corte em dia lhe proporciona

mais segurança.

111

5. CONCLUSÃO E SUGESTÕES DE ESTUDOS FUTUROS

A profundidade pode ocultar-se na superfície das coisas ou em situações

silenciosas (Maffesoli, 2000), daí a importância que deve ser dada também às

aparências que são um vetor de agregação de tribos, ou seja, a estética faz com

onhecidos. No entanto, a compreensão

de pequenos grupos a partir de características estéticas parece ser difícil. O

trevistadas – em depoimentos que

demonstram que elas se percebem como fora de um padrão de beleza que

inal desviante ou de rebeldia, foram dando lugar a uma

demonstração de vaidade e a uma preocupação estética que poderiam estar

, com um corte moderno, com cabelos bem cuidados e brilhosos.

Para além disso, eles chegam a ser a garantia de que a aparência não será

em ou com a raiz branca aparente. Os

abelos brancos fazem parte de mulheres que, em termos de cuidados com a

aparência, parecem ser tão vaidosas quanto as que pintam. Mulheres que também

que os componentes do grupo sejam rec

indivíduo pós-moderno pertence a várias tribos e em cada uma delas pode

desempenhar um papel diferente, pode usar uma máscara específica (Cova, 1997;

Cova e Cova, 2002). O desafio, portanto, neste estudo, foi buscar semelhanças e

diferenças nos discursos de um grupo de mulheres que não pintam o cabelo.

A escolha dos cabelos grisalhos como um possível elemento da contracultura na

estética parece ter sido legitimada pelas en

valoriza o rejuvenescimento; para realização do qual, esconder os fios brancos é

uma atitude inexorável.

No entanto, o despojamento e a falta de vaidade que também pareciam

predominar inicialmente nos relatos, e que fizeram crer que a atitude de não pintar

os cabelos era um s

igualmente no discurso daquelas consideradas reféns, escravas, dependentes e

obrigadas a colorir o cabelo de acordo com as amarras dos padrões de beleza

predominantes. O cabelo branco parece possuir também fortes amarras. Tem que

combinar com o quê?

Com olhos claros

comprometida com tinturas que não combin

c

112

seguem rituais de beleza, que avaliam o que estão consumindo e que estão

preocupadas com suas aparências. O senso estético não parece desaparecer

ca por

e

esse

dúvida,

ras

sociais.

que pintam o cabelo: falam de marcas, das diferenças

entre as marcas, do preço e da qualidade do xampu, da tonalidade do branco, do

eles que devem perceber a diferença. A aparência não é o

lugar do individualismo e sim do coletivo, dos outros. “A aparência constrói-se sob

quando se adota uma estética possivelmente desviante. Muito menos a bus

uma aparência física bela e em equilíbrio.

As “desviantes” entrevistadas são capazes de identificar os padrões estéticos, d

reconhecer que estão fora de alguns deles e de questioná-los. Entretanto, e

é um achados principais deste estudo, seguem outros. Elas optam, sem

pela não adesão a certas amarras sociais, motivadas por valores como

“autenticidade”, “busca por equilíbrio interior”, “liberdade”. Valores que sugerem

estratégias de construção de uma individualidade via manipulação das reg

O discurso de algumas entrevistadas demonstra que elas têm margem de

manobra, autonomia de escolha. Quando falam do consumo de produtos para

seus cabelos, surgem preocupações e vaidades que não parecem diferir das

presentes em mulheres

branco com mais brilho, do estoque ou do descarte de xampus variados e do

comentário “dos outros” sobre como o cabelo estava diferente com aquele xampu.

E, afinal, quem são “os outros”? Nos testemunhos aparecem pessoas que as

entrevistadas admiram ou criticam, a mídia que nunca faz uma reportagem sobre

os cuidados com os cabelos brancos, os cabeleireiros que valorizam a opção com

os cortes e que incomodam com as suas propostas; vendedores, amigos,

familiares, ou seja, aqu

e para o olhar do outro” (Maffesoli, 2005, p.119).

Alguns relatos sugerem fragilidade e efemeridade. Cabelos brancos podem

representar liberdade, mas a liberdade está em constante tensão com a

113

segurança (Bauman, 2003). Os outros parecem ameaçar a individualidade ou

diferenciação buscada pela escolha de não pintar os cabelos.

Para algumas mulheres, existe um perfil da desviante, que não combina com

mulheres cuja rotina profissional seja de uma “executiva” ou “advogada”, por

si, ainda que existam casos em que as

entrevistadas transitem de um motivo para outro.

adrão.

exemplo. O cabelo grisalho não pode ser de todas. Ele, assim, caracterizaria um

grupo, como um elemento de ligação.

No entanto, através da análise dos achados desse estudo, é possível enxergar as

entrevistadas dentro de categorias distintas segundo seus principais motivos para

não pintar o cabelo. Isso indica que, mesmo sendo um pequeno grupo social, elas

podem apresentar diferenças entre

O primeiro motivo a se destacado é a busca por diferenciação. Algumas

entrevistadas marcam sua individualidade através dos seus cabelos. Ao não

colorirem o cabelo, algumas mulheres demonstram que buscam propositadamente

o desvio, a diferenciação frente à sociedade (NOVAES E VILHENA, 2003). Essa

foi uma motivação muito presente nos discursos de Lucia (31), Regina (31), Aline

(47), Cristiana (49) e Ana Maria (53).

Reações de admiração parecem estimular algumas delas a permanecerem nessa

situação, como é o caso de Cristiana (49), chamada de “bárbara e autêntica”. O

diferente desperta elogios admirados e curiosidade, em episódios que foram

relatados. Essas mulheres, com os cabelos brancos, estão em evidência porque

se diferenciam dos padrões, como indica Lucia, ao comentar que o “estilo

executiva” não combina com mulheres que não pintam o cabelo, ou seja, as

executivas parecem ser vistas por ela como um p

Interessante constatar que, para algumas dessas mulheres, o uso da tintura é

respeitado quando o que se busca é “brincar com o visual”, o “lúdico”. Elas não

114

são simplesmente contra o produto tintura, mas a maneira como ele é utilizado, o

contexto social no qual se insere.

Outro motivo que pode ser identificado no grupo das entrevistadas é avaliação do

risco de mudar o cabelo pelo uso de tinturas e colocar em risco sua aparência ou

saúde. Essas mulheres avaliam a atitude de pintar o cabelo menos sob um ponto

de vista de julgamento do contexto social, como analisado anteriormente, e mais

com um olhar sobre si mesmas. As mulheres em cujos relatos estão presentes

de Bruna (38) e de Ana Maria

(53) que levam valores do estilo de vida “natureba”, como não ingestão de

seus depoimentos. É possível ser desviante

frente a um padrão e estar satisfeita consigo mesma? Ou, será preciso estar “em

No entanto, e mais interessante, a simbologia dos fios brancos para as mulheres

essa motivação são: Rogéria (28), Maria Cristina (33), Lúcia (31), Alice (37)

O terceiro e último motivo que se delineia ao final da análise das entrevistas é o

das mulheres que não pintam os cabelos por uma questão mais “ideológica”, que

transpassa outras esferas da sua vida. É o caso

produtos químicos, para o consumo de produtos para os cabelos.

Esta-se lidando nessas categorias com as razões das entrevistadas para

continuarem em desvio. É preciso coragem para ir contra padrões estéticos

(Bouzón, 2004). Não é fácil enfrentar o julgamento social para ser desviante, e

várias razões foram apresentadas em

desvio”, para se sentir satisfeita?

A atitude de manter os fios brancos é corajosa não somente porque é preciso

conviver com a avaliação negativa no convívio social. Mas, especialmente, porque

no âmbito pessoal, essa mulher de cabelos brancos precisa conviver diariamente,

frente ao espelho, com a imagem do envelhecimento.

entrevistadas neste estudo está para além da cronologia da vida. Valores como

“autenticidade”, “reconhecimento social” e “liberdade” ajudam a explicar a decisão

115

e a colocar essas mulheres e seus cabelos grisalhos numa esfera mais ampla que

a do senso comum.

Alguns questionamentos, a serem investigados em estudo futuros, podem ser

levantados com os achados deste estudo exploratório. Pode-se sugerir a

expansão desta pesquisa para outros tipos de estudos qualitativos que possam

avaliar mais mulheres jovens e grisalhas, e de outras regiões do país, ou outros

aspectos do seu comportamento e que, talvez, identifique outras motivações e

valores na decisão de manter fios brancos.

É possível, também, desenvolver uma pesquisa quantitativa que, ao utilizar os

valores aqui identificados, teste tipos de mensagens publicitárias que atinjam e

persuadam essa categoria de consumidoras – que hoje parece não ser atingida

efetivamente pela comunicação dos produtos para coloração dos cabelos.

As informações deste estudo podem já ser úteis a empresas que comercializem

coloração e produtos para os cabelos. Através do olhar sobre as não usuárias,

talvez seja possível extrair insights e novas conclusões sobre a utilização do

produto para tingir os cabelos brancos.

116

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ANEXO 1 - ROTEIRO DE ENTREVISTA

Estudo sobre hábitos de beleza relacionados ao cabelo Introdução

dia/tarde/noite. Me chamo Flávia Rosário, sou mestranda do Instituto Coppead de Administraizando uma pesquisa sobre os hábitos de beleza das mulheres com relação a seus cabelos.

Bom ção e estou real Autorização para gravação Para facilitar nosso trabalho, eu gravo esta entrevista. Assim, não se perdem detalhes importantes da nossa conversa. Essa gravação é para uso interno da pesquisa. Você não será identificada em nenhum momento. Tudo bem? Você autoriza a gravação?

Fale um pouco sobre você: - nome completo - idade - estado civil - formação - profissão Qual a sua rotina diária? Quais são seus hábitos de lazer?

Objetivo: Identificar perfil da entrevistadora e os cuidados cotidianos com relação aos cabelos

Quais são seus principais hábitos de beleza e cuidados pessoais na em casa? (rosto, corpo, ...) E fora dela? O que mais? (ginástica, manicure, depilação, dermatologista) E com relação aos seus cabelos? (explorar produtos e serviços: Quais são? Onde compra? Alguém indicou? Freqüência de compra ou uso?)

Objetivo: Conhecer o histórico do cuidado com o cabelo e o não-uso da tintura pela entrevistada e por amigos e familiares

O nosso cabelo faz parte da nossa história. Ao longo das diferentes fases da sua vida você tem alguma lembrança relacionada ao seu cabelo? Pense, primeiro, na sua infância. Você tem alguma lembrança relacionada ao seu cabelo daquela época? (repetir para adolescência e vida adulta) Você se lembra de algum cuidado com o cabelo que você teve nessas fases e não tem mais? Vamos falar, agora, mais especificamente sobre tintura de cabelo. Você já pintou o cabelo? Se sim, como foi? (quantos anos você tinha, o que você achou, com qual freqüência você pintava os cabelos, que cores você utilizava?)

123

O que fez você mudar (deixar de pintar)? Você teve algum momento de arrependimento? Fale-me sobre ele.

es que também não são usuárias de tintura?

Na sua família e entre seus amigos existem mulher

Objetivo: Descobrir

Agora, eu vou te fazer algumas perguntas a respeito da atitude de não pintar o cabelo. Por favor, tenha em mente que não existem respostas ce

encadeamento dos atributos, das conseqüências e dos valores pessoais que estão por trás do hábito

Você disse que deixou de pintar o cabelo por causa de ..... Por quê? Por que não é bom pinta o cabelo? Por que (

de não pintar o cabelo

rtas ou erradas para essas perguntas, o que importa é o seu ponto de vista, certo?

não) é importante......? cia para você?

efícios de ....? .. algo?

.... em relação a .....? idar com respondente sensível ao tema: conversar em terceira

ntar um aspecto seu que faça o entrevistado ficar mais a vontade; ar em seguida ao tópico)

Por que .... (não) tem importânQuais são os benefícios/malPor que você não ..O que é melhor de(técnica para lpessoa; inveanotar e volt

Objetivo: Conhecer como as mulheres percebem as mulheres que pintam o cabelo e reação dos outros a atitude de não pintar

motiva as mulheres a pintarem o cabelo?

ão pintem o cabelo. Para você existe a, atitude, ...)

ocê percebe algum tipo de reação das pessoas ao seu redor em relação ao fato

positivas? Como elas são? Quem as tem? (familiares, amigos, esconhecidos, cabeleireiros)

O que você acha que mais Pense em mulheres que pintem e que ndiferença entre elas? (estilo de vid Vde você não pintar os cabelos? Em geral, quais seriam essas reações? Existem reações negativas? Como elas são? Quem as tem? Existem reações d

Objetivo: Descobrir se essas mulheres consideram a

não pintar o

beleza que predomina hoje?

o não pintar o cabelo, você acha que está fora desse padrão de beleza? De atitude de cabelo uma atitude desviante frente aos padrões de beleza que ela percebe.

Em sua opinião, qual o padrão de Aonde você acha que vem essa sua percepção?

Objetivo: omplementar a

definição do perfil C

Aplicar o Critério Brasil (em anexo)

Para encerrar, gostaria de lhetintura, que tenha entre 25 e 55

agradecer e perguntar se você conhece outra mulher que não seja usuária de anos, para indicar para esta mesma entrevista.

124

ANE entrevis

AMANDA,

IST

LUC 37

REGINA 38

ANA

MARIA,

53

SA

54

I NA

TELMA, 51

ROGÉRIA

, 28

ALINE, 47

XO 2 – E

36

MA

CR

33

scala d

RIA

INA,

e cabelos brancos da

IA, 31

ALICE,

s tadas

, 31

BRUNA, NDRA,

CR STIA

, 49

Cabelo mu

escuro, fios

brancos

quase

imperceptí

s. Cabelos

longos.

belo

ito

cu

nco

rcep s

as e

uca

antid .

belos

gos.

Cabelo

escuro, fi

brancos

perceptív

, em gran

quantida

Cabelo

médio

a

c com

e s

a s em

ade

é Tom

n

o ado.

a

n

lo

a

m

g .

i

lo

c

lo

muito

comprido.

b

s

f

m

d

d

n

m

b

t

C

m o

h n

ea.

n

ânci

cab

bran .

Tom z

clar

Cab

méd

elo

des

has

cas

omin

a dos

cos.

ito

vei

Ca

mu

es

bra

pe

, m

po

qu

Ca

lon

ro, fios

s

tívei

m

ade

os

eis

de

de.

C

es

m

br

qu

m

ci

ac

C

lo

belo

uro

cha

nca

antid

dia.

za

bre

belo

go.

Cab

mes

de f

hom

fios

e n

Tom

esc

Cab

el

cl

or

og

br

egr

c

uro

el

dio

o

ado

ma

ênea,

ancos

os.

inza

.

o

.

Cabe

mescl

de for

homo

Tom c

Cabe

curto

do

a

ênea

nza.

Mechas

acinzen

das,

distribui

s de

forma

homogê

ea. Tom

cinza –

abelo

ngo.

ta

da

n

M

a

d

d

d

h

ec

cin

as

istr

e f

ete

ea.

cinz

Cab

ha

ze

,

iuí

or

ro

To

a.

elo

longo –

s

nta

da

ma

m

s

n

Ca

me

de

ho

Pre

cia

bra

To

Ca

cur

elo

clado

orma

ogênea.

ominân

os fios

cos.

cinza.

elos

os.

abelo

esclad

de forma

omogê

Predomi

a de

elos

cos

cin

o.

elo

io.

a

C

c

g

m

b

P

â

fi

b

ab

om

ran

ec

ran

red

nci

os

ran

125

cxxvi

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